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ANÁLISE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA SOBRE
PEGADA HÍDRICA EM SISTEMAS DE
MANUFATURA: ESTADO DA ARTE E
TENDÊNCIAS
Thamiris Linhares Marques
Diogo Aparecido Lopes Silva
Maria Cléa Brito de Figueirêdo
Larissa Raquel Matias Menussi
A pegada hídrica (PH) é uma ferramenta utilizada para quantificar e avaliar
os impactos hídricos gerados dentro de uma cadeia produtiva. O uso não
racional da água pode ocasionar impactos de escassez hídrica, eutrofização,
toxicidade humana, acidificação e prejudicar os ecossistemas. Assim, o
objetivo deste artigo foi realizar uma análise bibliométrica sobre a produção
científica relacionada a PH em sistemas de manufatura. A pesquisa
caracterizou-se como pesquisa exploratória, realizada por meio da análise
bibliométrica. Foi utilizado o software HistCite para responder quais são os
principais autores, as instituições de pesquisa, e as revistas que mais
abordam esse tema, além da análise das citações de cada artigo mapeado.
Ao todo, foram mapeados 49 artigos na base de dados Web of Science, e os
resultados mostram que nos últimos anos vêm crescendo as pesquisas acerca
dos impactos hídricos, porém, ainda são poucas as abordagens dentro dos
sistemas de manufatura. A ferramenta de PH com maior aplicação foi a
Water Footprint Network (WFN). A Itália, foi o país com maior número de
publicações. A instituição Commonwealth Scientific Industrial Research
Organisation (CSIRO), da Austrália e o pesquisador australiano Ridoutt B.G
apresentaram o maior número de artigos publicados, e a revista Journal of
Cleaner Production foi o principal veículo de publicação de estudos de PH em
sistemas de manufatura. Por fim, o Brasil mostrou-se pouco expressivo na
pesquisa, com apenas 4% dos artigos identificados, o que pode estar
XXXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
“A Engenharia de Produção e suas contribuições para o desenvolvimento do Brasil”
Maceió, Alagoas, Brasil, 16 a 19 de outubro de 2018.
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associado ao fato do país se destacar mais no setor de agronegócio, e menos
no de manufatura. Logo, a produção cientifica sobre PH está mais atrelada
ao setor primário, e mais pesquisas com foco também na indústria de
manufatura são desejáveis para cobrir esta lacuna.
Palavras-chave: Avaliação do Ciclo de Vida, Pegada hidrica, Manufatura,
Revisão bibliográfica sistemática
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1. Introdução
A avaliação do ciclo de vida (ACV) serve para avaliar os aspectos e os impactos ambientais
potenciais gerados ao longo do ciclo de vida de um processo, produto ou serviço. A ACV
segue as seguintes etapas metodológicas: definição de objetivo e escopo, análise do inventário
do ciclo de vida (ICV), avaliação do impacto do ciclo de vida (AICV) e interpretação
(International Organization for Standardization - ISO, 2006 a, b).
Recentemente foi incluída a abordagem da Pegada Hídrica (PH) dentro do contexto de ACV.
Essa inclusão tem por objetivo mensurar e avaliar os impactos hídricos gerados dentro de uma
cadeia produtiva relacionados ao uso da água. Os aspectos de uso da água e da sua poluição
podem acarretar em diversos impactos ambientais como: escassez hídrica, eutrofização de
mananciais, toxicidade humana, acidificação e outros que podem afetar diretamente a vida
humana e o ecossistema local (BOULAY et al., 2015).
Há cerca de cinco anos, foi feito o lançamento da normativa ISO 14046:2014 que aborda a
avaliação da PH dentro do ciclo de vida de um produto. Essa norma tem por finalidade
identificar, quantificar e minimizar os hotspots ambientais na busca por sugestões de
melhorias de cunho ambiental.
