Architekton Lelé o mestre da arte de construir.pdf

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68 ARQUITETURA&URBANISMO OUTUBRO 2008 ESPECIAL JOÃO FILGUEIRAS LIMA, LELÉ L ucio Costa nos deu uma boa expli- cação de arquitetura: é construção com intenção plástica." Foi assim que Zenon Lotufo, importante baluarte da arquitetura paulista do século 20, introduziu a conclusão de sua tese Arte ou Artifício, na FAUUSP, em 1966. Curiosamente, é Lucio Costa, junto com Oscar Niemeyer, quem faz a apresentação de João da Gama Filgueiras Lima, o Lelé, em completa e expressiva publicação homônima de sua obra, lançada em 2000. Nela, Lucio Costa é categórico ao definir Lelé como "o arquiteto em quem arte e tecnologia se encon- tram e se entrosam – o construtor". Com seu trabalho, Lelé resgata a figura do ARCHITEKTON LELÉ O MESTRE DA ARTE DE CONSTRUIR "...A ESTRUTURA DE UM EDIFÍCIO É ELEVADA AO NÍVEL DA POESIA, COMO PARTE DA ESTÉTICA. NÃO HÁ NENHUMA DIFERENÇA. UM ARQUITETO DEVE PROJETAR A ESTRUTURA COMO PROJETA ARQUITETURA, NO SENTIDO DOMÉSTICO DA PALAVRA..." (LINA BO BARDI) POR YOPANAN REBELLO E MARIA AMÉLIA D'AZEVEDO LEITE Na Fábrica de Equipamentos Comunitários, a "fábrica de cidades" montada por Lelé em Salvador, foram produzidos sistemas construtivos para atender demandas de equipamentos públicos, como abrigos para transporte coletivo (abaixo), creches e escolas (acima e à esquerda) reprodução de João Filgueiras Lima, Giancarlo Latorraca (organizador), Editorial Blau " INTERSEÇÃO

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    Lucio Costa nos deu uma boa expli-cao de arquitetura: construocom inteno plstica." Foi assimque Zenon Lotufo, importantebaluarte da arquitetura paulista do

    sculo 20, introduziu a concluso de sua teseArte ou Artifcio, na FAUUSP, em 1966.

    Curiosamente, Lucio Costa, junto comOscar Niemeyer, quem faz a apresentao deJoo da Gama Filgueiras Lima, o Lel, emcompleta e expressiva publicao homnimade sua obra, lanada em 2000. Nela, LucioCosta categrico ao definir Lel como "oarquiteto em quem arte e tecnologia se encon-tram e se entrosam o construtor".

    Com seu trabalho, Lel resgata a figura do

    ARCHITEKTON LELO MESTRE DA ARTEDE CONSTRUIR"...A ESTRUTURA DE UM EDIFCIO ELEVADA AO NVEL DA POESIA, COMO PARTE DA ESTTICA. NO H NENHUMA

    DIFERENA. UM ARQUITETO DEVE PROJETAR A ESTRUTURA COMO PROJETA ARQUITETURA, NO SENTIDO DOMSTICO

    DA PALAVRA..." (LINA BO BARDI) POR YOPANAN REBELLO E MARIA AMLIA D'AZEVEDO LEITE

    Na Fbrica de Equipamentos Comunitrios, a "fbrica de cidades" montada por Lel em Salvador,foram produzidos sistemas construtivos para atender demandas de equipamentos pblicos, comoabrigos para transporte coletivo (abaixo), creches e escolas (acima e esquerda)

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    "arquiteto construtor" em contraposio ao"arquiteto desenhador".

    Embora historicamente consolidada pelatradio, haja vista o patrimnio cultural edifi-cado pela engenhosidade dos arquitetos desdeque se tem registro da profisso, durante oRenascimento um novo contexto se formou. Apartir da, a busca por ascenso social junto scortes reais, a retomada de novos ideais estti-cos relacionados aos padres clssicos e a pr-pria recuperao dos escritos de Vitrvio pas-

    Para o Centro Administrativo da Bahia, onde foraminstaladas as diversas secretarias de Estado, Lel desenvolveuum sistema pr-fabricado em concreto armado commodulao em malha radial, de modo a permitir o desenhoondulado dos edifcios em consonncia com a topografia

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    usam a evidenciar a figura do arquiteto simulta-neamente tcnico e letrado, com progressivavalorizao da segunda categoria, instituindo adicotomia que passar a dominar quanto aocarter da profisso, principalmente no mbitoda formao pelas escolas.

