AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR RESPONSÁVEL PELO JULGAMENTO DAS DEFESAS ADMINISTRATIVAS DO IBAMA

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    AO EXCELENTSSIMO SENHOR RESPONSVEL PELO JULGAMENTO DAS DEFESAS

    ADMINISTRATIVAS DO IBAMA.

    FUNDAO NACIONAL DO NDIO, entidade autrquica federal, com sede nacional na capital

    federal, SEPS 702/902, Ed. Lex 3 andar, CEP: 70.390-025, telefones: 061. 313.3501/226.8503,

    criada aps autorizao da Lei 5.371, de 05 de dezembro de 1967, com Estatuto aprovado pelo

    Decreto n 4.645, de 25 de maro de 2003, por sua PROCURADORIA FEDERAL ESPECIALIZADA,

    com sede no mesmo endereo citado, onde poder receber as intimaes de praxe, vem,

    conforme dispe o pargrafo 6 do art. 11-B, da Lei 9.028, de 12 de abril de 1995, com redao

    dada pela Medida Provisria 2.180-35, de 24.08.2001, por meio da Procuradora Federal que

    esta subscreve, mandato ex vi legis (art. 10 da Lei 10.480, de 02.07.2002; art. 9o da Lei 9.469,

    de 10.07.1997; art. 37, I, da MP 2229-43, de 06.09.2001; e art. 17, I, da LC 73, de 10.02.1995),

    apresentar DEFESA ADMINISTRATIVA, com o fito de contestar multa aplicada a esta Fundao

    por meio do Auto de Infrao n 553824, srie D, de acordo com os seguintes fundamentos

    de fato e de direito: I. DA TEMPESTIVIDADE.

    De acordo com o art. 71, I, da lei 9.605/98, o infrator tem o prazo de 20 dias, contados da data

    da cincia da autuao, para apresentar sua defesa. notrio, no entanto, que a Fazenda

    Pblica, entenda-se, Unio, Estados, Distrito Federal, Municpios, Autarquias e Fundaes, de

    acordo com o art. 188 do Cdigo de Processo Civil, possui prazo em qudruplo para contestar.

    Tal prerrogativa justifica-se pela ocorrncia da burocracia necessria para realizao de atos da

    Administrao Pblica, e, ainda, por no existir para Fazenda a possibilidade de escolher as

    causas que patrocina, ao contrrio da advocacia privada. Destarte, onde existem as mesmas

    razes aplica-se o mesmo direito, contando-se em qudruplo o prazo para apresentao de

    defesa administrativa por parte desta Pessoa Jurdica de Direito Pblico.

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    313-3519 Fax: 313-3676

    II. DOS FATOS. Desde o incio do ms de maro do corrente ano, os madeireiros da regio de

    Pacarna comearam a estreitar relaes com algumas lideranas da comunidade indgena de

    Zor, visando a extrao ilegal de madeira na referida terra indgena. No intuito de evitar um

    agravamento da situao e o reincio da explorao madeireira na rea indgena, o Ncleo de

    Apoio Local de J Paran/ FUNAI oficiou a Polcia Federal (Ofcio Cir. N. 010, de 21/03/2006 e

    Ofcio Circ. N. 012), solicitando a notificao dos madeireiros que estavam a pressionar os

    indgenas, enviando, tambm, cpia do ofcio tanto ao Ministrio Pblico Federal, quanto ao

    IBAMA, para as providncias cabveis. Em virtude da constante presena de aliciadores nos

    arredores da reserva, alguns lderes da comunidade indgena de Zor, beneficirios da

    explorao irregular da madeira, acabaram por permitir a entrada de mquinas e tratores dosmadeireiros na citada rea. A FUNAI, que vinha trabalhando em parceria com a comunidade

    indgena de Zor, foi impedida, pelos ndios, de ingressar na reserva, sendo os seus

    funcionrios compelidos a deixar o local. Os lderes da comunidade, pintados para a guerra,

    determinaram o bloqueio da reserva, protegendo os infratores, que ali permaneceram com

    tratores e caminhes. Em virtude do agravamento da situao e da presena macia de

    madeireiros na reserva, realizou-se uma ao conjunta entre FUNAI/IBAMA/DPF e Polcia

