Alegações Finais na forma de memoriais · JOSÉ ROBERTO BATOCHIO ADVOGADOS ASSOCIADOS 3...

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JOSÉ ROBERTO BATOCHIO ADVOGADOS ASSOCIADOS EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 13ª VARA FEDERAL CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE CURITIBA/PR “Eu sei como é que eu vou passar pra história. Eu não sei como eles vão passar. Não sei se eles vão passar pra história como juízes ou como algozes. Não sei. O herói não é o cara que enforcou Tiradentes. Foi o enforcado que virou herói”. Luiz Inácio Lula da Silva Ação Penal nº 5021365-32.2017.4.04.7000/PR LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, já qualificado nos autos da ação penal em epígrafe, cujos trâmites se dão por esse douto Juízo, vem, por seus advogados infra-assinados, com o devido respeito, à presença de Vossa Excelência, para apresentar suas inclusas Alegações Finais na forma de memoriais

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JOS ROBERTO BATOCHIO

ADVOGADOS ASSOCIADOS

EXCELENTSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 13

VARA FEDERAL CRIMINAL DA SEO JUDICIRIA DE

CURITIBA/PR

Eu sei como que eu vou passar pra histria. Eu no sei como eles vo passar. No sei se eles vo passar pra histria como juzes ou como algozes. No sei. O heri no o cara que enforcou Tiradentes. Foi o enforcado que virou heri. Luiz Incio Lula da Silva

Ao Penal n 5021365-32.2017.4.04.7000/PR

LUIZ INCIO LULA DA SILVA, j qualificado nos autos da

ao penal em epgrafe, cujos trmites se do por esse douto Juzo, vem, por

seus advogados infra-assinados, com o devido respeito, presena de Vossa

Excelncia, para apresentar suas inclusas

Alegaes Finais

na forma de memoriais

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o que faz com supedneo no artigo 403, 3 do Cdigo de Processo Penal e

ancorado nos fundamentos fticos e jurdicos a seguir articulados.

Antes de mais nada, porm, mister se faz consignar, sempre

e sempre, que o Defendente no reconhece a competncia desta 13 Vara

Federal de Curitiba/PR para julgar o presente feito, eis que, conforme

fundamentadamente exposto na exceo de incompetncia 5036131-

90.2017.4.04.7000 e amplamente demonstrado na instruo processual

inclusive pelo que se contm na verso dos prprios delatores inexiste

qualquer elo ou ligao entre as reformas do stio de Atibaia, supostamente

realizadas em benefcio do Defendente, e os supostos desvios ocorridos em

contratos celebrados pela Petrobras.

Imprescindvel salientar, tambm, que o Defendente no

reconhece a validade ou higidez dos atos praticados, na presente persecuo,

pelo Juiz suspeito Srgio Fernando Moro (agora ex-magistrado), pois,

consoante exaustivamente demonstrado nas excees de suspeio n 5036130-

08.2017.4.04.7000, 5021192-71.2018.4.04.7000 e no habeas corpus n

164.493/STF, referido magistrado no se revestia como jamais se revestiu

da necessria imparcialidade, impessoalidade e independncia para a cognio

e isento julgamento do feito.

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Registre-se, ainda, desde logo, que o Defendente no e jamais

foi proprietrio do stio de Atibaia. Essa constatao, que emerge com nitidez

da prova coligida durante a instruo, o que basta para rechaar a esdrxula

tese acusatria de que o Defendente teria sido beneficiado por reformas

realizadas naquele imvel em contrapartida a afirmadas atuaes em favor de

contratos firmados pelas empresas OAS e Odebrecht com a Petrobras.

Mas a defesa tcnica ir nestas alegaes finais enfrentar todos

os aspectos atinentes a este feito e ao cenrio de patente lawfare imposto ao

Defendente, como se passa a expor a seguir.

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Ementa

1. MPF da Lava Jato escolheu este Juzo com ntida posio pr-estabelecida para a condenao do Defendente como meio de lawfare1 mediante a mera afirmao, desacompanhada de qualquer fiapo de prova, de que o ex-Presidente teria sido beneficiado por reformas em Stio com recursos provenientes de contratos especficos firmados pela Petrobras;

2. Prtica de atos por este Juzo, antes e aps o oferecimento da denncia, que indicam a impossibilidade de o Defendente obter julgamento justo, imparcial e independente; magistrado que presidiu a fase de investigao atualmente ministro do governo do Presidente eleito a partir de sufrgio que impediu a participao do Defendente at ento lder disparado em todas as pesquisas de opinio a partir de atos concatenados praticados ou com origem em aes praticadas pelo mesmo juiz; Governo Federal sob a conduo de Presidente da Repblica que anunciou que iria fuzilar petralhada2 e que o Defendente deve apodrecer na cadeia3 e que seus aliados tm a opo de deixar o pas ou cadeia4: reforo do lawfare e da ausncia de imparcialidade do julgador que toda a fase de instruo e que atualmente ocupa um dos principais cargos do Governo Federal de oposio ao Defendente;

3. Cenrio de parcialidade e de violao ao devido processo legal que se manteve, no obstante a substituio da presidncia do feito. A conduo do interrogatrio do Defendente, de forma opressiva, autoritria e inquisitria, comprovou que o ex-presidente Lula segue sendo visto

1 O lawfare consiste no abuso e mau uso das leis e dos procedimentos jurdicos para fins de perseguio poltica. Conferir: https://www.conjur.com.br/2018-dez-17/opiniao-lawfare-militar-politico-comercial-geopolitico (acesso em 02.01.2019). 2 https://oglobo.globo.com/brasil/campanha-confirma-video-em-que-bolsonaro-fala-em-fuzilar-petralhada-do-acre-foi-brincadeira-23033857 (acesso em 02.01.2019). 3 https://www.valor.com.br/politica/5939477/bolsonaro-afirma-que-lula-e-haddad-apodrecerao-na-cadeia (acesso em 02.01.2019). 4https://www.poder360.com.br/eleicoes/bolsonaro-diz-que-vermelhos-terao-duas-opcoes-deixar-o-pais-ou-cadeia/ (acesso em 02.01.2019).

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como um inimigo, destitudo de direitos, cuja fala e manifestaes devem ser cerceados. Ntida violao da garantia fundamental da ampla defesa (autodefesa e defesa tcnica) e do devido processo;

4. Sustentao da competncia deste juzo por argumentos patentemente inidneos e superficiais, em franca contrariedade s normas constitucionais e processuais definidoras da competncia jurisdicional, bem como pacfica jurisprudncia do STF sobre o tema (QO no INQ 4130, INQ 4418 e INQ 3994);

5. Existncia de trs decises emanadas pelo STF (PET 6780, PET 6664 e PET 6827), reconhecendo que inmeros elementos relacionados a esta persecutio, incluindo-se a prpria narrativa sobre o clebre stio de Atibaia, no possuem qualquer ligao com os desvios havidos na Petrobras, razo pela qual foi afastada a competncia deste juzo. Inexplicvel negativa de cumprimento de tais decises por este juzo, fato que se encontra sub judice perante o STF (Rcl. 30.372, Rel. Min, CRMEN LCIA);

6. Usurpao da competncia da Justia Eleitoral, ao arrepio das taxativas previses constitucionais (CR/88, art. 109, I), infraconstitucionais (CPP, art. 78, V; CE, art. 35, II), bem como a jurisprudncia sedimentada do STF (CC 7033 e INQ 4399), que reconhecem a prevalncia da Justia Eleitoral (especializada) mesmo subsistindo crimes comuns conexos;

7. Lawfare evidenciado pelo direcionamento, pelo MPF, de narrativas em delao sobre a prtica de ilcitos na Petrobras apenas a partir de 2003, ano em que o Defendente assumiu o cargo de Presidente da Repblica

(Depoimento de Pedro Barusco5 6: Defesa:- Mas tem propinas que o

5 Evento 353 da ao penal 5063130-17.2016.4.04.7000/PR, trasladado aos autos no evento 126, termo 06. 6 Confirmao da seletividade no depoimento prestado nestes autos (Transcrio no evento 455): Defesa:- Certo. Mas, quer dizer, ento na realidade, esse recebimento de vantagens indevidas pelo senhor comea antes de 2003. Comea... Ento, essa planilha no reflete todo o perodo em que o senhor recebeu vantagens indevidas?

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senhor recebeu ento antes de 2003? Pedro Jos Barusco Filho:- Tem; Defesa:- O senhor v essa delimitao, ento, lavajato a partir de 2003? Pedro Jos Barusco Filho:- ; Defesa:- Certo. Mas, quer dizer, ento na realidade, esse recebimento de vantagens indevidas pelo senhor comea antes de 2003. Comea... Ento, essa planilha no reflete todo o perodo em que o senhor recebeu vantagens indevidas? Pedro Barusco:- bvio);

8. Seletividade acusatria confirmada por Salim Taufic Schahin, que tambm testificou no ter sido questionado, em sua delao, acerca de

contratos firmados pela Construtora Schahin com a Petrobras antes de

2003, muito embora a empresa mantenha contratos com a Petrobras

desde 1983: Defesa:- Certo. O grupo Schahin passou a ter contratos com a Petrobras em 2009 apenas ou j tinha contratos? Salim Taufic Schahin:- No, j tinha contratos desde... O primeiro contrato, acho, que ns assinamos com a Petrobras, se no me falha a memria tambm, foi em 1983, eu acho. Defesa:- E o Ministrio Pblico questionou o senhor em relao a outros contratos que o senhor tenha

firmado, a empresa do senhor tenha firmado desde esse perodo de 82

at 2009 ou s fez questionamentos em relao a esse contrato do

Vitria 10000? Salim Taufic Schahin:- Olha, eu no me lembro

exatamente disso, mas eu acho que mais foi tratado deste contrato do Vitria 10000, mas eu citei que ns tnhamos uma expertise no Lancer, como eu disse agora h pouco. Defesa:- Certo, mas de contratos

anteriores a 2003 o senhor no se lembra de ter sido questionado pelo Ministrio Pblico? Salim Taufic Schahin:- No me lembro;

9. Repetio da acusao veiculada nos autos da Ao Penal n 5046512-94.2016.4.04.7000/PR (caso do trplex), que levou condenao do

Defendente sem reconhecimento de concurso material questionada nos Tribunais Superiores por recursos pendentes de julgamento sob o

(falso) fundamento de que ele seria o garantidor de um esquema maior, assegurando nomeaes e manutenes de agentes pblicos em cargos

Pedro Barusco:- bvio.

