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Boletim da Sociedade Brasileira de Limnologia - nº 35 (2) Mensagem do presidente .................................31 Mensagem do Editor do Boletim .....................32 Artigos .............................................................32 Editor Alex Enrich-Prast [email protected] Editores Executivos Luiz Fernando Jardim Bento Humberto Marotta Breno Alves Guimarães-Souza Ana Lúcia Santoro SBL 2005 - 2007 Vice Presidente Antônio Fernando M. Camargo [email protected] Primeira Secretária Renata Panosso [email protected] Primeiro Tesoureiro Marcos Callisto [email protected] Segunda Secretária Andrea Figueiredo [email protected] Segundo Tesoureiro Luís Maurício Bini [email protected] Presidente Ricardo Motta Pinto Coelho [email protected] Tópicos Especiais................................37 Métodos e Equipamentos ...................57 Eventos Científicos ............................59 nº 35 (2) [email protected] Setembro de 2006 Foto: Alex Enrich-Prast Ninfa da Ordem Plecoptera por José Ricardo Inacio Ribeiro agoa Comprida (Macaé-RJ) Foto: L. P. Nielsen

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Boletim da Sociedade Brasileira de Limnologia - nº 35 (2)

Mensagem do presidente .................................31Mensagem do Editor do Boletim .....................32Artigos .............................................................32

EditorAlex Enrich-Prast

[email protected]

Editores Executivos

Luiz Fernando Jardim Bento Humberto MarottaBreno Alves Guimarães-Souza Ana Lúcia Santoro

SBL 2005 - 2007

Vice PresidenteAntônio Fernando M. [email protected]

Primeira SecretáriaRenata [email protected]

Primeiro TesoureiroMarcos [email protected]

Segunda SecretáriaAndrea [email protected]

Segundo TesoureiroLuís Maurício [email protected]

PresidenteRicardo Motta Pinto [email protected]

Tópicos Especiais................................37Métodos e Equipamentos ...................57Eventos Científicos ............................59

nº 35 (2)

[email protected]

Setembro de 2006

Foto: Alex Enrich-PrastNin

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Mensagem do Presidente

Prezados Limnólogos

A gestão da SBL, no último trimestre,iniciou-se com a primeira reunião da diretoria,realizada no final de maio em Belo Horizonte.Essa reunião que contou com todos os membrosda atual diretoria, foi importantíssima para quetodos nós tivéssemos uma oportunidade manterum primeiro contato direto, discutindo aspectosessenciais da gestão da SBL que muitas vezessão muito difíceis de serem abordados através demensagens eletrônicas. Adicionalmente, adiretoria foi capaz de organizar um cronogramaobjetivo de metas, dentre elas organizar-se paraapoiar, da melhor forma possível, o comitêorganizador do XI CBL que será realizado emMacaé, RJ, em agosto de 2007. Dandoprosseguimento a essa estratégia, e para evitardesencontros entre a diretoria da SBL e os comitêsorganizadores dos congressos, estivemos o nossotesoureiro, Dr. Marcos Callisto, e eu presentesna UFRJ onde fizemos uma primeira reunião detrabalho com o Prof. Francisco Esteves. Nessareunião, discutimos vários aspectos ligados ao XICBL tais como o planejamento financeiro, asdatas do evento, formas de captação de recursos,além de vários outros aspectos relevantes.

No ultimo trimestre, a SBL tambéminvestiu na continuidade da reestruturação donosso portal web (http://www.sblimno.org.br). Oponto mais relevante refere-se à disponibilizaçãode todo o acervo da Acta Limnologica, incluindoo primeiro volume de 2006 (volune 18). Grandeparte desse acervo pode ser acessado agoralivremente na www (apenas os dois últimos anossão reservados aos sócios quites com asanuidades). As outras publicações tais como oBoletim e a série Limnotemas já têm os seusúltimos números disponíveis no portal. Em breve,

nº 35(2)Setembro de 2006disponibilizaremos todas as atas da sociedadebem como os boletins mais antigos.

A diretoria vem dando todo apoio a ActaLimnologica Brasilensia . Temos mantidorigorosamente em dia os repasses de recursospara a sua publicação e temos atuando emconjunto com o Prof. Raoul Henry atuando nacontínua melhoria dessa importante publicaçãoda SBL. A revista vem passando por substanciaismodificações não somente em sua versãoeletrônica, mas também na versão escrita. Oformato da revista impressa já foi modificadono seu último número. Um novo projeto gráficoda revista está sendo analisado pelo comitêeditorial e também estamos ampliando bastantea distribuição dessa revista. Hoje, inúmerasbibliotecas de universidades, sejam elas públicasou particulares, estão recebendo os exemplaresda Acta em todas as regiões do Brasil. Nóstambém temos enviado releases sobre asociedade e nossas publicações on line paraoutras sociedades, em diversos continentes.Acreditamos que tais medidas deverão ampliara penetração e divulgação da SBL junto ao meiocientífico internacional principalmente entre oslimnólogos, oceanólogos, taxonomistas, demaisbiólogos e outros profissionais ligados ao estudodos recursos hídricos em geral.

A SBL também esteve presente noSimpósio sobre Limnologia de ReservatóriosProfundos, realizado em Ita, SC, eventoorganizado pelo Prof. Érico Porto da UFSC. Oevento foi um sucesso com grande afluência delimnólogos do sul e de diversos outros pontosdo país, do Mercosul e dos EUA. Nesse evento,tive a oportunidade de divulgar a SBL e otrabalho que estamos fazendo e os resultados jáapareceram sob a forma de assinaturasinstitucionais da Acta solicitadas poruniversidades do sul do país.

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Eu não poderia encerrar essas palavras,

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sem conclamar a todos os nossos sócios a visitaremo portal da SBL, apreciando as novidades (vejam,por exemplo, a nova web site do XI CBL), enviandoas suas críticas e atualizando as suas respectivasanuidades. A força de uma grande sociedadecientífica é o produto do apoio de cada um de seusassociados. Nós não poderemos melhorar aqualidade de nossas publicações científicas bemcomo não poderemos ampliar a presença da SBLno cenário científico nacional sem o contínuo apoioe participação de cada um de nossos associados.Portanto, sejam sempre bem-vindos à SBL!

Saudações Limnológicas ! 

Ricardo Motta Pinto [email protected]

Universidade Federal de Minas Gerais

Mensagem do Editor do Boletim

Os editores executivos e eu ficamos muitolisongeados com os elogios e mensagens de apoioà última edição do boletim. O novo formato pareceter agradado a maioria dos leitores. A inclusão daseção LIMNOTópicos, que a partir desta edição irase chamar Tópicos Especiais, foi bastante elogiada.Em Dezembro deste ano e Março de 2007 osTópicos Especiais abordarão os temas Fitoplânctone Microbiologia Aquática respectivamente. Oobjetivo da seção Tópicos Especiais é que autoresdiscorram resumidamente sobre aspectos gerais deum tópico em Limnologia. Gostaria de lembrar queo Boletim tem outras seções, para as quais outrosartigos também podem ser submetidos. Dúvidaspodem ser esclarecidas através de nosso endereçoeletrônico ([email protected]). Aguardamossubmissões para as próximas edições.

Alex [email protected]

Universidade Federal do Rio de Janeiro

ArtigosDIVULGAÇÃO E EDUCAÇÃO CIENTÍFICAS:ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

HistóricoA Ciência é um processo de

aprendizado sobre a natureza em que diferentesidéias sobre como o mundo trabalha sãomedidas contra a observação. Desta forma,diferente do senso comum, a ciência necessitatestar suas idéias, sintetizadas em hipóteses oumodelos, através do confronto com a realidade.Foi assim com Galileu que, observando osmovimentos dos astros, provou (em sentidoliteral) que a Terra girava em torno do Sol,apesar disto parecer tão ilógico.

Sem incorrer em grande erro podemosdizer que a ciência, tal qual a conhecemos hoje,nasceu com Galileu. Agora, imagine umhomem que, em plena Inquisição, sustentavaque a Lua não era uma esfera perfeita, que avia Láctea era composta de inúmeras eincontáveis estrelas, além é claro de nossoplaneta ser apenas mais um entre outros, e tudoisto usando um telescópio (que, para seus pares,“distorcia a realidade do olho nu”!!). Nãobastassem esses pioneirismos, ao invés deescrever uma de suas principais obras, o“Diálogo sobre os dois máximos sistemas demundo” em latim (o “inglês” da época)publicou mesmo em italiano (idioma oficial deapenas um país). Mas a clara intenção deGalileu neste seu livro de 1632 era divulgar aciência, ou melhor, ensinar o método científicomatemático-experimental, que ele haviadelineado em oposição ao respeito irrestrito queseus pares davam as chamadas “autoridades”(sistema aristotélico-ptolomaico).

O leitor limnológo me perdoe adigressão, mas é importante notar que onascimento da ciência vem junto com suaprópria divulgação, que entre os cientistasnacionais é uma tarefa praticamentemarginalizada. Ludovico Geymonat, autor deuma das biografias de Galileu (Editora NovaFronteira) destaca este caráter da obragalileana, em especial dos “Diálogos” de 1632:“Divulgar a ciência não é baixar o seu nívelpoluindo-lhe o rigor racional, mas difundi-lareduzindo suas razões a uma clareza inteligívelpara muitos, lá onde forem por demaisdifíceis”.

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Anos depois de Galileu destronar nossoplaneta do centro do universo, outra idéia de comoo mundo funciona iria transformar a maneira depensar dos terráqueos. Em 1859 Charles Darwinpublicou sua teoria da seleção natural comoprincípio da evolução no livro “A Origem dasEspécies”. É irônico que um dos motivos dademora de Darwin em publicar suas idéias erajustamente...torná-la pública!!, já que ia contraos dogmas cristãos vigentes (hoje em dia a Igrejaaceita a seleção natural e a evolução das espécies)e então afetaria a sensibilidade de seus maisqueridos contemporâneos.

Particularmente, e apesar de me esforçarpara isso, não consigo compreender a recusa deDarwin em defender suas idéias perante asplatéias. Os motivos podem ser vários: problemasde saúde, preguiça, modéstia excessiva,esnobismo ou tédio tipicamente inglês ousimplesmente falta de tempo (Esta última é agrande justificativa pela qual não fazemosdivulgação de nossos trabalhos) ou ainda todasestas razões combinadas. Mas afinal, por que Darwin iria se dar a estetrabalho se havia um craque neste ofício? ThomasHuxley, depois chamado de “buldogue” deDarwin (bons tempos àqueles nos quais osbuldogues eram os cães mais ferozes), desde 1855ministrava palestras noturnas para a “plebeignara” inglesa. Os assuntos discorridos eram, porexemplo, as glaciações e suas formas de estudo eanálise, os fósseis e os misteriosos ambientes daera dos dinossauros. Segundo o Prof. FernandoFernandez no livro “O poema imperfeito” (EditoraUFPR), os 600 ingressos para as palestras deHuxley eram disputados a tapas com cambistas eos auditórios ficavam sempre lotados. Depois deler a “Origem das Espécies” foi fácil para o jáexperiente Huxley tratar mais um grande assunto,ou melhor, “O” assunto, para suas palestras deeducação científica.

E assim nobre leitor, peço licença praresumir meu próprio texto: o nascimento daCiência, com Galileu, vem acompanhado de suadivulgação. O parto da Biologia Moderna, com aaceitação da seleção natural, seria muito maisdifícil sem a educação científica perpetrada pelogrande Huxley. Desta forma, ambas as atividades

são partes fundamentais do trabalho doscientistas. Mas o que elas realmente significam?Conceitos

A Educação Científica utiliza odelineamento experimental e a história depesquisadores para ensinar os fenômenos eprocessos que regem a dinâmica de vida dosorganismos e a influência da intervenção humanasobre ela. Além disso, tem o papel de mostrar oprazer de conhecer as ciências e despertarvocações nos jovens, enquanto educa o cidadãopara uma atitude científica, isto é, para acuriosidade, a observação honesta e a lógicaacurada.

A Divulgação Científica pode serentendida como toda atividade de descriçãointeligível e de difusão dos conhecimentos dopensamento científico, que ocorre fora do ensinooficial com o objetivo de esclarecer ao público,enquanto tenta sensibilizar a sociedade para aimportância das instituições de pesquisa e avalorização dos pesquisadores. Pouca gente sabe,mas em 1813 (3 anos após a criação da ImprensaRégia) surgia O Patriota a primeira publicaçãonacional com cunho científico e em todo o séculoXIX houve ao menos 300 periódicosrelacionados à ciência, como mostra o livro“Ciência e Público: caminhos da divulgaçãocientífica no Brasil” (Editora UFRJ), organizadopela Profa. Luisa Massarani e colaboradores. Vale ressaltar que quase na mesma épocaem que Huxley fazia sucesso em Londres comsuas palestras, foram criadas em 1873 “AsConferências Populares da Glória” com muitosucesso entre a elite carioca durante pelo menos20 anos.E a Limnologia?

