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Artigo sobre educação a distância

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  • Referncia: ARAJO, Nukcia M. S. A avaliao de objetos de aprendizagem para o ensino de lngua portuguesa: anlise de aspectos tecnolgicos ou didtico-pedaggicos? In: ARAJO, Jlio; ARAJO, Nukcia. Ead em tela: docncia, ensino e ferramentas digitais. Campinas: Pontes, 2013.

    A AVALIAO DE OBJETOS DE APRENDIZAGEM PARA O ENSINO DE LNGUA PORTUGUESA: ANLISE DE ASPECTOS

    TECNOLGICOS OU DIDTICO-PEDAGGICOS? Nukcia Meyre Silva Arajo (UECE)

    Consideraes Iniciais

    Os objetos de aprendizagem (OA) nos ltimos anos tm se difundido como um novo modelo de recurso digital reutilizvel que se presta a servir como ferramenta de ensino em diversos contextos educacionais, entre os quais estariam tanto a modalidade de ensino presencial como a modalidade a distncia. Devido importncia que vm ganhando, os objetos educacionais passaram a ser desenvolvidos e usados como ferramentas potenciais de apoio ao processo de ensino e aprendizagem de diversas disciplinas. Esse destaque e disseminao de uso fazem, no entanto, surgir uma preocupao quanto qualidade e pertinncia dos objetos educacionais que so publicados em repositrios.

    Embora repositrios e pesquisadores proponham vrios conjuntos de critrios para avaliao, no h consenso quanto aos aspectos que determinariam a qualidade de um objeto de aprendizagem. A prpria concepo de OA, que nasceu nas Cincias da Computao, parece encaminhar a descrio e avaliao dessas ferramentas de ensino para aspectos tcnicos em detrimento de aspectos didtico-pedaggicos. considerando essa discusso a respeito da avaliao de objetos de aprendizagem que, neste artigo, nos propomos a analisar dois OAs destinados ao ensino de lngua portuguesa publicados no Banco Internacional de Objetos Educacionais BIOE1 um repositrio mantido pelo Ministrio da Educao em parceria com o Ministrio da Cincia e Tecnologia, a Rede Latino-americana de Portais Educacionais (RELPE), a Organizao dos Estados Ibero-americanos (OEI) e outros organismos/instituies. O objetivo da anlise verificar se os objetos so adequados do ponto de vista lingustico e do didtico-pedaggico.

    Para proceder ao relato da pesquisa, dividimos este trabalho em quatro partes. Na primeira, fazemos uma discusso sobre o conceito de objetos de aprendizagem, mostrando caractersticas dessas ferramentas educacionais digitais. Na segunda, explicamos como funcionam os repositrios; na terceira fazemos consideraes sobre a avaliao de OAs, estabelecendo uma ligao entre esses recursos e teorias de ensino. Na ltima seo, fazemos a anlise das animaes Noite de almirante e No meio do caminho.

    1. A (difcil) definio de objeto de aprendizagem As novas prticas pedaggicas surgidas a partir do uso das Tecnologias da Informao

    e Comunicao (TICs) em salas de aula (presenciais ou virtuais) proporcionaram a criao de

    1 Conferir objetoseducacionais2.mec.gov.br/

  • novas metodologias de ensino e de ferramentas que servem de meio para uma aprendizagem baseada no interesse, criatividade e autonomia do aluno. Entre outros aspectos, o uso das TICs tem provocado mudanas na maneira de projetar e de utilizar materiais didticos.

    Dentre os materiais didticos que surgem a partir da mediao das TICs, esto os chamados objetos de aprendizagem. Os objetos surgiram em funo da necessidade de se criarem novas estratgias de ensino-aprendizagem para a web e da necessidade de economia de pessoal e de tempo na elaborao de materiais instrucionais2. Apesar de a discusso sobre OAs remontar a meados da dcada de 19903 ainda no h uma definio consensual para essas entidades digitais. Discutiremos, ento, algumas definies de objetos de aprendizagem a partir de Wiley (2000), uma referncia que parece funcionar como uma espcie de discurso fundador quando se trata da definio de OA.

    Segundo Wiley (2000), a definio de que partem boa parte dos conceitos de OA a do Comit de Padres de Tecnologia de Aprendizagem (LTSC - Learning Technology Standards Committee) do Instituto de Engenheiros Eltricos e Eletrnicos (IEEE)). De acordo com o LTSC, um objeto de Aprendizagem seria uma entidade, digital ou no-digital, que pode ser usada, reusada ou referenciada durante o ensino com suporte tecnolgico. (LOM, 2000 apud Wiley 2000, p. 5).

    Como se pode observar, a definio bastante larga e a partir dela, por exemplo, possvel dizer que seriam OAs contedos multimdia, softwares educacionais assim como pessoas, organizaes ou eventos referenciados durante a aprendizagem apoiada por tecnologia (LOM, 2000 apud Wiley 2000, p. 5). Nessa perspectiva, numa atividade em que um passeio pelo campo feito por professor e alunos para analisar o clima de um determinado local, o passeio poderia ser um objeto de aprendizagem, uma vez que poderia ser referenciado como suporte tecnolgico de ensino. O problema inicial uma definio to ampla diz respeito considerao de que entidades no-digitais tambm podem ser OAs.

