AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR RESPONSÁVEL PELO JULGAMENTO DAS DEFESAS ADMINISTRATIVAS DO IBAMA
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7/28/2019 AO EXCELENTSSIMO SENHOR RESPONSVEL PELO JULGAMENTO DAS DEFESAS ADMINISTRATIVAS DO IBAMA
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AO EXCELENTSSIMO SENHOR RESPONSVEL PELO JULGAMENTO DAS DEFESAS
ADMINISTRATIVAS DO IBAMA.
FUNDAO NACIONAL DO NDIO, entidade autrquica federal, com sede nacional na capital
federal, SEPS 702/902, Ed. Lex 3 andar, CEP: 70.390-025, telefones: 061. 313.3501/226.8503,
criada aps autorizao da Lei 5.371, de 05 de dezembro de 1967, com Estatuto aprovado pelo
Decreto n 4.645, de 25 de maro de 2003, por sua PROCURADORIA FEDERAL ESPECIALIZADA,
com sede no mesmo endereo citado, onde poder receber as intimaes de praxe, vem,
conforme dispe o pargrafo 6 do art. 11-B, da Lei 9.028, de 12 de abril de 1995, com redao
dada pela Medida Provisria 2.180-35, de 24.08.2001, por meio da Procuradora Federal que
esta subscreve, mandato ex vi legis (art. 10 da Lei 10.480, de 02.07.2002; art. 9o da Lei 9.469,
de 10.07.1997; art. 37, I, da MP 2229-43, de 06.09.2001; e art. 17, I, da LC 73, de 10.02.1995),
apresentar DEFESA ADMINISTRATIVA, com o fito de contestar multa aplicada a esta Fundao
por meio do Auto de Infrao n 553824, srie D, de acordo com os seguintes fundamentos
de fato e de direito: I. DA TEMPESTIVIDADE.
De acordo com o art. 71, I, da lei 9.605/98, o infrator tem o prazo de 20 dias, contados da data
da cincia da autuao, para apresentar sua defesa. notrio, no entanto, que a Fazenda
Pblica, entenda-se, Unio, Estados, Distrito Federal, Municpios, Autarquias e Fundaes, de
acordo com o art. 188 do Cdigo de Processo Civil, possui prazo em qudruplo para contestar.
Tal prerrogativa justifica-se pela ocorrncia da burocracia necessria para realizao de atos da
Administrao Pblica, e, ainda, por no existir para Fazenda a possibilidade de escolher as
causas que patrocina, ao contrrio da advocacia privada. Destarte, onde existem as mesmas
razes aplica-se o mesmo direito, contando-se em qudruplo o prazo para apresentao de
defesa administrativa por parte desta Pessoa Jurdica de Direito Pblico.
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II. DOS FATOS. Desde o incio do ms de maro do corrente ano, os madeireiros da regio de
Pacarna comearam a estreitar relaes com algumas lideranas da comunidade indgena de
Zor, visando a extrao ilegal de madeira na referida terra indgena. No intuito de evitar um
agravamento da situao e o reincio da explorao madeireira na rea indgena, o Ncleo de
Apoio Local de J Paran/ FUNAI oficiou a Polcia Federal (Ofcio Cir. N. 010, de 21/03/2006 e
Ofcio Circ. N. 012), solicitando a notificao dos madeireiros que estavam a pressionar os
indgenas, enviando, tambm, cpia do ofcio tanto ao Ministrio Pblico Federal, quanto ao
IBAMA, para as providncias cabveis. Em virtude da constante presena de aliciadores nos
arredores da reserva, alguns lderes da comunidade indgena de Zor, beneficirios da
explorao irregular da madeira, acabaram por permitir a entrada de mquinas e tratores dosmadeireiros na citada rea. A FUNAI, que vinha trabalhando em parceria com a comunidade
indgena de Zor, foi impedida, pelos ndios, de ingressar na reserva, sendo os seus
funcionrios compelidos a deixar o local. Os lderes da comunidade, pintados para a guerra,
determinaram o bloqueio da reserva, protegendo os infratores, que ali permaneceram com
tratores e caminhes. Em virtude do agravamento da situao e da presena macia de
madeireiros na reserva, realizou-se uma ao conjunta entre FUNAI/IBAMA/DPF e Polcia
Militar Ambiental com o escopo de obstaculizar a extrao madeireira na regio. Em que pese
a diligente atuao do Ncleo de Apoio local de J Paran/ FUNAI, que atua em estrita parceria
com o IBAMA, Polcia Federal e Polcia Militar Ambiental, foi lavrado Auto de Infrao, no dia
12 de setembro, em desfavor da FUNAI, sob o argumento desta Fundao ser conivente e co-
responsvel com os crimes ambientais que vm acontecendo na regio, descrevendo a
infrao nos seguintes termos, ipsis litteris: Danificar vegetao em rea indgena considerada
de preservao permanente, sendo co-responsvel com o corte de rvores e venda de
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madeiras para os empresrios do ramo madeireiro da regio de Boa Vista do Pacarna.
