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    HISTRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA:repercusso da Lei 10.639 nas escolas municipais da cidade dePetrolina - PE

    Adlene Silva Arantes1

    Fabiana Cristina da SilvaIntroduo

    Sabemos que a educao tem sido entendida como um direito social e umprocesso de desenvolvimento humano. Como pode ser observado nos ParmetrosCurriculares Nacionais (PCN), a educao escolar corresponde a um espaosociocultural e institucional, responsvel pelo trato pedaggico do conhecimento

    e da cultura. Sendo assim, estaramos, segundo Cavalleiro (2006), trabalhandoem solo pacco, porque universalista. Mas, na realidade, as prticas educativas,que se pretendem universalistas, isto , iguais para todos, acabam sendo as maisdiscriminatrias. Da a luta histrica dos movimentos sociais, e, de maneiraespecca, a dos movimentos negros brasileiros por uma sociedade mais justa euma educao que valorize cada sujeito, inclusive o negro, sempre excludo dahistria (ou includo de maneira estereotipada) e da cultura deste pas.

    Pela via legal, ou seja, por meio da legislao, os direitos do povo negroforam assegurados, principalmente, na segunda metade do sculo XX. A partirda criao da organizao das Naes Unidas (ONU), em 1945 e a proclamao,em 1948, da Declarao Universal dos Direitos Humanos, o Brasil iniciou asaes de combate ao racismo e ao preconceito sancionando a Lei Afonso Arinos(1951), que caracterizou a discriminao racial como contraverso penal, aoproibir a discriminao racial no Brasil. Em seguida, vrios movimentos e eventos

    foram organizados no solo brasileiro em prol da eliminao de todas as formas dediscriminao racial. Assim, chegamos a mais uma conquista, a Constituio de1988 que considerou a prtica do racismo como crime inaanvel e imprescritvel,e as manifestaes culturais como um bem de todos, sem preconceitos de origem,raa, sexo, idade e quaisquer outras formas de discriminao. Posteriormente, foipublicada a Lei n 7716/89, a chamada Lei Ca, que dene os crimes resultantes dediscriminao por raa ou cor (CAVALLEIRO, 2006, p.16).

    Portanto, as Leis foram sendo sancionadas tendo em vista impedir o racismo na

    1 Professora assistente - Campus Petrolina - Universidade de Pernambuco.

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    de formao de qualquer sociedade e abre caminhos para a ampliao da cidadania(BRASIL, 2004).

    Diante do exposto, buscamos mapear a repercusso da Lei 10.639/03 e ainsero da histria e cultura afro-brasileira e africana nas escolas municipais de

    Petrolina, buscando compreender de que forma a secretaria municipal tem tentadoimplementar a temtica e como os professores esto atuando nas salas de aula daeducao bsica. Para tanto, fez-se necessrio sondar se os(as) professores(as) egestores(as) da rede municipal de ensino tiveram acesso Lei 10.639 e s DiretrizesCurriculares para a Educao das Relaes tnico-Raciais e para o Ensino deHistria e Cultura Afro-Brasileira e Africana; identicar as aes que a Secretariamunicipal de educao tem feito para implementar a referida lei no currculo escolarda educao bsica, compreender o papel atribudo Lei tanto pela secretaria, comopelos(as) professores(as) pesquisados(as), caracterizar o perl dos professores, queatuam na rede municipal, em relao escolarizao e autoidenticao tnicoracial e apontar diculdades/facilidades que o docente encontra para abordar atemtica em sala de aula.

    Alm das respostas para essas questes, tambm nos propomos, a apresentaros resultados parciais da proposta de interveno que estamos realizando em umadas escolas da rede, objetivando sensibilizar os professores sobre a importncia de

    trabalhar a temtica na sala de aula e construindo estratgias e instrumentos paraessa ao.

    Este texto est organizado em trs partes distintas e complementares. Noprimeiro momento, realizamos uma breve reexo sobre a Lei 10.639/03, cujosprincpios destacados nas diretrizes curriculares institudas sobre a temtica eautores, nos ajudam a compreender as prticas histricas e sociolgicas, que, pormuitos anos, vm criando e reproduzindo, nas escolas, um perl nico do povo

    brasileiro. No segundo momento, apresentamos dados de uma pesquisa descritiva,realizada com professores e membros das equipes gestoras de dez escolas da redemunicipal de Petrolina sobre a repercusso e execuo da referida Lei2. No terceiromomento do texto, registramos a nossa proposta de interveno para implementaoda temtica na sala de aula.

    importante destacar que a nossa proposta de pesquisa e de intervenotambm est alicerada na metodologia da pesquisa-ao por ser um mtodode pesquisa - que agrega diversas tcnicas de pesquisa social - com as quais seestabelece uma estrutura coletiva, participativa e ativa no nvel da captao dainformao; requer, portanto, a participao das pessoas envolvidas no problema

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    investigado. Esse mtodo pressupe nfase anlise das diferentes formas de ao.Os temas so limitados ao contexto da pesquisa com base emprica, voltando-separa a descrio de situaes concretas e para a interveno orientada em funo daresoluo dos problemas efetivamente detectados na coletividade (THIOLLENT,

    1986).Em sntese, como prope esse autor, a pesquisa-ao uma estratgiametodolgica da pesquisa social, na qual existe ampla e explcita interao entreo pesquisador e as pessoas envolvidas na situao investigada. Dessa interaoresulta a priorizao dos problemas a serem pesquisados e das solues a seremencaminhadas em aes concretas; o objeto de investigao no se constitui empessoas, mas, sim, em situaes sociais e seus problemas; o objetivo da pesquisa-ao resolver ou esclarecer os problemas identicados na situao observada.A pesquisa no se limita ao; pressupe um aumento do conhecimento e donvel de conscincia das pessoas ligadas situao e do prprio pesquisador. Deacordo com os princpios da pesquisa-ao, os aspectos prticos de concepo eorganizao do trabalho apresentam fases, que no so rigorosamente sequenciais,sendo seu planejamento exvel e passvel de adequao s necessidades dopesquisador e dos participantes (THIOLLENT, 1992). Ou seja, na pesquisadescrita neste artigo, a pouca compreenso sobre a Lei 10.639/03 ou seu total

    desconhecimento em algumas escolas da rede municipal de ensino possibilitarama execuo de um projeto de interveno, de longo prazo, sobre a temtica. importante destacar, tambm, dentro desse contexto da pesquisa, que a relevnciado estudo de temas decorrentes da histria e cultura afro-brasileira e africana no serestringe populao negra; ao contrrio, dizem respeito a todos os brasileiros, umavez que devem educar-se enquanto cidados atuantes no seio de uma sociedademulticultural e pluritnica, capazes de construir uma nao democrtica. (BRASIL,

    2004). essa perspectiva de construo de uma sociedade plural e que respeite adiversidade que estamos tentando construir em conjunto com alunos e professoresda escola na qual desenvolvemos o referido projeto.

    2 Neste momento, gostaramos de agradecer a todos os que contriburam para a realizao dasnossas aes, entre os quais destacamos as alunas que participam do projeto: Ana Paula MendesPorto e Eslany Vanessa da Silva Teotonio, bolsistas do Programa Institucional de Bolsa deIncentivo Acadmico da Fundao de Amparo Cincia e Tecnologia do Estado de PernambucoBIA/FACEPE; Michella Eloina de S Torres e Terezinha da Silva Santos, bolsistas da Pro-Reitoriade Extenso e Cultura da Universidade de Pernambuco PROEC/UPE e aos alunos voluntrios,Maria Amlia Jesus da Costa, Aurilia de Brito Lima, Maria dos Anjos Sa Moreira, Marcio Jos dosSantos, Maria Ceclia dos Santos e Ivonete Silva Almeida.

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    Histria e cultura africana e afro-brasileira na educao bsica:algumas determinaes legais

    Acreditamos que o primeiro passo para o reconhecimento e a valorizao do

    povo negro nas escolas brasileiras se deve insero dos artigos 26A e 79B da Leide Diretrizes e Bases da Educao nacional, LDB, como veremos a seguir:

    Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e

    mdio, oficiais e particulares, torna-se obrigatrio o ensino

    sobre Histria e Cultura Afro-Brasileira.