    McGrael (2004) discute definies de objetos de aprendizagem em funo da acepo de coisa que comporia um OA. O autor organiza as definies partindo de conceitos mais gerais para conceitos especficos. Leffa (2006) comenta a anlise proposta por McGrael. Segundo o autor, um OA poderia ser:

    a) qualquer coisa (DOWNES, 2003; FRIESEN, 2001; MORTIMER, 2002 apud LEFFA, 2006, p.6). Segundo essa perspectiva, um livro, um computador ou at uma vassoura, por exemplo, poderiam ser um OA. Na opinio de Leffa (2006), a definio seria atraente do ponto de vista terico, visto que seria o uso que se faz de um objeto que o tornaria ou no um objeto de aprendizagem;

    b) qualquer coisa digital (WILEY, 2000). A definio proposta por Wiley a de que um OA seria qualquer recurso digital que pode ser reusado para apoiar a aprendizagem,. Sob esse ponto de vista, seriam algumas caractersticas do prprio OA que no permitiriam

    2 O desenvolvimento de cursos a distncia e de materiais didticos para a web requeria altos custos, em funo

    das prprias caractersticas de implementao desses materiais. A produo envolve, por exemplo, alm de educadores, vrios outros profissionais responsveis por design, programao e pessoal de suporte de hardware e software entre outros. 3 Segundo Wiley (2000), foi criado em 1996 o Comit de Padres de Tecnologia de Aprendizagem (LTSC -

    Learning Technology Standards Committee) do Instituto de Engenheiros Eltricos e Eletrnicos (IEEE). Iniciativa semelhante se deu em 2000 com a criao do consrcio Aliana de Autoria de Aprendizagem a Distncia e Redes de Distribuio na Europa (ARIADNE - Alliance of Remote Instructional Authoring and Distribution Networks for Europe).

  • que entidades no-digitais fossem objetos. Seria difcil, por exemplo, editar, adaptar e incorporar um livro a outros livros, mas, por outro lado, isso seria simples se fosse feito com uma entidade digital.

    Wiley(2000) destaca vantagens no conceito por ele proposto. A delimitao digital atribuda aos OAs e a reduo do universo em que estariam esses recursos seriam as primeiras vantagens. De acordo com o terico, a delimitao digital permitiria que se estabelecesse uma medida para OAs, os quais teriam 15 terabytes, medida que, em 2000, era aceitvel para informaes disponveis na internet, mas que hoje, em 2010, j foi vrias vezes multiplicada. Ainda segundo o autor, a delimitao entidade digital reutilizvel tambm seria positiva porque, assim, os OAs no seriam qualquer entidade digital, mas apenas aquelas que podem ser usadas e reusadas. Leffa (2006) chama ateno para o fato de a definio, no entanto, no tocar no objetivo com que seriam concebidos esses recursos.

    Continuando a destacar as vantagens de sua definio, Wiley (2006) ainda assevera que sua proposio comporta aspectos daquela que foi proposta pelo LTSC, uma vez que admite atributos essenciais de um objeto de aprendizagem, entre os quais estariam ser um recurso digital reutilizvel e que apia a aprendizagem.

    c) qualquer coisa com objetivo educacional (QUINN; HOBBS, 2000, DOORTEN et al., 2004 apud LEFFA, 2006, p.6). Nessa perspectiva, no existiria a diferena entre recursos digitais e no-digitais. A nica caracterstica a mais em relao a recursos no digitais seria a possibilidade de separao do contedo de ensino em blocos que, por sua vez, poderiam ser reagrupados em blocos maiores;

    d) qualquer coisa digital com objetivo educacional (ALBERTA LEARNING, 2002; CISCO SYSTEMS, 2001; KOPER, 2001 apud LEFFA, 2006, p.7). Sob esse ponto de vista, seriam objetos textos, imagens, vdeos, softwares, animaes desde que fossem usados para o ensino. Essa a definio dominante na rea.

    Neste trabalho, aceitamos a definio de Wiley (2000) de que OA um recurso digital que pode ser usado e reusado para apoiar atividades de ensino-aprendizagem. Admitimos ainda o ponto de vista de Silveira (2008, p. 44) que afirma que OAs seriam elementos de informao que podem ter tamanhos variados, mas que podem ser reutilizados, medida que se tornem autocontidos e independentes de mdia..

    Sobre a definio de objeto de aprendizagem, preciso ainda comentar as duas metforas usadas para explicar o conceito a iniciantes nos estudos da rea. A primeira delas a que compara um OA e seu comportamento ao jogo LEGO. A metfora, segundo Wiley (2000, p.15), serviria para apresentar uma ideia bsica e para dar uma interface amigvel a uma nova tecnologia. A partir dela, seria possvel explicar a granularidade e a combinao de OAs. A metfora explicaria como se fazem e como se comportam os OAs: criam-se pequenos pedaos de instruo (peas de Lego) que podem ser unidos em uma estrutura instrucional maior (um castelo) e tambm reusados em outras estruturas instrucionais (uma astronave). O autor, entretanto, critica essa metfora e mostra que, apesar de ela ter se tornado comum quando se quer explicar como se concebe um OA, ela simplificaria e limitaria bastante o que se pode pensar sobre objetos de aprendizagem. Para proceder crtica, Wiley (2000, p.16) lembra algumas propriedades de um bloco de LEGO, quais sejam: Qualquer bloco de LEGO combinvel com qualquer outro bloco de LEGO; Os blocos de LEGO podem ser unidos da maneira que se escolher; Os blocos de LEGO so to divertidos e simples que at crianas podem uni-

    los. Quando se define ou se caracteriza algo por intermdio de uma metfora, atribui-se

    analogamente ao objeto que se quer definir propriedades tpicas do objeto comparado. Dessa forma, possvel afirmar que um OA, como uma pea de LEGO, poderia ser combinado,

  • indefinidamente com qualquer outro OA; que essa combinao, por sua vez, poderia ser feita de qualquer maneira, independente, por exemplo, de caractersticas do prprio OA e, por fim, que um objeto de aprendizagem um recurso de criao e manipulao bastante simples.

    Wiley prope a adoo de outra metfora que, segundo o autor, facilitaria o entendimento do que so os OAs e de como se configura seu funcionamento. Um OA seria, ento, como um tomo. Como uma pea de LEGO, um tomo seria uma coisa pequena que poderia se combinar, por sua vez, com outros tomos. Entretanto, ainda segundo o terico (WILEY, 2000, p.16), as caractersticas do tomo seriam contrrias s do LEGO porque: nem todo tomo combinvel com todos os outros tomos; os tomos s podem ser unidos em certas estruturas prescritas por sua prpria

    estrutura interna; algum treinamento exigido para ajuntar tomos.

