Arquivos Apostila Didática Do Ensino Superior (1)

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 Associação Juinense de Ensino Superior do Vale do Juruena – IES Instituto Superior de Educação do Vale do Juruena Pós-Graduação Lato Sensu Prof. Ms. Luiz Rodrigues Av.Gabriel Müller, S/N Esquina com Integração Jaime Campos n 145 – Modulo 01 – Juina – MT – CEP 78320-000 Todos os direitos reservados aos autores dos artigos contidos neste material didático. De acordo com a Lei 9610/98. www.ajes.edu.br  CURSO: PÓS-GRADUAÇÃO DIDÁTICA TEXTOS PARA ESTUDOS (ORG) Professor Ms. Luiz Rodrigues 1  – [email protected] - [email protected] 

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    CURSO: PS-GRADUAO

    DIDTICA TEXTOS PARA ESTUDOS (ORG) Professor Ms. Luiz Rodrigues

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    DIDTICA: UMA RETROSPECTIVA HISTRICA

    ILMA PASSOS ALENCASTRO VEIGA

    A retrospectiva histrica da Didtica abrange duas partes; na primeira abordado o

    papel da disciplina antes de sua incluso nos cursos de formao de professores a nvel superior, compreendendo o perodo que vai de 1549 at 1930; a segunda parte procura recons-tituir a trajetria da Didtica a partir da dcada de 30 at os dias atuais.

    So destacados os aspectos scio-econmicos, polticos e educacionais que servem de

    pano de fundo para identificar as propostas pedaggicas presentes ~a educao, bem como os enfoques do papel da Didtica. 1. Primrdios da Didtica: o perodo de 1549/1930

    Os jesutas foram os principais educadores de quase todo o perodo colonial, atuando,

    aqui no Brasil, de 1549 a 1759. No contexto de uma sociedade de economia agrrio-exportadora-dependente, explorada

    pela Metrpole, a educao no era considerada um valor social importante. A tarefa educativa estava voltada para a catequese e instruo dos indgenas, mas, para a elite colonial, outro tipo de educao era oferecido.

    O plano de instruo era consubstanciado no Ratio Studiorum, cujo ideal era a

    formao do homem universal, humanista e cristo. A educao se preocupava com o ensino humanista de cultura geral, enciclopdico e alheio realidade da vida de Colnia. Esses eram os alicerces da Pedagogia Tradicional na vertente religiosa que, de acordo com SAVIANI (1984, p. 12), marcada por uma "viso essencialista de homem, isto , o homem constitudo por uma essncia universal e imutvel" A essncia humana considerada criao divina e, assim, o homem deve se empenhar para atingir a perfeio, "para fazer por merecer a ddiva da vida sobrenatural". (Ibid., p. 12).

    A ao pedaggica dos jesutas foi marcada pelas formas dogmticas de pensamento,

    contra o pensamento crtico. Privilegiavam o exerccio da memria e o desenvolvimento do raciocnio; dedicavam ateno ao preparo dos padres-mestres, dando nfase formao do carter e sua formao psicolgica para conhecimento de si mesmo e do aluno.

    Desta forma, no se poderia pensar em uma prtica pedaggica e muito menos em uma

    Didtica que buscasse uma perspectiva transformadora na educao.

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    Os pressupostos didticos diludos no "Ratio" enfocavam instrumentos e regras metodolgicas compreendendo o estudo privado em que o mestre prescrevia o mtodo de estudo, a matria e o horrio; as aulas, ministradas de forma expositiva; a repetio visando repetir, decorar e expor em aula; o desafio, estimulando a competio; a disputa, outro recurso metodolgico era visto como uma defesa de tese. Os exames eram orais e escritos, visando avaliar o aproveitamento do aluno.

    O enfoque sobre o papel da Didtica, ou melhor, da Metodologia de Ensino, como denominada no Cdigo pedaggico dos jesutas, est centrado no seu carter meramente formal, tendo por base o intelecto, o conhecimento e marcado pela viso essencialista de homem.

    A Metodologia de Ensino (Didtica) entendida como um conjunto de regras e normas

    prescritivas visando a orientao do ensino e do estudo. Como afirma PAIVA (1981, p. 11), "um conjunto de normas metodolgicas referentes aula, seja na ordem das questes, no ritmo do desenvolvimento e seja, ainda, no prprio processo de ensino".

    Aps os jesutas, no ocorreram no pas grandes movimentos pedaggicos, como so

    poucas as mudanas sofridas pela sociedade colonial e durante o Imprio e a Repblica. A nova organizao instituda por Pombal, pedagogicamente, representou um retrocesso. Pro-fessores leigos comearam a ser admitidos para as "aulas-rgias"introduzidas pela reforma pombalina.

    Por volta de 1870, poca de expanso cafeeira e da passagem de um modelo agrrio-

    exportador para um urbano-comercial-exportador, o Brasil vive o seu perodo de "iluminismo". Segundo SAVIANI (1984, p. 275), "tomam corpo movimentos cada vez mais independentes da influncia religiosa",

    No campo educacional, suprime-se o ensino religioso nas escolas pblicas, passando o

    Estado a assumir a laicidade. ~ aprovada a reforma de Benjamin Constant (1890) sob a influncia do positivismo. A escola busca disseminar uma viso burguesa de mundo e sociedade, a fim de garantir a consolidao da burguesia industrial como classe dominante.

    Os indicadores de penetrao da Pedagogia Tradicional em sua vertente leiga so os

    Pareceres de Rui Barbosa, de 1882 e a primeira reforma republicana, a de Benjamin Constant, em 1890.

    Esta vertente leiga da Pedagogia Tradicional mantm a viso essencialista de homem,

    no como criao divina, mas aliada noo de natureza humana, essencialmente racional. Essa vertente inspirou a ctia~o da escola pblica, laica, universal e gratuita. (SAVIANI. 1984, p. 274).

    A essa teoria pedaggica correspondiam as seguintes caractersticas: a nfase ao ensino

    humanstico de cultura geral, centrada no professor, que transmite a todos os alunos

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    indistintamente a verdade universal e enciclopdica; a relao pedaggica que se desenvolve de forma hierarquizada e verticalista, onde o aluno educado para seguir atentamente a exposio do professor; o mtodo de ensino, calcado nos cinco passos formais de Herbart (preparao, apresentao, comparao, assimilao, generalizao e aplicao).

    E assim que a Didtica, no bojo da Pedagogia Tradicional leiga, est centrada no

    intelecto, na essncia, atribuindo um carter dogmtico aos contedos; os mtodos so princpios universais e lgicos; o professor se torna o centro do processo de aprendizagem, concebendo o aluno como um ser receptivo e passivo. A disciplina a forma de garantir a ateno, o silncio e a ordem.

    A Didtica compreendida como um conjunto de regras, visando assegurar aos futuros

    professores as orientaes necessrias ao trabalho docente. A atividade docente entendida como inteiramente autnoma face poltica, dissociada das questes entre escola e sociedade. Uma Didtica que separa teoria e prtica.

    A Pedagogia tradicionalista leiga refletia-se nas disciplinas de natureza pedaggica do

    currculo das Escolas Normais desde o incio de sua criao, em 1835. A incluso da Didtica como disciplina em cursos de formao de professores para o

    ento ensino secundrio, ocorreu quase um sculo depois, ou seja, em 1934. 2. A Didtica nos Cursos de Formao de Professores a partir de 1930 2.1.O perodo de 1930/1945: A Didtica tradicional, cumpre renov-la

    Na dcada de 30, a sociedade brasileira sofre profundas transformaes, motivadas

    basicamente pela modificao do modelo scio-econmico. A crise mundial da economia capitalista provoca no Brasil a crise cafeeira, instalando-se o modelo scio-econmico de substituio de importaes.

    Paralelamente, desencadeia-se o movimento de reorganizao das foras econmicas e

    polticas o que resultou em um conflito: a Revoluo de 30, marco comumente empregado para indicar o incio de uma nova fase na histria da Repblica do Brasil.

    No mbito educacional, durante o governo revolucionrio de 1930, Vargas constitui o

    Ministrio de Educao e Sade Pblica. Em 1932 lanado o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, preconizando a reconstruo social da escola na sociedade urbana e industrial.

    Entre os anos de 1931 e 1932 efetivou-se a Reforma Francisco Campos. Organiza-se o

    ensino comercial; adota-se o regime universitrio para o ensino superior, bem como organiza-

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    se a primeira universidade brasileira. A Faculdade de Filosofia Cincias e Letras da Universidade de So Paulo foi o primeiro instituto de ensino superior que funcionou de acordo com o modelo Francisco Campos. A origem da Didtica como disciplina dos cursos de formao de professores a nvel superior est vinculada criao da referida Faculdade, em 1934, sabendo-se que a qualificao do magistrio era colocada como ponto central para a renovao do ensino. No incio, a parte pedaggica existente nos cursos de formao de professores era realizada no Instituto de Educao, sendo a includa a disciplina "Metodologia do Ensino Secundrio, equivalente Didtica hoje nos cursos de licenciatura.

    Por fora do art. 20 do Decreto-Lei n.0 1190/39, a Didtica foi instituda como curso e

    disciplina, com durao de um ano. A legislao educacional foi introduzindo alteraes para, em 1941, o curso de Didtica ser considerado um curso independente, realizado aps o trmino do bacharelado (esquema trs + um).