    No mundo moderno, essa dicotomia foi res-ponsvel por uma no rara dvida acerca dacompetncia do arquiteto para resolver a cons-truo. Da parte dos profissionais, a questomuitas vezes se expressa pelo dilema em se con-

    siderarem artistas ou tcnicos, como se estas fos-sem efetivamente dimenses antagnicas emarquitetura. Curiosamente, a etimologia dadenominao profissional no deixa margem advidas: o termo grego Arkhitekton, derivado dearkhein (dirigir) e tekton (construtor, carpintei-ro) significa exatamente "mestre-construtor".

    talvez por conta disso que Lucio Costa,ainda na apresentao do livro sobre a obra deJoo Filgueira Lima, anuncia que Lel chegouna hora certa para preencher uma grave lacunano desenvolvimento da arquitetura brasileira,visto que ele enfrenta e resolve de forma racio-nal, econmica e com apurado teor arquitet-nico os mais variados e complexos desafios quea sociedade moderna programa e impe.

    E no foram pequenos os desafios colocadospara Lel como arquiteto. Recm-formado, com25 anos, destacado por Oscar Niemeyer paraconduzir suas obras em Braslia nos primrdiosda construo da capital, em condies exigen-tes de trabalho, conforme ele prprio conta:

    "Naquela poca, em Braslia, no havia mui-ta diferena entre engenheiro e arquiteto. Que-ro dizer, amos l construir uma Superquadra,

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    ento tnhamos que fazer o trabalho que hou-vesse. Levei uma poro de livros. De noite,pegava o lampio e ia estudar como que era afundao. Estudava feito um desesperado. Nohavia luz; ns tnhamos um pequeno geradorna obra que era apagado s oito horas. Tinhaque saber como era o trao do concreto, tinhade fazer as instalaes eltricas. Tudo isso tinhade ser feito, seno Braslia no seria feita."

    A premncia de construir a nova cidade emum prazo exguo cerca de trs anos foi oprincpio da experincia com a industrializa-o da construo, que se tornaria marcaregistrada de sua obra.

    A Igreja do CentroAdministrativo da Bahia,composta pela sucesso de"ptalas" de concreto armado de desenforma. Mesmo moldada"in loco", revela o raciocnioconstrutivo preciso de Lel naexecuo impecvel de formas degrande complexidade estrutural

    A premiada cama-maca e o trolley, ambos concebidos por Lel, permitem otrnsito dos pacientes ortopdicos, dentro e fora dos hospitais da rede Sarah

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    Dcadas depois, em meados dos anos 80, diri-gindo a Fbrica de Equipamentos Comunitrios(Faec), em Salvador, vive a utopia de resolvertodas as carncias urbanas, da infra-estrutura desaneamento ambiental ao transporte e educa-o, com a "fbrica de cidades", conforme a con-cepo de Roberto Pinho e Mrio Kertsz, res-pectivamente secretrio e prefeito poca. Maisuma vez,o tempo lhe era colocado como recursocrtico. Conta Lel que Eliana Kertsz, secretriade Educao, chamava-o e dizia, "daqui a 60 diastemos de ter aqui uma escola para duas mil pes-soas".E aps 60 dias l estava a escola,onde antesno havia nada. Nesse perodo, tambm trabalha

    com as diversas encomendas governamentaispara edifcios de uso institucional do governo doEstado, dentre os quais se destaca o complexo doCentro Administrativo da Bahia CAB.

    Finalmente, a partir de 1991, a concepo ea construo da impressionante srie de hos-pitais para tratamento do aparelho locomo-tor, os vrios Tribunais de Contas da Unio eoutros edifcios produzidos pelo Centro deTecnologia da Rede Sarah (CTRS), so distri-budos por todo o Pas.