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chaves para a empreitada criminosa; violao garantia do ne bis in idem;

10. Sistemtico cerceamento de Defesa, com o indeferimento indiscriminado de inmeras diligncias probatrias pleiteadas, por meio

de decises genricas e despidas de fundamentao idnea. Ofensa aos

princpios constitucionais da motivao das decises judiciais, da ampla

defesa e do contraditrio, bem como do devido processo legal (art. 93,

IX; art. 5, LV e LIV);

11. Depoimentos de ex-ocupantes dos cargos de Procurador Geral da Repblica, Ministro-Chefe da CGU, Diretor-Geral da Polcia Federal

demonstraram que o governo do Defendente foi o que mais fortaleceu e

deu autonomia s instituies e o que mais adotou medidas a fim de

tornar mais eficiente o combate criminalidade, incluindo-se a

corrupo e a lavagem de dinheiro;

12. Depoimentos de inmeras testemunhas, ocupantes de relevantes posies nos Poderes Executivo e Legislativo, que enfaticamente afirmaram que o Defendente, enquanto Presidente da Repblica, sempre

teve uma postura digna, proba e republicana, seja na interlocuo com o Congresso Nacional, seja nas conversaes com diferentes setores da

sociedade civil, incluindo-se o empresariado;

13. Inconcebvel criminalizao do legtimo relacionamento e de dilogos institucionais com representantes de empresas nacionais, passando-se a

errnea e leviana impresso de que o crescimento do setor, durante o

Governo do Defendente, ocorreu de forma isolada e por suposto

favorecimento do Defendente, quanto, na verdade, o Brasil, como um

todo, colheu os frutos do prspero perodo em que o Defendente chefiou

o Executivo Federal, deixando o cargo com aprovao recorde (87% de

bom ou timo7);

7 http://g1.globo.com/politica/noticia/2010/12/popularidade-de-lula-bate-recorde-e-chega-87-diz-ibope.html - Acesso em 02.01.2019;

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14. Seletividade acusatria. A relao mantida pelo Defendente com Emlio Odebrecht, criminalizada pela Lava Jato, a mesma que o ex-

presidente da Odebrecht manteve com Presidentes anteriores: Defesa:- (...) o senhor disse que o senhor tinha contato pessoal com o ex-

presidente Lula e levava, conversava com ele sobre os assuntos do pas,

eu pergunto ao senhor, o senhor tambm tinha esse relacionamento

com presidentes da repblica que antecederam Lula? Emlio Odebrecht:- Todos.

15. Manifesta improcedncia da tese de que o Defendente, na condio de Presidente da Repblica, tinha o magnnimo poder de indicar, nomear e

manter diretores da Petrobras em seus cargos. Cabal comprovao de

que tais atos no se encontram inseridos no plexo de atribuies do

Presidente da Repblica, sendo funo privativa do Conselho de

Administrao da petrolfera, que o fazia de forma tcnica e

independente. Abundante prova testemunhal nesse sentido;

16. 99 testemunhas e 02 informantes ouvidos na fase de instruo sendo 36 testemunhas de acusao, 63 testemunhas de defesa e 2 informantes arrolados pelas defesas. Realizao de 34 audincias realizadas para tais oitivas. Ausncia de qualquer depoimento muito menos com a iseno prpria s testemunhas e inaplicvel aos delatores que possa confirmar a hiptese acusatria. As alegaes finais do FT Lava Jato se baseiam amplamente (+ de 60%) em depoimentos de delatores, rostos bem conhecidos e sempre dispostos a confirmar qualquer narrativa fantasiosa elaborada pelo Parquet para o granjeio de benesses processuais e o restante em elementos sem qualquer carga probatria. Desesperada tentativa do rgo acusatrio de manter discurso com clara motivao poltica;

17. Inexistente liame entre o stio de Atibaia e supostas ilicitudes havidas em licitaes da Petrobras, consoante com o que o STF reconheceu na

PET 6780. Vinculao artificialmente construda, pela aleatria incluso de contratos da Petrobras, com o inequvoco objetivo de que o

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Defendente fosse processado e julgado perante esta Vara Federal, o que

ocorreu e permanece ocorrendo de forma parcial e interessada, ao arrepio

da Ordem Constitucional. Laudo Pericial8 e farta prova testemunhal

desmentindo tal vinculao;

18. Insubsistente vinculao entre as reformas no stio, supostamente intermediadas por Jos Carlos Bumlai, com a contratao da Construtora

Schahin pela Petrobras. Tese amparada em genricos, incongruentes e isolados relatos de delatores de que o Defendente teria abenoado o negcio. Amplo espectro probatrio descartando qualquer conhecimento e muito menos interveno do Defendente a respeito de tal contratao;

19. Enftica negativa de Marcelo Odebrecht, apontado pelo ente acusador como o executivo da Construtora Odebrecht que ofereceu e prometeu ao

Defendente vantagens indevidas decorrentes dos contratos apontados na

exordial, de que discutiu qualquer assunto relacionado Petrobras:

Defesa:- (...) senhor Marcelo, o senhor tratou pessoalmente sobre esses quatro contratos com o presidente Lula? Marcelo Odebrecht:- Sobre esse ponto da denncia no houve, quer dizer, eu no fiz

nenhuma tratativa direta ou indireta com o presidente Lula envolvendo contratos da Petrobrs.

20. Cabal negativa de Agenor Franklin Medeiros, apontado pelo ente acusador como o executivo da Construtora OAS que ofereceu e

prometeu ao Defendente vantagens indevidas decorrentes dos contratos

apontados na exordial, de que houve qualquer discusso de assunto

relacionado Petrobras: Defesa:- Boa tarde, senhor Agenor, pela defesa do ex-presidente Lus (sic) Incio Lula da Silva. Na denncia que

o Ministrio Pblico apresentou, que gerou essa ao penal, existe a

afirmao aqui ao acusar o senhor do crime de corrupo, de que o senhor teria oferecido e prometido vantagem indevida ao ex-presidente Lula, pelo o que eu entendi do seu depoimento o senhor no prometeu

8 Evento 1169.

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e nem ofereceu, isto? Agenor Franklin Magalhes Medeiros:-

Jamais. Eu nunca tive intimidade com o presidente Lula para tal. Nunca tive contato pra tal9;

21. Categrica negativa de Emlio Odebrecht10 e Alexandrino Alencar11, apontados como aqueles a quem o Defendente teria solicitado vantagem

indevida concretizada nas reformas do stio de Atibaia: Juza Federal Substituta:- O senhor chegou a conversar com o senhor ex-presidente sobre esse fato? Alexandrino Alencar:- Com o presidente? Juza Federal Substituta:- Com o presidente Lula. Alexandrino Alencar:- No. Juza Federal Substituta:- Nunca? Alexandrino Alencar:- Nunca. Juza Federal Substituta:- Nunca conversou sobre essa reforma? Alexandrino Alencar:- Nunca; Juza Federal Substituta:- O senhor se lembra de ter falado com o senhor presidente, reclamado de alguma questo da Petrobrs, da dificuldade que a empresa estava tendo? Emlio Odebrecht:- No (...). Emlio Odebrecht:- as minhas conversas que eu tinha com ele era efetivamente a forma da minha organizao

poder crescer, lutar e j ajudar o pas a crescer, era a forma com que eu

tinha, e se eu pudesse influenciar nessa direo era o que eu fazia,

contribua;

22. Assim como ocorreu no processo-crime relacionado ao celebrizado apartamento trplex, mais uma vez a tese acusatria se esteia,

fundamentalmente, na palavra de Lo Pinheiro e na imaterial tese do caixa geral. Afora a palavra do corru e candidato a delator, inexiste

qualquer circunstncia indiciria que permita vincular uma reforma

executada em 2014 com a indicao e nomeao de diretores da Petrobras (2003 e 2004) e licitaes vencidas pela Construtora OAS (2006, 2008 e 2009). Vedao legal (Lei 12.850/13, art. 4, 16) e jurisprudencial (HC 84517-7/SP, HC 94.034/SP, INQ 4419, INQ 3994) de a condenao ser amparada por tal elemento;

9 Transcrio no evento 1348, termo 03. 10 Transcrio no evento 1328, termo 03. 11 Transcrio no evento 1328, termo 01.

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23. Nulidade do processo; ausncia de prova de culpa do Defendente; presena inequvoca de prova de inocncia do Defendente.