Acrescente-se, ademais, que a FUNAI foi a responsvel pela realizao da ao fiscalizatria,
sendo que a situao somente alcanou tal grau de calamidade em virtude da constante
presso dos madeireiros na regio, que ali permanecem, em razo da omisso do rgo de
fiscalizao ambiental. Saliente-se, ainda, que a FUNAI, durante todo este perodo, vinha,
sistematicamente, oficiando IBAMA/ DPF/ MPF, bem como, tambm, vinha auxiliando e
efetivamente participando das fiscalizaes ali realizadas. No concordando com aplicao
desta multa, e evitando, de imediato, judicializar questes envolvendo duas entidades pblicas
federais, estamos buscando por meio do processo administrativo apresentar nossas razes de
fato e de direito. III. DA NULIDADE DO AUTO DE INFRAO. III.a. DA FALTA DE MOTIVAODiante dos pilares da legalidade e moralidade administrativa, a motivao obrigatria nos
atos administrativos que afetam o interesse individual do administrado. A Constituio Federal
de 1988 consagrou o princpio da moralidade, que passa a ser tido como obrigatrio, para que
a atuao tica do administrador fique demonstrada pela exposio dos motivos do ato e para
garantir o prprio acesso ao Judicirio.
"Art. 37. A administrao pblica direta e indireta de qualquer dos Poderes da Unio, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municpios obedecer aos princpios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficincia e, tambm, ao seguinte:".
A lei que regula o Processo administrativo no mbito federal (9.784/99), prescreve em seu art.
2 e 50:
Art. 2. A Administrao Pblica obedecer, dentre outros, aos princpios da legalidade,
finalidade, motivao, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa,
contraditrio, segurana jurdica, interesse pblico e eficincia.(g.n.)
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Art. 50. Os atos administrativos devero ser motivados, com indicao dos fatos e
fundamentos jurdicos, quando: I(...); II imponham ou agravem deveres, encargos ou
sanes; III(...); (g.n.)
A multa aplicada FUNAI no possui motivao, apenas se limitando a dar o enquadramento
da conduta, como transcrevemos a seguir:
Danificar vegetao em rea indgena considerada de preservao permanente, sendo co-
responsvel com o corte de rvores e venda de madeiras para os empresrios do ramomadeireiro da regio de Boa Vista do Pacarna.
Isso no fundamentao legal, pois apenas enquadra legalmente a conduta da FUNAI.
