ARTEFATOS DIGITAIS DE REVISTAS MENSAIS BRASILEIRAS, REVISTAS DIGITAIS E A PRESENÇA DO DESIGN NAS...

12
Gramado – RS De 29 de setembro a 2 de outubro de 2014 ARTEFATOS DIGITAIS DE REVISTAS MENSAIS BRASILEIRAS, REVISTAS DIGITAIS E A PRESENÇA DO DESIGN NAS EQUIPES EDITORIAIS Pedro Biz Eschiletti ESDI/UERJ [email protected] Washington Dias Lessa ESDI/UERJ [email protected] Resumo: Este artigo tem como objetivo situar a revista digital entre os artefatos digitais publicados por revistas brasileiras, assim como o de avaliar a apresentação das equipes de trabalho respectivas, destacando o designer em suas denominações e funções. Foram escolhidas as 30 revistas com maior circulação mensal no ano 2012-2013 e levantados os artefatos digitais a elas relacionados. Apesar da revista impressa ser o produto principal das editoras, a comunicação com o público é complementada por esses artefatos. A pesquisa foi realizada com base em informações declaradas nos sites das revistas e editoras, nos expedientes e nas lojas de aplicativos para iPad e Android. Palavras-chave: revistas mensais, design, mídias digitais Abstract: This article aims to place the digital magazine among artifacts published by the Brazilian magazines, as well as to evaluate the way the workgroups are shown, highlighting the role of the designer in its designations and functions. We chose the 30 magazines with more monthly issues in the period of 2012-2013 and raised the artifacts related to them. In spite of the printed magazine being the main product of the press, the communication with the audience is complemented by these artifacts. The research was made based on information found on magazine and press websites, mastheads and iPad and Android app stores. Keywords: monthly magazines, design, digital media Blucher Design Proceedings Novembro de 2014, Número 4, Volume 1 www.proceedings.blucher.com.br/evento/11ped

description

ARTEFATOS DIGITAIS DE REVISTAS MENSAIS BRASILEIRAS, REVISTAS DIGITAIS E A PRESENÇA DO DESIGN NAS EQUIPES EDITORIAIS

Transcript of ARTEFATOS DIGITAIS DE REVISTAS MENSAIS BRASILEIRAS, REVISTAS DIGITAIS E A PRESENÇA DO DESIGN NAS...

  • Gramado RS

    De 29 de setembro a 2 de outubro de 2014

    ARTEFATOS DIGITAIS DE REVISTAS MENSAIS BRASILEIRAS, REVISTAS DIGITAIS E A PRESENA DO DESIGN NAS EQUIPES EDITORIAIS

    Pedro Biz Eschiletti

    ESDI/UERJ

    [email protected]

    Washington Dias Lessa

    ESDI/UERJ

    [email protected]

    Resumo: Este artigo tem como objetivo situar a revista digital entre os artefatos digitais publicados por revistas brasileiras, assim como o de avaliar a apresentao das equipes de trabalho respectivas, destacando o designer em suas denominaes e funes. Foram escolhidas as 30 revistas com maior circulao mensal no ano 2012-2013 e levantados os artefatos digitais a elas relacionados. Apesar da revista impressa ser o produto principal das editoras, a comunicao com o pblico complementada por esses artefatos. A pesquisa foi realizada com base em informaes declaradas nos sites das revistas e editoras, nos expedientes e nas lojas de aplicativos para iPad e Android. Palavras-chave: revistas mensais, design, mdias digitais Abstract: This article aims to place the digital magazine among artifacts published by the Brazilian magazines, as well as to evaluate the way the workgroups are shown, highlighting the role of the designer in its designations and functions. We chose the 30 magazines with more monthly issues in the period of 2012-2013 and raised the artifacts related to them. In spite of the printed magazine being the main product of the press, the communication with the audience is complemented by these artifacts. The research was made based on information found on magazine and press websites, mastheads and iPad and Android app stores. Keywords: monthly magazines, design, digital media