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SUMRIO

I CONSIDERAES INICIAIS. 22

II DAS NULIDADES 28

II.1. Do Julgamento de Exceo. ................................................................................ 33 II.2. Suspeio do Magistrado. ................................................................................... 40

II.2.1. Perda da Imparcialidade Subjetiva. ................................................................. 47

a) Conduo coercitiva deferida com interesses estranhos ao processo................... 49

b) Monitoramento da Defesa Tcnica ......................................................................... 52

c) Violao do sigilo das interceptaes e divulgao ilegal dos udios ................... 55

d) Apario em eventos organizados por opositores do Defendente e nunca por seus apoiadores .............................................................................................................. 58

e) O Magistrado da instruo enquanto garantidor do encarceramento do Defendente ..................................................................................................................... 60

f) A liberao da delao de Palocci s vsperas do pleito eleitoral ......................... 65

g) O aceite para integrar o governo do Presidente Jair Bolsonaro .......................... 71

h) A contribuio da Teoria da Dissonncia Cognitiva para o processo penal ....... 78

i) As incriminaes pr-processuais contra o Defendente ......................................... 85

j) A violao estrutura dialtica do processo ........................................................... 94

II.2.2. Perda da imparcialidade objetiva ..................................................................... 98

II.2.3 Trocam-se os personagens, permanecem as praticas ilegais ...................... 105

II.2.3.1 Da negativa de esclarecimento acerca do rgo jurisdicional previamente designando para oficiar no feito. ......................................................... 121

II.2.3.2. Vulnerao Presuno de Inocncia 130

II.3 Da incompetncia da 13 Vara Federal de Curitiba/PR .................................. 141 II.3.1 Competncia da Justia Eleitoral Prevalncia da Justia Especializada Cenrio que restou clarividente ao fim da instruo processual ............................ 141

II.2.4. Acesso integralidade do HD com a cpia do computador de Marcelo Odebrecht. ................................................................................................................... 381

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II.2.7 Da ordem de apresentao das alegaes finais. ......................................... 385

II.2.8 Do insuficiente prazo concedido para apresentao das alegaes finais. 388

II.2.9 Concluses ...................................................................................................... 389

a)A funo do Ministrio Pblico .............................................................................. 391

b)A malograda Teoria dos Poderes Implcitos ......................................................... 396

c)A escolha do legislador constituinte ....................................................................... 401

d)O PIC n 1.25.000.003350/2015-98 e suas nulidades ............................................ 404

e)A inexistncia da conformao de uma adequada Opinio Delicti ....................... 405

f)A ilegalidade das provas obtidas no curso do PIC n1.25.000.003350/2015-98. . 406

g)Concluses ................................................................................................................ 412

III PRELIMINARES DE MRITO 414

III.1. Do necessrio cumprimento da deciso do Comit de Direitos Humanos da ONU. .................................................................................................................... 414 III.1.1 A deciso. ................................................................................................... 414 III.1.2 Carter cogente das determinaes do Comit de Direitos Humanos da ONU .......................................................................................................................... 420 III.1.3 Impossibilidade de os Tribunais e Juzes Brasileiros sindicarem as decises do Comit de Direitos Humanos ONU. ..................................................... 426 III.1.4 Concluses. ................................................................................................ 427 III.2. Da Inpcia acusatria ....................................................................................... 429

IV DO MRITO 441

IV.1 Consideraes Sobre O Acervo Probatrio ................................................... 441 IV.1.1 Consideraes sobre a valorao probatria: o sistema de livre convencimento motivado ............................................................................................ 441

IV.1.2 O standard Probatrio no Processo Penal.................................................. 446

IV.1.3 Do sistemtico (e sempre miditico) manejo da delao premiada como sustentao da Lava Jato e sua fbrica de manchetes. ........................................ 464

IV.1.4 Da fragilidade das delaes da Odebrecht De delao do fim do mundo delao dos arquivamentos...................................................................................... 478

IV.1.5 Valor Probatrio dos Depoimentos de Delatores ....................................... 488

IV.1.6 Das inconsistncias decorrentes das delaes premiadas. ........................ 509

IV.1.6.1 A delao de Delcdio do Amaral ............................................................. 513

IV.1.6.2 A delao de Pedro Corra ....................................................................... 521

IV.1.7 Das informais delaes premiadas .............................................................. 540

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IV.1.7.1 Da informal delao de Renato Duque .................................................... 541

IV.1.7.2 A informal delao de Jos Adelmrio Pinheiro Filho (Lo Pinheiro) e Agenor Franklin. ...................................................................................................... 548

IV.1.8 Do uso da delao informal pela FT Lava-Jato ..................................... 579

IV.1.9. H limites no exerccio acusatrio? 583

IV.2. Dos atos de corrupo relacionados s diretorias da Petrobras ....................... 624 IV.2.1. A tese acusatria ............................................................................................. 624

IV.2.1.1. A imputao de fato criminoso 625

IV.2.2. Premissas tericas 640

IV.2.2.1. Introduo 640

IV.2.2.2. Relao de Lula com o Congresso no marco do Presidencialismo de

Coalizo 648

IV.2.2.3. Relao de Lula com o empresariado ........................................................ 672

IV.2.2. 4. A criminalizao da atividade poltica 713

IV.2.2.5. Sobre o crime de corrupo passiva........................................................... 720

IV.2.2.5.1. Gnese do delito de corrupo passiva ................................................... 720

IV.2.2.5.2. O fenmeno da corrupo poltica .......................................................... 721

IV.2.2.5.3. Configurao: a discusso sobre o ato de ofcio ..................................... 724

IV.2.3. Mrito............................................................................................................... 745

IV.2.3.1. Preliminarmente: O bis in idem. Quantas vezes Lula ser condenado pelas mesmas condutas? ............................................................................................. 746

IV.2.3.2. A ausncia de lgica da imputao ............................................................ 754

IV.2.3.2. Quantas pessoas sero condenadas por supostamente conferir sustentao poltica a Paulo Roberto Costa e Renato Duque? ............................... 755

IV.2.3.3.Condutas atribudas ao Defendente aps deixar de ser funcionrio pblico: abandono total da expresso em razo da funo do art. 317 do CP .. 760

IV.2.4. A farsa dos contratos ...................................................................................... 765

IV.2.4.1 Introduo ..................................................................................................... 765

IV.2.4.2. Premissas tericas ........................................................................................ 766

IV.2.4.3. Os contratos em espcie............................................................................... 769

IV.2.4.4. Concluses sobre os contratos .................................................................... 818

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IV.2.5. Atipicidade das condutas atribudas ao Defendente ................................... 822

IV.2.5.1. A prova dos autos ........................................................................................ 829

IV.2.5.2. Refutando os elementos de prova do MPF ................................................ 830

IV.2.5.3. As provas da Defesa ..................................................................................... 868

IV.2.4.3.1. As indicaes realizadas por Lula: ausncia de qualquer ilicitude 868

IV.2.5.3.2. Conselho de Administrao da Petrobras: rgo autnomo e independente ................................................................................................................ 875

IV.2.5.3.3. Reduo dos riscos de corrupo 887

IV.2.5.5. Concluses Parciais ..................................................................................... 911

IV.2.6. Tentativas inidneas do MPF de suprir o vazio probatrio ....................... 920

IV.2.6.1. Impossibilidade de responsabilizao penal objetiva e a teoria do

domnio do fato 920

IV.2.6.2. Impossibilidade de responsabilizao penal por conduta de terceiros 938

IV.2.6.3. Impossibilidade de responsabilizao penal por ato omissivo 941

IV.3. Stio de Atibaia: A verdade .......................................................................... 949 IV.3.1. Premissas fticas A verdade sobre o stio de Atibaia ............................ 950

IV.3.1.2. Concluses das premissas expostas ....................................................... 1015

IV.3.2 Dos fatos relacionados a Jos Carlos Bumlai e Construtora Schahin 1018

IV.3.3 Da corrupo passiva ................................................................................. 1027

IV.3.3.1 Da atipicidade objetiva Inexistentes a causao e imputao do resultado ao Defendente ........................................................................................... 1033

IV.3.3.2 Da atipicidade subjetiva. Inexistentes os elementos cognitivo e volitivo1036

IV.3.3.2.1 Elemento cognitivo Do inexistente conhecimento atual acerca das eventuais ilicitudes (art. 18 c/c art. 20 do CP) ........................................................ 1038

IV.3.3.2.2 Da ausncia do elemento volitivo......................................................... 1074

IV.3.4 Da lavagem de capitais ............................................................................... 1079

IV.3.4.1 Tipo objetivo ............................................................................................ 1082

IV.3.4.1.1. Atipicidade: Inexistentes a causao e imputao do resultado ...... 1082

IV.3.4.1.2. Atipicidade objetiva. Do inexistente vnculo entre o stio de Atibaia e os crimes antecedentes narrados pela exordial ...................................................... 1086

IV.3.4.2 Tipo subjetivo Inexistentes os elementos volitivo e cognitivo ........... 1092

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IV.3.4.2.1 Elemento cognitivo Do inexistente conhecimento acerca das ilicitudes (art. 18 c/c art. 20 do CP) ......................................................................... 1093

IV.3.4.2.2 Ausncia do elemento volitivo do tipo ................................................ 1096

IV.3.4.2.3 Da prova testemunhal e o seu impacto para fins de reconhecimento da atipicidade subjetiva ............................................................................................ 1101

IV.3.4.3 Da inconcebvel tentativa de punir por lavagem a ttulo de omisso .. 1112

IV.3.4.4 Teses subsidirias .................................................................................... 1116

IV.3.4.4.1 Atipicidade dos fatos narrados. A motivao de Bumlai, ao participar das obras, no configura situao demandadora da tutela penal ......................... 1116

IV.3.4.4.2 Hiptese subsidiria. Inocorrncia de concurso material entre os crimes de corrupo passiva e lavagem de dinheiro Inobservncia do vedado bis in idem ........................................................................................................................ 1123

IV.4 Dos fatos relacionados Construtora Odebrecht ....................................... 1143

IV.4.1 Das descabidas imputaes lanadas no contexto das discusses relacionadas ao setor petroqumico ......................................................................... 1146

IV.4.1.1 Da inconcebvel criminalizao de polticas pblicas e da comprovao da atuao legtima do Defendente nas conversas sobre o tema ........................... 1147

IV.4.2 Da corrupo passiva ................................................................................. 1178

a) Da no solicitao, aceitao de promessa ou recebimento de vantagem indevida ...................................................................................................................... 1178

IV.4.2.1 Do tipo objetiva ........................................................................................ 1192

IV.4.2.1.1 Da atipicidade objetiva: Inexistentes causao e imputao do resultado ..................................................................................................................... 1192

IV.4.2.1.2 Da atipicidade diante da ausncia do ato de ofcio elementar implcita indispensvel subsuno do tipo penal de corrupo passiva ............ 1199

IV.4.2.2 Do tipo subjetivo ...................................................................................... 1204

