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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Renata Slud “AS POSSIBILIDADES DE INVESTIMENTO DE DESEJO NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO MATERNA EM MÃES SOCIAIS” CURITIBA 2010

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Renata Slud

“AS POSSIBILIDADES DE INVESTIMENTO DE DESEJO NO

EXERCÍCIO DA FUNÇÃO MATERNA EM MÃES SOCIAIS”

CURITIBA 2010

“AS POSSIBILIDADES DE INVESTIMENTO DE DESEJO NO

EXERCÍCIO DA FUNÇÃO MATERNA EM MÃES SOCIAIS”

Curitiba 2010

Renata Slud

“AS POSSIBILIDADES DE INVESTIMENTO DE DESEJO NO

EXERCÍCIO DA FUNÇÃO MATERNA EM MÃES SOCIAIS”

Pesquisa elaborada para a monografia de conclusão do Curso Pós Graduação em Psicologia Clínica - abordagem psicanalítica, do Setor de Ciências Biológicas e da Saúde, da Universidade Tuiuti do Paraná como requisito parcial para a obtenção do título de especialista. Sob a orientação do Professor Dr. Jorge Sesarino.

CURITIBA 2010

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.................................................................................................. 5

1.1 FUNÇÃO MATERNA NA CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO.............................. 6

1.2 CASA LAR E MÃE SOCIAL........................................................................... 16

2 CARACTERIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES ................................................... 25

2.1 DESCRIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES................................................................ 27

2.1.1 Instituição 1............................................................................................... 27

2.1.2 Instituição 2............................................................................................... 30

2.1.3 Instituição 3............................................................................................... 37

3 DISCUSSÃO E RESULTADOS ........................................................................ 51

4 CONCLUSÃO... ................................................................................................ 67

REFERÊNCIAS................................................................................................... 70 ANEXOS.............................................................................................................. 75

RESUMO Esta monografia de pós-graduação em Psicologia Clínica - abordagem psicanalítica visa refletir, com o aporte da psicanálise, sobre as possibilidades de investimento de desejo no exercício da função materna em mães sociais, sendo esta uma nova profissão regulamentada por lei. Essa profissão surge, vinculada à criação de uma modalidade de acolhimento chamada “Casa Lar”. Busca-se investigar, nesta pesquisa, o desejo encontrado nas mães sociais, personagens que aceitam acolher crianças e adolescentes que, naquele momento, não estão podendo estar com sua família biológica. Assim, deve exercer a função que é primordial para estruturação psíquica da criança, a função materna. Além do desejo, é proposto também entender – e perceber como as mães sociais lidam – essa nova possibilidade de se constituir famílias “passageiras”, quais são as questões destas sobre o exercício desta função, qual o papel determinante que elas têm na constituição subjetiva das crianças envolvidas nesse processo. Propõe-se também verificar como elas acolhem cada criança em sua particularidade, que lugar essas crianças ocupam no desejo dessas mulheres. São colocadas algumas hipóteses sobre as possibilidades de direcionamento da função materna da mãe social, de acordo com a posição subjetiva de cada uma delas que acolhe estas crianças que lhe são encaminhadas bem como o modo como exercerá sua função implica uma posição muito particular. Para tornar possível a realização da pesquisa optou-se por tomar como objeto de estudo, mães sociais responsáveis pelas Casas Lares selecionadas, da região de Curitiba. Foi realizado o contato com a Coordenação da Casa Lar, solicitando autorização para a realização de entrevistas com as mães sociais que atuam na instituição, além de ter sido explicado o objetivo e a metodologia do trabalho. Com as mães sociais que se disponibilizaram (pois foi proposto e a aceitação era livre) as entrevistas foram realizadas. As entrevistas foram gravadas e depois transcritas. Esta pesquisa foi motivada pela constatação de que o testemunho dessa prática, à luz de algumas reflexões sobre o contexto em que ela surge, é o relato mais fiel para se ter um conhecimento da realidade. PALAVRAS CHAVE: Mãe-social; Casa-Lar; Função Materna; Psicanálise.

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1 INTRODUÇÃO

O abrigo... tem que ter um programa, não é simplesmente um corredor de espera. O tempo pode ser curto, mas dois ou três meses na vida da criança é muito... (MARIN, 1991, p. 44, citado por CARVALHO, 1993, p.3).

(...) não existe isso que chamam de bebê. O que quero dizer, naturalmente, é que sempre que vemos um bebê vemos também um cuidado materno; sem o cuidado materno não haveria bebê. (WINNICOTT, 1978, p. 40).

O tema inicialmente pensado para este trabalho foi: “Função materna na

constituição do sujeito”. Este tema começou a me fazer questão quando fui

convidada para participar de um curso para babás, em que ministraria uma aula

sobre desenvolvimento infantil. Pensando sobre este desenvolvimento, o que me

inquietava era pensar qual a função destas babás no desenvolvimento das crianças,

o que é ser cuidadora, porém não ser mãe, mas em algumas situações passar mais

tempo com o bebê do que a própria mãe. Porém, aos poucos, lendo sobre o tema,

aliado ao trabalho que realizo numa ONG (Organização Não Governamental) que

atende crianças com sofrimentos psíquicos e possui parceria com abrigos, fui

tomando outro direcionamento. Passei a pensar nas crianças que não possuem

mães, ou melhor, que possuem, porém, por algum motivo, não residem com estas,

surgindo então, a figura central do meu trabalho, as mães sociais.

As inquietações passaram a ser na função das mães sociais, pois,

diferentemente das babás, que desenvolvem o papel de maternagem com as

crianças, estas precisam sim desempenhar a função materna, pois como

profissionais das Casas Lares, possuem algumas crianças por suas

responsabilidades.

Borges (2009) afirma que se a maternagem é universal, a função materna é

da ordem do singular. Somente ocorrem inscrições primordiais se os cuidados de

alimentação e higiene forem particularizados por quem exerce a maternagem, já a

função materna singulariza o bebê, a mãe e a relação, inscrevendo o infans num

lugar específico de seu desejo. É por conta dessa especificidade da relação que a

mãe consegue supor demandas do bebê e interpretá-las. O bebê deixa de ter

desconfortos fisiológicos e passa a ter fome, sede, cólica, manha, suas reações são

interpretadas, nomeadas e humanizadas.

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Então, como o objetivo era pensar na função materna, escolhi Casas Lares

que acolhem também crianças de zero a três anos, período que a função materna é

essencial para a constituição do sujeito.

Assim, o trabalho foi delineado para as questões das funções da mãe social,

ou seja, o que as move para cumprirem suas funções? Conforme mencionado na

citação acima, “inscrevendo o infans num lugar específico de seu desejo”, de que

desejo se trata? Que desejo estas possuem para desempenhar a função materna?

Sabe-se ainda que, segundo a psicanálise, toda escolha implica uma posição frente

ao gozo. Sendo assim, seria possível, dizer algo sobre as formas do gozo implicado

nesta questão? E então, o trabalho proposto foi nomeado: “As possibilidades do

investimento de desejo no exercício da função materna em mães sociais.” Afinal,

quando se pensa no significante “mãe”, a partir da psicanálise, pode-se indagar qual

a função de um filho no desejo feminino, pois, “não se trata de um desejo anônimo.”

(LACAN, 1998).

1.1 FUNÇÃO MATERNA NA CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO

Entre a magia e o paradoxo, um sujeito nasce da aposta à sua existência que, de fato, o Outro efetua ao chamá-lo como tal, antes mesmo de que o sujeito exista no real. (CORIAT, 1997, p.96).

(...) se o desenvolvimento depende de um processo maturativo, a constituição de um sujeito não depende para nada dele. E mais, tal processo maturativo faz limite para esse sujeito, porém não o condiciona nem o determina. (...) Para que um sujeito se constitua, não é necessário esperar que uma criança caminhe, ou maneje habilidosamente sua preensão (...), pois há crianças paralíticas cerebrais que nunca manjarão bem a pinça manual, nem caminharão; (...) nem por isso serão menos sujeitos de desejo que outras crianças que gozam de todas as habilidades corporais. (...) É certo que não é do corpo, mas da simbolização que nele se opere que depende a estruturação psíquica. (JERUSALINSKY, 1999, p.37).

Resgatando a idéia de que o bebê pode ser, pela sua condição de extrema

fragilidade em que vem ao mundo, tomado como um "nada" e que dependerá do

Outro (termo lacaniano para designar um lugar simbólico, o inconsciente, o

significante, a lei) cuidador para sobreviver, deve-se ressaltar que este Outro

cuidador poderá ou não ser a genitora. Mas, é essencial, para o sucesso da

subjetivação da criança, que tenha alguém – que deseje – realizando a função

materna.

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A função materna acontece antes mesmo do nascimento do bebê, através

do desejo no qual o casal insere seu filho. Há, no campo da linguagem, da palavra,

uma fala que preexiste ao sujeito, aonde vão se distinguir os elementos particulares,

próprios a cada criança antes mesmo do seu nascimento. (ESTRADA,1998, citado

por CATÃO, 2002).

Kamers (2004) afirma que o desejo implica na possibilidade subjetiva que

permite ao Outro Primordial supor um sujeito onde há somente um organismo vivo.

O que não pode ser qualificado como natural nem instintivo, pois a possibilidade de

quem realiza esta função, de supor uma demanda nos reflexos e automatismos do

vivente, depende da posição que a criança ocupa no fantasma materno. Pois, “a

vida de qualquer bebê ordena-se em função do desejo inconsciente de quem exerce

a função materna.” (CORIAT, 1997, p.120).

Após o nascimento, segundo Winnicott (1982), é preciso um período entre a

mãe e o bebê para que se reconheçam e se adaptem. Pois, ser pai e ser mãe na

ótica psicanalítica não implica apenas paternidade biológica, demanda também,

sentimentos e atitudes de adoção que decorrem do desejo pelo filho, a partir de um

interjogo de fatores conscientes e inconscientes. (DOLTO, 1996). No dizer de Levy e

Féres-Carneiro “os pais biológicos devem, também, adotar o seu filho.” (2001, p.78).

Bernardino (2006) acredita que o cuidador deve estar presente com a

particularidade de seu desejo, para dotar de significação as experiências vividas.

“Pois não adianta fatigar um bebê com uma super estimulação mecânica,

automática, mas que, por não fazer sentido algum, não possibilitará registros

psíquicos, não acionará um circuito pulsional.” (id., 2006, p.31).

Coriat ressalta que,

Ali onde há apenas um corpinho vivo é necessário que a mãe ilusione que há um sujeito com o qual dialogar, representando-o, a ele todo, nessa imagem de corpo que ela vê e sobre a qual deposita seu desejo. A criança só pode chegar a reconhecer sua imagem no espelho, a se reconhecer como Uma, se essa imagem inteira é desejada e libidinizada pela mãe, se a demanda da mãe convoca a criança a responder como Uma. (ibid, p.181).

No dizer de Lacan (1998) o “Estádio do Espelho” é uma identificação, é a

transformação produzida em um sujeito quando ele assume uma imagem, imagem

com efeito formador. A partir dos seis meses a criança começa a conquistar a

totalidade de seu corpo, através do espelho representado por sua mãe, ou pessoa

responsável pela função materna. Nesta fase, a criança se percebe como sendo o

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desejo da mãe e se identifica como uma extensão do desejo materno. O corpo

fragmentado se unifica, pois essa unificação só é possível na presença de um Outro

que o reconheça como Um. Assim, a criança se vê, porque o olhar do Outro a

sustenta.

Coriat afirma: “sabemos que são os pais, em função de seu desejo e suas

possibilidades, os artesãos que constroem este lugar.” (1997, p.83). E ainda, no

dizer da autora (1997) se tem que o adulto que exerce a função materna guia seu

agir sobre o bebê - assim como todos os atos e ações de sua vida - desde o que

lhes dita seu inconsciente. As palavras escritas no inconsciente representam aqui o

simbólico, que dirige a execução da função materna.

Checchinatto (1988, citado por MARIOTTO, 2005) argumenta que a função

materna se situa em dois registros: o da necessidade e o do desejo. Ou seja, o laço

de dependência entre mãe e filho deve se dar tanto no plano biológico, de cuidados

essenciais corporais, como no plano simbólico. Conforme ainda cita Checchinatto

(1988, p. 40 citado por MARIOTTO 2005), é a "prematuridade que leva a uma

dependência de alguém que sirva de suporte simbólico para a criança.” É neste

sentido que as necessidades do bebê serão sempre satisfeitas segundo o código

simbólico dá mãe ou pessoa responsável pela função materna, onde esta oferece ao

filho não apenas alimento, mas também palavras.

Assim, o bebê percebe este lugar que os pais lhe designam através da

alimentação, da maneira que o seguram, que o olham, lhe falam e como brincam

com ele. Sobre isto, Mariotto ainda complementa, “um ambiente enriquecido para o

bebê nos seus primeiros meses, é aquele que se dá a partir do laço com o outro, em

que o olhar e a palavra ocupam postos privilegiados, colocando em evidência

também a qualidade desse outro.” (2009, p.55).

Borges (2009) acrescenta que as primeiras marcas psíquicas são dadas

justamente a partir do investimento emocional da mãe no cuidar de seu filho e na

instalação do mamanhês, que se configura como a fala infantilizada da mãe, que

acredita traduzir para o bebê e para ela mesma o que este está sentindo. É o

estabelecimento de uma relação ímpar entre mãe e filho, que envolve trocas de

olhares que compreendem, confortam, e são traduzidos na fala da mãe com o bebê.

Segundo Laznik “o mamanhês é o dialeto de todas as mães do mundo quando elas

falam com seus bebês: a voz é postada um tom mais alto e a entonação é

exagerada.” (2006, p.98).

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Ainda com Catão, “o manhês indica para o bebê o interesse do Outro

cuidador nele. A voz porta o investimento libidinal que o Outro materno faz no bebê.”

(2008, p.34). Para a psicanálise, com Lacan, a voz define uma função psíquica que,

juntamente com o olhar, é fundadora do corpo da criança assim como de seu

funcionamento. Adotar um bebê na voz é poder escutá-lo, emprestando sentido aos

sons que a criança produz antes mesmo que eles tenham um. Mas é também saber

calar-se para que o bebê se manifeste.

Assim, através da função materna, é possibilitada a condição para a

introdução da criança na linguagem, conforme afirmou Carvalho (2001, citado por

KAMERS, 2004).

Pois,

O mundo que o bebê encontra ao nascer é um mundo de linguagem: já falam dele antes mesmo de seu nascimento. (...) Assim, antes de falar por si próprio, o bebê é falado: dizem-lhe o que sente o que vai fazer o que deve pensar do mundo. (BERNARDINO, 2006, p.25).

Paim (2007) ainda afirma que a mãe, ao exercer a função materna, diz

conhecer o que o bebê quer mesmo antes que ele aprenda a dizer, pois a criança,

em seus primeiros meses, está situada como objeto de desejo da mãe, portanto está

submetida a sua posição e imposição e, segundo Lacan (1998) a relação da criança

não é com a mãe, mas com o desejo da mãe.

Mariotto (2005) diz que se o sujeito é constituído na e pela linguagem é

preciso que ele encontre material significante suficiente para se fazer representar

simbolicamente, tarefa que será inicialmente dividida entre o pequeno ser e o Outro

Primordial. A inscrição de marcas psíquicas realizada nesta operação inaugural de

subjetivação corresponderia ao trabalho de simbolização em que o funcionamento

do ser estaria submetendo-se a um sistema de representações. Trabalho este de

responsabilidade daquele que vem ocupar o lugar do código de linguagem,

operando um trabalho de ciframento e deciframento das experiências.

Szejer e Stewart complementam: O conteúdo do consciente se constrói a partir deste banho de linguagem específico que faz parte dessa família, preexiste à criança e a ela será transmitido. Sua existência consistirá, em parte, em negociar esse banho de linguagem e estabelecer arranjos com seu próprio talento. A criança herdará túmulos de cadáveres, palavras e não-ditos e é em função desta herança que determinará e conduzirá sua própria vida. (1997, p.45).

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Em um entendimento lacaniano, “o sujeito se constitui no campo do Outro",

a mãe sustenta para o seu bebê o lugar de Outro primordial. Movida pelo desejo,

antecipará em seu bebê uma existência que ainda não está lá, mas que virá a se

instalar justamente porque foi suposta. Através do seu olhar, gestos e palavras, a

mãe desenha o mapa libidinal que recobre o corpo do bebê (KUPFER, 2000).

Paim (2007) também se refere ao corpo, no dizer na psicanálise, como corpo

de um sujeito, é simbólico, é letra, capaz de inscrição no processo de uma matriz

simbólica. Este corpo pode ser lido por outros e pelo Outro, por isso o corpo é

imaginário e como a imagem não diz, necessita de um outro que inscreva um dizer

no corpo. O corpo é real (faz o limite), imaginário (é necessário ser representado) e

simbólico (precisa ser lido e inscrito pelo desejo do grande Outro).

Para Dolto (1977), a humanização do bebê emerge na relação da criança

com seus pais, num clima de segurança e de relações humanas contínuas no

espaço e no tempo, na comunicação afetiva, sensorial e verbal.

Sendo assim, o Outro escreve as primeiras marcas no corpo do bebê, as

quais serão os alicerces do seu aparelho psíquico. Faria (2001 apud KAMERS,

2004) afirma ser possível a mãe supor na criança demandas, vontades, desejos e,

em si mesma, a capacidade de interpretar as demandas. Assim, são estas funções

que, enquanto nomeantes, dão existência simbólica à criança. É através de um

nome, significante que representa o sujeito, singularizando-o, que a criança ingressa

na ordem simbólica.

Pode-se perceber que o vivenciar da função materna tem suas vicissitudes

de acordo com as características de cada pessoa que vai desempenhar a função e

cada criança, sendo, então, singular cada desenvolvimento físico, psíquico,

emocional, além das condições ambientais. Sobre isto, Spitz afirma que “há infinitas

variações de mãe para mãe, além de que, cada mãe é diferente de si mesma de dia

para dia, hora para hora, situação para situação.” (2004, p.75). A personalidade

individual do bebê influi sobre esse padrão mutante em processo circular,

influenciando a gama de afetos da mãe por seu comportamento e por suas atitudes,

ainda complementa o autor (id.,2004).

Szejer e Stewart seguem afirmando que “não existe um modelo de boa mãe,

em si, no qual seja necessário se enquadrar, sob pena de falhar, mas existe, para

cada mulher, uma forma própria de ser para seu bebê, o que Winnicott chama de

uma mãe ‘suficientemente boa’.” (1997, p.285).