    Em relao s caractersticas de um OA, a tarefa de criar um objeto que til instrucionalmente o que deve primeiramente nortear a criao de OAs e no o fato de um objeto sempre poder ser combinado com outros. Dessa forma, deve haver objetos que se associam entre si, mas, por outro lado, pode haver outros que no so passveis de combinao. Ainda em relao a isso, ideia de que os OAs poderiam ser combinados em qualquer situao subjaz o que se costuma chamar de neutralidade terica. Sob esse ponto de vista, os OAs no deveriam ser embasados em nenhuma teoria de aprendizagem ou concepo de ensino. Por isso mesmo, eles poderiam ser associados e utilizados nos mais diferentes ambientes e contextos. O risco dessa possibilidade infinita de combinao seria a construo de entidades maiores que falhariam em seus objetivos de ensino. Por ltimo, a ideia de ludicidade absoluta e facilidade de manuseio ligada aos OAs tambm contribui para que se vejam esses recursos como algo que do ponto de vista pedaggico pode ser pouco importante ou pouco til e que no se teria que ter, por exemplo, graus variados de conhecimentos para lidar com OAs.

    Mesmo no havendo concordncia entre os autores sobre as caractersticas dos objetos de aprendizagem, h aspectos, pautados em padres internacionais que so admitidos como propriedades inerentes a qualquer OA. Todo objeto de aprendizagem deve, como uma atividade de ensino, apresentar propsito especfico e estimular a reflexo do aluno. Outra caracterstica dessa ferramenta que, normalmente, o OA apresenta um recorte de contedo pouco extenso, dessa forma, possvel construir um objeto para se trabalhar uma especificidade dentro de um assunto amplo (granularilidade). Mendes, Sousa e Caregnato (2004) apontam as principais caractersticas de um objeto de aprendizagem. Para os autores, um OA precisa apresentar:

    a) reusabilidade: ser reutilizvel diversas vezes em diversas situaes e ambientes de aprendizagem;

    b) adaptabilidade: ser adaptvel a diversas situaes de ensino e aprendizagem; c) granularilidade: apresentar contedo atmico, para facilitar a reusabilidade; d) acessibilidade: ser facilmente acessvel facilmente via Internet para ser usado em

    diversos locais ou, ainda, ser potencialmente acessvel a usurios com necessidades especiais;

    e) durabilidade: apresentar possibilidade de continuar a ser usado independente de mudana de tecnologia;

  • f) interoperabilidade: apresentar possibilidade de operar atravs de variedade de hardwares, sistemas operacionais e browsers.

    Dentre essas propriedades, a granularidade seria central, uma vez que a partir dela que se determina a reusabilidade. Um objeto de grande extenso, como um currculo inteiro (algo previsto na definio do LTSC, j referida nesta seo) muito difcil de ser reutilizado. A reutilizao, na definio que adotamos aqui, seria a caracterstica central de funcionamento de um OA. Dela, por seu turno, decorreriam, por exemplo, a adaptabilidade, a acessibilidade.

    Tendo empreendido a discusso sobre o que seria um objeto de aprendizagem, passemos agora a tratar de como se armazenam esses recursos.

    2. Os repositrios de objetos de aprendizagem Depois que se produzem objetos de aprendizagem, uma dificuldade pode surgir e impedir

    que eles sejam reusados: os OAs podem ficar atomicamente publicados na web e isso pode dificultar a busca dos objetos pelo usurio. Como os objetos normalmente fazem parte de um conjunto maior de ferramentas ou metodologias de ensino (um curso, uma disciplina, um mtodo especfico), eles terminam por se tornar recursos que, por sua granularidade, so pouco visveis nesses contextos maiores. Por essa razo, h necessidade de se criarem espaos organizados como bibliotecas virtuais em que os OAs so organizados e disponibilizados gratuitamente para os usurios. Esses espaos so chamados repositrios.

    O princpio de organizao dos repositrios o mesmo de bibliotecas. Para serem armazenados, os OAs primeiramente so catalogados. Os dados utilizados nessa organizao so chamados metadados. Literalmente, o termo quer dizer dados sobre dados. Metadados seriam, ento, a informao descritiva sobre um recurso. Citando um exemplo de Wiley (2000), um catlogo de cartes em uma biblioteca pblica uma coleo de metadados. No caso do catlogo de cartes, os metadados seriam as informaes armazenadas nos cartes sobre o Autor, Ttulo e Data de Publicao do livro ou a fonte (no caso de gravaes, etc).

    Existem trs tipos de categorias de repositrios de objetos, considerando a entidade/instituio que os mantm: a) pblicos, mantidos por governos de diferentes pases; b) universitrios, mantidos por uma ou vrias universidades; e c) privados, mantidos por empresas particulares (LEFFA, 2006).

    Entre os repositrios mais conhecidos mundialmente est o MERLOT (Multimedia Educational Resource for Learning and Online Teaching)4, um consrcio mantido por vrias entidades, principalmente dos EEUU e Canad. Em relao publicao de OAs, a alimentao do MERLOT feita por professores que submetem seus trabalhos a avaliao e permitem a publicao gratuita no repositrio. No MERLOT, alm de encontrar OAs, os usurios podem tambm participar de comunidades organizadas por disciplinas. possvel tambm encontrar no portal informaes sobre estratgias de ensino, associaes profissionais, peridicos e eventos cientficos. Alm do MERLOT, na web h repositrios organizados a partir de diversos objetivos. Existem, por exemplo, repositrios que se destinam ao ensino de lnguas, tais como o CALL&HULL5, mantido pela University of Hull e o Daves ESL Caf6, mantido por Dave Sperling (pessoa fsica).

    No Brasil h tambm repositrios que tm como objetivo o trabalho com o ensino de lnguas, o caso do Banco Multidisciplinar de Textos (BMT)7, mantido pela Universidade 4www.merlot.org. 5 www.fredriley.org.uk/call/index.htm

    6 www.eslcafe.com

    7 http://minerva.ufpel.edu.br/~anne.moor/bmt/index.htm

  • Federal de Pelotas. O portal, que administrado por pesquisadores de lingustica aplicada, publica textos em lngua materna e em lngua estrangeira. De acordo com informaes do prprio portal, o estudo desses textos serviria para desenvolver habilidades de compreenso e de produo verbais. Existem sugestes de como podem ser trabalhados os textos, os quais, por sua vez, se organizam de acordo com segmentos de ensino (Ensino Fundamental, Mdio e Superior). As sugestes, no entanto, no vm em forma de atividades, mas em comentrios que chamam ateno para alguns aspectos do texto.