V.4.2.2.1 Elemento cognitivo Do inexistente conhecimento atual acerca das eventuais ilicitudes (art. 18 c/c art. 20 do CP) ........................................................ 1206

IV.4.2.2.2 Inexistncia do elemento volitivo ......................................................... 1234

IV.4.3 Da lavagem de capitais ............................................................................... 1246

IV.4.3.1 Tipo objetivo ............................................................................................ 1248

IV.4.3.1.1 Atipicidade: Inexistentes a causao e a imputao do resultado .... 1249

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IV.4.3.1.2 Atipicidade objetiva. Do inexistente vnculo entre o stio de Atibaia e os crimes antecedentes narrados pela exordial. ..................................................... 1253

IV.4.3.2 Tipo subjetivo ........................................................................................... 1261

IV.4.3.2.1 Elemento cognitivo Do inexistente conhecimento acerca das ilicitudes (art. 18 c/c art. 20 do CP) ......................................................................... 1263

a) Da prova testemunhal e o seu impacto para fins de reconhecimento da atipicidade subjetiva ................................................................................................. 1265

IV.4.3.2.2 Ausncia do elemento volitivo do tipo ................................................. 1281

IV.4.3.3 Da inconcebvel tentativa de punir por lavagem a ttulo de omisso .. 1289

IV.4.3.4 Da atipicidade da conduta. A motivao de Emlio Odebrecht para, supostamente, autorizar as reformas no stio de Atibaia, o que no configura o tipo penal do art. 317 do Cdigo Penal ................................................................... 1293

IV.4.3.5 Hiptese subsidiria. Inocorrncia de concurso material entre os crimes de corrupo passiva e lavagem de dinheiro Inobservncia do vedado bis in idem ........................................................................................................................ 1301

IV.5 Dos fatos relacionados Construtora OAS 1322

IV.5.1 Bis in idem O suposto encontro de contas entre Lo Pinheiro e

Vaccari j foi julgado no processo-crime n 5046512-94.2016.4.04.7000/PR 1323

IV.5.2 Da inconsistente argumentao acerca dos crimes antecedentes 1341

IV.5.2.1 Da deturpada abordagem dos fatos apurados no processo-crime 5046512-94.2016.4.04.7000/PR ............................................................................. 1344 IV.5.2.2 Da corrupo passiva ............................................................................. 1345

a) Da desconstruo da acusao sob uma abordagem meramente lgica: A falcia do caixa geral. ............................................................................................ 1360

b) Da forada vinculao do Defendente com toda industriada cadeia factual narrada ....................................................................................................................... 1363

c) Do encontro havido entre o Defendente e Lo Pinheiro em So Bernardo do Campo ........................................................................................................................ 1368

IV.5.2.2 Do Tipo objetivo ....................................................................................... 1372

IV.5.2.2.1 Da atipicidade em razo da ausncia de elementar do tipo .............. 1372

a) Axiomas conceituais sobre o crime de corrupo ativa e a influncia da pretenso condenatria contra Lo Pinheiro tese defensivA ............................. 1376

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b) Da absoluta dissociao da funo pblica exercida pelo Defendente e as reformas realizadas em 2014 Atipicidade. Ausncia da elementar do tipo penal do art. 317 do CP ....................................................................................................... 1381

b.1) Do desconhecimento da existncia do stio, pelo Defendente, enquanto Presidente da Repblica ........................................................................................... 1383

b.2) Lo Pinheiro s tomou conhecimento da existncia do stio de Atibaia em 2014 ............................................................................................................................. 1384

b.4) A assuno do projeto pela OAS Empreendimentos em nenhum momento foi planejada ou previamente ajustada. Sua ocorrncia se deu, de forma despretensiosa, durante a visita que Lo Pinheiro fez ao stio em 2014 ............... 1393

b.5) Os prprios termos da participao de Paulo Gordilho no foram previamente planejados: Ideia inicial era aproveitar na propriedade os equipamentos que Dona Marisa possua ................................................................. 1402

b.6) O suposto acerto de contas amparado na imaginao de Lo Pinheiro teria ocorrido apenas em 2013 ................................................................................. 1405

b.7) Da mentirosa verso apresentada pela testemunha Misael de Jesus Oliveira1410

b.7.1) O primeiro bloco de mentiras. Da durao das obras e o condicionamento de sua continuidade ao resultado das eleies ........................................................ 1411

b.7.2) O segundo bloco de mentiras. O contato com o Defendente durante as obras e a alegada utilizao de lcio Vieira para passar recados a Misael de Jesus de Oliveira ........................................................................................................ 1415

IV.5.2.2.2 Concluses ............................................................................................. 1419

IV.5.2.3. Atipicidade. Ausncia de ato de ofcio seja em perspectiva ou praticado em favor da Construtora OAS............................................................. 1421

a) Suposta facilitao incluso da Construtora OAS no cadastro da Petrobras1424

b) Da suposta interveno do Defendente acerca de atrasos verificados nas obras1428

IV.5.2.3.1. Concluses ............................................................................................ 1435

IV.5.2.4. - Da atipicidade objetiva Inexistente imputao do resultado ........... 1438

a) Conjuntura 01. Atipicidade objetiva na conduta de encaminhar o nome dos diretores ao Conselho de Administrao da Petrobras ......................................... 1442

b) Conjuntura 2: A solicitao e o recebimento da vantagem indevida em 2014. Atipicidade. ................................................................................................................ 1447

IV.5.2.5 Do tipo subjetivo ...................................................................................... 1452

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IV.5.2.5.1 Elemento cognitivo Do inexistente conhecimento atual acerca das eventuais ilicitudes (art. 18 c/c art. 20 do CP) ........................................................ 1454

IV.5.2.5.2 Da ausncia do elemento volitivo......................................................... 1459

IV.5.3 Da lavagem de capitais ............................................................................... 1462

IV.5.3.1 Tipo objetivo ............................................................................................ 1462

IV.5.3.1.1 Inexistentes a causao e a imputao do resultado .......................... 1462

IV.5.3.1.2 Atipicidade objetiva. Do inexistente vnculo entre o stio de Atibaia e os crimes antecedentes narrados pela exordial. ..................................................... 1467

IV.5.3.2 Tipo subjetivo ........................................................................................... 1471

IV.5.3.2.1 Elemento cognitivo Do inexistente conhecimento acerca das ilicitudes (art. 18 c/c art. 20 do CP) ......................................................................... 1472

IV.5.3.2.2 Ausncia do elemento volitivo do tipo ................................................. 1475

IV.5.3.3 Da inconcebvel tentativa de punir por lavagem a ttulo de omisso .. 1480

IV.5.3.4 Da atipicidade da conduta: A motivao de Lo Pinheiro, para supostamente autorizar as reformas no stio de Atibaia, no configura pacto de corrupo ................................................................................................................... 1484

IV.5.3.5 Hiptese subsidiria. Inocorrncia de concurso material entre os crimes de corrupo passiva e lavagem de dinheiro Inobservncia do vedado bis in idem ........................................................................................................................ 1489

a) Balizas conceituais sobre o tema.......................................................................... 1490

b) Da compreenso jurisprudencial acerca da temtica ....................................... 1494

c) A sofisticao do meio empregado para o recebimento no afasta a consuno1498

d) A tutela de bens jurdicos distintos e a cominao de penas diferentes no afastam o reconhecimento da consuno ................................................................ 1500

e) Do necessrio afastamento do concurso material no presente feito ................. 1505

f) Concluses .............................................................................................................. 1507

IV.6 Da inaplicabilidade do dolo eventual lavagem de dinheiro 1508

a) Incompatibilidade da teoria da cegueira deliberada ao ordenamento jurdico

brasileiro 1515

b) Da inexistncia de provas da ocorrncia do tipo de lavagem na modalidade de dolo eventual ou cegueira deliberada ................................................................. 1524

IV.7. Concluses sobre o mrito da imputao 1526

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V DA EXTINO DE PUNIBILIDADE 1542

V.1 - Da prescrio quanto ao delito de corrupo passiva .................................... 1542 VI.1 Da ofensa autoridade do Supremo Tribunal Federal. Indevida incurso na competncia da Justia Federal do Distrito Federal para processar e julgar os delitos de organizao criminosa. ........................................................................... 1550 VI.2 Das circunstncias judiciais ......................................................................... 1557 VI.2.1 Culpabilidade ............................................................................................ 1557 VI.2.2 - Conduta Social .......................................................................................... 1561 VI.2.3 Personalidade ............................................................................................ 1563 VI.2.4 Motivos do delito ...................................................................................... 1566 VI.2.5 Circunstncias do delito ........................................................................... 1570 VI.2.6 Consequncias do delito ........................................................................... 1572 VI.3 Agravantes e Atenuantes ................................................................................ 1576 VI.3.1. Facilitar/assegurar a execuo de outros crimes (art. 61, II, b, CP)..... 1576 VI.3.2 Organizar/dirigir a atividade dos demais agentes no crime (art. 62, I, CP) .......................................................................................................................... 1579 VI.3.3 Defendente maior de 70 anos (art. 65, I, CP) ........................................... 1580 VI.4. Causas de aumento de pena ........................................................................... 1581 VI.4.1 Da causa de aumento do art. 317, 1, CP ................................................... 1581 VI.4.2 Da causa de aumento sobre ocupantes de cargo pblico (Art. 327, 2, CP) .......................................................................................................................... 1585 VI.4.3 Da causa de aumento do art. 1, 4, da Lei 9.613/98 ................................. 1592 VI.5 Dos manifestos bis in idem na dosimetria da pena ......................................... 1594 VI.6 Do afastamento do concurso material ............................................................ 1602 VI.7. Da Lavagem de Ativos. Ocorrncia, em tese, de crime nico ou mera continuidade delitiva. .............................................................................................. 1608

a)Do ncleo relacionado a Jos Carlos Bumlai e Construtora Schahin ............ 1609

b)Do ncleo relacionado Construtora Odebrecht ............................................... 1611

c)Do ncleo relacionado Construtora OAS ......................................................... 1615

VI.7.1. Do crime nico em cada ncleo temtico. .................................................. 1616 VI.7.2. Da ocorrncia, em tese, de continuidade delitiva. ...................................... 1619

VII DO DANO MNIMO 1625

VII.1 Do ncleo relacionado a Jos Carlos Bumlai e Construtora Schahin ..... 1626 VII.2 Do ncleo relacionado Construtora Odebrecht ....................................... 1627 VII.3 Do ncleo relacionado Construtora OAS ................................................ 1631 VII.4 Premissas conceituais ................................................................................. 1632 VII.5 Concluses ................................................................................................. 1633

IIX DOS PEDIDOS 1639

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I

CONSIDERAES INICIAIS.

