1

ANTROPOLOGIA DA EDUCAO: APONTAMENTOS ENTRE MALINOWISKI E

PAULO FREIRE

Eric Carlos de Mari

(Especializao em Ensino de Sociologia - Universidade Estadual de Londrina)

Palavras-chave: Antropologia Antropologia e Educao Antropologia da Educao

APRESENTAO

Este trabalho apresenta alguns apontamentos entre Bronislaw Malinowiski (1884 -

1942) e Paulo Freire (1921- 1997) atravs de antropologia e sua construo como reflexo a

respeito da educao. Por questes didticas e de organizao concebemos este trabalho em

quatro etapas. A primeira sobre a antropologia da educao, onde sero expostas idias

recentes desta nova rea de conhecimento, ou seja, alguns princpios explicativos de uma

antropologia da educao. Na segunda parte ser dado nfase alguns pontos do livro

Argonautas do Pacfico Ocidental de Malinowiski, na inteno de encontrar elementos da

noo de educao para este antroplogo, analisando brevemente o valor do

estranhamento antropolgico, que se apresenta na importncia dessa obra como preceito

fundamental para a construo da antropologia. Posteriormente na terceira parte, focar a

ateno em algumas questes da obra Pedagogia da Autonomia de Paulo Freire,

pressupondo ser este, um dos livros que apresenta a essncia do pensamento desse

importante pensador brasileiro, observando algumas das principais idias de seu texto e

expondo algumas discusses especficas, tais como a pedagogia junto ao compromisso

social, ou seja, de como a ideologia pedaggica pode exercer mudana na sociedade;

expondo conceitos como ensino e aprendizagem atravs de uma perspectiva da construo

do saber pelo professor e pelo aluno. Na parte final do trabalho haver uma tentativa de

aproximao dos dois autores atravs da relao que a antropologia faz com a educao,

apresentando como acesso a essa ponte, trabalhos de pesquisadores brasileiros na rea da

antropologia da educao, onde alguns deles se localizam como pesquisadores em algumas

universidades brasileiras.

2

1 INTRODUO

no respeito e na relao de equilbrio com a alteridade que alguns autores

brasileiros esto centrando suas pesquisas no intuito de uma antropologia da educao,

como Neusa Maria Mendes de Gusmo, Maurcio Rodrigues de Souza, Ana Lcia Valente

e Ana Luiza Carvalho da Rocha entre outros, os quais estabelecem o desafio de uma

discusso sobre o respeito diversidade cultural na escola, problematizando assim a escola

contempornea e capitalista como uma instituio a servio das idias capitalistas e

homogeneizadoras num contexto de enorme diversidade cultural, tanto em outros pases,

como no Brasil. A relao entre as reas de conhecimento da antropologia e educao ainda

pouco explorada pelo mbito acadmico brasileiro, apesar do que o dilogo entre a

antropologia e a educao remete-se a uma antiga e muito importante questo a respeito do

homem e seu processo de aprendizagem. No Brasil, foi a partir da dcada de 80 do sculo

XX que se comeou a pensar que entre a antropologia e a educao poderia ser construdo

um importante dilogo cientfico e cultural1.

No Brasil, um dos principais pesquisadores quando o assunto antropologia e

educao, a Prof Neusa Maria Mendes de Gusmo, que trata da importncia do dilogo

entre essas reas e nos mostra em seus textos que, na passagem do sculo XIX para o

sculo XX, que se comeou, com a antropologia norte-americana, a ter uma noo de que

os estudos antropolgicos relacionados Educao poderiam contribuir enormemente para

um alargamento na perspectiva educacional. A partir desse dilogo pde-se afirmar que

cultura e educao esto extremamente ligadas e que se constroem juntas no interior da

sociedade.

Embora pensamentos e conceitos usados na construo do conhecimento

antropolgico e educacional foram construdos desde a antigidade, a relao mais

1 Texto da prof Valente, onde ela indica uma mnima reviso a respeito dos valores e dos conceitos clssicos da Antropologia, colocando nfase na interdependncia da teoria e da prtica antropolgica que norteiam uma pesquisa e que se difere da viso do senso comum, ou seja, uma percepo de estranhamentos a respeito da realidade social que possibilite uma compreenso crtica. VALENTE, Ana Lcia. Conhecimentos antropolgicos nos parmetros curriculares nacionais: para uma discusso sobre a pluralidadecultural. In: GUSMO, Neusa M. (Org.). Diversidade, cultura e educao: olhares cruzados. So Paulo: Biruta, 2003. p. 17-46.

