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PÁG. 15 BARRA DO KWANZA CANDONGUEIRO COM WI-FI PÁGS. 13 | 14 HISTÓRIA A HUMANIDADE E A GUERRA 15 a 28 de Agosto de 2016 | Nº 115 | Ano V Director: José Luís Mendonça Kz 50,00 10 ANOS DE MESO MUMPASI ARTES PÁG. 7 ARTISTA DO MOSAICO E DA PINTURA ARDENTE

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PÁG. 15BARRA DO KWANZA

CANDONGUEIRO COM WI-FIPÁGS. 13 | 14HISTÓRIA

A HUMANIDADE E A GUERRA

15 a 28 de Agosto de 2016 | Nº 115 | Ano V • Director: José Luís Mendonça • Kz 50,00

10 ANOS DE MESO MUMPASI

ARTES PÁG. 7

ARTISTA DO MOSAICO E DA PINTURA ARDENTE

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2 | ARTE POÉTICA 15 a 28 de Agosto de 2016 | Cultura

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Nº 115 /Ano V/ 15 a 28 de Agosto de 2016

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Director e Editor-chefe:José Luís MendonçaSecretária:Ilda RosaAssistente Editorial:Coimbra Adolfo (Matadi Makola)Fotografia:Paulino Damião (Cinquenta)Arte e Paginação:Sandu CaleiaJorge de SousaAlberto Bumba Sócrates SimónsEdição online: Adão de Sousa

Colaboram neste número:

Angola: Adriano de Melo, Lito Silva, Luefe Khayari, Miguel Júnior

Moçambique: Dany Wambire

Brasil: Ana Maria Lucas, Zé da Luz

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O jornal Cultura aceita para publicação artigos literário-científicos e re-censões bibliográficas. Os manuscritos apresentados devem ser originais.Todos os autores que apresentarem os seus artigos para publicação aojornal Cultura assumem o compromisso de não apresentar esses mesmosartigos a outros órgãos. Após análise do Conselho Editorial, as contribui-ções serão avaliadas e, em caso de não publicação, os pareceres serãocomunicados aos autores.

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AS FLÔ DE PUXINANÃ(paródia de 'As Flô de Gerematáia', de Napoleão Menezes) Três muié ou três irmã,Três cachorra da molesta,Eu vi num dia de festa,No lugar Puxinanã.A mais véia, a mais robustaEra mesmo uma tentação!Mimosa flô do sertãoQue o povo chamava Ogusta.A segunda, a Guléimina,Tinha uns ói que ô! maldição!Matava qualquer cristãoOs oiá dessa menina.Os ói dela pareciaDuas estrela tremendo,Se apagando e se acendendoEm noite de ventania.A terceira, era Maroca.Com um corpo muito malfeito.Mas porém, tinha nos peitoDois cuzcuz de mandioca.Dois cuzcuz que, por capricho,Quando ela passou por eu,Minhas venta se acendeuCom o cheiro vindo dos bicho.Eu inté me atrapaiava,Sem saber das três irmãQue eu vi em Puxinanã,Qual era a que me agradava.Escolhendo a minha cruzPra sair desse embaraço,Desejei morrer nos braços,Da dona dos dois cuzcuz!_________________________Zé da Luz é o nome artístico de Severino de Andrade Silva, poeta popular brasileiro nascido em Itabaiana - Paraíba, em 1904, e falecido em 1965.

POEMA DE ZÉ DA LUZ

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A Dança da Chuva de Fragata deMorais abre com uma epígrafe de Mi-chel Foulcault que questiona o concei-to de ficção: “A ficção consiste não emfazer ver o invisível, mas fazer ver atéque ponto é invisível a invisibilidadedo invisível”. Como a ilustrar esta defi-nição, o incipit do ivro apresenta nos adescrição da Rua da Vaidade, que“sempre fora a mais curta e desalinha-da daquele bairro de Luanda”. A ausên-cia de passeios, as “poças de água malcheirosa”, “a imundice acumulada” etodos os factores que, por anticatásta-se, justificam ironicamente o nome deRua da Vaidade, são elementos que nospermitem mergulhar na ficção, isto é,que nos podem levar a “ver até queponto é invisível a invisibilidade do in-visível”. O aliciamento ao mergulho naficção ou, melhor, na compreensão doque é a ficção, pela leitura do livro quetemos em mãos, torna se claro quando,a propósito da Rua da Vaidade, o narra-dor faz uma afirmação, aparentementedespropositada, sobre livros: “Muitoshá, que julgam o livro pela capa osten-tosa que o encerra.”

O paralelismo inesperado entre osentimento dos moradores da rua,que a conhecem por dentro, e o julga-mento dos leitores marca o apelo àleitura que permite conhecer o livropor dentro, saber o que está para láda capa, sem descentrar, no entanto,a nossa atenção da rua, objecto da fo-calização interna de um narrador to-talmente obcecado pelo lugar e, so-bretudo, por uma “casa que destoavacompletamente do resto por ter umprimeiro andar, rachado e de cor im-precisa, com janelas de madeirameio apodrecidas.”A subjectividade da focalização in-terna, centrada no narrador, evidencianão o que personagem vê, mas o quealcança por outros sentidos que estãopara além da visão, incluindo o que éobjecto de reflexão interiorizada. Talcomo acontece com a Rua da Vaidade ecom os livros, não é o aspecto exteriorda casa que seduz o narrador nem oque os outros dizem dela. A seduçãoque a casa exerce sobre o narradordeve se ao que está dentro dela, ao cha-mamento da música que dela sai e que,

ao que parece, só ele consegue cap-tar: “Uma vez parei à sua frente para aobservar, tinha uma luz interna ace-sa, todavia não distinguia gente amovimentar se no interior. Retribui -me o olhar, quase com desdém, senti.Olhava para mim pelas duas janelasentreabertas, estática,1 Fragata de Morais, A Dança da Chuva, Luanda, UEA, 2016como natureza morta que algumpintor macambúzio tivesse transferi-do para uma tela amarelenta e perce-bi que cantava. Escutei e não tive amenor dúvida, cantava, não com pala-vras, mascom o soar melódico do ran-ger das tábuas e dobradiças podresdas janelas, produzindo uma melodiaestranha que se fazia ouvir pela ruaadentro, e que ninguém parecia ligar.Com o carro parado à berma do pas-seio, motor desligado, baixei as jane-las e escutei hirto, não fosse espantaro vento, esse fantasma compositor emaestro que regia tão bela sinfonia.Era um estranho fluir de sonoridades,tanto ressoava um violino pela chami-né esburacada, como um oboé no ran-ger das dobradiças enferrujadas, se-guido da bateria no agreste bater dasjanelas agora abrindo e fechando se,finalizando com os graves de contra-baixo dos portões enferrujados a on-dear para trás e para afrente numabre e fecha sereno. Quem produziaeste pranto musical que suavizava aputrefacção à volta? É verdade quequem canta seus males espanta, per-cebi.” (pp.16 17)A personificação da casa que “retri-bui o olhar” do sujeito e a melodia queentoa marcam a sedução que exercesobre alguém que se sente inferiori-zado por não conseguir captar os me-canismos de transfiguração do realocultos “no pranto musical” saído dacasa. O “pranto” justifica a necessida-de e urgência do desvendamento,mas o “desdém” no olhar da casamostra a incapacidade que o sujeito“sente” em desvendar e captar o “es-tranho fluir de sonoridades”, capazde “suavizar a putrefacção à volta”. Acasa “cantava, não com palavras” mascom um “estranho fluir de sonorida-des” em que o narrador se deixa emo-cionalmente envolver para desven-dar e verbalizar, isto é, para transfor-mar em palavras. Esta constataçãoleva nos, de novo, a estabelecer o pa-ralelismo entre o desvendamento doque se passa na Rua da Vaidade e oque acontece nas páginas do livro quenão podemos julgar pela capa.O desvendamento da ficção passapela metaficção, isto é, pela com-preensão dos mecanismos que sus-tentam a construção de um universofictício. O percurso na escrita, e tam-bém da leitura, é metaforizado pelo

caminho feito pelo narrador na Ruada Vaidade em que o prazer da desco-berta é orientado por dificuldades quesó o conhecimento consegue tornear:“Achei que, quando por ela passava,me atapetava o caminho por entre oscharcos, me revelava os buracos -armadilhas de suas entranhas, e ofere-cia belas ratazanas para me serviremde guia, as mais eficientes funcioná-rias de um protocolo profissional, es-beltas e longilíneas, de guincharescurtos, vem por aqui, cuidado comaquela água ali, salta esta pedra,cautela não tropeces.”(p.16). As ratazanas esburacam a terra,conhecem na por dentro, daí a pertinên-cia do seu papel de guias do narrador.A casa, espaço da sedução, revela -se como o lugar capaz de albergar ouniverso fictício que o sujeito tentacaptar na música encantatória quedela se desprende. A música, em ge-ral associada à plenitude da vida cós-mica, aparece, neste contexto, comoum canto de sedução, um chama-mento contínuo para a entrada numespaço do risco simultaneamentedesejado e temido.Longe da Rua da Vaidade, no apar-tamento no centro da cidade, onde onarrador vive, a música continua o jo-go de sedução: “Pareceu me ouvir umnovo sopro, uma nova nota de angús-tia no toque do clarinete, desta vezvindo da cozinha.” (p.25) e “Pé ante pé,não fosse espantar músico, fantasmaou não, ouvido afinado, fui andandopela casa e em todos os pontos em queestive sentia me rodeado pela melodiaténue, como se estivesse fechado den-tro de um ovo. Não havia um ponto es-pecial de onde dimanava, estava emtodo o apartamento, dentro da roupaque vesti, no fundo do copo vazio dabebida, suave, insinuante, às vezes umviolino de Mozart, outras o deleitososaxofone do Nanuto, sempre muitosuave, quase inaudível, mas nunca merevelando a proveniência.” (p. 53)A música esconde as palavras ne-cessárias para criar o universo fictí-cio que o sujeito persegue, como ex-plica a personagem Durango: – “Oque julga ser música, é o seu bisavô atentar entrar em contacto consigo,por isso lhe pareceu como vinda doalém, muito ténue. (…) Então enten-derá as palavras camufladas comomúsica, (…)”( p.65).A procura das palavras e, por exten-

LETRAS | 3Cultura | 15 a 28 de Agosto de 2016O PROCESSO DE METAFICÇÃO NO ROMANCE

A DANÇA DA CHUVA, DE FRAGATA DE MORAIS

ANA MARIA LUCAS

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4 | LeTRas 15 a 28 de Agosto de 2016 | Cultura

são, a procura do processo de criaçãoliterária “camuflado como música”aparecem como elementos da meta-ficção reveladores do próprio proces-so da escrita do romance. A suspeiçãoda máscara do narrador, que escondeo escritor atrás do jornalista,evidencia se pelo sentimento que ma-nifesta no primeiro encontro com Seli-na, uma amiga com quem comparti-lhou a infância e as primeiras expe-riências amorosas em Vila Nova e quereencontra, por acaso, em Luanda. Emvez da alegria de encontrar uma ami-ga, deparamos com a frieza do narra-dor que manifesta a sua curiosidadepela história da amiga, como possívelenredo de um livro.“O meu faro, o instinto de caça, co-meçava a fazer me sentir que havia emSelina uma história algures que medaria uma boa matéria, um livro até,por que não? Há muito que desejavaaventurar me na literatura, corria emparalelo à minha profissão, emboranem todo o jornalista fosse um bomescritor em potencial. Tinha a certezade que não passara a vida toda a lersem que disso não colhesse fruto, pos-suía uma sólida cultura geral e escritaera me um verdadeiro prazer. Num fu-turo próximo abraçaria esse almejo etransformá lo ia em realidade. (p.35)A posição do narrador que assumetornar se escritor “num futuro próxi-mo”, o interesse pela história de Selinalevantam suspeitas mas, sobretudo, ofacto de o narrador a levar exactamen-te à casa que o fascina na Rua da Vaida-de, porque é lá que ela mora, faz nosdesconfiar da coincidência e agrava anossa suspeição sobre o narrador.Como diz Linda Hutcheon2, a meta-ficção pretende que o leitor participeda produção e da recepção do texto eessa é uma marca de modernidadeneste livro de Fragata de Morais. Acoincidência da morada, a excentrici-