Dentro da avaliação dos impactos hídricos três metodologias têm sido utilizadas: o método de
quantificação volumétrica desenvolvido pela Water Footprint Network (WFN) (HOEKSTRA
ET AL. 2011); o método descrito nas normativas ISO 14040:2006 e ISO 14044:2006 que
aplica a ACV para avaliar diversos impactos, dentre eles os hídricos; e a ISO 14046:2014 que
foi desenvolvida especificamente para avaliação da PH.
Segundo Hoekstra et al. (2011) o WFN foca na quantificação volumétrica de água consumida
durante o ciclo de vida de um produto, não abordando os impactos oriundos desse consumo.
Nessa abordagem, a PH pode ser dividida em: água verde (água da chuva não escoada), água
azul (água superficial e/ou subterrânea retida para uso, que não retorna ao local de captação) e
água cinza (efluente líquido ou água necessária para diluir poluentes antes de seu retorno aos
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padrões de qualidade estabelecidos).
Já a normativa ISO 14046:2014 além de quantificar os fluxos de água, também considera os
impactos ambientais gerados pelo seu uso direto ou indireto no ciclo de vida do processo,
produto ou serviço (BOULAY et al., 2017). Os impactos analisados referem-se a alterações na
quantidade e na qualidade de água dentro de um sistema. Porém, essa norma permite o estudo
da pegada focado em uma categoria de impacto específica, relacionada a água, requerendo que
seja descrito explicitamente essa abordagem já no nome do estudo. Exemplificando, estudos de
pegada hídrica focados em escassez hídrica devem ser denominados “pegada de escassez
hídrica”.
Segundo Hoekstra et al (2011), são poucas as informações existentes hoje sobre a aplicação da
avaliação da PH em processos industriais e são limitadas as avalições de impactos provenientes da
sua utilização na manufatura, sendo que a maior parte dos estudos acadêmicos apresentam
aplicações com foco no agronegócio. Assim, o objetivo deste artigo é realizar uma revisão
bibliográfica sistemática (RBS) sobre a produção científica relacionada a PH em sistemas de
manufatura.
O principal interesse foi conhecer os estudos que aplicaram as abordagens da ACV, WFN ou
a ISO 14046:2014 em sistemas de manufatura. A revisão bibliográfica buscou identificar
quais são os principais autores, as universidades e os centro de pesquisa onde o tema de PH
mais está sendo estudado, quais as revistas científicas que mais publicam sobre o tema, os
principais países com artigos publicados na área, e classificar quais foram os artigos mais
relevantes dentro da temática de estudo, com base no número de citações de cada artigo
mapeado.
2. Materiais e métodos
A pesquisa caracterizou-se como exploratória. Normalmente, esse tipo de pesquisa implica na
realização da revisão da literatura e da revisão documental, com o objetivo de gerar
informações sobre o tema de estudo (GIL, 2008). Para isso, foi feita uma análise
bibliométrica, que consiste no mapeamento, estudo e análise da literatura existente e da sua
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relevância sobre o conceito ou ideia estudado (BRERETON et al., 2007). A Figura 1 mostra o
fluxograma das etapas e das atividades que foram realizadas para condução desta pesquisa.
Figura 1 – Fluxograma das atividades realizadas na pesquisa bibliométrica
Para realização da RBS, inicialmente foi feita a definição do objetivo da pesquisa e quais os
parâmetros que seriam aplicados para o levantamento bibliográfico. Para definir os
parâmetros foi necessário estabelecer a base de dados para busca de materiais bibliográficos,
o período de análise das publicações, o idioma e os tipos de documentos a serem consultados
(artigos em revistas, anais de eventos).
A metodologia aplicada teve como principal objetivo mensurar e avaliar a produção
bibliográfica na temática de PH em sistemas de manufatura. Por meio disso, buscou-se
responder as seguintes perguntas: quais são os principais autores, as instituições de pesquisa, e
as revistas que mais abordam o tema estudado. Além disso, foi analisada a participação do
Brasil dentro da amostra de artigos mapeados e as principais tendências relacionadas ao uso
da PH em sistemas de manufatura.
