Acordaos I - CARF

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  • CONSELHO EXECUTIVO

    lvaro Slon de FranaPresidente

    Floriano Jos MartinsVice-Presidente Executivo

    Jos Roberto Pimentel TeixeiraVice-presidente de Assuntos Fiscais

    Maria do Carmo Costa PimentelVice-presidente de Politica de Classe

    Benedito Leite SobrinhoVice-presidente de Poltica Salarial

    Roswlcio Jos Moreira GisVice-presidente de Assuntos da Seguridade Social

    La Pereira de MattosVice-presidente de Aposentadorias e Penses

    Ana Mickelina Barbosa CarreiraVice-presidente de Cultura Profissional e Relaes Interassociativas

    Euclia Maria Agrizzi MergarVice-presidente de Servios Assistenciais

    Mrcio Humberto GhellerVice-presidente de Assuntos Jurdicos

    Miguel Arcanjo Simas NvoVice-presidente de Estudo e Assuntos Tributrios

    Rosana Escudero de AlmeidaVice-presidente de Administrao, Patrimnio e Cadastro

    Josemar Jorge Cecatto SantosVice-presidente de Finanas

    Jos Tibrcio TabosaVice-presidente de Planejamento e Controle Oramentrio

    Jeziel Tadeu FiorVice-presidente de Comunicao Social

    Joo Larcio Gagliardi FernandesVice-presidente de Relaes Pblicas

    Jorge Cezar CostaVice-presidente de Assuntos Parlamentares

    Marcos Rogrio Alves RibeiroVice-presidente de Tecnologia da Informao

    CONSELHO FISCAL

    Luiz Carlos Correa Braga

    Leila S. de B. Signorelli de Andrade

    Durval Azevedo Sousa

    CONSELHO DE REPRESENTANTES

    AC - Heliomar lunzAL - Andr Vilaa dos SantosAP - Emir Cavalcanti FurtadoAM - Cleide Almeida NvoBA - Raimundo Joo DuailibeDF - Floriano Martins de S NetoCE - Givanildo Aquino da SilvaES - Jos Geraldo de Oliveira FerrazGO - Carlos Jos de CastroMA - Antonio de Jesus Oliveira de SantanaMS - Vanderlei Veiga TessariMT - Wilza do Carmo Pereira SoaresMG - Ilva Maria Franca LauriaPA - Ennio Magalhes Soares da CmaraPB - Dijanete de Souza LimaPR - Ademar BorgesPE - Luiz Mendes BezerraPI - Lourival de Melo LoboRJ - Sergio Wehbe BaptistaRN - Jonilson Carvalho de OliveiraRS - Marville TaffarelRO - Eni Paizanti de LaiaRR - Andr Luiz Spagnuolo AndradeSC - Carlos Alberto de SouzaSP - Ariovaldo CireloSE - Jorge Loureno Barros

    TO - Jos Carlos Rego Morais

    ASSESSORIA SOCIOECONMICA

    Vanderley Jos MaaneiroAssessor

  • Copyright 2013 - Associao Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP)

    Capa e editorao eletrnicaAllan Eumar Vitalino

    CoordenadoresMarcelo OliveiraElias Sampaio Freire

    Reviso ortogrfica:

    Nenhuma parte desta obra dever ser reproduzida ou divugada sem que seja citada a fonte.

  • SUMRIO

    APRESENTAO ....................................................................................................................................................11

    ABUSO DO DIREITO ...............................................................................................................................................13

    ADITAMENTO NAS RAZES DO LANAMENTO E SUAS IMPLICAES NO PRAZO DECADENCIAL ..............................29

    ALTERAO DE ALQUOTA POR DELEGAO A MINISTRO DE ESTADO .....................................................................47

    ARBITRAMENTO. PRINCPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE ......................................................59

    CARACTERIZAO DO DOLO PARA A QUALIFICAO DA MULTA DE OFCIO ............................................................75

    CONCOMITNCIA ENTRE PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL (PAF) E AO COLETIVA ..........................................91

    CONSTITUIO DE CRDITO TRIBUTRIO. DIREITO DE DEFESA DOS RESPONSVEIS ...................................................................... 99

    DECADNCIA.........................................................................................................................................................109

    DESTINAO DE ACERVO EMPRESARIAL REMANESCENTE PARA A CONSTITUIO DE NOVA SOCIEDADE .................189

    DIVERGNCIA. FUNDAMENTO RELEVANTE DE ACRDO RECORRIDO NO ATACADO .............................................203

    EFEITOS DA ANULAO DO LANAMENTO .............................................................................................................227

    ILEGITIMIDADE PASSIVA. MULTA REFERENTE A IMPORTAO DE MERCADORIA SOB EFEITO DE LIMINAR. BOA F ....... 241

    IMPOSSIBILIDADE DE RESTRIO DOS MEIOS DE PROVA .......................................................................................249

    IMPUTAO DE PAGAMENTO E DENUNCIA ESPONTNEA. DRAWBACK ...................................................................261

    LANAMENTO SUBSTITUTIVO. ALTERAO DO CRITRIO JURDICO E SUAS IMPLICAES NO PRAZO DECADENCIAL ........277

    MULTA. AGRAVAMENTO ......................................................................................................................................289

    PRECLUSO. NUS DA PROVA ..............................................................................................................................297

    QUALIFICAO DE MULTA ...................................................................................................................................309

    RETROATIVIDADE BENIGNA. MULTA AO TRANSPORTADOR ...................................................................................327

    REVISO DE OFCIO. ERRO DE DIREITO .................................................................................................................345

    SIMULAO E PROVA INDICIRIA ........................................................................................................................369

    SUJEIO PASSIVA. VENDA DE IMVEL RURAL. COMPROVAO DE QUITAO DO TRIBUTO .................................389

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    Apresentao

    A ANFIP - entidade de 63 anos que representa nacionalmente os Auditores--Fiscais da Receita Federal do Brasil - apresenta, nesta publicao, rol de acrdos com assuntos de extrema relevncia no contexto tributrio atual, escolhidos por Conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), rgo pblico com 88 anos, colegiado, paritrio, que tem por finalidade julgar recursos de deciso de primeira instncia, bem como os recursos de natureza especial, que versem so-bre a aplicao da legislao referente a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

    Em linhas gerais, Acrdo a manifestao de um rgo judicial colegiado, que adota um posicionamento argumentado sobre a aplicabilidade de determina-do direito a uma situao ftica especfica.

    Temos, portanto, que o Acrdo refora o arcabouo jurdico de um pas, uma vez que, por se tratar da manifestao de um colegiado, representa uma deci-so debatida em seus vrios pontos, fticos e jurdicos.

    Na presente publicao apresentamos uma seleo de acrdos que disponi-biliza aos leitores uma vasta viso das decises emanadas do CARF, propiciando dessa forma uma preciosa fonte de consulta e de conhecimento, para toda sociedade.

    No momento atual mais do que nunca verificamos que nosso Pas busca, com urgncia e celeridade, entre tantas demandas, que os servios pblicos presta-dos sejam transparentes e eficientes, como ocorre na atuao do CARF, em que h a disponibilizao de suas decises em seu stio na internet (www.carf.fazenda.gov.br) e em que sua jurisprudncia citada e utilizada pelos Tribunais Superiores.

    Com essa publicao a ANFIP busca auxiliar seus associados na realizao de suas atividades, assim como beneficiar todos os operadores do Direito, com impor-tante material para consulta, reflexo, anlise, concordncia ou discordncia, utiliza-o em seus estudos e trabalhos.

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  • TEMA: ABUSO DO DIREITO CONSELHEIRO (A): Francisco Jose Barroso Rios

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    196S3TE02 MINISTRIO DA FAZENDA

    CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS TERCEIRA SEO DE JULGAMENTO

    Processo n 11065.100019/201005

    Recurso n Voluntrio

    Acrdo n 3802001.553 2 Turma Especial Sesso de 26 de fevereiro de 2013

    Matria DCOMP Eletrnico Pagamento a maior ou indevido

    Recorrente Rojana Calados Ltda.

    Recorrida Fazenda Nacional

    ASSUNTO: NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTRIO Perodo de apurao: 01/10/2009 a 31/12/2009

    PRESTAO DE SERVIOS POR EMPRESAS VINCULADAS CONTRATANTE COM O OBJETIVO DE GERAR CRDITOS SEGUNDO REGIME DA NOCUMULATIVIDADE DA COFINS. ABUSO DO DIREITO CARACTERIZADO. DESCONSIDERAO DOS NEGCIOS JURDICOS CELEBRADOS ENTRE TOMADORA DOS SERVIOS E CONTRATADAS.

    Realidade em que empresa do ramo de calados contratou trs empresas para a prestao de servios de industrializao por encomenda, cujas despesas foram utilizadas para fins de creditamento da COFINS segundo o regime da nocumulatividade.

    Contudo, foi comprovado nos autos que: a) a contratante transferiu significativos montantes financeiros para o pagamento de despesas operacionais das contratadas b) uma das contratadas mantinha identidade de endereo com a tomadora dos servios (recorrente) c) os servios prestados pelas empresas contratadas eram quase que exclusivamente destinados reclamante d) houve transferncia de empregados da interessada para as empresas contratadas quando da constituio destas e) contratante e contratadas operavam no mesmo ramo de negcio f) scios das empresas envolvidas apresentavam ligao familiar.

    Tais fatos, no seu aspecto objetivo, revelam mcula finalstica quando da constituio das empresas contratadas, posto que no norteada por aspectos de natureza empresarial/econmica, corroborando para tanto as evidncias que demonstram a inexistncia de sua independncia gerencial e financeira. Da se deduz o vis subjetivo de que a estrutura foi criada com o intuito exclusivo de se obter vantagem tributria indevida.

    Abuso do direito caracterizado, o que legitima a desconsiderao dos negcios jurdicos celebrados entre as empresas envolvidas, posto que a

    ACR

    DO G

    ERADO

    NO PG

    D-CAR

    F PROC

    ESSO 1

    1065.10

    0019/20

    10-05

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    conduta se subsume norma antieliso objeto do pargrafo nico do artigo 116 do Cdigo Tributrio Nacional.

    Recurso a que se nega provimento.

    Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

    Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, preliminarmente, para indeferir o pedido de percia bem como para no acolher as razes de nulidade formalizados pela recorrente, e, no mrito, para negar provimento ao recurso voluntrio interposto pela mesma.

    (assinado digitalmente)

    Regis Xavier Holanda Presidente.

    (assinado digitalmente)

    Francisco Jos Barroso Rios Relator.

    Participaram, ainda, da presente sesso de julgamento, os conselheiros Cludio Augusto Gonalves Pereira, Jos Fernandes do Nascimento e Solon Sehn. Ausente momentaneamente o conselheiro Bruno Maurcio Macedo Curi.