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Atendo-se ao que Winnicott (1983) teoriza sobre a função materna, tem-se

que, no início da vida, o bebê não tem desejos, mas necessidades corporais que

devem ser supridas por alguém que se identifique com esta criança para saber, de

fato, o que ela precisa. “A maior parte do primeiro ano de vida é dedicado ao esforço

de sobrevivência e à formação e elaboração dos instrumentos de adaptação que

servem a esse objetivo.” (SPITZ, 2004, p.3). A criança, durante este período de sua

vida, é indefesa e incapaz de sobreviver por meio de seus próprios recursos. “O que

falta a criança é compensado e suprido pela mãe. Esta provê a satisfação de todas

suas necessidades.” (ibid, p.3).

Winnicott recorre à expressão “preocupação maternal primária”, sendo

caracterizado por “vontade bem como uma habilidade por parte da mãe para drenar

interesse de si mesma para o bebê.” (1978, p.27). Mariotto (2005) complementa que

a função “preocupação maternal primária” se refere a uma loucura normal entre mãe

e filho, onde a mãe dirige e investe toda a libido no filho tomando-o como objeto

primordial. É como se a mãe pudesse sentir o que o filho sente, já que se coloca

identificada a ele.

Winnicott (1978) coloca nos termos segurar ou sustentar (holding), tocar ou

manipular (handling) e apresentação de objetos (object-presenting) para descrever o

que seria uma mãe suficientemente boa. Segundo Paim, (2007, p.25) no holding a

função materna não somente cuida, mas também libidiniza o bebê, fazendo

mapeamento do corpo, demarcação das zonas erógenas que são marcadas pelo

olhar, pelas palavras e toque. Assim, o corpo do bebê vai sendo investido de desejo

para que este se constitua como sujeito psíquico, portanto inscrito pela função

materna. Winnicott (1983) ainda tem em sua teoria que o holding protege da

agressão fisiológica, leva em conta a sensibilidade cutânea – tato, temperatura,

sensibilidade auditiva, sensibilidade visual, sensibilidade à queda (ação da

gravidade) – e a falta de conhecimento do bebê da existência de qualquer coisa que

não seja ele mesmo. Inclui a rotina completa do cuidado dia e noite, e não é o

mesmo com dois, porque nunca são iguais.

Já o handling inadequado produz extrema tensão na criança, dando base

para sensação de se partir em pedaços. Coriat complementa que “é necessário ter

presente que a manipulação inclui não só as mãos do adulto que tocam o corpo do

bebê, mas também os olhos, que tocam com o olhar, e a voz, percebida desde o

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nascimento como um objeto privilegiado.” (1997, p.52). E a apresentação de objetos

dá início a capacidade da criança para se relacionar com objetos.

Winnicott complementa com a idéia de que a mãe suficientemente boa tem a

capacidade de se adaptar de forma delicada e sensível às necessidades iniciais do

bebê, estabelecendo uma relação com o ego do bebê que facilita para a criança

introjetar as suas ansiedades de forma suportável. (1978).

Além disto, A ‘mãe’ suficientemente boa (não necessariamente a própria mãe do bebê) é aquela que efetua uma adaptação ativa às necessidades do bebê, uma adaptação que diminui gradativamente, segundo a crescente capacidade deste em aquilatar o fracasso da adaptação e em tolerar os resultados da frustração. (id, 1975 p.25).

Nesta questão, pode-se pensar que os pais, algumas vezes, esforçam-se ao

máximo por antecipar-se a todo choro da criança. Porém, não se trata de torturar o

bebê, mas não se deve antecipar seus possíveis pedidos. Winnicott fala sobre “boa

mãe” e diz que à mãe corresponde ilusionar o seu filho, satisfazer de tal forma seus

pedidos que o bebê possa crer-se onipotente. O que se cita muito menos, é que

uma boa mãe deve “desilusionar“ gradualmente seu filho. Pois com tanta ilusão não

é dada ao bebê à chance de ir se apropriando, na medida de suas possibilidades, da

realidade. (CORIAT, 1997).

Nas palavras de Winnicott (1975, p.26):

A mãe, no começo, através de uma adaptação quase completa, propicia ao bebê a oportunidade para a ilusão de que o seio dela faz parte do bebê, de que está, por assim dizer, sob o controle mágico do bebê. O mesmo pode se dizer em função do cuidado infantil em geral, nos momentos tranquilos entre as excitações. A onipotência é quase um fato da experiência. A tarefa final da mãe consiste em desiludir gradativamente o bebê, mas sem experiência de sucesso, a menos que, a princípio, tenha podido propiciar oportunidades suficientes para a ilusão.

Catão (2008) alega que o exercício da função materna está intimamente

ligado a uma dupla capacidade da mãe: por um lado, identificar-se com o bebê e por

outro lado, dirigir-se a ele como a um outro.

Os termos alienação e separação, termos utilizados por Lacan, também

podem ser usados para explicar o que ocorre na relação mãe - bebê nesta fase

inicial. Sobre isto, Coriat (1997, p.236) afirma que:

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Quando um bebê chega ao mundo, passa pelo que Lacan chama de alienação. Ele todo depende completamente dos significantes do desejo de sua mãe, do Outro real. Não tem um desejo próprio porque não tem palavra própria. No começo, os significantes vão se escrevendo no real de seu corpo de forma absolutamente passiva da sua parte. Que possa alguma vez chegar a ter uma palavra própria, que não fique absolutamente colada ao Outro materno, depende da inscrição de um significante em particular, que é o Nome-do-Pai. Este significante é portador da Lei simbólica, que lhe diz que a mãe não é tudo, e lhe permite iniciar o tempo da primeira separação: deixar de ser um puro objeto do desejo da mãe passando a ter um desejo próprio.

No dizer de Lacan (1960/1998, citado por BRUDER; BRAUER, 2007), a

alienação é própria do sujeito. O lugar de Outro, que a mãe – ou a responsável pela

função materna - ocupa neste momento, oferece significantes através da fala,

possibilitando assim que o sujeito se submeta a um dentre os vários significantes

que lhe são oferecidos pela mãe.

Bernardino (2006) complementa afirmando que quando o bebê começa a

falar, é como outro que ele se refere, primeiramente a si mesmo, diz, por exemplo, “é

do nenê” para dizer que algo é dele. Lacan (1956, p.48, citado por BERNARDINO,

2006, p.25) afirma que “recebe a própria mensagem de forma invertida.” Este

processo é nomeado de alienação. “É necessário alienar-se no desejo e nas

palavras de um outro da espécie para poder ter existência simbólica. Tendo em vista

a importância deste outro, que está aí não somente como semelhante, mas como

representante do campo simbólico.” (BERNARDINO, 2006, p.25).

Para o bebê poder falar de si mesmo, tendo seu “eu” como sujeito das frases

leva o tempo de ser marcado pela linguagem e só depois terá a ilusão de dominá-la,

tê-la adquirido. Assim, será necessária a operação de separação, “que desalienará o

sujeito do saber e das palavras deste Outro, para que ele tenha uma existência

simbólica própria.” (BERNARDINO, 2006, p.26).

Bruder (2000) alega que a alienação é estruturante e funda o sujeito, porque

cria um vazio na intersecção entre o sujeito e o Outro, e é isto que faz surgir a falta,

a castração. O desejo da mãe vai marcar o filho, e introduz a criança no mundo

humano. A autora (2000) ainda complementa que o bebê, alienado nessa relação

imaginária, vai formar seu eu à semelhança do outro. Isto começa a mudar quando a

criança percebe a falta no Outro, ou seja, o que define o sujeito e permite que ele

saia da alienação - se separe – é aquilo que lhe falta, que constitui o seu desejo.

(BRUDER e BRAUER, 2007).

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Lacan, (1973/1988, citado por BRUDER e BRAUER, 2007) sobre a operação

de separação revela que esta permite que o sujeito encontre um espaço em que irá

se constituir seu desejo, o qual é desconhecido, o sujeito retorna então ao ponto

inicial, que é o de sua falta como tal. Isso indica que alienação e separação não são

"fases" estáticas, e mostram a oscilação permanente que se verifica entre a

alienação e a separação, como uma alternância sempre renovada.

Para que o processo de alienação ocorra, a mãe, ou outra pessoa que

ocupará o lugar, para desejar cumprir a função materna, precisa se encontrar em

falta simbólica, sobre isto, Baptista (2003) afirma que a mãe em falta busca algo

para tamponar, para suprimir o buraco. A mãe busca um filho, ao preencher a mãe,

a criança encarna o objeto fálico. “(...) tudo se liga ao fato de que a criança é dada à

mãe como substituto, ou mesmo equivalente, do falo.” (LACAN, 1956-7, p. 170). Em

outras palavras, a criança é tomada no lugar daquilo que falta à mãe, isto é, como

objeto de seu desejo.

Já, como explana Borges (2009), algumas outras condições são necessárias

para que processo de separação ocorra a contento. Inicialmente, é necessário - para

que ocorra um investimento libidinal- que a mãe tenha um amor dedicado a seu filho,

depois, é necessário que a própria mãe tenha sofrido o recalque de sua sexualidade

infantil, pois só assim ela conseguirá oferecer um discurso estruturado e marcado

pelo simbólico para a criança. Além disso, é preciso que consiga exercer sua função

para o aparecimento de um eu da criança, para que o corpo, o discurso, inicialmente

colado ao materno vire próprio.

Pois se não, conforme Baptista (2003) coloca, a criança pode saturar a falta

materna, mas agora não mais como substituto fálico, mas como sutura no real, do

corpo do bebê tomado como real na fantasia do Outro, ou seja, empresta o corpo

para o fantasma da mãe.

Ou seja,

Sobre a criança incide um desejo, ligado ao que Lacan chama a exigência do falo pela mãe, e é em relação a esse desejo que a criança irá estruturar-se. O vínculo da mãe com seu filho depende, portanto desse investimento fálico, marcado pelo lugar que a criança ocupa na economia do desejo materno. (FARIA 2001, p. 12, citado por KAMERS, 2004, p.43).

No dizer de Lacan (1998), comentado por Whitaker (2003) faz-se necessário

responder a pergunta: desde que posição esse filho está alienado no desejo

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materno? Para o devir de um sujeito, é necessário um desejo, e, mais ainda, que

tenha um predicativo, a saber, como já citado, que não seja anônimo. Caberá à

‘mãe’ investir de forma particularizada no infans, mesmo que pela via de suas

próprias faltas. Ou seja, para fazer a função materna não basta a maternagem – o

bebê deverá ser ‘capturado’ por quem dele se ocupa. Quanto a sua qualidade,

Sauret “vale mais uma marca negativa que nenhuma marca.” (1998, p.87 citado por

WHITAKER 2003, p.130).

“Este desejo tem a função de nomear, de transformar o grito em apelo, cuja

consequência é a de dar lugar na rede de significante, desde onde esse proto-sujeito

possa se constituir em um sujeito.” (WHITAKER, 2003, p.131).

Kamers (2004) aponta que o filho, ao mesmo tempo em que preenchendo

faz-se objeto amado, gera angústia e satura o desejo do sujeito feminino, sendo uma

mãe preenchida é uma mãe angustiada, pois não deseja como mulher. Assim, o

bebê inscrito na série de objetos fálicos deverá falhar como obturador da falta.

No dizer de Miller (1998) ou a criança preenche ou ela divide. Quanto mais a

criança preenche a mãe, mais ela a angustia, de acordo com a fórmula segundo a

qual é a falta da falta que angústia. A mãe angustiada é, inicialmente, aquela que

não deseja, ou deseja pouco, ou mal, enquanto mulher.

Ou seja, “há uma condição de não - todo, que o objeto criança não deve ser

tudo para o sujeito materno, mas que o desejo da mãe deve se dirigir para um

homem e ser atraído por ele.” (MILLER, 1998, p.8).

Dias prossegue afirmando que,

A intervenção da função paterna vem atualizar, na relação primordial da criança junto à mãe, uma assimetria que vem fazer barreira à devoração da criança pelo desejo materno. A lei dita que a criança não é tudo para a mãe, franqueando sua subtração, descolamento, da imediatez do mundo das coisas e autorizando-a à capacidade de substituição significante, o mundo das palavras. (2008, p.80).

Lacan (1998) revela que a criança, se não pela interferência da função

paterna, pode ser apreendida pelo desejo da mãe, aberta a todas as capturas

fantasmáticas. Pois, Baptista (2003) afirma que o desejo da mãe é infernal e toma a

criança como objeto causa de seu desejo. Assim, conforme citado, algo deverá

intervir para que a separação ocorra, o qual Lacan nomeou como o Nome-do-Pai.

Freud recorre ao período do Complexo de Édipo para explicar a inserção da

Lei, onde na infância, meninos e meninas estão fortemente apegados à mãe e são

16

obrigados a deixar esse estado de extrema satisfação pela interferência daquele que

possui a mãe por direito: o pai. O que pode ser interpretado como a personificação

da entrada da criança no mundo social. Ela deve abdicar de uma satisfação, acatar

a lei que limita seu gozo.

Catão (2008) complementa que para que a mãe alterne presença e

ausência, a função paterna tem que ter deixado as suas marcas na mãe ao longo de

sua própria história. A função paterna é o que marca uma interdição separadora

entre a mãe e o bebê. Seu exercício implica por um basta na plenitude de gozo que

voltaria a criança à dolorosa condição de vegetal. Porém a questão da função

paterna não será aprofundada neste trabalho.

Winnicott (1978) salienta que é parte normal do processo que a mãe

recupere o interesse em si mesma, e isso acontece na medida em que seu filho a

permite. A mãe patologicamente preocupada não apenas continua identificada com

seu filho tempo demais, mas também muda rapidamente da preocupação com seu

filho para uma preocupação anterior.

Szejer (1999 p.162) argumenta que:

Isso exige dela uma renúncia, pois ela já não pode deixar de reconhecer que o futuro do filho a ele pertence. É claro que ela vai influenciar seu desenvolvimento, mas ele já terá começado a construir um lugar para si. Que ela possa reconhecer esse lugar que ele ocupou depende daquele que lhe tiver sido outorgado na sua primeira idade.

1.2 CASA LAR E MÃE SOCIAL

Crianças órfãs, lares impróprios, com experiências de violência parental, são

alguns dos motivos que levam ao crescimento da realidade das crianças

institucionalizadas.

Evidenciando um breve histórico das políticas para a infância e a

adolescência no Brasil, Silva e Mello (2004) contribuem com seu estudo nesta área.

Até 1900, o atendimento às necessidades sociais da população brasileira era de

responsabilidade da Igreja, por meio das Santas Casas de Misericórdia, sem

qualquer atuação do Estado. Em 1922 começa a funcionar, no Rio de Janeiro, o

primeiro estabelecimento público para atendimento de crianças e adolescentes. Em

1942, foi criado o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), então ligado ao Ministério

da Justiça, com enfoque repressivo e, na mesma época, foi criada a Legião

17

Brasileira de Assistência (LBA) para dar apoio aos combatentes da II Guerra Mundial

e a suas famílias, tendo, depois, se estabelecido como instituição de assistência

suplementar para a sociedade civil de modo geral.

Após anos de luta para acabar com o SAM, em função das práticas

repressivas, no ano de 1964 é estabelecida a Política Nacional de Bem-Estar do

Menor (PNBEM), com proposta assistencialista.

Em 1979, foi aprovado o Código de Menores, que tratava da proteção e da

vigilância às crianças e aos adolescentes considerados em situação irregular e se

constituía num único conjunto de medidas destinadas, indiferentemente, a menores

de dezoito anos autores de ato infracional, carentes ou abandonados.

No fim dos anos 1970, surge um movimento social com uma nova visão

sobre crianças e adolescentes — considerando-os sujeitos de sua história —, que

evidenciava a ineficácia da prática de confinamento destes em instituições. Na

década de 1980, que se caracterizou pelo início da abertura democrática, a

legislação e as políticas destinadas aos “menores” passam a ser vistas como

representativas do autoritarismo do período anterior. O crescimento e a

consolidação dessas discussões culminaram com a criação, em 1986, da Comissão

Nacional Criança e Constituinte.

Em 1988, a nova Constituição Federal representou um marco na garantia de

direitos básicos. Nesse contexto, a Constituição contempla a proteção integral a

crianças e adolescentes, além de introduzir o conceito de seguridade social,

agrupando as políticas de assistência, previdência social e saúde. Em 1990, o

Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é elaborado constituindo-se numa

legislação adequada aos princípios da Convenção das Nações Unidas sobre o

Direito da Criança.

Orionte e Souza (2007) ressaltam que, do ponto de vista legal, até a

aprovação do ECA - conjunto de normas jurídicas que complementa o artigo 227 da

Constituição Brasileira - a criança não era reconhecida como cidadão, como sujeito

de direitos, mas como um sujeito incompleto e incapaz, cujas necessidades

deveriam ser expressas através da voz do adulto. Assim, a partir de então, as

crianças passaram a ter direitos no formato de um Estatuto. Ele representa um

divisor de águas na história da infância e da adolescência brasileiras, pois instaurou

direitos para todas as crianças e adolescentes, entendendo-os como sujeitos de

direitos e garantindo um atendimento integral, que leva em conta as diversas

18

necessidades desse público. O estatuto também cria medidas protetivas e sócio-

educativas.

Assim, atualmente sendo crianças de direitos consolidados, pode-se dar

sequência a pensar nas Instituições de acolhimento.

No artigo 101 do ECA (Brasil, 1990) § 1, este preconiza que o acolhimento

institucional e o acolhimento familiar são medidas provisórias e excepcionais,

utilizáveis como forma de transição para reintegração familiar ou, não sendo esta

possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de

liberdade.

Cavalcante e Magalhães (2007) citam que consideram o abrigo – instituições

de acolhimento- como instrumento da política social, quando oferece assistência à

criança que se encontra sem os meios necessários à sobrevivência (moradia,

alimentação, atenção à saúde e educação), ou mesmo diante da incapacidade dos

pais e/ou responsáveis para cumprir com as obrigações de guarda e sustento dos

filhos, por um tempo determinado ou de maneira definitiva.

As autoras (id, 2007) complementam que a permanência da criança em

instituição de abrigo, ainda que de modo provisório, é recomendada somente em

situações reconhecidas como de abandono material (precárias condições de

moradia, alimentação, higiene e saúde da criança) e/ ou abandono moral (processos

de socialização sem qualquer forma de orientação e apoio responsivo dos pais e

outros familiares).