dade de Selina reflectida nas atitudesviolentas e na decoração do espaçoque habita com bonecos decepados eum gato que come O cão e os Calus dePepetela, são elementos suspeitos quenos fazem ver Selina como uma perso-nagem de papel colocada pelo narra-dor num cenário previamente escolhi-do. As nossas suspeitas aumentamquando, no final do livro, somos con-frontados com mais coincidências, aoencontramos Durango, o médium quepretende ajudar o narrador, no cená-rio da casa da Rua da Vaidade e fica-mos a saber que, afinal, é ele o ex mari-do de Selina, o mesmo com quem elatinha zangas que escandalizavam osvizinhos. A metaficção centra se nonarrador/ autor enquanto criador douniverso diegético, no acto da escritaem si mesma, permitindo ao leitoracompanhar o processo de criação.Na sequência da epígrafe inicial deMichel Foucault, que já referimos,aparecem, no início de outros capítu-los, mais epígrafes com reflexões so-bre a criação literária que questionamconceitos relacionados com a verda-de e a veromilhança, a visibilidade e ainvisibilidade. Nesse sentido, as epí-grafes também são elementos da me-taficção, como acontece no capítuloquinto que é precedido desta epí-grafe do escritor português VergílioFerreira : “O Fantástico não está forado real,/ mas no sítio do real que detão visível não se vê.”A escrita é uma ferramenta de auto-conhecimento. O encontro do narra-dor com Selina permite o regresso aopassado, ao mundo da infância vividaem Vila Nova, ao reviver de experiên-cias ligadas ao imaginário popular co-mo o bungulamento do gato Zacarias eoutras crenças africanas que funcio-nam como lastro cultural da formaçãodo narrador. O contacto com JovelinoDurango, o médium seguidor da dou-

trina espírita, possibilitou ao narra-dor um recuo de dezasseis anos notempo e o regresso a Luanda do passa-do. Também lhe permitiu conhecer vi-das anteriores, em que encarnou ou-tras personagens, e a dança da chuvaque se instalou no seu quarto levou-oao encontro afectivo com os seus ante-passados: "Só quando distingui os rostos do meu país, pri-meiramente, da minha vó Nduva, emseguida, depois da minha mãe e domeu bisavô Palaia Sinkilile, entendique cada gota de água era a revelação _____________________________________2 Linda Hutcheon, Narcissistic

Narrative: The Metafictional Para-dox, Nova York, Routledge, 1985.de um familiar vivo, ou de um ante-passado, que me saudavam em reco-nhecimento. (…) Não sei quantas ho-ras permaneci nessa dança da chuva,quantos antepassados revi, quantosmilénios de formas desfilaram ao afa-go de minhas mãos transparentes,talvez toda a história de África me te-nha sido revelada.”O bisavô Palaia Sinkilile que saiu doquadro da parede da sala, a cubata, osarbustos que ocuparam o quarto dedormir, transformando o num cenárioafricano, presentificam as raízes dosujeito que levam ao autoconheci-mento. A escrita é um acto solitário deautoconhecimento e, disso tem cons-ciência o narrador quando diz: “A soli-dão, quando voluntária, é uma expe-riência edificante, leva nos a um diálo-go interno que nos obriga ao conheci-mento do eu. É quase como um pro-cesso de libertação, pelo desnudar dosrevestimentos que somos forçados aportar na sociedade. (p.183).A capacidade de observação, a objec-tividade, qualidades inerentes à profis-são do narrador, que é jornalista, são,

neste romance, suplantadas pelas diva-gações procedentes da sua imaginaçãocriadora e pela subjectividade, caracte-rísticas próprias dos escritores. É o queacontece, por exemplo, quando o nar-rador imagina a personagem Durango,antes de a conhecer: “Após o banho, fizum café com leite e duas torradas parapoder tornar o pão velho em algo tragá-vel e preparei me para arrancar para ojornal e ao encontro de Durango, nomepor certo tirado por seu pai de um filmeantigo de caubóis. Enquanto comia,comecei a antevê lo num alazão ma-lhado, chapéu preto meio enterradona testa, alto e magro. Winchester namão direita, em galope desenfreadopelas pradarias a caçar peles verme-lhas e bisontes. (p 57).Esta imaginação criativa leva nos asuspeitar do narrador que ora descre-ve ora põe em causa aquilo que vê, quereconhece as potencialidades criati-vas da sua imaginação, que nos con-funde e clarifica quando nos arrastapara a metaficção. Intensificando asnossas suspeitas, são recorrentes noromance as divagações do narradorsobre a verdade e a mentira dos factos,sobre a possibilidade de transfigura-ção do real provocada pelo gim, pelosonho ou pelo processo de criação li-terária que os elementos da metafic-ção nos permitem compreender. É oque acontece, por exemplo, no capítu-lo quinto em que a dança da chuvaocorre no sonho, mas deixa vestígiosde água no quarto de dormir. Instaladaa desconfiança que nos leva a nãodistinguir o que resulta ou não daimaginação do narrador, a confundirdiferentes níveis diegéticos, a mistu-rar o espaço do narrador com o das personagenseventualmente criadas por ele, pode-mos ver a carta de Lucira Boanova (vi-zinha do quinto bê), que encerra o ro-mance, como mais uma manifestaçãodo espírito criativo do narrador que jáantes tinha confessado que, depois debeber alguns copos de gim, imaginavaque ela lhe caía no colo, “entre caríciaseróticas e juras de amor eterno”.(p.49). Neste processo de metaficção,o mais provável é que a “carta da vizi-nha do quinto b” constitua o pretextopara começar nova narrativa ficcional,ironicamente anunciada pelo nomeda personagem (Boanova). A que seiniciou na Rua da Vaidade, depois deesventrada e compreendida pelo pro-cesso de metaficção do romance, fazjus ao nome, quando permite que a lei-tura do texto nos conduza ao desven-damento do percurso brilhante da es-crita na criação de universosfictícios.20 de Junho de 2016____________________Ana Maria Lucas é natural do Lu-

bango e lecciona em Portugal), na Fa-culdade de Letras da Universidade deLisboa. Formada em Filologia Români-ca; Mestrado em Literatura Francesa.

Fragata de Morais

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ADRIANO DE MELOArte e conhecimento são as duas pa-lavras para definir a segunda edição doprojecto “Transbordar da Mente”, quemostrou a habilidade dos jovens cria-dores angolanos, particularmente paraa criação poética, e consagrou IsvaniaFarinha como a melhor.A adolescente, de 17 anos, que estáfiliada ao movimento literário Lev’Ar-te, há um ano, provou, não só ao júri,mas também ao público, o interessedos jovens pela arte poética. Os aplau-sos da maioria das pessoas, que assis-tiram ao concurso no Camões - CentroCultural Português, foi o outro teste-munho do desempenho da sua estreianum concurso do género.Criatividade, desempenho e espon-taneidade em palco foram os detalhesque deram a Isvania Farinha o títulode melhor criadora do concurso depoesia em estilo livre. Apesar da di-versificação de temas, a maioria liga-dos a essência da própria poesia, o jú-ri, presidido por Jomo Fortunato, re-conheceu que a vencedora soube ex-plorar, no jogo métrico de palavras, oespírito do concurso.A disputa que contou com a partici-pação de dez candidatos teve AdrianaBorboleta, como segunda classificada,e Ginguba, pseudónimo de MarcosKingondo, como o terceiro. Além des-tes disputaram o título deste ano Antó-nio Paciência, M’banza José, Elizangela

André, Miguel Bembé, Pedro Belgio,Paulo Moyo e Ismael Farinha, todosprovenientes de vários movimentosculturais de Luanda.Poesia, amor, dor, água, vida, ale-gria, mar, mulher, olhar e música fo-ram os temas eleitos pelo júri, para ca-da um dos candidatos criar versos, apartir destas palavras. A maioria doscandidatos conseguiu, o que demons-trou o quanto a poesia está a ganharespaço entre estes, principalmente

com o surgimento da Mediateca, umespaço de leitura de muitos jovens, li-gados ou não aos movimentos literá-rios da capital. Embora ainda não te-nha a abrangência necessária em ter-mos de candidatos, por se limitar so-mente a cidade capital, “Transbordarda Mente” provou ser um bom exercícioà mente dos jovens e um ponto de refe-rência entre as actividades culturais,pelo número de pessoas que foram aoCamões - Centro Cultural Português.

O concurso, criado numa parceriaentre o Movimento de Arte e CulturaArmindo Paím e o Camões - CentroCultural Português, é um incentivo àcriação artística e tem como “alvo”os artistas emergentes da nova gera-ção. “Transbordar da Mente” temuma periodicidade anual. Actualmente, além de “Transbor-dar da Mente”, o Movimento de Arte eCultura Armindo Paím está a prepa-rar o “ArteConfusão”, um projecto cul-tural que junta diversos géneros dearte num único espaço. Tal como dis-se o seu mentor, Armindo Paím, éuma oportunidade a todos os jovenscriadores angolanos.O “ArteConfusão”, que também jávai na sua segunda edição e no mo-mento não tem uma data confirmada,tem sido uma porta aberta aos jovenstalentos da capital, em especial os quedificilmente têm uma possibilidade demostrar o seu potencial.O Movimento de Arte e Cultura Ar-mindo Paím existe a dois anos e temcomo objectivo principal a promoçãoda cultura angolana , especialmentena vertente da poesia, música, artesplásticas e literatura. Actualmente,devido o crescente número de jovensque procuram aumentar os seus co-nhecimentos, a organização tem cria-dos projectos interactivos, com o in-tuito de aproximar mais os jovens dasartes, encontrar talentos e contribuirpara a cultura nacional.

Argentino nascido em Rosário,Província de Santa Fé em 14 de Junhode 1928, Ernesto Che Guevara fez dasua vida uma das maiores contribui-ções para a libertação dos povos daAmérica latina e do mundo. Agora, aUNESCO - Organização das NaçõesUnidas para Educação, Ciência e Cul-tura, reconhece os escritos do revo-lucionário como Património da Hu-manidade. Os documentos foram in-cluídos no Programa de Memória doMundo. Este programa que possui noseu registo 299 documentos e colec-ções dos cinco continentes, contaagora com 431 manuscritos do Che,567 documentos sobre sua vida eobra, assim como uma selecção demateriais iconográficos, cinemato-gráficos, cartográficos e objectos pa-ra museu. Para Juan António Fernan-dez, presidente da Comissão Nacio-nal Cubana da UNESCO, esta decisãoreconhece a “contribuição do Che aopensamento revolucionário latino-americano e mundial, que o conver-

teram em símbolo de rebeldia, de li-bertação e internacionalismo”.Um internacionalistaO exemplo do guerrilheiro heróicoultrapassa as barreiras do tempo e atéhoje inspira os revolucionários do mun-do. Che, como era carinhosamente cha-mado entre os guerrilheiros do movi-mento 26 de Julho, ficou conhecido porutilizar as suas próprias atitudes parademonstrar como deve se comportarum revolucionário frente a diversas si-tuações, seja da vida quotidiana, seja nafrente de combate. Ernesto nunca se re-cusava a uma tarefa e defendia que umrevolucionário deve estar onde a revo-lução necessita. Enquanto Ministro daIndústria foi um grande entusiasta dotrabalho voluntário como emulação co-munista, ele próprio se dedicou duran-te anos ao trabalho voluntário na pro-dução, uma vez por semana.Sobretudo, Che era um internaciona-lista e após cumprir com as suas tarefas

em Cuba, foi construir a revolução nomundo. Passando pela África, e por fimvoltando à América Latina, o guerrilhei-ro foi assassinado na Bolívia sob orien-tação e com o apoio da CIA em 9 de Ou-tubro de 1967. Ainda assim, Che vivenas lutas dos povos do mundo para se li-bertarem da opressão. As suas ideiasestão mais vivas do que nunca. O seuexemplo arrasta milhões todos os anospara as lutas. Sobre Che não há melho-res palavras do que as do seu amigo ecamarada Fidel quando diz: “Se quere-mos um modelo de homem, um modelode homem que não pertence a este tem-po, um modelo de homem que pertenceao futuro, de coração, digo que esse mo-delo, sem uma mancha em sua conduta,sem uma só mancha em suas atitudes,sem uma só mancha em sua actuação,esse modelo é Che! Se queremos ex-pressar como desejamos que sejamnossos filhos, devemos dizer com todoo coração de veementes revolucioná-rios: queremos que sejam como Che!”sete dias antes, 1 de Julho.