    Relatrio

    Tratase de recurso voluntrio interposto contra deciso da 2 Turma da DRJ Porto Alegre (fls. 142/145), a qual, por unanimidade de votos, indeferiu a manifestao de inconformidade apresentada pela interessada contra o despacho decisrio que no reconheceu o direito creditrio argido pela mesma, relativamente Contribuio para o Financiamento da Seguridade Social COFINS.

    Conforme relatrio objeto da deciso recorrida, foram constatadas irregularidades na apurao de crditos relativos aos servios prestados para a recorrente pelas empresas Calados Ronessa Ltda, Calados Rafelly Ltda e Calados Ronelly Ltda. Averiguouse que tais empresas seriam, na verdade, mera extenso, apndice ou desdobramento das atividades produtivas da empresa Rojana Calados Ltda, com total dependncia econmicofinanceira e que, portanto, todas constituiriam uma s empresa. Conforme relato da instncia recorrida, a fiscalizao, para chegar a tais concluses, se embasou nas seguintes questes:

    a) H grau de parentesco entre os scios de todas as empresas b) As empresas envolvidas tm o mesmo objeto social fabricao de

    calados de couro c) 100% dos clientes e do faturamento das empresas Ronessa, Rafelly

    e Ronelly tm relao direta com o grupo (Rojana representa de 92,562 a 99,9999% e o restante representado por Ronessa e/ou Rafelly e/ou Ronelly)

    d) As empresas Ronessa, Rafelly e Ronelly receberam vultosos aportes financeiros advindos da empresa Rojana, efetuados na forma de depsitos, adiantamentos e transferncias entre contas. Operaes imprescindveis e utilizadas integralmente para cobrir seus gastos operacionais (custos com

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    Processo n 11065.100019/201005 Acrdo n. 3802001.553

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    pessoal, despesas bancrias e diversas, cheques e aluguis prpria Rojana)

    e) A contabilidade e as notas fiscais das empresas Ronessa, Rafelly e Ronelly evidenciam que a empresa Rojana praticamente o nico cliente daquelas, inclusive com a emisso de notas fiscais seqenciais entre as empresas

    f) Ocorreu uma migrao de diversos funcionrios da empresa Rojana para a recm constituda Rafelly, alm do fato de ambas possurem o mesmo endereo.

    Ainda nos termos do relatrio da deciso vergastada: A auditoria fiscal concluiu, ento, que restou evidenciado que o

    contribuinte na verdade transformou sua folha de salrios em servios de industrializao por encomenda prestados pelas empresas Ronessa, Rafelly e Ronelly. As prestaes de servios efetuadas por estas empresas, na verdade, simulavam terceirizao de modeobra. A abertura das empresas Ronessa, Rafelly e Ronelly, todas optantes pelo SIMPLES, com a efetiva transferncia de empregados do interessado para aquelas, visou apenas a reduo da carga tributria previdenciria e tambm o creditamento das contribuies PIS e COFINS, dentro da sistemtica da nocumulatividade, relativamente aos pretensos servios de industrializao por encomenda. Desta forma, o contribuinte no pode se creditar das contribuies em relao aos servios de modeobra em face de expressa vedao legal, conforme dispe os Arts. 3, 2 das Leis ns 10.637/2002 e 10.833/2003.

    O contribuinte, inconformado com o indeferimento, apresentou tempestivamente sua manifestao onde alega que, alm das empresas relacionadas no lanamento, diversas outras prestam servios a ele, o que facilmente pode ser constatado na sua contabilidade.

    Acrescenta que as empresas prestadoras de servios possuem seus prprios scios que, apesar de terem ligao de parentesco com um dos scios da empresa Rojana, no esto a ela subordinados. Diz que estas empresas estavam devidamente regulares perante os rgos pblicos, tinham autonomia, remuneravam seus scios e seus empregados regulamente cadastrados, alm de recolher seus impostos e contribuies previdencirias. Comenta que desde o incio da fabricao de calados na regio, h mais de cinqenta anos, existem empresas prestadoras de servios. Diz, ainda, que no h qualquer vedao legal para que uma empresa tenha contrato com outra de modo que seu faturamento mensal fique desta dependente.

    Alega, preliminarmente, a nulidade do procedimento fiscal que estaria motivado por mera presuno, o que ofenderia o princpio da segurana jurdica. Ainda em preliminar, alega novamente a nulidade em face de suposta ilegitimidade passiva da empresa Rojana. Entende que no plo passivo deveriam figurar as empresas prestadoras de servios, que recolhiam seus tributos pelo SIMPLES, pois considera que no teve benefcio algum com a reduo da carga tributria daquelas empresas.

    O manifestante contesta as afirmaes do auditor fiscal, com o argumento de que se tratariam de mera e inverdica presuno, no fundamentadas em qualquer elemento de prova. Explica que os pagamentos que efetuou s empresas prestadoras decorrem de notas fiscais de servios ou de antecipaes de receitas devidamente documentadas atravs de contratos de mtuo, contratos de antecipao de pagamentos e outros.

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    Acrescenta que o auditor fiscal poderia ter analisado a contabilidade das empresas prestadoras de servios onde constataria que elas tambm realizaram servios para diversas outras empresas.

    O interessado entende que o procedimento fiscal precisaria ser complementado, mediante diligncias fiscais e atravs da realizao de percia contbil, onde poder ficar melhor esclarecida a questo dos adiantamentos que realizou s empresas prestadoras de servios. Para tanto, indica o seu assistente tcnico e os quesitos a serem respondidos.

    Ao final, o sujeito passivo requer a insubsistncia e total improcedncia da ao fiscal, com o seu cancelamento e a legitimao de seus crditos complementares de PIS e COFINS, renovando tambm seus pedidos pela realizao de diligncias e percia contbil, bem como a produo de prova documental.

    Para fins de informao, foram tambm lanados contra a contribuinte Autos de Infraes relativos a tributos/contribuies previdencirias que motivaram o encaminhamento de Representao Fiscal para Fins Penais junto autoridade competente.

    Os argumentos aduzidos pelo sujeito passivo, no entanto, no foram acolhidos pela primeira instncia de julgamento administrativo fiscal, conforme ementa do Acrdo abaixo transcrito:

    ASSUNTO: CONTRIBUIO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL COFINS Perodo de apurao: 01/10/2009 a 31/12/2009 Ementa: CRDITOS. MO DE OBRA. IMPOSSIBILIDADE. No dar direito a crdito o valor de modeobra paga a pessoas fsicas, nos termos da legislao que rege a contribuio. A constatao de negcios simulados, enseja o indeferimento do pedido tendo como base a situao de fato, cabendo a desconsiderao dos atos jurdicos simulados envolvendo pessoas jurdicas que apenas aparentemente figuravam como prestadoras de servios. Manifestao de Inconformidade Improcedente Direito Creditrio No Reconhecido

    Cientificada da referida deciso em 06/07/2011 (fls. 147), a interessada, em 02/08/2011 (fls. 153), apresentou o recurso voluntrio de fls. 153/178, onde se insurge contra o lanamento com fundamento nos mesmos argumentos j expostos na primeira instncia recursal, destacando ainda:

    a) o cerceamento ao seu direito de defesa, dado que a instncia recorrida indeferiu pedido de produo pericial que seria imprescindvel para o julgamento da causa, violando, assim, os princpios constitucionais do contraditrio, da ampla defesa e do devido processo legal

    b) que a primeira instncia no demonstrou a existncia de negcio jurdico destinado a dissimular a ocorrncia de fato gerador de tributo, como disposto no pargrafo nico do artigo 116 do CTN, includo pela Lei Complementar no 104, de 2001 assim, o julgamento de primeiro grau, bem como o lanamento, teriam se fundado em presunes, sendo a citada deciso, portanto, nula

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    Processo n 11065.100019/201005 Acrdo n. 3802001.553

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    c) que as prestadoras de servios CALADOS RAFELLY, CALADOS RONELLY e CALADOS RONESSA foram constitudas de forma regular, tendo seus prprios scios e administradores, respondendo os mesmos pelas obrigaes fiscais e tributrias originrias de suas atividades econmicas portando, tais empresas so totalmente diversas da empresa tomadora dos servios a recorrente que, assim, figura indevidamente no plo passivo da lide, eis que o auto de infrao deveria ter sido lavrado em relao s empresas prestadoras dos servios

    Diante do exposto, requer seja dado provimento ao seu recurso, com o consequente reconhecimento, no mrito, do direito creditrio reclamado pela interessada.

    o relatrio.

    Voto

    Conselheiro Francisco Jos Barroso Rios

    O recurso merece ser conhecido por preencher os requisitos formais e materiais exigidos para sua aceitao.

    A legislao pertinente ao regime de incidncia nocumulativa das contribuies para o PIS/Pasep e para a COFINS (respectivamente, Leis nos 10.637, de 30/12/2002 e 10.833, de 29/12/2003), autoriza o desconto de crditos apurados com base em custos, despesas e encargos da pessoa jurdica, nos termos do artigo 3o das citadas leis ordinrias. Relevante para o caso em tela o disposto no inciso II do dispositivo retromencionado, que autoriza o desconto de crditos relativos a bens e servios, utilizados como insumo na prestao de servios e na produo ou fabricao de bens ou produtos destinados venda [...].

    Portanto, em tese, os servios prestados recorrente enquadramse na hiptese normativa que autoriza sua utilizao (como insumos) na base de clculo dos crditos do PIS e COFINS a serem descontados no regime da nocumulatividade.

    Contudo, conforme relatado, a fiscalizao desconsiderou os crditos das contribuies calculados a partir desses montantes sob o argumento de que a autuada transformou sua folha de salrios em servios de industrializao por encomenda prestados por outras empresas, no caso, as empresas Ronessa, Rafelly e Ronelly. Estas, segundo a fiscalizao, receberam vultosos aportes financeiros advindos da reclamante (para fins de pagamento de despesas operacionais funcionrios, aluguis, despesas bancrias, etc.). Ademais, a recorrente (Rojana) seria quase que exclusivamente o nico cliente das empresas Ronessa, Ronelly e Rafelly. Dentre outras questes abordadas pela autoridade lanadora, foi mencionado tambm que a empresa Rafelly estaria estabelecida no mesmo endereo da autuada (Rojana).

