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CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 12 (01): 41-56, 2014 41 POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES DA UTILIZAÇÃO DE OBJETOS DE APRENDIZAGEM PARA A COMPREENSÃO DE CIRCUITOS ELÉTRICOS EM UM CURSO DE ENGENHARIA ELÉTRICA POSSIBLE CONTRIBUTIONS OF THE USE OF LEARNING OBJECTS FOR AN UNDERSTANDING OF ELECTRICAL CIRCUITS IN AN ELECTRICAL ENGINEERING COURSE Sandra Maria Dotto Stump, Celina A. A. P. Abar Universidade Mackenzie, S. E-mail: [email protected] Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática, PUC/SP. E-mail: [email protected] Este trabalho apresenta resultados de uma pesquisa de Pós-Doutorado desenvolvida no Programa de Estudos Pós- Graduados em Educação Matemática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Como objetivo, a pesquisa buscou verificar as possíveis contribuições de objetos de aprendizagem que enfatizam a análise gráfica de informações, equacionadas e resolvidas com números complexos, para a compreensão de Circuitos Elétricos em um curso de Engenharia Elétrica. Teve, desde seu início, o aporte teórico de Raymond Duval, que possibilita ao aprendiz a coordenação de diferentes registros de representação semiótica, promovendo, assim, o acesso aos diversos conceitos envolvidos em teoria de circuitos, na resolução de equações diferenciais e em gráficos no plano complexo. A proposta apresentada poderá promover também flexibilidade na resolução de problemas e uma integração conceitual pela interatividade dos objetos de aprendizagem fundados na teoria escolhida. A pesquisa, de caráter qualitativo, se insere na linha de pesquisa Tecnologias e Educação Matemática, do grupo Tecnologias Digitais no Ensino de Matemática (TecDEM) que dá suporte a investigações envolvendo recursos digitais e podem promover o desenvolvimento do conhecimento matemático. Palavras-chave: Circuitos Elétricos; Objetos de Aprendizagem; Registros de Representação Semiótica; GeoGebra This paper presents the results of a post-doc research developed in the Program of Postgraduate Studies in Mathematics Education at the Pontifical Catholic University of São Paulo (PUC-SP). The research aimed to verify possible contributions of learning objects that emphasize graphic analysis of information, addressed and resolved with complex numbers, to the understanding of electrical circuits in an Electrical Engineering course. The theoretical framework chosen was that of Raymond Duval, which allows the apprentice to coordinate different semiotic representation registers, giving access to various concepts involved in the theory of circuits, differential equations and complex plane graphs. The proposal may also promote flexibility in problem-solving and a conceptual integration through the interactivity of learning objects founded on the chosen theory. This qualitative work falls in the line of research Technologies and Mathematics Education of the group Digital Technologies in the Teaching of Mathematics (TecDEM) which supports investigations involving digital resources to promote the development of mathematical knowledge Keywords: electrical circuits; Learning objects; Registers of Semiotic Representation; GeoGebra INTRODUÇÃO A primeira pesquisadora tem formação em Engenharia Elétrica, modalidade Eletrônica, com Mestrado e Doutorado em Sistemas Digitais, pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e atua como Docente de Engenharia Eletrônica no Programa de Engenharia Elétrica da Universidade Presbiteriana Mackenzie. No segmento da Pós-Graduação, atua no Grupo de Pesquisa “Ferramentas de Interação e Simulação Aplicadas aos Processos Educacionais, Tecnológicos e Sociais (FISAPETS)”. A escolha para desenvolver o projeto em um Programa de Educação Matemática, com orientação da segunda pesquisadora, deve-se ao fato de que há grande conexão entre matemática e resolução de problemas associados ao desenvolvimento técnico, humano e social. Um dos desafios de profissionais de engenharia é desenvolver e aplicar processos e métodos com mínimos impactos causados à natureza e elevada produtividade; no entanto, a maioria das disciplinas dos Cursos de Engenharia prioriza as técnicas da utilização de softwares matemáticos. As aplicações ficam restritas às “convencionais” ou “clássicas

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POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES DA UTILIZAÇÃO DE OBJETOS DE APRENDIZAGEM PARA A COMPREENSÃO DE CIRCUITOS

ELÉTRICOS EM UM CURSO DE ENGENHARIA ELÉTRICA POSSIBLE CONTRIBUTIONS OF THE USE OF LEARNING OBJECTS FOR AN UNDERSTANDING OF

ELECTRICAL CIRCUITS IN AN ELECTRICAL ENGINEERING COURSE

Sandra Maria Dotto Stump, Celina A. A. P. Abar

Universidade Mackenzie, S. E-mail: [email protected]

Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática, PUC/SP. E-mail: [email protected]

Este trabalho apresenta resultados de uma pesquisa de Pós-Doutorado desenvolvida no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Como objetivo, a pesquisa buscou verificar as possíveis contribuições de objetos de aprendizagem que enfatizam a análise gráfica de informações, equacionadas e resolvidas com números complexos, para a compreensão de Circuitos Elétricos em um curso de Engenharia Elétrica. Teve, desde seu início, o aporte teórico de Raymond Duval, que possibilita ao aprendiz a coordenação de diferentes registros de representação semiótica, promovendo, assim, o acesso aos diversos conceitos envolvidos em teoria de circuitos, na resolução de equações diferenciais e em gráficos no plano complexo. A proposta apresentada poderá promover também flexibilidade na resolução de problemas e uma integração conceitual pela interatividade dos objetos de aprendizagem fundados na teoria escolhida. A pesquisa, de caráter qualitativo, se insere na linha de pesquisa Tecnologias e Educação Matemática, do grupo Tecnologias Digitais no Ensino de Matemática (TecDEM) que dá suporte a investigações envolvendo recursos digitais e podem promover o desenvolvimento do conhecimento matemático. Palavras-chave: Circuitos Elétricos; Objetos de Aprendizagem; Registros de Representação Semiótica; GeoGebra