UNESCO RECONHECE ESCRITOS DE CHE GUEVARACOMO PATRIMÓNIO DA HUMANIDADE

CONCURSO “TRANSBORDAR DA MENTE”JOVENS MOSTRAM INTERESSE PELA POESIA

Ginguba foi um dos jovens candidatos ao título de melhor criador desta edição do concurso artístico

LETRAS | 5Cultura | 15 a 28 de Agosto de 2016

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6 | LETRAS 15 a 28 de Agosto de 2016 | Cultura

DANY WAMBIRE

Passou a ser frequente o Movimen-to Literário Kuphaluxa colocar à mes-ma ‘mesa literária’ escritores firma-dos e jovens aspirantes à carreira deescritor. O objectivo é fazer com que ogrupo conheça as ferramentas para aconstrução consciente do texto.Comungando deste objectivo, o es-critor Carlos dos Santos levou a sua‘receita’ de escrita, a 6 de Julho, paraos inúmeros jovens que o aguarda-vam no Centro Cultural Brasil-Mo-çambique. Sem demoras, disse o queera necessário para que o trabalhoperdurasse no tempo. “É necessáriodominar as técnicas de escrita”, exer-cício que exige trabalho árduo, “ras-cunhos e rascunhos”.Desengane-se quem pense que co-nhecendo técnicas de escrita, já se po-de tornar um escritor. Dos Santos dámais tarefa: “ler livros, dezenas deles,centenas deles”, perscrutando sem-pre “as técnicas que são utilizadas pe-los autores”.A observância das técnicas da escri-ta nos nossos dias parece uma utopia,pois, segundo Dos Santos, assiste-se aum imparável movimento que pre-meia “a cultura do vale tudo”.“Os apologistas desta abordagemem vez de se preocuparem em estudare trabalhar para corrigirem os erros,

para fazerem bem, para fazerem cadavez melhor, escolhem não se esforça-rem e, em vez disso, tratam de justifi-car o que fazem mal com diferenças elimitações supostamente resultantesdos contextos socioculturais nacio-nais”, acrescenta.Mais adiante, o nosso orador cha-ma a atenção para a necessidade de serecusar o trabalho fácil, medíocre,consequência da preguiça. “Ninguémnasce medíocre”, avisa. E aos que pre-tendem acreditar no trabalho paraelevar a qualidade da sua escrita, DosSantos exige vigilância, pois os ‘me-díocres’ “não querem afundar-se so-zinhos nas suas matérias fecais. Que-rem companhia”.“Elas [as apologias] são embustesdaqueles que, não se achando capa-zes de se elevarem até ao nível ondeos outros estão, tentam puxar parabaixo aqueles que se esforçam e cres-cem”, reforça.O conhecimento das técnicas de es-crita e o reconhecimento do trabalhoconstante não são tudo, são apenasum meio caminho andado. “O conhe-cimento sobre as técnicas não faz umescritor”, recorda o orador, paraquem este saber pode, pelo menos,ajudar a fazer alguma coisa: “um lin-guista, um analista, um revisor de tex-tos escritos, todos eles têm talentosimprescindíveis”.

Para se ser escritor, é fundamental“ter predisposições que criam umasensibilidade particular, uma maneiraprópria de ver o mundo e de o descre-ver.” Portanto, para Dos Santos, é men-tira que “qualquer pessoa que podeser escritor”. É preciso ter “vocação”.Ainda há mais. Depois das ‘técni-cas’, do ‘trabalho’, da ‘vocação’, vêm asvivências, fundamentais para a pro-dução de conteúdo de qualidade, vis-to que, de acordo com Dos Santos, oconhecimento das técnicas e a capa-cidade de usá-las não geram nenhumproduto. “Aquilo que se escreve temde tocar, de interessar a quem lê”,aconselha.O nosso orador vai mais longe elança farpas a alguns autores mo-çambicanos, que passam o tempo to-do a fazerem ‘transcrição’ de contostradicionais, afugentando, desta for-ma, os leitores.“Muita da literatura infantil publi-cada em Moçambique é, de facto, a me-ra transcrição de contos tradicionais,sem sequer serem retrabalhados pe-los ‘autores’”, afirma.Dos Santos não pára por aqui. Cri-tica também aos que ficam presos aopassado, os quais “têm mais de des-crever do que de escrever”. Escreversobre o passado é um “exercício téc-nico enfadonho, mais do que literá-rio”, refere.

Para Dos Santos, esta escolha de es-critores moçambicanos poderá estar aafugentar ‘clientes’, os poucos leitoresque ainda nos sobram. “Talvez o que os leitores, particular-mente os mais jovens, que são acusa-dos de desinteresse, de frivolidade,etc. (sempre eles os culpados!), quei-ram seja saber como podem antecipar,antever, imaginar como será daqui avinte anos este país, esta sociedadeem que vivem e em que se vão pro-criar, onde hoje se sai diplomado dasuniversidades sem se ter sequeraprendido a ler e a escrever”, sugere.Para terminar, Carlos dos Santosdeixa um recado para os que insistemna ideia de que é da quantidade que vi-rá a qualidade. É “mentira”, afirma. “Aqualidade resulta apenas do trabalho”,acrescenta para depois rematar:“Podem juntar sucata daqui até àLua, que tão grande quantidade nuncase transformará numa nave espacial.Já uma nave espacial mal desenhada,inadequadamente equipada, incom-petentemente pilotada, muito rapida-mente se transformará em sucata!”Carlos dos Santos é autor dos ro-mances de Ficção Científica “A QuintaDimensão” (2006), “O Pastor de On-das” (2011) e “O Eco das Sombras”(2013) bem como do contos infantis“O Conselho” (2007) e “O Caçador deOssos” (2013).

CARLOS DOS SANTOS, ESCRITOR MOÇAMBICANO“NÃO É QUALQUER PESSOA QUE PODE SER ESCRITOR”

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MATADI MAKOLAA sua obra, no que tange a temática,vem se desenvolvendo a partir do seuconceito de liberdade do sonho, por-que um dia disse para si que poderiachegar aos 10 anos de carreira, e a par-tir daí foi tecendo um fio sentimentalnos seus quadros. O sonho concreti-zou-se em obra, exposta nos dias quecorrem na galeria Tamar Golan. Meso-Mumpasi (nome kikongo que significasofrimento das vistas) é uma figurapresente nas artes plásticas, já tendosido na XII edição do ENSARTE Pré-mio Juventude com a obra “Conversa”e faz parte do leque de 20 artistas an-golanos cujas obras, um total de 40,estão visadas no livro "A Face da ArteAngolana Contemporânea", coorde-nado pela Fundação Arte e Cultura. Técnica mosaicoMesoMumpasi é o artista plásticoangolano originário do Zaire. Faz partede um sem número de artistas emer-gentes da novíssima cena artista ango-lana e que têm Luanda como o grandeponto de movimentação. Foram mui-tas coisas conseguidas nestes 10 anosde carreira. Garante não ter sido fácilchegar a este nível e fazer vincar a téc-nica mosaico, que é um trabalho de pa-ciência e intuição. Contudo, este traba-

lho tem sido também, ao mesmo tem-po, um exercício de memória, porqueherda do seu pai, já falecido desde1991. O salto à escola Académica deBelas Artes do Congo Democrático nãoo retirou da linha de construção ima-gética através dos mosaicos, nem tam-pouco o agrupou, do ponto de vista es-tético, aos cultores do cubismo, se qui-sermos considerar os mosaicos no mo-do estrutural geométrico. Do pai, seuprimeiro mestre, a escola o distanciana forma e nas cores, mas não os sepa-ra na técnica mosaico. O pai fazia mo-saicos de parede, sem nunca se aventu-rar a pintar em tela. O pintor era o filho,e isso o levou a faze-lo em tela, conse-guindo o efeito artístico desejado.A crítica tecida por académicos erafavorável ao seu sonho de se afirmarcomo artista, ao que, em síntese, di-ziam a Mumpasi que tinha grandespossibilidades de alcançar sucesso emÁfrica. A verdade tem se revelado aospoucos, e nestes 10 anos muita coisaboa lhe aconteceu, justificadas com aspalavras de alguns críticos: "Não é aarte académica da Belas Artes, masuma técnica que lhe confereautentici-dade", diz-se da sua obra.Ida ao Brasil Em 2014 vai ao Brasil e é convidadoa participar num projecto que ganha

corpo este ano. No próximo dia 20 deSetembro volta ao Brasil para uma ex-posição individual e iniciar a emprei-tada cuja finalidade é a construção deretratos em estilo mosaico de indivi-dualidades sonantes daquele país. Aexposição será a continuidade destaque está patente na galeria TamarGo-lan, em alusão aos seus 10 anos de car-reira artística, aberta ao público até aodia 23 de Agosto. O fogo das coresNa cena artística, fora o toque a mo-saico, Mumpasi é fácil de reconhecerpela escolha das cores. É sabido o seugosto de mistura-las e dar-lhes um efei-to mais afogueado. Justifica a escolhadas cores vivas como um reflexo do mo-do como olha a Angola de hoje, sedentade mudanças, com prédios a brotar,com o motor do desenvolvimento a to-do vapor. Lê as cores como meio de in-dução a este pensamento de desenvol-vimento, energia e vida. Mas, na arte,como refina a intuição?Respondeu-nos: "Eu também não sei como as cores,no acto de criação, se assumem na tela,mas sei que no fim o resultado é feliz ealegre, muito forte e ardente. Até as fi-guras que em vida são de aura carrega-da, quando passadas em telas ganhamleveza, e isto podemos ver nos retratosque fiz de Mandela e Kapela. O mosaicoprovoca nos observadores a sensaçãode vibração e de e subtileza". Experimentar a arte contemporâneaO conceituado Mestre Kapela játravou conhecimento com o pai deMumpasi, enquanto artistas e aindano fulgor da juventude. Kapela cruzacom Mumpasi, agora na posição demestre do filho do velho amigo, e oseduz a desafiar-se e sair da sua zonade conforto. Mumpasi tinha prometi-do avaliar a questão, mas a sua parti-cipação na 5ª edição do JAANGO veioa revelar-se estar mais dentro da artecontemporânea do que julgava. A co-munhão com Guizef e outros artistasescolhidos nesta edição do JAANGO,que é um evento de matriz arte con-temporânea, fê-lo aceitar a ideia desair da zona de conforto, estendendo-se para as técnicas impressionistas.Tem trabalhado em instalação e reci-clagem de pneus, que espera vir aapresentar quando estiver desenvol-vido. Vai avaliar ainda as técnicas dearte contemporânea e ver que tipo denovidade poderá resultar, dado que, aseu a seu ver, a arte contemporânea fo-ge muito dos modelos académicos,apoiada na ideia instantânea da suaobrigatória universalidade. "Porque aarte contemporânea europeia podenão apresentar diferença com a ma-neira contemporânea como os artistasafricanos de hoje desenvolvem os seustrabalhos", sustenta.

Vive da arteComo muitos artistas, tentar sobre-viver da arte foi muito difícil, visto quedependia dos apoios da mãe, e foi o ir-mão desta que teve a gentileza decomprar o primeiro quadro que Mum-pasi pôs à venda, como forma de in-centivar o sobrinho a não se deixarabater pelo desânimo. Ainda estudan-te de Belas Artes Kinsahsa, participanum concurso panafricano em 2017 econsegue uma menção honrosa, tendoa oportunidade de ver o seu quadrovendido a um preço de mil dólares. De momento, falta-lhe um grandeatelier e chegar aos níveis dos grandesmestres. O atelier é mais para artistasque precisam de apoio artístico, ou se-ja, ter um espaço para ensinar aos maisnovos aquilo que aprendeu na acade-mia. Chegar ao estatuto de grandemestre é algo que só depende de si, dasua entrega desinteressada e velada. Da questão que tem sido o pé de Aqui-les da massa artística angolana, veio umsim cheio de certeza: Mumpasi vive daarte que faz. Nunca se sentiu atraído poroutros tipos de trabalho e em nenhummomento pensa renunciar a arte de pin-tar, caso esta não lhe convenha financei-ramente. Esta consciente do que faz e seconsidera feliz por tudo que já ganhouna arte. Diante do que ouvimos, mesmotendo em conta a vulnerabilidade finan-ceira da Cultura e a falta de galerias, nãoresta margem de dúvidas que a sorte fa-vorece os audazes.