    O CTN, em seu artigo 116, dispe o seguinte: Art. 116. Salvo disposio de lei em contrrio, considerase ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:

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    I tratandose de situao de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstncias materiais necessrias a que produza os efeitos que normalmente lhe so prprios II tratandose de situao jurdica, desde o momento em que esteja definitivamente constituda, nos termos de direito aplicvel. Pargrafo nico. A autoridade administrativa poder desconsiderar atos ou negcios jurdicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrncia do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigao tributria, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinria. (Pargrafo includo pela Lcp n 104, de 10.1.2001) (grifo nosso)

    Interessa para a lide, especialmente, o disposto no pargrafo nico do artigo 116 do CTN, acima reproduzido.

    Neste mbito de discusso, a possibilidade legal para a desconsiderao de atos ou negcios jurdicos pela autoridade administrativa est restrita s hipteses em que for caracterizada a [...] finalidade de dissimular a ocorrncia do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigao tributria [...]. Necessrio, pois, examinar sistematicamente a aplicabilidade da regra em tela, inclusive considerando a parte final do preceito aludido, que remete sua aplicao observao de procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinria. Tal questo ser abordada adiante. Agora, analisemos a conduta proibida pela lei tributria complementar, que tem como ncleo o verbo dissimular.

    Segundo Aurlio Buarque de Holanda Ferreira, dissimular, quando usado como verbo transitivo direto como empregado no texto normativo (dissimilar a ocorrncia do fato gerador do tributo, dissimular a natureza dos elementos constitutivos da obrigao tributria) , significa (1) ocultar ou encobrir com astcia disfarar (2) no dar a perceber calar (3) fingir simular (4) atenuar o efeito de tornar pouco sensvel ou notvel.

    As condutas coibidas pela lei enquadramse em hipteses que a doutrina denomina de abuso do direito, cuja reprimenda legal deixa transparecer inegvel limitao ao princpio da autonomia da vontade, como, alis, ressalta Douglas Yamashita1 no incio de suas consideraes sobre o estudo do abuso do direito no Cdigo Civil de 2002, e seus reflexos em matria tributria:

    Ao reputar ilcito o exerccio de um direito por seu titular, sempre que tal exerccio exceda manifestamente os limites impostos pelo seu fim econmico ou social, pela boaf ou pelos bons costumes, o art. 187 do CC/20022 no faz outra coisa seno traduzir em nvel infraconstitucional limites constitucionais autonomia da vontade, consubstanciada essencialmente na liberdade de iniciativa garantida pela Constituio Federal de 1988, em seus arts. 1o, IV, e 170.

    Assevera, portanto, que o contexto do abuso do direito e do artigo 187 do Cdigo Civil de 2002 o contexto constitucional, ressaltando, ainda, que o princpio do Estado

    1 YAMASHITA, Douglas. Eliso e evaso de tributos. Limites luz do abuso do direito e da fraude lei. So Paulo: Lex Editora, 2005, p. 87. 2 Art. 187. Tambm comete ato ilcito o titular de um direito que, ao exerclo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econmico ou social, pela boaf ou pelos bons costumes.

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    Processo n 11065.100019/201005 Acrdo n. 3802001.553

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    Democrtico de Direito (caput do artigo 1o da Constituio Federal3) se alicera em bases formais (a segurana jurdica princpio da legalidade, da proteo ao ato jurdico perfeito, do direito adquirido, da coisa julgada, etc.) e materiais (voltados realizao da justia art. 3o, I, da CF/88 , a um Estado de Direito e de Justia Social Miguel Reale , a um Estado Social Trcio Sampaio Ferraz Jr.). Todos so valores que, muito embora positividados na Constituio Federal, esto em constante tenso, de modo que um plus na realizao de um valor significa um minus na realizao de outro ou outros valores4.

    nesse contexto de reprovao do abuso do direito (o qual, longe de se restringir ao Direito Civil, alcana todos os ramos do direito5) que precisa ser analisado o alcance da norma antieliso, cujo exame requer obrigatria aplicao do princpio da proporcionalidade, afastandose assim concepes absolutistas ou a ilimitabilidade do exerccio da liberdade de contratar, juzo que se amolda perfeitamente seguinte lio de Pontes de Miranda:

    O estudo do abuso do direito a pesquisa dos encontros dos ferimentos, que os direitos se fazem. Se puderem ser exercidos sem outros limites que os da lei escrita, com indiferena, se no desprezo, da misso social das relaes jurdicas, os absolutistas teriam razo. Mas a despeito da intransigncia deles, fruto da crena a que se aludiu, a vida sempre obrigou a que os direitos se adaptassem entre si, no plano do exerccio. Conceptualmente, os seus limites, os seus contornos, so os que a lei d, como quem pe objetos na mesma maleta, ou no mesmo saco. Na realidade, quer dizer quando se lanam na vida, quando se exercitam tm de coexistir, tm de conformarse uns com os outros6.

    Na mesma toada, e especialmente quanto possibilidade legal de desconsiderao de atos ou negcios jurdicos pela autoridade tributria com base no pargrafo nico do artigo 116 do CTN, destaca Luciano Amaro que no merecem prosperar as crticas daqueles que defendem que referido preceito teria dado autoridade administrativa o poder de criar tributo sem lei. Neste comenos, ressalta, textualmente:

    [...] O questionado pargrafo no revoga o princpio da reserva legal, no autoriza a tributao por analogia, no introduz a considerao econmica no lugar da considerao jurdica. Em suma, no inova no captulo da interpretao da lei tributria.

    O que se permite autoridade fiscal nada mais do que, ao identificar a desconformidade entre os atos ou negcios efetivamente praticados (situao jurdica real) e os atos ou negcios retratados formalmente (situao jurdica aparente), desconsiderar a aparncia em prol da realidade.

    3 Art. 1 A Repblica Federativa do Brasil, formada pela unio indissolvel dos Estados e Municpios e do Distrito Federal, constituise em Estado Democrtico de Direito e tem como fundamentos: 4 Cf. YAMASHITA, ob. cit., p. 8890. 5 PACHECO, Jos da Silva. Consideraes preliminares guisa de atualizao. In: BATISTA MARTINS, Pedro. Abuso do direito e o ato ilcito, 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. XV, apud YAMASHITA, ob. cit., p. 95. 6 PONTES DE MIRANDA, Francisco. Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, t. LIII, p.67 e ss., apud YAMASHITA, ob. cit., p. 92.

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    [...]

    Noutras palavras, nada mais fez o legislador do que explicitar o poder da autoridade fiscal de identificar situaes em que, para fugir do pagamento do tributo, o indivduo apela para a simulao de uma situao jurdica (no tributvel ou com tributao menos onerosa), ocultando (dissimulando) a verdadeira situao jurdica (tributvel ou com tributao mais onerosa)7.

    Releva mencionar a existncia de respeitveis entendimentos doutrinrios contrrios possibilidade de aplicao analgica em caso de abuso do direito, como denomina Alberto Xavier, o qual entende que as clusulas gerais antielisivas so uma tentativa de tributao analgica de fatos extratpicos8.

    Preferimos nos filiar primeira corrente, por entendermos que a mesma est em sintonia com o princpio constitucional do Estado Democrtico de Direito, o qual, como ressaltado, procura conciliar o direito considerando o conjunto de seus aspectos formal e material. Alm disso, a norma antielisiva em destaque est prevista em lei complementar, portanto, de observao compulsria por parte do julgador administrativo, que no poderia afastla, por exemplo, sob argumento de inconstitucionalidade, questo, vale lembrar, sumulada por este Conselho (Smula no 02: O CARF no competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributria).

    Mas ainda no campo terico da possibilidade legal de sano ao abuso do direito no mbito tributrio, ou, em outras palavras, na arena de aplicao efetiva do disposto no pargrafo nico do artigo 116 do CTN9, cumpre destacar que referido dispositivo faz remisso a procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinria, fato que poderia levar a juzo pela impossibilidade de sua autoaplicabilidade, dado que at hoje norma ordinria nesse sentido no foi editada10.

    Todavia, no obstante a inexistncia de norma ordinria especfica que trate da matria, temse admitido a desconsiderao de atos ou negcios jurdicos diante das hipteses contempladas pelo pargrafo nico do artigo 116 do CTN. Nessa toada, defende Douglas Yamashita11 que a ressalva legal referese clara e exclusivamente a procedimentos de desconsiderao, e se o conceito de dissimulao de direito material e no procedimental, logo, sua definio conjuga os conceitos de abuso do direito (arts. 50 e 187 do CC/2002) e de fraude lei (art. 166, VI, do CC/2002) independentemente da lei ordinria.

    Quanto aos critrios utilizados para a caracterizao do abuso do direito, a doutrina se refere a trs correntes principais: teoria subjetiva, teoria objetiva e teoria subjetivoobjetiva.

    Em apertada sntese, segundo o a teoria subjetiva, o abuso nasce quando o ato praticado sem interesse prprio e com o nico objetivo de prejudicar outrem. Pela teoria objetiva, ato abusivo o ato anormal, porque contrrio finalidade do direito [...] um ato economicamente prejudicial e reprovado pela conscincia pblica. Seria ainda, o ato em 7 AMARO, Luciano. Direito Tributrio Brasileiro. So Paulo: Saraiva. 2009. 15. ed. p. 237238. 8 XAVIER, Alberto. Tipicidade da tributao, simulao e norma antielisiva. So Paulo: Dialtica. 2001. p. 45. 9 Pargrafo nico. A autoridade administrativa poder desconsiderar atos ou negcios jurdicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrncia do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigao tributria, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinria. (grifo nosso) 10 Tais procedimentos chegaram a ser objeto dos artigos 15 a 19 da Medida Provisria no 66, de 2002. Contudo, foram suprimidos no processo de converso Lei no 10.637/2002. 11 idem, p. 149.

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    Processo n 11065.100019/201005 Acrdo n. 3802001.553

    S3TE02 Fl. 201

    9

    contrariedade s regras sociais [...] em desconformidade ao interesse ou valor ambientalcultural vigente. Ou, de forma mais abrangente, em conformidade com o critrio do motivo legtimo: o ato ser normal ou abusivo, segundo se explique, ou no, por motivo legtimo, que passa, pois, a constituir a pedra angular da teoria objetiva da finalidade social do direito12. Por fim, prega a teoria subjetivoobjetiva que ato abusivo seria aquele em que estariam presentes a inteno de se prejudicar a terceiro (aspecto subjetivo) e a no funcionalidade, ou anormalidade, do ato (aspecto objetivo)13.

