Apostila - Projeto Pedagógico e Gestão Da Escola
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 31 PROJETO 41.1 FINS DA EDUCAÇÃO 51.2 PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO OU PROJETO PEDAGÓGICO? 71.3 PROJETO PEDAGÓGICO 9
2 GESTÃO DA ESCOLA 112.1 CONCEPÇÕES 112.2 DEMOCRACIA E GESTÃO 122.3 A GESTÃO AFASTANDO-SE DO ESCOLAR 182.4 GESTÃO ESCOLAR E PROJETO PEDAGÓGICO 202.5 DIRETOR DE ESCOLA COMO ARTICULADOR DO PROJETO
PEDAGÓGICO 23
CONSIDERAÇÕES FINAIS 27 REFERÊNCIAS 28
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INTRODUÇÃO
O próprio título desta Disciplina já aponta para dois elementos indispensáveis
para as Unidades Educacionais. Refiro-me a necessidade de que elas possuam um
Projeto Pedagógico e a importância da Gestão da Escola. Esses elementos
combinados, a nosso ver, têm uma contribuição decisiva na qualidade do ensino.
A partir dessas considerações, trabalharemos, nessa Disciplina, com
concepções de Projeto, de Projeto Pedagógico e Gestão Escolar. Faremos referências
da importância de Projeto Pedagógico para o caminhar das Unidades Educacionais e
da sua Gestão. Com relação à Gestão das Escolas, pretendemos discutir sobre o seu
papel, atribuições que atualmente vem assumindo, conflitos e dificuldades. Também
teceremos considerações acerca do papel do Gestor na construção do Projeto
Pedagógico.
Apresentaremos esta articulação, que consideramos necessária, como uma
possibilidade de resgatar o Gestor para a sua função precípua, qual seja, a de cuidar do
ensino.
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1 PROJETO
“Somos feitos da mesma matéria que nossos sonhos.”
William Shakespeare
Projeto vem do latim projectus. Significa lançar, arremessar para frente. No
sentido etimológico, projeto é algo que impele para frente, para o futuro. Ter um projeto
é vislumbrar o futuro.
Todas as pessoas possuem projetos. Há pessoas que têm o projeto de fazer
um curso: superior, de língua estrangeira, de informática, de música, de pintura etc.
Outras têm o projeto de viajar para o Nordeste, para a Europa ou para outro lugar.
Muitas pessoas têm o projeto de possuir uma casa própria. Várias querem um
automóvel. A lista dos nossos sonhos, dos nossos projetos é quase infinita, sobretudo
no que se refere a alcançar coisas materiais.
Para conseguirmos o que desejamos, a primeira coisa é projetá-lo nos
nossos pensamentos, é idealizá-lo. Posteriormente, buscamos a concretização do
nosso projeto através de um planejamento, que nos possibilitará conquistar o que
pretendemos, pois ele nos ajudará na construção da realidade desejada, que, no nosso
caso, é a realização do nosso projeto.
O projeto é, pois, uma antecipação de si mesmo na medida da existência, numa vaga antecipação dele, mas uma “compreensão”, quer dizer, um “poder-ser”. O projeto, neste sentido, é inclusive anterior à possibilidade, pois só porque há projeto, há possibilidade. (VALLEJO, 2002, p. 86)
Para a nossa vida, certamente temos muitos projetos. E, para a educação,
podemos ter um projeto ou projetos? O que vislumbramos? Voltemos a pensar na
nossa vida. O que buscamos quando projetamos viajar, fazer um curso ou adquirir
algo? Acredita-se que, com todos os nossos projetos, buscamos a felicidade. Afirma-se
que todos os seres humanos querem ser felizes. Aristóteles, afirma que a felicidade é o
bem supremo do homem.
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A Educação tem uma finalidade? Qual? Podemos dizer que está finalidade
pode ser um projeto? Primeiro vamos buscar uma resposta para a finalidade da
educação.
1.1 FINS DA EDUCAÇÃO
“As coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis
quanto se nos poderia fazer crer...”
Rainer Maria Rilke
Para que existe a educação? Pode-se dizer que é para a transmissão e
preservação do patrimônio cultural, que é transmitido de uma geração a outra.
Historicamente sabemos que, desde os povos mais antigos, a educação
consistia na transmissão dos valores culturais. Atualmente, essa finalidade parece ser
insuficiente, ou não mais consistir na finalidade primeira da educação, principalmente
da educação escolar.
Então, qual é o fim ou fins da educação?
Segundo Castillo (apud VALLEJO, 2002, p. 69):
Não há dúvida de que hoje a função principal da escola não é só ensinar, mas também educar, ou melhor, ensinar educando. Também é comumente aceito que toda educação fundamenta-se num conjunto de valores. Desses dois princípios se deduz, pois, que a instituição escolar, em seu planejamento e projeto, não pode, nem deve, prescindir da axiologia educativa, enquanto projeção de um conjunto de valores que pretendem humanizar o educando. Portanto, todo projeto, planejamento, organização e atividade escolar é inseparável do valor, pois é impossível concluir qualquer ação educativa sem referência expressa ou implícita, ao mundo dos valores. Desta forma, educação e valores são inseparáveis como são o corpo e a alma, a mente e o cérebro, no ser humano.
Nesse sentido, a discussão e elaboração do Projeto Pedagógico assumem
uma grande dimensão, pois não se trata de definir apenas quais conteúdos,
metodologia, recursos, mas, sobretudo, de definir quais serão os valores
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imprescindíveis nos quais serão pautadas as ações e que buscaremos contribuir para
desenvolver.
Há uma estreita relação entre o fim e ou fins da educação e valores.
Em relação aos valores, os fins são valores escolhidos e, por isso, perseguidos, relacionados, embora jamais alcançados em sua totalidade. Nem todos os valores são fins, mas todos os fins são valores preferidos, escolhidos, opções realizadas. (Idem, p.83)
Afirma-se que a educação tem como fim o desenvolvimento da nossa
humanidade. Para Castillo, apud Vallejo (2002, p. 79):
A herança biológica nos dá o ser, mas não o modo de ser, pois nascemos humanos, mas não humanizados; sociais, mas não socializados; morais, mas não moralizados... Aprendemos a ser humanos, sociais, morais... por meio da educação. O nascimento nos dá as capacidades, a educação desenvolve as faculdades e potencialidades que a herança nos proporciona. Esta é a tarefa de toda educação: fazer com que a pessoa que nasce aprenda a ser humana, entre os humanos, incorporando valores à sua existência.