A base de dados escolhida foi a Web of Science (WoS), e o período de análise foi de todos os
artigos publicados até abril de 2018. Outros parâmetros definidos foram materiais escritos na
língua inglesa e os tipos de documento limitou-se a “articles” e “proceedings paper”. Depois
Fonte: Elaborado pelo autor
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disso, foi realizada a busca pelas palavras chaves mais utilizadas para mapear as publicações. Para
definir as palavras chave foi realizada a leitura prévia de artigos relevantes no contexto, que
resultou em: “life cycle assessment”; “LCA” “water footprint”; “WFN”, “manufacturing” e
“industry”.
Dessa forma, os dados de entrada para busca compuseram a seguinte string: ("Life Cycle
Assessment" OR "LCA") AND ("water footprint" OR "WFN”) AND ("manufacturing" OR
"industry"). Refinado por: Idiomas: (ENGLISH) AND Tipos de documento: (ARTICLE OR
PROCEEDINGS PAPER) Tempo estipulado: Todos os anos. Índices: SCI-EXPANDED, SSCI,
A&HCI, CPCI-S, CPCI-SSH, ESCI., que totalizou em 49 artigos.
A etapa de qualificação dos artigos foi iniciada com a leitura do título e do resumo (abstract)
dos 49 artigos identificados. Nessa etapa foi criada uma base de dados em planilha eletrônica
contendo o título do artigo, os autores, o método de PH utilizado, o processo ou produto
avaliado e a localização (país de origem) da pesquisa. Além da planilha eletrônica, foi
utilizado o software Mendeley para o fichamento dos materiais, visando destacar os principais
pontos fortes e fracos (limitações) de cada artigo.
Depois disso, foi feita a análise da situação atual (estado da arte) sobre o tema estudado a
partir das estatísticas de bibliometria. Para esta avaliação, foi utilizado o software HistCite. O
HistCite é uma ferramenta que auxilia no mapeamento de pesquisas e análise das citações.
O HistCite foi utilizado para analisar a quantidade de citações que os artigos analisados
obtiveram até o momento. Para essa mensuração, foi utilizado o indicador Global Citation
Scores (GCS), que quantifica o número de citações que determinado artigo possui dentro da
base de dados WoS. Outro indicador utilizado foi o Local Citation Scores (LCS), que
representa a quantidade total de citações que determinado artigo obteve dentro da própria
amostra de artigos (BARREIRO, 2015).
3. Resultados e discussão
3.1 Caracterização geral dos artigos mapeados
A evolução história das publicações dentro da temática estudada pode ser observada na Figura
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2. Nela, pode-se notar que a abordagem da PH em processos industriais vem crescendo nos
últimos anos. Segundo a Confederação Nacional da Industria – CNI (2013) as alterações dos
recursos hídricos podem afetar a sua quantidade e qualidade, e afetar diretamente a atividade
industrial, visto que a água é um recurso essencial para as atividades fabris, seja por meio do
seu uso direto (composição de produtos e materiais) ou indireto (limpeza de máquinas,
utilização em caldeiras a vapor, etc.). Assim, diante da tendência mundial de uso cada vez
maior da água nas atividades produtivas, estudar formas para se evitar a escassez hídrica tem
sido um tema em ascensão na literatura, o que pode explicar a crescente evolução da produção
cientifica sobre PH na Figura 2.
Figure 2 – Evolução histórica das publicações sobre PH em processos produtivos industriais dentro da RBS
Fonte: Elaborado pelo autor
A temática sobre mensuração volumétrica de água incorporada a um produto surgiu na
metade da década de 90, sobre o conceito da água virtual (ALLAN, 1998). Na base de dados
da WoS, o primeiro artigo que aborda esse tema foi publicado no ano de 1998, mas os últimos
três anos foram publicados quase 40% dos materiais sobre essa temática. Já o conceito de
pegada hídrica (PH) surge na base da WoS somente no ano de 2007 (HOEKSTRA;
CHAPAGAIN, 2007) e os últimos três anos representam mais de 50% do total de publicações
mapeadas.