3

especfica entre essas reas do conhecimento, aconteceu na virada do sculo XIX para o

sculo XX. Em um momento posterior, na primeira metade do sculo XX, Franz Boas

(1858-1942), um pensador clssico da antropologia, juntamente com seus discpulos Ruth

Benedict (1887- 1948) e Margareth Mead (1901-1978), possibilitaram o surgimento de

reflexo a respeito da pedagogia que se aplicava na sociedade moderna, principalmente na

sociedade norte americana, estabelecendo uma forte crtica em relao aos valores liberais

econmicos impostos atravs da educao.

Boas ser um crtico atuante diante do sistema educativo americano,

denunciando, entre outras coisas, a ideologia que lhe serve de base, centrada na

idia de liberdade, e sua prtica educativa de cunho conformista e coercitivo,

visando criar sujeitos sociais adequados ao sistema produtivo segundo um

modelo ideologizado de cidado. Demonstra, atravs de estudos diretos obtidos

no campo educacional, que a escola inexiste como instituio independente e,

como tal, no possibilita independncia e autonomia dos sujeitos que a esto. A

meta da escola centra-se num aluno-modelo que desconsidera a diversidade da

comunidade escolar e, para cont-la, atua de forma autoritria. (Gusmo, 1997,

p. 15)

A escola moderna cada vez mais distancia o sujeito social de uma reflexo em

relao realidade e sua prpria existncia enquanto membro da sociedade e faz com que

a ideologia de mercado seja cada vez mais perpetuada, de modo que o indivduo seja

construdo para a realizao ideolgica consumista pautada na sociedade capitalista livre.

No contexto ideolgico consumista no existe espao para o sujeito social, que pressupe

sua participao na sociedade, seja construdo com recursos que permitam a reflexo de seu

prprio contexto.

Considerando a antropologia e a educao como instrumentos de reflexo da

sociedade moderna e deixados expostos alguns pressupostos da relao entre antropologia e

educao, podemos nos voltar exposio que este trabalho prope, ou seja, a exposio a

cerca de alguns apontamentos de um clssico na antropologia como Bronislaw Malinowiski

e um pensador clssico na rea da Educao como Paulo Freire, no intuito de construirmos

possveis reflexes em sobre o surgimento de uma relao e do surgimento de uma reflexo

4

da educao atravs de olhos antropolgicos. Como estabelecer um dilogo entre esses

autores?

Inevitavelmente, de incio temos que consider-los de grande importncia para a

sociedade moderna como um todo, considerando Malinowski e Paulo Freire como seres

humanos que tiveram a capacidade de construir pensamentos e conceitos que possibilitaram

mudanas e reflexes sociais. Portanto, podemos partir de que eles contriburam

enormemente para a construo de uma conscincia social, sendo que ambos, a partir de

suas experincias individuais, puderam ter contato com diferentes modos de pensar a vida

em sociedade, ainda que em pocas diferentes e cada qual no seu contexto. Em seguida

podemos destacar que ambos pensadores expressavam uma considerao muito importante

a respeito da realidade do outro, que tambm vive e sobrevive na realidade social,

respeito este, que condio necessria para a construo do conhecimento humano.

2 ANTROPOLOGIA DA EDUCAO NA CONSTRUO DE UMA REFERNCIA

TERICA

Na impossibilidade de abarcar a obra de Malinowiski em sua totalidade,

estaremos atrelados seguinte questo: ao como Malinowiski se refere educao

antropolgica do pesquisador/professor e de como pode ser rica a contribuio deste para

com a prpria sociedade. Ciente de que Malinowiski no trata especificamente deste

assunto sobre a educao, devemos considerar este tema proposto compreendido no interior

de um conjunto de saberes antropolgicos tratados pelo autor. No comeo do livro

Argonautas do Pcfico Ocidental, Malinowiski expe algumas idias de cunho

metodolgico, que possibilitaram antropologia um carter mais coerente com sua

utilidade cientfica, terica e prtica. Malinowiski foi precedido por uma moda

evolucionista que, em sua poca, generalizava as classificaes das sociedades impondo

uma teoria etnocntrica, onde os tericos europeus se caracterizavam e caracterizavam sua

sociedade como mais evoluda em relao s outras sociedades. Malinowiski refletiu sobre

essas teorias e as considerava sem uma coerncia de base emprica, pois vislumbrava em

5

suas pesquisas que o pensamento etnocntrico no poderia ser aplicado para o estudo de

outras sociedades e na realidade social.

Na construo de uma antropologia mais reflexiva e no desenrolar da construo

propriamente dita da disciplina, foram de fundamental importncia os escritos de

Malinowiski, e este livro, Argonautas do Pacfico Ocidenta