Alguns dedos de Prosa: conversando sobre Psicologia, Educação Ambiental, Cultura da ... ·...

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5/2/2012 | Maristela Barenco Corrêa de Mello | (24) 2237-5801 Alguns dedos de Prosa: conversando sobre Psicologia, Educação Ambiental, Cultura da Paz e Espiritualidade Este Informativo é uma publicação quinzenal dedicada a Educadores, cujos conteúdos são de inteira responsabilidade da autora. Seu objetivo é formativo: oferecer subsídios e reflexões em Psicologia, Educação Ambiental, Cultura da Paz e Espiritualidade, e renovar o propósito rumo a uma educação transformadora. Wabi Sabi: o desafio de se aprender com a arte da beleza imperfeita Um conceito fundamental no seio de uma Educação Ambiental emancipadora é o de estética. A tarefa de transformação – seja de nós mesmos, de nossos valores, de nossas formas de ver, nossos modos de nos relacionar com a vida, de nosso mundo -, não pode estar calcada em num ideário mecanicista, de fabricação e produção em série, mesmo em relação aos projetos considerados mais importantes coletivamente. Transformação tem a ver com criação, com arte, com ateliê, com singularidade. Daí a importância de uma dimensão estética. O paradigma da modernidade não apenas reduziu nosso horizonte estético, mas impôs um modelo hegemônico e homogêneo daquilo que é belo e deve ser perseguido como valor fundamental. Trazendo para nossas vidas, equivale a dizer que não só nos acostumamos com as paisagens urbanas consideradas feias – os lixos espalhados nas ruas, as paisagens de concreto, a pichação nos muros, a poluição dos rios -, como estamos sendo alfabetizados em um padrão estético que, longe de constituir-se apenas em cenários do cotidiano, modelam nossas formas de sentir, de ser e de nos relacionar. Precisamos estar atentos à dimensão ética que toda estética delineia, e à dimensão sociopolítica enunciada por toda proposição espacial. O cenário proposto pela modernidade está comprometido, de forma subliminar e irrestrita, com alguns conceitos filosóficos e modeladores de um tipo subjetividade em detrimento de muitos outros. Um dos principais é a noção de tempo, ou melhor, é o ideal de um eterno presente, de uma contemporaneidade soberana. Isto se traduz na avidez que temos pelo nosso tempo, por aquilo que é novo e inovador, por simetria, por objetos e cenários lineares e considerados “clean”, pela obsessão com a idade e com um corpo sem rugas e qualquer marca de envelhecimento, Boletim No. 12, Ano I

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5/2/2012 | Maristela Barenco Corrêa de Mello | (24) 2237-5801

Alguns dedos de Prosa:

conversando sobre Psicologia,

Educação Ambiental, Cultura

da Paz e Espiritualidade

Este Informativo é uma

publicação quinzenal dedicada

a Educadores, cujos conteúdos

são de inteira responsabilidade

da autora. Seu objetivo é

formativo: oferecer subsídios e

reflexões em Psicologia,

Educação Ambiental, Cultura

da Paz e Espiritualidade, e

renovar o propósito rumo a

uma educação transformadora.

Wabi Sabi: o desafio de se aprender com a arte

da beleza imperfeita

Um conceito fundamental no seio de uma Educação Ambiental emancipadora

é o de estética. A tarefa de transformação – seja de nós mesmos, de nossos valores, de

nossas formas de ver, nossos modos de nos relacionar com a vida, de nosso mundo -,

não pode estar calcada em num ideário mecanicista, de fabricação e produção em série,

mesmo em relação aos projetos considerados mais importantes coletivamente.

Transformação tem a ver com criação, com arte, com ateliê, com singularidade. Daí a

importância de uma dimensão estética.

O paradigma da modernidade não apenas reduziu nosso horizonte estético,

mas impôs um modelo hegemônico e homogêneo daquilo que é belo e deve ser

perseguido como valor fundamental. Trazendo para nossas vidas, equivale a dizer que

não só nos acostumamos com as paisagens urbanas consideradas feias – os lixos

espalhados nas ruas, as paisagens de concreto, a pichação nos muros, a poluição dos rios

-, como estamos sendo alfabetizados em um padrão estético que, longe de constituir-se

apenas em cenários do cotidiano, modelam nossas formas de sentir, de ser e de nos

relacionar. Precisamos estar atentos à dimensão ética que toda estética delineia, e à

dimensão sociopolítica enunciada por toda proposição espacial.

