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Análise Econômico-financeira CBB – ano base 2011 A Confederação Brasileira de Basquetebol encerrou o ano de 2011 em uma situação econômico-financeira ruim e pior do que 2010 (que já não era boa) em praticamente todos os itens relevantes. Para a análise ficar mais completa, vamos separá-la em cinco grandes pontos, considerando o ano de 2011 e comparando com os dois anos imediatamente anteriores, quando necessário. 1. Ajustes contábeis Apesar do ótimo nível de contabilidade e evidenciação das informações, neste ano os balanços ficaram um pouco confusos e um ajuste precisou ser feito para fins de análise. Tal procedimento é relativamente comum, pois a visão de um analista é diferente da visão interna de uma empresa. O ajuste refere-se ao expressivo aumento no valor do imobilizado da CBB e, olhando a explicação sobre isto, encontrei que três imóveis foram ajustados a valor de mercado, provocando um aumento de quase 2 milhões no ativo. Tal fato não é mais permitido pelas leis brasileiras e, embora isto não caracterize nenhum desvio de dinheiro, ou coisa assim, não é mais permitido por levar o analista a uma falsa sensação de melhora nas contas. Sendo assim, este aumento será desconsiderado para fins de análise. Este ajuste produz alterações contábeis, ficando o novo balanço patrimonial expresso da seguinte forma (resumido, claro): ATIVO Valores Originais Valores Reclassifi cados PASSIVO E PATRIMôNI O LÍQUIDO Valores Originais Valores reclassif icados Ativo Circulant e 2.456.953 2.456.953 Passivo Circulant e 7.061.590 7.061.590 Ativo não Circulant e 3.564.403 1.541.114 Passivo não Circulant e 2.510.034 2.510.034 Patrimôni o Líquido - 3.550.268 - 5.573.558 Total 6.021.356 3.998.067 Total 6.021.356 3.998.067

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Análise Econômico-financeira CBB – ano base 2011

A Confederação Brasileira de Basquetebol encerrou o ano de 2011 em uma situação econômico-financeira ruim e pior do que 2010 (que já não era boa) em praticamente todos os itens relevantes. Para a análise ficar mais completa, vamos separá-la em cinco grandes pontos, considerando o ano de 2011 e comparando com os dois anos imediatamente anteriores, quando necessário.

1. Ajustes contábeis

Apesar do ótimo nível de contabilidade e evidenciação das informações, neste ano os balanços ficaram um pouco confusos e um ajuste precisou ser feito para fins de análise. Tal procedimento é relativamente comum, pois a visão de um analista é diferente da visão interna de uma empresa.

O ajuste refere-se ao expressivo aumento no valor do imobilizado da CBB e, olhando a explicação sobre isto, encontrei que três imóveis foram ajustados a valor de mercado, provocando um aumento de quase 2 milhões no ativo. Tal fato não é mais permitido pelas leis brasileiras e, embora isto não caracterize nenhum desvio de dinheiro, ou coisa assim, não é mais permitido por levar o analista a uma falsa sensação de melhora nas contas. Sendo assim, este aumento será desconsiderado para fins de análise. Este ajuste produz alterações contábeis, ficando o novo balanço patrimonial expresso da seguinte forma (resumido, claro):

ATIVO Valores Originais

Valores Reclassificados

PASSIVO E PATRIMôNIO LÍQUIDO

Valores Originais

Valores reclassificados

Ativo Circulante

2.456.953 2.456.953 Passivo Circulante

7.061.590 7.061.590

Ativo não Circulante

3.564.403 1.541.114 Passivo não Circulante

2.510.034 2.510.034

Patrimônio Líquido

- 3.550.268 - 5.573.558

Total 6.021.356 3.998.067 Total 6.021.356 3.998.067

2. Déficit

O déficit (que é o equivalente a prejuízo se a CBB fosse uma empresa privada) é muito grande, crescente e preocupante. Analisando a Demonstração de Resultados, percebe-se que há a separação por fontes de recursos, o que é bastante interessante para análise.

O déficit total da CBB foi de R$ 2.617.402. Este número fica ainda maior quando comparado com os outros anos. Em 2009, o déficit foi de R$ 1.304.908 e em 2010 de R$ 2.309.974.

Agora, um dado interessante. Normalmente, quando o déficit aumenta é porque as receitas diminuem, ou seja, eu perdi dinheiro porque arrecadei menos. Entretanto, na CBB a coisa foi diferente. As receitas estão crescentes. Em 2009, a receita total foi de R$ 15.809.164, em 2010 de R$ 17.676.472 e em 2011, R$ 25.220.698. Isto indica que o déficit é explicado pelo outro lado da questão. Os gastos estão crescentes. No caso de uma confederação desportiva, isto

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pode ser benéfico, pois quanto maior o gasto, maior o retorno para a modalidade em questão. Logo, podemos concluir que o basquete nacional deve estar vivendo dias cada vez melhores. Esta é uma questão que deixo para os especialistas em basquetebol responderem.