Segundo Prada e Weber (2006) os sistemas de abrigamento diferem quanto

à modalidade de atendimento. Os abrigos (do tipo tradicional) são instituições para

crianças e adolescentes em situação de risco pessoal ou social, onde estas moram

e são cuidadas por funcionários, que exercem a função de monitores ou

educadores, e são responsáveis por suprir as necessidades básicas de alimentação,

higiene, saúde, educação, afeto e organização da rotina diária das crianças. O

espaço físico é comunitário e sua principal característica é o grande número de

crianças por cuidador. Já a Casa Lar, foco do trabalho, é um sistema de organização

de instituições que abrigam crianças em situação de risco pessoal ou social, ou

abandono. O objetivo da estrutura de uma Casa Lar é garantir o direito da criança às

necessidades básicas de educação, saúde, lazer e afeto, através do convívio

familiar substituto, denominado família social.

19

A idéia de Casa Lar foi inicialmente pensada por Hermann Gmeiner em 1949

em Imst, na Suíça, como uma saída psicológica viável para as crianças filhas de

pais mortos na guerra, ou de famílias desfeitas pela mesma causa. Encontrado no

site Aldeia de Crianças SOS (UMA NOVA) tem-se que o seu fundador Hermann

Gmeiner conseguiu aplicar uma idéia fundamental e realizar um sonho, dar uma

mãe, irmãos, irmãs, uma família e um lar às crianças órfãs e abandonadas da II

Guerra Mundial.

Prada; Williams e Weber definem a Casa Lar como:

Um sistema de organização de instituições que abrigam crianças em situação de risco pessoal ou social ou abandono. O objetivo da estrutura de uma Casa Lar é garantir o direito da criança às necessidades básicas de educação, saúde, lazer e afeto por meio do convívio familiar substituto, denominado família social. A família social é composta, geralmente, por um casal social, ou apenas uma ‘mãe social’, que passa a morar na casa, com as crianças abrigadas. Essa casa deve ser preparada para uma família, gerenciada financeiramente por uma organização privada ou pública. O casal (ou mãe) social terá como tarefa agregar afetivamente as crianças em situação de risco pessoal ou social. Quanto ao número de crianças, essas são aproximadamente de oito a dez em cada casa, contando com os possíveis filhos do casal ou mãe social. O espaço físico é o mais semelhante possível ao de uma casa convencional, com quartos, banheiros, o quarto do casal, sala, cozinha e área livre (quintal ou varanda). (2007, p.17).

Segundo o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de

Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (Brasília, 2006),

Casa Lar ainda é definida por uma modalidade de acolhimento Institucional dividida

em unidades residenciais, nas quais pelo menos uma pessoa ou casal trabalha

como cuidador residente – em uma casa que não a sua- prestando cuidados a um

grupo de crianças e/ou adolescentes. As Casas Lares têm a estrutura de residências

privadas, podendo estar distribuídas tanto em um terreno comum, quanto inseridas,

separadamente, em bairros residenciais. Carreirão (2004) complementa que pode

ser uma casa com estrutura de uma residência privada, podendo ser de propriedade

ou alugada pela instituição responsável pelo programa.

Ainda segundo um projeto realizado pela prefeitura de Porto Alegre em

conjunto com a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Porto Alegre, 2006), o

espaço da Casa Lar deve constituir-se em ambiente de maior estabilidade, evitando

o ingresso e saída constante de crianças, de modo a proporcionar a estabilidade

necessária ao ambiente caracterizado como doméstico.

20

Prada e Weber (2006, p.10) também fazem este destaque,

A importância do sistema Casa Lar está, primordialmente, na proposta de acolhimento da criança em um ambiente o mais próximo possível do de uma família, priorizando os vínculos afetivos e a individualidade de cada criança, que deve ser respeitada em suas necessidades particulares.

Esta modalidade de acolhimento institucional surgiu com o objetivo da

criança/ adolescente poder vivenciar uma dinâmica familiar, verifica-se que se

buscou estar em consonância com as disposições do ECA (Brasil, 1990), o qual

prevê em seu Art. 92. que as entidades que desenvolvam programas de acolhimento

familiar ou institucional deverão adotar os seguintes princípios: preservação dos

vínculos familiares e promoção da reintegração familiar; integração em família

substituta, quando esgotados os recursos de manutenção na família natural ou

extensa; atendimento personalizado e em pequenos grupos; desenvolvimento de

atividades em regime de co-educação; não desmembramento de grupos de irmãos;

evitar, sempre que possível, a transferência para outras entidades de crianças e

adolescentes abrigados; participação na vida da comunidade local; preparação

gradativa para o desligamento; participação de pessoas da comunidade no processo

educativo.

A manutenção do trabalho executado pelo Programa de Abrigagem

Modalidade Casa Lar, também, ainda segundo o ECA (Brasil, 1990) deve considerar

os seguintes aspectos: preservar a identidade e oferecer ambiente de respeito e

dignidade às crianças e adolescentes; oferecer instalações físicas em condições

adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança; oferecer vestuário e

alimentação suficientes e adequados à faixa etária das crianças e adolescentes

atendidos; proceder a estudo social e pessoal de cada caso.

Sá (1998) ressalta que a palavra Casa sugere a idéia de moradia, habitação,

residência, espaço de proteção e conforto, entre outras. O atributo Lar tem um

sentido de Instituição familiar, espaço doméstico. A proposição Casa Lar reflete o

ideal de abrigo temporário para acolhimento de crianças e jovens em situação de

risco, abandono ou privação econômica, com a intenção de fortalecer vínculos

afetivos e humanizadores das relações institucionais.

Figueiredo (2006) afirma que vinculada à criação da Casa Lar surge, com

um papel central, uma nova profissão denominada mãe social, cuja natureza é a

mesma dos educadores, com a função de receber e cuidar das crianças que

21

chegam a esta modalidade de acolhimento, de forma a propiciar as condições

familiares ideais ao seu desenvolvimento.

Então, como já comentado anteriormente, a função materna, em que o nome

esclarece, não é obrigatoriamente desempenhada pela mãe biológica. Ela pode ser

desempenhada por outra pessoa. Levy e Féres-Carneiro afirmam que:

O vínculo emocional entre pais e filhos não decorre, portanto, diretamente da concepção e do nascimento, mas da atenção diária as necessidades físicas e afetivas da criança, do investimento narcísico feito. O provedor daquelas necessidades construirá uma relação nas mesmas bases das que são formadas por pais biológicos, tornando-se um ‘pai psicológico’, cujos cuidados fazem à criança sentir-se valorizada, desejada e parte do grupo familiar. (2001 p.78).

Os autores ainda ressaltam que:

O sentimento de filiação é antes de tudo simbólico, fundado no reconhecimento do que uma geração deve à precedente: não nos sentimos irmãos de alguém em função de um registro de estado civil, mas pela possibilidade de evocar uma serie de experiências comuns de momentos compartilhados. (ibid, p.78).

Pensando nestas outras pessoas que não a genitora em desempenhar a

função materna ater-me-ei em discorrer um pouco sobre as mães sociais, que, pela

Lei nº. 7.644, (Brasília, 1987) art. 2º. “Considera-se mãe social, para efeito desta Lei,

aquela que, dedicando-se à assistência ao menor abandonado, exerça o encargo

em nível social, dentro do sistema de Casas Lares.”

Os pais sociais funcionam como pais biológicos, ou mesmo adotivos e são

incumbidos de prover um lar saudável para as crianças que ainda não tiveram

resposta sobre sua situação legal de adoção ou recolocação. Esses pais -que

podem ser casados ou solteiros, dependendo da instituição- ficam responsáveis por

essas crianças com futuro incerto.

Sá define como uma “pessoa da comunidade supostamente qualificada para

cuidar de crianças e jovens residentes em uma Casa Lar.” (1998). A autora ainda diz

da mãe social como mãe substituta, aquela que cuida, protege, guarda, zela pelo

bem-estar, integridade física e moral das crianças.

Diferencia-se da mãe biológica ou adotiva por exercer uma atividade remunerada, a partir de parâmetros preestabelecidos, com sentido de tutela e assistência social. Assume uma simultaneidade de atribuições como autoridade, pessoa de referência, coordenadora, administradora e

22

educadora. Ao mesmo tempo, pratica uma espécie de maternagem e, talvez, cumpra também a função paterna pelas circunstâncias de seu trabalho. (SÁ, 1998).

Segundo Carvalho (1993, apud FIGUEIREDO, 2006), o dirigente da entidade

a qual pertence a Casa Lar, é quem tem a guarda institucionalizada das crianças.

Cabe a mãe social promover oportunidades às crianças acolhidas nas Casas

Lares, na perspectiva de garantir a preservação dos direitos fundamentais da

criança e do adolescente no seu desenvolvimento integral.

Appell (1998, citado por NOGUEIRA e COSTA, 2005) afirma que, se ocupar

de um bebê implica levar em consideração uma série de noções e detalhes.

Demanda estar atento às manifestações da criança, vigilante quanto a seu bem

estar, envolver-se, no sentido de garantir bons cuidados corporais e afetivos e, se

necessário, levar em consideração seu mal-estar. A autora ressalta também que

esses fatores tomam uma importância ainda maior, quando se trata de cuidar de

crianças separadas de seus pais. Para tanto, é fundamental que o adulto se

mantenha atento durante os momentos de cuidado. Essa atenção deve buscar

compreender o que o bebê exprime, para que se possa ajustar o mais finamente

possível às suas necessidades.

No dizer de Coriat (1997, p.81):

Se faltam os pais de um bebê, outro adulto deve suprir esta carência. Os bebês estão dispostos a aceitá-lo. Os bebês humanos são incrivelmente adaptáveis às condições e aos personagens mais diversos; mas esta maravilhosa capacidade de variação tem seus limites. É obvio que um bebê não sobrevive se não há alguém que se faça cargo de mantê-lo. Mas, desde Spitz, sabe-se que não basta alimentá-lo ou cuidar de sua limpeza e temperatura: é imprescindível que, além disto, seja alimentado de libido. E apesar dos avanços da tecnologia, não se pode alcançar sua industrialização: a libido segue sendo um produto artesanal, dosável e transmissível exclusivamente de maneira singular (mediante desejo).

A autora (1997) ainda coloca que se um bebê passa seu tempo de vida em

uma Instituição, isso não é nem bom nem mau por si só, a questão é se aparece ou

não alguém que se faça a função materna, porque sim (e não por obrigação).

Alguém que faça cargo de sua ‘adoção’ libidinal singularizando-o.

Nogueira e Costa (2005) apontam que ao se pensar na dinâmica da criança

dentro da Instituição, é inegável o fato de que a mãe social é aquela que a

acompanha, permitindo que ela seja capaz de falar sobre si, por meio de

brincadeiras (no caso de crianças pequenas), ações e diálogos. Sendo assim, esses

23

profissionais têm papel e função fundamentais dentro da instituição, pois lidam

diretamente com as crianças, estão mais próximos, acompanham o desenvolvimento

e as aquisições de cada uma de forma mais direta.

Golse (2002, apud NOGUEIRA e COSTA, 2005) complementa que dentro

destes papéis fundamentais, os cuidados são os que podem ser observados mais

diretamente nos momentos de rotina e do dia-a-dia da Instituição, como banho,

higiene, alimentação, repouso, brincadeiras. E assim pode se constituir a relação

afetiva entre a mãe social e as crianças, além dos momentos de lazer, de jogos e

durante as diferentes atividades desenvolvidas pela criança e acompanhadas por

essa profissional ao longo da rotina Institucional.

Buscando informações sobre esta profissão de mãe social, pode-se remeter

a Lei nº. 7.644 (Brasília, 1987) que dispõe sobre a regulamentação dessa atividade.

Selecionando alguns artigos, o art. 4º. se refere ao que são as atribuições da mãe

social: propiciar o surgimento de condições próprias de uma família, orientando e

assistindo os menores colocados sob seus cuidados; administrar o lar, realizando e

organizando as tarefas a ele pertinentes; dedicar-se, com exclusividade, aos

menores e à Casa Lar que lhes forem confiados.

Como parágrafo único tem-se que a “mãe social”, enquanto no desempenho

de suas atribuições, deverá residir, juntamente com os menores que lhe forem

confiados, na Casa Lar que lhe for destinada.

No art. 6º encontra-se que o trabalho desenvolvido pela mãe social é de

caráter intermitente, realizando-se pelo tempo necessário ao desempenho de suas

tarefas.

Além da lei que regulamenta a profissão, Figueiredo (2006) cita que existe

uma recomendação redigida pela Secretaria de Estado do Trabalho e da Assistência

Social da Criança e do Adolescente que define o atual “perfil da mãe social” que

reza pelos seguintes itens: Idade mínima de vinte e cinco anos, boa sanidade física

e mental, curso de primeiro grau, aprovação em estágio, boa conduta social,

aprovação em teste psicológico específico, capacidade de compreender a infância e

adolescência como um momento de vida peculiar, vontade e habilidade para

trabalhar com crianças e adolescentes em situação pessoal e social de risco,

portadores ou não de necessidades especiais, capacidade de organização e

gerenciamento da Casa Lar, capacidade de liderança, dinamismo, iniciativa,

criatividade, paciência, capacidade de diálogo e escuta, comprometimento com o

24

trabalho junto á crianças e adolescentes, afetividade e carinho por crianças e

adolescentes, disponibilidade para aprender e ensinar, capacidade para exercer a

autoridade e colocar limite, de forma equilibrada, crença nas possibilidades das

crianças e adolescentes, enquanto sujeitos de direito.

Estas leis são de fundamental importância, pois, como visto no pensamento

psicanalítico, a função materna é fundamental desde a etapa mais precoce do

desenvolvimento humano. Pois, a partir desta função que o cuidado com o bebê –

físico e psiquicamente- é garantido. Cuidado este que vai além do plano

autoconservativo (fome, dor, frio…), que passam para a criança um olhar amoroso,

abrindo assim a possibilidade da constituição de um sujeito, pois não há

desenvolvimento sem que haja uma estrutura subjetiva que o possa sustentar, ou

seja, o organismo só se desenvolverá na medida em que estiver posto em um

contexto cultural, humano, constituído pela linguagem e, portanto, perpassado pelo

desejo, caso contrário, o organismo “por si mesmo e em si mesmo não arma laço,

não estabelece laço social.” (LEVIN 1997, p.28 citado por SILVEIRA 2003, p.117).

Assim, pode-se pensar na importância da pesquisa neste tema, pois, as

mães sociais podem ser as responsáveis pelos primeiros contatos e investimentos

na criança, visto que o público escolhido para o trabalho são mães sociais

responsáveis por crianças com idade de zero a três anos. Então, nesta pesquisa

inicial me dispus a buscar referências sobre este tema, e assim percebi que há muito

pouco escrito, por isto a pesquisa de campo, como entrevista se faz necessário.

Assim, o presente trabalho teve como objetivo buscar a relação da mãe

social com a função materna perpassando pelo desejo envolvido e a maneira como

ocorre o exercício desta função. Ainda pode-se destacar as questões e dificuldades

destas sobre o exercício da função, verificar como percebem a partida das crianças,

analisar o papel determinante que estas têm na constituição subjetiva das crianças

que por elas são cuidadas, perceber se acolhem cada criança em sua

particularidade, além de verificar como se percebem no exercício da função.

25

2 CARACTERIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES Tendo em vista que a diretriz definida pelo ECA (Brasil, 1990) indica que a

medida de proteção de abrigo deve garantir o atendimento personalizado, em

pequenos grupos e sem separação de grupos de irmãos, a modalidade Casa Lar

surgiu como alternativa complementar ao abrigo institucional, buscando proporcionar

às crianças e adolescentes a possibilidade de desenvolverem-se em um modelo de

abrigagem que se aproxima do modelo familiar e doméstico, que não pode ser

proporcionado no ambiente institucional, dada a circulação de diferentes cuidadores.

Sendo a medida protetiva de abrigo transitória, a permanência da

criança/adolescente deve ocorrer durante o menor tempo possível. Segundo um

projeto realizado pela prefeitura de Porto Alegre em conjunto com a Fundação de

Assistência Social e Cidadania (Porto Alegre, 2006), a experiência no trabalho com

abrigos desenvolvida pela FASC (Fundação de Assistência Social e Cidadania) nos

últimos onze anos mostra que a transitoriedade prevista nem sempre pode ser

efetivada, levando-se em conta uma série de fatores: características do

funcionamento familiar que inviabilizam o rápido retorno, fragilidade da rede de apoio

às famílias em situação de risco pelas diversas políticas públicas (saúde, saúde

mental, habitação e geração de renda), a vulnerabilidade cada vez maior que faz

com que as famílias ampliadas não consigam assumir o cuidado das crianças e

adolescentes até mesmo em situações de óbito dos pais, o número reduzido de

adoções de crianças mais velhas, adolescentes e grupos de irmãos, a morosidade

dos processos judiciais, entre outros.

Assim, a experiência indica que o espaço da Casa Lar deve constituir-se em

ambiente de maior estabilidade, evitando o ingresso e saída constante de crianças,

de modo a proporcionar a estabilidade necessária ao ambiente caracterizado como

doméstico. Apesar da continuidade da tentativa de manter o investimento no reforço

e manutenção dos vínculos familiares e comunitário.

Com o objetivo de identificar, na sutileza que as palavras e as observações

permitem, foram realizadas entrevistas com sete mães sociais de três diferentes

Instituições buscando perceber as possibilidades de investimento de desejo no

exercício da função materna em mães sociais. Em cada Instituição foi feito contato

com uma responsável local, sendo assistente social, diretora e psicóloga,

respectivamente das Instituições 1, 2, e 3.

26

Como o foco foi no período em que a função materna se faz essencial para a

constituição subjetiva, foram escolhidas mães sociais que tivessem sob sua

responsabilidade crianças de zero a três anos.

Pensando através do dizer de Bernardino (2006, citado por BORGES 2009),

que o bebê possui reflexos que só funcionam quando encontram alguém para dar

sentido - direção, significado, sensibilidade - a eles, pode-se perceber a dimensão

do lugar que ele vai dar a este que vai humanizá-lo, lugar de um Outro primordial

que, com suas palavras, seu olhar e seus toques marca-o com o seu desejo.

Jerusalinsky complementa que o processo educativo que os pais cumprem em

relação a seus filhos – banho, amamentação, sono – gera uma mensagem às

crianças para que estas se ajustem e correspondam aos ideais de filho demandados

pelos pais. Dessa forma, toda organização constitutiva da criança será dada pelo

desejo do Outro. (1999, citado por BORGES, 2009).