O cenário proposto pela modernidade está comprometido, de forma

subliminar e irrestrita, com alguns conceitos filosóficos e modeladores de um tipo

subjetividade em detrimento de muitos outros. Um dos principais é a noção de tempo,

ou melhor, é o ideal de um eterno presente, de uma contemporaneidade soberana. Isto

se traduz na avidez que temos pelo nosso tempo, por aquilo que é novo e inovador, por

simetria, por objetos e cenários lineares e considerados “clean”, pela obsessão com a

idade e com um corpo sem rugas e qualquer marca de envelhecimento,

Boletim No. 12, Ano I

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energizante e de purificação, precisa ser

escondida. Esteticamente é deselegante

expor ao varal as roupas que usamos. Ainda

que os corpos possam ser exibidos, de todas

as formas, até as mais vulgares, as peças

íntimas de uma família não podem ser

mostradas. Seca-se a roupa às escondidas,

muitas vezes em locais inadequados. Outro

exemplo pode ser encontrado nas cozinhas

da modernidade. As mais antigas eram

espaços privilegiados de reunião da família.

Eram oficinas de experimentação, de

trabalho artesanal, expressão de vida. No

interior, ao redor de um fogão à lenha, nas

noites frias, as famílias se encontravam. Não

sou do interior, mas minha memória olfativa

pela artificialidade dos modos de ser, pelo

esvaziamento das dimensões da existência,

pela efemeridade nos modos de consumir.

Alguns exemplos podem expressar

melhor esta tendência. Moro numa região

serrana de expansão de grandes

empreendimentos imobiliários que atendem às

classes média e alta dos centros urbanos. Nos

condomínios em questão, persevera uma

ditadura estética: os latões de lixo são

padronizados, as casas e jardins precisam

seguir um padrão de acabamento e sofisticação

e, o mais interessante, a meu ver: não se

podem exibir varais de roupas. A prática dos

antigos de lavar as roupas e quará-las (clareá-

las) ao sol e ao vento, numa perspectiva

Tal estética é um convite para engendrarmos, em nossos processos educacionais, a

simplicidade, a rusticidade, o cotidiano, o artesanal, o imperfeito e o impermanente, seja no

pensar, no refletir, no fazer.

recorda-se do cheiro de janta que exalava da cozinha da minha avó em todos os finais

de tarde: eram vestígios de vida! Atualmente muitas cozinhas são espaços apenas

decorativos: frios, desérticos, artificiais, cuja estética e assepsia não comporta a feitura

de alimentos, e onde cozinhar significa, para alguns, muito trabalho e sujeira. Nesta

perspectiva, a estética da casa é a da vitrine, onde um conjunto de objetos prontos, de

consumo impessoal, está disposto e equivalem a troféus de acesso a uma

modernidade idílica. Mas em tudo deve haver a negação da passagem do tempo e da

vida, que sempre deixa muitas marcas, e da proximidade com os elementos naturais...

De fato, a modernidade instaurou um modelo de tempo no qual estamos

sempre em débito. Quarar roupas, fazer janta todos os dias são afazeres para os quais

não temos mais tempo. Mas o sequestro do tempo vai muito além deste cotidiano.

Porque o tempo que não tenho para tais afazeres, sou obrigada a ter para ficar nas

filas de banco, no trânsito diário dos grandes centros, na vistoria de um carro, como

fiquei ontem, exatamente por três horas! E na correlação de valores, o tempo dos

afazeres da casa, que a modernidade “produziu” como desqualificado, potencialmente

tem muito mais vida do que o tempo cronológico a que somos submetidos

diariamente, “produzido” como valoroso. Temos opções de escolha?

Em contraponto a esta lógica, há uma filosofia milenar inspirada na

observação da natureza, que pode refecundar o nosso modo de compreender a vida,

os nossos espaços e as práticas de educação ambiental. É uma concepção estética, de

inspiração japonesa, chamada Wabi Sabi. Ela surge na periferia de um tempo,

contrapondo-se à emergência de uma ostentação por parte da nobreza e dos líderes

militares, pelos monges e sacerdotes orientais, ganhando expressão na chamada

cerimônia do chá, onde os utensílios eram feitos de cerâmicas artesanais queimadas

por horas, em fornos, sempre irregulares e por objetos talhados de bambu. Sua prática

era a da extrema atenção e delicadeza. Mais tarde, tal filosofia irá inspirar o budismo