    Considerando a forma (sem nenhum tipo interatividade) como se apresentam os textos e as sugestes de trabalho do BMT, a caracterizao do portal como um repositrio objetos de aprendizagem se daria exclusivamente porque os textos sugeridos migraram do papel para a tela, tornando-se assim recursos digitais e no porque haveria, como em outros repositrios, materiais didticos em que se usem ferramentas multimdia, tais como vdeos, udios, simulaes, jogos e softwares educativos.

    Outro repositrio brasileiro projeto CESTA - Coletnea de Entidades de Suporte ao uso de Tecnologia na Aprendizagem. O portal foi idealizado a fim de sistematizar e organizar o registro dos objetos educacionais que vinham sendo desenvolvidos pela equipe da Ps-Graduao Informtica na Educao e do CINTED - Centro Interdisciplinar de Novas Tecnologias na Educao da UFRGS.

    Quanto aos repositrios mantidos por instituies governamentais, no Brasil h o RIVED, o Portal do Professor e o Banco Internacional de Objetos Educacionais (BIOE). O RIVED8 (Rede Interativa Virtual de Educao) um projeto do MEC/ Secretaria de Educao a Distncia - SEED em parceria com o Ministrio das Cincias e Tecnologias (MCT) e tem como objetivo a produo de contedos pedaggicos digitais, na forma de objetos de aprendizagem (animaes e simulaes). A alimentao do portal, que iniciou em 1999, foi feita at 2003 pela equipe da SEED. A partir de 2004, passou a ser feita por universidades em um projeto denominado Fbrica Virtual. O RIVED, apesar de ainda estar ativo, no publica mais novos OAs. O portal governamental que passou a desempenhar essa tarefa foi o BIOE. Com a criao do Banco,

    [...] os recursos, antes publicados no Rived, migraram para este outro repositrio, que muito mais amplo e com mais possibilidades de formatos, alm daqueles do Rived. [...] Com o tempo somente o Banco Internacional dever disponbilizar todos os recursos , centralizando tudo num nico local. (PRATA, 2009, no paginado)

    O Portal do Professor9, por sua vez, foi lanado em 2008 e, assim como o RIVED, fruto de parceria entre o MEC e o Ministrio das Cincias e Tecnologias (MCT). O portal se destina a apoiar processos de formao dos professores brasileiros e a fornecer subsdios para a prtica pedaggica desses profissionais. O espao pblico e pode ser acessado por qualquer pessoa. Nele possvel, interagir em fruns, compartilhar material e acessar objetos educacionais. O Banco Internacional de Objetos Educacionais (BIOE)10, repositrio de onde retiramos os OAs para anlise, foi criado em 2008 e um consrcio realizado entre o Ministrio da Educao, em parceria com o Ministrio da Cincia e Tecnologia, a Rede Latino-americana de Portais Educacionais (RELPE), a Organizao dos Estados Ibero-americanos (OEI) e outras entidades/instituies. O BIOE tem o propsito de manter e compartilhar recursos educacionais digitais de livre acesso, mais elaborados e em diferentes formatos: udio, vdeo, animao, simulao, software educacional, imagem, mapa, hipertexto considerados relevantes e adequados realidade da comunidade educacional local.

    8 http://rived.proinfo.mec.gov.br/projeto.php

    9 http://portaldoprofessor.mec.gov.br/sobre.html

    10 http://objetoseducacionais.mec.gov.br

  • O Banco interligado ao Portal do Professor. Participam do projeto BIOE a Universidade Federal do Cear, a Universidade Estadual Paulista de Presidente Prudente, a Universidade Federal do Rio de Janeiro, a Universidade de Braslia, a Universidade Federal de So Carlos e a Universidade Federal Fluminense.

    No portal, so publicados OAs em diversas lnguas. A rigor, qualquer pessoa pode publicar um OA no Banco desde que o recurso passe por uma avaliao. Para isso, submete o recurso a um comit que o avalia e decide pela sua publicao ou no.

    A avaliao de objetos para o BIOE feita por dois Comits Editoriais. O primeiro deles (Universidades brasileiras participantes) composto por professores e alunos da graduao e de ps-graduao de universidades pblicas. Essa equipe responsvel pela localizao, liberao de uso (direito autoral), avaliao e catalogao dos recursos. O segundo formado por especialistas do MEC que validam a publicao feita pelo primeiro comit. No caso da disciplina Lngua Portuguesa(LP), na pgina do BIOE em que h os membros dos dois comits, no h avaliador para a disciplina no primeiro comit e, no segundo, h apenas um profissional. Esse dado sugere que os OAs de LP no so avaliados por especialistas, uma vez que apenas um avaliador no conseguiria analisar o grande volume de objetos submetidos para essa disciplina. A ttulo de ilustrao, existem no BIOE, at a data de escrita deste artigo11, 706 objetos de aprendizagem de Lngua Portuguesa.

    Tendo apresentado o repositrio em que se encontram os OAs a serem analisados, faremos agora uma breve discusso sobre a orientao terica seguida no desenvolvimento e produo de OAs no que diz respeito a teorias de ensino-aprendizagem e teorias de ensino de lnguas.

    3. Teorias de ensino e objetos de aprendizagem Neste estudo, interessa-nos discutir especialmente os critrios didtico-pedaggicos

    utilizados para avaliao de OAs pelo Banco. No prprio portal, no entanto, no possvel obter essas informaes. Sob o ponto de vista de umas das universidades participantes do primeiro Comits, Melques et al (online), embora no exponha exaustivamente os critrios de avaliao do BIOE, do-nos uma viso geral sobre eles:

    Entre os critrios utilizados para a seleo dos objetos est a credibilidade da fonte, o fcil funcionamento do recurso, a interatividade, a interface de navegao adequada compreenso do contedo, a interdisciplinaridade, o contedo contextualizado e coerente, a contribuio para construo do conhecimento, entre outros.