    Blucher Design ProceedingsNovembro de 2014, Nmero 4, Volume 1

    www.proceedings.blucher.com.br/evento/11ped

  • 2

    1 INTRODUO Uma revista pode ser compreendida de duas maneiras: como marca e como

    mdia1. Uma no anula a outra. Enquanto marca, a revista envolve uma identidade que diz respeito no apenas a um produto tradicional, originariamente impresso, mas tambm a aes e a outros artefatos visando um posicionamento no mercado. Vrios so os objetivos dessas aes e artefatos: reforar a identidade da marca, fidelizar e/ou ampliar pblico, disponibilizar contedos complementares, trabalhar de modo coordenado com outras marcas, entre outras estratgias editoriais e mercadolgicas. Sendo assim, a revista como marca no difere de qualquer outra marca, seno por sua atuao em mercado editorial especfico, regulado segundo parmetros conceituais, jornalsticos e mercadolgicos. Enquanto mdia, a revista caracteriza-se como artefato baseado em uma tecnologia de comunicao.

    No caso desta pesquisa, partiu-se de marcas consolidadas a partir de mdias impressas, mas que envolvem mdias digitais. A mudana de meio implica em uma reconfigurao do trabalho, envolvendo diferentes ferramentas, novos conhecimentos e novas categorias profissionais.

    O presente artigo teve como objetivo levantar os tipos de artefatos digitais publicados por revistas impressas brasileiras, situar nesse quadro a revista digital, e avaliar a apresentao das equipes respectivas de realizao, destacando o design em suas funes e denominaes.

    2 REVISTAS E MDIAS DIGITAIS

    A revista impressa um artefato jornalstico caracterizado por uma temtica especfica, periodicidade expandida (semanal, mensal, ou outra), informaes detalhadas, analticas e interpretativas, e uma condio material e discursiva especfica, que dialoga com o contexto do qual ela parte constituinte (TAVARES & SCHWAAB, 2013, p. 27).

    Rene contedos variados sob uma temtica especfica direcionada a um publico imaginrio padro, diferente dos leitores das demais publicaes (ARAJO, 2013, p. 261). A criao e consolidao de uma revista depende da existncia de um nicho social compatvel. Corra (apud ARAJO, 2013, p. 262) relata que a primeira revista feminina brasileira, O Espelho Diamantino, foi lanada no mesmo ano que se ratificou a lei que estendia o direito de alfabetizao s mulheres, em 1827.

    O editor e pesquisador Srgio Cohn afirma que na dcada de 1990 a plataforma digital comeou a ser utilizada como suporte para revistas culturais, trazendo ao mesmo tempo novas possibilidades, mas tambm desafios. Se por um lado havia uma reduo de custos, por outro as revistas no conseguiram se consolidar como espao publicitrio (COHN, 2011, p. 241). Cohn percebe duas vertentes em relao ao formato dessas publicaes: as que mantiveram a estrutura das revistas impressas, apenas as adequando ao suporte digital, e as que buscaram utilizar as ferramentas tecnolgicas e sociais disponibilizadas por esse novo meio (id., p. 241). Embora Cohn esteja tratando do caso especfico de revistas culturais, sua afirmao vlida tambm para as demais que at hoje buscam a sustentabilidade

    1 Mdia aqui no entendida como o setor de venda de anncios das revistas, apenas como o

    meio de comunicao.

  • 3

    econmica em um meio onde o pblico est acostumado a acessar contedo de maneira gratuita.

    As mdias digitais se constituem em um mercado no qual as bases tecnolgicas de hardware e de software esto em constante transformao. Isso amplia a variedade de artefatos que transmitem informao, contribuindo para a disperso da mdia. Jenkins afirma que ao mesmo tempo que o contedo est convergindo para os meios digitais, as tecnologias que permitem essa comunicao esto divergindo. A previso de que todas as mdias seriam condensadas em apenas um dispositivo qual Jenkins se refere como falcia da caixa preta (JENKINS, 2006, loc. 402) no est se concretizando. O cenrio de cada vez mais artefatos de acesso informao como tablets, smartphones, e-readers, dispositivos vestveis (weareable devices), produzidos por inmeras marcas, que, naturalmente, instituem incompatibilidades tecnolgicas entre concorrentes como estratgia de mercado.

    Ao contrrio da mdia impressa, no meio digital a informao flui dispersa atravs de diversos artefatos. o que Jenkins chama de convergncia de cultura. Mais do que uma mudana tecnolgica assiste-se a uma mudana cultural, orientada pela cooperao entre mltiplas indstrias da mdia e o comportamento migratrio da audincia, que ir a quase qualquer lugar na busca das experincias [...] que quiserem (JENKINS, 2006, loc. 1782).