    Ao examinar o 187 do Cdigo Civil de 2002 luz da teoria do abuso do direito, YAMASHITA ressalta o seguinte:

    Hoje, a concepo mais moderna do abuso do direito baseiase, sim, em critrios estritamente jurdicos: os princpios positivados. Os princpios servem, de um lado, como fundamentos de justificao das regras e, de outro, como normas de regulao de aplicao das regras existentes ao caso concreto. [...] Nesse sentido o abuso do direito consiste em uma conduta ilcita atpica, pois esta perde sua permisso normativa prima facie, em virtude de sua contrariedade a princpios jurdicos, especialmente aqueles de nvel constitucional14. (grifo nosso)

    Especialmente no mbito tributrio, e notadamente em relao ao disposto no pargrafo nico do artigo 116 do CTN, h que se admitir que referido preceito no se restringe unicamente a uma norma antisimulao, como entende parte da doutrina (para estes, a aplicao como norma antieliso fere o princpio da legalidade estrita), mas opera efetivamente como norma antieliso contra abuso do direito ou contra a fraude lei. Nesse sentido, novamente, Douglas Yamashita15:

    A segunda corrente defende, com base na interpretao do verbo dissimular constante do pargrafo em questo, que esse pargrafo consiste em uma norma no apenas antisimulao, mas tambm antieliso, ou seja, de combate ao abuso do direito e fraude lei, sendo constitucional a norma antieliso. Para essa corrente, os atos ou negcios com finalidade dissimuladora da ocorrncia do fato gerador do tributo ou da natureza dos elementos constitutivos da obrigao tributria poderiam ser tambm atos no simulados, uma vez que efetivamente declarados como desejados e executados. Tais atos ou negcios seriam aqueles que utilizam a fraude lei ou o abuso do direito para disfarar "licitamente", perante o Fisco, fatos tributveis. [...] (gridouse)

    Ainda segundo Yamashita (ob. cit., p. 146), a dissimulao de que trata o pargrafo nico do artigo 116 do CTN ocorre no apenas quando um fato jurdico falso dissimula um fato verdadeiro, mas tambm quando um fato jurdico verdadeiro VI dissimule, isto , atenue o efeito de outro fato jurdico verdadeiro V2 e, portanto, sem simulao. Se 12 Um direito subjetivo no um poder do indivduo, mas uma funo social. Assim, abusivo o ato antifuncional, contrrio ao fim social ou econmico do direito. (SPOTA, Alberto G. Tratado de derecho civil. Buenos Aires: RubinzalCulzoni Editores, 1995, v. 2., 1.1, p. 10, apud LUNA, Everardo da Cunha. Abuso de direito. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 92 e ss., apud Yamashita, ob. cit., p. 104). 13 Conf. YAMASHITA, ob. cit., p. 100104. 14 Idem, p. 119120. 15 Ob. cit., p. 144.

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    10

    aquele fato jurdico verdadeiro VI ato abusivo e dissimula o efeito do segundo fato jurdico verdadeiro V2, ento VI constitui um abuso dissimulatrio.

    O caso em exame envolve, exatamente, suposto abuso de personalidade jurdica de empresas que, segundo a autoridade fiscal, teriam sido criadas com o intuito exclusivo de gerar vantagem tributria imprpria em favor da recorrente, no caso em anlise, na forma de direito creditrio indevido para as contribuies PIS e COFINS. Tal forma de abuso, em tese, muito embora seja de natureza civil (art. 50, c/c art. 187 do Cdigo Civil), possui reflexos tributrios, sendo, pois, admitida a material desconsiderao da personalidade jurdica, ou melhor, dos negcios jurdicos celebrados entre as envolvidas, para fins de lanamento tributrio16.

    Essa questo merece seja utilizado, como adequado critrio de exame da ocorrncia de suposto abuso do direito de personalidade jurdica, se, no ato, ficou evidenciado eventual aspecto objetivo de anormalidade (se injustificada a criao das empresas se fere vis finalstico operacionalizao das mesmas propsito econmico se no houve recursos dos scios para sua constituio se a empresa no tem empregados, etc.) da se extraindo ou deduzindo o intuito (aspecto subjetivo) de dissimular a ocorrncia do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigao tributria, como consta do pargrafo nico do artigo 116 do CTN, portanto, em prejuzo do Errio. Enfim, envolve a anlise do caso concreto frente s provas que instruem os autos para se examinar se o caso mesmo de desconsiderao do suposto ato abusivo.

    Em estudo da aduzida caracterizao de abuso do direito exercido por parte da empresa recorrente, considero como de menor importncia algumas questes trazidas pela fiscalizao, como o grau de parentesco entre os scios da reclamante e as empresas contratadas, ou ainda, a identidade de objeto social. Contudo, tais fatos tem fora probatria subsidiria para, ao lado das questes que julgo como mais importantes, revelarem a efetiva prtica da conduta vedada pelo pargrafo nico do artigo 116 do CTN. So elas:

    a) as empresas Ronessa, Rafelly e Ronelly receberam vultosos aportes financeiros advindos da reclamante para fins de pagamento de despesas operacionais funcionrios, aluguis, despesas bancrias, etc.

    b) a empresa Rojana (recorrente tomadora dos servios) quase que exclusivo cliente das empresas Ronessa, Ronelly e Rafelly

    c) a empresa Rafelly estabelecida no mesmo endereo da autuada (Rojana)

    d) a transferncia dos empregados da interessada quando da constituio das empresas Ronessa, Ronelly e Rafelly.

    Tais fatos, no seu aspecto objetivo, revelam mcula finalstica quando da constituio das empresas Ronessa, Ronelly e Rafelly, posto que a constituio dessas pessoas jurdicas no foi norteada por aspectos de natureza empresarial/econmica, corroborando para tanto as graves evidncias que demonstram a inexistncia de sua independncia gerencial e financeira. Da se deduz o claro vis subjetivo de que a estrutura foi criada com o intuito exclusivo de se obter crdito tributrio indevido.

    16 Ora, se o abuso de personalidade jurdica, como espcie de abuso do direito, um ilcito civil (art. 187 do CC/2002) e se todo ato ilcito, ainda que meramente civil, caso de evaso tributria, ento se pode concluir que a desconsiderao da personalidade jurdica perfeitamente cabvel em matria tributria. (YAMASHITA, ob. cit., p. 157)

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    Processo n 11065.100019/201005 Acrdo n. 3802001.553

    S3TE02 Fl. 202

    11

    Os fatos acima referenciados, em que se baseiam o presente juzo em favor da caracterizao de abuso do direito exercido por parte da empresa recorrente, no chegam a ser maculados pelos argumentos da interessada. Com efeito, a aduzida realizao de negcios com outras empresas, a alegada diversidade entre os scios de cada pessoa jurdica, a regularidade formal trabalhista, o recolhimento dos tributos, nenhum desses argumentos suficiente para afastar o conjunto probatrio trazido pela fiscalizao, suficientes para alicerar a procedncia do entendimento oficial.

    Subsidiariamente, e tambm em resposta ao argumento da suplicante em prol da nulidade do lanamento em vista de o mesmo haver sido baseado em suposta presuno, destaquese que o direito brasileiro admite sim a utilizao de presunes para combater ilcitos tributrios. Nesse sentido, a lio de Maria Rita Ferragut17:

    [...] no h como ignorar que, se a segurana jurdica no admitisse as presunes, acabaria dificultando a proteo do direito daqueles que os detm, mas que so prejudicados pela fraude, dolo, simulao. Dentre esses encontrase, sem dvida alguma, o Fisco.

    Assim, o motivo para a criao das presunes foi sanar a dificuldade de se provar certos fatos mediante prova direta, fatos esses que deveriam ser necessariamente conhecidos, a fim de possibilitar a preservao da estabilidade social mediante uma maior eficcia do direito.

    As presunes suprem deficincias probatrias, disciplinam o procedimento de construo de fatos jurdicos, alargam o campo cognoscitivo do homem18, e aumentam a possibilidade de maior realizao da ordem jurdica, ao permitir que alguns fatos sejam conhecidos por meio da relao jurdica de implicao existente entre indcios e o fato indiciado. No Direito Tributrio, assumem significativa importncia, tendo em vista que os fatos juridicamente relevantes so muitas vezes ocultados por meio de fraudes lei fiscal, ficando o processo de positivao do direito obstado de ocorrer.

    Em tais casos, a presuno tem natureza essencialmente procedimental, destinada a auxiliar o aplicador do direito na subsuno da situao ftica norma. Portanto, no cria, altera ou revoga direitos, concluso que se extrai, mais uma vez, das consideraes de Maria Rita Ferragut sobre o tema:

    A previsibilidade quanto aos efeitos jurdicos da conduta praticada no se encontra comprometida quando a presuno for corretamente utilizada para a criao de obrigaes tributrias. O enunciado presuntivo no altera o antecedente da regramatriz de incidncia tributria, nem equipara, por analogia ou interpretao extensiva, fato que no como se fosse, nem substitui a necessidade de provas. Apenas, tosomente, prova o acontecimento factual relevante no de forma direta j que isso, no caso concreto, impossvel ou muito difcil mas indiretamente, baseandose em indcios graves, precisos e concordantes, que levem concluso de que o fato efetivamente ocorreu19.

    17 FERRAGUT, Maria Rita. Presunes no Direito Tributrio. So Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 146147. 18 Cf. Jimir Doniak Jr, citado por FERRAGUT, ob. cit., p. 146. 19 Op. cit., p. 168.

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    26

    12

    [...]

    [...] Ora, diante de tudo o que j foi exposto at aqui, temos que as presunes constituemse em meio de prova que contribui para a eficcia jurdica da norma. E, se assim, no se trata de alegar que a obrigao decorre de fato no previsto na regramatriz, mas de se reconhecer que o conhecimento do evento descrito no fato jurdico tpico dse de forma indireta, com base em fatos indicirios graves, precisos e concordantes no sentido da ocorrncia pretrita do evento diretamente desconhecido20. (grifos nossos)

    A norma aduaneira, inclusive, admite textualmente a presuno de interposio fraudulenta de terceiros nas operaes de comrcio exterior diante da nocomprovao da origem, disponibilidade e transferncia dos recursos empregados (vide artigo 23, inciso V e 2, do Decretolei n 1.455/76, com a redao dada pelo art. 59 da Lei n 10.637/200221) (destaque nosso).

    Os argumentos at aqui desenvolvidos tambm deixam claro que a empresa que procurou se beneficiar indevidamente do direito creditrio das contribuies sociais PIS e COFINS foi a prpria Rojana Calados, a qual buscava a extino de dbitos prprios, por compensao, com os supostos crditos das contribuies. Assim, ela mesma quem deve figurar no plo passivo, o que afasta tambm o argumento de nulidade por aduzida ilegitimidade passiva da reclamante.

    Tambm no merece prosperar a argida nulidade do julgamento de primeira instncia por suposto cerceamento do direito de defesa da interessada, cerceamento o qual teria sido caracterizado na recusa do pedido de percia destinada a esclarecer, dentre outras, a questo dos adiantamentos que o contribuinte teria realizado s empresas Ronessa, Rafelly e Ronelly.