    1o O contedo programtico a que se refere o caput deste

    artigo incluir o estudo da Histria da frica e dos Africanos,

    a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o

    negro na formao da sociedade nacional, resgatando a

    contribuio do povo negro nas reas social, econmica e

    poltica pertinentes Histria do Brasil.

    2o Os contedos referentes Histria e Cultura Afro-

    Brasileira sero ministrados no mbito de todo o currculo

    escolar, em especial nas reas de Educao Artstica e de

    Literatura e Histria Brasileiras

    Art. 79-B. O calendrio escolar incluir o dia 20 de novembro

    como Dia Nacional da Conscincia Negra (BRASIL, 2003).

    Analisando essas alteraes na LDB, percebemos que clara a determinao.A temtica deve ser inserida no contedo programtico ocial e no como umadisciplina nova como muitos prossionais da educao pensaram assim que a

    Lei foi sancionada; mas, nas disciplinas j existentes de maneira a desconstruir ahistria, muitas vezes, contada na escola e contida nos livros didticos em que opovo negro aparece na grande maioria, como sujeitos inferiores e, portanto, menosimportantes que os brancos na formao da sociedade brasileira.

    Aps a publicao da Lei 10.639/03, o Conselho Nacional de Educao CNEaprovou o parecer CNE/CP3/2004, que instituiu as Diretrizes Curriculares Paraa Educao das Relaes tnico-Raciais e Para o Ensino de Histria e CulturaAfro-Brasileira e Africana a serem executadas pelos estabelecimentos de ensino dediferentes nveis e modalidades, cabendo aos sistemas, no mbito de sua jurisdio,orientar e promover a formao de professores e professoras e supervisionar o

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    cumprimento das referidas diretrizes.Entretanto, temos conscincia de que a sociedade brasileira tende a fazer

    vista grossa ainda hoje, aos muitos casos que tomam, por exemplo, espao namdia nacional, mostrando o quanto ainda preciso lutar para que todos recebam

    uma educao igualitria, que possibilite desenvolvimento intelectual e emocional,independentemente do pertencimento tnico-racial do aluno. Com isso, osprossionais da educao permanecem no comprendendo em quais momentossuas atitudes dirias acabam por cometer prticas favorecedoras de apenas parte deseus grupos de alunos e alunas (CAVALLEIRO, 2006).

    Nesse sentido, a autora menciona que o silncio da escola sobre asdinmicas das relaes raciais tem permitido que se transmita aos alunos umapretensa superioridade branca, sem que haja questionamento desse problemapor parte dos prossionais da educao e envolvendo o cotidiano escolar emprticas prejudiciais ao grupo negro. Silenciar-se diante do problema no apagamagicamente as diferenas; ao contrrio, permite que cada um construa, a seumodo, um entendimento, muitas vezes estereotipado do outro que lhe diferente.Esse entendimento acaba sendo pautado pelas vivncias sociais de modo acrtico,conformando a diviso e a hierarquizao raciais.

    Segundo as Diretrizes Curriculares para a Educao das relaes tnico-

    Raciais e para o Ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana paraconduzir suas aes, os sistemas de ensino, os estabelecimentos e os professorestero como referncia, entre outros, aspectos pertinentes s bases loscas epedaggicas que assumem os princpios a seguir explicitados.

    O primeiro princpio, conscincia poltica e histrica da diversidade,deve conduzir igualdade bsica de pessoa humana como sujeito de direitos; compreenso de que a sociedade formada por pessoas que pertencem a grupos

    tnico-raciais distintos, que possuem cultura e histria prprias, igualmente valiosase que, em conjunto, constroem, na nao brasileira, sua histria; ao conhecimento e valorizao da histria dos povos africanos e da cultura afro-brasileira na construohistrica e cultural brasileira; superao da indiferena, injustia e desqualicaocom que os negros, os povos indgenas e, tambm, as classes populares s quaisos negros, no geral, pertencem, so comumente tratados; desconstruo, pormeio de questionamentos e anlises crticas, objetivando eliminar conceitos,ideias, comportamentos veiculados pela ideologia do branqueamento, pelo mitoda democracia racial, que tanto mal fazem a negros e brancos; busca de pessoasem particular, de professores no familiarizados com a anlise das relaes tnico-

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    raciais e sociais com o estudo da histria e cultura afro-brasileira e africana, dasinformaes e dos subsdios que lhes permitam formular concepes no baseadasem preconceitos e construir aes respeitosas; ao dilogo, via fundamental parao entendimento entre diferentes, com a nalidade de negociaes, tendo em vista

    objetivos comuns, visando a uma sociedade justa.O segundo princpio,fortalecimento de identidades e de direitos, deve orientarpara o desencadeamento do processo de armao de identidades, da historicidadenegada ou distorcida; o rompimento com imagens negativas forjadas por diferentesmeios de comunicao, contra os negros e os povos indgenas; os esclarecimentosa respeito de equvocos quanto a uma identidade humana universal; o combate privao e violao de direitos; a ampliao do acesso a informaes sobre adiversidade da nao brasileira e sobre a recriao das identidades, provocada porrelaes tnico-raciais; as excelentes condies de formao e de instruo, queprecisam ser oferecidas, nos diferentes nveis e modalidades de ensino, em todosos estabelecimentos, inclusive os localizados nas chamadas periferias urbanas e naszonas rurais.

    O terceiro princpio, aes educativas de combate ao racismo e adiscriminaes, encaminha para a conexo dos objetivos, estratgias de ensinoe atividades com a experincia de vida dos alunos e professores, valorizando

    aprendizagens vinculadas s suas relaes com pessoas negras, brancas, mestias,assim como as vinculadas s relaes entre negros, indgenas e brancos noconjunto da sociedade; a crtica pelos coordenadores pedaggicos, orientadoreseducacionais, professores, das representaes dos negros e de outras minorias nostextos, materiais didticos, bem como providncias para corrigi-las; condies paraprofessores e alunos pensarem, decidirem, agirem, assumindo responsabilidade porrelaes tnico-raciais positivas, enfrentando e superando discordncias, conitos,

    contestaes, valorizando os contrastes das diferenas; valorizao da oralidade,da corporeidade e da arte, como por exemplo, a dana, marcas da cultura de raizafricana, ao lado da escrita e da leitura; educao patrimonial, aprendizado a partirdo patrimnio cultural afro-brasileiro, visando preserv-lo e difundi-lo;o cuidadopara que se d um sentido construtivo participao dos diferentes grupos sociais,tnico-raciais na construo da nao brasileira, aos elos culturais e histricos entrediferentes grupos tnico-raciais, s alianas sociais; participao de grupos doMovimento Negro e de grupos culturais negros, bem como da comunidade em quese insere a escola, sob a coordenao dos professores, na elaborao de projetospoltico-pedaggicos, que contemplem a diversidade tnico-racial (BRASIL,2004).

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    A partir da compreenso de tais princpios, possvel perceber que so vriasas frentes de atuao, no s por parte dos professores mas tambm de todos osprossionais da educao que devem atuar desde a desconstruo das ideias ecomportamentos presentes na sociedade, passando pela valorizao dos elementos

    da cultura afro-brasileira para a construo da identidade at a anlise crtica dostextos didticos, principalmente, contidos nos livros didticos e paradidticos, quecirculam nas escolas. preciso compreender a histria e a cultura africana e afro-brasileira para que possamos, de fato, contribuir para a formao da conscinciapoltica e histrica da diversidade, para a construo da identidade e a promoode prticas que superem o racismo e o preconceito que existem no cotidianoescolar. Esses princpios e seus desdobramentos mostram exigncias de mudanade mentalidade, de maneiras de pensar e agir dos indivduos em particular, assimcomo das instituies e das suas tradies culturais. neste sentido que se fazem asseguintes determinaes em relao ao ensino deHistria e Cultura Afro-Brasileirae Africana nas escolas, destacando-se:

    O ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a

    educao das relaes tnico-raciais, se desenvolvero no

    cotidiano das escolas, nos diferentes nveis e modalidades de

    ensino, como contedo de disciplinas particularmente EducaoArtstica, Literatura e Histria do Brasil, sem prejuzo das

    demais em atividades curriculares ou no, trabalhos em salas

    de aula, nos laboratrios de cincias e de informtica, na

    utilizao de sala de leitura, biblioteca, brinquedoteca, reas

    de recreao, quadra de esportes e outros ambientes escolares

    (BRASIL, 2004, p.21).