Então vamos analisar onde foi gasto o dinheiro. Pelas demonstrações contábeis, os valores são agrupados demais. Mas, em outra peça contábil, chamada notas explicativas, que poucos dão atenção, oferecem uma boa pista dos gastos. Vou colocar os pontos que acho mais relevantes.

a) Juros. Sim, a CBB paga juros a bancos e esta conta é crescente. Em 2009, a despesa com juros somou R$ 29.286, em R$ 2010 833.234 e em 2011 R$ 1.272.059, ou seja, passou de menos de 30 mil reais para mais de 1,2 milhão em apenas dois anos. Uma conta rápida para explicar melhor. Em 2011, a CBB pagou, em 9 dias, a mesma quantidade de juros que pagou no ano de 2009 inteiro. Nem preciso dizer o que isto significa.

b) Manutenção da estrutura da CBB. As despesas com pessoal somadas às demais despesas administrativas da CBB somaram R$ 11.520.002, ou, em média, R$ 960.000 mensais (você não leu errado, a CBB custa quase 1 milhão de reais por mês entre pagamento de salários aos seus funcionários mais demais gastos administrativos). Isto tudo sem considerar os gastos com eventos propriamente ditos, só com a operação administrativa da CBB. Este número fica ainda mais preocupante, pois é crescente, visto que em 2010 este valor era de R$ 8.935.196 e em 2009 R$ 5.935.244, ou seja, um aumento de 94% em apenas dois anos.

c) Competições nacionais. A CBB aumentou e muito o gasto com competições nacionais, passando de R$ 1.428.157 em 2010 para R$ 5.635.259, um aumento de 295%. Entretanto, salvo melhor juízo, as competições nacionais adultas não são mais bancadas pela CBB e sim pelas ligas. Achei estranho também a CBB não ter divulgado nenhuma nota sobre este gasto. Porém, no balanço do ano de 2010, a CBB explicou que o gasto de 1,4 milhão naquele ano referia-se a competições nacionais das categorias de base Brasil afora. Se não houve mudança no rumo dos gastos, é de se presumir que as competições nacionais de base estão fortíssimas no Brasil, com um incremento enorme nos gastos. De novo, deixo aos especialistas em basquetebol a resposta.

d) Eventos. Está aí uma conta extremamente interessante e que, se não é o maior gasto da CBB, é um valor considerável de R$ 3.950.713, um aumento de 152% em relação a 2010, sendo que, do valor total, a CBB só abriu 32% deles (R$ 1.271.268, do convênio com a Eletrobrás). Infelizmente, R$ 2.679.445 não estão abertos e carecem de melhor explicação. Mas, o interessante aqui é o tipo de gasto que foi feito, onde vou relatar os que achei mais relevantes, dentro dos 32% que a CBB abriu:

Centro de Basquete Integrado (segundo a CBB, são centros para incentivar a prática do basquete): redução de 48% de 2011 para 2010, com um gasto total de R$ 290.525, o que dá R$ 24.210 mensais para todos os centros.

Clínica de Arbitragem (segundo a CBB, compreendem as clínicas de Formação e Atualização dos árbitros): redução de 46% de 2011 para 2010, com um gasto total de R$ 72.613, ou R$ 6.051 mensais para a formação dos nossos árbitros.

Auxílio à Filiadas (segundo a CBB, representam repasses para as federações estaduais de basquetebol para a manutenção das equipes de base): aumento de 170% em relação a 2010, com um gasto total de R$ 282.039. Entretanto, pelo menos considerando o que sai na grande mídia, não vejo muita equipes de base

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nas federações estaduais. De novo, preciso da ajuda dos especialistas em basquetebol.

Congressos: a CBB gastou em 2011 R$ 403.611 em congressos. Aqui não fica claro se foi para a promoção de algum congresso ou se foi em participações em congressos. Entretanto, o valor é interessante, pois o gasto com congresso foi 456% maior do que o gasto com clínicas de arbitragem, por exemplo.

3. Endividamento

À primeira vista, assusta que a CBB tenha um empréstimo bancário de mais de 4 milhões de reais em seu balanço. Entretanto, isto é apenas a ponta do iceberg. Sempre que olhamos o endividamento, temos que comparar o volume de dívidas com os bens que uma entidade possui para pagá-las. Se olharmos os balanços de empresas como Petrobrás, Vale do Rio Doce, Embraer etc veremos um volume de dívidas muito alto, porém, como os bens que possuem são maiores ainda, tal fato passa a ser relativizado.