Para melhor compreensão das metodologias aplicadas, foi feita a leitura dos métodos adotados
nos 49 artigos selecionados. Em seu escopo a ISO 14046:2014 especifica que a norma foi
baseada na ACV. Anteriormente a existencia dessa normativa, os impactos do uso da água
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eram avaliados por meio de estudos ACV que contemplavam categorias relacionadas ao
consumo e/ou poluição hídrica, associando-se ou não à abordagem volumétrica da WFN,
como pode ser verificado na Figura 3.
A principal diferença entre essas duas abordagens é quanto a análise e avaliação dos impactos.
A ISO 14046:2014 é uma metodologia recente que além de mensurar o volume de água numa
atividade, avalia também os impactos gerados por esse uso. A abordagem WFN foca apenas
na mensuração da quantidade de água destinada a um produto ou processo, seja para consumo
seja para diluição de poluentes oriundos de efluentes líquidos (PFISTER et al., 2017).
Figure 3 - Métodos de PH abordados nos 49 artigos selecionados
Fonte: Elaborado pelo autor
Dos 49 artigos selecionados, dez deles não abordam aplicação em setores produtivos, eles
tratam do desenvolvimento de novas metodologias e comparações de métodos de PH, sendo,
portanto, excluídos da análise da Figura 3.
A Tabela 1 relaciona os setores produtivos que abordam a PH.
Tabela 1 – Relação dos setores produtivos com aplicação da PH
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Cadeia Produtiva N° artigos Percentual
Bioenergia e bicombustíveis 7 18%
Cadeia produtiva papeis 4 10%
Cadeia produtiva vinho 4 10%
Cadeia produtiva tomates 3 8%
Cadeia produtiva de leite 3 8%
Alimentos prontos 2 5%
Cadeia produtiva de azeite 2 5%
Cadeia produtiva carne 2 5%
Máquinas e equipamentos 2 5%
Materiais construção civil 2 5%
Cadeia produtiva de mineração 2 5%
Cadeia produtiva de baterias 1 3%
Cadeia produtiva plástico 1 3%
Combustíveis fosséis 1 3%
Produtos a base de café 1 3%
Produção de tecidos - seda 1 3%
Tratamento de efluentes 1 3%
Fonte: Elaborado pelo autor
Os principais setores de aplicação das metodologias de PH e avaliação de impactos foram os
de: bioenergia e biocombustíveis (energia solar, biomassa, bioetanol) – com sete artigos; de
papéis e de vinhos – com quatro artigos; de tomates, e de leite e derivados – com três artigos
cada. Os demais setores se mostraram menos expressivos na análise, somados representando
46% da amostra de artigos estudados.
A cadeia produtiva de bioenergia e biocombustíveis, de vinhos, de leite e derivados e de
tomate correspondem a 54% dos artigos que aplicaram a avaliação da PH. A maior
participação da PH dentro da cadeia de bioenergia e biocombustíveis pode ser justificada por
se tratar de processos que visam alcançar alternativas mais sustentáveis para substituição ou
melhoria dos modelos convencionais de produção, ainda baseados, em geral, apenas no uso de
combustíveis fosseis. Além disso, o setor de energia pode ser considerado como estratégico
em qualquer nação, o que contribui para seu destaque entre os demais. Já a aplicação da PH
na produção de vinhos, leite e derivados, e tomates apresentam forte ligação com a produção
agropecuária, a mais abordada nos estudos de PH, uma vez que o setor agropecuário demanda
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cerca de 70% de água doce mundialmente utilizada nas atividades de produção
(BORGHETTI et al., 2017).
Entre os artigos de aplicação da PH na cadeia de bioenergia e biocombustíveis podem-se
encontrar diferentes enfoques como: ARGO (2013) que direciona seu estudo para PH na
cadeia de biocombustíveis a partir do milho; COLLOTTA et al. (2018) analisa os impactos
ambientais e hídricos da biomassa de algas para produção de biocombustíveis e PAN et al.