    Em 1937, ao se consolidar no poder com auxlio de grupos militantes e apoiado pela

    classe burguesa, Vargas implanta o Estado Novo, ditatorial, que persistiu at 1945. Os debates educacionais so paralisados e o "prestgio dos educadores passa a

    condicionar-se s respectivas posies polticas", como afirma PAIVA (1973, p. 125). O perodo situado entre 1930 e 1945 marcado pelo equilbrio entre as influncias da

    concepo humanista tradicional (representada pelos catlicos) e humanista moderna (representada pelos pioneiros). Para SAVIANI (1985, p. 276) a concepo humanista moderna se baseia em uma "viso de homem centrada na existncia, na vida, na atividade". H predomnio do aspecto psicolgico sobre o lgico. O escolanovismo prope um novo tipo de homem, defende os princpios democrticos, isto , todos tem direito a assim se desenvolverem. No entanto, isso feito em uma sociedade dividida em classes, onde so evidentes as diferenas entre o dominador e as classes subalternas. Assim, as possibilidades de se concretizar este ideal de homem se voltam para aqueles pertencentes classe dominante.

    A caracterstica mais marcante do escolanovismo a valorizao da criana, vista como

    ser dotado de poderes individuais, cuja liberdade, inciativa, autonomia e interesses devem ser respeitados. O movimento escolanovista preconizava a soluo de problemas educacionais em uma perspectiva interna da escola, sem considerar a realidade brasileira nos seus aspectos poltico, econmico e social. O problema educacional passa a ser uma questo escolar e tcnica. A nfase recai no ensinar bem, mesmo que a uma minoria.

    Devido predominncia da influncia da Pedagogia Nova na legislao educacional e

    nos cursos de formao para o magistrio, o professor absorveu o seu iderio. Consequentemente, nesse momento, a Didtica tambm sofre a sua influncia, passando a acentuar o carter prtico-tcnico do processo ensino-aprendizagem, onde teoria e prtica so justapostas.

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    O ensino concebido como um processo de pesquisa, partindo do pressuposto de que os

    assuntos de que tratam o ensino so problemas. Para CANDAU (1982, p. 22), os mtodos e tcnicas mais difundidos pela Didtica

    renovada so: "centros de interesse, estudo dirigido, unidades didticas, mtodos dos projetos, a tcnica de fichas didticas, o contrato de ensino, etc.. ."

    A Didtica entendida como um conjunto de idias e mtodos, privilegiando a

    dimenso tcnica do proces50 de ensino, fundamentada nos pressupostos psicolgicos, psicopedaggicos e experimentais, cientificamente validados na experincia e constitudos em teoria, ignorando o contexto scio-poltico-econmico.

    A Didtica, assim concebida propiciou a formao de um novo perfil de professor: o

    tcnico. 2.2. O perodo de 1945/1960: o predomnio das novas idias e a Didtica

    Esta fase corresponde acelerao e diversificao do processo de substituio de

    importaes e penetrao do capital estrangeiro. O modelo poltico baseado nos princpios da democracia liberal com crescente participao das massas. o Estado populista -desenvolvimentista, representando aliana entre empresariado e setores populares, contra

    oligarquia. No fim do perodo, comea a delinear uma polarizao, deixando entrever

    dois caminhos para o desenvolvimento: o de tendncia populista e o de tendncia antipopu-lista.

    Neste contexto, insere-se a educao. A poltica educacional, que caracteriza essa fase,

    reflete muito bem a "ambivalncia dos grupos no poder" como destaca FREITAG (1979, p. 54).

    Em 1946, o Decreto-Lei n.0 9053 desobrigava o curso de Didtica e, j sob a vigncia da

    Lei Diretrizes e Bases, Lei 4024/61, o esquema de trs mais um foi extinto pelo Parecer n.0 242/62, do Conselho Federal de Educao. A Didtica perdeu seus qualificativos geral e especial e introduz-se a Prtica de Ensino sob a forma de estgio supervisionado.

    Entre 1948-1961, desenvolvem-se lutas ideolgicas em torno da oposio entre escola

    particular e defensores da escola pblica. A disseminao das idias novas ganha mais fora com a ao do Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos (INEP). As escolas catlicas se in-serem no movimento renovador, difundindo o mtodo de Montessori e Lubienska.

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    Outros indcios renovadores comeam a ser disseminados nessa dcada, entre os quais

    se destacam o Ginsio Orientado para o Trabalho (GOT), os Ginsios Pluricurriculares, os Ginsios Vocacionais.

    Paralelamente a essas iniciativas renovadoras que comearam a ser implantadas, um

    outro redirecionamento vinha sendo dado escola renovada, fortemente marcada pela nfase metodolgica, que culminou com as reformas promovidas no sistema escolar brasileiro no perodo de 1968/1971.

    Por fora do convnio celebrado entre o MEC/Governo de Minas Gerais - Misso de

    Operaes dos Estados Unidos (PONTO IV) criou-se o PABAEE (Programa Americano Brasileiro de Auxlio ao Ensino Elementar), voltado para o aperfeioamento de professores do Curso Normal. Nesses cursos, comearam a ser introduzidos os princpios de uma tecnologia educacional importada dos Estados Unidos. Dado o seu carter multiplicador, o iderio renovador-tecnicista foi-se difundindo.

    importante frisar que, nesta fase, o ensino de Didtica tambm se inspirava no

    liberalismo e no pragmatismo, acentuando a predominncia dos processos metodolgicos em detrimento da prpria aquisio do conhecimento. A Didtica se voltava para as variveis do processo de ensino sem considerar o contexto poltico-social. Acentuava-se, desta forma, o enfoque renovador-tecnicista da Didtica na esteira do movimento escolanovista.

    2.3. O perodo ps-1964: os descaminhos da Didtica O quadro que se instalou no pas com o movimento de 1964 alterou a ideologia poltica,

    a forma de governo e, consequentemente, a educao. O modelo poltico-econmico tinha como caracterstica fundamental um projeto

    desenvolvimentista que buscava acelerar o crescimento scio-econmico do pas. A educao desempenhava importante papel na preparao adequada de recursos humanos necessrios incrementao do crescimento econmico e tecnolgico da sociedade de acordo com a concepo economicista de educao.

    O sistema educacional era marcado pela influncia dos Acordos MEC/USAID, que

    servir'm de sustentculo s reformas do ensino superior e posteriormente do ensino de ~ e 2.

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    O perodo compreendido entre 1960 e 1968 foi marcado pela crise da Pedagogia Nova e articulao da tendncia tecnicista, assumida pelo grupo militar e tecnocrata.

    O pressuposto que embasou esta pedagogia est na neutralidade cientfica, inspirada nos

    princpios de racionalidade, eficincia e produtividade. Buscou-se a objetivao do trabalho pedaggico da mesma maneira que ocorreu no trabalho fabril. Instalou-se na escola a diviso do trabalho sob a justificativa de produtividade, propiciando a fragmentao do processo e, com isso, acentuando as distncias entre quem planeja e quem executa.

    A Pedagogia Tecnicista est relacionada com a concepo analtica de Filosofia da

    Educao, mas no como conseqncia sua. SAVIANI (1984, p. 179), explica que a concepo analtica

    "no tem por objeto a realidade. Refere-se, pois, a clareza e

    consistncia dos enunciados relativos aos fenmenos eles mesmos. (. . .) A ela cabe fazer a assepsia da linguagem, depur-la de suas inconsistncias e ambiguidades. No sua tarefa produzir enunciados e muito menos prticas."

    A afinidade entre as duas encontra-se, no no plano das conseqncias, mas no plano

    dos pressupostos de objetividade, racionalidade e neutralidade. O enfoque do papel d3 Didtica a partir dos pressupostos de Pedagogia Tecnicista

    procura desenvolver uma alternativa no psicolgica, situando-se no mbito da tecnologia educacional, tendo como preocupao bsica a eficcia e a eficincia do processo de ensino. Essa Didtica tem como pano de fundo uma perspectiva realmente ingnua de neutralidade cientfica.

    Neste enfoque, os contedos dos cursos de Didtica centram-se na organizao racional

    do processo de ensino, isto , no planejamento didtico formal, e na elaborao de materiais instrucionais, nos livros didticos descartveis. O processo que define o que professores e alunos devem fazer, quando e como o faro.

    Na Didtica Tecnicista, a desvinculao entre teoria e prtica mais acentuada. O

    professor torna-se mero executor de objetivos instrucionais, de estratgias de ensino e de avaliao. Acentua-se o formalismo didtico atravs dos planos elaborados segundo normas prfixadas. A Didtica concebida como estratgia para o alcance dos produtos previstos para o processo ensinoaprendizagem:

    A partir de 1974, poca em que tem incio a abertura gradual do regime poltico

    autoritrio instalado em 1964, surgiram estudos empenhados em fazer a crtica da educao dominante, evidenciando as funes reais da poltica educacional, acobertada pelo discurso

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    poltico-pedaggico oficial. Tais estudos foram agrupados e denominados por SAVIANI (1983, p. 19) de "teorias

    crtico-reprodutivistas", que, apesar de considerar a educao a partir dos seus aspectos sociais, concluem que sua funo primordial a de reproduzir as condies sociais vigentes. Elas se empenham em fazer a denncia do carter reprodutor da escola. H uma predominncia dos aspectos polticos, enquanto as questes didtico-pedaggicas so minimizadas.