    Segundo o art. 18 do Decreto n 70.235/72, com a redao dada pelo art. 1 da Lei n 8.748/93, o julgador tem a prerrogativa de determinar de ofcio percias ou diligncias quando considerlas necessrias para a instruo do processo e, conseqentemente, para a soluo do litgio, sendo facultado ainda ao mesmo o indeferimento daquelas que [...] considerar prescindveis ou impraticveis [...].

    Portanto, tanto a percia como a diligncia, por representarem instrumentos capazes de propiciar melhor convencimento ao julgador, podero ser justificadamente negadas por este, no representando, pois, direito subjetivo do impugnante.

    Ademais, de acordo com os artigos 15, caput, e 16, 4, do PAF, as provas do sujeito passivo devero ser apresentadas no momento da impugnao, sob pena de precluso desse direito, salvo se demonstrada uma das hipteses discriminadas nos incisos a a c do

    20 Op. cit., p. 170. 21 Art 23. Consideramse dano ao Errio as infraes relativas s mercadorias: [...] V estrangeiras ou nacionais, na importao ou na exportao, na hiptese de ocultao do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsvel pela operao, mediante fraude ou simulao, inclusive a interposio fraudulenta de terceiros. (Includo pela Lei n 10.637, de 30.12.2002) [...] 2 Presumese interposio fraudulenta na operao de comrcio exterior a nocomprovao da origem, disponibilidade e transferncia dos recursos empregados. (Includo pela Lei n 10.637, de 30.12.2002) [...] (grifo nosso)

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    Processo n 11065.100019/201005 Acrdo n. 3802001.553

    S3TE02 Fl. 203

    13

    mencionado 4, atravs de petio devidamente fundamentada ( 5 do mesmo artigo), condies as quais no foram evidenciadas no caso presente.

    A primeira instncia recursal indeferiu o pedido de percia baseada na fundamentada suficincia probatria dos autos para a formao da convico pelo julgador. A suplicante alega a necessidade de percia para comprovar a razo dos adiantamentos realizados s empresas Ronessa, Rafelly e Ronelly, o que poderia ter feito atravs da apresentao de documentos que s ela pode dispor. Ora, a interposio de recurso voluntrio sem a apresentao de nenhuma documentao nova voltada a alicerar os argumentos da reclamante revela que andou bem a DRJ quando negou o pedido de produo pericial. E pelos mesmos fundamentos, nego o pedido de percia reapresentado na presente instncia recursal.

    Afastase, pois, aqui tambm, o argumento em prol da nulidade por aduzido cerceamento ao direito de defesa da interessada.

    Examinadas as questes de natureza preliminar e as nulidades aduzidas pela reclamante deixadas para o final em vista de sua ligao com as questes principais tratadas e considerando que, no mrito, no assiste razo recorrente, h que se concluir pela improcedncia dos argumentos apresentados pela interessada, devendo, portanto, ser mantido o entendimento da autoridade administrativa no sentido de glosar os crditos argidos pelo sujeito passivo.

    Da concluso

    Por todo o exposto, voto, preliminarmente, para indeferir o pedido de percia formalizado pela recorrente, bem como para no acolher as razes de nulidade aduzidas pela interessada, e, no mrito, para negar provimento ao recurso voluntrio interposto pela mesma.

    Sala de Sesses, em 26 de fevereiro de 2013.

    (assinado digitalmente)

    Francisco Jos Barroso Rios Relator

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  • TEMA: ADITAMENTO NAS RAZES DO LANAMENTO E SUAS IMPLICA-ES NO PRAZO DECADENCIAL CONSELHEIRO (A): Rycardo Henrique M. de Oliveira

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  • Acrdos

    31

    CSRFT2 Fl. 231

    1

    230CSRFT2 MINISTRIO DA FAZENDA

    CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS CMARA SUPERIOR DE RECURSOS FISCAIS

    Processo n 10980.012320/200592

    Recurso n 156.110 Especial do Contribuinte

    Acrdo n 920202.322 2 Turma Sesso de 24 de setembro de 2012

    Matria IRPF GLOSAS LIVRO CAIXA DECADNCIA TERMO FINAL

    Recorrente RENATO POSPISSIL

    Interessado FAZENDA NACIONAL

    ASSUNTO: NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTRIO Anocalendrio: 2000

    IRPF. NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTRIO. OMISSO DE RENDIMENTOS. RAZES DO LANAMENTO SUBSTANCIALMENTE ADITADAS APS AUTUAO INAUGURAL. TERMO FINAL DECADNCIA. DESLOCADO.

    Tendo a fiscalizao aditado as razes da autuao, aps a sua lavratura, a partir de diligncia determinada pela autoridade julgadora de primeira instncia, trazendo colao somente nesta segunda oportunidade as justificativas do lanamento, requisitos substanciais/materiais do Auto de Infrao, essenciais a sua prpria validade, impese considerar que o ato administrativo somente se aperfeioou/consumou a partir de referidas providncias, deslocandose, assim, o termo final do prazo decadencial para tal data.

    Como se observa, in casu, no se trata de uma simples diligncia para elucidar questes perifricas ou sanear dvidas do julgador diante das razes e documentos ofertados pelo contribuinte, mas, sim, de verdadeira complementao/aditamento da autuao, com a descrio dos fatos, indicao das despesas glosadas, datas, valores e apresentao dos documentos que serviram de lastro ao lanamento, pressupostos indispensveis validade do Auto de Infrao, sem os quais no produz efeitos.

    Recurso especial provido.

    Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

    Acordam os membros do colegiado, por maioria de votos, em dar provimento ao recurso. Vencidos os Conselheiros Luiz Eduardo de Oliveira Santos e Pedro Paulo Pereira Barbosa. Votou pelas concluses o Conselheiro Valmar Fonseca de Menezes.

    Fl. 1DF CARF MF

    Impresso em 10/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA

    CPI

    A

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2 de 24/08/2001Autenticado digitalmente em 01/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA, Assinado digitalmente em 10/10/2012 por VALMAR FONSECA DE MENEZES, Assinado digitalmente em 09/10/2012 por RYCARDO HENRIQUE MAGALHAES DE OLIVEIRA

  • Acrdos

    32

    2

    (Assinado digitalmente)

    Valmar Fonseca de Menezes Presidente em exerccio

    (Assinado digitalmente)

    Rycardo Henrique Magalhes de Oliveira Relator

    EDITADO EM: 26/09/2012

    Participaram, do presente julgamento, os Conselheiros Valmar Fonseca de Menezes (Presidente em exerccio), Gonalo Bonet Allage (VicePresidente em exerccio), Luiz Eduardo de Oliveira Santos, Pedro Anan Junior, Marcelo Oliveira, Manoel Coelho Arruda Junior, Gustavo Lian Haddad, Pedro Paulo Pereira Barbosa, Rycardo Henrique Magalhes de Oliveira e Elias Sampaio Freire.

    Relatrio

    RENATO POSPISSIL, contribuinte, pessoa fsica, j devidamente qualificado nos autos do processo administrativo em epgrafe, teve contra si lavrado Auto de Infrao, em 11/09/2005 (fl. 33), exigindolhe crdito tributrio relativo ao Imposto de Renda Pessoa Fsica IRPF, concernente a omisses de rendimentos decorrentes de glosas de despesas com Livro Caixa, em relao ao anocalendrio 2000, conforme pea inaugural do feito, s fls. 19/25, e demais documentos que instruem o processo.

    Devidamente intimado do lanamento, o contribuinte interps impugnao, s fls. 01/13, suscitando preliminarmente a nulidade do feito em razo da ausncia da descrio das despesas que teriam sido glosadas e objeto da exigncia fiscal.

    Por sua vez, a autoridade julgadora de primeira instncia entendeu por bem converter o julgamento em diligncia, s fls. 34, determinando o saneamento do Auto de Infrao nos seguintes termos:

    1) especificar quais foram os valores glosados, com anexao aos autos de demonstrativo nesse sentido, bem como de eventual cpia do livro caixa

    2) anexar comprovao de cincia do contribuinte quanto relao detalhada das despesas glosadas e, caso inexistente, que seja lhe dada cincia, com abertura integral de prazo para impugnao

    Em atendimento referida diligncia, a autoridade lanadora elaborou informao fiscal, s fls. 36 e 76/82, identificando as despesas glosadas, com as respectivas datas, descries, valores e motivos das glosas, juntando, ainda, o Livro Caixa do contribuinte, s fls. 37/74, com cincia ao autuado em 25/08/2006, de fl. 75, tendo apresentado impugnao complementar, s fls. 85/101.

    Aps regular processamento, interposto recurso voluntrio ao ento Primeiro Conselho de Contribuintes contra Deciso da 4a Turma da DRJ em Curitiba/PR, consubstanciada no Acrdo n 0612.638/2006, s fls. 117/130, que julgou procedente o

    Fl. 2DF CARF MF

    Impresso em 10/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA

    CPI

    A

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2 de 24/08/2001Autenticado digitalmente em 01/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA, Assinado digitalmente em 10/10/2012 por VALMAR FONSECA DE MENEZES, Assinado digitalmente em 09/10/2012 por RYCARDO HENRIQUE MAGALHAES DE OLIVEIRA

  • Acrdos

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    Processo n 10980.012320/200592 Acrdo n. 920202.322

    CSRFT2 Fl. 232

    3

    lanamento fiscal em referncia, a Egrgia 4 Cmara, em 06/08/2008, pelo voto de qualidade, achou por bem NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO VOLUNTRIO DO CONTRIBUINTE, o fazendo sob a gide dos fundamentos inseridos no Acrdo n 10423.364, sintetizados na seguinte ementa:

    ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA FSICA IRPF

    Exerccio: 2001

    PRELIMINAR NULIDADE DO AUTO DE INFRAO CERCEAMENTO AO DIREITO DE DEFESA No presentes as irregularidades previstas no artigo 59, do Decreto n 70.23 5, de 1972, e sanadas as incorrees e imperfeies do lanamento, por meio da realizao de diligncia, sobre a qual o contribuinte teve oportunidade de se manifestar em nova impugnao, no h que se falar em nulidade do procedimento.

    DECADNCIA CONTAGEM DO PRAZO TERMO FINAL Com a lavratura do auto de infrao e a respectiva cincia pelo contribuinte, consumase o lanamento do crdito tributrio. Por outro lado, igualmente determinase o termo final para a contagem do prazo decadencial. Desta forma, a decadncia s passvel de ocorrer no perodo anterior a essa lavratura, j que, posteriormente, e at que flua o prazo para a interposio do recurso administrativo, ou enquanto no for decidido recurso porventura utilizado pelo contribuinte, no mais corre prazo decadencial.