S quero deixar isso claro, porque digo-o sempre, Senhora Presidente um dia algum vai ler isso. Vir um historiador aqui e saber quem era cada um de ns12.

Em um superficial exame, pode parecer que a presente ao

penal concluiu sua instruo probatria e, chegado o momento da derradeira

manifestao defensiva, tudo teria transcorrido conforme as balizas

constitucionais e observado o due processos of law.

Olhando-se desatentamente, poder-se-ia supor que teria sido

assegurada a Luiz Incio Lula da Silva a presuno de sua inocncia; que lhe

fora garantido o amplo exerccio de Defesa; que o processamento do feito se

deu perante Juiz Natural. A meramente aparente e ilusria cortina do devido

processo poderia at nos levar a crer nesse cenrio.

Assim fosse e ordinariamente o presente tpico se voltaria a

sintetizar os principais atos processuais e os principais argumentos defensivos,

preparando o julgador exauriente anlise de todas as teses defensivas.

No se pode, todavia, incorrer em tamanha ingenuidade. Como

certa vez assinalou o Professor CELSO ANTNIO BANDEIRA DE MELLO, no

12 Ext 986, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 15/08/2007.

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houve [e no h] a menor procura pela justia. Eu acho que isso nem entrou

em pauta. O que entrou em pauta era a condenao do Lula (...)13.

Emerge ento a certeza de que, em um julgamento imparcial,

pautado pela fiel observncia das garantias constitucionais e dos modelos

dogmticos, Luiz Incio Lula da Silva no teria sido condenado, tampouco

estaria privado de sua liberdade.

queles que defendem e reconhecem a primazia das garantias

fundamentais positivadas no Texto Constitucional, indistinta e

desapaixonadamente, obvio e manifesto que Luiz Incio Lula da Silva no

teve um julgamento isento, independente, neutro, imparcial e impessoal naquele

processo, que tramitou perante este Juzo.

Se o clebre socilogo alemo advertia que a histria se repete,

a primeira vez como tragdia e a segunda como farsa14, em relao ao processo

aqui tratado poderia se dizer, sem maiores prejuzos, que a histria se repetiu,

idntica e fielmente, a mesclar tragdia e farsa.

trgico porque se est a subverter todo o sistema de Justia

de um pas que se pretende democracia - para a satisfao de interesses

polticos de determinados grupos ou agente, que se valem de instrumentais

jurdicas como aparato blico contra inimigos internos, no constituindo

exagero dizer que a lei est se tornando, gradativamente, uma poderosa e

13 Disponvel em: https://www.youtube.com/watch?v=v6plDw_R71Q Acesso em 02.01.2018. 14 MARX, Karl. O 18 de brumrio de Lus Bonaparte Traduo e notas Nlio Schneider; prlogo Herbert Marcuse. So Paulo: Boitempo, 2011.

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prevalente arma de guerra15, no cenrio que se identifica como lawfare16.

Farsa porque se est a encenar processo judicial que aparenta servir como mero

rtulo burocrtico, um rito de passagem necessrio ao atingimento de um

desfecho adrede determinado: a condenao do acusado.

O roteiro aqui pouco mudou. Desta feita, no entanto, versa a

imputao sobre suposto recebimento de vantagem indevida consistente em

reformas civis executadas na sede de uma chcara que, como ficou

comprovado, no nem nunca foi - de propriedade do Defendente.

Se a vantagem indevida ainda dinmica, os demais elementos

do processo so estticos. Enfrenta-se a mesma tentativa infeliz de se reescrever

a Histria do Brasil, com narrao de fatos comprometida unicamente com uma

deturpada ideologia divorciada da realidade, produto uma era de ps-verdade

em que se intensificam os revisionismos histricos. Defronta-se com a mesma

tentativa artificial de vincular fatos quaisquer com a empresa petrolfera

brasileira, por meio da indicao aleatria de contratos que os prprios acusados

desconhecem. Encara-se idntica e radical flexibilizao dos critrios de prova,

que transformam a atividade de reconstruo histrica do passado em mera

retrica argumentativa, onde provar argumentar e as convices, dedues

e presunes tm mais importncia do que aquilo que concreto, palpvel. V-

se o mesmo expediente de produo fordista de delatores de planto, que nesta

guerra jurdica so os soldados a colmatar as amplas lacunas probatrias que os

agentes estatais no logratam legitimamente preencher.

15 KITTRIE, Orde F. Lawfare: Law as a weapon of war. Oxford University Press, p. 1. 16 GOLDSTEIN, Brooke. Lawfare: Reat Threat ou Illussion?

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E sempre, sempre possvel identificar os mesmos interesses

metaprocessuais, inescondveis, que so exteriorizados de forma acintosa, antes

de tudo sensatez dos que se negam a cerrar os olhos, em deliberada cegueira, e

valor atribuem higidez e credibilidade do sistema de justia. Aqui, responde-

se ao Juiz que no tem vocao para apitar a partida; seno para manter o apito

rente a si, ao passo em que veste a camisa do outro time. Os novos ventos do

conta de que nem mais a toga deseja usar, pois honrado e embevecido com o

aceno poltico de adversrio deste Defendente. Enquanto no sai de campo,

segue agindo, sempre que h uma oportunidade, para prejudicar aquele que

elegeu como seu inimigo.

preciso dizer: as acusaes aqui firmadas no tm suporte em

base real. So frvolas. Foram construdas sobre convices fanticas

daqueles que elegeram o Defendente como inimigo. O fim ilegtimo e no

declarado elimina-lo do processo poltico brasileiro.

Neste processo como naquele que o precede, o Defendente foi

alvo de diversos mtodos de investigao ilegais, que sempre deixaram evidente

o verdadeiro castelo de areia terico construdo pela Lava Jato visando a

conden-lo sem provas, no qual os elementos so forados a caber em

categorias pr-concebidas: was nicht passt, wird passend gemacht O que

no se ajusta, faz-se ajustar 17. Ou, por outrem, se no h provas, no cabe

fabrica-las.

17 ARAGO, Eugnio Jos Guilherme de. O Risco dos Castelos Tericos do Ministrio Pblico em Investigaes Complexas. In: ZANIN MARTINS, Cristiano; TEIXEIRA ZANIN MARTINS, Valeska; VALIM, Rafael (coord.). O Caso Lula: A Luta Pela Afirmao dos Direitos Fundamentais no Brasil. So Paulo: Contracorrente, 2017, p. 51-59.

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As estratgias de lawfare ordinariamente envolvem tambm

manipulao da opinio pblica atravs da mdia, visando (alm do apoio

coletivo) ao prejuzo moral ou eliminao conceitual de um oponente,

como elemento de legitimao da violncia por meio da lei ou de

procedimentos legais.

neste proscnio de arbitrariedades que o Defendente vem

apresentar suas alegaes finais. Na hiptese de a acusao ser julgada com a

imparcialidade necessria e levando-se em considerao os elementos de

prova amealhados na instruo, caminhos idneos conduzem ou anulao

do processo ou absolvio do Defendente.

Ademais, para que se afaste qualquer eventual alegao de

objetivos protelatrios ou ainda prolixidade desmedida, cumpre esclarecer que a

extenso da presente defesa se d em justa medida. Isso, vez que no apenas so

imputados fatos pautados por complexos e imaginativos contextos

narrativos, como tambm existem inmeros procedimento incidentais e

autnomos que se lastreia, a todo tempo, a acusao. Nessa medida, sendo este

o momento processual destinado ao enfrentamento ftico e processual integral,

incide Defesa o dever legal de refutar com mxima completude o arguido pela

contraparte18.

18 Cdigo de Processo Penal: Art. 403. No havendo requerimento de diligncias, ou sendo indeferido, sero oferecidas alegaes finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusao e pela defesa, prorrogveis por mais 10 (dez), proferindo o juiz, a seguir, sentena. [...] 3. O juiz poder, considerada a complexidade do caso ou o nmero de acusados, conceder s partes o prazo de 5 (cinco) dias sucessivamente para a apresentao de memoriais. Nesse caso, ter o prazo de 10 (dez) dias para proferir a sentena.

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27

Frisa-se ainda a importncia de trazer relevantes questes que,

ainda que primeira vista paream ser extraprocessuais, resguardam ntima

relao aos fatos necessrios de apreciao. Estando, para tanto, devidamente

justificada a volumosa defesa.

Por prisma diverso, cumpre anotao histrica quanto ao

momento que se ostenta diante de ns. Sabe-se que a recente disputa eleitoral

foi amplamente marcada pelo levante das bandeiras do necessrio respeito aos

preceitos democrticos e independncia e autossuficincia das instituies

ptrias. Ironicamente, o que se v, correndo em paralelo ao agrandamento dos

discursos mencionados, verdadeiro processo de fragilizao do Estado

Democrtico de Direito todas as suas faces.

Desrespeita-se a soberania nacional ao se flertar com polticas

intervencionistas estrangeiras e ultraliberais; a democracia no mais critrio

basilar das prticas institucionais e, por fim, o respeito ao texto legal expresso

cada dia mais escasso, com inexorvel avano das interpretaes contra legis,

empregadas e convalidadas em todas as instncias do judicirio nacional.

irnico para no dizer absolutamente melanclico que

esteja o Defendente, maior implementador de mecanismos contra corruptivos da

histria do Pas, sendo subjugado a procedimento que pode ser tudo, mas jamais

pode ser taxado de processo judicial em seu sentido estrito.