A primeira vista, pode-nos parecer estranho esse pensamento de
desenvolvimento da nossa humanidade. Contudo, se analisarmos também do ponto de
vista das condições materiais de existência, percebe-se que muitíssimas pessoas
vivem, ou melhor, sobrevivem em condições sub humanas. Numa perspectiva ética,
entende-se que também é pouco humano, ou desumano, relegar outros seres a uma
condição degradante, aviltando a sua humanidade. Cortella (2000, p. 125) afirma que:
“a prática educacional tem como objetivo central fazer avançar a capacidade de
compreender e intervir na realidade para além do estágio presente, gerando autonomia
e humanização.”
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN (Lei 9394 98) no
Título II Dos Princípios e Fins da Educação Nacional estabelece no Art. 2º: A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
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A LDBEN assenta-se em princípios e aponta as finalidades da educação
nacional. Essa Lei, que estabelece as Diretrizes do país, define que a Educação deve
pautar-se em dois valores caros aos seres humanos: o da liberdade e o da
solidariedade. A importância do direcionamento legal fundamenta-se no entendimento
da necessidade de se desenvolverem valores imprescindíveis à formação humana.
Embora possa haver ressalvas das definições das finalidades da educação
pelo fato de serem elaboradas fora das instituições escolares, o que ocorre na
legislação, (na Constituição, LDBEN), os dispositivos legais possibilitam-lhes um caráter
de maior estabilidade. A manutenção ou permanência da indicação legal por um tempo
mais longo possibilita que esses princípios e finalidades sejam proficuamente
incorporados à prática educacional das escolas, pois sabemos de sobejo que a
formação humana não se realiza em pouco tempo.
Embora os fins possam ser estáveis, isso não significa facilidade de atingi-los,
contudo significa uma necessidade de persegui-los, pois “sem finalidade, a educação
careceria de sentido, à mercê do acaso, ou então seria um caos de contradições,
impróprias ao ser humano caracterizado por sua racionalidade”. (VALLEJO, 2002, p.
81)
A discussão da finalidade da educação é o ponto de partida de qualquer
atuação educacional, portanto da elaboração de um projeto pedagógico, pois ela nos
apontará o alvo que visamos atingir, o ponto de chegada.
1.2 PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO OU PROJETO PEDAGÓGICO?
“Os sonhos não envelhecem.”
Milton Nascimento
Nos meios educacionais, ocorreram várias discussões acerca da utilização
dos termos Projeto Político Pedagógico ou apenas Projeto Pedagógico. A princípio,
poderíamos pensar que era uma discussão sem maior importância. Contudo, a sua
relevância se fez sentir, pois atualmente ainda verificamos que essas discussões
prosseguem.
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Na História da Educação brasileira, houve uma época em que a educação foi
considerada como apartada das questões políticas e sociais. Quem ainda não ouviu a
afirmação que “a educação é neutra”? Ou que a educação não deveria se “meter” com
política, que educação não tem nenhuma relação com a política? Essas afirmações,
que advogavam a neutralidade da educação, as colocavam com uma técnica que
deveria ser aplicada em qualquer situação, para qualquer pessoa da mesma forma.
Será que é realmente dessa maneira? Será que a técnica não possui uma
intencionalidade? Será que ela não favorece mais a uns que outros?
A educação tem atingido igualmente as pessoas de diferentes condições
econômicas? Para aceitarmos que a educação é neutra, ou seja, que ela não está a
serviço de nenhuma política, de nenhum grupo social ou classe social, teríamos que
considerar a educação e a escola apartadas da sociedade. Todavia, a educação é uma
prática social e, enquanto tal, inserida numa sociedade.
A sociedade brasileira não é dividida em classes sociais? Com condições de
vida e interesses muito diferentes? A partir do entendimento das relações sociais e da
educação nesse contexto, muitos educadores defenderam e defendem que se deve
acrescentar a palavra “político” ao referir-se a projeto, ou seja, deve-se pensar e grafar
projeto político-pedagógico. Eles entendem que é preciso marcar posição, reafirmar-se
como contraponto às posturas de neutralidade da educação.
Segundo Gandin (2003), projeto político-pedagógico possui dois elementos:
projeto político, que reflete acerca de qual sociedade se quer ajudar a construir e
projeto pedagógico. Há educadores que, não desconhecendo as implicações políticas e
considerando a educação como reflexo da sociedade, portanto com determinações
políticas e sociais, preferem a utilização do termo projeto pedagógico. Argumenta-se
que toda ação educacional tem uma intencionalidade, que a educação é
essencialmente política. Nesse sentido, seria quase uma redundância acrescentar o
termo político à atividade educacional, ao projeto pedagógico.
A par das argumentações, importante é considerarmos as determinações
políticas e sociais na educação. É fundamental que se entenda que a contradição social
também está presente na escola, desta maneira possibilita também espaços de
atuação diferentes individual e coletivamente.
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Estes espaços para atuação no interior da escola podem ser de manter ou de
contribuir para a mudança das condições sociais e políticas. Necessário se faz à
elaboração de projetos que apontem as nossas definições, os nossos objetivos, que
explicite qual é o futuro que almejamos.
1.3 PROJETO PEDAGÓGICO
“O que brilha com luz própria nada pode apagar.”
Pablo Milanez
O Projeto Pedagógico é um caminho para a realização da finalidade da
escola. A finalidade da escola é concretizada através dos objetivos, que são
materializados através de planos e projetos. No Projeto Pedagógico agregam-se as
prioridades, as intenções e as propostas da escola. Ele possibilita a definição da
identidade da escola.
A escola, ao elaborar o seu Projeto Pedagógico, também constrói a sua
autonomia. Segundo Oyafuso; Maia (2004, p. 20):
A autonomia da escola implica na construção de sua identidade como instituição, implica na formulação da política da escola, na construção coletiva de um plano de gestão que revele um ideal de homem e sociedade. Segundo Azanha “é preciso não perder de vista que a autonomia da escola não se alcança com a mera definição de uma nova ordenação administrativa, mas, essencialmente, pela explicitação de um ideal de educação que permita uma nova e democrática ordenação pedagógica das relações escolares”. Reconhecer a importância da construção da identidade é admitir que, na condição de instituição singular, cada escola apresenta características próprias, clientela diversificada, e práticas docentes que emanam das relações entre os sujeitos e o conhecimento.