    Existem inmeras formas de disponibilizar contedo via mdia digital: websites, canais de vdeos, jogos, blogs, redes sociais, entre outras. Para se aproximar de seu pblico-alvo, editoras disponibilizam em outros artefatos o contedo tradicionalmente apresentado pela revista. Observamos tal situao nos portais de contedo, que centralizam a presena online da revista-marca. Alm do acesso a reportagens possvel assinar a revista, tanto impressa quanto digital, acessar mdias sociais, blogs de especialistas, o canal de vdeo, o canal de jogos, assinar a newsletter; escutar podcasts, baixar aplicativos exclusivos para smartphones etc. O portal da revista Nova Escola, por exemplo, vai alm da revista e se prope a ser um portal de apoio ao professor. Apresenta propostas de planos de aula para disciplinas da educao infantil ao ensino mdio, vdeos, jogos, testes. Os portais esto ligados a modelos que se desenvolveram a partir da internet, possuindo estruturas de produo com concepes, mtodos de trabalho e profissionais com formaes diferentes da editorial.

    Desde o lanamento do iPad, em 2010, editoras passaram a produzir verses para tablets de suas revistas, com o contedo das edies impressas. O que parece ter sido encontrado com as revistas digitais para tablets foi uma forma de evoluir os modelos editorial e econmico que comearam a se formar ainda no sculo XIX. Como estamos tratando de um mercado recente, os modelos de tablets funcionam em carter por vezes experimental, considerando que ainda no conseguem cobrir os custos de produo de contedo, seja pelo pequeno porm crescente nmero de leitores, seja pela desconfiana e falta de interesse dos anunciantes. Entretanto, a queda do consumo de revistas impressas nos ltimos anos uma realidade atribuda migrao de leitores para o meio digital, que dispersam-se entre dispositivos e a enorme quantidade de informao acessvel ao custo do provedor de internet e da energia eltrica.

    2 Referncia Kindle e-book. Traduo dos autores.

  • 4

    A tradio de websites de fornecer contedo gratuitamente um dos problemas que editoras vm enfrentando na reformulao de seus modelos de negcio frente s imposies do mercado digital. Faz-se necessrio uma reestruturao organizacional das editoras, inclusive repensando a prpria ideia de revista. Para Paulo Lima, publisher das revistas Trip e TPM, os dois ttulos so tratados como uma grande plataforma voltada ao nicho comportamental, sendo composta pelas duas revistas, dois eventos [...], um programa de TV e programa de rdio (PARENTE, 2013, p. 16).

    3 DESIGN EDITORIAL E REVISTA

    O papel do designer no processo de produo mensal de uma revista est ligado conformao das categorias grfico-editoriais de acordo com os padres editoriais e o contedo das matrias, visando criar mensagens visuais que engajem o pblico na leitura. Eventualmente designers so responsveis tambm pela criao de infogrficos, ilustraes e outros elementos grficos.

    Trabalham em conjunto com jornalistas e so pea fundamental na definio grfica da revista, participando ativamente da edio das imagens, das solues tipogrficas, cromticas, da elaborao de infogrficos de outros elementos visuais que compem as matrias. Segundo Gruszynski e Calza o design perpassa as vrias fases de produo e exige que os membros da equipe ponderem sobre os recursos verbais e visuais que possam melhor reportar o contedo (GRUSZYNSKI; CALZA, 2013, p. 208). Tambm reforam a importncia da atividade colaborativa entre jornalistas e designers, afirmando que cabe ao designer ter bom domnio do jornalismo e ao jornalista/editor reconhecer a importncia do design (id., p. 208).

    Segundo Werneck, o trabalho do designer ou editor de arte seria o de dar a tudo uma identidade (com uma capa que a face), para torn-las um conjunto coerente e singular (as pginas miolo ou corpo), buscando atrair o leitor e ganhar dele a lealdade eterna (WERNECK et al, 2000, p. 123). No mesmo sentido, Samara afirma que a funo do designer editorial a mesma, independente do meio de publicao: envolver uma audincia em uma mensagem ou assunto por um perodo de tempo (SAMARA, 2005, p. 12). No meio digital esta afirmao no deixa de ser vlida, segundo Manoel Lemos, chief digital officer da editora Abril em entrevista para uma edio especial sobre revistas digitais do jornal Meio & Mensagem: o maior desafio [das revistas] o design de [um] produto para gerar experincia (PARENTE, 2013, p. 4). Experincia um termo comum ao meio digital que parece atualizar a ideia de envolvimento com contedo. Lemos ainda afirma que no se trata de adaptar um mesmo produto para uma nova telinha, mas de redesenh-lo para cada uma das plataformas (PARENTE, 2013, p. 4), reforando a posio estratgica do designer na implementao de revistas no meio digital. Cabe ressaltar que, trabalhando com o conceito de experincia do usurio, o designer participa do esforo para mobilizar e envolver a audincia.