(2016) que analisa alguns impactos ambientais e hídricos em uma biorrefinaria através da
abordagem ACV. Os estudos da PH na produção de papeis também consideram diferentes
cenários, ZHANG (2015) avalia qual o ponto mínimo da PH associado a resistência do
material e encontra um valor entre 2500 - 2750 m³/ton de papel; MANZARDO et al (2014)
analisa os cenários de alguns países para minimizar a PH e os custos relacionados ao consumo
de polpa de celulose, o melhor resultado para PH foi o suprimento brasileiro com 1008 m³/
ton de eucalipto. Já os artigos aplicados na indústria de vinhos seguem uma mesma linha de
pesquisa, em três dos quatros estudos utiliza-se a abordagem da WFN e em ambos a produção
das uvas representou mais de 90% da PH total e a demanda de água consumida variou entre
504 a 632 L/garrafa de vinho (0,75 L).
3.2 Caracterização dos países e das instituições de pesquisa
Quando analisados os locais com publicações sobre PH, foram identificados 25 países
distintos. Os Estados Unidos participam na publicação de 11 artigos (sendo o país com maior
participação nessa temática). A Itália e a China estão na publicação de oito artigos científicos
cada um. Em seguida, tem-se a Austrália na publicação de sete artigos, a Alemanha em cinco
e a Suíça em quatro artigos. Já o Brasil, a Inglaterra, Espanha e Taiwan contribuíram com três
artigos cada. A França, o Japão, a Holanda, a Romênia e a Suécia contribuíram com dois
artigos cada, seguidos pelo Canadá, Egito, Índia, Irã, Malásia, México, Polônia, Correa do Sul
e Tailândia com apenas um artigo cada.
Globalmente, os países localizados na Europa desenvolveram mais pesquisas sobre a
aplicação de PH em processos industriais, com participação em 32 dos artigos. A Itália é
responsável por 25% do desenvolvimento desses estudos, seguida pela Alemanha, que se
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envolveu em 16% das pesquisas analisadas. O continente asiático participou dos estudos de
19 dos artigos selecionados, sendo a China o país que lidera as publicações, com 42% da
representação continental. Quando analisada a América do Norte, os Estados Unidos são
responsáveis por 85% dos estudos sobre PH em cadeias produtivas. A Austrália representa
sozinha a Oceania com sete artigos, e o Brasil representa a América do Sul sozinho em três
publicações. A África e América Central não apresentaram artigos sobre PH na pesquisa
realizada.
Os resultados mostram a necessidade de uma maior iniciativa para o desenvolvimento da
temática de PH mundialmente, principalmente na América Central, na América do Sul e na
África. A Figura 4 apresenta o percentual de publicações de artigos dentro da temática de
estudo por continente.
Figure 4 – Percentual de participação continental dos artigos analisados
Fonte: Elaborado pelo autor
Para concluir, os locais onde a temática é mais estudada também podem ser analisados em
nível das instituições com maiores publicações dentro da área. No total, foram identificadas
63 organizações, sendo a Commonwealth Scientific Industrial Research Organisation CSIRO,
localizada na Austrália, a maior representante, com sete registros de artigos, o que representa
14% do total das publicações mapeadas. Em seguida, duas organizações americanas, a United
States Department Of Energy Doe, a University of California System, e a instituição italiana
University of Perugia, apresentam, respectivamente, três registros cada (Tabela 2).
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Tabela 2 – Instituições com maiores representatividades de pesquisa dentro dos artigos analisados
Fonte: Elaborado pelo autor
3.3 Caracterização da autoria do número de citações dos artigos
Os autores com maior participação dentro da amostra de artigos selecionados foram: Ridoutt
B.G. com participação em seis trabalhos, depois os autores Asdrubali F., Bonamente E. e
Scrucca F., que desenvolveram três trabalhos cada um deles. A Tabela 3 mostra o percentual
de participação desses autores dentro do grupo amostral, e o índice Total Local Citation Score
(TLCS), que representa a quantidade de citações que cada autor obteve dentro da amostra de
artigos em análise.
