Armando Reverón

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O pintor da luz Armando Reverón nasceu em 1889, em Caracas, Venezuela. Com um inacreditável talento para a pintura (começou a pintar aos 7 anos), matriculou-se na Academia de Belas Artes, em Caracas, e foi terminar seus estudos na Europa. Viveu em Madri e Barcelona, onde teve aulas com o pai de Picasso e passou um curto período em Paris. Em 1915, retornou para Venezuela e, cinco anos mais tarde, decidiu deixar a cidade e “viver o mundo da arte”. Ele escolheu a praia de Macuto, na costa venezuelana do Caribe. Lá, viveu uma vida de reclusão numa simples choupana feita de pedras e toras de palha e passou sua vida pintando a paisagem e suas modelos nativas. Entre suas musas, estava a índia Juanita Rios, que virou sua esposa e passou a vida ao seu lado. A luz brilhante da região teve uma influência direta em seu trabalho. Segundo o curador Luis Pérez-Oramas: “Reverón bebeu na luz equatorial e deu isso de volta em forma de paisagens, numa antropofagia da luz”. A temática reveroniana é fortemente marcada por sua vida no litoral de Macuto, e também por um mundo mágico e espiritualizado gerado em “El Castillete”. Destaca-se aí, a presença de seus objetos, entre eles, as bonecas, que em conjunto marcariam sua proposta plástica de 1920 até sua morte em 1954. 1

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O pintor da luz

Armando Reverón nasceu em 1889, em Caracas, Venezuela. Com um inacreditável talento para a pintura (começou a pintar aos 7 anos), matriculou-se na Academia de Belas Artes, em Caracas, e foi terminar seus estudos na Europa. Viveu em Madri e Barcelona, onde teve aulas com o pai de Picasso e passou um curto período em Paris.

Em 1915, retornou para Venezuela e, cinco anos mais tarde, decidiu deixar a cidade e “viver o mundo da arte”. Ele escolheu a praia de Macuto, na costa venezuelana do Caribe. Lá, viveu uma vida de reclusão numa simples choupana feita de pedras e toras de palha e passou sua vida pintando a paisagem e suas modelos nativas. Entre suas musas, estava a índia Juanita Rios, que virou sua esposa e passou a vida ao seu lado.

A luz brilhante da região teve uma influência direta em seu trabalho. Segundo o curador Luis Pérez-Oramas: “Reverón bebeu na luz equatorial e deu isso de volta em forma de paisagens, numa antropofagia da luz”.

A temática reveroniana é fortemente marcada por sua vida no litoral de Macuto, e também por um mundo mágico e espiritualizado gerado em “El Castillete”. Destaca-se aí, a presença de seus objetos, entre eles, as bonecas, que em conjunto marcariam sua proposta plástica de 1920 até sua morte em 1954.

Os temas mais recorrentes na obra de Reverón são: a paisagem de Macuto, as marinas, os nus, os grupos humanos, os auto-retratos e os portos.

“El Castillete” (o castelinho) é uma obra de arte em si, por sua arquitetura e seus objetos. Ali, Reverón criou um curioso, surpreendente e peculiar imaginário pessoal e nos deixou uma pintura com cheiro de maresia

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e apreço à forma humana. Também foi no “El Castillete” que Reverón se revelou um criador iluminado, preocupado em converter seu mundo pessoal no último degrau que o vinculava com o absoluto. Seu objetuário fantástico, irônico, burlesco e sensual se acomoda, intrigantemente, com a cenografia misteriosa de seu psiquismo.

“El Castillete” lhe serviria para provar toda espécie de rito e ultrapassar a realidade estética deixada junto com o ruidoso mundo da cidade.

Assim, teve tempo para construir seu Éden cheio de plantas, animais e ilusões que o levavam para outro mundo, de mãos dadas com a natureza, para ser merecedor de seu mistério e assim poder deixar um legado de uma pintura autenticamente venezuelana.

(Armando-Reverón,-Oramas-and-the-Biennial.aspx)

Macuto

Em 1920, Reverón se instala em Macuto. Aí, realiza diversas obras que refletem sua paisagem, como “El Bosque de La Manguita”, 1919; “Figura Bajo um Uvero, 1919; “Parque de Macuto”, 1921; “Paisagem de Macuto”, 1927. Nestas obras se percebe um tratamento da atmosfera e das tonalidades de cor diferente do estilo predominante na pintura da época, mediante à observação da luz misturada à maresia, criando uma especial atmosfera marítima. Para muitos entendidos, essa mudança, inicia uma fase de verdadeira renovação na arte venezuelana.

Construção de “El Castillete”

Durante uma década, com a ajuda de pedreiros locais, Reverón vai construindo espaços num terreno de sua mãe.

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Começa com um atelier e uma cozinha e, aos poucos, outras edificações vão sendo incorporadas: casa, capela, tanque para os gansos até completar o castelinho. A casa era chamada de “bar das bonecas”. No jardim, havia uma arara e um macaco, que Reverón batizou de Pancho, por várias gerações.

