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141 Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.42, n.72 p.141-283, jul./dez.2005 ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO TRT-00930-2005-015-03-00-9-RO Publ. no “MG” de 30.09.2005 RECORRENTE: BJLN VAREJISTA DE MODA LTDA. RECORRIDA: UNIÃO FEDERAL EMENTA: AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL - PEDIDO PROCEDENTE. Constatado que o auto de infração foi lavrado por autoridade incompetente, deve ser declarado nulo, diante da ausência de um dos requisitos de validade do ato administrativo. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso, interposto contra decisão proferida pelo Ex. mo Juízo Federal da 11ª Vara/MG, em que figuram: como recorrente, BJLN VAREJISTA DE MODA LTDA.; como recorrida, UNIÃO FEDERAL (FAZENDA PÚBLICA NACIONAL). RELATÓRIO O MM. Juízo Federal da 11ª Vara/MG, pela r. decisão de f. 76/77, cujo relatório adoto, julgou improcedente o pedido formulado por BJLN Varejista de Moda Ltda., condenando-a ao pagamento das custas e honorários advocatícios, fixados em R$400,00 (quatrocentos reais). A autora interpôs apelação (f. 79/96), pretendendo que sejam declarados insubsistentes os autos de infração contra ela lavrados, com a conseqüente absolvição do pagamento das multas impostas. Apresentou comprovantes de recolhimento de custas (f. 112 e 112v). A União Federal apresentou contra-razões (f. 115/119), pugnando desprovimento do recurso. A Ex. ma Desembargadora Federal, Maria do Carmo Cardoso, Relatora designada no Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com amparo na Emenda Constitucional n. 45/2004, declinou da competência em favor deste Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, determinando a remessa dos autos (f. 134). O Ex. mo Juiz Corregedor no exercício da Vice-Presidência deste Tribunal determinou que os autos fossem enviados a uma das Varas do Trabalho de Belo Horizonte, para autuação, cadastramento e aquisição de número único, após o que deveriam ser remetidos à 2ª Instância para distribuição a uma das Turmas julgadoras (f. 138). O d. Ministério Público do Trabalho, em parecer da Drª Maria Christina Dutra Fernandez, opinou pela confirmação do julgado (f. 142). Tudo visto e examinado. VOTO Admissibilidade Conheço da apelação interposta como recurso ordinário, a teor do art. 2º da Instrução Normativa n. 27/2005 do Colendo TST. Observo que a presente ação anulatória de débito fiscal tramitou perante a Justiça Federal de 1ª Instância até abril de 2005, quando foi declarada a incompetência material pela Ex. ma Desembargadora do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (f. 134). Evidentemente, portanto, a apelação interposta em 21.11.2002 (f. 79/96) deve

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ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO

TRT-00930-2005-015-03-00-9-ROPubl. no “MG” de 30.09.2005

RECORRENTE: BJLN VAREJISTA DEMODA LTDA.

RECORRIDA: UNIÃO FEDERAL

EMENTA: AÇÃO ANULATÓRIADE DÉBITO FISCAL - PEDIDOPROCEDENTE. Constatadoque o auto de infração foilavrado por autoridadeincompetente, deve serdeclarado nulo, diante daausência de um dos requisitosde validade do atoadministrativo.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso, interpostocontra decisão proferida pelo Ex.mo JuízoFederal da 11ª Vara/MG, em quefiguram: como recorrente, BJLNVAREJISTA DE MODA LTDA.; comorecorrida, UNIÃO FEDERAL (FAZENDAPÚBLICA NACIONAL).

RELATÓRIO

O MM. Juízo Federal da 11ªVara/MG, pela r. decisão de f. 76/77, cujorelatório adoto, julgou improcedente opedido formulado por BJLN Varejista deModa Ltda., condenando-a aopagamento das custas e honoráriosadvocatícios, fixados em R$400,00(quatrocentos reais).

A autora interpôs apelação (f.79/96), pretendendo que sejamdeclarados insubsistentes os autos deinfração contra ela lavrados, com aconseqüente absolvição do pagamentodas multas impostas.

Apresentou comprovantes derecolhimento de custas (f. 112 e 112v).

A União Federal apresentoucontra-razões (f. 115/119), pugnandodesprovimento do recurso.

A Ex.ma DesembargadoraFederal, Maria do Carmo Cardoso,Relatora designada no Egrégio TribunalRegional Federal da 1ª Região, comamparo na Emenda Constitucional n.45/2004, declinou da competência emfavor deste Tribunal Regional doTrabalho da 3ª Região, determinando aremessa dos autos (f. 134).

O Ex.mo Juiz Corregedor noexercício da Vice-Presidência desteTribunal determinou que os autosfossem enviados a uma das Varas doTrabalho de Belo Horizonte, paraautuação, cadastramento e aquisição denúmero único, após o que deveriam serremetidos à 2ª Instância paradistribuição a uma das Turmasjulgadoras (f. 138).

O d. Ministério Público doTrabalho, em parecer da Drª MariaChristina Dutra Fernandez, opinou pelaconfirmação do julgado (f. 142).

Tudo visto e examinado.

VOTO

Admissibilidade

Conheço da apelação interpostacomo recurso ordinário, a teor do art. 2ºda Instrução Normativa n. 27/2005 doColendo TST.

Observo que a presente açãoanulatória de débito fiscal tramitouperante a Justiça Federal de 1ª Instânciaaté abril de 2005, quando foi declaradaa incompetência material pela Ex.ma

Desembargadora do Tribunal RegionalFederal da 1ª Região (f. 134).Evidentemente, portanto, a apelaçãointerposta em 21.11.2002 (f. 79/96) deve

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ser aqui conhecida como recursoordinário, aplicando-se o prazo de 15dias, previsto no art. 508 do CPC.

No que tange às custas,considero que foram regularmenterecolhidas, conforme documentos de f.112 e 112v (códigos 5762, 8021 e 5260).Não cabe exigir qualquer complemento,tendo em vista que se trata aqui de açãoanulatória de débito fiscal cujo pedidofoi julgado improcedente, inexistindo,portanto, condenação imposta aquaisquer das partes, salvo no quetange aos ônus de sucumbência.

Destarte, encontram-sesatisfeitos todos os pressupostos deadmissibilidade do recurso, pelo quedele conheço.

Conheço também das contra-razões, regularmente apresentadas.

Mérito

1. Violação ao Princípio daLegalidade

Insurge-se a autora BJLNVarejista de Moda Ltda. contra a r.sentença de f. 76/77, que julgouimprocedente o pedido de anulação dosautos de infração n. 856100, 856118 e856126, lavrados em decorrência deviolação aos seguintes subitens daPortaria n. 3.214/78 do Ministério doTrabalho: subitem 11.2.8, alínea “c” daNR-11; subitem 8.3.5 da NR-8 e subitem11.2.8, alínea “e” da NR-11, queprevêem, respectivamente, que osdegraus da escada de acesso aomezanino devem guardar proporçãoentre o piso e os espelhos; que a escadadeve ter piso antiderrapante e que aescada deve ter corrimão na altura de01 (um) metro, em toda a sua extensão.

Sustenta a autora a nulidade dosautos de infração por violação ao incisoII do artigo 5º da Constituição da

República, que consagra o Princípio daLegalidade, uma vez que as infraçõese penalidades constam tão-somente denormas regulamentares de portaria,inexistindo previsão legal nesse sentido.

Não lhe assiste razão, nesseaspecto.

Não se desconhece quesomente a lei, em sentido estrito, podecriar obrigações, no entanto, no casodos autos, há expressa autorizaçãolegal que possibilita ao Ministério doTrabalho a expedição de normasregulamentares que imponhamobrigações aos administrados. Deacordo com o artigo 200 da CLT, cabeao Ministério do Trabalho estabelecerdisposições complementares às normasde que trata o Capítulo V da CLT (DaSegurança e Medicina do Trabalho),tendo em vista as peculiaridades decada atividade ou setor de trabalho.Quanto às penalidades, a previsão legalestá contida no artigo 201 da CLT, queestabelece as multas a serem aplicadas.

Verifica-se, ao contrário do queafirma a recorrente, que as normasexpedidas pelo Ministério do Trabalhonão extrapolam o poder regulamentar,estando em perfeita consonância como disposto no inciso II do parágrafo únicodo artigo 87 da Constituição daRepública, segundo o qual compete aosMinistros de Estado expedir instruçõespara a fiel execução das leis, decretosou regulamentos.

Nesse sentido vinha seposicionando o Tribunal RegionalFederal da 1ª Região, competente até2004 para julgar a matéria:

A D M I N I S T R A T I V O .PROGRAMAS DO MINISTÉRIODO TRABALHO. SEGURANÇAE MEDICINA DO TRABALHO.AUSÊNCIA DE AFRONTA AOPRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

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1. As normas dos Programas doMinistério do Trabalho relativasà segurança e medicina dotrabalho em nada afrontam oprincípio da legalidade, aocontrário, seguem o estabelecidona CLT e na Constituição.2. Apelo improvido.(AMS 1997.01.00.036416-2/GO;Relator: Juiz Hilton Queiroz;Órgão Julgador: Quarta Turma;Publicação: 18.06.1999; Data daDecisão: 30.03.1999)

DEPÓSITO PRÉVIO COMOCONDIÇÃO DE RECURSO NAVIA ADMINISTRATIVA.CONSTITUCIONALIDADE.1. A exigência do depósito dovalor da multa como pressupostodo recurso administrativo nãoimplica violação aos princípiosconstitucionais do devidoprocesso legal e da ampladefesa previstos nos incisos LIVe LV, respectivamente, do artigo5º da Constituição Federal.Precedentes do STF e destaCorte.2. Improcedência da alegação deausência de fundamentação doato administrativo que impôs aaplicação de multa à embargante,pois tem por base os pareceresque refutaram as alegaçõesapresentadas pela embarganteem sua defesa administrativa,com indicação do dispositivo legalno qual se apóia, que é o quantobasta para que a exigência demotivação seja satisfeita.Precedente desta Corte.3. A discrepância entre o valor damulta inicialmente fixado e ovalor constante da petição inicialda execução decorre daaplicação dos acréscimos legais

(correção monetária e juros), oque não implica iliquidez do títuloexecutivo.4. Por outro lado, a aplicaçãosubsidiária das normas doCódigo de Processo Civil aoprocesso da execução fiscal nãoimplica a derrogação dosdispositivos específicos da Lei6.830/80 (art. 1º), pois a leiespecial prevalece sobre anorma geral (Lei de Introduçãoao Código Civil, art. 2º, § 2º).5. Não há que se falar emviolação ao disposto no princípioda legalidade estrita, uma vez quea multa em causa temfundamento nos artigos 200,inciso VII, e 201 da CLT, sendoque o primeiro dispõe quecompete ao Ministério doTrabalho estabelecer disposiçõescomplementares às normaspertinentes da CLT, tendo emvista as peculiaridades de cadaatividade ou setor de trabalho,especialmente sobre higiene noslocais de trabalho, comdiscriminação das exigências,instalações sanitárias, comseparação de sexos, chuveiros,lavatórios, vestiários e armáriosindividuais, enquanto que osegundo estabelece a multa a seraplicada.6. Assim sendo, é legal a NormaRegulamentadora 24 (NR-24) daPortaria 3.214/78 do Ministériodo Trabalho.7. Apelação provida. Remessaprejudicada.(AC 1998.01.00.030414-9/DF;Relator: Juiz Leão AparecidoAlves; Órgão Julgador: TerceiraTurma Suplementar; Publicação:15.04.02; Data da Decisão:06.03.02)

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Conclui-se, pois, que os autos deinfração foram lavrados em consonânciacom o Princípio da Reserva Legal e coma Consolidação das Leis do Trabalho,em seus artigos 200 e 201, não havendofalar em violação aos incisos II e XXXIVdo artigo 5º e ao artigo 37 daConstituição da República.

2. Descrição das infrações eausência de provas

Sustenta a autora que os autosde infração contra ela lavrados nãocontêm descrição suficiente dasinfrações, bem como não existemprovas acerca de sua efetiva ocorrência,razão pela qual deve ser declarada anulidade dos mesmos.

Sem razão.Observa-se que os autos de

infração de f. 15, 19 e 20 descrevem deforma clara a infração apontada, bemcomo a situação fática encontrada nolocal inspecionado, não trazendo paraa defesa da autora qualquer prejuízo.

Afasta-se o argumento de que osautos foram lavrados emdesatendimento ao artigo 6º da Portarian. 3.159/71 do Ministério do Trabalho,já que as violações constatadas foramobjetivamente consignadas, inexistindoomissões que possam justificar a suairresignação.

Quanto à alegação de que osautos não contêm provas das infraçõesneles consignadas, há que seesclarecer que os atos administrativosgozam de presunção de legitimidade,competindo à recorrente elidir os fatosdescritos nas autuações, ônus do qualnão se desincumbiu.

Ao contrário, a autora limitou-sea afirmar que mantém em seuestabelecimento Programa de ControleMédico de Saúde Ocupacional ePrograma de Prevenção de Riscos

Ambientais, bem como que a escadareferida nos autos de infração é usadaesporadicamente e por apenas umfuncionário. Nenhuma prova foiproduzida no sentido de infirmar os fatosconstatados pelas autuações.

Além disso, muito embora existaa possibil idade de o agente dafiscalização anexar aos autos deinfração fotos ou documentos queesclareçam melhor os fatos, talprevisão, constante do artigo 4º daPortaria n. 3.159/71, traduz-se em merafaculdade, não havendo, como quer aautora, obrigação de fazê-lo.

Desse modo, diante da nãocomprovação de irregularidades nosautos de infração, subsiste a presunçãode legitimidade dos mesmos.

3. Incompetência do agente dafiscalização

A autora sustenta ainda aincompetência da médica do trabalhoque lavrou os autos de infração, aoargumento de que tão-somenteengenheiros do trabalho poderiam atuarno exercício de funções de inspeção dasegurança do trabalho, o que tornanulos os autos de infração contra elalavrados.

Assiste razão à autora, datavenia.

A r. sentença de 1º grau rejeitoua alegação de que os autos de infraçãoteriam sido lavrados por autoridadeincompetente ao argumento de que oartigo 2º do Decreto n. 55.841/65 prevêcircunscrição com número inferior deagentes ao descrito nas supostascompetências do artigo 2º. Todavia, odispositivo legal não trata do número deagentes existentes em cadacircunscrição, mas tão-somente atribuicompetência aos agentes de inspeçãodo trabalho.

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Dispõem as alíneas “b” e “c” doinciso II do artigo 2º do Decreto n.55.841/65:

São autoridades competentes,no sistema federal de inspeçãodo trabalho, sob a supervisão doMinistro do Trabalho ePrevidência Social:[...]II - De execução, os Agentes daInspeção do Trabalho, a saber:[...]b) Médicos do Trabalho, quandono efetivo exercício de funçõesde inspeção da higiene dotrabalho;c) Engenheiros, quando noefetivo exercício de funções deinspeção da segurança dotrabalho;

Com efeito, as infraçõesatribuídas à autora referem-se a normasde segurança do trabalho, razão pelaqual os autos de infração deveriam tersido lavrados por um engenheiro dotrabalho e não por uma médica dotrabalho.

Cumpre esclarecer que, emborao Decreto n. 55.841/65 tenha sidorevogado pelo Decreto n. 4.552/02,como afirma a recorrida em contra-razões (f. 118), tal Diploma Legal estavaem vigor na oportunidade em que foramfeitas as questionadas autuações, umavez que as mesmas se deram em04.12.98 (f. 15, 19 e 20).

Registre-se que são requisitosou condições de validade do atoadministrativo a competência, afinalidade, a forma, o motivo e o objeto.A falta de um desses requisitos podelevar à invalidação do ato, à suailegalidade ou à possibilidade de suaanulação pelo Poder Judiciário.

Constatada a incompetência da

médica do trabalho para a lavratura deautos que versam sobre infrações anormas de segurança do trabalho, nãohá como afastar a argüição de nulidadedas autuações.

Destarte, dou provimento aorecurso da autora, para declarar nulosos autos de infração de n. 856100,856118 e 856126 e as multas delesdecorrentes.

ISTO POSTO, dou provimento aorecurso ordinário interposto pela autora,para, invertendo-se os ônus dasucumbência, declarar nulos os autosde infração n. 856100, 856118 e 856126e as multas deles decorrentes.

Fica autorizada a autora arequerer a devolução da quantia paga atítulo de custas mediante procedimentopróprio na Receita Federal.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes doTribunal Regional do Trabalho daTerceira Região, pela sua PRIMEIRATURMA, preliminarmente, àunanimidade, em conhecer da apelaçãointerposta pela autora como recursoordinário; no mérito, sem divergência,em dar-lhe provimento para, invertendoos ônus da sucumbência, declarar nulosos autos de infração n. 856100, 856118e 856126 e as multas deles decorrentes.Fica autorizada a autora a requerer adevolução da quantia paga a título decustas mediante procedimento própriona Receita Federal.

Belo Horizonte, 26 de setembrode 2005.

MARIA LAURA FRANCO LIMA DEFARIA

Relatora

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TRT-00766-2005-042-03-00-2-ROPubl. no “MG” de 05.10.2005

RECORRENTE: UNIÃO FEDERALRECORRIDO: SUCOCÍTRICO CUTRALE

LTDA.

EMENTA: AÇÃO ANULATÓRIA- DÉBITO FISCAL - FRAUDE ÀLEGISLAÇÃO TRABALHISTA -PSEUDOCOOPERATIVA. Aexistência de cooperativa,ainda que regularmenteformalizada, mas, sob o mantode falsa prestação de trabalhoautônomo, transferindo osbenefícios das atividadeslaborais, classificadas comoatividade-meio, ou ainda,atividade-fim da empresatomadora, deve ser coibida,por evidente afronta aoordenamento jurídico, que temcomo um dos princípiosfundamentais a dignidade dapessoa humana e os valoressociais do trabalho, integradospor um dos objetivosfundamentais da República deerradicar a pobreza e amarginalização, bem comoreduzir as desigualdadessociais (CF, art. 1º, incisos III eIV c/c art. 3º, inciso III).Concretamente, a atuação dap s e u d o c o o p e r a t i v a ,evidentemente, promove amarginalização dostrabalhadores que a ela seassociam, na medida em queos exclui dos maiselementares direitos laborais(CR, art. 7º, caput e incisos).Assim, demonstrado que opropósito da tomadora era amera intermediação de mão-de-obra, em prejuízo para os

trabalhadores tidos como“cooperados”, devida a multaaplicada por inobservância dodisposto na CLT, art. 41,devendo ser julgadosubsistente o débito fiscal,decorrente do auto de infraçãolavrado pela autoridadeadministrativa.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso ordinário,interposto da decisão da 2ª Vara doTrabalho de Uberaba, em que figuracomo recorrente União Federal, sendorecorrida Sucocítrico Cutrale Ltda.

RELATÓRIO

Trata-se de ação anulatória dedébito fiscal com pedido de antecipaçãode tutela proposta por SucocítricoCutrale Ltda. contra a União Federal,onde busca a autora a anulação damulta e do débito aplicados emdecorrência do auto de infração n.0001207725, de 30.06.1999, relativo aoprocesso administrativo n.46.242.000.864/99-20, da DelegaciaRegional do Trabalho de Minas Gerais,em razão de ter mantido trabalhadorescom as características do disposto naCLT, art. 3º, sem a respectiva anotaçãode suas CTPS dizendo-se que aintermediação da mão-de-obra foirealizada através de cooperativaregularmente constituída.

O pedido de antecipação detutela foi deferido (f. 349/350).

Após, foi interposto agravo deinstrumento, com pedido de efeitosuspensivo pela ré União Federal (f.352/359).

Pela sentença de f. 1112/1123, oExcelentíssimo Juiz Federal Substitutoda 1ª Vara Federal da Seção Judiciáriade Minas Gerais - Subseção de

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Uberaba, julgou procedente, em parte,o pedido de ação anulatória de débitofiscal com pedido de antecipação detutela, anulando-se o auto de infraçãon. 0001207725, de 30.06.1999, relativoao processo administrativo n.46.242.000.864/99-20, da DelegaciaRegional do Trabalho de Minas Gerais,condenando a União Federal aopagamento da verba honorária, bemcomo devolução das custas processuaisadiantadas.

A União Federal opôs embargosde declaração às f. 1127/1131, providospara apreciação e indeferimento dopleito de complementação do valor dodepósito do débito constante do agravode instrumento interposto, eesclarecimentos quanto aolevantamento do depósito.

Inconformada, a União Federalinterpõe recurso de apelação (f. 1132/1159), argumentando que a formação decooperativa visou exclusivamente aintermediação de mão-de-obra, sem agarantia dos mínimos direitostrabalhistas, concluindo não existirprovas suficientes a comprovar aregularidade da cooperativa formada,requerendo, ao final, a improcedência dopedido exordial e subsistência da multaaplicada através do auto de infração.

Contra-razões foram oferecidaspela autora (f. 1162/1173), pelodesprovimento.

Determinada a remessa dosautos a este Egrégio Regional (f. 1177)pelo Desembargador Federal AntônioEzequiel, para o julgamento do recursointerposto, em razão das alteraçõesintroduzidas pela EmendaConstitucional n. 45, publicada no DiárioOficial da União no dia 31.12.2004,alterando, entre outros, o artigo 114 daConstituição Federal, que trata dacompetência da Justiça do Trabalhopara processar e julgar as ações

relativas às penalidades impostas aosempregadores pelos órgãos defiscalização das relações de trabalho.

No despacho de f. 1181, édeterminada a distribuição do feito auma das Varas do Trabalho de Uberabapara, após a devida autuação ecadastramento, com a aquisição dorespectivo número único, seremremetidos a este Eg. Regional, paradistribuição a uma das Turmas paraanálise do recurso interposto.

O douto Ministério Público doTrabalho, em parecer da lavra da i.Procuradora Júnia Soares Nader (f.1187/1190), opinou pelo conhecimentoe provimento do recurso ordinário daUnião, reformando-se a v. sentençaproferida pela Justiça Federal, com oconseqüente restabelecimento do autode infração lavrado pelo MTE - Ministériodo Trabalho e Emprego.

É o relatório.

VOTO

Juízo de conhecimento

Segundo o princípio tempus regitactum, aplicável ao Direito Processual,o juízo de admissibil idade deveconsiderar a lei vigente à data dainterposição do recurso sob exame.

No caso, o recurso (f. 1132/1159)encontra-se tempestivo, tendo sidointerposto dentre do prazo paraapelação, conforme disposto no CPC,art. 188 (30 dias), regra que regia oprocesso à época da interposição, em16.10.2002, razão pela qual, também,a ausência de depósito recursal nãotorna deserto o recurso.

Assim, presentes ospressupostos intrínsecos e extrínsecosde admissibilidade, conheço do recurso,bem como das contra-razões,tempestivamente apresentadas.

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Juízo de mérito

Ação anulatória - Multa - Autode infração

Tratam os presentes autos deação anulatória proposta pela empresaSucocítrico Cutrale Ltda. contra a UniãoFederal, requerendo a desconstituiçãode auto de infração e a conseqüenteanulação do respectivo débito fiscal, aoargumento de que os trabalhadores quelhe prestam serviços na colheita delaranjas, relacionados no citado auto deinfração, não são seus empregados,mas cooperados da cooperativacontratada para este serviço -Cooperativa de Trabalho dosTrabalhadores Rurais do TriânguloMineiro Ltda. - COOTRIMI.

O MM. Juiz Federal a quo julgouprocedentes os pedidos da inicial,fundamentando que os trabalhosrelacionados à atividade-meio (colheitade laranja) não podem ser confundidascom os da atividade-fim(industrialização). Acrescentou, ainda,que o exercício do direito constitucionalde contratação de mão-de-obra nãopode ser objeto de prévia declaraçãojudicial.

A ré, ora recorrente, busca areforma da r. sentença, sustentando airregularidade do contrato firmado coma cooperativa para prestação dosserviços de colheita de laranja.

Merece prosperar a insurgênciarecursal, data venia do entendimento daorigem.

No caso, a matéria deve sertratada à luz da realidade fática, pois sóa indagação e a resposta à regularidadedos atos efetivamente praticados podemlevar a uma conclusão satisfatória,notadamente porque, do ponto de vistada constituição da cooperativa comopessoa jurídica, não se vislumbra, em

princípio, vício formal capaz deevidenciar a irregularidade ou a fraude.

Registre-se que a criação decooperativas tem sido incentivada emtodo o mundo, tendo a OrganizaçãoInternacional do Trabalho editado aRecomendação n. 127 nesse sentido,objetivando a “melhoria da situaçãoeconômica, social e cultural de pessoascom recursos e possibilidades limitadas,assim como para fomentar seu espíritode iniciativa”.

O Texto Consolidado, art. 442,parágrafo único, introduzido pela Lei n.8.949/94, dispõe que não se formavínculo de emprego entre a cooperativade qualquer ramo de atividade e seuassociado, que, nessa condição, éconsiderado como trabalhadorautônomo, segundo o Decreto n. 2.172/97.

A propósito, acerca do tema,merece ser aqui destacado trecho doartigo doutrinário “Cooperativas detrabalho: um caso de fraude atravésda lei”, de autoria do ilustre juristaMárcio Túlio Viana, publicado naRevista n. 55/56 deste Regional:

...quando a lei exclui da CLT oscooperados, refere-se apenasàqueles que realmente sãocooperados, mantendo entre sirelação societária. Em outraspalavras: pessoas que não sevinculam ao tomador deserviços, nem à própriacooperativa, pelos laços dapessoalidade, da subordinação,da não-eventualidade e dosalário. Assim, ao usar aexpressão: qualquer que seja oramo de atividade da sociedadecooperativa, a lei não estáafirmando: qualquer que seja omodo pelo qual o trabalho éexecutado. O que a lei quer éexatamente o que está nela

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escrito, ou seja, que não importao ramo da cooperativa. Mas épreciso que se trate realmente decooperativa, não só no planoformal, mas especialmente nomundo real. Ou seja: que ocontrato se execute na linhahorizontal, como acontece emtoda a sociedade, e não na linhavertical, como no contrato detrabalho. Em outras palavras, épreciso que haja obra em comum(co-operari) e não trabalho sobdependência do outro (subordinare).

Além disso, a Lei n. 5.764/71, emseu artigo 2º, estabelece como objetivoda cooperativa a defesa socioeconômicade seus associados, por meio da ajudamútua, procurando libertá-los dointermediário trabalhista, mediante otrabalho autônomo em atividadesagrícolas, industriais, comerciais e naprestação de serviços para empresasprivadas e órgãos públicos.

Por outro lado, também é bomnotar que - pela própria natureza dascooperativas - quase sempre estarãopresentes os pressupostos daonerosidade, da pessoalidade e dacontinuidade. Por isso, a pedra detoque, mais do que nunca, será asubordinação. Sem ela, aplica-se oparágrafo susomencionado; com ela, odisposto no caput do referido artigo.

Pode-se afirmar, portanto, que aprestação de serviços por cooperadosdeve apresentar como elementoidentificador e indispensável aautonomia, o que não se verifica no casodos autos pela própria natureza doserviço para o qual foram contratadosos trabalhadores, colhedores de laranja.

Nesse raciocínio, passa-se aoexame da matéria fática, ora posta aexame.

No caso sub judice, o contextoprobatório não permite visualizar, datavenia, a existência de cooperativa,embora regular sob o ponto de vistaformal.

O contrato juntado à f. 110 revela,em sua cláusula primeira, que arecorrida contratou a Cooperativa deTrabalho dos Trabalhadores Rurais doTriângulo Mineiro - COOTRIMI para aprestação de serviços “transitórios decolheita de cítrus”.

Os documentos de f. 946/947,948 e 959 (Relatórios de Fiscalização),pertinentes à inspeção realizada naFazenda Santa Rita, relatam osresultados observados pelo fiscal, taiscomo a ausência de noção decooperativismo, recrutamento porterceiros (vulgo “gatos” ou “turmeiros”),descontentamento com a remuneraçãopaga, entre outras alegações, fatoratificado à f. 954.

Acrescente-se que não se verificanos autos a existência de participaçãoativa de quaisquer daqueles cooperadosrelacionados no rol de f. 42, da diretoriadela e das suas relações com terceiros.

Mais a mais, conformeressaltado pelo parquet, a lavoura ondese executavam os serviços de colheitade laranja ocorriam no estabelecimentoda própria recorrida, haja vista que aFazenda Santa Rita é de propriedadedesta, conforme documento de f. 110.

Além disso, com base noContrato de Prestação de Serviço (f.110), item 4.6 (f. 111), verifica-se,também, que todo o material necessárioà realização das tarefas contratadas,bem como todos os meios preventivosde assepsia, em razão da possibilidadede incidência de pragas e doenças nospomares (cancro cítrico e o“amarelinho”), seria fornecido pelaautora, sendo “incondicionalmente” depropriedade da mesma (item 4.7, f. 111).

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Chama, também, especialatenção, no contrato supramencionado,o trabalho a executar, o qual seconfunde com a atividade-fim dostomadores, considerando-se que a“cliente” declara que a atividade dapropriedade - Fazenda Santa Rita - érural, predominando a produção decítrus e a mesma, reafirme-se, pertenceà recorrida.

Pode-se dizer, apesar de alegarter como atividade a industrialização ecomercialização do suco de laranjaconcentrado, que as funções exercidaspelos trabalhadores estavamrelacionadas à atividade-fim da autora,exatamente como consta do seu objetosocial.

Ademais, a subordinação ficaevidente, principalmente, pelaexclusividade exigida pela empresa,única beneficiária dos serviçosprestados pelos obreiros.

Segundo Valentin Carrion, inComentários à Consolidação das Leisdo Trabalho,

a fixação de um operário em umdos clientes, pela continuidadeou subordinação, e a perda dadiversidade da clienteladescaracterizam a cooperativa.1

Com relação à onerosidade, nãose pode olvidar de que a verba erarepassada quinzenalmente pelatomadora dos serviços, pagadoraindireta, o que se verifica na cláusulaterceira do contrato de f. 110v.

Impõe-se salientar que, tendohavido a admissão dos serviços pelareclamada e, ainda, que esses sedavam nas suas atividades finalísticas,

a ela incumbia o ônus de demonstrarfato impeditivo do reconhecimento dovínculo pretendido, já que a presunção,neste caso, é totalmente favorável àrecorrente. E desse ônus não sedesincumbiu, já que nenhuma provaproduziu em relação a esse fato.

Ainda que assim não fosse, aprova trazida aos autos é uníssona nosentido de que havia pessoalidade noexercício das atividades, bem comosubordinação e pagamento dossalários, requisitos ensejadores dovínculo pretendido.

Diante dos elementos fáticosexistentes nos autos há clara afronta aoordenamento jurídico, que tem como umdos princípios a dignidade da pessoahumana e os valores sociais dotrabalho, integrados por um dosobjetivos fundamentais da República deerradicar a pobreza e a marginalização,bem como reduzir as desigualdadessociais (CF, art. 1º, incisos III e IV c/cart. 3º, inciso III), pois, concretamente,a atuação da pseudocooperativa (jáchamadas “gatoperativas”, por alguns)vem promovendo evidentemarginalização dos trabalhadores quea ela se associam, na medida em queos exclui dos mais elementares direitoslaborais (CR, art. 7º, caput e incisos).Estes trabalhadores são postos aserviço, sob o manto de falsa prestaçãode trabalho autônomo, transferindo osbenefícios de suas atividades, estasidentificadas com os próprios fins,classificadas como atividade-meio ouatividade-fim da empresa em comento,mas, que, tornam-se trabalhadores desegunda categoria, em tese, aodesamparo da legislação laboral.

Assim, a livre iniciativa, tambémprincípio fundamental, não chega aoextremo de suprimir a aplicação ouconcretização dos demais princípios,este é o equilíbrio a ser preservado, não

1 CARRION, Valentin. Comentários àConsolidação das Leis do Trabalho. 30. ed.Editora Saraiva, 2005, p. 442.

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sendo o cooperativismo defendido pelaré, como nunca o foi, solução para oretraimento do mercado de trabalho ouos crescentes índices de desempregonos últimos anos. Mesmo o § 2º do art.174 da CR, que prevê o apoio e oincentivo ao cooperativismo, deveobedecer à orientação dos princípiosfundamentais expressamenteinsculpidos na Lei Maior, não estandoali previsto que a intermediação de mão-de-obra poderá ser exercida sob a formade associação cooperativa, traduzindo-se na supressão de direitosfundamentais de trabalhadores urbanose rurais (CR, art. 7º, caput e incisos).

Considero, pois, que, diante docontexto fático-probatório produzido nosautos, não há como não se acolher, aocontrário da v. sentença de 1º grau,renovada vênia, a pretensão darecorrente, haja vista a demonstraçãode que o propósito da recorrida é a meraintermediação predatória de mão-de-obra, em prejuízo para os trabalhadores“cooperados”, que sequer possuíamnoção da sua real situação perante adita cooperativa.

Nem se diga, ao contrário doentendimento da recorrida, que osagentes fiscais não observaram ocontrato de prestação de serviço firmadocom a cooperativa COOTRIMI, como,também, não compareceram à referidacooperativa para certificarem-se dafiliação dos cooperados, que sequerforam ouvidos. Aqui, com a devidavênia, transcrevo o entendimento da i.Procuradora que exarou o parecerministerial, inclusive fazendo remissãoà jurisprudência ali inserida, verbis:

Cumpre lembrar que noDireito do Trabalho prevalece arealidade fática em detrimento daforma e ao constatar que ostrabalhadores encontrados na

propriedade da autora não seenquadravam nos requisitos doparágrafo único do art. 442 daCLT, correta a lavratura do autode infração, data venia.

Ressalte-se que a simplespresença de cooperados e a regularconstituição da cooperativa nãoinduzem a inexistência de vínculoempregatício, havendo necessidade daausência dos pressupostos da relaçãode emprego entre os trabalhadorescooperados e o tomador de serviços,como revela a ementa do seguintejulgado:

COOPERATIVA. FRAUDE.TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA.SUBORDINAÇÃO DIRETA. AConstituição de 1988, aoincentivar o cooperativismo (art.174, § 2º), não o fez de forma aexcluir a proteção conferida aotrabalho, nos vários dispositivosque lhe são destinados (arts. 1º,IV, 6º, 170, caput e 193). É certoque o parágrafo único do art. 442da CLT exclui a existência devínculo empregatício entre ocooperado e a cooperativa.Contudo esta norma não escapaà disposição do art. 9º da CLT,ou seja, para que a contrataçãoatravés de cooperativa sejaválida é necessário que estejampresentes as característicasinerentes ao cooperativismoprevistas no art . 4º da Lei5.764/71, e ausente aconjugação dos pressupostosinerentes ao vínculo de emprego,previstos nos arts. 2º e 3º da CLT.Tudo isto em reverência aoprincípio da primazia darealidade sobre a forma, cânonedo Direito do Trabalho, que se

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destina de forma precípua àproteção do hipossuficiente narelação. No caso dos autos,evidenciada a existência desubordinação e pessoalidadediretas à tomadora de serviços,tem-se por caracterizado ovínculo de emprego, tornandoilícita a terceirização. (Enunciadon. 331, III, do TST)(AC TRT 3ª Reg. - 3ª T - RO00811-2004-021-03-00-7, Rel.Juíza Maria Cristina DinizCaixeta)

Assim, entendo que restoucomprovada a prestação de serviçosubordinado e remunerado nos termosda Consolidação das Leis do Trabalho(art. 3º) sem o necessário registro (CLT,art. 41), bem como a fraude resultantedo trabalho subordinado que se realizapor intermédio das cooperativas (CLT,art. 9º).

Dou provimento ao recurso,reformando a r. sentença proferida pelaJustiça Federal, para julgar subsistenteo débito fiscal da autora decorrente doauto de infração, invertendo-se o ônusde sucumbência.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso ordinário dareclamada. No mérito, dou provimento,reformando a r. sentença proferida pelaJustiça Federal, para julgar subsistenteo débito fiscal da autora decorrente doauto de infração lavrado pelo Ministériodo Trabalho e Emprego, invertendo-seo ônus de sucumbência.

Fundamentos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, em SessãoOrdinária da Segunda Turma, hoje

realizada, analisou o presente processoe, unanimemente, conheceu do recurso;por maioria de votos, vencido o Ex.mo

Juiz Revisor, deu-lhe provimento para,reformando a r. sentença proferida pelaJustiça Federal, julgar subsistente odébito fiscal da autora decorrente doauto de infração lavrado pelo Ministériodo Trabalho e Emprego, invertidos osônus de sucumbência.

Belo Horizonte, 27 de setembrode 2005.

ANEMAR PEREIRA AMARALRelator

TRT-00168-2005-094-03-00-2-ROPubl. no “MG” de 06.08.2005

RECORRENTES: MINISTÉRIOPÚBLICO DO TRABALHO eVIAÇÃO CISNE LTDA.

RECORRIDOS: OS MESMOS

EMENTA:AÇÃO CIVIL PÚBLICA- COMPETÊNCIA FUNCIONALORIGINÁRIA. A ação civilpública permite a obtenção detutela específica para umadeterminada coletividade detrabalhadores, enquanto quena ação declaratória denulidade de cláusulaconvencional isso não épossível, tendo em vista aabrangência da provisãojurisdicional inerente a esseremédio processual, já queafeta tanto a totalidade dacategoria profissional quantoda econômica representadaspor seus respectivos órgãossindicais. Na espécie vertente,objetivando o MinistérioPúblico do Trabalho a

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condenação da empregadora/requerida na obrigação de fazerconsistente em conceder oefetivo gozo do intervalo mínimode uma hora para o repouso ealimentação dos empregadosque laborem em jornadassuperiores a seis horas diárias,consoante a regra do caput doart. 71 da CLT, a competênciafuncional originária é do juízomonocrático e não da SeçãoEspecializada em DissídiosColetivos, não se aplicando aocaso o disposto no art. 39 doRegimento Interno desteRegional.

RELATÓRIO

A Juíza Flávia Cristina RossiDutra, da Vara de Sabará, acolheu aexceção de incompetência funcionaldaquele juízo para julgar a presenteação civil pública que, a seu ver, visaprovimento jurisdicional anulatório decláusula coletiva que reduz o intervalointrajornada mínimo previsto no art. 71da CLT, extinguindo o processo semjulgamento do mérito, nos termos doinciso IV do art. 267 do CPC.

Recorrem ambas as partes.O requerente, Ministério Público

do Trabalho, pugnando peloafastamento da incompetência funcionaldeclarada pelo juízo singular e o retornodos autos à origem para apreciação domérito da presente ação civil pública.

A requerida, Viação Cisne Ltda.,de forma adesiva, requerendo que, sendoreconhecida a competência funcional dojuízo recorrido para conciliar e julgar ofeito, sejam os autos remetidos à origempara exame das demais preliminaresinvocadas na defesa pertinentes àexceção de incompetência absoluta emrazão da matéria, inconstitucionalidade do

inciso III do art. 83 da Lei Complementarn. 75/93, carência de ação porilegitimidade ativa do Ministério Público eausência dos pressupostos necessáriospara o ajuizamento de ação civil públicae prejudicial de inépcia da inicial, sob penade supressão de instância.

Contra-razões às f. 410/414 e439/442.

Dispensado o parecer daProcuradoria Regional do Trabalho,mormente por ser ele autor na presenteação civil pública.

VOTO

Conheço de ambos os recursosporque próprios, tempestivos e nãosujeitos a preparo, examinando-osconjuntamente.

O Ministério Público do Trabalhopostula, por meio desta ação civilpública, que a empregadora/requeridaseja condenada na obrigação de fazerconsistente em conceder o efetivo gozodo intervalo mínimo de 01 (uma) horapara repouso e alimentação, bem comopela prática de lesão aos direitoscoletivos e difusos, pretendendo com oprovimento jurisdicional impedir que ainfração à ordem jurídica continue evolte a se repetir, impondo multa queseja suficiente para coibir essa prática,que somente incidirá, e será cobrada,se no futuro a lesão for reiterada.

Cabe, primeiramente, observarque o inciso III do art. 83 da LeiComplementar n. 75/93 autoriza oMinistério Público do Trabalho apromover ação civil pública, no âmbitoda Justiça do Trabalho, objetivando adefesa de interesses coletivos, quandodesrespeitados os direitos sociaisconstitucionalmente garantidos, comono caso, não restando, pois, qualquerdúvida quanto à possibilidade de suautilização no âmbito desta Justiça.

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Ao ver do parquet, trata-se ocaso dos autos de lesão a direitosdifusos e coletivos, dado que a condutapraticada pela empregadora/requeridaatinge a todos os seus atuaisempregados e os que a elaingressarem, em vista do reiteradodescumprimento da legislaçãotrabalhista (art. 71, caput, da CLT) econstitucional (inciso XXII do art. 7º daCF), além do próprio organismo social,em face da abrangência da lesãomaterial perpetrada e a ofensa aosditames de justiça social, enquadrando-se a hipótese na definição do CDC, art.81, parágrafo único, incisos I e II, (causade pedir à f. 11).

O juízo singular, em seusfundamentos às f. 374/377, teceu asseguintes razões de decidir:

[...]A nosso sentir, há a

incompetência absoluta desteJuízo monocrático para conhecere julgar a presente ação, postoque, não obstante intitulada deAção Civil Pública, em verdade,nada mais se traduz em açãoanulatória de cláusulaconvencional, cuja competência,por força do disposto no artigo39, do Regimento Interno desteRegional, seria atribuída à SeçãoEspecializada em DissídiosColetivos.

Nos termos do próprioRegimento Interno citado, tem-seque:

Art. 39. Compete à SeçãoEspecializada em DissídiosColetivos:I - conciliar e julgar os dissídioscoletivos e estender ou rever assentenças normativas;II - homologar as conciliações

celebradas nos dissídios coletivosde que trata o inciso anterior;III - julgar:[...]c) as ações anulatórias emmatéria de sua competência;

Acresça-se que o artigo25 do mesmo Regimento prevêexpressamente que:

Art. 25. Compete aoPresidente praticar todos os atosnecessários à execução dosserviços do Tribunal, na forma daConstituição da República, da leie deste Regimento, cabendo-lhe,além de outras, as seguintesatribuições:

[...]XXXII - conciliar e instruir

a ação para declaração denulidade de cláusula deConvenção ou Acordo Coletivode Trabalho, ajuizada peloMinistério Público do Trabalho,observados os trâmites e osprocedimentos da açãorescisória no que com ela não forincompatível, facultada a suadelegação na forma do incisoanterior; (grifamos)

Por certo, na searatrabalhista, o artigo 83, da LeiComplementar n. 75/93, atribuiao Ministério Público do Trabalhocompetência para:

[...]III - promover a ação civil

pública no âmbito da Justiça doTrabalho, para defesa deinteresses coletivos, quandodesrespeitados os direitossociais constitucionalmentegarantidos;

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IV - propor as açõescabíveis para declaração denulidade de cláusula de contrato,acordo coletivo ou convençãocoletiva que viole as liberdadesindividuais ou coletivas ou osdireitos individuais indisponíveisdos trabalhadores; (grifamos)

Considerando que a lei“não contém palavras inúteis”,forçosamente se há que concluirque o objeto da Ação CivilPública não é a “declaração denulidade de cláusulaconvencional”, já que previstaação própria para tanto.

Por certo, o Requerentenão foi expresso quanto aopedido de anulação de cláusulade Convenção Coletiva.Contudo, em última análise,pretende exatamente adesconsideração das reiteradasprevisões de normas coletivasquanto à repactuação dointervalo intrajornada de forma aobter a aplicação do art. 71 daCLT. Fato é que o Requerentechega a citar a OJ 342 do TST(SBDI-I) à f. 09, de forma aarrimar sua pretensão. A referidaOrientação Jurisprudencial trataexatamente de norma coletiva,senão vejamos:

OJ 342 - INTERVALOINTRAJORNADA PARAREPOUSO E ALIMENTAÇÃO.NÃO CONCESSÃO OUREDUÇÃO. PREVISÃO EMNORMA COLETIVA. VALIDADE.É inválida cláusula de acordo ouconvenção coletiva de trabalhocontemplando a supressão ouredução do intervalo intrajornadaporque este constitui medida de

higiene, saúde e segurança dotrabalho, garantido por norma deordem pública (art. 71 da CLT eart. 7º, XXII, da CF/88), infensoà negociação coletiva.

[...]De todo o exposto, forçoso

evidenciar que a Ação CivilPública detém natureza diversada Ação Anulatória, sendojuridicamente impossível atribuir-se a competência a órgão de 1ºgrau, para apreciar pedido deanulação de cláusula de acordoou convenção coletiva detrabalho, quando este não detéma competência para apreciar açãocoletiva, e, por via de extensão,para apreciar acordos ouconvenções coletivas de trabalho.

Por conseguinte, restaevidenciado que a açãocondenatória de que trata a açãocivil pública tem natureza dedissídio plúrimo, cujacompetência originária é mesmodas Varas de Trabalho; enquantoa ação anulatória de cláusulacoletiva, qualquer que seja o teordesta, tem natureza coletiva,fugindo, portanto, dacompetência monocrática dasVaras, visto que, para estas, a leiestabeleceu competência restritaa dissídios individuais, ainda queplúrimos, mas, não coletivos.

Donde podemos concluirque há incompatibilidade entreos pedidos deduzidos na açãocivil pública e aqueles passíveisde figurarem na ação anulatória,por serem diversos o escopo e acompetência originária paraapreciá-los.

Registramos, de todamaneira, que, em que pese não

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figurar pedido expresso deanulação de cláusulaconvencional, o que se extraiefetivamente do feito é que aRequerente pretende mesmo é,com a desconsideração dasreferidas cláusulas coletivas(aliás, que vêm sendo pactuadasano a ano quase de formaidêntica), a anulação de cláusulaprevista em instrumento coletivo(CCT), firmada pelos sindicatosdas categorias - advindo de taldecisão as demais decisõescorrelatas.

Estabelecendo, pois, a leiprocedimentos distintos paradefesa de interesses coletivos,genericamente, e para declaraçãode nulidade de cláusulaconvencional, em especial, bemassim, em face de previsãoexpressa contida no RegimentoInterno deste E. Tribunal, declaroa incompetência deste Juízo paraapreciar a matéria suscitada.

Em face da adoção deprocedimentos incompatíveis,com pedidos que estão afetos aórgãos de competênciasdiferentes, bem assim,considerando que todos ospedidos dependem dadeclaração de nulidade dacláusula convencional atacada,deixa-se de remeter o processoao Juízo competente, impondo-seextinguir o feito, sem julgamentodo mérito, nos termos do art. 267,IV, do CPC, por ausentes ospressupostos processuais deconstituição e desenvolvimentoválido e regular do processo.

O Ministério Público, emsuas razões recursais às f. 366/385, alegou:

[...]O art. 83, incisos III e IV,

da LC 75/93 trata das atribuiçõesdo Ministério Público doTrabalho, sendo legitimado tantopara intentar a ação civil pública,na defesa dos interessescoletivos como para proporações de declaração de nulidadede cláusula de CCTs que violedireitos individuais indisponíveisdo trabalhador.

No presente caso, oRecorrente não propôs açãopretendendo a anulação decláusulas de instrumento, bemcomo não pretendeu retirar detoda a categoria, representadapelos sindicatos, o direitoestatuído nas referidas cláusulas,até mesmo porque o pedido, sefosse julgado procedente,beneficiaria tão-somente osempregados, sejam atuais, sejamfuturos da recorrida.

E mais, para que sealcance toda a categoria serianecessário que a ação fosseproposta, seja anulatória e/ouação civil pública, em face daspartes que firmaram o instrumentonormativo, ou seja, os sindicatos.

Ainda, mesmo sendoproposta ação anulatória e/ouação civil pública, para anulaçãode cláusula e condenação emobrigação de fazer (abster deinserir em novos instrumentosnormativos cláusulas com omesmo teor), ainda assim nãoteria o mesmo objeto que apresente ação.

Sendo certo que,independentemente do queconsta no instrumento normativoe/ou sendo a cláusula anulada,a ação proposta em face dos

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sindicatos não significaria que aRecorrida estaria cumprindo odeterminado no art. 71 doDiploma Celetista.

Não merece prosperar aafirmativa do douto Juízo a quode que o que se extraiefetivamente do feito é que aRequerente pretende mesmo é,com a desconsideração dasreferidas cláusulas coletivas(aliás, que vêm sendo pactuadasano a ano quase de formaidêntica), ou seja, a anulaçãoprevista em instrumento coletivo(CCT), firmada pelos sindicatosdas categorias - advindo de taldecisão as demais decisõescorrelatas (377), em verdade oque pretende mesmo oRecorrente é o queexpressamente foi requerido emsua peça inicial, ou seja:

A condenação da Ré naobrigação de fazer consistenteem conceder o efetivo gozo dointervalo mínimo de 01 (uma)hora para o repouso ealimentação dos empregadosque laborem em jornadassuperiores a 6 (seis) horasdiárias, nos termos do art. 71,caput, da CLT, sob pena de multade R$20.000,00 (vinte mil reais)devida a cada constatação.

A condenação da Ré naresponsabilidade pela lesão aosdireitos coletivos e difusosdecorrentes da sua conduta ilícita,consistente no pagamento emdinheiro do valor deR$100.000,00 (cem mil reais),corrigido monetariamente até oefetivo recolhimento em favor doFundo de Amparo ao Trabalhador- FAT, como requerido. (f. 21)

Tendo em vista taisconsiderações, entendo que a razãoestá com o Ministério Público doTrabalho, pois não houve pedido dedeclaração de nulidade de cláusulaconvencional, pretensão que, seacolhida, afetaria tanto a integralidadeda categoria profissional quanto daeconômica representadas pelos órgãossindicais subscritores dos instrumentoscoletivos juntados às f. 241/329,hipótese em que seria cabível a açãode declaração de nulidade de cláusulade acordo ou convenção coletiva detrabalho, cuja competência funcionaloriginária para conciliar e julgar é daSeção Especializada em DissídiosColetivos, consoante o disposto naalínea “c” do art. 39 do RegimentoInterno deste Regional. O que se busca,efetivamente, na presente ação civilpública é a condenação daempregadora/requerida na obrigação defazer relativa à concessão integral dointervalo intrajornada mínimo de umahora previsto no caput do art. 71 da CLTaos empregados com o contrato detrabalho em vigor ou àqueles que vierema ser contratados após o provimentojurisdicional, tutela que afetará apenasuma coletividade determinada detrabalhadores, projetando-se para ofuturo na medida em que alcançarulteriores contratações.

Logo, a ação civil pública permitea obtenção de tutela específica parauma determinada coletividade detrabalhadores, enquanto que na açãodeclaratória de nulidade de cláusulaconvencional isso não é possível tendoem vista a abrangência da tutelajurisdicional inerente a esse remédioprocessual, já que afeta tanto atotalidade da categoria profissionalquanto a da econômica, intenção quenão foi a do Ministério Público doTrabalho, como pormenorizadamente

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exposto em suas razões recursais e sedenota da exordial, não cabendo, naespécie, interpretação judicial quedestoe do requerido, data venia doentendimento esposado pelo juízorecorrido.