10 ANOS DE MESO MUMPASIARTISTA DO MOSAICO E DA PINTURA ARDENTE

ARTES | 7Cultura | 15 a 28 de Agosto de 2016

A conversa (Mumpasi)

Mumpasi

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8 | artes 15 a 28 de Agosto de 2016 | Cultura

omelhor do universo ficcionalda cultura pop, que duranteanos tem sido o mote e o sus-

tento da imensa “máquina” cinema-tográfica de Hollywood, foi apresen-tado aos fãs, em san diego, nos esta-dos Unidos, naquela que é, para to-dos os aficcionados, um dos maioresencontros de artes do momento, aComic Con.Actualmente visto por muitos comoum dos pontos de referência para sa-ber o que vem por aí em termos de ci-nema, televisão, banda desenhada evideojogos, o encontro deste ano nãodesapontou os fãs. As adaptações dehistórias de banda desenhada ao cine-ma que, nos últimos anos, tem marca-do a “guerra” entre os estúdios War-ner Bros, detentora dos direitos daeditora DC Comics, e da Disney, donado selo Marvel, continuam a ser osgrandes destaques.Este ano, durante cinco dias, os afi-cionados da cultura pop ficaram a sa-ber, através de anúncios feitos por pro-dutores ou actores, o que reserva 2016e o que foi preparado para 2017 e 2018.Surpresas são inúmeras e entre elas es-tão sequências de filmes célebres, co-mo “King Kong”, ou de séries que hojeregistam as maiores audiências em te-levisão, a nível mundial, como “Guerrados Tronos”.Futuros grandes êxitos de bilheteira,como “Liga da Justiça”, ou estreias tãoesperadas como “Animais Fantásticos eonde Habitam”, escrito por J.K. Row-ling, de forma a ser uma sequência dasaventuras do universo mágico de Har-ry Potter, assim como “King Artur: Le-gend of The Sword”, nova adaptação daépica história de ascensão da mais cé-lebre figura lendária britânica do pe-ríodo medieval, foram apresentados aopúblico e convidados.Em trailers (vídeos de pequena du-ração), posters e entrevistas, os res-ponsáveis dos estúdios Warner Bros,Marvel, Universal falaram dos seusprojectos, assim como os directoresde canais como Netflix, FOX e TimeWarner mostraram o que vem por aí.O surpreendente nesta edição daComic Con San Diego é o número deproduções de ficção científica e adap-tações de banda desenhada com es-treias marcadas para este e os próxi-mos anos, mostrando uma clara ten-dência dos grandes estúdios para ex-plorarem mais o imaginário e fugir umpouco dos habituais casos da vida real.Apesar de ser um festival mais viradopara este género de arte, o número de vi-sualizações que estas estreias receberam

até ao momento no Youtube demons-tra não só o interesse dos fãs, mas tam-bém do público em entrar mais no uni-verso da ficção e mesmo que a maiorparte delas não venha a ser incluída nacorrida aos Oscares do próximo ano, émais do que certo o sucesso destas nasbilheteiras mundiais.minas de ouroAs principais “minas de ouro” desteano são as adaptações de banda dese-nhada para o cinema, por ser um uni-verso, cheio de leitores no mundo in-teiro, que traz novidades e muitas cu-riosidades, devido as mudanças quealgumas destas histórias trazem aoserem transpostas para a sétima arte.

As estreias de “Doctor Estranho”,“Pantera Negra” e “Capitã Marvel” mar-caram o painel de propostas da Marvel,além das sequências de “Guardiões daGaláxia 2”, “Thor: Ragnarok” e “Ho-mem-Aranha”, agora com o jovem actorTom Holland como protagonista. Porsua vez, os desafios de produção daWarner Bros, detentora da editora DC,são “Batman”, com Ben Afleck como oheroi vigilante, e “Mulher Maravilha”,que marca a estreia a solo de Gal Gadot,após o êxito em “Batman vs Superman:A Origem da Justiça”.Independentemente destas produ-ções, a Warner Bros tem ainda em car-teira duas versões de clássicos do ci-nema: “King Kong” e “Rei Artur”, no-meadamente, “Kong: Skull Island” e

“King Artur: Legend of the Sword”. Co-mo disse Júlio César antes de atraves-sar o rio Rubicão: “A sorte está lança-da” e agora só resta ver o que os argu-mentistas podem fazer para trazer al-go de diferente a duas histórias, cujonúmero de versões cinematográficasjá excederam a conta e se tornaramimortais na sétima arte.Como não poderia deixar de ser, odrama continua a marcar a sua presen-ça na grande indústria do entreteni-mento norte-americano. Uma das sur-presas é “Snowden”, baseada na bio-grafia do homem que tornou públicovários segredos de vigilância global daNSA (Agência de Segurança Nacional)norte-americana.Outra surpresa para os fãs de ficçãocientífica foi o anuncio da sequênciade “Caminho das Estrelas”, a série deaventuras que teve início em 1966 eaté hoje já originou jogos e foi adapta-do à televisão. Durante anos a sériemarcou uma geração e influenciou omundo não só pelo seu “slogan” inicial“Para audaciosamente ir aonde ne-nhum homem jamais esteve”, mas porser a primeira do género a aceitar umelenco multirracial e multicultural, al-go que só se tornou muito comum natelevisão norte-americana em 1980.mundo “tele”As séries de televisão estiveramtambém em alta nesta edição da Co-mic Con San Diego, onde houve oanúncio de estreias, de sequências edo encerramento de muitas. Algumasdestas são vistas pelos angolanos, a

estúdios mostram metas e ProJeCtos aNUais

MELHOR DA FICÇÃO NA CULTURA POPADRIANO DE MELO

Sucessos como “Superman” levaram a Warner Bros a trabalhar com a editora DC em novos projectos

Festa da banda desenhada angolana abre as portas ao público esta semana no Camões

Milhares de fãs foram até San Diego nos EUA para conhecer as próximas atrações do mundo da sétima arte em especial as adaptações de banda desenhada

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ARTES | 9Cultura | 15 a 28 de Agosto de 2016 partir dos canais FOX, SyFy, ou AXN,através da ZAP ou DStv, como “A Teo-ria de Big Bang”, agora com mais per-sonagens no elenco, “Supernatural”,que traz o regresso do pós-morte dapersonagem Sam Winchester, ou “Ar-row”, que pretende incluir mais heróisda DC na televisão, ou a tão contagian-te e pirateada “Guerra dos Tronos”, oactual fenómeno da HBO, que a cadaano tem obtido uma nova legião de fãs.“Velas Negras”, “Ossos”, “OrphanBalck” e “Diários do Vampiro” são as sé-ries de televisão que depois de váriastemporadas despendem-se dos fãs esteano, algumas devido ao baixo índice deaudiências e outras pela longevidadeno pequeno ecrã.Porém, para alegria dos entusias-tas da televisão, os argumentistasanunciaram na Comic Con a continua-ção de outras séries, como “The Wal-king Dead”, “Sherlock”, “Lúcifer”, “TheExpanse” e “Vikings”, assim como aestreia de “Defenders”, AmericanGods”, “Luke Cage”, “Legion”, “Punhode Ferro” e “O Exorcista”.O painel de estreias reservou aindao regresso à televisão de uma série quejá foi um êxito de audiência: “PrisonBreak”. A sequência da aventura domaior escapista de prisões norte-ame-ricanas está de volta, sete anos depois,com um novo elenco, além dos rostos ha-bituais, com destaque para o protagonis-ta Michael (Wenthort Miller), dado co-mo morto no fim da 5ª temporada.

TecnologiaA cada ano que passa as Comics Constem criado inovações e apresentadosnovas propostas para o seu público di-versificado. Este ano, no campo das no-vidades no campo da telefonia móvel foiapresentado o jogo “Pokemon Go”, umsucesso viral do mundo dos smartpho-nes, disponíveis para as plataformas iOS(iPhones) e Androids.Baseado numa nova tecnologia, o jo-go usa a realidade aumentada, atravésdo GPS e da câmara do dispositivo, pa-ra deixar o jogador mais próximo doque está a sua volta. Considerado peloscríticos como bom para ajudar as pes-soas a explorarem novos cenários e ao

mesmo tempo os incentivar ao exercí-cio, “Pokemon Go” é, para o Presidentedo Conselho de Administração (PCA)da Niantic, empresa criadora do jogo,uma forma de retirar os filhos do isola-mento provocado pelo mundo virtual.John Hanke acredita que o jogo tem “umenorme potencial para tornar tudomais divertido”.Actualmente o jogo, que apanhou omundo de surpresa, só tem algunscontratempos, em especial por usar arealidade aumentada e alguns jogado-res, em especial os mais jovens, esta-rem a sofrer acidentes. Porém, consi-derou, opções a serem superadas, poro jogo estar a levar mais pessoas àsruas e a interagirem mais entre elas.Pontes interculturaisO fenómeno da cultura pop conti-nua a ganhar força pelo mundo, com arealização, cada vez mais regular, deencontros, entre os seus criadores e osfãs, em vários géneros, que vão desdeo cinema aos videojogos, televisão ebanda desenhada.Actualmente as Comic Con, um en-contro que tem mais força nos EUA,também já acontece em vários outrospaíses, desde a Europa à Ásia, África eAmérica do Sul. O Brasil, por exemplo,prepara para Dezembro, o Comic Con

Experience, em São Paulo, assim comoo Festival Internacional de Quadrinhos,em Belo Horizonte.A França, um dos países, onde a arteangolana neste género já foi apresen-tada, pelos irmãos Olímpio e Lindo-mar de Sousa, realiza, anualmente, oFestival Internacional de Banda Dese-nhada de Angoulême, um dos maioresmercados da cultura pop na Europa.Com o surgimento de novas propos-tas e o evoluir do tempo, as ComicCons começam a conquistar maioresmercados, numa clara demonstraçãoda actual aceitação desta arte.O primeiro Comic Con aconteceuem 1968 em Birmingham, na Inglater-ra. Na altura, era um encontro de fãsde banda desenhada, mas com o au-mento de popularidade de outras mé-dias e vertentes da fantasia e ficçãonos anos 80, 90 e com o ápice nos anos2000, os encontros passaram a se vol-tar também para os aficionados por ci-nema, séries de televisão, jogos elec-trónicos e outras actividades ligadas àcultura pop. As maiores Comic Cons do mundo,como a de San Diego, Nova Iorque eSalt Lake City (as três nos Estados Uni-dos) reúnem a nata da indústria de en-tretenimento, entre artistas, produto-res e empresas do segmento. Hoje, há40 Comic Cons no mundo.

Actores participaram nos debates ao longo de toda a actividade e explicaram aos fãs o que podem esperar dos seus futuros trabalhos no cinema e televisão

“Guardiões da Galáxia” regressa aos ecrãs depois de ter sido um dos maiores sucessos de bilheteira mundial

Por cá, a festa da cultura pop come-ça no dia 19, no Camões Centro Cultu-ral Português, às 18h30, com o me-lhor da banda desenhada e do cinemade animação produzido no país, oupor criadores angolanos.Pelo seu ca-riz internacional, o festival, denomi-nado Luanda Cartoon, que já vai nasua 13ª edição, traz artistas nacionaise estrangeiros, com destaque este anopara o português Osvaldo Medina. Co-mo único na região da África Austral, oLuanda Cartoon deste ano traz, até odia 26, desafios excepcionais.JORNAL CULTURA - Quais as

inovações e propostas este ano?LINDOMAR DE SOUSA - Além doslançamentos de diversos títulos debanda desenhada, como “Regina” e“Arrependimento de Salomão”, que-remos aumentar a interacção entreos autores e o público. O programainclui ainda uma exposição de cari-catura, a exibição de filmes de anima-ção, em 2D e 3D, assim como seminá-rios dirigidos a profissionais e ama-dores e o lançamento da VI edição doprojecto “A Banda Desenhada na Lín-gua Portuguesa”.JORNAL CULTURA - E quanto

aos convidados?LINDOMAR DE SOUSA -Este anoos artistas convidados vêm de Portu-gal, Osvaldo Moreira, e de França,Eduardo Pinto Barbier, como resul-tado de várias parcerias criadas du-rante encontros mantidos pelo Lin-domar Estúdios no Festival AmadoraCartoon e no de Beja. Além destes ar-tistas temos trabalhos de cartoonis-tas do Brasil, os dois Congos, Gabão,Moçambique, Itália e Cuba.JORNAL CULTURA - Quais os lo-

cais escolhidos para o festival?LINDOMAR DE SOUSA- A festa dabanda desenhada angolana acontecena Mediateca de Luanda e no Camões- Centro Cultural Português. São locaisque têm tido muita afluência do públi-co. É uma oportunidade de ter a activi-dade em dois pontos diferentes.JORNAL CULTURA - Quanto ao

mercado de trabalho?LINDOMAR DE SOUSA- O mercadode trabalho para o criador de banda de-senhada ainda é muito fraco. Pratica-mente nem se faz sentir. Actualmentevemos um ou outro trabalho em algunsjornais, como os títulos das Edições No-vembro, que até tem uma página dedi-cada a este género, e um outro privado.Mas, no geral, os cartoonistas angola-nos continuam sem espaço para mos-trarem o seu trabalho.