This paper presents the results of a post-doc research developed in the Program of Postgraduate Studies in Mathematics Education at the Pontifical Catholic University of São Paulo (PUC-SP). The research aimed to verify possible contributions of learning objects that emphasize graphic analysis of information, addressed and resolved with complex numbers, to the understanding of electrical circuits in an Electrical Engineering course. The theoretical framework chosen was that of Raymond Duval, which allows the apprentice to coordinate different semiotic representation registers, giving access to various concepts involved in the theory of circuits, differential equations and complex plane graphs. The proposal may also promote flexibility in problem-solving and a conceptual integration through the interactivity of learning objects founded on the chosen theory. This qualitative work falls in the line of research Technologies and Mathematics Education of the group Digital Technologies in the Teaching of Mathematics (TecDEM) which supports investigations involving digital resources to promote the development of mathematical knowledge Keywords: electrical circuits; Learning objects; Registers of Semiotic Representation; GeoGebra

INTRODUÇÃO

A primeira pesquisadora tem formação em Engenharia Elétrica, modalidade Eletrônica, com

Mestrado e Doutorado em Sistemas Digitais, pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e atua

como Docente de Engenharia Eletrônica no Programa de Engenharia Elétrica da Universidade

Presbiteriana Mackenzie. No segmento da Pós-Graduação, atua no Grupo de Pesquisa “Ferramentas de

Interação e Simulação Aplicadas aos Processos Educacionais, Tecnológicos e Sociais (FISAPETS)”.

A escolha para desenvolver o projeto em um Programa de Educação Matemática, com orientação

da segunda pesquisadora, deve-se ao fato de que há grande conexão entre matemática e resolução de

problemas associados ao desenvolvimento técnico, humano e social. Um dos desafios de profissionais de

engenharia é desenvolver e aplicar processos e métodos com mínimos impactos causados à natureza e

elevada produtividade; no entanto, a maioria das disciplinas dos Cursos de Engenharia prioriza as técnicas

da utilização de softwares matemáticos. As aplicações ficam restritas às “convencionais” ou “clássicas

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pertencentes a livros textos”. A aplicação é realizada de forma mecânica, sem que o estudante

compreenda de fato o problema a ser solucionado e, também, não avalia a coerência do resultado.

As pesquisas em Educação Matemática, voltadas às questões de ensino-aprendizagem, podem

promover uma melhor compreensão das mudanças didáticas e pedagógicas, envolvidas no projeto

apresentado.

O interesse pela Educação Matemática também teve motivação em orientações de Mestrado, com

alunos que trabalharam com Objetos de Aprendizagem e buscavam um novo modelo de aprendizagem

autônoma. Particularmente, na Engenharia Elétrica, os conceitos, dispositivos e sistemas utilizados são

descritos por equações e deduções matemáticas de difícil compreensão e utilização. Há ainda que se

considerar os pré-requisitos em álgebra, geometria, trigonometria e gráficos no plano complexo, gerando

dificuldades nos primeiros contatos com os assuntos que deverão ser estudados.

Os Objetos de Aprendizagem, com as adequações necessárias, podem ser utilizados como apoio à

construção de conceitos matemáticos envolvidos na análise de circuitos em regime estacionário que, por

envolverem grandezas como tensões e correntes elétricas, exigem soluções de equações senoidais ou

cossenoidais, nem sempre de simples resolução. Além desse aspecto, importante considerar que a

visualização gráfica pode promover o entendimento dos conceitos e a flexibilidade quando se tratar de

circuitos mais complexos, apesar das atividades de conversão de representações de um mesmo fenômeno

não serem triviais e automáticas.

A interpretação de um determinado assunto, de qualquer área do conhecimento, requer, muitas

vezes, soluções e formulações para resolvê-las. A matemática poderá funcionar, neste caso específico,

como um instrumento para a solução de problemas e, assim, os estudantes passariam a entender os fatos

reduzidos a abstrações. E essas, manipuladas, podem ser comparadas aos fatos.

JUSTIFICATIVA

O trabalho desenvolvido nesta pesquisa tem como aporte teórico os Registros de Representação

Semiótica, de Raymond Duval (2009), particularmente sobre a organização semiótica e cognitiva das

representações gráficas, pressupondo-se a possibilidade de analisar graficamente circuitos elétricos em

regime estacionário utilizando números complexos.

A introdução ao processo de ensino e aprendizagem tem preocupado profissionais nas mais

diversas áreas educacionais que buscam opções na superação de obstáculos, principalmente, em sala de

aula. A Eletricidade apresenta dificuldades conceituais, concepções alternativas, uso da linguagem e

raciocínios errôneos que os alunos costumam apresentar, por exemplo, no estudo de circuitos elétricos. O

entendimento do significado da relação entre as grandezas elétricas é determinante para a formação do

profissional e é com este objetivo que se pretende utilizar os recursos, estimulando a aprendizagem,

viabilizando e otimizando os métodos de análise.

Construir Objetos de Aprendizagem que possam representar as grandezas elétricas, seja na forma

de equação, gráficos e as devidas conversões entre essas representações, possibilitará ao aluno

“materializar” o conceito ou fenômeno a ele associado, que é uma das principais dificuldades que se pode

observar durante os vários anos de trabalho da pesquisadora com alunos dos cursos de Engenharia

Elétrica.