    Em conseqncia, a Didtica passou tambm a fazer o discurso reprodutivista, ou seja, a

    apontar o seu contedo ideolgico, buscando sua desmistificao de certa forma relevante, porm relegando a segundo plano sua especificidade.

    CANDAU (1982, p. 28) afirma que:

    "junto com esta postura de denncia e de explicitao do compromisso com o 'status quo' do tcnico aparentemente neutro, alguns autores chegaram negao da prpria dimenso tcnica da prtica docente."

    Sob esta tica, a Didtica nos cursos de formao de professores passou a assumir o

    discurso sociolgico, filosfico e histrico, secundarizando a sua dimenso tcnica, comprometendo, de certa forma, a sua identidade, acentuando uma postura pessimista e de descrdito relativo sua contribuio quanto prtica pedaggica do futuro professor.

    Contudo pode-se perceber que se, de um lado, a teoria critico-reprodutivista contribuiu

    para acentuar uma postura de pessimismo, por outro lado, a atitude crtica passou a ser exigida pelos alunos e os professores procuraram rever sua prpria prtica pedaggica a fim de torn-la mais coerente com a realidade scio-cultural. A Didtica questionada e os movimentos em torno de sua reviso apontam para a busca de novos rumos. 2.4. A dcada de 80: momento atual da Didtica

    Ao longo dos anos 80, a situao scio-econmica do pas tem dificultado a vida do

    povo brasileiro com a elevao da inflao, elevao do ndice de desemprego, agravado mais com o aumento da dvida externa e pela poltica recessionista, orientada pelo Fundo Monetrio Internacional (FMI).

    Na primeira metade da dcada de 80, instala-se a Nova Repblica, iniciando-se, desta

    forma, uma nova fase na vida do pas. A asceno do governo civil da Aliana Democrtica

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    assinala o fim da ditadura militar, porm conserva inmeros aspectos dela, sob formas e meios diferentes. (FALCAO, 1986, p. 27)

    A luta operria ganha fora, passando a se generalizar por outras categorias profissionais e, dentre elas, os professores.

    Nessa dcada que os professores se empenham para a reconquista do direito e

    dever de participarem na definio da poltica educacional e na luta pela recuperao da escola pblica.

    A realizao da I Conferncia Brasileira de Educao foi um marco importante na

    histria da educao brasileira. Constituiu um espao para se discutir e disseminar a concepo critica de educao, pois, como afirma SAVIANI (1984, p. 24)

    " a preocupaao com a perspectiva dialtica ultrapassa, na filosofia da educa o~ aquele empenho individual de sistematizao e se torna objeto de um esforo coletivo."

    A concepo dialtica ou crtica no foi dominante no nosso contexto educacional. Ela

    se organizou com maior nitidez a partir de 1979. Para a concepo dialtica de Filosofia da Educao, no existe um homem dado '~a

    priori", pois no coloca como ponto de partida uma determinada viso de homem. Interessa-se pelo ser concreto. A tarefa da filosofia explicitar os problemas educacionais e compreend-los a partir do contexto histrico em que esto inseridos (SAVIANI, 1984, p. 24).

    A educao no est centrada no professor ou no aluno, mas na questo central da

    formao do homem. A educao est voltada para o ser humano e sua realizao em sociedade. Nesse sentido, GADOTTI afirma que, no bojo de uma Pedagogia Crtica, "a educao se identifica com o processo de hominizao. A educao o que se pode fazer do homem de amanh". (1983, p. 149) E uma pedagogia que se compromete com os interesses do homem das camadas economicamente desfavorecidas.

    A escola se organiza como espao de negao de dominao e no mero instrumento

    para reproduzir a estrutura social vigente. Nesse sentido, agir no interior da escola contribuir para transformar a prpria

    sociedade. Ora, no meu entender a Didtica tem uma importante contribuio a dar em funo de

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    clarificar o papel scio-poltico da educao, da escola e, mais especificamente, do ensino. Assim, o enfoque da Didtica, de acordo com os pressupostos de uma Pedagogia

    Crtica, o de trabalhar no sentido de ir alm dos mtodos e tcnicas, procurando associar escola-sociedade, teoria-prtica, contedo-forma, tcnico-poltico, ensino-pesquisa, professor-aluno. Ela deve contribuir para ampliar a viso do professor quanto s perspectivas didtico-pedaggicas mais coerentes, com nossa realidade educacional, ao analisar as contradies entre o que realmente o cotidiano da sala de aula e o iderio pedaggico calcado nos princpios da teoria liberal, arraigado na prtica dos professores.

    Na dcada de 80, esboam-se os primeiros estudos em busca de alternativas para a

    Didtica, a partir dos pressupostos da Pedagogia Crtica. A Didtica no mbito desta pedagogia auxilia no processo de politizao do futuro

    professor, de modo que ele possa perceber a ideologia que inspirou a natureza do conhecimento usado e a prtica desenvolvida na escola. Neste sentido, a Didtica crtica busca superar o intelectualismo formal do enfoque tradicional, evitar os efeitos do espontaneismo escolanovista, combater a orientao desmobilizadora do tecnicismo e recuperar as tarefas especificamente pedaggicas, desprestigiadas a partir do discurso reprodutivista. Procura, ainda, compreender e analisar a realidade social onde est inserida a escola.

    E preciso uma Didtica que proponha mudanas no modo de pensar e agir do professor

    e que este tenha presente a necessidade de democratizar o ensino. Este concebido como um processo sistemtico e intencional de transmisso e elaborao de contedos culturais e cientficos. i~ evidente que a Didtica, por si, no condio suficiente para a formao do professor crtico. No resta dvida de que a tomada de conscincia e o desvelamento das contradies que permeiam a dinmica da sala de aula so pontos de partida para a construo de uma Didtica crtica, contextualizada e socialmente comprometida com a formao do professor.

    BIBLIOGRAFIA CANDAU, Vera M. A. Didtica e a formao de educadores - da exaltao negao a busca da relevncia. ln: Anais do Seminrio: A Didtica em Questo. PUC- RJ, dez. 1982. p.p. 15-20. (mimeo) FALCO, Rui. A repblica que fez plstica. lo: KOUTZII, Flvio. (Org.). Nova Republica: um balano. So Paulo, LPM Editores. 1986, p.p. 26-44. FREITAG, Brbara. Escola. Estado e Sociedade. 3 ed. So Paulo, Cortez e Moraes, 1974, p.p. 52-69. (,ADOTTI, M. Concepo dialtica da Educao. So Paulo, Cortez Editoral Autores Associados, 1983.

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    PAIVA, Jos M. de O mtodo pedaggico jesutico: uma anlise do "Ratio Studiorum". Minas Gerais: Imprensa Universitria da UFV, 1981. (mimeo) SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. So Paulo, Cortez Editora/Autores Associados, 1983. ______ DIDTICA E SOCIEDADE: O CONTEDO IMPLCITO DO ATO DE ENSINAR

    Olga Teixeira Damis

    Embora, na rea pedaggica, a tendncia predominante para a abordagem de questes relativas "didtica", na maioria das vezes, tenha ficado restrita ao aspecto tcnico e instrumental do como o professor deve organizar e desenvolver o ensino de um contedo especfico, pretendo, aqui, tratar o "como ensinar" do ponto de vista da relao sociedade-edu-cao.

    Segundo esta abordagem, a prtica pedaggica que ocorre no interior da sala de aula, entre o professor e o aluno, para a transmisso-assimilao de um saber cientfico, atravs de determinados meios e procedimentos, no neutra. Isto porque, uma forma de ensinar, alm da atividade planejada de um professor para transmitir direta ou indiretamente um saber, utilizando-se de procedimentos e recursos especficos, e alm da atividade de um aluno para assimilar, memorizar, descobrir e produzir um novo saber, expressa uma forma de educao especfica do homem, seu desenvolvimento e sua adaptao para a vida em sociedade. No possuindo um fim em si mesma, a forma de ensinar possui determinada formao social como seu ponto de partida e de chegada.

    Esta anlise que leva em conta a "no-neutralidade" da prtica pedaggica evidencia a relao entre o carter social-individual da educao escolar. Segundo essa relao, a funo da escola, justificada pela integrao e adaptao do homem ao progresso e ao desenvolvimento da sociedade, destaca somente o seu carter individual-social, estando a prtica escolar voltada, apenas, para o desenvolvimento e a preparao do aluno segundo as exigncias colocadas pelas condies e necessidades predominantes na realidade.

    Neste sentido, as diferentes teorias e prticas do ato de ensinar, ao enfatizarem em cada momento ora o professor e a transmisso do saber, ora o aluno e o processo da aprendizagem,

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    ora a organizao racional dos meios e procedimentos, ora a qualidade total, evidenciam a preparao individual do homem no que se refere aos conhecimentos e aos hbitos, e s habilidades e aos valores necessrios sua sobrevivncia.

    Em outras palavras, no sendo neutras, a teoria e a prtica de uma forma de ensino articulam as finalidades individuais de educao do homem a um modelo de sociedade, por meio da atividade de quem ensina, de quem aprende, do como se ensina e dos meios utilizados, e contribuem para a manuteno-superao da prtica social mais ampla. Sociedade e teorias de ensino

    Para anlise das articulaes entre "o como ensinar" e a sociedade mais ampla ser

    utilizado, aqui, o pensamento pedaggico de Comnio como expresso das transformaes econmicas, polticas e ideolgicas ocorridas no interior da sociedade feudal.