LUANDA CARTOON

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MATADI MAKOLANos dias que correm, a novíssimageração de músicos despoletou umapolémica que esperamos vir trazermaior lucidez e balizas epistemológi-cas aos géneros que agora lavram. Aconsolidação da 4ª edição do AngolaMusic Awards (AMA), acolhido a 30 deJulho no Pavilhão Multiuso do Kilam-ba, teve as suas peripécias, muito alémdo idílico glamour e estilo socialite queo evento pretende defender como ima-gem, com os famosos e a alta sociedadeluandense misturados para celebrar ogénio musical de cada ano, conformeacontece em muitas paradas musicais,sendo a mais sonante o prémio norte-americano Grammy Awards, entendi-do como o momento mais alto da para-da pop. Contudo, estas exaltaçõessempre têm os seus momentos pecu-liares, e muitas das vezes propensos apolémicas. Lembremos, a título deexemplo, que a 58ª edição do arquéti-po da iniciativa angolana teve váriaspolémicas, e umas das mais agudas foia resposta da cantora pop Taylor Swiftao raper, produtor e empresário Ka-nye West. A razão da alfinetada de Tay-lor prende-se pelo raper a ter chama-do de “insignificante” numa das faixasmusicais do seu mais recente álbum.Sem deixarmos de dar protagonismo ànovela Kanye e Taylor nos Awards, re-cuemos uns poucos anos para voltar apuxar como exemplo o comportamen-to deste raper na gala de 2009. Emoti-vamente, Kanye simplesmente e semmotivo ou autorização subiu ao palcoe tomou o microfone das mão de Tay-lor Swift para desabafar ao mundo asua opinião de que Beyoncé, um papãohabitual, merecia o prémio de melhorvídeo feminino e não ela, justificandoem defesa que “Beyoncé tinha um dosmelhores vídeos de todos os tempos”.Assim acontece na terra dos gringos.Mas, é preciso não esquecer que aspessoas têm o seu direito à opinião,principalmente pessoas entendidasno assunto, quando a balança da orga-nização aponta para um lado e meiomundo aponta para outro. A gralhaestá em como (meio e momento) apessoa desabafa. Kanye veio a público,por via do Istagram, pedir desculpapela forma como se comportou, masnão pelo que disse, certo de que aí nãoerrou em nenhum momento. Já a olhar para o nosso umbigo, afesta azedou quando o evento já levaestima e consideração. E, feitas ascontas, não deu só em amor. As opi-niões sobre os vencedores divergiame as redes sociais (principalmente oFacebook) foi a plataforma que mui-tos escolheram para contestar,apoiar ou comentar os resultados.Uma dessas pessoas foi o não menosconhecido Kizua Gourgel, que, sus-peitando algum absurdo em algumasescolhas, usou a sua página do Face-book para desabafar e certificarquem também pensava como ele. Osartistas mais lesados na crítica que

teceu foram Nsoki e Nelo de Carva-lho, não deixando de fora a organiza-ção, encabeçada por Daniel Mendes.

Ora, Kizua reclama que a músicaque venceu a categoria afrojazz não éum registo equivalente ao estilo que acategoria indica. Trata-se de “Vai-teembora”, de Nsoki. Quanto a esta ma-ka, Kizua, embora tenha usado termospouco amigáveis e duros, com muitaironia e sarcasmo, pedia à organiza-ção maior seriedade ao especificar ascategorias, e à Nsoki maior acutilân-cia na sua definição musical. Não res-tam dúvidas para qualquer ouvidoapurado que causa um certo embara-ço ver o registo da Nsoki ser conside-rado um afrojazz, visto que está muitomais próximo da balada Pop. SobreNelo de Carvalho, Kizua levantou sus-peitas quanto à sua competência en-quanto produtor, dizendo sem receionenhum o que acha. Mas não ficouapenas pelos cantores, Daniel Men-des viu-se convidado à rixa pelo factode Kizua ter reclamado o pecado capi-tal da organização em permitir que oscantores em destaque ainda actuas-sem em playback, tirando a salvo ogrupo pop As Africanas. Não demorou muito e a polémicafez-se. Amigos e amigos de amigoscompartilharam as palavras de Ki-zua, outros copiavam à letra e repas-savam publicamente. Bem, não é to-dos os dias que a crítica (pelo menosde bom senso e bom gosto) faz-sepresente na plataforma de opiniões,principalmente a eventos institucio-nalizados como AMA. Muitas das ve-zes as pessoas "engolem" os resulta-dos sem fazerem questão de contestar. Sem aproveitamento desnecessá-rio e nulo de sensacionalismo, o canaltelevisivo Zap Viva, no seu programaZap News do dia 3 de Agosto, reto-mou o debate e transformou num fó-rum justo, ouvindo tanto Kizua comoDaniel Mendes.A postura de Daniel Nascimento, en-quanto apresentador/moderador emúsico, foi plausível ao cortar imedia-tamente um certo infantilismo cres-cente em Daniel Mendes, ao dizer quesó levaria em consideração as opiniõesde Kizua Gourgel caso este fosse "umministro da Cultura", frase retomada

por um dos jornais digitais da capital eescolhida como título do artigo, umpouco para chamar atenção das pes-soas sobre o absurdo desta afirmação. Ademais, Mendes justificou o play-back por estar a passar por vicissitu-des financeiras, aliás, como toda a esfe-ra cultural. Disse assim: “ O AMA tevesempre bandas a acompanhar os artis-tas desde a sua primeira edição, e esteano está a ser muito complicado a níveleconómico. E só para conseguir reali-zar esta gala, só Deus sabe o que nóspassamos para conseguirmos faze-la”. Agora em defesa de Nelo, Mendesaclara que o criador de “Zanga” foi es-colhido por ter produzido vários te-mas do seu mais recente álbum. E paradissipar as dúvidas sobre a categoriaem que Nsoki participa e ganha, acres-centa que a mesma é, simultaneamente,

para cultores de afrojazz e wordmusic. De todo rol da conversa, Kizua, co-mo que a desabafar por toda classe osentimento de falta de legitimidade doevento, terá assim levantado um pro-blema que carece a intervenção préviado próprio ministério da Cultura e es-truturas afins, no que concerne a umdevido esclarecimento sobre as obri-gações que tutela a organizações co-mo o AMA. Porque, e enquanto músi-co, Daniel Nascimento não só terá dei-xado a perceber que reina na classedos músicos um sentimento de insa-tisfação e de falta de legitimidade pe-los prémios AMA, como também deum órgão regulador que coordene eateste a importância e as razões daexistência desta ou daquela organiza-ção, para bem da classe artística e dasua união e homogeneidade.Mendes preferiu justificar relevan-do o sentido quantitativo, dizendo que“ Noventa por cento dos músicos an-golanos já passou no AMA”, deixandopor dizer a filosofia do evento e o con-tributo, convincente e satisfatório, pa-ra a classe artística. Nas suas declarações no referidoprograma, Kizua voltou a dizer literal-mente aquilo que escreveu na sua pá-gina do Facebook, acrescentando até,só para dar maior sustento ao que de-fende, que “Dar o prémio à Nsonki se-ria como dar um prémio de rock àBanda Maravilha”. A respeito de estar a ser levado deforma pessoal, com perguntas absur-

das como se o músico criticasse pornão ter estado presente entre os no-meados ou feito parte do júri do AMA2016, Kizua deixa claro que não é umacrítica aos músicos, mas sim à organi-zação do AMA. Foi um tento sem muito sucesso,Porque de Nelo e Nsoki as respostasnão tardaram por vir, e ambas a enfa-tizar como foram afrontados em pú-blico, de forma vil e insensível. Nelo fez circular nos meios de co-municação social uma resposta que sepretende cabal sobre tudo em que seviu lesado. “Quem fala deve certificar-se primeiro se está correcto, sob penade deixar de ter legitimidade. Possopensar que a questão levantada (pon-do em causa a minha competência), te-nha a ver com algo mais do que simplesvontade de mostrar indignação, podeser algo que ultrapasse o razoável econtra isso, não posso fazer nada. Nãofaz parte da minha índole nem do meucarácter receber créditos ou prémiospor algo que não mereça!”, lê-se numdos pontos, encabeçado por uma fraseescrita em letras garrafais dizendo quetodos os seus discos foram produzidospor ele - Nelo de Carvalho -, ArmindoMonteiro e Alberto Monteiro. Nsoki respondeu a Kizua pela mes-ma via: Facebook, no dia seguinte.Num discurso pautado pela intencio-nal mensagem da importância dosmúsicos zelarem melhor a profissãoque é o ganha pão das suas famílias,refere num dos pontos: “Nós todos vi-vemos da Música e temos que apren-

der a respeitar a arte de cada um. CaroKizua, apesar de tudo ainda respeito oseu trabalho e não será tão cedo queme verá a tentar denegrir o seu empúblico, porque, tal como eu, vocêtambém tem uma família para susten-tar e fãs que o apoiam e torcem por si”.Não faltaram nas suas falas nem be-liscos nem elogios, como a tentativa dedar à acção de Kizua outras razões quenão fossem as bem intencionadas críti-cas construtivas, que geram polémicasnecessárias para o mercado artístico, edisso, escreve a autora do sucesso meu“Meu Anjo”, respeita e admira Kizua co-mo músico mas também lamenta a for-ma como este crítica, se interrogandoporque nunca o fez em privado, dado

ANGOLA MUSIC AWARDS TRAÍDO PELOS CONCEITOS10 | ARTES 15 a 28 de Agosto de 2016 | Cultura

Kizua Gourgel

Daniel Mendes

Nelo de Carvalho

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Cultura | 15 a 28 de Agosto de 2016 ARTES | 11que até compartilham amigos comuns.Efectivamente sobre a confusão deafrojazz e wordmusic, escreve: “Infeliz-mente, o músico Kizua ficou ofendidocomigo por eu ter ganho e aceite o pré-mio de melhor "jazz/ WORLD MUSIC"pela minha Música “Vai-te embora”, poreu não cantar "jazz" ou por não ser umacantora de Jazz. A categoria, segundo osorganizadores do evento, engloba todasaquelas músicas do estilo "jazz" e do es-tilo "WORLD MUSIC". A descrição da ca-tegoria é visível no regulamento do con-curso e está disponível para todos. "Vai-te embora" enquadra-se no estilo"WORLD MUSIC" e está registada naSPA em Lisboa nessa mesma categoria”,defende-se na sua página do facebook. Azar nosso, africanos, o conceitowordmusic é este saco onde os ociden-tais resolvem empilhar tudo que venhade África e seja novo para eles, com in-tenção clara de nos sintetizar e diminuira um rótulo maleável a todos, e é elásti-co. Eles podem juntar na mesma escalaAnselmo Ralph, Bonga, Waldemar Bas-tos, Totó, Papa Wemba. Aliás, vezes háque vemos escrito assim: artista africa-no e da wordmusic. Será que artista afri-cano não basta para ser artista mundial?O afrojazz é um refém perfeito da word-music, e as kizombas mais lentas, as ba-ladas pop criadas à força de rupturas rít-micas mais lentas, ligadas a géneros mu-sicais africanos ou fusões de um mundonão codificado ainda pelo ocidente, re-solve-se cunhado wordmusic. Traídos pelos conceitos, Kizua re-clama exactamente a falta desta coe-rência, defendendo que aquele registode Nsoki jamais seria afrojazz, e comrazão. Mas, e por ser balada pop de ori-gem angolana (africana), fica word-music e o problema está resolvido. In-felizmente, a extensão wordmusictambém é essa aberração. Em verda-de, se pode dizer que não é mera falá-

cia o adágio de que há males que vêmpara bem. E para bem da Música Ango-lana, esta polémica instala-se num mo-mento em que é preciso chamar a aten-ção de todos, para não se aproveitaremda fragilidade financeira da cultura pa-ra justificar erros e retrocessos. Por is-so, esperamos que estes assuntos ve-nham a ganhar importância juntos dosfazedores de música e gerar boas ma-kas, e quem sabe mesmo um dia nãopoderíamos, dado que o assunto veio àbaila, ouvir de um Jerónimo Belo, nu-ma dessas ecléticas Maka à Quarta-fei-ra na UEA, as discrepâncias do Afrojazze Jazz, ou as malícias oriundas do con-ceito wordmusic. Aliás, porquê do pre-fixo afro em afrojazz, se o Jazz já em siprovem de África? Ou será um retornonoutro tempo, temática e intenção mu-sical desta nova África, e não um retor-no a si, ao Jazz voltar à fonte de si? Portermos muito que aprender, fica a pro-vocação do convite, tanto para Jeróni-mo como para a UEA, secretariada peloreceptivo Carmo Neto.