    Apesar de sabermos que os sistemas de ensino e os estabelecimentos deeducao bsica em todos os nveis e modalidades, segundo as referidas diretrizes,precisam se organizar para garantir a insero da temtica nas salas de aulas,acreditamos que ainda no so todas as redes que o fazem. Sabemos da existnciade iniciativas individuais que acontecem, e, muitas vezes, no so nem divulgadas.Apontaremos a seguir as impresses dos professores e membros das equipesgestoras sobre a lei 10.639/03 e a insero da temtica na rede municipal e as aes,que esto acontecendo em Petrolina, com o objetivo de implementar a referida Lei.Uma delas a nossa prpria proposta de interveno.

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    Algumas indicaes sobre a repercusso da Lei 10.639/03 nasescolas municipais da cidade de Petrolina- PE

    A cidade de Petrolina, localizada no interior do estado de Pernambuco, ca

    situada a 800 quilmetros da capital recifense. Construda na regio hoje denominadacomo Mdio So Francisco, cidade de altas temperaturas do serto pernambucanoou como mais popularmente conhecida do semirido privilegiada por ter sidoconstruda e constituda s margens do chamado rio da integrao nacional, o rioSo Francisco. Segundo dados do IBGE de 2008, a cidade tem, atualmente, 285 milhabitantes. Petrolina destaca-se no cenrio nacional e internacional como uma dasmaiores produtoras e exportadoras de frutas do pas, segundo Nunes (2009),

    [...] tudo isso graas ao trabalho de petrolinenses, aqui

    nascidos, ou PR ela adotados, que com garra, inteligncia e

    determinao implantaram a tecnologia da irrigao [cultura

    irrigada] transformando o cinza da caatinga semimorta

    em verdes e imensurveis paisagens de encher os olhos do

    sertanejo acostumados a terra e troncos ressequidos, e mais

    ainda dos japoneses e investidores da regio sul do Brasil,

    que viram e vm nestas terras banhadas pelas guas do Velho

    Chico, como popularmente conhecido o rio So Francisco,

    um futuro promissor (p.11).

    da plantao de frutas em projetos de cultura irrigada que gira toda aeconomia da cidade. Petrolina hoje considerada um dos polos de desenvolvimentoeconmico do estado, apontada por diversas revistas econmicas como uma das

    cidades mais dinmicas do Pas. Toda essa riqueza tambm tem seu reexo naeducao. Atualmente, a cidade conta com trs instituies de ensino superior degrande porte. A FACAPE (Faculdade de Cincias Sociais e Aplicadas de Petrolina),uma autarquia mantida pelos governos municipal e estadual com oito cursos nasreas de cincias Humanas e Sociais. A UNIVASF - Universidade Federal do Valedo So Francisco, recentemente criada, com vinte e um cursos das reas de CinciasHumanas, Exatas e Sade e a UPE - Universidade de Pernambuco, instituio da

    qual fazemos parte, mantida pelo governo do estado e que possui sete cursos delicenciatura e trs cursos na rea de sade.A rede escolar municipal possui um quantitativo ainda pequeno de escolas

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    no nvel da educao bsica e um bom quadro de prossionais em permanentequalicao. Segundo Nunes (2009), a rede municipal, contava em 2008 com 82escolas de educao infantil, ensino fundamental e ensino mdio, sendo 60 escolasna zona rural e 22 na zona urbana. Neste mesmo ano, foram matriculados 22.032

    alunos, e a rede possua 804 professores. Foram respondidos, 62 questionrios: 50por professores e 12 membros das equipes gestoras em 10 escolas da rede municipalde Petrolina. A partir da anlise desse instrumento, estabelecemos, primeiramente, operl dos sujeitos da pesquisa e, em seguida, apresentamos as categorias de anlisee os resultados obtidos.

    Constatamos que a maioria dos professores pesquisados so do sexo feminino.Em relao ao vnculo com a rede de ensino, temos temporrios (46%); concursado(52%), no informado (2%). Acreditamos que o vnculo permanente, via concurso,pode favorecer o trabalho contnuo enquanto o contrato pode impedir que prticasinteressantes e ecazes sejam continuadas.

    Em relao origem tnico-racial, constatamos que a maior parte dosprofessores se autoclassica como parda, mas, considerando que as classicaesmorena, morena clara, preta e negra dizem respeito raa negra, a maior partedos professores se autodenomina afro-brasileiro. Temos conscincia dos progressosda Gentica, que apontam para a impossibilidade de determinar a raa de um ser

    humano. Nesse sentido, os pesquisadores da rea descobriram que os patrimniosgenticos de duas pessoas pertencentes a uma mesma raa podem ser mais distantesdo que os de indivduos pertencentes a raas diferentes. Sendo assim, concluramque a raa no uma realidade biolgica humana, mas um conceito cienticamenteinoperante para explicar a diversidade humana e para dividi-la em grupos. Ou seja,biolgica e cienticamente, as raas no existem. Por isso, estamos utilizando otermo raa como conceito relacional, que se constituiu histrica e culturalmente,

    a partir de relaes concretas entre grupos sociais em cada sociedade, rejeitandoo determinismo biolgico e valorizando a cultura e a identidade de cada um(MUNANGA, 2003; SISS, 2003).

    Porm, no podemos deixar de mencionar o nmero de professores que seconsidera branco e amarelo, como pode ser observado, a seguir:

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    Autoclassicao dos professores quanto origem tnico-racial

    MORENA 8%

    MORENA CLARA 2%

    AMARELA 2%

    PRETA 4%

    BRANCA 22%

    NEGRA 20%

    PARDA 36%

    NO INFORMADA 6%

    Denir a origem tnico-racial dos brasileiros no tarefa simples. Existemmuitos adjetivos para dizer o que somos e aqui tivemos uma pequena amostra dessesadjetivos. Nesse sentido, Silva (2007) arma que a percepo dos professores negrosem relao questo tnico-racial em sala de aula est intimamente associada forma como eles lidam com o seu pertencimento tnico-racial. Esse pertencimento,geralmente, foi gerado de forma lenta, processual e gradativa o que, muitas vezes,s ocorre depois de os professores terem sofrido algum tipo de preconceito oudiscriminao que os tenha atingido de tal forma que os levou a se verem comonegro ou negra. Sabemos que o conceito de identidade mltiplo, ou seja, fala-se em identidades de gnero, identidades etrias, identidades raciais, entre outras.

    Nesse sentido, gostaramos de ressaltar o conceito de identidade segundo Munanga(2003)

    (...) uma realidade sempre presente em todas as sociedades

    humanas. Qualquer grupo humano, atravs de seu sistema

    axiolgico, sempre selecionou alguns aspectos pertinentes

    de sua cultura para se definir em contraposio ao

    alheio. A definio de si(autodefinio) e a definio dosoutros(identidade atribuda) tem funes conhecidas: a

    defesa da unidade do grupo, a proteo do territrio contra

    inimigos externos, as manipulaes ideolgicas por interesses

    econmicos, polticos, psicolgicos etc (p.45).

    Portanto, podemos dizer que a construo da identidade no tarefa simples,se pensarmos na nossa histria contada em sala de aula, por exemplo, perceberemoso quanto difcil para uma criana negra se identicar como tal e assumir a suaidentidade de negro ou negra pois aprendeu e ainda aprende na escola que os

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    brancos so os heris nacionais e que no havia lugar de prestigio para os negrosna sociedade brasileira ao longo dos tempos , diferentemente do lugar ocupadopelos brancos no nosso pas. Assim, situaes vivenciadas em aula de histria podelevar as crianas negras a negarem sua origem e assumirem-se como brancas.