Neste diapasão, peço venia paratranscrever o acórdão citado peloparquet nas suas razões recursais:

EMENTA: Recurso extraordinário.Trabalhista. Ação civil pública. 2.Acórdão que rejeitou embargosinfringentes, assentando queação civil pública trabalhista nãoé meio adequado para a defesade interesses que não possuemnatureza coletiva. 3. Alegação deofensa ao disposto no art. 129, III,da Carta Magna. Postulação decomando sentencial que vedassea exigência de jornada detrabalho superior a 6 horasdiárias. 4. A Lei Complementar n.75/93 conferiu ao MinistérioPúblico do Trabalho legitimidadeativa, no campo da defesa dosinteresses difusos e coletivos,legitimidade ativa, no campo dadefesa de interesses difusos ecoletivos, no âmbito trabalhista. 5.Independentemente de a próprialei fixar o conceito de interessecoletivo, é conceito de DireitoConstitucional, na medida em quea Carta Política dele faz uso paraespecificar as espécies deinteresses que compete aoMinistério Público defender (CF,art. 129, III). 6. Recursoconhecido e provido para afastara ilegitimidade ativa do MinistérioPúblico do Trabalho.(Recurso extraordinário n. 213-015-0; Relator Ministro Néri daSilveira; Precedente citado: RE163.231-SP (DJU de 29.06.2001);

recorrente: Ministério Público doTrabalho; recorridos: PetróleoBrasileiro S.A. - PETROBRÁS eoutros; julgamento proferido em08.04.2002 e acórdão publicadono DJ de 24.05.2002)

Na referida decisão, o MinistroRelator transcreve o despacho deadmissibil idade do recursoextraordinário, exarado pelo Presidentedo TST, merecendo destaque o seguintetrecho, por amoldar-se com perfeição àhipótese dos autos:

Ora, para se percebercomo na ação civil pública emapreço se defendiam interessescoletivos, basta verificar que nãose postulou reparação do danocom relação ao passado, masimposição de obrigação de fazerem relação ao futuro, dando-se àdemanda caráter cominatório enão indenizatório individual!Assim, o enquadramento dahipótese concreta - ação públicapostulando a imposição deobrigação de não fazer emrelação a toda a categoria - comode interesse individual é distorcera realidade de forma a não ter queenfrentar a questão concreta.Desde que os fatos estejampostos, por mais sibilina que sejaa controvérsia, não pode o PoderJudiciário furtar-se a enfrentá-lo.Independentemente da própria leifixar o conceito de interessecoletivo (fazendo-o, no caso,como expressamente o diz “paraefeitos deste Código” - Lei8.078/90, art. 81), ele é conceitode Direito Constitucional, namedida em que a Carta Políticadele faz uso para especificar asespécies de interesses que

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compete ao Ministério Públicodefender (CF, art. 129, III).Distorcer o conceito de interessecoletivo ou dar-lhe conceitodistinto do que pretendeu aConstituição é violar a CartaMagna de forma direta.(destaques no original)

Noutro vértice, dispõe o art. 83do CDC que “Para a defesa dos direitose interesses protegidos por este Códigosão admissíveis todas as espécies deações capazes de propiciar suaadequada e efetiva tutela”, dessumindodessa regra que não há qualquerlimitação ou restrição quanto aospedidos formulados em ação civilpública, conforme ensinamentosdoutrinários citados pelo MinistérioPúblico:

É correto dizer que nós játemos um processo civil capazde permitir a tutela jurisdicionaladequada dos conflitos própriosda sociedade de massa. Osistema brasileiro de tutelacoletiva dos direitos é integrado,fundamentalmente, pela Lei n.7.347/85 - a Lei da Ação CivilPública - e pelo Código deDefesa do Consumidor. O artigo90 do Código de Defesa doConsumidor manda aplicar àsações ajuizadas com base noCódigo - as normas da Lei daAção Civil Pública e do Códigode Processo Civil. Por outro lado,pelo artigo 21 da Lei da AçãoCivil Pública - introduzido peloartigo 117 do Código de Defesado Consumidor - são aplicáveisàs ações nela fundadas asdisposições processuais queestão no Código de Defesa doConsumidor. A Lei da Ação Civil

Pública e o Código de Defesa doConsumidor estão interligados,existindo uma ampla e perfeitainteração entre os dois estatutoslegais.

Atualmente é possível atutela de qualquer direito difuso,coletivo ou individual homogêneo.Muito embora o art. 1º, IV, da Leida Ação Civil Pública, fale apenasem direitos difusos ou coletivos, éviável a tutela coletiva de direitosindividuais homogêneos que nãodigam respeito às hipótesesexpressamente previstas na Leide Ação Civil Pública.

Inicialmente a Lei da AçãoCivil Pública regulava apenas asações de responsabilidade civil,de obrigação de fazer e não fazere as ações cautelares. Hoje, emvista do art. 83 do Código deDefesa do Consumidor - queconsagra o direito à adequadatutela jurisdicional - são cabíveistodas as espécies de açõescapazes de propiciar a adequadae efetiva tutela dos direitosdifusos, coletivos e individuaishomogêneos. Podem serpropostas, assim, as açõesdeclaratória, constitutiva,condenatória, mandamental,executiva e cautelar. Nada obsta,portanto, uma ação coletiva quevise a desconstituir um contratoadministrativo lesivo ao meioambiente.(In MARINONI, Luiz Guilherme.Novas linhas do processo civil.2. ed. São Paulo: MalheirosEditores, 1996, p. 54)

Para a propositura daACP, a atividade do MP doTrabalho não está limitada “àsquestões trabalhistas, pois a

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legitimação ampla e irrestrita doParquet, na defesa dos direitosdifusos e coletivos, decorrediretamente da CF 129 III.(In NERY JÚNIOR, Nelson eNERY, Rosa Maria Andrade.Código de processo civilcomentado, comentários à Lei deAção Civil Pública, 1999, SãoPaulo: Editora Revista dosTribunais, p. 1130)

Observa-se, finalmente, que amenção à OJ 342 da SBDI-I do TST nainicial não tem o condão de, por si só,transmudar a natureza processual daação intentada, servindo a citaçãoapenas como apoio à tese de lesão dedireito individual e indisponível de cadaempregado da requerida, já que assenteno âmbito do TST o entendimento deque a redução do intervalo para repousoe alimentação é prejudicial aoempregado, visto que afeta a higiene,saúde e segurança do trabalho, sendotal matéria infensa à negociaçãocoletiva, como deixa claro a referidaorientação jurisprudencial. Quanto àalegação de defesa no sentido de queexiste ajuste coletivo amparando oprocedimento patronal, trata-se dequestão incidental e como tal deve serexaminada, sendo certo que apesar deao juízo monocrático ser vedada adeclaração da nulidade de cláusulaconvencional, à vista da suaincompetência funcional para fazê-lo, aele é permitido deixar de aplicar ajustecoletivo que traz prejuízo à saúde esegurança do empregado, tendo emvista a garantia constitucional inserta noinciso XXII do art. 7º.

Destarte, declara-se acompetência funcional originária do Juízode primeiro grau para conciliar e julgaros pedidos constantes da presente açãocivil pública, devendo os autos retornar

à Vara de origem para exame das demaispreliminares argüidas e do mérito, comorequerido por ambos os recorrentes,restando prejudicado o exame do recursoadesivo.

Isto posto,

Conheço de ambos os recursose dou provimento ao do MinistérioPúblico do Trabalho para declarar acompetência funcional originária doJuízo de primeiro grau para conciliar ejulgar os pedidos constantes dapresente ação civil pública, devendo osautos retornar à Vara de origem paraexame das demais preliminaresargüidas e do mérito, como entender dedireito, restando prejudicado o examedo apelo adesivo.

Fundamentos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, em sessão ordináriada Quinta Turma, julgou o presenteprocesso e, preliminarmente, àunanimidade, conheceu de ambos osrecursos; no mérito, sem divergência,deu provimento ao do Ministério Públicodo Trabalho para declarar acompetência funcional originária doJuízo de primeiro grau para conciliar ejulgar os pedidos constantes dapresente ação civil pública, devendo osautos retornar à Vara de origem paraexame das demais preliminaresargüidas e do mérito, como entender dedireito, restando prejudicado o examedo apelo adesivo.

Belo Horizonte, 2 de agosto de2005.

JOSÉ MURILO DE MORAISRelator

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TRT-00710-2004-087-03-00-8-ROPubl. no “MG” de 26.11.2005

RECORRENTE: CERÂMICA SAFFRANS/A

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICODO TRABALHO

EMENTA: AÇÃO CIVILPÚBLICA - DANO MORALCOLETIVO - NÃOCONFIGURAÇÃO. Emboraconstatada a deficiência naobservação, pela empresa, denormas de medicina,segurança e higiene dotrabalho, não se pode extrairdaí a existência de umsentimento coletivo deindignação, de desagrado e devergonha capaz de ferir a“moral” da coletividadeinserida nesse contexto, paraefeito de indenização por danomoral coletivo. Para esse fim,o ilícito e seus efeitos devemser de tal monta que a repulsasocial seja imediata eextrapole aquela relativa aodescumprimento pelo agentetransgressor de determinadasnormas de conduta trabalhista.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso ordinário,oriundos da 4ª Vara do Trabalho deBetim/MG, em que figuram, comorecorrente, CERÂMICA SAFFRAN S/Ae, como recorrido, MINISTÉRIOPÚBLICO DO TRABALHO.

RELATÓRIO

Ao de f. 4580/4581, que adoto ea este incorporo, acrescento que o Ex.mo

Juiz José Nilton Ferreira Pandelot, emexercício na 4ª Vara do Trabalho de

Betim/MG, pela sentença de f. 4580/4587, rejeitou a preliminar deimpossibilidade jurídica do pedido e aprejudicial de suspensão do processoe julgou procedentes, em parte, ospedidos deduzidos na ação civil pública,proposta pelo Ministério Público doTrabalho em face da ré, para confirmarinteiramente a antecipação de tutela econdenar a ré a cumprir e manter emcumprimento as obrigações descritasnas alíneas de “a” a “o”, do item 1 dapetição inicial, salvo a alínea “n”, quefoi indeferida, sob pena de multa diáriade R$1.000,00, em caso dedescumprimento de cada obrigaçãodescrita naqueles itens, cujo valor serárevertido ao Fundo de Amparo aoTrabalhador - FAT, nos termos do art.13 da Lei n. 7.347/85, conformepostulado no item 2 da inicial, e pagar aindenização postulada no item 3, parareparação do dano moral coletivo, masno valor de R$200.000,00, que serárevertido também em favor do FAT, porforça do mesmo dispositivo.

Embargos de declaraçãoopostos pela reclamada às f. 4589/4591,julgados improcedentes (f. 4598/4599).

Às f. 4607/4654, a reclamadainterpõe recurso ordinário. Argúi acarência de ação, por impossibilidadejurídica do pedido. Aponta a ocorrênciade julgamento extra petita. Pede areforma da sentença, com relação aospedidos por ela acolhidos e,conseqüentemente, à multa diária, bemcomo à indenização por dano moralcoletivo.

Junta comprovante derecolhimento das custas e do depósitorecursal (f. 4656/4657).

O recurso ordinário veioacompanhado de vasta documentação(f. 4658/5105).

Contra-razões pelo MinistérioPúblico do Trabalho (f. 5111/5139).

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Argumenta que a ré incorre em litigaçãode má-fé, ao alegar a ocorrência dejulgamento extra petita . Requer odesentranhamento dos documentosapresentados com a defesa. Pede odesprovimento do recurso.

À f. 5137, o MPT opinou peloprosseguimento regular do feito. É orelatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

Satisfeitos os pressupostosobjetivos e subjetivos deadmissibilidade, conheço do recurso.Não conheço, contudo, dos documentosde f. 4658/5105, a teor da Súmula n. 08do C. TST, estando preclusa aoportunidade para a sua juntada.

Juízo de mérito

Da carência de ação -Impossibilidade jurídica do pedido

Argumenta a recorrente quetanto o pedido liminar quanto apretensão de mérito, formulados peloautor, são juridicamente impossíveis,por não encontrarem amparo no direitomaterial positivo.

Sustenta que as obrigações defazer a ela impostas já foramimplementadas em seu estabelecimentofabril.

Ressalta que a ação quetramitava na 20ª Vara Federal de BeloHorizonte, processo n.2004.38.00.006356-0, com o objetivo dedeclarar a ilegalidade dos autos deinfração lavrados e que embasaram apresente ação civil pública, foi extinta,tendo a decisão transitado em julgado,haja vista a comprovação da realizaçãodas obrigações a ela impostas.

Sustenta que constitui violaçãoao princípio constitucional da livreiniciativa (artigo 170 da CR/88),intimamente vinculado aos princípios daigualdade e liberdade, o fato de outroente assomar para si a deliberação dosatos do particular.

Aponta, ainda, a ocorrência deafronta ao inciso II do artigo 5º daCR/88, ao fundamento de que o autornão apontou as disposições legais,relativas às medidas de segurança, queconferem à empresa obrigatoriedade deserem por ela observadas e cumpridas.

Sem razão.Não há dúvida de que, na

hipótese em apreço, o Ministério Públicoatua na defesa de interesses coletivos,sendo, também, incontroverso que sediscutem nos autos direitos sociaisconstitucionalmente garantidos, hajavista que a Magna Carta assegura odireito à saúde e à segurança dotrabalho (art. 7º, XXII), representando aação civil pública, no âmbito da Justiçado Trabalho, um instrumento deproteção do ordenamento jurídico comoum todo.

Da mesma forma, a tutelaantecipatória concedida (f. 4489/4493)encontra amparo nos artigos 11 e 12da Lei da Ação Civil Pública (Lei n.7.347/85) c/c artigos 273 e 461 do CPC.

Outrossim, com relação à açãoque tramitava na 20ª Vara Federal deBelo Horizonte, processo n.2004.38.00.006356-0, importaesclarecer que, em razão de acidenteocorrido no labor junto às “prensas”,com lesão da mão direita de trabalhador(f. 2528/2538), foi a empresa notificadapara sanar as irregularidades (TN 39683- f. 2505), tendo sido, ainda, lavradotermo de interdição das referidasmáquinas (f. 2503). Tal providênciaensejou a concessão de pedido liminarpara suspender a exigibilidade do ato,

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em face de ação cautelar preparatóriaproposta pela empresa (f. 2523/2525 e2574/2587), em que pese a eficácia dorespectivo auto ter sido restabelecida,em face de AI aviado pela AGU (f. 2791).

Nesse diapasão, ao contrário datese da recorrente, tal fato não constituióbice à proposição da presente açãocivil pública, que visa, de forma maisampla, à adoção de medidas desegurança, não se limitando à anulaçãode auto de infração que apurou, deforma específica, a utilização de formaincorreta das “prensas”, maquinários daempresa.

Lado outro, não há falar emviolação ao princípio constitucional dalivre iniciativa (artigo 170 da CR/88),bem como aos princípios da igualdadee liberdade e da reserva legal, sobretudoem se considerando que os mesmosnão se podem contrapor aos direitossociais indisponíveis referentes ao meioambiente de trabalho,constitucionalmente assegurados(artigo 7º, XXII).

Nesse aspecto, assinala adoutrina:

Com efeito, assegura oart. 1º da Constituição Federal,como fundamentos da RepúblicaFederativa do Brasil e do EstadoDemocrático de Direito, acidadania, a dignidade dapessoa humana e os valoressociais do trabalho, entre outros.O art. 170 da mesma Lei Maior,que cuida da ordem econômicano sistema capitalista, diz que alivre iniciativa deve fundar-se navalorização do trabalho humanoe ter por fim assegurar a todosexistência digna, conforme osditames da justiça social,observado como princípio adefesa do meio ambiente, do que

se extrai que, em termosteóricos, a Carta Magna procuroucompatibilizar a livre iniciativapara o desenvolvimentoeconômico com o respeito àdignidade humana no trabalho,o que significa dizer que oconstituinte norteou-se noprincípio do desenvolvimentosustentado. Em outras palavras,o constituinte de 1988 asseguroue incentivou a livre iniciativaeconômica, desde querespeitados os princípios quenorteiam a dignidade da pessoahumana, no caso, o respeito aomeio ambiente do trabalho comonovo direito da personalidade.(MELO, Raimundo Simão de.Ação civil pública na Justiça doTrabalho, 2. ed. São Paulo: LTr,2004)

Por fim, as discussõesabrangendo o cumprimento dasobrigações de fazer, impostas àempresa, exigem a aferição de mérito,emergindo, sem dúvida, a possibilidadejurídica do pedido, já que nada há, noordenamento jurídico, a vedar oexercício do direito de ação. Pelocontrário, a legislação prevê, emabstrato, o direito pretendido.

Presentes, pois, as condições daação, sobretudo a possibilidade jurídicado pedido, rejeito a argüição em apreço.

Da realidade dos fatos

Sob o título epigrafado, em longaexposição, a recorrente aponta quesempre cumpriu com suas obrigaçõeslegais, sobretudo com aquelasrelacionadas à implantação das normasde segurança do trabalho, ditadas pelaatuação da DRT.

Menciona que a diligência fiscal,

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ocorrida em 05.09.2000, nadacomprova, tendo implementado todasas medidas de segurança constantes dorespectivo termo de notificação.Argumenta que os fiscais da DRTsomente voltaram ao seu parque fabriltrês anos após, ou seja, em dezembrode 2003, quando ocorreu um acidentecom empregado, não sendo esse fatoatribuído ao funcionamento das“prensas”.

Aponta que, desde o ano de1988 até 2003, a DRT realizou apenas06 inspeções em suas dependências,colocando em dúvida, assim, se aocorrência de negligência e imprudênciaseria mesmo da empresa requerida.

Argumenta que não existequalquer contexto fático que caracterizeo histórico de acidentes do trabalhonarrados na exordial, sobretudo em seconsiderando o relato de ocorrência deapenas 04 infortúnios, nos anos de1988, 1992, 1993 e 2003.

Aduz que, em momento algum,omitiu-se na regularização de suaconduta com relação ao cumprimentodas normas de saúde e segurança,tendo ocorrido grandes desajustes earbitrariedades na atuação dos fiscais,prejudicando-a sobremaneira.

Sustenta que os auditores,responsáveis pelo relatório de vistoria,elaborado em janeiro de 2004, nãopossuem formação em Engenharia doTrabalho, mas, tão-somente, emMedicina do Trabalho, tendodeterminado a adoção de medidasextremamente gravosas para aempresa, sem a existência de qualquerlaudo pericial competente, bem comosem apresentação de qualquer ordemde serviço, na forma da IN 47/3003 doMTb.

Menciona ainda que, naquelaoportunidade, houve inobservânciapelos fiscais do trabalho do caráter

pedagógico, bem como do critério dadupla visita (NR-28 da Portaria n.3.214/78 do MTb).

Assinala que o Termo deAjustamento de Conduta, proposto peloMTb, não foi por ela assinado, sobretudopelo fato de já se encontraremviabilizadas todas as normas demedicina e segurança do trabalho.

Como se vê, a reclamada,através desses argumentos, sustenta ainvalidade dos atos jurídicosadministrativos, e que serviram defundamento para a presente ação, o quenão pode ser acolhido.

Nesse sentido, fazendo umabreve análise dos fatos constantes dosautos, verifica-se que, a partir dedenúncia ofertada pelo procurador dotrabalho, em face de reclamaçãotrabalhista (RO-07385/99 - f. 39), ondefoi apurada, através de perícia, apresença de ambiente insalubre/periculoso, na empresa reclamada, foiinstaurada representação contra a orarecorrente, por indícios de lesão adireitos sociais constitucionalmentegarantidos, consubstanciados nainobservância da proteção integral domeio ambiente de trabalho - f. 76.

Referida representação foiconvolada em procedimento prévioinvestigatório (f. 77/82). Nessa ocasião,foi a reclamada intimada a fazer provacontrária ao teor da denúncia, bemcomo ao respeito às normas desegurança e medicina do trabalho (f. 83/84).

Com o fito de coletar maioreselementos para comprovação do ilícitodenunciado, foi expedido ofício àSubdelegacia do Trabalho de Betim,solicitando fiscalização da empresa (f.85).

Às f. 1927/1928, a DRT informouque, em resposta àquela determinação,foram realizadas ações fiscais na

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empresa, nos dias 23.04 e 10.09.1999,tendo concluído pela necessidade denovas ações fiscais para verificação dafase de implantação das medidas desegurança pertinentes.

Lado outro, em face dosdocumentos apresentados pelaempresa, com vista a comprovar ocumprimento do objeto da denúncia (f.88/1925), o MPT, através de relatórioelaborado por engenheira de segurançado trabalho (f. 1932/1936), sugeriu, namesma linha da DRT, apresentação dareavaliação do programa PPRA(Programa de Prevenção de RiscosAmbientais), apontando, ainda, anecessidade de solução de algumaspendências relacionadas ao ambientede trabalho da empresa.

Nesse aspecto, a ProcuradoriaRegional do Trabalho da 3ª Regiãonovamente solicitou à empresa ofornecimento de outros documentos (f.1938/1940), o que foi cumprido às f.1941/2049.

Remetidos os autos para a i.perita, engenheira do MPT (f. 2100), foiapurada a permanência de maispendências, relativas à segurança dotrabalho.

Destarte, considerando assugestões da i. perita, o MPT intimou aempresa para, novamente, apresentaras provas mencionadas (f. 2105/2107),tendo sido por ela anexados novosdocumentos (f. 2115/2362 e 2364/2431e 2363).

Nessa oportunidade, a DRT foitambém oficiada, em 25.07.2000 (f.2107), para que a empresa fossenovamente fiscalizada.

Nesse diapasão, às f. 2432/2434, em 05.09.2000, a DRT, atravésdos termos de notificação de n. 41884,47169 e 47632, e com base no relatóriode vistoria juntado às f. 2477/2485,determinou à empresa reclamada,

estabelecendo prazos, o cumprimentode exigências relativas à segurança emedicina do trabalho.

Com fundamento na inspeçãofiscal realizada na DRT, em setembrode 2000, e, ainda, considerando osdocumentos apresentados pelaempresa, bem como as diversassolicitações da investigada deconcessões de prazos extensos parasanar as irregularidades apontadas nostermos de notificações (doc. de f. 2438),a engenheira de segurança do trabalhodo MPT (f. 2435/2436) sugeriu aelaboração de um Termo de Ajuste deConduta (minuta de f. 2491/2492), cujascláusulas foram elaboradas a partir deopinião conjunta (DRT e MPT), conformeinformação da i. perita (f. 2477), o quefoi acatado pela procuradora do trabalho(f. 2476v).

Às f. 2489/2490, visando ultimaras investigações, determinou aprocuradora do trabalho a expedição deofício à SDT de Betim, solicitando oenvio do histórico de fiscalizaçõesimplementadas na investigada, desde2001, assim como relatórios fiscais,notif icações, autos de infração,porventura lavrados, nos anos de 2002e 2003. Em caso negativo, solicitou-senova fiscalização.

Atendendo à referida solicitação,às f. 2493 e seguintes, foramapresentados laudos de vistorias daDRT, realizados em 2004, em razão deacidente ocorrido em prensa, com lesãoda mão direita de trabalhador (f. 2528/2538), tendo sido apurada a ausênciade proteção adequada nas zonas deprensagem, desde setembro de 2000 (f.2499-TN 47362 e relatórios de f. 2479e 2453/2454, este último elaborado pelaprópria empresa).

Nessa ocasião, foi a empresanotificada para sanar as irregularidades(TN 39683 - f. 2505), tendo sido, ainda,

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lavrado termo de interdição dasreferidas máquinas (f. 2503),providência essa que ensejou, inclusive,a concessão de pedido liminar parasuspender a exigibilidade do ato, emface de ação cautelar preparatóriainterposta pela empresa (f. 2523/2525e 2574/2587).

Da mesma forma, à f. 2543, aDRT apresentou resumo das vistoriaspor ela realizadas na reclamada, desde1988.

Com o escopo de manter aquelainterdição, cuja eficácia do respectivoauto, inclusive, foi restabelecida, emface de AI aviado pela AGU (f. 2791), oMPT propôs à ré, então inquirida noinquérito civil público, a celebração deTermo de Compromisso de Ajustamentode Conduta (f. 2613/2617), cujaaudiência foi marcada para 05.04.2004,contemplando sanar as irregularidadesverificadas nas diversas ações fiscaisempreendidas em seu estabelecimento(f. 2612).

A empresa, por seu turno,recusou-se a firmar o TAC (f. 2620),sendo que, em virtude da juntada, emaudiência, de documentos tendentes acomprovar a regularização dependências (f. 2622/2674 e 2676/2788),foi a ela concedido o prazo de 20 diaspara apresentação de contraproposta aoTAC oferecido. Nessa oportunidade, foiainda determinada a expedição de ofícioà Subdelegacia do Trabalho de Betim,para verificar o cumprimento dasnormas de medicina e segurança (f.2621 e 2675).

Todavia, o relatório de vistoria def. 2792/2794 comprova que, em02.06.2004, auditores-fiscais do trabalho(dois engenheiros de segurança e ummédico do trabalho) compareceram àempresa e constataram a subsistênciade várias irregularidades, inclusive orisco acentuado nas prensas.

Feitos esses relatos, não severificou nos autos qualquerirregularidade na atuação e vistoriasrealizadas pelos fiscais da DRT,sobretudo naqueles termos denotificação lavrados em 05.09.2000 (f.2432/2434), que, com fundamento norelatório de vistoria (f. 2477/2485),estabeleceram prazos para a reclamadacumprir com as exigências relativas àsegurança e medicina do trabalho.

Outrossim, o fato de terem sidorealizadas apenas 06 inspeções noparque fabril da empresa, desde o anode 1988 até o ano de 2003, nãocompromete a atuação da DRT, sendoda empresa o dever legal de promoveravaliações periódicas das suascondições de segurança, medicina esaúde, visando à melhoria dascondições de trabalho dos seusempregados.

Da mesma forma, o histórico dasinspeções realizadas pela DRT,sinalizando a ocorrência de trêsacidentes na empresa, nos anos de1988, 1992, 1993 e, ainda, dois casosde doenças profissionais, apuradas em1999, ao contrário da tese da recorrente,não podem ser desconsiderados parafins de caracterização de um históricode acidentes do trabalho na empresa,uma vez que poderiam ter sido evitados,caso a reclamada não tivessenegligenciado com a adoção demedidas de proteção, as quais tem odever de cumprir.

Lado outro, o laudo técnicorealizado na 8ª Delegacia de Betim (f.3184), referente a acidente do trabalhonas dependências da empresa, nãotem o condão de invalidar aqueleapresentado pela DRT (f. 2503), datadode 14.01.2004, bem como o relatóriode vistoria de f. 2814, mesmo porqueaquele visava à apuração de fatos deinteresse criminalíst ico e não de

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adoção de medidas de segurança dotrabalho.

Doutro tanto, não restaramprovadas nos autos as alegaçõesrecursais de que os auditores-fiscais,Srª Valéria e Sr. Ricardo, responsáveispela elaboração do laudo apresentadopela DRT (f. 2503), datado de14.01.2004, tenham adotado condutaprofissional com abuso de poder,ilegalidade e arbitrariedade, em quepese o ato de interdição das máquinas“prensas” ter sido objeto de cassaçãoem face de liminar.

Assinale-se, quanto a esseaspecto, que, como alhures registrado,o relatório de vistoria de f. 2792/2794,posteriormente realizado, datado de02.06.2004, constatou a subsistência devárias irregularidades, inclusive o riscoacentuado nas prensas, tendo sidoelaborado após inúmeras outrasvistorias e concessão de prazos parasanar pendências, não tendo ocorridoqualquer afronta aos critériospedagógicos e da dupla visita.

Pontue-se, ainda, que a CLT nãofaz qualquer distinção quanto àformação profissional do auditor-fiscal(artigo 160), sendo, portanto, irrelevanteo fato de o relatório de vistoria, datadode janeiro de 2004, ter sido elaboradopor médicos do trabalho, o que nãoimplica adoção de medidasextremamente gravosas para aempresa.

Por fim, não se pode olvidar dofato de que a elaboração de um Termode Ajuste de Conduta teve como umadas premissas as solicitações da própriareclamada de que fossem a elaconcedidos prazos para sanar asirregularidades apontadas nos diversostermos de notificações (doc. de f. 2438),o que justifica o ajuizamento da açãocivil pública.

Nada a prover.

Dos pedidos acolhidos nasentença - Prensas - Dispositivosmecânicos e eletrônicos de proteção- Plano de manutenção das prensas -Enclausuramento de correias -Treinamento - Ruído industrial -Extintores portáteis - Guarda-corpo -Instalações sanitárias

Registre-se, inicialmente, que,como alhures já apreciado, inexistem osvícios e máculas apontados pelarecorrente, no procedimentoinvestigatório, restando, portanto,superados os argumentos da empresa,quanto a esse aspecto, ora renovados.

Lado outro, encerrado o inquéritocivil público, foram determinadas, pelaprocuradora do trabalho, providênciaspara distribuição da ação civil pública(f. 2807/2809).

Às f. 2940/2959, requereu aempresa o indeferimento de liminarpretendida pelo autor, em sede de açãocivil pública, tendo, ainda, apresentadodefesa (f. 3037/3089), impugnada peloMPT (f. 4497/4518).

Contudo, em face da decisão def. 4489/4493, datada de 22.07.2004, foiacolhido o pedido de antecipação detutela, para determinar que a empresacumprisse com as obrigações de fazer,descritas às f. 4491/4493, no prazo de30 dias, sob pena de multa de R$500,00ao dia, na hipótese de recusa quantoao seu cumprimento.

Nesse aspecto, foi determinadoà empresa-reclamada, como medidaantecipatória (conforme pedido inicial deletras “a”, “b”, “c”, “d”, “e”, “f”, “i” e “o” - f.34/35) que:

I. Instale, nas prensas e nasmáquinas com acionamentorepetitivo, dispositivoseficazes de proteção, deforma a eliminar o risco de

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acidente aos operadores nomomento do acionamento ouquando em movimento, deacordo com as seguintesespecificações: osdispositivos devem sercapazes de impedir acessoinvoluntário de partes docorpo dos operadores nazona de operação doequipamento e na área deprensagem e/ou interromperimediatamente o movimentodo equipamento quandohouver tal acesso, devendofuncionar com total eficiência,independentemente da açãoou comportamento humano,e que estejam emconformidade com asexigências de todas asdisposições legais ouregulamentares sobre oassunto, inclusive, todas asnormas técnicas vigentespela ABNT;

II. Instale, em todos os acessosque levam a uma área derisco nas prensas, grades ououtros dispositivosmecânicos de proteção,aparelhos eletrônicos -específicos para estaaplicação - com circuitoduplo, canal e possibilidadede autoteste, devendo aempresa valer-se, entreoutros, dos seguintesrecursos tecnológicos:ferramenta fechada;enclausuramento da zonade prensagem através degrade acoplada a dispositivoeletromecânico desegurança que, quandoremovida, impeça ofuncionamento da máquina,

sem possibilidade deingresso da mão humana;cortina de luz, categoria IV,com autoteste; válvula desegurança com fluxocruzado e categoria IV e reléde segurança, categoria IV;comando bimanual comsimultaneidade e autotesteque garanta a vida útil docomando; plano demanutenção, fixando nocorpo da máquina arespectiva ficha deinspeção;

III. Implemente plano demanutenção de cadaprensa e/ou equipamentosimilar que deverá prever arealização de manutençõescorretivas e preventivas,registradas em livro próprio,em fichas e/ou registroinformatizado, com relatoda data da realização e doserviço realizado, as peçasreparadas ou substituídas eo responsável pelaexecução;

IV. Proceda ao enclausuramentodas correias de transmissãode força dentro de suaestrutura ou mantenha taiscorreias isoladas poranteparos adequados,conforme item 12.3.2 daNR-12;

V. Ministre treinamentoadmissional e periódico aostrabalhadores que operamou auxiliam nas prensas,por profissional habilitado,treinamento este versandosobre a forma de operaçãodas mesmas, os riscos eprocedimentos desegurança, especialmente

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quanto a anormalidades nofuncionamento dasprensas, sendo que, a cadatreinamento, a reclamadadeve registrar a data e o tipode treinamento, com acolheita da assinatura dospresentes;

VI. Adote medidas de controleeficazes, de ordem coletiva,para a minimização do ruídoindustrial, especialmente oruído de impacto geradonas prensas, de forma queo risco de exposição sejareduzido para abaixo dosníveis de ação aferidos,conforme o item 9.3.6.2,alínea “b” da NR-9;

VII. Disponibil ize extintoresportáteis adequados aocombate do fogo em seuinício, de acordo com o item23.12.1 da NR-23 daPortaria 3.214/78;

VIII. Instale guarda-corpo deproteção contra quedas nosandares acima do solo nãovedados por paredes.

Às f. 4555/4559, foi apresentadorelatório de vistoria realizada naempresa, em 08.10.2004. Nesseaspecto, o MPT (f. 4574), à vista dessedocumento, registrou que

de acordo com o relatóriode vistoria elaborado pelosauditores do Ministério do Trabalhoe Emprego, a ré cumpriu, deforma satisfatória, as obrigaçõesimpostas, empreendendomelhorias em seu parque fabrilpara a garantia da higidez físicados seus empregados.

Contudo as medidas deordem prática implementadas

pela ré carecem demonitoramento futuro, porquantopodem ser, mesmo que aoarrepio da lei, subtraídas ou nãorepetidas periodicamente, comoas obrigações previstas nos itensI, II, IV e VIII.

Algumas obrigações,como aquelas insertas nos itensIII, V, VI e VII da decisão liminar,são de cumprimento continuado,revelando prestações periódicasque não se exaurem com oadimplemento presente.

Sendo a tutela liminar decorte satisfativo mero conteúdoantecipado da sentençadefinitiva, postula o Autor, porcorolário processual, aconversão da mesma em tuteladefinitiva, sob pena de incursãoda Ré na hipótese final do incisoIII do art. 588 do CPC, provendoos pedidos de letras “a”, “b”, “c”,“d”, “e”, “f”, “i” e “o” do pleitodefinitivo.

De outra feita, asobrigações postuladas nos itens“g”, “h”, “l”, “m” e “n” do item 1 ea reparação pecuniária do item3 do pedido definitivo não foramainda analisadas.

À f. 4576, as partes declararamnão haver mais provas a produzirencerrando-se a instrução processual.

Ao contrário da tese dareclamada (f. 4626), o relatório devistoria, apresentado às f. 4556/4559,não conduz à perda de objeto dapresente ação civil pública, mesmoporque aquele se refere apenas àquelasobrigações constantes da tutelaantecipatória concedida (f. 4491/4492).

Outrossim, ainda que cumpridasalgumas das obrigações impostas àempresa (conforme pedido inicial de

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letras “a”, “b”, “c”, “d”, “e”, “f”, “i” e “o” - f.34/35), como apontado pelo MPT, asmesmas carecem de monitoramentofuturo, porquanto podem ser, mesmoque ao arrepio da lei, subtraídas ou nãorepetidas periodicamente (itens I, II, IVe VIII - f. 4491/4493), sendo que, comrelação às obrigações estabelecidasnos itens III, V, VI e VII, são decumprimento continuado, revelandoprestações periódicas que não seexaurem com o adimplemento presente.

Portanto, correta a decisão a quaque determinou a conversão dasmesmas em tutela definitiva, provendoos pedidos de letras “a”, “b”, “c”, “d”, “e”,“f”, “i” e “o” do pleito definitivo,mantendo, ainda, a multa diária deR$1.000,00 (hum mil reais), em favor doFAT, por item descumprido.

Nego provimento.

PCA - Programa de ControleAuditivo - Ergonometria do Trabalho- Equipamentos de ProteçãoIndividual - Programa de ControleMédico de Saúde Ocupacional

Quanto às demais obrigações(“g”, “h”, “l”, “m” do item 1 da inicial), oMPT assim pleiteou:

Letra g - Elaborar eimplementar o PCA - Programa deControle Auditivo, obedecendo aOS 608/INSS, devendo conter, nomínimo, as informações easpectos seguintes:

g.1. demonstração damonitorização do risco - ruído -para todas as funções/postos detrabalho da área de produção,manutenção e outras áreas cujoruído esteja acima do nível deação;

g.2. monitorização deveráser atualizada e realizada com o

equipamento “audiodosímetro”,considerando a dose para 8h detrabalho;

g.3. manutenção doshistogramas das dosimetriasarquivados junto ao PPRA;

g.4. demonstração daescolha do EPI para uso noslocais ruidosos (considerar graude atenuação do equipamento -NIOSH, adequação à função,conforto), realizada por médico/fonoaudiólogo;

g.5. demonstração doestudo do ruído por freqüências- banda de oitava - de modo adeterminar se os níveis depressão sonora presentes estãointerferindo na comunicação e apercepção audível de sinais dealerta;

g.6. proposição demedidas coletivas de engenhariae administrativas que atenuem orisco, que deverão estarincluídas no cronograma deações do PPRA, contendo asdatas de implementação;

g.7. identificação dogrupo de trabalhadores queparticipará do Programa;

g.8. monitorizaçãoaudiométrica;

g.9. exames audiométricosde referência e seqüenciaisconforme consta da NormaRegulamentar - NR-7, contendoas respectivas análises doresponsável;

g.10. realização detreinamentos e palestras, visandoà educação e motivação dostrabalhadores a participar doPrograma, medida que deveráconstar do cronograma do PPRA.

Letra h - Elaborar análiseergonômica do trabalho que

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deverá observar, no mínimo, osseguintes aspectos: informartodas as funções/atividadesexercidas na empresa; conterproposição de medidas queatenuem as sobrecargasconsideradas, sob forma decronograma, incluindo as dataspara sua implementação;considerar, principalmente, osaspectos referentes aorganização do trabalho,abrangendo, inclusive, trabalhoprescrito e real, normas deprodução, exigência de tempo,modo operatório, conteúdo dastarefas, ritmo de trabalho,repetitividade, trabalho em pé,horas extras, produtividade,previsão de pausas, rodízios,turnos, incidência de queixas dostrabalhadores em relação aoacometimento de regiõescorporais, satisfação no trabalhoe clima organizacional; deveráser elaborado por profissionalespecialista da área ergonômica;

Letra l - Fornecergratuitamente e exigir o uso dosEquipamentos de ProteçãoIndividual - EPI, especialmente amáscara respiratória purificadorade ar em trabalhos rotineiros naárea de preparação de massas,de acordo com o PPR -Programa de ProteçãoRespiratória;

Letra m - Adequar oPCMSO - Programa de ControleMédico de Saúde Ocupacionalao disposto na NR-7, de forma acontemplar, no mínimo, osseguintes itens: relatório médicoanual com detalhamento porsetor, identificando os examesrealizados, sua natureza(admissional, periódico,

demissional, mudança defunção, retorno ao trabalho) dosexames realizados e o tipo(clínico ou complementar), onúmero de exames alterados,relação ou não da alteração como trabalho, a conduta médicaadotada no caso de alteraçõesnos exames relacionados aotrabalho, devendo ainda realizaranálise por escrito dos dadosapresentados no relatório anual;número de exames periódicosrealizados e número deempregados expostos aos riscosno ano; número de examesadmissionais, demissionais e deretorno ao trabalho; número deexames anormais dostrabalhadores expostos ao ruído,indicando as condutas adotadas;relacionar as CATs emitidas emdecorrência de PAIR - PerdaAuditiva Induzida por Ruído - equantos empregados estãoafastados pelo INSS; submeteros empregados expostos aaerodispersóides à espirometriae RX do tórax, conformepreconiza a NR-7.

No que tange ao PCA (Programade Controle Auditivo), em que pese aempresa ter adotado medidas decontroles eficazes, de ordem coletiva,para minimização do ruído industrial(pedido de letra “f” acima analisado),consta, no relatório de vistoria (f. 4558),quanto à implementação respectiva, quea empresa vem realizando estudos,tendo sido criada uma comissão paraavaliação do programa e elaborado umcronograma de implantação demedidas.

Tais fatos justif icam odeferimento do pedido de letra “g”, umavez que a aludida pretensão refere-se,

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exatamente, à fase de implementaçãodo referido programa.

Quanto à análise ergonômica dotrabalho, o relatório de vistoria de f.2792/2794 comprova que, em02.06.2004, os auditores-fiscais dotrabalho constataram a subsistência devárias irregularidades na empresa,dentre elas, a ausência de análiseergonômica do trabalho, conformedisposições legais e regulamentaressobre segurança e medicina dotrabalho, em que pese ter sidoanteriormente notif icada, em21.01.2004, com prazo de 60 dias, jávencido (auto de infração 010380027).

Ora, o fato de a reclamada tercontratado, em julho de 2004 (f. 4477/4480), empresa para tanto qualificadana implementação dessa medida nãoprova que as medidas previstas na NR-17 tenham sido efetivamente cumpridas,sendo irreparável a sentença tambémquanto a esse aspecto.

Com relação aos equipamentosde proteção individual, ao exame dosautos, verifica-se que, desde junho de2000, após análise de documentosfornecidos pela empresa (f. 1941/2049),a i. perita, engenheira de segurança dotrabalho do MPT (f. 2100), apurou queos critérios técnicos de sua escolha,apresentados pela empresa, foramconsiderados insuficientes, de acordocom aqueles recomendados nasInstruções Normativas do MTE.

Destarte, considerando que asmedidas de caráter coletivo nãoestavam sendo eficazes, foi sugeridopela expert, de acordo com o item9.3.5.5 da NR-9: a especificação do EPIrecomendado por posto de trabalho/atividade/função, de acordo com osriscos ambientais existentes,demonstrando sua eficácia quanto aocontrole de exposição, considerando,ainda, os fatores de proteção atribuídos

e requeridos, critérios utilizados paraconforto e adaptação do empregado aouso, EPI com filtro combinado;comprovação de programa detreinamento dos trabalhadores quantoà correta utilização e orientação sobreas limitações de proteção que o EPIoferece; normas ou procedimentosestabelecidos pela empresa parapromover o fornecimento, o uso, aguarda, a higienização, a conservação,a manutenção e a reposição do EPI,visando garantir as condições deproteção originalmente estabelecidas (f.2101/2103). (grifo meu)

Às f. 2489/2490, em janeiro de2004, visando ultimar as investigações,a procuradora do trabalho solicitou àSDT o envio do histórico de fiscalizaçãona investigada desde 2001, assim comorelatórios fiscais, notificações, autos deinfração, porventura lavrados, nos anosde 2002 e 2003. Em caso negativo,solicitou-se nova fiscalização.

Nesse sentido, às f. 2493 eseguintes, foram apresentados laudosde vistorias da DRT, realizados emjaneiro de 2004, tendo sido, naquelaocasião, constatada irregularidadequanto ao fornecimento adequado dosEPIs (NR-6), onde ficou aindaregistrado, inclusive, que nenhumtrabalhador utilizava protetor respiratório(relatório de f. 2494/2497), o que geroua lavratura do termo de notificação n.56949 (f. 2501).

O MPT propôs à ré, entãoinquirida no inquérito civil público, acelebração de Termo de Compromissode Ajustamento de Conduta (f. 2613/2617), cuja audiência foi marcada para05.04.2004, contemplando sanar asirregularidades verificadas nas diversasações fiscais empreendidas em seuestabelecimento (f. 2612), dentre elas,o fornecimento e exigência do uso doEPI (f. 2615- cláusula 10ª).

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A empresa, por seu turno,recusou-se a firmar o TAC (f. 2620),sendo que, em virtude da apresentação,em audiência, de documentostendentes a comprovar a regularizaçãode pendências (f. 2622/2674 e 2676/2788), foi a ela concedido o prazo de20 dias para apresentação decontraproposta ao TAC oferecido. Nessaoportunidade, foi ainda determinada aexpedição de ofício à Subdelegacia doTrabalho de Betim, para verificar ocumprimento das normas de medicinae segurança (f. 2621 e 2675).

Todavia, o relatório de vistoria def. 2792/2794, datado de 02.06.2004,comprova a subsistência de váriasirregularidades na empresa, inclusivequanto ao uso de EPI, sobretudo damáscara respiratória purificadora de arem trabalhos rotineiros na área depreparação de massas, apesar de oPPR fazer a sua previsão (auto deinfração 010380019).

Assim, deve prevalecer acondenação a qua também quanto aesse aspecto.

Quanto ao PCMSO - Programade Controle Médico de SaúdeOcupacional (NR-7), a prova nos autosé no sentido de que, desde julho de1999 (f. 83/84), foi a ré intimada a fazerprova em contrário do teor da denúncia,bem como do respeito às normas desegurança e medicina do trabalho,dentre outras, a elaboração, avaliaçãoe implementação do PCMSO (Programade Controle Médico e SaúdeOcupacional - NR-7).

Nessa ocasião, após fiscalizaçãorealizada na empresa, nos dias 23.04 e10.09.1999, pela Subdelegacia doTrabalho de Betim (f. 1927/1928), foiconcluída a necessidade de novasações fiscais para verificação da fasede implantação das medidas desegurança pertinentes, com relação ao

PCMSO (Programa de Controle Médicoe Saúde Ocupacional - NR-7).

Novamente, em 25.07.2000 (f.2107), foi a DRT intimada para efetuarfiscalização na reclamada, sobretudocom relação à NR-7.

Nesse diapasão, às f. 2432/2434, em 05.09.2000, a DRT, atravésdo termo de notificação de n. 41884, ecom base no relatório de vistoria juntadoàs f. 2477/2485, determinou à empresareclamada, estabelecendo prazo de 15dias, providenciar para que o PCMSOfosse planejado e implantado, com basenos riscos específicos existentes àsaúde dos trabalhadores, em cadaatividade, reformulando o documentoque fora elaborado e coordenado pelomédico de trabalho da empresa, Dr.José Francisco Cuellar Erazo, citadopela ora recorrente.

Nesse sentido, o documento def. 2438, datado de outubro de 2000,revela que, por solicitação da própriainvestigada, foram-lhe concedidos mais30 dias de prazo para sanar airregularidade apontada naquele termode notificação, o que motivou, inclusive,a elaboração do já citado Termo deAjuste de Conduta (minuta de f. 2491/2492), cujas cláusulas estabeleceram,dentre outras, “adequar o PCMSO atodas as situações previstas na NR-7 -cláusula 6ª - f. 2492”.

Contudo, o relatório de vistoria,elaborado pela DRT, em janeiro de 2004(f. 2494), constatou a permanência deirregularidades no PCMSO (Programade Controle Médico e SaúdeOcupacional - NR-7), o que gerou alavratura de termos de notificações daempresa (f. 2509, 2510, 2512 e 2513).

O MPT propôs à ré, entãoinquirida no inquérito civil público, acelebração de Termo de Compromissode Ajustamento de Conduta (f. 2613/2617), cuja audiência foi marcada para

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05.04.2004, objetivando sanar, dentreoutras, a irregularidade verificada emface das ações fiscais empreendidasem seu estabelecimento (f. 2612), o quefoi por ela recusado, como alhuresmencionado, não havendo nos autos acomprovação de que a referidaobrigação foi cumprida, nos termos daNR-7 e com as especificações da letra“m” da inicial.

Nego provimento.

Instalações sanitárias

Por fim, quanto às instalaçõessanitárias, registre-se, inicialmente, que,na sentença, não houve a específicaanálise do pedido de letra “j”, formuladoà f. 35, nos seguintes termos:

Submeter a processopermanente de higienização oslocais onde se encontram asinstalações sanitárias, nostermos da NR-24, item 24.1.3.

No entanto, na parte dispositiva(f. 4586), foi a ré condenada a cumprire manter em cumprimento asobrigações descritas nas alíneas de “a”a “o”, do item 1 da petição inicial, salvoa alínea “n”, que foi indeferida.

Destarte, não há dúvida de quea obrigação constante na letra “j” dainicial foi incluída na condenação, tendosido objeto de recurso da reclamada.

Da análise dos autos, constata-se que, em 20.01.2004, a empresa foiautuada pelo fato de ter sido verificada“a presença de instalações sanitárias,em número de 10, localizadas no galpãode produção, com bacias turvas, nãodevidamente higienizadas, em precárioestado de limpeza”.

Nesse diapasão, argumenta arecorrente que as medidas dehigienização dos locais, onde se

encontram as instalações sanitárias,sempre foram por ela observadas, nostermos da NR-24, item 24.1.3, tendosido celebrado, em março de 2004,contrato de prestação de serviços coma empresa CONCRETA ASSESSORIAEMPRESARIAL LTDA. (f. 4469/4475).

No entanto, o fato de a ré tercontratado empresa especializada,visando à prestação de serviços delimpeza de sanitários, não prova oefetivo cumprimento do disposto na NR-24 - item 24.1.3, não valendo para tantoa declaração da prestadora de serviços(documento de f. 4470), no sentido deque a tarefa de higienização dosvestiários e sanitários é feita 03 vezesao dia.

Não se pode olvidar, quanto aesse aspecto, de que a referidaobrigação, da mesma forma queaquelas estabelecidas nas letras “a”, “b”,“c”, “d”, “e”, “f”, “i” e “o” do pleito inicial“carecem de monitoramento futuro,porquanto podem ser, mesmo que aoarrepio da lei, subtraídas ou nãorepetidas periodicamente [...] são decumprimento continuado, revelandoprestações periódicas que não seexaurem com o adimplementopresente”.

Nego provimento.

Do julgamento extra petita -Multa diária

Argumenta a recorrente (f. 4611)que, em que pese o fato de todas asobrigações de fazer, descritas na inicial,terem sido por ela cumpridas, o doutojuízo a quo condenou-a ao pagamentode multa diária, visando manter emcumprimento as referidas obrigações,extrapolando os limites do pedidoexordial.

Menciona que, ainda quehouvesse manifesto pedido do autor,

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nesse sentido, não mereceria acolhida,tendo em vista haver sanções legaisprevistas para a hipótese dedescumprimento futuro das medidasimplementadas, não cabendo aoJudiciário a determinação de taissanções.

Não se pode olvidar de que amulta arbitrada visa a compelir a parteao cumprimento das obrigações defazer que lhe foram impostas, sendodevida enquanto não forem elasadimplidas, o que ocorreu, na hipóteseem apreço, com aquelas previstas nospedidos de letras “g”, “h”, “l”, “m” do item1 da inicial.

Quanto às obrigaçõesestabelecidas nas letras “a”, “b”, “c”, “d”,“e”, “f”, “i” e “o” do pleito inicial, aindaque já cumpridas, não se há falar emjulgamento extra petita pela cominaçãode multas com relação a elas.

Isto porque, como supra-ressaltado, “carecem de monitoramentofuturo, porquanto podem ser, mesmo queao arrepio da lei, subtraídas ou nãorepetidas periodicamente [...] são decumprimento continuado, revelandoprestações periódicas que não seexaurem com o adimplemento presente”.

Outrossim, como assinaladopelo MPT (f. 5115), “...mesmo nãopedido pelo autor, ao Juízo é atribuídoo poder-dever de fixação de sançãopecuniária nas obrigações de fazer enão fazer, para garantir a efetividade doprovimento jurisdicional, consoantedicção precisa do art. 461, § 4º, doCPC”.

Destarte, a multa imposta, noaspecto, tem por objetivo compelir aparte ré à manutenção do cumprimentoda obrigação na forma específica e,portanto, o seu estabelecimento não tempor escopo que o devedor arque com aapenação.

Nego provimento.

Da transmutação da normaconstitucional aplicável à espécie

Sob o título epigrafado,argumenta a recorrente que o inciso XXIIdo artigo 7º da CR/88 estabelece comodireito do trabalhador a “REDUÇÃO dosriscos inerentes ao trabalho, por meiode normas de saúde, higiene esegurança” (marco meu), o que implicadiminuição e não extinção dessesriscos, como pretende o autor, sendoesta última praticamente impossível emalgumas atividades.