Nove entre dez notícias sobre o avançoda ciência, seus métodos e descobertas, são sobresaúde humana. Mas, os limnológos e ecólogostambém têm um objeto de estudo de enormeinteresse do público e mais do que isto, dascrianças do ensino formal. Este fato facilita o trabalho de escrever einstruir, mas tomo a liberdade para tecer algumasconsiderações com bases em minha pequenaexperiência nesta atividade:

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i) divulgar é mais esclarecer do que discorrer

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sobre pormenores;ii) catastrofismos como, por exemplo, “a água doplaneta está acabando” devem ser evitados, poisou o público não acredita, ou fica prostrado peranteum problema hercúleo que não poderá resolver;iii) assuntos locais sobre recursos hídricoschamam mais atenção que os globais, além depotencialmente terem maior chance de mudar aatitude de crianças e adultos;iv) analogias e metáforas, desde que na medidacerta, são sempre muito bem vindas na explicaçãodos pontos mais nebulosos;v) comparações com outros lugares (ambientes,países, cidades) auxiliam na contextualização doque está sendo tratado;vi) uma notícia recente, ou ainda algumcomentário de personalidade pública, podemservir como “ganchos” para a discussão ouesclarecimentos mais aprofundados de umdeterminado tema, com a considerável vantagemde agradar os editores dos jornais e revistas eentreter ainda mais as crianças;vii) atividades de educação científica têm poucosignificado se pontuais (um só dia);viii) é fundamental a criança fazer a pesquisa,desenvolvendo a metodologia adequada e nãoapenas analisar os resultados.Mas, como e onde publicar?

Hoje no Brasil é possível encontrar emqualquer banca de jornais várias revistas dedivulgação: Scientific American Brasil, a NationalGeographic, a Ciência Hoje (que finalmenteregularizou sua distribuição), e a “PesquisaFapesp”. Numa linha voltada para o públicojuvenil, há a Superinteressante (400 milexemplares por mês), a Galileu e a mais recenteLer Ciência. Além destas revistas há outro meiomuito interessante, mas não muito valorizado entreos cientistas que são os jornais locais. Eurecomendaria uma conversa com o editor, tentandoconvencê-lo da importância do artigo e do tema“ciência”. Geralmente estes veículos decomunicação estão mesmo ávidos por artigos de“doutores” que lhes confiram uma “aura” maisintelectualizada. Uma informação que não deveser subestimada é o fato que o Brasil tem 70 milpesquisadores e forma em torno de 8 mil doutorespor ano, além de contar com 245 mil professores

universitários. E onde mais esta gente podeadquirir cultura científica geral?

As instituições também podem auxiliarna divulgação, como bem já mostrou o Prof.Reinaldo Bozelli no capítulo “DivulgaçãoCientífica: limnologia para todas e para todos?”no recente livro “Lições de Limnologia”(organizado por F. Roland e colaboradores,Editora Rima). Mas no geral, as instituições sãolentas pra estas iniciativas (já repararam comoboa parte das assessorias de comunicação dasuniversidades serve mais como departamentosde marketing , quando não como merosapêndices das secretarias das administraçõessuperiores) e tudo acaba dependendo mesmo docientista que individualmente deve fazer seutrabalho completo.

Assim, esta é apenas mais uma de nossasatividades, como nos ensinaram Galileu eHuxley e apesar dos métodos e estratégias paradivulgar e educar sobre ciência serem novosainda para pesquisadores brasileiros, talvez esseseja um bom momento para reproduzirmos oexemplo pioneiro por eles deixado e nostornarmos mestres de nosso próprio futuro.

Ronaldo [email protected]

Universidade Estadual de Goiás

BROMÉLIAS-TANQUE: INSTRUMENTOPARA O ENSINO DE ECOLOGIA AQUÁTICA

Os cursos de limnologia oferecidos paragraduação e pós-graduação nas universidadespúblicas brasileiras visam ensinar conceitoslimnológicos e metodologias para a mensuraçãode parâmetros biológicos, físicos e químicos emecossistemas aquáticos continentais. Havendodisponibilidade de recursos, as aulas teóricas sãoacompanhadas de aulas de campo.

As tradicionais aulas de campo emlimnologia podem ser custosas devido ànecessidade da locomoção até algumecossistema aquático continental e de infra-estrutura de campo e laboratorial. Em situaçõesem que os recursos são escassos, ou que não

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exista facilidades de locomoção, o uso debromélias-tanque para o ensino de limnologiasurge como uma boa alternativa.

Os tanques formados pelo acúmulo deágua entre as folhas das bromélias-tanque(Phytotelmata) (Figura 1) são habitats quepossuem uma biota aquática característica,abrigando organismos, como fitoplâncton,zooplâncton e protozoários, abrangendo desdeprodutores primários, consumidores atédecompositores, podendo chegar a armazenar até45 litros de água. Richardson et al. (J. Trop. Ecol.,16: 167-188. 2000) definiram as bromélias comoum microcosmo com elevada diversidade, ondepodem ser estudados parâmetros físicos,químicos e biológicos principalmente devido aseu pequeno tamanho e limites definidos.

FIG1: Ecossistema aquático formado pelo acúmulo de água entre

as folhas de uma bromélia-tanque (Neoregelia cruenta).

Tanto em ambientes onde as broméliasse desenvolvem naturalmente, quanto em jardins(figura 2) onde as mesmas são plantadas, asbromélias geralmente estão submetidas adiferentes condições físico-quimicas.

FIG2: Alunos realizam medidas de pH na coluna d’águaacumulada em bromélias-tanque

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Como exemplo podemos citar: incidêncialuminosa, aporte de matéria orgânica e de águada chuva, que acabam por influenciar ometabolismo da coluna d’água presente no seutanque (Guimarães-Souza et al, Acta Limnol.Bras., 18: 47-53. 2006).

Bromélias-tanque têm sido utilizadas noensino de conceitos limnológicos para alunos desegundo semestre no curso de graduação doInstituto de Biologia da Universidade Federal doRio de Janeiro. Esta pratica tem duração de umamanha e é ministrada para uma turma de 20alunos, subdivididos em grupos de 4 ou 5.Inicialmente os professores e monitores ensinamos alunos a utilizarem os equipamentos eexplicam a importância de se obter cada umdosparâmetros mensurados (Figura 3).Posteriormente cada grupo de alunos escolhe umabromélia, e obtêm seus próprios dadoslimnológicos (Figura 4).

FIG3: Monitora ensina alunos de graduação como medir a

incidência luminosa sobre a coluna d’água de bromélias com o

uso do luxímetro.

A profundidade da coluna d’água e alargura do copo central da bromélia são medidoscom uma régua. Os valores de pH e concentraçõesde oxigênio são mensurados na superfície e nofundo das bromélias, através do uso de umpHmetro e oxímetro de campo. A temperatura édeterminada com um termômetro de bulbo e aincidência luminosa sobre a bromélia-tanque émensurada com um luxímetro. O volume d’águaé mensurado com um sistema feito com frascosde vidro, parecido com os sugadores utilizadosem coletas entomológicas (Figura 5). Parte daágua coletada para determinação do volume étransferida para frascos transparentes, sendo os

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valores de turbidez, coloração e clorofila-adeterminados relativamente a partir dacomparação visual dos mesmos (Figura 6).

FIG4: Aluna mensurando as concentrações de oxigênio.

Todos os resultados encontrados sãotabulados em um quadro branco e uma discussãoé realizada com os alunos no próprio local deprática (Figura 7). As diferenças e semelhançasencontradas entre estes microecossistemasservem de base para uma discussão teórica deconceitos básicos em limnologia e da relaçãoentre os parâmetros mensurados. Ao final dadiscussão, apresenta-se um paralelo aos estudoslimnológicos realizados em lagos e rios.

FIG5: Monitora coleta água acumulada para determinação do

volume do tanque com o auxílio de um sugador.

Uma das vantagens deste enfoque, é queos alunos podem comparar os resultados obtidosem diferentes ecossistemas (bromélias-tanque)em um curto espaço de tempo. A flexibilidadenas práticas é enorme, pois os alunos podem fazer

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comparações dos parâmetros mensurados embromélias-tanque de diferentes espécies, idades,localizadas no sol ou à sombra de árvores e etc.Estas diferentes situações são capazes de simularum possível aporte diferencial de materiaorgânica alóctone e, assim, gerar um gradientediferentes concentrações de carbono orgânicodissolvido. É também possível a realização deexperimentos in situ com diferentes gradientesde concentrações de nutrientes, simulando corposd’água oligotróficos a eutróficos.

FIG6: As diferenças marcantes entre a água coletada em 5

diferentes bromélias possibilita que parâmetros como coloração,

clorofila-a e quantidade de material em suspensão sejam

mensurados relativamente.

Não questionamos a importância dasaulas de campo ministradas em lagos e rios,fundamentais para a formação de um biólogo. Noentanto, as situações encontradas nos tanques debromélias são capazes de suscitar discussõeslimnológicas semelhante às aulas tradicionaisministradas nos corpos aquáticos. Nosso objetivoé apenas apresentar uma nova alternativa para oensino em limnologia utilizando bromélias-tanque, em função da facilidade da realização econdução das aulas de campo.

FIG7: Discussão sobre os resultados obtidos na prática.

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Luana [email protected]

Breno Alves Guimarã[email protected]

Alex [email protected]

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Tópicos EspeciaisMacroinvertebrados Bentônicos

O QUE SÃO MACROINVERTEBRADOS MESMO?

Conceitos precisam ser definidos eentendidos no contexto da teoria em que eles sãousados. Historicamente, as ciências ambientais sãomarcadas pelo uso de conceitos pouco precisos ouque assumem significados diferentes dependendodo contexto. Este problema tem gerado dificuldadespráticas na utilização de teorias ecológicas e suaaplicação.

O intenso uso de um conceito podeconsagrar sua aplicação e, muitas vezes, sobrepordiscussões sobre o seu significado e papel naconstrução de conhecimento e aplicação. O conceito‘macroinvertebrados’ (“macroinvertebrates”) nosfornece um exemplo. Uma simples busca na internet(Google®) resulta em aproximadamente 1.000.000de citações nos mais variados contextos. O conceitovem sendo amplamente utilizado em biologiamarinha, limnologia e ecologia desde os pioneirostrabalhos que cristalizaram estas áreas doconhecimento e mais recentemente emmonitoramento e avaliações ambientais. Mas o quesão macroinvertebrados?

O conceito ‘macroinvertebrados’ dependeda definição de dois componentes: “macro” e“invertebrados”. Invertebrados compreendem todosos Metazoa não-vertebrados e o sufixo macrodesempenha o papel de delimitar o universo dopesquisador aos invertebrados de determinadotamanho, geralmente os observáveis a olho nu,retidos em malhas de rede entre 0,2-0,5 mm.

Aparentemente é um conceito claro eoperacional, mas, dependendo do objetivo, suaaplicação pode ser pouco efetiva, acurada e/ou precisa, resultando em interpretaçõesequivocadas sobre padrões, processos emecanismos ecológicos.

Embora reconheçamos a importânciade discussões sobre técnicas para medir oconceito, por exemplo, coleta, triagem e nívelde resolução taxonômico, nós focalizaremosnossos comentários em implicações que osimples fato de adotar o conceito impõe aotrabalho.

Em ambientes aquáticos continentais,os macroinvertebrados incluem geralmenterepresentantes de Insecta (Plecoptera,Ephemeroptera, Trichoptera, Odonata, Diptera,Megaloptera, Hemiptera, Coleoptera eLepidoptera), Mollusca, Annelida e Crustaceae menos freqüentemente Nematoda e Porifera.Este agrupamento não representa um grupomonofilético do ponto de vista filogenético,sendo assim, não existe qualquer caráter quereúna exclusivamente os grupos acima citados.

Já a definição de um limite de tamanhoentre macroinvertebrados e outrosinvertebrados tem bases práticas comofacilidade de observação visual. Entretanto,alguns trabalhos têm demonstrado que emalgumas comunidades de metazoáriosaquáticos a distribuição de tamanho do corpoé bimodal, em que o intervalo entre as modascoincide com o tamanho que separa a‘meiofauna’ da ‘macrofauna’, justificandoentão a adoção da malha de 0,2-0,5mm nostrabalhos com macroinvertebrados. O assuntoé bastante controverso e recentemente estudosfocados em séries temporais (por exemplo:Stead et al., 2005. J. of Animal Ecol. 74: 475-487) demonstraram que a distribuição varia notempo (mono, bi ou polimodal), o que nãofornece suporte empírico para definição declasses de tamanho fixas.

Funcionalmente, embora diverso (porexemplo: modos de aquisição de alimento), osmacroinvertebrados representam um recorterestrito das comunidades de ambientesaquáticos e pode sub-quantificar o papel de

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grupos com funções similares. Por exemplo,considerando apenas o tamanho do corpo,funcionalmente um inseto detritívoro podedesempenhar papel ecológico semelhante à deoutro metazoário de similar tamanho, como umalarva de anfíbio ou um peixe.

A delimitação do grupo usando o critériotamanho apresenta outras implicações. O tamanhodo corpo é um dos atributos mais importantes queas espécies possuem e a teoria alométrica predizque diversos processos fisiológicos (ex. excreção,respiração, crescimento) dependem do tamanhocorpóreo dos indivíduos (Peters, 1983, TheEcological Implication of Body Size. CambridgeUniversity Press). Na escala de populações ecomunidades, o tamanho do corpo parece estarligado à densidade populacional, extensão dohabitat e riqueza de espécies. Assim, a definiçãodo tamanho do corpo do grupomacroinvertebrados impõe conseqüências emrelação ao entendimento dos mecanismos quegeram alguns padrões observados na natureza. Porexemplo, se alguém estivesse interessado eminvestigar padrões de abundância de indivíduosdos táxons que compõem os chamadosmacroinvertebrados em córregos e utilizasse olimite definido 0,2-0,5mm, poderia ignorar asmaiores abundâncias dos táxons, muitas vezesencontradas em classes de tamanho inferiores,como previsto pela teoria e observadoempiricamente (por exemplo: Schmid et al.,2000,Science 289: 1557-1560).