O atelier, no centro do terreno, era alto, coberto com folhas de palmeira, construído com madeiras retiradas dos bosques da região. As paredes, de estacas de cana, sustentam grandes cortinas de folhas através das quais a luz era filtrada. Na parte do fundo do atelier, o artista colocava seus quadros para secar. O piso era de terra lisa batida e compacta, criando uma superfície muito limpa e brilhante.

No lugar, havia muitas plantas ornamentais e árvores de frutas: laranja, coco, limão, entre outras.

Entre 1922 e 1925, Reverón intensifica a construção de “El Castillete”, levanta uma muralha de pedra ao seu redor, que além de diferenciá-lo das construções do lugar, também o isola dos vizinhos. À medida que a muralha subia, intensificava o estado de saúde do pintor.

Para decorar sua casa, Reverón criava objetos que não tinham funções utilitárias, mas estéticas: um telefone, uma gaiola, um piano, um vaso com flores de papel.

Reverón também criava seus instrumentos de trabalho como pincéis, cavaletes, mesas e cadeiras. Assim, vivia num ambiente completamente propício à concentração total na pintura.

Em 1920, Reverón enfrenta a representação da paisagem numa condição específica e desafiadora da luz tropical. Reverón captou o caráter ofuscante dessa luz de uma

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maneira esvanecida, quase monocromática. Como se um véu cobrisse o mundo. O resultado é uma pintura paradoxalmente fria, semelhante a cenas invernais.

As pinturas de Reverón da fase branca são consideradas uma das mais importantes criações da arte moderna da América Latina.

Pintadas ao ar livre, essas obras capturam a luminosidade do trópico e dialogam com a tradição impressionista; mas já apontam para a modernidade da metade do século XX, na aplicação expressiva de tinta e na forma literal que Reverón deixa descoberto o suporte. As paisagens brancas nos deixam conscientes de que a pintura é algo material e artificial e não uma janela para o mundo, mas um objeto, uma coisa em si mesma.

“Para o pintor a realidade cotidiana basta para o seu trabalho. Essa foi a razão porque eu vim morar em Macuto. Num mundo de vegetação incrível, de mar, onde ninguém me cansa perguntando: “Armando, por que pintas assim?”Essa é uma gente que nunca viu a beleza de uma palmeira ou escutou o ruído do mar ou muito menos, sabe que a luz dissolve as cores e que todas as cores, ao fim e ao cabo, são brancas.” (Armando Reverón)

Em 1930, Reverón volta a utilizar a figura em suas obras. Ele retrata majas, que na sua imaginação povoavam a região antes da sua colonização. No final da década de 30, essas modelos passam a ser bonecas de tamanho natural que ele e Juanita Rios faziam.

O trabalho de Reverón evoca a compreensão de um artista lutando não para ordenar o mundo, mas para retratar a luta das coisas e das pessoas comuns contra a opacidade: sobre a paisagem invisível, figuras sem

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visibilidade e confusos objetos sem uso. A eloquência desse universo está inserida num mundo silencioso. Essa estranheza provoca sentimentos escondidos na vida cotidiana.

Para Reverón, olhar o mundo podia ser uma experiência desconcertante.

Reverón é um artista sem comparação. As fontes e origem de sua arte são distintos daqueles que estamos habituados a encontrar quando vemos pintura e escultura modernas. Sua personalidade inventiva, um tanto excêntrica, contribui para o repertório da arte. E sua arte foi muito ampla. Suas belas paisagens até suas impactantes bonecas de tamanho natural que ele e sua esposa, Juanita Rios, produziram nos anos 40.

As bonecas são o aspecto mais grotesco da obra de Reverón. O artista as tratava como belas mulheres: vestindo-as, maquiando-as, falando com elas. Elas faziam parte integral do mundo do pintor. Tinham nome e personalidades distintas. Para elas, Reverón construiu móveis, onde as colocava para lhes ver pintar. Em sua imaginação, elas eram habitantes reais de seu mundo arcaico.

Desde as paisagens brancas, Reverón trabalhou a questão da materialidade em sua obra. O aspecto mais físico da pintura. Realizava os quadros como fazia suas bonecas, usando lenço, pigmento, linha. Também construía seus pincéis com os mesmos materiais. Reverón chegou a enfatizar o aspecto físico do ato de pintar, lidando com a tela através de rituais dramáticos e gestuais.

Gente esclarecida comprava suas obras, mas naquela época, ninguém considerava as bonecas como parte de sua produção artística. Alguns chegaram a considerá-las

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como evidência de sua desordem psicológica. Afinal, Reverón padecia de esquizofrenia.

É impossível compartimentar sua produção. Sua obra foi parte integral de sua vida: bonecas, pinturas, objetos, El castillete.