Fundamentao (motivao) o exame das questes de fato e de direito, onde se constri as
bases lgicas da parte decisria, onde se fixa as premissas da deciso aps laborioso exame
das alegaes relevantes que as partes formularam, bem como do enquadramento do litgio
nas normas legais aplicveis. bom frisar que se trata de enquadramento genrico. Pela
motivao, o administrador pblico justifica sua ao administrativa, indicando os fatos(pressupostos de fato) que ensejam o ato e os preceitos jurdicos (pressupostos de direito) que
autorizam sua prtica, contudo a deciso supra mencionada no analisa devidamente os
pressupostos de fato. No resta sombra de dvida que o ato administrativo vinculado em
apreo est eivado de vcio pela falta de motivao, devendo o mesmo ser desconstitudo
atravs da sano de nulidade.
III.b. DO DEVIDO PROCESSO LEGAL
A Constituio Federal em seu art. 5, inciso LV elevou a sede de princpio constitucional o
devido processo legal e a ampla defesa tanto no mbito judicial quanto no administrativo:
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Art 5. LV Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral
so assegurados o contraditrio e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;.
Normalmente, para que seja aplicada uma multa necessrio que haja um processo
administrativo em que seja garantido o contraditrio e a ampla defesa para que depois a multa
seja mensurada e aplicada. De acordo com os ensinamentos de Helly Lopes Meirelles:
O reconhecimento da auto-executoriedade tornou-se mais restrito, em face do art, 5, LV, da
CF, que assegura o contraditrio e a ampla defesa inclusive nos procedimentos
administrativos. No obstante, quando o interesse pblico correr perigo iminente, a auto-
executoriedade deve ser reconhecida.1 (g.n).
A prpria lei 9.605/1998, que regulamenta o processo administrativo especfico do dano
ambiental determina que:
Art. 70 Considera-se infrao administrativa ambiental toda ao ou omisso que viole
regras jurdicas de uso, gozo, promoo, proteo e recuperao do meio ambiente. (...) 4
As infraes ambientais so apuradas em processo administrativo prprio, assegurado o
direito de ampla defesa e o contraditrio, observadas as disposies desta lei. Art. 71 O
processo administrativo para apurao de infrao deve observar os seguintes prazosmximos: I vinte dias para o infrator oferecer defesa ou impugnao contra o auto de
infrao, contados da data de cincia da autuao; II trinta dias para a autoridade
competente julgar o auto de infrao, contados da data de sua lavratura, apresentada ou no
a defesa ou impugnao; III vinte dias para o infratos recorrer a deciso condenatria
instncia superior do Sistema Nacional de Meio Ambiente SISNAMA, ou Diretoria de Portos
e Costas, do Ministrio da Marinha, de acordo com o tipo de autuao; IV cinco dias para o
pagamento da multa, contados da data do recebimento da notificao.
O Auto de infrao o ato inicial do procedimento, que desemboca na notificao para
pagamento de multa, que o ato final. No se pode inverter as coisas.
1
MEIRELLES, Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro So Paulo: Editora Malheiros, 1999,
pg. 145.
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Como se verifica do auto de infrao, o agente do IBAMA de pronto calculou o valor da multa,
no montante de R$ 50.000,00, e ainda, exigiu o seu pagamento at o dia 02/10/2006. A multa
s se torna exigvel aps todo o processo administrativo onde assegurado o contraditrio e a
ampla defesa, pois, caso contrrio, est-se aplicando uma sano sem o devido processo legal.
Diante do exposto, a multa aplicada no referido auto de infrao nula, por afronta aos
princpios da legalidade, motivao, contraditrio e ampla defesa, segundo o ilustre professor
Helly Lopes Meirelles: O exame do ato administrativo revela
nitidamente a existncia de cinco necessrios sua formao, competncia, finalidade, forma,
objeto.( Direito Administrativo 24 edio). requisitos, a saber: motivo e Brasileiro,
Maria Sylvia Zanella Di Pietro, enumera os elementos do Ato administrativo como sendo,
sujeito, objeto, forma, motivo e finalidade. Sem a convergncia desses elementos no se
aperfeioa o ato e, consequentemente, no ter condies para produzir efeitos vlidos.