    A pesquisa revelou que a maior parte dos docentes tem entre 11 e 20 anosde atuao e, portanto, com muita experincia na rea de educao, o que nospermite inferir que desenvolvem (ou deveriam desenvolver), a cada dia, seutrabalho de maneira melhor e mais consciente. Apesar de acreditarmos que ocomprometimento com a temtica independe do tempo de atuao. Ou seja, se osprofessores realmente quiserem abordar esse tema em vrias situaes iro faz-lo,independente do tempo de servio, embora reconheamos que essa tarefa no fcil. Nesse sentido, temos relatos de professores que foram acusados de racistas savessas por estarem tentando valorizar a cultura negra nas salas de aula e quereremmudar o foco eurocntrico para o afrocntrico (MUNANGA, 2003).

    Em relao escolarizao, a maior parte dos professores possui nvelsuperior, com predominncia do curso de Pedagogia. Esse dado demonstra queo municpio est seguindo a LDB 9394/96, a qual determina que, at 2010, osprofessores da educao bsica possuam formao superior. Porm, sabemos queos cursos de formao de professores da regio do vale do So Francisco ainda

    no esto preparando os alunos para trabalharem a temtica, exceo de algumasiniciativas relacionadas a prticas de alguns professores com essa preocupao.Infelizmente, a maioria das universidades brasileiras ainda no inseriu a temticaem seus currculos e, assim, no podem formar professores conscientes e preparadospara abordar a histria e a cultura africana e afro-brasileira em suas salas de aula.Nesse sentido, Gomes Junior (2007) menciona, por exemplo, que so poucos oscursos de histria que oferecem a disciplina Histria da frica nas universidades

    do Nordeste, disciplina que seria de fundamental importncia para a formao dosfuturos professores de histria. Imaginemos, ento, a situao dos demais cursos deformao de professores.

    Portanto, a incluso da Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana noscurrculos da Educao Bsica , tambm, uma questo poltica, com fortesrepercusses pedaggicas, inclusive no que se refere formao de professores.Nesse sentido, os cursos de Pedagogia vm reformulando seus currculos em todoo pas, com ns a contemplar o exigido pelas Diretrizes Curriculares Nacionais,institudas pelo Conselho Nacional de Educao em maio de 2005. As diretrizes,em acordo com o anseio de formao de uma sociedade igualitria e mais justa,

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    compreendem a docncia, em seu Art. 2, pargrafo 1:

    (...) Como ao educativa e processo pedaggico metdico e

    intencional, construdo em relaes sociais, tnico-raciais

    e produtivas, as quais influenciam conceitos, princpios eobjetivos da Pedagogia, desenvolvendo-se na articulao entre

    conhecimentos cientficos e culturais, valores ticos e estticos

    inerentes a processos de aprendizagem, de socializao e

    de construo do conhecimento, no mbito do dilogo entre

    diferentes vises de mundo (BRASIL, 2005, p.19, Grifo nosso).

    Assim sendo, o curso de Pedagogia, do qual fazem parte todos os alunosenvolvidos nesse projeto, poder contribuir, entre outras coisas, para a formaodo futuro licenciado em relao temtica. Em sintonia com a Lei 10.639/03, asDiretrizes, acima citadas, tambm instituem a abordagem educativa diferenciada emescolas indgenas ou em escolas de remanescentes de quilombos, como podemosobservar a seguir:

    1 No caso dos professores indgenas e de professores que

    venham a atuar em escolas indgenas, dada a particularidadedas populaes com que trabalham das situaes em que

    atuam, sem excluir o acima explicitado, devero:

    I - promover dilogo entre conhecimentos, valores, modos de

    vida, orientaes filosficas, polticas e religiosas prprias

    cultura do povo indgena junto a quem atuam e os provenientes

    da sociedade majoritria;

    II - atuar como agentes interculturais, com vistas valorizaoe o estudo de temas indgenas relevantes.

    2 As mesmas determinaes se aplicam formao de

    professores para escolas de remanescentes de quilombos ou que

    se caracterizem por receber populaes de etnias e culturas

    especficas. (BRASIL, 2005, Grifo nosso).

    No que diz respeito aos nveis em que os professores atuam no momento,temos (12%) na educao infantil, (70%) na educao fundamental, (4%) naeducao mdia e (14%) no informaram em que nvel atuam. Os professores da

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    educao infantil, que participaram da nossa pesquisa, mencionaram a importnciade inserir a temtica nesse nvel de ensino para que nos nveis em que se seguirem,as crianas j tenham uma base de compreenso menos preconceituosa e maisinclusiva.

    Entre os membros das equipes gestoras (MEG), todos os sujeitos participantesso do sexo feminino, apenas um no informou esse dado. Como o nmero dequestionrios recebidos das MEG foi bem menor que o dos professores, remetemosao quantitativo em nmeros e no em percentuais. Como so membros da gestoescolar, todas as participantes possuem vinculo permanente com a rede municipal,so todas concursadas, possuem nvel superior, sendo que quatro possuem curso dePs-Graduao Lato Sensu. Tm entre 30 e 50 anos de idade e atuam de 11 a 20 anosna rea da educao. Em relao origem tnico- racial , cinco se autodeclararambrancas, trs pardas, uma morena, uma preta e duas no informaram, como pode serobservado no quadro abaixo:

    Autoclassicao dos membros das equipes gestoras quanto a origem

    tnico-racial

    MORENA 01

    PRETA 01

    BRANCA 05PARDA 03

    NO INFORMADA 02

    A partir da anlise do nosso instrumento de coleta, estabelecemos as seguintescategorias: conhecimento sobre a Lei 10.639 e a histria e cultura africana e afro-brasileira; prtica docente insero da temtica na sala de aula e os materiaisdidticos utilizados; importncia da temtica; aes da escola e da secretaria da

    educao para implementao da Lei. importante destacar que, embora saibamos que o nosso instrumento

    apresenta falhas, como qualquer outro, na medida em que menciona a temticaantes de questionar sobre o conhecimento da Lei (na apresentao/objetivo dapesquisa para o pesquisado) e seu contedo, acreditamos que isso poderia levar ossujeitos a copiarem, ou seja, a responderem mesmo sem o conhecimento real daLei. Mesmo assim, acreditamos que as respostas revelam mesmo que, parcialmente,- considerando que nossa amostra representa em torno de 10 % das escolasmunicipais - aspectos da realidade do municpio de Petrolina sobre a insero datemtica histria e cultura africana e afro-brasileira nas escolas.

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    No que se refere ao conhecimento sobre a Lei 10.639 e a histria e culturaafricana e afro-brasileira, cujo objetivo era sondar se os professores e membrosdas equipes gestoras da rede detinham algum conhecimento sobre a Lei e o seucontedo, percebemos que (42%) dos professores no responderam s questes

    referentes a essa categoria. Dos (24%) que responderam, (14%) demonstraramconhecer a Lei e seu contedo, como veremos a seguir: uma Lei que exige quea cultura afro-brasileira faa parte da grade curricular do ensino brasileiro. uma Lei que diz que obrigatrio trabalhar a cultura afro-brasileira na escola.Porm, no podemos deixar de mencionar os depoimentos que demonstraramconhecimento parcial ou equivocado sobre a Lei e a temtica. Foi uma Lei criadapara defender os nossos irmos afros. A mesma fala sobre as punies referentes discriminao racial. Determina os direitos e deveres da cultura afro-brasileira.Os relatos dos professores referem-se ao combate da discriminao e ao respeito aosdireitos dos afro-brasileiros, o que demonstra que, mesmo no sabendo exatamentedo contedo da Lei, sabem que esse diz respeito aos negros e seus descendentes.