    Alm dos aspectos de avaliao, faz-se necessrio discutirmos, antes de passar anlise dos OAs, algumas caractersticas que advm do prprio mbito de criao de objetos de aprendizagem e que terminam, muitas vezes, por compromet-los no que diz respeito teoria da aprendizagem e, no caso especfico do OAs destinados ao ensino de lnguas, concepo de lngua e ao tipo de ensino subjacentes ao objeto. Na seo 2, j discutimos a metfora dos blocos de LEGO e do tomo propostas no mbito dos estudos sobre OA. Nas duas metforas, tem-se como objetivo explicar como se comporiam a granularidade e a reusabilidade do recurso didtico digital. Essas duas caractersticas, segundo as quais possvel se terem e se combinarem pequenos blocos de contedo que podem ser usados e reusados, proporcionariam o surgimento de outra caracterstica, a adaptabilidade. Um objeto tem adaptabilidade quando pode ser utilizado em diversas situaes de ensino aprendizagem. Sendo assim, por exemplo, um OA que se destinasse ao ensino de ortografia e em que a tarefa principal fosse preencher mecanicamente 11

    Agosto de 2010.

  • lacunas em palavras com letras que faltam poderia indistintamente ser aplicado em uma sala em que se tem uma viso tradicional de ensino de lngua e em uma outra em que se tem uma perspectiva interacional.

    Uma das grandes premissas de produo de objetos de aprendizagem a possibilidade de combinar e usar objetos de qualquer maneira (metfora do LEGO). Isso seria possvel porque teoricamente um OA no deveria estar ligado a nenhuma corrente terica da disciplina a que pertena ou a nenhuma a teoria de ensino-aprendizagem. Chama-se essa viso na literatura da rea de hiptese da neutralidade terica.

    Vrios so os autores que defendem a ideia de objetos teoricamente neutros assim como vrios outros tambm rechaam essa caracterstica. Entre os que defendem, por exemplo, est Friezem (2004, apud TEIXEIRA, 2008) que sugere que as questes pedaggicas no devem influenciar os desenvolvedores de OAs. Afirma o autor que um bom objeto seria no aquele que se baseia em uma teoria pedaggica, mas aquele que estimula uma boa pedagogia.

    Kooper (2003, apud TEIXEIRA, 2008), assevera que um objeto neutro teoricamente em relao pedagogia, contexto e formato facilitaria a interoperabilidade e o reuso, mas, por outro lado, traria dificuldades para o professor. Segundo o autor, mesmo os objetos ditos teoricamente neutros, apresentam uma teoria de aprendizagem, uma vez que ou veem o processo de ensino como transferncia de conhecimento ou como aprendizado ativo.

    Discordando da hiptese da neutralidade, Wiley (2000) critica os desenvolvedores/vendedores de OAs e ironiza afirmando que teoricamente neutro pode significar teoricamente agnstico e sugere que a ausncia de teoria poderia, na verdade, estaria mais ligada a desconhecimento de teorias e do que a uma opo consciente de no usar teoria alguma.

    Admitindo que todo OA deve apresentar uma teoria de base e que, no caso do ensino de lnguas, a perspectiva de ensino influenciada pela concepo de linguagem que subjaz abordagem do fenmeno lingustico estudado, tratamos brevemente das concepes de linguagem que podem embasar um OA destinado ao ensino de lngua portuguesa12.

    a) Lingua(gem) como expresso do pensamento Na perspectiva de linguagem como expresso do pensamento, a expresso produzida no interior da mente dos indivduos. Sendo assim, uma linguagem lgica e articulada expresso de um pensamento tambm lgico e articulado. De acordo com esse ponto de vista, enunciao constituiria um ato monolgico que no afetado pelo outro nem pela situao em que a prpria enunciao se configura. Em relao ao ensino de lngua, dessa perspectiva emerge o ensino prescritivo, em que se admite como base a dicotomia certo/errado. O texto, nessa concepo, visto como um produto lgico do pensamento (representao mental) do autor, nada mais cabendo ao leitor/ouvinte seno captar essa representao mental, juntamente com as intenes (psicolgicas) do produtor (KOCH, 2002, p. 16). O ensino, nesse caso, pauta-se especialmente em regras do bem falar e do bem escrever.

    b) Lingua(gem) como instrumento de comunicao

    12

    As concepes de linguagem perpassam qualquer abordagem que se faz da lngua. A delimitao aos objetos de aprendizagem puramente metodolgica.

  • Sob o ponto de vista da linguagem como instrumento de comunicao, v-se a lngua como uma estrutura em que regras se combinam para que se possa estabelecer comunicao entre falantes. Dessa perspectiva, emerge a viso de texto como um simples produto da codificao de um emissor a ser decodificado por um ouvinte/ leitor, bastando a este, para tanto, o conhecimento do cdigo (KOCH, 2002, p. 16). Isso se daria porque o texto depois de codificado seria totalmente explcito.

    A teoria de aprendizagem behaviorista o que embasa essa concepo, assim, a aprendizagem da lngua passa por estmulo-resposta-reforo. A nfase em sala de aula dada aos exerccios de gramtica que, por sua vez, se pautariam na repetio de estruturas.

    c) Lingua(gem) como forma de interao

    Na perspectiva da linguagem como interao, a atividade verbal vista como um lugar de troca e de negociao de sentidos, atravs de que os falantes realizam aes, agem e atuam sobre o interlocutor. A interao , ento, um trabalho coletivo scio-historicamente situado. O texto considerado o prprio lcus da interao e nele os interlocutores, como sujeitos dialogicamente ativos se constroem e so construdos (KOCH, 2002). A leitura e a escrita so vistas como processos em que, em constante negociao, entra um vasto conjunto de saberes dos interlocutores (lingusticos, enciclopdicos, sociais) que, por sua vez, se reconstroem no interior da interao verbal. O ensino sob essa perspectiva baseado na reflexo e anlise de fenmenos lingustico-textuais-discursivos.

    Tendo comentado as concepes de linguagem que podem embasar o ensino de lnguas e a hiptese da neutralidade terica, passamos agora anlise dos OAs.