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A representação gráfica constitui-se em um importante recurso para análise dos dados e tratamento

da informação. Para o aprendiz, não é suficiente saber ler um gráfico, mas saber operar e organizar de

forma objetiva os dados contidos nessa forma de representação.

Saber ler e interpretar informações, dados, gráficos e tabelas, ou seja, a quantificação da

diversidade de informações é fundamental no ensino superior, de maneira a estabelecer uma relação

consistente entre o conhecimento do fenômeno físico e o tratamento da informação decorrente do mesmo.

Acredita-se que uma maior compreensão do que embasa o raciocínio matemático pelo aluno

universitário é essencial para uma melhora qualitativa na aquisição de conhecimentos matemáticos

(Machado e Nogueira, 2005).

Para tanto, cabe ao docente deixar claro o objeto de estudo que será ensinado, quais os registros de

representação semiótica inerente à atividade e procurar trabalhar com, no mínimo, dois tipos de

representação de transformação, a de tratamento e a de conversão.

Deste modo, a pesquisa foi guiada pela questão: Objetos de Aprendizagem podem contribuir na

coordenação de registros gráficos e algébricos no ensino de circuitos elétricos em regime estacionário?

Na procura de resposta à questão acima foram utilizados Objetos de Aprendizagem para estudo e

análise de circuitos elétricos em regime estacionário, com suporte na Teoria dos Registros de

Representação Semiótica.

Como objetivo secundário, a pesquisa procurou direcionar os alunos do curso de engenharia

elétrica, a partir dos objetos de aprendizagem, a uma melhor compreensão entre o teórico e o prático dos

circuitos elétricos em regime estacionário, por meio da dinâmica e interatividade das simulações em

diferentes registros, ou seja, em equações senoidais e cossenoidais ou representações usando números e

gráficos no plano complexo.

APORTES TEÓRICOS

Os Registros de Representação Semiótica

Sob a perspectiva cognitivista, Duval (2009) apresenta a teoria dos Registros de Representação

Semiótica, na qual enfatiza que a atividade matemática deve visar o desenvolvimento das capacidades de

raciocínio, de análise e de visualização do aprendiz.

Silva (2011), pautada na teoria de Duval, esclarece que ao longo do processo de ensino-

aprendizagem é mais importante que o docente compreenda o funcionamento cognitivo do aprendiz do

que tenha como foco o erro, a fim de, por meio de uma abordagem cognitiva, permitir que o próprio

aprendiz se conscientize, participe e dirija seu processo de aprendizagem.

Para Silva (2011), ensinar matemática, sob o ponto de vista da teoria de Raymond Duval, é

possibilitar o desenvolvimento geral das capacidades de raciocínio, de análise e de visualização. Nesse

contexto teórico, a atividade matemática é caracterizada pela dependência das representações semióticas,

bem como pela grande variedade destas representações.

Para Duval (2009) existe uma diversidade de representações semióticas que são agrupadas em

quatro registros:

• língua natural;

• escritas algébricas e formais;

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• figuras geométricas;

• representações gráficas.

A partir desse agrupamento de representações semióticas, Duval nos traz as noções de tratamento

e de conversão como operações cognitivas diretamente envolvidas no processo de apreensão do

conhecimento matemático e na construção dos conceitos.

O tratamento de uma representação refere-se às operações dentro de um mesmo registro de

representação, por isso, é dita “interna a um registro”. Já a conversão de uma representação está

relacionada às operações em que o registro inicial é transformado em outro. Por essa razão, é dita como

uma “transformação externa”.

O uso de diferentes registros de representação para os fenômenos elétricos envolvidos pode

justificar sua aplicabilidade nos objetos de aprendizagem que foram utilizados.

O uso da tecnologia

A educação superior tem dificuldades em acompanhar o impacto causado pelas mudanças

tecnológicas que ocorrem em curto espaço de tempo. De acordo com Stump e Mustaro (2005), as

demandas da sociedade exigem alterações para acompanhar este ritmo das mudanças; no entanto, o

ensino, e todos os processos relacionados a ele, não consegue acompanhar a velocidade destas mudanças.

No processo de constante evolução da ciência, para complementar o trabalho das metodologias de

ensino tradicionais, as instituições de ensino superior também tem a importante missão de buscar novas

metodologias e ferramentas que possam estimular nos aprendizes o desenvolvimento de habilidades

tradicionais, assim como prepará-los para os desafios que demandam os adventos da tecnologia.

A evolução tecnológica, inserida na prática docente, pode se tornar um importante instrumento na

busca por didáticas mais modernas e no aumento da eficiência das tradicionais ferramentas utilizadas,

quebrando paradigmas e possibilitando que a aprendizagem seja mais produtiva.

Inovação tecnológica na prática docente não se caracteriza por transferir aulas para o computador,

mas sim utilizar os recursos disponíveis como simulações computacionais, animações e recursos

interativos como complemento ao ensino e aprendizagem.

Foram utilizados, como suporte inicial, os trabalhos desenvolvidos por Daniel Mertrand1 na

construção de Objetos de Aprendizagem e utilizando o software Geogebra2 como mediadores no processo

de desenvolvimento desta pesquisa.

Objetos de Aprendizagem

Na procura por um ensino produtivo, algumas importantes e conceituadas instituições de ensino

buscaram suas próprias definições para os objetos de aprendizagem. Uma das instituições mais

reconhecidas e respeitadas na área de engenharia, o Institute of Eletronics and Eletrical Engineers

(IEEE), definiu os objetos de aprendizagem como “uma entidade, digital ou não digital, que pode ser

usada e reutilizada ou referenciada durante um processo de suporte tecnológico ao ensino e

aprendizagem” (IEEE, 2008).