    Partindo das condies e necessidades predominantes no momento em que a relao capitalista de produo emergiu no interior da sociedade feudal, e situando Comnio como sntese dessa nova realidade, deparamos com uma nova proposta de "didtica". Esta, ao questionar os conhecimentos, os valores e as habilidades necessrios vida humana, questionou tambm a sociedade, em fase de superao, e props a transformao da escola e do ensino.

    O pensamento pedaggico de Comnio ser analisado e compreendido como expresso da transio entre a realidade pedaggica do mundo antigo e feudal e a sociedade capitalista posterior. Este pensamento, ao mesmo tempo em que questiona a sociedade e a educao em vias de superao, expressa a "nova" realidade emergente e coloca uma "nova" proposta para o ensino.

    Assim, quando Comnio (1592-1670) props a sua Didctica Magna - Tratado da arte universal de ensinar tudo a todos 1(1651), ficou evidenciado no ttulo, e confirmado no contedo da mesma, que seu propsito era o de definir um mtodo para ensinar todas as cincias, todos os costumes bons e a piedade, segundo o grau de inteligncia e de aptido de cada um. Com esse propsito foi introduzida a nfase no processo de ensino atravs da "arte de ensinar", que, buscando a ordem perfeita da natureza, conseguisse "ensinar e aprender para que seja impossvel no obter bons resultados" (Comnio 1976, p. 186).

    Como uma reao tendncia que voltava a finalidade do ensino para o seu produto, Comnio, ao enfatizar o processo do ato de ensinar, expressou as novas condies e necessidades de educao resultantes das transformaes que estavam atingindo o mundo naquele momento.

    Essas transformaes da sociedade foram assim descritas por Huberman (1984, pp. 36-37):

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    Ora, se recapitularmos o estabelecimento da sociedade feudal, veremos que

    a expanso do comrcio, trazendo em conseqncia o crescimento das cidades, habitadas sobretudo por uma classe de mercadores que surgia, logicamente conduziria a um conflito. Toda a atmosfera do feudalismo era a de priso, ao passo que a atmosfera total da atividade comercial na cidade era a da liberdade. As terras da cidade pertenciam aos senhores feudais, bispos, nobres, reis. Esses senhores feudais, a princpio no viam diferena entre suas terras na cidade e as outras terras que possuam. Esperavam arrecadar impostos, desfrutar os monoplios, criar taxas e servios, e dirigir os tribunais de justia, tal como faziam em suas propriedades feudais. Mas isso no podia acontecer nas cidades. Todas essas prticas eram feudais, baseadas na propriedade do solo e tinham de ser modificadas, no que se relacionasse s cidades. As leis e a justia feudais se achavam fixadas pelo costume e eram difceis de alterar. Mas o comrcio, por sua prpria natureza, dinmico, mutvel e resistente s barreiras. No se podia ajustar estrutura feudal. A vida na cidade era diferente da vida no feudo e novos padres tinham que ser criados.

    Desta maneira, o interior das estruturas agrrias, do poder poltico dos senhores feudais

    e da Igreja Catlica, foi abalado pelo desenvolvimento de uma nova forma de produo da existncia, de uma nova ordem das coisas: o comrcio, no s o interno como tambm o martimo, j iniciava o delineamento de novas relaes entre povos e pases; as mquinas, no incio movidas a gua e a vento, e depois a vapor, facilitavam o processo de moagem e tecelagem e substituam a fora fsica do homem; o crescimento das cidades e de tcnicas inovadoras para as operaes financeiras, e a diviso entre o trabalho urbano e o rural, dentre outros, contriburam para redesenhar um novo contorno material, poltico e ideolgico para a sociedade.

    Se, no incio, a atividade comercial desenvolvida com base no excedente da produo feudal era escassa e descontnua (a relao de produo fundamental era ainda o trabalho servil e visava apenas s necessidades de consumo), aos poucos, medida que o comrcio iniciado atravs de feiras peridicas se expande, novas condies e aptides predominam e a troca passa a possuir finalidades comerciais.

    Huberman (op. cit., p. 26) assim expressa a realidade do feudo no perodo que antecede o desenvolvimento comercial:

    Mas, no se necessitava diariamente de dinheiro para adquirir coisas? No, porque quase nada era comprado. Um pouco de sal, talvez, e algum ferro. Quanto ao resto, praticamente toda a alimentao e vesturio de que o povo precisava eram obtidos no feudo. Nos primrdios da sociedade feudal, a vida econmica decorria sem muita utilizao de capital. Era uma economia de consumo, em que a aldeia feudal era praticamente auto-suficiente. Se algum perguntar quanto pagamos por um casado novo, a proporo de 100 para 1 como voc responder em termos de dinheiro. Mas se essa mesma pergunta fosse feita no incio do perodo feudal, a resposta provavelmente seria: "Eu mesmo o fiz". O servo e sua

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    famlia cultivava o alimento e com suas prprias mos fabricavam qualquer mobilirio de que necessitassem. O senhor do feudo logo atraa sua casa os servos que se demonstravam bons artfices, a fim de fazer os objetos de que precisava. Assim, o estado feudal era praticamente completo em si - fabricava o que necessitava e consumia seus produtos.

    Sendo o crescimento da atividade comercial incompatvel com a organizao social,

    econmica e poltica predominante no interior do feudo, outra sociedade, outra relao material de produo e outra viso de mundo so desenvolvidas. O poder fragmentado do senhor e do trabalho servil, por exemplo, ao se constituir em condio que impedia a expanso das necessidades comerciais, de consumo, de mo-de-obra etc., foi superado por outra forma de governo, de relaes de trabalho e de explicar o mundo.

    Da troca de produtos para atender s necessidades de consumo para o desenvolvimento de condies para a venda, so produzidas transformaes fundamentais na realidade material predominante.

    Os direitos que mercadores e cidades conquistaram refletem a importncia crescente do comrcio como fonte de riqueza. E a posio dos mercadores na cidade reflete a importncia crescente da riqueza em capital em contraste com a riqueza em terras. Nos primrdios do feudalismo, a terra, sozinha, constitua a medida da riqueza do homem. Com a expanso do comrcio, surgiu um novo tipo de riqueza - a riqueza em dinheiro. No incio da era feudal, o dinheiro era inativo, fixo, mvel; agora tornara-se ativo, vivo, fluido. No incio da era feudal, os sacerdotes e guerreiros, proprietrios de terras, se achavam num dos extremos da escala social, vivendo do trabalho dos servos, que se encontravam no Outro extremo. Agora, uni novo grupo surgia - a classe mdia, vivendo de uma forma nova, da compra e da venda. No perodo feudal, a posse da terra, a nica fonte de riqueza, implicava o poder de governar para o clero e a nobreza. Agora, a posse do dinheiro, uma nova fonte de riqueza, trouxera consigo a partilha no governo para a nascente classe mdia. (Huberman 1984, p. 44)

    A sociedade feudal, estruturada inicialmente por meio de um processo de produo

    bastante artesanal, domstico, descentralizado, expandiu-se para o comrcio e a produo de mercadorias. Nesta nova relao social novas instituies foram estruturadas e as antigas foram reorganizadas para se adaptar aos interesses, s necessidades e s funes exigidas pela nova realidade comercial emergente. O mercador, como intermedirio entre a produo e a destinao do produto do trabalho, foi aos poucos ocupando um espao fundamental na relao social nascente, e o comrcio ultrapassou os limites locais para o regional e at mesmo para o internacional, atravs de feiras e mercados. Assim, por volta do sculo XV, j mais organizada e ampliada, a relao comercial de produo transformou significativamente a vida do homem.

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    Essas transformaes, ao mesmo tempo como processo e produto da atividade histrica do homem ao produzir sua existncia, esto articuladas a um processo social mais amplo que

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    se constitui em uma nova realidade histrica, social, poltica e econmica.

    Aquela sociedade, na qual predominavam o poder da Igreja Catlica e do senhor feudal, a vida na zona rural etc., foi, aos poucos, cedendo espao para outra forma de viver e de pensar. O crescimento e o desenvolvimento de uma classe mdia e da vida urbana, o questionamento dos dogmas impostos pela Igreja, a liberdade de expresso do pensamento e, at mesmo, a defesa de ampliao do atendimento escolar (Lutero, por exemplo) so algumas alteraes ocorridas. Era necessrio instituir uma sociedade em que predominasse o "clima" de liberdade de maneira a garantir as condies necessrias para a "nova" sociedade comercial emergente.

    Neste sentido, entre os sculos XVI e XVIII, conforme a fora do capital comercial vai solapando as instituies feudais, institudo o Estado Nacional e, aos poucos, o poder centralizado no rei. Esta forma de Estado chega a extremos na forma de governos absolutistas, despticos e tiranos. Fortalecido com o desenvolvimento do comrcio e da burguesia, o absolutismo cresce por toda a Europa. E o caso, por exemplo, de pases como Inglaterra, Frana, Rssia, onde ocorreu a centralizao do poder usufrudo dos benefcios e das vantagens da acumulao comercial. Existe um movimento nacional de reforo e valorizao da monarquia: "unidade de deciso no topo, unidade nas diversas partes do corpo poltico. Ligam muita importncia aos laos que unem o sdito ao monarca: sem sdito no h poder; o prncipe deve ser amado e ao mesmo tempo temido" (Touchard, III, 1970, p. 97).