    4. Analisando objetos de aprendizagem publicados no BIOE Nesta seo procedemos anlise de dois objetos de aprendizagem para o ensino de lngua portuguesa publicados no BIOE. Nosso objetivo verificar se os objetos so adequados do ponto de vista lingustico e do didtico-pedaggico. Comecemos pelos aspectos metodolgicos da anlise.

    a) A escolha dos OAs O BIOE divide os objetos publicados por nvel/tipos de ensino: educao infantil, ensino

    fundamental (EF): sries iniciais e sries finais; ensino mdio (EM), educao superior, educao profissional e modalidades de ensino: educao de jovens e adultos e educao escolar indgena. Quanto aos tipos de OAs, os recursos so classificados em animao/simulao, udio, experimento prtico, hipertexto, imagem, mapa, software educacional e vdeo.

    Seguindo a classificao do prprio BIOE, escolhemos examinar animaes. A escolha se deu por esses tipos de objetos permitirem maior utilizao de recursos multimdia, o que no deixaria dvidas quanto ao seu carter digital. A fim de delimitar a amostra, elegemos as sries finais do ensino fundamental.

    No repositrio esto publicados, para o ensino de lngua portuguesa nas sries finais do EF, trs animaes. Nossa amostra, no entanto, limita-se a dois OAs. Descartamos a animao intitulada Desarrollar, destinada ao ensino de espanhol e de portugus como lngua estrangeira, uma vez que a anlise se limita exclusivamente a OAs para o ensino de LP como lngua materna. Compem a amostra, ento as animaes Noite de almirante e No meio do caminho.

  • b) Descrio e anlise dos OAs A animao Noite de almirante apresenta uma retextualizao do conto homnimo de

    Machado de Assis. O enredo de Machado conta a decepo amorosa do marujo Deolindo, que se apaixona por Genoveva, que, por sua vez, lhe jura amor eterno, mas troca o amor do marinheiro pelo amor de um mascate. O ttulo do conto Uma noite de almirante expresso usada por marinheiros para nomear uma noite de prazeres mundanos alude noite que Deolindo passaria com Genoveva, depois de voltar de um perodo de dez meses no mar. A noite de almirante, no entanto, no acontece, uma vez que Genoveva cara de amores por outro. Deolindo, entretanto, conta a histria do encontro amoroso aos companheiros de barco como se tivesse vivido realmente uma noite de almirante. Na narrativa machadiana, a noite (real ou irreal) de almirante fio que costura o conflito. Vejamos agora como se apresenta a histria retextualizada.

    A retextualizao uma das obras publicadas originalmente no site Livro Clip13. O site espao virtual em que obras literrias completas ou parte de obras so apresentadas em forma de animao ou de jogos. O contedo do site pode ser acessado gratuitamente. Nele, acompanham cada obra retextualizada informaes sobre o autor e algumas indicaes de contedo a ser trabalhado. No BIOE, entretanto, apenas a animao est publicada.

    A animao Noite de almirante lembra um pequeno filme do cinema mudo. No reconto, aparecem cenrios e personagens que se movimentam mecanicamente ao som de um tango. O tempo da narrativa, sugerido pelo cenrio e pelas roupas dos personagens, um tempo passado. No entanto, alguns comentrios do narrador remetem a um registro lingustico atual. Vejamos a primeira sequncia de telas do OA:

    Embora a verso animada da histria reduza bastante o enredo, possvel a quem assiste entender o conflito do conto: a perda de um grande amor. No entanto, na animao, corta-se o fio condutor do conflito: a noite de almirante que Deolindo teria passado com Genoveva. No reconto, a narrativa termina abruptamente no momento em que Genoveva conta a uma vizinha que Deolindo teria dito que iria se matar. Esse final sugere para o interlocutor que o marinheiro teria se matado, o que no acontece no conto.

    Tendo comentado aspectos de contedo e da apresentao do OA, discutiremos brevemente o que pode ser inferido sobre a anlise do OA no que diz respeito hiptese da neutralidade pedaggica e viso de lngua subjacente ao objeto.

    A teoria da neutralidade pedaggica, embora, como j afirmamos, sofra muitas crticas, parece ser usada com frequencia para fundamentar as caractersticas reusabilidade, granularidade e adaptabilidade por isso mesmo parece ser uma escolha na formulao de objetos de aprendizagem.

    13

    Conferir http://www.livroclip.com.br.

  • No caso do OA Noite de almirante, as trs caractersticas14 so contempladas. Por outro lado, a ausncia de indicao de como poderia ser usado o reconto assim como a ausncia de qualquer indicao terica a respeito de habilidades de leitura ou de leitura do texto literrio aspectos do ensino de lngua que poderiam ser destacados no uso do AO deixa o objeto numa espcie de limbo terico em que tudo (ou mesmo nada) pode acontecer.

    Sendo assim, por exemplo, um professor pode, a partir de uma viso de lngua como expresso do pensamento, pedir que os alunos digam qual a linguagem mais correta, a de Machado de Assis ou a do reconto. Essa atividade que, do ponto de vista de adequao do contedo de ensino, seria absolutamente equivocada, to possvel quanto uma outra (adequada) em que sejam exploradas, por exemplo, a diferena entre as linguagens em funo das mdias em que os dois textos circulam, da poca de publicao, dos interlocutores pensados por um e por outro autor etc. A hiptese da neutralidade terica pode ser inferida a partir dos objetivos e da descrio do OA. Nos dados de catalogao do recurso, apresentam-se:

    Objetivo: Despertar o interesse do aluno em relao obra apresentada, mostrando um pouco do enredo da obra. Descrio do recurso: O vdeo apresenta a obra Noite de Almirante, de Machado de Assis, de forma simples, interessante e divertida.

    A formulao do objetivo demonstra que do ponto de vista do ensino de lngua ou de literatura no h finalidade especfica. O que se pretende apenas despertar o interesse do aluno em relao obra apresentada. No se tem nenhuma orientao a mais sobre o ponto de vista a partir de que se pode estudar o reconto, da relao que se pode estabelecer entre o novo texto e o texto original, do tipo de atividade que pode ser feita usando o OA ou mesmo da viso de aprendizagem subjacente ao recurso15.