    Militar Ambiental com o escopo de obstaculizar a extrao madeireira na regio. Em que pese

    a diligente atuao do Ncleo de Apoio local de J Paran/ FUNAI, que atua em estrita parceria

    com o IBAMA, Polcia Federal e Polcia Militar Ambiental, foi lavrado Auto de Infrao, no dia

    12 de setembro, em desfavor da FUNAI, sob o argumento desta Fundao ser conivente e co-

    responsvel com os crimes ambientais que vm acontecendo na regio, descrevendo a

    infrao nos seguintes termos, ipsis litteris: Danificar vegetao em rea indgena considerada

    de preservao permanente, sendo co-responsvel com o corte de rvores e venda de

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    madeiras para os empresrios do ramo madeireiro da regio de Boa Vista do Pacarna.

    Acrescente-se, ademais, que a FUNAI foi a responsvel pela realizao da ao fiscalizatria,

    sendo que a situao somente alcanou tal grau de calamidade em virtude da constante

    presso dos madeireiros na regio, que ali permanecem, em razo da omisso do rgo de

    fiscalizao ambiental. Saliente-se, ainda, que a FUNAI, durante todo este perodo, vinha,

    sistematicamente, oficiando IBAMA/ DPF/ MPF, bem como, tambm, vinha auxiliando e

    efetivamente participando das fiscalizaes ali realizadas. No concordando com aplicao

    desta multa, e evitando, de imediato, judicializar questes envolvendo duas entidades pblicas

    federais, estamos buscando por meio do processo administrativo apresentar nossas razes de

    fato e de direito. III. DA NULIDADE DO AUTO DE INFRAO. III.a. DA FALTA DE MOTIVAODiante dos pilares da legalidade e moralidade administrativa, a motivao obrigatria nos

    atos administrativos que afetam o interesse individual do administrado. A Constituio Federal

    de 1988 consagrou o princpio da moralidade, que passa a ser tido como obrigatrio, para que

    a atuao tica do administrador fique demonstrada pela exposio dos motivos do ato e para

    garantir o prprio acesso ao Judicirio.

    "Art. 37. A administrao pblica direta e indireta de qualquer dos Poderes da Unio, dos

    Estados, do Distrito Federal e dos Municpios obedecer aos princpios de legalidade,

    impessoalidade, moralidade, publicidade e eficincia e, tambm, ao seguinte:".

    A lei que regula o Processo administrativo no mbito federal (9.784/99), prescreve em seu art.

    2 e 50:

    Art. 2. A Administrao Pblica obedecer, dentre outros, aos princpios da legalidade,

    finalidade, motivao, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa,

    contraditrio, segurana jurdica, interesse pblico e eficincia.(g.n.)

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    Art. 50. Os atos administrativos devero ser motivados, com indicao dos fatos e

    fundamentos jurdicos, quando: I(...); II imponham ou agravem deveres, encargos ou

    sanes; III(...); (g.n.)

    A multa aplicada FUNAI no possui motivao, apenas se limitando a dar o enquadramento

    da conduta, como transcrevemos a seguir:

    Danificar vegetao em rea indgena considerada de preservao permanente, sendo co-

    responsvel com o corte de rvores e venda de madeiras para os empresrios do ramomadeireiro da regio de Boa Vista do Pacarna.

    Isso no fundamentao legal, pois apenas enquadra legalmente a conduta da FUNAI.

    Fundamentao (motivao) o exame das questes de fato e de direito, onde se constri as

    bases lgicas da parte decisria, onde se fixa as premissas da deciso aps laborioso exame

    das alegaes relevantes que as partes formularam, bem como do enquadramento do litgio

    nas normas legais aplicveis. bom frisar que se trata de enquadramento genrico. Pela

    motivao, o administrador pblico justifica sua ao administrativa, indicando os fatos(pressupostos de fato) que ensejam o ato e os preceitos jurdicos (pressupostos de direito) que

    autorizam sua prtica, contudo a deciso supra mencionada no analisa devidamente os

    pressupostos de fato. No resta sombra de dvida que o ato administrativo vinculado em

    apreo est eivado de vcio pela falta de motivao, devendo o mesmo ser desconstitudo

    atravs da sano de nulidade.