1 http://dmentrard.free.fr/GEOGEBRA/. 2 http://www.geogebra.org.

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Entretanto, devido ao fato do termo “Objetos de Aprendizagem” ser muito comum entre os

profissionais que buscam integrar as novas tecnologias ao ensino, Wiley (2000), pesquisador da área,

definiu de forma mais clara os objetos de aprendizagem, excluindo as entidades não digitais, ou seja,

limitou os objetos de aprendizagem apenas como entidades digitais.

Existem diversos tipos de objetos de aprendizagem. Em geral, quem cria um objeto tem alguma

finalidade em mente e alguma concepção de ensino-aprendizagem. A finalidade pode ser a de introduzir

um assunto de maneira contextualizada, de criar uma oportunidade para o uso de um conhecimento já

adquirido, de demonstrar algum conceito complexo, de ressaltar interligações entre vários conceitos, de

introduzir certo tipo de pensamento ou comportamento no usuário, de ajudar em um processo de dedução,

de avaliar o grau de conhecimento do usuário sobre certo assunto ou habilidade etc. (NUNES, 2007).

A título de exemplo, no trabalho de Mamude (2009), o autor desenvolveu um recurso na área de

amplificadores ópticos de fibras dopadas por érbio (EDFA), motivado pela dificuldade e carência de

materiais didáticos no campo de engenharia de telecomunicações. Trata-se de uma abordagem

pedagógica, que conta com interatividade, recursos audiovisuais e disponibilidade para o aluno

administrar seu próprio tempo e da maneira mais flexível.

CIRCUITOS ELÉTRICOS EM REGIME ESTACIONÁRIO E REPRESENTAÇÃO FASORIAL COM NÚMEROS COMPLEXOS

Segundo Eves (2002), os números complexos surgiram no século XVI como descobertas de

procedimentos gerais para resolução de equações algébricas de terceiro e quarto grau.

O símbolo introduzido por Girard em 1629, passou a ser representado por em 1777 por

Euler. Em 1637, Descartes introduziu os termos real e imaginário. A expressão números complexos foi

usada pela primeira vez por Gauss em 1831.

Girard em 1628, Wallis em 1685, Wessel em 1797 e Argand em 1790 representaram

geometricamente os complexos como vetores em um plano cartesiano. Gauss definiu os números

complexos na forma , onde a e b são números reais e Finalmente a representação

geométrica permitiu que os complexos fossem visualizados e aceitos como números.

A álgebra dos números complexos permite representar e operar vetores no plano e possibilita que

grandezas que variam senoidalmente (ou cossenoidalmente) em função do tempo, sejam representadas

por vetores bidimensionais (fasores) do tipo A ( ), que sofre rotação em sentido anti-horário

com velocidade angular .

As tensões fornecidas por geradores de corrente alternada são representadas por funções senoidais

e cossenoidais. Entretanto, a análise dos circuitos se torna complicada, mesmo quando os circuitos

equivalentes são relativamente simples, empregando fasores para representar tensões e correntes,

relacionados por impedâncias no campo dos números complexos para responder pelos elementos de

circuito. Dessa forma, ficará simplificada a análise em estado estacionário.

Os objetos de aprendizagem podem permitir a visualização dos fasores e, portanto, das grandezas

elétricas no plano complexo.

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Um circuito elétrico (Edmisnter, 1972) é a ligação de elementos elétricos, resistores, indutores,

capacitores, linhas de transmissão, fontes de corrente, entre outros elementos, de modo que formem um

caminho fechado para a passagem de corrente elétrica. Quando ligado, o circuito está fechado, a corrente

elétrica sai de um dos terminais da fonte de energia, percorre os componentes do circuito e fecha seu

percurso no outro terminal da fonte de energia, produzindo efeitos como luz, aquecimento, sons,

movimentos etc.

É possível fazer a análise de circuitos em corrente contínua ou em corrente alternada ou em regime

estacionário.

Na análise de circuito de corrente alternada em estado estacionário, objeto desta pesquisa, as

tensões fornecidas pelos geradores de corrente alternada são, muito aproximadamente, funções senoidais

puras. Além disso, a onda periódica pode ser substituída por um termo constante e uma série de termos

senoidais e cossenoidais, descritos pelo Método de Fourier de análise em forma de onda.

Como já mencionado, para melhor compreender e tornar simplificada a análise de circuitos em

estado estacionário empregam-se fasores representando tensões e correntes, relacionados por uma

impedância no campo dos números complexos para responder pelos elementos de circuito.

A impedância é usada para definir a relação entre tensões e correntes no circuito e pode ser

expressa em números complexos. A parte real da impedância representa as resistências e a parte

imaginária, as reatâncias indutivas e capacitivas do circuito.

Ao utilizar notação fasorial torna-se possível transformar as equações diferenciais que representam

um circuito elétrico em equações algébricas e, neste caso, equações algébricas são mais simples para

resolver do que equações diferenciais.

A importância da notação fasorial na análise do regime senoidal deve-se ao fato de que nos

circuitos lineares excitados por fontes senoidais, as tensões e as correntes, em todos os nós e componentes

do circuito, serem também senoidais com a mesma frequência angular. (GUSSOW, 1985).

Cada ponto de uma senóide pode ser representado por um vetor de módulo constante em uma

posição diferente. Para uma dada frequência f do sinal senoidal, o movimento harmônico do vetor possui

a mesma frequência ou velocidade angular da senóide.