    A descrio do recurso sugere que o vdeo traz o conto de Machado de Assis (O vdeo apresenta a obra Noite de Almirante, de Machado de Assis..). Isso leva o interlocutor a pensar que, apesar de se ter uma verso em outra mdia, as caractersticas da obra sero mantidas. Entretanto, como uma retextualizao, o reconto apresenta um outro registro lingustico, outra extenso, entre outras diferenas. A aluso forma como a obra apresentada: simples, interessante e divertida tambm no sugere orientao terica especfica.

    O objeto No meio do caminho, por sua vez, outra animao tambm publicada originalmente no site Livro Clip. Na animao, apresentado o poema No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade. Diferente do objeto Uma noite de almirante, nesse OA no se anima uma narrativa, mas se enumeram fatos que teriam acontecido na mesma poca em que o poema foi publicado. O poema apresentado ao final da enumerao. O objetivo e descrio do recurso so assim delimitados no BIOE:

    Objetivo: Despertar o interesse do aluno em relao poesia de Drummond, assim como despertar o interesse pelos diversos acontecimentos da dcada de 80.

    14

    No trataremos aqui das caractersticas acessibilidade, durabilidade e interoperabilidade por estas dizerem respeito especificamente ao aspecto tecnolgico dos OAs.

    15 No site Livro Clip, feita a seguinte indicao para o professor: Em Noite de Almirante, Machado de Assis

    relativiza os juramentos e coloca em dvida a moral de pobres e ricos. Genoveva jura, e dizia a verdade, mas o tempo passou e no cumpriu o juramento. O desmascaramento dos personagens no conto , pois, um bom ponto de partida para o professor debater com os alunos o significado da palavra "verdade". Existe uma nica verdade? Ela pode mudar? O que , afinal, a verdade no mundo contemporneo?.

  • Descrio do recurso: O vdeo apresenta uma contextualizao da poca em que foi escrita a poesia No meio do Caminho, de Carlos Drummond de Andrade, apresentando os fatos mais marcantes ocorridos nos anos 80, tendo Carlos Drummond de Andrade como personagem atuante dessa poca.

    Considerando-se o objetivo do OA, v-se primeiramente uma inadequao quanto finalidade do objeto. Afirma-se que, alm de despertar o interesse do aluno pela poesia de Drummond, que se quer tambm despertar o interesse pelos diversos acontecimentos da dcada de 80. exatamente neste ponto que se revela o equvoco. Na animao, so enumerados fatos de diversas ordens e que aconteceram em 1928, data da publicao do poema de Drummond, portanto na dcada de 20 do sculo XX e no na dcada de 80. Na animao, apresentam-se os fatos completando a seguinte afirmao: H oitenta anos nascia.... Tem-se, ento:

    H oitenta anos nascia... ... a escola de samba estao primeira da Mangueira ... a televiso nos Estados Unidos ... a penicilina ... Che Guevara ... Adam West, o primeiro Batman da TV ... o Aboparu de Tarcila do Amaral ... Mickey Mouse no cinema ... o bolero de Ravel ... e os versos que mudaram a histria da poesia no Brasil: No meio do caminho, de Carlos Drummond de Andrade...

    Vejamos a seguir a tela em que aparece a primeira frase e a tela em que aparece o poema, no final da animao.

    Ainda em relao ao desenvolvimento da sequncia de quadros da animao, aps a ltima frase a ser completada, como um boneco animado, Drummond que viera caminhando por todas as telas em que apareceram os fatos , picha em um muro o poema No meio do caminho. Como se v pela lista de fatos, no h entre os acontecimentos nada em comum, a no ser a o ano em que aconteceram16. A lista parece servir apenas como pretexto para se apresentar o poema. Observa-se isso quando se compara a relao entre o nascimento 16

    A inferncia a respeito da poca a que se refere a expresso h 80 anos nascia... no simples de se fazer, uma vez que, dependendo do ano em que se l a frase, os aludidos 80 anos passados podem se referir a um tempo diferente. Sendo assim, lendo em 2010, os 80 anos remeteriam a 1930 e no a 1928, ano em que o poema foi publicado. Na verdade, depois do ano de 2008, o OA passou a exibir informaes incorretas sobre o poema de Drummond e sobre os acontecimentos enumerados.

  • da escola de samba Mangueira e o do ator Adam West, o primeiro Batman, e destes dois fatos com a poesia de Carlos Drummond.

    Na descrio do recurso, o equvoco se amplia e passa a ser uma inadequao de contedo. Afirma-se que o vdeo apresenta uma contextualizao da poca em que foi escrita a poesia No meio do Caminho. Assevera-se ainda que a suposta contextualizao feita por intermdio da apresentao dos fatos mais marcantes ocorridos nos anos 80, tendo Carlos Drummond de Andrade como personagem atuante dessa poca. A disparidade de contextos e de fatos que contextualizariam a poca dificilmente reconstri o contexto em que o poema foi escrito. Na verdade, leva-nos a pensar, como interlocutores cooperativos (GRICE, 1982) o que a poesia de Drummond teria a ver com a escola de samba Mangueira, com a televiso nos Estados Unidos e com Mickey Mouse, por exemplo.

    Por ltimo, a afirmao de que Drummond seria um personagem atuante dessa poca sugere uma espcie de militncia do poeta em relao aos fatos enumerados e pode levar o interlocutor menos experiente a achar que de alguma forma o poeta teria a ver com a criao do Bolero de Ravel, com o nascimento de Che Guevara, para citar apenas alguns acontecimentos.

    Assim como o primeiro objeto analisado, o OA No meio do caminho atende aos requisitos de granularidade e adaptabilidade. Mas no atende ao requisito da reusabilidade, uma vez que, se usado depois do ano de 2008, o objeto passa a ter uma incorreo de contedo. Vejamos por que: primeiramente, a inferncia a respeito da poca a que se refere a expresso h 80 anos nascia... no simples de se fazer, visto que, dependendo do ano em que se l a frase, os aludidos 80 anos passados podem se referir a um tempo diferente. Sendo assim, lendo em 2010, os 80 anos remeteriam a 1930 e no a 1928, ano em que o poema foi publicado. Na verdade, depois do ano de 2008, o OA passou a exibir informaes incorretas sobre o poema de Drummond e sobre os acontecimentos enumerados.