Sugestões de Leituras

DENÓRIO, Darcy França. Cora Coralina. Seleção. Coleção Melhores Poemas. São Paulo: Global Editora, 2004, 358 p. Uma forma única de fazer poesia. Olhar para a vida e o cotidiano. Aí, avistar o que há de mais miúdo, desprezado, imperceptível, sofrido. Olhar sensivelmente. Transformar sensibilidade em escrita poética. É isso que Cora Coralina nos proporciona ao poetizar o processo de sua própria vida. Ela cria arranjos entre monturos de lixo e ouro, entre muros e avencas, entre casebres e becos, entre jasmineiros e quintais, entre rios e lavadeiras, entre sofrimento e superação. Conhecer seus versos é visitar sua terra, Goiás, e beber nas fontes da esperança: seu sonho de ser escritora e ter seu primeiro livro publicado é realizado quando ela tinha 75 anos. Para Cora, a escrita é emancipação! Seus versos emocionam. Vale à pena conhecer seus versos!

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b

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Sugestões de Filmes

Reinaldo José de Lima

([email protected])

Primeiramente gostaria de agradecer o convite da querida amiga Maristela para fazer parte desta ideia cheia de informação, reflexão e acima de tudo sensibilidade, uma característica peculiar da nossa Stela. A proposta aqui será a de trazer pequenas sinopses e indicações de filmes de nacionalidades diferentes com o objetivo de possibilitar interações variadas com a imagem e as narrativas cinematográficas. Espero que gostem.

Nosso primeiro filme chama-se VERMELHO COMO O CÉU (2006), produção italiana, dirigida por Cristiano Bortone e que narra a vida de Mirco, um garoto de 10 anos de idade que vive na região da Toscana e é apaixonado por cinema. Após um acidente perde a visão e, rejeitado pela escola pública, é enviado para um instituto para cegos na cidade de Gênova. É neste ambiente, após a descoberta de um gravador, que começa a criar histórias sonoras que mudarão sentidos e paradigmas. Realizado com extrema sensibilidade – algo muito peculiar no cinema italiano – “VERMELHO COMO O CÉU”, traz a superação como possibilidade sempre real e por isso envolve o espectador de maneira única – assim como qualquer ser humano – diante das transformações, sejam elas vistas das mais variadas formas. Para finalizar, um pequeno registro para quem curte as curiosidades que envolvem as narrativas cinematográficas: a história do filme é baseada na vida real de Mirco Mencacci, um renomado editor de som da indústria cinematográfica da Itália – o elemento que faltava para se envolver de vez com o filme. Até a próxima.

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Sugestões de Atividades

Oficina do Pão Colocar literalmente as

mãos na massa. Compreender que

fazer é uma forma de conhecer. Atuar

em grupo. Preparar o alimento que

será coletivamente partilhado.

Pesquisar sobre os ingredientes e

sobre modos de fazer com os

familiares. Estudar a trajetória do pão,

seu significado simbólico, bíblico,

sagrado. Obedecer ao tempo da

fermentação. Observar o pão crescer.

Levar ao forno. Aguardar. Ver a

transformação. Preparar uma mesa

bonita, com toalha e flores. Refletir

sobre todas as fases do processo.

Degustar o pão partilhado em clima

de celebração.

Normalmente, nas Escolas,

há muitas tarefas práticas e

artesanais, mas nem todas refletidas.

Fazer por fazer não é algo educativo.

Trabalhar artesanalmente

compreendendo que isso também é

uma tecnologia, obedecer aos ritmos

dos processos, não se impacientar

com a espera, encantar-se com os

processos que envolvem natureza-

trabalho-processo é uma atividade

muito importante. Mais ainda se for

interdisciplinar, envolvendo vários

momentos, professores, disciplinas.

Precisamos resgatar

urgentemente a mística do trabalho

criativo, simbólico, que gera vida e a

faz prosperar na perspectiva da

abundância emocional e material.

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zen.

A filosofia Wabi Sabi significa a arte da beleza imperfeita e tem como finalidade

evidenciar uma estética que emerge da imperfeição, da assimetria, da rugosidade, da

austeridade, da passagem do tempo, da simplicidade dos objetos e modos de viver, nos

elementos naturais e disponíveis. Nesta filosofia minimalista, menos é mais, e a

simplicidade e a autenticidade são valores imprescindíveis. É a conjugação entre o

simples, o rústico, o fresco (Wabi), que sugere a eliminação do supérfluo, e o

impermanente, a serenidade daquilo que atravessa o tempo e se desgasta, o que

necessita de reparos (Sabi), que sugere um apaziguamento com a passagem da

temporalidade.