    Mas, diante das contradies colocadas pela oposio entre o clima de "liberdade" e "igualdade" necessrio ao desenvolvimento comercial e o poder cada vez mais desptico dos governantes absolutistas, que lutavam por manter a forma de explorao feudal, foram desenvolvi dos valores, idias e concepes que questionavam o mundo econmico, poltico e ideolgico dominado pelo poder da nobreza e da Igreja Catlica. Passa a predominar na sociedade um movimento renovador que se inicia com o desenvolvimento e a expanso da relao comercial no mundo e culmina com a revoluo industrial, no final do sculo XVIII, por meio da qual o capitalismo vai se tornar dominante.

    O perodo de efervescncia intelectual iniciado no sculo XVI atinge a arte, a literatura, a filosofia, a cincia etc., e culmina nos sculos XVII e XVIII com o desenvolvimento das idias iluministas.

    Diante da superao das relaes de produo que mantinham a sociedade feudal, a viso de mundo elaborada segundo a concepo crist (a realidade obediente a uma ordem divina, eterna e perfeita) questionada pela possibilidade de o homem agir sobre a natureza, compreend-la e transform-la, de acordo com seus interesses e necessidades e segundo um mtodo cientfico e racional de investigao. Nesse momento so produzidas teorias como as de Bacon, Kepler, Galileu, Descartes, Newton, dentre outros.

    Descartes (1596-1650), por exemplo, revolucionou a viso religiosa do mundo feudal colocando no seu "penso, logo existo", a razo humana como ponto de partida para a

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    elaborao do conhecimento. Seu mtodo, fundamentado na deduo, procurou investigar as causas e os princpios do que possvel conhecer e instituiu a dvida metdica como base da investigao da verdade.

    Neste momento, o modelo ideal de mundo, de homem, de sociedade, elaborado desde os antigos gregos e conservado pelo ideal cristo atravs da relao Deus-homem, questionado pela razo e estabelecido um novo caminho para a elaborao do conhecimento. Superando a explicao de mundo fundamentada, predominantemente, na viso crist, os pensadores do sculo XVII, mesmo quando levaram em conta a existncia de Deus e a vida sobrenatural, no deixaram de considerar a realidade emprica, natural e humana, como ponto de partida de suas investigaes.

    Enquanto Descartes questionou o pensamento religioso predominante propondo um mtodo de conhecimento para conhecer evidentemente (clara e distintamente), Bacon (1561-1626) tambm procurou um novo caminho para o conhecimento cientfico: a experincia. A partir dela, a sistematizao cientfica, at ento concebida como contemplao de uma. ordem eterna e perfeita, tornou-se ativa, devendo fornecer resultados prticos para a vida do homem, ajudando-o a dominar a natureza.

    Nesse mesmo sculo de valorizao da razo e do emprico, tambm Galileu (1564-1642) e Kepler (1571-1630), completando a teoria heliocntrica de Coprnico, deduziram os movimentos da Terra e comprovaram que os planetas descrevem rbitas elpticas em torno do Sol, centro de todo o sistema.

    Comnio, como pastor e bispo protestante (Irmo Mornio), professor e reitor de universidade, pertencente a um grupo religioso que possua as Sagradas Escrituras como nica autoridade da f, dedicou grande parte de sua vida a ensinar. Denominado por alguns de "Bacon da Pedagogia" e "Galileu da Educao", ele criticou a sociedade que perseguiu o protestantismo, tendo convivido com as causas e as conseqncias da guerra dos 30 anos entre catlicos e protestantes.

    Foi com base nessas experincias e nesse clima de transformaes materiais, polticas e ideolgicas que atingiu a sociedade desde o sculo XV que ele questionou a forma de ensinar predominante nas escolas dominadas pelo dogmatismo da Igreja Catlica e revolucionou o "como ensinar ".

    Segundo Comnio, a escola deve desenvolver as potencialidades do aluno, ligando-o ao mundo sobrenatural (mundo perfeito) na medida em que destri tudo o que o prende existncia material. Na "Didctica Magna" ele critica o mtodo de ensino utilizado pelas escolas da Igreja. Fundamentado na escolstica, este ensino priorizava a forma lgica de organizao do pensamento do professor para a exposio de argumentos "pr" e "contra" uma questo colocada por ele. A esta, o aluno devia apresentar argumentos e objees, at chegar a um argumento nico que geralmente revelava a posio do mestre. Tal ensino utilizava "lies" (explicao de um manual) e "questes" (exerccios de discusso organizada

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    pelo professor com seus discpulos), atravs das quais o pensamento lgico do aluno era conduzido pelo professor do confuso para o distinto, de princpios gerais evidentes para aplicaes e concluses particulares.

    Possuidor de uma viso crtica a respeito da teoria e da prtica religiosas dominantes no mundo feudal, Comnio leu Joo Luiz Vives, Campancila, Bacon e Descartes e produziu um grande nmero de obras dedicadas religio e ao ensino. E ser numa posio oposta nfase colocada no modelo ideal de homem, utilizada pela Igreja Catlica, que Comnio, no sculo XVII, prope sua" Didctica Magna".

    Ao destacar nove requisitos necessrios para ensinar e aprender, seguindo o caminho da natureza, ele inverte a nfase do produto para a nfase no processo de ensino:

    Fundamento 1: A natureza espera o momento favorivel. Fundamento II: A natureza prepara a matria, antes de comear a introduzir-lhe uma forma. Fundamento III: A natureza toma um sujeito apto para Se as operaes que ela quer realizar ou, ao menos, prepara

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    Segundo ele, a educao do homem dever ser realizada atravs de uma "Didctica Magna" que, buscando a ordem perfeita da natureza, visa ensinar e aprender para que seja impossvel no obter bons resultados" (idem, p. 186). Significando a "arte de ensinar", a didtica passa histria possuindo como seu objeto o "como ensinar".

    Os fundamentos de seu mtodo de ensinar e de aprender foram edificados na natureza e comparados arte do jardineiro:

    ...Por isso, aqueles que instruem e educam a juventude no tm outra obrigao alm de semear habilmente na alma dos jovens as sementes daquilo que tem de ensinar, e de regar cuidadosamente as plantazinhas de Deus; o crescimento e o incremento viria por acrscimo. (Comnio, 1976, p. 206)

    Sua "didtica ser, ento, um mtodo...

    Ns ousamos prometer uma "Didactica Magna", isto , um mtodo universal

    de ensinar tudo a todos... Que devera auxiliar o professor a ensinar com prazer e solidamente para obter bons resultados... E de ensinar com tal certeza, que ser impossvel no conseguir bons resultados. E de ensinar rapidamente, ou seja, sem nenhum aborrecimento para os alunos e professores, mas antes como sumo prazer para uns e para outros. E de ensinar solidamente, no superficialmente e apenas com palavras, mas encaminhando os alunos para uma verdadeira instruo, para os bons costumes e para a piedade sincera... (idem 1976, pp. 45-46, grifos do autor)

    Que prev um "novo" professor, um "novo" aluno, uma "nova escola", um "novo"

    homem... A proa e a popa da nossa "Didctica" seni investigar e descobrir o mtodo segundo o

    qual os professores ensinem menos e os estudantes aprendam mais; nas escolas, haja menos barulho, menos enfado, menos trabalho intil, e, ao contrrio, haja mais recolhimento, mais atrativo e mais slido progresso; na Cristandade, haja menos trevas, menos confuso, menos dissdios e mais luz, mais ordem, mais paz e mais tranqilidade... (idem, pp. 43-44).

    Adequada a este enfoque de Comnio, ainda existe hoje no interior do conhecimento

    produzido sobre didtica, uma tendncia em compreend-la como "arte, tcnica, cincia, disciplina ou ainda metodologia" (Alvite 1981, p. 21). Considera-se, ainda, que sua temtica central "guiar, dirigir ou instrumentalizar o processo ensino-aprendizagem em que esto envolvidos alunos e professor" (idem, ibidem). A partir deste enfoque a didtica (e o seu ensino nos cursos que habilitam o profissional da educao) tem, predominantemente, ficado

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    restrita ao aspecto tcnico e instrumental do como organizar, desenvolver e avaliar o ensino.

    Possuindo como objeto de estudo o "como ensinar", o contedo da "didtica", desde Comnio, em nvel tanto de pesquisa como de ensino, foi historicamente direcionado para as formas de organizar, desenvolver e avaliar a relao pedaggica. Na prtica, tais formas significaram a nfase ora na transmisso do saber, ora na atividade do aluno, ora na inovao do recurso tcnico, ora no planejamento etc.

    Mas para a anlise aqui pretendida no ser levada em conta apenas esta concepo de "didtica" que destaca o aspecto operacional do processo educativo. Tal concepo somente considera o ensinar do ponto de vista da funo da escola de transformar a realidade (a socie-dade, o homem, a cincia etc.) por meio dos conhecimentos, dos hbitos, das habilidades e dos valores que so colocados para o aluno aprender.

    Pretende-se, aqui, considerar tambm que a sociedade, como finalidade para a qual se destina a educao escolar, condio determinante para a objetivao do ensino. Neste caso, a "didtica" ser analisada e compreendida como forma terico-prtica de ensino e, como tal, expressa determinada educao do homem para a vida em sociedade. A relao contedo-forma do ato de ensinar

    Marx (1818-1883), ao utilizar o mtodo dialtico para a anlise e a interpretao da realidade, compreende o mundo material em que vivemos como fenmeno social, totalidade contraditria, econmica, poltica e ideolgica, resultante das relaes de trabalho que os homens e as classes sociais estabelecem entre si para produzir a existncia humana.