    4 UNIVERSO DE ANLISE

    Foram escolhidas as 30 revistas com maior circulao mensal no ano 2012-2013, identificadas em pesquisa do Instituto Verificador de Circulao (IVC). Os nmeros de circulao referem-se apenas s revistas impressas pagas, ou seja, os dados de circulao dos artefatos digitais analisados no esto contabilizados nos

  • 5

    dados dessa pesquisa. A escolha do ndice restringiu a amostra a revistas que teriam maiores condies econmicas de investir em diferentes mdias para se manterem na liderana. Cabe mencionar que esses peridicos no so necessariamente concorrentes. As trs primeiras, Nova Escola, Claudia e Superinteressante, por exemplo, so lderes em seus respectivos segmentos temticos e destinam-se a pblicos diferentes.

    A partir dessa seleo, a pesquisa sobre os artefatos digitais foi feita com base no que estava declarado nos websites das revistas, websites das editoras, Google Play Store, iTunes Store, redes sociais e nas edies impressas. Em paralelo, buscou-se nos expedientes gerais e das revistas digitais informaes sobre a composio das equipes de trabalho destacando a presena do designer.

    Tabela 1. Maiores Circulaes: revistas mensais. Janeiro a agosto 2013-2012.

    Fonte: IVC Instituto Nacional de Verificao

    Disponvel em: . Acesso em 12 de abr. de 2014.

    4.1 Artefatos Digitais Na tabela 2, abaixo, foi estabelecida uma tipologia de artefatos segundo quatro

    categorias: a) revistas digitais compostas por artefatos que preservam similaridade de estruturao de informao e formatao de uso dos artefatos impressos (azul); b) website, o prprio portal de contedo e artefatos constituintes, que se destacam como outra mdia (roxo); c) redes sociais (vermelho); d) outros que no se configuram como grupo (marrom).

  • 6

    A tipologia est organizada com base em similaridades da entrega de contedo. Entretanto, os diferentes tipos de artefato se inter-relacionam, compartilhando matrias e apoiando-se mutuamente. Contedos da revista impressa, por exemplo, so publicados na edio para tablet, no website e, ainda, divulgados nas redes sociais. De outro modo, um vdeo publicado no youtube estar no canal de vdeos do website e na revista digital.

    Tabela 2. Tipos de artefatos digitais utilizados por revistas.

    Aplicativo (App) iPad App de revista para tablets iPad.

    App Tablet Android App de revista para tablets com sistema operacional Android.

    Navegador de internet Revistas digitais visualizadas atravs do navegador de internet.

    Portal de Contedo O website que centraliza a presena da marca na internet.

    Canal de vdeo Vdeos localizados em uma rea especfica do portal de contedo.

    Canal de jogos Tambm chamados newsgames, so desenvolvidos pela (ou para) a revista que tem relao com o tema e/ou contedo da revista. Localiza-se em uma rea especfica do portal de contedo.

    Podcast Um episdio de um programa de udio transmitido via internet.

    Redes sociais Facebook, Twitter, Google+, Instagram, LinkedIn, Pinterest, Youtube

    Apps Iphone Aplicativos para celulares iPhone.

    App Smartphone Android App de revista para Smartphones com sistema operacional Android.

    SMS Contedo via mensagens via Short Messaging Service.

    Newsletter Mala direta via e-mail

    Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa realizada. O grfico 1 apresenta os artefatos utilizados nas revistas segundo segundo a

    tipologia. Fica evidente que os websites e as redes sociais, artefatos nativos do ambiente digital, tm mais espao que as revistas digitais. O que percebemos, confirmando a afirmao do publisher da revista Trip, que a ideia de editora est mudando para uma produtora multimdia de contedo jornalstico. A revista desvincula-se do artefato impresso e passa a ser regida pela marca em seu segmento, periodicidade e pblico-leitor especficos.