    Nos hospitais da Rede Sarah, a ousadia cons-trutiva de Lel vai ao extremo. Alm dos edif-cios, concebe e produz tambm o mobilirio eos diversos equipamentos, como elevadores,telefricos, ventiladores, luminrias, e as famo-sas camas-macas que permitem o deslocamen-to do paciente ortopdico, em geral submetidoa longos perodos de imobilidade, por todo ohospital e at fora dele, nesse caso usando umveculo tambm por ele projetado.

    No exagero dizer que Lel talvez seja umdos raros exemplos mundiais de profissional

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    que mantm viva a tradio do arquitetocomo aquele que resolve efetiva e integralmen-te a construo. Vendo-se responsvel, comoprojetista e construtor, por obras de grandeporte e complexidade, e com cronograma res-trito, elabora uma arquitetura que tem pornecessidade ser comunicvel e compreensvelaos seus auxiliares e aos futuros usurios, comum grau de universalidade que talvez s a arteseja capaz de atingir (voltamos ao ponto ini-cial deste artigo...).

    Nessa perspectiva, os componentes cons-trutivos pr-fabricados concebidos por Lelassemelham-se s notas e acidentes de clavedas escalas meldicas, com as quais se podemelaborar infinitas composies, cada qual comsua identidade, concretizando a clebre frasede Goethe: "Arquitetura msica petrificada".

    Tornam-se assim executveis por qualquerpessoa, em qualquer lugar, que queira fazeruso de seus sistemas construtivos para resol-ver as necessidades arquitetnicas especficasda obra em questo. como diz a jornalistaCynara Menezes, a quem Lel prestou extensoe sensvel depoimento, registrado na publica-o O que ser arquiteto, em 2004:

    "(...) estruturas que sempre me fascinarampelo inusitado de serem como um Lego gigan-te, peas que se encaixavam, que podiam sermontadas e desmontadas. Em qualquer lugar,se poderiam fazer escolas, postos de sade,parques, equipamentos comunitrios (...)".

    Igualmente, ao enfrentar o desafio da produ-o industrial de edifcios e, portanto, no con-texto de uma economia de escala, Lel leva aolimite a preciso quanto ao dimensionamentodas sees resistentes e organizao dos ele-mentos e componentes construtivos, recupe-rando com maestria e excepcional destreza ospreceitos da coordenao modular extensiva-mente apregoados por Teodoro Rosso emdcadas passadas, quando a discusso sobre aindustrializao da construo perpassava osprogramas habitacionais como alternativa.

    Longe de serem uma repetio montona deunidades-tipo, as obras de Lel caracterizam-se por uma variedade surpreendente de solu-es arquitetnicas adequadas a cada contextoe programa, e sempre com grande enraizamen-to cultural ao coletivo que atende.V-se, assim,que o conhecimento profundo sobre as carac-tersticas dos materiais uma meta em sua tra-

    jetria, consagrada na progressiva evoluo dalinguagem construtiva de suas obras.

    Da madeira, alternativa primeira para resol-ver em regime de urgncia os alojamentospara milhares de operrios na construo deBraslia e, posteriormente, escolas transitrias,ao concreto armado e protendido, predomi-nante nas obras das dcadas de 60 e 70, Lelpercorre um caminho de descobertas tecnol-gicas que desemboca no rico universo atualdas esbeltas estruturas mistas de ao e arga-massa armada, a respeito das quais a melhordescrio talvez seja "leveza plena" de lingua-gem arquitetnica e estrutural, e de resoluoeconmica, haja vista o controle absoluto deconsumo dos insumos e do desempenho ener-gtico, quer seja na produo e na montagemem canteiro, quer seja na vida til do edifcio.