    Para ele, existe uma relao dinmica entre determinada fase de desenvolvimento das foras produtivas e determinada organizao 50cial, material, poltica e ideolgica.

    Que a sociedade, qualquer que seja a sua forma? O produto da ao

    recproca dos homens. Podem os homens eleger livremente esta ou aquela forma social? Nada disso. A um determinado nvel do desenvolvimento das foras produtivas dos homens corresponde uma determinada forma de comrcio e de consumo. A determinadas fases de desenvolvimento da produo, do comrcio, do consumo correspondem determinadas formas de organizao social, uma determinada organizao da famlia, das camadas sociais ou das classes; ... (Marx, 1982, p. 85)

    Em sua anlise da sociedade capitalista, Marx leva em conta as relaes existentes entre

    o estgio de desenvolvimento das foras produtivas e as formas de organizao da sociedade, entre o desenvolvimento dos meios materiais de produo e o desenvolvimento histrico da sociedade. Nessa mesma anlise, Marx destaca as relaes entre cada estgio particular de desenvolvimento das foras de produo e as respectivas transformaes produzidas na

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    sociedade.

    Do mesmo modo, as relaes sociais de acordo com as quais os indivduos produzem, as relaes sociais de produo, alteram-se, transformam-se com a modificao e o desenvolvimento dos meios materiais de produo, das foras produtivas. Em sua totalidade, as relaes de produo formam o que se chama de relaes sociais, a sociedade, e, particularmente, uma sociedade num estgio determinado de desenvolvimento histrico, uma sociedade com um carter distintivo, peculiar. A sociedade antiga, a sociedade feudal, a sociedade burguesa so conjuntos de relaes de produo desse gnero, e, ao mesmo tempo, cada uma delas caracteriza um estgio particular de desenvolvimento na histria da humanidade. (idem, ibidem, p. 96)

    Na rei ao dinmica entre a estrutura econmica e a superestrutura jurdica, poltica e

    ideolgica da sociedade, Marx explica sua viso de mundo para a anlise crtica do modo de produo capitalista.

    O resultado geral a que cheguei e que, uma vez obtido, serviu de guia para

    meus estudos, pode formular-se, resumidamente, assim: na produo social da prpria existncia, os homens entram em relaes de produo correspondente a um grau determinado de desenvolvimento de suas foras produtivas materiais. O conjunto dessas relaes de produo constitui a estrutura econmica da sociedade, a base reaJ sobre a qual se eleva uma superestrutura jurdica e poltica e qual coreespondem formas sociais determinadas de conscincia. O modo de produo da vida material condiciona o processo de vida social, poltica e intelectual. No a conscincia dos homens que determina a realidade; ao contrrio, a realidade social que determina sua conscincia. (idem, ibidem, pp. 82-83)

    Partindo desta viso que compreende a histria e o mundo humano como resultado de relaes dinmicas entre a produo material e a produo espiritual (intelectual) da existncia, entre o econmico e o poltico, que se pretende aqui compreender o significado terico e prtico do pensamento de Comnio, em seu propsito de definir um Mtodo universal de ensinar tudo a todos".

    Deste ponto de vista, a didtica, ao significar uma forma de vivenciar a ao da escola

    para a formao do aluno, segundo uma finalidade social determinada, possui um sentido e um significado que vo alm da especfica operacionalizao do ensino. Pois, na medida em que seu objeto de estudo uma forma de ensino que busca adequar e preparar o aluno para a vida social, essa forma, alm do aspecto tcnico operacional, possui um contedo que determinado pelas condies e necessidades predominantes na prtica social mais ampla.

    Em outras palavras, o objeto da "didtica" (o "como ensinar") ser aqui analisado e compreendido no apenas do ponto de vista tcnico e operacional de um movimento que organiza o ensino para educar e adaptar o homem a uma sociedade. Mas, como forma de

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    Av.Gabriel Mller, S/N Esquina com Integrao Jaime Campos n 145 Modulo 01 Juina MT CEP 78320-000

    Todos os direitos reservados aos autores dos artigos contidos neste material didtico. De acordo com a Lei 9610/98.

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    organizar, desenvolver e avaliar uma prtica social especfica, a escola determinada por condies, necessidades e interesses predominantes na prtica social mais ampla que a instituiu. Neste sentido, a forma de ensinar est articulada a uma prtica social, seu pressuposto e sua finalidade.

    Assim compreendido, o contedo da didtica, em vez de tratar o "como ensinar apenas como tcnica, deve constituir-se, tambm, em meio que contribui para a compreenso crtica da educao e do ensino. Como rea de conhecimento que possui o ensinar como seu objeto, a didtica ser aqui compreendida como a operacionalizao de uma forma que expressa um contedo, vinculado a um modelo de sociedade.

    Cheptulin, em A dialtica materialista, oferece uma importante contribuio para a compreenso da relao entre a forma de uma prtica e o mundo exterior:

    ...no h nenhuma forma no material da realidade objetiva nem pode

    haver. Toda forma existente no mundo a estrutura dessa ou daquela formao material... (as estruturas) encerram um contedo determinado que reflete direta ou indiretamente a correlao entre os elementos correspondentes do mundo exterior... (1982, p. 267)

    Longe de ser autnoma e independente, isto , longe de existir primeira e independentemente do mundo exterior, como props Aristteles, toda forma a estrutura de determinada formao material. Neste sentido, a rea de conhecimento que possui a teoria e a prtica da forma de ensino como seu objeto no pode ficar restrita, apenas, s relaes que priorizam ora um, ora outro elemento dos que compem a relao pedaggica: o professor, o aluno, o contedo e os recursos de ensino. Como estrutura articulada a uma formao material e poltica mais ampla, as formas de ensinar utilizadas historicamente pela escola expressam, tambm, finalidades relacionadas e ligadas aos diferentes momentos de desenvolvimento do processo histrico de produo da sociedade humana. Estas, ao serem analisadas, compreendidas e vivenciadas apenas do ponto de vista ou do professor que ensina (pedagogia tradicional), ou do aluno que aprende (pedagogia nova), ou do planejamento da ao que garante a produtividade do ensino (pedagogia tecnicista), enfatizando-se ora o saber, ora o aluno, ora as tcnicas que orientam o processo ensino-aprendizagem, levam a uma compreenso neutra e fragmentada do "como ensinar

    Isto porque, dadas as condies e necessidades predominantes na formao social mais ampla, a finalidade da escola ser vivenciada na forma de ensinar e de transmitir ao aluno uma viso terico-prtica de mundo, isto , uma determinada forma de pensar e agir. Assim concebida, essa forma de ensinar, alm dos conhecimentos, dos hbitos, das habilidades e dos valores transmitidos, possuem um contedo implcito, uma concepo de sociedade, de homem, de educao. Este contedo vivenciado por meio das relaes e ligaes que o

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    aluno levado a estabelecer entre um objeto de conhecimento e o mundo, a sociedade, o homem, a cincia, a tecnologia etc.

    Assim compreendida, a forma de ensinar deixa de desempenhar apenas a funo de organizar os elementos que esto envolvidos na relao pedaggica. Pois, se analisada tambm do ponto de vista de seu contedo implcito, ela expressa as condies e as necessidades predominantes na sociedade e pode contribuir para desenvolver no aluno uma viso crtica de mundo.

    E Cheptulin (1982, p. 267) esclarece esta relao entre uma forma e um contedo:

    ..Estando, de uma maneira ou de outra, ligadas s formaes materiais, essas estruturas (essas formas) no somente no podem ser introduzidas no mundo dos fenmenos, determina-los e ordena-los, mais ainda, elas prprias no so deduzidas do mundo exterior e so determinadas por ligaes e relaes das formaes materiais pelas estruturas que lhe so prprias.

    Como estrutura que reflete uma relao entre a educao e a sociedade, a forma de ensinar no , simplesmente, introduzida no interior da prtica escolar como resultado de uma opo individual que o professor organiza e desenvolve. Ela, tambm, no mecnica e simplesmente deduzida das condies e necessidades predominantes na sociedade. Mas, ao mesmo tempo em que determinada pela prtica social mais ampla, uma forma especfica de ensino, tambm determina a viso de mundo transmitida pelo contedo escolar (saber cientfico), por meio das ligaes e articulaes que so estabelecidas entre os elementos que a compem (o professor, o aluno, os recursos e o saber) e a sociedade. Neste sentido, no sendo absoluta a autonomia de uma forma de ensinar, ela relativa s relaes e ligaes que so estabelecidas entre o conhecimento transmitido e a sociedade.

    Em outras palavras, embora o professor possua autonomia para organizar, desenvolver e avaliar o ensino e concretizar a formao do aluno, esta autonomia relativa aos conhecimentos, aos hbitos, s habilidades e aos valores vivenciados pela prtica pedaggica.