Para os precursores deste pensamento, os “wabibitos”, a casa era, sobretudo,

um santuário, e os objetos eram testemunhas da própria vida, repletos de significados.

Sua escolha se dava em função de sua utilidade, de sua beleza ou de o seu significado

sentimental. Mas os objetos eram expressão de escolhas e não determinações de um

mercado. Para os wabibitos, as casas não são lugares de perfeição, mas locais onde deve

se concentrar a beleza natural, para que a vida prospere. Daí a ênfase na eliminação de

ruídos, na iluminação natural e no gosto pelas formas irregulares.

Tenho na minha casa um banco herdado da minha infância. Para ser precisa,

não herdei nada. Foi sendo deixado ao longo das mudanças. Ele é azul, mas possui várias

cores que se descortinam em seus descascados. Já foi cor de madeira, já foi azul claro e

vermelho também. É um banco forte e vem, bravamente, atravessando as gerações. Vez

por outra alguém me diz: “que banco feio... por que não o pinta?” As pessoas veem-no

como um sinal de desleixo. Mas não entendem que aquele banco e eu conversamos. Que

ele me conta, sem precisa falar, de muitos acontecimentos, histórias e tramas. E é assim

que pretendo deixá-lo no passar deste tempo... Assim é em toda a vida: a passagem da

temporalidade deixa marcas em tudo o que existe. E tudo o que existe retrata a

passagem do tempo. Nossos fios de cabelos brancos, que ojerizam a muitos, contam

histórias, registram transformações, amadurecimentos, aquisições. Nossas marcas e

rugas também. Se quisermos viver longos anos, precisamos entender que o tempo causa

desgastes... que este processo pode ter um encantamento.

A estética Wabi Sabi é uma forma de conceber poesia e beleza a este processo.

É a arte de trazer contrastes para dentro da vida, para que estes expandam nossas

singularidades. Há muitas outras artes. Cora Coralina, por exemplo, fazia poesia dos

muros velhos de sua Cidade, que “cochichavam” uns com os outros e sobre os quais o

tempo plantava avencas... Tal estética é um convite para engendrarmos, em nossos

processos educacionais, a simplicidade, a rusticidade, o cotidiano, o artesanal, o

imperfeito e o impermanente, seja no pensar, no refletir, no fazer. Para além da

temporalidade, temos gerado, como culturas, processos sociais e históricos de muita

imperfeição, assim como modos relacionais que necessitam de muitos “reparos”. É

preciso olhar com amorosidade esta esquizofrenia que se alimenta da simetria e da

perfeição e produz assimetrias e imperfeições. A estética Wabi Sabi nos ensina que

precisamos aprender a contemplar o que produzimos com realismo e com esperança.

Afinal, a tesssitura que queremos construir é feita da complexidade de muitos fios: aquilo

que foi, aquilo que é, aquilo que não devia ter sido, aquilo que pode vir a ser, aquilo que

não sabemos ainda...

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Sugestões de Filmes

Reinaldo José de Lima

([email protected])

Primeiramente gostaria de agradecer o convite da querida amiga Maristela para fazer parte desta ideia cheia de informação, reflexão e acima de tudo sensibilidade, uma característica peculiar da nossa Stela. A proposta aqui será a de trazer pequenas sinopses e indicações de filmes de nacionalidades diferentes com o objetivo de possibilitar interações variadas com a imagem e as narrativas cinematográficas. Espero que gostem.

Nosso primeiro filme chama-se VERMELHO COMO O CÉU (2006), produção italiana, dirigida por Cristiano Bortone e que narra a vida de Mirco, um garoto de 10 anos de idade que vive na região da Toscana e é apaixonado por cinema. Após um acidente perde a visão e, rejeitado pela escola pública, é enviado para um instituto para cegos na cidade de Gênova. É neste ambiente, após a descoberta de um gravador, que começa a criar histórias sonoras que mudarão sentidos e paradigmas. Realizado com extrema sensibilidade – algo muito peculiar no cinema italiano – “VERMELHO COMO O CÉU”, traz a superação como possibilidade sempre real e por isso envolve o espectador de maneira única – assim como qualquer ser humano – diante das transformações, sejam elas vistas das mais variadas formas. Para finalizar, um pequeno registro para quem curte as curiosidades que envolvem as narrativas

Fundação Projeto Pereyra (Argentina):