Então, que desejo é este que é primordial para que uma criança nasça como

sujeito? Como desejo, tem-se por Doron e Parot (2006, p. 227) que as condições de

possibilidades da formação do desejo são dispostas no decorrer da experiência de

satisfação. Esta ocorre quando a excitação proveniente de uma necessidade interior

é amainada pela obtenção do objeto específico. O desejo inconsciente é portanto

definido como visando primitivamente a uma repetição alucinatória de uma

percepção anteriormente associada à satisfação, o que explica sua propensão a

manifestar-se no sonho ou na fantasia.

Ou seja, há algo da história de vida de cada pessoa, uma singularidade que

a possibilita fazer suas escolhas, desejar algo, e isto vale também no que diz

respeito a desempenhar a função de mãe social.

As Instituições contatadas então, pertencem a modalidade de abrigo Casa

Lar, tendo características, como vistas, comuns e também singulares como serão

descritas a seguir.

Ao entrar em contato com as três Instituições, percebeu-se uma grande

receptividade das responsáveis locais, que agendaram horário para a conversa. No

contato feito pessoalmente, as responsáveis locais deram atenção devida,

mostrando a Instituição após a conversa inicial que esclarecia sobre seu

funcionamento.

Neste primeiro momento, pode-se perceber que nas três Instituições as

instalações físicas eram aparentemente adequadas e limpas, parecendo ter um

27

cuidado com o material utilizado com as crianças. As Instituições 1 e 3 por

agruparem algumas Casas Lares no mesmo terreno, contavam com um amplo

espaço externo de área verde, já a Instituição 2, menor com somente uma Casa Lar

possuía um espaço mais restrito. As casas possuem em geral quartos separados

para meninos e meninas e um quarto para o casal, armários e camas

individualizados para cada criança, um a dois banheiros, sala e cozinha.

As Instituições visitadas se localizam em bairros mais afastados do Centro,

mas sempre com estrutura de saúde pública e escola por perto.

Logo após o contato e a observação da estrutura, as responsáveis locais já

possibilitaram o início das entrevistas. A Assistente Social da Instituição 1 passou

pelas Casas Lares verificando a disponibilidade das mães sociais para a realização

das entrevistas naquele momento, se prontificando a cuidar das crianças durante

este período. Em geral as mães sociais desta Instituição estavam brincando com as

crianças menores, que não haviam ido a escola, por ser no meio da tarde. As outras

responsáveis locais já pediram para que as mães sociais dessem um jeito para dar a

entrevista, parando o que estavam fazendo e estas prontamente deram um jeito de

iniciar a entrevista.

2.1 DESCRIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES

A fim de resguardar a identidade das Instituições participantes bem como

das mães sociais que concederam entrevistas, será utilizada as letras MS acrescida

de números para designar as diferentes mães sociais entrevistadas, seguido entre

parênteses da palavra Instituição e um número de 1 a 3 correspondendo aos três

diferentes lugares que a pesquisa foi realizada, cujas falas serão citadas ao longo

desta exposição, por exemplo, MS 1 (Instituição 1).

2.1.1 Instituição 1

Na Instituição 1, quem forneceu as informações gerais foi a Assistente

Social. Esta relata que a Instituição é uma ONG (Organização Não Governamental),

baseada no ideal cristão, que existe há mais de vinte e cinco anos. Possui duas

casas lares e um berçário. O casal mora na Instituição, sendo o marido voluntário e

a mãe contratada, responsável por uma das Casas Lares. Cada casa é constituída

por uma mãe e um pai social, caso o casal tenha filhos estes podem morar junto,

28

uma folguista e uma diarista além de uma atendente geral que acompanha as

crianças em algumas atividades. As crianças mais novas ficam no berçário com as

atendentes, e por volta dos dois anos e meio vão para uma das Casas Lares, caso o

processo jurídico permaneça sem definição, porém não é habitual de acontecer. A

mudança do berçário para a Casa Lar é justificada pela idéia da busca de uma

noção de família, com o objetivo de um maior desenvolvimento das crianças, além

da questão da sociabilidade com crianças de diferentes idades.

A busca da captação por mães sociais é realizada nas Igrejas, ou por

indicações de conhecidos de pais que já trabalham na Instituição. A seleção é

realizada através de entrevistas, testes pela parte da Psicologia, visita a residência

da candidata, além da família ser chamada como um todo (que se faz necessário),

para saber se todos estão de acordo, pois devem abdicar do modo que vivem para

morar na Casa Lar.

É realizado um curso de capacitação por módulos englobando desde

explicações sobre a parte administrativa, o serviço social, o acolhimento das

crianças, a psicologia (desenvolvimento infantil), entre outros assuntos.

Possuem um projeto nomeado “cuidando cuidador”, em que as mães sociais

participam discutindo temas de interesses próprios além de ser um espaço

disponibilizado para falar sobre as angústias que sentem no cotidiano.

Assim, estando a profissional apta a assumir uma Casa Lar esta inicia

acompanhada pela Psicóloga e pela Assistente Social.

Durante as entrevistas com as mães sociais, algumas interrupções

ocorreram, em sua maioria, as crianças querendo alguma coisa.

A entrevista com a MS 1 (Instituição 1) foi realizada na sala de sua casa,

esta ficou com uma criança no colo a entrevista toda e, enquanto a mãe conversava

comigo a Assistente Social dava uma olhada nas crianças. A assistente social

interrompe a entrevista num dado momento elogiando a mais nova mãe social.

Durante a entrevista as crianças querem atenção e a MS 1 (Instituição 1) atende

solicitamente e vai ver o que elas querem, na segunda vez as crianças aparecem

querendo folha, e esta dá atenção novamente, “vão lá desenhar”. Com a MS 2

(Instituição 1), que é atendente de berçário, mas já foi mãe social, a entrevista

ocorre no banco ao lado de fora do berçário, com as crianças circulando e brincando

por perto. Durante a entrevista, as crianças querem motos e ela vai lá dar atenção e

29

volta com uma criança no colo, chorando. Logo depois cai uma criança e chora, e

MS 2 (Instituição 1) pega no colo dando atenção.

Antes de todas as entrevistas é lido o Termo de Consentimento ficando de

livre a adesão ao trabalho.

Em entrevista as mães sociais desta Instituição, inicialmente questionando

como seria o funcionamento de uma Casa Lar, foram obtidas respostas como:

“Normal, dona de casa, com uma porção de filhos, crianças de dois anos até cinco anos.” (MS 1

Instituição 1). “(...) tem que levantar as seis da manhã, para arrumar as crianças pra escola, as sete

da manhã eles têm que estar lá na frente. (...) Eu era a primeira a acordar e a última a dormir, é

cansativo, bem cansativo. Mas, tem seus momentos bons, tinha folga, tinha uma pessoa que me

ajudava a limpar em casa. Mas a gente não têm a privacidade da gente, às vezes a gente quer sair

com o marido, com o filho e não tem como. Os anos que fui mãe social, nunca saí com meu marido a

noite, jantar fora. Eu tinha a minha folga, mas saia de folga e ficava com a cabeça aqui, não se

desliga, ficava pensando se eles estavam bem.” (MS 2 Instituição 1).

Com relação as características necessárias a uma mãe social, a de que “tem

que ter tudo” apareceu em alguns discursos, como segue nas falas a seguir: “Acho

que experiência, com filhos, com as crianças, é o principal porque você ta com as crianças dia e

noite, tem que ter bastante vontade. Pra mim é tudo, você tem que ter tudo, tudo que precisar você

tem que fazer.” MS 1 (Instituição 1). “Tem que ter de tudo um pouco (2X), porque se não ela não

consegue controlar, tem que ser carinhosa, saber a hora do carinho, tem que ser rígida, ter pulso

firme dependendo da criança, mas você tem que dar muito (enfatizando) amor, tem que passar pra

eles que você ama eles, eles já vieram de uma situação bem complicada. Se você trabalha com uma

criança e nunca fala que ama, que trabalho que é esse? Aqui a gente vive falando que gosta demais.”

MS 2 (Instituição 1).

Sob este tema, pode-se adentrar no tema primordial do trabalho, que seria a

questão do desejo, ou seja, o que move esta mãe social a cumprir suas funções,

que desejo possui para desempenhar a função materna?

As mães sociais desta Instituição já haviam trabalhado com crianças em

outro momento da vida delas, a MS1 (Instituição 1) relata, “eu comecei cuidando de

crianças em casa, eu cuidava de vinte na minha casa, desde nove anos eu cuidava de criança, desde

os nove anos. (...) A gente começou aqui vindo no culto, com o padre e daí a gente viu que era, a

gente gostou, não sei, sabe assim quando a gente chega e gosta do trabalho e como nos fizemos o

curso e daí entramos aqui.”

MS 1 (Instituição 1) complementa dizendo que gosta que suas crianças são

pequenas, então fica tranquila de deixá-los mais soltos brincando no parquinho.

Mas ainda afirma que as crianças da Casa Lar são diferentes das que cuidava, “eles

são diferentes, as crianças são diferentes, você tem que dar mais atenção, sabe? E se um ta

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acontecendo alguma coisa você tem que parar com tudo e ver o que é, né, e os meus lá não né, eu

ficava a semana toda com eles e até as sete horas a mãe passava pegar.”

MS 2 (Instituição 1) também enfatiza que sempre trabalhou com crianças, “eu

tenho uma filha de vinte anos, e faz vinte que trabalho com criança,(...) quando eu tinha nove, dez,

onze anos eu já era babá, já cuidava das crianças do meu primo, sempre gostei. Sempre falo que se

eu sair daqui hoje não vou saber fazer outra coisa, sabia? Só com criança que eu gosto de trabalhar,

demais.” Quando questionada sobre como se percebia com as crianças, esta ri, como

se demonstrasse algo de uma espontaneidade, “é tão difícil de falar, eu me sinto tão bem

com eles, igual eu te falei, se um dia eu sair daqui eu vou sofrer tanto, eu acho que sou carinhosa,

claro que na hora de por limite, tem que por limite.” MS 2 (Instituição 1).

Quando questionadas sobre as dificuldades no exercício da função de mãe

social, alguns aspectos apontados foram o cansaço que gera estar disponível dia e

noite no trabalho, a falta de privacidade e o quanto tem que cuidar de si no aspecto

mental, pois se não, como afirma a MS 2 (Instituição 1) “ao invés de passar coisa boa a

gente ficava ruim.” MS1 (Instituição 1) ainda não encontrou dificuldades, pois faz um

mês que está como mãe social, “a outra mãe saiu de licença maternidade, só estou cumprindo

este tempo.” Questionada se tem vontade de ficar, “tenho, por enquanto estou gostando.

Como os meus são pequenos ficam mais por aqui, tem parquinho. Eu lá na minha casa também tinha

um parquinho, fazia minhas coisas na casa e eles ficavam tudo brincando quietinho.”

Sobre assegurar a individualidade de cada criança MS 2 (Instituição 1)

garante que “a gente passa a conhecer cada uma delas, conhece o gosto de cada uma, do que

gosta, do que não gosta, do que gosta de brincar, passa a conhecer cada uma, porque eles chegam

bem pequenos, e conhece cada uma delas.” MS 1 (Instituição 1) também afirma que dá sim,

sempre com o cuidado de conhecer cada uma das crianças.

Em se tratando de passar valores e referências, MS 1 (Instituição 1) alega,

“eu acho que a gente tenta fazer o mais possível com eles, ensinando o que é certo. (...) Tem que dar

amor e dar o limite.” E ainda, "tudo que fez pros filhos tem que fazer pra eles.”

2.1.2 Instituição 2

Na Instituição 2, todas as funcionárias são registradas como mães sociais,

independente da função ocupada. Enquanto é realizada a conversa com a

responsável local, fica um bebê em um tapetinho no chão, com alguns

brinquedinhos, quando questionada, a diretora responde que não dá para ficar todas

as crianças juntas dentro da Casa, então, como ele – com idade de

aproximadamente um ano - havia acordado, a mãe social o deixou ali, pelos

31

cuidados da diretora. Ao longo da conversa o telefone toca algumas vezes com

pessoas oferecendo voluntariado, oferecendo doações, o que a diretora diz ser

normal.

A diretora do local foi quem passou as informações gerais da Instituição,

iniciando por afirmar que as profissionais, tanto da limpeza, quanto da cozinha, além

das mães sociais são registradas como mães sociais, para que todas possam

auxiliar na função. Na época da entrevista a diretora estava com dificuldade de

encontrar mãe social e estavam com uma oportunidade em aberto. Acredita que a

dificuldade em arrumar uma profissional tem relação com o fato de que, nesta

Instituição, são somente as mulheres que dormem no trabalho.

Porém, afirma que “a partir do momento que elas vêm é por que elas gostam muito de

criança, não adianta trabalhar pelo dinheiro, pois não da para dizer que ganham muito bem. Não é

um trabalho fácil, tem que ter paciência, não adianta querer berrar com uma criança porque você não

sabe o histórico, desta, não adianta agredir, não adianta não ligar.” (Diretora Instituição 2).

Alega ser necessária muita disposição para este trabalho, pois as crianças

ficam doentes, quando os bebês chegam a Instituição é necessário dar mamadeira

de duas em duas horas. Conta que no momento estão com somente uma pessoa

cuidando das crianças.

As crianças são encaminhadas via Conselho Tutelar, com idade de zero a

seis anos para entrar, atualmente, está com nove crianças na faixa etária de zero a

oito anos.

O perfil das crianças que estão nesta Instituição são filhos de pais usuários

de drogas, o que dificulta o retorno familiar, mas enquanto os pais não abrem mão

da criança esta não pode ir para a adoção.

Ao apresentar a casa, fala do desejo de manter a singularidade das

crianças, tendo um armário para cada uma, sua cama, suas roupinhas.

O contato com as mães sociais, foi realizado na cozinha. Durante a

entrevista com MS 3 (Instituição 2), esta foi solicitada para abrir a porta, servir café e

também foi dar atenção a uma avó que faz visita a um neto, o qual quer pegar a

guarda.

Neste dia, tinham alguns voluntários circulando pela Instituição, pois há um

convênio com um colégio, em que os alunos fazem visita a Casa Lar uma vez por

semana. Porém, as adolescentes que lá visitavam não tinham muito cuidado no

manejo com os bebês e não havia ninguém supervisionando.

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Com MS 4 (Instituição 2), que cuida da limpeza, mas já foi mãe social, a

entrevista também ocorreu na cozinha. Esta entrevista ocorre sem interrupções

apesar de que no ambiente que estávamos passavam várias pessoas.

Na entrevista com as mães sociais, estas são questionadas sobre suas

funções dentro da Casa Lar, conforme relatado pela diretora, varia, pois todas as

funcionárias são registradas como mães sociais, então obteve-se respostas como:

As funções da MS 3 (Instituição 2) são, em sua maioria, com relação a

cozinha, conforme relata, “minha função é da cozinha, fazer almoço, café da manhã, almoço,

lanche, daí a janta e também ajudar com a criança, eh, trocar a fralda, dar banho. É isso.” Depois

complementa, “sempre sábado e domingo trabalha duas e aí a gente ajuda com as crianças, e daí

na semana também antes de ir embora, dá a janta daí eu lavo a louça e vou embora, daí oito horas ta

de novo.” Mas, atualmente também está dormindo na Instituição pois estão com falta

de mãe social.

MS 4 (Instituição 2) diz das suas funções, “atualmente, apesar de ser registrada

como mãe social, faço o serviço de limpeza, mas a gente não faz só isso, a gente faz de tudo, com as

crianças, quando precisa na cozinha eu trabalho na cozinha, dar banho, trocar, dar comida, faço de

tudo. Mas sou da limpeza (...) mas já fui mãe social assim que cheguei para trabalhar.”

Nesta Instituição, como moram somente as mães sociais, não podendo levar

seus cônjuges, MS 4 (Instituição 2) passou a outra função após se casar, “se não

tivesse com meu marido taria aqui até hoje.” Mas revela, “a pessoa não quer trabalhar na limpeza o

dia todo e a noite ficar acordada com as crianças né... Também não dá, é chato, mas se fosse,

tivesse outro jeito lógico que eu aceitaria.”

A inserção delas neste trabalho foi de maneiras distintas, MS 4 (Instituição 2)

descreve seu ingresso neste trabalho como um convite vindo de sua irmã, “na verdade

eu não sou daqui, sou do interior, (...) e minha irmã trabalhava numa outra Casa Lar, (...) aí ela ficou

sabendo que tavam precisando de alguém para trabalhar aqui, aí acho que ela passou meu telefone

para dona da casa e aí ela ligou e eu vim trabalhar. Vim direto aqui pra começar, aí já é o sexto ano

que estou aqui. (...) No ano passado trouxe minha irmã que tava precisando de mãe social.” Conta

que no início ficou assustada, “imagine uma casa com doze crianças, que quando você não

conhece, falam que é igual a orfanato e você imagina aquelas crianças gritando, batendo, nossa, é

totalmente diferente, eu tinha medo. Tanto que no começo quando entrei aqui era só criança grande e

grande é pior que pequena, eles eram terríveis, aí depois fui me acostumando e o tempo foi

passando (ri). (...) Os pequenos são bem mais fáceis, eh, os grandes são independentes, você

trabalha menos com eles, eles comem sozinhos, tomam banho sozinhos, os pequenos são mais

dependentes de você, mas eu prefiro os pequenininhos (ri), de dois aninhos. Gosto dos grandes

também.” (MS 4 Instituição 2).

33

A MS 3 (Instituição 2) iniciou trabalhando em um outro Lar quando uma

amiga a convidou para mudar para esta Instituição. Conta que sua entrada em

Casas Lares se deu através de sua curiosidade “eu tinha curiosidade de saber, conhecer,

como que era, (...). É curiosidade de conhecer assim (ri) de ver como funciona, mas funciona que

nem uma casa, eu acho que não tem (pausa) eh, que nem um lar assim, funciona que nem uma

residência mesmo. (...) Eu imaginava que ficava fechado, ficava só com a escola, chegava e não

tinha nenhuma atividade, eles não, eles têm atividades...”

Sobre as características que as mães sociais devem ter, MS 3 (Instituição 2)

relata que, na sua visão, deve gostar da sua própria casa, de seus filhos, para

depois poder gostar de ser mãe social. E também acredita que deva-se ter

responsabilidade, respeito e educação. Ainda complementa, “tem que ser menos

espantada.” Responde rindo que tinha uma aqui que as crianças estavam dormindo e

ela gritava do quarto pro banheiro, “gritava meu nome, nossa, ela berrava vinte e quatro horas,

as crianças dormindo e ela nem se tocava.” (MS 3 Instituição 2).