Um número complexo representado na forma retangular, ou cartesiana, é um número composto

por uma parte real e uma parte imaginária:

Um número complexo representado na forma polar é composto por um módulo de um vetor

radial e um ângulo (ou argumento):

Se o fasor, que é um vetor radial, for traçado em um plano cartesiano complexo, passa a ser

representado por um número complexo. Portanto, uma função senoidal no domínio do tempo, como

pode ser transportada para o chamado domínio fasorial e transformada em um

fasor representado por um número complexo na forma polar, tal que o módulo corresponde a um valor

fixo que identifique a senóide como o valor de pico e o argumento corresponde ao ângulo de fase inicial,

obtendo a representação:

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A representação fasorial é importante na análise de circuitos elétricos porque permite realizar

operações matemáticas entre tensões e correntes, sem usar a função no domínio do tempo, ou seja,

expressões trigonométricas ou a representação gráfica da onda.

A representação trigonométrica permite operações matemáticas usando equações de identidades

trigonométricas, mas os cálculos são trabalhosos para serem manipulados. Deste modo, acredita-se que a

mudança de registro pode facilitar a manipulação e a visualização.

Considerando que sinais senoidais de tensão e corrente podem ser representados por meio de

fasores e esses podem ser representados por números complexos, então, é possível operá-los por meio da

álgebra aplicável no campo complexo. Para finalizar, os cálculos podem novamente converter o fasor

resultante para o domínio do tempo e encontrar novamente uma função senoidal.

Há, portanto, quatro registros de representação de um sinal senoidal: por meio do gráfico em forma

de onda, do diagrama fasorial, da expressão matemática trigonométrica e dos fasores que poderão estar

contidos em objetos de aprendizagem.

A forma de onda é uma representação mais visual, mostrando a variação periódica do sinal por

meio dos gráficos em função do tempo ou em função do ângulo.

O diagrama fasorial é uma forma gráfica simplificada de representação do sinal senoidal que

permite fazer operações gráficas de soma e subtração entre vários sinais de tensão ou corrente. A

representação de sinais senoidais, por meio de fasores, utiliza os números complexos e é a forma mais

simplificada da função contendo apenas a amplitude e o ângulo de fase inicial do sinal.

A expressão matemática na forma trigonométrica representa a função de forma completa,

mostrando todos os detalhes do sinal e permitindo a determinação de seus valores instantâneos.

É importante que o aluno tenha consciência das correspondências entre as variações visuais dos

gráficos e as alterações significativas na escrita algébrica da relação.

Segundo (Duval, 1988), as dificuldades de leitura e de interpretação gráfica podem ser decorrentes

da dificuldade em utilizar as regras de correspondência semiótica entre o registro da representação gráfica

e o registro da expressão algébrica.

METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA

O interesse por esta pesquisa, de caráter qualitativo, teve motivação nas disciplinas ministradas aos

alunos de graduação em engenharia elétrica e no mestrado, com orientados que trabalharam com objetos

de aprendizagem e buscavam propor um novo modelo de aprendizagem autônoma e participativa.

Creswell (2010) compreende que na Pesquisa Qualitativa: a) o foco do pesquisador está

proporcionalmente no processo e não no resultado do produto; b) o interesse está na construção do

significado; c) o próprio pesquisador é o instrumento principal para a coleta e análise dos dados, por meio

da sua interpretação; d) o tipo de pesquisa envolve trabalho de campo; e) a pesquisa é descritiva, já que o

foco do pesquisador está no processo, no significado e na compreensão; f) o processo de pesquisa

qualitativa é indutivo.

Ainda, segundo Creswell:

(...) pesquisa qualitativa é um meio para explorar e para entender o significado que os indivíduos ou grupos atribuem a um problema social ou humano. O processo de pesquisa envolve as questões e os procedimentos que faz emergir os dados tipicamente coletados no ambiente do participante, a análise dos dados,

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indutivamente, construído a partir das particularidades para os temas gerais e as interpretações feitas pelo pesquisador acerca do significado dos dados.

(...) os pesquisadores qualitativos coletam pessoalmente os dados por meio de exame de documentos, de observação do comportamento ou de entrevistas com os participantes. (CRESWELL, 2010, p. 26).

O público-alvo desta pesquisa foram dezesseis alunos da pesquisadora, do terceiro ano de

Engenharia Elétrica e cursando a disciplina teórica de Circuitos Elétricos, previamente informados sobre

os objetivos do projeto em questão.

Os discentes tiveram pleno conhecimento sobre a pesquisa na qual estiveram envolvidos,

garantindo o anonimato no desenvolvimento e resultados obtidos na pesquisa.

A proposta incluiu três fases distintas: em um primeiro momento, a elaboração de material didático

teórico, para auxiliar na superação de possíveis dificuldades detectadas, visando promover uma revisão

conceitual do conteúdo específico, abordado em aulas teóricas convencionais. A partir de atividades e

exercícios realizados em sala de aula, foram identificados alguns obstáculos da aprendizagem, envolvidos

no processo de formação de conceitos, relacionados à Teoria de Circuitos Elétricos. Deste modo, foram

desenvolvidas atividades que continham registros distintos de tais conceitos, segundo Duval (2009),

procurando superar as dificuldades identificadas. Nesta fase, foram utilizados os objetos de aprendizagem

criados no software GeoGebra.

Em um segundo momento, foi disponibilizado aos alunos do terceiro ano do curso de Engenharia

Elétrica objetos de aprendizagem interativos, que permitiu a transição entre as diferentes representações

do objeto de estudo da pesquisa.