Com amor ou com medo? Uma escolha

em Educação Ambiental

Desde que começamos a trabalhar com Educação Ambiental,

há uns 20 anos, deparamo-nos com um panorama ambiental cada vez

mais degradado, mais contaminado, mais arrasado. Digamos, então,

que poderíamos ter apenas más notícias para dar: a água de rios,

córregos e aquíferos envenenados com poluentes industriais, a

devastação da terra pelas monoculturas e seus agrotóxicos associados,

camponeses sendo expulsos de suas terras, o desmatamento de

milhões de florestas e matas nativas, grandes mineradoras a céu aberto

destruindo montanhas e contaminando geleiras e rios, provocando

secas e inundações. E a lista poderia seguir... Contudo, estamos

convencidos de que apenas a informação a respeito desta realidade não

é suficiente para que as pessoas tenhamos a consciência do Todo do

qual somos parte e então possamos compreender o mundo de relação

em que estamos imersos e possamos modificar nossos costumes, e

formas de fazer, de modo que freiem, revertam e remedeiem ou evitem

os desastres ambientais que cada dia visualizamos com mais recorrência

e mais próximos. E mais, poderíamos dizer que, em muitos casos,

resulta contraproducente “bombardear” com problemas ambientais,

sobretudo, às crianças pequenas. E também aos adolescentes e aos

adultos, quando estão em situações emocionais de muito estresse ou

desconexão com a Natureza. Pode acontecer que o resultado, ao

contrário do que esperávamos, seja o desinteresse, o isolamento, a

angústia, uma sensação de impotência, em que tudo se torna grande e

é preferível ignorar o tema e seguir como se nada se passasse. Assim é

com todas as emoções que tem por fundamento o medo. É uma decisão

que devemos tomar como educadores: queremos investir com nossa

prática um mundo de amor ou um mundo de medo? Para que

tenhamos tal resposta é necessário que revisemos nossas formas de

trabalhar, as ferramentas que elegemos e também o que poderíamos

chamar de “currículo oculto”, isto é, todas estas coisas que ensinamos

através da forma de ensinar, do estilo de comunicação que geramos no

grupo, as atitudes de “recompensa”, o exemplo da coerência (ou não)

que damos nós mesmos, entre outras coisas. Tudo isso que “ensinamos

enquanto ensinamos” e que as crianças e jovens “aprendem enquanto

aprendem” é uma forma de VER o mundo, uma forma de nos

RELACIONARMOS conosco e com todo Outro (os outros nossos pares,

os outros distintos de nós, o outro a Natureza e todas suas formas de

vida).

Encontramo-nos, então, frente a um dilema: como abordar

efetivamente nossa tarefa como educadores ambientais, objetivando

transmitir uma visão realista do que acontece e que seja

suficientemente esperançosa para nos entusiasmar e nos comprometer

Sugestões de Filmes

Reinaldo José de Lima

([email protected])

Que bom iniciarmos mais um ano de reflexões e ideias

neste espaço tão especial como este informativo. Para começarmos

escolhi um belíssimo documentário lançado em 2010 (também

disponível em DVD), que narra as experiências/vivências do artista

plástico brasileiro Vik Muniz em meio aos catadores de material

reciclável em um dos maiores aterros sanitários do mundo: o

Jardim Gramacho, na periferia do Rio de Janeiro. Dirigido por Lucy

Walker e co-dirigido pelo também muito competente João Jardim, o

filme acompanha o processo de produção do trabalho do artista

plástico desde sua própria história de vida até a sua inserção no

Jardim Gramacho, onde seleciona alguns catadores para

participarem do projeto. A partir das fotos dessas pessoas Muniz

começa a compor - junto com os catadores - imensos painéis com

material coletado diretamente no aterro. Belas e surpreendentes

composições surgem a partir do contato de cada um dos catadores

e consequentemente transformações de várias ordens ocorrem a

partir de então. Os melhores momentos do documentário – para os

olhares mais críticos – são justamente os que mostram esse

processo de interação sobre como a arte é capaz de mudar as

pessoas de forma tão profunda e sensível. Quando nos deparamos

com estes momentos, fica claro a força do trabalho ali realizado –

mesmo que o espectador não concorde com alguns elementos do

documentário do ponto de vista de produção apenas. Mas quando o

assunto é arte, a tela se abre para declarações, testemunhos, relatos

tão fortes que definitivamente não tem como não se emocionar.