    III.b. DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

    A Constituio Federal em seu art. 5, inciso LV elevou a sede de princpio constitucional o

    devido processo legal e a ampla defesa tanto no mbito judicial quanto no administrativo:

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    Art 5. LV Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral

    so assegurados o contraditrio e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;.

    Normalmente, para que seja aplicada uma multa necessrio que haja um processo

    administrativo em que seja garantido o contraditrio e a ampla defesa para que depois a multa

    seja mensurada e aplicada. De acordo com os ensinamentos de Helly Lopes Meirelles:

    O reconhecimento da auto-executoriedade tornou-se mais restrito, em face do art, 5, LV, da

    CF, que assegura o contraditrio e a ampla defesa inclusive nos procedimentos

    administrativos. No obstante, quando o interesse pblico correr perigo iminente, a auto-

    executoriedade deve ser reconhecida.1 (g.n).

    A prpria lei 9.605/1998, que regulamenta o processo administrativo especfico do dano

    ambiental determina que:

    Art. 70 Considera-se infrao administrativa ambiental toda ao ou omisso que viole

    regras jurdicas de uso, gozo, promoo, proteo e recuperao do meio ambiente. (...) 4

    As infraes ambientais so apuradas em processo administrativo prprio, assegurado o

    direito de ampla defesa e o contraditrio, observadas as disposies desta lei. Art. 71 O

    processo administrativo para apurao de infrao deve observar os seguintes prazosmximos: I vinte dias para o infrator oferecer defesa ou impugnao contra o auto de

    infrao, contados da data de cincia da autuao; II trinta dias para a autoridade

    competente julgar o auto de infrao, contados da data de sua lavratura, apresentada ou no

    a defesa ou impugnao; III vinte dias para o infratos recorrer a deciso condenatria

    instncia superior do Sistema Nacional de Meio Ambiente SISNAMA, ou Diretoria de Portos

    e Costas, do Ministrio da Marinha, de acordo com o tipo de autuao; IV cinco dias para o

    pagamento da multa, contados da data do recebimento da notificao.

    O Auto de infrao o ato inicial do procedimento, que desemboca na notificao para

    pagamento de multa, que o ato final. No se pode inverter as coisas.

    1

    MEIRELLES, Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro So Paulo: Editora Malheiros, 1999,

    pg. 145.

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    Como se verifica do auto de infrao, o agente do IBAMA de pronto calculou o valor da multa,

    no montante de R$ 50.000,00, e ainda, exigiu o seu pagamento at o dia 02/10/2006. A multa

    s se torna exigvel aps todo o processo administrativo onde assegurado o contraditrio e a

    ampla defesa, pois, caso contrrio, est-se aplicando uma sano sem o devido processo legal.

    Diante do exposto, a multa aplicada no referido auto de infrao nula, por afronta aos

    princpios da legalidade, motivao, contraditrio e ampla defesa, segundo o ilustre professor

    Helly Lopes Meirelles: O exame do ato administrativo revela

    nitidamente a existncia de cinco necessrios sua formao, competncia, finalidade, forma,

    objeto.( Direito Administrativo 24 edio). requisitos, a saber: motivo e Brasileiro,

    Maria Sylvia Zanella Di Pietro, enumera os elementos do Ato administrativo como sendo,

    sujeito, objeto, forma, motivo e finalidade. Sem a convergncia desses elementos no se

    aperfeioa o ato e, consequentemente, no ter condies para produzir efeitos vlidos.