A animação interativa é uma ferramenta pedagógica utilizada para criar uma imagem de um

fenômeno físico construída em consonância com um modelo com o qual podemos interagir modificando

suas condições iniciais (TAVARES, 2010).

Nesta segunda etapa, os alunos foram submetidos ao emprego dos objetos, em diferentes situações,

após terem realizados os cálculos matemáticos necessários, que os levariam a refletir e a concluir sobre as

características de cada dispositivo e seu comportamento em relação à defasagem entre tensões e correntes.

Esperava-se que com a utilização de quatro registros de representação de um sinal senoidal, ou

seja, o gráfico da forma de onda, o diagrama fasorial, da expressão trigonométrica e dos fasores,

aplicados a três circuitos, os alunos poderiam responder à questão: qual a defasagem entre a tensão

aplicada e a corrente em cada um dos elementos do circuito?

O ensino do conteúdo poderia terminar nessa fase, no entanto, pretendeu-se submetê-los à

utilização do objeto, como um “visualizador” do conceito aprendido. Verificou-se que os alunos

adquiriram uma melhor compreensão do objeto estudado, por meio das diversas formas de representação.

O terceiro momento teve como enfoque a avaliação, que foi organizada por questões de múltipla

escolha, dissertativas, ou projetos para análise de desempenho de circuitos elétricos.

O questionário aplicado não teve relação com a avaliação da disciplina e a participação do aluno

contribuiu somente para o aperfeiçoamento do processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos relativos

a Circuitos Elétricos.

Sobre a avaliação, sabe-se que é um processo abrangente porque implica uma visão crítica que

fornece ao professor elementos para aperfeiçoar sua prática de ensino e, ao aluno, informações sobre seu

desempenho. Pode-se dizer que a avaliação é uma necessidade fundamental do processo de ensino-

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aprendizagem, permitindo que o educador busque novas formas de atuação e, ao aprendiz, verificar seus

conhecimentos e buscar alternativas para ampliá-los.

A avaliação exige do professor um aprofundamento com relação ao conhecimento do assunto em

questão, domínio do conteúdo e ideia ampla da disciplina a ser ministrada, permitindo fazer a relação

entre o que o aluno conseguiu apreender e a base científica do conhecimento abordado.

O que se pretendeu com a avaliação foi a reflexão sobre a ação desenvolvida, para que se pudesse

compreender as dificuldades dos educandos no momento da aprendizagem para buscar novas soluções.

É importante considerar que a pesquisa qualitativa também seja desenvolvida com

aprofundamento e compreensão dos conceitos, levando em consideração o perfil dos envolvidos, sejam

professores ou alunos.

Segundo Demo (2005):

A avaliação qualitativa pretende ultrapassar a avaliação quantitativa, sem dispensar esta. Entende que, no espaço educativo, os processos são mais relevantes que os produtos, não fazendo jus à realidade, se reduzida apenas às manifestações empiricamente mensuráveis. (DEMO, 2005, p. 108).

Deste modo, a pesquisa proposta teve a intenção de verificar a compreensão dos conceitos

abordados e de que maneira as formas de registro de representação, por meio de objetos de aprendizagem,

contribuíram para o processo de aprendizagem de circuitos elétricos.

PRODUTOS DESENVOLVIDOS NO PROJETO

O trabalho desenvolvido resultou na criação, no software GeoGebra, de Objetos de Aprendizagem

para a representação de circuitos em corrente alternada, quer na sua representação temporal na forma de

equações, quer na representação fasorial, como vetores tratados pelos números complexos ou, ainda, pela

variação periódica de sinais elétricos por meio de gráficos (forma de onda).

A integração entre as várias representações dos fenômenos estudados levou ao interesse pelas

mudanças de registros e representações, fundamentais ao aprendizado de novos conceitos e métodos de

resolução dos problemas a serem solucionados pelos alunos.

A proposta dos Objetos de Aprendizagem disponibilizados foi a de propiciar uma melhor

compreensão entre o teórico e o prático de circuitos elétricos, por meio da dinâmica e interatividade em

diferentes registros, ou seja, partindo de equações trigonométricas e observando formas de onda e

gráficos no plano complexo.

A forma de representação utilizada na resolução de problemas relacionados à teoria de Circuitos

Elétricos pressupõe a existência de um conceito teórico associado, representando ou exemplificando a

realidade ou o fenômeno a ser estudado, nem sempre evidente para o aluno, e que pode representar

dificuldades na interpretação dos resultados esperados.

Uma fonte de tensão senoidal ou alternada produz uma tensão que varia no tempo. As tensões

alternadas são expressas por funções seno ou cosseno para a demonstração escolhida.

É fundamental que se faça distinção entre o fenômeno a ser estudado e suas possíveis

representações; o real aprendizado ocorrerá quando se puder realizar a distinção entre o objeto de estudo e

seus variados registros.

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Assim, o objetivo do aplicativo é proporcionar a possibilidade de visualizar o fenômeno nos três

circuitos apresentados: resistor, capacitor e indutor, pois a representação fasorial acompanha o

movimento na forma de onda.

A análise fasorial pode ser interessante, pois suas operações são bem simples comparadas às

operações trigonométricas que seriam realizadas com as funções senoidais expressas em função do

tempo.

Quando uma tensão alternada é aplicada a um resistor, Figura 1, a tensão cresce até um valor

máximo e cai a zero, depois cresce até um máximo com polaridade invertida retornando a zero,

completando um ciclo. A corrente elétrica no resistor segue a mesma variação da tensão e, portanto, estão

em fase.