    Em relao aos Membros das equipes gestoras (MEG), quatro (4) membrosno responderam e oito (8) demonstraram conhecer a Lei e seu contedo mesmoque parcialmente, como podemos observar:

    Fala dos direitos dos afrodescendentes. H um documento (Lei)que determina o ensino nas escolas. []A reformulao da

    LDB que determina o ensino essa incluso da cultura africana

    e afro-brasileira em ensino regular. Est na LDB, como tambm

    nos estados para definir dentro do contedo pedaggico na

    cultura local.[] Trata-se do ensino da histria e cultura

    africana e afro-brasileira. [] A Lei 10.639 de 9 de janeiro

    de 2003 que determinou a obrigatoriedade da temtica histriae cultura afro-brasileira no currculo oficial da rede de ensino

    fundamental e mdio, nas escolas publicas e particulares do

    Brasil. [] importante para ser vivenciada na educao do

    Brasil. Eu j li essa Lei. Que obrigatrio incluir no currculo

    o ensino da cultura afro-brasileira nas reas de educao

    artstica, literatura e histria.

    Ao analisar os depoimentos anteriormente mencionados, percebemos queas MEG demonstraram um conhecimento mais pontual que os professores em

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    relao Lei e ao seu contedo. Esse diferencial pode ser atribudo ao prpriosetor de atuao, ou seja, a prpria atividade de gerir uma unidade escolar exigemaior conhecimento sobre legislao da educao. Esse conhecimento a mais,demonstrado pelas MEG, poderia favorecer uma prtica pedaggica mais eciente,

    desde que houvesse uma gesto democrtica de fato no interior das escolas.Em relao prtica docente insero da temtica na sala de aula e osmateriais didticos, o nosso o objetivo era tomar conhecimento da forma com queo professor aborda a temtica em sala de aula e que materiais e recursos utilizapara tanto. Percebemos que os professores que no abordam a temtica em sala deaula no opinaram sobre materiais didticos disponveis na escola. Entre os relatosde suas prticas, os professores armaram que abordam a temtica em situaespontuais como datas comemorativas com uso de vdeos e livros didticos comopode ser observado a seguir:

    Explicao sobre o assunto que tem em livros didticos, filmes

    que o prprio professor loca. [] S com danas. A

    importncia dos negros na cultura brasileira. []Apenas

    nas datas comemorativas, 13 de maio e 20 de novembro dia

    da conscincia negra. Sim, debatendo sobre como os

    negros chegaram em nosso pais e tambm sobre as diferenasraciais.[] Sim, atravs de conversas e debates sobre a

    escravido e de forma resumida. []Utilizando grficos,

    filmes e slides sobre vrios temas que se fazem necessrio

    abordar o tema. []Explanando noticias e eventos do que

    est acontecendo no momento e contedos do livro didtico.

    [] Com atrativos da histria dos negros e da literatura.

    Exemplo: um passeio pela frica de Alberto Costa e Silva. Aescola dispe da coleo Vivendo a diversidade (cultura afro-

    brasileira) a qual de grande contribuio para o ensino e a

    aprendizagem.[]

    Em relao aos materiais especcos que tratam da histria e cultura africanae afro-brasileira, menciona-se o livro Um passeio pela frica e a coleo Vivendoa diversidade. Em Um passeio pela frica, primeiro livro infanto-juvenil doembaixador e acadmico Alberto da Costa e Silva, os jovens brasileiros Zezinha,Gustavo e Incio se aventuram por um continente que, na maioria das vezes,

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    conhecemos apenas por meio dos atlas geogrcos: Angola, Guin, Costa doMarm, Senegal, Congo. Maior africanista do pas e autor do clssico A enxadae a lana, Costa e Silva prope um delicioso roteiro em que olha para o passadoafricano - mostrando as diferenas culturais entre os vrios povos que vieram para

    o Brasil como escravos e ajudaram a formar nossa cultura - tambm aponta parao futuro. Fugindo dos clichs, ele revela para os jovens leitores uma frica urbanae moderna, sem deixar de destacar as peculiaridades de cada pas visitado por seutrio de personagens. Um passeio pela frica conta com as ilustraes de RodrigoRosa. Multicoloridas, elas enfatizam a imagem de um continente vibrante e plural,destacada pelo autor (www.historianet.com.br).

    A coleo Vivendo a Diversidade: cultura afro-brasileira, tambmmencionada por professores e MEG, uma proposta pedaggica para a superaodo racismo na escola e, consequentemente na sociedade, da Editora Fapi. Ela trazatividades, proposta e projetos que visam subsidiar o trabalho do educador sobre asrelaes tnico-raciais positivas, reconhecendo e valorizando a histria, a culturae a identidade da populao afro-descendente do Brasil. A coleo busca levar osalunos e os educadores a se posicionarem de maneira reexiva e crtica, partindo doconhecimento e da contextualizao de situaes variadas, para que aprendam pormeio da anlise de fatos. O objetivo form-los para que sejam capazes de intervir

    na realidade, transformando-a, quando necessrio. Essa proposta de trabalhovisa estabelecer relaes humanas mais fraternas, promovendo a colaborao, asolidariedade e a construo da dignidade pessoal, alm de proporcionar a reexode todos (www.educacaoecia.com.br). Entre os membros das equipes gestoras,uma no respondeu e onze disseram que a escola dispe dos mesmos materiaiscitados pelos professores.

    No que diz respeito importncia da temtica, os professores, apesar de

    alguns desconhecerem a importncia da temtica e outros acharem que no importante, (14%) disseram que no acham importante e (4%) no opinaram,(4%) disseram sim, mas no sabem por que. A maioria arma que importante porvrios motivos (valorizao da nossa histria, contribuio da cultura africana parao nosso pas, por causa do preconceito e da discriminao racial, incluso social,construo da identidade entre outros). Nos depoimentos que seguem, encontramosvrias justicativas para a insero da temtica.

    Foi grande a contribuio cultural do nosso pais mas os negros

    no foram valorizados como deveria ser. [] Temos que

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    esclarecer o assunto como aconteceu para os alunos. []

    Sim, porque vai ampliar o universo cultural dos docentes

    e dos discentes. [] Sim, porque existe muito preconceito

    com o negro e a sociedade em geral no conhece a riqueza

    que a cultura afro e a contribuio que esta trouxe para onosso pais.[] Sim porque existe muito preconceito em

    relao ao negro e precisamos mostrar a riqueza, que h na

    sua cultura. []Sim por conta da incluso social. []

    Sim existem crianas que tem racismo com o colega. []

    Sim para informar e esclarecer o porqu da discriminao.

    []Sim, nos ajuda a reconhecer a nossa histria, nossa

    origem e respeitar as diferenas. [] Sim, somos um pas

    afrodescendente, preciso conhecer nossas origens, razes.

    []Devemos preservar o legado cultural deixado pelos

    africanos para o brasileiro respeitando, assim, a diversidade

    cultural.

    Podemos apontar algumas direes em relao aos depoimentos dos docentes.A primeira aponta para a abordagem feita em sala de aula, remetendo ao passado,

    principalmente escravido e s datas comemorativas como o 13 de maioe o Dia da conscincia negra. A segunda aponta para o uso de lmes e livrosdidticos. Em relao ao uso do livro didtico, destacamos a nossa preocupao,pois sabemos que esse , muitas vezes, o nico impresso a que professores e alunostm acesso, sobretudo nas escolas pblicas, e, muitos livros didticos ainda trazemrepresentaes distorcidas sobre a situao do negro na sociedade brasileira, apesarda poltica de elaborao de livros de qualidade nos ltimos tempos. Os estudos

    de Silva (1995) sobre representao de negros em livros didticos apontam quea maneira como os negros eram representados era estereotipada, negativa, emepisdios que narram a escravido; por exemplo, o africano foi estereotipado comoselvagem, mau, sem alma, para justicar a sua sujeio aos maus tratos dosbrancos. Nosella (1978), por sua vez, analisou livros de comunicao e expressoda 1 4 srie do primeiro grau, na Rede Ocial do Esprito Santo, na dcada de1970, com o objetivo de desmascarar a ideologia subjacente aos textos em queos negros - entre outros atores, como mulheres - apareciam. Essa ltima anlisedemonstrou que os negros eram representados como empregadas domsticas,empregados da casa grande, pobres, entre outros.