A MS 4 (Instituição 2) ressalta, “(...) tem que ser carinhosa, olha... Não sei te falar,

chega mulher aqui que diz ah, eu já criei meus filhos, já tive meus filhos, mas chega aqui e não... Não

tem aquele carinho, sabe, aquela coisa, não sei... Tem que gostar né, tem que gostar de criança. (...)

Além de ser um trabalho de muita responsabilidade, é remédio certinho, nossa, é muita

responsabilidade mesmo, mas com o tempo a gente vai se acostumando.” Afirma que, “tem que

dar conta de conseguir dar banho, dar mamadeira pra todos os três, se um ficar doente, tem que

correr com o outro, não deixar os três chorar porque a gente não gosta de deixar eles chorar.”

Ao se referir as características, as mães sociais dizem do próprio desejo

destas de trabalhar nesta função, MS 3 (Instituição 2) refere-se a sua mãe durante

esta resposta, contando que sua mãe é enfermeira e sempre gostava de cuidar de

crianças pequenas e de idosos também, “daí eu comecei a gostar, trabalhei de babá e

comecei a gostar, acho que com criança (...) lidando com eles (as crianças) a gente recebe energia

né, carinho deles, tudo, daí é como se fosse uma escola também, está trabalhando numa escola que

tem bastante criança, todo dia passa e mesma coisa, não é diferente.”

Diz que o desejo não perpassa pela questão financeira, e sim pelo amor às

crianças. Pois há algumas mães sociais que “vêm, daí trabalha dois meses, arruma um

dinheirinho e vai embora, (...) não tem nem amor, nem carinho... Quem trabalhar só pelo dinheiro (ri),

para juntar alguma coisa e ir embora. (...) Eh, mais pelo amor... (...) sempre gostei (de trabalhar com

crianças), com crianças e cozinhar (ri), juntou os dois.” MS 3 (Instituição 2).

MS 4 (Instituição 2) conta de que no início, veio a Curitiba porque havia a

proposta de emprego, e agora diz ter um grande amor pelas crianças, “Tanto que ano

passado, quando fez quatro anos que eu tava aqui eu pedi a conta peguei e saí, aí eu comecei a ficar

em casa, assim, comecei a pensar neles, não conseguia trabalhar em outra coisa, não conseguia

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outro serviço, tudo, quando tava pra começar, eu não conseguia. Aí eu pedi, vim, conversei, pedi pra

voltar e dois meses depois eu tava aqui, trabalhando com eles.” (...) "Sonhava com eles a noite, o dia

todo eu pensava, sempre tem um que a gente se apega mais né, (...). Não sei sabe... Não sei se

conseguiria trabalhar em outra coisa não, com criança mesmo. Eu faço o que eu gosto.”

MS 4 (Instituição 2) fica confusa diante da questão realizada, por onde

perpassa este desejo de ser mãe social, referindo-se a hora da separação como a

mais difícil, “ah, eu não vou saber te explicar (ri) eu não sei... Eu sei que eu... É uma coisa que não

dá pra explicar...Não dá... Até quando eles vão embora mesmo assim, nossa, a gente sente, na

verdade a gente sente bem quando eles tão indo embora pra uma família, ah eh uma coisa que não

dá pra explicar... No começo que eu entrei aqui quando iam embora as crianças eu sofria bastante,

quando ta aqui é tua, mas com o tempo fui me acostumando, fui aceitando que não é... que eu vim

aqui só pra cuidar e eles tinham que ir. Não mudou nada assim de cuidar, não mudou nada, mas com

o tempo a gente vai aceitando que a gente têm que cuidar, eles chegam aqui a gente cuida e eles

vão embora depois. Ainda acontece de se apegar mesmo bastante.”

Sobre esta questão, de quando vão embora, MS 3 (Instituição 2) diz, “ah, eu

fico feliz quando a criança vai embora porque né, vai crescer, tem criança que cresceu aqui dez anos,

a A., uma menininha que tinha aqui, ela tinha problema de Síndrome de Down daí ela ficou dez, oito

anos no lar, imagine, daí esses que estão pequenininhos e já vão embora a gente fica feliz né melhor

que ficar aqui, que daí tem outras crianças pra vir (ri).” Afirma que é difícil, porque há um

apego, “é mais aos nenéns, os grandes também.” (MS 3 Instituição 2).

Sobre o contato com as crianças, MS 4 (Instituição 2) diz “eu não sou mãe

ainda, mas eu me vejo mãe (ri), mais dos pequenininhos, dos bebezinhos, até os grandes, eles

perguntam pra gente, tia você é minha mãe... Sou, sou tua mãe, sei lá, eu me vejo mãe. Por mais que

eu mesma não tenha filho meu mesmo, eu me vejo.” Conta isto, mas responde que as

crianças não a chamam constantemente de mãe, “como teve um tempo que teve muita

troca de mãe aqui às vezes entrava uma hoje, é tua mãe, é a mãe, daí saia aquela entrava outra, é

tua mãe, aí a gente parou, falou assim não, vamos chamar todo mundo de tia.”

Algumas das questões levantadas pelas mães sociais no que diz respeito às

dificuldades de exercer esta profissão foram MS 3 (Instituição 2) “estou a cinco anos na

Instituição, (...) eu saí uma época, dois anos atrás eu tinha saído, estava com stress, o médico disse

que era stress do trabalho (ri), trabalho direto. Eu e uma amiga minha, ela saiu, agora ta trabalhando

em outro lugar, a gente ficava trabalhando, a gente não parava, de noite estendia roupa, sabe, querer

lavar calçada, tirar tudo do lugar, daí nós tava trabalhando mais e comendo menos daí que a gente

tava com excesso de serviço, daí deu stress, (...) chegava de noite queria dobrar roupa, daí o médico

falou para eu parar, (ri) tem que ir devagar, chegou tal hora, seis horas, sete horas, para vai pro

quarto toma banho assiste TV, jornal, novela porque se não você só quer trabalho, trabalho.”

Complementa dizendo que dificuldade em lidar com as crianças não encontra, “até

agora não achei nenhuma dificuldade, tudo é tranquilo até agora, não achei dificuldade, eu não sinto

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dificuldade nenhuma. O limite a gente sempre coloca, uma cadeirinha, para pensar, (...). Dificuldade

também assim, tem de, da educação entre eles, têm crianças com dois, três anos, e já vieram de

casa com educação diferente daí chega aqui, daí é difícil de lidar, qualquer coisa a gente vai no

escritório fala com a diretora e ela conversa com eles, ela tem educação bem brava.”

MS 4 (Instituição 2) também diz, “eu não sei, não tem dificuldade, não tem mesmo,

bom, eu acho que não né, (ri) eu não sinto.” Apesar de que em outro momento da entrevista

revela, ao se referir as mães sociais que não ficam na Instituição, “olha, eu acho que pra

trabalhar aqui se você vir pelo salário você não trabalha, tem que vir realmente se você gostar, que a

gente fica aqui dentro só se gostar mesmo, porque tem horas que tira a gente do sério, tem horas que

tem que pegar, sair, dar uma volta, voltar aqui dentro, porque não é fácil. Tem hora que os três bebês

querem mamar, os três têm que trocar fralda, às vezes hora de janta, de dar banho, hora de tudo, às

vezes tem que ficar sozinha aqui, pra dar conta dos dez, agora é dez né, normalmente é doze. E no

começo mesmo, na quarta feira que era folga da mãe social eu ficava sozinha com os doze, era

terrível, nossa, dava comida pros doze, dava banho nos doze, era o dia todo. Então, se vir lá de fora

achando que vai ficar aqui, que vai ficar tranquilo, não fica, porque é muito trabalho. Ainda agora se

sai um de folga a gente fica em duas, mesmo assim. Tem pessoas que vêm aqui, trabalham dois dias

e não voltam nem pra receber, então se vir aqui só por causa do trabalho não fica.” MS 4 (Instituição

2).

Sobre a questão da estimulação dos bebês e crianças e de assegurar a

individualidade de cada um, MS 3 (Instituição 2) relata que os bebês tem diferentes

horários, já os grandes almoçam todos juntos, “os bebês mamam a cada três horas, quatro

horas né que tomam mama e dormem numa hora só os três, não tem mistério.” Complementa

afirmando que na hora do banho dos bebês esquece dos outros afazeres, “daí arruma

a água da banheira, dá banho neles, como se tivesse dando banho no filho da gente também.” (MS 3

Instituição 2).

Quando frizado a relação que elas têm com os bebês/ crianças de zero a

três anos, MS 4 (Instituição 2), relata uma disponibilidade maior, pois cada uma faz a

sua rotina, “(...) chego de manhã, em vez de eu ir lá e fazer meu serviço, eu fico lá no berço com

eles... Aí às vezes eu converso um pouco com A., V, com o D., acho que eu fico uma hora lá no berço

com eles conversando. Então já é atenção né, já estou dando atenção pra eles. (...) Com os grandes

mesmo a gente vai dar banho a gente começa a conversar com eles, a gente ta trocando, tamo

conversando com eles. Final de semana que a gente trabalha, às vezes a gente trabalha no sábado,

às vezes domingo, depois do almoço a gente não faz mais nada, a gente senta tudo aqui na sala e

fica com eles, a gente pega um filme pra assistir, às vezes eles sentam com a gente pra brincar, a

gente fica lá fora sentado com eles, então dá sim pra dar atenção. Digo assim, a hora do fervo

mesmo é a hora do almoço, a tarde na hora do banho e na hora da janta e de manhãzinha quando

você chega, agora no meio do dia assim dá, dá pra dar atenção, a gente consegue.”

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Ainda complementa, “(...) eh, a gente faz bastante. Hoje mesmo quando eu tava dando

banho eu colocava ela de pezinho, sentadinha, ensinava a segurar nas coisas... Cada um faz como

pode.” MS 4 (Instituição 2). Esta ainda exemplifica a relação que tem com uma criança

que está saindo da fralda agora, “(...) ele já ta grandão, mas ele não entende, ele não sabe o

que é xixi e o que é cocô. Ele pede pra fazer cocô chega lá e faz xixi às vezes e do contrário, vai lá e

faz cocô. Então, se eu tenho tempo eu lembro ele e falo oh, senta aqui, fica aí que você já faz, eu fico

ali com ele e aí ele consegue fazer, mas quando a gente não têm tempo ele acaba fazendo lá fora

porque ninguém foi lá e chamou ele.” MS 4 (Instituição 2).

MS 3 (Instituição 2) diz de uma menina, com sete meses que está sendo

acompanhada pela diretora da Instituição, “ela (diretora) leva ela pra casa, estimula ela

porque aqui não tem muito tempo assim para ficar com a criança, desenvolver, por isso tem a

fisioterapeuta que eles contratam que faz fisioterapia neles, põe eles para engatinhar, porque aqui

não tem tempo, nem mesmo com duas mães não dá, elas não têm tempo de sentar, brincar,

estimular, engatinhar. (...).”

Ainda sobre a relação com as crianças na idade de zero a três anos, é

interrogado como se dá o processo de interpretação das demandas das crianças,

bem como ajudar a criança neste desenvolvimento, nomeando o mundo a ela,

supondo algo de uma vontade daqueles que ainda não se expressam. Sobre isto,

MS 4 (Instituição 2) afirma que “os nenéns dá pra saber, a gente sabe quando eles tão com

fome, bom, eu sei, quando eles tão com fome, até quando tão com dor mesmo a gente sabe, quando

ta de cocô, quando é xixi, até tem os nossos aqui que às vezes se fingem sabe (rindo), a gente

sabe... Então a gente sabe tudo. (...) Quando eles tão de manha, começa a se jogar no chão, às

vezes até a criança ta com dor né a gente acha que é manha, mas não é não, a gente sabe.”

MS 4 (Instituição 2) refere-se as atividades que a mãe social tem para fazer,

“tem que cortar unha, daí quando ta tudo os grandes, aí não tem tempo, tem que arrumar guarda

roupa, levar em atendimento, não tem tempo daí. Não dá para ficar como se fosse uma babá com a

criança, ficar sentada brincando, não tem tempo aqui. Por isso eles fazem atendimentos fora.”

MS 3 (Instituição 2) percebe a profissão de mãe social, como uma dona de

casa, assim como acredita que as crianças se sentem em casa “(...) eu acho que se

sentem em casa sim. Daí vão pra escola, fazem a atividade deles e a noite janta, depois vai dormir

como... um dia normal.” Ao MS 4 (Instituição 2) ser questionada o que significa ser mãe

social, esta responde, “pra mim... (pausa) Olha, no caso (pausa) o que significa pra mim? Ah, pra

mim significa mãe, é sim, mãe. (pausa) (...), eu sei que é muito bom, não tem como explicar, é bom

ser mãe. Às vezes tem um que vem lá de fora gritando mãe, aí você sente aquela coisa gostosa

sabe... Às vezes eles chamam a gente de mãe, eles sentem falta de chamar alguém de mãe.”

Quanto as regras da Instituição, MS 4 (Instituição 2) afirma que todas têm a

mesma linguagem com as crianças, com regras estabelecidas, mas cada mãe social

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pode cobrar da sua maneira, sem que interfiram, “(...) se eu dou um castigo, se eu coloco lá

ninguém vai tirar, eu vou tirar, se M. coloca, ela vai tirar, se ela esquece, eu falo pra ela, já faz um

tempinho que ta lá, não ta na hora de tirar? Com tudo a gente segue aquela norma. E... A gente fala

as mesmas coisas com as crianças, não adianta eu falar uma coisa e ela outra, eu por de castigo e

ela tirar. Então eles levantam de manhã, arrumam a caminha deles, eu acho bom né, eles arrumam a

caminha deles, as três fazem eles fazerem isso. Se eles fazem bagunça lá fora, se foi eles mesmo

que eu vejo, faço todos eles arrumar, mesma coisa faz as meninas, às vezes vou sair mais cedo falo

para elas falarem para eles arrumar. Então a gente faz igual, nós três, não discorda da outra. Quando

acontece de entrar alguma pessoa aqui nova que queira fazer diferente da gente, a gente vai lá e

conversa com a diretora, pede uma reunião, tem que fazer todo mundo igual, se não vão respeitar

uma e não vão respeitar outra e fica lá, aquela tia ali é boazinha e aquela é uma bruxa (rindo), então

é todo mundo, tudo igual.” MS 4 (Instituição 2).

MS 4 (Instituição 2) diz ter mudado bastante coisa na sua vida após se

tornar mãe social, “ah, mudou bastante coisa, eu... Eu acho que eu era tão estressada, eu

brigava, eu era irritada, não, agora eu sou mais calma, agora estou bem mais calma. Aqui mesmo

eu... Em casa chego muito irritada, nossa meu marido, brigo com ele sem ele tar fazendo nada pra

mim (ri), mas aqui não, aqui eu fico calma o dia todo, aí quando eu saio, chego em casa e me

estresso, qualquer coisinha to brigando, (...) mas eu chego aqui sabe nervosa e de eu ver uma

criança rindo, ou vou lá no berço começo a conversar com os bebês e pronto, já passa aquilo, passa

tudo, até esqueço meus problemas em casa.”

2.1.3 Instituição 3

Durante a visita pela Instituição a Psicóloga recolhe alguns brinquedos

quebrados e leva até uma sala em uma caixa relatando que a quantidade de

doações é muito grande, então esta fez um programa em que, se muitos brinquedos

fossem estragados, eles não receberiam outros, pois pela grande disponibilidade de

brinquedos novos, as crianças estavam perdendo a idéia do cuidado com as coisas.

A Casa Lar funciona com crianças de 0 a 7 anos, sempre privilegiando que

grupos de irmãos fiquem juntos. A questão da idade é flexível, até onde conseguem

proporcionar uma boa harmonia, se não, encaminham.

Ressalta a importância da existência dos pais sociais, e se refere a

capacitação através de cursos, palestras, salientando a importância de estar atento

a saúde mental deles, proporcionando espaços de diálogo e, caso verifiquem a

necessidade, é encaminhado a psicoterapia.

Discorre sobre a dificuldade de lidar com as diferenças e a singularidade de

cada criança, afirmando que cada um tem seu jeito de ser, mas é necessário

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trabalhar questões como rotina, limites e cotidiano da Casa Lar, o desafio é a mãe

social se colocar como quem cuida da criança, mas nunca desvalorizar nem

desmerecer os pais biológicos.

Relata que é um trabalho intenso, vinte e quatro horas, tem uma folga

semanal de vinte e quatro horas obrigatória. Elas às vezes nem veem o resultado,

mas devem estar sempre motivadas. A Psicóloga ressalta da importância que as

mães sociais têm com as crianças alegando que não dá para testar mães sociais,

pois na Casa a criança passa a reconstruir uma confiança, então, é importante

investir na seleção e na capacitação.

A diretora da Instituição é bastante presente, sendo a pessoa de referência.

A Instituição é composta por três Casas Lares, cada uma com um casal e uma

auxiliar, que cuida dos afazeres domésticos.

As entrevistas com as mães sociais foram realizadas em suas casas,

sempre após ter lido o Termo de Consentimento para que a participação seja de

livre adesão. Com a MS 5 (Instituição 3), quando chego para conversarmos ela está

arrumando o cabelo de uma das meninas. Durante este início, toca o telefone, as

crianças estão ali, querendo atenção. A mãe social arruma as crianças, pois é

avisada que a diretora passará para levar alguns para cortar o cabelo. Fala com a

criança se referindo a mãe, “a mãe não pode descascar a laranja, a mãe tem que conversar com

esta tia e a mãe não tem tempo, come uma banana?” (MS 5 Instituição 3).

Quando M. chega para buscar as crianças vem uma querendo ir junto e MS

5 (Instituição 3) vê com a diretora se é possível e a ajuda a trocar de roupa. No

decorrer da entrevista fica um bebê dormindo na sala, quando este acorda, pergunto

seu nome e MS 5 (Instituição 3) relata que ele não tem nome.

Já durante as entrevistas com MS 6 (Instituição 3) e MS 7 (Instituição 3) as

crianças não entram na casa e os nenéns estão dormindo.