    Existem duas categorias de atos invlidos, os nulos e os anulveis, os primeiros gerando efeitos

    retroativos ( ex tunc ) e o segundo no retroage ( ex nunc), no mbito do direito

    administrativo, por se tratar de matria de direito pblico s existem atos nulos, conforme

    ensina o ilustre administrativista HELLY LOPES:

    ... em Direito Pblico no h lugar para atos anulveis, como j assinalamos

    precedentemente . Isto porque a nulidade (absoluta) e a nulidade ( relativa) assentam,

    respectivamente, na ocorrncia do interesse pblico e do interesse privado na manuteno ou

    eliminao do ato irregular. (idem).

    Como observamos dos ensinamentos acima trazidos a falta de qualquer requisito (elemento)

    do ato administrativo acarreta a nulidade como sano, devendo o ato ser desconstitudo

    desde o seu nascedouro.

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    IV.

    DO SUJEITO PASSIVO

    Conforme ser demonstrado adiante, a nova disciplina constitucional referente aos ndios

    introduziu modificaes no regime tutelar do Estatuto do ndio, de forma que no se pode

    falar em responsabilidade objetiva da FUNAI pela conduta da Comunidade Indgenasupramencionada. A sistemtica vigente antes da Constituio Federal de 1988, considerava os

    ndios como pessoas relativamente incapazes (Cdigo Civil de 1916). O Estatuto do ndio, por

    sua vez, estabeleceu, em seu art. 7, que "os ndios e as comunidades indgenas ainda no

    integrados comunho nacional" ficariam sujeitos a um regime tutelar incumbido Unio,

    que a exerceria atravs de rgo federal competente, o qual veio a ser a FUNAI. O tratamento

    dispensado aos povos indgenas estava inserido no esprito de promover a sua "integrao"

    sociedade, como ressuma evidenciado no art. 1 da Lei 6.001/73, in verbis:

    "Art. 1. Esta Lei regula a situao jurdica dos ndios ou silvcolas e das comunidades

    indgenas, com o propsito de preservar a sua cultura e integr-los, progressiva eharmoniosamente, comunho nacional." (grifamos)

    Em outras palavras, o ordenamento anterior Carta Magna vigente proclamava que a tutela

    da Unio teria a finalidade de incorporar os ndios a uma cultura diversa da sua, como

    condio imperiosa para que adquirissem capacidade civil. Enquanto tal no ocorresse,

    permaneceriam sob a tutela do Estado. Em verdade, sob o lema de respeitar os usos, costumes

    e tradies dos "silvcolas", a legislao supracitada assentava-se em uma ideologia

    integracionista expressa em dispositivos que se referem "integrao dos ndios comunho

    nacional" e sua "adaptao civilizao do pas" como objetivos a serem atingidos. O

    advento da Constituio de 1988, por outro lado, dentre tantas outras progresses no campo

    social, ampliou sobremaneira os direitos dos povos indgenas. A nova Carta rompeu com a

    tradio de integrao do ndio aos valores da sociedade ocidental, assegurando aos ndios o

    direito de permanecerem como tais e de manterem a sua identidade cultural enquanto povos

    etnicamente diferenciados,

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    reconhecendo permanentemente sua organizao social, costumes, lnguas, crenas e

    tradies e seus direitos originrios sobre as terras que ocupam. A importncia dessa

    observao decorre da constatao de que a Lex Mater no fala, em nenhum momento, de

    tutela dos ndios pela Unio. A nova ordem constitucional, isto sim, altera o enfoque do papel

    do Estado, transmudando a ptica da tutela de pessoas para a da proteo de direitos.

    Compete Unio, precisamente, a incumbncia de proteger e fazer respeitar os direitos

    indgenas. Nesse sentido, o art. 232 da CF/88 contm disposio de extrema relevncia para a

    demonstrao do direito da FUNAI, ipsis litteris:

    "Art. 232. Os ndios, suas comunidades e organizaes so partes legtimas para ingressar emjuzo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministrio Pblico em todos os atos

    do processo." (grifamos)