As denncias de arbtrios contidas nestes autos no ficam

registradas apenas para a jurisdio, mas, seguramente, para a Histria, que ser

revisitada por geraes futuras. E neste dia, como afirmou o Ministro EROS

GRAU, se saber quem era cada um de ns.

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II

DAS NULIDADES

H insanvel contradio entre processo errado e descoberta da verdade. No se pode descobrir a verdade atravs do erro19.

A assim denominada Operao Lava Jato exps a tenso

existente entre concepes antagnicas de direito processual penal que convive

no cotidiano judicirio de nosso pas. Embora o Legislador Constituinte tenha

gravado na Lei Maior a submisso da pretenso punitiva do Estado s garantias

do devido processo legal, a Fora Tarefa da Operao Lava Jato reiteradamente

insiste em conferir menor ou nenhuma importncia a estas garantias: busca

transform-las em palavras bonitas rabiscadas em um pedao de papel sem

utilidade prtica20, como lembrava o Ministro EROS GRAU. Nesse sentido,

subverteu a ordem jurdica, sob a tica distorcida de que os fins poderiam

justificar os meios.

Distintamente do modelo acima apontado, o processo penal

ostenta enquanto razo de existir a proteo das garantias da pessoa acusada

frente ao Estado. Conforme esta ratio essendi, AFRNIO SILVA JARDIM discorre

que o direito processual penal representa mais uma forma de autolimitao do

19 MONTALBANO, Giuseppe. Il Diritti di Libert del Cittadino e il Processo Penale. Rivista di diritto processuale penale, 1957, p. 297.. 20 HC 95009/SP, Rel. Min. EROS GRAU, Plenrio, j. em 06/11/2008, publicado em 19/12/2008.

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Estado do que um instrumento destinado persecuo criminal, sendo fruto

do avano civilizatrio da humanidade21.

Como ensinam ZAFFARONI, BATISTA E OUTROS, o Estado de

Direito serve conteno do Estado de Polcia que coabita em seu interior:

A conteno e reduo do poder punitivo, planificadas pelo direito penal para uso judicial, impulsionam o progresso do estado de direito. No h nenhum estado de direito puro; o estado de direito no passa de uma barreira a represar o estado de polcia que invariavelmente sobrevive em seu interior. Por isso, a funo de conteno e reduo do direito penal um componente dialtico indispensvel sua subsistncia e progresso22.

imprescindvel o estabelecimento de regras que asseguram a

todo cidado a garantia a um julgamento justo (fair trial). As regras do jogo

tecnicamente tico e limpo devem ser, portanto, estveis, sendo solidificadas a

partir de formas tpicas. Nessa vereda, a observncia das formas

processuais se convola em instrumento de garantia do acusado e em

mecanismo de sustentao da ordem jurdica, afinal, como afirma BADAR as

partes ficariam profundamente inseguras se, ao praticarem um ato processual,

no soubessem se este seria eficaz ou ineficaz, ficando a produo ou no dos

efeitos ao mero capricho do juiz23.

Conclui FREDERICO MARQUES, na mesma linha, que a

observncia das formas, na justia penal, constitui, muitas vezes, o instrumento

21 JARDIM, Afrnio Silva. Direito Processual Penal. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 317. 22 ZAFFARONI, E. Rul; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro: primeiro volume Teoria Geral do Direito Penal. Rio de Janeiro: Revan, 2003, 4 ed., p. 41. 23 BADAR, Gustavo Henrique. Processo Penal. 4 ed. So Paulo: RT, 2016, p.787.

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de que a lei se vale para garantir o jus libertatis contra as coaes indevidas e

sem justa causa24.

preciso, pois, com vistas a conferir eficcia ao Texto

Constitucional, que se adote como premissa a natureza garantidora do processo

penal sendo este o nico caminho balizado pela Carta de 1988, o nico

sentido autorizado pelo ordenamento jurdico. Em idntica compreenso

discorre o Eminente Ministro Decano do Supremo Tribunal Federal, CELSO DE

MELLO:

A exigncia de fiel observncia, por parte do Estado, das formas processuais estabelecidas em lei, notadamente quando institudas em favor do acusado, representa, no mbito das persecues penais, inestimvel garantia de liberdade, pois o processo penal configura expressivo instrumento constitucional de salvaguarda dos direitos e garantias assegurados ao ru25.

A transigncia com a estrita observncia das formas

processuais penais avilta o Estado Democrtico de Direito e, com escusas pela

fora da expresso, evidncia patolgica destes tempos. Sob a mxima da

utilizao do processo como instrumento de combate corrupo

deformaram-se os cnones legais, substituindo-se a Constituio e as normas

positivadas pelo direito particular que vige paralelamente naquilo que se

denominou como a Repblica de Curitiba. O Parquet, mas no somente ele,

substituiu a Lei Maior por convices morais (e polticas) de seus membros.

Ocorre que, como afirma LENIO STRECK, as questes jurdicas se resolvem a

partir do prprio ordenamento jurdico e no por meio da vontade individual do

24 MARQUES, Jos Frederico. Estudos de Direito Processual Penal. Campinas: Millennium, 2001, p. 267. 25 HC 99566, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 15/12/2009, publicado em 13/04/2011.

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aplicador, sendo este o singelo custo a se pagar no paradigma do Estado de

Direito26.

Sendo a lei a medida de todas as coisas, no se pode admitir

que Agentes Pblicos a desrespeitem sob o pretexto de atingirem determinados

escopos, sejam estes quais forem. A lei a todos submete, inclusive os

integrantes da Fora Tarefa e Julgadores da Lava Jato. A problemtica de um

sistema de controle e viglia unilateral foi posto pelo adgio latino lembrado por

Juvenal: quis custodiet ipsos custodes?, ou seja, quem vigia os vigilantes?.

Assim, verificado o desrespeito s formulas tpicas que

regem o processo penal brasileiro, como se viu ocorrer incontveis vezes neste

processo, de rigor a aplicao dos efeitos jurdicos decorrentes das

transgresses: a nulidade. Como assevera TOURINHO FILHO, o ato nulo aquele

que praticado em desconformidade com o paradigma legal27.

O que est em jogo neste caso no somente a resoluo da

temtica de direito material. Questiona-se at com mais veemncia o verdadeiro

sentido que deve orientar o processo: se este serve tutela dos direitos e

garantias da pessoa acusada forma democrtica que se apresenta como reflexo

do avano civilizatrio conquistado pela humanidade ou se presta como

instrumento inquisitorial a servio de interesses particulares.

26 STRECK, Lenio. Perus, paves e urubus: a relao entre Direito e moral. Publicado em 15.08.2013. Disnvel em: http://www.conjur.com.br/2013-ago-15/senso-incomum-perus-pavoes-urubus-relacao-entre-direito-moral. 27 TOURINHO FILHO. Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 16 ed. So Paulo: Saraiva, p. 536.

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Como relembra o Ministro GILMAR MENDES:

Parece que o Tribunal est realmente devedor dos seus adversrios e inimigos, neste momento, porque ele ter que se reinventar nesse tipo de matria. Ele ter que, realmente, rediscutir esse tema, no ser um homologador de wishful thinking da Procuradoria-Geral, de propsitos totalitrios, s vezes at bem-intencionados, agora se v que nem to bem-intencionados. At porque tambm se sabe, como se diz: boas intenes pavimentam o caminho do inferno. No podemos nos afastar dos paradigmas do Estado de Direito28.

Neste chiaroscuro de nossa tenra democracia, urge recuperar a

essncia do processo penal constitucional: o compromisso com a questo da

liberdade29.

Diversas violaes s garantias processuais do Defendente

aconteceram na fase da persecuo em juzo e na tambm em ocasies pr-

processuais, todas a ensejar a decretao da nulidade do feito. Organizou-se o

presente captulo em cinco tpicos:

(i) O Julgamento de Exceo;

(ii) Suspeio do Julgador;

(iii) Vulnerao presuno de inocncia;

(iv) Incompetncia da 13 Vara Federal de Curitiba/PR;

(v) Cerceamento do Direito de Defesa.

28 Inq 4118, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 08/05/2018, publicado em 05/09/2018. 29 JARDIM, Afonso Silva. Direito Processual Penal. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 317.

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II.1. Do Julgamento de Exceo.

O Poder Judicirio no est autorizado a substituir a tica da legalidade por qualquer outra. No ho de ter faltado ticas e justias humanidade. Tantas ticas e justias quantas as religies, as culturas, os costumes em cada momento histrico, em cada recanto geogrfico. Muitas ticas, muitas justias. (...) A nica tentativa vivel, embora precria, de mediao entre ambas encontrada na legalidade e no procedimento legal, ou seja, no direito posto pelo Estado, este com o qual operamos no cotidiano forense, chamando-o direito moderno, identificado lei30.

De h muito, as crises democrticas tm permitido aos radicais,

desequilibrados e oportunistas escolher inimigos31: pessoas ou instituies

contra os quais pretendem impor, justificativa de subterfgios patriticos,

morais, ideolgicos ou econmicos, a lgica perversa de que os fins justificam

os meios.

Que no se busque paralelo perseguio poltica sofrida por

Luiz Incio Lula da Silva nos anais da histria forense brasileira. A procura ser

infrutfera. O Defendente vtima de verdadeira caada judicial empreendida

por agentes estatais que se utilizaram indevida e abusivamente de instrumentos

jurdicos para perseguir politicamente um cidado, buscando anular, uma a uma

e um a um, suas liberdades e seus direitos. Estes agentes da autoridade do

30 GRAU, Eros Roberto. Por que tenho medo dos juzes (a interpretao/aplicao do direito e os princpios). 7 ed. So Paulo: Malheiros, 2016, p. 174-5. 31 Eugnio Raul Zaffaroni acentua que, segundo Carl Schmitt, o inimigo no vem onticamente imposto, no um dado de fato que se impe ao direito, mas politicamente assinalado. Embora existam mitos anteriores, reconhece-se que se assinala o inimigo porque convm faz-lo. (...) Trata-se de uma identificao vazia de contedo, que o poder pode preencher a seu bel prazer, porque sempre necessita ter um inimigo. (O Inimigo no Direito Penal, Rio de Janeiro: Editora Revran, 2007, p.142).