Acerca da autonomia na escola pública, afirma-se que: Considerando contexto, limites, recursos e realidade própria, cada escola pública tem a possibilidade de definir e desenvolver seu projeto de escola. Ao ocupar seu espaço de autonomia para realizar o trabalho educativo, a escola faz mais do que adotar as diretrizes gerais formuladas
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para o sistema público como um todo. Com seu projeto, o caminho escolhido tem a sua marca, a escola assume feição própria, adquire ‘personalidade’. (CENPEC, Caderno 4, p. 2)
Considera-se que, através da elaboração e implantação do seu Projeto
Pedagógico, a escola conquistará a sua autonomia. Nesse sentido, a construção do
Projeto Pedagógico é imprescindível para que a escola não fique à mercê das
propostas elaboradas externamente e não se transforme em mera executora delas. O
Projeto construído a partir dos princípios, das ideias e ações dos integrantes da escola,
possibilitar-lhe-á luz própria. Acredita-se que o Projeto Pedagógico é um importante
instrumento para favorecer o desenvolvimento pessoal de cada participante e do
coletivo da escola. Segundo Rios (2001, p. 127):
Um projeto de escola não se faz sem a participação de todos os que a constituem e não é uma mera soma dos projetos individuais, mas sim uma proposta orgânica, em que se configura a escola necessária e desejada, e na qual se articulam, na sua especificidade, as ações de cada sujeito envolvido. Na elaboração do projeto, é necessário considerar criticamente os limites e as possibilidades do contexto escolar e do contexto mais amplo do que este faz parte, definindo os princípios norteadores da ação, determinando o que se deseja alcançar, estabelecendo caminhos e etapas para o trabalho, designando tarefas para cada um dos sujeitos e segmentos envolvidos e avaliando continuamente o processo e os resultados.
O Projeto Pedagógico é também “um espaço a ser preenchido pela utopia
daqueles que desejam transformar a realidade das coisas: tornar as pessoas melhores
e a sociedade mais justa”. (CENPEC, Caderno 4, p. 4) O processo de elaboração do
Projeto Pedagógico é tão importante quanto o seu registro.
O documento onde se registram as ideias, o que se pretende realizar é
chamado de plano. A sua elaboração deve contar com a colaboração de todos os
segmentos da escola, na qual o Diretor de Escola atuará como coordenador desse
processo, articulando as intenções, as propostas e a definição do caminho para o
alcance dos objetivos. Nessa perspectiva, a gestão da escola assume papel
preponderante na coordenação dos esforços, no repensar da atuação dos profissionais
e na reflexão acerca da qualidade do trabalho que se pretende alcançar.
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2 GESTÃO DA ESCOLA
“Nunca deixe que lhe digam que não vale a pena acreditar nos sonhos que se têm
ou que os seus planos nunca vão dar certo ou que você nunca vai ser alguém.”
Renato Russo
2.1 CONCEPÇÕES
Recentemente o termo “administração” foi substituído pelo de “gestão”.
Entende-se por administração a organização racional dos recursos para desenvolver
determinada atividade. No entendimento de Colombo (2004, p. 7):
Acreditamos que gerir é mais amplo e profundo do que administrar, pois, além de planejar, organizar, controlar e avaliar, também engloba a busca e a implementação de inovações e de melhorias nos processos relacionados ao negócio, identificando oportunidades e agindo preventivamente perante possíveis ameaças.
Verifica-se que tanto na administração quanto na gestão de alguma coisa,
são necessários o planejamento, a organização e a avaliação.
O planejamento é um processo no qual se organizam as ideias, as propostas
que se pretendem alcançar, definindo recursos, procedimentos, prazo e como e quando
avaliar o alcance dos objetivos. Pode-se afirmar que planejar é projetar o futuro, é
colocar-se a caminho da realidade desejada. Nesse sentido, planejamento e projeto são
sinônimos.
O planejamento busca incorporar as inovações existentes para que a
atividade a ser desenvolvida obtenha a melhor qualidade possível. Embora deva ser
flexível, ele visa evitar as improvisações que poderia comprometer a realização da
atividade.
Entendendo-se essas dimensões do planejamento e que, tanto na
administração quanto na gestão, ele é um elemento imprescindível, pode-se afirmar
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que administrar e gerir possuem a mesma significação. Por isso, encontramos a
utilização dos dois termos para designar as mesmas atividades.
Nesse sentido, afirma-se que:
À semelhança das produções na área da administração empresarial, hoje denominada gestão empresarial, os textos e inclusive a legislação educacional passam a utilizar a palavra gestão como sinônimo de administração, tendência observada nos últimos anos, quando da substituição das expressões administração da escola ou administração da educação por gestão da escola ou gestão da educação, inovação que pode ser interpretada de diferentes maneiras. Uma opção interpretativa apregoa que a substituição sugere uma tentativa de superação do caráter técnico, pautado na hierarquização e no controle do trabalho por meio da gerência científica, que a palavra administração (como sinônimo de direção) continha. Neste caso, sua substituição pelo termo gestão pode significar a adoção de uma lógica na organização do trabalho, cujo pressuposto seria evidenciar os aspectos políticos inerentes aos processos decisórios. (MURANAKA; MINTO apud OLIVEIRA; ADRIÃO, 2002, p. 75)
Por outro lado, quando se qualifica a administração, vinculando-a á
participação e à democratização, tem-se utilizado o termo gestão. Nesse sentido,
encontramos a expressão “gestão democrática”. No caso da educação, gestão
democrática da educação ou então gestão democrática da escola. Pode-se entender
que essa posição objetiva reafirmar os aspectos políticos das práticas administrativas,
da gestão escolar, da gestão da educação e da atividade educacional.
2.2 DEMOCRACIA E GESTÃO
“O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.”
Carlos Drummond de Andrade
Afirma-se que a participação é uma garantia para a democratização da
gestão da escola pública. A participação da população na escola é vista como um
mecanismo para impedir que o diretor de escola aja contra os interesses dela.
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Segundo Paro (2003, p. 24), “a natureza de seu cargo, que é o que o tem
levado a agir necessariamente contra os interesses da população.” Para esse autor, o
diretor de escola, porque, investido de um cargo público, através de concurso, o faz
“agir necessariamente contra os interesses da população”. (grifos nossos)
No que se fundamenta esta afirmação? Paro afirma ainda que é da “natureza
do cargo” do diretor essa atuação contrária aos interesses da população com a qual
convive cotidianamente.
