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Numa carta que Mário de Carvalho escreveu aos alunos de uma escola secundária de Vila Nova de Gaia, que o questionaram precisamente sobre a génese da obra, disse Mário de Carvalho:

“O que me levou a escrever a Inaudita…e por que razão misturei épocas distintas: foi a consciência de que Portugal é um país muito antigo, muito miscigenado, percorrido por muitas culturas e civilizações, de modo que cada um de nós é mais do que ele próprio, porque tem atrás de si uma grande espessura de História.

Nós somos mais do que nós, nós somos uma nação muito antiga. E, antes de sermos nação, isto tinha um caldeamento muito grande de povos e civilizações. Por detrás de nós, há toda uma estrutura histórica. Quando eu escrevo A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho, quando os mouros aparecem aí num engarrafamento em Lisboa, é isso que eu quero dizer: atenção, nós somos uns e somos outros. Ou seja, temos cá uma civilização árabe também.”

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Constatamos, assim, que a razão apresentada por Mário de Carvalho é, fundamentalmente, histórico-cultural, aliados, evidentemente, a uma incontível ânsia de liberdade.

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Análise morfológica:

“A inaudita Guerra da Avenida Gago CoutinhoGago Coutinho”

Determinante nome comum abstracto,artigo definido, nome comum género feminino,género feminino, abstracto, contracção número singular,número singular género feminino, da grau normal número singular, preposição nome grau normal “de” com o próprio determinante concreto, adjectivo, artigo definido género masculino, género feminino, “a” número singular, número singular, “de”+”a”= da grau normal grau normal

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Informações fornecidas pelo título:

“A inaudita Guerra da Avenida Gago CoutinhoGago Coutinho” Geógrafo, marinheiro, principal local matemático e inventor. acontecimento onde Almirante português,Qualificação do do ocorre o pioneiro da aviaçãoSubstantivo conto (acção) acontecimento (Lisboa 1869-In- + audita (espaço físico) - 1959). Geó- prefixo Palavra grafo de campo, ten-de primitiva tou adaptar à aeronavegaçãonegação os processos e instrumentos da navega- ção marítima, tendo criado, em 1919, o famoso sextante que ostenta o seu nome.

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Gago CoutinhoMaria José Nogueira 2008/09

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Simões Muller chamou-o “O Grande Almirante das Estrelas do Sul”, por ter empreendido um feito “inaudito”, a maior façanha de então: a primeira travessia aérea do Atlântico Sul (entre Lisboa e o Rio de Janeiro), em 1922, com Sacadura Cabral, executada com grande rigor científico.

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Inaudita = in- + audita

In- =prefixo de negação de origem latina.

Audita = particípio passado, com função adjectival, do verbo latino audire que significa “ouvir”.

Inaudita = palavra derivada por prefixação.

“não ouvida, nunca ouvida”incrívelespantosainsólitode que não há exemplo ou memóriaMaria José Nogueira 2008/09

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O título fornece informações sobre o narrador:

- o seu gosto pela História;

- a sua ligação à cidade de Lisboa, escolhida como cenário desta guerra inaudita;

- o seu conhecimento sobre a cidade;

- o prazer que tem em provocar abertamente o leitor.

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O Conto

•O narrador explica e justifica a génese da história que se propõe contar.•O narrador recorre à Antiguidade Clássica para certificar a justificação que dá (Homero, Clio).•Quandoque bonus dormitat Homerus (o grande Homero às vezes dormitava), até os grandes sábios cometem deslizes. Esta fragilidade não é específica apenas do mundo humano, ela é alargada ao mundo mítico/divino: os deuses (Clio) também são dados a fraquezas. Note-se já aqui a evidente tendência temática do cruzamento de mundos diferentes: o humano e o divino.

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• A palavra dos poetas antigos não gera dúvida nem contestação “…garante Horácio.”

• Clio, a musa da História, é a chave para o desenrolar dos fios da meada narrativa.

• É no âmbito do fantástico, do insólito, da duplicidade, da alteridade e da manipulação livre do tempo e da história, que se insere o conto A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho.