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    Ainda em relao aos relatos anteriormente citados, percebemos que avalorizao da cultura e da raa, a discriminao, que existe na sociedade, aconstruo da identidade afro-brasileira foram apontados como motivos importantespara se trabalhar a histria e cultura africana e afro-brasileira nas escolas, na opinio

    da maioria dos professores pesquisados.Porm, tem um depoimento que gostaramos de destacar. Diz o seguinte: Simporque o nosso pas formado por um quantitativo enorme de pessoas da raa negraonde os prprios negros se discriminam. Mencionamos que a professora e autoradesse depoimento se auto-denominou negra e que esse tipo de relato comum nos na escola mas tambm na sociedade como um todo; ns, nem sempre, aceitamosquando pessoas nossa frente, que ns consideramos negros e negras, agem demaneira preconceituosa ou mesmo racista com outros que consideramos negros enegras tambm. Isso nos leva a outro depoimento tambm comum na sociedade,isto , no nos identicarmos como negro ou negra, ou os considerarmos diferentesde ns, mesmo sendo afro-brasileiros. Referimo-nos ao depoimento a seguir: Simporque sempre bom saber sobre as culturas diferentes da nossa. []. A professoraque fez esse relato se declarou parda. O que comum, como j foi dito, so muitosadjetivos utilizados para no dizer que somos negros, mas o IBGE considera comonegro os pardos tambm.

    Em relao aos depoimentos dos membros das equipes gestoras, percebemosque todos responderam, atribuindo algo de importante para a implementao datemtica, como segue:

    Sim, porque a diversidade cultural deve ser trabalhada,

    compreendida e respeitada.[] Sim, pois preciso que

    haja conscientizao de que a abordagem problema de

    todos. [] Sim, porque h muita discriminao e muitobom falar (discutir) em sala de aula. []Sim, porque se

    faz necessrio conscientizar os alunos do papel cultural e da

    infiltrao dos valores que os negros exerceram na histria do

    pas. []Sim, resgata as razes origens do povo brasileiro.

    []Sim, essa temtica oferece elementos para a contribuio

    dos povos africanos e destaca a ocorrncia cultural e poltica.

    []Sim, porque todos os assuntos que abordam a histria dos

    povos importante para a formao dos alunos. [] Sim,

    porque esse aprofundamento sobre a temtica contribui para

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    enriquecer nossa pratica pedaggica.[]

    Por m, no que se refere s aes da escola e da secretaria da educao paraimplementao da Lei, segundo os professores, h algumas iniciativas da escola e da

    secretaria para inserir a temtica e facilitar o trabalho dos professores e professorasem Petrolina. Em relao s aes da escola, (30%) dos professores armaramque nada tem sido feito pela escola. Mas a maioria apontou algo a respeito dotrabalho da escola, que ainda no suciente para garantir efetivamente a inclusoda histria e cultura africana e afro-brasileira na sala de aula, como mencionamosa seguir:

    Apenas com material disponvel na escola, livros, debates que

    escreve pouco sobre o assunto. [] um tema que eu no

    trabalho mais para os professores de histria. [] A escola

    desde 2008 vem colaborando atravs de visitas com estudantes

    da UPE e palestras com os mesmos, aquisio de recursos

    didticos (livros, computadores, atividades artsticas). []

    No foi posta ainda em prtica essa temtica. [] No

    trabalhamos ainda essa temtica mas a escola disponibiliza

    internet. [] Facilitando ao conhecimento atravs deoportunidades de estudos e novas tecnologias. Incentivo

    a trabalhar o tema na disciplina historia, educao artstica

    e literatura. [] Oferecendo subsdios para trabalhar a

    temtica. [] Minha escola nunca tratou desse assunto,

    talvez nas aulas de geografia ou artes, no sei. A escola

    garante a autonomia do professor em sala de aula. Isso j

    uma vitoria. []

    Analisando os depoimentos acima mencionados, percebemos que histria,geograa, literatura e artes so colocadas como nicas reas em que se pode abordara temtica, como se, nas demais reas do conhecimento, isso no fosse possvel,o que comum se pensar por desconhecimento da Lei e das suas diretrizes. Osdepoimentos dos membros das equipes gestoras no so diferentes. Seis (6)membros no responderam, e, entre os que responderam, encontramos: Abordasupercialmente nas disciplinas ans: histria e geograa. Dando suporte namedida do possvel.[] Os professores da rea de histria vem trabalhando a

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    conscincia negra atravs de pesquisas, trabalhos expositivos, teatro, leitura. []Iro preparar apostilas para o trabalho em sala de aula. [] Dispe de materialcom a temtica. Em relao Secretaria de Educao, percebemos que h poucoincentivo, restringe-se formao continuada no geral na opinio dos professores

    apesar de (20%) armarem que nada tem sido feito. Entre os que apontam aesacontecendo, temos:

    H pouco encontro da secretaria, mas pode mudar esse

    quadro. Colabora na formao dos professores. []

    Disponibilizou um documento que visa o professor abordar e

    trabalhar com nfase sobre a semana da conscincia negra e o

    incentivo a criao de projetos. [] O mnimo possvel, pois

    no se conscientizou que preciso investir na cultura sobre

    temas importantes que fizeram e fazem parte do nosso pas.

    [] No ano passado e durante as formaes continuadas com

    professores algumas formaes de histria abordaram o tema.

    []Tivemos orientaes, mas no existe prtica na escola.

    [] J fomos orientados inclusive recebemos um projeto, mas

    ainda no entramos em ao. [] Por enquanto somente

    formaes de histria. Capacitando atravs de estudos emgrupo.

    No que diz respeito ao trabalho da Secretaria de Educao entre os membrosdas equipes gestoras, seis (6) no responderam e as demais apontam que, nasformaes continuadas, essa temtica abordada. Vejamos os depoimentos:

    Acho que tem feito muito pouco, mas pode melhorar dandomaior suporte nessa construo. [] J foram preparadas

    algumas apostilas. [] Todas as escolas municipais

    receberam material didtico com esta temtica que foi a

    coleo citada na questo 11 (coleo diversidade e cultura

    afro-brasileira).[] Promove encontros de professores

    nessa rea na formao continuada.[]

    Portanto, segundo os professores e as MEG, no existe uma poltica efetivapara a insero da histria e cultura afro-brasileira e africana na rede municipal de

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    Petrolina, mas h algumas iniciativas sendo realizadas, mesmo que s nas formaescontinuadas. Assim, acreditamos que a nossa proposta de interveno pode serampliada para atender toda a rede municipal por meio de formaes continuadas,no s para professores de histria, mas tambm para todos os nveis da educao

    bsica. A seguir, apresentamos o nosso projeto de interveno.

    Histria e cultura africana e afro-brasileira: literatura infantil,msica e produo de materiais didticos uma proposta deinterveno

    No intuito de atingir, mesmo que inicialmente, os trs princpios denidos

    pelas diretrizes curriculares: conscincia poltica e histrica da diversidade;fortalecimento de identidades e de direitos, aes educativas de combate ao racismoe a discriminaes, construmos um projeto de extenso/interveno. A propostadivide-se em trs perspectivas. A primeira perspectiva de atuao a formaodos professores em Histria e Cultura Afro-brasileira e Africana com o objetivo desensibiliz-los sobre a importncia de se trabalhar a temtica em suas atividadesdidticas cotidianas para a construo da cidadania (por meio do projeto Escolacidad: formao de professores em Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana

    em Petrolina PE) e a segunda perspectiva a construo e o acesso a materiaisdidtico-pedaggicos (por meio do projeto intitulado Produo de materiaisdidtico-pedaggicos para o ensino de Histria e Cultura Afro-brasileira e Africanaem Petrolina-PE), como, por exemplo, jogos, que iro contribuir para a realizaode situaes de aprendizagem relacionadas temtica para facilitar o trabalho comos alunos nas salas da escola, onde o projeto est sendo realizado. Apesar de saberda existncia dos materiais didticos sobre a Histria e Cultura Afro brasileira

    e africana, como os materiais que o MEC produziu via Secretaria de EducaoContinuada, Alfabetizao e Diversidade (SECAD), os professores declaram nosaber da existncia desse tipo de material. As prprias Diretrizes sobre a Lei nochegaram s escolas municipais. E a terceira perspectiva de atuao direta comos alunos, desenvolvendo atividades de sensibilizao e construo da identidadea partir da literatura infantil (por meio do projeto Escola: espao de construoda identidade cidad- tentativas de implementao da Lei 10.639 nas escolas

    municipais da cidade de Petrolina) e da msica (por meio do projeto Cultura afro-brasileira: insero da msica nas escolas municipais de Petrolina-PE).A pesquisa analisada no item anterior possibilitou rearmar, em nosso