Ao iniciar a entrevista, as mães sociais relatam como ingressaram na

Instituição, MS 5 (Instituição 3) mãe social mais antiga da casa, conta, “eu entrei aqui

em 2000, vim morar em Curitiba foi em maio de 2000, vai fazer nove anos que estou por aqui. Eu

sempre trabalhei em hospital, sou auxiliar de enfermagem, trabalhei vinte anos em hospital, mas

quando eu vim embora para Curitiba, eu não conhecia nada aqui, só tinha vindo para cursos de

enfermagem e não conhecia Curitiba. Aí meu marido ficou desempregado lá e eu trabalhava e ele

falou para virmos para Curitiba que tinha mais opção de emprego. (...) uma vizinha falou que na rádio

eles anunciavam emprego (...) e escutei o diretor daqui falando que precisava de uma mãe social

para trabalhar aqui, todos os perfis que ele pedia eu tinha, mas um que não tinha era tempo no lugar

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e o marido tinha que ter de dois a três anos de emprego fixo e isso a gente não tinha. Quem se

interessasse era para ligar, eu liguei, (...) e nem uma semana depois ela já chamou, aí a gente, ia no

Centro numa clínica de terapia, fez várias sessões de terapia com uma equipe de Psicólogos e tinha

oitenta casais na época daí foi uma seleção mesmo. Cada terça e quinta ia dez casais, eu tava toda

semana e os casais não vinham os mesmos, no final ficou três, ficou dois e aí o segundo casal não

apareceu, eles não tinham mais chamado, nós já estávamos selecionados, aí a gente veio pra cá.”

Diz ter ligado para o anúncio “uma das razões, eu tinha uma filha de nove anos que

morava comigo, agora já não mora mais. Eu era separada do pai dela desde que ela era

pequenininha e sempre eu que cuidei. Como eu vim embora para cidade grande, e a gente era lá do

interior, eu tinha muito medo porque a gente via muita notícia de marginalidade na televisão, eu toda

vida fui aquela mãezona que protegia muito, tinha medo de deixar ela sozinha, até mesmo para ir

para escola, e ficar pegando ônibus pra ir pro trabalho. (...) E eu não conhecia nada, ficar pagando

aluguel, isto trazia uma insegurança pra minha filha e pra nós também, meu marido trabalhava a noite

e eu tinha que ficar em casa. E como eu sempre fazia plantão a noite, eu pensei, que tal que eu

arrumo um serviço num hospital de noite? Com quem minha filha vai ficar? E se acontecer alguma

coisa com ela a minha família vai me culpar por isso. Então quando eu vi um anúncio que era um

trabalho em casa, que eu não ia precisar sair, que eu tinha como cuidar da minha filha, eu me

interessei, sabe?“. Diz ter participado do início da Instituição, e que até hoje a diretora

tem preferência por pegar alguém do interior porque ela diz que deu certo.

MS 6 (Instituição 3) é filha da MS 5 (Instituição 3) e esta descreve sua

entrada em 2003 como auxiliar, “Eu trabalhei uns dois anos como auxiliar daí saí, retornei como

folguista fiquei mais um período bem longo e agora como mãe social fez um ano em fevereiro. É

tranquilo, uma experiência nova, eu entrei aqui com dezoito anos, e hoje estou com vinte e quatro, já

tive filho de quatorze anos aqui da casa, como eles chamam a gente de mãe, tive filho com diferença

de dez anos, bem complicado, mas normal, a gente faz por que gosta, tranquilo.” Iniciou a

trabalhar na Instituição 3 pois precisava trabalhar, “eu tinha filho pequeno, precisava

trabalhar, aí eu vim aqui e a diretora me recebeu e contratou, ela falou que se eu arrumasse outro

trabalho eu podia ir. Eu tinha acabado de fazer dezoito anos, aí ela me falou assim e eu fui ficando,

fui ficando e eu sempre gostei bastante de criança, o meu sonho de criança era ser professora, para

trabalhar com criança, crescendo eu já não quis mais, eu vim trabalhar aqui porque eu gosto

realmente de criança, foi isto que me motivou a estar aqui.” Porém MS 6 (Instituição 3) conta

“não vim para ser mãe social, eu fui até embora de Curitiba, aí no ano retrasado a diretora tinha que

dar férias para todo mundo e aí ela me contratou por três meses, para cobrir as férias de todas elas, e

eu aceitei, vim pra cá e nesse período uma mãe social saiu, aí eu acabei assumindo a casa que era a

dois e eu trouxe as crianças pra cá (casa três) e assumi essa casa este ano.” Escolheu a casa

que sua mãe morava antes, “daí eu já tinha conhecimento e aquela casa eu nunca tinha tido

contato, nesta eu já me sentia em casa, um negócio diferente, eu preferi mudar as coisas de lá pra cá

e preferi ficar aqui, já fez um ano em fevereiro.” Revela que no início ficou insegura, mas já

40

está mais tranquila, só deixa claro que “menor que dez meses eu não pego porque realmente

tenho medo.”

No início, MS 6 (Instituição 3) assume que teve medo, insegurança, “tinha

duas crianças especiais que davam muito trabalho, aí uma pessoa inexperiente, não tanto porque eu

já tinha conhecimento deles, mas não era o conhecimento de eu tomar as rédias da casa era aquele

conhecimento de eu cuido hoje e amanhã vou pra minha casa ou mudo de casa e não vejo mais, foi

um pouco de medo mas hoje já não tenho mais.”

MS 7 (Instituição 3), também conta sobre como iniciou o trabalho em Casa

Lar, diz sempre ter trabalhado com crianças, “na Igreja, trabalhava com crianças, trabalhei

três anos com crianças, dois com adolescentes, daí por último tava mais com senhoras, fazia reunião

em casa com senhoras. Daí tive minha filha né, ela tem seis anos agora, só tenho uma e vim tendo

dificuldades assim com ela na educação porque ela era sozinha e a gente não pretende ter mais

filhos. Daí a gente pensou, eu pensei em fazer algo que ajudasse a ela e a mim também né, na

educação dela, aí eu pensei em fazer pedagogia, trabalhar numa creche, alguma coisa assim, sabe,

daí eu já tava trabalhando com as crianças e automaticamente eu iria ajudar ela também na

educação, aprender coisas novas né, e daí nesse meio surgiu a oportunidade de vir pra cá.” A

oportunidade surgiu através empregada da diretora, “a secretária dela que convidou a

gente, daí a gente foi em Psicólogo, viemos aqui, conversamos com ela e a gente gostamos, meu

marido adorou, ele adora aqui, a filha também gostou, daí eu deixei de fazer o curso de pedagogia

que eu ia fazer porque eu falei pra ela que seria a mesma coisa, porque aqui mexe com criança e lá

eu ia mexer com criança, então pra mim seria a mesma coisa, aí eu achei melhor vir pra cá. Daí a

gente tamo levando aí, três meses já.”

MS 5 (Instituição 3) conta que trabalhava em hospital e se dava bem na

parte da pediatria, “nossa, quando a gente vinha as crianças já ficavam felizes, aquele agrado,

aquele carinho. Eu me casei muito nova, tive meus filhos também, sempre assim cuidei deles, protegi

o máximo, até hoje, a gente mimou demais, então aquele carinho especial com idosos e crianças.

Não que a gente deixe de cuidar dos outros, principalmente com crianças especiais.” Conta que

passaram pela Instituição crianças especiais, “tinha enfermeiras que diziam que aquela

criança não parava, não tomava remédio, eu não tinha este problema, eu agradava, conversava e

dava certo, eles aceitavam, não tinha problema em lidar com este tipo de criança. E aqui os vários

que passaram por mim, e ainda tem uma hoje. O médico disse que ela sobreviveu por causa do meu

carinho e cuidado. Ela é vitima do alcoolismo fetal, a mãe era soro positivo e ela também é. Ela

nasceu muito pequenininha e frágil, quando eu peguei ela, ela tinha nove meses, sempre os mais

doentinhos, com problemas que precisam de mais cuidado vêm aqui pra casa. Eu entreguei um em

dezembro passado, ele era um cadeirante e eu fiz ele andar. Vários assim, sei lá, aquela afinidade

maior, com os outros também, não tenho dificuldade nem problemas, mas eles já são crianças que

conseguem se virar, uma criança especial não consegue, você fala vai brincar e ele não consegue,

tem que acompanhar, as outras já fazem. Tem que acompanhar, ter um cuidado, uma dedicação

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diferenciada com estas crianças, e com o carinho, com o que a gente consegue passar para eles, isto

traz muita segurança para eles.”

Assim, estas mulheres assumiram a profissão de mães sociais, e MS 7

(Instituição 3) afirma que se percebe como mãe mesmo, “uma mãe, uma protetora, dá

segurança.” Conta de duas crianças que depois de um tempo passaram a se sentir

mais seguras tendo os pais, com a tranqüilidade que eles estariam ali com eles.

Porém complementa que, “eles gostam dos pais sociais pela comida e pela troca (...) porque as

crianças não entendem, eu acho, não sei talvez assim, só amor, porque a gente dá comidinha na

hora certa, banho. Agora é horário de comer, de limpar, e é isso que vai fazendo eles se apegar mais

na gente, querendo ou não já envolve um amor, mesmo que não tá pegando abraçando e beijando o

tempo todo, isso já faz que eles já sintam isso.”

MS 6 (Instituição 3) afirma se sente mãe mesmo, “quando eles vão embora a

gente fica muito triste, (...) mas ao mesmo tempo fica feliz, porque sabe que eles estão indo pra um

caminho bom, de uma família. Porque a gente não têm condições de dar um futuro, um lar pra eles,

uma casa de verdade, eles fazendo dezoito anos têm que seguir o caminho deles. Quando é

bebezinho menor a gente sofre bastante porque acaba se apegando, mesmo não sendo da gente,

não é que os outros não sejam, mas os menores a gente se apega bem mais, você passa mais dias

triste, quando entra na casa parece que falta algo, os grandes não, porque já têm mais liberdade, já

vão pra escola, os menores não, ficam em casa dia e noite com a gente, um sentimento que a gente

não consegue explicar, a gente fica triste, feliz, tudo ao mesmo tempo.” Mas diz ser gratificante,

”sabe, quando vem a pequenininha que chegou agora, no segundo dia ela vem, oh mãe, a gente fica

até surpreso.” Apesar de que desconfia do significado da palavra mãe para eles, “eles

passam por tantos lugares que chamam de mãe, mãe, mãe, não sei se é uma palavra forte como é

pra gente, não sei se esta palavra tem um sentimento pra eles.”

MS 5 (Instituição 3) “em primeiro lugar, é gostoso, ser mãe social, é uma coisa diferente,

é uma coisa assim mais forte, além de ser mãe, eu acho que é legal.” Complementa afirmando

que até pouco tempo essa profissão de mãe social não existia, “pois é, pensei, como vai

ficar, toda vida fui auxiliar de enfermagem, hoje eu sou mãe social, é uma mudança. Mas existe ou

não existe, mais tarde vai dar problema. (...) Mas eu acho que ser mãe social são duas coisas juntas,

ser mãe como a gente é com os filhos da gente, que não é social nenhum, é mãe mesmo e mãe

social é porque a gente têm um jeito diferente de socializar as crianças, assim de poder fazer coisas

diferentes com eles, e não só ser mãe, porque a mãe é casa, comida, carinho e levar para escola,

aqui é muito mais do que isso, a gente têm que além, tem que ser mais, como uma roupa social, é

uma roupa mais, tem que ensinar eles assim a diferenciar também né, e não assim vamos dizer,

meus filhos se criaram, não tinha muito isto de sair, de se introduzir com outras pessoas e os daqui

têm, e é um objetivo, isso é ser mãe social.”

Contando um pouco da rotina, MS 5 (Instituição 3) relata que “minhas funções

começam as seis da manhã, tirando a noite né?! Já é hora de levantar, aí já chamo as duas que vão

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para escola, tem dias e horários diferentes, daí tem que acordar eles, arrumar para ir para escola, o

cabelo de A. dá um trabalhão pra arrumar, fazer café para os que vão para escola, os da creche não

tomam em casa. Aí levar para escola, uma semana cada mãe leva todas as crianças, é duas quadras

daqui, assim não fica cansativo. Depois tomo um banho, arrumo meu quarto, e daí já começa a

organização da casa, tiro um tempo para o bebê, dar mama, troco a fralda, dar banho, colinho. (...)

Aquela rotina toda, mas sempre dá um tempo para descansar, eu faço artesanatos também, pra

vender, faço pra nós, pra mim, e eu do conta, dou colinho pros bebês, sobra um tempo pro marido

também.” MS 6 (Instituição 3) afirma, “faço a lição com eles, sirvo o prato deles, faço a

alimentação deles, dou banho, uma vez por semana seja grande ou pequeno dou banho geral. Nos

menorzinhos todo dia, os outros um a dois por semana, eles ficam meio envergonhados mas é

tranquilo, porque se não, não lavam atrás da orelha, o pé. Tem dias que a gente acaba achando que

nem é trabalho, acaba levando a vida como se fosse a casa da gente mesmo.”

Referindo-se as crianças, é questionado sobre qual a possibilidade de

assegurar a individualidade de cada criança, bem como estimulá-las cada uma em

suas necessidades, e nisto, MS 5 (Instituição 3) responde, “É difícil, sabe, você não

consegue agradar todos do mesmo jeito, tem que ter um jogo de cintura para conseguir. E às vezes

se tentar convencer dois com a mesma palavra, um tu convence, mas o outro não, tem que negociar

com eles. Não dá para usar o método, se fizer isto eu faço isto, tem que fazer por que tem que fazer e

não que vai ganhar alguma coisa. Eu faço trabalho em grupos com todos juntos, ou acabo fazendo

alguma outra coisa, conversando individual com cada um, tem algumas coisas que a gente forma em

segredo, com criança é difícil manter em segredo com eles.” A rotina dos pequenos é feita por

cada casa, “o horário do banho, do mama de duas horas e meia, três horas. Não chego a deixar ele

chorar, ele começa a embravar e eu já dou de mamar, se ele quer mamar a gente tem que dar.”

Sobre a estimulação, MS 5 (Instituição 3) assegura que busca estimular

muito, principalmente os pequenos, “gosto de fazer massagem, no banho, estímulo de

contato, de conversar, de tudo dizer o que vai fazer, vamos tomar banho, vamos trocar.” Assume

que “dizem que meus bebês são muito mimados, porque dou muito colo pra eles. Daí meu marido

quando tá em casa também já chega e já pega, ele trabalha até as três horas da tarde. Já chega e

pega o bebê, anda, tem que levar num médico, levar num atendimento eu vou, e se não for eu que

levo a gente organiza quem leva e quem busca. Se a auxiliar não vem, eu tenho que tomar conta da

casa, as duas meninas mais grandinhas ajudam, mas não é que elas fazem, a gente têm que estar

sempre no comando.” “Quando chega recém nascido, ele é diferente de quando chega mais

grandinho, mais carente, aquela perda, tira da mãe e vai pro Conselho, vai pra casa de passagem,

vai pro abrigo, já passou em muitas mãos. Quando vem direto do hospital é diferente, porque nasceu

no hospital e veio pra cá, e a gente acaba fazendo a rotina dele: horário de dormir, de mamar, banho

e a criança acostuma. Agora quando já vem sem rotina nenhuma, muitos vêm sem rotina nenhuma,

sem hábitos de banho, de higiene, sem horário de comer, o que come, come fora de hora, e a gente

começa a estipular um horário, horário de mamadeira, horário de dormir, acordou depois vai brincar,

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porque se não, não dá. Depois elas querem alguma coisa, têm que negociar uma coisa pela outra, é

meio difícil, mas a gente consegue, uma fruta pela outra, ou um doce pela fruta, elas são espertas,

elas pedem. O que uma ganha a outra também quer. Às vezes não tem, tem que negociar, elas

aceitam. E tudo através de horário, se pode ou não. O banho, o horário de dormir, de passear, de

brincar.”

MS 5 (Instituição 3) diz que a Instituição não dá mais nomes aos bebês que

vêm sem nome, “quando chega do hospital sem, às vezes dava nome, mas dava problema, então

não demos mais. Porque teve vários que chegou sem nome, a gente deu e chega os pais e dão outro

nome, aí tem que ir no juiz para mudar. Conta de uma criança que passou por vários nomes, e que

no nome do posto de saúde não tinha nada na sua ficha de tantas mudanças.”

MS 6 (Instituição 3) reafirma que trata cada um da maneira que merece, “de

forma que, eu não gosto de todo mundo assim, eu gosto de cada um da sua maneira, o meu filho eu

tenho sentimento diferente por ele, mas eu gosto de cada um de vocês da maneira, eu não posso

gostar de duas pessoas da mesma forma, cada um tem uma forma de gostar (...) tem um que gosta

de ficar mais grudado, outro que nem gosta de ficar perto, a gente têm que tomar cuidado para

perceber, não adianta ser carinhosa, amorosa com você, se você não gosta disto, então a gente têm

que saber com cada um devido ao histórico e como chegam aqui. Tem uns que têm medo e não

chegam nem perto, já tive uns que chegaram e não deixavam nem levar até o banheiro, tinham medo

de tirar roupa e hoje não, com o tempo a gente vai conhecendo melhor e esperando que eles venham

se apegar com a gente e não a gente tentar forçar.” Segue dizendo que deixando vir deles

mas com o cuidado de não deixar de lado, sempre ir conversando. Conta o exemplo

“as duas meninas ficam assustadas com homem, o marido passa de longe dá oi de longe, dá um

sorriso, hoje não, ele passa perto elas já chamam, a gente não força nada, não quer não quer, a hora

que eles querem eles mesmo procuram.”.

Quanto a estimulação com os pequenos MS 6 (Instituição 3) confirma que

“como eles ficam o dia todo com a gente, dá sim. Mostra o pé, a mão, no banho, escova de cabelo,

de dente, ela adora. Ela gosta quando vou trocar ela, fazer cócegas, ela fala comigo de manhã, eu

fico ouvindo ela e fazendo perguntas e ela fica respondendo, não sei o que passa na cabeça dela,

mas tá estimulando, eu brinco com ela, o pé , a mãe, eu falo meu nome, e ela repete bem certinho.