O conceito macroinvertebrados teve, teme terá grande papel na construção deconhecimento científico e aplicação embiomonitoramento, onde a operacionalidade doconceito é vantajosa quanto à viabilidade dotrabalho, entretanto é importante que tenhamosclareza de que ele representa apenas umaabstração que visa operacionalizar nossosesforços para medir atributos da natureza e quecarrega consigo uma série de limitaçõesinjustificáveis em determinados contextos.

Fabio de Oliveira [email protected]

Universidade de São Paulo

Tadeu [email protected]

Universidade Federal de São Carlos

O PAPEL DOS INVERTEBRADOS NADECOMPOSIÇÃO

Os estudos realizados nas últimasdécadas têm demonstrado que os riachos decabeceira são ecossistemas que dependem damatéria orgânica proveniente da vegetaçãoripária. Diante disso, fica implícita a importânciado processo de decomposição do detrito alóctoneno fluxo de energia e na ciclagem de nutrientes.

O processo de decomposição é complexoe tem muitas variáveis físicas, químicas ebiológicas influenciando sua dinâmica. Estasvariáveis, basicamente, atuam com mais oumenos intensidade nas 3 fases do processamentoda matéria orgânica: lixiviação, condicionamentoe fragmentação.

Dentre as variáveis biológicas, osinvertebrados aquáticos que colonizam osdetritos atuam como o elo energético entre aenergia estocada na matéria orgânica vegetal(que está sendo decomposta) e os níveis tróficossuperiores. Além disso, atuam na decomposiçãoacelerando o processamento e a fragmentaçãodos detritos em pequenos pedaços. No entanto,a colonização dos detritos pelos invertebrados éinfluenciada principalmente pelo estágio decolonização da comunidade microbiana no tecidofoliar, composição química do detrito e o estágiode decomposição que se encontra o detrito.Porém, o desenvolvimento desta comunidadetem como principal força motora o processo desucessão ecológica degradativa que éindependente da decomposição do detrito.

A comunidade de invertebrados aquáticospode ser estudada quanto à sua classificaçãozoológica ou em grupos tróficos funcionais –GTF (ver Merritt & Cummins, 1996 Anintroduction to the aquatic insects of NorthAmerica . 3 rd edition. Kendall/Hunt), querepresenta a estratégia de alimentação destes

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organismos. Predadores são aqueles que sealimentam de tecido de outros animais; raspadoresos que raspam o biofilme (algas, fungos, bactériase protozoários) aderido a diversos substratos;coletores os que se alimentam da matéria orgânicaparticulada fina, que podem ser divididos emcoletores-flitradores (filtram as partículas da água)e coletores-catadores (catam as partículas aderidasao substrato ou sedimento); e finalmente osfragmentadores que são capazes de se alimentardiretamente da matéria orgânica particuladagrossa vegetal. A classificação em grupos tróficospermite uma análise de como o detrito éprocessado e utilizado, a partir do hábito alimentardos invertebrados. Apesar disso, esta classificaçãodeve ser vista com cuidado, pois é evidente queeles podem por diversos motivos mudar seucomportamento alimentar e ainda são poucos osestudos em regiões tropicais capazes de validarcom precisão este sistema de classificação.

Devido ao seu hábito alimentar, osfragmentadores formam o grupo trófico funcionalmais importante no processo de decomposição.Este grupo é representado por Gamaridae,Trichoptera, Diptera (Chironomidae e Tipulidae)e Plecoptera (Graça, 2001 op cit). Além disso,Dobson (2004 Freshwater Forum 21:3–26)encontrou na África evidências da importância demacrocrustáceos (p.ex. Decapoda), o que ampliaa importância para outros grupos zoológicosnegligenciados pelas metodologias utilizadas nosestudos de decomposição (devido ao tamanho dasmalhas dos “litter bags”). A presença ou ausênciadestes invertebrados são decisivas na aceleraçãoda decomposição dos detritos.

As informações aqui apresentadasrepresentam o status vivendi da comunidadecientífica na Europa e América do Norte. Porém,os estudos realizados em riachos tropicais têmdemonstrado que os fragmentadores são raros ouausentes. Consequentemente, a decomposição dosdetritos vegetais dependeria basicamente dacomunidade microbiana, como foi descrito porIrons et al. (1994 Freshwater Biology, 32: 401–411). Diante disso, muitas questões sãolevantadas, tais como: 1) Quais foram os motivos,em regiões tropicais, que levaram osfragmentadores à seleção negativa? 2) Será que

nos trópicos os invertebrados tendem a ter umhábito alimentar generalista? 3) Quais são osinvertebrados ou grupos tróficos funcionaisresponsáveis pelo elo energético em regiãotropical? 4) Como são as relações entre ascomunidades de invertebrados e osmicroorganismos?

Como mencionado anteriormente, osdados disponíveis na literatura levam a pensarque a comunidade microbiana é a principalresponsável pelo processamento do detrito emriachos tropicais. No entanto, em Gonçalves etal. (2006. Journal of the North AmericanBenthological Society , 25: 344-355) foidemonstrado que a comunidade microbiana emum riacho de Cerrado na Serra do Cipó (MG)não foi tão eficiente no processamento do detritoquanto em região temperada, contrariando o quese esperava encontrar em um ecossistematropical. Sendo assim, as lacunas continuamabertas quanto à importância dos invertebrados.A “caixa preta” da decomposição emecossistemas tropicais continua.

O Brasil e, consequentemente, alimnologia brasileira pode vir a ter um papeldecisivo na mudança do paradigma dadecomposição em região tropical, poispossuímos diversos biomas que permitiriam umconhecimento mais aprofundado sobre esteprocesso e as suas relações com as diversasvariáveis envolvidas. Para tanto, é fundamentalo desenvolvimento de novas pesquisas e aconcessão de recursos financeiros para o estudoda ecologia de rios e riachos. E aqui cabe umaoutra pergunta: como se pode falar em estratégiasde conservação e manejo de bacias hidrográficasse ainda é incipiente o levantamento de dadossobre o processo fundamental dos riachos decabeceiras de nossas bacias? A decomposiçãode detritos foliares e o papel dos invertebradossão caminhos a serem trabalhados.

José Francisco Gonçalves Júnior [email protected]

Centro Universitário do Leste de MinasGerais

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BIOMONITORAMENTO DEMACROINVERTEBRADOS BENTÔNICOS:CONSOLIDANDO PASSOS NA BUSCA DODESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Programas de BiomonitoramentoA importância dos rios para abastecimento,

como fonte de alimento e recreação é claramentereconhecida, apesar da degradação dos ecossistemasaquáticos ter atingido os níveis máximos até entãoregistrados na história da humanidade. Osecossistemas aquáticos têm sido fortementealterados em função de múltiplos impactosambientais decorrentes de atividades antrópicas,como mineração, construção de barragens erepresas, retificação e desvio de cursos naturais derios, lançamento de efluentes domésticos eindustriais não tratados, desmatamento e usoinadequado do solo em regiões ripárias e planíciesde inundação, super-exploração de recursospesqueiros, introdução de espécies exóticas, dentreoutros.

Em função da valoração da água e suaimportância para o desenvolvimento humano, asbacias hidrográficas passaram a ser consideradasunidades espaciais de estudo para o planejamento,gerenciamento e desenvolvimento humano napaisagem. Entender as características e ofuncionamento dos corpos hídricos passou a serfundamental para o desenvolvimento sustentável,uma vez que refletem o uso e ocupação do solo emsua bacia hidrográfica, considerando-se a qualidadee a quantidade de água e as atividades antrópicasexistentes.

A necessidade de ligação entre medidas demanejo e programas de biomonitoramento deecossistemas aquáticos reflete a mudança denecessidades ambientais da sociedade humana.Programas de biomonitoramento passaram a serimplementados em diversos países, a partir dadécada de 80, com o intuito de desenvolver técnicascapazes de ajudar a antecipar problemas ambientais.

A primeira etapa do biomonitoramento é abusca pelo indicador ideal (ou bioindicador) cujapresença, abundância, e/ou comportamento refletemos efeitos estressores sobre a biota. Um indicadorpode ser utilizado para biomonitorar em diferentes

níveis de organização, desde o nível sub-organizacional (p.ex. genes, células, tecidos)a organismos, populações, comunidades, e atémesmo ao nível de ecossistemas.

O biomonitoramento de comunidadesbentônicas, com ênfase em insetos aquáticos,tem uma longa tradição em países de primeiromundo, iniciado com alguns poucos enfoquese ampliado para um grande número dediferentes métodos utilizados em vários paísesou regiões. Os macroinvertebrados bentônicossão considerados bons indicadores dequalidade de água por possuírem ciclos de vidacom duração mais longa que os planctônicos,e viverem de forma séssil durante semanas aalguns meses no compartimento sedimentar.Por este motivo, o seu monitoramento torna-se mais eficiente que o monitoramento baseadoapenas na mensuração de parâmetros físicos equímicos.

Política de Meio AmbienteDesde 1997 o Laboratório de Ecologia

de Bentos vem pesquisando ecologia deorganismos bentônicos em diferentes bacias noEstado de Minas Gerais e, a partir de 2003,iniciou-se o Programa de Biomonitoramentoda Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas. Asinformações obtidas já foram utilizadas paraauxiliar na elaboração do Plano Diretor deRecursos Hídricos desta bacia. Atualmentevem subsidiando as discussões sobre asalterações na Deliberação Normativa COPAM(30/03) para Minas Gerais em função daResolução CONAMA no 357 de 17 de marçode 2005, que dispõe sobre a classificação doscorpos de água e diretrizes ambientais para oseu enquadramento. Estas discussões visaminserir o enfoque de utilização de indicadoresbiológicos para avaliar a qualidade dosambientes aquáticos, utilizando-secomunidades de organismos. Desta forma,Minas Gerais vem procurando estabelecer asbases de um processo de avaliação por meiode indicadores biológicos que representem osresultados da implementação da políticaambiental no Estado.

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Na busca de participar deste processo

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para o desenvolvimento de políticas públicascomo reflexo de mobilização ambiental earticulação com ONGs e governo, o Laboratóriode Ecologia de Bentos da UFMG vem buscandocontribuir com a disponibilização de informaçõesde biomonitoramento e na sua transcrição (=tradução e articulação) junto aos gestores etomadores de decisão.

Biomonitoramento na Bacia do Rio das VelhasA bacia do rio das Velhas localiza-se na

região central do estado de Minas Gerais, entreas latitudes 17o 15’e 20o 25’ S, e longitudes 43o

25’ e 44o 50’ W, apresentando uma forma alongadana direção norte-sul. O rio das Velhas é o maiorafluente em extensão da bacia do rio SãoFrancisco, tendo sua nascente no município deOuro Preto, desaguando no rio São Francisco, ajusante da barragem do Três Marias. Possui 761km de extensão, 38,4 m de largura média,drenando uma área total de 29.173 km2 (Pompeuet al., 2005 American Fisheries SocietySymposium, 47:11–22.).

A bacia do rio das Velhas é dividida emtrechos alto, médio e baixo, sendo:? Alto rio das Velhas: compreende a porção

do rio que vai da Cachoeira dasAndorinhas, em Ouro Preto, até a jusanteda foz do Ribeirão da Mata, em SantaLuzia;

? Médio rio das Velhas: depois da foz doRibeirão da Mata até a foz do Paraúna;

? Baixo rio das Velhas: do Paraúna até a fozno rio São Francisco.O Programa de Biomonitoramento da

Bacia do rio das Velhas vem sendo realizadodesde 2003 com 4 coletas anuais intensivas,concentradas nos períodos de chuvas e seca. EstePrograma conta com uma rede amostral de 37pontos ao longo da bacia hidrográfica do rio dasVelhas, sendo 4 no trecho alto do rio das Velhas,13 na região metropolitana de Belo Horizonte, 9no trecho médio e 11 no trecho baixo do rio dasVelhas.

O programa de monitoramento ambientalrealizado também avalia: 1- a ictiofauna, pelaequipe do Departamento de Zoologia da UFMG;2- as condições ecológicas através da aplicação

de um Protocolo de Caracterização de condiçõesecológicas de trechos de bacia, proposto porCallisto et al . (2002 Acta LimnologicaBrasiliensia, 14 (1): 91-98); 3- a composiçãogranulométrica e teores de matéria orgânica dosedimento; 4- a composição e estrutura dascomunidades bentônicas; 4.1- descrição daspopulações e comunidades características; 4.2-identificação de diferenças entre as populaçõese comunidades em sítios distintos; 4.3- RiscoAmbiental. Este último enfoque é realizado combase na avaliação de respostas biológicas apoluentes; na obtenção de informações técnico-científicas para as tomadas de decisão; utilizaçãodo conceito de bacia hidrográfica como unidadede estudos; na avaliação de riscos para a saúdehumana e identificação de riscos ecológicos; nooferecimento de ferramentas para seremcomparadas com as condições esperadas naausência de atividades antrópicas; na obtençãode informações para ações de manejo buscandominimizar fontes de risco biológico identificadase de interesse ambiental.

Além disso, utilizamos neste programa oenfoque de áreas de referência, em comparaçãoa trechos de bacia impactados. Desta forma, alémdo biomonitoramento nas áreas que sofremdiferentes níveis de pressão antrópica, tambémsão avaliadas áreas preservadas. A bacia do riodas Velhas possui atualmente mais de 20unidades de conservação, distribuídas entreParques Nacionais, Estaduais, APAs, RPPNs eEstações Ecológicas. Dentre estas unidades, oPrograma de Biomonitoramento vem amostrandoem 8 diferentes rios situados, pelo menosparcialmente, em unidades de conservação.