Existem duas categorias de atos invlidos, os nulos e os anulveis, os primeiros gerando efeitos
retroativos ( ex tunc ) e o segundo no retroage ( ex nunc), no mbito do direito
administrativo, por se tratar de matria de direito pblico s existem atos nulos, conforme
ensina o ilustre administrativista HELLY LOPES:
... em Direito Pblico no h lugar para atos anulveis, como j assinalamos
precedentemente . Isto porque a nulidade (absoluta) e a nulidade ( relativa) assentam,
respectivamente, na ocorrncia do interesse pblico e do interesse privado na manuteno ou
eliminao do ato irregular. (idem).
Como observamos dos ensinamentos acima trazidos a falta de qualquer requisito (elemento)
do ato administrativo acarreta a nulidade como sano, devendo o ato ser desconstitudo
desde o seu nascedouro.
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IV.
DO SUJEITO PASSIVO
Conforme ser demonstrado adiante, a nova disciplina constitucional referente aos ndios
introduziu modificaes no regime tutelar do Estatuto do ndio, de forma que no se pode
falar em responsabilidade objetiva da FUNAI pela conduta da Comunidade Indgenasupramencionada. A sistemtica vigente antes da Constituio Federal de 1988, considerava os
ndios como pessoas relativamente incapazes (Cdigo Civil de 1916). O Estatuto do ndio, por
sua vez, estabeleceu, em seu art. 7, que "os ndios e as comunidades indgenas ainda no
integrados comunho nacional" ficariam sujeitos a um regime tutelar incumbido Unio,
que a exerceria atravs de rgo federal competente, o qual veio a ser a FUNAI. O tratamento
dispensado aos povos indgenas estava inserido no esprito de promover a sua "integrao"
sociedade, como ressuma evidenciado no art. 1 da Lei 6.001/73, in verbis:
"Art. 1. Esta Lei regula a situao jurdica dos ndios ou silvcolas e das comunidades
indgenas, com o propsito de preservar a sua cultura e integr-los, progressiva eharmoniosamente, comunho nacional." (grifamos)
Em outras palavras, o ordenamento anterior Carta Magna vigente proclamava que a tutela
da Unio teria a finalidade de incorporar os ndios a uma cultura diversa da sua, como
condio imperiosa para que adquirissem capacidade civil. Enquanto tal no ocorresse,
permaneceriam sob a tutela do Estado. Em verdade, sob o lema de respeitar os usos, costumes
e tradies dos "silvcolas", a legislao supracitada assentava-se em uma ideologia
integracionista expressa em dispositivos que se referem "integrao dos ndios comunho
nacional" e sua "adaptao civilizao do pas" como objetivos a serem atingidos. O
advento da Constituio de 1988, por outro lado, dentre tantas outras progresses no campo
social, ampliou sobremaneira os direitos dos povos indgenas. A nova Carta rompeu com a
tradio de integrao do ndio aos valores da sociedade ocidental, assegurando aos ndios o
direito de permanecerem como tais e de manterem a sua identidade cultural enquanto povos
etnicamente diferenciados,
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reconhecendo permanentemente sua organizao social, costumes, lnguas, crenas e
tradies e seus direitos originrios sobre as terras que ocupam. A importncia dessa
observao decorre da constatao de que a Lex Mater no fala, em nenhum momento, de
tutela dos ndios pela Unio. A nova ordem constitucional, isto sim, altera o enfoque do papel
do Estado, transmudando a ptica da tutela de pessoas para a da proteo de direitos.