    Merece destaque a adoo da argamassaarmada como material de base para suas obrasa partir de meados dos anos 80. Seu conheci-mento a respeito tem origem no estmulo de

    Na residncia Nivaldo Gomes, mesmo sem fazer uso da pr-fabricao, v-se a clareza daconcepo estrutural e da resoluo construtiva de Lel

    A grelha de formasorgnicas produzidapor Nervi tem origemna organizaomodular das frmasde argamassa armadaque ficamincorporadas laje e lhe conferemacabamento inferior perfeito

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    Lina Bo Bardi ao estudo da obra Pier LuigiNervi, que o leva a somar a questo da pr-fabricao necessidade de leveza, descobrin-do a possibilidade de um novo material atento no explorado no Brasil. Um materialdcil, resistente pela forma, prprio para oexerccio da arte na engenharia de estruturas.

    O que Lel observa e apreende da obra deNervi no simplesmente o processo de

    tando, assim, bastante ductibilidade commenor possibilidade de fissurao.

    Como as espessuras ideais de trabalho daargamassa armada so muito reduzidas (nomximo 40 mm), a opo para enrijecer aslminas conferir-lhes dobras e curvaturas, oque resulta em formas estruturais de granderiqueza plstica caso se queira explorar a natu-reza resistente do material.

    aqui que reside a consistncia da produ-o de Lel nas ltimas duas dcadas: comouma quintessncia de sua concepo arquite-tnica, ele assume a questo do aumento deinrcia da seo pelas dobraduras em umexerccio fantstico do que o memorvel enge-nheiro de estruturas Joaquim Cardozo deno-minava de "simbiose entre esttica e esttica".

    Um simples modelo feito com uma folhade papel pode comprovar como as dobradu-ras da seo podem amplificar enormementesua resistncia sem aumento de material e dopeso prprio. Fisicamente, o que se promove o deslocamento de material para longe docentro de gravidade, ou centro de giro, daseo. Quanto mais afastada a massa estiverdo centro de giro, mais difcil gir-la oudesloc-la de sua posio original. Como arigidez de uma seo dada por sua maior oumenor facilidade de giro (o que se denominainrcia da seo), quanto mais afastado esti-ver o material do centro de gravidade, maisdifcil se tornar gir-lo e, portanto, maisrgida ser a seo.

    Idia simples no conceito, porm exigente naconcepo e execuo, pois requer investimen-

    executar argamassa armada, mas de criar, apartir desse processo, possibilidades inova-doras. O renomado engenheiro italianousava o material no apenas para executaresbeltas peas estruturais em lminas e bar-ras ia mais alm. Nervi visualizou a possi-bilidade de utilizar o material tambmcomo frma de concreto armado em substi-tuio madeira e, mais ainda, incorpor-laao concreto e obter acabamentos primoro-sos, inclusive em formas arquitetnicasorgnicas e requintadas, similares s maiselaboradas formas da natureza. Exemplodisso a sofisticada estrutura de coberturaem grelha da Gatti, indstria de processa-mento de algodo executada por Nervi emRoma, em 1951.

    Estudiosos e investigativos, Lina e Lelvalem-se do mesmo expediente para executaras lajes de piso que substituram os assoalhosde madeira deteriorados na recuperao doCentro Histrico de Salvador, em 1988, optan-do, no caso, por uma distribuio ortogonaldas nervuras da grelha, visto que seus apoiosocorrem na periferia da edificao.

    Lel, j profundo conhecedor do comporta-mento das estruturas, percebe que a argamas-sa armada tipicamente um material parapeas laminares devido s caractersticas desua composio ou trao. Alm da ausnciado agregado grado (brita) e de uma maiordosagem de cimento em comparao ao con-creto armado, a argamassa armada funcionacom a armadura difusa (telas) e grande taxade armao (acima de 200 kg/m3), apresen-

    Nas obras de renovao urbana propostas para o CentroHistrico de Salvador, Lel e Lina Bo Bardi valem-se deprocedimento tcnico semelhante ao adotado por Nerviem Roma: uma laje-grelha conformada a partir de frmasde argamassa armada

    O sistema de conteno proposto por Lel e Lina Bo Bardi,com placas plissadas compostas com peas de travamentobusca dar rigidez s lminas esbeltas de argamassa armadacom o aumento da inrcia da seo

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    to criativo para se atingir o desempenho resis-tente desejado, com economia de produo.