    IRPF LIVRO CAIXA Cabe ao contribuinte comprovar, mediante documentao hbil e idnea, a veracidade das receitas e despesas escrituradas em Livro Caixa, mantendo tudo em seu poder, disposio da fiscalizao, enquanto no ocorrer a prescrio ou decadncia.

    IRRF LIVRO CAIXA GLOSA DE DEDUO Somente so dedutveis as despesas escrituradas no Livro Caixa, se necessrias percepo de receita e manuteno da fonte produtora e desde que devidamente comprovadas.

    JUROS TAXA SELIC A partir de 1 de abril de 1995, os juros moratrios incidentes sobre dbitos tributrios administrados pela Secretaria da Receita Federal so devidos, no perodo de inadimplncia, taxa referencial do Sistema Especial de Liquidao e Custdia SELIC para ttulos federais (Smula 1

    CC n 4).

    Preliminar rejeitada.

    Argio de decadncia rejeitada.

    Recurso negado.

    Irresignado, o Contribuinte interps Recurso Especial, s fls. 178/188, com arrimo no artigo 7, inciso II, do ento Regimento Interno da Cmara Superior de Recursos

    Fl. 3DF CARF MF

    Impresso em 10/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA

    CPI

    A

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2 de 24/08/2001Autenticado digitalmente em 01/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA, Assinado digitalmente em 10/10/2012 por VALMAR FONSECA DE MENEZES, Assinado digitalmente em 09/10/2012 por RYCARDO HENRIQUE MAGALHAES DE OLIVEIRA

  • Acrdos

    34

    4

    Fiscais, aprovado pela Portaria MF n 147/2007, procurando demonstrar a insubsistncia do Acrdo recorrido, desenvolvendo em sntese as seguintes razes:

    Aps breve relato das fases ocorridas no decorrer do processo administrativo fiscal, insurgese contra o Acrdo atacado, por entender ter contrariado entendimento levado a efeito pelas demais Cmaras dos Conselhos de Contribuintes a respeito da mesma matria, conforme se extrai do Acrdo n 10247.824, impondo seja conhecido o recurso especial do recorrente, uma vez comprovada divergncia arguida.

    Reitera as alegaes suscitadas em sede de impugnao e recurso voluntrio, especialmente quanto ao termo final do prazo decadencial, no sentido de que ocorrera somente com a cincia da diligncia determinada pelo julgador de primeira instncia para que autoridade lanadora saneasse o lanamento fiscal.

    Assevera que o Acrdo paradigma por demais enftico ao estabelecer que a reabertura do prazo de impugnao, para o contribuinte se manifestar a propsito de diligncia e documentos que deveriam ter sido colacionados aos autos por ocasio do lanamento, desloca o termo final do prazo decadencial para a data da cincia de referido aditamento/saneamento, ao contrrio do que restou assentado pelo decisum guerreado.

    Contrapese ao Acrdo atacado, inferindo que somente foram juntados ao processo os principais fundamentos e reais motivos da autuao aps a diligncia determinada pelo julgador de primeira instncia, a partir da alegao do contribuinte da nulidade por cerceamento do direito de defesa, na pea impugnatria.

    Dessa forma, impese reconhecer que o lanamento s fora devidamente aperfeioado em 25/08/2006, oportunidade em que o contribuinte tomou conhecimento dos motivos, descrio, datas e valores das despesas com Livro Caixa que foram glosadas pela fiscalizao.

    Defende que a data final do prazo decadencial para a constituio do crdito objeto da medida fiscal em destaque 31/12/2005, marco temporal em que expirou o direito da Fazenda Nacional efetuar o lanamento em decorrncia lgica e direta da incidncia da decadncia, o que retira o direito de constituir o crdito tributrio, haja vista a cincia vlida ter ocorrido em 25/08/2006.

    Alega ser nula a primeira citao do lanamento, em face de evidente cerceamento do direito de defesa do contribuinte, porquanto no observados os requisitos formais de observncia obrigatria para que seja reconhecida a validade da medida, nos termos do artigo 10, inciso III, do Decreto n 70.235/72, o qual contempla a necessidade da descrio do fato.

    Esclarece que a falha na descrio dos fatos no se restringiu apenas em simples falta de clareza nos fundamentos, uma vez que, de incio, no foram oferecidas quais as razes, nem tampouco o detalhamento das glosas efetuadas, o que s ocorrera aps a diligncia determinada pela autoridade julgadora de primeira instncia.

    Acrescenta que prevalecendo a tese do voto vencedor do Acrdo recorrido, estarseia estabelecendo a possibilidade de toda vez em que se aproximasse o prazo fatal da decadncia, a Fiscalizao no intuito de se precaver, procedesse lanamentos tributrios aos milhares de incautos contribuintes, cujos autos de infrao desprovidos de tcnicas formais, incompletos em sua descrio ftica, j que estes requisitos no seriam necessrios ou vazios

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    Processo n 10980.012320/200592 Acrdo n. 920202.322

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    de contedos jurdicos sob o plio da faculdade de posterior correo de tais vcios, conseguindo, por este ardil, postergar a data limtrofe da decadncia a seu bel prazer.

    Por fim, repisa os argumentos lanados em sede de recurso voluntrio, requerendo o conhecimento e provimento do Recurso Especial, impondo a reforma do decisum ora atacado, nos termos encimados.

    Submetido a exame de admissibilidade, o ilustre Presidente da 2 Cmara da 2a SJ do CARF, entendeu por bem admitir o Recurso Especial do contribuinte, sob o argumento de que o recorrente logrou comprovar que o Acrdo guerreado divergiu de outras decises exaradas pelas demais Cmaras dos Conselhos de Contribuintes, a propsito da mesma matria, Acrdo paradigma n 10247.824, conforme Despacho n 220000.593/2011, s fls. 217/222.

    Instada a se manifestar a propsito do Recurso Especial do contribuinte, a Fazenda Nacional apresentou suas contrarrazes, s fls. 226/230, corroborando as razes de decidir do Acrdo recorrido, em defesa de sua manuteno.

    o Relatrio.

    Voto

    Conselheiro Rycardo Henrique Magalhes de Oliveira, Relator

    Presentes os pressupostos de admissibilidade, sendo tempestivo e acatada pelo ilustre Presidente da 2 Cmara da 2a SJ do CARF a divergncia suscitada, conheo do Recurso Especial e passo anlise das razes recursais.

    Conforme se depreende da pea recursal, como j robustamente demonstrado nos autos, o contribuinte deduziu de seu imposto de renda as despesas com Livro Caixa suportadas no anocalendrio fiscalizado. Uma vez intimado a comprovar a efetividade de tais despesas, o autuado no logrou comprovalas, na forma que a legislao de regncia exigia, ensejando a respectiva glosa e a lavratura do presente auto de infrao.

    Devidamente intimado do lanamento, o contribuinte interps impugnao, s fls. 01/13, suscitando preliminarmente a nulidade do feito em razo da ausncia da descrio das despesas que teriam sido glosadas e objeto da exigncia fiscal.

    Por sua vez, a autoridade julgadora de primeira instncia entendeu por bem converter o julgamento em diligncia, s fls. 34, determinando o saneamento do Auto de Infrao nos seguintes termos:

    3) especificar quais foram os valores glosados, com anexao aos autos de demonstrativo nesse sentido, bem como de eventual cpia do livro caixa

    4) anexar comprovao de cincia do contribuinte quanto relao detalhada das despesas glosadas e, caso inexistente, que seja lhe dada cincia, com abertura integral de prazo para impugnao

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    Em atendimento referida diligncia, a autoridade lanadora elaborou informao fiscal, s fls. 36 e 76/82, identificando as despesas glosadas, com as respectivas datas, descries, valores e motivos da glosa, juntando, ainda, o Livro Caixa do contribuinte, s fls. 37/74, com cincia ao autuado em 25/08/2006, de fl. 75, tendo aprosentado impugnao complementar, s fls. 85/101.

    Por seu turno, a Cmara recorrida, pelo voto de qualidade, entendeu por bem rechaar a pretenso do contribuinte, reconhecendo como termo final da decadncia a primeira cincia do Auto de Infrao, afastando o argumento de que somente com a diligncia determinada pela autoridade julgadora de primeira instncia se aperfeioou o lanamento, razo pela qual o prazo decadencial somente se findaria na data da cincia do resultado de referida diligncia, com reabertura do prazo de impugnao.

    Inconformado, o contribuinte interps Recurso Especial de Divergncia, pugnando pela reforma do Acrdo em vergasta, alegando, em sntese, que as razes de decidir ali esposadas contrariaram outras decises das demais Cmaras deste Conselho a respeito da mesma matria, mais precisamente o Acrdo n 10247.824.

    A fazer prevalecer sua pretenso, sustenta que o Acrdo paradigma por demais enftico ao estabelecer que a reabertura do prazo de impugnao, para o contribuinte se manifestar a propsito de diligncia e documentos que deveriam ter sido colacionados aos autos por ocasio do lanamento, desloca o termo final do prazo decadencial para a data da cincia de referido aditamento/saneamento, ao contrrio do que restou assentado pelo decisum guerreado.

    Com mais especificidade, aduz que somente foram juntados ao processo os principais fundamentos e reais motivos da autuao aps a diligncia determinada pelo julgador de primeira instncia, a partir da alegao do contribuinte da nulidade por cerceamento do direito de defesa, na pea impugnatria.

    Neste sentido, impese reconhecer que o lanamento s fora devidamente aperfeioado em 25/08/2006, oportunidade em que o contribuinte tomou conhecimento plenamente das glosas, dos motivos, descrio, datas e valores das despesas com Livro Caixa que foram glosadas pela fiscalizao, sendo, portanto, o termo final a ser admitido na contagem do prazo decadencial.

    Arremata, defendendo que a falha na descrio dos fatos no se restringiu apenas em simples falta de clareza nos fundamentos, uma vez que, de incio, no foram oferecidos quais as razes, nem tampouco o detalhamento das glosas efetuadas, o que s ocorrera aps a diligncia determinada pela autoridade julgadora de primeira instncia.

    Como se observa, resumidamente, o cerne da questo posta nos autos a discusso a propsito da possibilidade de se admitir como data da efetiva cincia do auto de infrao, ou melhor, do devido aperfeioamento do lanamento, a cincia do resultado da diligncia determinada pela autoridade julgadora de primeira instncia, saneando o ato fiscal, descrevendo precisamente as despesas glosadas, com as respectivas datas, descries, valores e motivos da glosa, juntando, ainda, o Livro Caixa do contribuinte.

    De incio, para melhor delimitao do tema, na busca da soluo mais adequada da lide, impende definir a natureza do vcio incorrido pela autoridade lanadora, de maneira a verificar a sua importncia na validade do lanamento.