Compete Unio, precisamente, a incumbncia de proteger e fazer respeitar os direitos
indgenas. Nesse sentido, o art. 232 da CF/88 contm disposio de extrema relevncia para a
demonstrao do direito da FUNAI, ipsis litteris:
"Art. 232. Os ndios, suas comunidades e organizaes so partes legtimas para ingressar emjuzo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministrio Pblico em todos os atos
do processo." (grifamos)
A norma constitucional ventilada consagra a capacidade processual dos povos indgenas. Os
ndios no mais necessitam da assistncia judicial do Estado para defenderem seus direitos
judicialmente, podendo demandar em juzo, inclusive, contra o prprio Estado, seu suposto
tutor. O caso em tela configura nitidamente hiptese de no-recepo de diversos dispositivos
do Estatuto do ndio pela Constituio em vigor. Toda a sistemtica relativa tutela estatal
deve ser reexaminada e adaptada nova ordem constitucional. Tal entendimento j foi
preconizado, inclusive, em documento da Presidncia da Repblica intitulado "Sociedades
Indgenas e a Ao de Governo", onde consta que: "Os dispositivos atuais do Estatuto
permanecem vigentes naquilo que no confrontem a Constituio. Por isso, sua leitura deve
ser feita com a cautela de singularizar os aspectos que requerem adaptao ao novo texto
constitucional. O aspecto mais importante que a tica da tutela de pessoas foi substituda
pela da tutela de direitos." (Documento publicado em 1996. Acessvel em
https://www.planalto.gov.br/publi_04/colecao/indio4.htm) Desta feita, com as inovaes
trazidas baila pela Magna Carta, o instituto da tutela estatal sobre os ndios deve ser
reavaliado, luz dos aspectos realados, o que enseja impostergveis consideraes para odeslinde do caso concreto.
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Da mesma forma, no se pode mais admitir que o Estado se responsabilize objetivamente
pelas aes e omisses dos ndios. Tal tratamento no condiz com o esprito arraigado na
Constituio. A proteo dos direitos indgenas no importa a chancela da FUNAI a condutas
ilegais que venham a ser praticada por ndios. Esta Fundao, por outro lado, pelo s fato de
ser a entidade responsvel pela proteo e promoo dos direitos indgenas, no possui meios
para obrigar qualquer pessoa a fazer ou deixar de fazer algo. A FUNAI zela, isto sim, pelo bem-
estar dos ndios, mas no anui a ocupaes de terras nem a desobedincia de ordens judiciais,
ou supostas infraes contra ao meio ambiente. In casu, o suposto ato infracional praticado
pela Comunidade Indgena focalizada no contou com a anuncia da FUNAI. No se ressuma
escorreita, portanto, data maxima venia, a cominao de multa a FUNAI, para o caso deconduta praticada por terceiros. Afinal, como quedou destacado nas linhas anteriores, a
postura paternalista inerente ao instituto da tutela sofreu profunda alterao aps 1988.
Outrossim, se o Direito reconhece aos ndios a capacidade processual para defenderem seus
direitos em juzo, inclusive ajuizando aes contra a FUNAI (como freqentemente ocorre),
decorrncia lgica desse entendimento que as comunidades indgenas tambm se
responsabilizam por seus atos que afrontem as normas jurdicas. Ademais, a invocao do art.
37, 6 da CF/88 para fundamentar a responsabilidade da FUNAI, com base em suposta
omisso na tutela, contradiz tudo o que foi dito a respeito do papel do Estado na defesa dos
ndios. No se pode mais dizer que a FUNAI tem a funo de tutelar os ndios, fiscalizando
cotidianamente suas aes com vistas a impedi-los de transgredir normas jurdicas. No essa
a atribuio legal da FUNAI, at mesmo porque o ordenamento jurdico no confere aos ndios
a condio de inimputveis. Alis, no caso em tela, ainda que se admitisse a possibilidade de
aplicao do art. 37, 6, no se poderia cominar a multa estipulada FUNAI, uma vez que a
responsabilidade desta decorreria, em tese, de sua omisso na tutela respectiva. Como se
sabe, no existe responsabilidade objetiva do Estado por omisso. Nesses casos, a
responsabilidade subjetiva. Para que se cogitasse da responsabilidade da FUNAI por omisso
na tutela dos ndios, portanto, dever-se-ia
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perquirir quanto existncia de culpa no caso concreto. a conhecida teoria da falta de
servio, que responsabiliza o Estado quando o servio pblico no funcionou ou funcional mal.