Figura 1: Objeto de Aprendizagem de um Resistor. Aplicando-se uma tensão alternada nos terminais de um capacitor, Figura 2, a corrente será alta,

pois o capacitor se opõe às variações bruscas de tensão. A corrente diminui gradativamente e a tensão nos

terminais do capacitor aumenta exponencialmente até chegar ao valor máximo. Por isso, tensão e corrente

no capacitor estão defasadas entre si, sendo que a corrente está adiantada em relação à tensão.

Figura 2: Objeto de Aprendizagem de um Capacitor. Quando se aplica uma tensão no indutor, Figura 3, a corrente leva um determinado tempo para

crescer; agora, a corrente estará atrasada em relação à tensão, ou seja, a tensão está aplicada e a corrente

começa a aumentar.

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Figura 3: Objeto de Aprendizagem de um Indutor. Algumas questões foram propostas durante a observação da utilização dos Objetos de

Aprendizagem pelos alunos. O movimento dos seletores e a interatividade, permitida pelos aplicativos,

propiciou a possibilidade de respostas à estas questões:

a) Se aumentarmos o valor do módulo da tensão, em cada caso, o valor da corrente será alterado?

Compare com o valor teórico calculado.

b) A variação do módulo da corrente alteraria a defasagem entre tensão e corrente? Experimente

para os três circuitos.

QUESTIONÁRIO APLICADO, RESULTADOS OBTIDOS E RESPECTIVAS ANÁLISES

O questionário aplicado era composto de sete questões com seus respectivos objetivos e foi

aplicado aos dezesseis alunos participantes. A seguir, estão as questões com os resultados obtidos e as

respectivas análises.

Conforme exposto anteriormente, o uso de diferentes registros de representação para os fenômenos

elétricos justifica sua aplicabilidade nos Objetos de Aprendizagem. Com base no aporte teórico deste

trabalho, ou seja, segundo Duval (2009), existe uma diversidade de representações semióticas, que podem

ser agrupadas em quatro registros: língua natural, escritas algébricas e formais, figuras geométricas e

representações gráficas.

Deste modo, com a questão número 1, pretendeu-se avaliar a importância das várias

representações possíveis para os circuitos elétricos.

Também é importante que o aluno tenha percepção das correspondências entre as variações visuais

dos gráficos e as alterações significativas na escrita algébrica da relação matemática. É o objeto

representado que importa e não suas diversas representações semióticas possíveis, pois como afirma

Duval (2009, p. 14) “toda confusão entre objeto e sua representação provoca, com o decorrer do tempo,

uma perda de compreensão.”

Portanto, com as questões 2 e 4, pretendeu-se obter informações sobre a familiaridade do aluno

com recursos computacionais.

As questões 3, 5 e 6 permitiram avaliar a importância de recurso adicional às aulas expositivas e

teóricas.

Finalmente, com a questão 7, procurou-se conhecer a avaliação pessoal de cada participante sobre

o objeto apresentado.

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Questão 1: Você já tinha conhecimento sobre as formas de representação possíveis (equação,

gráfico, fasor) na análise de Circuitos Elétricos?

Não (5) Sim (11)

Questão 2: Você já utilizou algum objeto de aprendizagem relacionado a Circuitos Elétricos?

Não (3) Sim (13) Se sim, qual? ___________________________

Com as questões 1 e 2 pretendeu-se verificar se os alunos tinham conhecimento ou já utilizaram

algum objeto de aprendizagem. Como já colocado anteriormente, de acordo com Tavares (2010), a

animação interativa é uma ferramenta pedagógica utilizada para criar uma imagem de um fenômeno

físico construída em consonância com um modelo o qual podemos interagir modificando suas condições

iniciais.

A análise dessas questões, associada à avaliação do objeto proposto, permitiu verificar que a

utilização anterior de um aplicativo semelhante favorece o manuseio do objeto proposto.

Os cinco alunos que responderam negativamente à primeira questão não consideraram possíveis

representações para um mesmo circuito.

Questão 3: Como você avalia a melhora de sua habilidade na análise de circuitos, após utilização

do objeto de aprendizagem apresentado:

(0) não melhorou nada

(3) melhorou muito pouco

(4) melhorou um pouco

(9) melhorou

(0) melhorou muito

As respostas favoráveis da questão 3 permitem verificar a contribuição do Objeto na habilidade de

análise de Circuitos Elétricos.

Questão 4: Se você encontrou dificuldade na utilização do objeto de aprendizagem, especifique

qual foi a dificuldade.

Aluno 2: “minha dificuldade foi em relação à leitura do gráfico, talvez se tivesse uma forma de

obter ajuda, seria legal.”

Aluno 3: “eu gostaria de poder consultar o conteúdo enquanto realizava os testes.”

Aluno 11: “gostaria de conhecer melhor o Geogebra.”

Aluno 13: “leitura do gráfico.”

As observações obtidas da questão 4 mostram que os alunos não apresentam dificuldades para

manusear o Objeto, mas seria pertinente oferecer mais informações prévias sobre o software GeoGebra e

a Teoria de Circuitos.

Questão 5: Preencha o quadro abaixo atribuindo valores de 1 a 5, correspondentes à importância

do uso de objetos de aprendizagem para atingir os objetivos propostos na análise e cálculos de circuitos

elétricos:

1 = nada importante

2 = pouco importante

3 = indiferente

4 = importante

5 = muito importante

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• Compreensão do conteúdo estudado

• Entendimento dos cálculos a serem realizados

• Facilitação dos cálculos a serem realizados

• Fixação do assunto estudado

Compreensão do conteúdo estudado: 9 alunos responderam importante, 4 alunos responderam

indiferente e 3 alunos responderam pouco importante.