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    Processo n 10980.012320/200592 Acrdo n. 920202.322

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    A grande celeuma, em verdade, tratase em definir se estamos diante de um mero vcio formal, passvel de saneamento sem qualquer alterao do contedo do ato administrativo, ou de vcio material do lanamento que, mesmo sendo passvel de correo antes da deciso inaugural, representaria um verdadeiro aditamento ao Auto de Infrao, que somente estaria definitivamente aperfeioado nesta ltima oportunidade.

    Isto porque, considerando tratarse de simples vcio formal, admitir a data da cincia da diligncia como termo final do prazo decadencial, por via transversa implica malferir os preceitos do artigo 173, inciso II, do Cdex Tributrio, uma vez que, nestes casos, a melhor soluo seria determinar a nulidade do feito, restabelecendo, assim, lapso temporal da decadncia a contar da deciso que anulou o lanamento por vcio formal, como restou devidamente assentado no voto vencedor do Acrdo recorrido.

    Em outra via, admitindose que estamos diante de um vcio material, no contedo do ato do lanamento, temos que reconhecer que o auto de infrao somente se aperfeioou com o saneamento procedido a partir da diligncia determinada pelo julgador de primeira instncia, entendimento que nos filiamos, pelas razes de fato e de direito que passamos a desenvolver.

    Antes mesmo de se adentrar s demais questes de mrito propriamente ditas, de bom alvitre trazer baila a distino das 03 (trs) concluses possveis, a priori, de serem levadas a efeito em um julgamento, quais sejam, vcio formal, material ou (im) procedncia do lanamento.

    O vcio formal, em nosso entender, relacionase aos requisitos de validade do ato administrativo, ou seja, os pressupostos sem os quais referido ato no produziria efeitos. Em outras palavras, guarda relao com as formalidades legais extrnsecas do lanamento. Os artigos 10 e 11, do Decreto n 70.235/72, so os exemplos mais ntidos que podemos encontrar a respeito do tema, in verbis:

    Art. 10. O auto de infrao ser lavrado por servidor competente, no local da verificao da falta, e conter obrigatoriamente:

    I a qualificao do autuado

    II o local, a data e a hora da lavratura

    III a descrio do fato

    IV a disposio legal infringida e a penalidade aplicvel

    V a determinao da exigncia e a intimao para cumprila ou impugnla no prazo de trinta dias

    VI a assinatura do autuante e a indicao de seu cargo ou funo e o nmero de matrcula.

    Art.11. A notificao de lanamento ser expedida pelo rgo que administra o tributo e conter obrigatoriamente:

    I a qualificao do notificado

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    II o valor do crdito tributrio e o prazo para recolhimento ou impugnao

    III a disposio legal infringida, se for o caso

    IV a assinatura do chefe do rgo expedidor ou de outro servidor autorizado e a indicao de seu cargo ou funo e o nmero

    Ao tratar da matria, a Lei n 4.717/65, que regulamenta a Ao Popular, em seu artigo 2, pargrafo nico, alnea b, estabelece que o vcio formal :

    [...] a omisso ou observncia incompleta ou irregular de formalidades indispensveis existncia ou seriedade do ato.

    Como se observa, o ato administrativo somente ter validade se observados os pressupostos formais, extrnsecos, insculpidos nos dispositivos legais supra, entre outros, sob pena de ser anulado por vcio formal. Repitase, o requisito formal do lanamento representa a observncia dos ditames estabelecidos por lei no momento de sua exteriorizao.

    A jurisprudncia administrativa, que se ocupou do tema, mansa e pacfica nesse sentido, seno vejamos:

    PROCESSUAL LANAMENTO VCIO FORMAL NULIDADE nula a Notificao de Lanamento emitida sem o nome do rgo que a expediu, sem identificao do chefe desse rgo ou outro servidor autorizado e sem a indicao do respectivo cargo e matrcula, em flagrante descumprimento s disposies do art. 11, do Decreto n 70.235/72. Precedentes da Terceira Turma da Cmara Superior de Recursos Fiscais. Recurso Especial improvido. (3 Turma da Cmara Superior de Recursos Fiscais, Recurso n 201108717 Acrdo n CSRF/0303.305, Sesso de 09/07/2002)

    PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL NULIDADE VCIO FORMAL LANAMENTO FISCAL COM ALEGADO ERRO DE IDENTIFICAO DO SUJEITO PASSIVO INEXISTNCIA Os vcios formais so aqueles que no interferem no litgio propriamente dito, ou seja, correspondem a elementos cuja ausncia no impede a compreenso dos fatos que baseiam as infraes imputadas. Circunscrevemse a exigncias legais para garantia da integridade do lanamento como ato de ofcio, mas no pertencem ao seu contedo material. O suposto erro na identificao do sujeito passivo caracteriza vcio substancial, uma nulidade absoluta, no permitindo a contagem do prazo especial para decadncia previsto no art. 173, II, do CTN. [...] (8 Cmara do 1 Conselho, Recurso n 143.020 Acrdo n 10808.174, Sesso de 23/02/2005) (grifamos)

    O Acrdo n 10706695, da lavra do Conselheiro representante da Fazenda, Dr. Francisco de Sales Ribeiro de Queiroz, nos traz com muita propriedade a diferenciao entre vcio formal e material, nos seguintes termos:

    [...]

    RECURSO EX OFFICIO NULIDADE DO LANAMENTO VCIO FORMAL. A verificao da ocorrncia do fato gerador

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    Processo n 10980.012320/200592 Acrdo n. 920202.322

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    da obrigao, a determinao da matria tributvel, o clculo do montante do tributo devido e a identificao do sujeito passivo, definidos no artigo 142 do Cdigo Tributrio Nacional CTN, so elementos fundamentais, intrnsecos, do lanamento, sem cuja delimitao precisa no se pode admitir a existncia da obrigao tributria em concreto. O levantamento e observncia desses elementos bsicos antecedem e so preparatrios sua formalizao, a qual se d no momento seguinte, mediante a lavratura do auto de infrao, seguida da notificao ao sujeito passivo, quando, a sim, devero estar presentes os seus requisitos formais, extrnsecos, como, por exemplo, a assinatura do autuante, com a indicao de seu cargo ou funo e o nmero de matrcula a assinatura do chefe do rgo expedidor ou de outro servidor autorizado, com a indicao de seu cargo ou funo e o nmero de matrcula.[...] (7 Cmara do 1 Conselho de Contribuintes Recurso n 129.310, Sesso de 09/07/2002)

    Por sua vez, o vcio material do lanamento ocorre quando a autoridade lanadora no demonstra/descreve de forma clara e precisa os fatos/motivos que a levaram a lavrar a notificao fiscal e/ou auto de infrao. Guarda relao com o contedo do ato administrativo, pressupostos intrnsecos do lanamento.

    Destarte, o artigo 142 do Cdigo Tributrio Nacional, ao atribuir a competncia privativa do lanamento a autoridade administrativa, igualmente, exige que nessa atividade o fiscal autuante descreva e comprove a ocorrncia do fato gerador do tributo lanado, identificando perfeitamente o sujeito passivo, como segue:

    Art. 142. Compete privativamente autoridade administrativa constituir o crdito tributrio pelo lanamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrncia do fato gerador da obrigao correspondente, determinar a matria tributvel, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicao da penalidade cabvel.

    No mesmo sentido, o artigo 50 da Lei n 9.784/99 estabelece que os atos administrativos devem conter motivao clara, explcita e congruente, sob pena de nulidade, vejamos:

    Art. 50. Os atos administrativos devero ser motivados, com indicao dos fatos e fundamentos jurdicos [...]

    1 A motivao deve ser explcita, clara e congruente [...]

    Consoante se infere dos dispositivos legais encimados, para que o lanamento encontre sustentculo nas normas jurdicas e, consequentemente, tenha validade, dever o fiscal autuante descrever precisamente e comprovar a ocorrncia do fato gerador do tributo. A ausncia dessa descrio clara e precisa, especialmente no Relatrio do Trabalho Fiscal, ou erro nessa conduta, macula o procedimento fiscal por vcio material.

    Outro no o entendimento do ilustre Dr. Manoel Antnio Gadelha Dias, expresidente do 1 Conselho de Contribuinte, conforme se extrai do excerto de sua obra O Vcio Formal no Lanamento Tributrio, nos seguintes termos:

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    [...]

    O defeito na descrio do fato, por exemplo, no pode caracterizarse mero vcio formal, pois a descrio do fato est intimamente ligada valorao jurdica do fato jurdico, requisito fundamental do lanamento.

    A descrio do fato defeituosa tanto pode configurar nulidade de direito material como de direito processual.

    Estaremos diante da primeira situao quando o vcio atinge o motivo do ato, ou seja, o seu pressuposto objetivo, que corresponde ocorrncia dos fatos que ensejaram a sua prtica. (Trres, Heleno Taveira et al. coordenao Direito Tributrio e Processo Administrativo Aplicados So Paulo : Quartier Latin, 2005, p. 348)

    A jurisprudncia administrativa no discrepa desse entendimento, consoante se positiva dos julgados com suas ementas abaixo transcritas:

    PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. RECURSO EX OFFICIO nulo o Ato Administrativo de Lanamento, formalizado com inegvel insuficincia na descrio dos fatos, no permitindo que o sujeito passivo pudesse exercitar, como lhe outorga o ordenamento jurdico, o amplo direito de defesa, notadamente por desconhecer, com a necessria nitidez, o contedo do ilcito que lhe est sendo imputado. Tratase, no caso, de nulidade por vcio material, na medida em que falta contedo ao ato, o que implica inocorrncia da hiptese de incidncia. (1 Cmara do 1 Conselho de Contribuintes, Recurso n 132.213 Acrdo n 10194049, Sesso de 06/12/2002, unnime)

    LANAMENTO NULIDADE VCIO MATERIAL DECADNCIA Nulo o lanamento quando ausentes a descrio do fato gerador e a determinao da matria tributvel, por se tratar de vcio de natureza material. Aplicvel o disposto no artigo 150, 4, do CTN. (2 Cmara do 1 Conselho, Recurso n 138.595 Acrdo n 10247201, Sesso de 10/11/2005)

    Antes de seguir com o estudo, cabe aqui fazer um parntese, relativamente ao efeito prtico de se declarar a nulidade do lanamento por vcio formal ou material. No primeiro caso, o prazo decadencial restabelecido, passando a ser contado a partir da data da deciso definitiva que declarou a nulidade por vcio formal do lanamento. o que se extrai do artigo 173, inciso II, do CTN.