Contudo, ao contrário da tese dareclamada, a realização do labor emcondições seguras para seusempregados implica observância dasnormas de segurança, medicina ehigiene do trabalho, e deve ser feita pelaempresa, de tal forma, a proporcionar aredução aceitável dos riscos inerentesà sua atividade, sendo certo que opropósito da lei é a busca da suaredução desejável, qual seja, a suaeliminação total.

Outrossim, a determinação documprimento de obrigação de fazer,como se verifica na hipótese em apreço,constitui medida de prevenção defuturos danos, sendo irrelevante ohistórico de acidentes do trabalho, noâmbito empresarial.

Nada a prover.

Da indenização por dano moralcoletivo

Pugna a recorrente peloindeferimento da indenização por danomoral coletivo, arbitrada emR$200.000,00, ou, na eventualidade,pela sua redução.

Segundo a doutrina, “A idéia e oreconhecimento do dano moral coletivo(lato sensu), bem como a necessidadede sua reparação, constituem mais uma

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evolução nos contínuosdesdobramentos do sistema daresponsabilidade civil, significando aampliação do dano extrapatrimonialpara um conceito não restrito ao merosofrimento ou à dor pessoal, porémextensivo a toda modificação desvaliosado espírito coletivo, ou seja, a qualquerofensa aos valores fundamentaiscompartilhados pela coletividade, e querefletem o alcance da dignidade dosseus membros.” (MEDEIROS NETO,Xisto Tiago de. Dano moral coletivo, LTr,2004, p. 136)

Da obra citada, extrai-se adefinição de João Carlos Teixeira aodano moral coletivo como “a injustalesão a interesses metaindividuaissocialmente relevantes para acoletividade (maior ou menor), e assimtutelados juridicamente, cuja ofensaatinge a esfera moral de determinadogrupo, classe ou comunidade depessoas ou até mesmo de toda asociedade, causando-lhes sentimentode repúdio, desagrado, insatisfação,vergonha, angústia ou outro sofrimentopsico-físico.” (f. 140/141)

Nessa linha de pensamento, adoutrina não tem resistido aoreconhecimento do dano moral coletivo,consolidando-se a idéia da possibilidadede violação ao patrimônio moral dasociedade que, do mesmo modo que odo indivíduo, deve ser respeitado.Porém, para a aferição respectiva,devem ser examinadas asparticularidades de cada caso.

Na hipótese em apreço, emboraconstatada a deficiência na observação,pela empresa, de normas de medicina,segurança e higiene do trabalho, não sepode extrair daí a existência de umsentimento coletivo de indignação, dedesagrado e de vergonha capaz de ferira “moral” da coletividade inserida nessecontexto.

Para a configuração do danomoral coletivo, o ilícito e seus efeitosdevem ser de tal monta que a repulsasocial seja imediata e extrapole aquelarelativa ao descumprimento pelo agentede determinadas normas de condutatrabalhista.

Assim sendo, dou provimento, noaspecto, para absolver a reclamada dacondenação correlata.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso, à exceção dosdocumentos de f. 4658/5105. No mérito,rejeito a argüição de carência de ação, porimpossibilidade jurídica do pedido e dou-lhe parcial provimento, para absolver a réda condenação ao pagamento deindenização por dano moral coletivo.Reduzo o valor da condenação paraR$13.000,00 e o das custas para R$260,00.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes do TribunalRegional do Trabalho da Terceira Região,pela sua Oitava Turma, em,preliminarmente, à unanimidade, conhecerdo recurso, à exceção dos documentos def. 4658/5105; no mérito, sem divergência,em rejeitar a argüição de carência de ação,por impossibilidade jurídica do pedido e emdar-lhe parcial provimento para absolver aré da condenação ao pagamento deindenização por dano moral coletivo;unanimemente, em reduzir o valor dacondenação para R$13.000,00 (treze milreais) e o das custas para R$260,00(duzentos e sessenta reais).

Belo Horizonte, 16 de novembrode 2005.

DENISE ALVES HORTARelatora

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TRT-01138-2005-022-03-00-0-ROPubl. no “MG” de 21.10.2005

RECORRENTE: CAIXA ECONÔMICAFEDERAL

RECORRIDA: UNIÃO FEDERAL

EMENTA: AÇÃODECLARATÓRIA DEINEXISTÊNCIA DE DÉBITOFISCAL - PEDIDOIMPROCEDENTE. Constatadopelos Auditores-Fiscais odescumprimento aos artigos59, caput e § 1º, 74, § 2º, e 225,todos da CLT, quer seja atravésde verificação física, em que seencontraram empregadostrabalhando após o horário desaída já consignado nas folhasde presença, ou seja, atravésdo cotejo entre os horáriosregistrados em tais folhas eaqueles constantes das fitasde caixa como referentes àabertura e ao fechamento,impõe-se a manutenção daspenalidades aplicadas emdecorrência dos autos deinfração devidamentelavrados.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso ordinário,interposto contra decisão proferida peloEx.mo Juiz Federal da 6ª Vara/MG, emque figuram: como recorrente, CAIXAECONÔMICA FEDERAL; comorecorrida, UNIÃO FEDERAL.

RELATÓRIO

O MM. Juiz Federal da 6ª Vara/MG,pela r. decisão de f. 230/233, cujorelatório adoto, julgou improcedente opedido formulado pela Caixa EconômicaFederal, condenando-a ao pagamento

das custas processuais e doshonorários advocatícios, estes fixadosem R$500,00.

A autora interpôs apelação (f.235/241), pretendendo que sejamdeclarados insubsistentes os autos deinfração anexos, ao fundamento de queforam lavrados em data posterior ao diaem que teria ocorrido a infração, emafronta ao § 1º do art. 629 da CLT eparágrafo único do art. 8º do Decreto n.55.841/65, o que caracteriza vícioinsanável de formalização. No que tangeàs infrações propriamente ditas, alegaque não as cometeu, porque o serviçoextraordinário constatado pelo Auditor-Fiscal estava autorizado pelo art. 61 daCLT e também pelo acordo coletivovigente à época dos fatos, queexpressamente assegura o pagamentodas horas extras com adicional de 50%.

Comprovante de recolhimentodas custas à f. 242 (código 5762).

A União Federal apresentoucontra-razões (f. 245/248), pugnandodesprovimento do recurso.

O Ex.mo Desembargador FederalCatão Alves, Relator designado noEgrégio Tribunal Regional Federal daPrimeira Região, com amparo naEmenda Constitucional n. 45/2004,declinou da competência em favor desteTribunal Regional do Trabalho daTerceira Região, determinando aremessa dos autos (f. 252).

A Ex.ma Juíza Vice-Presidentedeste Tribunal determinou que os autosfossem enviados à Diretoria daSecretaria de Atermação e Distribuiçãode Feitos de 1ª Instância, onde seriamdistribuídos a uma das Varas doTrabalho de Belo Horizonte, para, apósa devida autuação, cadastramento e aaquisição de número único, seremremetidos à 2ª Instância paradistribuição a uma das Turmasjulgadoras (f. 258).

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O d. Ministério Público doTrabalho, em parecer da Drª JúniaCastelar Savaget, opinou peloconhecimento e desprovimento dorecurso (f. 261/262).

Tudo visto e examinado.

VOTO

Admissibilidade

Conheço da apelação interpostacomo recurso ordinário, a teor do art. 2ºda Instrução Normativa 27/2005 doColendo TST.

Observo que a presente açãodeclaratória de inexistência de débitofiscal tramitou perante a Justiça Federalaté julho de 2005, quando foi declaradaa incompetência material pelo Ex.mo

Desembargador do Tribunal RegionalFederal da 1ª Região (f. 252).Evidentemente, portanto, que aapelação interposta em 25.11.2004 (f.235/241) deve ser aqui conhecida comorecurso ordinário, aplicando-se o prazode 15 dias, previsto no art. 508 do CPC,e não o prazo de 8 dias, previsto no art.895 da CLT.

No que tange às custas,considero que foram regularmenterecolhidas, conforme comprovante de f.242 (código 5762). E não cabe exigir aefetivação de depósito recursal, tendoem vista que se trata aqui de açãodeclaratória de inexistência de débitofiscal cujo pedido foi julgadoimprocedente, inexistindo, portanto,condenação imposta a quaisquer daspartes, salvo no que tange aos ônus desucumbência.

Destarte, encontram-sesatisfeitos todos os pressupostos deadmissibilidade do recurso, pelo quedele conheço.

Conheço também das contra-razões, regularmente apresentadas.

Mérito

Insurge-se a autora contra a r.sentença de f. 230/239, que julgouimprocedente o pedido de anulação dos32 autos de infração lavrados contra aCEF, conforme listagem de f. 27 edocumentos de f. 28/193.

Mas não lhe assiste qualquerrazão.

No que tange ao vício deformalização invocado pela recorrente,improcede a argumentação recursal. O§ 1º do art. 629 da CLT apenas prevêque o auto de infração deverá serlavrado no local da inspeção,inexistindo, em tal dispositivo,determinação para que a lavraturaocorra no exato momento em que ainfração é cometida.

Entendimento diverso implicariaadmitir o absurdo de que infraçõespassadas, constatadas posteriormentepelo Auditor-Fiscal, não poderiam serobjeto de punição, o que inclusive vaide encontro ao disposto no art. 628 daCLT, que impõe ao Auditor lavrar o autode infração sempre que concluir pelaexistência de violação a preceito legal,sob pena de responsabilidadeadministrativa.

Em outras palavras, o auto deinfração deve ser lavrado no local emque se realizar a inspeção e nomomento em que for constatado o ilícitoou a irregularidade, e não quando daprática do ato passível de punição, jáque esta segunda hipótese exigiria apresença de um fiscal em cadaestabelecimento que mantenhaempregado prestando serviços, àespera por um flagrante, o qual,provavelmente, não ocorreria.

Não socorre a recorrente,outrossim, o disposto no parágrafo únicodo art. 8º do Decreto n. 55.841/65 (járevogado pelo Decreto n. 4.552/2002,

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mas ainda vigente à época da lavraturados autos de infração em questão), poisaquele dispositivo tratava da hipóteseem que o fiscal surpreendia grave eflagrante violação de disposição legal,mesmo que ela ocorresse emestabelecimentos ou locais de trabalhosituados em zona diferente daquela quelhe competisse. A situação descrita nosautos de infração anexos, portanto, nãose enquadra na hipótese descrita nodispositivo legal invocado.

Todos os autos de infração emquestão estão devidamente assinadospor preposto da CEF (f. 28, 32, 39, 44,51, 55, 59, 66, 70, 76, 82, 86, 91, 95,100, 104, 108, 113, 119, 124, 130, 135,140, 147, 151, 155, 160, 169, 173, 179,183 e 188), o que faz presumir queforam lavrados no local da inspeção,como afirmado na contestação. Logo,pouco importa que tenham sido lavradosalguns dias após a data em que seconsumou a infração neles descrita.

No que diz respeito às infraçõesque deram ensejo à aplicação dasmultas, foram todas constatadas deforma inequívoca pelos Auditores-Fiscais do Trabalho, como se passa ademonstrar.

Extrai-se dos diversos autos deinfração anexos que a CEF foi autuadapor descumprir o § 2º do art. 74 da CLT,ao deixar de anotar em registromecânico, manual ou eletrônico, osefetivos horários de entrada e saída dosempregados (f. 28, 32, 39, 44, 51, 55,59, 66, 70, 76, 86, 100, 104, 108 e 113).

Alguns empregados foramencontrados trabalhando no dia09.11.2000, às 17h30min, sem quetivessem sido até então assinalados oshorários de entrada ou saída desde 1ºde novembro (f. 28). Outros foramencontrados no interior doestabelecimento no dia 08.11.2000prestando serviços entre 16h10min e

17h30min, embora já tivesse sidoregistrada a saída às 15h ou 16h (f. 32).Situação semelhante também severificou em diversos outros dias (f. 51,55, 59, 66, 70 e outras).

Em outros casos, os Auditores-Fiscais compararam os horários deentrada e saída registrados nas folhasde freqüência com os termos deabertura e encerramento de caixa oufitas de caixa, concluindo que diversosempregados haviam trabalhado muitomais que a jornada consignada nasreferidas folhas de freqüência (ex. f. 39,44, 76 e outras).

Houve também autuação porinfração ao § 1º do art. 59 da CLT, porter sido constatado que a CEF deixoude pagar as horas extras integralmenteprestadas a diversos empregados como acréscimo legal exigido (f. 82, 91, 95,140, 167, 179, 183 e 188), o queigualmente foi verificado mediante acomparação entre as folhas defreqüência com as fitas de caixa e asfolhas de pagamento do mesmoperíodo.

A autora foi ainda autuada porinfringir o caput do art. 59 da CLT (f. 124,130, 135, 147 e 151), tendo sidoconstatada a extrapolação da jornadaalém do limite legal de duas horas,também através dos termos de aberturae encerramento de caixa.

E por fim, tipificou-se infração aoart. 225 da CLT (f. 119, 155, 160 e 173),por ter sido prorrogada a jornada normaldos bancários sujeitos ao limite de seishoras por mais de oito horas diárias.Novamente a constatação inequívoca sefez através das fitas de caixa, queconsignam os horários de abertura efechamento, demonstrando o tempo deefetivo serviço, ao menos, naquelaatividade.

Como se vê, tudo foi constatadopelos Auditores-Fiscais através da

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análise de documentos do próprioBanco, os quais revelaram divergênciaentre os horários que a CEF permitiaaos trabalhadores consignar em folhasde freqüência e os horáriosefetivamente trabalhados, registradosnas fitas extraídas dos caixas, das quaisconsta o momento exato da abertura edo fechamento. Ou então a constataçãose fez por verificação física, ou seja,quando o próprio Auditor presencioutrabalhadores prestando serviços noestabelecimento além dos horários desaída que já estavam consignados nasfolhas de presença.

Ora, partindo-se do pressupostolegal de que o auto de infração goza depresunção de veracidade, competia àautora produzir prova robusta quepudesse infirmar seu conteúdo (se é queisso seria possível), o que não ocorreu.A empresa não pretendeu produzirprova nem em sede administrativa,quando apresentou defesa, nem napresente ação que lhe foi movida,provavelmente porque não haviamesmo como negar os fatos apurados.

Desse modo, não resta a menordúvida de que o pedido de declaraçãode inexistência do débito fiscal apuradoé manifestamente improcedente, comocorretamente decidido.

Os argumentos invocados pelarecorrente afiguram-se de tododespropositados.

Primeiro, porque a alegação deocorrência de necessidade imperiosa ouserviços inadiáveis não restoudemonstrada, tampouco pode serpresumida, diversamente do que aempresa pretende fazer crer. Ao revés,as atividades inadiáveis invocadas pelaCEF, como remessa de cheques paracompensação, fechamento diário dacontabilidade, envio de relatórios,atendimento a clientes que já estão naagência, são todas elas de rotina das

instituições bancárias. Assim é que, seo número de empregados contratadosnão é suficiente para atender a taisserviços, outras soluções devem serbuscadas, que não o descumprimentoda legislação trabalhista e, o que é pior,a adulteração dos horários efetivamentecumpridos, para supressão dacontraprestação devida. Obrigar oempregado a registrar a saída econtinuar trabalhando, ou seja, atrabalhar de graça, não pode serjustif icado pela ocorrência denecessidade imperiosa e, menos ainda,pela necessidade de proporcionar “obom desempenho das empresas, comoelemento gerador e catalisador deprodução” (f. 238).

E mais, se a hipótese fossemesmo de necessidade imperiosa,competia à autuada observar asformalidades legais exigidas, inclusiveno que tange à comunicação àautoridade competente no prazo de dezdias (§ 1º do art. 61 da CLT).

Por fim, no que diz respeito àprevisão contida no acordo coletivoanexo (f. 17/26), evidentemente que emnada altera os rumos do presentejulgamento. A cláusula 18ª do citadoACT autoriza a prorrogação da jornadanormal diária, mas apenasexcepcionalmente, observado o limitelegal, determinando, como não poderiaser diferente, o pagamento das horasextras correspondentes com acréscimode 50% (f. 21).

No caso em exame, o que restouapurado é que a autora não permitia oregistro das horas extras e,conseqüentemente, não pagava aremuneração devida, nem de formasimples, nem com acréscimo de 50%.Além disso, forçava os trabalhadores aregistrar seus horários de forma aresultarem numa jornada inferior àefetivamente praticada. E também não

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observava o limite legal de extrapolação,sendo estes os motivos que resultaramnas autuações.

De resto, dizer que “se não houveanotação regular por parte daquelesempregados, decorreu simplesmente deincúria sua, sem responsabilidade daapelante” é menosprezar a inteligênciado Juízo. É óbvio que nenhumtrabalhador iria se dispor a prestarserviços gratuitos à instituição financeirapor livre e espontânea vontade, muitomenos iria optar por registrar em folhasde freqüência carga horária maisreduzida que a efetivamente praticada,sendo despiciendo dizer que se trata,sem dúvida alguma, de imposiçãopatronal.

Por todo o exposto, negoprovimento ao recurso ordináriointerposto pela autora.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes doTribunal Regional do Trabalho daTerceira Região, pela sua PRIMEIRATURMA, preliminarmente, àunanimidade, em conhecer da apelaçãode f. 235/241 como recurso ordinário;no mérito, sem divergência, em negar-lhe provimento.

Belo Horizonte, 17 de outubro de2005.

MARIA LAURA FRANCO LIMA DEFARIA

Relatora

TRT-00217-2005-089-03-00-1-ROPubl. no “MG” de 09.07.2005

RECORRENTE: SERVIÇO SOCIAL DAINDÚSTRIA - SESI

RECORRIDA: JANE APARECIDACOSTA GOMES

EMENTA: ACORDO COLETIVO- ESTIPULAÇÕES -C O M U T A T I V I D A D EINDISPENSÁVEL - PENA DENÃO RECONHECIMENTOCOMO FONTE DE DIREITO.Verificando-se que o acordocoletivo traduziu apenasrenúncia coletiva de direitos,sem contrapartidaempresarial, há de serdeclarada sua inatividadejurídica. Máxime quandoobservada a distância entre adisposição nele contida e ocaráter finalístico do Direito doTrabalho, contra cuja imagemmanipulada reage o Judiciáriotrabalhista, confirmando queele se justifica tambémcontemporaneamente, e nãopode ser facilmente alijado daesfera empresarial, com a“composição” coletiva.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso ordináriointerposto de decisão da MM. 3ª Varado Trabalho de Coronel Fabriciano, emque figuram, como recorrente,SERVIÇO SOCIAL DA INDÚSTRIA -SESI e, recorrida, JANE APARECIDACOSTA GOMES.

RELATÓRIO

A douta 3ª Vara do Trabalho deCoronel Fabriciano, representada peloEx.mo Juiz Daniel Gomide Souza, pela r.

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decisão de f. 83/87, rejeitou a preliminarde carência de ação por ilegitimidadepassiva e julgou procedentes, em parte,os pedidos formulados pela autora.

Decisão complementada pelojulgamento dos embargos dedeclaração (f. 90/91).

O réu interpôs recurso ordinário(f. 92/110), argüindo a preliminar denulidade da decisão por julgamentoextra petita. Invocou a prescriçãoparcial, insurgindo-se contra adeclaração de unicidade contratual eilicitude da terceirização realizadamediante suposta cooperativa.

Juntou documentos (f. 113/121).Comprovou depósito recursal e

recolhimento de custas (f. 111/112).Contra-razões pela autora (f.

123/126).É o relatório.

VOTO

Juízo de conhecimento

Conheço do recursotempestivamente interposto, porquantocomprovado o pagamento das custas eo depósito recursal (f. 111/112), estandoregular a representação.

Recebo os documentosacostados (f. 113/121),consubstanciados em jurisprudência,porquanto publicado o v. Acórdão apósa sentença primeva, atendidos osrequisitos da Súmula n. 8 do TST.

Juízo de mérito

Preliminar de nulidade dedecisão - Sentença extra petita

Requereu o réu fosse a decisãodeclarada nula por ter analisado matériaestranha aos contornos da lide, no quetange à declaração de nulidade da

cláusula constante do ACT (f. 36/54),que dá quitação aos direitos laboraisreferentes ao período em que a autoraera cooperada.

Razão não lhe assiste,porquanto na peça vestibular ela narroua existência da suposta fraude nacontratação (f. 03/06).

Ademais, não incumbe à autoraapontar os institutos jurídicos em quepretende seja o réu enquadrado, eis queesta é função do Magistrado. Comoprelecionam as máximas jurídicas iurianovit curia, o juiz conhece o direito, eda mihi factum et dabo tibi ius,exponham-se os fatos que o juízo lhedará o direito.

Portanto, inexiste nulidade a serdeclarada.

Prescrição parcial

Invocou o demandado aprescrição parcial dos direitos da autora.

Acolho a prefacial eriçada,provendo o apelo, sob esse aspecto,para declarar a prescrição qüinqüenalem relação aos direitos anteriores a18.03.2000 (f. 03).

Unicidade contratual -Terceirização ilícita - Funçõesatreladas à atividade-fim do tomador- Configuração do liame de emprego

A celeuma trazida aoconhecimento do juízo ad quemdemanda análise profícua dascircunstâncias de fato ocorridas no casosub ocullis.

O réu debate-se em suas razõesrecursais contra o reconhecimento daunicidade contratual e a formação dovínculo direto com o tomador, afirmandoque a terceirização obedeceu fielmenteaos ditames da Súmula n. 331 daColenda Corte Trabalhista.

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Detendo-se à análise dos atosconstitutivos do primeiro réu (f. 67),constata-se que algumas das suasfinalidades sociais são:

[...] b) uti l izar os recursoseducativos e assistenciaisexistentes, tanto públicos, comoparticulares; [...] d)promoverquaisquer modalidades decursos e atividadesespecializadas no serviço social;[...] i) servir-se dos recursosaudiovisuais e dos instrumentosde formação da opinião pública,para interpretar e realizar a suaobra educativa e divulgar osprincípios, métodos e técnicas doserviço social.

Constata-se, portanto, que afunção desempenhada pela autoraintegrava um dos objetivos sociais dotomador de serviço, uma vez que eraprofessora, estando intrinsecamenteligada à sua atividade-fim.

Além disso, a i l icitude daterceirização também emana daconstatação de pessoalidade esubordinação direta ao poder diretivo edisciplinar do beneficiário da força detrabalho, colidindo, frontalmente, com oteor do item III da Súmula n. 331 do TST.E a prova testemunhal corroborou athese defendida pela autora.

Consoante o depoimento datestemunha coligida pelo réu (f. 13/14),verbis:

...se alguns dos professoresprecisasse faltar avisaria àreclamada...; a função dareclamante como cooperada oucomo empregada era a mesma;que a distribuição de matérias doano letivo era feitaexclusivamente pela reclamada.

Desse modo, restou evidenciadaa fraude na contratação, alheia aosmoldes cooperativistas que serviram deparâmetro para o legislador.

Peço venia para citar trecho deartigo publicado na Revista SínteseTrabalhista, publicada em abril de 2001,p. 132/149, da lavra do professor daUniversidade de Direito da UNESP e juizdo trabalho da 15ª Região, Mauro CésarMartins de Souza, acerca do tema“Terceirização”, in verbis:

...as novas necessidadeseconômicas reclamam essaespecialização flexível,considerando até viável adelegação de atividades que nãose enquadrem entre os finsnormais da tomadora, masacreditam que a situação seagrava quando há olocupletamento do empregador àcusta do empregado que, por seuturno, é hipossuficiente narelação jurídica.

Ademais, argumentamque a inexistência de garantiados mesmos salários, quandoidênticas as funções exercidaspelos empregados da tomadorae as exercidas pelos daprestadora, não é justa, vez quediferencia trabalhadores queexecutam atividades iguais comganhos distanciados.

Como se sabe, naterceirização não há lugar parao modelo de relação de empregoconceituado pela CLT. Nestatécnica de organizaçãoempresarial há o deslocamentoda figura do empregador, poisquem admite, assalaria e dirigea prestação do serviço é aempresa contratada. (grifosnossos) Diante disso, há quem

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diga, ainda, que esse sistemacompromete a eficácia dosprincípios fundamentais doDireito do Trabalho, a saber: o daliberdade de trabalho e o dacontinuidade, além do princípioconstitucional da valorização edignificação do trabalho humano.

Fortalecendo o entendimentocristalizado pelo verbete n. 331 do TST,o Ministério do Trabalho editou a I.N.n.03/97, estabelecendo que:

[...]Art. 2º, §§ 5º e 6º, litteris, “Aempresa de prestação deserviços a terceiros contrata,remunera e dirige o trabalhorealizado por seusempregados.”; “Os empregadosda empresa de prestação deserviços a terceiros não estãosubordinados ao poder diretivo,técnico e disciplinar da empresacontratante.”

Inicialmente, registro que, aocontrário do que sustentado nas defesasdas demandadas, o parágrafo único doartigo 442 da CLT que diz, verbis:“Qualquer que seja o ramo de atividadeda sociedade cooperativa, não existe ovínculo empregatício entre ela e seusassociados, nem entre estes e ostomadores de serviços daquela”, nãotem o condão, por si só, de vedar oreconhecimento da relação de empregoquando presentes os pressupostos darelação referida, em especial asubordinação, porquanto aqueledispositivo legal deve ser interpretadosistematicamente, sem se perder devista o que disposto nos artigos 2º e 3ºda mesma Consolidação.

Assim, o que diz referido artigo(442 da CLT) nada mais é do que há

muito diz o artigo 90 da Lei n. 5.764/71,que cedem espaço, no caso concreto,quando presentes os elementos fáticosjurídicos do liame empregatício.

Como se sabe, o fenômenosócio-jurídico da relação de empregoemerge, desde que reunidos os seuscinco elementos fático-jurídicosconstitutivos exigidos pela legislaçãoceletista, em seus artigos 2º e 3º, quaissejam: prestação de trabalho porpessoa física a outrem, compessoalidade, não eventualidade,onerosidade e sob subordinação.

Do ponto de vista formal, o réusequer trouxe aos autos documentosque comprovassem a regularidade docontrato de terceirização de mão-de-obra, impedindo fosse verificada aregular constituição da cooperativa. Notocante ao aspecto material, ou seja, nomundo real, é necessária a presençados princípios reitores docooperativismo, quais sejam, o da duplaqualidade e o da retribuição pessoaldiferenciada, aliás, princípiospercebidos na ordem jurídica ebrilhantemente sistematizados pelocitado jurista Mauricio Godinho Delgadoem sua obra Curso de Direito doTrabalho.

A definição legal de cooperativaestá consubstanc iada na Le i n .5.764/71, em seu artigo 3º, verbis:

Celebram contrato de sociedadecooperativa as pessoas quereciprocamente se obrigam acontribuir com bens ou serviçospara o exercício de umaatividade econômica, de proveitocomum, sem objetivo de lucro.

Peço venia para citar um trechodo artigo escrito por Ricardo TadeuMarques da Fonseca e Cláudia Afanio,pesquisadores do Núcleo de Direito

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Cooperativo e Cidadania - UFPR eProcuradores Regionais do MinistérioPúblico do Trabalho da 9ª Região,publicado na Revista do TribunalRegional do Trabalho da 9ª Região,Curitiba - Paraná, a. 29, n. 52, janeiro/junho 2004, p. 222, pertinente à matériasob enfoque:

O ordenamento jurídicobrasileiro contém diversosdispositivos que institucionalizamos princípios universais docooperativismo exatamenteaqueles criados por Rochdale eenunciados pela AliançaInternacional Cooperativista, daforma seguinte: 1) princípio daadesão voluntária e livre. Oprincípio em tela é abordado pelaAliança ao caracterizar ascooperativas como “organizaçõesvoluntárias, abertas a todas aspessoas aptas a utilizar os seusserviços, e dispostas a assumir asresponsabilidades comomembros, sem discriminações desexo, sociais, raciais, políticas oureligiosas”; 2) princípio da gestãodemocrática pelos membros. Talprincípio é explicado pela AliançaInternacional, lembrando que “ascooperativas são organizaçõesdemocráticas controladas pelosseus membros, que participamativamente na formulação dassuas políticas e na tomada dedecisões. Os homens e asmulheres eleitos comorepresentantes dos outrosmembros são responsáveisperante estes”; 3) princípio daparticipação econômica dosmembros. Aduz a AliançaInternacional que “os membroscontribuem eqüitativamente parao capital das suas cooperativas e

o controlam democraticamente.Pelo menos parte desse capitalé, normalmente, propriedadecomum da cooperativa. Osmembros recebem habitualmentee, se houver, uma remuneraçãolimitada ao capital subscrito comocondição da sua adesão”; 4)princípio da autonomia eindependência. Ao ressaltar oprincípio em foco, o organismointernacional preconiza que “ascooperativas são organizaçõesautônomas, de ajuda mútua,controladas pelos seus membros.Se estas firmarem acordos comoutras organizações, incluindoinstituições públicas, ourecorrerem a capital externo,devem fazê-lo em condições queassegurem o controledemocrático pelos seus membrose mantenham a autonomia dascooperativas”; 5) princípio daeducação, formação einformação; [...] 6) princípio daintercooperação; [...] 7) princípiodo interesse pela comunidade.Trata-se, aqui, de princípio deíndole política/participativa, nosentido de que “as cooperativastrabalham para odesenvolvimento sustentado dassuas comunidades através depolíticas aprovadas pelosmembros.”

Dentre esses princípios, algunsinformaram a própria Constituiçãobrasileira. O princípio da adesãovoluntária e livre materializa-se no incisoXX do artigo 5º da CF/88, a saber:

Art. 5º [...]XX. ninguém poderá sercompelido a associar-se ou apermanecer associado.

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Também o princípio da gestãodemocrática pelos membros encontra-se no art. 5º, XIX:

as associações só poderão sercompulsoriamente dissolvidasou ter suas atividades suspensaspor decisão judicial, exigindo-se,no primeiro caso, o trânsito emjulgado.

O princípio da autonomia eindependência faz-se presente no incisoXVIII do mesmo art. 5º:

a criação de associações e, naforma da lei, a de cooperativasindependem de autorização,sendo vedada a interferênciaestatal em seu funcionamento.

Encontra-se na Constituição,além de princípios explícitos, umincentivo às cooperativas: art. 174, § 2º:

A lei apoiará e estimulará ocooperativismo...

A norma que trataespecificamente da Política Nacional doCooperativismo, Lei n. 5.764/71, traz emdiversos dispositivos os princípiosuniversais do cooperativismo, entre eleso art. 4º, que dispõe sobre a definiçãodas sociedades cooperativas, e seuinciso I, que explicita o princípio daadesão voluntária e livre:

Art. 4º As cooperativas sãosociedades de pessoas, comforma e natureza jurídicapróprias, de natureza civil, nãosujeitas à falência, constituídaspara prestar serviços aosassociados, distinguindo-se dasdemais sociedades pelasseguintes características:

I - adesão voluntária, comnúmero ilimitado de associados,salvo impossibilidade técnica deprestação de serviços.

Além disso, o próprio art. 4º dacitada Lei revela o princípio da gestãodemocrática (inciso V), o princípio daindiscriminação política e religiosa(inciso “IX - neutralidade política eindiscriminação religiosa, racial esocial”) e o princípio da educação,formação e informação (inciso “X -prestação de assistência aosassociados, e, quando prevista nosestatutos, aos empregados dacooperativa”).

O princípio da participaçãoeconômica dos membros emerge doinciso IV do art. 21 da Lei em comento,e do seu inciso VI, o princípio dasolidariedade, da seguinte forma:

Art. 21. O estatuto dacooperativa, além de atender aodisposto no art. 4º, deveráindicar:[...]IV - a forma de devolução dassobras registradas aosassociados, ou do rateio dasperdas apuradas porinsuficiência de contribuição paracobertura das despesas dasociedade;[...]VI - as formalidades deconvocação das assembléiasgerais e a maioria requerida paraa sua instalação e validade desuas deliberações, vedado odireito de voto aos que nelastiverem interesse particular semprivá-los da participação nosdebates;[...]

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O Código Civil de 2002 inclui noLivro II - Do Direito de Empresa - umcapítulo específico (Capítulo VII) sobrea sociedade cooperativa (arts. 1093 a1096).

Insta salientar que o art. 1094enumera alguns dos princípioscooperativistas. O inciso VI enuncia oprincípio da gestão democrática (“direitode cada sócio a um só voto nasdeliberações, tenha ou não capital asociedade, e qualquer que seja o valorde sua participação”) e, no inciso VII, oprincípio da repartição econômicademocrática (“distribuição dosresultados, proporcionalmente ao valordas operações efetuadas pelo sóciocom a sociedade, podendo ser atribuídojuro fixo ao capital realizado”).

A cooperativa permite,efetivamente, que o cooperado obtenhauma retribuição pessoal, em virtude desua atividade autônoma, superioràquela que obteria caso não estivesseassociado. A retribuição pessoal decada cooperado é, necessariamente(ainda que em potencial), superioràquela alcançada caso estivesseatuando isoladamente.

Para investigar a existência deconsistir a relação mantida entre a autorae rés em autêntica cooperada, mister sefaz investigar a natureza jurídica dovínculo cooperativo travado entre aassociada e a respectiva entidade.

Considerando o teor dosdepoimentos prestados (f. 13/14),conclui-se que a autora estavadiretamente subordinada ao tomador deserviços, cumprindo horário por eledeterminado e sujeita ao poderdisciplinar, uma vez que, naoportunidade em que se ausentava doposto de trabalho, tinha o dever dejustificar-se perante aquele.

Ademais, a autora exerciaatividade-fim do tomador e foi admitida

em seus quadros logo após o términodo “contrato cooperativista”.

Pelo exposto, nego-lheprovimento.

Em face da contrataçãofraudulenta ocorrida, determino sejaoficiado o Ministério Público do Trabalhoe a Delegacia Regional do Trabalho,para que adotem as medidas legaiscabíveis à espécie.

Acordo coletivo - Estipulações- Comutatividade indispensável -Pena de não reconhecimento comofonte de direito

Requereu o recorrente fosseoutorgada validade ao instrumentocoletivo (f. 36/54), bem como aos“termos de concordância” coligidos àsf. 09 e 29.

E ainda que reconhecida a fraudee fossem considerados os cooperadosempregados pertencentes à categoriados professores, é vedado à entidadesindical transacionar acerca de direitosindisponíveis, tal como existência ou nãode relação empregatícia, compelindoseus representados a procederem àquitação complessiva de todos osdireitos decorrentes do período em queprestaram serviços ao réu como“cooperados”.

Verificando-se que o acordocoletivo traduziu apenas renúnciacoletiva de direitos, sem contrapartidaempresarial, há de ser declarada suainatividade jurídica. Máxime quandoobservada a distância entre a disposiçãonele contida e o caráter finalístico doDireito do Trabalho, contra cuja imagemmanipulada reage o Judiciáriotrabalhista, confirmando que ele sejustifica também contemporaneamente,e não pode ser facilmente alijado daesfera empresarial, com a “composição”coletiva.

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Existente a modalidadesubordinada da relação de trabalho,aplica-se-lhe o ordenamento jurídicoque pretende igualar juridicamente osubordinado ao empregador, entecoletivo e forte nesta sociedadecapitalista.

Quanto aos “termos deconcordância” individualmentefirmados, não bastassem os princípiosda irrenunciabilidade e do contratorealidade, a fraude declarada os atinge,sendo forçoso o reconhecimento de suanulidade.

Nesse diapasão, confirmo adeclaração de nulidade dos termos def. 09 e 29 e cláusula 2ª, § 4º do ACT def. 36.

Desprovejo.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso. No mérito,afasto a preliminar de nulidade dedecisão por julgamento extra petita edou-lhe parcial provimento para declararprescritos os direitos anteriores a18.03.2000.

Fica mantido o valor dacondenação.

Em face da contrataçãofraudulenta ocorrida, determino sejaoficiado o Ministério Público do Trabalhoe a Delegacia Regional do Trabalho,para que adotem as medidas legaiscabíveis à espécie.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes doTribunal Regional do Trabalho daTerceira Região, pela sua Oitava Turma,preliminarmente, à unanimidade, emconhecer do recurso; no mérito, semdivergência, em afastar a preliminar denulidade de decisão por julgamentoextra petita e em dar-lhe parcial

provimento para declarar prescritos osdireitos anteriores a 18.03.2000; emficar mantido o valor da condenação. Emface da contratação fraudulentaocorrida, em determinar seja oficiado oMinistério Público do Trabalho e aDelegacia Regional do Trabalho, paraas medidas legais cabíveis à espécie.

Belo Horizonte, 29 de junho de2005.

JOSÉ MIGUEL DE CAMPOSRelator

TRT-01870-2004-000-03-00-1-ARPubl. no “MG” de 02.09.2005

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DOTRABALHO

RÉU: BEIRADA AGROPECUÁRIA S/A

EMENTA: AÇÃO RESCISÓRIA -AÇÃO CIVIL PÚBLICA - ACORDOJUDICIAL - LIMITAÇÃOTEMPORAL DA CONSTATAÇÃODE OBSERVÂNCIA OU NÃO DASOBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃOFAZER PACTUADASJUDICIALMENTE. 1 - Tendo aspartes celebrado acordojudicial estabelecendo apossibilidade de execução damulta diária pactuada a cadavez que for constatado odescumprimento dasobrigações de fazer e não fazerobjeto do acordo, este deve sercumprido tal como livrementepactuado, não comportando ares judicata interpretaçãorestritiva de forma a permitir aextinção da demanda, com oarquivamento dos autos porter a multa decorrente dosdescumprimentos até então

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verificados sido regularmentequitada. 2 - Esse posicionamentoencontra respaldo na própriarazão de ser da ação civilpública, por se tratar de ação quetem por escopo a obtenção deprovimento jurisdicional denatureza inibitória dos atossuscetíveis de repetição,compelindo o demandado acessar a prática ilegal verificada,não sendo passível de qualquerlimitação e, assim, também porestes fundamentos, ocompromisso assumido pela réno acordo homologado devevigorar por prazo indeterminado,uma vez que uma das utilidadese objetivos da ação civil públicaé o de resguardar não só direitosou interesses difusos e coletivospresentes como também osfuturos. 3 - Ação rescisória quese julga procedente paraexpungir do v. acórdãorescindendo a extinção definitivado feito, mantendo íntegro oacordo homologado de forma apossibilitar novas constataçõesde seu cumprimento oudescumprimento.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de ação rescisória, emque figuram, como autor, MINISTÉRIOPÚBLICO FEDERAL e, como réu,BEIRADA AGROPECUÁRIA S/A.

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICOFEDERAL ajuíza ação rescisória contraBEIRADA AGROPECUÁRIA S/Avisando, com fulcro no inciso IV do art.485 do CPC, a desconstituição doacórdão de f. 29/35, proferido nos autosda reclamatória trabalhista processada

perante a Vara do Trabalho de Januária,sob o n. 00388-1997-083-03-00-1.

Narra que este Regional,apreciando o agravo de petiçãointerposto pelo MPT, negou-lheprovimento, confirmando a r. decisão de1ª instância que julgou extinta aexecução, indeferindo a pretensão depossibilidade de prosseguimento daexecução na hipótese de verificação denovos descumprimentos das obrigaçõesde fazer e não fazer pactuadas noacordo judicial.

Assevera que, mesmo após aexecução do valor das multasdecorrentes do descumprimentoverificado, as obrigações de fazer e nãofazer remanescem, sendo de tratosucessivo.

Alega que a extinção daexecução importou em infringência àcoisa julgada consubstanciada noacordo judicial de f. 54, através do qualcomprometeu-se a ré a cumprir as“obrigações de fazer e de não fazer,inseridas nos itens 3.1 e 3.2 da petiçãoinicial, sob pena de multa diária deR$2.000,00 por obrigação descumpridae, a cada nova constatação”.

Requer, afinal, a procedência daação para desconstituir o v. acórdão, naparte que determinou a extinção do feitoe, em juízo rescisório, proferir novojulgamento, no sentido de expungir adeterminação de extinção do feito,mantendo-se íntegro o acordohomologado, de forma a possibilitarnovas constatações de seucumprimento ou descumprimento, emrespeito à coisa julgada. À causa atribuio valor de R$50.000,00.

Com a inicial a certidão dotrânsito em julgado de f. 40, o acórdãorescindendo de f. 29/35 e osdocumentos de f. 36/39 e 41/150.

Regularmente citada, a réapresentou a contestação de f. 156/159,

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argüindo preliminar de carência de açãopor se tratar de matéria controvertidanos Tribunais. Com a defesa, osdocumentos de f. 160/165.

Colaciona a ré à f. 170 oinstrumento de procuração aos autos.

Regularmente intimados,requereu a ré a produção de provatestemunhal, pedido este indeferido à f.172, enquanto o autor pleiteou oencerramento da instrução processual,por versar o l itígio sobre matériaexclusivamente de direito, tendo sidoencerrada a instrução processual econcedido prazo para apresentação derazões finais.

Razões finais pelo MPT às f. 177/191 e pela ré às f. 192/198.

Manifestação da d. ProcuradoriaRegional do Trabalho, à f. 200, atravésda Drª Júnia Castelar Savaget,entendendo desnecessária novamanifestação do parquet, na forma dodisposto no inciso III do art. 83 do RI eno Provimento 01/2005 daCorregedoria-Geral do C. TST, por jáestar o seu entendimento consignado napetição inicial e razões finais.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

Não cabimento da açãorescisória - Aplicação da Súmula n.83 do TST

Argúi a ré preliminar de nãocabimento da ação rescisória, por versarsobre matéria de interpretaçãocontrovertida nos Tribunais.

Data venia, razão não lheassiste, uma vez que a presente açãorescisória não foi ajuizada com fulcro emviolação a literal dispositivo de lei (incisoV do art. 485 do CPC), mas sim sob o

fundamento de violação à coisa julgada( inciso IV do art. 485 do CPC) e, assim,a preliminar não se sustenta, uma vezque versa sobre tema que não estáinserido no pedido inicial, nãointegrando, via de conseqüência, alitiscontestação.

Rejeito.Presentes os requisitos de

admissibilidade, admito a presente açãorescisória.

Juízo de mérito

Inciso IV do artigo 485 do CPC

O MPT ajuizou em 14.05.1997ação civil pública em face da ora réBeirada Agropecuária S/A aduzindo terconstatado graves violações praticadaspela mesma, que inclusive tornavamseu imóvel passível de desapropriação,uma vez que vinha sendo utilizado demodo a reduzir trabalhadores acondição degradante, não atendendo asua função social.

Na audiência inaugural, foicelebrado acordo, comprometendo-se aré a cumprir as obrigações de fazer enão fazer inseridas na petição inicial,sob pena de multa diária de R$2.000,00por obrigação descumprida e a cadanova constatação, verbis:

a reclamada compromete-se acumprir as obrigações de fazere não fazer inseridas nos itens3.1 e 3.2 da petição inicial, sobpena de multa diária deR$2.000,00 por obrigaçãodescumprida, e a cada novaconstatação. (f. 54)

Constatado o descumprimentodo acordo, iniciou-se o processo deexecução da multa devida em 1998,tendo este se desenrolado até ser

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proferida a decisão de f. 36/56 em12.08.02, que fixou o valor da multa,determinando a comprovação de seurecolhimento em favor do Fundo deAmparo ao Trabalhador - FAT.Comprovado o recolhimento,determinou, ainda, fossem os autosconclusos para extinção da execução,rejeitando, assim, a tese do ora autorde que, mesmo após a execução dovalor das multas decorrentes dodescumprimento verificado, asobrigações de fazer e não fazerremanescem, sendo de trato sucessivo,por considerar que “tal entendimentoimportaria na eternização do processo,sendo certo que a idéia de lideinterminável não se compadece com oordenamento jurídico. Uma vez“zeradas” as pendências que deramorigem à ACP e, conseqüentemente, aoacordo (que se executa), impõe-se pôrfim à execução”.

Contra esta decisão opôs o MPTagravo de petição, tendo este Regional,através do acórdão de f. 29/35,confirmado a r. decisão, verbis:

Por outro lado, não podeo Ministério Público pretender,em sede de execução, que seestenda no tempo, a ponto deeternizar-se, o provimento ou atutela jurisdicional obtida, deforma como vem postulandoneste feito de ação civil pública.

Ora, a causa de pedir foicerta e delimitou o pedido emrazão de determinadasirregularidades apuradas emprocedimento prévio, sendo queo acordo foi feito em tornodaquela situação. Impossívelrespaldar-se, na execução, aeternização do processo e dajurisdição, ainda que se trate, oobjeto do título judicial

exeqüendo, de obrigações defazer e de não fazer, até porquenão há justiça de exceção paraquem quer que seja, nem sepode retirar-lhe o direito à ampladefesa e ao contraditório. (f. 34)

Contra esta decisão, ajuíza oMPT a presente ação rescisória,alegando que o v. acórdão rescindendoviolou a coisa julgada, já que o acordojudicial determinou o pagamento demulta diária por obrigação descumpridae a cada nova constatação.

Assiste-lhe razão.O acordo celebrado entre as

partes, devidamente homologado, e quetransitou livremente em julgado,expressamente estabeleceu apossibilidade de pagamento de multadiária a cada vez que for constatada odescumprimento das obrigações defazer e não fazer objeto do acordo.

Assim, cabível tão-somente ocumprimento da res judicata, nãocomportando esta interpretaçãorestritiva de forma a permitir a extinçãoda demanda, com o arquivamento dosautos por ter a multa decorrente dosdescumprimentos até então verificadossido regularmente quitada.

O fato de os termos do acordopermitirem, em tese, a projeção de seusefeitos indefinidamente no futuro nãotraduz motivo suficiente para ainfringência à coisa julgada, uma vezque as próprias partes, quandolivremente se compuseram, assimdispuseram, conferindo-lhe naturezasucessiva.

Não há, ainda, que se falar napossibilidade de violação ao direitoconstitucional de defesa da ré, nahipótese de o MPT constatar aocorrência de infringências àsobrigações de fazer e não fazer objetodo acordo, uma vez que, em tal

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hipótese, como o foi no processo deexecução que se encerrou, a legislaçãolhe assegura o mais amplo direito dedefesa, com a utilização de todos osrecursos cabíveis para a defesa de seusdireitos e interesses.

Importante ressaltar que esteposicionamento encontra respaldo naprópria razão de ser da ação civilpública, por se tratar de ação que tempor escopo a obtenção de provimentojurisdicional de natureza inibitória dosatos suscetíveis de repetição,compelindo o demandado a cessar aprática ilegal verificada, não sendopassível de qualquer limitação.

Somente na hipótese deverificação de descumprimento deobrigações de fazer e não fazer que nãoforam objeto da ACP é que haveria anecessidade de ajuizamento de novaação civil pública.

O entendimento adotado pelo v.acórdão rescindendo, em última análise,importaria na necessidade deajuizamento de tantas ações civispúblicas quantas forem as constataçõesde descumprimento das obrigações,onerando e sobrecarregando aindamais o Judiciário trabalhista.

Frise-se, por importante, que ocompromisso assumido pela ré noacordo homologado deve vigorar porprazo indeterminado, uma vez que umadas utilidades e objetivos da ação civilpública é o de resguardar não só direitosou interesses difusos e coletivospresentes como também os futuros.

Nesse sentido, acórdão n.00039.732/98-3-AP, oriundo do TRT da4ª Região da i. lavra do Juiz Álvaro DaviBoessio, publicado no DJ de 19.06.00:

EMENTA: ASTREINTE. MULTAPOR DESCUMPRIMENTO DEOBRIGAÇÃO DE FAZER.Possibilidade de apresentação

de valores suplementares àexecução promovida, tratando-se de relação continuada. Agravode petição que se dá provimento.[...]ASTREINTE. PENA PORDESCUMPRIMENTO DEOBRIGAÇÃO DE FAZER.ELASTECIMENTO DAEXECUÇÃO.O Ministério Público do Trabalhoajuizou Ação Civil Pública, compedido de Antecipação de Tutela,fundada em denúncia de váriasirregularidades apuradas peloórgão de fiscalização doMinistério do Trabalho, apuradasem face da requerida CatedralEmpresa de Transporte dePassageiros Ltda. No petitório daação, pleiteou facere negativo porparte da empresa, no sentidodesta se “abster de”: mantertrabalhadores sem registros,satisfazer as parcelas rescisóriase conceder férias após o prazo delei, prorrogar jornada de trabalhoalém do limite legal ou fixado eminstrumento coletivo, dentreoutros. Sucessivamente, para ahipótese de descumprimento dopedido principal, requereu fossecominada multa na ordem de1.000 UFIRs por infração e portrabalhador flagrado em situaçãoirregular, reversível ao FAT. Aspartes, na audiência da ata de f.45, compuseram o litígio,comprometendo-se a requerida aatender todos os itens pedidos,sob pena de incidência da multapostulada. Descumprido o acordojudicial, pela perpetração dasirregularidades apontadas napeça inicial, aplicou-se à empresaa sanção pecuniária prevista, aqual resultou na penhora de que

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se tem notícia à f. 62 dos autos.Ato contínuo, para satisfação daexecução, foi autorizado o leilãojudicial, f. 69. A este tempo,contudo, nova manifestação doMinistério Público do Trabalhoveio comunicar permanecer arequerida descumprindo ostermos da conciliação, razão dasolicitação de nova sançãopecuniária. O requerimento foiindeferido pelo juízo da execução,f. 86 (carmim), ao argumento deesgotada a possibilidade de seacrescerem novos valoresàqueles já em execução, “tendose exaurido a jurisdição comrespeito à conciliaçãohomologada pelo Juízo, que nãoproduz efeitos ao infinito, em setratando de relação de tratocontinuado”. Inconformado comesta decisão, submete orequerente a questão ao II Graude Jurisdição. Ressalta o caráterpreventivo do provimentoperseguido na peça inicial, comvista a coibir ilegalidade que seperpetua. Elege o sistema dasastreintes como o remédio porexcelência para obrigar aoadimplemento o devedor deobrigação de fazer ou não fazer,donde não se pretender nopresente processo “acrescer”valor à condenação, mas tão-somente obter cumprimento daobrigação assumida pelaempresa, mediante acordo.É de se acolher o apelo. Comefeito, tratando-se de relaçãocontinuada como a retratada napeça inicial, e não delimitada amedida temporal em que a penapecuniária foi requerida,usualmente “por dia de infração”,cumpre dar provimento ao

recurso da Procuradoria Regionaldo Trabalho para determinar oregular processamento daexecução da multa pelodescumprimento de obrigação denão fazer, com previsão emacordo judicial de f. 45.A ausência de tal parâmetro nopedido e, ainda, no título judiciala partir daí formado, tornou amulta exigível ad perpetuum nopresente processo, em face daperpetração das irregularidadesque lhe deram causa. Alémdisso, a aplicação da astreinteprevista no título judicial reporta-se a fatos com apuraçãocognitiva nos autos, nãonecessitando para sua novacominação nova investigação,em outro processo.A cominação de astreintes é omeio eficaz para coagir o réu acumprir com a obrigação de fazerdescumprida; a jurisdição naexecução não se esgotou nacominação da pena pecuniáriacujos cálculos foramapresentados pelo MinistérioPúblico do Trabalho às f. 50-51.Razão pela qual, dá-seprovimento ao agravo de petiçãopara determinar o regularprocessamento da execução, naforma requerida na peça de f. 71-73 (carmim) dos autos.