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    contexto, a necessidade de a universidade tentar iniciar um caminho de dilogosobre a temtica dentro das escolas pblicas. Atualmente, j podemos considerarum aumento na produo do conhecimento sobre as questes afro-brasileirasnas instituies pblicas de nvel superior, mas sabemos que apenas um pouco

    de tudo isso chega de forma concreta s escolas regulares. importante destacarque, no projeto de extenso, priorizamos o trabalho com as professoras e alunos daEducao Infantil e do Ensino Fundamental, com o objetivo de aproximar nossosalunos da graduao, envolvidos no projeto, nos nveis de ensino em que atuaromais efetivamente.

    Diante disso, com a proposta de sensibilizar, inicialmente, um grupo deprofessores para a temtica, encaminhamos para a Secretaria de Educao o nossoprojeto, que foi aprovado e indicado pelo Secretrio de Educao para uma dasescolas da rede. A escolha de uma nica escola se deve ao fato de nossa equipeser pequena e de possibilitar a realizao de uma ao longa e duradoura com ummesmo grupo de professoras.

    A escola indicada pela Secretaria de Educao, como j explicitadoanteriormente, chama-se professora Laurita Coelho Leda Ferreira3 . Existe h onzeanos e ca situada em um bairro popular chamado Vila Marcela. A instituiofunciona nos horrios da manh, tarde e noite, com turmas da educao infantil,

    ensino fundamental e Educao de Jovens e Adultos.No ano de 2009, data principal de execuo de nossos projetos, a escola

    possuia treze professores, onze funcionrios e quatrocentos e vinte e oito alunosmatriculados.

    A instituio possui uma infraestrutura pequena, com apenas seis salas deaula, uma biblioteca com espao amplo, mesas e cadeiras, porm com poucos livros;um laboratrio de informtica, um refeitrio e um grande ptio para o recreio sem

    cobertura contra o sol. Em relao aos equipamentos, os quadros so de giz e, emtoda a instituio, s existe uma TV, um DVD, um vdeo, um retroprojetor e umaparelho de som.

    O pblico-alvo composto de cinco professoras que atuam na educaoinfantil e fundamental, nos dois turnos, da escola j citada e, consequentemente,seus respectivos alunos4. Para a realizao do projeto, as professoras cam reunidasem uma sala da prpria da instituio conosco (coordenadoras do projeto) e com

    3 Vale ressaltar que esta escola faz parte da amostra analisada na primeira parte do artigo.4 Agradecemos imensamente a toda a equipe (professores, funcionrios, alunos) da escola LauritaCoelho Leda Ferreira pela ateno e carinho com que sempre nos receberam.

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    a bolsista responsvel realizando estudos, atividades e discusses a respeitoda temtica Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana, enquanto os alunospermanecem em suas salas com as outras bolsistas do projeto, realizando atividadesrelacionadas temtica, que descreveremos a seguir. importante destacar que

    todo o material didtico e pedaggico, que construmos em conjunto com osgraduandos de pedagogia que fazem parte do projeto para a execuo das ocinas,ns disponibilizamos uma cpia para a escola, no intuito de possibilitar suautilizao por todos os professores. Destacaremos trs ocinas j realizadas comas professoras.

    A primeira foi para a apresentao dos projetos e de nossa inteno para comessa proposta de interveno. Nesse momento, percebemos que as professorasdessa escola no conheciam a referida Lei e nem trabalhavam com a temtica emsala de aula. Vale ressaltar que ningum conhecia as Diretrizes Curriculares paraa Educao das Relaes tnico-Raciais e para o Ensino de Histria e CulturaAfro-Brasileira e Africana, o que demonstra que nem toda escola recebeu o referidodocumento. Esse relato se repetiu nas escolas cujos dados foram coletados. Duranteo nosso primeiro encontro, muitos exemplos de preconceito em sala de aula foramrelatados pelas professoras, entre os quais podemos destacar: os alunos do prdiscriminam um determinado aluno por ser negro, dizem que a me dele o colocou

    no forno e esqueceu de tirar e ele queimou todo at o cabelo, eu os repreendo, masno tem jeito (professora. da Educao Infantil). Outro dia mesmo a moa dalimpeza entrou na sala e perguntou: cad a vassoura? E a turma inteira respondeucomo um coral: t na cabea da aluna [... ]. Eu quei sem ao, deu vontade de rir,mas me controlei(Professora do 2 ano Ensino Fundamental).

    comum ouvir das professoras, com quem trabalhamos, que no estopreparadas para lidar com essas situaes. Como a escola um reexo da

    sociedade, as crianas reproduzem o que veem no seu cotidiano e, muitas vezes, osprossionais da educao, principalmente os professores no enxergam situaescomo as descritas como preconceituosas e no interferem, contribuindo, assim,para a disseminao de preconceitos na sala de aula. Ao nal do encontro, tivemosrelatos positivos em relao ao encontro e a necessidade de se tornar atento asituaes que, aparentemente, paream brincadeira de criana no cotidianoescolar para que situaes preconceituosas no se repitam. Nesse encontro, osalunos conheceram os livros de literatura infantil Menina bonita do lao de tas,de Ana Maria Machado,editora tica; Bom dia todas as cores de Ruth Rocha,editora Quinteto Editorial e Na minha escola todo mundo igual de Rossana

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    Ramos, da editora Cortez. O objetivo do dia foi trabalhar a identidade de cadaum e a autoestima, por meio da construo de seu autorretrato de duas maneiras:uma maneira foi construir um autorretrato com massa de modelar, momento emque se observou o fato de os alunos no pegarem a massa de cor preta, apesar de

    serem afro-brasileiros. Outra maneira foi confeccionar um boneco de jornal emque deveria colocar suas caractersticas fsicas e, tambm, pudemos perceber quenenhum pintou seu boneco de preto. Quando apresentamos os referidos livros sprofessoras, apesar de saberem da existncia de uma ou outra obra, armaram noconhec-las.

    A segunda ocina foi dedicada exclusivamente sensibilizao dessesprossionais sobre a importncia de trabalhar essa temtica em sala de aula eapresentar a prpria Lei e suas diretrizes curriculares. Nessa ocina, utilizamosos recursos que tnhamos disponveis para atingir os nossos objetivos, imagensque mostravam as mudanas histricas e sociolgicas do povo negro no mundo,desde o prprio continente africano, seu lugar de origem, a chegada ao Brasil esua contribuio para a constituio do povo brasileiro. Destacamos a luta de anospela instituio da Lei 10.639/03 e como e quais as razes que zeram a Lei setornar realidade durante o Governo Lula. Estudamos a Lei e, principalmente, oque institudo nas Diretrizes Curriculares para a Educao das Relaes tnico-

    Raciais e para o Ensino de Histria e Cultura Afro-Brasileira e Africana, comoas alternativas e sugestes de colocar a temtica ao longo do currculo escolar.As professoras pediram para ter uma cpia das referidas diretrizes curriculares erelataram o que a pesquisa anteriormente relatada demonstrou, ou seja, a realidadeda rede municipal: no h formao continuada para se trabalhar a temtica porisso acreditavam que era para se criar uma nova disciplina chamada Histria dafrica, mencionaram a falta de materiais didticos, entre outros. Nesse encontro,

    os alunos continuaram trabalhando com literatura infantil mas com um livro aindano lido entre os mencionados. Nesse dia uma das turmas trabalhou com o contoafricanoKiriku e a feiticeira em vdeo. Percebemos que as professoras e os alunosno conheciam o vdeo em questo. Os alunos prestaram bastante ateno durantea exibio do vdeo e demonstraram estranhamento, pois nunca tinham assistidoa um desenho animado em que todos os personagens fossem negros, inclusive oheri. O primeiro comentrio das crianas: todo mundo negro! As professorassolicitaram uma cpia do vdeo para car na escola e ns j a providenciamos. Emoutros momentos, relataram que tem sido muito boa a experincia de assistir aovdeo, at as turmas que no participam do nosso projeto querem assistir a ele.