    Os aplicativos para Android e iOS3 em geral so idnticos em contedo e configurao visual. A diferena est na tecnologia de desenvolvimento dos aplicativos de leitura: os Android so programados em linguagem Java e os iOS em Objective-C. No caso dos tablets, existem programas semi-automatizados que do conta da compatibilidade. Outra diferena est na publicao dos aplicativos. Quando publicada para dispositivos com iOS os aplicativos passam por um processo reviso baseados em um conjunto de critrios tcnicos, de contedo e de design (APPLE, 2014). Ao mesmo tempo que isso garante mais segurana aos aplicativos, pode ser visto como uma maneira de controlar a informao publicada. Por exemplo, a Apple possui restries a contedos erticos, impedindo a revista Playboy de ser publicada para Ipad, o que justifica a diferena numrica entre os dois artefatos.

    3 Sistema operacional do iPhone e do iPad.

  • 7

    Grfico 1. Artefatos digitais utilizados pelas revistas selecionadas.

    Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa realizada.

    O grfico 2 apresenta os totais de artefatos digitais, de revistas digitais e de

    websites, discriminados por marca. A primeira observao a partir do grfico 2 que no h uma diferena numrica significativa de artefatos empregados entre a revista de maior circulao e a trigsima. Registra-se uma oscilao ao longo da tabela entre 4 a 14 artefatos digitais e a mdia de 9,1 artefatos por marca. Salientamos que as revistas digitais e os websites no grfico concentram o trabalho de design nas editoras, enquanto as redes sociais no demandam designers e os outros no foram investigados pela baixa expresso numrica entre as revistas.

    Grfico 2. Totais de artefatos digitais, de revistas digitais e de websites,

    discriminados por marca (seguindo a ordem da tabela).

    Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa realizada.

  • 8

    4.2 Redaes e ncleos digitais Alm do levantamento dos artefatos digitais, foram averiguadas as funes

    declaradas nos expedientes das revistas selecionadas, com o intuito de estabelecer uma aproximao preliminar do lugar ocupado pelo design nas atuais equipes de edio de revista.

    Cada novo artefato lanado por uma marca demanda remodelao da estrutura de trabalho. A criao de ncleos especficos para atender mdias digitais traz ao jornalismo de revista novas carreiras, como as de analista de redes sociais, animador, desenvolvedor, diretor de estratgia digital, editor de tablet, webdesigner, webmaster, entre outras.

    Entretanto, o levantamento a partir do expediente no possibilita identificar exatamente as funes cobertas pelas novas denominaes profissionais. Nos ncleos digitais podemos perceber uma falta de padronizao das denominaes no contexto geral do universo de anlise, em contraste com a predominncia de funes consolidadas nas redaes: diretor de redao, editor, reprter, responsveis pelos textos; e diretor de arte, editor de arte e designer, responsveis pelo design.

    Os ncleos digitais tendem a manter essa estrutura organizacional valendo-se de denominaes que fazem alguma meno as mdias digitais referentes funo, ao meio de comunicao ou perfil. Listamos segundo a hierarquia estrutural: a) diretivas diretor criativo, diretor de inovao digital, diretor de convergncias; coordenador de interfaces digitais; gerente de interface digital, gerente de tecnologia digital; b) editoriais editor de mdias sociais, editor de mdias digitais; c) especficas ou subordinadas analista de redes sociais; animador; desenvolvedor; produtor multimdia; webdesigner; e webmaster.

    Quando a editora Globo denomina como diretor de inovao digital o responsvel pelo Ncleo de Inovao Digital, est enfatizando o carter de incerteza e experimentao frente ao campo recente que vem sendo explorando. Mesmo que esse diretor promova inovaes, primordialmente sua funo a de coordenar o ncleo digital. No mesmo ncleo existe um diretor de convergncias, referindo-se ao fenmeno ao qual Jenkins se refere como convergncia de cultura, que tornou-se um termo corrente na rea da comunicao. Eventualmente esses nomes mais parecem estar alinhados aos objetivos de marketing das editoras, demonstrando-se atuais e acompanhando tendncias, do que propostos para identificar funes de modo descritivo. Esta estratgia de afirmao de uma nova condio editorial se verifica tambm no oferecimento de produtos e servios. As revistas digitais para tablets, por exemplo, apresentam circulao ainda baixa e no cobrem a queda da circulao das revistas impressas. Todavia sua presena tambm estratgica: segundo pesquisa do IVC, revistas que no tm edio digital apresentaram queda de 3% a 4,4% em 2013 em relao ao ano anterior (A CIRCULAO, 2014). Marcar presena por meio de mdias digitais, portanto, alm de oferecer mais um servio de entrega de contedo tambm serve ao objetivo de valorizao da marca.