Um cargo tem “vida” própria? As pessoas não imprimem aos seus cargos
funções, ações, suas ideias, concepções, valores? E se não houvesse mais o cargo ou
a atividade de diretor de escola resolveríamos o problema da democracia na escola?
Vivemos numa sociedade democrática? Tem-se considerado, de fato, as injunções
sociais na escola?
A partir de uma concepção que a gestão da escola é necessariamente
autoritária, foram implantados os conselhos de escola, visando garantir a democracia
no interior das unidades escolares.
Nas palavras de Paro:
Uma teoria e prática de Administração Escolar que se preocupe com a superação da atual ordem autoritária na sociedade precisa propor como horizonte a organização da escola em bases democráticas. E para a Administração Escolar ser verdadeiramente democrática é preciso que todos os que estão diretamente ou indiretamente envolvidos no processo escolar possam participar das decisões que dizem respeito à organização e funcionamento da escola. Em termos práticos, isso implica que a forma de administrar deverá abandonar seu tradicional modelo de concentração da autoridade nas mãos de uma só pessoa, o diretor – que se constitui, assim, no responsável último por tudo o que acontece na unidade escolar -, evoluindo para formas coletivas que propiciem a distribuição da autoridade de maneira adequada a atingir os objetivos identificados com a transformação social. (1987, p. 160)
Pelas afirmações acima, pode entender que a centralização da autoridade
nas mãos de uma só pessoa, o diretor, é um empecilho à democratização social.
Em que se caracteriza a autoridade do Diretor? Decidir sobre a organização e
funcionamento da escola? Não há regras ou uma legislação para isso? Pode o Diretor
organizar a escola de maneira diferenciada do que estabelece a legislação? Onde está
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o âmago da escola? Na sua organização ou no trabalho educacional que desenvolve
com os alunos? A organização escolar determina como será realizado esse trabalho?
Certamente, a organização da escola influencia o trabalho desenvolvido,
contudo não a determina. A História da Educação não tem demonstrado muitos
acontecimentos que subverteram as ações escolares à revelia de sua organização
controladora? A ideia de uma certa passividade dos professores frente à “autoridade”
do diretor parece-nos pouco verossímil frente á realidade atual.
É possível uma transformação social sem a mudança das pessoas?
Verificamos nas últimas décadas do século passado o que se chamou de processo de
redemocratização do país. Implantaram-se mudanças nas instituições políticas visando
à sua democratização. Ampliou-se a quantidade de partidos políticos, reestabeleceu-se
o voto direto para eleição de Prefeitos ao Presidente da República, implantou-se uma
Assembléia Constituinte para elaborar uma nova Constituição, passou a haver a
liberdade da imprensa etc. Contudo, a transformação social tão sonhada ainda não
ocorreu. A concentração de renda no país é uma das maiores do mundo, o desemprego
é enorme, a pobreza atinge uma quantidade assustadora da população, a qualidade da
educação, dos serviços de saúde, sobretudo públicos, continuam sendo um grande
problema nacional.
Então, nada mudou? Não, muita coisa mudou. Algumas coisas melhoraram.
Contudo, assistimos assustados, pelo menos alguns, a crise social tão fortemente
demonstrada pela violência em todos os seus matizes, entre elas a da miséria, a falta
de credibilidade da população nas instituições políticas e sociais. Vemos
constantemente apontamentos acerca da crise de valores, de paradigmas que vive a
sociedade atualmente. Apesar desse quadro, podemos dizer que a escola atualmente é
mais democrática.
Em que aspecto podemos afirmar isto? A escola, em todos os níveis, teve um
significativo aumento do seu atendimento. Afirma-se que, no ensino fundamental, o
atendimento quase se universalizou. O acesso ao ensino superior cresceu
enormemente, graças ao crescimento das universidades privadas. Também não temos
gerações sendo reprovadas, embora com a ajuda da implantação da organização
escolar em ciclos. E há uma participação maior no interior das escolas através de
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reuniões e das instituições como o Conselho de Escola e a Associação de Pais e
Mestres (APM).
Contudo, o Diretor de Escola continua sendo o responsável último por tudo o
que acontece na escola. Poderíamos dizer que, via de regra, ele é visto como culpado
pelo que ocorre na escola, porque em geral o que se destaca são os problemas, os
equívocos; dificilmente se evidenciam os acertos, as coisas boas, sobretudo nos meios
de comunicação de massa, principalmente na televisão.
Por que as responsabilidades não foram divididas? Não se advoga que cada
um é responsável pelas suas ações? Por que isso parece que não tem valido para a
escola? Os professores não são responsáveis pelas suas ações e os demais
profissionais também não são? Qual tem sido a sua ação do Conselho de Escola?
Quem executa o que ele decide? Todos os membros do Conselho de Escola executam
o que foi definido coletivamente?
Paro (2003) refere-se ao diretor como “chefe da escola”, reafirmando que é o
“cargo de maior autoridade na escola”.
Estranhamos o termo “chefe da escola”. Vejamos onde se fundamenta esse
estranhamento: Primeiro, porque nos parece uma associação da escola a empresa. Por
que esta insistência em associar a escola, a sua organização à empresa, a indústria?
Na escola não temos uma produção alheia ao trabalhador, como na indústria. Também
o processo de trabalho não é decidido à sua revelia. Nas escolas, pelo menos nas
públicas, não é o professor que planeja e executa o seu trabalho?
Segundo, porque, etimologicamente, chefe é aquele que está à cabeça, ou
seja, aquele que é a cabeça. A cabeça é que vê, pensa, promove o bem comum. Nesse
sentido, somos da opinião que o diretor de escola também é um chefe e o seu cargo é
de chefia. Conforme o sentido etimológico de chefe, de ser a cabeça, os outros
profissionais também não o são, ou seja, também não podem ver, pensar e promover o
bem comum? Ser chefe não significa necessariamente ser capataz ou feitor, conforme
romanceado nos livros que tratem da escravatura. O Diretor “é a maior autoridade”? O
que é autoridade? Uma definição para autoridade é de possuir influência, prestígio. Diz
também daquele que tem possibilidade de decidir. Quem exerce mais influência na
escola? Quem tem mais possibilidade de decidir sobre o seu trabalho? Será que não é
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de fato o professor o que possui o cargo de maior autoridade na escola? Não é ele que
realiza a atividade fundamental da escola? Não é no trabalho do professor e do aluno
que se alicerça a finalidade da escola? Portanto, detentor de maior prestígio?