Podemos dizer que as bonecas de Reverón resumem toda a sua obra: são, ao mesmo tempo, arcaicas e modernas. Isso é que faz de Reverón um artista extraordinário.

Quando criança, Reverón se distraía pintando. E aquela ocupação se converteu numa obsessão que ocupava todas as horas do seu dia, 365 dias por ano.

Fases:

Época Azul:

Produção realizada entre 1918 e 1924. Essa fase se caracteriza não só pelo uso de tonalidades azuis como por um acento tenebrista e noturno, estilo do pintor russo Nicolas Ferdinandov, de quem Reverón era amigo.

Em obras como “Mujeres em La cueva”, 1919; “La Luna (Nocturno de Luna)” e “Procession de La Virgem Del Valle”, 1920.

A influência de Goya é muito forte.

Tenebrismo (Dicionário Oxford de Arte): termo que designa a predominância de uma tonalidade escura numa pintura. Deriva do vocábulo tenebroso (de origem latina) e é aplicado, sobretudo, aos seguidores de Caravaggio, do século XVII, na Itália e em outros países.

Época Branca (Segundo Alfredo Boulton):

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Aos poucos, os tons azuis dão lugar aos brancos. Fase compreendida entre 1924 e 1933, aproximadamente. É um dos períodos de maior relevância na produção do artista. É uma pintura onde o branco transforma-se em representação luminosa e de síntese atmosférica. O interesse de Reverón por expressar a luz o leva a traduzir a visão ofuscada das formas em sutis matizes absorvidas pelo branco. Em uma obra como “El Rancho”, de 1930, se evidencia a maturidade estilística de Reverón através da síntese gestual e cromática alcançada durante esse período. A visão diáfana junto com o uso inovador dos materiais pictóricos constituem um dos aportes mais significativos da arte venezuelana e latino americana. A partir de 1922, Reverón passou a utilizar suportes quase sem preparo, e mais adiante, passa a elaborar cores à base de pigmentos naturais, conseguindo um resultado semelhante ao guache e à tempera.

Fase Sépia (Segundo Alfredo Boulton):

Período inscrito entre 1940 e 1946 aproximadamente e é a tonalidade mais frequente na palheta do pintor. Nessa fase, os temas mais recorrentes são nus, marinas e cenas de Porto da Guaira. Os tons mudam, o artista abandona a incandescência da luz para telas com texturas ásperas, quase sempre sem muita preparação, técnica utilizada com a intenção de converter a tela em um valor cromático e de textura.

Pós-impressionismo (Dicionário Oxford de Arte):

Termo aplicado a várias tendências na pintura (francesas em particular) que surgem como desenvolvimento do impressionismo, ou reações a ele, no período de 1880 a 1905. O termo foi cunhado por Roger Fry, que o usou como título de uma exposição de Manet e

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os Pós-Impressionistas, realizada em Londres, em 1910. A exposição foi dominada por trabalhos de Cézanne, Gauguin e Van Gogh, considerados personagens centrais do pós-impressionismo.

A rejeição ao naturalismo e a preocupação com os efeitos momentâneos, típicos do impressionismo, assumiu diferentes contornos nos vários artistas pós-impressionistas: Seurat e os neo-impressionistas, por exemplo, concentraram-se numa análise mais científica da cor; Cézanne, que desejava “fazer do impressionismo algo sólido e durável, como a arte dos museus”, ocupou-se do estudo da estrutura pictórica; Gauguin renunciou ao “abominável erro naturalista” para explorar o uso simbólico da cor e da linha; e Vangogh foi o grande manancial do expressionismo.

LinKs:

Youtube: Reverón – Auto-retrato (1953)

http://www.youtube.com/watch?v=V_rXg4gtjDM

MoMa: http://www.moma.org/interactives/exhibitions/2007/reveron/

Música:

http://www.youtube.com/watch?v=nqgnoMA7ZBo

Documentário: Documental Armando Reverón

Parte 1: http://www.youtube.com/watch?v=sN_dk6LJ_7c

Parte 2: http://www.youtube.com/watch?v=y82-CdZHhOk

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Reverón según Da Antonio

http://www.youtube.com/watch?feature=endscreen&NR=1&v=ORyg2nyK98Q

Proposta da Oficina

Um trabalho de sensopercepção através dos elementos sensoriais do universo reveroniano

Vamos criar um trajeto com estímulos táteis/visuais/sonoros/gustativo, feitos com palha, tecido, areia, sal grosso, luz, vento, graveto, água, terra, papel, entre outros; as crianças de olhos vendados vão percorrer esse caminho, sentindo os materiais com o corpo. No final da vivência, elas podem fazer um registro da experiência com papel, lápis colorido, canetinha, etc.

Material do Percurso:

Palha, tecido, areia, sal grosso, luz, ventilador, graveto, água, argila, papel, bonecas de pano, barulho do mar, tela, bambu, pedra, folha seca, folha de palmeira, etc.

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