    A maior parte dos expedientes no faz meno s funes que atenderiam os respectivos artefatos digitais. Apesar dos canais de vdeos estarem presentes em 63% dos portais de contedo, nenhuma das revistas declarou em seu expediente qualquer funo relacionada produo de vdeos. Uma explicao para a questo se evidencia no caso da revista Voc S.A., integrante do ncleo digital e portal Exame.com, que recorre ao ncleo de vdeos da revista Exame.

  • 9

    Mas h, tambm, outras explicaes. Quando h um grande nmero de artefatos miditicos mas no so identificadas as funes respectivas, justifica-se a conjectura de que se busca uma reduo de custos. Isso pode ser observado a partir do que est explicitado nos expedientes. Entre as estratgias mais utilizadas podemos apontar: (1) acmulo de funes por profissional; (2) compartilhamento de profissionais entre ncleos e redaes; (3) mo de obra ainda sem registro profissional; (4) terceirizao para situaes especficas, evitando vnculos trabalhistas que resultem em encargos trabalhistas.

    No primeiro caso, por exemplo, os designers que integram as redaes passariam a editar tanto a edio impressa quanto a edio para tablet. No segundo caso, temos os ncleos digitais, responsveis pelo design dos portais de contedos, gerenciamento de redes sociais, entre outros. O ncleo e portal M de mulher congrega as revistas Claudia, Sade, Manequim, Nova, Mxima e Estilo de vida. No terceiro caso, verificamos o emprego de estagirios em funes que deveriam ser exercidas por profissionais. Por exemplo, na revista Mens Health so os estagirios que cumprem a funo de designer e de webmaster; j na revista Casa Claudia eles cuidam das redes sociais. No quarto caso observamos a terceirizao. O expediente da Playboy registra um nmero de colaboradores (29) por edio maior que o tamanho da redao (9) entre os quais profissionais de arte, ilustrao e produo de moda. Outro caso de terceirizao acontece na revista Planeta: a criao e manuteno dos portais de contedos das revistas e monitoramento das mdias sociais so terceirizados para uma agncia digital.

    Outro dado significativo o de que as revistas impressas empregam diretamente mais profissionais que todas as mdias digitais. O somatrio de todas redaes pesquisadas quase o dobro de profissionais que os ncleos digitais: 305 e 161, respectivamente. Se considerado apenas os designers, a diferena passa para o triplo entre aqueles que trabalham nas redaes (58) e nos ncleos digitais (17). O que se justifica porque muitos profissionais atuam em ncleos digitais que atendem mais de uma revista.

    4.3 Designer: denominaes e atribuies Para se referir, de modo geral, ao design existe o recurso a categorizaes

    correntes na rea editorial entre as quais aquelas de diretor de arte, vinda da propaganda, de editor de arte, do jornalismo, e de designer, que designa apenas o diagramador. Tradicionalmente o diretor de arte o responsvel pelo projeto grfico da revista; o editor de arte tem a funo de gerenciar o trabalho dos designers, de acompanhar o fluxo de envio de textos da edio para a arte e de fechamento dos arquivos para envio da grfica; e o designer que trabalha a diagramao responsvel pela diagramao da revista segundo orientaes do diretor e do editor de arte, assim como das direes geral e setoriais da revista.

    Estas atribuies no so fechadas e, apesar de recorrentes, variam de redao para redao de acordo com o perfil daqueles que gerenciam a equipe e das demandas de trabalho. Com a queda de circulao das revistas impressas, as editoras reduziram o nmero de profissionais nas redaes, tornando estas diferenas mais tnues.