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    Do ponto de vista da relao educao-sociedade, a rea de conhecimento que possui a forma de ensinar como seu objeto de estudo (didtica) no pode possuir como contedo apenas o planejamento, o desenvolvimento e a avaliao do "como ensinar". Pois, uma forma de ensino, alm da atividade planejada de um professor para transmitir, direta ou indiretamente, um conhecimento cientfico; alm da atividade de um aluno para assimilar, memorizar, descobrir ou produzir um novo saber; alm dos recursos e dos procedimentos especficos utilizados; expressa a educao do homem, seu desenvolvimento e sua adaptao a uma sociedade. No possuindo um fim em si mesma, determinada forma de ensinar possui a formao social como seu ponto de partida (condies e necessidades existentes) e de chegada (finalidades a serem alcanadas) e, como tal, expressa um contedo pedaggico, implcito nas relaes estabelecidas no interior da sala de aula.

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    A partir da compreenso destas relaes, a forma de ensinar ser, aqui, fundamentada

    nos seguintes pressupostos:

    O primeiro deles considera que, o mundo humano, como transformao da natureza para produzir a sobrevivncia material da humanidade, produto de um processo social de trabalho no qual o homem o agente, processo-produto.

    No mundo, o que resultado de transformao da natureza, atravs do trabalho do homem, produto social, seja ele material, intelectual e at mesmo o prprio homem. medida que as relaes sociais de trabalho que os homens estabelecem entre si transformam a realidade objetiva e produzem a existncia humana, estas relaes modificam as condies e necessidades predominantes s quais o homem precisa se adaptar e se ajustar. Neste caso, a sociedade, como resultado, produto de determinado modo de produo da existncia, possui o homem como seu agente, processo e produto do trabalho.

    Existe, pois, uma relao determinante, mas dinmica, entre o processo social de produo da existncia e o produto obtido, seja ele material, intelectual e o prprio homem; entre determinada estrutura econmica (material) e a superestrutura jurdica, poltica e ideolgica produzida, na medida em que o homem simultaneamente, como agente, processo e produto, o elemento articulador mediador-mediado da prtica social de produo da existncia.

    Mas, na medida em que, historicamente, neste processo de produo uns foram escravos, outros homens livres, uns servos, outros senhores, uns capitalistas, outros operrios, predominou, na sociedade escravagista, feudal e capitalista correspondente, uma classe social livre que explorou e apropriou-se do produto material e intelectual do trabalho de outra classe utilizada, apenas, como instrumento, mo-de-obra de produo.

    Essas funes sociais especficas de direo e controle ou de mo-de-obra, desempenhadas por classes sociais distintas, determinaram as formas de participao do processo de produo, e de apropriao-expropriao do produto do trabalho. Na prtica, no momento em que uma classe ficou sendo responsvel, predominantemente, pela mo-de-obra e a outra apropriou-se do produto do trabalho e, consequentemente, dos meios de produo, esta segunda classe possuiu as condies objetivas-subjetivas para controlar e dirigir a relao social como um todo, para direcionar jurdica, poltica e ideologicamente o produto material e intelectual obtido. A produo e apropriao do produto do trabalho so, neste caso, determinadas pela forma social segundo a qual se organiza o processo material de produo da existncia.

    Aqui, fica colocado um segundo pressuposto: A estrutura da sociedade est fundamentada historicamente em relaes sociais de trabalho que dividem os homens em classes sociais opostas conforme a participao de cada grupo ou classe como proprietrio ou mo-de-obra da produo.

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    Interferindo na vida humana do ponto de vista da produo, da, apropriao ou da

    expropriao do produto material e intelectual, econmico, poltico e ideolgico, a diviso dos homens em classes sociais opostas recorre da organizao de um Estado, para manter as condies, as necessidades e interesses predominantes na relao social de trabalho que o fundamenta.

    Sweezy (1986, p. 189) assim expressa a relao entre classe social e Estado:

    Um determinado conjunto de relaes de propriedade serve para definir e demarcar a estrutura de classes da sociedade. Qualquer que seja o conjunto de relaes de propriedade, uma classe ou classes (os proprietrios) desfrutam vantagens materiais; outras classes (os que so possudos e os no possuidores) sofrem desvantagens materiais. Uma instituio especial capaz e disposta a usar a fora necessria essencial manuteno desse conjunto de relaes de propriedade. A pesquisa mostra que o Estado possui esta caracterstica no mais alto grau, e que nenhuma outra instituio pode competir com ele sob tal aspecto. Isso habitualmente se expressa dizendo-se que o Estado, e apenas ele, exerce a soberania sobre todos os que esto sob sua jurisdio. No difcil, portanto, identificar o Estado como o analista de um determinado conjunto de relaes de propriedade.

    Esta compreenso do Estado como superestrutura, produto Jurdico, poltico e ideolgico) de relaes materiais de trabalho que os homens estabelecem entre si, constitui o terceiro pressuposto da anlise.

    Gramsci distingue, no interior do Estado, duas esferas essenciais:

    ...a "sociedade poltica" (Estado-coero) que formada pelo conjunto de mecanismos, atravs dos quais a classe dominante detm o monoplio legal da represso e da violncia, e que se identifica com o aparelho de coero sob controle das burocracias executivas e policial militar; a "sociedade civil", formada precisamente pelo conjunto das organizaes responsveis pela elaborao e ou difuso das ideologias, compreendendo o sistema escolar, as igrejas, os partidos polticos, os sindicatos, as organizaes profissionais, a organizao material da cultura (revistas,jomais, editoras, meios de comunicao de massa) etc. (Coutinho 1981, pp. 91-92)

    Ao distinguir estas duas funes no interior do Estado, Gramsci diferencia e destaca a contribuio especfica de meios instituidos que, no realizando uma funo explcita de "coero e dominao", contribuem para manter os interesses dominantes, atravs da "direo poltica" e do "consenso", Trabalhando especfica e adequadamente com as condies, os

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    interesses e as necessidades predominantes na realidade social, a "sociedade civil", na anlise de Gramsci, realiza uma funo poltica implcita no contexto da realidade social, atravs de sua forma de organizao. Assim, os meios de comunicao, a Igreja, os sindicatos, as escolas etc., como instituies aparentemente neutras, por meio de uma prtica social especfica, alm de desenvolverem uma compreenso-explicao de mundo, do ponto de vista de suas prticas, desenvolvem, tambm, uma concepo implcita de mundo que contribui para "conservar a unidade ideolgica de todo o bloco social" (Grasmsci 1981, p. 16). , portanto, no nvel das prticas especficas das instituies da "sociedade civil" que so sistematizados e veiculados, explcita e impli citamente, as concepes, as teorias e os valores adequados produo reproduo das relaes econmicas que mantm o capital.

    Neste sentido, a escola, como instituio da "sociedade civil' desempenha sua finalidade especfica de difuso de determinada com preenso-explicao cientfica, metdica e sistematizada de mundo atravs de uma forma de organizao, desenvolvimento e avaliao de trabalho pedaggico. Como forma de expresso terico-prtica de deter minada compreenso de mundo, a escola desenvolve a formao de un homem segundo a viso histrica, geogrfica, lingstica, matemtica etc. que transmite.

    Fica evidenciado, desta maneira, que a produo e a veiculao de determinada concepo cientfica sobre o mundo contribuem para garantir o consenso necessrio sobrevivncia de um modelo de sociedade atravs do como ensinar. Ou seja, o trabalho do professor (na acepo de Gramsci, o trabalho dos funcionrios da hegemonia da classe domi-nante), utilizando-se de uma forma especfica de organizao, execuo e avaliao da prtica pedaggica, con4ribui para transmitir concepes, teorias e valores adequados a uma realidade social. Chega-se, assim, a um quarto pressuposto: As instituies da "sociedade civil", estando adequadas a uma base econmica, produzem uma forma de estabelecer relaes Terico-prticas com esta realidade, isto , uma forma especfica de compreender e desenvolver sua prtica, a partir das condies e necessidades predominantes.

    Assim compreendido, o trabalho do intelectual, estando organicamente articulado aos interesses e s necessidades de determinado grupo ou classe social, organiza uma forma especfica de desenvolver e avaliar sua prtica, tambm especfica e adequada base material da sociedade que o fundamenta.

    Levando em conta esta relao entre um modo de produo material e o Estado, como "sociedade poltica e sociedade civil", a contribuio da escola para a manuteno- superao da realidade adquire uma dimenso mais ampla. Esta instituio, ao possuir como finalidade especfica o desenvolvimento de uma compreenso sistemtica de mundo, do ponto de vista das diferentes reas do saber que constituem o currculo escolar, utiliza-se de uma forma de trabalho pedaggico, para organizar a prtica de sua funo social especfica. E atravs da forma de o professor desenvolver com o aluno relaes e articulaes entre o conhecimento transmitido pela escola e a sociedade, como pressuposto e finalidade da educao, que os valores, os hbitos e as habilidades, gerados pelo trabalho social de produo da existncia, sero sistematicamente transmitidos, elaborados e reelaborados.

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    Pois, conforme j foi colocado, uma forma de ensinar um sistema de ligaes e

    relaes entre todos os processos e elementos que compem o interior da aula, e os processos materiais, jurdicos, polticos e ideolgicos, predominantes na prtica social mais ampla.