Pelo exposto, conheço da açãorescisória e, no mérito, com fulcro nodisposto no inciso IV do art. 485 do CPC,julgo-a procedente, para desconstituirparcialmente o acórdão proferido nosautos do processo n. 00388-1997-083-03-00-1-AP (TRT/AP/6890/02) no quediz respeito à determinação de extinçãodefinitiva do feito e, em novo julgamento,dar provimento parcial para expungir a

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determinação de extinção do feito,mantendo íntegro o acordohomologado, por se tratar de relaçãocontinuada, de forma a possibilitar, nofuturo, novas constatações pelo MPT deseu cumprimento ou descumprimento.

CONCLUSÃO

O TRIBUNAL REGIONAL DOTRABALHO da Terceira Região, emSessão Ordinária (da 2ª SDI), porunanimidade, rejeitou a preliminarargüida em defesa, admitiu a açãorescisória; no mérito, por maioria devotos, vencidos os Ex.mos Juízes Revisor,Heriberto de Castro, Lucilde D’AjudaLyra de Almeida e Ricardo Marcelo Silva,julgou-a procedente para desconstituirparcialmente o acórdão proferido nosautos do processo n. 00388-1997-083-03-00-1-AP (TRT/AP/6890/02) no quediz respeito à determinação de extinçãodefinitiva do feito e, em novo julgamento,dar provimento parcial para expungir adeterminação de extinção do feito,mantendo íntegro o acordohomologado, por se tratar de relaçãocontinuada, de forma a possibilitar, nofuturo, novas constatações pelo MPT deseu cumprimento ou descumprimento.Custas, pela ré, no importe deR$1.000,00, calculadas sobreR$50.000,00, valor atribuído à causa nainicial.

Belo Horizonte, 18 de agosto de2005.

JÚLIO BERNARDO DO CARMOPresidente

MARIA LÚCIA CARDOSO DEMAGALHÃES

Relatora

TRT-00356-2003-103-03-00-5-ROPubl. no “MG” de 09.07.2005

RECORRENTE: CLEUBER JUSTINORECORRIDA: MÓVEIS E DECORAÇÕES

TIM LTDA.

EMENTA: ATO ATENTATÓRIO ÀDIGNIDADE DA JUSTIÇA -LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. A ordemlegal em vigor, atenta ao deverde honestidade, lealdade e boa-fé das partes e ao de não atentarcontra a dignidade da Justiça,instituiu meios dos quais oEstado-Juiz dispõe para coibira prática de condutas queinfrinjam esses deveres,aplicáveis em qualquerinstância e em qualquer fasedo processo em que severifique a prática do atofaltoso. De fato, de acordo comos incisos I e II do artigo 14 doCPC, subsidiariamente aplicadoao Processo do Trabalho, “sãodeveres das partes e de todosaqueles que de qualquer formaparticipam do processo: I -expor os fatos em juízoconforme a verdade; II -proceder com lealdade e boa-fé”. Doutro tanto, de acordo comos incisos II e V do artigo 17 domesmo texto legal acima citado,“reputa-se litigante de má-féaquele que: [...] II - alterar averdade dos fatos; [...] V -proceder de modo temerário emqualquer incidente ou ato doprocesso”. Tendo o autoromitido, in casu, ser o seu paium dos sócios da empresareclamada, extinta desde 1997,alegando, ainda, estar a ré emlocal incerto e não sabido, coma nítida intenção de obter, frente

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à revelia da reclamada, decisãoque lhe fosse favorável, mostra-se seu comportamentoinaceitável, devendo, destarte,ser condenado ao pagamentoda multa por litigância de má-féprevista no artigo 18 do CPC.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos, decide-se:

RELATÓRIO

Ao relatório da r. sentença de f.210/214, complementada pela proferidaem embargos de declaração (f. 219/220), o qual adoto e a este incorporo,acrescento que o MM. Juiz FernandoSollero Caiaffa, Titular da 3ª Vara doTrabalho de Uberlândia/MG, extinguiu oprocesso, com julgamento do mérito,nos termos do inciso IV do artigo 269do CPC, isentando o reclamante dopagamento das custas processuais.

Inconformado, recorreuordinariamente o reclamante, às f. 221/226, postulando a revisão do julgado noque tange ao acolhimento da prescriçãoargüida na defesa, com a conseqüenteextinção do processo, com julgamentodo mérito, deferindo-lhe, assim, asverbas rescisórias postuladas noaditamento à exordial de f. 08/09.

Contra-razões oferecidas às f.227/235, pelo desprovimento do apelocom condenação do recorrente àspenas por litigância de má-fé.

Tudo visto e examinado.É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

Próprio e tempestivo,preenchidos os demais pressupostos deadmissibilidade, conheço do recurso

ordinário obreiro, esclarecendo que seencontra o autor isento do pagamentodas custas processuais (dispositivo def. 214).

Mérito

Prescrição total

Pugna o recorrente pela reformado r. decisum de origem que, acolhendoa prescrição total do direito de açãoargüida na peça defensiva de f. 186/196,extinguiu o processo, com julgamentodo mérito, nos termos do inciso IV doartigo 269 do CPC. Sustenta, para tanto,que o labor após o ano de 1990, maisespecificamente até junho de 2001,restou cabalmente provado nos autos.Aduz que a baixa constante da suaCTPS sequer pode ser consideradacomo tal, eis que nem mesmo foiassinada. Cita a seu favor o depoimentoda testemunha Terezinha Nunes Abrão.Argúi que as provas dos autoscomprovam que a reclamada setransformou em casa de bailes na qualcontinuou a laborar.

Contudo, sem razão.Em face da complexidade do

caso presente e para melhorcompreensão dos fatos ocorridos, peçovênia para fazer, inicialmente, um breverelato dos mesmos.

Ingressou o autor CLEUBERJUSTINO com a presente demanda emface de MÓVEIS E DECORAÇÕES TIMLTDA., em 27.02.03, alegando, emsuma, que trabalhou para a reclamadano período de 02.05.98 a 01.06.95quando foi injustamente dispensado,postulando, tão-somente, a entrega pelaré das guias TRCT, no código 01, paraque pudesse sacar o FGTS acrescidoda multa de 40%.

Notificada a reclamada noendereço informado na peça de

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ingresso, não foi a mesma localizada(notificação de f. 07).

Em 24.03.01 o demandanteaditou a inicial informando que, naverdade, no período de 23.07.90 a01.06.01, trabalhou para a reclamadasem a devida anotação em sua CTPS,exercendo a função de gerente devendas, recebendo a importância deR$1.000,00 a R$1.200,00 por mês, nãotendo gozado férias nem recebido 13ºsalários. Pleiteou, assim, a condenaçãoda ré ao pagamento do aviso prévio,férias integrais em dobro, simples eproporcionais, acrescidas de 1/3, 13ºsalários integrais e proporcionais,diferenças de FGTS acrescido da multade 40%, RSRs sobre comissões e multasdos artigos 467 e 477 da CLT (f. 08/09).

Tendo o autor declarado à f. 27que a reclamada se encontrava em localincerto e não sabido, foi determinada anotificação da mesma por edital. Naaudiência de f. 29, informou a existênciade erro material na data de admissão,esclarecendo que a correta é a02.05.88.

Diante da ausência da ré àaudiência inaugural (ata de f. 29), foram-lhe aplicadas as penas de revelia econfissão, nos termos do artigo 844 daCLT, culminando na decisão de f. 30/33,com condenação da reclamada aopagamento das parcelas ali elencadas,da qual foi a mesma intimada por edital(f. 34).

Transitada em julgado a decisão(certidão de f. 35), foram as partesintimadas para apresentação de cálculo,sendo, após diversas retificações pordeterminação judicial, homologados oscálculos apresentados pelo autor (f. 74),fixando-se o montante da execução emR$152.378,75.

A reclamada foi intimada porexpediente (f. 77) para efetuar opagamento do débito.

À f. 80 os procuradores doreclamante renunciaram aos poderesque lhes foram conferidos.

Constituído novo procurador,pleiteou o autor, às f. 82/84, a intimaçãoda reclamada em novo endereço, bemcomo a penhora do imóvel descrito nodocumento de f. 87, de propriedade dasócia Abadia Auxiliadora de Jesus.

Incluídos os sócios no pólopassivo da demanda, determinou-se aexpedição de mandado executório emdesfavor deles, com cópia do bemindicado pelo reclamante (f. 96).

A esta altura manifestou-se nosautos a reclamada, juntando aprocuração de f. 112.

Em cumprimento ao mandado,foi expedida a certidão de f. 106,manifestando-se o exeqüente acerca damesma à f. 108.

Após a penhora do imóveldescrito no auto de f. 118, interpôs a réos embargos à execução de f. 119/130,sustentando a nulidade da citação, eisque o autor é filho do seu proprietário,tendo absoluta ciência do seu endereçoe, no entanto, maliciosamente, declarouestar a reclamada em local incerto e nãosabido. Salientou que a empresademandada sequer existe no mundojurídico, porquanto extinta em 27.11.97,conforme documento de f. 193. Pleiteou,assim, a nulidade do feito desde acitação.

O exeqüente impugnou osaludidos embargos às f. 156/159.

Após frustrada tentativa deconciliação (ata de f. 166), proferiu o d.juízo a quo a decisão de f. 167/169,acolhendo os embargos e anulando ofeito desde a citação, determinando-sea renovação do ato e sua reinclusão empauta.

Defendeu-se a reclamada, às f.186/196, argüindo, preliminarmente, aprescrição e a decadência do direito

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vindicado e, no mérito, sustentando queo autor é filho do proprietário da extintaré, registrado como funcionário damesma apenas “para encaminhá-lo nasenda do bom viver”, onde faziapequenos serviços de datilografia. Em23 de julho de 1990 o autor pediu quefosse dada baixa em sua CTPS, eis quese mudou para o Rio de Janeiro, ondese encontra até a presente data.Salientou que, conforme documento def. 202, a empresa, em 02.10.95, mudou-se para endereço diverso daqueleinformado na inicial, tendo odemandante plena ciência da mudançade endereço bem como da sua extinçãoem 1997, sendo flagrante a má-fé domesmo. Declarou que o autor jamaistrabalhou para a ré, comprovando osdocumentos acostados que o mesmolaborou para diversas empresas desde05.04.93. Afirmou que o reclamanteentrou na Justiça contra o pai apenas atítulo de retaliação, eis que este lhenegou a compra de um apartamento noRio de Janeiro. Acrescentou que odemandante sempre gozou e recebeuférias, 13º salários e teve seus depósitosfundiários efetuados, não havendo quese falar em aviso prévio diante doabandono de emprego por parte domesmo.

Após o breve relato, passo adecidir.

De proêmio, buscou a reclamadanegar a relação de emprego aduzidapelo autor, ao argumento de que amesma era de cunho absolutamentepaternalista, sendo o filho (reclamante)registrado pelo pai, que muito o amava,como funcionário da loja de móveis, tão-somente, “para encaminhá-lo na sendado bom viver” (f. 190).

No entanto, afirmou a ré que oautor fazia pequenos serviços dedatilografia, tendo abandonado oemprego em 23.07.90, quando se

mudou para o Rio de Janeiro, sendo queo mesmo sempre gozou férias, recebeuos 13º salários corretamente e teve seusdepósitos fundiários devidamenteefetuados.

Assim, na esteira doentendimento primevo, a par dasdiversas incongruências constantes dosautos, mister se faz o reconhecimentode que o autor, bem ou mal, durantecerto tempo, foi empregado da ré, tantoque a mesma, em sua defesa, admite opagamento de salário e 13º salários,gozo de férias e depósito do FGTS naconta vinculada do demandante.

Resta, portanto, perquirir a dataem que efetivamente se deu orompimento do pacto laboral.

Nem mesmo o autor se decideacerca do período em que efetivamentelaborou para a ré. Inicialmente, declarouque o pacto laboral vigorou no interstíciode 02.05.98 a 01.06.95. No aditamentode f. 08/09 declarou que, no período de23.07.90 a 01.06.01, trabalhou para areclamada sem carteira assinada. Emaudiência informou que a data deadmissão correta é 02.05.88. E,finalmente, em seu depoimento pessoal,em patente inovação, declarou que “areclamada, em 1997, deixou de ser casade móveis para ser casa de bailes; queo depoente também trabalhou nestacasa como gerente” (f. 181).

Portanto, do depoimento dopróprio demandante, deflui que omesmo efetivamente não mais laboroupara a reclamada a partir de 1997, atéporque a mesma foi extinta, conformedocumento de f. 133, em 27.11.97.

Por outro lado, pouco importaria,in casu, se o autor, a partir de 1997,passou a laborar para a casa de bailesdo pai. A uma, porque, conforme jásalientado, trata-se de verdadeirainovação fática no curso da instrução. Aduas, porque se trata de relação com

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pessoa diversa da ré. A três, porquesequer encontra amparo probatório nospresentes autos.

Convém salientar que odepoimento da segunda testemunhaapresentada pelo autor, TerezinhaNunes Abrão, mostra-se cheio decontradições, não havendo, destarte,como lhe conferir validade. De fato, vaicontra todas as provas constantes dosautos ao declarar que “não sabe se oreclamante foi para o Rio de Janeiro”.Depois, embora tenha informado que“não se lembra quando a loja fechou”,declarou que “a loja virou salão de baileem 1998” (f. 183).

Da mesma forma, não há comose dar validade à assertiva obreira e desua testemunha, Lauro SerafimGonçalves, no sentido de que o autor,no período de 1993 a 1997, fez estágiosem empresas diversas no Rio deJaneiro, em benefício da ré e por elacusteados.

No que tange à aludidatestemunha ouvida a rogo do autor,entendeu o d. juízo a quo que seudepoimento se mostrou inseguro(fundamentos de f. 214), e, conformetenho reiteradamente sustentado,quando se trata de avaliação da provaoral produzida, deve a instânciarevisora, pelo menos em princípio,prestigiar a valoração do conjuntoprobatório feita pelo juízo de primeirograu, eis que este é quem teve contatodireto com os depoentes, estando emmelhores condições de estabelecer seugrau de credibilidade a partir de seucomportamento e de sua atitude emaudiência, o que os autos não têm comoregistrar.

Doutro tanto, conforme se inferedo documento de f. 150, o demandante,no aludido período, prestou serviços adiversas empresas, com o devidorecolhimento para a Previdência Social,

o que afasta totalmente a tese de que,neste interstício, esteve estagiando embenefício da ré. Como é consabido, nacontratação a título de estágio, não hárecolhimento para o INSS.

Lado outro, não bastasse odocumento retromencionado ondeconsta que o autor, em 1993, prestouserviços à empresa “Gávea Interiores eObjetos de Arte Ltda.”, a certidão de f.147 e 198 comprova que o mesmo seencontra domiciliado no Município doRio de Janeiro desde 08.11.90, tendo,no dia 23.10.90, constituído seu paicomo seu bastante procurador (doc. def. 139). E tais documentos, diante dafragilidade da prova oral ofertada peloautor, bem como da série decontradições em suas assertivas, levamà conclusão de que o vínculoempregatício existente entre oslitigantes realmente se extinguiu em1990, conforme declarado pela ré emsua defesa.

Assim, ajuizada a presentereclamação quando já decorridos muitomais de dois anos da ruptura contratual,o direito do demandante estáirremediavelmente fulminado pelaprescrição bienal estabelecida no incisoXXIX do artigo 7º da Lei Maior, nadahavendo a reformar no r. decisum deorigem que, à vista do contexto fático-probatório produzido, extinguiu oprocesso, com julgamento do mérito,nos termos do inciso IV do artigo 269do CPC.

Desprovejo.

Multa por litigância de má-fé

Pugna a reclamada, em suascontra-razões, pela condenação dorecorrido ao pagamento das penas porlitigância de má-fé.

Assiste-lhe razão.A ordem legal em vigor, atenta

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ao dever de honestidade, lealdade eboa-fé das partes e ao de não atentarcontra a dignidade da Justiça, instituiumeios dos quais o Estado-Juiz dispõepara coibir a prática de condutas queinfrinjam esses deveres, aplicáveis emqualquer instância e em qualquer fasedo processo em que se verifique aprática do ato faltoso.

De fato, de acordo com osincisos I e II do artigo 14 do CPC,subsidiariamente aplicado ao Processodo Trabalho, “são deveres das partes ede todos aqueles que de qualquer formaparticipam do processo: I - expor os fatosem juízo conforme a verdade; II -proceder com lealdade e boa-fé.”

Doutro tanto, de acordo com osincisos II e V do artigo 17 do mesmotexto legal acima citado, “reputa-selitigante de má-fé aquele que: [...] II -alterar a verdade dos fatos; [...] V -proceder de modo temerário emqualquer incidente ou ato do processo”.

Ora, no caso vertente, restoupatente a conduta desleal e atentatóriaà dignidade da Justiça por parte doreclamante que, flagrantemente, omitiuser filho do sócio da empresa reclamadae, alterando a verdade dos fatos,declarou que a ré se encontrava emlocal incerto e não sabido, quando amesma, conforme ele próprio declarou,“em 1997 deixou de ser casa de móveispara ser casa de bailes”, o quedemonstra que tinha o mesmo plenoconhecimento de que a empresareclamada foi extinta no aludido ano,como faz prova o documento de f. 133.

Lado outro, é fato incontroversoque o autor, a par de ter declarado estara ré em local incerto e não sabido, sabiao paradeiro de seu pai, sócio proprietárioda empresa, eis que, nas impugnaçõesaos embargos à execução (f. 156/159),em nenhum momento se insurgiu contratal assertiva.

Restou claro, pois, que odemandante, intencionalmente, deixoude informar nos autos o endereço dosproprietários da empresa reclamada,legalmente extinta em 1997, a fim deobter decisão que lhe fosse totalmentefavorável, correndo o processo à reveliada demandada.

Por outro lado, já na fase deexecução, conforme salientado pelo d.juízo a quo na decisão de f. 167/169,não poupou esforços em indicar bensda outra sócia da reclamada, AbadiaAuxiliadora de Jesus, conformedocumento de f. 87, para penhora, sóciaesta que, como se não bastasse, éesposa do pai do autor (doc. de f. 140).

De fato, o comportamento doreclamante na presente ação se mostrainaceitável, no nítido intuito de obtervantagem indevida de seu próprio pai,sócio da ré extinta desde 1997, pai esteque, conforme documento de f. 134/139,encontra-se com a saúde sobremaneiracomprometida, sendo portador dediabetes tipo II e cardiopatia isquêmica,necessitando de diálise em virtude denefropatia, apresentando, ainda, perdaquase total da visão.

Por essa razão, condeno oreclamante ao pagamento da multaprevista no caput do artigo 18 do CPC,que ora arbitro em 1% sobre o valor dacausa, bem como à indenização de 20%sobre o valor da causa, prevista no § 2ºdo mesmo artigo, a serem pagas a favorda ré.

Determino, ainda, seja oficiadoao d. Ministério Público do Trabalhopara que o mesmo tenha ciência destadecisão e dos seus fundamentos, paraos f ins de direito. Isso porque,conforme deflui amplamente dos autos,houve intenção do reclamante de seutilizar desta Justiça Especializadapara fins ilícitos, o que configura, salvomelhor juízo, crime contra a

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administração da Justiça, a exigirreparação.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso e, no mérito,nego-lhe provimento, condenando orecorrente ao pagamento da multaprevista no caput do artigo 18 do CPC,que ora arbitro em 1% sobre o valor dacausa, bem como à indenização de 20%sobre o valor da causa, prevista no § 2ºdo mesmo artigo, a serem pagas a favorda ré, e determinando que seja oficiadoao Ministério Público do Trabalho parater ciência da decisão e seusfundamentos, para os fins de direito.

Fundamentos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, pela sua QuintaTurma, preliminarmente, àunanimidade, conheceu do recurso; nomérito, sem divergência, negou-lheprovimento, condenando o recorrenteno pagamento da multa prevista nocaput do artigo 18 do CPC, que arbitrouem 1% do valor da causa, bem como àindenização de 20% sobre o valor dacausa, prevista no § 2º do mesmo artigo,a serem pagas a favor da ré,determinando que seja oficiado aoMinistério Público do Trabalho para terciência da decisão e seus fundamentos,para os fins de direito.

Belo Horizonte, 28 de junho de2005.

ADRIANA GOULART DE SENARelatora

TRT-00549-2005-026-03-00-3-ROPubl. no “MG” de 03.09.2005

RECORRENTE: FIATAUTOMÓVEIS S/ARECORRIDA: UNIÃO FEDERAL

EMENTA: AUTO DE INFRAÇÃO- NORMA REGULAMENTADORAEMITIDA PELO MTE -VALIDADE. Compete aoMinistério do Trabalho eEmprego estabelecerdisposições complementaresque visem a proteção da saúdedo trabalhador, por força doart. 200 da CLT. Assim, é válidoo auto de infração emitidocontra a empresa que nãoobserva NormaRegulamentadora expedidapelo MTE.

Vistos, relatados e discutidosestes autos de recurso ordinário, em quefiguram, como recorrente, FIATAUTOMÓVEIS S/A e, como recorrida, aUNIÃO FEDERAL.

RELATÓRIO

O d. juízo da 1ª Vara Federal deBelo Horizonte, da Seção Judiciária deMinas Gerais, sob a condução do MM.Juiz Cláudio José Coelho Costa, pelasentença de f. 86/89, acrescentada peladecisão de embargos de declaração def. 96, julgou improcedente o pedidoformulado pela FIAT Automóveis S/A naação ordinária proposta em face daUnião Federal.

Não se conformando, a autorainterpôs o recurso de apelação de f.98/118, tecendo razões para que sejadeclarada nula a sentença recorrida,por negat iva de prestaçãojurisdicional. No mérito, sustenta anulidade do auto de infração lavrado

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pela DRT e, via de conseqüência, damulta imposta. Pugna pela devoluçãodos valores pagos a t í tulo dapenalidade imposta. Ao final, requerseja a DRT compelida a abster-se denovas autuações.

Custas recolhidas à f. 119.A União Federal contrariou o

apelo às f. 125/127.O feito foi remetido para o E.

Tribunal Regional Federal da 1ª Região,tendo sido distribuído para oDesembargador Federal CarlosFernando Mathias, que, através dadecisão de f. 135, declinou dacompetência para este Revisional.

Recebidos os autos, a d. Vice-Presidência deste Tribunal, através dodespacho de f. 141, determinou adistribuição dos autos a uma das Varasdo Trabalho desta Capital, paraautuação e cadastramento e posteriorremessa a esta Instância Revisora paradistribuição a uma de suas Turmas paraapreciação e julgamento dos recursosinterpostos.

Parecer do d. MPT, da lavra da i.Procuradora Júnia Soares Nader, pelaconfirmação do julgado.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

Trata-se de apelação, recebidacomo recurso ordinário, em face dosistema recursal trabalhista. O feito foiencaminhado a esta Justiça Laboralpelo Tribunal Regional Federal da 1ªRegião, que declinou da competênciaem razão da promulgação da EmendaConstitucional n. 45.

Presentes os pressupostosobjetivos e subjetivos deadmissibilidade, conheço do recurso.

Juízo de mérito

Nulidade da sentença

Diz a recorrente que a r.sentença recorrida é nula, uma vez quedeixou de enfrentar questões de direitoformuladas na peça de ingresso.Assevera que não foi examinada aconstitucionalidade das NormasRegulamentadoras expedidas peloMinistério do Trabalho e Emprego, bemcomo a nulidade do auto de infração eda decisão administrativa que lhe impôsa multa.

Sem razão.O d. juízo de origem entendeu

que as razões que motivaram a açãonão prosperavam uma vez que asnormas referentes à segurança e àsaúde abrigam-se na CLT e foramrecepcionadas pela Constituição daRepública. Asseverou, ainda, que a NR-7 não criou obrigação de fazer, sendolegítimo o instrumento, pois visacontrolar a saúde dos trabalhadores,limitando-se a norma a detalhar como aproteção do trabalho será realizada. Notocante à imposição da multa, entendeuo n. julgador, pelas razões que expôs,que a autoridade que a aplicou não eraincompetente para a prática do ato oraimpugnado.

Assim, à evidência, não houveausência de prestação jurisdicional, e,ademais, em se tratando de matériaexclusivamente de direito abordada noapelo em exame, não existe nulidade,visto que não há prejuízo.

Rejeito.

Nulidade do auto de infração

Entende a recorrente que o autode infração é nulo porque fundamentadoem Portarias que usurparam funções doCongresso Nacional e atribuições

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privativas do Presidente da República.Diz que a Portaria n. 24 do MTE não serevela como lei no sentido formal, nãopodendo lhe impor obrigações, sendode toda inconstitucional. Entende,também, que o Secretário de Segurançae Saúde no Trabalho não temcompetência para expedir a referidaPortaria, nos estritos termos dos arts.84, IV e 87, parágrafo único, II, daConstituição da República. Afirma quea referida NR cria obrigação para oempregador ao impor-lhe os custos dosprocedimentos relacionados aoPCMSO. Aduz que restou violado oprincípio da reserva legal. Argumentaque o poder de polícia conferido àAdministração não permite a expediçãode NRs que criem obrigações aosempregadores. Sustenta que, por forçado art. 25 do ADCT, a delegação dascompetências ao Poder Executivo(MTE) para editar NRs encontra-serevogada. Em suma, tece inúmerasrazões para que seja declarado nulo oauto de infração.

Sem razão.Com efeito, a NR-7 da Portaria

n. 24 do MTE não criou obrigação defazer, como bem entendeu o d. juízo deorigem, mas apenas regulamentou aproteção estabelecida no art. 200 daCLT.

Art. 200. Cabe aoMinistério do Trabalhoestabelecer disposiçõescomplementares às normas deque trata este Capítulo, tendo emvista as peculiaridades de cadaatividade ou setor de trabalho,especialmente sobre:

[...]VI - proteção do

trabalhador exposto asubstâncias químicas nocivas,radiações ionizantes e não

ionizantes, ruídos, vibrações etrepidações ou pressõesanormais ao ambiente detrabalho, com especificação dasmedidas cabíveis paraeliminação ou atenuação dessesefeitos, limites máximos quantoao tempo de exposição, àintensidade da ação ou de seusefeitos sobre o organismo dotrabalhador, exames médicosobrigatórios, limites de idade,controle permanente dos locaisde trabalho e das demaisexigências que se façamnecessárias.

Observe-se que as NRs são atosadministrativos que visam a execuçãodas leis, expressando detalhadamentea intenção abstrata da lei, nelarespaldados. E é a CLT que cria aobrigação pela proteção da saúde dotrabalhador.

E mais, verifica-se dos autos queo PCMSO encontra-se implantado,contudo, os prazos nele estabelecidospara realização de exames periódicosé que não estão sendo observadosquanto à maioria dos empregados daFIAT, a teor do que se colhe dasinformações da DRT e do próprio autode infração, fato sequer impugnado naação.

Assim, entendo que o que estáem discussão não é a obrigatoriedadede elaboração de PCMSO, uma vez queeste existe, mas sim a sua observância.Veja-se que a autuação não decorreuda inexistência do referido Programa,mas do descumprimento dos prazosnele previstos para os examesperiódicos.

Não se mostra correto, mas simrepudiável, o fato de a autora implantaro PCMSO mas não o cumprir, ignorandoo prazo para a realização dos exames

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periódicos, e, via de conseqüência, aproteção à saúde de seus empregados,para depois discutir a legalidade danorma que instituiu a elaboração domencionado Programa.

E não socorre a tese de que aConstituição da República nãorecepcionou o citado art. 200 da CLT,bastando a leitura do inciso XXII do art.7º da Carta Magna c/c o inciso I do art.155 da CLT.

Art. 7º São direitos dostrabalhadores urbanos e rurais,além de outros que visem àmelhoria de sua condição social:[...]XXII. redução dos riscosinerentes ao trabalho, por meiode normas de saúde, higiene esegurança.

Art. 155 - Incumbe aoórgão de âmbito nacionalcompetente em matéria desegurança e medicina dotrabalho:

I - estabelecer, nos limitesde sua competência, normassobre a aplicação dos preceitosdeste Capítulo, especialmente osreferidos no art. 200.

A competência do Secretário deSegurança e Saúde no Trabalhotambém se encontra respaldada nosdispositivos legais acima transcritos,uma vez que, nos termos do item 1.3da NR-1 da Portaria n. 3.214 do MTE, éa SSST (Secretaria de Segurança eSaúde no Trabalho) o órgão nacionalcompetente em matéria de medicina dotrabalho.

1.3. A Secretaria de Segurançae Saúde no Trabalho - SSST é oórgão de âmbito nacional

competente para coordenar,orientar, controlar e supervisionaras atividades relacionadas coma segurança e medicina dotrabalho, ...

Deste modo, como bemasseverado pelo d. juízo de origem, oMinistério do Trabalho valeu-se denorma regulamentadora paradeterminar a realização de examesmédicos periódicos (objeto do auto deinfração), conforme lhe autorizam edeterminam as disposições legaispertinentes à matéria. Não socorre,portanto, nenhuma das teses denulidade do auto de infração, sendo esteválido. Também, não há que se falar emusurpação das funções do CongressoNacional, muito menos das atribuiçõesdo Presidente da República, e sequerviolação ao princípio da reserva legal,uma vez que esta Especializada nãopode chancelar a omissão ou falta devontade dos empregadores em zelarpela saúde de seus empregados.

Nada a prover.

Nulidade da decisão queimpôs a multa administrativa

Diz a recorrente que a decisãofoi proferida pelo Chefe da Seção deMultas e Recursos e não pelo DelegadoRegional do Trabalho, conformedetermina a legislação vigente.

Sem razão.Conforme se colhe da Portaria n.

065/1998, o Delegado Regional doTrabalho delegou ao Chefe da Seçãode Multas e Recursos, da DRT/MG, acompetência para imposição de multasadministrativas em processosoriginários de autos de infração.

E a delegação de competênciaencontra respaldo no Decreto-lei n. 200/67, art. 11:

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Art. 11. A delegação decompetência será utilizada comoinstrumento de descentralizaçãoadministrativa, com o objetivo deassegurar maior rapidez eobjetividade às decisões,situando-as na proximidade dosfatos, pessoas ou problemas aatender.

Nada a modificar.Mantida a validade do auto de

infração e da multa administrativaaplicada, não há o que se examinar emrelação à repetição de indébito ou àpossibilidade de autuação da reclamadapelo fiscal da DRT.

Em face do exposto, conheço dorecurso ordinário. No mérito, nego-lheprovimento.

Motivos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, em SessãoOrdinária da Egrégia 5ª Turma,preliminarmente, à unanimidade,conheceu do recurso ordinário; nomérito, sem divergência, negou-lheprovimento.

Belo Horizonte, 23 de agosto de2005.

EDUARDO AUGUSTO LOBATORelator

TRT-00011-2005-048-03-00-6-ROPubl. no “MG” de 23.07.2005

RECORRENTES: 1) JUÍZO DA VARADO TRABALHO DE ARAXÁ (EXOFFICIO) (MUNICÍPIO DE IBIÁ)2) LUCIENE APARECIDAFONSECA

RECORRIDOS: 1) OS MESMOS2) SANTA CASA DE MISERICÓRDIAPADRE EUSTÁQUIO

EMENTA: MUNICÍPIO DE IBIÁ -FRAUDE - CONTRATAÇÃOIRREGULAR - SANTA CASA DEMISERICÓRDIA PADREEUSTÁQUIO - UTILIZAÇÃO DOPROCESSO PARA PRÁTICA DEATO SIMULADO E COM FINSESCUSOS - NULIDADE DOCONTRATO DE TRABALHO. Ojuízo, no cumprimento dodever jurisdicional, comrespaldo no que dispõe oartigo 335 do Código deProcesso Civil, pode utilizar-sedas regras da experiênciacomum subministradas pelaobservação do queordinariamente acontece, bemcomo carrear aos autos asprovas necessárias e dedomínio público para instruir oprocesso, quando se trata decontratação irregular, com aparticipação do Município, emevidente fraude à lei, cujairregularidade tentaram aspartes ocultar mediante acordo.Demonstrada, à evidência, autilização do processo para aprática de ato simulado e comfins escusos, mantém-se adecisão de primeiro grau quedeclarou a nulidade do contratode trabalho e a impossibilidadede homologação do ajuste.

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Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso ordinário,decide-se:

RELATÓRIO

O MM. Juízo da Vara do Trabalhode Araxá, pela sentença de f. 41/60 eanexos de f. 62/94, negou homologaçãoao acordo entabulado pelas partes ejulgou improcedentes os pedidosiniciais, declarando a nulidade docontrato de trabalho.

Recurso ordinário interposto pelareclamante às f. 98/109, argüindo apreliminar de nulidade da sentença porcerceamento de defesa, de produção deprova e ausência de prova material. Nomérito, pretende a reforma da r. decisãoe a homologação do acordo pactuadoentre as partes, alegando autonomia epersonalidade jurídica própria da SantaCasa de Misericórdia Padre Eustáquio,validade do contrato de comodato,inexistência de irregularidades nascontratações e ilícito penal,responsabilidade da pessoa jurídica dedireito público pelo ato praticado porseus agentes, princípio da realidadecontratual e ausência de provas.

Determinada a remessa dosautos ao egrégio Tribunal para oreexame necessário, conforme Decreto-lei n. 779/69.

Contra-razões apresentadaspelo Município às f. 127/132. Emboraregularmente intimada, a primeirareclamada não ofertou contra-razões(certidão f. 133).

Parecer do Ministério Público doTrabalho às f. 134/135, opinando peloconhecimento dos recursos voluntárioda reclamante e de ofício, rejeição dapreliminar de nulidade argüida e, nomérito, pelo desprovimento dosrecursos.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

Preliminar de descabimento daremessa necessária argüida de ofício

A obrigatoriedade ao duplo graude jurisdição das decisões proferidasem desfavor dos entes públicos erespectivas autarquias foi abrandadarecentemente, com a edição da Lei n.10.352, de 26.12.2001, que introduziuo § 2º ao artigo 475 do CPC, assimvazado:

§ 2º Não se aplica o dispostoneste artigo sempre que acondenação, ou o direitocontrovertido, for de valor certonão excedente a 60 (sessenta)salários mínimos, bem como nocaso de procedência dosembargos do devedor naexecução de dívida ativa domesmo valor. (grifamos)

As custas foram fixadas noimporte de R$80,39, calculadas sobreR$4.019,55, valor arbitrado àcondenação, portanto, bem aquémdaquele fixado para a aplicação docaput do artigo 475 do CPC.

Nem se diga que o Decreto-lein. 779/69 afastaria a aplicação do § 2ºdo artigo 475 do CPC, porquanto opróprio Decreto-lei trouxe para oProcesso do Trabalho o recurso exofficio e, por isso, as demais normas deprocedimento relativas a esse instituto,apenas referidas no Decreto-lei n. 779/69, admitem a aplicação subsidiária dodiploma processual que lhe deu origemnesta Justiça Especializada.

Por tais fundamentos, nãoconheço do recurso ex officio.

Satisfeitos os pressupostos de

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admissibilidade, conheço do recursoordinário oposto pela reclamante e dascontra-razões apresentadas peloMunicípio.

Preliminar de nulidade dasentença por cerceamento de defesae de prova - Ausência de provamaterial - Não configuração

Argúi a recorrente a preliminar denulidade da r. sentença por infringênciaao inciso LV do artigo 5º da ConstituiçãoFederal, aduzindo que a decisãofundamentou-se no Contrato deComodato firmado entre o Município deIbiá e a Santa Casa de MisericórdiaPadre Eustáquio, inserindo no corpo dojulgado cláusulas do citado ajuste, semque referido instrumento tenha sidocarreado aos autos, impossibilitando opleno exercício da defesa.

Demais disso, alega que, dopróprio texto da Lei n. 1.473/95 citadana sentença, verifica-se que o comodatofoi autorizado por seis anos, nãohavendo sequer menção de suaprorrogação, ou ainda alteração de seustermos e também a própria perda devigência.

Não merece acolhida apreliminar suscitada, pela inexistênciade qualquer cerceamento de defesa,sendo de domínio público na região avinculação de longa data havida entrea Santa Casa de Misericórdia PadreEustáquio e o Município de Ibiá.

Por outro lado, verifica-se que ademanda, ao contrário da tese recursalsustentada, foi proposta também contrao Município, o que denota, à evidência,o total conhecimento da relaçãoexistente entre os reclamados.

E se não bastasse, como bemressaltou o douto representante doMinistério Público do Trabalho em seuparecer às f. 134/135, não restou

configurado qualquer cerceamento dedefesa, que sequer foi produzida, já quea hipótese não demandava a produçãode provas, em razão do acordoformalizado pelas partes às f. 19/20.

Rejeito.

Mérito

Acordo pactuado entre aspartes - Homologação - Nulidadecontratual

A recorrente insurge-se contra ar. decisão de primeiro grau, tentandodesconstituí-la, alegando em síntese aautonomia e personalidade jurídica daSanta Casa de Misericórdia PadreEustáquio, a validade do contrato decomodato havido entre os reclamados,inexistência de irregularidades nascontratações, não configuração de ilícitopenal, responsabilidade jurídica dapessoa jurídica de direito público pelosatos praticados por seus agentes,princípio da realidade contratual eausência de provas.

Sustenta que a primeirareclamada não é, e nunca foi, empresapública, tratando-se de associaçãofilantrópica, com personalidade jurídicade direito privado, orçamento eadministração próprios, recebendo,além dos recursos municipais, verbasdo governo federal através do SUS eoutros convênios, além de atendimentosparticulares e onerosos, alegando quea citada Lei n. 1.473/95 autoriza oMunicípio a repassar recursos para aprimeira reclamada e assumir a suadireção, sem, contudo, alterar a suapersonalidade jurídica.

Aduz que, apesar de o Municípioadministrar a primeira reclamada, nostermos do contrato de comodato quenão foi trazido aos autos, trata-se depessoas jurídicas distintas, concluindo

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que os trabalhadores não sãoservidores públicos, mas empregadosregidos pela CLT.

Afirma a inexistência deirregularidades nas contratações, bemcomo a não configuração de ilícito penaleleitoral, visto que ocorreram “sob osolhos da Câmara Municipal de Ibiá, dorepresentante do Ministério PúblicoEstadual em Ibiá (guardião doMunicípio) e ainda das fiscalizaçõesfeitas pelo Ministério do Trabalho, semque tenha levantado nenhumairregularidade ou nulidade”,acrescentando que diversas foram asreclamações trabalhistas propostascontra a primeira reclamada, e que todosos contratos de trabalho foram mantidose os acordos homologados, além dehomologações de rescisões contratuaishavidas perante o representante doMinistério Público local.

Por último, aduz que é princípiobasilar do direito, insculpido no artigo81 da Lei Orgânica do Município de Ibiá,que a pessoa jurídica de direito públicoresponde pelos danos causados pelosatos praticados por seus agentespúblicos, sendo obrigatório o direito deregresso contra o responsável legal.

Assim, ainda que, naeventualidade, admitam-se as ilicitudesapontadas na r. sentença de primeirograu, a Lei prevê a responsabilidade doMunicípio, devendo, por isso, serreformada a decisão para homologar oacordo entabulado, nos exatos termosem que foi pactuado, não deixando desalientar o princípio da realidadecontratual, a hipossuficiência dareclamante e a ausência de provas asustentar a decisão proferida.

Em que pese o inconformismo darecorrente, e ao contrário das alegaçõesrecursais, provas das irregularidadescometidas pelas partes é o que nãofaltam nos autos.

Por questões óbvias, não foramtrazidas pelas partes, mas pelo juízo,diligente no cumprimento do dever eatento “...as regras de experiênciacomum subministradas pela observaçãodo que ordinariamente acontece... (artigo335 do Código de Processo Civil)”, quelhe permitiram “chegar à conclusão deque as contratações efetivadas peloPoder Executivo Municipal através daSanta Casa tiveram o intuito de burlar alei, não só burlando o instituto doconcurso público, mas representandoum ilícito penal eleitoral, pois ascontratações foram utilizadas - também- com o intuito de arregimentar votos,tudo com o conhecimento - também -dos trabalhadores envolvidos”.

Constata-se com clareza nosautos que o Chefe do ExecutivoMunicipal desvirtuou o contrato decomodato, quebrando a impessoalidadenas contratações, sendo administradaspor pessoas nomeadas pelo Prefeito ecom orçamento público municipal.

Como bem salientou a r. decisãoà f. 45, “A Santa Casa foi utilizada paraburlar a via do concurso público. Nainstrução de um dos processos o juízodeparou com um ‘empregado’ da SantaCasa que jamais deu expediente ali,pois fazia a manutenção dos mata-burros das estradas municipais(Processo n. 00010-2005-048-03-00-1- Carlos Roberto da Cruz X Santa Casade Misericórdia Padre Eustáquio eMunicípio de Ibiá/MG - f. 35).” Confira-se às f. 21/24.

Na trilha da comprovação dasirregularidades cometidas, verificou-seainda que “O próprio Presidente doSindicato dos Servidores Municipaisprestou depoimento perante a Justiçado Trabalho e disse que a entidade fezuma denúncia na Câmara dosVereadores em relação às contrataçõesirregulares e que o INSS foi acionado e

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autuou a Santa Casa emR$3.000.000,00 (f. 23).”

Quanto às irregularidades nascontratações e na administração dosempregados públicos concursados,encontram-se estampadas às f. 46/57,validamente adunadas aos autos,demonstrando ainda que, nos inúmerosjulgados de casos semelhantes,sobressai a parcela de culpa dostrabalhadores envolvidos,“...contratados com cláusula implícita de‘fidelidade’ aos ideais políticos do Chefedo Executivo”, ensejando a nulidadedeclarada em primeiro grau. Descabe,pois, cogitar-se de ausência de provas,visando contornar a situação e dar aresde legalidade ao acordo entabuladopelas partes com intuito de encobrir afraude existente.

É bem verdade que não persistecompetência penal a esta Especializadapara declarar a configuração do ilícitopenal decorrente de crime eleitoral; noentanto, pode apontar incidentalmentea existência do fato criminoso para odesate da controvérsia trabalhista.

De toda sorte, já determinada aexpedição de ofícios, caberá aos órgãoscompetentes a adoção das medidas queentenderem necessárias.

Correta a decisão de primeirograu que não homologou o acordo de f.19/20, declarando a nulidade docontrato de trabalho da autora.

Mantenho.

CONCLUSÃO

Não conheço do recurso exofficio, em face do disposto no § 2º doartigo 475 do CPC. Conheço do recursoordinário interposto pela reclamante,rejeito a preliminar argüida e, no mérito,nego-lhe provimento.

Determino cópia da presentedecisão ao douto MPT.

Fundamentos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, pela sua EgrégiaOitava Turma, preliminarmente, àunanimidade, não conheceu do recursoex officio, em face do disposto no § 2ºdo artigo 475 do CPC; mas conheceudo recurso ordinário interposto pelareclamante; unanimemente, rejeitou apreliminar argüida; no mérito, semdivergência, negou-lhe provimento;determinou a remessa de cópia destadecisão ao d. MPT.

Belo Horizonte, 13 de julho de2005.

PAULO MAURÍCIO RIBEIRO PIRESRelator

TRT-00458-2005-000-03-00-5-ARPubl. no “MG” de 28.10.2005

AUTORA: PARCERIA CONSERVAÇÃOE SERVIÇOS TÉCNICOS LTDA.

RÉU: OSMAR GUILHERME DORNELLAS

EMENTA: DECADÊNCIA -AJUIZAMENTO DERESCISÓRIA ANTERIOREXTINTA SEM JULGAMENTODO MÉRITO -IMPOSSIBILIDADE DEINTERRUPÇÃO DO PRAZODECADENCIAL. Na dicção doart. 207 do nCCb, “Salvodisposição legal em contrário,não se aplicam à decadênciaas normas que impedem,suspendem ou interrompem aprescrição.” Mas a ressalvanão atrai a incidência dodisposto nos artigos 220 e 219do CPC, para efeito deinterromper o prazo

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decadencial, ainda quevalidamente ultimada a citaçãoem rescisória anteriormenteajuizada, extinta semjulgamento do mérito. Ainterpretação, na espécie, deveser feita consoante oassentado na Súmula n. 106 doC. STJ. Portanto, quando o art.207 do nCCb ressalva aexistência de disposição legalpara possibilitar a suspensão,interrupção e impedimento dadecadência, há de se entenderque se trata daquelashipóteses específicas em quea lei expressamente prevê osóbices em apreço, a exemplodas previsões contidas no § 2ºdo art. 26 do Código de Defesado Consumidor. Deste modo,ajuizada a segunda demandaapós escoado o biênioprevisto no art. 495 do CPC,consuma-se a decadência,impondo-se a extinção doprocesso, na forma do incisoIV do art. 269 desse mesmoCódigo.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de ação rescisória, emque figuram, como autora, PARCERIACONSERVAÇÃO E SERVIÇOSTÉCNICOS LTDA. e, como réu, OSMARGUILHERME DORNELLAS.

RELATÓRIO

Trata-se de ação rescisóriaajuizada por PARCERIACONSERVAÇÃO E SERVIÇOSTÉCNICOS LTDA. em desfavor deOSMAR GUILHERME DORNELLAS,com fulcro nos incisos V e IX do art. 485do CPC. Aduz que não teve ciência daação trabalhista proposta pelo ora réu,

que teria indicado, maliciosamente, paracitação, denominação empresária eendereço incorretos, pelo que o feito foijulgado à sua revelia, aplicando-se-lhea pena de confissão quanto à matériade fato. E, após o trânsito em julgadoda sentença, foi alterado o pólo passivoda ação, para constar a sua corretadenominação, como se do feito tivesseparticipado, embora fosse ele eivado denulidade. Aduz que a hipótesecaracteriza erro de fato, na medida emque o julgador considerou existente fatoque não ocorreu, havendo, outrossim,violação aos artigos 213, 214, 247 doCPC, 841 da CLT e inciso LV do art. 5ºda Constituição Federal.

Informa que anteriormenteajuizou idêntica ação rescisória, julgadaimprocedente neste Regional, mas cujoprocesso foi extinto sem julgamento domérito, quando da apreciação de seurecurso no C. TST, o que viabiliza arepetição da demanda, como ora seconcretiza. E alega que o ajuizamentodaquele feito, em 11.09.2002, extintosem julgamento do mérito, teve ocondão de interromper o prazodecadencial para o pleito rescisório, poisa sentença rescindenda transitou emjulgado em 16.05.2002 e, embora oprazo decadencial se consumasse emmaio de 2004, a sua contagem foireiniciada em 16.08.2004.

Pugnando pela procedência daação, requereu a antecipação dosefeitos da tutela, visando a suspensãoda execução no processo originário,reconhecendo-se, em novo julgamento,a nulidade da demanda, desde a citaçãoinicial.

Atribui à causa o valor deR$26.051,49.

Junta documentos às f. 41/654.Admitido o processamento da

ação (f. 656/657) e indeferida aantecipação da tutela, o réu foi citado

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(f. 660), trazendo defesa, comdocumentos, às f. 661/755, suscitandoa prejudicial de decadência, epugnando, se ultrapassada, pelaimprocedência da ação e condenaçãoda autora em honorários advocatícios.

Sem outras provas, encerrou-sea instrução processual à f. 766,produzindo o réu razões finais à f. 767.

Parecer do Ministério Público doTrabalho, às f. 770/772, opinando pelarejeição da decadência suscitada eprocedência da ação.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

Do prazo decadencial -Ajuizamento de rescisória anteriorextinta sem julgamento do mérito

Suscita o réu, na defesa, aprejudicial de decadência, pois, comose extrai da certidão de f. 554, a decisãorescindenda teria transitado em julgadoem 16 de maio de 2002, ao passo quea presente ação foi proposta em 18 deabril de 2005. E a autora, já na inicial,defende a interrupção do prazo emapreço, por força de ajuizamento, em11.09.02, de rescisória idêntica, extintasem julgamento do mérito no C. TST (f.605), decisão que transitou em julgadoem 16.08.2004, após esgotada ainterposição, sem sucesso, dosrecursos manejados. Assim, a partir detal data (16.08.2004), teria havido oreinício do prazo decadencial.

Apresentada a questão, nestestermos, o deslinde da matéria passapelo exame da possibil idade deinterrupção do prazo decadencial.

Como se sabe, pelo disposto noart. 495 do CPC, o direito de propor açãorescisória se extingue em dois anos,

contados do trânsito em julgado dadecisão. E leciona Agnelo Amorim Filho,RDPC 3/95, como a rescisória é açãodesconstitutiva com prazo de exercícioprevisto em lei, tal prazo é dedecadência (NERY JUNIOR, Nelson eNERY, Rosa Maria de Andrade. CPCcomentado, 7. ed. Editora RT, 2003, art.495, p. 844). E a decadência, naconceituação jurídica, “é a perda dodireito, em virtude de não ter sidoexercitado dentro do prazo legal ou dasdilações judiciais” (NÁUFEL, José. Novodicionário jurídico brasileiro, 3. ed. JoséKonfino Editor, v. II, p. 165). Ou seja (eaqui invoca-se Caio Mário), “quando alei marca um tempo, como condição deexercício, o vencimento desse limitetemporal importa na caducidade oudecadência do direito” (Autor cit.Instituições de direito civil, Forense, 14.ed. v. I, p. 479).

É certo que, na dicção do art. 207do nCCb, “Salvo disposição legal emcontrário, não se aplicam à decadênciaas normas que impedem, suspendemou interrompem a prescrição.”(grifamos) E não se olvida de que o art.220 do CPC contém ressalva de que odisposto no art. 219 daquele Códigoaplica-se a todos os prazos extintivosprevistos em lei, dentre os quais, semdúvida, a decadência. E, nos termos doart. 219 do CPC, “A citação válida tornaprevento o juízo, induz litispendência efaz litigiosa a coisa; e, ainda quandoordenada por juiz incompetente,constitui em mora o devedor einterrompe a prescrição.”

Da interpretação dessa normaprocessual não se extrai, porém, que aextinção do processo, sem julgamentodo mérito, interromperia o prazodecadencial, que recomeçaria a fluir,para efeito de possibilitar o ajuizamentotempestivo de uma nova demanda.Quando o art. 207 do nCCb ressalva a

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existência de disposição legal parapossibilitar a suspensão, interrupção eimpedimento da decadência, há de seentender que se trata daquelashipóteses específicas em que a leiexpressamente prevê a interrupção dadecadência, como, por exemplo, asprevisões contidas no Código de Defesado Consumidor, a saber:

Art. 26. [...]§ 2º Obstam a

decadência:I - a reclamação

comprovadamente formuladapelo consumidor perantefornecedor de produtos eserviços até a resposta negativacorrespondente, que deve sertransmitida de forma inequívoca;

II (Vetado.);III - a instauração de

inquérito civil, até seuencerramento.

§ 3º Tratando-se de víciooculto, o prazo decadencialinicia-se no momento em queficar evidenciado o defeito.

No caso em apreço, a normacontida no art. 220 do CPC, que remeteà atração para a decadência dainterrupção prevista no art. 219 daqueleCódigo, diz respeito à não fluidez docurso da decadência naquele mesmoprocesso em que ajuizada a demanda.Do contrário, a parte que ajuizasse aação às vésperas da consumação doprazo decadencial não teria o fluxo desteobstado, ante a natural demora narealização dos atos processuais. Nestesentido, a Súmula n. 106 do C. STJ, asaber:

Proposta a ação no prazo fixadopara o seu exercício, a demora nacitação, por motivos inerentes ao

mecanismo da Justiça, nãojustifica o acolhimento da argüiçãode prescrição ou decadência.