No caso da CBB, o rombo é muito pior. Apenas de dívidas de curto prazo, com vencimento no ano de 2011, o montante é de mais de 7 milhões de reais, um aumento de 39% em relação ao já ruim ano de 2010, além de 2.510.034 reais que a CBB considera que terá que desembolsar no longo prazo (algo praticamente inexistente em 2010). Em uma empresa saudável, o volume de dívidas não deve superar 66% (2/3) do seu volume de bens e direitos (ativos). Entretanto, na CBB, o volume de dívidas representa 239% do volume de ativos, ou seja, a CBB tem de dívidas mais do dobro do que possui de bens e direitos, significando que, caso a CBB vendesse tudo o que possui, teria condições de arcar apenas com 42% de suas dívidas, sendo que estes dois números estão ainda piores do que os já ruins do ano de 2010.

Além disto, se olharmos o que a CBB tem de bens e direitos de curto prazo, ou seja, que são mais fáceis de transformar em dinheiro, vemos que a situação é ainda mais catastrófica. Estes recursos, que em uma empresa normal devem superar as dívidas de curto prazo, cobrem apenas 35% destas dívidas. Isto faz com que a entidade seja de altíssimo risco para conseguir financiamento, fazendo com que pague juros muito altos para a rolagem da sua dívida. Apesar deste indicador ter tido uma leve melhora em comparação com 2010 (era de 31%), há que se ressaltar o fato de que, em 2010, todos os empréstimos eram de curto prazo e, no ano de 2011, a CBB conseguiu alongar a dívida, sendo que, dos empréstimos totais, 33% passaram a ser de longo prazo.

Este alongamento de dívida é bom, pois os juros em empréstimos de longo prazo são, normalmente, menores. Porém, é de causar muita preocupação o fato que, mesmo alongando a dívida, os totais das dívidas de curto prazo não diminuem, pelo aumento constante de outras dívidas da entidade. Basicamente, a CBB pode estar armando uma enorme bomba relógio na questão de solvência para o longo prazo.

A situação, que já está ruim, pode piorar ainda mais. De acordo com a Nota Explicativa número 14, a empresa Champion Products Europe Ltda move um processo judicial contra a CBB referente a um contrato preliminar de patrocínio, firmado em 31/12/2008 e, segundo os

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assessores jurídicos da CBB, há um risco possível de perda. Este processo hoje está em R$ 4.175.535 e, se a CBB perder a causa, este valor vai impactar de maneira extremamente relevante nas suas dívidas, já muito altas, visto que estes valores, por ainda não ter decisão judicial, não estão evidenciados no Balanço da entidade.

4. Situação de Caixa

Aqui é onde funciona o ditado de “as aparências enganam”. Olhando a demonstração de fluxo de caixa, observa-se que o total do que chamamos de equivalente de caixa (caixa em si, bancos e aplicações financeiras) subiu de 870 mil reais para 2 milhões de reais, com um aumento de, aproximadamente, 1 milhão e 130 mil reais. Isto é bom, certo? Normalmente sim, mas, depende de como este aumento foi obtido.

Analisando as demonstrações, ficamos com números contraditórios. Como a CBB pode ter tido déficit se o seu saldo de caixa aumentou? Aqui não é algo tão simples e direto para entender, mas vamos a um exemplo didático:

Imagine que você tenha feito compras no cartão de crédito no valor de R$ 1.000, sem ter tido receita nenhuma no período, ou seja, vai haver um déficit de R$ 1.000 e uma dívida no valor de R$ 1.000. Agora, imagina que você, além disto, tenha feito um empréstimo no banco no valor de R$ 1.500 e guardou isto na sua carteira. Logo, sua dívida total vai ser de R$ 2.500 (R$ 1.000 do cartão e R$ 2.500 do empréstimo). Como você não pagou nada de dívida ainda, você terá tido um déficit de R$ 1.000, mas terá R$ 1.500 de dinheiro. E como isso tudo foi financiado? Pelas dívidas de R$ 2.500. Vamos agora aos números da CBB:

Déficit de 2011: R$ 2.617.402

Aumento de equivalente de caixa: R$ 1.133.731

Aumento das dívidas de curto prazo: R$ 1.966.845

Aumento das dívidas de longo prazo: R$ 2.142.247

O que isto quer dizer? Simples, a CBB teve um déficit de R$ 2.617.402 e ainda aumentou seu equivalente de caixa em R$ 1.133.731, ou seja, precisou de R$ 3.751.133 para sustentar o aumento de caixa e financiar o déficit. Analisando o aumento das dívidas, temos um total de aumento no valor de R$ 4.109.092, o que explica como a CBB aumentou seu dinheiro em caixa (a diferença de pouco mais de R$ 350 mil entre os dois valores foi utilizada para compra de bens e para demais variações de curto prazo nas outras contas).

Resumindo, a CBB aumentou seu nível de dinheiro em caixa aumentando suas dívidas, o que, em minha opinião, não é nada bom.