    Quanto perspectiva de lngua subjacente ao OA, a prpria apresentao do contedo sugere o texto como produto acabado. Sendo assim, ao leitor/usurio do objeto cabe o lugar de receptor a quem dada uma sucesso de informaes que contextualizariam a publicao do poema de Drummond. Essa suposta contextualizao parece surgir como uma espcie de cenrio construdo apenas para no se apresentar o poema simplesmente como um poema, como um texto literrio, como uma leitura de fruio.v Na forma como foi construdo o OA, parece no haver espao para interlocuo. Como uma ferramenta que facilitaria o ensino, o objeto poderia conter alguma pista sobre onde se quer chegar com a apresentao do poema. No entanto, nada sugerido ou apontado com relao participao do aprendiz no processo de ensino-aprendizagem ou com relao aos objetivos de ensino da ferramenta.

    Consideraes finais

    Como j afirmamos anteriormente, no existe consenso na avaliao da qualidade objetos de aprendizagem. Neste estudo, analisamos dois OAs publicados em um grande repositrio institucional, o BIOE. A anlise nos levou a constatar alguns pontos que merecem discusso no que diz respeito avaliao desses recursos digitais. Faamos, ento, uma pequena discusso a respeito deles. Embora normalmente destaquem-se seis aspectos essenciais: reusabilidade, adaptabilidade, granularidade, acessibilidade, durabilidade e interoperabilidade de um OA para que ele seja visto como adequado, preciso que se considerem caractersticas que ultrapassem aspectos tecnolgicos e aspectos pedaggicos gerais. Com efeito, muitos pesquisadores tm se dedicado a propor parmetros de avaliao da qualidade de OAs. Consideram-se normalmente normas internacionais como a ISO 9126 e acrescentam-se a ela principalmente caractersticas tecnolgicas no contempladas.

  • Bieliukas et al (2010), por exemplo, afirmam que para se desenvolver um modelo de qualidade integral de um OA preciso considerar caractersticas pedaggicas, tecnolgicas e de interao humano-computador. Na interao humano-computador, ver-se-iam aspectos como o desenho visual (a interface grfica do OA deve ativar conhecimentos previamente adquiridos pelo aprendiz), ajuda memorizao (os objetos, aes e opes devem estar visveis e no devem precisar ser memorizados pelo aprendiz) e recuperao diante de falhas (resoluo de erros que podem ocorrer enquanto o aprendiz usa o OA). No que respeita s caractersticas tecnolgicas, os autores destacam acessibilidade (possibilidade de ser rotulados com um padro que possibilitem fcil localizao e catalogao); flexibilidade (possibilidade de ser usado em diferentes contextos e combinado com outros objetos); adaptabilidade (possibilidade de ser adaptado a novos contextos); portabilidade (possibilidade de ser usado em diferentes sistemas operacionais); disponibilidade (capacidade de estar disponvel em repositrios e facilmente encontrvel). Com relao s caractersticas pedaggicas, os autores sugerem que sejam observados a) os estilos de aprendizagem: um OA deve contemplar uma ampla audincia e contemplar tambm as diferentes formas de aprendizagem de cada aluno; b) os objetivos de aprendizagem: um OA deve ter propsitos definidos que respondam necessidade de instruo em diversos contextos educativos e que descrevam comportamentos esperados da audincia sob determinadas condies; e c) os contedos: um OA deve ter contedos que correspondam s capacidades cognitivas que devem ser acrescentadas/modificadas pelo aprendiz como resultado do processo de aprendizagem. Numa rpida anlise, aplicando a proposta de Bieliukas et al (2010) em relao ao s caractersticas pedaggicas aos OAs No meio do caminho e Uma noite de almirante, teramos em relao a) aos estilos de aprendizagem: os dois OAs parecem permitir que a aprendizagem se d de maneira diferente, a depender da perspectiva de ensino assumida pelo professor (talvez seja possvel usar o objeto para promover o aprendizado numa perspectiva sociointeracionista nesse caso, partir-se-ia dele para fazer a proposta, que extrapolaria o AO ou mesmo mecanicista), alm disso os OAs atendem a uma grande audincia, cuja abrangncia pode ir desde o aluno de ensino fundamental ao aluno de ensino mdio; quanto b) aos objetivos de aprendizagem: os dois OAs falham. Em nenhum dos dois h a determinao de objetivos especficos, mas de um objetivo geral, que seria promover o gosto pela leitura de cada um dos textos (conto e poema). A ausncia de objetivos especficos deixa margem para qualquer enfoque de ensino ( o que um dos objetivos dos repositrios) e no auxilia o professor com nenhuma sugesto de trabalho mesmo que implcita) como os textos; e, por ltimo, quanto c) ao contedo: o contedo do AO Uma noite de Almirante, adequado, uma vez que apresenta uma retextualizao de um conto de Machado de Assis, em que se apresenta em forma de animao o enredo. Uma observao, entretanto, deve ser feita, no que respeita combinao entre o registro lingstico escolhido no reconto e o contexto em que a histria acontece. Nesse caso, o tempo da narrativa o sculo XIX(caracterizado pela indumentria e pela manuteno de aes do texto original), mas em alguns momentos a fala dos personagens do sculo XXI (o marujo ficou maus!). A adaptao deveria ser feita considerando-se um sculo ou outro no OA e no os dois ao mesmo tempo. Em relao ao OA No meio do caminho, o contedo configura-se como parcialmente adequado, uma vez que h dificuldade em se dar coerncia juno do poema de Drummond a alguns acontecimentos/fatos enumerados no OA. Essa breve discusso nos aponta outra inquietao a respeito da avaliao de AO: a de que para avaliar esses contedos didticos digitais imprescindvel a presena de um especialista na rea de que trata o OA. Isso, no entanto, no parece ser uma preocupao de quem alimenta repositrios. Tem-se, ento, como resultado disso uma grande quantidade de

  • OAs catalogados e disponveis aos internautas, mas a quantidade nem sempre pode ser equiparada qualidade dos Objetos.

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