Afinal, o que é afrojazz?Procuramos Nino Jazz, um produ-tor musical que tem sido suportepara muitos cantores com bons cré-ditos nesta vertente. Nino ficou co-nhecido como Jazz exactamente porser um batalhador incasável na afir-mação desta sonoridade junto dosmais jovens, e igual mérito reconhe-ce em Moisés Luís, o radialista deuma emissora que tem na sua grelhaum programa inteiramente virado aesta sonoridade, Caminhos do Som.A imprensa nacional é clara, emboracaia e provoque erros, em mostrarcomo são vários os momentos e osprotagonistas que aí são apresenta-dos como cantores de afrojazz oujazz-fusion. Há nomes que vão ga-nhando espaço, principalmente amalta que foge da kizomba, semba ekuduro, e prefira ouvir algo quetambém às vezes é chamado de mú-sica alternativa para ouvidos bemapurados. Começou com alguma ti-

midez, admitamos. Mas como enca-rar como débil início, se este género, aganhar espaço na fina flor da músicaangolana, foi agraciado com um festi-val internacional que fez furor e pro-vocou inveja a outros já bem posicio-nados em África? Exacto. Trata-se doFestival Internacional de Jazz deLuanda. Um pouco depois, embora te-nha surgido a meio focos de pequenasiniciativas com este carácter, Luandaganha o JAZZING, que trouxe estrelascomo Nneka, Lokua Kanza e DianneReeves e Stewart Sukuma. Agora, em2016, temos o JAZZMENTE. A praça tem nomes de peso: NdakaYo Wini, Filipe Mukenga, Gari Sinedima,Sandra Cordeiro, Africanita, e tantosoutros a surgir com base musical jazzfundido a alguma sonoridade nossa. Nino nos conta que afrojazz é a fu-são de ritmos africanos e uma lingua-gem mais jazística, com harmonias so-fisticadas, ou seja, é uma música afri-cana inclinada ao jazz. Ela tem rítmicadiferente em cada música ou autor,mas a estética jazz deve estar patente. Atenção, por outra, que o termoafrojazz carrega outros géneros. E ad-verte que uma música nunca é carac-terizada por um instrumento, mas simpela forma que é tocada. Isto para nãoconfundir os mais desatentos que po-dem a vir pensar que a presença do sa-xofone seja indício de jazz. Não é. O rit-mo define a nomenclatura a atribuir.Por exemplo, a falar de Richard Bona,um puro afrojazz, este já sai madurodos Camarões e bebe na América e naFrança muito de gurus do jazz, comum desenvolvimento do conceito har-mónico e de linguagem musical muitoapurados. O resultado é arrepiante.Ou seja, não é fácil o processo de con-seguimento estético nesta fusão, a quedominar o bom e jazz e não se perdernas raízes da sua origem musical.

Em prol da Cultura, a ADPP Angola(Ajuda de Desenvolvimento de Povopara Povo) levará a cabo, pelo terceiroano consecutivo, o festival deTEATRO-ADPP-ANGOLA.As competições regio-nais serão a partir de Outubro e agrande final nacional será no dia 22 deNovembro.Participam no festival de teatro asEscolas da ADPP Angola, nomeada-mente as 15 Escolas de Professores doFuturo (EPF), e as 8 Escolas Polivalen-tes e Profissionais (EPP), as EscolaFormigas do Futuro, a Cidadela dasCrianças e o Instituto da Linha daFrente Huambo.Deste 2014, o festival de TEATROADPP ANGOLA começa com uma se-mana de treinamento, com instruto-res com mais de 25 anos de experiên-cia na área do teatro, para capacitarprofessores e estudantes das Escolasda ADPP Angola.As peças ensaiadas são de auditoria

de escritores profissionais de teatrocomo William Shakespeare, Bertolt-Brecht, Cervantes, Lysistrate e outros.O presente ano contará com maisrepresentatividade africana, comobras de John Cani e dos angolanos Jo-sé Mena Abrantes e Armando Rosa.Para todas as Escolas, a componentede teatro tem sido e continua a ser umamais-valia, que contribui para o desen-volvimento dos jovens estudantes.Durante os meses de Abril a Junho,foram realizados ensaios nas diferentesescolas.No mês de Junho decorreu o se-minário de instrutores de teatro das es-colas- Em Julho e Agosto houve o ensaiogeral.De Agosto a Setembro são realiza-dos eventos nas escolas e nas comuni-dades locais. As competições finais de-correrão em Outubro e Novembro.Antes do seminário de instrutoresde teatro, as escolas escolhem as pe-ças a apresentar, onde também tere-mos peças angolanas.

Lista de algumas peças a seremapresentadas:A Profetiza Ardente (KIMPA VITA)Revolução das Mulheres A Excepção e a Regra O Mulato Prodígio (Sequeira Lopes)Nada além da VerdadeSangue de CãoQue diz Sim que diz Não Canção do Vale Homem de La Mancha’A sapateira Prodigiosa Ratos e Homens Sonho de uma Noite de Verão Muito Barulho para NadaTari-Yari: misericórdia e poder no

Reino do Congo.O festival de TEATRO ADPP ANGOLAenquadra-se nas festividades dos 30Anos da ADPP em Angola, criando de-senvolvimento nas áreas de Educação,Saúde, Agricultura, DesenvolvimentoComunitário e Meio Ambiente.

Com peças de William Shakespeare, BertoltBrecht, e CervantesFESTIVAL DE TEATRO ADPP ANGOLA

Teatro

Nsoki (à direita)

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12 | ARTES 15 a 28 de Agosto de 2016 | CulturaZWA

PURA MÚSICA MANGOPMATADI MAKOLAZWA será, de 24 a 28 de Agosto, a retoma significativa das actividadesmusicais da III Trienal de Luanda. Fernando Alvim apresentou estefestival de música angolana na sexta-feira à tarde, 12, numa confe-rência de imprensa acolhida no Palácio de Ferro. Posicionou que é um pro-jecto desenhado em 2008, quando a fundação pensava seriamente na cria-ção de uma revista cultural mas não via sentido faze-la sem que antes co-meçasse por um festival. Entre as razões do seu surgimento, aponta como intenção atacar o diag-nóstico de que uma das grandes máculas do funcionamento da música an-golana se consigna na falta de festivais, que servem para dar popularidadee rodagem aos músicos. Por outro lado, para levar os músicos a alternaremao hábito de só se apresentarem em palcos quando têm concertos. São oito horas de música por dia e quatro palcos disponíveis, sendo queos concertos começam às 16 e terminam às 0h. Estarão presentes 40 ban-das, o que representa 40 concertos, com um total de custo avaliado em 40milhões de kwanzas, o que perfaz um milhão de kwanzas por concerto. Al-vim garante que será um projecto simples, com dois concertos por palco,sem parar. Todo o espaço do Palácio de Ferro está a ser desenvolvido paradar vida a este festival. A escolha das bandas recaiu a um núcleo ligado àfundação, dentre produtores musicais e jornalistas com grande atenção àmúsica. Serão duas homenagens no último dia, 28, ao compositor-mestreXabanú e ao Presidente da República, José Eduardo dos Santos, enquantohomem de música. Uma das dificuldades dos desenhadores de um festival, partilha Alvim, éa escolha. Diz este que depende muito da leitura a fazer, mas, no caso doZWA, decidiram deixar em evidência um segmento que é parte importantedo ADN cultural de todos, que é a música popular angolana. Que, no fundo,define Alvim, é aquela música que está enraizada na nossa memória e fazparte dos nossos sintomas culturais, embora esteja muito desaparecidanestes últimos trinta anos. Mas, acautela: “Não se tratará de nenhuma se-paração de geração e de estilo, visto que o festival terá de tudo, desde amúsica dita mais tradicional à música contemporânea produzida e tocadapor angolanos de todas as gerações”.

Será também uma oportunidade para as novas gerações que não pude-ram ouvir bandas dos anos 50, 60 e 70, para que possam ganhar dados nacompilação das suas memórias musicais com estes espectáculos ao vivonestes cinco dias de ZWA, sugere. A filosofia do festival, traça Alvim, é um sistema que abrange o projectoGirabairro Cultural (música, literatura e fotografia) e já foi solicitado a serdesenvolvido em mais cinco cidades de Angola. Quanto à música, todo em-penho se direciona ao sonho de um dia termos um festival por bairro. E oZWA já tem para 2017 a confirmação dos seus mecenas, que apoiam aabrangência do festival entre o Largo 17 de Setembro até à Fortaleza deLuanda, com possíveis dez palcos internos e 8 externos. Anteprojecto da BISANos últimos tempos era notória a presença da direcção da FundaçãoSindika Dokolo em Portugal, criando laços afectivos com a cidade do Porto.A boa nova veio também arrastada ao ZWA: BISA. Trata-se de uma parceriaentre Luanda e Porto para tratar e traçar um assunto que Alvim consideraurgente trazer à tona, que é o som do atlântico. Ou seja: “Como todos sa-bem, o oceano atlântico é um espaço que é um pouco de todos nós, uma se-gura geografia, e a ideia é fazer em 2018 a primeira Bienal Internacionaldo Som do Atlântico (BISA)”. O grande trunfo consiste em exportar bandas angolanas nestas 20 cida-des banhadas pelo Atlântico. Cada com a sua vez, durante um ano, de Feve-reiro a Novembro, uma cidade acolherá 20 ou trinta bandas das cidadesbanhadas pelo Atlântico que serão escolhidas. Será possível deixar em cir-culação oitocentas bandas e mais de quatro mil músicos durante 10 meses. O BISA traz conceitos específicos, teoriza Alvim, e o primeiro será oimpacto e a ramificação da música africana no Atlântico, Américas eEuropa; o segundo será a influência da música sul americana, com com-ponentes africanas, no atlântico; a terceira será sobre o impacto da mú-sica da América central e do norte; a quarta será a influência da músicaeuropeia no atlântico. É politica da Fundação Sindica Dokolo, enquanto organizador, darmais tempo, para evitar cair no erro de muitos festivais internacionais,feitos num tempo muito curto, não possibilitando às bandas conhecerdetalhadamente a história e estórias das cidades que visitam neste pe-ríodo, sem interagir com os músicos locais. A solução encontrada é quecada cidade anfitriã apresente 20 bandas, para além das 20 ou trintabandas que virão de outras cidades. Assim, esse número quarenta doZWA, conclui Alvim, é um treino para o BISA, avisando as produtoras an-golanas para estarem preparadas ao mercado musical que se poderáabrir, de casas de música, contacto com grandes produtoras, circulação einserção normal no circuito musical digital como um passo derradeiropara que a internacionalização da música angolana atinja uma certa nor-malidade, e não ser sempre uma efeméride quando se levanta a possibili-dade de exportação da música angolana. A experiência recente no Porto, continua Alvim, ajudou a fundação a pro-var que há música especificamente de Angola mas não é de grande conheci-mento lá fora, e acredita ser necessário criar estes caminhos, porque en-contra numa nova geração, mesmo ao contrário do que se pode pensar, sóli-dos sinais de trazer consigo a estética sonora da alma da música angolana. O que significa zwaO termo ZWA carrega múltiplos significados, mas todos ligados à raizdas línguas tradicionais. Neste caso, quer dizer som. Sindica Dokolo, presi-dente da fundação, contribuiu acentuando que em lingala significa toma,relendo assim: toma este som, certamente para todo um mundo por co-nhecer a música angolana, pura musica mangop, acrescenta Jomo Fortu-nato aí presente na conferência. Os significados de muitas palavras das línguas nacionais, não só conse-guem ser esteticamente interessantes como também são práticos em darsentido às coisas, e ZWA significa o som, e há um conceito específico da un-dação que é intercessões, e a logo marca ilustra um pouco isso, indicandoimputes e maneiras de trabalhar a memória musical, completa Alvim.

Fernando Alvim

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INTRODUÇÃOA guerra precede o Estado e ela é tão an-

tiga quanto é a humanidade. As suas ori-gens estão patentes nos primórdios da hu-manidade. No decurso da evolução huma-na, a guerra evoluiu e revestiu-se de váriascaracterísticas. Na modernidade, ela as-sumiu outra dimensão e continuou a de-terminar o curso da história. Ela esteve naorigem do surgimento e derrube de impé-rios e suas sociedades, bem como ela pro-porcionou o aparecimento e desmorona-mento de Estados. Ela contribuiu para oavanço técnico-científico da humanidade,como também esteve na origem dos gran-des desastres e hecatombes por que pas-sou a humanidade. A guerra sempre foi companheirada humanidade. Todos os povos a faceda terra viveram em maior ou menorgrau a guerra. Por isso, neste texto, va-mos fazer uma incursão retrospectivasobre a guerra ao longo dos temposmas com o propósito de avaliá-la co-mo fenómeno social e ver como elaevoluiu e como se caracterizou emcertos períodos históricos.Desta maneira, em primeiro lugar,vamos descrever a guerra desde as ci-vilizações pré-clássicas até às clássicaspara perceberemos como tudo se pas-sou de maneira concreta. Em segundolugar, analisaremos a guerra do perío-do medieval até à modernidade paraidentificarmos os seus pontos fortes.