    A norma constitucional ventilada consagra a capacidade processual dos povos indgenas. Os

    ndios no mais necessitam da assistncia judicial do Estado para defenderem seus direitos

    judicialmente, podendo demandar em juzo, inclusive, contra o prprio Estado, seu suposto

    tutor. O caso em tela configura nitidamente hiptese de no-recepo de diversos dispositivos

    do Estatuto do ndio pela Constituio em vigor. Toda a sistemtica relativa tutela estatal

    deve ser reexaminada e adaptada nova ordem constitucional. Tal entendimento j foi

    preconizado, inclusive, em documento da Presidncia da Repblica intitulado "Sociedades

    Indgenas e a Ao de Governo", onde consta que: "Os dispositivos atuais do Estatuto

    permanecem vigentes naquilo que no confrontem a Constituio. Por isso, sua leitura deve

    ser feita com a cautela de singularizar os aspectos que requerem adaptao ao novo texto

    constitucional. O aspecto mais importante que a tica da tutela de pessoas foi substituda

    pela da tutela de direitos." (Documento publicado em 1996. Acessvel em

    https://www.planalto.gov.br/publi_04/colecao/indio4.htm) Desta feita, com as inovaes

    trazidas baila pela Magna Carta, o instituto da tutela estatal sobre os ndios deve ser

    reavaliado, luz dos aspectos realados, o que enseja impostergveis consideraes para odeslinde do caso concreto.

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    Da mesma forma, no se pode mais admitir que o Estado se responsabilize objetivamente

    pelas aes e omisses dos ndios. Tal tratamento no condiz com o esprito arraigado na

    Constituio. A proteo dos direitos indgenas no importa a chancela da FUNAI a condutas

    ilegais que venham a ser praticada por ndios. Esta Fundao, por outro lado, pelo s fato de

    ser a entidade responsvel pela proteo e promoo dos direitos indgenas, no possui meios

    para obrigar qualquer pessoa a fazer ou deixar de fazer algo. A FUNAI zela, isto sim, pelo bem-

    estar dos ndios, mas no anui a ocupaes de terras nem a desobedincia de ordens judiciais,

    ou supostas infraes contra ao meio ambiente. In casu, o suposto ato infracional praticado

    pela Comunidade Indgena focalizada no contou com a anuncia da FUNAI. No se ressuma

    escorreita, portanto, data maxima venia, a cominao de multa a FUNAI, para o caso deconduta praticada por terceiros. Afinal, como quedou destacado nas linhas anteriores, a

    postura paternalista inerente ao instituto da tutela sofreu profunda alterao aps 1988.

    Outrossim, se o Direito reconhece aos ndios a capacidade processual para defenderem seus

    direitos em juzo, inclusive ajuizando aes contra a FUNAI (como freqentemente ocorre),

    decorrncia lgica desse entendimento que as comunidades indgenas tambm se

    responsabilizam por seus atos que afrontem as normas jurdicas. Ademais, a invocao do art.

    37, 6 da CF/88 para fundamentar a responsabilidade da FUNAI, com base em suposta

    omisso na tutela, contradiz tudo o que foi dito a respeito do papel do Estado na defesa dos

    ndios. No se pode mais dizer que a FUNAI tem a funo de tutelar os ndios, fiscalizando

    cotidianamente suas aes com vistas a impedi-los de transgredir normas jurdicas. No essa

    a atribuio legal da FUNAI, at mesmo porque o ordenamento jurdico no confere aos ndios

    a condio de inimputveis. Alis, no caso em tela, ainda que se admitisse a possibilidade de

    aplicao do art. 37, 6, no se poderia cominar a multa estipulada FUNAI, uma vez que a

    responsabilidade desta decorreria, em tese, de sua omisso na tutela respectiva. Como se

    sabe, no existe responsabilidade objetiva do Estado por omisso. Nesses casos, a

    responsabilidade subjetiva. Para que se cogitasse da responsabilidade da FUNAI por omisso

    na tutela dos ndios, portanto, dever-se-ia

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    perquirir quanto existncia de culpa no caso concreto. a conhecida teoria da falta de

    servio, que responsabiliza o Estado quando o servio pblico no funcionou ou funcional mal.