    Assim, Lel escapa da mesmice das formasortogonais e massivas que normalmentevemos nos sistemas pr-fabricados e nos sur-preende continuamente com volumetriasvariadas e sees elegantes a servio do dilo-go do edifcio com ambiente, criando espaospor onde, na mais perfeita traduo do poemaFbula de um arquiteto, de Joo Cabral deMelo Neto, caminham "por onde, livres: ar luzrazo certa".

    Fazendo, sem dvida, uma arquiteturaclara, ntida, inteligvel, sensvel, de "construiro aberto" e no de "fechar secretos", conformediria o poeta, Lel realiza a tese defendida peloprofessor Henry Petroski em sua obra To engi-neer is human, qual seja, a idia de que a enge-nharia de estruturas est mais prxima da artedo que da cincia, pois esta ltima tem comoseu objeto o "mundo dado", enquanto as duasprimeiras lidam com o "mundo criado".

    Vale a pena recuperar o lembrete do enge-nheiro e filsofo Mlton Vargas sobre a sutilligao entre tecnologia e a poesia, j que asduas trazem em si o carter revelador de tra-zer luz da realidade algo que estava anterior-mente escondido. Poisis em grego quer dizercriao, e a funo de criar desvelar algo queestava escondido.

    Lel, em vrios de seus depoimentos, se dizfrustrado pelas diversas obras ou iniciativasno realizadas ou interrompidas, quer sejapela alternncia poltica nos governos contra-tantes, quer seja por restries da burocracia,

    ou outros motivos. Insatisfao prpria dasmentes iluminadas, inquietas.

    Mas o arquiteto-construtor, o engenheiro-artista, o mestre pleno do canteiro de produ-o pode se orgulhar de contar hoje com umlegado de conhecimento que ultrapassa as edi-ficaes realizadas e se manifesta da mais tra-dicional forma como os arquitetos, imemorial-mente, sempre foram educados e formados: narelao mestre-aprendiz. A obra de Lel hojeexemplo vivo usado como objeto de estudonas escolas de arquitetura e urbanismo doBrasil e tambm no exterior, servindo comoobjeto raro de investigao sobre a atuao doarquiteto no campo da produo industrial daconstruo na atualidade, aos moldes do que oforam Nervi e os grandes mestres da Bauhaus.

    Entretanto, se lhe dissermos dessa sua auto-ridade e maestria, certamente ele nos dir,humildemente, no seu tom manso e gentil:"Que nada, gente, sou apenas um aprendiz hmais tempo".

    O Hospital Sara-Lago Norte, emBraslia. As formas onduladas eespaos tcnicos das obras deLel, longe de serem requintes deformalismo, cumprem ocompromisso do dilogo com oambiente. Assim, assemelham-secom as impressionantesesculturas cinticas do holandsTheo Jansen, que sem qualquerartifcio mecnico se deslocamaproveitando o movimento do are, segundo o autor, "esculpem oar sua volta"

    BIBLIOGRAFIALatorraca, Giancarlo (organizador). Joo FilgueirasLima. So Paulo: Lisboa: Editorial Blau, s/d.Leite, Maria Amlia D. F. D'Azevedo. A Aprendizagem Tecnolgica do Arquiteto.Tese de Doutorado. FAUUSP, So Paulo, 2005.Rebello, Yopanan C. P. A Concepo Estruturale a Arquitetura. So Paulo: Ed. Zigurate, 2000.Pier Luigi Nervi. Process Architecture no 23, 1981.

    Yopanan C. P. Rebello engenheiro civil,doutor pela FAUUSP e professor nos cursos degraduao e ps-graduao em arquitetura eurbanismo da Universidade So Judas Tadeu. diretor pedaggico da Ycon FormaoContinuada. ([email protected])

    Maria Amlia D. F. D'Azevedo Leite arquiteta e urbanista, doutora pela FAUUSP,pesquisadora e professora nos cursos degraduao em arquitetura e urbanismo eengenharia ambiental da PontifciaUniversidade Catlica de Campinas.Especialista em Controle do Ambiente eformao em Educao Internacional.([email protected])

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