A GUERRA NOS PERÍODOS PRÉ-CLÁSSICOS E CLÁSSICOS A guerra evoluiu com o desenvolvi-mento das sociedades humanas. A me-lhor maneira para percebermos essaevolução, é penetrando no passado dahumanidade. A guerra ganhou formano seio das civilizações pré-clássicas.Estas civilizações surgiram no fim da

pré-história e mantiveram-se até ao sé-culo V a.C. As civilizações egípcia, meso-potâmica e siro-palestiniana viveram aguerra mas cada uma a sua maneira.Penetrando na história da guerra daMesopotâmia, vamos encontrar infor-mações que atestam que a guerra civili-zada começou na Suméria. A guerracom carácter ininterrupto começa pre-cisamente na Suméria. No decurso dotempo, a guerra tornou-se intensa e co-meçaram a despontar, no seu seio, osprimeiros líderes militares. Fruto des-sa liderança militar, a especializaçãomilitar começou a ter lugar e a metalur-gia das armas foi-se fazendo sentir. Ou-tro aspecto digno de nota, devido ao ca-rácter ininterrupto da guerra, é o apa-recimento do conceito de batalha mili-tar. Esta concepção ganhou, entretanto,forma com o desenrolar dos tempos.Outro conceito que emergiu na Su-méria foi o da campanha militar devi-do às incursões que se faziam a longadistância. Ainda no contexto das guer-ras que se travavam, e em consequên-cia dos vários interesses em jogo, naSuméria apareceu o primeiro impera-dor da história – Sargão da Acádia. Esteimperador, no seu tempo, conduziu demaneira exitosa mais de trinta e qua-tro guerras. Por aqui, podemos atestaro carácter ininterrupto da guerra. Na Mesopotâmia deu-se, entretanto,no segundo milénio a. C., um “koinetecnológico” do ponto de vista militar.Este avanço tecnológico modificou, porsua vez, muitas das questões relativas àguerra. Tanto mais que surgiram novosguerreiros mais bem treinados e muitomais abalizados para a guerra. Outragrande novidade foi, sem qualquer dú-vida, o aparecimento do carro de guer-ra. Em paralelo, criaram um arco com-posto. Na verdade, estes avanços tecno-lógicos da época conferiram mobilida-de e fizeram dos guerreiros homens

muito mais devastadores. Com isto a guerra tinha alcançadooutra dimensão, de tal sorte que nestascondições a Assíria, como mais uma ci-vilização da Mesopotâmia, alcançou oesplendor militar. Por isso, Assíria erano século VIII a. C um Estado guerreiroe que manteve o seu exército em plenacampanha. Por força do papel militarque ela desempenhou na guerra, o seuexército converteu-se naturalmenteem exército modelo.Os traços mais característicos da As-síria estavam patentes no carro deguerra e na sua organização logística.Ela possuía uma capacidade logísticaque permitia as suas tropas efectuaremmarchas de longa distância. As suastropas eram capazes de efectuar mar-chas até 480 km. Eles introduziram osbarcos e o recrutamento de cidadãospara o serviço das armas. Também fo-ram eles que conceberam a ideia de pri-sioneiro de guerra. Por tudo isto, estemodelo de exército transitou, com otempo, para as demais civilizações daMesopotâmia e fora desta região.Outra civilização pré-clássica queviveu a guerra foi com certeza a Egíp-cia. Do ponto de vista militar, o Egiptotinha um certo atraso tecnológico e vi-via de certo modo despreocupadoporquanto julgava que ele não tinhaameaças externas. O seu exército comcarácter permanente tinha armamen-tos muito rudimentares e atrasadosem comparação com outros povos. Assuas formas de combate estavamaquém das demais sociedades.A situação mudou no Egipto quan-do eles foram invadidos pelos Hicksos.Um povo que era militarmente maisavançado que os egípcios. Eles dispu-nham de carros de guerra e possuíamum potencial imperial. Subjugarampor algum tempo o Egipto, até ao mo-mento em que os egípcios expulsaram

os invasores e passaram a prestarmaior atenção às coisas da guerra. Nu-ma fase mais avançada, o Egipto apa-receu como potência militar. A provaestá patente na descrição que se fazsobre a Batalha de Kadech.No tempo apareceu a primeira civi-lização clássica. Trata-se da civilizaçãoGrega. Ela surgiu no século XVIII a. C. epermaneceu até ao ano 476. O seu apa-recimento fez brotar um novo espíritomilitar. Com a irrupção da nova menta-lidade militar, surgiram novas ideias eformas de organização, o que se reflec-tiu de forma directa sobre a maneira deempregar as tropas. Em termos de or-ganização militar, o exército tinha ca-rácter permanente e o seu adestra-mento era constante. No seio do exér-cito também imperou o espírito demo-crático, atendendo as suas origens e oclima que se vivia em Esparta.Nestas condições a unidade militarde base era a falange. Ela representavauma forma concreta de organização decombate e simbolizava a táctica grega.Mas por força da vida militar e da suavalorização no seio da sociedade gregadespoletou o espírito espartano. Deresto, este era o clima que reinava emEsparta, onde os jovens eram recruta-dos, desde muito cedo, e eram subme-tidos à treinos militares rigorosos.Quando Alexandre “o Grande” assu-miu o comando militar, por força dosdesafios militares da sua época, ele foiforçado a modificar a forma de organi-zação da Falange. Aliás, foi na Gréciaonde se travaram duas grandes bata-lhas históricas devido ao significadode cada uma. Um é a Batalha de Mara-tona, que teve lugar em 490 a. C. Nestabatalha o que esteve em disputa foi odestino da democracia e sua defesaem oposição à tirania. Outra foi a Bata-lha de Arbelas, que sucedeu em 331 a.C. Nesta batalha esteve em disputa da

MIGUEL JÚNIOR

A HUMANIDADE E A GUERRAHISTÓRIA |13Cultura | 15 a 28 de Agosto de 2016

Cavaleiros Mossi com reféns

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defesa da cultura ocidental contra acultura oriental. Em ambas as bata-lhas há lições de vida e histórias ricase com muitos ensinamentos.A segunda civilização clássica foiRoma. Esta civilização emergiu com afundação da cidade em 154 a. C. Porforça da sua aparição, Roma conver-teu-se em centro cultural da humani-dade. Roma, do ponto de vista militar,era belicosa. Do ponto de vista políti-co e militar, Roma era avançada. Tan-to mais que foi no seu seio que brotoua palavra pátria. Em Roma tambémnasceu o conceito de Estado. Quandose aborda a questão da guerra nesteperíodo é preciso ter em conta que asinstituições politicas e a guerra pas-saram por três períodos (PeríodoMonárquico, Período Republicano ePeríodo Imperial).Do ponto de vista militar, cada umdestes períodos tem as suas particula-ridades e todos contribuíram para o de-senvolvimento militar de Roma. Aliás, agrandeza territorial de Roma foi produ-to desse desenvolvimento e da con-quista contínua de várias parcelas ter-ritoriais e sua incorporação, controle eadministração segundo o modelo de vi-da político-militar dos romanos. Por força da grandeza do seu impé-rio e das exigências da guerra, os ro-manos foram os primeiros a organi-zar o censo da população no interesseda organização militar. Isso contri-buiu grandemente para o avanço mi-litar de Roma. A organização militarromana alcançou altos níveis de orga-nização que reforçaram a capacidadee a actuação prática do seu exércitoem combate. O exército romano tinhauma arte militar muito apurada emtodos os seus escalões. Eles possuíamdisciplina e instrução muito rigoro-sas sob todos os pontos de vista. Issoconstituiu o elemento de força paraas suas conquistas. ConquistaramItália, Cartago, Oriente e Gálias.Como produto das exigências davida e dos próprios desafios milita-res, a educação militar no exército ro-mano era essencial e assentava sobredois aspectos: formação moral e de-senvolvimento profissional. De facto,daqui resultou a robustez do exércitoromano. O exército continuou a me-lhorar a sua organização em funçãoaos desafios militares. Estas altera-ções contribuíram para o avanço mi-

litar, bem como para a manutenção eexistência do Império Romano noOcidente e no Oriente. O Império Ro-mano cresceu muito e desenvolveu-se bastante. Ele esteve presente emtoda Europa, na Ásia e em África. En-tretanto, dada a sua extensão e nãosó, o Império Romano enfrentou pro-blemas de toda ordem. No tempo, oImpério Romano conheceu de formaprogressiva o seu declínio.O declínio do Império Romano tevea ver com um conjunto de causas.Aqui podemos destacar questões po-líticas, sociais, económicas, culturaise militares. Do ponto de vista militar,as causas foram:Tradições de renúncia (falta de sa-crifício e de entrega ao trabalho. Caí-ram na ociosidade e na vida fácil);Competições políticas (luta pelopoder e intrigas, o que gerou mortes); Inclusão de mercenários e estran-geiros nas fileiras militares (renún-cia aos valores de Roma e falta deamor à pátria);Espírito fraco e moral abalada (de-vido à corrupção, aos vícios e ao estilode vida).A GUERRA NOS PERÍODOSMEDIEVAL E MODERNOO declínio do Império Romanoabriu as portas para o avanço bárba-ro. Além do mais, do ponto de vistamilitar e da guerra, os bárbaros apro-priaram-se da herança militar greco-romana. Os bárbaros fizeram daguerra o seu modo de vida. Tantomais que os bárbaros germânicosconseguiram converter a profissãomilitar em uma actividade digna.Nestas condições surgiu a figura mili-tar do chefe de “bandas de guerra”.Estes indivíduos, como regra, contro-lavam certas parcelas de terras e usa-vam as mesmas em conformidadecom os seus fins e de acordo com assuas motivações guerreiras. Com otempo, eles passaram a efectuar inva-sões em diversas direcções.Nestas condições de incertezas elutas sem qualquer sentido, CarlosMagno despontou como líder. Com elesurgiu uma nova visão de guerra, ouseja, as guerras passaram a ser feitascom base na motivação política. Asmotivações políticas passaram a ser-vir de catalisador e os fins das guerrastambém começaram a ser políticos.

Carlos Magno criou o Império Caro-língio. Ele organizou o seu exército emconformidade com as exigências doseu tempo. Para atender o ritmo daguerra da sua época, o exército do Im-pério Carolíngio consagrou a presta-ção do serviço militar através de umaordem de mobilização. Com a particu-laridade de que os refractários ficavamsujeitos ao pagamento de uma multa,enquanto que os desertores eram con-denados à pena de morte. Assim, Car-los Magno obteve muitos êxitos. A guerra continuou o seu cursonormal e todos passaram a fazer re-curso à guerra. Assim sucedeu com oIslão. De resto, cada muçulmano eraum guerreiro por natureza e destino.O guerreiro muçulmano estava desti-nado a ir para o paraíso mediante adestruição dos infiéis. Por isso, o in-fiel era combatido. Por força dessepostulado, o Islão converteu-se numareligião de guerra. Surge na humani-dade a religião acoplada à guerra.Nestas condições o Islão empreendeum processo de conquista de espaçosterritoriais, o que lhe proporcionoucriar um vasto império que abarcouterras desde a Índia até a Espanha.Esta obra foi possível visto que o pre-ceito de Maomé – “guerra santa mu-çulmana” - era praticado sem qual-quer hesitação. A guerra islâmica le-vou os árabes até a Síria, a Palestina eao Egipto, onde se implantaram e dis-seminaram sua cultura e seus valo-res. Também no âmbito das guerrassantas o exército muçulmano, sob co-mando de Tarik, conquistou algumasparcelas de Espanha e Portugal. A guerra prosseguiu o seu curso econtinuou a transformar as socieda-des, a ditar o curso da história e a mo-dificar as relações sociais e de classe.Apesar de alguma uniformidade quejá existia no território da Europa co-mo consequência das acções políticase militares do Império Carolíngio,mas a verdade é que a parte continen-tal da Europa conheceu novas inva-sões. Estas invasões foram encabeça-das pelos povos normandos originá-rios da Noruega e da Dinamarca. Assuas invasões também se estenderama Inglaterra e a Rússia. Do ponto devista da guerra, as suas acções tive-ram um grande impacto pois elas mu-daram as realidades socioeconómi-cas dos espaços invadidos.