    Sabemos, de modo no sistemtico, que o cargo do diretor de arte tende a ser ocupado por designers de formao. Entretanto, o projeto grfico em revistas tem uma de suas origens no campo publicitrio, o que explica o vnculo terminolgico do

  • 10

    meio. Foram os diretores de arte do campo publicitrio norte-americano que popularizaram a expresso design grfico para o layout de revistas a partir da dcada de 1930 (BRAGA, 2011, p. 12). Ironicamente, na hierarquia editorial o design corresponde funo mais subalterna, referindo-se ao trabalho de criao com nfase tcnica e executiva, enquanto ao diretor de arte caberiam as diretrizes projetuais do artefato.

    A seguir sero destacados aspectos da apresentao das equipes em relao presena do designer e suas relaes entre as demais funes.

    Antes restrito s atribuies grficas, como as de diretor de arte, editor de arte, diagramador, ilustrador e infografista, hoje h espao para outras habilitaes: designer de interao, designer audiovisual e designer de jogos. A revista Casa & Jardim, por exemplo, declara em seu expediente um coordenador de interfaces digitais, j na Superinteressante consta um profissional responsvel pela animao.

    O designer destaca-se tanto nas redaes quanto nos ncleos digitais como podemos observar nas tabelas 3 e 4. Nas redaes, as denominaes de designer, editor de arte e diretor de arte esto entre as cinco mais recorrentes nos expedientes das revistas em relao a outras denominaes, assim como nos ncleos digitais o editor de arte, o designer e o webdesigner4. Tabela 3 Denominaes mais recorrentes nos expedientes das redaes

    Designer Editor Diretor de redao

    Editor de arte

    Diretor de arte

    Ocorrncia 90% 80% 63% 57% 50%

    Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa realizada.

    Tabela 4 Denominaes mais recorrentes nos expedientes dos ncleos digitais

    Editor Reprter Webmaster Editor assistente, Editor arte, designer e webdesigner

    Estagirios

    Ocorrncia 86% 57% 43% 36% 29%

    Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa realizada. O menor nmero de diretores de arte em relao a designers nas redaes e a

    ausncia desta funo nos ncleos digitais podem indicar uma tendncia da sua substituio por outras funes que atendam s necessidades e protocolos do meio (tabela 3). Nas mdias digitais, em geral as categorias experincia do usurio, interface, interao e web, so mais corriqueiras do que direo de arte.

    Nas redaes o termo diretor de arte substitudo em trs revistas: na revista Autoesporte a titulao atualizada para atender as mdias digitais passando a ser diretor de design multiplataforma; na revista Casa Claudia a funo chamada de coordenadora de arte; e na revista Planeta h uma inverso das funes, o diretor de arte est abaixo de um supervisor de arte e no constam editores de arte e designers. A ausncia de diretores de arte nas revistas que integram o ncleo digital e portal M

    4 Foram encontradas as duas denominaes dentro dos ncleos digitais. Especulamos que

    podem no indicar funes diferentes, mas inconsistncias nominativas.

  • 11

    de Mulher justifica-se na presena de uma diretora geral para o ncleo todo denominada diretora criativa.

    5 CONSIDERAES FINAIS

    A partir desta pesquisa foi possvel observarmos trs situaes que vm acontecendo face s reestruturaes das editoras para acomodar os artefatos digitais. A primeira, a partir da visualizao do amplo espectro de artefatos digitais organizados segundo tipologia proposta, indica a tendncia de editoras tornarem-se produtoras de contedo multimdia, direcionadas pela identidade de marca e no mais especificamente pelo vnculo com o artefato impresso apesar desse ainda ser o principal produto.

    Se na revista tradicional o engajamento com o pblico era feito atravs do contedo e da identidade visual da revista, no meio digital existem ainda outras maneiras de estabelecer essa aproximao, que envolvem a fragmentao, disperso e simultaneidade desses contedos entre artefatos impressos e digitais. O resultado uma ampliao do nmero de funes, pedindo reformulaes/otimizaes dos quadros funcionais.

    De acordo com a segunda, ao compararmos os artefatos digitais com as funes declaradas nos expedientes identificamos os modos de organizao dos ncleos para gerenciar esses artefatos. E tambm uma diferenciao quanto denominao de funes nos ncleos digitais, caracterizando tanto uma presena ainda no consolidada quanto uma inteno de se apresentar de um modo tecnicamente atualizado.