Moniz de Aragão, comentando oart. 220 do CPC, leciona:

238. COMPREENSÃO DODISPOSITIVO. - Mas é evidentea insuficiência da redação,embora claríssimo o espírito dalei.

[...]Mas aí surge a

impropriedade da forma de seexprimir, escolhida pelo legislador,em 1944 e agora. É que não setrata de interromper a decadênciaou o prazo de extinção.

O que a lei visa é aassegurar à parte que os efeitosda decadência ou extinção doprazo não ocorrerão, se ajuizara causa dentro do lapso em leiprevisto e obtiver o despachoinicial - ou apresentar a petiçãoinicial no protocolo dadistribuição ou do tribunal, desdeque a citação inicial sejarealizada na conformidade dodisposto nos §§ 2º e 3º do artigoanterior. Se o não for, incidirá emtoda a plenitude o preceitocontido no § 4º.

O efeito antecipado não éinterrupção, pois a decadência aesta não fica subordinada; o quese antecipa é a instauração doprocesso, a efetividade doexercício do direito de ação,mesmo antes de se completar aformação da relação processualatravés da citação do réu, exigidapelo art. 263.(Comentários ao Código deProcesso Civil, v. II, Forense,1987, p. 252)

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A jurisprudência tem semanifestado no sentido de que

Se a petição inicial da açãorescisória for indeferida (CPC490), nem assim se suspende ouinterrompe o prazo para oajuizamento de outra rescisória(NEGRÃO, CPC, 495, 363).(NERY JUNIOR, Nelson e NERY,Rosa Maria de Andrade. Códigode Processo Civil comentado elegislação extravagante, 7. ed.Editora RT, art. 495, p. 845)

Outra decisão também extraídado CPC de Theotônio Negrão nãodiverge:

Indeferida a inicial, se bem quese permita renovar a rescisória,o prazo decadencial não seinterrompe ou suspende pelacitação para a açãoincidentalmente frustrada.(TFR-1ª Seção, AR 1416-SP, rel.Min. José Dantas, j. 17.08.88,julgaram inadmissível a ação,v.u., DJU 12.09.88, p. 22.694)(ob.cit., 31. ed. Saraiva, art. 495,nota 3, p. 501)

Na mesma linha de entendimentoa seguinte decisão do C. TST:

PROC. N. TST-ROAG-751.961/2001.3RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃORESCISÓRIAANTERIORMENTEAJUIZADA. DECADÊNCIA DASEGUNDA RESCISÓRIA. O prazodecadencial não se sujeita àinterrupção ou à suspensão, sendoirrelevante ter-se ultimado a citaçãona rescisória anteriormenteajuizada, considerando tratar-se deduas ações distintas, pelo que

inaplicável à hipótese a disposiçãocontida no caput do art. 219 e noart. 220 do CPC. Desse modo, adata a ser considerada para fins dodisposto no art. 495 do CPC é a doefetivo registro constante doprotocolo na origem, que acusa apropositura da segunda ação em09.10.00, quando já ultrapassadoo biênio legal, tendo em vista ainformação constante da inicial deque o trânsito em julgado dadecisão rescindenda ocorreu em05.03.96. Recurso a que se negaprovimento.(SBDI-2, ac. un. Rel. Min. BarrosLevenhagen, de 21.08.2001,pub. DJ em 06.09.2001)

À luz deste contexto, a hipótesenão se equipara àquela prevista naSúmula n. 268 do TST, no sentido deque “A ação trabalhista, ainda quearquivada, interrompe a prescriçãosomente em relação aos pedidosidênticos.”

Deste modo, acolho a prejudicialde decadência suscitada na defesa enão admito a rescisória, extinguindo oprocesso, com julgamento do mérito, naforma do inciso IV do art. 269 do CPC.

Para ilustrar esta decisão, peçovênia ao Ex.mo Juiz Júlio Bernardo doCarmo, Presidente da SDI-2 desteRegional, para transcrever a sua doutamanifestação sobre o tema, na sessãode julgamento:

VOTO CONVERGENTECOM O DA D. JUÍZA REVISORA.

O artigo 495 do Código deProcesso Civil estatui de formaincisiva que o direito de proporação rescisória se extingue em 2(dois) anos, contados do trânsitoem julgado da decisão. Como

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ensina o eminente processualistaCoqueijo Costa, o prazo paraajuizar a rescisória é dedecadência e não de prescrição,assertiva doutrinária que nãoencontra qualquer dissenso entreos doutos. Importa isso em dizerque o prazo extintivo previsto noartigo 495 do Código de ProcessoCivil é de decadência, não sesuspendendo ou interrompendopor constituir açãodesconstitutiva, fluindoinexoravelmente o lapso extintivodesde o dia em que a sentençarescindenda transitou em julgado,o que se corrobora pelo dispostono artigo 207 do Código Civil quetaxativamente dispõe que, a nãoser que haja disposição legal emcontrário, não se aplicam àdecadência as normas queimpedem, suspendem ouinterrompem a prescrição.

Neste contexto, aeminente Juíza revisora, comaguda propriedade, nominoucasos expressos previstos em leionde se minimizam os efeitosextintivos e inexoráveis dadecadência e, fora dessasressalvas legais, a regraimperativa que emana do artigo207 do Código Civil é aimpossibil idade jurídica deinterrupção do lapsodecadencial, não se podendo poreste motivo aplicar-se à regradecadencial casos específicos etópicos de interrupção do prazoprescricional, como acontece,e.g., com a citação válida, aindaque ordenada por juizincompetente, porque trata-se desituações jurídicas distintas quemerecem tratamento jurídicodiferenciado.

Com base nas assertivassupra-expostas, tenho que osimples ajuizamento de açãorescisória anterior, onde restouconsumado o efeito processualinterruptivo da prescrição, nãoestende tal favor (impeditivo dofluxo temporal) aos casos dedecadência, à míngua deexpressa disposição legal emcontrário.

A única condescendênciaque se faz nesta seara é aprevista na Súmula n. 106 doSuperior Tribunal de Justiça,onde se firmou o entendimentode que “proposta a ação no prazofixado para o seu exercício, ademora na citação, por motivosinerentes ao mecanismo deJustiça, não justif ica oacolhimento da argüição deprescrição ou de decadência”.

É dentro do contextojurídico idealizado pela Súmulan. 106 do STJ que tempertinência a citação dosseguintes pronunciamentosdoutrinários, ou seja, de que adecadência, em um determinadoprocesso, pode sim serinterrompida se a citação válidase consuma após o biêniodecadencial por culpa do juízo:

I) ARAGÃO, E. D. Monizde. Comentários ao Código deProcesso Civil, II v. arts. 154 a269, Forense, 1. ed. comentárion. 237, referente ao artigo 220 doCPC, pp. 202/203, in verbis:

“237. PRAZOS EXTINTIVOS. -Acolhida, nos §§ 2º e 3º daredação original do art. 166 doCódigo de 1939, a regra de odespacho aposto à petição inicial

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antecipar o efeito interruptivo daprescrição, ficariam a descobertoos demais casos, previstos noart. 178 do Código Civil e em leisextravagantes, que, emboradenominados de prescrição, naverdade são prazos extintivos oude decadência - não sendosujeitos a interrupção, a normanão se lhes aplicaria; far-se-ianecessário que a citação inicialse completasse até o último diado respectivo prazo, a fim de odireito do autor não se extinguirpela decadência.

Mas essa solução seriarudemente iníqua, pois osmotivos determinantes daadoção da providência contidanos referidos parágrafos (que oDecreto-lei n. 4.565, de 11 deagosto de 1942, englobou em umúnico) valem integralmente paraos prazos extintivos ou dedecadência. Em alguns é, até,maior a razão determinante danecessidade de serem aplicadosos mesmíssimos princípios;basta figurar o prazo de dez dias,que o Código Civil (art. 178, § 1º)concede para a propositura daação, que visa a anular ocasamento, fundada no seu art.219, IV. Se aplicado a esse caso,o preceito de ser necessária acitação inicial antes deconsumar-se a decadênciatornaria impossível exercitar aaludida pretensão, em vista danatural demora, não só empropor essa ação, como efetivara citação inicial. O prazo, que jáé curtíssimo, ainda ficaria maisreduzido.

Atentando para essa eoutras situações, o Decreto-lei n.6.790, de 15 de agosto de 1944,

declarou que a disposição do art.166, do Código de 1939, seriaaplicável ‘a todos os casosprevistos no art. 178 do CódigoCivil e aos demais casos deprescrição e prazos extintivosprevistos em lei’.

Idêntica é a normaconstante deste artigo, queestende os preceitos contidos noanterior a todos os prazosextintivos, ou decadenciais,previstos em lei.”

II) TEIXEIRA FILHO,Manoel Antonio. Ação rescisóriano Processo do Trabalho, LTr, 2.ed. 1994, p. 306/307:

“Entendemos que acitação do réu, na rescisória,ordenada pelo relator, é causainterruptiva da decadência, emvirtude do disposto no art. 220 doCPC, que esclarece ser o art.219 do mesmo Código aplicável‘a todos os prazos extintivosprevistos na lei’ (sublinhamos).

[...]Em termos práticos, isso

significa que, nos dez diassubseqüentes ao proferimentodo despacho, pelo relator, deveráo autor promover a citação do réu(art. 219, § 2º). Não sendo citadoo réu, o juiz prorrogará o prazoaté o máximo de noventa dias,desde que a parte assim requeiranos cinco dias seguintes aotérmino do prazo mencionado noparágrafo anterior (§ 3º). Nãosendo efetuada a citação, nosprazos referidos, haver-se-á pornão interrompida a decadência(§ 4º).

É óbvio que aconseqüência cominada no § 4º

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do art. 219 do CPC apenasatuará se a citação do réu nãofor realizada por culpa do autor.

Em face da atualtendência jurisprudencial,portanto, já não nos parecepossível proclamar-se, em tomprofessoral, que os prazosdecadenciais em nenhumahipótese se suspendem ou seinterrompem, embora nãoestejamos, com isso, procurandonegar o seu caráter de fatalidadee de peremptoriedade.”

A exceção, como visto,importa o acolhimento de justacausa impeditiva da expeditaconsumação da citação emdeterminado processo ajuizadono prazo legal, não seestendendo esse favor, no casode decadência, a processodiverso, se o primeiro por fás ounefas vem a ser extinto semjulgamento do mérito.

A ser assim, a manobraardilosa do litigante que, ansioso,assiste à fluência inapelável dosúltimos dias do biêniodecadencial, poderia ser de fácilsucesso, desde que ajuizasse arescisória nos estertores doprazo extintivo e maliciosamentedeixasse de juntar documentoimprescindível à tramitação darescisória, por se tratar decondição de sua procedibilidade,como é o caso da prova dotrânsito em julgado da decisãorescindenda, situação queconduziria à extinção doprocesso sem julgamento domérito, abrindo-se novo marcodecadencial para o ajuizamentoda ação rescisória, abalando-secom tal maquinação a assertiva

inconteste de que “a segurançadas relações sociais exige que aautoridade da coisa julgada, umavez estabelecida, não fiquedemoradamente sujeita apossibilidade de remoção”.

E, tenho para mim quecolocar-se à disposição do autorda rescisória tamanha faculdadeprocessual, a de, por ato seu,empecer o fluxo inexorável dadecadência, comprometeria sima estabilidade das relaçõessociais, tendo merecido bem porisso o desprezo explícito dolegislador.

Na toada de que oajuizamento de ação rescisóriaanterior, extinta sem julgamentode mérito, não impede o fluxo dolapso decadencial, que secomunica incontinenti à novademanda proposta pelo autor,temos os r. julgados ressaltadospela eminente Juíza revisora aque acrescento est’outro julgadoigualmente emanado do ColendoTribunal Superior do Trabalho:

RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃOR E S C I S Ó R I AANTERIORMENTE AJUIZADA.DECADÊNCIA DA SEGUNDARESCISÓRIA. O prazodecadencial não se sujeita àinterrupção ou à suspensão,sendo irrelevante ter-se ultimadoa citação na rescisóriaanteriormente ajuizada,considerando tratar-se de duasações distintas, pelo queinaplicável à hipótese adisposição contida no caput doart. 219 e no art. 220 do CPC.Desse modo, a data a serconsiderada para fins dodisposto no art. 495 do CPC é a

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do efetivo registro constante doprotocolo na origem, que acusaa propositura da segunda açãoem 03.03.00, quando jáultrapassado o biênio legal,tendo em vista a informaçãoconstante da inicial de que otrânsito em julgado da decisãorescindenda ocorreu em10.04.96. Recurso a que se negaprovimento.(TST-ROAR-737555, 2001, DJ06.09.2001, p. 540)

Com tais fundamentosapresento o presente votoconvergente com a divergênciasuscitada pela eminente Juízarevisora e igualmente acolho apreliminar de decadência.

Honorários advocatícios

O pleito é formulado pelo réu, nadefesa. Porém, os honorários emapreço, em sede de rescisória, naJustiça do Trabalho, somente seafiguram devidos quando presente aassistência sindical e deferidos osbenefícios da justiça gratuita, conformeinciso II da Súmula n. 219 do C. TST,que incorporou a OrientaçãoJurisprudencial n. 27 da SBDI-II daquelaCorte, requisitos estes não satisfeitos,na hipótese.

Improcede.

CONCLUSÃO

Acolho a prejudicial dedecadência suscitada na defesa e nãoadmito a rescisória, extinguindo oprocesso, com julgamento do mérito, naforma do inciso IV do art. 269 do CPC.

Indefiro o pleito do réu decondenação da autora ao pagamento dehonorários advocatícios.

Custas pela autora, no importede R$641,37, calculadas sobreR$32.068,95, valor atribuído à causa nainicial do processo principal (f. 45),devidamente corrigido (OJ n. 147 daSBDI-II do TST, índice 1.1151521, até30.09.05).

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes doTribunal Regional do Trabalho daTerceira Região, em Sessão Ordináriada 2ª Seção Especializada de DissídiosIndividuais, em, por maioria de votos,vencidos parcialmente os Ex.mos Juízesrelator, Cleube de Freitas Pereira eBolívar Viégas Peixoto, acolher aprejudicial suscitada na defesa e nãoadmitir a rescisória, extinguindo oprocesso, com julgamento do mérito, naforma do inciso IV do artigo 269 do CPC.Sem divergência, em indeferir o pleitodo réu de condenação da autora aopagamento de honorários advocatícios.Custas pela autora, no importe deR$641,37, calculadas sobreR$32.068,95, valor atribuído à causa nainicial do processo principal (f. 45),devidamente corrigido (OJ n. 147 daSBDI-II do TST, índice 1.1151521, até30.09.05).

Belo Horizonte, 13 de outubro de2005.

JÚLIO BERNARDO DO CARMOPresidente da 2ª SDI

DENISE ALVES HORTARedatora

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TRT-01367-2004-060-03-00-0-ROPubl. no “MG” de 17.09.2005

RECORRENTES: NEUZA MARIACAETANO (1)CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (2)

RECORRIDAS: AS MESMAS

EMENTA: EMBARGOS DEDECLARAÇÃO - EFEITOMODIFICATIVO -INEXIGIBILIDADE DE VISTA ÀPARTE CONTRÁRIA -NULIDADE INEXISTENTE.Insustentável a aplicação da OJn. 142 da SDI do TST, após oadvento da norma legal insertano art. 897-A da CLT, porquantoadmite o referido dispositivolegal, de maneira expressa, quese confira efeito modificativo nojulgamento dos embargos dedeclaração, sem que se prevejaou determine a concessão devista prévia à parte contrária,para manifestação. E a razão élógica, porquanto já ocorrido oprocedimento em contraditórioentre as partes até oproferimento da decisãoembargada. Não há nulidade,pois, na espécie, por isto e porausência de prejuízo, haja vistaque os recursos ordináriosinterpostos já propiciaram àspartes a impugnaçãogeneralizada das decisões deprimeiro grau, com o efeitodevolutivo amplo ou emprofundidade.

Vistos, relatados e discutidos osautos de recurso ordinário, em quefiguram, como recorrentes, NEUZAMARIA CAETANO (1) e CAIXAECONÔMICA FEDERAL (2) e, comorecorridas, AS MESMAS.

RELATÓRIO

Inconformadas com a sentençade f. 431/9, complementada pelasdeclaratórias de f. 461/4 e 487/8,recorrem ambos os lit igantes; areclamante para argüir preliminar denulidade da decisão dos embargosdeclaratórios da reclamada por violaçãodo princípio do contraditório ejulgamento extra petita, e, no mérito, osrecorrentes pugnam pela reforma; aCEF no pertinente a horas extras,buscando sua absolvição (f. 470/82), aopasso que a reclamante pleiteia aprocedência dos pedidos relativos aosreflexos das horas extras sobre APIPs,licença-prêmio e abonos, ao cômputodas verbas VP-GIP tempo de serviço eVP-GIP / sem salário + função à basede cálculo das horas extras, nos termosdos pedidos de letras “c” e “d” da inicial,e ao de seu retorno à jornada de seishoras, sem prejuízo da gratificação defunção percebida (f. 440/5 e 489/501).

Contra-razões recíprocas, f. 503/6 e 510/22.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

Conheço dos recursos, portempestivos e regularmenteprocessados.

Juízo do mérito recursal

Recurso da reclamante

Preliminar de nulidade dadecisão de embargos de declaração

Pela r. decisão de f. 461/4, foramacolhidos os embargos de declaraçãointerpostos pela reclamada, e excluída

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da condenação a incorporação dagratificação de função ao salário dareclamante.

Inconformada, a reclamante opôsnovos embargos de declaração,argüindo violação do princípio docontraditório, porque aos embargos dareclamada foi atribuído efeitomodificativo, sem que lhe fosse oferecidaoportunidade para se manifestar.

Pela r. decisão de f. 487/8,ficaram rejeitados os embargosdeclaratórios da reclamante, aofundamento de que “de acordo com o art.897-A da CLT, os embargos devem serjulgados na primeira audiência ou sessãosubseqüente à sua apresentação, ouseja, não se exige que a parte contráriatenha oportunidade de se manifestar.”

Comungo de tal entendimento, eacrescento que se afigura mesmoinsustentável a aplicação da OJ n. 142da SDI-I do TST, após o advento danorma legal inserta no art. 897-A da CLT,porquanto admite o referido dispositivolegal, de maneira expressa, que seconfira efeito modificativo no julgamentodos embargos de declaração, sem quese preveja ou determine a concessãode vista prévia à parte contrária, paramanifestação.

E a razão é lógica, porquanto jáocorrido o procedimento emcontraditório entre as partes até oproferimento da decisão embargada.

Não há nulidade, pois, naespécie, por isto e por ausência deprejuízo, haja vista que os recursosordinários interpostos já propiciaram àspartes a impugnação generalizada dasdecisões de primeiro grau, com o efeitodevolutivo amplo ou em profundidade.

Daí que sequer haveria talnulidade por julgamento extra petita,ante a possibilidade de revisão daquestão que foi objeto de impugnaçãoda reclamante-recorrente.

Incorporação da gratificaçãode função ao salário da reclamante

A r. decisão de embargos dedeclaração da reclamada, às f. 461/464,decidiu com acerto e nos limites em queposta a lide, não havendo que serreformada ou desbastada, data venia,eis que não se vislumbra a decisão forado pedido.

Com efeito, foi a própria petiçãode ingresso que manifestou a pretensãode que fosse reconhecido à reclamanteo direito de retornar à jornada especiale reduzida dos bancários de seis horas,sem prejuízo da remuneração, abrindoo contorno da lide para as razõesexpostas na defesa, que indicam apromoção levada a efeito por mútuoconsentimento, daí pretender areclamada que a gratificação de funçãopaga se prendesse à manutenção e/oupermanência da jornada comum de oitohoras, no pressuposto da confiançabancária e do reconhecimento dapromoção ocorrida para o cargo deconfiança aludido.

Houve, assim, o reconhecimentoem parte do pleito da inicial, no sentidode que à reclamante fosse reconhecidoo enquadramento no caput do art. 224da CLT, fazendo jus ao retorno pleiteadoà jornada de seis horas, referente àfunção que não se enquadra nasexigências do § 2º do art. 224 da CLT,daí que devidas as 7ª e 8ª horastrabalhadas como extras, mas sem aincorporação pretendida da gratificaçãode função ao seu salário contratual.

De acordo com a exegese dada,não há como manter a gratificação defunção como obrigação daempregadora se não haverá mais ocorrespondente exercício da função tidacomo de confiança bancária, ante oretorno deferido à jornada especial ereduzida, sendo o entendimento de que

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não se pode perpetuar o efeito secessada a causa, que é o mesmoconsagrado, mutatis mutandis, noparágrafo único do art. 468 da CLT e naOJ n. 248 da SDI-I do TST.

E atr ibuo razão à defesa,perfilhando o mesmo entendimento dojuízo a quo na referida decisão de f.461/464, daí que nego provimento aoapelo da empregada no aspecto.

Integrações na base de cálculodas horas extras e reflexos destas

Nesse particular, de igual modo,atribuo razão à defesa e à motivaçãodas r. decisões de primeiro grau, quedeslindaram judiciosamente asquestões, com espeque na melhorexegese das normas internas daempresa (RH 018 01, RH 020 01 e RH115 00).

Também quanto ao abonoespecial, como previsto nas normascoletivas aplicáveis, não pode prosperara pretensão quer de sua integração nabase de cálculo das horas extras, querde receber repercussões destacadasdestas, considerando a sua naturezaestabelecida na fonte normativa e ocaráter do pagamento comodeterminado.

Desprovejo.

Recurso da reclamada

Cargo de confiança bancária -Horas extras

Tenho como improsperáveis asrazões recursais da reclamada, datavenia, ante a robustez da motivaçãodada às r. decisões de primeiro grau,inclusive com o minudente e judiciosoexame dos fatos e provas.

De fato, não há como refutar queas funções exercidas pela reclamante

não se enquadram no § 2º do art. 224da CLT, em face da ausência de encargode direção, chefia ou equivalente, sendomesmo beneficiária a empregada dajornada reduzida e especial dosbancários de seis horas, comopretendido na exordial.

E por isso que, devidas as horasextras como deferidas, hão de sermantidas na condenação como imposta,e, por serem tutelares as normastrabalhistas aplicáveis, não se há decogitar de qualquer ajuste que a possaprejudicar nesse aspecto relativo àduração do trabalho.

Nego provimento.

CONCLUSÃO

Conheço dos recursos; quantoao apelo da reclamante, rejeito apreliminar de nulidade e nego-lheprovimento no mais; e ao da reclamadanego provimento.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes doTribunal Regional do Trabalho daTerceira Região, pela sua Quarta Turma,à unanimidade, em conhecer do recursoda reclamante; sem divergência, emrejeitar a preliminar de nulidade; nomérito, unanimemente, em negar-lheprovimento; sem divergência, emconhecer do recurso da reclamada; nomérito, unanimemente, em negar-lheprovimento.

Belo Horizonte, 24 de agosto de2005.

FERNANDO LUIZ GONÇALVES RIOSNETORelator

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TRT-00489-2005-084-03-00-0-APPubl. no “MG” de 27.10.2005

AGRAVANTES: UNIÃO FEDERAL (1)MINERAÇÃO AREIENSE S.A. (MASSA

FALIDA) (2)AGRAVADAS: AS MESMAS

EMENTA: EXECUÇÃO FISCAL -MULTAS ADMINISTRATIVAS -FALÊNCIA - FOROPRIVILEGIADO. Não obstante aFazenda Pública gozar doprivilégio de executar sua DívidaAtiva no foro da execução fiscal,no caso esta Especializada, esob o procedimento da Lei n.6.830/80, não há como seimunizar da Lei de Falências,porque, ao final, o crédito fiscaldecorrente de multasadministrativas tambémsucumbirá à ordem depagamento a ser observadapelo administrador judicial, cominevitáveis cortes das regaliasdo ente público, pois. Noutrodizer, a autonomia da execuçãofiscal não anula a preferênciados créditos de indenização poracidente do trabalho, dosfundados na relação deemprego e equiparados, dentreoutros. Frente ao juízouniversal, a União figura comocredora subquirografária, nostermos do inciso VII do art. 83da Lei n. 11.101, de 09.02.2005.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos em destaque, DECIDE-SE:

RELATÓRIO

Trata-se de recursos interpostoscontra decisão de embargos à execuçãofiscal, que exclui, da cobrança da dívida,

os juros computados após aconfirmação da sentença que decretoua falência da executada pelo Tribunalde Justiça, bem assim a própria multadecorrente da infração administrativa.

A União Federal repisa preliminarde não-admissibilidade dos embargos,por falta de pagamento das custasprocessuais. Argúi nulidade por defeitode representação processual da massafalida; e a extinção do processo, semjulgamento do mérito, por falta degarantia do juízo. Sustenta que alegislação falimentar não é aplicável àexecução fiscal, nos termos dos artigos2º, 5º e 29 da Lei n. 6.830/80. Por fim,impugna a manifestação do MinistérioPúblico Estadual (f. 87/96).

A Massa Falida da MineraçãoAreiense S.A., a seu turno, requerexclusão do encargo previsto noDecreto-lei n. 1.025/69, porquedestinado a cobrir honoráriosadvocatícios. Pede a concessão dosbenefícios da justiça gratuita e amajoração da verba honorária concedidapara patamar não inferior a 10%,conforme art. 20 do CPC (f. 100/118).

Contra-razões recíprocasproduzidas às f. 120/149 e 153/159.

A d. Procuradoria manifestou-seàs f. 174, reportando ao parecer emitidopelo Ministério Público do Estado deMinas Gerais (f. 75/81).

É o relatório.

VOTO

Conhecimento

Preliminar de intempestividadedo recurso da executada

Registra-se, de plano, que a matériaem discussão foi alçada à competênciada Justiça do Trabalho por força daEmenda à Constituição n. 45/2004.

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Assim, a tempestividade argüidahá de ser analisada à luz do artigo 508do CPC - prazo para interpor recurso deapelação de 15 dias, considerando-seainda que o trâmite processual naJustiça Comum ocorreu por ausência daVara Federal na localidade, sendo orecurso destinado ao TRF, em que há,no fim do ano, o recesso forense.

Pois bem. A executada tomouciência da decisão dos embargos em18.12.2002, conforme documento de f.99 verso, e protocolizou a apelação nodia 10.01.2003, f. 100. Observado, pois,o recesso da Justiça Federal, no períodode 20.12 a 06.01, e a conseqüentesuspensão dos prazos, deintempestividade não se pode cogitar.

Satisfeitos os pressupostos deadmissibilidade, conheço dos recursosregularmente interpostos.

MÉRITO

Agravo da União Federal

Ausência de preparo

Requer a União não sejamconhecidos os embargos, porquantonão foram pagas as custas processuais.

Ocorre que a Lei n. 9.289, de 4julho de 1996, que dispõe sobre ascustas devidas à União, na JustiçaFederal de primeiro e segundo graus, emseu art. 7º, prescreve: “A reconvenção eos embargos à execução não se sujeitamao pagamento de custas.”

Em idêntico sentido, a recentePortaria/Presi n. 1105-294, publicada noBoletim de Serviço 108, de 22 de junhode 2005: “Os Embargos à Execução,distribuídos por dependência, não estãosujeitos ao pagamento das custasiniciais e da apelação.” - caso dos autos(v. f. 47).

Provimento negado.

Ausência de pressupostoprocessual

Os documentos de f. 42, 69, 150e 151 suprem o alegado defeito derepresentação processual.

Desprovejo.

Garantia do juízo

O juízo se encontra devidamenteseguro pela penhora de f. 11 feita norosto dos autos do concurso universal.

Aliás, outra não seria a solução,uma vez decretada a quebra, e todosos bens arrecadados ao juízo falimentar.

Nesse sentido, a Súmula n. 44do extinto Tribunal Federal de Recursos:

Ajuizada a execução fiscalanteriormente à falência, compenhora realizada antes desta,não ficam os bens penhoradossujeitos a arrecadação do juízofalimentar; proposta a execuçãofiscal contra a massa falida, apenhora far-se-á no rosto dosautos do processo da quebra,citando-se o síndico.

E decisão do STF: RE 92.488, 1ªT., Rel. Cunha Peixoto, ac. de 11.11.1980:

...não viola a lei, pois não impedeo curso do executivo, quecontinua em seu andamentonormal, recebendo a FazendaPública, no final,prioritariamente, do resultado daliquidação da Massa.De outro modo, impossível setornaria a atuação do juízo dafalência, cuja unidade seriadesfeita com séries de penhoras,em bens por ela já arrecadados.

Nada a modificar.

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Intervenção do MinistérioPúblico

Não há consenso acerca danecessidade ou não da atuação doMinistério Público como custos legis nasexecuções fiscais.

A corrente majoritária posiciona-se pela dispensa da atuação, por não seconsiderarem incluídas entre as causasde interesse público as que somenterefletem interesses patrimoniais daFazenda, defendidos em juízo por seusprocuradores especialmente habilitados.

No caso, porém, de execuçãofiscal contra massa falida, ressaltaHumberto Theodoro - Lei de execuçãofiscal, comentários e jurisprudência, 9.ed. 2004, f. 156, que o TJSP temdecidido pela obrigatoriedade daintervenção do Ministério Público, nãopela natureza tributária da obrigação,mas pelo interesse público que envolvetodo o processo concursal.

Destarte, seja ou não essencial,a manifestação do Ministério Público (f.75/81) não acarreta prejuízo algum aquaisquer das partes, mormente àpessoa jurídica de direito públicointerno, que contra tanto se rebela.

Provimento negado.

Multa administrativa - Juros demora

O juiz sentenciante deuprovimento parcial ao recurso paraexcluir da cobrança da dívida os juroscomputados após a confirmação dasentença que decretou a falência peloEg. Tribunal de Justiça deste Estado ea multa decorrente da infraçãoadministrativa (f. 85).

Ora, se a dívida decorreunicamente da multa administrativa, naverdade, declarou-se a inexigibilidadedo título executivo.

Assim, a questão posta areexame consiste em definir se a UniãoFederal pode ou não cobrar, autônomae judicialmente, das empresas falidascrédito inscrito na Dívida Ativa referentea multas administrativas por infração àsleis trabalhistas.

Estou certo que sim: o créditofiscal goza da garantia de não participarde concurso de credores.

A teor do artigo 29 da Lei n.6.830/80, a Fazenda Pública, paracobrar a dívida ativa, não se sujeita “aconcurso de credores ou habilitação emfalência, concordata, l iquidação,inventário ou arrolamento”.

O art. 5º da mesma Lei assimdispõe:

A competência para processar ejulgar a execução da Dívida Ativada Fazenda Pública exclui a dequalquer outro Juízo, inclusive oda falência, da concordata, daliquidação, da insolvência ou doinventário.

A preocupação maior dessanorma, conforme escólio de HumbertoTheodoro Júnior - ob. citada, p. 67,

foi a de libertar a FazendaPública da sujeição a todo equalquer juízo universal oucoletivo. Assim, uma vezdeterminada a competência,pela legislação ordinária, para aexecução fiscal, esse foro torna-se o único e o exclusivo daFazenda Pública. Ainda que odevedor venha a falecer, a cairem falência, insolvência ouliquidação, continuará a Fazendacom o privilégio de executar suaDívida Ativa no foro da execuçãofiscal, e sob o procedimento daLei n. 6.830, sem sujeição ao

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juízo universal eventualmenteinstaurado. Dessarte, aexistência de procedimentoadministrativo de liquidaçãoextrajudicial não impede ainstauração de execução fiscalnem acarreta a suspensão daque já estiver em curso contra aempresa insolvente.(STJ, 1ª T., Resp 191.104-SC,Rel. Min. Garcia Vieira, ac. de14.12.1998, DJU 29.mar.1999, p.101)

[...]No entanto, é bom notar

que a execução fiscal, emboranão fique paralisada pordecorrência da quebra dodevedor, não pode ir até aentrega do produto daarrematação à Fazendaexeqüente. E que “os créditosfiscais não estão sujeitos ahabilitação no juízo falimentar,mas não se livram declassificação, para disputa depreferência com créditostrabalhistas (Decreto-lei n.7.661/45, art. 126). Na execuçãofiscal contra falido, o dinheiroresultante da alienação de benspenhorados deve ser entregueao juízo da falência, para que seincorpore ao monte e sejadistribuído, observadas aspreferências e as forças damassa.(STJ, 1ª T., Resp 84.844-MS, Rel.Min. Humberto Gomes deBarros, ac. de 22.02.1996, DJU8.abr.1996, p. 10459)

Por outro lado, se a execuçãofiscal tiver início após a decretação daquebra, a penhora não poderá incidirsobre bem arrecadado no juízouniversal. Deverá ser feita “no rosto dos

autos” do concurso universal (STJ, 2ªSeção, comp 11.958-8-RJ, Rel. Min.Nilson Naves, ac. de 29.03.1995, RSTJ,79:145. No mesmo sentido: TJMG, Ap20.569-0, Rel. Des. Monteiro de Barros,ac. de 01.12.1994, DJMG, 23 maio 1995,p. 2).

Nada altera o fato de a dívidadecorrer de multa administrativa, d.m.v.A nova Lei de Falências, sancionada nadata de 09 de fevereiro de 2005, em vigordesde 09 de junho de 2005, encerraqualquer dúvida acaso existente.

Preleciona Fábio Ulhoa Coelho- Comentários à nova Lei de Falênciase de recuperação de empresas (Lei n.11.101, de 09.02.2005), Ed. Saraiva, 2.ed. p. 222, que

a União, os Estados, o DistritoFederal, os Territórios, osMunicípios e as autarquias(fundacionais ou corporativas)podem inscrever na dívidaqualquer crédito que titularizem,tributários ou não tributários.Note-se que, para fins deaparelhamento da execuçãofiscal, é irrelevante a natureza docrédito do Estado. Uma vezinscrito na dívida ativa, pode-sepromover a execução contra ocontribuinte que não pagou oimposto (crédito tributário fiscal)e contra o motorista responsávelpelo acidente de trânsito quedanificou veículo do Estado(crédito fiscal não tributário).

Cabe ressaltar apenas a ordemdos pagamentos, anotada pelo referidoautor - obra e f. citadas:

O administrador judicialnão deve pagar na classe doscréditos fiscais, mesmo queinscrito na dívida ativa, o valor

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correspondente a penaspecuniárias por infraçãoadministrativa ou desrespeito àlei penal impostas por autoridadefederal, estadual ou municipal,inclusive as multas tributárias.

Esse crédito não goza damesma preferência do principaldevido ao Fisco. Tem, naverdade, natureza de créditosubquirografário. Seupagamento só prefere aoscredores subordinados e, assim,eles devem ser atendidos apósa satisfação dos quirografários eem concurso com o devido peloempresário individual ousociedade empresária comfalência decretada, em razão decláusula penal.

Nesse cume da decisão, tem-seo apontamento do também professorFábio Ulhoa Coelho - ob. citada, p. 229:

A razão de ser dessedesdobramento do crédito emduas classes é fácil de entender.

[...] não seria justo deixarde atender à maioria doscredores (excetuam-se dessetratamento apenas ossubordinados) em razão de seconsumirem recursos da massano pagamento desse gênero deobrigação. Equivaleria, numcerto sentido, a transferir para acomunidade de credores asconseqüências da il icitudeperpetrada pelo devedor. Isso,principalmente quando se tratade pena pecuniária por infraçãoà lei penal, agride frontalmenteos valores sociais cultivados pelaorganização democrática, queimpedem seja a sançãosuportada.

Os créditos derivados de multaou pena pecuniária constituídos emrazão da falência é que não sãoreclamáveis, o que, em absoluto, não éo que se tem aqui.

Por todo o exposto, conclui-seque, não obstante a Fazenda Públicagozar do privilégio de executar sua DívidaAtiva no foro da execução fiscal, no casoesta Especializada, e sob o procedimentoda Lei n. 6.830/80, não há como seimunizar da Lei de Falências, porque, aofinal, o crédito fiscal também sucumbirá àordem de classificação ditada pelo artigo83 da Lei n. 11.101/2005, com inevitáveiscortes das regalias do ente público, pois.

Daí por que entendo perfeita adecisão quanto aos juros de mora. Adecretação da falência suspende afluência dos juros, legais ou contratuais.Somente os vencidos até a data dasentença de quebra somam-se aoprincipal do crédito (art. 124 da vigenteLei de Falências).

Provejo o recurso, para determinaro prosseguimento da execução, oficiando-se ao juízo universal a fim de que, apóssatisfeitos os credores com preferênciamaior, o saldo acaso existente sejacolocado à disposição desse juízo, paraa realização do crédito tributário.

Agravo da executada

Honorários advocatícios -Custas

Não prospera o inconformismoda executada contra o encargo de 20%incluído na dívida, conforme artigo 1º doDecreto-lei n. 1.025/69.

Isso porque a massa falidasucumbe ao pagamento de honoráriosde advogados e custas processuais sim,finalidade do encargo combatido.Principalmente na execução fiscal,autônoma.

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Por fim, não vinga o pedido demajoração dos honorários devidos pelaUnião, uma vez fixados conforme aregra do § 4º do artigo 20 do CPC.

Nada a modificar.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes doTribunal Regional do Trabalho daTerceira Região, pela sua Sexta Turma,à unanimidade, em rejeitar a preliminarde intempestividade do recurso daexecutada e em conhecer de ambos osagravos; no mérito, sem divergência, emdar provimento parcial ao da União-exeqüente para determinar oprosseguimento da execução, oficiando-se ao juízo universal a fim de que, apóssatisfeitos os credores com preferênciamaior, o saldo acaso existente sejacolocado à disposição desse juízo, paraa realização do crédito tributário; aindasem divergência, ao apelo daexecutada, em negar-lhe provimento.

Belo Horizonte, 17 de outubro de2005.

FERNANDO ANTÔNIO VIÉGASPEIXOTO

Relator

TRT-01113-2005-050-03-00-5-ROPubl. no “MG” de 16.12.2005

RECORRENTE: FUNDAÇÃOEDUCACIONAL LUCASMACHADO - FELUMA

RECORRIDO: ANTÔNIO DE PÁDUARIBEIRO

EMENTA: HORAS DESOBREAVISO - USO DECELULAR E DE BIP -CONFIGURAÇÃO DO DIREITO.

A toda a prova, por analogia, oTST serviu-se do § 2º do art. 244da CLT para estruturar a OJ n.49 da SDI-I - o que, sem dúvida,tornou-se de todojuridicamente correto. Naanalogia, com efeito, “afirma-seque um modelo (paradigma,exemplum) tem certascaracterísticas; depois, que umoutro fato tem característicasiguais. Depois, que o modelotem uma outra ou outrascaracterísticas, concluindo-seque essa outra (outras)pertence, também, ao outrofato, ou seja, constatando-seque dois fatos ou objetos têmcaracterísticas comuns e queum deles tem outra ou outrascaracterísticas, infere-se que osegundo tem, também, essasoutras características. Trata-sede uma proporção, a partir daqual se extrai uma conclusãoprovável” (SALGADO, JoaquimCarlos. In Revista brasileira deestudos políticos, n. 91, p. 46 -BH/MG). Sobressai, a todaevidência, na presenteanalogia, que, do § 2º do art. 244da CLT (paradigma) para com aOJ n. 49, caracteristicamente,entram em cena a liberdade egarantia do fácil acesso doempregador ao empregado,fora do horário de trabalhodeste, facilitando ao primeiro acondição de convocar e tornarpresente o segundo, sempreque precisar. Acontece, porém,que, em 20.03.44 (data dapromulgação do Decreto-lei n.6.353 - que deu origem ao fatoparadigmático da edição da OJn. 49), devido à insuficiênciados meios de

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telecomunicações, tal condiçãode acesso tornava-se viável,apenas, através de telégrafo outelefone, ambos localmentefixos - o que acaba por explicara exigência de o empregado“permanecer, em sua própriacasa, aguardando, a qualquermomento, o chamado para oserviço”. Nos tempos atuais,porém, torna-se de todoinexplicável que, para aconfiguração do direito àshoras de sobreaviso, oempregado tenha quepermanecer, em suaresidência, aguardando ordens- quando estas, por meio detelefonia móvel (telemóveis),podem ser ordenadas por igualou até mais apurado meio deconvocação (sobretudo, casocircunstancialmente o próprioempregado tenha condições depermanecer, em residência oulocais alheios, ainda maispróximos de seu local detrabalho). Preservadas, pois, ascaracterísticas básicas dadisponibilidade do empregadoe da plena condição de suaconvocação, pelo empregador,entre os dois institutos,atualmente, tem-se comoinexplicável e totalmentedesprezível a condição deantanho, de obrigar oempregado a permanecer, emsua residência, para verconfigurado seu direito àshoras extras de sobreaviso -sobretudo, no presente caso(em que, além de obrigado aouso do celular, não podiaausentar-se dos limites de umapequena cidade do interior deMinas Gerais).

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso ordinário,interposto de decisão do MM. Juiz daVara do Trabalho de Bom Despacho, emque figuram: como recorrente,FUNDAÇÃO EDUCACIONAL LUCASMACHADO - FELUMA; como recorrido,ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO.

RELATÓRIO

O MM. Juiz da Vara do Trabalhode Bom Despacho, pela r. sentença def. 137/145, cujo relatório adoto, declaroua ilegitimidade passiva da reclamadaFaculdade de Ciências Médicas deMinas Gerais e julgou procedente, emparte, o pedido, para condenar areclamada FELUMA a pagar aoreclamante horas de sobreaviso ereflexos, conforme especificado nodispositivo de f. 144/145.

Inconformada, a primeirareclamada interpôs recurso ordinário (f.147/149), alegando que não sãodevidas as horas de sobreavisodeferidas, porque o reclamante tinhaliberdade de locomoção, como informoua prova testemunhal.

Comprovantes de recolhimentodo depósito recursal e pagamento dascustas às f. 150/151.

O reclamante apresentou contra-razões, pugnando pelo desprovimentodo recurso e pela condenação dareclamada ao pagamento de multa porlitigação de má-fé.

Tudo visto e examinado.

VOTO

Admissibilidade

Conheço do recurso, uma vezsatisfeitos todos os pressupostos de suaadmissibilidade, recebendo-o no efeitomeramente devolutivo.

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Conheço também das contra-razões, tempestivas e subscritas porprocuradora regularmente constituída (f.63).

Mérito

Insurge-se a recorrente contra acondenação ao pagamento das horasde sobreaviso pleiteadas.

Sem razão, data venia.Os depoimentos prestados pelas

testemunhas do reclamante, Márcio LuizPereira e Rosimar Leles dos Santos,revelam que o recorrido e a empregadaLilianete Maria Gontijo exerciam amesma função, na Santa Casa de BomDespacho, sendo operadores deaparelho de Raios X; enquanto elatrabalhava de manhã, ele prestavaserviços, na parte da tarde; havia,também, escalas de plantão, para osperíodos noturnos e finais de semana -oportunidade em que ambos eramconvocados, se necessário, por telefonefixo ou celular, a pedido dos médicos; apessoa que estava de sobreaviso nãotinha obrigação de permanecer, em suaresidência, aguardando ser chamada,havendo restrição, apenas, quanto aviagens (f. 75/76).

De tais informações conclui-seque o reclamante não era obrigado apermanecer, em sua casa, aguardando,a qualquer momento, o chamado parao serviço.

O fato de portar telefone celularé suficiente para lhe conferir o direito arecebimento do salário normal, à razãode 1/3, como pretendido.

Nesta parte, data venia, decidiu,acertadamente, a r. decisão recorrida -o que transparece do item 2.5, de f. 141/143 (sobretudo, quando, à f. 143,ressalta que “o sobreaviso é instituto deconstrução analógica do § 2º do art. 244da CLT, aplicável ao presente caso”).

A toda a prova, por analogia, oTST serviu-se do § 2º do art. 244 da CLTpara estruturar a OJ n. 49 da SDI-I - oque, sem dúvida, tornou-se de todojuridicamente correto.

Na analogia, com efeito,

afirma-se que um modelo(paradigma, exemplum) temcertas características; depois,que um outro fato temcaracterísticas iguais.Depois, que o modelo tem umaoutra ou outras características,concluindo-se que essa outra(outras) pertence, também, aooutro fato, ou seja, constatando-se que dois fatos ou objetos têmcaracterísticas comuns e que umdeles tem outra ou outrascaracterísticas, infere-se que osegundo tem, também, essasoutras características. Trata-sede uma proporção, a partir daqual se extrai uma conclusãoprovável.(SALGADO, Joaquim Carlos. InRevista brasileira de estudospolíticos, n. 91, p. 46 - BH/MG)

Sobressai, a toda evidência, napresente analogia, que, do § 2º do art.244 da CLT (paradigma) para com a OJn. 49, caracteristicamente, entram emcena a liberdade e garantia do fácilacesso do empregador ao empregado,fora do horário de trabalho deste,facilitando ao primeiro a condição deconvocar e tornar presente o segundo,sempre que precisar.

Acontece, porém, que, em20.03.44 (data da promulgação doDecreto-lei n. 6.353 - que deu origemao fato paradigmático da edição da OJn. 49), devido à insuficiência dos meiosde telecomunicações, tal condição deacesso tornava-se viável, apenas,

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através de telégrafo ou telefone, amboslocalmente fixos - o que acaba porexplicar a exigência de o empregado“permanecer, em sua própria casa,aguardando, a qualquer momento, ochamado para o serviço”.

Nos tempos atuais, porém, torna-se de todo inexplicável que, para aconfiguração do direito às horas desobreaviso, o empregado tenha quepermanecer, em sua residência,aguardando ordens - quando estas, pormeio de telefonia móvel (telemóveis),podem ser ordenadas por igual ou atémais apurado meio de convocação(sobretudo, caso circunstancialmente opróprio empregado tenha condição depermanecer, em residência ou locaisalheios, ainda mais próximos de seulocal de trabalho).

Preservadas, pois, ascaracterísticas básicas dadisponibilidade do empregado e daplena condição de sua convocação, peloempregador, entre os dois institutos,atualmente, tem-se como inexplicável etotalmente desprezível a condição deantanho, de obrigar o empregado apermanecer, em sua residência, paraver configurado seu direito às horasextras de sobreaviso - sobretudo, nopresente caso (em que, além deobrigado ao uso do celular, não podiaausentar-se dos limites de uma pequenacidade do interior de Minas Gerais).

Nego provimento ao apelo.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes doTribunal Regional do Trabalho daTerceira Região, pela sua PrimeiraTurma, preliminarmente, àunanimidade, em conhecer do recurso;no mérito, por maioria de votos, emnegar-lhe provimento, vencido o Ex.mo

Juiz Relator, que absolvia a primeira

reclamada de toda a condenação quelhe fora imposta.

Belo Horizonte, 12 de dezembrode 2005.

MANUEL CÂNDIDO RODRIGUESRedator

TRT-00401-2005-075-03-00-9-ROPubl. no “MG” de 21.10.2005

RECORRENTES: 1) SILVEIRAPRODUÇÕES E PUBLICIDADESLTDA.2) GIMENE DOS SANTOSGALVÃO

RECORRIDAS: AS MESMAS

EMENTA: HORAS EXTRAS -FUNÇÃO DE CONFIANÇACARACTERIZADA, PORÉMCOM ESTRITO CONTROLE DEHORÁRIOS DE TRABALHO -CABIMENTO. Ainda que oempregado exerça cargo dedireção, com importantespoderes na empresa, aexistência de controle efiscalização estritos dejornada afasta a possibilidadede aplicação do inciso II doart. 62 da CLT. O preceito legalnão criou discriminação (queseria, de todo modo,inconstitucional), mas simplespresunção de que, sendocargo de elevada confiança,torna-se incompatível estritocontrole e fiscalização sobreo horário do dirigente.Comprovada situação fáticadiametralmente oposta, incidea imperativa regra do incisoXIII do art. 7º da CF/88.

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Vistos os autos, relatados ediscutidos os presentes recursosordinário e adesivo interpostos contradecisão proferida pelo MM. Juízo da 1ªVara do Trabalho de Pouso Alegre, emque figuram, como recorrentes,SILVEIRA PRODUÇÕES EPUBLICIDADES LTDA. e GIMENE DOSSANTOS GALVÃO e, como recorridas,AS MESMAS.

1 - RELATÓRIO

O MM. Juízo da 1ª Vara doTrabalho de Pouso Alegre, pela sentençade f. 124/128, julgou parcialmenteprocedentes os pedidos relativos àpresente ação trabalhista, condenandoa reclamada a pagar à reclamante asparcelas de férias proporcionais + 1/3,13º salário proporcional, salários dosperíodos de 25.04.03 a 30.06.03 e deoutubro/03 a dezembro/04, comissõesno importe de 30% sobre vendas/reflexose indenização por danos morais noimporte de R$6.000,00.

Ambas as partes recorrem dadecisão.

A reclamada interpõe recursoordinário, às f. 129/143, insurgindo-secontra o deferimento dos salários e dascomissões, indenização por danosmorais e o indeferimento da multa porlitigação de má-fé.

A reclamante interpõe recursoadesivo, às f. 162/179, insurgindo-secontra o valor arbitrado para aindenização dos danos morais e oindeferimento das horas extras, multasdos arts. 467 e 477 da CLT e porlitigação de má-fé.

Contra-razões recíprocas, às f.147/161 e 181/185.

Custas processuais e depósitorecursal, às f. 144/145.

Dispensada a manifestação doMinistério Público do Trabalho, por não

se vislumbrarem, neste processo,interesse público a proteger, ou mesmoquaisquer das hipóteses previstas noartigo 82 do Regimento Interno desteTribunal.

É o relatório.

2 - ADMISSIBILIDADE

Conhece-se dos recursosordinário e adesivo interpostos, própriose tempestivos.

3 - FUNDAMENTOS

3.1 - Recurso da reclamada

3.1.1 - Salários dos períodosde 25.04.03 a 30.06.03 e de outubro/03 a dezembro/04

Insurge-se a recorrente contra odeferimento dos salários dos períodosde 25.04.03 a 30.06.03 e de outubro/03a dezembro/04, aduzindo ser impossíveluma pessoa trabalhar por mais de doisanos sem a paga dos salários devidos.Sustenta não haver, na empresa,nenhum empregado que tivesse ossalários retidos ou não pagos, muitomenos a recorrida, que era a diretoraadministrativa e responsável pelopagamento e encaminhamento dosholerites de todos os empregados aoescritório de contabilidade; que o art.359 do CPC não tem aplicabilidade nopresente caso, porque a recorrida reteveem seu poder os recibos de pagamento,bem como outros documentos de sumaimportância para a empresa; que, aotomar conhecimento desta açãotrabalhista, a recorrente solicitou aoescritório de contabilidade os recibossalariais da recorrida, relativos a todo opacto laboral, sendo-lhe fornecidosapenas os dos meses de julho/agosto/setembro/03 e janeiro/05 e os dos 13º

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salários de 2003 e 2004, porque osdemais não haviam sido encaminhadospara o escritório; que o fato foi objetode boletim de ocorrência policial,processo de sindicância interna enotificação judicial, para que a recorridaos devolvesse, sendo manifesta a suamá-fé ao pleitear a aplicação do art. 359do CPC, quando tinha certeza de que aempregadora não teria os referidosdocumentos para apresentar.

Sustentando não ter havidonenhuma irregularidade quanto aopagamento de salários, comprovada,inclusive, pela fiscalização do Ministériodo Trabalho ocorrida em abril/04, pleiteiaa reforma da decisão, para excluir dacondenação o pagamento de saláriossupostamente retidos.