Considerações FinaisO Programa de Biomonitoramento

realizado na bacia do rio das Velhas é resultadode parcerias entre profissionais que atuam emdiferentes áreas, tanto de pesquisa quanto deatuação institucional (pública, privada e ONGs).Somente integrando estes diferentes setores dasociedade é possível buscar o desenvolvimentode um Programa de Biomonitoramento que possautilizar o conceito de bacia hidrográfica comounidade de estudos. A partir deste prisma é

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possível buscar integrar o homem e a natureza, adiversidade social e biológica em escala espacial,importante no estudo de áreas urbanizadas, comoé o caso da bacia hidrográfica do rio das Velhas.

A utilização de bioindicadores dequalidade de água na bacia do Rio das Velhas vemmostrando que esta bacia apresenta situaçõesextremas, com áreas muito degradadasapresentando pouquíssimos taxa resistentes emelevadas densidades; e áreas bem preservadas comelevada riqueza taxonômica e presença de taxasensíveis. Estes resultados evidenciam a mádistribuição demográfica na bacia, sendo que aconcentração populacional situa-se no trecho altoda bacia do rio das Velhas com 3.082.407 dehabitantes (70% da população total).

Com base nestas informações, o Programade Biomonitoramento, que possui um carátertrans-institucional, consegue sensibilizar osgestores e tomadores de decisão a secompromissar em viabilizar políticas públicasvoltadas para a melhoria da qualidade ambiental.Existe hoje um compromisso celebrado entreatores governamentais, usuários de água da baciae a sociedade civil organizada em atuar em váriasfrentes para que seja possível navegar, pescar enadar no Rio das Velhas em sua passagem pelaregião metropolitana de Belo Horizonte em 2010,denominada META 2010 do Projeto Manuelzão.

Levantar meios para a recuperação egerência de ecossistemas aquáticos continentaisnão é tarefa fácil, uma vez que não se trata apenasde interesses científicos, mas de interesses muitasvezes econômicos e políticos. Medidas desaneamento e tratamento de esgotos podemmelhorar consideravelmente as condições dequalidade das águas da bacia do rio das Velhas,permitindo a revitalização das comunidadesaquáticas. Resultados obtidos pelo Programa deBiomonitoramento já apontam para uma sensívelmelhora da qualidade das águas a jusante da regiãometropolitana de Belo Horizonte. Foi detectadoo aumento da riqueza taxonômica e a presença deorganismos menos tolerantes à poluição, tanto demacroinvertebrados aquáticos (p.ex. Trichopterae Plecoptera) quanto de peixes (p.ex. Curimatá,Piau e Dourado).

comunidades bentônicas na bacia do rio dasVelhas nos incentiva a acreditar que o empregode indicadores ambientais é importante paracompreender e avaliar metas progressivas demelhorias da qualidade das águas econsequentemente da qualidade ambiental.

Marcos [email protected]

Pablo [email protected]

Universidade Federal de Minas Gerais

POSSIBILIDADES DA PARTICIPAÇÃOPÚBLICA EM PROGRAMAS DEBIOMONITORAMENTO DE RIO

O interesse sobre a participação públicana gestão dos recursos hídricos vem aumentandodesde a última década e é apontada comoestratégica para o século XXI. De acordo com odocumento da Organização das Nações Unidas,AGENDA 21 (CNUMAD, 1996 – Capítulo 18)e outros documentos posteriores: “Para delegaro manejo dos recursos hídricos ao níveladequado mais baixo é preciso educar e treinaro pessoal correspondente em todos os planos eassegurar que a mulher participe em pé deigualdade dos programas de educação etreinamento. Deve-se dar particular ênfase àintrodução de técnicas de participação pública,inclusive com a intensificação do papel damulher, da juventude, das populações indígenase das comunidades locais. Os conhecimentosrelacionados com as várias funções do manejoda água devem ser desenvolvidos por governosmunicipais e autoridades do setor privado,organizações não-governamentais locais/nacionais, cooperativas, empresas e outrosgrupos usuários de água. É necessária tambéma educação do público sobre a importância daágua e de seu manejo adequado. (...) Paraimplementar esses princípios, as comunidadesprecisam ter capacidades adequadas. Aquelesque estabelecem a estrutura para o

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Enfim, o biomonitoramento das

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desenvolvimento e manejo hídrico em qualquerplano, seja internacional, nacional ou local,precisam garantir a existência de meios paraformar essas capacidades os quais irão variarde caso para caso. Elas incluem usualmente: (a)programas de conscientização, com amobilização de compromisso e apoio em todosos níveis; (...); e (e) partilha de conhecimento etecnologia adequados, tanto para a coleta dedados como para a implementação dedesenvolvimento planejado, incluindo tecnologiasnão-poluidoras e o conhecimento necessário paraobter os melhores resultados do sistema deinvestimentos existente”.

Desde então, a comunidade internacionaltem feito esforço considerável para aumentar aatenção sobre os recursos hídricos, sob osobjetivos de equidade e sustentabilidade.

Diante das dificuldades que um controleestatal centralizado poderia acarretar, os sistemaspolíticos mais modernos, no que se refere arecursos hídricos, têm adotado a descentralizaçãoparticipativa. Nele, o Estado, apesar de manter odomínio sobre a água, descentraliza a gestãopermitindo a participação da sociedade e dosusuários de água através de entidadesespecialmente criadas.

No Brasil, o interesse pelas questõesambientais teve reflexo na legislação específicadesenvolvida nos últimos anos. A Lei das Águas(Lei 9.433/97) foi o marco legal para oestabelecimento dessa nova cultura. Em seu sextofundamento, a lei aponta que a gestão de recursoshídricos deve ser descentralizada e contar com aparticipação do Poder Público, dos usuários e dascomunidades. Por descentralizado entende-se quetudo o que puder ser resolvido localmente deveráser assim feito, mas traz implicitamente a idéiade transferência para a sociedade de atribuições eresponsabilidades na gestão.

A lei possui caráter inovador e moderno,sobretudo quando propõe que a gestãoparticipativa deve ser feita não somente entre osníveis estadual e federal, mas também envolvendoos níveis de base. O envolvimento dos cidadãosna gestão de recursos hídricos é fundamental,tendo em vista as dimensões continentais do Brasile as próprias características do setor, que

impossibilitam iniciativas centralizadas ouexclusivamente governamentais para o trato coma água. Não só no gerenciamento das águas comoem outras iniciativas de conservação e proteçãoambiental, os movimentos sociais brasileiros têmsido responsáveis por boa parte dos avanços,embora falte maior articulação e oreconhecimento das mídias, do público e dosgovernos para que esses grupos ampliem suaeficácia e abrangência de ação.

As soluções para o estabelecimento deuma gestão descentralizada são particulares edependem dos contextos sócio-ambientais. Noentanto, duas facetas são universalmenteimportantes: o empoderamento dos atoressociais, em todos os níveis, e a produção de dadoscom qualidade, para nortear as discussões e atomada de decisões (UNESCO, World WaterAssessment Programme. 2003. Water for people,water for life: The United Nations World WaterDevelopment Report. Barcelona: UNESCO andBerghahn Books).

Em busca de alternativas para oatendimento de objetivos tão complexos eamplos, desde 1999 o Laboratório de Avaliaçãoe Promoção da Saúde Ambiental (LAPSA/IOC/FIOCRUZ) vem desenvolvendo os “ProgramasParticipativos de Avaliação Integrada eMonitoramento da Qualidade da Água de Rios”.O escopo deste breve artigo é apresentar as idéiase alguns resultados destes programas de pesquisacujas propostas são: desenvolver e testarmetodologias de coleta de dados eficientes e debaixo custo, além de materiais educacionais eestratégias de mobilização para a formação degrupos de agentes comunitários voluntários,tendo como unidade básica a bacia hidrográfica.

O Biomonitoramento como ferramenta deanálise da qualidade da água de rios

As vantagens de utilizar abordagensintegradas para a avaliação ambiental já vêmsendo apontadas por pesquisadores desde adécada de 70. As abordagens mais modernaslevam em conta não somente as metodologiastradicionais (análises físico-químicas ebacteriológicas, cujas limitações já foramamplamente discutidas), mas também

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parâmetros ambientais e biológicos, a fim de obterum espectro completo de informações sobre oecossistema.

O uso de parâmetros biológicos para medira qualidade da água se baseia nas respostas dosorganismos em relação ao meio onde vivem.Como os rios estão sujeitos a inúmeros distúrbiosambientais, a biota aquática reage de algumaforma a esses estímulos, sejam eles naturais ouantropogênicos. Monitoramento biológico, oubiomonitoramento, é definido como o usosistemático das respostas de organismos vivospara avaliar as mudanças ocorridas no ambiente,geralmente causadas por ações antropogênicas.

Apesar do desenvolvimento demetodologias de avaliação com diversosorganismos, o grupo de macroinvertebradosbentônicos é o mais testado e utilizado. Estascomunidades têm sido amplamente utilizadas poruma série de razões: 1) são ubíquos, podendo serafetados por perturbações em praticamente todosos ambientes aquáticos e em todos os períodos;2) a grande variedade de espécies oferece umamplo espectro de respostas às variações; 3) emrios de pequenas dimensões, a fauna pode serextremamente rica, enquanto esses ambientespodem não comportar a fauna de peixes; 4) anatureza basicamente sedentária de váriasespécies leva a uma eficiente análise espacial dospoluentes e efeitos nas populações existentes; 5)apresenta metodologias de coleta simples e debaixo custo, que não afetam adversamente oambiente; 6) são relativamente fáceis deidentificar segundo as metodologias existentes.

As vantagens da integração de resultadosbiológicos aos métodos tradicionais já foramapontadas em diversos estudos e vêm sendo cadavez mais empregados em programas oficiais demonitoramento (e.g. US EPA, CETESB, CETEC).

Fundamentos da educação para umaparticipação pública na gestão e menejo derecursos hídricos

A noção de manejo integrado espelha umamudança progressiva na direção dodesenvolvimento de abordagens que incluamtodos os atores sociais, levando-se em conta asintrincadas conexões entre sociedade, cultura,

ciência e ambiente. Para tal, é necessária maiorparticipação em todos os níveis e profundasmodificações na relação entre estado esociedade, com implicações nas formas com queo conhecimento é criado, adquirido ecompartilhado.

Um aspecto fundamental a ser levado emconta na aplicação de um programa demonitoramento é a habilidade em traduzir ainformação tanto para os gestores ambientaisquanto para o público em geral. Atualmente,considera-se que parte do conhecimentocientífico gerado pelas pesquisas biológicas (oupor outras ciências) seja direcionado para atenderàs necessidades da sociedade. Muitas vezes, acomplexidade dos resultados impede ainterpretação pelo público leigo e até mesmopelos tomadores de decisão, tornando ainformação restrita e com baixo poder deresolução dos problemas. Portanto, éfundamental que esse processo envolva diversosatores sociais, integrando o meio científico, opolítico, o social e o econômico, para que asinformações geradas sejam compreendidas eaplicadas adequadamente.

Vale ressaltar que para além dopragmatismo da resolução dos problemasambientais concretos é fundamental no processoeducativo a incorporação da crítica a respeito dascausas e efeitos destes problemas ambientais edas responsabilidades individuais e coletivas.Desta forma, a Educação Ambiental atua nãosomente como atividade-fim, mas como tema-gerador, em uma perspectiva de educaçãolibertadora.

Relatos de experiências dos programasparticipativos de avaliação da qualidade daágua de rios

No município de Guapimirim, RJ,desenvolvemos um projeto em parceria com aPrefeitura Municipal de 2000 a 2004. Nosprimeiros dois anos, o público escolar(professores e alunos de 6ª e 7ª séries) de trêsescolas locais (uma estadual, uma municipal euma particular) foi envolvido diretamente, emcaráter voluntário e extra-classe. Os objetivosneste período eram testar metodologias

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relativamente simples de coleta e identificaçãode macroinvertebrados, em nível taxonômico deordem, seguindo um índice desenvolvido a partirde trabalhos prévios nesta mesma área, além douso de dados físico-químicos e de uma análise daintegridade ambiental (traduzido e modificado deU.S. Enviromental Protection Agency. 1999.Rapid Bioassessment Protocols for use in Streamsand Wadeable rivers: Periphyton, BenticMacroinvertebrates and Fish. Washington: EPA,2nd Ed.).

As aulas eram realizadas uma vez porsemana e a teoria era usada para favorecer aprática, onde se dava o processo de construçãocoletiva de cada conceito. Após a discussão/socialização dos resultados, novos temas/conceitos eram sugeridos para o encontro dasemana seguinte.

As aulas práticas em campo eramrealizadas nas localidades onde havia maiorprobabilidade de haver problemas ambientais e/ou nas áreas de referência, mais íntegras. Aescolha das áreas era realizada em consenso entreos parceiros do projeto: segundo o ponto de vistatécnico/científico, político/estratégico, dos usosda água e das representações sociais.

Ao realizarmos a coleta em uma das áreasde referência da bacia do rio Soberbo, a poucosmetros dos limites do Parque Nacional da Serrados Órgãos, tanto as análises físico-químicas daágua quanto a análise ambiental indicavam classede qualidade “excelente”. No entanto, a análisebiológica enquadrava o rio em classe “ruim”,apesar de descrito em trabalhos prévios comosendo um trecho com alta biodiversidade.

Os alunos decidiram então seguir osprincípios da pesquisa qualitativa para investigaros motivos do possível impacto: após aobservação de um fato/fenômeno (a qualidade daágua estava incompatível com o esperado,portanto, haveria um possível impacto), foramlevantadas perguntas (que tipo de impacto e comoocorreu?) e desenvolvida uma metodologiainvestigativa (mediante entrevistas commoradores locais).