Infelizmente, os profissionais da educação, diretor de escola, professores,
supervisores e coordenadores não têm recebido o merecido respeito social, na verdade
há um desprestígio social desses profissionais. Esse desprestígio reflete-se, entre
outras coisas, nas difíceis condições de trabalho desses profissionais, nas condições
salariais, na qualidade e estrutura dos cursos de formação profissional e no desrespeito
á sua ação.
A preocupação com a justiça social, com a melhoria das condições de vida da
população e de sua participação nas diferentes instâncias da sociedade é muito
relevante. Inclusive para a implantação da democracia e para uma vivência
democrática. A democracia é um princípio a ser perseguido na vida social.
A democracia como princípio articula-se ao da igualdade ao proporcionar, a todos os integrantes do processo participativo, a condição de sujeitos expressa no seu reconhecimento como interlocutor válido. Como método, deve garantir a cada um dos participantes igual poder de intervenção e decisão, criando mecanismos que facilitem a consolidação de iguais possibilidades de opção e ação diante dos processos decisórios. Nestes termos, os conselhos de escola apresentam-se como espaços públicos privilegiados, nos quais tensões e conflitos, ao serem superados, desestabilizam práticas monolíticas ou pretensamente “harmoniosas” de gestão, ao mesmo tempo que se configuram como espaços institucionais de soluções locais para os problemas do cotidiano escolar. (MURANAKA; MINTO apud OLIVEIRA; ADRIÃO, 2002, p. 77)
Conforme apontamos acima, o pretenso poder do diretor sobre a escola seria
o impedimento para a democratização da gestão escolar. Qual é de fato o poder do
Diretor? O Diretor de Escola pode decidir sobre o quê? Entendemos que não
precisaríamos de muito tempo trabalhando como diretor de escola para logo
percebermos a falácia do poder do diretor. Um estudo da legislação acerca das suas
competências e atribuições também não deixaria dúvidas acerca do seu “poder de
decisão”.
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Acreditamos que esse poder tão difundido existe apenas no imaginário dos
profissionais, inclusive de alguns “teóricos” sobre gestão escolar das Universidades.
Alguns diretores também possuem esse imaginário, o que às vezes o fazem
desembocar na arbitrariedade. Se pensarmos que o autoritarismo também é
encontrado em outros segmentos da comunidade escolar, o se propõe para barrá-lo?
Via de regra, aponta-se que apenas o diretor de escola é autoritário, os professores e
demais funcionários raramente são acusados como autoritários. Por quê? Pais,
professores e demais funcionários também não se formaram sob a égide do
autoritarismo? Conseguiram eles passarem incólumes a ele? Será que algumas vezes
não vemos autoritarismo onde é exercício da autoridade? Constitui autoritarismo o
exercício da autoridade? Os outros profissionais não possuem autoridade?
Segundo Silva Júnior:
Ao longo do Brasil, cresce a disputa e a animosidade entre “especialistas” e professores. Estes autoproclamados “proletariado” do sistema escolar, investem contra a “burguesia” apontada do sistema: diretores, orientadores, supervisores, coordenadores e assistentes pedagógicos. Não sem razão, argumenta-se com a “inchação burocrática”, com a neurose do “controle”, com as marcas e deformações, enfim, produzidas pelo autoritarismo e que, numa visão ingênuo-reducionista, se apagariam com a eleição do diretor da escola pela “comunidade”. A crítica ingênua, segundo a qual apenas o professor teria condições de interpretar e encaminhar satisfatoriamente as soluções das questões educacionais funda-se, na verdade, num estranho postulado. A seu ver, o professor teria passado incólume pelas determinações do contexto autoritário de toda uma época. (1990, p. 65 -66)
Como a escola poderia se isentar do autoritarismo e da falta de solidariedade
marcadamente presentes na sociedade? Entendemos que uma possibilidade de
contribuir para a melhoria da gestão da escola e do ambiente escolar não está na forma
de provimento de seus profissionais, nem na atuação de conselhos. A complexidade
humana e social, os conflitos de interesses e intenções existentes na sociedade, na
qual a escola são uma parte e não nos possibilita acreditar nessas simplificações.
A importância do Conselho de Escola manifesta-se na possibilidade de várias
pessoas com atuações diferentes imbuídas por interesses comuns, por um projeto
comum, discutirem e encaminharem problemas que lhe são afetos. A assunção da
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responsabilidade é de todos, na autoria de sua atuação individual a serviço do
desenvolvimento coletivo. Tornando “o todo superior a soma das partes”.
Na escola não estamos em lados opostos, não somos classes que se
digladiam pela sobrevivência, mas profissionais que, pela qualidade de sua ação,
contribuem para a realização da finalidade da escola. A autoridade, de fato, está no
exercício da sua competência, entendida como “um conjunto de qualidades presentes
na ação profissional”. (RIOS, 2001, p. 132). Silva Júnior (1990, p. 57) nos adverte que:
O direcionamento da discussão para a questão do “poder” e da “gestão democrática” obscureceu, entretanto, a percepção de questão ainda mais significativa: a relação necessária entre a administração da escola e o ensino que se realiza em seu interior e para o qual a administração deve concorrer, se efetivamente se preocupa com sua legitimação.
Certamente, a participação é muito importante nas escolas, pois as
discussões das ideias e a reflexão acerca de propostas e encaminhamentos são
enriquecidas pela contribuição de um coletivo que tenha objetivos comuns e visem à
melhoria da aprendizagem dos alunos. Nesse aspecto, destaca-se a importância do
conselho de escola. Contudo, ele não deve ser entendido como uma panacéia, pois são
muitas as dificuldades com que se defrontam os profissionais na escola, bem como a
população atendida. E há uma questão que é um dilema para os profissionais da
educação em geral e na situação que estamos discutindo, e que é especialmente
importante para o diretor: aproximar a sua fala, o seu discurso da sua ação, pois partir
do exemplo é o melhor caminho para o exercício da autoridade em qualquer âmbito.
2.3 A GESTÃO AFASTANDO-SE DO ESCOLAR
“O que foi feito amigo de tudo o que a gente sonhou?”