Assiste-lhe razão.Na inicial, a autora alegou que,

durante todo o pacto laboral (de abril/03 a fevereiro/05), só recebera ossalários dos meses de julho/agosto/setembro de 2003 e janeiro de 2005.Invocando o art. 464 da CLT, requereua exibição dos recibos de pagamento desalários, sob as penas do art. 359 doCPC (f. 04/07).

Em defesa, a reclamadasustentou a mesma tese exposta nestasrazões recursais: que a reclamante,como diretora administrativa eresponsável pela documentação relativaaos empregados, inclusive pelaremessa dos documentos ao escritóriode contabilidade, reteve em seu poderos recibos de pagamento dos mesesmencionados como não pagos, sendoo fato objeto de boletim de ocorrência,processo de sindicância interna enotificação judicial (f. 36/42).

Na r. sentença, o i. julgador a quomanifestou o entendimento de ter ficadosuficientemente claro que ambas aspartes não trouxeram aos autos toda arealidade que as envolveu e que, em

sendo assim, cumpria observar asformalidades que a lei impõe (videfundamentação, f. 125). No caso, comoo pagamento de salários se provamediante recibo (art. 464 da CLT) eestes não foram apresentados, deferiuà reclamante os salários de todo operíodo pleiteado - 25.04.03 a 30.06.03(sem registro na CTPS) e de outubro/03 a dezembro/04.

Diverge-se, data venia, doentendimento adotado na instância deorigem.

Ao discorrer sobre o princípio darazoabilidade, este relator já expôs emuma de suas obras que:

...as condutas humanasdevem ser avaliadas segundoum critério associativo deverossimilhança, sensatez eponderação. Não apenasverossimilhança, viabilidadeaparente, probabilidade média;mas também, ao mesmo tempo,sensatez, prudência,ponderação.

Há, como se vê, um clarocomando positivo no princípio darazoabilidade: ele determina quese obedeça a um juízo tanto deverossimilhança como tambémde ponderação, sensatez eprudência na avaliação dascondutas das pessoas.

Há, por outro lado, umindubitável comando negativo nomesmo princípio: ele sugere quese tenha incredulidade,ceticismo quanto a condutasinverossímeis, assim como notocante a condutas que, emboraverossímeis, mostrem-seinsensatas.(Princípios de direito individual ecoletivo do trabalho, 2. ed. LTr,p. 188)

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Esse comando negativo é o quese capta dos autos, por ser inverossímilque a diretora administrativa de umaempresa, responsável pelo pagamentode salários de todos os empregados,deixasse de providenciar o pagamentodos seus próprios salários durante 18meses, no curso de um contrato detrabalho que teve duração de apenas22 meses (de 25.04.03 a 10.02.05).

Há outra incongruência napetição inicial, indicativa da ausência derazoabilidade: a autora pleiteou opagamento de 18 meses de saláriosretidos, mas, curiosamente, não alegoufalta de pagamento das férias. Nesseaspecto específico, informou que “tevesuas férias indenizadas na rescisão,tendo a reclamar apenas as fériasproporcionais de 02/12 acrescidas doterço constitucional, referente aoperíodo que laborou sem registro” (f. 08).No TRCT, todavia, só foram indenizadas08/12 de férias proporcionais (f. 29),ficando claro que as férias normais deum período foram corretamente pagasno curso do pacto laboral. Ora, nãoparece crível que não recebessesalários durante a prestação normal deserviços, mas os auferisse normalmentequando estava de férias e, portanto, semprestação laboral efetiva.

A par de não razoável apretensão, os elementos de provatrazidos com a defesa tornam plausívela tese sustentada pela reclamada/recorrente, senão vejamos:

Após ajuizada esta ação, e nãoencontrando a reclamada, no escritóriode contabilidade, os recibos de saláriosrelativos aos meses pleiteados nainicial, registrou um boletim deocorrência, em 16.03.05, denunciandoa constatação da falta de uma pasta decor preta contendo documentosconfidenciais e pessoais da empresa (f.

57). Na mesma data, instaurou umprocedimento de sindicância interna,constatando a existência de váriosdocumentos na sala da administraçãoocupada pela autora, que deveriam tersido encaminhados para aContabilidade e lançados nos “caixas”correspondentes (f. 58/59).

O documento de f. 64/68, por suavez, comprova a notificação feita noJuízo Cível, relativa à suspeita desubtração de vários documentoscontábeis, além de uma pasta contendodocumentação confidencial e fiscal dareclamada. E os depoimentos colhidosno inquérito realizado na 13ª DelegaciaRegional de Polícia Civil de PousoAlegre foram unânimes no sentido deque a reclamante, quando trabalhava naAdministração da TV Libertas(reclamada), era a responsável por todaa documentação e pelo envio desta àContabilidade, além de mencionaremuma representação criminal do Sr.Landulpho (sócio-diretor) contra aautora e de confirmarem a ausência dosdocumentos denunciados no BO econstatados na sindicância interna (f.74/77).

Não olvida ser eminentementedocumental a prova de pagamento desalários, representada pelos recibos depagamento. Todavia, e ainda que osautos não noticiem o resultado doinquérito policial e da representaçãocriminal mencionada nos depoimentosprestados na 13ª DP, há prova suficientenos autos de que a reclamada/recorrente ficou impossibilitada deentregar os recibos salariais na formarequerida na inicial, o que afasta apossibilidade de aplicação pura esimples do art. 464 da CLT, renovadavênia.

Registre-se, por relevante, quenenhuma das testemunhas ouvidas arogo da autora mencionou a ausência

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de pagamento de salários, enquantoaquela ouvida a pedido da reclamada,Sr. Cláudio Nogueira Alves, informou“...que ninguém nunca ficou semreceber; que a reclamante nuncacomentou que estava sem recebersalários” (f. 115).

Registre-se, por fim, que ainspeção realizada pelo Ministério doTrabalho na empresa, no período de 05a 22.04.04, não constatou nenhumairregularidade quanto à retenção desalários, o que reforça a tese sustentadana contestação. Nesse tocante, a únicairregularidade constatada foi a não-concessão de aumento salarial previstoem acordo coletivo, que foi sanadanaquela ação fiscal, com o pagamentodas diferenças e recolhimentos doFGTS (f. 118/119).

O conjunto probatório, portanto,aliado à ausência de razoabilidade eracionalidade, não autoriza odeferimento dos salários pleiteados nainicial. Não obstante a existência de umaformalidade legalmente prevista (provado pagamento de salários medianteapresentação de recibos, art. 464 daCLT), não pode olvidar que o Direito é,antes de tudo, instrumento de justiça.

Nesses termos, dá-seprovimento ao recurso, no particular,para excluir da condenação opagamento dos salários dos períodos de25.04.03 a 30.06.03 e de outubro/03 adezembro/04.

3.1.2 - Das comissões de 30%sobre vendas e seus respectivosreflexos

Alega a recorrente que ascomissões sobre as vendaseventualmente efetuadas foram pagas,sendo certo que o percentual incidentesobre as vendas era de 20% e não de

30%; que, tratando-se de vendaseventuais, não cabe falar-se em reflexosdas comissões em outras parcelas.

Não lhe assiste razão.O pedido de comissões,

conquanto referido na defesa, não foiobjeto de impugnação específica, comose observa do tópico “b”, às f. 41/42. Nãobastasse, a realização de vendas ficoudevidamente comprovada, seja peloscontratos de veiculação de apoiocultural juntados com a petição inicial(f. 17/23), seja pelas declarações dapreposta: “...que, à vista dosdocumentos de f. 17 e seguintes dainicial, acredita que a reclamanterecebia comissão de vendas, pois osoutros funcionários que vendiamrecebiam...” (f. 113).

Fica mantida, pois, acondenação ao pagamento dascomissões, observados os parâmetrosdefinidos na r. sentença. Os reflexos sãodevidos, por habituais as vendas no anode 2004.

Mantém-se a decisão.

3.1.3 - Da indenização pordanos morais

Aduz a recorrente ter impugnadoos fatos que ensejaram o pleito dedanos morais, por não seremverdadeiras as alegações de ofensafísica e moral. Alega nunca ter chamadoa autora de prostituta, tampoucoimplicado com as vestimentas dos seusempregados, mormente da recorrida,que era o cartão de visitas da empresa;que, ao contrário do sustentado nainicial, solicitou à autora apenas osextratos bancários e os talões decheques, para conferência de rotina,tendo esta alterado o seu estadoemocional e discutido com o sócio daempresa; que as agressões físicas nãoficaram comprovadas, por não haver

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nos autos boletim de ocorrência nemexame de corpo de delito, sendo certoque até o exame médico demissionaljuntado pela recorrida não menciona osefeitos da agressão (olho roxo,hematomas no braço e antebraço),justamente por serem falsas asalegações; que não agiu com dolo ouculpa que a obrigasse à reparação dedanos.

Tece considerações acerca daresponsabilidade civil e do princípio donão-enriquecimento sem causa; alegaa existência de uma indústria do danomoral e pleiteia que se exclua dacondenação a indenização por danosmorais ou, no mínimo, a redução dovalor arbitrado.

Não lhe assiste razão.Os fatos narrados na inicial -

injusta agressão moral e física, em facedo uso de saia curta (“roupa de prostitutae vagabunda”), por ocasião da visita doPrefeito à emissora de TV - foramcomprovados na prova oral colhida nosautos.

Declarou a testemunha LuizHenrique de Lima Gonçalves que:“...que não presenciou a agressão, masouviu o Sr. Landulpho chamando areclamante de prostituta e vagabundae desconhece o motivo; que a conversaposterior entre os colegas era que a saiada autora gerara a confusão; que a saiaera normal; que após a discussão viuque a reclamante estava com o rosto eo braço vermelho, chorando e abalada;que ouviu um comentário geral sobre adiscussão...” (f. 115).

Ora, tanto a higidez física comoa mental, inclusive emocional, do serhumano são bens fundamentais de suavida, privada e pública, de suaintimidade, de sua auto-estima eafirmação social e, nesta medida,também de sua honra. São bens,portanto, inquestionavelmente

tutelados, regra geral, pela Constituição(artigo 5º, V e X). Agredidos em face decircunstâncias laborativas, passam amerecer tutela ainda mais forte eespecífica da Carta Magna, que seagrega à genérica anterior (inciso XXVIIIdo artigo 7º da CF/88).

Evidenciada a conduta ilícita dareclamada e o prejuízo subjetivo daempregada, cabível a reparaçãopecuniária (arts. 186 e 927 do CC), cujoescopo é o de amenizar o sofrimentocausado à obreira, bem como opedagógico/punitivo ao agentecausador do dano.

Irreparável, pois, a r. sentença noaspecto, inclusive quanto ao valorarbitrado.

Nega-se provimento.

3.1.4 - Da litigação de má-fé

Sustenta a recorrente saltar aosolhos a má-fé da recorrida, ao pleitearsalários retidos invocando o art. 359 doCPC, quando havia subtraído os reciboscorrespondentes; que a própria inicialindica o exercício da função de diretoraadministrativa, responsável, portanto,pelo pagamento de todos osempregados, não sendo crível que aempresa efetuasse o pagamento detodos eles e retivesse apenas os de suaprópria diretora; que a rescisão docontrato de trabalho foi homologadaperante o Ministério do Trabalho, semnenhuma ressalva quanto à ausência desalários durante dois anos; que asubtração de documentos da empresa,o fornecimento de dados incorretos aojuízo e o pedido de verbas indevidasatraem a aplicação dos arts. 14, I e 17,II, do CPC, aptos a ensejar a aplicaçãoda multa por litigação de má-fé.

Sem razão.Ao pleitear as parcelas

mencionadas na inicial, valeu-se a

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autora, tão-somente, do direito de açãoque lhe é constitucionalmente garantido(inciso XXXV do art. 5º da CF/88).

Esclareça-se que a reforma dasentença no tocante aos salários retidosdeveu-se à constatação de que a orarecorrente ficou impossibilitada deapresentar os recibos salariais,demonstrada através de documentos(BO, sindicância interna, inquéritopolicial), conforme analisado no tópico3.1.1.

A existência de tais documentos,todavia, não implica o reconhecimentode culpa da recorrida, mesmo porque,como dito alhures, os autos não noticiamo resultado do inquérito e darepresentação criminal mencionada nosdepoimentos prestados na 13ª DP, paraque se possa considerar a reclamante,pelos motivos invocados nestas razõesrecursais, como litigante de má-fé.

Nega-se provimento.

3.1.5 - Expedição de ofício aoMinistério Público - Crime de falsotestemunho

A recorrente pleiteia a expediçãode ofício ao Ministério Público, parainstauração de inquérito/apuração docrime de falso testemunho cometidopela testemunha Jean Carlos daConceição Fernandes.

Nesse particular, a recorrentecarece de interesse recursal, porquantoa providência já foi determinada pelo i.julgador a quo quando da prolação dasentença (f. 128).

3.2 - Recurso adesivo dareclamante

3.2.1 - Das horas extras

Sustenta a recorrente, emsíntese, que a sujeição a uma jornada

de trabalho expressamente consignadana CTPS exclui a incidência do inciso IIdo art. 62 da CLT, mormente porque asfunções exercidas (diretoraadministrativa e diretora deprogramação) não lhe conferiampoderes de gestão da empresa.

Cita trechos dos depoimentos epleiteia a reforma da decisão, paraacrescer à condenação as horas extrase reflexos.

Assiste-lhe razão.Para excluir horas

extraordinárias com base no inciso II doartigo 62 da CLT, a alegação doexercício de função de confiança deveser comprovada, demonstrando que oempregado tem desempenho funcionalcom poderes de gestão da empresa(Súmula n. 287 do TST) e, ainda, quereceba acréscimo salarial igual ousuperior a 40% do salário do cargoefetivo.

A CLT, no entanto, cria apenasuma presunção jurídica - a de que oempregado não está submetido, nocotidiano laboral, à fiscalização e aocontrole de horário, não se sujeitando,pois, à regência das regras sobrejornada de trabalho. Desse modo,havendo prova firme de que ocorriaefetiva fiscalização e controle sobre ocotidiano da prestação laboral, fixandofronteiras claras à jornada laborada,afasta-se a presunção legal instituída,incidindo o conjunto das regrasclássicas concernentes à duração dotrabalho.

No caso específico dos autos, astestemunhas ouvidas a rogo dareclamada mencionaram algunspoderes de gestão, tais como:responder pela administração daempresa, inclusive pelo pagamento detodos os empregados; pagamento dedespesas com seus próprios cheques,para posterior reembolso; contratação

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e dispensa de empregados, bem comofixação de salários; guarda dos talõesde cheques da reclamada;responsabilidade por todos os tipos depagamento, inclusive com chequespróprios (Cláudio Nogueira Alves eLucas da Silveira, f. 115/116).

Ocorre que, não obstante adenominação do cargo ocupado(diretora administrativa) e as atividadesexercidas, a recorrente não percebianenhuma gratif icação de função,requisito legalmente exigido para aconfiguração do cargo de confiança(parágrafo único do art. 62 da CLT), oque, por si só, exclui o tipo aventadopelo inciso II do referido dispositivoceletizado.

A par disso, a jornada por elacumprida era efetivamente fiscalizada econtrolada pela empregadora, fatocomprovado tanto pela provadocumental (vide anotações da CTPS,f. 16), como pela prova oral, inclusivepelo depoimento da preposta (“que areclamante assinava o livro de ponto;que o livro de ponto tinha horário deentrada e saída”, f. 113).

Afastada a aplicabilidade doinciso II do art. 62 da CLT, restaaveriguar a existência do laborextraordinário.

Na inicial, a autora alegou que ohorário pactuado entre as partes era das13h às 18h, de segunda a sexta-feira, edas 14h às 16h, aos sábados, mastrabalhava, em média, 09 ou 10 horasdiárias, auxiliando na maioria dosprogramas ao vivo, alguns realizados demanhã (como o do Pastor Cláudio, quedurava 01 hora), outros realizados ànoite (como o do apresentadorLeandro). Alegou, ainda, que assinavao ponto no horário pactuado, paraefeitos formais, prestando, na realidadee em média, 04 a 05 horas extras pordia (f. 07).

Não vieram aos autos os cartõesde ponto, mas os horários pactuadosestão registrados na CTPS, à f. 16, com15 minutos de intervalo. E a prova oralcolhida nos autos, se não demonstrouuma jornada tão elastecida como ainformada na inicial, comprovou ter havidolabor extraordinário, senão vejamos:

Informou a testemunha LuizHenrique de Lima Gonçalves (ouvida arogo da autora) que “...trabalhava das09h às 17h, em média; a reclamantechegava após o almoço (12h30min/13h)e em algumas vezes chegava antes doalmoço (2/3 vezes por semana),chegando entre as 09h/09h30min; odepoente saía e a reclamantecostumava ficar trabalhando; nãorecebeu pela maioria das horas extras;assinava o livro de ponto, mas nãoreflete a real jornada...” (f. 115).

A testemunha Cláudio NogueiraAlves (apresentada pela reclamada)declarou que “...a reclamante trabalhavaem horários alternados, sendo que odepoente pediu para que a reclamanteviesse na parte da manhã; ...acha quea autora não tinha necessidade departicipar da programação, mas nãosabe se participava; ...o depoente ia nareclamada apenas uma vez porsemana, normalmente nas quintas-feiras...” (f. 115).

Os depoimentos autorizamconcluir que a autora prestava 03 horase 30 minutos extras, em 03 dias dasemana, quando chegava às 09h30min,bem antes do horário contratual de 13h.Veja-se que a própria testemunhaapresentada pela reclamada reconheceuo labor na parte da manhã, ao menosnas quintas-feiras, dia em que ela própriacomparecia. Nos demais dias da semanae aos sábados, não houve prova do laborextraordinário. O horário de saída (18h)tampouco ficou desconstituído, já que a

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1ª testemunha saía às 17h, sendoabsolutamente normal que deixasse areclamante ainda trabalhando.

Pelo exposto, dá-se provimentoparcial ao recurso, no particular, paraacrescer à condenação 03 horas e 30minutos extras, em 03 dias da semana,acrescidos do adicional de 50%, portodo o período contratual. Por habituais,haverá incidências nos RSRs e, após,nas férias + 1/3, 13º salário, aviso prévioe FGTS + 40%, observada a Súmula n.264 do TST e o divisor 135 (27 horassemanais/6 = 4h30min x 30 = 135).

3.2.2 - Do valor arbitrado paraa indenização dos danos morais

Alega a recorrente que a r.sentença foi “tímida” ao arbitrar aindenização por danos morais emR$6.000,00, já que não levou emconsideração o caráter inibitório dapunição, o grau de culpa do ofensor, ascondições socioeconômicas das partes,o bem jurídico lesado e o caráterretributivo em relação à vítima e punitivoem relação ao causador do dano,deixando de observar critérios deproporcionalidade e razoabilidadedefinidos pela doutrina e jurisprudência.

Pleiteia seja majorada acondenação para 30 vezes o valor desua remuneração, conforme pleiteadona inicial.

Sem razão.Em relação ao quantum, não há

parâmetro objetivo insculpido na lei, peloque o valor da reparação há de serarbitrado por um juízo de eqüidade,levando-se em consideração algunscritérios, tais como: a gravidade do atodanoso, a intensidade da suarepercussão na comunidade, odesgaste provocado no ofendido, aposição socioeconômica do ofensor, etc.

Pelo que consta dos autos,mostra-se razoável o montanteindenizatório de R$6.000,00, porquearbitrado com sensatez, equanimidade,isenção e imparcialidade.

Mantém-se a decisão.

3.2.3 - Da multa do art. 477 daCLT

Aduz a recorrente que, emborao TRCT tenha sido tempestivamentehomologado, várias verbas trabalhistasincontroversas não foram quitadas naocasião, sendo certo que a ausência dequitação integral enseja a aplicação damulta prevista no § 8º do art. 477 da CLT.

Sem razão.A dispensa ocorreu em 02.02.05,

mediante aviso prévio indenizado; oacerto rescisório e sua homologação,em 10.02.05 (TRCT, f. 29). Restoucumprido, portanto, o prazo determinadopela alínea “b” do § 6º do art. 477 daCLT, o que afasta a aplicação da multaprevista no seu § 8º.

Nega-se provimento.

3.2.4 - Da multa do art. 467 daCLT

Sustenta a recorrente que areclamada não efetuou, na primeiraaudiência, o pagamento dos salários ecomissões que se tornaramincontroversos com a não-apresentaçãodos recibos, impondo-se a reforma dadecisão, para acrescer à condenação amulta do art. 467 da CLT.

Sem razão.A reclamada impugnou o pedido

de salários retidos e todas as demaisparcelas pleiteadas na inicial. Instalou-se, portanto, controvérsia suficiente nosautos, apta a afastar a aplicação do art.467 da CLT.

Nega-se provimento.

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3.2.5 - Da multa por litigaçãode má-fé

Alega a recorrente que aalteração da verdade dos fatos, adedução de defesa contra textoexpresso de lei e a interposição derecurso meramente protelatórioconfiguram a lit igação de má-fé,atraindo a aplicação dos arts. 17 e 18do CPC.

Sem razão.Não se configuraram quaisquer

das hipóteses previstas no art. 17 doCPC para que se possa cogitar daaplicação, à reclamada, da multa porlitigação de má-fé.

Nega-se provimento.

4 - CONCLUSÃO

Conhece-se dos recursosordinário e adesivo interpostos. Nomérito, dá-se provimento parcial aorecurso da reclamada para, nos termosda fundamentação, excluir dacondenação o pagamento dos saláriosdos períodos de 25.04.03 a 30.06.03.Dá-se provimento parcial ao recurso dareclamante, para acrescer àcondenação 3 horas e 30 minutosextras, em 03 dias da semana,acrescidos do adicional de 50%, portodo o período contratual; por habituais,haverá incidências nos RSRs e, após,nas férias + 1/3, 13º salário, aviso prévioe FGTS + 40%, observada a Súmula n.264 do TST e o divisor 135.

Mantém-se o valor arbitrado àcondenação.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Juízes doTribunal Regional do Trabalho da 3ªRegião, pela sua 1ª Turma,preliminarmente, à unanimidade, em

conhecer de ambos os recursos; nomérito, sem divergência, em darprovimento parcial ao recurso dareclamada para, nos termos dafundamentação, excluir da condenaçãoo pagamento dos salários dos períodosde 25.04.03 a 30.06.03; unanimemente,em dar provimento parcial ao recursoda reclamante, para acrescer àcondenação 3 horas e 30 minutosextras, em 03 dias da semana,acrescidos do adicional de 50%, portodo o período contratual; por habituais,haverá incidências nos RSRs e, após,nas férias + 1/3, 13º salário, aviso prévioe FGTS + 40%, observada a Súmula n.264 do TST e o divisor 135. Mantido ovalor arbitrado à condenação.

Belo Horizonte, 17 de outubro de2005.

MAURICIO GODINHO DELGADORelator

TRT-00275-2005-000-03-00-0-MSPubl. no “MG” de 29.09.2005

IMPETRANTE: ASSOCIAÇÃO DOSMAGISTRADOS DA JUSTIÇADO TRABALHO DA TERCEIRAREGIÃO - AMATRA

IMPETRADO: JUIZ CORREGEDOR DOTRIBUNAL REGIONAL DOTRABALHO DA TERCEIRAREGIÃO

EMENTA: 1) MANDADO DESEGURANÇA COLETIVO -ASSOCIAÇÃO DOSMAGISTRADOS DA JUSTIÇADO TRABALHO DA 3ª REGIÃO- DEFESA DE PRERROGATIVAINSTITUCIONAL DAMAGISTRATURA. CABIMENTO.2) A SENTENÇA E O PRINCÍPIO

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DA INDEPENDÊNCIA JUDICIAL- INVALIDADE DE QUALQUERCONDIÇÃO QUE AFETE,DIRETA OU INDIRETAMENTE, ALIBERDADE DO JUIZ DEFUNDAMENTAR O ATODECISÓRIO, COMO LHEPARECER ADEQUADO. 3)PEDIDO DE PROVIDÊNCIAPREVISTO NO REGIMENTOINTERNO E NOREGULAMENTO DACORREGEDORIA DOTRIBUNAL - NATUREZA EFINALIDADE INCONFUNDÍVEISCOM AS DO PROCEDIMENTOADMINISTRATIVO DE QUEPOSSA RESULTAR AAPLICAÇÃO DAS PENAS DEADVERTÊNCIA OU CENSURA -PUBLICAÇÃO DO NOME DOMAGISTRADO NA RESPECTIVADECISÃO - LEGALIDADE DOATO. 4) SEGURANÇACONCEDIDA PARCIALMENTE.O mandado de segurançacoletivo de que trata o art. 5º,LXX, “b”, da Constituição daRepública, impetrável pororganização sindical, entidadede classe ou associaçãolegalmente constituída e emfuncionamento há pelo menosum ano, tem por finalidade aproteção jurídica dos direitossubjetivos de incontestávelcerteza (líquidos e certos,portanto) de membros ouassociados que, de tal modo, jánão têm mais, como tiveramdesde a Constituição de 1934(ressalvado o interregno daCarta de 37), a exclusivatitularidade da açãomandamental.Daí por que a Associação dosMagistrados da Justiça do

Trabalho da 3ª Região temlegitimidade para promover,pela via do mandado desegurança coletivo, a defesade prerrogativa institucionaldos seus associados,enquanto membros damagistratura, contra ato que,concernente embora a ummagistrado, afeta os demaispela projeção dos seus efeitossobre a própria funçãojudicante.Fundamentar a sentença ououtra qualquer decisão comoparecer adequado ao seuprolator constitui a dimensãomáxima do princípio deindependência judicial.É inválido, por conseguinte, oato que recomenda ao juiz quese abstenha de fazer, nasentença, consideraçõesoutras que na percepção dadigna autoridade impetradanão sejam técnicas apenas.Nem mesmo ao órgãojurisdicional investido dacompetência de derrogação sereconhece legitimidadejurídica para impor uma talrestrição.De outra parte, também pede aimpetrante que cesse apublicação do nome demagistrado referido emdespacho que o órgãocorregedor profere nodenominado Pedido deProvidência. Mas a medida, aorevés do alegado, nãocontraria a Lei Orgânica daMagistratura Nacional, pois emrazão de sua natureza efinalidade não busca aplicarpena de advertência oucensura.

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Segurança parcialmenteconcedida, não na extensão dopedido, mas na medidanecessária para resguardarprerrogativa inerente à funçãojudicante, em ordem apreservar as relevantesatribuições do JuizCorregedor, para cujoexercício se acha eleigualmente investido deprerrogativas, que não lhepodem ser suprimidas.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de mandado desegurança, sendo impetrante aASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOSDA JUSTIÇA DO TRABALHO DATERCEIRA REGIÃO - AMATRA eimpetrado o EXCELENTÍSSIMOSENHOR JUIZ CORREGEDOR DOTRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHODA TERCEIRA REGIÃO.

RELATÓRIO

É da lavra do eminente relator,Juiz Eduardo Augusto Lobato, o relatóriocircunstanciado do feito, comotranscrevo.

Cuida-se de mandado desegurança coletivo, com pedidode liminar, impetrado em face dedecisões do e. Juiz Corregedor,proferidas em sedeadministrativa (em verdade,decisões proferidas emprocedimentos administrativosautuados como Pedidos deProvidências - PP), a mais antigadelas de 26.01.2005, segundorelata a Associação-autora; naverdade, quer anular taisdecisões, que, a seu ver, violamas prerrogativas dos

magistrados, bem como que sejaimposta à indigitada autoridadeque se abstenha de “praticar atoscom o mesmo teor”.

A impetrante indica oprimeiro ato como sendo adecisão proferida no processo n.TRT/SCR/3-PP-01619-2004-000-03-00-7, onde foi grafado onome da autoridade contra aqual o expediente administrativofoi movido, ao fundamento deque, muito embora a conclusãotenha se mostrado estéril, o fatoé que houve uma exposição daimagem da Magistrada.

O segundo ato alvo dapresente ação diz respeito aoprocedimento n. TRT/SCR/3-PP00127-2005-000-03-00-5, ondehá referência à mesmaMagistrada, contudo, sob a óticada associação, com a agravanteda “censura pública”, sem odevido processo legal e sem ocrivo do contraditório, o queinterfere na liberdade eindependência da Magistrada.Transcreve excertos da decisãocorregedora, com especialdestaque para a chamada“orientação geral decomportamento”, onde a juízacorrigida “...concita as partes atomarem consciência de suasrelações de trabalho, mesmo quecom terceiros, da necessidadede proteção da saúde dotrabalhador no ambiente de labor[...]”. O punctum dolens quegerou o inconformismo da autorae dos seus representados dizrespeito a este trecho dacorrigenda: “Sentença é obratécnica. Nela se diz o direito,presta-se a jurisdição. Não há aliespaço para lições, conselhos,

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editoriais, concitações, aulas,palestras, demonstrações deconhecimento ou de cultura, nemmesmo lugar existe para o Juizdemonstrar posições devanguarda (ouconservadorismo), que ficammuito bem em salas de aula,trabalhos doutrinários,congressos, teses, dissertações.Observe-se que, na espécie,sequer haveria lugar para oaconselhamento dado [...]. Daí,recomenda-se à Ilustre Juíza,prolatora da r. decisão proferidanos autos da reclamação n.00393-2004-045-03-00-8 que seabstenha de emitir, em suassentenças, conselhos às partes”.Afirma que “...as violações àhonra e às prerrogativasinstitucionais da magistradaforam tantas, que serão tratadasseparadamente...”, e que aAutoridade Impetrada excedeu“competências”, aplicando“censura pública” sem o devidoprocesso legal e semcontraditório, contrariandogarantias institucionais. Chamade “ácida crítica” a afirmação deque a Magistrada desconhececomo fundamentar umasentença. Vê também crítica doe. Juiz Corregedor às questõesde fundo (“...na espécie sequerhavia lugar para oaconselhamento dado...”), queculmina na advertência pública(sic). Segue raciocinando que“...a decisão e a sua publicaçãoequivalem, na prática, a umacensura pública...” (item 43 de f.10). Entende que o abuso depoder é manifesto. Consideraque o Sr. Juiz Corregedor nãotem como estabelecer regras

para a fundamentação dedecisões dos Magistrados.

A terceira questão dizrespeito ao procedimento n. TRT/SCR/3-PP-00128-2005-000-03-00-0, e refere-se a uma possívelexposição “desnecessária”, ondeo e. Juiz Corregedor teria tornadopúblico um desentendimentoentre os Magistrados do Tribunal.Considera inapropriados oscomentários oferecidos naoportunidade, tais como aocorrência de “...grande alvoroçoexistente entre os nobres Juízesde primeiro grau porque do textodo acórdão TRT/00316-2004-045-03-00-8-ROPS se fezconstar determinação de suaremessa à Corregedoria, o quepoderia ‘sugerir censura’.” Nesteponto, reconhece a autora que aAutoridade Impetrada nãoidentificou nominalmente os“supostos Juízes” que estariamalvoroçados ou revoltados, o queacabou se transformando emmaior gravame, pois, a seu ver,sugere que “todos” (de primeirainstância) estariam alvoroçados.

O quarto ponto destemandamus trata daapresentação de pedidoadministrativo à Corregedoria (n.TRT-SCR/3-PP-00173-2005-000-03-4) cuidando dasquestões acima noticiadas, quefoi autuado, merecendodespacho desfavorável, nosentido de que a publicação dedecisões proferidas emreclamações correcionais, “...nãose confundem comprocedimento disciplinar”.

Diante destasconsiderações, entende que hádireito líquido e certo, que

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desafia a medida impetrada, queconstitui, até, medida preventiva.A petição inicial, a esta altura,passa a cuidar da legitimidade daautora para esta impetração (art.5º, LXX, “b”, da CR/88 e decisãodo Excelso STF, no sentido deque basta a autorizaçãoconstante dos estatutos). Aindaassim, por cautela, juntaalgumas “autorizaçõesindividuais”. Lembra, uma vezmais, que a LOMAN garante aosMagistrados, no que tange aprocedimentos administrativos,relacionados à apuração de suasfaltas funcionais, o sigilo, bemassim que a instauração dosprocedimentos administrativos eas punições são secretas e/ouaplicadas “reservadamente”(arts. 43 e 44).

Sustenta que há violaçãodo art. 95 da Carta de 1988;transcreve lição de MoacyrAmaral Santos. Oferece rol depedidos (concessão de liminar,prestação de informações daautoridade apontada comocoatora, declaração de nulidadedas decisões impugnadas,determinação de imposição àautoridade impetrada de nãopublicar o inteiro teor dasdecisões que proferir em sedecorrecional e administrativa;vedação de util ização, pelamesma autoridade, dequalificativos degradantes; deabstenção de expor censuras e/ou advertências e aplicarqualquer tipo de penalidade,direta ou indireta; abstenção deinterferência na atividadejurisdicional dos magistrados).Deu à causa o valor deR$1.000,00.

Juntou procuraçãooutorgada pela Presidente (daAMATRA) em exercício, DrªMaria Cecília Alves Pinto, edocumentos (f. 17 e seguintes),dentre eles a ata de posse etransmissão de cargos dadiretoria da impetrante, do seuEstatuto, cópia do “MG” relativoao Procedimento 00128 e 01619,esta última do Juiz Vice-Corregedor e Corregedor “emexercício”, o Dr. Júlio Bernardodo Carmo, e também o de n. PP-00127, este efetivamente do e.Juiz Corregedor.

O feito foi distribuído,inicialmente, à e. Juíza AliceMonteiro de Barros, que se deupor suspeita (despacho de f. 36),o mesmo ocorrendo com o e.Juiz Sebastião Geraldo deOliveira (f. 38). Na redistribuiçãosubseqüente (f. 38v), coube-mea relatoria do feito, em 21 demarço do corrente.

A Associação-autoraprotocolizou petitório (f. 39),escoltado de duas “autorizações”de dois juízes (Dr. Orlando TadeuAlcântara e Dr. Antônio Neves deFreitas), para a impetração domandado de segurança.

De minha ordem,determinou-se, por despacho,fosse emendada a petição inicial(f. 42), no que se refere à cópiada petição inicial, o que foiatendido, dentro do decêndiolegal (f. 43).

Os autos vieram-meconclusos, quando admiti ainicial e remeti o exame dopedido liminar para após fossemcolhidas as informações daautoridade dita coatora (f. 45).

As informações vieram

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densas (f. 47/67), com argüiçãode não cabimento da impetração(art. 5º, I, da Lei n. 1.533/51), quecuida de “ato de que caibarecurso administrativo”;considera a digna autoridade quenenhuma das decisõesproferidas desafiou recursopróprio, por parte do magistradorequerido/interessado; consideraque, nos autos do PP 00127, aAMATRA 3 opôs “recursoadministrativo”, embora nãofosse “parte”; tal recurso foirecebido como agravoregimental, ainda assim, parafins de encaminhamento aoÓrgão Especial, de modo a evitarpossível alegação de cerceio dedefesa ou de expressão, dentreoutros; destaca que o único dosPedidos de Providênciasdaqueles insertos na inicialapenas o PP 00173 envolveudiretamente a AMATRA, foiobjeto de recurso, distribuído aoJuiz Tarcísio Alberto Giboski;neste tópico finaliza sustentandoque, a despeito de despachodeste Relator determinandofosse emendada a petição inicial,trazendo cópias, a impetrantenão cumpriu, limitando-se aapresentar cópias da inicial semos documentos que a instruem;passa, a seguir, a relatar os“fatos”, afirmando, em primeiroplano, desconhecer a decisãoproferida nos autos do PP 01619-2004-000-03-00-7, já que dalavra do e. Juiz Júlio Bernardo doCarmo, mesmo porqueencontrava-se em gozo de férias;pede a limitação do exame dasquestões apenas no que serefere aos 3 “PPs” que declina(n. 00127, 00128, e 00173);

passa, a seguir, a tecerconsiderações sobre o “objeto daimpetração”, relembra a dignaautoridade que nos “PPs” n.00127 e 00128 não houveoposição de recurso próprio(agravo regimental), correndo inalbis o prazo para tanto; no PP00127, a AMATRA 3 opôsrecurso administrativo, recebidocomo agravo regimental;transcreve o despachosubmetido ao Juiz TarcísioAlberto Giboski (f. 50/53); o pontoseguinte das informações daindigitada autoridade apontadacomo coatora diz respeito sobrea “publicação das decisõesproferidas em procedimentosadministrativos daCorregedoria”, com referência etranscrições de julgados;destaca que no PP 00173 aAMATRA 3, expressamente,pretendeu não fossempublicadas no Diário Oficial doEstado decisões sob a alegaçãode que os Juízes de primeirainstância têm passado por“constrangimento” ao veremseus nomes nas publicações, oque foi respondido (esclarecemas informações), que se cumprirao Regulamento Interno daCorregedoria (art. 15), que cuidaexatamente da forma pela qualo magistrado interessado seráintimado (via postal oupublicação no jornal oficial);segue observando que aLOMAN, realmente, deixa claroque é prerrogativa do magistradoexigir o sigilo da tramitação e dosprocedimentos relacionados àapuração de suas faltasfuncionais, forma de publicidade,formação do processo

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administrativo etc. (art. 22, §§ 2º,6º, 7º); considera que não sepode encontrar relação entre asquestões suscitadas e osdispositivos legais mencionados,inclusive porque nem existem naLei Complementar n. 35/79 os §§6º e 7º...; transcreve excertos dejulgado do Tribunal RegionalFederal da 3ª Região, emespecial no que tange àpublicidade das decisões, comdestaque para o fato de que jáem 1997, época do transcritojulgamento, o Pretório emreferência já tinha comoinconstitucional os artigos daLOMAN frente às disposições doart. 93, IX, da Constituição daRepública; e sobre a mesmaquestão, pronunciou-se oExcelso STF, na ADI 2700-MC/RJ(17.10.2002); transcreve, à f. 57,excerto do mencionado julgado,sob a relatoria do MinistroSydney Sanches, sendo tambémtranscrito trecho da manifestaçãodos Ministros Marco Aurélio eMaurício Corrêa; destaca aindaa Autoridade Impetrada aquestão referente àstransmissões da “TV JUSTIÇA”,que coloca à disposição docidadão, às vezes “ao vivo”, osjulgamentos do ExcelsoSupremo Tribunal Federal;invoca Calamandrei e sua obra“Eles, os juízes, vistos por nós,os advogados”; destaca,ademais, que o próprio ColendoTST não atenta contra o PoderJudiciário e contra a idoneidadede seus membros, ao publicar,diariamente, no Diário doJudiciário da União, o inteiro teordas decisões administrativasproferidas em Pedidos de

Providências e ReclamaçõesCorrecionais a ele dirigidas, eque têm como requeridos Juízesdos Tribunais Regionais; à f. 19de suas informações, destaca adigna autoridade coatora que noPP 00173 a AMATRA afirmara oseu descontentamento comcertas publicações, chegando,por essa razão, a requerer àCorregedoria a alteração do art.15 do seu Regulamento Geral,“adequando-o aos princípiosditados pela LOMAN - arts. 27,43, 44 e 46”, sendo que agora,na petição inicial, aduziu, dentreoutros aspectos, que “...grandeparte da categoria já se senteameaçada por atos de teorsemelhante a serem praticadospela i. Autoridade coatora”;conclui, no particular aspecto,que “...não se pode atinar dondeas expressões utilizadas nadecisão possam representarqualquer ‘violação àsprerrogativas dos magistrados’,se é a própria impetrante quemdá notícia do ‘sentir’ dos juízesacerca de tais questões”; lembraque as “manifestações deagitação e revolta” puderam serdetectadas em lista de discussão(Internet).

De minha ordem (f. 68),os autos foram remetidos à d.Procuradoria Regional, paraparecer.

Antes, porém, emcomplementação a tal despacho,decidi, desfavoravelmente à tesevestibular, sobre o pedido deliminar (f. 69).

O d. Ministério Público doTrabalho, pela sua entãoProcuradora-Chefe, Drª MarilzaGeralda do Nascimento, opinou

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pelo indeferimento liminar domandamus (art. 8º da Lei n.1.533/51). Invocou a OJ n. 92 daSDI-II do TST e a Súmula 267 doExcelso STF. No mérito, é pelaconcessão parcial da segurança.

Ao iniciar-se a sessão dejulgamento, a atual Procuradora-Chefe,Drª Maria Amélia Bracks, reiterando aargüição que sua ilustre antecessora jáfizera de outra feita, sustentou que amatéria objeto da presente ação deveriaser submetida ao Tribunal Pleno, dadaa competência deste para deliberar arespeito.

Este o relatório.

VOTO

Competência do Órgão Especial

O douto Ministério Público doTrabalho sustenta que é do TribunalPleno a competência para conhecer edecidir sobre a matéria versada nestesautos.

A argüição foi rejeitada porunanimidade, à vista dos fundamentosexpendidos pelo Relator, Juiz EduardoAugusto Lobato, a seguir transcritos:

Nos termos do art. 16,parágrafo único, da LeiComplementar n. 35/79(LOMAN), nos Tribunais em quefor constituído Órgão Especial,este terá atribuiçãoadministrativa e jurisdicional quesão da competência do TribunalPleno.

E segundo o art. 21, V, “c”,do Regimento Interno destaCasa, compete ao Tribunal Plenojulgar, originariamente, osmandados de segurançaimpetrados contra seus próprios

atos, os do Presidente e aquelesimpetrados por Juízes doTribunal.

Observe-se que areferência é aos Juízes doTribunal e não àqueles de 1ªInstância. Da leitura domencionado Regimento Internopercebe-se, claramente, que háuma dicotomia entre Juízes de1ª Instância e do Tribunal, dondese depreende que não háexceção à regra, ou seja,compete ao Tribunal Pleno julgaroriginalmente apenas osmandados de segurançaimpetrados pelos Juízes destaCasa.

Por ou t ro lado , omenc ionado a r t . 21 doRegimento Interno do TRT da3ª Região não esclarece, emseus incisos V e VI, quanto àcompetênc ia pa ra ju lga rmandado de segurançacon t ra dec isão ou a to doCorregedor.

Assim, uma vez que opresente mandamus não foiimpetrado contra ato do próprioTribunal Pleno, do Presidentedesta Casa, ou por Juiz desteRegional, há de se inferir que acompetência para apreciar ejulgar o feito pertence ao ÓrgãoEspecial, por força da LeiComplementar n. 35/79, uma vezque o Regimento Interno desteTribunal não faz expressaprevisão a respeito dacompetência do Tribunal Pleno.

Juízo de admissibilidade

Sobre o conhecimento, o voto dodouto Juiz Eduardo Augusto Lobato temo seguinte teor:

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Nas informaçõesprestadas pelo e. JuizCorregedor deste Tribunal foipugnado pelo não cabimento daimpetração, em face do art. 5º, I,da Lei n. 1.533/51, já que adisposição legal é cogente, nosentido de não caber mandadode segurança quando se tratarde “ato de que caiba recursoadministrativo com efeitosuspensivo, independente decaução”.

As decisões, segundosustenta ainda a dignaautoridade, desafiavam agravoregimental, não manejados (art.166 do RITRT).

Em primeiro lugar, quantoaos “PPs 127/05 e 173/05”,foram interpostos recursos,encontrando-se, pois, sub judice,como bem lembrou, aliás, a d.Procuradoria Regional, em seujudicioso parecer (f. 71), questãotambém reconhecida,parcialmente, nas informaçõesda d. autoridade coatora (f. 48),quando afirmou que o PP 00173foi “regularmente distribuído aoeminente Juiz Tarcísio AlbertoGiboski”.

No que se refere aos“PPs 1619/04 e 128/05”,encontram-se eles arquivados,não havendo comprovação ouafirmação de existência dequalquer recurso.

A OrientaçãoJurisprudencial n. 92 da SDI-II doC. TST, invocada pela d.Procuradoria Regional,estabeleceu:

Mandado desegurança. Existência derecurso próprio.

Não cabe mandadode segurança contradecisão judicial passívelde reforma medianterecurso próprio, aindaque com efeito diferido.

E a Súmula n. 267 doExcelso STF, também invocadana mesma oportunidade,assentou:

Não cabe mandadode segurança contra atojudicial passível derecurso ou correição.

Em discordância com ajudiciosa impugnação oferecidapela digna autoridadeimpetrada, o art. 5º, inciso I, daLei n. 1.533/51, dispõe que nãose dará mandado de segurançaquando se tratar “de ato de quecaiba recurso administrativocom efeito suspensivo,independentemente de caução”,repetindo o que já acima relatei.

Não obstante, se orecurso não tem efeitosuspensivo, nada impede aimpetração da segurança, já queo texto legal acima transcritocogita de “efeito suspensivo”. Naespécie, não há elementos quedemonstrem a presença doreferido efeito; logo, parececorreto afirmar que não há óbiceao ajuizamento do mandamus,sob este particular enfoque.

De outro lado, agoratomada a questão sob o prismado r. parecer ministerial, tenhoque a Súmula n. 267 do ExcelsoSupremo Tribunal Federal e aOrientação Jurisprudencial n. 92da SDI-II do Colendo Tribunal

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Superior do Trabalho, cujatranscrição acima considerei, aoassinalarem o descabimento domandado de segurança, naexistência de recurso, sãodirigidas aos casos em que seimpetra o mandado contradecisão judicial e ato judicial,sendo certo que não é este ocaso dos autos, em que aimpetrante se insurge contradecisão tomada na esferaadministrativa, pelo e. JuizCorregedor. Sendo assim, só orecurso administrativo com efeitosuspensivo poderia impedir, emtese, a impetração. E, comovisto, esta não é a hipótese.

Convém acrescentar,ainda, a sempre atual lição deHely Lopes Meirelles, inMandado de segurança, AçãoPopular, Ação Civil Pública,Mandado de Injunção, HabeasData, 14. ed. atualizada porArnoldo Wald, setembro de1992, p. 31/32:

Ato de que caibarecurso administrativo -Quando a lei veda seimpetre mandado desegurança contra “ato deque caiba recursoadministrativo com efeitosuspensivo, independentede caução” (art. 5º, I), nãoestá obrigando oparticular a exaurir a viaadministrativa para, após,util izar-se da viajudiciária. Está, apenas,condicionando aimpetração à operatividadeou exeqüibilidade do ato aser impugnado perante oJudiciário. Se o recurso

suspensivo for utilizado, ter-se-á que aguardar seujulgamento, para atacar-seo ato final; se transcorre oprazo para o recurso, ou sea parte renuncia à suainterposição, o ato se tornaoperante e exeqüível pelaAdministração, ensejandodesde logo a impetração. Oque não se admite é aconcomitância do recursoadministrativo (com efeitosuspensivo) com omandado de segurança,porque, se os efeitos do atojá estão sobrestados pelorecurso hierárquico,nenhuma lesão produziráenquanto não se tornarexeqüível e operante. Sóentão poderá o prejudicadopedir o amparo judicialcontra a lesão ou a ameaçaa seu direito. O que se exigesempre - em qualquer caso- é a exeqüibilidade ou aoperatividade do ato a seratacado pela segurança: aexeqüibilidade surge nomomento em que cessamas oportunidades para osrecursos suspensivos; aoperatividade começa nomomento em que o atopode ser executado pelaAdministração ou peloseu beneficiário.

Assim, como o efeito“normal” - no sentido de“ordinário” - dos recursosadministrativos é o devolutivo (jáque o suspensivo exige normaexpressa que o diga), a questãotrazida a lume encaixa-seperfeitamente nessa situação.

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No tocante à questãoseguinte, em sede prefacialofertada nas informações dodigno Juiz Corregedor, aquiimpetrado, relativa à falta decópias dos documentos queinstruíram a peça vestibular,entendo-a despicienda, senãoestéril, data venia, uma vez que,no caso, trata-se de documentos“comuns às partes”, para valer-me do lugar comum em casosque tais, ou assemelhados, jáque cuida de documentação,grande parte dela pelo menos,intimamente afeta à d.Corregedoria, além de cópias deofícios da própria Secretaria daCorregedoria Regional, bemcomo de decisões do seuilustrado Corregedor.

Mais há que seacrescentar, no que diz respeito aocaso concreto: diz respeito a ummandado de segurança coletivo,com a natureza da proteção, deevidente caráter genérico (já quea tese vestibular é de prejuízonão só a uma Magistrada,diretamente envolvida em certosfatos, mas também de toda umaclasse, a de Juízes do Trabalho,Titulares e Substitutos).

Não há, portanto, como seadmitir a impetração no tocante aoPP 01619/04, porque fruto dedecisão proferida pelo e. Juiz Vice-Corregedor, o Dr. Júlio Bernardodo Carmo. Da mesma forma, nãoé possível admiti-la quanto aosPPs 127/05 e 173/05, pelo fato dasrazões expostas, dentre elasprincipalmente em face deencontrarem-se sub judice.

Ainda que assim nãofosse, em relação aos PPs 01619/04 e 127/05, a impetrante, através

da ação mandamental coletiva,busca a defesa de interessesindividuais de magistradosassociados, o que não é possívelpela via eleita, uma vez que elesdetêm o direito ou prerrogativa de,individualmente, defenderem-seem Juízo.

Hely Lopes Meirelles, namesma obra citada, agora às f.18/19, tem o mesmoposicionamento:

O b s e r v a m o s ,todavia, que o mandado desegurança coletivo não sepresta à defesa de direitoindividual de um ou dealguns filiados de partidopolítico, de sindicato ou deassociação, mas sim dacategoria, ou seja, datotalidade de seus filiados,que tenham um direito ouuma prerrogativa adefender em juízo.

Só admito, pois, a impetração domandamus em relação ao PP 00128/05,que contém referência ao acórdão TRT/316-2004-045-03-00-8, e está nosautos, e aos pedidos relativos àabstenção do Corregedor de praticar osatos elencados à f. 14 (“a” a “d”). No quediz respeito à pretensão de proteção adireito da coletividade, os atos queatentaram contra aqueles direitosindividuais servem somente a título deexemplo ou “pano de fundo”. Assim, nãoobstante não admita o presentemandamus para anular as decisões que,no entender da impetrante, violaramdireito individual líquido e certo, é certoque a pretensão de resguardar direitoda classe decorre de tais fatos, pelo queé necessário, quando do exame domérito, considerá-los.

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Prevaleceu, entretanto, oirrestrito conhecimento do mandado desegurança, nos termos do voto que arespeito proferi.