Através das entrevistas que os alunosconduziram, chegamos à conclusão de que oproblema deveria estar relacionado ao lançamento

de cloro na água, fato reiterado em várias falas etestemunhado por um aluno: “Fui dormir na casado meu tio e ficamos conversando na varandada casa... às 23 horas, sentimos um cheiro decloro que parecia vir do rio... fomos até a beirado rio e vimos uma espuma branca nas margense um cheiro bem forte de cloro na água”. Deposse dessa nova informação, partimos em buscado potencial responsável pelo problema que, aque tudo indicava, era a empresa deabastecimento de água da cidade, únicoempreendimento próximo à área.

Em resumo, descobrimos quecomumente nos tanques de estocagem, a cadadois meses dependendo das condições, parte docloro armazenado solidifica, se agregando àparede dos tanques. Para sua remoção, oprocedimento padrão é o jateamento, devendo ocloro ser removido e depositado em localadequado. No entanto, aparentemente oprocedimento adotado em um município depequeno porte, cuja fiscalização era precária (einexistente durante a noite), foi o de liberar ocloro no rio Soberbo.

Após a empresa negar qualquerlançamento irregular de efluentes, iniciou-se ummovimento social, capitaneado pelos alunosparticipantes do projeto, para resolução desteproblema junto à prefeitura e à empresa. A notíciade que alunos podiam analisar a qualidade daágua e detectar problemas ambientais chegou atéos meios de comunicação e, em um mês, oprojeto virou destaque de jornais e vários canaisde TV.

Sempre com responsabilidade, o processofoi conduzido de forma a não denunciar aempresa, mas mostrar que o protagonismojuvenil poderia e deveria ser estimulado. Aempresa e a prefeitura, pressionadas pelasassociações de moradores e outras organizaçõescivis, concordaram em financiar o projeto demonitoramento por um ano. Apesar da empresasempre haver negado ser a causadora doincidente, “coincidentemente” não foramverificados eventos similares.

A partir desses eventos, muitas pessoasda comunidade se interessaram em participar doprograma, tanto que, desde então, o foco está na

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formação de agentes comunitários voluntários,não envolvendo necessariamente apenas o públicoescolar. Assim, atualmente o projeto almeja nãosomente realizar o diagnóstico da qualidade daságuas, mas também ajudar a comunidade e outrosatores sociais a construírem fóruns de discussãosobre os impactos e potencialidades locaisvisando, sobretudo, à resolução dos problemasligados à saúde humana e aos recursos hídricos.

A partir dessa experiência, o projeto foiimplementado em outros municípios do Estadodo Rio de Janeiro (Paracambi, Nova Friburgo, Riode Janeiro e Engenheiro Paulo de Frontin), doEspírito Santo (Domingos Martins, Santa Mariade Jetibá) e do Paraná (Matelândia, Céu Azul eToledo), com resultados igualmente animadores.

No município de Paracambi, as ações domonitoramento participativo indicaram que o Riodos Macacos (tributário do Ribeirão das Lages, àjusante chamado de Rio Guandu, usado para oabastecimento da cidade do Rio de Janeiro) tinhasuas águas degradadas, com alto grau decontaminação por efluentes domésticos, pelomunicípio à montante da bacia, Engenheiro Paulode Frontin. Os voluntários iniciaram então umprograma de divulgação dos resultados nos doismunicípios e junto ao Comitê do Rio Guandu.Atualmente, o município de Eng. Paulo de Frontinconta com um grupo de voluntários paradeterminar as fontes poluentes de forma amelhorar a qualidade da água dos rios.

No Estado do Paraná, o projeto conta coma parceria de Itaipu Binacional, InstitutoAmbiental do Paraná, prefeituras e universidadeslocais. A proposta é abranger todos os 29municípios que possuem rios que deságuam nolago de Itaipu, que contará com uma malha demais de 700 voluntários e 20 universidades.Atualmente, além do monitoramento da qualidadeda água, diversas ações educativas vêm sendorealizadas pelos voluntários com as comunidades,o que deu legitimidade aos grupos em busca desoluções para outros problemas (p.ex. luta poruma maior periodicidade da coleta de lixo,redução do uso de agrotóxicos e de boas práticasde manejo ambiental).

Outro marco de atenção dos programasparticipativos é a garantia da qualidade dos dados

gerados pelos voluntários, conforme os objetivostraçados pela UNESCO (op. cit.). Ou seja, nãoadianta apenas que a população participe. Osdados gerados nesses programas devem ser dequalidade para servirem à tomada de decisão.Por isso, aplicamos em todos os projetosmetodologias de Quality Assurance/QualityControl (US EPA, op. cit.). Uma das formas paratal é realizar o monitoramento seguindo astécnicas usadas nos centros de pesquisa ecompará-los aos dados gerados pelosvoluntários. Os resultados até o momentoindicaram que em 92% dos casos o índicemultimétrico utilizado pelos pesquisadores, ondeos macroinvertebrados são identificados emnível taxonômico de gênero, e o índice biológicocriado para os voluntários, em nível taxonômicode ordem, produziram o mesmo resultado. Istoindica a possibilidade concreta do uso de dadosgerados por voluntários, bem treinados ecertificados, para o monitoramento rotineiro daqualidade das águas.

Nossa proposta é desenvolver uma redede informações com múltiplas instituições paraque essas atividades pautem os programas demonitoramento realizados pelos centros depesquisa e as agências ambientais. Assim, omonitoramento, mais custoso, realizado poresses órgãos seria utilizado predominantementequando os dados gerados pelos voluntáriosindicassem algum impacto. Isto permitiria aredução dos custos de análise, incluiria umaparcela da população na gestão ambiental(principalmente pessoas que sabem aonde osproblemas ocorrem) e direcionaria os gastospúblicos para a resolução dos problemas locais.

Saberes técnicos e populares: algumas reflexõesem voz alta

No caso da produção científica serconcebida a partir do enfoque da participação eda ação, exige-se do pesquisador uma atitudepolítica diante do conhecimento e da própriarealidade. Os conhecimentos sobre a saúde, acultura e a história são subsídios para a ação,para as mudanças desejadas. Na prática, esserelacionamento entre pesquisadores e acomunidade é uma relação dialética, onde

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certamente o conhecimento sobre a realidade éenriquecido por ambas as partes. O elementopopular sente, mas nem sempre compreende ousabe; o elemento intelectual sabe, mas nemsempre compreende ou, sobretudo, sente.(Gramsci, A. 1978. Concepção Dialética daHistória. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira). Neste sentido, esta relação entre o sabercientífico e os saberes da comunidade, paraprodução de um novo conhecimento, na prática,contribui para uma nova cultura, superando aidéia comum de que pesquisa se realiza de formadistanciada dos problemas da vida cotidiana e daluta pela saúde humana e ambiental (Freire, P.1981. Criando Métodos de Pesquisa Alternativa:aprendendo a fazê-la melhor através da ação. InBrandão,C.R.; Pesquisa participante . 8ª ed. 1990.São Paulo: Brasiliense). A participação representa e possibilita a açãointerativa entre as forças que se complementame se contrapõe numa comunidade. A nãoparticipação, de qualquer ator social,principalmente os mais antagonizados pelosproblemas ambientais, decompõe a realidadereduzindo-a e simplificando-a, não dando contade sua complexidade e somente possibilitandointervenções parciais. Assim, só se efetiva agestão ambiental para superação dos problemasambientais se a participação de todos os atoressociais envolvidos for possível. Portanto, é fundamental a conquista demecanismos participativos para a gestãoambiental, que garantam a participação desegmentos sociais mais fragilizados nosprocessos de negociação. Observamos que istopode ser, em parte, adquirido com a aproximaçãoentre estes setores e o setor técnico, pois ampliaa capacidade de avaliação crítica da comunidadee confere autonomia de saber, uma vez que secria uma nova cultura de construção deconhecimentos, que agrega e valoriza os váriossaberes. Uma educação política (Freire, 1986, op.cit.) permite a ampliação do espaço democráticona sociedade. É certo que os dados gerados pelos programasparticipativos são de grande valor, não apenaspor envolver setores sociais desprivilegiados deatuação nos processos de gestão, mas porque a

comunidade sabe aonde os problemas existem equais os mecanismos locais possíveis pararesolvê-los. No caso do programa de pesquisasaqui apresentado, demonstrou-se que, a partir deum treinamento básico adequado, os voluntáriosmostraram ser capazes de agir na melhoria efetivada qualidade da água e, portanto, de vida, de todaa população.

Daniel F. Buss

[email protected], Rio de Janeiro, RJ

Macroinvertebrados Aquáticos e oLicenciamento Ambiental

O universo de ferramentas utilizadas paraanálises ambientais em sistemas de água doce nãoé pequeno. Diversos são os estudos que fazemuso de metodologias baseadas em análisesquímicas, físicas, morfométricas e biológicas doscursos d’água . Dentre as metodologias propostaspara análises ambientais incluindomacroinvertebrados aquáticos, destacam-se osprotocolos de avaliação rápida (e.g., RapidAssessment Protocol - EPA), índice deintegridade biológica (B-IBI, Kerans B. L, KarrJ. R. 1994. Ecol Appl 4: 768-785) e inúmerosíndices com as mais variadas siglas: EPT, EPT-C, BMWP, referentes a programas reconhecidosem nível nacional e internacional para a avaliaçãode impactos ambientais.

Muito já se comentou a respeito dasuperficialidade de alguns índices (Nijboer e cols.2005. Freshwater Biology 50:1427-1440) aoutilizarem poucos taxa em nível de grandesgrupos taxonômicos (e.g., EPT, EPT-C), oumesmo um universo maior de grupostaxonômicos (e.g., BMWP), os quais podemresultar em classificações precipitadas daqualidade da água. Ainda, particularidadesregionais tornam os índices restritos à aplicaçãoem sua área de origem (e.g., AusRivAS,Austrália; RIVAPACS, Reino Unido) sendo vemsendo largamente apresentados pela comunidade

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científica, porém sua implantação ereconhecimento por órgãos ambientais deve serintensificado e incentivado em todas asinstâncias.muitas vezes não possível seu uso emoutras regiões.

Segundo Nijboer e cols. (2005.Freshwater Biology 50: 1427-1440), deveria-seutilizar todos os taxa para caracterizar acomunidade de macroinvertebrados emprogramas de avaliação e monitoramento deimpacto ambiental. Mas será que isto é suficiente,afinal este procedimento demanda um trabalhoexaustivo na triagem, separação e identificaçãode muitos taxa e em curto prazo isto se tornainviável. Contudo, análises envolvendo ometabolismo de sistemas aquáticos podem proverinformações de vários parâmetros, resumidos emuma atividade biológica facilmente compreensível– processos ecológicos - quer seja, produção,consumo ou decomposição (Gessner e Chauvet.2002. Ecological Applications 12(2): 498-510;Pascoal e cols. 2003. Freshwater Biology48:2033-2044.) ou, a interação desses com aestrutura da comunidade ou assembléias demacroinvertebrados (Casas e Gessner. 1999.Freshwater Biology 41: 781-793). Gessner eChauvet (2002 Ecological Applications 12(2):498-510) enfatizam a utilização de indicadoresecossistêmicos na avaliação da qualidade da águacomo uma importante ferramenta a ser utilizada,pois estes se relacionam diretamente aoecossistema em questão e serve como mecanismoconfiável para detectar fragilidades ambientais.

Um dos atuais desafios no uso adequadode macroinvertebrados como apetrecho para omonitoramento ambiental consiste na percepçãoda escala temporal e espacial em que os impactosestão sendo avaliados. Os distúrbios físicos, sejameles naturais e/ou antrópicos, podem influenciara estruturação das assembléias demacroinvertebrados aquáticos de forma dinâmica,apresentando diversos cenários em curtos espaçosde tempo.

No Brasil, estudos envolvendomacroinvertebrados aquáticos como indicadoresda qualidade da água (Marques e Barbosa,Hydrobiologia. 457: 69-76) ou até mesmo em

(Galdean e cols. 2000. Aquatic Ecosystem Healthand Management . 3:545-552) vem sendolargamente apresentados pela comunidadecientífica, porém sua implantação ereconhecimento por órgãos ambientais deve serintensificado e incentivado em todas asinstâncias.

Atribui-se alguns fatores para a utilizaçãopouca efetiva de macroinvertebrados aquáticoscomo prática para o licenciamento, avaliação emonitoramento ambiental por órgãosfiscalizadores no Brasil. Dentre eles, inclui-se acarência de uma política pública como veículoincentivador para o reconhecimento desta análisemais refinada, bem como a percepção da inter-relação dos padrões e processos ecológicos emdiferentes escalas, o qual vislumbra perspectivasde maior amplitude no entendimento,reconhecimento e detecção de alteraçõesambientais.

Estudos vinculados ou em parcerias comos órgãos ambientais permitem a aplicação doconhecimento acadêmico no âmbito das políticaspúblicas. Rodrigues e Barbosa (2006. In: ManualTécnico, Vol. 2:85-96) avaliaram o impacto dasatividades suinícolas em cursos d’água de umabacia hidrográfica no noroeste gaúcho, atravésde um projeto junto ao órgão ambiental estadual(FEPAM) financiando pelo programa nacionaldo meio ambiente (PNMA II-MMA). A partirda determinação da taxa de decomposição foliarassociados à colonização pormacroinvertebrados aquáticos, detectaram-setrechos da bacia hidrográfica sob impacto daatividade suinícola, gerando subsídios para oórgão ambiental intervir na regulamentação dolicenciamento das atividades suinícola (Fig. 1).