Milton Nascimento
Há pouco tempo, os diretores de escolas públicas começaram a reivindicar o
repasse de recursos para serem administrados pelas escolas. Essa solicitação vinha
revestida do argumento de conquista da autonomia pelas unidades escolares.
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Entendia-se que, se a escola tivesse recursos financeiros, ela teria mais autonomia face
ao Governo. Devido à falta de recursos materiais e às condições de precariedade das
escolas, os diretores incorporaram às suas reivindicações o repasse financeiro para ser
administrado pelas unidades.
Aliada a essa discussão estava a que apontava a necessidade da
descentralização das ações, também entendida como descentralização do poder. O
repasse de recursos para as escolas foi instituído pelo Poder Público, que define o
montante e os setores da sua aplicação. Com esses recursos, as unidades
educacionais têm conseguido comprar equipamentos, materiais pedagógicos, fazer
reparo nos prédios escolares e investir em formação dos profissionais.
Devido à precariedade dos prédios escolares, muitos diretores têm investido
muito destes recursos na busca de conservação das escolas ou de melhorar as suas
condições, visando à melhoria do ambiente escolar. Contudo, com o repasse dessas
verbas, os setores responsáveis pelos prédios escolares têm se eximido da sua
responsabilidade de acompanhar as condições das escolas, encaminhar reformas para
as que necessitam e vistoriá-las, sobrecarregando as escolas, mais especialmente o
diretor, dessas tarefas. Com o recebimento desses recursos financeiros, os diretores de
escola devem se encarregar de comprar material, procurar prestadores de serviço,
acompanhar o serviço etc.
Aliado a isso, há todo um processo de prestação de contas dessas verbas, o
que também exige muito zelo e atenção. Se por um lado esses recursos financeiros na
escola trouxeram possibilidades de realização de algumas coisas materiais e também
de investimento no Projeto Pedagógico; por outro lado, tem ocupado muito do tempo do
diretor, afastando-o ainda mais das atividades mais pedagógicas. Havia uma queixa do
diretor do excesso de atividades mais administrativas e burocráticas, o que o impedia
de acompanhar mais de perto o trabalho pedagógico da escola. A necessidade de
gestão dessas verbas veio ampliar ainda mais o distanciamento do Diretor das
questões de cunho mais pedagógicas.
Enquanto isso, percebe-se que o Poder Público tem repassado para a escola
muito das suas incumbências com a manutenção dos prédios escolares, com a
aquisição de materiais e até de formação dos profissionais. Pergunta-se se com essas
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ações não haveria um gasto maior de recursos, pois a pulverização de verbas pode ser
mais onerosa do que sua centralização na aquisição de materiais e de serviços. Muitos
diretores têm apontado as suas contrariedades das inúmeras atividades que têm sido
repassadas para as escolas e que constituem desvio da sua função, entre elas está o
repasse de verbas, embora revestido do discurso de autonomia da escola. Percebe-se
que onde se achava que seria solução, acabou resultando em mais problemas, mais
utilização do tempo do diretor em tarefas que o afastam do escolar, das questões do
ensino.
2.4 GESTÃO ESCOLAR E PROJETO PEDAGÓGICO
“Tenho em mim todos os sonhos do mundo.”
Fernando Pessoa
Aponta-se que o gestor ou diretor tem exercido a função principal de controle,
sobretudo do trabalho do professor. O diretor de escola, na rede pública, é por
formação e experiência um professor, pois é condição para ser diretor a experiência
docente. Nesse sentido, esperamos que o diretor de escola, a partir da sua experiência
como professor, utilize-a no sentido de contribuir para que a organização do trabalho
escolar possibilite a melhoria da qualidade do ensino e do desenvolvimento dos alunos
em todos os seus aspectos.
A vinculação a uma postura controladora e a uma concepção de mundo da
classe dominante independe da atividade profissional que exercemos. Em dado
momento, os homens mesmo vivendo em uma condição opressiva, podem ser ou se
transformare em opressores. Segundo Freire (1980, p. 57):
A própria estrutura de seu pensamento viu-se condicionada pelas contradições da situação existencial concreta que os manipulou. Seu ideal é serem homens, mas, para eles serem homens é serem opressores. Este é o seu modelo de humanidade. Tal fenômeno provém de que os oprimidos, num dado momento de sua experiência existencial, adotam uma atitude de “adesão” em relação ao opressor.
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Todas as pessoas possuem concepções, embora muitas vezes não consigam
explicitá-las. Por estarem imersas na realidade, não conseguem ter uma visão nítida de
si mesmas, bem como elaborar uma reflexão crítica de suas práticas. Esse fato lhes
impossibilita revelar as suas concepções acerca das coisas. Essa dificuldade contribui
para que as ações sejam realizadas acriticamente.
Devido à força da ideologia dominante, disseminada pela classe abastada
financeiramente através dos meios de comunicação de massa e de outras instituições
sociais, incorporamos ideias e práticas dissonantes com a nossa condição social.
A escola enquanto instituição social reproduz ideias e práticas, muitas vezes
inconscientemente, contrárias à condição dos alunos com os quais trabalha e até dos
profissionais que nela atuam. A incorporação e reprodução da ideologia da classe
dominante pela classe dominada tem sido objeto de muitos estudos. No Brasil, Paulo
Freire e outros têm nos alertado para isso. E para o papel da escola como reprodutora
das desigualdades sociais.
Todavia, afirmam também que a escola pode atuar como um instrumento na
luta pela transformação das condições sociais. Para isso, é necessária uma atuação
intencional, refletida, planejada para que os objetivos desejados possam ser
alcançados. Nesse processo, é importante desenvolver mecanismos de avaliação das
opções realizadas, das estratégias adotadas, visando corrigir possíveis desvios de rota.
Simultaneamente a esse processo de avaliação, é igualmente importante a realização
de procedimentos de autoavaliação por parte das pessoas, objetivando também rever
ou olhar mais detidamente as ações desenvolvidas. Instituir um processo de reflexão
individual e coletiva possibilitará a realização de práticas que tenham a intencionalidade
de realizar as finalidades da escola, isso significa desenvolver ações fundamentadas
em opções conscientes de mundo, homem, sociedade e de educação.