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Estado desnaturaram o primado liberal do direito penal do fato e o substituram

pelo tirnico direito penal do autor; mesmo antes de iniciada a ao, o roteiro j

estava escrito e o desfecho determinado j se tinha o culpado e o veredito

restava a burocrtica encenao do processo com aparncia de legalidade.

Diga-se com todas as letras: o Defendente foi e est sendo

vtima de um julgamento de exceo. A concluso a que se chega de que o

regramento jurdico positivado no foi a ele aplicado. Seu julgamento no

seguiu regras ordinrias, mas sim um padro extraordinrio, irregular, que

variava conforme a necessidade de lhe impor toda a sorte de prejuzos.

Esse odioso estado excepcional de coisas foi desnudado em

deciso exarada pela Corregedoria do TRF-4, ao julgar recurso interposto no

processo administrativo n 0003021-32.2016.4.04.8000/RS, em que se

determinou o arquivamento do pedido de sano disciplinar ao juiz desta causa

pela divulgao de udios interceptados entre o ora Defendente e autoridades

com prerrogativa de funo, incluindo-se a a ento Presidente da Repblica

Dilma Rousseff. Impende transcrever trecho do voto condutor proferido pelo e.

Desembargador Federal RMULO PIZZOLATTI, acompanhado por 13 (treze) dos

14 (quatorze) magistrados:

Ora, sabido que os processos e investigaes criminais decorrentes da chamada "Operao Lava-Jato", sob a direo do magistrado representado, constituem caso indito (nico, excepcional) no direito brasileiro. Em tais condies, neles haver situaes inditas, que escaparo ao regramento genrico, destinado aos casos comuns. Assim, tendo o levantamento do sigilo das comunicaes telefnicas de investigados na referida operao servido para preserv-la das sucessivas e notrias tentativas de obstruo, por parte daqueles, garantindo-se assim a futura aplicao da lei penal, correto entender que o sigilo das comunicaes telefnicas (Constituio, art. 5, XII) pode, em casos excepcionais, ser

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suplantado pelo interesse geral na administrao da justia e na aplicao da lei penal. A ameaa permanente continuidade das investigaes da Operao Lava-Jato, inclusive mediante sugestes de alteraes na legislao, constitui, sem dvida, uma situao indita, a merecer um tratamento excepcional (destacou-se).

A deciso majoritria exemplifica o que se est a afirmar: os

Tribunais hierarquicamente superiores concederam a este Juzo verdadeiro

salvo conduto para que se descolasse do mbito da legalidade e ingressasse no

campo da excepcionalidade, sem que sofresse qualquer sano pelas solues

extraordinrias que reiteradamente foram adotadas. Nessa viso autoritria e

de exceo, a ordem constitucional passa a ser um mero detalhe acessrio...

Sobre a deciso, discorreu EUGNIO RAL ZAFFARONI:

Excepcionalidade foi o argumento legitimador de toda a inquisio da histria, desde a caa s bruxas at hoje, atravs de todos os golpes e ditaduras subsequentes. Ningum nunca exerceu um poder repressivo arbitrria no mundo sem invocar a necessidade e exceo32.

Destacam-se, a ttulo de exemplificao sobre o evidente estado

de exceo judicial que se instaurou contra o Defendente, os seguintes fatos:

(1) O repugnante episdio da sua conduo coercitiva, ocorrido

em 04.03.2016, no qual se buscou e conseguiu uma proposital condenao

miditica do Defendente, engendrada sob a aparncia de legalidade, justificada

pela falaz preservao da segurana pblica.

32 Disponvel em: Acessado em 15.11.2018.

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(2) O mencionado levantamento do sigilo das interceptaes

telefnicas, divulgados horas antes da nomeao do Defendente ao cargo de

Ministro Chefe da Casa Civil pela ento Presidente da Repblica, Dilma

Rousseff.

(3) A tramitao anmala da apelao criminal n 5046512-

94.2016.4.04.7000/PR, que foi julgada com celeridade recorde pelo TRF-4. A

imprensa identificou que (i) o recurso do Defendente foi o que mais rpido

chegou 2 instncia33, (ii) os votos do relator e revisor foram elaborados em

tempo quase trs vezes menor do que em outros casos da Lava Jato34, (iii) o

recurso passou frente da ordem de julgamento em relao a outros processos

da Operao Lava Jato35, (iv) soube-se que aps o seu recurso, o Tribunal

diminui acentuadamente o ritmo de julgamento de outras apelaes36, (v) tudo

isso aps o Presidente do Tribunal declarar imprensa que o recurso seria

julgado antes das eleies37 e que a sentena de primeira instncia era

tecnicamente irrepreensvel3839. Haveria alguma razo especial nessa anmala

cronologia?

33 Recurso de Lula foi o que mais rpido chegou 2 instncia (http://folha.com/no1912821). Acessado em 29.12.2018. 34 Relator d celeridade a recurso, e segunda instncia deve julgar Lula no 1 semestre de 2018 (https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2017/12/05/relator-da-celeridade-a-recurso-de-lula-no-trf-4.htm). Acessado em 29.12.2018. 35 Caso Lula passa frente de 7 aes da Lava Jato em tribunal (http://folha.com/no1948737). 36 Aps ao de Lula, TRF-4 reduz ritmo de julgamento de processos da Lava Jato (https://folha.com/z5bafkh4). Acessado em 29.12.2018. 37 Presidente de tribunal federal prev julgamento de processo contra Lula antes das eleies (https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/processo-contra-lula-sera-julgado-antes-das-eleicoes-diz-presidente-de-tribunal-federal.ghtml ). Acessado em 29.12.2018. 38 https://oglobo.globo.com/brasil/triplex-sentenca-de-moro-tecnicamente-irrepreensivel-diz-presidente-do-trf-4-21675452 - Acessado em 29.12.2018. 39 Sobre as declaraes do Presidente do TRF4, digno de destaque o artigo publicado por Lenio Streck, disponvel em: https://www.conjur.com.br/2017-ago-07/streck-presidente-trf-falar-sentenca-moro - Acessado em 29.12.2018.

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(4) No julgamento do HC 152.752/PR, que visava a afastar a

inconstitucional execuo provisria da pena imposta ao Defendente, o Ministro

Relator remeteu o feito ao Plenrio sob a justificativa de que seria necessrio

uniformizar a jurisprudncia da Corte quanto possibilidade dessa modalidade

de priso. A Presidente do Tribunal se negou a pautar tanto o julgamento do

writ como as Aes Declaratrias de Constitucionalidade n 43 e 44 (mais

recomendadas por se tratarem de aes de controle de constitucionalidade

concentrado). Aps forte insistncia, levou ao Colegiado o mandamus e no o

processo genrico. Embora o objetivo declarado da remessa ao Plenrio

houvesse sido a uniformizao da compreenso da Corte, o voto decisivo do

julgamento, que determinou a denegao da ordem, se pautou na posio

subjetiva da Ministra ROSA WEBER, que deixou entrever que votaria de maneira

distinta caso as aes de controle concentrado estivessem em mesa. Ou seja, se

fossem as Aes Declaratrias de Constitucionalidade n 43 e 44 o objeto de

julgamento, o Defendente no teria sido preso; se o processo houvesse sido

julgado pela Segunda Turma do Pretrio Excelso, no estaria preso; neste caso,

venceu a estratgia, perdeu o Estado de Direito. A Histria haver de julgar.

Pede-se vnia para colacionar trecho do voto do Ministro

Relator MARCO AURLIO nos autos do habeas corpus n 152.752/PR (grifos

nossos).

E o mais interessante que, se este habeas fosse julgado no rgo fracionado, como ocorreria normalmente, a ordem seria concedida. A perplexidade grande. [...] Em sntese, Presidente, e que isto fique nos anais do Tribunal: vence a estratgia, o fato de Vossa Excelncia no ter colocado em pauta as declaratrias de constitucionalidade. esta a concluso. [...] E nos defrontamos com quadro conflitante. O Tribunal indeferir a ordem neste habeas para, posteriormente por maioria escassa, certo, considerados

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os dois votos, do ministro Gilmar Mendes e da ministra Rosa Weber , julgar no sentido da constitucionalidade, pelo menos parcial, do artigo 283 do Cdigo Processo Penal. Ento passa-se a julgar o habeas corpus pela capa, no pelo contedo.

A frase do e. Ministro MARCO AURLIO corrobora com o que

se est a asseverar: julgou-se o procedimento pela capa. E aqui adicionamos:

julga-se a todo tempo os processos do Defendente pela capa, no pelo

contedo.

(7) Enfim, denegada a ordem em 04.04.2018, iniciou-se a to

esperada corrida pelo encarceramento do Defendente, antes mesmo de findar a

jurisdio do TRF-440. Desta feita, este Juzo expediu, em 05.04.2018, mandado

de priso em nome do Defendente, a qual foi efetivada no dia 07.04.2018. O

que no se sabia, poca, era que o Magistrado havia exigido ao Diretor Geral

de Polcia Federal o cumprimento da ordem de priso41, o que revela o

protagonismo deste Juzo enquanto garantidor do encarceramento aodado do

Defendente.

(8) Alcanado o encarceramento, era necessrio assegurar a

segregao do Defendente da sociedade. Assim, em 08.07.2018, o e.