Quando analisadas a quantidade de citações globais dos autores participantes, Ridoutt B.G.
também é o mais citado, seguido pelos autores Orr S. e Chapagain A. K. A Tabela 4 mostra o
indice Total Global Citation Score (TGCS), que representa a quantidade de citações dentro do
WoS que eles apresentam até o momento.
Instituição País N° artigos Percentual
Commonwealth Scientific Industrial Research
Organisation CSIROAustrália 7
14%
United States Department of Energy Doe Estados Unidos 3 6%
University of California System Estados Unidos 3 6%
University of Perugia Itália 3 6%
Tabela 3 - Participação em artigos e índice TLCS
Fonte: Elaborado pelo autor
Tabela 4 - Participação em artigos e índice TGCS
Autores País de origem N° artigos TLCS
Ridoutt BG Austrália 6 9
Asdrubali F Itália 3 6
Bonamente E Itália 3 6
Scrucca F Itália 3 6
Autores País de origem N° artigos TGCS
Ridoutt BG Austrália 6 221
Orr S Reino Unido 2 139
Chapagain AK Reino Unido 1 120
Bellotti B Austrália 2 85
Page G Austrália 2 85
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Para a interpretação da citações e co-citações existentes dentro da amostra de artigos
selecionadas foi utilizado software HistCite como ferramenta de apoio. Nesta etapa,
analisaram-se os artigos que apresentaram os maiores índices de citações nas seguintes
indicações: Global Citation Scores (GCS) e Local Citation Scores (LCS). Esses dois índices
representam a importância/relevância de um artigo dentro do tema em estudo.
Na Tabela 5 estão apresentados os artigos com maior número de citações globais pelo índice
GCS. Do grupo de artigos mais citados, CHAPAGAIN; ORR, (2009), RIDOUTT; PFISTER
(2013) e (PAGE; RIDOUTT; BELLOTTI, 2012), são os mais representativos nesse índice. O
artigo (CHAPAGAIN; ORR, 2009) possui aproximadamente o dobro de citações globais se
comparado ao artigo de (RIDOUTT; PFISTER, 2013) e (PAGE; RIDOUTT; BELLOTTI, 2012).
Quanto ao índice LCS, três artigos se destacam com quatro citações locais (LCS) cada:
(RIDOUTT; SANGUANSRI; HARPER, 2011); (GU et al., 2015); e BONAMENTE et al.,
(2015). Os seis artigos que apresentaram a maior quantidade de citações podem ser
observados na Figura 5. Entre eles A revista Journal of Cleaner Production aparece como o
principal veículo de publicação de estudos de PH em sistemas de manufatura.