Nesse sentido, a construção de atuações profissionais conscientes de suas
responsabilidades social e política é também resultado de aprendizagem individual e
coletiva. “Para saber pensar e sentir; para saber querer, agir é preciso aprender, o que
implica o trabalho educativo”. (SAVIANI, 1991, p. 15). A maioria das pessoas não teve
um processo educativo que lhes propiciasse a aquisição de um pensamento reflexivo e
os profissionais da educação também são frutos desse processo educativo. Nesta
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perspectiva, a escola pode ser transformar num local que favoreça a autoaprendizagem
dos seus profissionais. Isso não significa negar o conhecimento que eles já possuam,
mas de ampliá-lo para que se efetive melhoria da qualidade de ensino e do trabalho da
escola como um todo. Via de regra, quando pensamos em aprendizagem, pensamos
apenas da aprendizagem do aluno. Todavia, para a melhoria dessa e do ensino,
devemos ampliar a nossa concepção acerca do papel da escola.
Para Alarcão:
A qualidade do ensino e da aprendizagem deve ser vista não simplesmente no contexto da sala de aula, mas no contexto mais abrangente da escola como lugar e tempo de aprendizagem para todos (alunos, professores, funcionários) e para si própria como organização qualificante que, também ela, aprende e se desenvolve. (ALARCÃO apud RANGEL et al. 2002, p. 31)
O que se propõe é criar uma escola como um local de aprendizagem, uma
“organização aprendente”. Segundo Alarcão (Idem, p. 36): “Senge, o criador do
conceito de organização aprendente, define esta como ‘organização que está
continuamente expandindo sua capacidade de criar o futuro’(1994, p.14)”. Alarcão
afirma ainda que:
Na concepção de Senge et. Al. (1994) reconhece-se à organização a capacidade de se pensar por meio do pensamento original de seus membros, livremente expresso. Mas simultaneamente a capacidade de se desenvolver e de lhes proporcionar, a eles também, condições de aprendizagem coletiva e individual. Daí a expressão, também hoje utilizada, de organização qualificante. Trata-se de uma aprendizagem individual em ambiência de coletividade, uma aprendizagem cooperativa do conjunto das pessoas na organização. (Apud RANGEL et. al. 2002, p. 37)
Para a autora:
A escola, como organização aprendente e qualificante de seus membros, necessita ter uma visão partilhada do caminho que quer percorrer e refletir sistemática e cooperativamente sobre as implicações e as conseqüências da concretização dessa visão. O que significa que a escola tem que ter um projeto de ação e em ação, projeto que conte com o empenho de cada um na realização do que é comum a todos. (ALARCÃO apud RANGEL et. al. 2002, p. 41)
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Reafirma-se a importância da escola ter um projeto e de desenvolvê-lo,
contando com o envolvimento de todos na realização dos objetivos definidos pela
unidade educacional. Construir uma escola no sentido de uma organização aprendente
exigirá o empenho do diretor de escola. Atuando nessa perspectiva, ele buscará
organizar e implementar ambientes de aprendizagem e de formação humana e, nessa
busca, o diretor não atuará solitariamente, pois a construção de ambientes acolhedores,
formativos é uma tarefa de todos que neles convivem.
Porém, a sua atuação é imprescindível. O diretor, atuando como o
coordenador geral das atividades escolares, poderá elaborar um planejamento no qual
ele vislumbre a escola que pretende ajudar a construir. Compartilhar os seus sonhos
com os dos outros educadores é necessário para elaboração de um projeto de escola.
Nessa direção, todos poderão construir o projeto da escola onde atuam, a identidade da
escola, o projeto pedagógico.
2.5 O DIRETOR DE ESCOLA COMO ARTICULADOR DO PROJETO PEDAGÓGICO
“Anda quero te dizer nenhum segredo,
falo deste chão da nossa casa, vem que está na hora de arrumar.”
Beto Guedes
As múltiplas atividades que compreendem o trabalho do Diretor de Escola
fazem-no pensar que a sua função aproxima-se com o um apagador de incêndio, pois,
cotidianamente, são inúmeras as solicitações e reclamações que recebe. A
preocupação com as condições do prédio, telhado quebrado, torneira pingando, ou falta
dela, salas com lâmpadas queimadas, banheiros entupidos, a merenda que ainda não
chegou, falta de professores, de outros funcionários, solicitações inúmeras dos órgãos
superiores etc. fazem com que o diretor seja aprisionado por um turbilhão de
demandas, em geral todas consideradas importantes e urgentes.
Muitos diretores dizem-se cansados e frustrados, pois argumentam que,
muitas vezes, não conseguem participar de reuniões com os professores e acompanhar
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o projeto pedagógico da escola. Essa situação, além do desalento e frustração, desvia
o diretor de escola da sua função precípua, que é de cuidar do trabalho pedagógico.
Nessa atividade de cuidar do trabalho pedagógico realizado na escola, ele
possui outros parceiros, contudo, é importante que ele não se exima dessa atividade,
que é o aspecto central da escola.
Devido às inúmeras demandas para o diretor, que tem crescido a cada dia
com a implantação de projetos assistenciais nas escolas (distribuição de leite, material,
uniforme etc.), e com o repasse de recursos financeiros que ele tem que administrar,
além de ter que cuidar do prédio escolar, trabalhar com falta de funcionários, entre
outras coisas, muitos diretores de escola não têm conseguido desempenhar o seu
papel na coordenação do projeto pedagógico da escola, delegando essa atividade, às
vezes tacitamente, outras explicitamente, a outros profissionais da escola.
Esse fato contribui para o pensamento de que há uma polaridade entre
administrativo e pedagógico. Pensamento que é semelhante ao de que há uma
dissociação entre teoria e prática. Esses pensamentos nos impedem de perceber que
essas práticas (administrativo-pedagógico; teoria-prática) são indissociáveis, são faces
da mesma moeda.
Com relação à teoria e prática, Chauí afirma que:
A teoria – ao contrário da ideologia – não está encarregada de tomar o lugar da prática, fazendo a realidade depender das idéias. Também não está encarregada de guiar a prática... E também não está encarregada de se inutilizar enquanto teoria para valorizar apenas a prática, visto que a alienação prática reproduz a prática alienada... A relação entre teoria e prática é uma relação simultânea e recíproca por meio da qual a teoria nega a prática enquanto prática imediata, isto é, nega a prática como um fato dado para revelá-la em suas mediações e como práxis social, ou seja, como atividade socialmente produzida e produtora da existência social. A teoria nega a prática como comportamento e ação dados, mostrando que se trata de processos históricos determinados pela ação dos homens que, depois, passam a determinar suas ações. Revela o modo pelo qual criam suas condições de vida e são, depois, submetidos por essas próprias condições. A prática por sua vez, nega a teoria como um saber separado e autônomo, como puro movimento de idéias se produzindo umas às outras na cabeça dos teóricos. Nega a teoria como um saber acabado que guiaria e comandaria de fora a ação dos homens. E negando a teoria enquanto saber separado do real que pretende governar esse real, a prática faz com que a teoria se descubra como conhecimento
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das condições reais da prática existente, de sua alienação e de sua transformação. (1982, p.81- 82)
Assim como compreendemos a teoria e a prática como profundamente inter-
relacionadas, compreendemos que o administrativo e o pedagógico também são inter-
relacionados. Há uma unidade entre esses aspectos, embora haja uma distinção entre
eles.