Em áreas naturais sujeitas a impactosambientais de diferentes níveis, quandodetectada alguma alteração ambiental ou ainda,se pretende realizar o licenciamento de umaatividade que possa causar algum dano aoambiente e/ou a sua diversidade, éimprescindível o seu licenciamento por órgãocompetente. Recentemente estudos têm sidoconduzidos a fim de subsidiar o licenciamentode atividades extrativistas no Rio Grande do Sul.

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tentativas de classificações dos sistemas lóticos Mesmo para o licenciamento de uma

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aa

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FIG 1: (i) Localização espacial da bacia hidrográfica Lajeado Grande, RS e das estações de coleta (EC) analisadas em experimentos

de colonização e decomposição foliar de Ocotea puberula (Lauraceae). (ii) Valores referentes à abundância média de

macroinvertebrados durante período 180 dias. EC’s a, b, g e h apresentaram menores valores de abundância cumulativa. EC’s c,

d, e e f apresentaram maiores valores de abundância cumulativa. [Rodrigues, G. G. & Barbosa, A. F. 2006. Concepção ecossistêmica

para avaliação da qualidade da água na bacia do Lajeado Grande. In: Controle da contaminação ambiental decorrente da suinocultura

no Estado do Rio Grande do Sul (Programa Nacional do meio Ambiente - PNMA II). Manual Técnico, Vol. 2: 85-96].

(ii)

b

f e c

d

g h i

a

(i)

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atividade de uso sustentável em áreas depreservação permanente, este processo épermeado por inúmeros estudos que envolvamtanto análises em diferentes níveis de organização,desde organismo, população, comunidade eecossistema. Neste caso, foi viável reunirsubsídios técnico-científicos no monitoramentocom macroinvertebrados para a legalização de usode fibras vegetais (macrófitas aquáticas) porpequenos agricultores familiares (extrativistas),através da simulação de um distúrbio no sistema(corte de Typha domingensis) associado aosestudos de crescimento da macrófita e omonitoramento da estrutura da comunidade demacroinvertebrados em áreas com efeitos do cortee áreas controle (Fig. 2).

Assim, medidas e análises da biodiversidadede assembléias de macroinvertebrados aumentama resolução de detecção de distúrbios, porém emalguns casos apresentam respostas limitadasquanto à dinâmica do sistema em questão. Quandoassociados a processos ecossistêmicos, porém,análises de biodiversidade tornam possíveldetectar não somente a ocorrência destesdistúrbios como também identificar e monitoraro metabolismo do sistema aquático.

Considerações finais? Um dos desafios no uso de

macroinvertebrados como apetrecho parao monitoramento ambiental consiste napercepção da escala espaço-temporal emque os impactos estão sendo avaliados.

? Distúrbios naturais e/ou antrópicos quepodem influenciar as assembléias demacroinvertebrados ocorrem de formadinâmica apresentando diversos cenáriosem curtos espaços de tempo.

? A implantação de metodologias para aanálise de impacto ambiental baseadasem macroinvertebrados por agências,instituições e órgãos de fiscalizaçãoambiental é uma medida que deve serintensificada e incentivada.

? Atribui-se alguns fatores para a poucautilização efetiva de macroinvertebradosaquáticos como prática demonitoramento por órgãos fiscalizadoresno Brasil. Dentre eles, inclui-se acarência de uma política públicaincentivando o reconhecimento destaanálise mais refinada na avaliação deimpacto e monitoramento ambiental.

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FIG 2: A, esquema do corte de T. domingensis. B, Regeneração de T. domingensis e riqueza de macroinvertebrados. As barras

expressam valores de biomassa de Typha nos diferentes tratamentos: [cinza, tratamento controle e preto tratamento de corte][losango

escuro, riqueza de macroinvertebrados nos controles; circulo claro, riqueza de macroinvertebrados no tratamento de corte].

(Silveira, T.C.L. 2006. Avaliação da sustentabilidade do uso de plantas aquáticas para confecção de artesanato. In: I Simpósio

sobre o Uso Sustentável da Mata Atlântica, Palmeira Juçara, plantas aquáticas e cipós como alternativas sustentáveis. Maquiné,

RS, 06 de abril de 2006. www.jornaldomeioambiente.com.br).

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de estudo é a flora ou a fauna, respectivamente.O conhecimento de eventos relacionados

à história geológica da terra, como mudanças noclima e geografia, e de fatores e processosecológicos, como tipo de hábitat e interações, éessencial para a compreensão dos padrões atuaisde distribuição dos organismos. A análise eentendimento destes padrões de distribuição vãodepender da escala do estudo. Assim sendo,dados sobre a configuração passada doscontinentes e ligações terrestres podem serimportantes para explicar padrões de distribuiçãode maior escala, nos quais componenteshistóricos teriam uma maior influência, enquantoque em uma escala menor os padrões dedistribuição poderiam ser mais influenciados porfatores ecológicos recentes. Da mesma maneira,a avaliação da influência de fatores históricos eecológicos são importantes para uma melhorinterpretação da atual distribuição e composiçãode comunidades aquáticas. Junto à grandevariabilidade do meio das águas continentais,como variações nas concentrações de íons,nutrientes, temperatura, as característicasregionais influenciam a distribuição dosorganismos aquáticos e a atual composição decomunidades de rios e lagos (Schäfer, A.1984.Fundamentos de Ecologia e Biogeografiadas Águas Continentais).

As chamadas regiões biogeográficas sãoáreas do globo onde distintos endemismos sãoreconhecidos. O primeiro mapa biogeográfico foipublicado por Lamarck & Candolle em 1805 paraa flora da França (Ebach & Goujet 2006 J.Biogeogr., 33: 761-769), mas foi Candolle em1820 que fundou o sistema global de regiõesbiogeográficas, ao reconhecer 20 áreas deendemismos baseado na distribuição de plantas,passando este número para 40 áreas pelo próprioCandolle em 1838. Considerando a distribuiçãoda fauna, os primeiros zoogeógrafos nãodistinguiram mais do que seis regiõescontinentais, e o reconhecimento formal dessasregiões começou com o trabalho de Sclater em1858, o qual dividia o mundo em seis regiões,posteriormente aceitas por Wallace em 1876 aotambém estudar a distribuição de animais. Os

? O estudo a partir do reconhecimento dasinter-relações (estrutura e processosecológicos) em diferentes escalasvislumbra perspectivas de maioramplitude no entendimento e detecção dealterações ambientais.

? Medidas e análises da biodiversidade deassembléias de macroinvertebradosaumentam a resolução de detecção dedistúrbios, mas têm resposta limitadaquanto à dinâmica do sistema em questão.

? Quando associadas a processosecossistêmicos, as análises de diversidadede macroinvertebrados aquáticos tornampossível detectar não somente aocorrência destes distúrbios como tambémidentificar e monitorar o metabolismo dosistema aquático.

Gilberto Gonçalves [email protected]

Thiago Cesar Lima [email protected]

André Frainer [email protected]

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Biogeografia e Macroinvertebrados deÁgua Doce

Cada táxon, seja ele espécie, gênero ouqualquer outra categoria, ocupa uma áreageográfica, chamada de área de distribuição,extensão ou endemismo. A biogeografia é adisciplina que estuda os padrões de distribuiçãodos organismos. Ela procura explicar como ostáxons são distribuídos e porque a composiçãotaxonômica da biota varia de uma região paraoutra, através da formulação de hipóteses acercade processos históricos e ecológicos. Abiogeografia pode também ser referida como

mapas de Wallace mostraram em 1876 as seis

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fitogeografia ou zoogeografia, quando o objeto

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(Banarescu. op cit). A definição de um organismocomo aquático ou terrestre também não é muitofácil, já que larvas de vários grupos são aquáticase os adultos terrestres (ou aéreos), como no casode muitos insetos aquáticos, ou ainda vivem emambientes úmidos, como o folhiço de florestas,e são considerados semi-terrestres.

Uma grande parte destas linhagens demacroinvertebrados é limitada a ambientesaquáticos, pois a evolução destes gruposaconteceu em águas continentais e suasdispersões ocorreram via rotas de água doce. Deacordo com Banarescu (op cit), estes gruposapresentam um padrão de distribuiçãocontinental, similar às linhagens terrestres, e sãoincluídos dentro das linhagens chamadas deHolárticas, Gondwânicas, etc., estandorelacionados à distribuição passada doscontinentes. Já outras linhagens são provenientesde grupos marinhos, e suas distribuições estãorelacionadas às áreas de águas continentais ondeseus ancestrais adentraram; estes grupospossuem um padrão de distribuição chamadaperiférica. Por exemplo, a separação da Américado Sul do continente africano resultou noaparecimento do Oceano Atlântico, e váriosgrupos de linhagens marinhas deste oceanocolonizaram águas continentais de ambos oscontinentes, como foi o caso do gênero decrustáceos Atya.

Estes sucessivos movimentos das massasde terra, desde a separação da Pangea emLaurásia e Gondwana, e a deriva destas até aconfiguração atual dos continentes, foramresponsáveis por muitos padrões passados eatuais de distribuição das espécies, chamados depadrões de vicariância. Um dos primeirostrabalhos a provar a existência de eventosvicariantes foi feito por Brundin (1966.K. V. A.Handl.11: 1-472 + 30 plates), ao estudar relaçõesfilogenéticas de insetos dípteros quironomídeosdas subfamílias Podonominae, Aphroteniinae eDiamesinae. Brundin (op cit) investigou asrelações de parentesco e distribuição destesgrupos de quironomídeos em riachos frios demontanha em áreas temperadas da América doSul, África do Sul, Austrália e Nova Zelândia, eAntártida. Ao comprovar que existiam relações

regiões ou reinos biogeográficos que atualmenteainda são amplamente aceitos: RegiãoAfrotropical (ou Etiópica), Australiana, Neártica,Neotropical, Oriental e Paleártica. As regiõesNeártica e Paleártica juntas são freqüentementereferidas como Região Holártica, pois ambascompartilham a distribuição de muitos táxons. Nointerior dos grandes reinos, barreiras à dispersãocomo cadeias de montanhas, ou regiões demudanças ambientais abruptas como desertos,muitas vezes definem os limites entre associaçõesde espécies. Dessa forma, diversos autores vêmidentificando e delimitando áreas biogeográficascom base nas análises dos padrões de distribuiçãodos organismos. Morrone (2006.Annu. Rev.Entomol.51: 467-494) distingue sub-regiões,domínios, províncias biogeográficas e zonas detransição na América Latina, incluindo algumasda Região Neártica, com base em análisescladísticas da fauna de insetos aquáticos eterrestres. Ainda, vale mencionar que estasgrandes regiões biogeográficas nem semprerepresentam limites para a distribuição. Banarescu(1990.Zoogeography of Fresh Waters. Vol 1:General Distribution and Dispersal of FreshwaterAnimals) menciona que estas regiões não seencaixam bem para a fauna de água doce, poissistemas fluviais muitas vezes não representambarreiras para a fauna aquática.

Os macroinvertebrados de água doce, assimcomo os demais organismos aquáticos, podem serclassificados em dois grupos gerais, em relaçãoàs suas origens: grupos de origem marinha, ouorganismos aquáticos primários, e grupos deorigem terrestre, ou organismos aquáticossecundários. Exemplos de macroinvertebradosaquáticos primários são moluscos bivalvos ecrustáceos, e de macroinvertebrados aquáticossecundários moluscos gastrópodos, algunsoligoquetos, e insetos e ácaros aquáticos. Muitasvezes a delimitação entre organismos de águadoce de origem marinha e organismos marinhosé difícil. Algumas espécies não são nemgenuinamente marinhas nem originalmente deágua doce, vivendo exclusivamente em águassalobras, enquanto outras são eurialinas, ou seja,toleram uma ampla variação de salinidade,habitando águas salgadas, salobras e doces

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estreitas de parentesco entre estes táxons dequironomídeos e, desta forma, a existência derelações trans-antárticas, Brundin sugeriu queestes grupos tiveram uma origem austral-Gondwânica, corroborando com a hipótese de quea distribuição de muitos organismos relaciona-seà história geológica dos continentes.

As modificações climáticas durante e apósas glaciações provocaram as maiores migraçõesativas de formas límnicas: de um lado, pelamudança contínua dos sistemas lóticos e lênticosse formaram ou caíram barreiras para dispersõese, por outro lado, pela grande quantidade deformas relictas em determinadas regiões (Schäfer,op cit). A capacidade de dispersão por grandesdistâncias varia muito de grupo para grupo. Emum ambiente lótico, uma das formas de dispersãoque possibilita a colonização de novas áreas é aderiva ou “drift” passivo e ativo de muitosmacroinvertebrados, principalmente insetosaquáticos. Insetos aquáticos que possuem a formaadulta alada também podem se dispersarativamente ou ser transportados a grandesdistâncias pelo vento. Alguns moluscos emicrocrustáceos às vezes se dispersam na formade ovos, ou em formas de resistência, presos aoutros animais. Ainda, em ambientes lênticos adispersão também pode ocorrer através de canais,interligações naturais ou modificadas pelo homementre lagos e lagoas.

A habilidade de dispersão é apenas um demuitos fatores ecológicos que influenciam adistribuição. O sucesso de um organismo emcolonizar um determinado lugar vai depender demecanismos de escolha de hábitat e interaçõescom outros organismos, além de diversascaracterísticas ambientais como altitude,temperatura, disponibilidade de nutrientes e váriosoutros fatores físico-químicos.