    Saliente-se, ademais, que se entendssemos dessa forma, o IBAMA tambm deveria ser

    igualmente responsabilizado pela omisso no que tange a atuao dos madeireiros na regio,

    ponto de origem de toda a celeuma. O sujeito passivo da respectiva multa deve ser a pessoa

    fsica ou jurdica que pratica a conduta descrita na norma, no foi a FUNAI que bloqueou a

    reserva indgena ou que propiciou a extrao ilegal da madeira, e ainda, no prospera a tese

    da responsabilidade objetiva do tutor em relao ao tutelado pelos argumentos expostos

    acima. Diante do exposto, a multa nula, pois foi aplicada contra quem no a devia. V. DO

    MRITO

    FUNAI, entidade autrquica federal, criada aps autorizao da Lei 5.371/67, restou a

    incumbncia de garantir o cumprimento da poltica indigenista resguardando, dentre outras

    finalidades, a garantia da posse permanente das terras habitadas pelos ndios e o usufruto

    exclusivo de seus recursos naturais. A Medida Provisria n. 2.166, de 24 de agosto de 2004,

    acrescentou ao Cdigo Florestal a possibilidade de explorao de recursos florestais em terras

    indgenas, nos seguintes termos, in verbis: Art. 3. A explorao dos recursos florestais em

    terras indgenas somente poder ser realizada pelas comunidades indgenas em regime demanejo florestal sustentvel, para atender a sua subsistncia, respeitados os arts. 2 e 3 deste

    Cdigo. Desta feita, o que se busca o atingimento do regime de manejo florestal sustentvel,

    estritamente para fins de subsistncia indgena, o que somente ser alcanado com uma

    parceria com os rgos de fiscalizao ambiental, coibindo a atuao de madeireiros e,

    conseqentemente, evitando o aliciamento dos ndios. No presente caso, no h que se

    cogitar em conivncia ou coresponsabilidade da FUNAI, que usou de todos os meios que

    dispunha para tentar conter a ao exploratria dos madeireiros na reserva indgena de Zor,

    inclusive, solicitando, antes

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    mesmo da deflagrao da crise, a ao fiscalizatria em parceria com rgos ambientais da

    regio. Tal como j dito em linhas volvidas, segundo a nova exegese constitucional, no se

    pode admitir que o Estado se responsabilize pelas aes e omisses dos ndios, competindo

    FUNAI, to somente, zelar pela promoo e proteo dos direitos indgenas, no sendo dotada

    de poderes para compeli-los a fazer ou deixar de fazer algo. De outra sorte, ressalta-se que os

    ndios possuem uma perspectiva antropolgica diferenciada, a qual nos permitir afirmar que

    eles no so madeireiros e que, caso se entenda que houve omisso por parte estatal, esta,

    por sua vez, no foi da atuao da FUNAI, mas de omisso na fiscalizao dos rgos

    ambientais, que permitiram o reincio da extrao irregular de madeira na regio de Pacarna.

    VI. DO PEDIDO Isto posto, a FUNAI vem a presena desta autoridade administrativa requerer

    que: a) b) c) a multa seja julgada nula por falta de motivao, e afronta ao devido processo

    legal; a FUNAI seja excluda da condio de sujeito passivo da respectiva sano; em seu

    mrito, a multa seja considerada indevida, em face da diligente atuao da FUNAI, por

    intermdio de seu Ncleo de Apoio local em J Paran; Por todos os meios de prova legalmente

    admitidos, inclusive recebendo como verdadeiras as cpias dos documentos ora acostados, no

    termos do art. 24 da lei 10.552/2002. Termos em que pede e espera deferimento, Braslia, 23

    de setembro de 2006.

    d)

    LUIZ FERNANDO VILLARES E SILVA Procurador-Geral da FUNAI AGU/PGF/PFE-FUNAI.

    RENATA SANTANA F. DE PAULA Procuradora Federal AGU/PGF/PFE-FUNAI

  • 7/28/2019 AO EXCELENTSSIMO SENHOR RESPONSVEL PELO JULGAMENTO DAS DEFESAS ADMINISTRATIVAS DO IBAMA

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