    A relao intensa com o pblico leitor e a constante atualizao desse vnculo so potencializadas pelas mdias digitais. A crescente migrao de leitores que buscam informaes nas mdias digitais e a constante queda na tiragem dos impressos so sintomas das mudanas tecnolgicas, econmicas e culturais que impactam a rea da comunicao. E essa dinmica passa a fazer parte da operao das editoras, levando-as a reestruturaes em seus modelos de negcios e em seus quadros funcionais.

    Por fim, a terceira diz respeito posio dos designers nas redaes e ncleos digitais. Esses profissionais destacam-se entre os mais presentes nas duas reas, reforando a sua importncia para as editoras. Ainda que no revelados nos expedientes, podemos citar a formao de novas equipes para auxiliar a produo de artefatos digitais. A editora Abril possui uma equipe formada por designers exclusivamente para edio dos tablets, assim como uma equipe de teste, suporte e treinamento de revistas digitais tambm formada por designers e programadores.

    Outro aspecto observado foi um menor nmero de diretores de arte em relao a designers nas redaes; e tambm a ausncia da funo nos ncleos digitais, que recorrem a denominaes genricas ou mais adequadas a um cenrio multimdia. Cabe ressaltar que somente a partir do expediente no possvel precisar os antecedentes e nem as causas dessa situao, cabendo investigao mais aprofundada valendo-se de outros mtodos de pesquisa.

    Independente do estado econmico e organizacional das editoras, o designer parte fundamental tanto para as redaes quanto para os ncleos digitais. Quando essas mudanas colocam em xeque a prpria noo tradicional de revista que ressignificada em um contexto de carter plural isso demonstra, numa viso positiva,

  • 12

    um novo campo de possibilidades que se abre tanto para novos equacionamentos da forma revista, quanto para novos desenhos de suas equipes de realizao.

    REFERNCIAS A CIRCULAO de revistas digitais cresceu 5,8% no segundo semestre aponta IVC. Jornal Folha de S. Paulo. So Paulo, 20 de abr. de 2014. Disponvel em:

    . Acesso em 12 de ago. 2014.

    APPLE Developer. Disponvel em: . Acesso em 27 de abr. de 2014.

    ARAJO, Silvia Amlia de. Rotinas produtivas em revista: padres e transformaes no fazer de uma publicao segmentada. In: TAVARES, Frederico de Mello B. ; SCHWAAB, Tavares (Orgs.). A revista e seu jornalismo. Porto Alegre: Penso, 2013.

    BRAGA, Marcos da Costa da. O papel Social do Design grfico. So Paulo: Editora Senac, 2011.

    COHN, Sergio. Revistas de inveno: 100 revistas de cultura do modernismo ao sculo XXI. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2011.

    GRUSZYNSKI, Ana C.; CALZA, Mrlon U.. Projeto grfico: a forma de um conceito editorial. In: TAVARES, Frederico de Mello B. ; SCHWAAB, Tavares (Orgs.). A revista e seu jornalismo. Porto Alegre: Penso, 2013.

    JENKINS, Henry. Convergence culture: Where Old and New Media Collide. New York: New York University Press, 2006.

    MARTINS, Ana Luiza. Revista em revista. So Paulo: EDUSP, 2001.

    PARENTE, Edianez. Mobilidade em Pauta. In: Especial Revistas: mobile magazines. So Paulo: Jornal Meio & Mensagem, set. 2013.

    _______, Edianez. O choque do futuro: comportamento e customizadas. In: Especial Revistas: mobile magazines. So Paulo: Jornal Meio & Mensagem, set. 2013.

    STORCH, Laura. Revista e leitura: Sujeitos e interao. In: TAVARES, Frederico de Mello B. ; SCHWAAB, Tavares (Orgs.). A revista e seu jornalismo. Porto Alegre: Penso, 2013.

    TAVARES, Frederico de Mello B.; SCHWAAB, Reges. Revista e comunicao: percursos, lgicas e circuitos In: TAVARES, Frederico de Mello B.; SCHWAAB, Tavares (Orgs.). A revista e seu jornalismo. Porto Alegre: Penso, 2013.

    VOGEL, Daisi. Revista e contemporaneidade: imagens, montagens e suas anacronias. In: TAVARES, Frederico de Mello B.; SCHWAAB, Tavares (Orgs.). A revista e seu jornalismo. Porto Alegre: Penso, 2013.

    WERNECK, Humberto et al. Revistas no Brasil. So Paulo: Editora Abril, 2000.