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Clio é uma das nove musas, e, junto com as irmãs, habita monte Hélicon. Filhas de Zeus e Mnemósine, a memória. As musas reúnem-se, sob a assistência de Apolo, junto à fonte Hipocrene, presidindo às artes e às ciências, com o dom de inspirar os governantes e restabelecer a paz entre os homens.Clio é a musa da história e da criatividade, aquela que divulga e celebra as realizações. Preside a eloquência, sendo a fiadora das relações políticas entre homens e nações. É representada como uma jovem coroada de louros, trazendo na mão direita uma trombeta e, na esquerda, um livro intitulado "Thucydide“ . Outras representações apresentam--na segurando um rolo de pergaminho e uma pena. Clio é considerada a inventora da guitarra. Nalgumas de suas estátuas traz esse instrumento numa das mãos e, na outra, um plectro (palheta).

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ClioDa união de Zeus e Mnemósine – a deusa da memória –, nasceram as nove musas, personificando as artes e ciências. Clio (ou Arauto) é a musa grega da História. Representada como uma jovem com uma coroa de louros e um pergaminho nas mãos, é frequentemente acompanhada por um baú de livros nas representações iconográficas. Metaforicamente, Clio simboliza que o conhecimento é fruto da leitura e do estudo e, nas lendas gregas, a musa é referida como aquela que legou o alfabeto aos homens. " Clio é a musa maior, assim como os livros são a maior invenção da humanidade, e o conhecimento, a maior dádiva dos Deuses".

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Clio

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Acção do conto

3.Génese da acção – Clio adormeceu e enleou os fios da trama da História, misturando as datas de 4 de Junho de 1148 e 29 de Setembro de 1984.

6.Núcleo da narrativa – situa-se num confronto (guerra) entre duas hostes que pertencem a dois tempos diferentes.

9.A acção é encadeada, as sequências narrativas sucedem-se numa relação de causa/efeito.

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• 1º Momento – Confronto de dois tempos no mesmo espaço:. Os automobilistas apanham um grande susto e saem dos carros.. Os árabes assustam-se, não percebendo o que se estava a passar.

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• 2º Momento – Intervenção das forças militarizadas:

. Incidente que provoca o início da guerra – Manuel da Silva Lopes atirou uma pedra que foi bater no broquel de Mamude Beshewer.

. Rendição – trapo branco – improviso à portuguesa.

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• 3º Momento – Resolução do problema:. Clio desperta e devolve todos ao seu tempo histórico, borrifando-os, em seguida, com água do rio Letes, o rio do esquecimento.Assim, do mesmo modo inexplicável como haviam surgido os árabes na Avenida Gago Coutinho na manhã de 29 de Setembro de 1984, assim desapareceram misteriosamente. E não podendo Clio apagar totalmente os vestígios dos acontecimentos decorridos, pôde, pelo menos, toldar a memória dos homens com borrifos de água do rio Letes.

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Consequências:

. Ibn-el-Muftar desistiu de atacar Lixbuna, por considerar todas aquelas aparições de mau agoiro;

. Os policiais e militares do séc. XX viram-se obrigados a explicar, em processo marcial o que se encontravam a fazer naquelas zonas à frente de destacamentos armados, ensarilhando o trânsito e gerando a confusão e o pânico.

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1. Supremacia da força árabe:. Os árabes estão assustados, mas dignos, procurando cumprir a sua função de atacantes, ao contrário do corpo policial lisboeta, que bate em retirada e se refugia na cervejaria Munique.

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Esquema síntese:

1º momento Clio adormece…

mistura os fios do tempo

enlaça 2 épocas diferentes

4/6/1148 29/9/1984 1 espaço

Lisboa: Av. Gago Coutinho

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Lisboa: Av. Gago Coutinho

Acção

Encontro de 2 grupos antagónicos

Exército árabe automobilistasde Ibn-el-Muftar Polícia de Intervenção Tropa do Ralis e da Escola Prática de Administração

CONFRONTO 2 épocas 1148 – Lisboa do séc.XII 2 espaços 1984 – Lisboa do séc.XX

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2º momento Clio acorda…

o engano é desfeito

Consequências

O exército árabe volta à A Polícia de Intervençãosua época, aproveitando fica sem objectivo deo regresso “com grande combate; não recorda vantagem de troféus e uma justificação aceitá-espólios”. para dar aos seus superi- ores. Clio é castigada: a ambrósia é-lhe interdita durante 400 anos!

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Tempo

Mistura (amalgama) de dois tempos diferentes – 4 de Junho de 1148 e 29 de Setembro de 1984.

Tempo cronológico/Tempo histórico

Manipulação livre do tempo da história.