    Por outro lado, tratandose de vcio material, o prazo decadencial continua a ser contado da ocorrncia do fato gerador do tributo, no caso do artigo 150, 4, do CTN, ou do 1 dia do exerccio seguinte quele em que o lanamento poderia ter sido efetuado, tratandose dos artigos 173 do CTN. Ou melhor, poder o Fisco promover novo lanamento, corrigindo o vcio material incorrido, conquanto que dentro do prazo decadencial acima estipulado.

    Retornando diferenciao das concluses de julgamento, j a decretao da improcedncia da autuao, implica inferir que, diante dos elementos de provas e razes ofertados pela autoridade lanadora, chegouse concluso da inexistncia do fato gerador do tributo exigido. Ou seja, adentrandose ao mrito da questo, o lanamento efetuado no deve

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    prosperar, uma vez que no restou comprovada a ocorrncia do fato gerador, o que impede o Fisco de promover novo lanamento a partir dos mesmos fatos.

    Diante de tais consideraes, voltemos hiptese dos autos, onde o fiscal autuante promoveu o lanamento sem a devida descrio das imputaes e, posteriormente, instado pelo julgador de primeira instncia, apresentou as respectivas datas, descries, valores e motivos da glosa, juntando, ainda, o Livro Caixa do contribuinte e, por conseguinte, somente a, demonstrando o prprio fato gerador do imposto de renda ora exigido e condio do lanamento. Nesses termos, no se cogitaria em vcio formal, mas, sim, em mcula no lanamento por vcio material.

    Observese que o contribuinte somente teve condies de defesa e tomou conhecimento das infraes apontadas pela fiscalizao nesta segunda oportunidade, razo pela qual temos que reconhecer que fora aps a cincia da diligncia fiscal que o auto de infrao passou a produzir plenamente seus devidos efeitos, com a perfeita descrio do fato gerador e razes da autuao.

    A propsito da matria, dissertou com muita propriedade o ilustre Conselheiro Pedro Paulo Pereira Barbosa, nos autos do processo administrativo n 10935.003462/200342, de onde peo vnia para transcrever a ementa e excerto do voto, e adotar como razes de decidir:

    EMENTA:

    LANAMENTO COM BASE EM DEPSITOS BANCRIOS REGULAR INTIMAO PARA COMPROVAR A ORIGEM DOS DEPSITOS LEGITIMIDADE DA PRESUNO DE OMISSO DE RENDIMENTOS A presuno de omisso de rendimentos com base em depsitos bancrios requer a prvia e regular intimao do titular da conta bancria para comprovar a origem dos valores utilizados nas operaes. A intimao genrica, sem a indicao, de forma individualizada, dos depsitos bancrios cujas origens devem ser comprovadas, no satisfaz a condio de regular intimao, indispensvel legitimidade da presuno de omisso de rendimentos.

    Recurso provido.

    [...]

    d) em 17/12/2003 foi ento lavrado o Auto de Infrao do qual o Contribuinte tomou cincia, por via postal, em 23/12/2003

    e) A autoridade julgadora de primeira instncia, entendendo que "as intimaes lavradas no incio do procedimento de fiscalizao, quando sequer se tinha conhecimento dos extratos das contas bancrias, no conferia Fiscalizao, mais de um ano depois, direito de presumir, sem nova intimao ao contribuinte, acompanhada dos extratos bancrios, que os crditos/depsitos foram realizados com rendimentos omitidos", determinou a devoluo dos autos em diligncia, "para que seja atendido o comando do art. 42 da Lei n 9.430/96", mediante nova intimao para que o

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    Contribuinte comprovasse a origem dos depsitos bancrios, agora acompanhada com a cpia da relao individualizada dos depsitos constantes do Termo de Verificao anexo ao Auto de Infrao, (fls. 1317)

    f) O Contribuinte foi intimado, conforme determinado, com cincia da intimao por via postal em 14/04/2004 (fls. 1322), e apresentou, em 04/05/2004, suas razes em resposta intimao, nos termos j relatados e, em 16/06/2004, foi cientificado do Termo de Verificao Fiscal em Procedimento de Diligncia e de Cincia de Prazo para Impugnao de fls. 1671/1685, no qual a autoridade lanadora, aps excluses de valores da base de clculo, apurou o montante do imposto devido, assinando prazo de 30 dias para o Contribuinte impugnar.

    Ante esses fatos colocamse as seguintes questes: a) a intimao na forma como realizada no procedimento fiscal que antecedeu lavratura do Auto de Infrao atende condio de regular intimao posta no art. 42 da Lei n 9.430, de 1996, como pressuposto para a presuno de omisso de rendimentos com base em depsitos bancrios de origem no comprovada? Se no, o vcio pode ser sanado por meio apenas de uma nova intimao, posterior autuao?

    Penso que a resposta negativa para ambas as questes.

    Quanto primeira, o art. 42 da Lei n 9.430, de 1996 claro ao se referir a valores creditados em contas de depsitos ou de investimento a serem analisados de forma individualizada e que o contribuinte deve ser regularmente intimado a comprovar a origem desses crditos. Somente aps a regular intimao, sem que o contribuinte tenha comprovado a origem dos crditos, se presume a omisso de rendimentos. Para maior clareza, reproduzo o art. 42 da Lei n 9.430, de 1996, j com as alteraes posteriores, verbis:

    [...]

    O dispositivo, portanto, cria uma presuno legal de omisso de rendimentos, a qual, entretanto, para se estabelecer, requer a observncia de algumas condies claramente especificadas: a regular intimao do contribuinte, a anlise individualizada dos crditos/depsito, a excluso das transferncias entre contas, a desconsiderao dos valores individuais inferiores a R$ 12.000,00 quanto estes no totalizem no ano R$ 80.000,00, a diviso dos rendimentos e receitas entre os titulares de contas conjuntas, etc.

    No caso concreto, no s a intimao no relacionou os depsitos/crditos cuja origem o Contribuinte deveria demonstrar como indicou, de forma globalizada, valores que sequer correspondem exatamente ao montante dos depsitos bancrios realizados nas contas bancrias, mas meros indicadores do montante da movimentao financeira do titular da conta.

    Ora, como se exigir que o titular da conta bancria comprove, de forma individualizada, a origem dos recursos

    Fl. 12DF CARF MF

    Impresso em 10/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA

    CPI

    A

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2 de 24/08/2001Autenticado digitalmente em 01/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA, Assinado digitalmente em 10/10/2012 por VALMAR FONSECA DE MENEZES, Assinado digitalmente em 09/10/2012 por RYCARDO HENRIQUE MAGALHAES DE OLIVEIRA

  • Acrdos

    43

    Processo n 10980.012320/200592 Acrdo n. 920202.322

    CSRFT2 Fl. 237

    13

    depositados em sua conta bancrias, se a intimao no individualiza esses depsitos?

    Vale repisar que o art. 42 da Lei n 9.430, de 1996 instituiu uma presuno legal, que representou, em termos prticos, a inverso do nus da prova, mas no a inverso do nus de realizar os procedimentos de apurao do crdito tributrio, referidos no artigo 142 do CTN, verbis:

    [...]

    Notese que se trata aqui de lanamento de ofcio e, portanto, cabe ao Fisco e no ao contribuinte realizar os procedimentos tendentes apurao do montante do imposto devido. E o que se tem neste caso que, ao intimar o Contribuinte, genericamente, da origem dos depsitos bancrios, sem individualizlos, informando apenas valores globalizados relativos a crditos sobre os quais incidiu a CPMF, o Fisco praticamente transferiu para o Contribuinte o nus de realizar todo o procedimento.

    foroso concluir, portanto, que da forma como foram feitas as intimaes que antecederam lavratura do Auto de Infrao, no se atendeu ao requisito da regular intimao a que se refere o caput do art. 42 da Lei n 9.430, de 1996 e, assim, no se implementaram as condies para que o Fisco pudesse legitimamente presumir a omisso de rendimentos.

    Seguese a segunda questo: poderia o Fisco proceder intimao, conforme a prescrio da Lei n9.430, de 1996, aps a lavratura do auto de infrao, j na fase conteciosa do procedimento e com isso sanar o vcio?

    A resposta tambm negativa. No caso no se trata de questo acessria, que possa ser corrigida com a simples emenda do ato administrativo, mas de vcio substancial que interfere na essncia da definio da matria tributria e do imposto devido. Como referido acima, a conseqncia da falta de prvia e regular intimao do Contribuinte a falncia dos pressuposto da presuno de omisso de rendimentos e, portanto, da prpria existncia do crdito tributrio. A realizao posterior dos procedimentos previstos no art. 42 da Lei n 9.430, de 1996 poderiam levar presuno de omisso de rendimentos e ensejar a autuao com base em depsitos bancrios de origem no comprovada, mas no poderia retroagir para salvar a autuao anteriormente feita.

    A se admitir tal possibilidade, o Fisco poderia proceder a autuaes sem a observncia dos requisitos referidos no art. 142 do CTN e com base em meras estimativas arbitrrias, para, apenas posteriormente, na fase do contraditrio, apurar o valor efetivamente o crdito tributrio, o que certamente no compatvel com as normas que regem a tributao e o processo administrativo tributrio.

    Fl. 13DF CARF MF

    Impresso em 10/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA

    CPI

    A

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2 de 24/08/2001Autenticado digitalmente em 01/10/2012 por AFONSO ANTONIO DA SILVA, Assinado digitalmente em 10/10/2012 por VALMAR FONSECA DE MENEZES, Assinado digitalmente em 09/10/2012 por RYCARDO HENRIQUE MAGALHAES DE OLIVEIRA

  • Acrdos

    44

    14

    No presente caso, ainda que se considerasse a possibilidade de saneamento dos vcios da autuao, no sendo esses formais, mas substanciais, as providncias saneadoras teriam que ser adotadas dentro do prazo decadencial, o que no ocorreu neste caso, pois a cincia do Termo de Diligncia, a partir do qual o Contribuinte pde se manifestar sobre a apurao do imposto, somente se deu em 16/06/2004.

    [...] (4a Cmara do 1o Conselho de Contribuintes Acrdo n 10422.432 Sesso de 24/05/2007 grifamos)

    Mutatis mutandis, o caso contemplado no processo acima transcrito se amolda perfeitamente hiptese destes autos. Destarte, em que pese se referir autuao com base em depsitos bancrios de origem no comprovada, igualmente, fora implementado somente no decorrer do processo administrativo fiscal, em face de diligncia determinada pelo julgador de primeira instncia.

    No se trata, pois, de uma simples diligncia para elucidar questes perifricas ou sanear dvidas do julgador diante das razes e documentos ofertados pelo contribuinte, mas, sim, de verdadeira complementao/aditamento da autuao, com a descrio dos fatos, indicao das despesas glosadas, datas, valores e apresentao dos documentos que serviram d