O mandado de segurançacoletivo de que trata a Constituição daRepública, art. 5º, LXX, alínea “b”,impetrável por organização sindical,entidade de classe ou associaçãolegalmente constituída e emfuncionamento há pelo menos um ano,tem por finalidade precípua a proteçãojurídica dos direitos subjetivos deincontestável certeza, líquidos e certos,portanto, de membros ou associados,que, de tal modo, já não têm mais, comotiveram desde a Constituição de 1934(ressalvado o interregno da Carta de37), a exclusiva titularidade da açãomandamental. Di-lo Celso AgrícolaBarbi:

Como o item LXIXmenciona direito a ser protegidopelo mandado de segurança,pensamos que o mandado desegurança coletivo é, sob umprimeiro aspecto, aqueledestinado a reclamar direitossubjetivos individuais dosmembros dos sindicatos e dosassociados de entidades declasse e associações. São osmesmos direitos que, no sistemaconstitucional anterior, somentepoderiam ser reclamados por seustitulares, mas que, agora, poderãoser reclamados por aquelasentidades, em favor dos seusmembros ou associados. (apudOLIVEIRA, Francisco Antônio de.Mandado de Segurança eControle Jurisdicional. 3. ed. 2001,editora RT, p. 262)

Calmon de Passos situa comprecisão o tema:

...os direitos que podemser objeto do mandado desegurança coletivo são osmesmos direitos que comportamdefesa pelo mandado desegurança individual. Aqui, aoinvés de se exigir que cadasujeito, sozinho oulitisconsorciado, atue em juízo nadefesa de seu direito (individual),a Carta Magna proporcionou asolução inteligente e prática depermitir que a entidade que osaglutina, mediante um só writ,obtenha a tutela do direito detodos. (Mandado de segurançacoletivo - Mandado de injunção -Habeas Data . 1. ed. 1989,editora Forense, p. 8)

Com instituir esta ação entre osdireitos fundamentais, o legislador daConstituição brasileira “quis que sejulgasse num único processo o conjuntode todos os litígios entre os integrantesde determinado grupo ou categoria e oPoder Público, evitando-se a pluralidadede processos que têm por objeto amesma pretensão e ajuizados poriniciativa de diversos indivíduos, pleitosque, tramitando separadamente, corremo risco de ser decididos de modoconflitante. Com o mandado desegurança coletivo, tudo ficasimplificado, pois, em vez de dezenasou centenas de processos, apenas umse realizará, movido pela entidadecoletiva, com resultado extensivo a todaa categoria interessada”, segundo omagistério de Carlos Mário da SilvaVelloso, fundado em lição de JoséCarlos Barbosa Moreira (Temas dedireito público. 1. ed. 1997, editora DelRey, p. 187-188).

Outra é, entretanto, a perspectivado eminente Juiz Relator. S. Exª aduz,com efeito, que

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a impetrante, através da açãomandamental coletiva, busca adefesa de interesses individuaisde magistrados associados, oque não é possível pela via eleita,uma vez que eles detêm o direitoou prerrogativa de,individualmente, defenderem-seem Juízo.

Respeitável embora, nãocomungo desse entendimento, dv. Queos juízes podem se defenderindividualmente me parece manifesto,até porque as ações coletivas não foramcriadas para anular o indivíduo,suprimindo-lhe poderes jurídicos eprerrogativas que a ordem jurídica lhereconhece. Ao contrário, instituíram-separa instrumentalizar a defesa coletivados direitos, por isso se deve entendê-las como “um passo adiante em favordo indivíduo”, como remarca o exímioCalmon de Passos (ob. cit., p. 15).

Não obstante a doutrina a quealudi e o fato de a jurisprudência do STFcompreender o mandado de segurançacoletivo como mera espécie da açãomandamental instituída pelaConstituição de 1934 e, portanto, dotadoda função jurídico-processual de tutelardireito líquido e certo não amparável porhabeas corpus e habeas data, parece-me que o writ não é instrumento peloqual se veicule, sem fronteira alguma,um qualquer direito subjetivo individual,mas direito que guarde um mínimo desubjetivação coletiva, ao comunicar-secom o direito dos demais membros deum grupo determinado e até de todauma categoria. Nesse sentido é quevejo, na ação de que se trata, umareferibilidade coletiva.

Aí está, segundo penso, overdadeiro foco do problema. Se umdireito é compartilhado pela totalidadede uma dada categoria, ou por uma

parcela ponderável, ou seja, não épertença de um apenas, mas dequantos se igualam na titularidade dele,poderá deduzi-lo a entidade em que seassociam todos, não como merorepresentante dos membros ouassociados, mas na condição desubstituto processual, fazendo-o emnome próprio, independentemente atéde aquiescência dos substituídos. É oquanto basta para validar o mandado desegurança coletivo.

É isto exatamente o que se verificano caso. A impetrante sustenta que, noPedido de Providência n. 127/2005, oórgão corregedor interveio diretamenteno teor de uma sentença da juíza MarthaHalfeld Furtado de Mendonça, a pretextode fazer uma recomendação. Daí porque a questão gravita em torno doprincípio de independência do juiz,prerrogativa institucional que concernea toda a magistratura.

Como lhe consentem as suasfinalidades estatutárias, cumpre àimpetrante “defender as prerrogativas,direitos e interesses individuais oucoletivos dos associados, pugnandopela independência, dignidade eprestígio do Poder Judiciário, nas suasrelações com os poderes públicos outerceiros” (art. 2º, III).

De logo se vê que uma talfinalidade (defesa de prerrogativas)corresponde precisamente ao direito ouinteresse que este mandado desegurança coletivo se ordena aproteger. E como assomam situações,por assim dizer, homólogas ehomocêntricas, a da impetrante, comseu maior raio de ação e, portanto, maisampla circunferência, permite que elase valha da condição de substitutoprocessual para, de uma só feita, obtera proteção de quantos precisem reagircontra ato supostamente ilegal ouabusivo de autoridade.

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Tenho assim que é igualmentecabível a ação mandamental em relaçãoao ato praticado no PP 127.

Por fim, igualmente conheço daimpetração quanto ao PP 1619, nãoobstante se trate de decisão do Ex.mo

Juiz Vice-Corregedor. É que ele a deucomo Juiz Corregedor, em exercício,como está à f. 30, uma vez que o Ex.mo

Juiz Corregedor encontrava-se emférias àquela altura, consoante osesclarecimentos contidos nasinformações (cf. f. 48/49). Fê-lo, então,o eminente Juiz Júlio Bernardo doCarmo, plenamente investido dasatribuições do Corregedor, na condição,portanto, de órgão-sujeito daCorregedoria.

De toda sorte, a decisão dada noreferido expediente é, em sua essência,objeto da mesma impugnação dirigidapela impetrante às decisões dosPedidos de Providência 128 e 173. Comefeito, em todos eles se discute aquestão atinente à publicação do nomedo magistrado referido em despacho doCorregedor nos chamados Pedidos deProvidência, razão pela qual asinformações amplamente prestadaspelo impetrado aproveitam àgeneralidade das impugnações opostaspela impetrante nesta ação.

Em suma, admito o mandado desegurança coletivo em sua amplaextensão, tal como proposto.

Juízo de mérito

Da publicidade da decisão emPedido de Providência - Anulação

São do Juiz Eduardo AugustoLobato os fundamentos pertinentes aotema, adotados à unanimidade peloÓrgão Especial. Tal como expostos porS. Exª, consigno os seus termos:

Consoante relatei acima,a pretensão da associaçãoimpetrante é de que seja anuladaa decisão proferida pela d.Corregedoria no Pedido deProvidência n. 128/05, bemcomo de que a autoridade ditacoatora se abstenha de publicaro inteiro teor das decisõesproferidas em procedimentoscorreicionais e administrativosque digam respeito aosmagistrados deste Regional,limitando-se à publicação daconclusão das referidasdecisões, sem a possibilidade deidentificação do magistrado.

Todavia, não vislumbrorazão alguma à pretensãomandamental.

Cabe aqui uma digressãosobre o remédio adotado pelaassociação impetrante.

Nos termos do art. 1º daLei n. 1.533/51, “Conceder-se-ámandado de segurança paraproteger direito líquido e certo,não amparado por habeascorpus, sempre que, ilegalmenteou com abuso do poder, alguémsofrer violação ou houver justoreceio de sofrê-la por parte deautoridade, seja de que categoriafor e sejam quais forem asfunções que exerça.”

A ação mandamental tem,portanto, como objeto a correçãode ato ou omissão de autoridadeofensivo do direito líquido e certo,contudo, repete-se, apenas esempre na hipótese de alguémsofrer violação ou houver justoreceio de sofrê-la, desde que oato seja ilegal ou revestido deabuso de poder.

Convém não perder devista, de pronto, que a concessão

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da segurança, neste remédioheróico mandamental, tem quese revestir, como pressupostoinsuperável, da necessidade dese tutelar direito líquido e certo,que não antevejo, e que,segundo a melhor doutrina,“traduz aquele direito que nãosuscita dúvidas, que nãoapresenta obscuridades, quenão necessita ser demonstrado,que é, de si mesmo, concludentee inconcusso...” (Pontes deMiranda, em citação de ManoelAntonio Teixeira Filho, inMandado de Segurança naJustiça do Trabalho, 2. ed. SãoPaulo: LTr, p. 128). Assim, se odireito perseguido não se mostraabsolutamente claro, o remédiomanejado é inócuo.

Pois bem, os Pedidos deProvidência encontram previsãono art. 81, XXIV, do RegimentoInterno desta Casa. A publicaçãocontendo os nomes dosmagistrados não é ilegal, vistoque decorre do art. 15 doRegulamento Interno daCorregedoria.

Assim, não quererpublicidade das questõestratadas não passa pelo crivo doart. 15 do Regulamento Internoda Corregedoria, acimamencionado, que determina aintimação das autoridades emquestão por via postal ou atravésde publicação em jornal oficial,conforme transcrito nasinformações prestadas, ou doparágrafo único do art. 19 doRegulamento Interno da mesmaCorregedoria.

O expediente cujadecisão busca a impetranteanular não se confunde com

procedimento administrativoinstaurado para aplicação daspenas de advertência oucensura, este regulado nos arts.52 e seguintes do RITRT, e apósa constatação, através dereclamação correcional, deprática de ato que possacaracterizar a negligência nocumprimento dos deveres docargo, procedimento incorreto ouincompatível com o exercício dafunção ou o abuso de autoridadepor parte do Juiz (art. 18 doRegulamento Interno daCorregedoria), pelo que não háque se cogitar em inobservânciados arts. 43 e 44 da LOMAN.

A publicação do nome domagistrado alvo do Pedido deProvidência não é vedada pelaLOMAN, visto que a pena, sejade advertência ou censura, é quedeve ser aplicadareservadamente. Nas decisõesproferidas pelo Corregedor nãovislumbro qualquer penalidade.

O mesmo se diga emrelação aos arts. 52 e seguintesdo RITRT. O procedimentoinstaurado não foi para apuraçãode faltas puníveis com as penasde advertência ou censura, peloque não havia a necessidade deseu processamento se dar deforma reservada. Não se percade vista que os expedientestrataram, insisto, de Pedido deProvidência e não deReclamação Correcional, esta“cabível para corrigir ações,omissões, abusos e atoscontrários à boa ordemprocessual, que impliquem errode procedimento” (art. 34 doRITRT).

Assim, também não há

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como se cogitar no abuso ouexcesso de poder. Entenda-secomo abuso de poder a práticade ato pela autoridade coatora,que, apesar de detercompetência para tanto,ultrapassa os limites de suasatribuições ou se desvia dasfinalidades administrativas.

Ressalto que sequerhouve aplicação de penalidade,tendo ocorrido apenas e tão-somente uma recomendação.

Deste modo, não há comoendossar a pretensão vestibularde ver anulada ou revogada adecisão da d. Corregedoria, umavez que não há direito líquido ecerto à não publicação do nomedo Magistrado em Pedido deProvidência, não sendo ilegal talato.

Denego.

Dos alegados qualificativosdegradantes - Censuras eadvertências

Também aqui prevaleceu o votodo Juiz Eduardo Augusto Lobato, cujosfundamentos transcrevo.

Pretende a impetrante,ainda, a concessão desegurança para determinar queo Corregedor se abstenha deutil izar, em suas decisões,qualificativos degradantes, bemcomo de fazer censuras eadvertências ou aplicarpenalidades, de forma direta ouindireta, aos Magistrados.

Não há razão para aconcessão da segurança,também neste ponto.

A insurgência daimpetrante, no tocante à

util ização de qualif icativosdegradantes, a meu ver, guardapertinência à adoção pelo e.Corregedor da expressão“grande alvoroço existente entreos nobres Juízes de primeirainstância”.

Entendo que o uso daexpressão “grande alvoroço” nãopode ser entendido comoqualificativo de degradação,sendo por demais rigoroso crerque tal afirmação busquediminuir ou degradar a imagemda classe ou de um de seusmembros.

Ademais, soa-meestranha a pretensão daimpetrante de querer que sedetermine ao Corregedor quenão util ize expressões quedegradem a imagem dosMagistrados. Não podemos nosesquecer de que ele também éJuiz e, portanto, é atingido portais degradações, se existentes,na ótica da associação.

Parece-me que aimpetrante pretende a criação,de forma indireta, de um “quadrode normas de conduta” para serobservado pelo Corregedordesta Casa, na forma detratamento de seus pares, o quenão pode em hipótese algumaser objeto do presente remédio,pois é evidente a ausência dedireito líquido e certo para efeitode mandado de segurança.

Aliás, o nossoordenamento jurídico jácontempla remédio processualpara o caso de alguém se utilizarde expressões que denigram aimagem de uma determinadaclasse ou pessoa por elasatingida.

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No tocante à abstençãode fazer censuras, advertênciasou aplicar penalidades, direta ouindiretamente, aos magistrados,a hipótese é a mesma. Háprevisibil idade na normaprocessual para responsabilizaçãono caso concreto.

Por outro lado, não sepode atribuir a umarecomendação a pecha decensura, advertência ouaplicação de penalidade, aindaque de forma indireta. Aliás, seassim se entender, poder-se-iachegar à ilação de que omagistrado que, em suasentença, resolve aconselhar aspartes como devem se comportar,também estaria censurando-asou advertindo-as, o que não foi ocaso, tanto que, repete-se, sequerfoi aplicada penalidade, masapenas feita uma recomendação.

As penalidades, apósverificação da falta através deprocedimento disciplinaradministrativo, resguardado ocontraditório e a ampla defesa,bem como o sigilo, encontram-se previstas na LOMAN e noRegimento Interno desta Casa,sendo certo, como já mencioneiacima, que o e. Corregedor, emquaisquer das decisões objetodo presente mandamus, aplicoualgum tipo de penalidade.

Improcede, pois, aimpetração também nesteaspecto.

Da sentença e do princípio daindependência judicial

No aspecto, vencedor o meuvoto, passo a expor os fundamentos quea maioria acolheu.

Como de certo modo já antecipeino juízo de admissibilidade, trava-se odebate em torno de garantiasasseguradas aos juízes para o exercícioda função jurisdicional. Segundo aimpetrante, o Ex.mo Juiz Corregedor, aodecidir o PP 127, violou uma destasfundamentais garantias, qual seja, aindependência dos juízes, porque fezcríticas aos fundamentos de umasentença proferida pela Ex.ma JuízaMartha Halfeld, assim como, medianterecomendação prescrita na mesmadecisão correcional, estabeleceu“regras para a fundamentação dassentenças”. Fez ainda, diz a impetração,censura pública àquela magistrada, semo devido processo legal e o contraditórioimperativos, donde a conseqüenteviolação de princípios constitucionais eregras legais, nomeadamente as que seacham previstas na LOMAN.

Detenho-me logo na questão daindependência do juiz. A independênciajudicial é um dado fundamental para alegitimação democrática do PoderJudiciário. Somente assumindo-a noseu sentido mais profundo é que o juizse torna verdadeiramente garante doEstado Democrático de Direito instituídopela Constituição vigente.

Como não basta entregar-lheesse mister, que envolvenecessariamente o controle dos demaispoderes, a tutela dos direitosfundamentais dos cidadãos, e a garantiada estabilidade institucional, comoassinala Luiz Flávio Gomes (A dimensãoda magistratura no estado constitucionale democrático de direito, 1997, editoraRevista dos Tribunais, p. 24/25),adjudica-lhe a ordem jurídica, comogarantia e valor constitucional, umaindependência absolutamenteindispensável para cumprir, na suamáxima extensão, os poderes eatribuições institucionais que lhe são

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próprios, com vistas a salvaguardar umoutro valor, certamente conexo e maisimportante ainda - o da imparcialidade,como escreveu Mauro Cappelletti(Juízes irresponsáveis?,1989, SérgioAntônio Fabris Editor, p.32).

A independência judicial é tantopolítica e externa quanto interna, istoé, em face da estrutura judiciáriamesma. “Na prática, a lesão àindependência interna costuma ser demaior gravidade do que a violação àindependência externa”, porque estaúlt ima, num país democrático, érelativamente neutral izável pelosinstrumentos de informação, expressãoe crítica, enquanto a outra pode revelar-se sutil e contínua, como agudamenteobserva o jurista argentino e maisinfluente penalista latino-americano desua geração, Eugênio Raúl Zaffaroni,autor de um dos mais completosestudos sobre o Poder Judiciário(Poder Judiciário - Crise, acertos edesacertos, 1995, Ed. Revista dosTribunais, p. 88/89).

O certo é que ambas estãoontologicamente ligadas à jurisdição,como condição de que esta se preste,refriso, com imparcialidade e cumpraplenamente o seu desígnio de darsolução justa aos conflitos de interesse.

Nas suas últimasconseqüências, o ato verdadeiramenteafirmativo do poder jurisdicional, comoque potestade máxima do juiz, é asentença. Em lata compreensão, namesma altura figuram as mais diversasdecisões da autoridade judiciária, comoliminares e todos os provimentos decarga decisória. Para verter qualquerdelas, o juiz está resguardado pelaindependência de convicção, a talvezmais sensível projeção do princípio daindependência judicial.

Fixando-me na sentença, ato deculminância que é, ela deriva de uma

acepção intelectual do magistrado arespeito do direito e dos fatos da causa.Dá-la, portanto, não é algo singelo, poisrequer o equacionamento crítico eracional de uma múltipla e geralmentecomplexa ordem de fatores geradapelos fatos e pelo direito material eprocessual.

Quando se tem em vista aoperatividade do direito, o juiz é figurade primeiro plano. E ele traz consigo afigura do intérprete, que entra comgrande força na solução dos problemasconcretos, até porque “a modernahermenêutica parte do pressuposto deque o ser não é cognoscívelobjetivamente, nem definível - ésomente interpretável” (Verdade eConhecimento / Tomás de Aquino,tradução, estudos introdutórios e notasde Luiz Jean Lauand e Mário BrunoSproviero, 1999, ed. Martins Fontes, p.96/97).

Por isso mesmo, sua tarefaprimacial é que interprete a norma - oque já não é pouco, dada a desejável eideal compreensão do direito comointegridade, tanto que Dworkin chamade Hércules o juiz preparado para fazê-lo, “dotado de capacidade, dedicação epaciência sobre-humanas e com todo otempo necessário à sua disposição”,como averba Dinamar Cely Hoffmannem sua brilhante monografiaapresentada à Faculdade de Direito daUFMG (Interpretação e segurançajurídica: reflexões sobre uma novahermenêutica - Um esboço dascontribuições de Hans-Georg Gadamere Ronald Dworkin). Mas é igualmenteindissociável do seu esforçohermenêutico que o aplicador interpretee compreenda a realidade sobre a qualincide o direito positivado no texto dalei.

Para dar conta desse complexotrabalho, que pede a transposição do

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comando abstrato ao preceito concreto,o juiz “em maior ou menor grau,acrescenta algo, tem opções pessoaisque não decorrem, necessariamente,nem do texto da norma, nem dasconseqüências que ela determina. Issoé indescartável. Cada cabeça, cadasentença, já o afirma, há muito, asabedoria popular” (PASSOS, Calmonde, ob. cit., p. 1).

Pois bem. Retomo, nesta altura,os fatos que deram origem àimpetração. Nos autos de umareclamação de procedimentosumaríssimo, a ilustre magistrada quea sentenciou criou um tópico por eladenominado “ORIENTAÇÃO GERAL DECOMPORTAMENTO”, em que “concitaas partes a tomarem consciência, emsuas relações de trabalho, mesmo quecom terceiros, da necessidade deproteção da saúde do trabalhador noambiente de labor ... o objetivo daspartes, em qualquer relação de trabalho,deve ser a eliminação total dos agentesnocivos, perigosos ou penosos à saúdedo trabalhador. Assim fazendo etrabalhando no plano local, estarãocontribuindo para o progresso dasrelações profissionais e, de modo geral,para o desenvolvimento do Brasil...” (cf.informações, f. 64 e doc. de f. 31).

Instado a pronunciar-se, uma vezque o acórdão lavrado nocorrespondente ROPS lhe fora remetidopara as providências que julgassecabíveis, o Ex.mo Juiz Corregedor, depoisde reconhecer e proclamar que não lhecabe “avaliar o mérito da decisãoproferida por Juiz de Primeira Instância”,mas tão-só apurar se, “no curso doprocesso o Juiz esteve atento aos seusdeveres, cumprindo e fazendo cumprircom independência, serenidade eexatidão, as disposições legais e atosde ofício”, concluiu que não vira, naconduta da mesma ilustre Juíza,

qualquer erro de procedimento oudescumprimento dos deveres do cargo,tudo consoante a análise queempreendeu a partir dos próprios autos.

Dito isto, S. Exª afirmou oseguinte:

Entretanto, em exame dasentença, apurei que questãointeiramente estranha àquelaposta no v. acórdão requerintervenção desta Corregedoria.Refiro-me ao tópico da decisãotitulado “Da orientação geral decomportamento” em que a MM.Juíza dentre outros “concita”... (eaí segue o texto já transcritoacima).

E prossegue:

Sentença é obra técnica.Nela se diz o direito, presta-se ajurisdição. Não há ali espaçopara lições, conselhos, editoriais,concitações, aulas, palestras,demonstrações deconhecimento ou de cultura, nemmesmo lugar existe para o Juizdemonstrar posições devanguarda (ouconservadorismo), que ficammuito bem em salas de aula,trabalhos doutrinários,congressos, teses, dissertações.Observe-se que, na espécie,sequer haveria lugar para oaconselhamento dado: aeliminação total do agente nocivo(o perito já o afirmaraimpossível... e não há como,tomando-se como parâmetrouma medição de calor de um diaqualquer, eliminar ainsalubridade decorrente docalor do sol em face de umtrabalhador que presta serviços

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no leito de uma via férrea...). Daí,recomenda-se à Ilustre Juíza,prolatora da r. decisão proferidanos autos da reclamação n.00393-2004-045-03-00-8, que seabstenha de emitir, em suassentenças, conselhos àspartes...

O encarar a sentença como obratécnica, como a encara a dignaautoridade impetrada, é uma concepçãoa que se deve respeito intelectual. Afinal,toda a dogmática jurídica tem porfinalidade principal a decisão dascontrovérsias. O direito só cumprerealmente a parêmia de que “vive pararealizar-se” se essa realização consiste,nem mais nem menos, na aplicaçãodele, direito, aos casos concretos. Estánisto, dizia F. Ferrara há mais de umséculo, a técnica da decisão, isto é, atécnica de “saber atinar com as diversasnormas a que, na sua combinação,pertence governar o caso concreto”(Como aplicar e interpretar as leis,editora Líder, p. 77 e 78).

Com subsumir o fato à regrajurídica, o juiz dá cabo de uma operaçãoem boa parte revestida de técnica,porque se espera dele que identifique opreceito no ordenamento, compreenda-o e o empregue corretamente no casoque lhe cumpre julgar.

A atividade judiciária, porém, nãose reduz ao trabalho de subsunção dofato à norma de direito. É o mesmoFerrara quem o diz - e acrescenta: “...ojuiz não é um autômato de decisões; éum homem pensante, inteligente, epartícipe de todas as idéias econhecimentos que formam opatrimônio intelectual e a experiência doseu tempo” (ob. cit., p. 78/79).

Ora, se é para operar, comocreio, a inserção do direito na realidade,esta se impõe ao aplicador, que não

pode desviar-se dela. Fragmentada, éindispensável que o intérprete adelimite, para separar fatos relevantesdos que não o sejam. Desde então,direito e realidade passam a constituir,na visão do juiz, uma unidade imanente,que se materializa na decisão. Mas semdúvida que um tal percurso ele não oterá feito acompanhado apenas datécnica, que, isoladamente, não oajudará a carregar o grande fardo dotrabalho interpretativo.

Experiência, pré-compreensão,percepção, sensibilidade, memóriacultural, entre outras incontáveisaquisições e atributos do espíritohumano, formam um apreciável acervoque ao julgador ministra um saberindesatável da sua função judicante,mediante o qual ele dirá, em situaçõesconcretas, o que é boa-fé, o que sãobons costumes, o que constitui ou nãouma prática contrária à dignidadehumana, de sorte a poder cumprir opapel de mediador entre a norma e ofato, como lhe cabe.

O concitar da sentença eu otenho precisamente neste contexto quevenho de referir. Em primeiro lugar, éuma asserção técnica, já que deriva dodireito posto. A rigor, tem origem efundamento de validade na Constituiçãoda República (art. 7º, XXII) e nas normasinfraconstitucionais (CLT, arts. 154 eseguintes). No que a sentença não seesgota nesse prisma puramentetécnico-normativo, ela não é menoslegítima, visto que decorre de umadisposição íntima da sua prolatora,expressamente manifestada, deconclamar as consciências envolvidasno litígio quanto à necessidade deproteção à saúde dos trabalhadores,eliminando-se os riscos, etc. Ou seja,concebe-se que o direito não deve sersomente obedecido, mas tambémreconhecido, em ordem a que se faça

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observar por uma adesão crescente. Éuma idéia que se encontra emPerelman, o grande formulador da teoriada argumentação (Ética e Direito, 1996,editora Martins Fontes, p. 480), tema derecentíssimo ciclo de estudospromovido pela Escola Judicial.

A sentença está perfeitamentecontextualizada. A sua prolatoracertamente conhece bem a realidade dajurisdição em que atua e julgouoportuna, esclarecedora e socialmenteútil a conclamação que dirigiu às partes.Os juízes se podem atribuir essa funçãono seio das comunidades em que vivem,por meio de integrações dialógicas evariados métodos narrativos, entreestes a própria sentença. Isto vale,nomeadamente, para os direitosfundamentais - como o trabalho humano- para cuja vis expansiva deve simcolaborar o saber da magistratura, tantomais se puder transformar-se em umsaber comunicativo.

O que se reputa inaceitável,evidentemente, é que o magistradotransforme o princípio da independênciajudicial numa blindagem que lhe permitaconotar de puro subjetivismo as suassentenças e decisões, que passam a serdicções abusivas, quando não um puroexercício de arbítrio, a que se deve porcobro prontamente pelos mais diversosremédios jurídicos.

O ato impugnado, nãoverbalizado em termos ácidos, como diza impetrante, mas realmenteimpositivos, como é da natureza dequalquer pronunciamento judiciário, éobjetivamente restringente, tanto queenvolve uma recomendação para quenão se profiram sentenças quecontenham conselhos às partes. Comotal, afeta diretamente prerrogativaessencial da magistratura, qual seja, ade fundamentar o ato decisório como lheparecer adequado. No pressuposto de

que a sentença é obra técnica apenas,o que revela uma compreensãopossível, como já frisei, o atoquestionado reduz sensivelmente aliberdade de convicção de quantos nãocompartilhem a mesma posição. É comose a decisão administrativa dissesse: oubem a sentença é técnica, como talentendida a que se revela, na percepçãoda Corregedoria, desprovida deconsiderações desnecessárias,heterotópicas, como conclamações, porexemplo, ou terá sido dada cominadequação evidente, a merecer,portanto, intervenção correcional.

A meu juízo, a postulação deuma sentença em termos tais,contrariamente à prerrogativa de o juizfazer, em última análise, uma legítimaescolha axiológica, reduz o atodecisório, no processo judicial, a umaexplicação monolítica, insatisfatória eincompleta na sua finalidade de prestara jurisdição. Reitero que o ato de julgaré que integra o direito à experiênciahumana, transformando exigências egarantias jurídicas abstratamenteconcebidas em realidades concretas,que se somam aos diversos processosde vida. Afinal, a ciência do direito éciência dos seres vivos, que entra nafisiologia das funções vitais, comoassinalava, ainda no século XIX, emescrito pungente, o gênio de TobiasBarreto, o insuperável mestre darespeitada e histórica Escola do Recife.

É oportuno lembrar que oseventuais erros jurídicos e a injustiça dadecisão corrigem-se mediante remédiospróprios e pela instância jurisdicional.Claro é que, no apreciar o recursoprocessual cabível, o Tribunal forma umjuízo sobre os fundamentos dasentença, inclusive para os rejeitarintegralmente. Mas lhe será semprevedado dizer ao sentenciante que nãomais os adote, ou que passe a seguir

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uma certa técnica que o órgão ad quemconsidere a mais apropriada.

Portanto, a intervenção da doutaCorregedoria, com o já declinadopropósito, oblitera direito subjetivo quenão é apenas líquido e certo, masinstitucional principalmente, domagistrado e da magistratura.

Mas a pretensão é maisabrangente. Quer a nulidade do ato eque a autoridade impetrada seabstenha, em qualquer hipótese, deinterferir na atividade jurisdicional dosmagistrados.

O pedido denota um evidenteexagero e é preciso entendê-lo namedida do razoável. Estabelecer parao Corregedor a alvitrada abstenção (emqualquer hipótese) é manietá-locompletamente e impedir o exercício daatividade que lhe compete. As mesmasprerrogativas da magistratura oCorregedor as tem como Juiz que é,além do dever de cumprir a função naqual foi investido.

A correição, em certos casos, émesmo interventiva, para reconstituir esalvaguardar a ordem no processocontra ato judicial abusivo edesordenador, de que resulte inversãoe tumulto. Um provimento amplo, comose quer inculcar, reduziria a pó uma dasatribuições da Corregedoria.

Por outro lado, a questionadacláusula, no que fere prerrogativasinstitucionais da magistratura de 1o grau,ao estabelecer condição restritiva àindependência de convicção do juiz noato de sentenciar, de modo que não façaconcitações, aconselhamentos e outrasexpressamente referidasconsiderações, não se acha porconstituir, pois já o está, desde aexpedição do ato impugnado; não é atoin fieri apenas, cuja ocorrência, nofuturo, não possa desde agora serverificada. Ao contrário, o ato do ilustre

Corregedor traz em si mesmo oresultado específico pretendido (cf.MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado desegurança e ação popular. 8. ed. p. 14)ao intervir diretamente nafundamentação de uma determinadasentença, criticando-lhe o conteúdo efixando-lhe diretrizes não somenteimpositivas como generalizantes, razãopela qual tais diretrizes abrem apossibil idade real de controle desentenças proferidas pela mesma juízaou por qualquer outro magistrado, quenão correspondam àquela estruturaconcebida por S. Exa. Isto é suficientepara reconhecer no ato o seu efeitoconcreto, desbordante da funçãocorrecional, que cumpre, pois, fazercessar.

Em suma, concedo parcialmentea segurança para declarar a invalidadedo ato consubstanciado na decisão doEx.mo Juiz Corregedor no PP 127, noaspecto concernente à intervenção,declaradamente realizada no conteúdoda sentença prolatada no processo n.00393-2004-045-03-00-8, e àrecomendação ali contida, alusivas aotópico denominado “Da OrientaçãoGeral de Comportamento”, o que a meuver basta para resguardar, a um sótempo, as prerrogativas institucionais damagistratura, na amplitude dossubstituídos.

Fundamentos pelos quais,

O Órgão Especial do TribunalRegional do Trabalho da TerceiraRegião, à unanimidade, rejeitou apreliminar de incompetência argüidapelo Ministério Público do Trabalho; pormaioria de votos, vencidos os Ex.mos

Juízes Márcio Ribeiro do Valle,Deoclécia Amorelli Dias, AntônioMiranda de Mendonça e EduardoAugusto Lobato, admitiu o mandado de

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segurança coletivo em sua amplaextensão; no mérito, ainda por maioria,vencidos os Ex.mos Juízes Márcio Ribeirodo Valle, Deoclécia Amorelli Dias,Antônio Miranda de Mendonça eEduardo Augusto Lobato, concedeuparcialmente a segurança para declarara invalidade do ato consubstanciado nadecisão do Ex.mo Juiz Corregedor no PP127, no aspecto concernente àintervenção, declaradamente realizadano conteúdo da sentença prolatada noprocesso n. 00393-2004-045-03-00-8, eà recomendação ali contida, alusivas aotópico denominado “Da OrientaçãoGeral de Comportamento”,resguardando as prerrogativasinstitucionais da magistratura, naamplitude dos substituídos. Custas, pelaUnião, no importe de R$20,00,calculadas sobre R$1.000,00, valoratribuído à ação, imune.

Belo Horizonte, 15 de setembrode 2005.

MÁRCIO RIBEIRO DO VALLEPresidente

MARCUS MOURA FERREIRARedator

TRT-01188-2005-000-03-00-0-MSPubl. no “MG” de 22.11.2005

IMPETRANTES: WALDER DE BRITOBARBOSA E OUTRA

IMPETRADO: JUIZ PRESIDENTE DOTRIBUNAL REGIONAL DOTRABALHO DA TERCEIRAREGIÃO

EMENTA: 1) MANDADO DESEGURANÇA - CONCURSOPÚBLICO PARA INGRESSO NACARREIRA DA MAGISTRATURA- INCISO I DO ART. 93 DACONSTITUIÇÃO DAREPÚBLICA, COM A REDAÇÃODADA PELA EMENDACONSTITUCIONAL N. 45/2004 -INSERÇÃO DESSA NORMAENTRE OS PRINCÍPIOSORGÂNICO-ESTATUTÁRIOS DAMAGISTRATURA, DOS QUAIS OESQUEMA ORGANIZATÓRIO-FUNCIONAL DO PODERJUDICIÁRIO EXTRAI A SUAPRÓPRIA CONFORMAÇÃO -MATÉRIA DE LEICOMPLEMENTAR, PODENDOSER TRANSITORIAMENTENORMATIZADA POR ATO DOCONSELHO NACIONAL DEJUSTIÇA (ART. 103-B, § 4º, I),NÃO DOS TRIBUNAIS. 2)EDITAL N. 01/2004, SOB CUJAREGÊNCIA OS IMPETRANTESINSCREVERAM-SE NOCERTAME E CUMPRIRAM ASSUAS ETAPAS - PREVALÊNCIADELE SOBRE A RESOLUÇÃOADMINISTRATIVA N. 1.046/2005DO TST, QUE, A PAR DE DISPORA RESPEITO DE MATÉRIARESERVADA À LEI, AINDARETROAGE PARA BLOQUEAR APROJEÇÃO DE QUALQUEREFEITO PROSPECTIVO DE

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CONCURSOS ATÉ MESMOREALIZADOS. 3) DIREITOLÍQUIDO E CERTO DOSIMPETRANTES À SUANOMEAÇÃO E POSSE, PARACUJA PROTEÇÃO O MANDADODE SEGURANÇA É A GARANTIACONSTITUCIONAL ESPECÍFICA.ORDEM CONCEDIDA. Asnormas dos artigos 93, I e 129, §3º da Constituição da República,com a redação que lhes deu aEmenda Constitucional n. 45/2004, trazem consigo umconceito irresoluto, como écomum aos enunciados queveiculam matériaconstitucional, polissêmicos eabertos quase sempre - o deatividade jurídica de três anos,no mínimo (o que é e a partir dequando se conta), aspecto que,inegavelmente, singularizou-asno contexto da chamadaReforma do Poder Judiciário.O certo é que o art. 93, aoinstituir princípios (rectius:normas-princípio) de regênciada magistratura sobre simesma e princípios deinteresse da jurisdição,estabeleceu que tais,estruturantes que são, deverãoconstar da Lei Complementarque contiver o Estatuto daMagistratura, condicionandodesde logo o âmbito normativodeste. É que se trata, em últimaanálise, do esquemaorganizatório-funcional doPoder Judiciário, a cujorespeito a Constituição dispôscom o objetivo manifesto decriar uma estrutura uniformepara todos os órgãos a queatribuiu a função de prestar ajurisdição.

Não tem, portanto, adequaçãoconstitucional ato normativodos tribunais, concretizado apretexto de regulamentaraquela norma no que dizrespeito ao já referidorequisito, porque não lhescabe dispor sobre as linhas deorganização da carreira, cujomarco inicial é, antes de tudo,a aprovação em concursopúblico. E ao se espalharemabundantemente tantasresoluções quantas são as jáexpedidas, com critériosinteiramente distintos entre si,a revelar que critério emverdade não há, e só haverápela via da unificação, ostribunais legislam sobreconcurso público, quando lhescumpre realizá-lo, nos termosda lei.Como o art. 93, I contém normade eficácia contida, mas nãosem eficácia alguma, não sepodendo ignorar quefreqüentemente o processolegislativo opera o resgatetardio dos problemasconcretos, cabe ao ConselhoNacional de Justiça, em razãode competência expressa (art.103-B, § 4º, inciso I), exercer,mesmo transitoriamente, aatribuição de regulamentar oassunto.No caso, a ResoluçãoAdministrativa n. 1046/2005 doTST, além de disciplinarmatéria reservada à lei, afetougravemente a posição jurídicade quantos participaram deconcursos cujos editais enormas de regência eramanteriores à própria EC n. 45/2004, inclusive alcançando

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certames já realizados,bloqueando-lhes os efeitosprospectivos. Retroaçãoinadmissível, nomeadamentepor suprimir do Edital deConcurso Público o seucaráter vinculante para aAdministração Pública queo instituiu segundo asnormas em vigor à época (RAn. 907/2002), às quais todos oscandidatos foram chamados aaderir expressamente; porviolação à situação de quantosobtiveram sua aprovaçãosegundo as condições domesmo Edital e, finalmente,pela quebra da segurançajurídica, subprincípio doEstado de Direito, do qualdecorre a própria idéia dejustiça material, como temproclamado o STF (MS 22.357,Min. Gilmar Mendes).Segurança que se defere aosimpetrantes, para que sejamnomeados e empossados,observada a ordem declassificação de ambos noconcurso.

Vistos, etc.

RELATÓRIO

Trata-se de mandado desegurança impetrado por WALDER DEBRITO BARBOSA E ANA PAULACOSTA GUERZONI, com pedido deliminar, contra ato do Ex.mo JuizPresidente deste Tribunal,consubstanciado no AVISO por meio doqual S. Exª fez saber aos candidatosaprovados no Concurso Público paraprovimento de cargo de Juiz Substitutoda Justiça do Trabalho da TerceiraRegião, então homologado, o seguinte:

Finalmente, ficam oscandidatos aprovados cientes deque devem apresentar, no prazode 30 (trinta) dias após apublicação deste, adocumentação comprobatória dotempo de atividade jurídica, nosmoldes do que preceitua o art.35, da Resolução Administrativan. 907/2002, do Colendo TribunalSuperior do Trabalho. (DJU de30.08.2005)

Segundo os impetrantes, quedeclaradamente “não possuem o tempomínimo de 3 anos de atividade jurídicanos moldes que o art. 35 da Resoluçãon. 907/2002, em sua nova redação,passou a exigir”, o ato por ambosimpugnado “os impede de obter anomeação e tomar posse no cargo parao qual foram aprovados e classificados”,ao tempo em que permite sejamnomeados e empossados candidatosclassificados em posições inferiores.

Alegam que, ao estabelecer aexigência de que eles comprovem otempo de atividade jurídica, o Impetradolhes impôs requisito que à época dapublicação do Edital as normas entãovigentes para o Concurso não lhesimpuseram, razão pela qual o atoincorre em diversas violações apreceitos constitucionais e legais e aprincípios jurídicos, nomeadamente, oda anterioridade da lei, “que sustenta aforça do Edital como lei do concurso”, oda intangibilidade do direito adquirido eo da proteção do ato jurídico perfeito e,outrossim, os princípios da legalidade,da pessoalidade, da publicidade e daeficiência.

Sustentam ainda que a exigênciaaos bacharéis em Direito de, no mínimo,três anos de atividade jurídica, previstana Emenda Constitucional n. 45, de2004, é “princípio que deverá ser

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observado em uma futura leicomplementar, de iniciativa do SupremoTribunal Federal”, como reza o inciso Ido art. 93 da Constituição, de sorte quea sua veiculação por ResoluçãoAdministrativa é “juridicamenteinadmissível, tanto em razão da violaçãode competência constitucional quantoem razão da violação de direitossubjetivos dos Impetrantes”.

Por derradeiro, argumentam coma necessidade de que a medida liminarlhes seja concedida, para que aautoridade impetrada cumpra aResolução Administrativa n. 907/2002do TST em sua primitiva redação, deforma a garantir-lhes o direito de seremambos nomeados e empossados naordem de classificação, e pedem que,afinal, seja a ação julgada procedente,para afastar-se definitivamente aaplicação da Resolução Administrativan. 1046/2005 do TST no tocante àquelaexigência.

Com a inicial, os documentos def. 15/41.

Deferi-lhes a liminar para afastara exigência de comprovação de trêsanos de atividade jurídica, garantindo-lhes o direito de serem nomeados eempossados, segundo a ordem declassificação, com observância da RAn. 907/2002 do TST, em sua redaçãoprimitiva (f. 43/45).

Seguiu-se, de parte doimpetrado, a manifestação de f. 47/49,com pedido de “Adequação da Liminar”,para que os efeitos desta ficassemrestritos à reserva de vagas em favordos impetrantes, no caso de serconcedida, ao final, a segurança.

Mantida a liminar (f. 54/55),determinei a citação da União Federalpara integrar o pólo passivo comolitisconsorte.

Em reclamação correcionalrequerida pela União (f. 121/127), o

Ex.mo Sr. Ministro Vice-Presidente doTribunal Superior do Trabalho, noexercício da Corregedoria-Geral, deferiua liminar então pleiteada para suspenderos efeitos das liminares concedidasneste e em outro mandado desegurança (01193-2005-000-03-00-2,Relatora a Ex.ma Juíza Alice Monteiro deBarros), “até o julgamento do mérito doscitados mandamus, garantindo-se aosimpetrantes, neste ínterim, a reserva davaga e a garantia da posição na lista declassificação” (f. 128/131).

Como tal decisão foi cassadapelo Pleno do TST, a União requereu aoPresidente daquela Corte quesuspendesse a execução das liminaresdeferidas em ambos os mandados desegurança, no que foi atendida, comose acha na decisão de f. 152/159.

O impetrado prestouinformações (f. 59/70 e documentos def. 71/116), inicialmente relatando osfatos desde a publicação do Edital doConcurso Público n. 01/2004 até aimpetração da segurança. No mérito,bateu-se pela inexistência de direitoadquirido à imutabilidade das cláusulasdo Edital; alegou que a exigênciacontida no inciso I do art. 93 daConstituição reveste-se de eficáciaplena e imediata; teceu consideraçõessobre o ato administrativoinfraconstitucional e seus efeitos e, aofinal, sustentando a juridicidade da RAn. 1046/05 do TST, entendeu que opedido é improcedente.

De sua vez, a União Federalreportou-se às informações daautoridade impetrada e requereu adenegação da segurança (f. 138).

O Ministério Público do Trabalho,pela sua ilustre Procuradora-Chefe,emitiu o parecer de f. 143/149, opinandopela concessão da segurança.

É o relatório.

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VOTO

A norma do inciso I do art. 93 daConstituição da República, em torno decujo alcance trava-se o debate nestaação mandamental, atribuiu significadoa uma situação conhecida e objeto dereflexão nos meios acadêmico ejudiciário - a conveniência de quepostulantes à carreira da magistraturatenham antes formado um acervosuficiente de conhecimento eexperiência prática no campo do Direitoe, implícita, mas conseqüentemente,possam atender à relevância de que,tornando-se juízes, sejam-no à altura deuma idade a partir da qual, presume-se,terão entrado mais sensivelmente nociclo vital e contínuo do processo dematuridade psicológica. Afinal, é dasrelações psicossociais que emergem osconflitos, com a inserção de todos nomeio social.

É exatamente aí, na dialéticaincessante dos conflitos, que o juiz semete, tangido por uma irredutível forçaque o coloca como órgão prismático doDireito. Dadas as funções do cargo e afundada expectativa social de que ascompetências correlatas sejamexercidas com real utilidade para opoder jurisdicional, compreende-seperfeitamente a exigência de que hajatranscorrido algum tempo até ainvestidura de quem se pretenda juiz.O tempo, que estrutura todas aspossibilidades, é a realidade dentro daqual se dá a construção existencial quede si próprio faz o indivíduo.

Daí ter o legislador instituído orequisito de três anos, no mínimo, deatividade jurídica, para ingresso nascarreiras da magistratura e do MinistérioPúblico (artigos 93, I e 129, § 3º). É umingrediente de aptidão técnica epsicológica, que guarda estreita relaçãocom medidas estratégicas de política

judiciária, no seu conjunto articuladasem benefício do aprimoramentocontínuo do corpo de magistradosbrasileiros, destacando-se entre elas oscursos oficiais de preparação,aperfeiçoamento e promoção,ministrados ou reconhecidos por EscolaNacional, seja como etapa obrigatóriado processo de vitaliciamento nacarreira, seja como critério de aferiçãomeritória (art. 93, II, “c” e IV).

O art. 93 estabelece princípios deregência da magistratura sobre simesma e princípios de interesse dajurisdição, que repercutem diretamenteno exercício, por juízes e tribunais, dafunção judicante. Como normasorgânicas e estatutárias - estruturantes,portanto - deverão constar da leicomplementar que contiver o Estatutoda Magistratura.

É certo que o Supremo TribunalFederal já decidiu que as regrasinseridas naquele dispositivo daConstituição não dependem, para quepossam operar e atuar concretamente,da promulgação e edição do Estatutoda Magistratura, pois são elaspressupostos condicionadores daprópria ação normativa do CongressoNacional. Disse-o, com efeito, o MinistroCelso de Mello na ADI 189. Antes já odissera o Ministro Octávio Gallotti, noHC n. 67480-RS.

Entretanto, ao proferir o seu votonaquela mesma ADI, o douto MinistroCelso de Mello, detendo-se nosprincípios de que tratam os incisos doart. 93, deixou assente, a respeito, que:

em sua maioria, estabelecemcritérios objetivos referentes aoingresso na Magistratura e aodesenrolar da carreira judiciária,até a aposentadoria. A naturezaestritamente objetiva dessasregras traduz-se na sua eficácia

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plena e em sua aplicabilidadeimediata, e torna dispensável -mediante adequada interpositiolegislatoris - qualquer integraçãonormativa.

Mas com o advento da EC n. 45/2004, o art. 93 foi extensamentemodificado, tanto pelo acréscimo dedispositivos em que se consubstanciamnovos princípios, de observânciaigualmente obrigatória pela leicomplementar, como pela alteração deoutros nascidos do texto promulgado daConstituição de 1988.

A norma do inciso I, na suaredação atual, já não expressa o critérioobjetivo a que aludira o SupremoTribunal Federal para operar comeficácia plena todos os seus possíveisefeitos, independentemente de ulteriorprovidência legislativa. Ela não é maisum elemento somente condicionador daatividade normativa do PoderLegislativo; antes, reclama o contributoda função positiva do legislador, comose verá.

O seu problema, segundo meparece, não é de grave obscuridade;fosse isto, teria apenas reproduzido aconhecida falta de clareza dos textoslegais, fenômeno que não cessa deocorrer no processo legislativocontemporâneo, no Brasil e em todo omundo ocidental, a mostrar que olegislador real, como legislador racional,não raro é pura ficção (Cf. Karl Larenz,Metodologia da Ciência do Direito, 3.ed., Gulbenkian, p. 439 e seguintes;Manuel Calvo Garcia, Los fundamentosdel método jurídico: uma revisión crítica,ed. Tecnos, p. 217, apud InocêncioMártires Coelho, Interpretaçãoconstitucional, Sergio Fabris Editor, 2.ed., p. 95/96). De mais a mais,dificuldades do texto normativo seresolvem no trabalho hermenêutico,

dado que “a interpretação é parteintegrante do processo legislativo”,conforme escreveu Lúcio Bittencourt hámais de sessenta anos, como se falassepara o momento presente.

Mas já repercute intensamente apolêmica sobre o que seja “atividadejurídica” e o momento a partir do qualela deve contar-se. Trata-se de conceitoirresoluto, como soe acontecer com ospreceitos constitucionais, abertos epolissêmicos que são, cumprindo aointérprete-aplicador a tarefa de dar àregra jurídica o sentido mais próximopossível da realidade que ela se propõea recobrir. O Supremo Tribunal tem sidochamado a examinar a questão e nomandado de segurança n. 25.501 oMinistro Cezar Peluso, ao conceder aliminar, destacou o seguinte:

Neste juízo prévio esumário, tenho por coexistentesos requisitos do fumus boni iurise do periculum in mora,necessários à concessão damedida (art. 7º, inc. II, da Lei n.1.533, de 31.12.51). Com efeito,é dotada de razoabilidadejurídica a alegação de que anorma do art. 129, § 3º, daConstituição da República, naredação da EmendaConstitucional n. 45/2004, nãoimpõe que os 3 (três) anos deatividade jurídica prévia, exigidosdo candidato à carreira doMinistério Público, tenham portermo inicial a aquisição do títulode bacharel. (Cf. MS n. 25.501)

No caso, os impetrantes nãotêm, declaradamente, “o tempo mínimode 3 anos de atividade jurídica nosmoldes que o art. 35 da Resolução n.907/2002, em sua nova redação,passou a exigir”, mas a decisão do

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Ministro Peluso traz à tona uma situaçãode fato que se expande gradualmente -a disseminação, por entre normasadministrativas dos tribunais e órgãosdo Ministério Público, de múltiplasregulamentações sobre o exigidorequisito, estabelecidas consoantecompreensões distintas, facilmentepercebidas da consulta direta aos textosdas resoluções já editadas.

Com efeito, as normas podemprever que se contam os três anos apartir do bacharelado; antes deste, massem precisar o marco inicial; na data dainscrição no concurso; na data danomeação, ou da posse, ou antes até,no momento da homologação docertame; do mesmo modo podemestabelecer critérios diversos paradeterminar-se o que seja atividadejurídica, se é amplo ou restrito o seuconceito, tratando-se assim de questãocuja resposta exige um mínimo dereflexão sobre o próprio Direito e suasdiversificadas técnicas de aplicação. Enão haverá, por certo, um critériounívoco, mas algum o legislador deveráoferecer, centrando-se talvez numaacepção dominantemente pragmáticado discurso jurídico.

Não obstante a respeitabilidadedos tribunais, a do Tribunal Superior doTrabalho, em particular, constituído demagistrados experientes e cultos, nãoparece constitucionalmente adequadoque possam dispor amplamente sobrea questão. Não está em discussão umproblema de economia interna, masuma das exigências organicamentevinculadas à carreira da magistraturabrasileira, com toda a carga derelevância institucional que esta carreiratem para a jurisdição, que sem ela seriainoperante.

No seu amplo espectro, comopoder e função do Estado, a jurisdiçãocompreende a ordem judiciária, com

todos os seus órgãos e respectivascompetências. E a compreende numaunidade metodológica tal que a própriadisciplina jurídico-legal da magistraturajaz no seu largo conceito e deve estarem íntima coordenação com ela. Porisso mesmo é que todos os princípiosdo art. 93 da Constituição (agoraampliados pela EC n. 45/2004) não sereduzem à simples regulação dosdireitos e deveres dos magistrados, poisna sua essência traduzem normasfundamentais de um verdadeiro estatutoorgânico do Poder Judiciário, como fezconsignar o douto Ministro SepúlvedaPertence, ao decidir o HC n. 68.210.

Precisamente por conta do seucaráter orgânico, é que tais normas-princípio condicionam o âmbitonormativo do Estatuto da Magistratura,ao tempo em que estabelecem para simesmas a sua unificada aplicação.