Macroinvertebrados de ambientes lóticosque realizam deriva (“drift”) possuemmecanismos sensoriais que possibilitam a escolhade um novo hábitat, que geralmente possuicaracterísticas semelhantes às daquele de onde oindivíduo saiu. Assim sendo, muitosmacroinvertebrados aquáticos como insetos e

ou todo o seu ciclo de vida. A escolha por sítiosde postura também envolve mecanismoscomportamentais; em certas espécies de insetosda ordem Odonata, os machos adultos ocupamterritórios que determinam onde as fêmeas irãorealizar a postura de ovos.

A distribuição local de espécies pode serlimitada pela predação, parasitismo ecompetição. Estudos considerando o impacto dapredação em ambientes de água doce têm osdípteros quironomídeos como a principalcategoria de presa, e muitos destes trabalhosmostram que há uma diminuição da densidadede quironomídeos através de predação direta ouindireta por outros macroinvertebrados (outrosinsetos aquáticos predadores como plecópterose odonatas) ou vertebrados (peixes e aves).

O gradiente de altitude seria outro fatorque influenciaria a distribuição de organismos.Illies (1964.Verh. Int. Verein. theor. Angew.Limnol. 15: 1077-1083) sugeriu que haveria umarelação causal entre uma assumida concentraçãoalta de oxigênio na água em riachos de altitudee a distribuição de macroinvertebrados ao longode um gradiente altitudinal. O suprimentopotencial de oxigênio para macroinvertebradosaquáticos é influenciado por dois fatoresdependentes da temperatura: o coeficiente dedifusão do oxigênio na água, que aumenta como aumento da temperatura, e a viscosidadecinemática da água, que diminui com o aumentoda temperatura, reduzindo a espessura dasubcamada laminar envolvendo a superfície docorpo destes organismos e, assim, aumentado adifusão do oxigênio (Jacobsen et al.2003.Freshw. Biol. 48: 2025-2032).A produção, qualidade, entrada, transporte edisponibilidade da matéria orgânica emambientes aquáticos influenciam a composiçãoe função das comunidades demacroinvertebrados. O conceito do contínuofluvial ou rio contínuo (Vannote et al. 1980.Can.J. Fish. Aquat. Sci. 37: 130-137.) propõe quehaveria uma zonação longitudinal demacroinvertebrados em sistemas lóticos,influenciados pela a estrutura física do rio, ciclohidrológico e padrões de carreamento,

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crustáceos apresentam preferências por um tipode substrato, o hábitat onde eles vão passar parte transporte, utilização e estocagem da matéria

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orgânica ao longo do rio: nas cabeceiras haveriaum predomínio de táxons cortadores e coletoresda matéria orgânica, em trechos médios deraspadores e coletores, e em trechos inferiores decoletores da matéria orgânica mais finamenteparticulada, proveniente de trechos superiores dorio. No caso de ambientes lênticos como lagos elagoas, há uma diferença na distribuição de táxonsda zona litoral para a profundal, e dentro de cadazona, a composição da comunidade estárelacionada com condições do hábitat. Algunsgrupos de crustáceos e insetos têm sua distribuiçãorelacionada com a distribuição de macrófitas ealgas epifíticas associadas, enquanto que outrosestão relacionados à rugosidade do substrato(macroinvertebrados que constroem tubos ougalerias, macroinvertebrados que vivem emsedimentos mais grossos na zona litoral).

Inúmeros outros fatores ambientais, comopH, alcalinidade, salinidade, turbidez da água, vãoinfluenciar a composição e a distribuição atualdos macroinvertebrados em ambientes de águadoce. Um exemplo para a nossa região é acaracterização da Bacia Amazônica em três tiposde sistemas de água doce (Sioli. 1965.Amazoniana1(1): 74-83), de acordo com as condições físico-químicas e tipo de material sólido suspenso oudissolvido nestas águas: rios de coloraçãolevemente esverdeada, transparentes, semmaterial em suspensão, chamados de águas claras;rios de coloração parda, com muito material emsuspensão, chamados de águas brancas; e rios deágua transparente, de coloração marrom devido àpresença de substâncias húmicas, sem substânciassólidas em suspensão e chamados de águas pretas.Condições ecológicas tornam-se mais nítidas naregião central, onde predominam rios de águapreta, com um pH em torno de 4.5, sendo estaságuas ácidas e pobres em eletrólitos. A pequenaquantidade de sais nutritivos impossibilita umagrande produção primária, e macroinvertebradosfitófagos e detritívoros como larvas de mosquitosculicídeos e percevejos aquáticos como oscorixídeos são mais raros nestas águas(Fittkau.1971.II Simposio y Foro de BiologíaTropical Amazonica, p. 365-372). A distribuiçãodos organismos aquáticos está relacionada com a

relacionada também com a formação geológicae climatológica da região.

Angela M. Sanseverino

[email protected] Federal do Rio de Janeiro

Macroinvertebrados de Água Doce noBrasil: um Retrato do nossoConhecimento Atual

O Brasil está entre os países mais ricosem recursos hídricos do planeta, com trêsgrandes bacias hidrográficas e o maior aqüíferodo mundo. A diversidade de corpos d’água e dabiota acompanham a magnitude dessa riqueza.Por outro lado, temos um pequeno contingentede profissionais qualificados para fazer frente ànecessidade de produzir conhecimento emvelocidade compatível ao avanço da demandasobre os recursos hídricos, especialmente no quese refere ao seu aproveitamento de formasustentável e à conservação da biota.

Os estudos acerca da fauna em corposde água doce no Brasil não se desenvolveramequitativamente em seus diversoscompartimentos. O de ictiologia, por motivos atécerto ponto óbvios, foi um dos que mais sedesenvolveu e consolidou, com a diversificaçãode subáreas de estudo, formação de redes deinformação, bancos de dados e importantescoleções de referência. Junto a isso, houvegrande investimento na formação de recursoshumanos. Outro compartimento que sedesenvolveu foi o de zooplâncton. Auniformidade e a simplicidade dos métodos deamostragem e a associação com estudos decaracterização limnológica, provavelmenteconcorreram para isso. Outro fator decisivo foio direcionamento para estudos em ambientes dosistema lêntico, como açudes, reservatórios erepresas.

Somente nas últimas décadas os estudoscom macroinvertebrados de água doce vêm

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natureza dessas águas e, dessa maneira,

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ganhando visibilidade, especialmente por motivosrelacionados à conservação de recursos hídricos,em especial, do sistema lótico, onde o bentos éuma das biocenoses mais importantes. Contudo,apesar do esforço crescente empreendido porvárias instituições de pesquisa, ainda há umadefasagem significativa entre esse segmento e osanteriores. A nossa megadiversidade da fauna, opequeno conhecimento taxonômico, asdificuldades inerentes ao estudo das comunidadesbentônicas (incluindo heterogeneidade ambiental,a conseqüente distribuição desigual e o ciclo devida anfíbio de grande parte de seus componentes)e a necessidade de especialização cada vez maiornos diferentes grupos taxonômicos, são fatoresresponsáveis por essa defasagem.

Para obter um panorama dos estudos commacroinvertebrados de água doce no Brasil,fizemos um levantamento dos resumosapresentados nos últimos congressos brasileirosde Ecologia, Entomologia, Limnologia eZoologia, nos anos 2005 e 2006. Preferimosutilizar somente estudos apresentados emcongressos como base para nossa pesquisa porconsiderarmos que estes refletem melhor asdiversas atividades desenvolvidas no país,incluindo estudos acadêmicos, trabalhos técnicos,formação de recursos humanos e projetoseducacionais, e que os seus resultados nem sempresão expressos em publicações científicas.

Nos quatro congressos, a participação deestudos envolvendo macroinvertebrados de águadoce correspondeu a aproximadamente 8% decerca de 6.650 resumos apresentados. Comoesperado, a maior participação relativa,aproximadamente 18%, ocorreu no CongressoBrasileiro de Limnologia, enquanto que nos outroscongressos essa participação ficou em torno de6%. Os estudos referentes a corpos d’água dasregiões Sudeste e Sul representaram mais de 60%do total, o que reflete a maior concentração deinstituições de pesquisa, de financiamento e dedemanda por serem áreas com maioresconcentrações populacionais e impactoantropogênico. As demais regiões contribuíramcom pouco mais de 37% dos estudos, sendo oNordeste a região com o menor número de estudos

abordaram duas ou mais regiões.

FIG 1: Número de resumos relativos a macroinvertebrados de

água doce, por região, apresentado nos anos de 2005 e 2006

nos congressos brasileiros de Ecologia, Entomologia,

Limnologia e Zoologia.

Dentre os sistemas aquáticos, cerca de300 estudos foram desenvolvidos com fauna deambientes lóticos e cerca de 260, com fauna deambientes lênticos. Destes, mais de 20% foramdesenvolvidos em reservatórios ou represas emenos de 5% enfocavam fitotelmata. Essesresultados mostram um direcionamento deestudos para ambientes lênticos, levando-se emconta a proporção inversa entre os dois sistemasno país.

Uma análise preliminar indica que oestudo de macroinvertebrados de água doce vemse diversificando, com a utilização cada vezmaior desses organismos em diversas atividadesque perpassam pela pesquisa básica e suaaplicação com diferentes finalidades,respondendo a demandas atuais. Os resumosanalisados foram agrupados nas seguintes áreasde conhecimento: Biologia (bionomia,alimentação, fisiologia e reprodução), Ecologia(comunidades, populações, distribuição,comportamento, associações, conservação,controle, biomonitoramento, etc.), EducaçãoAmbiental, Genética (análise molecular,citogenética, genética de populações, etc.),Zoologia (taxonomia, filogenia, inventáriosfaunísticos, distribuição, biodiversidade,coleções zoológicas, etc.) e Métodos e Técnicas(Fig. 2). Geralmente, um mesmo resumoabrangeu mais de uma área ou subárea.

A maioria dos trabalhos considerados naárea Biologia estava relacionada ao cultivo deespécies de potencial importância econômica eao controle de espécies de importância médico-sanitária ou invasoras. Alguns estudos foram

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Sudeste Sul Centro-Oeste Norte Nordeste

realizados, menos de 9% (Fig. 1). Cerca de 6%

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desenvolvidos com relação à toxicidade de drogase à bioacumulação de poluentes. A maior partedos estudos agrupados na área Ecologia referia-se a abundância, riqueza e distribuição espacial etemporal da comunidade macrobentônica,comparando áreas com diferentes graus deimpacto antropogênico e visandobiomonitoramento. Menos de dez resumos foramrelacionados a estudos básicos, descritivos ouexperimentais, sobre teoria ecológica ou oentendimento e a descoberta de processosecológicos.

FIG 2: Número de resumos relativos a macroinvertebrados de

água doce, por área de conhecimento, apresentado nos anos de

2005 e 2006 nos congressos brasileiros de Ecologia,

Entomologia, Limnologia e Zoologia.

Também, na área Zoologia, os estudosvisaram prioritariamente levantamentosfaunísticos para caracterizar preliminarmentecorpos d’água ou bacias hidrográficas. Muitosdesses estudos apresentaram resoluçãotaxonômica limitada à categoria de família ealguns à de gênero, uma limitação inerente à faltade conhecimento taxonômico e à abordagemempregada nos estudos. Cerca de 90% da faunade macroinvertebrados de água doce é constituídapor insetos, dos quais a maioria das formasaquáticas é representada por imaturos, cujaidentificação em nível específico é dependenteda associação com a forma adulta, não aquática ede ocorrência concentrada em determinadosperíodos do ano. Infelizmente, reforçando essadeficiência, o número de estudos taxonômicosenvolvendo listagens, distribuição geográfica,descrições, filogenia e chaves de identificaçãorepresentou cerca de 10%.

O panorama que temos é de que os estudosdesenvolvidos relacionam-se claramente ademandas atuais como saúde e meio ambiente.

Cabe ressaltar a importância dessas demandasno direcionamento, e talvez, no desenvolvimentode estudos com macroinvertebrados. É nítido quehá grande influência dos grandesempreendimentos e da legislação ambiental emvigor. Cerca de 100 estudos apresentados estãoexplicitamente relacionados a atividades debiomonitoramento, cerca de 170 referem-se a“levantamento” e aproximadamente 90relacionam-se à área de saúde. Apenasrecentemente, estudos de biomonitoramento e deimpacto ambiental ou de zoneamentos,obrigatórios, têm incluído macroinvertebradosno conjunto de grupos abordados, desde osprimeiros levantamentos para caracterização dabiota. Nos países mais desenvolvidos, comtradição em pesquisa em macroinvertebrados deágua doce, vários sistemas de acompanhamentojá foram elaborados, testados e aprimorados.Esse avanço foi proporcionado pela existênciade uma boa base de conhecimento taxonômico ebiogeográfico da fauna de água doce.

Ainda estamos muito aquém donecessário quanto ao conhecimento de nossabiodiversidade. Programas incentivandopesquisa básica visando descrever a fauna demacroinvertebrados de água doce, sua biologiae interações são fundamentais. A formação derecursos humanos em taxonomia, a realizaçãode inventários faunísticos, listas taxonômicas echaves de identificação são as mais importantesbarreiras a serem transpostas.