Fonte: Elaborado pelo autor
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Fonte: Elaborado pelo autor – Software Histcite
Tabela 5 - Artigos com maior número de citações dentro do grupo amostral e maior número de citações globais
ARTIGOS AUTORES JOURNAL LCS GCS
1 An improved water footprint methodology linking global
consumption to local water resources: A case of Spanish tomatoes
Chapagain AK, 2009 Journal of environmental
management
3 120
5 Fresh tomato production for the Sydney market: An evaluation of
options to reduce freshwater scarcity from agricultural water use
Page G, 2011 Agricultural water
management
3 26
6 Comparing Carbon and Water Footprints for Beef Cattle
Production in Southern Australia
Ridoutt BG, 2011 Sustainability 4 28
8 Carbon and water footprint tradeoffs in fresh tomato production Page G, 2012 Journal of cleaner
production
3 59
10 A new water footprint calculation method integrating consumptive
and degradative water use into a single stand-alone weighted
indicator
Ridoutt BG, 2013 International journal of
life
3 61
13 Integration of water footprint accounting and costs for optimal
chemical pulp supply mix in paper industry
Manzardo A, 2014 Journal of cleaner
production
3 28
19 Calculation of water footprint of the iron and steel industry: a case
study in Eastern China
Gu YF, 2015 Journal of cleaner
production
4 20
21 The Water Footprint of the Wine Industry: Implementation of an
Assessment Methodology and Application to a Case Study
Bonamente E, 2015 Sustainability 4 8
Fonte: Elaborado pelo autor
Figura 5 - Mapa da relação de citações dos artigos analisados
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Conclusão
Os últimos três anos representam mais de 50% do total de publicações no contexto de PH. A
ferramenta aplicada na maioria dos artigos foi a WFN, isso se justifica por ser uma
metodologia desenvolvida anteriormente a metodologia da ISO 14046:2014. A cadeia
produtiva de bioenergia e biocombustíveis, de vinhos, de leite e derivados e de tomate,
representaram mais da metade das publicações sobre o tema em indústrias de manufatura.
O continente europeu é responsável pelo maior número de publicações dentro do tema
estudado. Na amostra de artigos não houve pesquisas encontradas na América Central e nem
na África, e a América do Sul ficou com a menor participação continental quando comparada
aos outros continentes com produção bibliográfica na temática. A instituição australiana,
Commonwealth Scientific Industrial Research Organisation – CSIRO foi responsável pelo
desenvolvimento da maior parte das pesquisas mapeadas.
O autor com maior participação dentro da amostra de artigos foi Ridoutt B.G., com seis
trabalhos publicados, sendo também o autor com maior número de citações GCS. O artigo
com maior número de citações globais foi (CHAPAGAIN; ORR, 2009). Já artigos que
apresentaram maior relevância de citação dentro do grupo amostral, isto é, com maior LCS
foram: RIDOUTT; SANGUANSRI; HARPER (2011); GU et al. (2015) e BONAMENTE et
al. (2015) com quatro citações cada.
Portanto, os resultados desta análise bibliométrica mostram que há uma crescente evolução no
número de pesquisas que abordam os impactos sobre os recursos hídricos, contudo, ainda são
poucas as aplicações da PH no setor de manufatura.
Também foi possível medir a pequena participação do Brasil na implantação da PH em
sistemas de manufatura, o que sinaliza uma grande oportunidade de estudos nesse contexto. A
participação brasileira foi de apenas 4% dos artigos mapeados, e isso pode estar relacionado
ao fato dos estudos de pegada hídrica ainda estarem restritos a aplicações no setor de
agropecuária do país. Logo, mais pesquisas com enfoque de estudar a PH em sistemas de
manufatura são desejáveis.
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Na indústria de manufatura, destaca-se o emprego da PH nos processos de produção de
biocombustíveis e bioenergia, de papeis e de vinho, que envolvem, portanto, processos de
transformação química e de produção alimentícia, no caso do vinho. Nesses três tipos de
indústria, as mudanças na quantidade e na qualidade da água são relevantes e devem ser
analisadas para redução dos potenciais impactos hídricos. A produção de biocombustíveis e
de papeis são realizadas de forma contínua, ou seja, a entrada da matéria prima e a saída do
produto final ocorre continuamente. A produção de vinhos é realizada por batelada ou lotes,
que se caracteriza por pequenos ciclos de produção que se inicia assim que o processo anterior
é finalizado, e são recarregados continuamente em curtos intervalos de tempo. Quanto a
caracterização da estocagem, essas três indústrias podem ser definidas como make-to-stock
(MTS), uma vez que a produção é direcionada para estoque com base na previsão de demanda.
Portanto, percebe-se que a tipologia dos sistemas produtivos mais susceptíveis ao estudo da
PH são processos de produção em massa, e com destaque para produtos feitos à base d´água
(vinhos) ou que necessitam do uso direto da água na produção (papel, combustíveis).
REFERÊNCIAS
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