Para uma atuação profícua do diretor de escola, é importante o princípio da
não fragmentação da unidade administrativo-pedagógico. A compreensão dessa
unidade é imprescindível na construção de uma prática gestora (do diretor de escola,
do coordenador pedagógico) que rompa com as segmentações, preconceitos e o
isolamento. Esse princípio de unidade embasa a atuação do diretor como o
coordenador do Projeto Pedagógico. Entende-se que o elemento essencial do seu
trabalho é a articulação das atividades educativas, definindo assim, a finalidade
pedagógica de sua atuação. O diretor de escola, o gestor ou administrador escolar
será: Alguém que dirige o esforço coletivo dos professores, orientando-o para o fim comum, ou seja, o domínio do saber escolar por seus alunos. O administrador é assim alguém a serviço do serviço que os professores prestam aos seus alunos. (SILVA JÚNIOR, 1990, p. 77 – 78)
Mas, qual será a direção do esforço coletivo? Entendemos que o Diretor de
Escola deverá direcionar o esforço coletivo na direção da construção da escola como
local de aprendizagem e autoaprendizagem de seus membros. Nesse esforço coletivo,
ele pode também contribuir para a aprendizagem dos pais dos alunos ou dos membros
do Conselho de Escola, proporcionando a ampliação do entendimento deles sobre a
organização e funcionamento de escola, possibilitando uma participação mais efetiva
na escola.
Acreditamos que possivelmente o próprio Diretor terá que se educar para
assumir esse papel, contudo, o investimento na sua autoaprendizagem poderá ser
motivador para os demais profissionais; além de servir de modelo, será indicador de
crescimento individual e da escola. Assim, o diretor de escola poderá constituir-se um
líder dessa comunidade de aprendizagem. Para isso, ele poderá assumir algumas
funções, que poderão ser compartilhadas com outros profissionais, tais como:
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A função de desencadear ou fazer a leitura dos desafios e apoiar as pessoas no processo de aprendizagem (no seu próprio ou no dos outros). Tal ação implica uma capacidade de observação antecipada para detectar desafios emergentes (a leitura das situações), de conceptualização de intervenção estratégica, de comunicação interpessoal e de persistência, de avaliação monitorizada de processos e resultados. (ALARCÃO apud RANGEL, et alli, 2002, p. 37)
A necessidade de se buscarem formas diferentes de trabalho escolar e a de o
diretor assumir a coordenação do processo de aprendizagem da instituição educacional
se fortalece na medida em que verificamos os resultados da aprendizagem dos alunos.
Nesse sentido, entendemos também que “para além de necessitar aprender a preparar
seu futuro, a escola precisa criar seu presente, porque se deixou atrasar”. (Idem, p. 36).
Entendemos que é urgente que a escola recupere-se desse atraso na sua função de
possibilitar o acesso e a apropriação do conhecimento universal aos seus alunos.
Sabemos de sobejo que os professores têm um papel decisivo na efetivação das
finalidades da escola.
Consideremos a escola como um mosaico em que os professores são as pedras fundamentais. Para que o mosaico tenha sentido e coerência, as funções que cada um desempenha têm de estar articuladas e assumidas. Mas, não obstante essa variedade, há uma função que todos têm de desempenhar e esta chama-se educar. (Idem, p. 33)
Assim, para que as finalidades da escola possam ser concretizadas, faz-se
necessárioa a elaboração coletiva de seu projeto e o diretor de escola atuará como o
articulador do projeto pedagógico da escola, bem como a sua construção em um local
de aprendizagem individual e coletiva. Para isso, é necessário que ele priorize essa
atuação, assumindo-a como uma atribuição intransferível, exercendo a liderança, que
ao invés de ser apenas de direito, seja também de fato.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta disciplina, iniciamos com uma breve apresentação do conceito de
projeto. Visamos mostrar a importância de possuirmos projetos, tanto na nossa vida
pessoal, bem como na educação. Resgatamos as concepções de projeto político-
pedagógico e projeto pedagógico, uma vez que é comum lermos e ouvirmos a
utilização dos dois termos. Realizamos apontamentos acerca dos fins da educação.
Nesse item, também discutimos a relação da educação com valores. Nessa discussão,
intentamos mostrar a importância de reflexionarmos acerca desses temas para a
fundamentação dos projetos.
Posteriormente, revisitamos algumas concepções de administração e gestão,
para entrarmos na discussão da gestão escolar. Na gestão escolar, buscamos
problematizar algumas concepções acerca da atuação do gestor ou diretor.
Tivemos também, nesta disciplina, o objetivo de questionar algumas visões
estereotipadas da Gestão Escolar. Apresentamos algumas dificuldades e dilemas que
vivem muitos diretores de escola. Tecemos apontamentos sobre algumas
consequências do repasse de verbas para as escolas administrarem. Discutimos, ainda,
o equívoco da relação recebimento de verbas com conquista de autonomia pela escola.
Apontamos que a construção da autonomia da escola relaciona-se à
elaboração e execução de seu Projeto Pedagógico. Apresentamos uma concepção de
escola como um local de aprendizagem individual e coletivo e a função do diretor de
escola para a concretização desta proposta. Discutimos também a concepção de
fragmentação entre o que se considera administrativo e pedagógico na atuação
educacional. Explicitamos o nosso entendimento da unidade e inter-relação destas
ações.
E por último, expomos a concepção do diretor de escola como o articulador
do Projeto Pedagógico que se fundamenta nessa unidade e na reconhecimento da
importância do diretor investir na sua autoaprendizagem e assumir o papel de
coordenador do processo de aprendizagem de todos os membros da escola com vistas
à realização de suas finalidades.
28
REFERÊNCIAS
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