Entendimento dos cálculos a serem realizados: 7 alunos responderam importante, 6 alunos

responderam indiferente e 3 alunos responderam pouco importante.

Facilidade dos cálculos a serem realizados: 3 alunos responderam importante, 6 alunos

responderam indiferente e 7 alunos responderam pouco importante.

Fixação do assunto estudado: 11 alunos responderam importante, 2 alunos responderam

indiferente e 3 alunos responderam pouco importante.

Os resultados da questão 5 permitiram verificar a contribuição dos Objetos de Aprendizagem,

construídos com o uso do GeoGebra para a compreensão e fixação do assunto estudado.

Questão 6: Escolha a metodologia de estudo que mais se adéqua a seu perfil:

(1) somente estudos com livros didáticos

(7) estudo com livros e resolução de listas de exercícios

(5) estudo em grupo

(1) estudo utilizando somente os recursos apresentados pelo objeto de aprendizagem

(2) estudo com livro, complementado pelo objeto de aprendizagem

(0) outro, especifique: ________________________________

A questão 6 confirma a prática tradicional na área tecnológica de resolução de listas de exercícios.

Acredita-se que esse projeto possa contribuir para uma alternativa da prática ou comportamento didático,

como uma ferramenta complementar das aulas teóricas e de laboratório.

Questão 7: Faça uma breve análise ou avaliação dos objetos de aprendizagem apresentados

utilizando a seguinte escala:

5=Muito bom

4=Bom

3=Indiferente

2=Regular

1=Péssimo

• Facilidade de interação da interface

• Clareza do conteúdo

• Facilidade de visualização

Facilidade de interação da interface: 6 alunos deram valor 5; 5 alunos deram valor 4; 2 alunos

deram valor 3; 3 alunos deram valor 2

Clareza do conteúdo: 9 alunos deram valor 5; 6 alunos deram valor 4; 1 aluno deu valor 2.

Facilidade de visualização: 9 alunos deram valor 5; 6 alunos deram valor 4; 1 aluno deu valor 2.

Finalmente, a questão 7 permitiu verificar que os objetos de aprendizagem apresentam clareza de

conteúdo e facilidade de visualização. Como proposta de futuras pesquisas, podemos sugerir

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aperfeiçoamento da interface utilizando outros recursos do Geogebra, como sugerido nas respostas da

questão 4.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa teve como objetivo verificar as possíveis contribuições de Objetos de

Aprendizagem que enfatizam a análise gráfica de informações, equacionadas e resolvidas com números

complexos, para a compreensão de Circuitos Elétricos em um curso de Engenharia Elétrica.

Verificamos, nesta pesquisa, que Objetos de Aprendizagem, com as adequações necessárias,

serviram de apoio à construção de conceitos matemáticos envolvidos na análise de circuitos em regime

estacionário. Por envolver grandezas como tensões e correntes elétricas, os circuitos exigem soluções de

equações senoidais ou cossenoidais, nem sempre de simples resolução. Além deste aspecto, foi

considerado que a visualização gráfica pode promover o entendimento dos conceitos e flexibilidade

quando se tratar de circuitos mais complexos, apesar das atividades de conversão de representações de um

mesmo fenômeno não serem triviais e automáticas.

Objetos de Aprendizagem que possam representar as grandezas elétricas, seja na forma de

equação, gráficos e as devidas conversões entre estas representações, possibilitarão ao aluno

“materializar” o conceito ou fenômeno a ele associado, que é uma das principais dificuldades que se pode

observar durante os anos de trabalho da pesquisadora com alunos dos cursos de Engenharia Elétrica.

Saber ler e interpretar informações, dados, gráficos e tabelas, ou seja, a quantificação da

diversidade de informações é fundamental no ensino superior, de maneira a estabelecer uma relação

consistente entre o conhecimento do fenômeno físico e o tratamento da informação decorrente deste.

Sabemos que as representações semióticas permitem dois tipos de manipulação, o tratamento e a

conversão. Segundo Duval (2009, p. 57) “um tratamento é uma transformação de representação interna

a um registro e a conversão está relacionada às operações em que o registro inicial é transformado em

outro”.

Os Objetos de Aprendizagem disponibilizados contribuíram na coordenação de registros gráficos e

algébricos de circuitos elétricos em regime estacionário, pois propiciou uma melhor compreensão entre o

teórico e o prático de circuitos elétricos, por meio da dinâmica e interatividade em diferentes registros

segundo Duval, ou seja, partindo de equações trigonométricas e observando formas de onda e gráficos no

plano complexo.

Para finalizar a análise da pesquisa, nos procedimentos propostos, os alunos tiveram a

possibilidade de transitar pelo tratamento, na medida em que a resolução da equação representativa do

circuito e a visualização gráfica utilizaram os mesmos parâmetros: as tensões e as correntes como podem

ser observados nos Objetos de Aprendizagem.

A conversão também é verificada na utilização dos Objetos de Aprendizagem quando foi possível

analisar o fenômeno pela representação fasorial, em que os registros passam a ser de ângulo e fase,

permitindo a visualização da defasagem entre tensão e corrente, pouco evidente na solução das equações

representativas do circuito proposto.

Esperamos que a proposta apresentada nesta pesquisa possa contribuir para o ensino e

compreensão de circuitos elétricos em cursos de Engenharia Elétrica.

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Os Objetos de Aprendizagem estão disponibilizados no espaço TecDEM do grupo de pesquisa

TecMEM, com as devidas orientações aos usuários interessados, em particular, aos professores e

estudantes de Engenharia Elétrica, no endereço:

http://www.pucsp.br/tecmem/OAs/OAs_Circuitos.html

REFERÊNCIAS

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