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    A terceira ocina denominou-se frica: um pas ou continente? Tivemoscomo objetivo conhecer, em conjunto com as professoras, aspectos geogrcosdo continente africano para valorizar, entre outros fatores, a cultura dos povosque l viveram e vivem. Destacamos, nessa ocina, os pases que compem esse

    continente, sua cultura e seus costumes atravs de um jogo, elaborado pela equipe.O jogo em questo composto de perguntas e respostas e seu tabuleiro um grandemapa do continente africano. Nessa ocina, alm de jogarmos com as professoras ereetirmos aos poucos sobre aspectos da Geograa desse continente, apresentamosvdeos e slides referentes fauna e ora africana, destacando curiosidadese aproximaes com o nosso pas, alm de sempre mostrar possibilidades efacilidades de trabalhar essa temtica em sala de aula. Essa ocina teve grandereceptividade por parte das professoras, segundo suas prprias avaliaes, porconseguirmos trabalhar de forma ldica e construir o conhecimento geogrcosobre o continente africano que elas no conheciam e, ao mesmo tempo, possibilitara criao de estratgias de como vivenciar tudo isso em sala de aula com os seusalunos. No momento de jogar, as professoras demonstraram conhecer alguns dospases africanos por caractersticas particulares positivas ou negativas. A dinmicado jogo consiste em jogar um dado para saber em que lugar vai estar e, dependendoda resposta correta para uma pergunta sobre assuntos gerais sobre o pas em que

    est, avanar ou permanecer no lugar. Todos partem do mesmo lugar. Temosrelatos para exemplicar esse momento, entre eles: no quero car na Etipia, poisl tem muita fome! [] No Congo eu co, pois queria ver um gorila, Vou praCamares aprender a jogar futebol! [] a frica do Sul o lugar que tem maisbrancos em todo o continente[]

    Entre as grandes diculdades reveladas pelos professores, na pesquisa e naescola em que atuamos, esto a sua formao inicial na universidade, momento

    em que esse tema no tem sido abordado e o acesso a materiais didticos - queabordem a Histria e Cultura Afro brasileira e Africana. Como j foi mencionado,o prprio MEC produziu por meio da Secretaria de Educao Continuada,Alfabetizao e Diversidade (SECAD) inmeros materiais que tm contribudopara a implementao da temtica em sala de aula, mas esse material, que podeat circular com facilidade nas capitais, no tem sido divulgado em cidades dointerior, como o caso de Petrolina. Pensando nesse acesso, principalmente em umacidade do serto do estado nos propomos possibilitar o acesso e a construo dosmateriais didtico-pedaggicos, o que contribuir para a realizao de situaes deaprendizagens relacionadas temtica histria e cultura afro-brasileira e africana,

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    pensando assim, na real efetivao dessa temtica em sala de aula. Alm do jogode perguntas e respostas j citado, construmos domins e jogos de memria sobrea fauna e a ora do continente africano. Os referidos jogos foram confeccionadoscom imagens que representam a ora e a fauna e o nome do elemento logo abaixo

    para que, alm do ldico, se possa trabalhar a lngua portuguesa por meio da escritados elementos que expressam a biodiversidade do continente.Nesse encontro, algumas turmas trabalharam com literatura infantil, uma com

    Kiriku e outra trabalhou com msica, com o objetivo de proporcionar uma vivnciainterdisciplinar da cultura afro-brasileira a partir da msica. Nesse momento, osalunos tiveram contato com msicas e os ritmos afro-brasileiros, como o frevoem seus diversos tipos meldicos: frevo cano, frevo de rua, frevo de bloco, eseus instrumentos, principalmente um acessrio: sombrinha de frevo, a partir deatividades que proporcionassem s crianas o reconhecimento dessa msica comode origem africana. Alm do conhecimento e a construo de instrumentos musicaisde origem africana como o Ganz (construdo com copos descartveis e sementes)e o pandeiro (construdo com embalagens de goiabada e tampinhas de refrigerante).

    Gostaramos de nalizar com os depoimentos das professoras que participamda nossa proposta de interveno, em relao ao vdeo Rompendo o Silncio, queaborda a caso de uma professora branca que modica sua prtica em sala de aula

    a partir de uma formao continuada e passa a fazer coisas simples que surtemefeitos importantes no combate ao preconceito. A realidade diante do preconceitofaz com que a gente reconhea o preconceito diante dos alunos.[] A professoratem que estar mais atenta ao preconceito dentro da sala de aula e ensinar aos alunosa respeitar as diferenas entre eles. []Ns no podemos fechar os olhos paraos problemas que aparecem dentro da sala e no nosso dia a dia. Como diz o lme

    Rompendo o silencio, precisamos ser mais uma sementinha contra o preconceito e

    a discriminao racial. []

    Algumas Consideraes

    Diante da especicidade do tema abordado, necessria uma reexo maisprolongada e sistematizada sobre o papel, que ns, professores, de todos os nveisde ensino, deveremos construir junto com os nossos alunos, sobre o nosso pase sobre o nosso povo. O respeito diversidade e as diferenas vo alm de umproblema escolar, porm, a escola o local com maior capacidade de empreenderalternativas de soluo, ou ao menos, de diminuio dessa desigualdade. A partir

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    da pesquisa realizada, foi possvel perceber que muitos professores e membros dasequipes gestoras, da rede municipal de Petrolina, acreditam que a Lei 10.639/03tem sua importncia no combate ao preconceito e discriminao em sala de aulae que abordar a temtica se faz necessrio para valorizar, resgatar nossa histria,

    nossa raiz africana e, assim, promover o incluso social. Mas as iniciativas darede municipal ainda no so efetivas e nem atingem todos os professores da rede,restringindo-se aos professores de histria em momentos pontuais da formaocontinuada. Uma das grandes diculdades reveladas pelos professores pesquisados que, alm de em sua formao inicial na universidade esse tema no ter sidoabordado, pelo menos, sistematicamente, a real falta de material didtico queaborde a Histria e Cultura Afro brasileira e africana nas escolas municipais dePetrolina.

    De fato, no se pode negar a importncia da temtica Histria e culturaAfro-brasileira e africana na sala de aula e sua repercusso na sociedade brasileira.Rearmamos mais uma vez que, sem a escola, seria impossvel reverter o racismo.J dizia Nelson Mandela [...] ningum nasce odiando ningum, ns aprendemosa odiar e achar que as pessoas valem menos. Se ns aprendemos a odiar, podemosdesaprender, e o espao escolar essencial para essa desaprendizagem.

    Temos conscincia de que uma Lei por si s no pode mudar uma realidade,

    que foi construda historicamente a partir da hierarquizao social em que o negroe o ndio foram considerados inferiores aos brancos.

    A partir dos resultados obtidos, principalmente, no que se refere a nossainiciativa de trabalhar a temtica em uma escola, inicialmente, poder contribuir paraampliar essa discusso. A sensibilizao dos professores e a tomada de conscinciapela existncia do tema j um passo importante para essa construo. Assim,acreditamos que a nossa proposta de interveno pode ser ampliada e atender o

    maior quantitativo da rede municipal que for possvel, por meio de formaescontinuadas no s para professores de histria, mas tambm para todos os nveisda educao bsica. Esperamos, assim, contribuir, mesmo que minimamente, parao desenvolvimento de polticas pblicas que garantam a incluso efetiva da histriae cultura africana e afro-brasileira, a formao de cidados conscientes de suahistria e cultura e consequentemente, para a reduo das desigualdades sociais eeducacionais existentes pelo menos em nossa cidade.

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