Todo tempo que tá fazendo uma brincadeirinha, estimula um monte. Ela abre os armários, antes

quando ela começou a engatinhar, andar, eu ensinava ela a fechar e eu falava parabéns, agora

quando ela fecha ela olha esperando o parabéns.” A MS 7 (Instituição 3) relata que dá, dá

pra ver o que as crianças querem, “dá pra sentir bastante assim, a maioria eles querem colo,

mas isso é o de menos que a gente pode dar aqui, porque não dá tempo, não dá tempo de dar colo,

porque é super corrido durante o dia, levanta as sete da manhã, daí sempre tem compromisso, um

vai pro colégio, outro vai pra outro curso, Psicóloga, nisso eu levanto preparo o café, a mamadeira do

bebê, nisso boto um no chiqueiro, outro no tapete, outros vão pra fora, outros já saem, e assim já tem

outros compromisso assim vai e tem pouco tempo pra eles no colo, é mais a noite, a tarde, igual meu

esposo gosta muito, adora eles, deita no chão, pega eles, coloca todos no chão, mais a noite pois de

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dia é super corrido e o que eles mais gostam é de colo, todos mesmo a de dois aninhos, todos colo,

querem bastante atenção. A mais velha tem madrinha, aí às vezes final de semana a madrinha leva

pra passear daí fica sete, às vezes outros saem com alguma madrinha daí aqueles que sobram eu

posso dar um pouco mais de atenção, porque daí é menos. Porque se dá pra um, vem todos e você

acaba não dando pra ninguém e às vezes você tá sozinha, chega um começa a te cheirar, querer

colo, daí a gente pode dar.” Diz ter começado a conhecer cada criança “ah essa hora quer

mamar, essa hora ta com birra, a gente acaba conhecendo cada um individualmente, então a gente

sabe que este é uma criança calma, outro chora bastante, então vejo que vou dar de comer de três

em três horas, neste intervalo dou bolachinha, aguinha, coloco eles no chão, se eles querem dormir,

eu já percebo, quando começa a reinar já sei que quer dormir se não é hora de comer. Boto ele na

cama ele já dorme.”

E sobre as características que uma mãe social deve ter para desempenhar

esta profissão, MS 5 (Instituição 3) se recorda das solicitadas na rádio quando ouviu

o anúncio, “tinha que ser um casal que tivesse um filho ou nenhum, idade de vinte e cinco anos ou

acima, pedia uma escolaridade também ele pedia que a pessoa tivesse assim paciência né, e que

tivesse assim responsabilidade para assumir uma casa com tantas crianças, e que gostasse de

criança.” MS 6 (Instituição 3) acredita que as características necessárias seriam,

“gostar bastante de crianças, e gostar realmente do que faz, se não, eu acho que não consegue,

porque a gente acaba se doando completo.” MS 7 (Instituição 3) acredita que deve-se ter

amor, “amor e gostar, gostar de criança e ter bastante amor, porque se você não tiver amor por eles

não vai conseguir ficar aqui, tem que ter paciência porque é o dia inteiro mãe, mãe, mãe, mãe é vinte

e quatro horas, por dia a noite às vezes tem que levantar, cuidar deles, então tem que ter muita

paciência e amor, porque tendo amor aí você vai ter paciência, vai aguentar muita coisa, né, e se a

pessoa não tiver o amor, não gostar do que faz ela vai perder a paciência e já vai sair, né, então eu

acho que o principal é ter amor e gostar do que faz (...). Tem que ter bastante paciência, bastante né

a vontade também, amor pra ficar, se não tiver paciência não fica.” Com sua experiência , MS 5

(Instituição 3) conta que já viu vários casais que iam para entrevista e “a gente olhava e

via que não leva jeito. No olhar da pessoa, no conversar, a maioria destas pessoas que tava fazendo

um contato com o lar, a diretora mandava conversar comigo e perguntava o que eu achava, e eu

dizia, não leva jeito, às vezes não pelo jeito da pessoa, sei lá, mais pelo gênio, no conversar ou vê a

pessoa, a gente já vê a pessoa que não leva jeito. (...) Percebo uma diferença no contato com a

criança, o jeito da pessoa, (...) nosso trabalho têm que ser por amor mesmo, se não desiste, não dá

para ser só pelo trabalho. (...) Amor pelo que faz, e não fazer por obrigação. Sempre falo pras minhas

meninas, não adianta fazer as coisas chutando, brava, nunca façam as coisas assim, façam por

amor, por gostar e não por obrigação ou que alguém mandou, porque nada a gente consegue se sair

bem num trabalho, num trabalho de escola, num curso se fizer por obrigação, eu acho que a pessoa

tem que fazer sempre por gostar.”

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Assim, pode-se pensar qual o desejo destas mulheres em assumir uma

Casa Lar, com crianças que precisam que elas desempenhem a função materna.

Além de aspectos que elas revelam ao longo da entrevista, MS 6 (Instituição 3)

alega que “depois de tudo que eles passaram, espero que tudo de certo, que aqui a gente incentiva

muito o estudo, a alimentação, coisas assim que quem sabe aqui dentro não veja, ou assim eles

progredir aqui dentro mesmo, quem sabe lá fora que de tudo certo pra eles.” Ao ser um pouco

mais questionada, esta responde, “não sei, é uma coisa gratificante pra gente, não sei explicar

assim como, mas acho uma coisa tão legal assim que sei lá, sem explicações, uma coisa muito legal

mesmo. Eu não consigo expressar, sei lá, a gente se sente feliz, se sente triste, toma dor do outro, é

uma coisa sem explicação, é uma coisa que acontece, não sei.” MS 5 (Instituição 3) diz gostar

de se doar “é gratificante, porque eles respondem. No hospital quando chegava crianças com

problemas, quando tinha que encaminhar pra fora, eu sempre ia atrás para saber como eles tavam,

se estavam bem, se deu certo, aquela preocupação pois precisam de um cuidado maior. Meu filho

mais velho tem problema de audição, eu tive ele com dezesseis anos e ele teve problema, nasceu

com problema, muito doente, hoje ele usa aparelho, é pai, é casado, tem uma vida normal. Mas ele

demorou sete anos para falar, demorou para andar, ele vivia no médico, eu me dediquei muito a ele,

para ele sobreviver. Quando ele nasceu o médico falou que ele não sobreviria.” Conta de seu

gosto de receber nenéns e vê-los crescer, “é muito gostoso nossa, ele já engordou.” MS 5

(Instituição 3) fala para o neném, o papai falou que não pode ficar comendo porque

a tia M. (diretora) falou que, por favor, não me engorde este guri. MS 5 (Instituição

3), “Porque, você vai me dar a conta? A conta não, mas vou te dar um curso de nutrição, não gosto

de ver o bebezinho magrinho, eu deixo eles muito gordo.”

Existem muitas dificuldades encontradas neste desempenho da atuação das

mães sociais, MS 6 (Instituição 3) percebe mais dificuldade na adaptação de cada

criança quando chega na Instituição “dificuldade de conseguir entender todos eles, no início,

quando cada criança chega, até conseguir colocar as regras, por exemplo, eu não quero comer, não

quero dormir, sinto dificuldade neste momento, porque a gente têm que colocar os limites, desde

quando chega, lógico que a gente é um pouco mais tolerante, no limite, hora de comer é de comer,

hora de dormir, é de dormir, nesta hora eu sempre fico meio perdida, depende da criança, têm uns

que consegue em dias, outros em mês, aí surge um pouco de dificuldade.” Aponta como

dificuldade também contando de quando seu filho ficou com febre depois que outra

criança menor entrou, “tem que acabar passando por cima disto para dar conta, ele falou pra

mim, né mãe que eu não sou mais o seu bebê? E aquilo doía mas ele só sentia febre quando tava

perto de mim, quando fazia as atividade não sentia nada, era chegar final de tarde, entrar pra casa

que começava a arder em febre, (...) aí a gente entendeu quando ele pode se expressar que não era

mais o bebê, que ele tava sentindo que tinha um bebê menor que ele. Eu sempre dou atenção pra

ele, mas ele come o que todo mundo come, brinca com todo mundo, eu gosto dele bem diferente de

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todos outros, mas na hora de todo mundo é todo mundo, eu sempre digo que ninguém é melhor que

ninguém.” MS 7 (Instituição 3) “eu acho que não seria nem dificuldade, eu acho que a gente que

é mãe que tem o filho da gente é diferente, a gente pode cobrar mais do filho porque ele é teu, lidar

com as crianças é diferente, você não sabe quem é eles realmente, você acaba conhecendo por fora,

o basicão, é teimoso, é briguento, este tipo de coisa, mas assim, assim bem conhecendo você acaba

não conhecendo. Têm crianças que falam aqui, a tia bateu, mas a tia não bateu, a tia botou de

castigo, tem tudo isso, e do teu filho você conhece, se você brigar, colocar de castigo ele vai falar

isso. Agora a criança que vem aqui às vezes da receio de colocar de castigo também, é complicado,

a gente não bate neles, mas eles podem falar que a gente bateu, entre eles mesmo eles se batem. A

gente fica um pouquinho de receio das atitudes deles próprios, e os filhos da gente é diferente, a

gente se sente mais livre de corrigir, de cobrar e essas crianças nem deve cobrar muito, nem deve,

eu acho, porque acaba lá na frente, a gente não sabe o que pode acontecer. (...) eu nem sei, os

pequenos de menos, mas os mais velhos eu não sei, a criança, a gente não conhece a família, não

conhece a criança, então é muito complicado assim as crianças que vêm, que aparecem derrepente,

derrepente as coisas mudam, ela chega, você é mãe, ela é filha, e assim, uns certos costumes que

nunca viu na vida, eh... Certos costumes que se fosse sua filha você deixaria de castigo, e talvez não

é o caso daquela ali, né?. É muito complicado eu acho assim, neste fato.” Relata também da

dificuldade de adaptação da sua filha nesta nova forma de vida, descrevendo

atitudes e comportamentos de angústia da filha em consequência da sua mãe estar

dividindo a atenção que era exclusiva a ela com outras crianças. “Dói um pouquinho, às

vezes, depende a coisa assim me da uma dozinha assim sabe... Eu sou bem assim firme com ela,

sou bem firme com ela. Ontem mesmo ela dormiu comigo até, a noite inteira. De vez em quando ela

levanta, diz que não quer dormir, que tá com medo, e vai pro quarto. Ontem ela queria ir embora, (ri)

fez as malas e queria ir embora. Perguntei aonde você vai? Vou pra casa do meu tio. (Ri) Mas é só

chantagem, ela só pegou as bonecas né, então era chantagem (conta rindo). Ela tava com medo e

dormiu comigo, então é assim, no meio da noite ela levanta, vai pro meu quarto, às vezes eu nem

vejo, quando eu acordo, ela já ta no meio da gente, mas assim.” Diz se preocupar pois as

outras crianças passam somente pela instituição, “elas vão pra uma família, vão pra

alguém, e ela vai ficar pra sempre, daí a gente fica preocupada no amanhã né, como será, o que vai

ser dela. Ela pode pensar que a minha mãe me abandonou, minha mãe preferiu as outras crianças,

ela pensa isso na realidade. A gente explica você é filha da barriga, e os outros são do coração, eu

falo pra ela que eles vão pra uma família, família deles, ou vão voltar pra família, ou outra família vai

pegar eles pra cuidar, a mãe só ta aqui para dar atenção pra eles, carinho, explico pra ela, mas ela

ainda não entendeu, não entendeu ainda não.”

Sente dificuldade na relação com um bebê também, “o A. é uma criança

complicada que não sei explicar, ele chora, mas quanto a alimentação eu sei no horário, tem vezes

que ele acabou de mamar ele chora, ele não quer brincar porque dou brinquedo ele chora, fico

esperando como ele vai reagir.” (MS 7 Instituição 3).

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MS 5 (Instituição 3) revela que sentiu dificuldade no início, “era vida nova pra

mim, pro meu marido, pra minha filha que teve que dividir a mãe, tudo com as outras crianças, foi

difícil, mas ela gostou, ela morou com nós até os quatorze anos.” Mas atualmente já não

percebe dificuldades, “faz tempo que estou aqui, várias crianças passaram por mim e ainda

estão, eu não vejo dificuldade, os outros, as pessoas de fora, os próprios voluntários que trabalham

com algumas crianças minhas, às vezes veem uma certa dificuldade de contornar uma situação, eu

não vejo porque os meus me obedecem. Mas às vezes com os outros eles não, não é que eles têm

medo, mas é uma questão de respeito, eu não vejo dificuldades nos meus. Eu gostaria que às vezes

eles pudessem entender melhor a mensagem né, às vezes eles não entendem, mas desde um bebê

a gente têm que tentar transmitir, às vezes a gente pensa que não entende. (...) no dizer de uma

coisa. Hoje eu tava limpando a casa e o bebê tava de manha, chorando, eu peguei ele e conversei

que a mãe tinha que limpar o chão e ele tinha que ficar quietinho, que a mãe ia colocar ele pra tomar

sol no quarto, ele se espreguiçou e ficou quietinho um pouco, ele é um bebê, é pequenininho, mas a

gente têm que ir conversando desde pequeno. Os outros, às vezes a gente pensa que eles não

entendem, mas eles entendem. No querer passar uma mensagem para eles entender, mas numa

questão de estudo, aprendizado, eles são espertos, eles entendem, às vezes eles se fazem não

entender.”

A educação de cada criança é feita pela sua mãe social, que deve achar a

melhor maneira de educar, MS 6 (Instituição 3) conta que “tem momentos em que se

repete uma explicação algumas vezes e a criança não tá nem ai, é sim e pronto, parece que você é

um nada ali falando. Às vezes lá na frente, uma semana, duas, a criança pega e faz sem você

mandar, aí a gente fica muito feliz, porque não sai na hora mas às vezes depois a criança por conta

própria acaba entrando naquele ritmo e a gente fica feliz, não pegaram no momento mas vai servir

em algum momento pra eles. (...) Às vezes a gente pensa, não adianta, mas eu mesmo peguei eles

sem limites, sem horários, sem nada, aí peguei eles e comecei a colocar rotina, organizar, eu sempre

tive os grandes, o último organiza o banheiro, não fica nada de roupa no banheiro, no início eu falava

e parecia coisa de outro mundo, hoje é tudo organizado, depois do banho o banheiro está seco,

levantam o tapete. Eles revezam as coisas da casa, depois eu elogio por mais que fique sujo, eu

organizo depois. É uma coisa que foi assim em um ano, pode parecer um tempo grande, mas pra

eles foi muito difícil, e hoje ninguém tem medo de ser o último a tomar banho, no início ninguém

queria e hoje não interessa. Às vezes alguém esquece, o outro veio e falou que tava desorganizado e

foi lá arrumar.”

MS 7 (Instituição 3) se percebe rígida com as crianças, “o pai é mais solto assim,

até porque eu fico o dia inteiro com eles e ele só chega a tarde, então tudo é dez. E como é o dia

inteiro, o dia inteiro, sou uma pessoa rígida com eles, como poderia dizer, eu cobro mais deles, mais

brinco bastante com eles, passo a mão em bastante coisa, se for cobrar o dia inteiro tudo que eles

fazem, meu D - us. Ponho eles de castigo na cadeirinha, da disciplina, assim que põe de castigo

quando faz alguma arte.” Segue dizendo que cada um tem seu método, “eu sempre ponho

na cadeirinha, ou boto no quarto, as meninas boto no quarto, vão lá pro quarto e ficam lá, elas vão e

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ficam, mas se for cobrar o dia inteiro, o dia inteiro criança apronta, daí acaba assim, só brigando, só

cobrando. Acho que eu sou mais leve, eu cobro, sou muito de falar, falo bastante, mas eu não cobro

muito deles não, muito pouco castigo deles, até porque eu acho que eles já têm bastante regras,

horários, acaba cobrando demais, então automaticamente eles já crescem com esse compromisso

dos horários, da rotina, acorda tal horário, faz isso, faz aquilo.”

MS 7 (Instituição 3) relata que cada um faz a sua casa, “essa aqui é minha

família, eu que lido com a minha família. Do jeito que eu criei a minha eu crio eles, eu adaptei aquilo

aqui e continuo, eu acabo falando muito, vou por você de castigo, vou por você no quarto, mas acabo

deixando, relevando um pouco para evitar muito castigo porque eu acho que vai prejudicar eles.”

Refere-se a liberdade que cada um tem também para seguir sua religião e

passar as suas crianças, “esses dias veio tarefa da escola, que religião ela era, e ela colocou,

sou católica, aí alguma pergunta sobre os pais, e ela se confundiu. A mãe vai pra Assembléia de D -

us, você acompanha a mãe, pode colocar isso, eu nunca passo que tem que ir, eles vão porque

gostam, são livres, ela colocou, sou católica mas vou na Assembléia de D - us com a minha mãe. Eu

nunca passo que tem que ser assim, a única coisa que faço é levar, porque alguma coisa tem que ir,

como sou de lá, levo lá. Nunca falaram que não querem ir, lá tem escolinhas pra eles, e eles

frequentam, lá eles cantam, fazem lição, contam histórias.” MS 7 (Instituição 3).

MS 5 (Instituição 3) complementa dizendo que uma mãe social não interfere

na educação que a outra está dando, “a gente não interfere, se ela chama atenção de uma

criança eu não falo nada. Só se ver alguma coisa no pátio que a gente vê que estão errados, mas na

parte da educação o que pode o que não pode cada mãe educa os seus, a gente não interfere um no

outro né e também a gente não dá opinião, cada uma faz do seu jeito. (...) É uma equipe,

trabalhamos pelo mesmo objetivo, mas com jeitos diferentes. Por mais que eu consiga convencer os

meus do meu jeito, talvez eu não consiga os outros. E às vezes também, a MS 6 tem dificuldade com

outras crianças, eu não interfiro, ela é minha filha, mas eu não interfiro, ela que cuida, ela é

responsável. Se ela tiver alguma dificuldade ela fala com diretora, com a psicóloga, se pede uma

opinião a gente pode ajudar, mas sem interferir uma no trabalho da outra. Se põe de castigo é quem

colocou que tira.”

As mães sociais assumem as mudanças na vida após se tornarem mães

sociais, MS 6 (Instituição 3), “eu amadureci bastante, mudou assim um monte de coisa, sei lá,

eu creio que eu aprendi bastante coisas assim. Quando eu entrei não sabia nem trocar uma fralda,

com o tempo assim sabe, como eu digo, se eu tivesse meu filho hoje, eu falo nossa, tem tanta coisa

que eu não fiz pra ele, tanta estimulação, tanta coisa que hoje eu sei fazer, e assim, ninguém veio

dizer, com o tempo, indo, vendo, fazendo, e com o tempo assim sabe, então o amadurecimento foi

uma coisa. A aprendizagem que eu tenho hoje, hoje se me derem um bebê de um dia eu acho que

tenho aquela condição, eu tenho medo lógico por ter os demais, mas eu acho que sou capaz hoje de

desempenhar coisas que há cinco anos atrás eu não conseguia.” MS 7 (Instituição 3) responde

que mudou tudo, “tudo (ri), tudo, tudo, tudo, tudo, tudo porque é totalmente diferente. Era nós três,

agora é em dez, começa com a alimentação, eu sirvo todos eles, eu quem cozinho, são oito

49

chamando o dia todo, colocando pijama, fazendo tarefa de casa, antes eu pegava uma arrumava e

saia, agora é bem diferente. O marido, eu que fiquei com ciúmes, porque ele me dá oi e vai brincar

com as crianças, muda bastante é como se tivesse dez filhos. Agora repartimos o amor por todos.