Nesta primeira semana de aula propus um trabalho de leitura

dessas imagens com meus alunos do 5º ano. Todos meninos com

um olhar apurado para as imagens, já que vem se tornando um

hábito esse tipo de interação para eles. E dentre os muitos relatos e

opiniões expressas, após o filme, um, em especial, em muito me tocou. Foi quando J.V. (09 anos), que disse com os olhos brilhantes:

“nossa, como a arte pode modificar as pessoas!”. J. V. está certo e o

filme mostra isso de forma surpreendente. Vale a pena conferir!

Abraços e boas vibrações de retorno a tod@as!

VOCÊ SABIA?

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no trabalho de desconstrução e construção de um mundo mais justo, saudável e feliz?

Nossa forma de ir resolvendo tal dilema tem sido através do trabalho sobre as

“raízes” dos problemas ambientais. Cremos que nestas raízes encontramos uma divisão

e um “desengajamento” que nos separou da Natureza, que a coisificou e a colocou ao

nosso serviço; separou-nos também de nossos sentimentos e nossa intuição e colocou a

razão e certa forma de conhecimento sobre todas as demais, separando-nos da vivência

comunitária e nos lançando em uma corrida individual para que nos tornássemos

“melhores”. Este “desengajamento” foi-nos separando da terra que pisamos e foi-

nos inserindo em um tempo que, de tão veloz, estagna-nos em um eterno presente.

Então, fazer Educação Ambiental, para nós, é trabalhar no “retorno do

desengajamento”, como diria Eloísa Trellez Solís (doutora em educação ambiental e

física).

Poder recuperar nosso vínculo com os ciclos e processo da Natureza, dando-

lhe valor em si mesmo, para além da “utilidade” que tenha, ou não como “recurso”.

Integrar nossos sentimentos e nossa intuição como fontes válidas, gerar um diálogo

entre diferentes formas de conhecimento, revalorizando os saberes locais e o

conhecimentos ancestrais, e desfrutando da arte como forma de expressão humana.

Facilitar processos de cooperação, em vez dos processos de competição, abrir canais

para que interajam distintos atores da comunidade, vizinhos, instituições. Partir sempre

da experiência vivida, próxima, do cotidiano, do que está ao alcance “de nossas próprias

mãos”, de forma que também nos seja possível ser parte da história de sua

transformação. Respeitar os tempos nos processos grupais e na própria vida, na

Natureza, como uma forma de voltarmos a dançar juntos ao ritmo da Vida. E quando

estivermos trabalhando com crianças pequenas precisamos não sobrecarregá-las com

decisões que estão fora de seu alcance, e se uma problemática ambiental se apresenta

na comunidade, devemos abordá-las juntamente com os adultos envolvidos, não

somente com as crianças.

É um dilema que professores de diferentes lugares nos contam: o que fazer

quando a escola é afetada ambientalmente por algum empreendimento (monocultura

florestal, mineração, fábrica que gera poluentes tóxicos) que é, ao mesmo tempo, a

fonte de trabalho dos pais dos alunos?

É necessário encontrar as “brechas” a partir de onde se pode semear a

esperança e oferecer, assim, alternativas, para poder sair da dualidade de “ou nós

morremos de fome ou morremos contaminados”, e também sair da impotência gerada

por aqueles que sentem que quem tem o poder econômico tem o poder de decidir

sobre a vida de todos. Trabalhar em rede com outras pessoas, grupos e instituições.

Conhecer e divulgar experiências de outras comunidades que têm encontrado

alternativas ou que têm culturalmente outra forma de compreender os mesmos temas.

Expressar-se através da arte. Evitar as explicações em termos de “bons e maus”. E usar o

jogo, o bom humor e a ternura, como meios para compreender a complexidade a qual

somos parte... São algumas opções que temos para adentrarmos no caminho de fazer

uma Educação Ambiental que nos permita construir a partir do amor e não a partir do

medo. Queremos agradecer a partir destas páginas a tantas e tantos educadores que,

sozinhos, em suas comunidades, encontram, a cada dia, criativamente, um caminho

alternativo para ser parte desta fase de transformações que nos estimula a mudar a

partir da alegria e do amor.

Fotografias:

1) Balde de madeira com flores naturais e

artificiais, 2012

2) Comunidade em Laguna de Rocha,

Uruguai, 2007

3) Oficina do Pão com alunos do Instituto

de Formação Professor Ismael

Coutinho, em Niterói (RJ), pela Profa.

Marisol Barenco Corrêa de Mello, 2011

4) Rosa do jardim da casa de Hélcio e

Mariluci, 2011

Maristela Barenco

Corrêa de Mello

(24) 2237-5801 [email protected]