Ao instituírem as suas própriasnormas a respeito do ingresso nacarreira da magistratura,regulamentando, por assim dizer, oinciso I do art. 93 da Constituição, ostribunais do país podem obstruir aunificação da regra, que se deve imporigualmente a todos os órgãos do PoderJudiciário, por expressa vontade dolegislador constituinte, originário ederivado. E, ao se espalharemabundantemente, afetam por certo oesquema organizatório-funcional doJudiciário, a cujo respeito a Constituiçãodispôs com o objetivo manifesto de criaruma estrutura uniforme. É uma questãode conformidade constitucional, que é,ao cabo, um princípio de competência(Cf. CANOTILHO, J.J. Gomes, Direitoconstitucional, ed. Almedina, 1992, p.233/234), a resultar, pois, violado. Só alei pode dar uma conformidadedefinitiva, só ela pode construirlegitimamente a solução adequada àaplicação prática do princípio. Ou a lei

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complementar que veicule, futuramente,o Estatuto da Magistratura, prevista nocaput do mesmo artigo, ou até que sejaela promulgada, lei complementar queintroduza a norma regulamentadora navigente Lei Orgânica da MagistraturaNacional (LC n. 35/79).

Assim, por mais ajustados quepossam parecer os critérios que seadotem para atender ao preceitoconstitucional, terão eles ultrapassadoos limites formal e material decompetência constitucionalmenteinstituída, que não se suprime nem setransfere fora do processo legislativo.Aos tribunais não é permitido em talcaso atuar constitutivamente; cada umdeles é órgão de soberania do poderestatal, mas todos se sujeitam aosmesmos princípios orgânico-estatutários do art. 93 da Constituiçãoe, em decorrência, à reserva da leicomplementar prevista na norma eindispensável, como visto, aotratamento unificado e à eficácia plenado referido dispositivo, desde aalteração promovida pela EC n. 45/2004.

Como é útil o procedimento dereconstruir a nomogênese jurídica,através do caminho percorrido pelolegislador histórico, observo que,mesmo no regime constitucionalanterior, antes ainda da EC n. 07/1977,quando talvez fosse até mais amplo opoder regulamentar dos tribunais sobreaspectos da carreira judiciária, em facede resumidos princípios estatutário-constitucionais da magistraturabrasileira, Pontes de Miranda jáinvectivava os excessos na formulaçãode regras atinentes à situação que entãodenominara de “política da investidurajudiciária”; “organizar concursos”, diziaele, “não é legislar sobre concursos”,embora reconhecesse a competênciadas Cortes, necessitatis causa, para

editar regras jurídicas quando não ashouvesse (Comentários à Constituiçãode 1967, RT, tomo IV, p. 298). Tal espaçoviu-se reduzido com a LOMAN, nascidadaquela Emenda, e hoje, mais do quenunca, o organizar não é legislar sobreconcursos, exatamente pela razão deque aos tribunais não é dado disporsobre as linhas organizatórias dacarreira.

Não obstante todos os aspectosaté aqui examinados, tenho que,enquanto não se editar a leicomplementar indispensável à plenaaplicação do art. 93, I (não se podendoignorar que muitas vezes o processolegislativo opera o resgate tardio dosproblemas concretos), esta norma, deeficácia contida, é certo, mas não semeficácia alguma, pois tal a transformariaem exortação apenas ao legisladorinfraconstitucional, pode receber ereceberá, transitoriamente, do ConselhoNacional de Justiça a integraçãooperativa de que carece, dada a posiçãoque este órgão ocupa no quadrojurídico-institucional do Poder Judiciário(v. o art. 103-B, principalmente odisposto no § 4º, inciso I), sendoinduvidoso, diante da momentâneainexistência de lei, que somente ele, naesfera dos fatos, poderá expedir umaregulamentação necessariamenteunificadora, para todo o PoderJudiciário, dos requisitos criados pelaEC n. 45/2004 para o ingresso nacarreira, mediante concurso público.

Uma provável regulamentaçãopoderá dispor, se o CNJ julgarconveniente, sobre a sua aplicaçãocomo norma intertemporal, tendo emvista os concursos que à épocaestiverem em andamento, o que jamaisincidiria, pela inadmissibilidade de umqualquer efeito retrooperante, sobre asituação de candidatos aprovados emcertames já encerrados e homologados,

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como é o caso dos impetrantes, que sesubmeteram a normas e condiçõesfixadas em Resoluções Administrativase Editais datados de antes da EC n. 45/2004, como são a RA n. 907/2002 doTST, em sua redação anterior à RA n.1046/2005, a RA 095/2004 e o Edital doConcurso Público n. 01/2004, ambos doTribunal Regional do Trabalho da 3ªRegião.

Diante, pois, de todo o quadroaté aqui delineado é que reputointeiramente procedentes osfundamentos da impetração,parecendo-me rigorosamente corretatoda a linha de argumentaçãoconstruída a partir do Edital n. 01/2004,sob cuja égide os impetrantes fizerama sua inscrição para o Concurso ecumpriram as etapas que se seguiram,com a realização das provas. Comefeito, dizem eles na petição inicial que,ao exigir-lhes a comprovação do tempode atividade jurídica, a digna autoridadeimpetrada lhes impôs requisito que a leinão exige e que não constou do Editaldo Concurso e das normas que oregiam, vigentes ao tempo de suapublicação.

Atrelado que está, na suagênese, ao princípio da publicidade,princípio vetor de transparência naAdministração Pública, como decorre docaput do art. 37 da Constituição, o Editalnão é mera diretriz ou impostação tão-somente, mas lei material do concursopúblico, do interesse de todos e,designadamente, de quantos queiramdele participar.

A Constituição da República a elese refere expressamente no art. 37, IV,o que deve conduzir o intérprete a umareflexão mais detida sobre o seuconteúdo e sobre a extensão dos seusefeitos, enquanto norma de regência docertame.

É induvidoso que o Edital deve

guardar relação harmônica com todo ocorpo normativo que se lhe sobrepõe,mas, ajustando-se a tanto, passa a serum procedimento administrativo decaráter vinculante para a AdministraçãoPública e os candidatos, uma garantiade que as condições e normas serãoiguais para todos estes.

A propósito, a doutaProcuradora-Chefe do MPT tocou noâmago da questão, como se vê daseguinte passagem do judicioso parecerque lavrou nos autos:

[...] a norma não pode retroagirpara lesar os integrantes darelação jurídica regularmenteestabelecida, o que importariaafronta ao ato jurídico perfeito,com evidente comprometimentoda segurança jurídica. Não sepode exigir dos autores oadimplemento de uma condiçãonão vigente quando dapublicação do edital, sob pena dese declarar nela a própriainscrição no certame. No caso,à época da publicação do edital,os impetrantes atendiam aosrequisitos nele previstos e, dessemodo, não se pode aplicar novanorma em prejuízo do candidatoque se inscreveu no certame elogrou aprovação sob a regênciade norma pretérita. (f. 148)

E o parecer ainda invoca decisãodo STF, de todo adequada à espécie:

CONCURSO - EDITAL -PARÂMETROS. Os parâmetrosalusivos ao concurso hão deestar previstos no edital.Descabe agasalhar ato daAdministração Pública que, apóso esgotamento das fasesinicialmente estabelecidas, com

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a aprovação nas provas, implicacriação de novas exigências. Asegurança jurídica,especialmente a ligada à relaçãocidadão/Estado rechaça amodificação pretendida.(RE 118927-RJ, Rel. Min. MarcoAurélio, julgamento 07.02.95, 2ªTurma)

Pois bem. A Resolução do TSTn. 1046/2005, de 07.04.2005, introduziualterações na Resolução n. 907/2002,passando a exigir do Bacharel emDireito, na data da nomeação, três anos,no mínimo, de atividade jurídica,consoante dispõe o art. 35, cujos §§ 5ºa 8º definem o que se devecompreender como tal. E no seu art. 2ºatribuiu efeito retroativo àquelerequisito, nos seguintes termos:

A exigência de 3 (três)anos de atividade jurídica paraingresso na magistratura temaplicação a partir de 31.12.2004,inclusive aos concursosrealizados antes dessa data,como também àqueles iniciadosanteriormente e ainda nãoencerrados.

Ora, logo se vê que háproblemas incontornáveis na ResoluçãoAdministrativa n. 1046/2005. Enumeroos mais sensíveis, segundo a linha deentendimento que expus até aqui: a) elaestabelece uma entre váriascompreensões possíveis para umrequisito conceitualmenteindeterminado, em ordem a afetar ocaráter orgânico do princípio que secontém no inciso I do art. 93 daConstituição, motivo pelo qual, insisto,tal deve ser fixado de forma geral eimpessoal para ser indistintamenteaplicável, donde a razão de o

constituinte remeter o tratamento daquestão à lei complementar; b) matériaa cujo respeito impera a cláusula dereserva legal não é conversível emmatéria sobre a qual possa dispor aAdministração Pública, como se oadministrador ficasse nela sub-rogadoipso facto e, portanto, no lugar da leicomplementar de que trata o caput doart. 93 da Constituição não vale o atonormativo do TST; c) a Resolução n.1046, no seu art. 2º, oblitera, com todasas vênias, a significação maisinequívoca de um outro princípiointrinsecamente ligado ao da legalidade,que concerne à irretroatividade da lei(“princípio complementar ao dalegalidade”, chama-o SILVA, JoséAfonso da, Curso de direitoconstitucional positivo, 25. ed. MalheirosEditores, p. 430) - lei, quero dizer, emsentido lato, para compreender os atosnormativos em geral, pois, como bemresumem os impetrantes, é a lei “quesustenta a força do Edital como lei doconcurso”, ao tempo em que entendo acláusula de irretroatividade não com ocaráter absoluto e intransponível que selhe costuma emprestar, mas comoprincípio de tutela ou garantia contra aretroação que seja capaz de quebrar asegurança jurídica do indivíduo, “que éa razão principal de ser dairretroatividade”, como explanaBASTOS, Celso Ribeiro, Comentários,ed. Saraiva, 1989, v. 2, p. 192). E esteprincípio foi afetado com uma tal inflexãoque a Resolução n. 1046/2005 retroagepara alcançar até mesmo concursos járealizados, de sorte a bloquear adimensão prospectiva dos efeitos de umprocedimento administrativo entãoconsumado no tempo.

Daí por que o edital, ao qual osimpetrantes expressamente aderiram àépoca em que se inscreveram noconcurso e sob cuja regência este

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realizou-se, atendidos assim todos osrequisitos e exigências nele instituídas,não pode ser simplesmente ignorado,como se tivesse sido um nada, ou comose fora mera ficção. Aprovados segundoas normas vigentes naquele ato, osimpetrantes têm direito líquido e certo ànomeação e posse no cargo de JuizSubstituto, já que não se estabeleceuainda a vinculante prescrição da lei, quepudesse atingir a sua situação jurídica,configurada a partir do Edital n. 001/2004.

De resto, são em tese corretosos fundamentos expendidos pela dignaautoridade impetrada acerca do alcancedo ato administrativo e da suaindispensabilidade para fazer atuar, emcada situação concreta, a solução quemelhor atenda ao interesse público, talcomo postula a doutrina jurídica citadanas informações. Mas o problema éoutro, como venho afirmando desde oinício: o ato administrativo em questão(Resolução n. 1046/2005, do TST)suprime a lei precisamente onde aConstituição a impõe. E não está o TSTautorizado a tanto, nem mesmotransitoriamente, pois aí, insisto, é oCNJ que tem uma tal atribuição.

Em face do exposto, julgoprocedente o pedido para determinarque se cumpra a ResoluçãoAdministrativa n. 907/2002 do TST, emsua redação primitiva, afastando assima aplicação da Resolução Administrativan. 1046/2005 do TST, no que respeita àexigência de três anos de atividadejurídica para nomeação e posse nocargo de Juiz do Trabalho Substituto daTerceira Região, e determinando quesejam os impetrantes nomeados eempossados no referido cargo,observada a posição de ambos naordem de classificação do concurso,com efeito ex tunc relativamente aoexercício.

SÚMULA DO VOTO

Por todo o exposto, concedo asegurança requerida para, afastando aaplicação da Resolução Administrativa n.1046/2005 do TST, no que respeita àexigência de três anos de atividadejurídica para nomeação e posse no cargode Juiz do Trabalho Substituto daTerceira Região, determinar que sejamos impetrantes nomeados e empossadosno referido cargo, observada a posiçãode ambos na ordem de classificação doconcurso, com efeitos ex tuncrelativamente ao exercício, ou seja, comose em exercício tivessem entrado namesma data de seus colegas deconcurso já empossados, para fins deantigüidade na carreira.

Expeça-se ofício ao Ex.mo JuizPresidente do Tribunal, autoridadeimpetrada, para dar cumprimento àpresente decisão, tão logo seja delacomunicado (Lei n. 1.533/51, arts. 11 e 12).

Submeto esta ao duplo grau dejurisdição, nos termos do parágrafoúnico do art. 12 da Lei n. 1.533/51.

Custas, pela União, no importede R$20,00, sobre R$1.000,00, imune.

Fundamentos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, por seu TribunalPleno, em sessão ordinária realizada,decidiu, à unanimidade de votos,conhecer do mandamus e conceder asegurança requerida para, afastando aaplicação da Resolução Administrativa n.1046/2005 do TST, no que respeita àexigência de três anos de atividadejurídica para nomeação e posse no cargode Juiz do Trabalho Substituto daTerceira Região, determinar que sejamos impetrantes nomeados e empossadosno referido cargo, observada a posiçãode ambos na ordem de classificação do

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concurso, com efeitos ex tuncrelativamente ao exercício, ou seja, comose em exercício tivessem entrado namesma data de seus colegas deconcurso já empossados, para fins deantigüidade na carreira. Expeça-se ofícioao Ex.mo Juiz Presidente do Tribunal,autoridade impetrada, para darcumprimento à presente decisão, tãologo seja dela comunicado (Lei n.1.533/51, arts. 11 e 12). Decisão sujeitaao duplo grau de jurisdição, nos termosdo parágrafo único do art. 12 da Lei n.1.533/51. Custas, pela União, no importede R$20,00, sobre R$1.000,00, imune.

Belo Horizonte, 17 de novembrode 2005.

DEOCLÉCIA AMORELLI DIASPresidente

MARCUS MOURA FERREIRARelator

TRT-00959-2005-108-03-00-0-ROPubl. no “MG” de 01.10.2005

RECORRENTE: UNIÃO FEDERALRECORRIDA: MAKRO ATACADISTA S/A

EMENTA: MANDADO DESEGURANÇA -SUPERMERCADOS -FUNCIONAMENTO AOSDOMINGOS E FERIADOS. ACarta Magna de 1988estabelece, em seu artigo 170,que a ordem econômica funda-se no primado da valorização dotrabalho e no respeito à livreiniciativa. Neste mesmo sentido,o art. 5º, inciso XIII, que conferea liberdade do exercício dequalquer trabalho, ofício ouprofissão. A liberdade de

iniciativa é, em outras palavras,o direito de escolha da atividadeeconômica, a forma e o modode seu exercício. Obviamente,não constitui faculdadeilimitada, restandocondicionada às restriçõeslegais, entre elas, o respeito adireitos mínimos de segurançae saúde dos trabalhadores, dedignidade humana e dos demaisinteresses coletivos. Assim, aAdministração Pública atuaatravés de seu poderfiscalizador, de polícia, impondoregras ao livre exercício daatividade econômica ouprofissional, impedindo que ointeresse particular prevaleçasobre o público. Dentro destequadro, conclui-se que asrestrições do Poder Públicoatuam como uma exceção. E, nocaso em tela, não há razão paraas mesmas, uma vez que ofuncionamento da impetrante,nos domingos e feriados,encontra-se amparado pordispositivos legais. A Lei n.10.101/00, pelo seu art. 6º,autoriza o funcionamento docomércio varejista, em geral,aos domingos, a partir de09.11.97, observado o inciso I doart. 30 da CF/88. Por outro lado,o Decreto n. 27.048/49, queregulamenta a Lei n. 605/49, trazum elenco taxativo sobre asatividades permitidas nos diasde repouso, aí incluídos,obviamente, os feriados. Ocontrato social da impetranterevela que seu objeto é adistribuição e o comércio dotipo atacadista ou varejista,inclusive em consignação oucomissão, por conta própria ou

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de terceiros, nacionais ouestrangeiros, de gênerosalimentícios e não alimentícios,medicamentos em geral ecorrelatos, produtos de limpeza,móveis, tapetes, artigosfarmacêuticos, produtosquímicos, dietéticos, etc. Se a leidispõe que o comércio varejista,em geral, goza do privilégio dofuncionamento nos domingos,não há razão para discriminar oatacadista, pena de ofensa aocaput do art. 5º da CF/88. Deoutra face, não se pode dizerque o decreto regulamentadorda Lei n. 605/49 excluiu ossupermercados. Isto porque orol constante do art. 7º não podeser interpretado segundoapenas os rigores da lei. Odireito não é estático, evoluicom a sociedade e com omomento histórico. O art. 5º daLICC recomenda ao intérpreteque se observem os fins sociaisa que a norma jurídica se dirigee as exigências do bem comum.Portanto, há de ser observadoque, nos tempos atuais, ossupermercados (ouhipermercados) são osmercados a que se refere o art.7º do Decreto n. 27.048/49,registrando que, se se permitiuque os estabelecimentos quecomercializam menor gama deprodutos funcionem nosdomingos e feriados, maiorrazão existe para que aquelesque englobam todos osprodutos também operem nosreferidos dias. Do mesmomodo, é de se pontuar que amodernização da sociedadetrouxe menor tempo ao homeme à mulher para realizarem as

tarefas mínimas do lar, nasquais se compreendem ascompras de produtos básicospara a subsistência da família.Portanto, pode-se mesmo dizerque o funcionamento dossupermercados nos dias derepouso não só atende à livreiniciativa, como também aointeresse público moderno,respeitados, obviamente, osdireitos dos trabalhadores,aliás, como previsto namulticitada Lei n. 10.101/00.Assim, correta a decisão deorigem, que concedeu asegurança.Ao intérprete impõe-se a leitura da lei de modo que asua linguagem não se torneperempta, desatualizada, antiga,ultrapassada. Com o avançotecnológico, com aglobalização, com atransnacionalização dosmercados, a necessidade de oempregado usufruir o repousosemanal no domingo, assimcomo gozar o feriado civil oureligioso no próprio dia, ficacada vez mais esbatido navontade do próprio empregado.Muitos até preferem que o gozose dê em outro dia da semana,conforme permite aConstituição. Nos dias atuais, olazer pode ser usufruído emqualquer dia da semana com amesma intensidade que nosdomingos e feriados. O empregoestá em franco e aberto declínio,devendo a lei ser interpretada emconsonância com a realidade,oxigenando o mercado,respeitadas as normas desegurança e saúde dotrabalhador. O favorecimentoao fornecimento de bens e

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serviços vinte e quatro horaspor dia, sete dias na semana,trinta ou trinta e um dias no mês,trezentos e sessenta e cincodias no ano, é uma tendência dasociedade pós-moderna. Ohomem quer vencer o tempo eencurtar a distância e otrabalhador, que somos todosnós, de uma forma ou de outra,tudo temos feito para nosadaptarmos a esta realidade.Novos tempos, direito novo, istoé, leitura contemporânea, semferir a dignidade do trabalhador,mas outorgando modernidade àlei, que, em matéria como esta,deveria sempre ceder espaçopara a negociação coletiva.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso ordinário,interposto de decisão proferida peloEx.mo Juiz Federal da 14ª Vara de BeloHorizonte - Seção Judiciária de MinasGerais, em que figuram, comorecorrente, UNIÃO FEDERAL e, comorecorrida, MAKRO ATACADISTA S/A.

RELATÓRIO

O Ex.mo Juiz Federal da 14ª Varade Belo Horizonte - Seção Judiciária deMinas Gerais, EVALDO DE OLIVEIRAFERNANDES FILHO, através dasentença de f. 95/104, concedeu asegurança pleiteada pela impetranteMAKRO ATACADISTA S/A, nos autos domandado de segurança preventivoimpetrado contra ato do DelegadoRegional do Trabalho em Minas Geraise do Subdelegado do Trabalho emContagem, determinando que estes, porsi ou por seus agentes, abstenham-sede autuar o estabelecimento daimpetrante, acaso esteja funcionandoaos domingos e feriados.

Remessa oficial (f. 104).Inconformada, a União Federal

interpôs apelação às f. 118/20,aduzindo, em síntese, que o contratosocial de f. 32/46 revela que aimpetrante, além do comércio varejista,dedica-se também ao atacadista, peloque não se insere no estrito rol doDecreto n. 27.048/49, ressaltando,ainda, que o labor aos domingos eferiados é excepcional, justificando-sesomente nos casos da lei (art. 1º da Lein. 605/49 e art. 67 da CLT).

Não houve contra-razões,conforme certidão de f. 122.

O d. Ministério Público Federal,pelo parecer da DRª TÂNIA MARIAFREITAS DE SOUZA, ProcuradoraRegional da República, de f. 127/32,opinou pelo conhecimento eimprovimento do apelo e da remessaoficial.

O Ex.mo Desembargador FederalANTÔNIO EZEQUIEL, Relatordesignado no Egrégio Tribunal RegionalFederal da 1ª Região, declinou dacompetência em favor deste Eg.Tribunal, com fulcro na EmendaConstitucional n. 45/2004,determinando a imediata remessa dosautos, conforme decisão de f. 134.

O Ex.mo Juiz Corregedor desteTribunal, em exercício da Vice-Presidência, ANTÔNIO FERNANDOGUIMARÃES, determinou o envio dosautos à Diretoria da Secretaria deAtermação e Distribuição de Feitos de1ª Instância, a fim de proceder àdistribuição a uma das Varas doTrabalho desta Capital, pelo que, apósa devida autuação e cadastramento, naforma da decisão proferida no PP00650-2005-000-03-00-1, com aaquisição do respectivo número único,fossem eles remetidos à 2ª Instância,para distribuição a uma das Turmasjulgadoras (f. 138).

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O d. Ministério Público doTrabalho, em parecer da DRª MARIAMAGDÁ MAURÍCIO SANTOS, de f. 141/42, opinou pela confirmação do julgado,ratificando o parecer de f. 127/32.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

Conheço da apelação interpostacomo recurso ordinário, considerando odisposto no art. 2º da InstruçãoNormativa n. 27/2005 do C. TST, comobem realçou o Ex.mo Juiz Corregedor noexercício da Vice-Presidência deste Eg.TRT, à f. 138.

Observe-se que, tendo corrido owrit na Justiça Federal, o prazo para aapelação é de 30 dias, consoante o art.508 do CPC, em dobro, em face dapresença de órgão público (art. 188 doCPC).

Conheço da remessa oficial, porimperativo legal.

Juízo de mérito

Analiso em conjunto a remessaoficial e o recurso voluntário.

Discorda a União Federal da r.sentença recorrida, aduzindo, emsíntese, que o contrato social de f. 32/46 revela que a impetrante, além docomércio varejista, dedica-se tambémao atacadista, pelo que não se insereno estrito rol do Decreto n. 27.048/49,ressaltando, ainda, que o labor aosdomingos e feriados é excepcional,justificando-se somente nos casos dalei (art. 1º da Lei n. 605/49 e art. 67 daCLT).

Nenhuma censura merece odecisum.

A Carta Magna de 1988estabelece, em seu artigo 170, que a

ordem econômica funda-se no primadoda valorização do trabalho e no respeitoà livre iniciativa. Neste mesmo sentido,o art. 5º, inciso XIII, que confere aliberdade do exercício de qualquertrabalho, ofício ou profissão.

A liberdade de iniciativa é, emoutras palavras, o direito de escolha daatividade econômica, pelo cidadão,compreendidos, também, a forma e omodo de exercício.

Obviamente, não se constituifaculdade il imitada, restandocondicionada às restrições legais, entreelas, o respeito a direitos mínimos desegurança e saúde dos trabalhadores,de dignidade humana e dos demaisinteresses maiores, coletivos.

Assim, a Administração Públicaatua através de seu poder fiscalizador,de polícia, impondo negativas ao livreexercício da atividade econômica ouprofissional, impedindo que o interesseparticular prevaleça sobre o público.

Dentro deste quadro, conclui-seque as restrições do Poder Públicoatuam como uma exceção.

E, no caso em tela, não há razãopara as mesmas, uma vez que ofuncionamento da impetrante, nosdomingos e feriados, encontra-seamparado por dispositivos legais.

A Lei n. 10.101/00, pelo seu art.6º, autoriza o funcionamento do comérciovarejista, em geral, aos domingos, apartir de 09.11.97, observado o inciso Ido art. 30 da CF/88.

Por outro lado, o Decreto n.27.048/49, que regulamenta a Lei n.605/49, traz um elenco taxativo sobreas atividades permitidas nos dias derepouso, aí incluídos, obviamente, osferiados.

O contrato social de f. 32/46revela que a impetrante tem por objetoa distribuição e o comércio do tipoatacadista ou varejista, inclusive em

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consignação ou comissão, por contaprópria ou de terceiros, nacionais ouestrangeiros, de gêneros alimentícios enão alimentícios, medicamentos emgeral e correlatos, produtos de limpeza,móveis, tapetes, artigos farmacêuticos,produtos químicos, dietéticos, etc.

A distinção pretendida pelaUnião Federal não prospera, porqueamparada em frágeis pilares.

Ora, se a lei dispõe que ocomércio varejista, em geral, goza doprivilégio do funcionamento nosdomingos, não há razão para discriminaro atacadista, pena de ofensa ao caputdo art. 5º da CF/88.

Sob outra face, não se pode dizerque o decreto regulamentador da Lei n.605/49 excluiu os supermercados.

Isto porque o rol constante do art.7º não pode ser interpretado segundoapenas as friezas da lei.

O direito não é estático, evoluicom a sociedade e o momento histórico.

O art. 5º da LICC recomenda aointérprete do direito que se observemos fins sociais a que a lei se dirige e asexigências do bem comum.

Portanto, há de ser observadoque, nos tempos atuais, ossupermercados (ou hipermercados) sãoos mercados a que se refere o art. 7ºdo Decreto n. 27.048/49, registrandoque, se se permitiu que osestabelecimentos que comercializammenor gama de produtos funcionem nosdomingos e feriados, maior razão existepara que aqueles que englobam todosos produtos também operem nosreferidos dias.

Do mesmo modo, é de sepontuar que a modernização dasociedade trouxe o menor tempo aosindivíduos para realizar as tarefasmínimas do lar, aí compreendidas ascompras de produtos básicos para asubsistência da família. Muitas vezes,

restam-lhes apenas os domingos eferiados para tanto.

Portanto, pode-se mesmo dizerque o funcionamento dossupermercados nos dias de repousonão só atende à livre iniciativa, comotambém ao interesse público moderno.

E não há nenhuma ofensa adireitos mínimos dos trabalhadores.

A uma, porque, cuidando-se deamplo negócio, promove-se o rodíziodos empregados nesses dias,possibilitando, até, a contratação deoutros, pelo que o labor em domingos eferiados torna-se eventual para essestrabalhadores e, também, benéfico, como recebimento de remuneração superior.

A duas, pois determinado pela v.sentença o respeito ao repouso semanalremunerado no domingo pelo menosuma vez a cada quatro semanas,consoante reza a Lei n. 10.101/00.

Por derradeiro, irrelevantes asquestões levantadas sobre acompetência do Município para disporsobre assuntos locais, entre eles, ofuncionamento do comércio nos dias derepouso, porque não há prova nos autosde existência de lei municipal expressasobre o tema ventilado neste mandamus.

A matéria vem sendosistematicamente decidida em nossostribunais superiores, pendendo ajurisprudência pela tese da impetrante,citando, por ex., o recentíssimo arestodo STJ:

EMENTA: ADMINISTRATIVO.S U P E R M E R C A D O S .FUNCIONAMENTO AOSDOMINGOS E FERIADOS. LEIN. 605/49 E DECRETO N.27.048/49. POSSIBILIDADE. 1.É permitido o funcionamento desupermercados aos domingos eferiados. Precedentes. 2.Recurso especial provido.

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(REsp 142992/RS; RECURSOESPECIAL 1997/0054966-6 - DJ14.02.2005 - p. 151, Rel. MinistroJoão Otávio de Noronha - 2ªTurma)

Assim, correta a decisão deorigem, que concedeu a segurança.

Nego provimento.

Isto posto, conheço da remessaoficial e do recurso voluntário da UniãoFederal e, no mérito, nego-lhesprovimento.

Fundamentos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, pela sua QuartaTurma, à unanimidade, conheceu daremessa oficial e do recurso voluntárioda União Federal; no mérito, semdivergência, negou-lhes provimento.

Belo Horizonte, 21 de setembrode 2005.

LUIZ OTÁVIO LINHARES RENAULTRelator

TRT-00106-2005-079-03-00-8-ROPubl. no “MG” de 17.09.2005

RECORRENTE: ANDREA VILELA DECARVALHO PEREIRA

RECORRIDO: MUNICÍPIO DE ILICÍNEA

EMENTA: SERVIDOR PÚBLICO- COMPETÊNCIA - JUSTIÇA DOTRABALHO - INTERPRETAÇÃODO ARTIGO 114 DA CF/88. Aodizer que “Compete à Justiçado Trabalho processar e julgaras ações oriundas da relaçãode trabalho, abrangidos osentes de direito público externo

e da administração públicadireta e indireta da União, dosEstados, do Distrito Federal edos Municípios”, o legisladorconstitucional usou delinguagem explícita, objetiva eclara, que não admite outroentendimento, senão o queprovém de sua construçãosemântica. A expressão “ente”tem caráter generalizante e seempregada em sentidofilosófico para indicar “tudo oque existe”, sem qualqueroutra consideração, ficandopara as diferentes ciências asclassificações possíveis deacordo com seu objeto. Aoempregar a palavra “ente” emrelação à administraçãopública direta e indireta daUnião, dos Estados, do DistritoFederal e dos Municípios, ficouclara e seguramente garantidaa competência para julgar ascontrovérsias entre servidorespúblicos e as entidades dedireito público interno,independentemente danatureza do vínculo jurídico. Ainterpretação da norma, pormais livre que seja, não podedesviar-se do sentido literal daspalavras que lhe dãocontextura semântica. Emboranão exista o método exegéticoda “interpretação literal”, há,sem dúvida, interpretação ainterpretação restrita, quando alinguagem, pela sua clareza eimediatidade, não traz dúvidasou incertezas ao espírito dointérprete. Além da vontadeexpressa da Constituição ematribuir esta competência àJustiça do Trabalho, através detexto objetivo e claro, outros

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inequívocos apontam namesma direção e reforçam aconvicção do intérprete:1. Não há mais regime jurídicoconstitucional entre servidorespúblicos e o Poder que osadmite.2. A própria Constituição falaem “emprego público”, no art.37, I, abrindo a possibilidadede contratação fora do regimeestatutário. Esta possibilidadejá está expressamentereconhecida na Lei n. 9.962/00,que prevê a contratação deservidores para empregospúblicos.3. Ao servidor público foigarantido, pela Constituição de88, o direito de sindicalizaçãoe greve - art. 37, VI e VII, o qualera restrito aos empregados deempresas privadas e aosempregados de empresaspúblicas e sociedades deeconomia mista- inciso II do §1º do art. 173 da CF.4. A negociação coletiva e suamaterialização jurídica atravésde convenção coletiva, emboranão previstas na Constituição,existem e são intensamenteexercidas na prática, quandohá greve de servidores.

Todos estes fatos demonstramque não há mais regimeestatutário no Direito Públicobrasileiro, mas sim um sistemamisto, com partes de um e deoutro, segundo asnecessidades daAdministração e da prestaçãode serviço público. Portanto,nada mais natural do quesubmeter as controvérsias quedaí nascem a uma jurisdição

única, para uniformizar oentendimento e tratarigualmente, do ponto de vistajurídico, uma situação que estáuniformizada pela prática davida. Este entendimento maisse reforça à luz do inciso I doart. 114 da Constituição, com anova redação que lhe deu a ECn. 45/04, que conferiu à Justiçado Trabalho competência parajulgar “ações oriundas darelação de trabalho”. Estasrelações de trabalho existemsempre que alguém exerceuma atividade em proveito deoutrem, não mudando suanatureza ontológica se éprestado para o Estado ou parao particular. A liminar proferidano julgamento da ADIN n. 3.395-6 não obriga os juízesinferiores, nos termos do § 2ºdo art. 102 da Constituição,pois só possui efeito vinculantea decisão definitiva de méritoem ação direta deinconstitucionalidade oudeclaratória deconstitucionalidade. Portanto,até que seja definitivamentejulgada, a questão continua emaberto e deve ser debatida portodos os segmentosinteressados, a fim de que oSTF tenha, da forma maiscompleta possível, dados einformações para o julgamentode tão importante tema.

1 - RELATÓRIO

Ao de f. 12/13, acrescento que aMM. VARA DO TRABALHO de Varginhajulgou extinto o processo semjulgamento do mérito nos termos doinciso IV do art. 267 do CPC.

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A reclamante recorreordinariamente às f. 15/18, pugnandopela reforma in totum do julgado, sendodeclarada a competência destaEspecializada para o julgamento daação ou que seja suspenso o presentefeito até o julgamento final da ADIN n.3.395-6; conforme análise que se farána fundamentação.

Inexistem contra-razões.A d. PRT se pronunciou sobre o

feito à f. 26, opinando pelo seuconhecimento e desprovimento.

É o relatório.

2 - FUNDAMENTOS

2.1 - Admissibilidade

Regularmente interposto(s),conheço do(s) recurso(s).

2.2 - Mérito

2.2.1 - Servidor públicoestatutário - EC n. 45/04 - Competênciada Justiça do Trabalho

Insurge-se a reclamante contraa r. sentença em que foi extinto oprocesso sem julgamento do mérito nostermos do inciso IV do art. 267 do CPC.

Alega, em síntese, que a simplesexistência de liminar proferida nojulgamento da ADIN n. 3.395-6, por partedo Ministro Nelson Jobim, não teria ocondão de suspender a eficácia da novaredação dada ao art. 114 da CF/88 pelaEC n. 45/04.

Aduz que uma decisão liminarem ação direta de inconstitucionalidadenão vincula os demais órgãos do PoderJudiciário, não havendo que falar deefeito erga omnes, sendo plenamentecompetente esta Especializada para aanálise e julgamento da lide proposta.

Alternativamente, caso assim

não se entenda, pleiteia que sejasuspenso o presente feito até o trânsitoem julgado da ADIN n. 3.395-6.

Uma vez mantida a r. sentençaque declarou a incompetência daJustiça do Trabalho, requer a remessados autos ao Juízo Cível da Comarcade Boa Esperança nos termos do art.113 do CPC.

Razão lhe assiste.O meu entendimento é no

sentido de que a EC n. 45/04efetivamente ampliou a competência daJustiça do Trabalho, tendo sido essa aintenção do legislador ao redigir arespectiva emenda constitucional.

A Justiça do Trabalho passou aser não apenas competente para julgardemandas entre empregado eempregador, mas entre qualquerprestador de serviços e o seu tomador,inclusive a administração públicamunicipal, como no presente caso.

Compartilho ainda doentendimento exposto nas razõesrecursais no sentido de que a decisãoliminar do STF não possui os efeitospretendidos pelo reclamado, uma vezque ainda não foi julgado o seu méritoe nem houve o respectivo trânsito emjulgado, o que então obrigaria asinstâncias inferiores.

Também entendo não ser o casode suspensão do feito, pois nesse casoa principal prejudicada seria a própriaautora que ficaria na longa espera deum julgamento definitivo por parte doEg. STF, enquanto aguarda o possívelpagamento de crédito de naturezaalimentar como o que aqui se reivindica.

Ao dizer que “Compete à Justiçado Trabalho processar e julgar as açõesoriundas da relação de trabalho,abrangidos os entes de direito públicoexterno e da administração pública diretae indireta da União, dos Estados, doDistrito Federal e dos Municípios”, o

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legislador constitucional usou delinguagem explícita, objetiva e clara, quenão admite outro entendimento, senão oque provém de sua construção semântica.

A expressão “ente” tem carátergeneralizante e se empregada emsentido filosófico para indicar “tudo oque existe”, sem qualquer outraconsideração, ficando para as diferentesciências as classificações possíveis deacordo com seu objeto.

Ao empregar a palavra “ente” emrelação à administração pública diretae indireta da União, dos Estados, doDistrito Federal e dos Municípios, ficouclara e seguramente garantida acompetência para julgar ascontrovérsias entre servidores públicose as entidades de direito público interno,independentemente da natureza dovínculo jurídico.

A interpretação da norma, pormais livre que seja, não pode desviar-se do sentido literal das palavras quelhe dão contextura semântica. Emboranão exista o método exegético da“interpretação literal”, há, sem dúvida,interpretação a interpretação restrita,quando a linguagem, pela sua clarezae imediatidade, não traz dúvidas ouincertezas ao espírito do intérprete.

Além da vontade expressa daConstituição em atribuir estacompetência à Justiça do Trabalho,através de texto objetivo e claro, outrosinequívocos apontam na mesma direçãoe reforçam a convicção do intérprete:

1. Não há mais regime jurídicoconstitucional entre servidores públicose o Poder que os admite.

2. A própria Constituição fala em“emprego público”, no art. 37, I, abrindoa possibilidade de contratação fora doregime estatutário. Esta possibilidade jáestá expressamente reconhecida na Lein. 9.962/00, que prevê a contratação deservidores para empregos públicos.

3. Ao servidor público foigarantido, pela Constituição de 88, odireito de sindicalização e greve - art.37, VI e VII, o qual era restrito aosempregados de empresas privadas eaos empregados de empresas públicase sociedades de economia mista - incisoII do § 1º do art. 173 da CF.

4. A negociação coletiva e suamaterialização jurídica através deconvenção coletiva, embora nãoprevistas na Constituição, existem e sãointensamente exercidas na prática,quando há greve de servidores.

Todos estes fatos demonstramque não há mais regime estatutário noDireito Público brasileiro, mas sim umsistema misto, com partes de um e deoutro, segundo as necessidades daAdministração e da prestação de serviçopúblico. Portanto, nada mais natural doque submeter as controvérsias que daínascem a uma jurisdição única, parauniformizar o entendimento e tratarigualmente, do ponto de vista jurídico,uma situação que está uniformizadapela prática da vida.

Este entendimento mais sereforça à luz do inciso I do art. 114 daConstituição, com a nova redação quelhe deu a EC n. 45/04, que conferiu àJustiça do Trabalho competência parajulgar “ações oriundas da relação detrabalho”. Estas relações de trabalhoexistem sempre que alguém exerce umaatividade em proveito de outrem, nãomudando sua natureza ontológica se éprestado para o Estado ou para oparticular.

A liminar proferida no julgamentoda ADIN n. 3.395-6 não obriga os juízesinferiores, nos termos do § 2º do art. 102da Constituição, pois só possui efeitovinculante a decisão definitiva de méritoem ação direta de inconstitucionalidadeou declaratória de constitucionalidade.

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Portanto, até que sejadefinitivamente julgada, a questãocontinua em aberto e deve ser debatidapor todos os segmentos interessados,a fim de que o STF tenha, da forma maiscompleta possível, dados e informaçõespara o julgamento de tão importantetema.

Assim sendo, declaro competentea Justiça do Trabalho para o julgamentoda lide, sendo desnecessário oencaminhamento dos autos ao d. JuízoCível da Comarca de Boa Esperança,como sugerido pela d. PRT.

Passo de imediato à análise domérito propriamente dito da demanda,consoante disposto no art. 515 do CPC,não havendo a necessidade de retornodos autos a d. Vara de origem.

2.2.2 - Terço de férias

A autora alega que não teriarecebido o terço constitucional sobreférias relativas aos anos de 2002 a2004, conforme previsto no inciso XVIIdo art. 7º da CF/88 e no § 3º do art. 39da CF/88, acrescido pela EC n. 19/98.

Razão lhe assiste.Como se percebe das

contestações que envolvem oreclamado, o Município se limita a alegara inexistência de previsão dopagamento do terço constitucional emseu Regime Jurídico Único. Todavia nãotrouxe aos autos o respectivo texto legalpara corroborar suas alegações. Nocaso concreto sequer houvecontestação devido à antecipação daaudiência de f. 12/13.

Ainda que assim não fosse, odisposto no § 3º do art. 39 da CF/88,acrescido pela EC n. 19/98, estaria sendofrontalmente violado uma vez que prevêexpressamente a extensão aosservidores públicos da vantagem previstano inciso XVII do art. 7º da CF/88.

Posto isso, à míngua de provado correto pagamento das fériasimpugnadas, provejo o recurso paradeterminar o pagamento das diferençasalegadas na peça de ingresso; conformese apurar de acordo com o salário deR$440,00.

Provejo.

2.2.3 - Honorários advocatícios

Infere-se do documento de f. 19que a autora encontra-se assistida peloSindicato dos Servidores PúblicosMunicipais de Ilicínea, havendo nos autostambém a declaração de pobreza de f. 07.

Assim sendo, tendo cumprido areclamante os requisitos previstos naLei n. 5.584/70 e OJs n. 304 e 305 daSDI-I do TST, defiro ao sindicatoassistente honorários de 15% sobre ovalor da condenação.

Provejo.

3 - CONCLUSÃO

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, por sua Quarta Turma,à unanimidade, conheceu do recurso; nomérito, sem divergência, deu-lheprovimento para declarar a competênciada Justiça do Trabalho para o julgamentoda lide, condenando o reclamado nopagamento das diferenças de fériasalegadas na inicial, conforme se apurar,além de honorários advocatícios a favordo sindicato assistente de 15% sobre ovalor da condenação. Fixado o valor dacondenação em R$600,00, com custas deR$12,00.

Belo Horizonte, 31 de agosto de2005.

ANTÔNIO ÁLVARES DA SILVARelator

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Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.42, n.72 p.141-283, jul./dez.2005

TRT-00174-2005-026-03-00-1-ROPubl. no “MG” de 23.07.2005

RECORRENTE: POSTO BARRA SETELTDA.

RECORRIDA: CLÁUDIA BEATRIZ DEAMORIM

EMENTA: VALE-TRANSPORTE- INDENIZAÇÃOSUBSTITUTIVA. As normastrabalhistas devem serinterpretadas no sentido deconceder aos trabalhadores osbenefícios e direitos nelasprevistos e não de forma aobstar seu exercício. Emboraos incisos I e II do art. 7º doDecreto n. 95.247/87, queregulamentou as leis queinstituíram o vale-transporte,estabeleçam como condiçãode exercício daquele direitoque o empregado informe porescrito ao empregador seuendereço residencial e a linhade transporte utilizada notrajeto de ida e volta dotrabalho, isto não quer dizerque ao empregador (a parteque tem melhores condiçõesde produzir prova documental,em qualquer relação deemprego) baste alegar emjuízo que seus empregadosnão se interessaram pelorecebimento daquelavantagem, sem nada precisarprovar. É que não se podeatribuir à parte hipossuficienteo onus probandi documprimento de requisitomeramente formal para afruição de direito cogente, deincidência genérica eimperativa a toda relaçãoempregatícia, sendo razoável

presumir que seu exercício éde interesse de todo equalquer trabalhador. Nestalinha de raciocínio, cabesempre por inteiro àempregadora, em princípio, oônus de provar concretamenteem juízo o fato extraordináriode que o empregado nãopleiteou a totalidade dos vales-transporte necessários aodeslocamento casa-trabalho evice-versa. Não sedesvencilhando do encargo, édevida a indenizaçãosubstitutiva do direitovindicado.

Vistos, relatados e discutidos ospresentes autos de recurso ordinário,decide-se:

RELATÓRIO

Ao de f. 168/169, que adoto e aeste incorporo, acrescento que o MM.Juízo da 1ª Vara do Trabalho de Betimrejeitou os protestos lançados pelareclamante na ata de f. 167 e julgouparcialmente procedentes os pedidosformulados na inicial, condenando oreclamado ao pagamento das parcelaselencadas no r. decisum.

Recurso ordinário peloreclamado às f. 181/187, argüindo apreliminar de nulidade da r. sentença porjulgamento ultra petita, pretendendo areforma no tocante às horas extras ereflexos relativos ao intervalointrajornada, indenização de vales-transporte e restituição do valordescontado pela devolução de cheque.

Recolhimentos de custas edepósito recursal comprovados às f.188/189.

Contra-razões apresentadas àsf. 195/197.

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Dispensada manifestação do d.representante do Ministério Público doTrabalho nos termos do RegimentoInterno deste Tribunal.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

Satisfeitos os pressupostos deadmissibilidade, conheço do recursointerposto, assim como das contra-razões, ainda que subscritas porprocurador com poderes advindos desubstabelecimento apócrifo (f. 161),diante da configuração de mandatotácito (ata de f. 166).

Preliminar de nulidade dasentença por julgamento ultra petita

Insurge-se o recorrente contra acondenação que lhe foi imposta quantoao pagamento de doze horas extrasrelativas à participação em cursos,acrescidas dos adicionais previstos nasnormas coletivas juntadas aos autos, eindenização relativa aos vales-transporte não fornecidos quando daparticipação nos seis cursos deaperfeiçoamento, aduzindo que, apesarde constar da peça de ingresso brevehistórico das pretensões, não háformulação de pedido expresso emtorno delas, dando origem aojulgamento ultra petita.

Sem razão o recorrente.Basta um breve passar de olhos

na inicial para constatar a pretensão daautora ao relatar os fatos ensejadoresdos pedidos formulados de modoexpresso à f. 05, ocasião em querequereu o pagamento das horas extraspor todo o pacto laboral, nelas incluídas,por óbvio, as decorrentes departicipação em cursos de

aperfeiçoamento. O mesmo se diga noatinente à indenização dos vales-transporte para o deslocamento nocurso do contrato de trabalho.

Data venia do entendimentoesposado no recurso, o reclamado éque não foi cauteloso no atender aospreceitos legais e proceder àcontestação minuciosa das alegaçõesiniciais, arcando assim com asconseqüências da opção feita, atraindoa aplicação do disposto no artigo 302do CPC, descabendo cogitar nahipótese de julgamento ultra petita.

Rejeito.

Mérito

Horas extras - Intervalosintrajornadas - Reflexos

Irresigna-se o recorrente contraa condenação em horas extras ereflexos, provenientes da redução dosintervalos intrajornadas, alegando quea recorrida usufruía regularmente dointervalo de uma hora, consoanteprovado na instrução processual.

Ao contrário da alegaçãorecursal, a prova produzida permiteconcluir exatamente ao revés: que asconvenções coletivas adunadas aosautos às f. 89/115 autorizam tão-somente a diluição do intervalointrajornada e não a sua redução comoprocedido no curso do contrato detrabalho.

No pertinente ao intervalointrajornada, a testemunha ouvida arogo do reclamado, Antônio CarlosPereira (f. 167), afirmou que usufruía de40 minutos, confirmando as anotaçõesdos cartões de ponto às f. 81/88,validados diante dos apontamentosfeitos pela própria reclamante, conformedepoimento prestado à f. 166.

Mantenho a sentença.

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Vale-transporte - Indenização

Postulou a autora a condenaçãodo reclamado ao pagamento deindenização do valor correspondenteaos vales-transporte necessários e nãoconcedidos para o deslocamento casa-trabalho e vice-versa, e para aparticipação nos cursos deaperfeiçoamento.

Defendeu-se o reclamado,alegando que forneceu à reclamante osvales-transporte requeridos einformados por ocasião da admissão -duas conduções diárias.

Cumpria ao reclamadocomprovar as alegações defensivas nosentido de que a autora informou anecessidade de apenas duasconduções diárias para cobrir asdespesas do deslocamento residência-trabalho, nos termos do art. 818 da CLTc/c inciso II do art. 333 do CPC, ônusdo qual não se desincumbiu.

Registre-se que as normastrabalhistas devem ser interpretadas nosentido de conceder aos trabalhadoresos benefícios e direitos nelas previstose não de forma a obstar seu exercício.Embora os incisos I e II do art. 7º doDecreto n. 95.247/87, que regulamentouas leis que instituíram o vale-transporte,estabeleçam como condição deexercício daquele direito que oempregado informe por escrito a seuempregador seu endereço residencial ea linha de transporte utilizada em seutrajeto de ida e volta do trabalho, istonão quer dizer que baste ao reclamadoalegar em juízo que a autoranecessitava apenas de duas conduçõesdiárias para cumprir seu mister.

É que não se pode atribuir àparte hipossuficiente o onus probandi documprimento de requisito meramenteformal para a fruição de direito cogente,de incidência genérica e imperativa a

toda relação empregatícia, sendorazoável presumir que seu exercício éde interesse do empregado. Nesta linhade raciocínio, cabe sempre por inteiroao empregador o ônus de provarconcretamente em juízo o fatoextraordinário, que na hipótese dosautos se refere à necessidade de quatroe não duas conduções diárias.

Ademais, incumbe aoempregador colher do empregado,quando de sua admissão, a declaraçãoacerca da necessidade ou não do usodo transporte público, já que o fatoconstitutivo do direito vindicado refere-se ao deslocamento do trabalhador desua residência até o local de trabalho evice-versa, o que se presume, enquantoos fatos impeditivos, modificativos ouextintivos do direito postulado devem serprovados, e somente a renúncia dointeressado poderá desobrigar areclamada do fornecimento, o que nãoé a hipótese dos autos.

Apesar de o Decreto n. 95.247/87, que regulamenta a Lei n. 7.418/85,em seu artigo 7º, impor à requerentedemonstrar a necessidade e interesseem receber o vale-transporte (OrientaçãoJurisprudencial n. 215 da SDI-I do TST),cabe à empresa elaborar o documentorequisitório, colhendo os dadosindispensáveis ao seu atendimento, eapresentá-lo ao empregado para quefaça a opção, declarando quantasconduções necessita diariamente paraseu deslocamento, sob pena de sofrer acondenação substitutiva.

Desprovejo.

Restituição do valordescontado pela devolução de cheque

A reclamante pleiteou adevolução de R$40,00, descontados deseu salário em virtude da devolução decheque de cliente.

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O reclamado defendeu-sealegando que o desconto procedido foilegítimo e amparado nas normascoletivas, que prevêem a possibilidadede sua realização diante da nãoobservância, pela autora, das normasnecessárias ao recebimento de cheque,não tendo conferido a assinatura docliente no documento de identidade,nem registrado corretamente oendereço completo, o telefone e amarca do veículo abastecido.

A 15ª cláusula das convençõescoletivas juntadas aos autos determinamas condições para recebimento decheques de clientes; no entanto, prevêtambém que as empresas deverãoadotar um carimbo padrão contendo osdados necessários ao preenchimentopelos empregados (f. 43 e 110).

Ocorre que o carimbo constantedo verso do cheque de f. 08 não contémtodos os campos relacionados nacláusula convencional, existindo apenasespecificação para o endereço, telefonee placa do veículo, o que foidevidamente observado, recebendoinclusive a autorização do gerenteconforme assinatura no verso dodocumento de f. 08, o que se afirma comtranqüilidade diante da identificação daassinatura aposta às f. 158/159.

Assim, tomadas as precauçõesexigidas pelo reclamado, indevido odesconto procedido no salário daautora, tendo em vista o princípio de queos riscos do empreendimento devem sersuportados pelo empregador e não peloempregado.

Nego provimento.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso interposto,bem como das contra-razões, rejeito apreliminar de nulidade e, no mérito,nego-lhe provimento.

Fundamentos pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalhoda Terceira Região, pela sua EgrégiaOitava Turma, preliminarmente, àunanimidade, conheceu do recursointerposto, bem como das contra-razões; unanimemente, rejeitou apreliminar de nulidade da sentença porjulgamento ultra petita; no mérito, semdivergência, negou-lhe provimento.

Belo Horizonte, 13 de julho de2005.

PAULO MAURÍCIO RIBEIRO PIRESRelator