Jorge Luiz Nessimian

[email protected]

Nelson Ferreira Júnior

[email protected] Federal do Rio de Janeiro

Métodos e Equipamentos

MÉTODOS MOLECULARES PARA ANÁLISE DECOMUNIDADES MICROBIANAS EMAMBIENTES AQUÁTICOS: II. PCR

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Ecologia Zoologia Biologia Genética Métodos eTécnicas

Educação

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DESNATURAÇÃO

HIBRIDIZAÇÃ O

INICIADORES

EXTEN SÃ O

PRODUTO DA REAÇÃ O

CICLO

O desenvolvimento das técnicasmoleculares tornou possível o estudo dadiversidade de comunidades microbianas atravésde análise e comparação de seqüências de genesque codificam para o rRNA (rDNA) ou do própriorRNA, possibilitando, assim, o estudo da parceladas comunidades representada pelosmicroorganismos não cultiváveis. O crescenteaumento do número de seqüências depositadas nobanco de dados via internet(www.ncbi.nlm.nih.gov/entrez/) possibilitou acomparação de seqüências por todo o mundo, logoa análise de diversidade microbiana alcançou altosníveis de resolução (grupos, espécies e estirpes).Outro importante avanço foi o estudo de funçõese metabolismos específicos, por exemplo, aanálise de estrutura de comunidade de nitrificantesem um determinado ambiente. Todos os avançoscitados anteriormente só foram possíveis de seremrealizados com o advento da técnica de PCR(“Polymerase chain reaction”).

Essa técnica consiste na amplificação donúmero de uma determinada seqüência especifica,definida por iniciadores também específicos, apartir do DNA total, seja de um determinadoorganismo, seja de uma amostra ambiental. Omecanismo de funcionamento da PCR é baseadoem dois componentes principais, os iniciadores,também chamados de “primers”, que vão se ligarao genoma por homologia de seqüência definindoqual região do mesmo que deverá ser copiada, e aenzima DNA polimerase que é responsável pelarealização da reação adicionando osdesoxiribonucleotídeos a nova fita a sersintetizada. E essa atividade enzimática se tornouresponsável pelo próprio nome da técnica, reaçãoda polimerase em cadeia (ou “Polymerase ChainReaction”) – PCR.

Existem outros componentes necessáriospara que a reação aconteça, entre eles estão:tampão, cloreto de magnésio e osdesoxiribonucleotídeos (dNTPs: dATP, dCTP,dGTP e dTTP). Em algumas reações de PCR sãoutilizados alguns aditivos como, formamida,glicerol e albumina de soro bovino (BSA). Todoseles são utilizados para exercer uma funçãoespecífica na reação. O tampão estabiliza o pHda reação no pH ótimo da enzima, já o cloreto de

magnésio é utilizado como cofator na atividadeda polimerase, participando do sitio ativo destae facilitando o pareamento das fitas de DNA.Os quatro desoxiribonucleotídeos (adenina,timina, guanina e citosina) são usados pelaenzima na formação das novas fitas de DNA. OBSA aumenta a viscosidade da solução ondeocorre a reação, favorecendo o funcionamentoda enzima e a formamida é um desnaturante queaumenta a especificidade da reação.

Após a solução final da reação ter sidofeita, distribuem-se alíquotas em microtubosonde se adiciona o DNA extraído. A partir destemomento todos os componentes da reação estãoreunidos e torna-se necessário submetê-los a umasérie ciclos de temperaturas que induzem oprocesso de amplificação dos fragmentosespecíficos de DNA (Figura 1).

FIG 1: Dinâmica da PCR. Seus ciclos de tempos e temperatura.

No primeiro momento necessita-se deuma desnaturação dos genomas, que são grandesfitas duplas e por isso usa-se uma temperaturaalta (entre 90 e 96°C) por um tempo mais longo(de 2 à 4min). Depois se aplicam diversos ciclosiguais de, normalmente, três etapascaracterizadas por diferentes temperaturasvisando à amplificação exponencial do DNAalvo. Na primeira etapa, a desnaturação consisteem aplicar-se uma temperatura entre 90 e 96°C.Em seguida vem a etapa de anelamento onde

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baixa-se a temperatura para cerca de 40 e 70°C(dependendo dos iniciadores utilizados), que é afase de ligação do iniciador a fita a ser copiada, eextensão onde se utiliza a temperatura ótima dereação da enzima, normalmente 72°C . Essaultima é a fase de síntese da nova fita onde oDNA está efetivamente sendo amplificado. Apóso termino dos ciclos, inicia-se um tempo maisprolongado de temperatura de extensão final(entorno de 10min) e depois manutenção dostubos à 4°C até a estocagem, que deve serrealizada em freezer (aproximadamente -20°C).Esses programas são realizados com um aparelhochamado de termociclador, sendo cada um delesespecífico para cada par de iniciadores. Segueesquema mostrando a dinâmica da reação (Figura2).

FIG2.: Utilização da PCR com outras técnicas moleculares.

Mostrando a sua importância no estudo de ecologia molecular.

Para análises de diversidade são muitoutilizados iniciadores ditos “universais”, issoporque são homólogos a regiões do genomacomuns a todo um determinado Domíniomicrobiano, assim como os iniciadores paraseqüências de genes rRNA (rDNA). Essas regiõessão definidas por uma série de critérios paradesenho de iniciadores, porém as principaiscaracterísticas desejadas são o fato de seremconservadas o suficiente para abrangerem a maiordiversidade possível e que amplifiquem umaregião variável o bastante para diferenciá-lasentre si. O gene mais utilizado para análises deperfis de comunidade bacteriana é o rrs quecodifica o rRNA 16S. Sua utilização é muito

importante pois esse gene representa toda acomunidade bacteriana de uma amostra,esclarecendo, assim, muitas questões antes nãorespondidas através de técnicas-padrão.

O protocolo da reação em cadeia dapolimerase com iniciadores para o gene rrs ésimples de ser realizado. Para formar a soluçãofinal da reação rotineiramente utilizada em nossolaboratório, também chamada de “mix”, vão sernecessários 34,9µL de água Milli-Q estéril, 5µLde tampão 10X (não contendo MgCl2), que éespecífico para cada enzima e é comercializadojunto com a mesma, 5µL de MgCl2(25mM)também comercializado junto à enzima, 1µL dedNTPs (10mM), 1µL do iniciador “Forward”(10mM), 1µL do iniciador “Reverse” (10mM),0,5µL de BSA 1%, 0,5µL de formamida 100%,0,5µL da enzima Taq DNA polimerase e 1µL deamostra em cada tubo para uma reação final de50µL. O programa de ciclos aplicados a essesiniciadores consiste em uma desnaturação inicialde 94°C por 4min. Logo após aplica-se uma sériede 35 ciclos de desnaturação (94°C por 1min),anelamento (55°C por 1min) e extensão (72°Cpor 2min), sendo aplicado posteriormente umaetapa de extensão final de 72°C por 10min eestabilização da temperatura à 4°C até que asamostras sejam estocadas em freezer (-20°C).

Assim como este protocolo, todos os outrossão de simples execução, porém existem algunsaspectos que merecem uma maior atenção para aobtenção de um produto final de qualidade. Aqualidade dos reagentes utilizados deve sersuperior aos utilizados para técnicas-padrão,comercialmente utiliza-se o termo “moleculargrade” para produtos com grau de purezasuficiente para utilização em técnicas de biologiamolecular. A síntese dos iniciadores também éum aspecto importante, pois estes devem ser bempurificados após serem sintetizados. Todos osmateriais que entraram em contato com asamostras devem ser livres de quaisquer impureza,incluindo DNases e RNases, sendopreferencialmente material novo e tratado paraser livre de DNases e RNases (comercialmenteditos: “DNases e RNases free”).

A utilização desta técnica em biologiamolecular tornou-se uma prática básica e muitasvezes essencial para realização de outras técnicas,sendo que hoje quase todas as técnicas mais

Cultivo d e isola d os

Am ostra

PCR

Perfis por tamanho (T)-RFLP, ITS, ARDRA

Perfis por d esnaturação DGGE/TGGE Clonagem

Seqüenciamento

Extração

FISH In situ PCR

Microarray Hibridização

Ingela Dahllöf, 2002. Environmental Biotechnology

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Boletim da Sociedade Brasileira de Limnologia - nº 35 (2)

Tabela 1. Exemplos de iniciadores utilizados para estudos em ecologia molecular microbiana.

avançadas dependem da PCR. A figura 2 mostraa relação desta com outras metodologias usadaspara estudo em ecologia molecular microbiana.A evolução dessa técnica gerou odesenvolvimento da PCR em tempo real (“Real-time PCR”), que é capaz de quantificarseqüências homólogas aos iniciadores. Talmétodo tornou possível a elucidação dequestionamentos relacionados ao número deindivíduos com características específicasdetectadas por homologia dos iniciadores. O queantes era apenas detectável passou a ser passívelde quantificação.

Uma técnica muito utilizada associada àPCR para estudo de ecologia molecular é aeletroforese em gel com gradiente desnaturante(DGGE-”Desnaturing Gradient GelEletrophoresis”), que é uma técnica que permitediferenciar as seqüências amplificadas pela PCRpor diferenças nas quantidades de guanina,citosina, timina e adenina. Isso possibilitou oestudo de perfis de estrutura de comunidademicrobiana, além de se diferenciar por possibilitaro corte de bandas e identificação de indivíduoscontidos nelas por sequenciamento. Na Tabela 1estão citados exemplos de iniciadores utilizadospara diferentes fins, tanto para estudos de gruposmicrobianos, quanto para genes de funçõesespecíficas.

Natália Oliveira [email protected]

Rodrigo Govêa [email protected]

Alexandre Soares [email protected]

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Eventos CientíficosASLO Summer meeting

Foi realizado, entre 4 e 9 de junho de2006, o Congresso de Verão (Summer Meeting)da Sociedade Americana de Limnologia eOceanografia (ASLO), em Victoria, no Canadá.Como a ASLO inclui limnólogos e oceanógrafos,nem sempre os seus encontros científicos sãodirecionados para a Limnologia.Tradicionalmente, o Congresso de Verão incluiparticipantes dos dois campos de pesquisa; existeum encontro científico voltado para aOceanografia (o Ocean Sciences Meeting) e umvoltado para a Limnologia (Aquatic SciencesMeeting).

No entanto, desde a primeira vez em queo Congresso de Verão foi realizado fora dosEstados Unidos (2000 – Copenhagen,Dinamarca), a participação de pesquisadoresestrangeiros vem crescendo a cada ano. Destaforma, o Congresso de Verão da ASLO assumeum importante papel para a LimnologiaInternacional; ele está ao lado do Congresso daSIL como o mais importante encontro científicoda Limnologia Internacional. A título decomparação, o último Congresso da SIL (Lahti,Finlândia, 2004) teve 937 trabalhos apresentados;

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o Congresso de Verão em Victoria teve 1047trabalhos apresentados.

Eu tive a oportunidade de participar destarecente edição do Congresso, fornecida peloProjeto “Balanço de Carbono em Reservatóriosde Furnas Centrais Elétricas S.A.”, assim comooutros três pesquisadores brasileiros: Dr. FábioRoland (UFJF), Dr. Donato Abe (IIEGA) e Dr.Fernando Ramos (INPE). Foram submetidos 8trabalhos referentes a este Projeto, que está sendorealizado desde outubro de 2003, com o objetivode medir e modelar os fluxos de carbono emgrandes reservatórios hidroelétricos. O nossoProjeto foi a principal atração de uma sessãoaonde foram apresentados trabalhos sobre aciclagem de carbono em lagos e reservatórios; nósapresentamos dados referentes aos primeiros doisanos do projeto, englobando quatro reservatóriose três campanhas quadrimestrais em cadareservatório. O nosso trabalho foi muito bemrecebido pela comunidade internacional.

Além da nossa participação comopalestrantes, tivemos a satisfação de encontraroutros pesquisadores brasileiros em Victoria,incluindo alunos de doutorado que estão fazendoum doutorado-sanduíche e pesquisadoresbrasileiros que fazem parte de centros de pesquisano exterior. A participação brasileira no Congressoda ASLO não cresceu em comparação com aúltima edição do Congresso de Verão; os 16trabalhos que incluíram autores brasileirosrepresentam uma queda em relação à ediçãoanterior (Santiago de Compostela, Espanha,2005), aonde foram apresentados 20 trabalhosincluindo autores brasileiros. Entretanto, euacredito que boa parte da explicação para estaredução se deve à maior distância do local doevento em relação ao Brasil. Infelizmente, eu nãoconsegui levantar dados sobre o último Congressoda SIL (Lahti, Finlândia, 2005) para uma outracomparação.

De qualquer maneira, o Congresso deVerão da ASLO continua sendo uma das principaisportas de entrada na Limnologia Internacionalpara pesquisadores brasileiros, e um modelo a serseguido pela SBL em vários aspectos. É evidenteque as diferenças entre a ASLO e a SBL sãoconsideráveis, em número de membros e,principalmente, em arrecadação; no entanto, uma

Congressos não é completamente desfavorávelpara nós. Uma particularidade que chamou aatenção do então presidente da ASLO, Dr.Jonathan Cole, quando ele participou do IXCongresso Brasileiro de Limnologia (Juiz deFora, 2003), foi a participação ativa e entusiásticade estudantes na organização e nas sessões doCongresso. Nós também temos uma grandediversidade de ambientes naturais e modificados(como os grandes reservatórios hidroelétricos),que podem ajudar bastante em testes de hipótesesgeradas em ambientes temperados; não éincomum, como sabemos, que uma hipótesesatisfatória em ambientes temperados e depequena magnitude (lagos e rios) se revelecompletamente inadequada quando transpostapara os nossos ambientes tropicais. Em suma, onosso potencial é maior do que as nossaslimitações, e devemos nos esforçar para divulgaro excelente trabalho em Limnologia sendorealizado no Brasil, tanto através de participaçõesem Congressos no exterior, como o Congressode Verão da ASLO, como através de parceriascom pesquisadores estrangeiros, que resultem emum enriquecimento de nossa ciência, não apenasem publicações, mas também e principalmentena formação de recursos humanos e naparticipação em nosso próprio Congresso deLimnologia.

Paulo [email protected]

Furnas

comparação entre as duas entidades e seus

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