Desembargador ROGRIO FAVRETO, investido de jurisdio, concedeu a ordem

do habeas corpus n 5025614-40.2018.4.04.0000 para reestabelecer a liberdade

do Defendente. Em aberrante episdio, diversas decises foram proferidas, de

40 Encontrava-se pendente de publicao o acrdo proferido nos autos dos embargos declaratrios opostos da apelao criminal. 41 Afirmou-se: Moro exigiu que a gente [a Polcia Federal] cumprisse logo o mandado. Disponvel em < https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2018/08/12/diretor-geral-da-pf-relata-detalhes-da-prisao-de-lula.htm > Acessado em 29.12.2018.

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ofcio inclusive, pelo antigo titular desta Vara, que se encontrava em frias

poca do fato , a fim de manter, a todo custo, a clausura do Defendente.

(9) Registra-se, ainda, o recente episdio ocorrido s vsperas

do primeiro turno das eleies presidenciais, em que o juiz titular desta Vara

Federal decidiu por divulgar parcela do acordo de delao premiada firmado

entre Antonio Palocci e a Polcia Federal, que apresenta relato incriminatrio do

Defendente, embora no possua qualquer credibilidade e respaldo probatrio42 43, em inegvel atuao com a finalidade de influir no processo eleitoral. Outra

vez o calendrio eleitoral...

As excepcionalidades s escaparo aos olhos daqueles que

fazem questo de no v-las. O rastro de arbitrariedades deixadas legar ao

Estado de Direito sua fragilizao e a impresso de que a supremacia da lei

(rule of law) foi substituda pela supremacia da fora; que a heterotutela como

forma de resoluo de conflitos foi trocada pela autotutela; enfim, que nesse

estado excepcional, no mais vence quem tem razo, pois nessa quadra tem

razo quem vence44.

A sada (se ainda existe) est no apego Constituio. A Carta

Cidad acima dos valores, justias e ticas particulares. Muitas ticas, muitas

justias, lembra o Ministro EROS GRAU. A nica legtima a tica da

legalidade.

42 https://oglobo.globo.com/brasil/delacao-de-palocci-tem-muita-fofoca-diz-procurador-21762571 > Acessado em 29.12.2018.. 43 https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/procuradoria-afirma-ao-trf-4-nao-haver-comprovacao-de-eficacia-de-delacao-de-palocci/ > Acessado em 29.12.2018.. 44 BOBBIO, Norberto. Se a lei ceder. As ideologias e o poder em crise. 4 ed. Braslia: Editora UnB, 1990, p. 97-98.

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Tempos estranhos em que defender a Ordem

Constitucional passou a representar um gesto revolucionrio, como bem

observou LENIO STRECK45, ou que garantir o seu cumprimento virou um

ato de coragem, como brada LUIS CARLOS VALOIS46.

As arbitrariedades aqui narradas conduzem nulidade do

presente julgamento por fora dos artigos 1, III (dignidade da pessoa humana),

5, caput (isonomia), XXXVII (vedao a juzo de exceo) e LIV (devido

processo legal).

II.2. Suspeio do Magistrado.

O Poder Judicirio, ao qual prpria a funo de pacificar as relaes sociais, converteu-se em catalizador de conflitos. No atributo do Poder Judicirio avaliar o relevo social e poltico de conversas captadas em interceptao e submet-las ao escrutnio popular. Ao faz-lo, o Judicirio abdica da imparcialidade, despe-se da toga e veste-se de militante poltico47.

Lembra CARNELUTTI48, com singular sagacidade, que quando

se diz que as partes esto perante um juiz para serem julgadas, j se

subentende que o juiz no uma delas.

45 https://www.conjur.com.br/2017-mar-09/senso-incomum-frase-faca-concurso-juiz-restou-processo-penal > Acessado em 29.12.2018. 46 https://reveronline.com/2018/08/26/cumprir-a-constituicao-atualmente-e-um-ato-de-coragem-do-juiz-luis-carlos-valois/ - Acessado em 29.12.2018. 47 Voto divergente do Des. Federal Rogrio Favreto no P.A. Corte Especial n 0003021-32.2016.4.04.8000/RS. TRF4. Relator Des. Federal Rmulo Pizzolatti, j. em 22/09/2016. 48 CARNELUTTI, Francesco. As Misrias do Processo Penal. Ed. Servanda, 2016. p. 47.

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No h como negar: um dos principais requisitos, seno o mais

crucial, para a devida prestao jurisdicional a imparcialidade do julgador,

que possui dupla funo: assegurar o direito do cidado de ser submetido um

processo justo e conferir credibilidade funo jurisdicional. O juiz que julga com

imparcialidade aquele deixa de lado suas prprias consideraes subjetivas,

exercendo a atividade jurisdicional despido de preconceitos49. Assim, o julgador

no pode possuir qualquer interesse geral ou particular na soluo da

controvrsia50. A ateno estrita ao dever de imparcialidade garante

legitimidade atuao do magistrado51.

Conforme nos ensina PEDRO ARAGONESES ALONSO, a

imparcialidade do rgo jurisdicional um princpio supremo do processo e,

portanto, imprescindvel efetivao do devido processo legal52.

A imparcialidade do juiz direito fundamental que visa a

assegurar que todo cidado seja submetido a um processo justo. Apesar de no

estar expressamente prevista na Carta Fundamental, garantia constitucional

que decorre do respeito ao devido processo legal (art. 5, LIV da CF), ao

contraditrio e ampla defesa (art. 5, LV, da CF) e que assegura a presuno

49 FERREIRA DA ROCHA, Slvio Lus. A imparcialidade do juiz. In: ZANIN MARTINS, Cristiano; TEIXEIRA ZANIN MARTINS, Valeska; VALIM, Rafael (Coord.). O caso Lula: a luta pela afirmao dos direitos fundamentais no Brasil. So Paulo: Editora Contracorrente, 2017, p. 164. 50 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razo: Teoria do Garantismo Penal. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 534. 51 DE PASSOS, J. J. Calmon, A formao do convencimento dos Magistrados e a Garantia Constitucional de Fundamentao das Decises, conferncia proferida em 11.05.2001, no Simpsio de Direito Civil e Direito Processual Civil promovido pelo Instituto de Ensinos Jurdicos, Rio de Janeiro, apud REIS FRIEDE, Vcios de Capacidade subjetiva do julgador: Do Impedimento e da Suspeio do Magistrado, Editora Forense, 5 edio, p. 07. 52 ARAGONESES ALONSO, Pedro. Proceso y Derecho Penal. Madrid: Editorial de Derecho Reunidas AS, 1997, p.127.

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de inocncia, enquanto regra de tratamento e probatria, da pessoa acusada (art.

5, LVII, da CF).

Ressabido que a imparcialidade do juiz princpio

expressamente consagrada por diplomas, tratados e convenes internacionais

sobre direitos humanos das quais o Brasil signatrio53.

O Supremo Tribunal Federal apresentou conceito de

imparcialidade no julgamento do paradigmtico habeas corpus n 95.009/SP:

(...) [Imparcialidade] expresso da atitude do juiz em face de influncias provenientes das partes nos processos judiciais a ele submetidos. Significa julgar com ausncia absoluta de preveno a favor ou contra alguma das partes. Aqui nos colocamos sob a abrangncia do princpio da impessoalidade, que a impe.54

Neste julgamento, o Ministro Decano da Suprema Corte,

CELSO DE MELLO, manifestou-se da seguinte forma sobre tal garantia:

exatamente o Direito Fundamental de qualquer pessoa, independentemente da

natureza do delito que lhe haja sido imputado, de ser julgada por um juiz ou

por um tribunal imparcial. Essa uma prerrogativa bsica, essencial.

53 Declarao Universal dos Direitos Humanos Artigo X. Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pblica audincia por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusao criminal contra ele. Pacto Internacional de Direitos Civis e Polticos Artigo 14.1. Todas as pessoas so iguais perante os tribunais e as cortes de justia. Toda pessoa ter o direito de ser ouvida publicamente e com devidas garantias por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei (...). Conveno Americana sobre Direitos Humanos Artigo 8.1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razovel, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei (...). 54 HC 95009/SP, Rel. Min. Eros Grau, Plenrio, julgado em 06/11/2008, publicado em 19/12/2008.

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Conforme NUCCI disserta, o juiz que perde sua imparcialidade

vicia o processo e d causa arguio de sua suspeio (grifos nossos):

(...) no se pode deixar a credibilidade da Justia nas mos da elevao do carter do julgador, que, realmente segundo cremos, a maioria possui, mas no todos. No correto permitir-se que uma das partes assiste, inerte e vencida de antemo, o juiz amicssimo do representante da parte contrria conduzir a causa ou, em caso de inimizade capital, veja-se obrigada a lanar mo de toda sorte de recursos para combater os atos decisrios do magistrado, eivados, no seu entender, de parcialidade. 55

Relevante a ponderao do Presidente do Superior Tribunal de

Justia, Ministro JOO OTVIO NORONHA, segundo o qual o Juiz no

combatente de crime nenhum. Se for, assume papel de polcia ou Ministrio

Pblico, vira parte do processo e perde independncia56.

Ao analisar o fenmeno da multiplicao dos juzes que se

comprometem com o discurso do combate corrupo, o Desembargador

Federal da 1 Regio, NEY BELLO, enderea eloquente crtica figura do juiz

combatente, identificando nessa construo um apelo autoritrio apto a

comprometer a imparcialidade dos Juzes. Nota-se, a propsito, que parte

dos fatos citados em seu artigo-manifesto se sucedeu justamente na relao

entre o Defendente e este Julgador. Leia-se:

(...) no raro percebemos invases de competncia, interpretaes retorcidas da lei, arbitrariedades na execuo de decises, personalismos em se tratando de rus especficos, desrespeito e inconformismo com decises de instncia superior, criticas pessoais ao prprio integrante do Judicirio que discordante Tudo isso consequncia da posio apaixonada que se revela

55 NUCCI, Guilherme de Souza. Cdigo de processo penal comentado. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 652. 56Ministros criticam juzes que decidem baseados na moralidade. Disponvel em: .

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quando o juiz deixa a sua funo e se torna combatente. a negativa do prprio conceito de magistrado que se oferece socie