Saliente-se, ademais, que se entendssemos dessa forma, o IBAMA tambm deveria ser
igualmente responsabilizado pela omisso no que tange a atuao dos madeireiros na regio,
ponto de origem de toda a celeuma. O sujeito passivo da respectiva multa deve ser a pessoa
fsica ou jurdica que pratica a conduta descrita na norma, no foi a FUNAI que bloqueou a
reserva indgena ou que propiciou a extrao ilegal da madeira, e ainda, no prospera a tese
da responsabilidade objetiva do tutor em relao ao tutelado pelos argumentos expostos
acima. Diante do exposto, a multa nula, pois foi aplicada contra quem no a devia. V. DO
MRITO
FUNAI, entidade autrquica federal, criada aps autorizao da Lei 5.371/67, restou a
incumbncia de garantir o cumprimento da poltica indigenista resguardando, dentre outras
finalidades, a garantia da posse permanente das terras habitadas pelos ndios e o usufruto
exclusivo de seus recursos naturais. A Medida Provisria n. 2.166, de 24 de agosto de 2004,
acrescentou ao Cdigo Florestal a possibilidade de explorao de recursos florestais em terras
indgenas, nos seguintes termos, in verbis: Art. 3. A explorao dos recursos florestais em
terras indgenas somente poder ser realizada pelas comunidades indgenas em regime demanejo florestal sustentvel, para atender a sua subsistncia, respeitados os arts. 2 e 3 deste
Cdigo. Desta feita, o que se busca o atingimento do regime de manejo florestal sustentvel,
estritamente para fins de subsistncia indgena, o que somente ser alcanado com uma
parceria com os rgos de fiscalizao ambiental, coibindo a atuao de madeireiros e,
conseqentemente, evitando o aliciamento dos ndios. No presente caso, no h que se
cogitar em conivncia ou coresponsabilidade da FUNAI, que usou de todos os meios que
dispunha para tentar conter a ao exploratria dos madeireiros na reserva indgena de Zor,
inclusive, solicitando, antes
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mesmo da deflagrao da crise, a ao fiscalizatria em parceria com rgos ambientais da
regio. Tal como j dito em linhas volvidas, segundo a nova exegese constitucional, no se
pode admitir que o Estado se responsabilize pelas aes e omisses dos ndios, competindo
FUNAI, to somente, zelar pela promoo e proteo dos direitos indgenas, no sendo dotada
de poderes para compeli-los a fazer ou deixar de fazer algo. De outra sorte, ressalta-se que os
ndios possuem uma perspectiva antropolgica diferenciada, a qual nos permitir afirmar que
eles no so madeireiros e que, caso se entenda que houve omisso por parte estatal, esta,
por sua vez, no foi da atuao da FUNAI, mas de omisso na fiscalizao dos rgos
ambientais, que permitiram o reincio da extrao irregular de madeira na regio de Pacarna.
VI. DO PEDIDO Isto posto, a FUNAI vem a presena desta autoridade administrativa requerer
que: a) b) c) a multa seja julgada nula por falta de motivao, e afronta ao devido processo
legal; a FUNAI seja excluda da condio de sujeito passivo da respectiva sano; em seu
mrito, a multa seja considerada indevida, em face da diligente atuao da FUNAI, por
intermdio de seu Ncleo de Apoio local em J Paran; Por todos os meios de prova legalmente
admitidos, inclusive recebendo como verdadeiras as cpias dos documentos ora acostados, no
termos do art. 24 da lei 10.552/2002. Termos em que pede e espera deferimento, Braslia, 23
de setembro de 2006.
d)
LUIZ FERNANDO VILLARES E SILVA Procurador-Geral da FUNAI AGU/PGF/PFE-FUNAI.
RENATA SANTANA F. DE PAULA Procuradora Federal AGU/PGF/PFE-FUNAI
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