    Na realidade, toda forma esta' organicamente ligada ao contedo, uma forma de ligao dos processos que o constituem. A forma e o contedo estando em correlao orgnica, dependem um do outro e essa dependncia no equivalente. O papel determinante nas relaes desempenhado pelo contedo. Ele determina a forma e suas mudanas correspondentes da forma. Por sua vez, a forma reage sobre o contedo, contribui para seu desenvolvimento ou o refreia. (Cheptulin 1982, p. 268)

    Esta compreenso da forma de uma prtica, ao expressar as ligaes e relaes dos processos que ocorrem entre os elementos que a compem e o mundo exterior, chama a ateno para um aspecto, ainda secundarizado no como ensinar: o contedo da forma. Significando determinada compreenso da articulao entre o mundo, a sociedade, o homem (aluno), a educao etc., atravs do conhecimento transmitido, o Contedo implcito na forma de ensinar determina a contribuio da prtica pedaggica para a conservao-superao da sociedade mais ampla. No possuindo uma finalidade em si mesma e estando articulada a determinadas finalidades sociais que extrapolam o interior da escola, uma forma de ensinar, ao contribuir para ajustar e adaptar o aluno a determinada prtica social, pode, tambm, contribuir para desenvolver uma compreenso crtica da mesma.

    necessrio ainda destacar, aqui, que esta anlise da relao contedo-forma de ensinar

    que parte de ligaes e relaes entre a prtica social que produz e mantm a existncia humana e o interior da escola, segundo estes quatro pressupostos, no mecnica. Pois esto sendo considerados tanto a correlao e a interdependncia (determinao), como o isolamento e a independncia (autonomia relativa), entre a estrutura material e a superestrutura poltica, jurdica e ideolgica, entre a escola e a sociedade

    Compreender o "como ensinar" com base nessa articulao supe ampliar seu significado e a extenso de sua organizao, de seu desenvolvimento e de sua avaliao. Em outras palavras, supe compreender que a escola, para cumprir sua funo pedaggica explcita de transmitir um saber cientfico sobre o mundo, organiza, desenvolve e avalia o ensino por meio de relaes implcitas que so estabelecidas entre elementos envolvidos. Tais elementos - o professor, o aluno, o saber, os recursos etc. - ao mesmo tempo em que expressam e sintetizam condies e as necessidades predominantes na realidade, direcionam o "como ensinar" para atender a finalidades sociais determinadas. Pois o aluno, ao ser levado a estabelecer relaes entre um concebimento especfico e a realidade natural e social mais ampla, atravs do saber cientfico transmitido, acaba adquirindo determinada compreenso de mundo, determinados hbitos, habilidades e valores, adequados ao modelo de sociedade que

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    fundamenta a prtica.

    Esta anlise da prtica pedaggica escolar contribui para destacar a dupla funo desempenhada por essa instituio social. De um lado, na medida em que, historicamente, ficou caracterizada como funo da escola a transmisso do saber elaborado sobre as diversas reas do conhecimento, evidenciou-se a transmisso de um contedo explcito sobre o mundo, a sociedade, o homem, a natureza etc. Por outro lado, se considera que a transmisso-assimilao dessa viso significa, tambm, a formao de um homem em termos de conhecimentos, de hbitos de habilidades, de valores, implcitos na forma de ensinar, destaca-se outra funo desempenhada pela escola no processo de produo-reproduo-transformao do mundo produzido historicamente pelo trabalho do homem. O "como ensinar" assim compreendido transmite explcita implicitamente uma viso de mundo, atravs do como organizado desenvolvido e avaliado o ensino do saber escolar. Para a didtica, caracterizada agora como contedo-forma, passa a ser de fundamental importncia compreender e analisar as determinaes, as ligaes e as relaes que ocorrem entre a sociedade e a escola, atravs do ensino. Neste caso, considerando que o professor, ao definir sua forma de ensinar, define, tambm, um contedo pedaggico implcito, o tratamento que reduz a didtica apenas operacionalizao do "como ensinar" superado pela compreenso do contedo implcito na forma de ensino. Neste sentido, a didtica pode contribuir para desenvolver uma compreenso crtica da arte de ensinar na medida e,n que for trabalhada do ponto de vista da relao contedo forma. Bibliografia ALVITE, M.C.C. Didtica e psicologia - Crtica ao psicologismo da educao. So Paulo, Loyola, 1981. AQUINO, Santo Toms de. Suma teolgica. Porto Alegre, Grafosul, 1980. CHEPTULIN, A. A dialtica 'na teria lista. So Paulo, Alfa-Omega, 1982. COM NIO, J.A. Didctica Magna. Lisboa, Calouste Gubenkian, 1976. COUTINHO, C.N. Fontes do pensamento poltico de Grainsci. Porto Me-gre, L.& PM, 1981. DAMIS, O.T. "Didtica e sociedade - O contedo implcito do ato de ensinar". Cmpinas, Unicamp, 1990 (dissertao de mestrado). GRAMSCI, A.A concepo dialtica da histria. Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 1981. IIUBERMAN, L. Histria da riqueza do homem. Rio de Janeiro, Zabar, 1984.

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    IANNI, 0. (org.). Marx. So Paulo, tica, 1982. SWEEZY, P.M. "Teoria do desenvolvimento capitalista". Os economistas. So Paulo, Nova Cultura, 1986. TOUCHARD, J. Histria das idias polticas. Lisboa, Europa Amrica, 1970, vol. III. A RELAO TEORIA-PRATICA NA DIDTICA ESCOLAR CRTICA

    Oswaldo Alonso Rays

    A evoluo da humanidade amplia a cada momento o crculo de fatos e fenmenos que so objeto tanto da atividade cognoscitiva como da atividade prtica do gnero humano. As grandes descobertas da cincia e as mltiplas transformaes ocorridas at hoje sempre foram resultado da ao consciente do homem - ao crtica - de conjugar a unidade da teoria e da prtica em sua atividade sociocultural. Pode-se, pois, obviamente, afirmar que as grandes transformaes ocorridas na histria da humanidade foram realizadas pela ao do homem sobre o mundo da natureza e o mundo da cultura, ou seja, atravs do trabalho humano.

    No entanto, nossa sociedade mantm-se dividida em classes ocupam posies antagnicas na estrutura social, resultando, consequentemente, na hierarquia e na diviso do trabalho humano. Este fato tem cerceado s classes trabalhadoras, que se encontram em posies subalternas (na hierarquia social e na hierarquia do trabalho), a aquisio de novos conhecimentos e a assimilao da experincia da humanidade acumulada ao longo do processo histrico. Por essas razes, processo de escolarizao, preciso desenvolver o trabalho pedaggico no sentido de propiciar condies objetivas a essas classes sociais c conhecerem criticamente os motivos histricos pelos quais se encontram nessa posio social.

    No modo de produo existente em nossa sociedade nem toda atividade do homem uma atividade consciente. Em parte, essa situao pode ser atribuda ao processo educacional sempre que este no oferece uma formao cientfica crtica, em que a unio da teoria e da prtica seja a marca predominante para a formao do homem onilateral. Por isso, preciso que todo processo formativo sistematizado oferea ao homem a oportunidade de alcanar a atividade consciente. para que possa transformar a realidade objetiva que o oprime. Da a importncia da unio da teoria e da prtica nos processos formativos escolares.

    Torna-se necessrio lembrar, logo no incio deste texto, que toda atividade consciente do homem guiada pela unia-o da teoria e da prtica, na forma histrico-social da atividade-

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    trabalho, envolvendo, a um s tempo, valores cognitivos e valores prticos. Essa unio no caracteriza apenas a atividade consciente do homem, mas o prprio homem. Assim, toda ao humana realizada com base no princpio da vinculao teoria-prtica ocupa posio cientfica na atividade consciente do homem.

    O carter cientfico da atividade consciente do homem manifesta-se no momento em que o homem se reconhece como homem histrico (e no puramente biofsico) e tem conscincia de suas condies socio-culturais concretas, ou seja, quando tem conscincia da sua histria. De fato, trabalhando-pensando e pensando-trabalhando, o homem conhece e transforma, cientificamente, seu mundo circundante. O ato relacional teoria-prtica-teoria

    A nfase em se buscar um acordo consciente entre teoria e prtica reside no fato de os modos da relao teoria-prtica terem assumido, na histria do pensamento cientfico, acepes diferentes. Grosso modo, essas acepes podem ser classificadas em negativa e positiva.

    A acepo negativa da relao teoria-prtica pode ser representada, de forma esquemtica, assim: "PRATICA ---> TEORIA" (em que a teoria submete-se prtica) e "TEORIA ---> PRTICA" (em que a prtica submete-se teoria). Na acepo negativa da relao teoria-prtica, a teoria assume as caractersticas de uma no-teoria e a prtica, as caractersticas de uma no-prtica, por no se complementarem. Isolar, portanto, a teoria da prtica e a prtica da teoria privar o homem de sua capacidade de agir consciente e historicamente.

    Na acepo positiva a relao teoria-prtica, ao contrrio da acepo negativa, pode ser assim representada: "TEORIA PRATICA" (em que teoria e prtica constituem-se reciprocamente). Na acepo positiva a reciprocidade teoria-prtica passa, portanto, pela reciprocidade sujeito-objeto, que se constitui no lado ativo da relao teoria-prtica. Nesse entendimento, a evoluo da teoria corresponde evoluo da prtica que ocorre sempre ligada evoluo da teoria.

    Esse princpio de identidade faz com que teoria e prtica sejam dinmicas. As vezes pensamos, equivocadamente, que a teoria sempre a mesma, que a prtica sempre a mesma e que ambas desenvolvem-se autonomamente. Mas, se pensarmos mais detidamente vamos concluir que, a um s tempo, teoria e prtica movem-se e transformam-se continuamente. Em nenhum momento da atividade humana a teoria e a prtica esto imveis, uma vez