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Espaço

Avenida Gago Coutinho, em Lisboa.A escolha deste espaço cujo nome recorda e

perpetua um feito igualmente inaudito (a travessia aérea do atlântico sul com adaptação à aeronavegação dos processos e instrumentos da navegação marítima) foi intencional.

Uma guerra inaudita só poderia acontecer num palco cujo nome perpetua um acontecimento que na época foi considerado, também, inaudito.

Trata-se, então, de dois tempos históricos diferentes, mas de um só espaço. Também aqui sobressai o insólito, deixando-nos na ânsia e na expectativa de desvendar tão estranho mistério.

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Personagens

3.colectivas/individuais: século XII /século XX. Caracterização das personagens – directa (é feita directamente pelo narrador ou pelas personagens) e indirecta (as características são deduzidas através de atitudes e comportamentos). Descrição das personagens colectivas e individuais – descrição física e psicológica: - personagens colectivas: dois grupos pertencentes, cada um deles, a épocas históricas distintas. E é um facto que poucas são as personagens que ganham algum relevo, destacando-se e individualizando-se dos seus grupos.

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- personagens individuais com algum protagonismo, pertencentes ao séc. XX: o agente da PSP, Manuel Reis Tobias; Manuel da Silva Lopes, condutor de camiões distribuidores de grades de cerveja; comissário Nunes; e o capitão Aurélio Soares.

- personagens individuais com protagonismo do séc. XII: Ibn-el-Muftar e Ali-Ben-Yussuf, seu lugar-tenente. Todas as outras personagens, que formam a “multidão”

que se vai apinhando na Avenida Gago Coutinho, não passam de figurantes, cuja única função é conferir alguma verosimilhança a uma história particularmente inverosímil.

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2. As personagens apresentadas apontam, pela indumentária e pelos adereços de guerra, para dois grupos de personagens distintas e espaçadas no tempo, embora presentes no mesmo espaço.

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Narrador

3.Quanto à presença é heterodiegético, a sua focalização/ciência é omnisciente e a posição é subjectiva. O leitor recebe o conto através do olhar do narrador, que é uma entidade omnisciente (sabe tudo) e que controla totalmente a narração. Esta visão omnisciente confere-lhe uma posição de superioridade, que lhe acentua o seu distanciamento irónico e a sua veia humorística. 5.O narrador evidencia conhecimento acerca de um período da História de Portugal: a conquista de Lisboa aos Mouros. Evidencia também conhecimentos de vários campos semânticos e conhecimentos da língua.

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1. O narrador identifica-se, claramente, como contemporâneo de 1984 e essa identificação permite-lhe um olhar próximo, mas repleto de humor, de ironia, de espírito crítico sobre a cidade e os seus costumes (engarrafamentos…).

2. O narrador apresenta, a partir da narração, a sua perspectiva de História: repetição cinzenta dos acontecimentos – os homens caem sempre nos mesmos erros.

3. O narrador transmite que o texto é uma tapeçaria que vai sendo tecida ao longo do tempo. Cada texto acrescenta um fio à história. O tempo é o grande escultor da narrativa.

4. Transmite os pontos de vista e as impressões das personagens dos dois tempos diferentes.Maria José Nogueira 2008/09

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1. Transmite os pontos de vista e as impressões das personagens dos dois tempos diferentes.

2. Ridiculariza as forças policiais, apresentando a sua incapacidade para defender a população.

3. Duas visões:- negativa – das forças policiais lisboetas;

- positiva – das tropas árabes.

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A linguagem e o estilo

3.O tecido verbal do conto cruza o registo familiar com o registo cuidado.4.Recursos expressivos: sinestesia, ironia, adjectivação, comparação, metáfora, enumeração, onomatopeias, hipérbole.5.Expressividade dos verbos e dos advérbios de modo.6.Classes de palavras: nomes, adjectivos, advérbios, determinantes, pronomes, preposições, conjunções, verbos.7. Sinonímia, antonímia, hiperonímia, hiponímia.8. Linguagem expressiva, com recurso a sensações auditivas e visuais e a todo um conjunto de termos

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e expressões lexicais que, para além de nos permitir imaginar, quase visualizar a situação, contribui para dar cor épocal aos tempos cronológicos referidos, bem como aos seus contendores, evidenciando distintamente as suas diferenças.

“Salam Aleikum” é uma expressão árabe que se pode traduzir por “Que a paz esteja contigo”. Foi desta expressão árabe que adveio a palavra portuguesa “salamaleque” que é um cumprimento de cortesia.

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