A guerra continuou a fazer moradano seio das sociedades medievais eela influenciou a marcha dos aconte-cimentos, bem como obrigou a intro-dução de modificações significativasna arte da guerra e na organização dosexércitos. Tanto mais que na segundafase da evolução militar no períodomedieval as atenções estiveram volta-das para a defesa contra as invasõesdo século IX, o que proporcionou oaparecimento do cavaleiro. O cavalei-ro foi o símbolo da mais alta expres-são militar desta época. Nestas condi-ções, e no contexto da táctica e batalhafeudais, foram criadas uma série decondições que precipitaram o apare-cimento da infantaria. Neste ambien-te teve lugar a Batalha de Azincourt enos períodos subsequentes aparece-ram as armas de fogo.Na modernidade a guerra assumiuoutras características. Tanto maisque triplicaram as campanhas, as ba-talhas, os conflitos e a belicosidade.Da mesma forma que vários Estadosse envolveram em guerras. Comotambém ocorreu uma evolução doponto de vista tecnológico.CONCLUSÃOPodemos concluir que a guerra sem-pre esteve presente em todas as fasesda vida da Humanidade. Desde os pri-mórdios que a guerra está patente noseio dos humanos. Apesar da sua natu-reza e dos meios bélicos que os huma-nos fazem recurso para levá-las a cabo,a guerra foi um elemento propulsor dopróprio avanço da humanidade querdo ponto de vista de técnico quer doponto de vista científico. BIBLIOGRAFIACREASY, Edward S. – Quinze Batalhas Deci-

sivas da Humanidade, Edições Sílabo, Lda, Lis-boa, 2008.

GILBERT, Adrian – Enciclopédia das Guer-ras Conflitos Mundiais Através dos Tempos, M.Books do Brasil Editora, São Paulo, 2005.

KEEGAN, John – A Face da Batalha, Bibliote-ca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 2000.

KEEGAN, John – Uma História da Guerra,Tinta da China, Lisboa, 2006.

MAGALHÃES, J. B. – Estudo Histórico sobre aGuerra Antiga, Biblioteca do Exército Editora,Rio de Janeiro, 2006.

SANTOS, António Ramos dos e VARANDAS,José – A Guerra na Antiguidade, CalidoscópioEdição e Artes Gráficas, Lisboa, 2006.

Guerra no Sudão do Sul Africanos na Segunda Grande Guerra

14 | HISTÓRIA 15 a 28 de Agosto de 2016 | Cultura

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Vos conto uma coisa, um dos momentos mais interessantes do meu dia é oregresso a casa, depois de mais um dia de labuta. Todo o percurso é nor-malmente abarrotado de coisas que me inspiram e que inflamam o meuser esponja, para, assim que der, descarregar tudo numa crónica ou aumentarnas páginas do livro que venho a escrever há mais de sete anos. Ah… antes queme esqueça de dizer, eu ando de Táxi, ou Candongueiro, ou seja lá como quise-rem chamar. Só sei que isso facilita muita coisa, porque não preciso resguardara minha atenção para o volante ou para a estrada e tenho um universo de cenaspara explorar. Vos garanto, não há melhor combustível para a inspiração doque andar de candongueiro em Luanda.No candongueiro, ouve-se das pequenas conversas às grandes discussões,das cavaqueiras às controvérsias, dasexplosões de ira, por diversos moti-vos, à manifestação do cansaço dosbilingueiros que não fazem muito pa-ra as coisas melhorarem e vivem acu-sando, sem muitos argumentos, osoutros de serem relaxados e que porcausa disso o país está a regredir.Tanto como isso, é lá onde se ouvemas melhores demonstrações porA+B, com cada argumento mais con-vincente que outro, o quanto os an-golanos são fracos a matemática, tãofracos que foi preciso mais de umano para resolverem uma simplesquestão de aritmética (15 + 2). Ou-ve-se, também, os mais sinceros co-mentários de uma ou outra atitudealtruísta como a que constatei umdia desses: um polícia da BET man-dou parar os automobilistas na viaexpressa para ajudar um deficientefísico a atravessar de uma ponta aoutra, as duas vias, empurrando-lhea cadeira de rodas.Quem anda de candongueiro enormalmente aguenta os empur-rões e cotoveladas de manhã pra nãoatrasar na labuta, se tiver sorte lápelo final do dia, na hora de regres-so, encontra a paragem vazia. É somente aí que percebe quão confortáveis oudesconfortáveis podem ser os carros em que sobe. E é nesses momentos queeu noto quem tem maior criatividade para angariar mais passageiros. Não ésó o grito do cobrador ou do chamador que vai convencer o cidadão cansadoa entrar numcandongueiro qualquer. É melhor que esteja limpo e a cheirarbem. Uns até ligam o AC, e de repente passam a ser chamados de geleira. Con-fesso que demorei bué para perceber porque chamavam isso, enfim....! Masde todos os artifícios que já testemunhei o que mais me fechou constatei hádias, o candongueiro tinha rede de internet.«Xé, estás a andar num candongueiro com Wi-Fi e ainda por cima grátis?»Li no visor do telefone do Olívio, meu colega, enquanto socializava pelo What-sapp com um compincha que está nos Estados Unidos. Parece que o madié sabeque o Olívio nunca tem saldo de dados e estranhou ao vê-lo online. Assim quecomeçou a zombar, a querer menosprezar, porque agora se sente mais america-no que angolano, lhe mandaram a foto da imagem que estava colada no vidro detrás: «aqui tem internet grátis». Aí ele engoliu tudo que estava a falar da banda.«Angola está mesmo evoluindo!»Li ao espreitar outra vez no visor após ouvir uma vez mais o sinal de mensagem e

observar a cara de matreiro do Olívio. Namesma conversa com o angolano ameri-canizado, tinha uma outra kamba quelhe respondeu no gerúndio, acompa-nhando a frase com unsemoticons de co-ração nos olhos. Ele resmungou:«Essa mboa está a estudar no Brasile o outro nos estados unidos. Seachambué porque estão já nas Améri-cas e lá são um bocadinho avançadosnessas coisas das tecnologias. Mas ago-

ra a cara lhes doeu, porque nunca por nunca vão apanhar um candongueiro cominternet de graça. Lá não tem esses mambos, por isso mesmo, e pra lhes darmais raiva, partilhei a foto do vidro de trás do Hiace».A paragem nas horas do meu regresso a casa fica um pouco vazia e nesse dianão foi excepção. O candongueiro estava a demorar a encher. Mas de repente en-trou um individuo com um I-Pad na mão e quando galou a frase que tinha Wi-Fisem segurança chamou a atenção de toda a miudagem que estava na paragem.Numa fracção de segundos o exterior do candongueiro ficou abarrotado de pes-soas. Não tardou a encher e nos fizemos à estrada.Das dezasseis pessoas lá dentro, apenas duas ou três não estavam com o tele-fone nas mãos usufruindo da rede de internet grátis, uma delas era o motorista,obviamente, mas o cobrador não era nenhuma delas, pois o telefone dele era oque mais dava o toque de mensagem do chat do facebook. Eu, no banco do meio,largava algumas gargalhadas leves pelo que lia. Chegou um momento que não re-sisti e a gargalhada saiu mesmo ao estilo LOL com aquele sitcker de línguafora.Dois madiés do banco de trás esticaram o pescoço pra ver o que eu lia e asduas mboas do banco da frente viraram pedindo, sem um pingo de escrúpulos,alto e bom som, para partilhar a publicação que estava a me deixar a rir à toa. Nãovos minto, nesse momento, a minha gargalhada subiu de nível. Para não ofenderninguém com a dura verdade que sairia da minha boca, usei o conceito de queimagens falam mais que palavras. Fechei o livro que estava a ler e mostrei-lhes acapa. A palma da mão não lhes disse nada, tão menos o que estava lá escrito:«ISMAEL MATEUS»«O autor de Laços de Sangue»«CINCO DEDOS DE VIDA» A decepção foi manifestada por uns comentários indecorosos que não me dei otrabalho de prestar atenção. Com os olhares incrédulos da maioria do pessoal quese prendia no mundo virtual, não foi difícil perceber que, para essa geração da tec-nologia, dos telemóveis, da internet e das redes sociais, e que se acha perfeita,quem se prende a ler um livro onde existe internet de graça representa, no míni-mo, um produto defeituoso para a sociedade actual.(in “Crónicas Incoerentes”)

candongueiro

CANDONGUEIRO COM WI-FIBARRA DO KWANZA | 15Cultura |15 a 28 de Agosto de 2016

LUEFE KHAYARI (LUCAS FERNANDES)Pai, esposo, engenheiro, escritor.. Integrante do Projecto Literário Palavra ÉArte da Cultura Editorial (Brasil, Salvador - BA). Participante da 16ª e 25ª edi-ção da Colectânea Palavra É Arte – Poesia (Brasil, Salvador - BA). Criador doProjecto Literário O Nosso Jango que albergou a colectânea O Canteiro Poéticolançada em Novembro de 2015. Coordenador editorial da Revista Digital deLiteratura e Artes Palavra & Arte - PAParticipou nas antologias Palavra é Arte (Poesia). Cultura Editorial. Salva-dor, BA, Brasil, 2013, O Canteiro Poético (Poesia). O Nosso Jango, Luanda, An-gola, 2015.Mais do autor em: Palavra & Arte (Revista Digital Online)-www.issuu.com/palavraearte; www.palavraearte.net; Incoerências do Khaya-ri- www.facebook.com/incoerênciasdokhayari;Jango das Letras - www.jango-dasletras.blogspot.com;Jovem Mulher - www.jovemmulher.com

LUEFE KHAYARI

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16| NAVEGAÇÕES 15 a 28 de Agosto de 2016 | Cultura

MUSAMBU WA DYANGA(ni mukumbu wa jingoma ni marimba)

Ivwenu o ndunduma ya kiluminu ku hongoIvwenu anji o mukunji mu mulenge wa lelu Mwene wa mwangana mu usuku wo-lembweKu jivungu jo-zeluke ku kalunga, ivwenueeh!

Dizwididi, kukolakolakwaMuta-kalombo* Kunu ni kusambwamwene:

Mbejiangaki u sukula o ngijiyaKwanzaNi mukilawewaisalayakusukaKinyoka u fundumukabu kangaKumenyama kola

Anga etu mwene, Makongo mu mbole omoEtu tu atangia malunda ma kalela-kuKiki tu lokela o matubya ma kitukumwiseNi jinvula ja kulendula o mwenyuw’etu

Kizuwaokyo, Ngombo twondo mu bandulula

Mukonda mu nzunduyahojikumilundukunaNi ku muxima wa mutu wa xixima O mudyelelu u lala kala matubya mama – Anga manyinga ma tema

Poema Kimbundu de António Marques (Kiba-Mwenyu)

Elelenu Ngombo w’etu, mulundi wa mulongaElelenu ni ujitu woso o mulonga wa manyinga!

PRIMEIRA ORAÇÃO(ao som de batuques e marimbas)

Escutai o ribombar do trovão no horizonteEscutai o recado estrondeante no vento Caindo sobre a noite abandonada Aos abutres pálidos do mar, escutai!

Eis a voz de Muta-kalombo* clamando alto E além:

Quando a lua banha o rio KwanzaCom sua cauda de plumas vermelhasA serpente Kinyoka* ergue-se Das águas sagradas

E nós mestres caçadores em matos serrados Contadores de malunda* milenaresJuramos perante o fogo que espantaE a chuva que reconforta almas

Que um dia Ngombo* será reivindicado

Porque no fígado do leão das montanhas E no coração sôfrego do aldeão A esperança é ardente como este fogoQue esquenta o sangue

Elogiai Ngombo guardião da palavraElogiai a palavra venerada no sangue!__________*muta-kalombo: deus protector dos caçadores. *kinyoka: serpente grande.*malunda: narrativas históricas dum reino. *ngombo: nume tutelar; deus da verdade, sinceridade.Kiba-Mwenyu é o pseudó-nimo de António Marques.Livros publicados emKimbundu: Ixinganeku2005 (poemas); Mukum-buniMulokoso 2005 (poe-mas); Difuta 2006 (poe-mas); NgunduwaNdala2008 (poemas); Miloza2009 (poemas). Todos oslivros foram editados naSuécia. Kiba-Mwenyu émestre em administraçãopública. Traduz os seuspoemas Kimbundu paraportuguês, inglês e sueco.