Meu marido se refere aos meus filhos aos oito, e não só a filha. Eu também, não penso só na filha e

sim nas crianças, então muda bastante. Pra mim mesmo, um outro mundo, bem diferente.” MS 5

(Instituição 3) já se refere a uma mudança de outra forma, “não mudou muita coisa,

diminuiu do que era antes, diminui meus compromissos, obrigações, eu acho mais fácil ser mãe

social que auxiliar de enfermagem. A minha responsabilidade era muito grande como plantonista da

noite. Aqui tenho responsabilidade grande, de mãe e dona de casa, tenho vidas sob minha

responsabilidade, mas no hospital era bem diferente, era muito mais responsabilidade. Então hoje

vejo que é mais tranquilo. Hoje eu do remédio, cuido de um bebê a noite, mas é aquela coisa mais

light.”

As mães sociais relatam sobre a dificuldade de lidar quando as crianças vão

embora, MS 6 (Instituição 3) “tem o espacinho deles guardado, quando a gente faz uma comida

a gente pensa, ele gostava, uma roupa quando a gente vê, isso é a cara deste, ou daquele. Mesmo

sabendo que foram transferidos pra um lugar melhor a gente lembra deles e gosta do mesmo jeito.

(...) alguns cresceram aqui dentro e foram transferidos. É um apego que pega por eles sem

compromisso nenhum, a gente acaba pegando. Alguns como são bastante carentes através afeto

que a gente oferece até eles se apegam.”

MS 5 (Instituição 3) também revela sua dificuldade nesta separação, “é

complicado, aí sim pesa, pra nós, mãe, pai, cada desligamento a gente sofre muito, mas eu me

colocando no lugar deles, eles sofrem muito mais. Hoje tenho crianças grandes que já entreguei,

muitos mandam cartas, e-mails, os pais mandam cartas agradecendo pela educação, pelas crianças

maravilhosas que são. Eu acho que eles sofrem bem mais, porque a gente é um trabalho, cada

criança que é inserida numa família, para nós é uma vitória, é o sonho de cada um ter uma família,

uma casa de verdade, eles custam a acostumar, eles sofrem no começo. A maioria dos casais traz

para visitar, passear, cada saída de volta eles choram denovo. É sempre uma tentativa de retorno à

família, não havendo possibilidade, vai para adoção. É poucos os que não voltam nos visitar.”

“Quando eles saem a gente já começa a preparar, que vão para uma mãe de verdade, uma família,

que eu vou ficar aqui, que sempre que eles voltarem a mãe vai estar aqui, alguns demoram a voltar,

outros já vêm logo, mas quando a criança já tá falando, mais grandinha, já volta chamando de tia.

Quando volta para família biológica a gente acompanha, pegamos no pé, para que a família

realmente mude.” (MS 5 Instituição 3).

MS 6 (Instituição 3) acredita que as crianças se sentem em casa na

Instituição, “não conheço outras Casas Lares, só conheço aqui mesmo e a gente pode deixar o

portão aberto eu nunca vi ninguém dizendo eu to indo embora, não quero ficar, eles se sentem

seguros aqui dentro, quando eles saem passear, vai chegando final da tarde eles começam a dizer

que têm que ir para casa. Pelo meu ver eles se sentem bem aqui, uns já falam que não querem ir

50

embora, querem morar aqui, eles olham como uma casa e não como um abrigo, eu acredito que seja

assim.”

A relação na Instituição, segundo MS 6 (Instituição 3) é bem aberta “aqui todo

mundo trabalha em grupo né, se eu tenho uma dificuldade eu procuro ajuda, não é assim o caso de

uma se intrometer uma na outra, cada uma cuida da sua casa, mas a gente sempre se ajuda, por

exemplo, se uma criança fala que ta precisando de ajuda a gente ajuda, a gente assim, sabe, é bem

unida, é um grupo que quando precisa a gente fala. Eu, com as mães sociais e as outras pessoas da

Instituição, é todo mundo bem unido, fica uma coisa bem legal assim, a gente acaba se sentindo em

família também, todo mundo. Que nem os da minha mãe são filhos né, chamam ela de mãe, os meus

chamam minha mãe de nona, porque meu filho a chama de nona, também a gente têm o costume de

fazer almoço, de lanchar juntos, coisa assim de família mesmo, vão dormir lá, eu já trouxe uns pra

dormir comigo, aquele negócio de rotina de família mesmo bem gostoso.”

51

3 DISCUSSÃO E RESULTADOS

Segue-se com partes das entrevistas realizadas para ir evidenciando e

destacando os trechos que correlacionam à forma em que se pode demonstrar as

possibilidades de investimento de desejo das mães sociais no exercício da função

materna. Podem ser percebidas pela maneira com que as mães sociais se

posicionam diante da entrevista e diante das crianças.

Já nas entrevistas com as responsáveis locais foi possível observar a

dinâmica de como as mães sociais ou as Instituições como um todo lidam com as

crianças que acolhem. Enquanto é realizada uma conversa com a responsável local

da Instituição 2, fica um bebê brincando em um “tapetinho no chão”. Nesta cena,

duas hipóteses podem ser apresentadas, inicialmente pode-se passar a idéia de que

o bebê fica “abandonado”, sem atenção dedicada a ele, mas, a outra idéia, é que

surge a necessidade de correlacionar a Casa Lar com o dia a dia de uma casa, onde

a mãe biológica nem sempre pode dar atenção a todo momento ao seu filho

mostrando que a mãe, seja ela social ou biológica, pode vir a faltar. Mas para que

isto se realize, a mãe social (objeto de estudo do trabalho) deve ter sido submetida à

castração, ter seus limites introjetados, para poder ficar tranquila ao se separar da

criança por um momento. Ainda, deve-se valorizar que, inicialmente, o bebê é

inteiramente alienado ao Outro e esta alienação começa a mudar quando a criança

percebe a falta no Outro.

Ao longo da conversa na Instituição 2, o telefone toca algumas vezes com

pessoas oferecendo voluntariado, oferecendo doações, o que a diretora diz ser

normal. Isto foi uma característica encontrada também na Instituição 3, em que a

quantidade de doações é muito grande, chegando a Psicóloga (Instituição 3) fazer

um programa em que se muitos brinquedos fossem estragados, eles não receberiam

outros, pois, pela grande disponibilidade de brinquedos novos, as crianças estavam

perdendo a idéia do cuidado com as coisas. Pode-se pensar que a Psicóloga tem

um cuidado de colocar uma Lei na Instituição. Além de que, assim como é

importante que a mãe possa faltar, outras coisas -objetos- também irão faltar ao

longo da vida.

A maneira com que as mães sociais ingressam na Instituição representa a

forma em que o desejo inicial se manifesta, pois há diferentes motivações para se

trabalhar nesta profissão. Em sua maioria, as mães sociais já haviam trabalhado

52

com crianças, algumas cuidando em suas residências ou como babás, há também

casos de mães sociais que chegaram para trabalhar direto em Casa Lar, como MS 4

(Instituição 2) que veio por um convite de trabalho sem nunca ter tido contato com

crianças e “com o tempo a gente vai pegando amor por eles.” Já MS 7 (Instituição 3)

trabalhava com crianças na Igreja e o convite surgiu pela secretária da diretora da

Instituição 1, e, como não queria mais ter filhos além de sua filha, achou interessante

– até para sua filha - poder estar com outras crianças “pensei em fazer algo que ajudasse

a ela e a mim também né, na educação dela.” MS 5 (Instituição 3) também entra pelo viés

da criação dos filhos, após se mudar do interior para Curitiba, ficava assustada de

pegar ônibus e deixar sua filha livre, “eu tinha muito medo porque a gente via muita notícia de

marginalidade na televisão, eu toda vida fui aquela mãezona que protegia muito, tinha medo de

deixar ela sozinha, até mesmo para ir para escola, e ficar pegando ônibus pra ir pro trabalho”, assim

viu neste trabalho uma oportunidade de cuidar de sua filha em um lugar que ficariam

próximas e considera seguro.

Pode-se afirmar, apesar destas motivações relatadas, que as escolhas

passam por fatores conscientes e inconscientes, pois o desejo nada mais é que a

vontade inconsciente, é a inclinação que o sujeito tem e não domina. Então o que

pode ser destacado é que, em cada uma das mulheres que trabalham como mães

sociais, há algo particular que lhes chamou atenção, pois, propostas de trabalho se

tem diversas, mas, se esta ressoou na escuta, é porque algo em desempenhar a

função materna as atraiu, e isto deve ser desvendado no decorrer da discussão.

Durante a conversa com MS 3 (Instituição 2), esta foi solicitada a abrir a

porta, servir café e também foi dar atenção a uma avó, entre outras situações

descritas em sua fala. Percebe-se um acúmulo de funções, o que pode representar

uma dificuldade em despender uma atenção adequada às crianças. Levanta-se um

questionamento no sentido de como esta mãe social é registrada, pois assim

também tem por sua responsabilidade a cozinha, como já citado na caracterização

das instituições.

Apesar de se queixar, MS 3 (Instituição 2) revela através de sua fala no

decorrer da entrevista, algo sobre seu desejo. Há uma posição de orgulho no papel

de quem possui muito trabalho para realizar, como pode ser visto, “(...) nós tava

trabalhando mais e comendo menos daí que a gente tava com excesso de serviço, daí deu stress,

(...) chegava de noite queria dobrar roupa, daí o médico falou para eu parar, (ri) tem que ir devagar,

chegou tal hora, seis horas, sete horas, para vai pro quarto toma banho assiste TV, jornal, novela

53

porque se não você só quer trabalho, trabalho.” Em outro momento diz: “Tem hora que os três

bebês querem mamar, os três têm que trocar fralda, às vezes, hora de janta, de dar banho, hora de

tudo, tem que ficar sozinha aqui, pra dar conta dos dez, agora é dez né, normalmente é doze. E no

começo mesmo, na quarta feira que era folga da mãe social eu ficava sozinha com os doze, era

terrível, nossa, dava comida pros doze, dava banho nos doze, era o dia todo. Então, se vir lá de fora

achando que vai ficar aqui, que vai ficar tranquilo, não fica, porque é muito trabalho. Ainda agora se

sai uma de folga a gente fica em duas, mesmo assim. Tem pessoas que vêm aqui, trabalham dois

dias e não voltam nem pra receber, então se vir aqui só por causa do trabalho não fica.” MS 3

(Instituição 2).

Sua fala pode ser comparada a de uma dona de casa, que não tem mais

tempo para ela, pois está acumulada de funções, se dedicando a casa e aos filhos,

gozando desta posição. O gozo aqui pode ser entendido como o que dá sentido ao

sofrimento, onde a pulsão fica se satisfazendo. Pereirinha (1997, citado por LIMA e

FREGONEZZI, 2006) complementa argumentando que enquanto se goza, é feliz. É

feliz tanto na ‘felicidade’ como na infelicidade, no bem como no mal, no prazer e na

dor. Assim, MS 3 (Instituição 2) se encontra psiquicamente dividida, entre ser

mulher, ser dona de casa e ser mãe, situação que pode ser encontrada em algumas

mulheres. Esta associação pode representar que, estando MS 3 (Instituição 2)

identificada a esta posição descrita, é uma pista de que há um desejo em

desempenhar a função materna, que está podendo ser desempenhada através de

uma maneira singular.

Já no contato com MS 2 (Instituição 1) a relação também aparece, no

momento em que esta que trabalhava como mãe social e passou a ser atendente de

berçário. Após um tempo, não estava conseguindo conciliar em ser mãe social e

estar casada, “a gente não têm a privacidade da gente, às vezes a gente quer sair com o marido,

com o filho e não tem como. Os anos que fui mãe social, nunca saí com meu marido a noite, jantar

fora. Eu tinha a minha folga, mas saia de folga e ficava com a cabeça aqui, não se desliga, ficava

pensando se eles estavam bem.”

Se pensar sobre o desejo que está podendo investir neste momento, ela se

encontra diante da situação que não conseguiu conciliar a sua vida pessoal com a

responsabilidade de cuidar de uma Casa Lar, assim lhe tranquiliza saber que ao final

do dia retornará a sua casa e terá outra pessoa como responsável das crianças. A

MS 4 (Instituição 2) apesar de ser registrada como mãe social, não exerce mais esta

função como primordial, pois após casar, preferiu a função da limpeza. Estes

exemplos não significam que não haja um investimento destas mulheres como mães

54

sociais, e sim fica evidente que elas puderam reconhecer suas limitações para lidar

com elas.

Dando sequência a maneira com que as mães sociais percebem a rotina,

verifica-se que algumas têm uma possibilidade de investimento maior a outras,

conseguindo conciliar a vida pessoal com o trabalho, como MS 5 (Instituição 3)

relata, “minhas funções começam as seis da manhã, tirando a noite né?! Já é hora de levantar, aí já

chamo as duas que vão para escola, tem dias e horários diferentes, daí tem que acordar eles,

arrumar para ir para escola, o cabelo de A. dá um trabalhão pra arrumar, fazer café para os que vão

para escola, os da creche não tomam em casa. Aí levar para escola, (...). Depois tomo um banho,

arrumo meu quarto, e daí já começa a organização da casa, tiro um tempo para o bebê, dar mama,

troco a fralda, dar banho, colinho. (...) Aquela rotina toda, mas sempre dá um tempo para descansar,

eu faço artesanatos também, pra vender, faço pra nós, pra mim, e eu do conta, dou colinho pros

bebês, sobra um tempo pro marido também.” Ou, como diz MS 6 (Instituição 3) “(...) Têm dias

que a gente acaba achando que nem é trabalho, acaba levando a vida como se fosse a casa da

gente mesmo.” Esta ainda acrescenta que “(...) como a gente (MS 6 e o marido) têm um quarto

restrito, sobra tempo assim, mas do mesmo jeito, acaba se enturmando, dá pra ser mãe, mulher tudo

junto, come junto todo mundo, lancha junto, vê TV todo mundo junto, apesar de ter TV nos quartos a

gente prefere ficar assistindo junto, fica mais a vontade, tem com quem comentar, a gente acabou se

tornando mesmo uma família mesmo assim aqui dentro também. Pro marido um pouco mais difícil

porque eu já tinha o conhecimento, já tinha um filho também, ele não, ele entrou com dezenove anos,

hoje ta com vinte e um anos, então pra ele foi uma experiência, mas eu nunca ouvi ele reclamar (...).”

Estes relatos falam de mulheres que estão podendo conciliar seu desejo de

ser mãe, ter um marido e fazer suas atividades particulares, ou seja, transitam por

diferentes papéis com mais tranquilidade. No dizer de Nomine esta revela que “a

criança não é a única a dividi-la, porque ela não é toda. Ela não é toda para mãe,

não é toda fálica e certamente ela não é toda para a criança, ela é também uma

mulher para o pai.” (1997, p.20).

Ao assumir a profissão de mãe social, elas- em sua maioria- se consideram

“mães mesmo”, como MS 3 (Instituição 2) que diz perceber a profissão de mãe

social, como uma dona de casa, assim como acredita que as crianças se sentem em

casa. MS 6 (Instituição 3) garante que “(...) eles se sentem seguros aqui dentro, quando eles

saem passear, vai chegando final da tarde eles começam a dizer que ta na hora de ir para casa. (...)”

MS 3 (Instituição 2) revela que tinha curiosidade em conhecer uma Casa Lar, e

assim, ao seu ver, descobre ser uma “casa normal”, como cita, “é curiosidade de

conhecer assim (ri) de ver como funciona, mas funciona que nem uma casa, eu acho que não tem

(pausa) eh, que nem um lar assim, funciona que nem uma residência mesmo.”

55

Sendo assim, como as mães sociais moram nas instituições, tendem a

possibilitar um lar e uma estrutura de confiança para as crianças. Para algumas

crianças, é uma possibilidade de ressignificar noções de convivência familiar. Assim,

a idéia de se estar em família é algo transmitido pela vivência cotidiana,

considerando que as crianças – naquele momento- fazem parte daquela família,

com pai e mãe.

Aspectos como segurança e suporte emocional são importantes de serem

passados para que ocorra um desenvolvimento saudável das crianças.

Conforme citado na Introdução, o abrigo não é um corredor de espera, pois

este tempo na vida da criança – ainda mais dos bebês, idade abordada no trabalho-

é determinante. Para que isto aconteça, a mãe social deve se satisfazer e

proporcionar esta convivência função materna X bebê/criança. Assim, deve estar

investida de desejo, possibilitando que a função materna seja desempenhada de

uma forma “suficientemente boa”, no dizer de Winnicott. E, nos trechos citado, estas

mães sociais descrevem que isto é possível.

MS 5 (Instituição 3) responde o que é ser mãe social para ela, “(...) eu acho que

ser mãe social são duas coisas juntas, ser mãe como a gente é com os filhos da gente, que não é

social nenhum, é mãe mesmo e mãe social é porque a gente têm um jeito diferente de socializar as

crianças, assim de poder fazer coisas diferentes com eles, e não só ser mãe, porque a mãe é casa,

comida, carinho e levar para escola, aqui é muito mais do que isso, a gente tem que além, ser mais

como uma roupa social, é uma roupa mais, (...) meus filhos se criaram, não tinha muito isto de sair,

de se introduzir com outras pessoas e os daqui têm, e é um objetivo, isso é ser mãe social.” Esta

mãe social passa a idéia de que há uma responsabilidade a mais em lidar com estas

crianças que não biológicas, no que diz respeito ao inserir as crianças no social.

Sobre isto, Paim (2007) afirma sustentando a idéia de que o bebê nasce

imerso no mundo cultural e simbólico, porém necessita do Outro e dos outros para

começar a se apropriar dos significantes que o marcam. É essencial o Outro supor

ações e necessidades, fazer suposições de demandas em seu bebê, a fim de

conceder antecipações, dar-lhe crédito, formular hipóteses, pois dessa forma enviará

os significantes. Assim, inicialmente este corpo orgânico, fragmentado, começará a

se construir subjetivamente sobre a imagem de quem exerce a função materna,

onde a linguagem produzirá enlaces com ações que possam gerar cenas,

deslizando para diversos sentidos, engatados numa cadeia de significantes.

Diferente de outros animais, o bebê humano nasce incompleto, com um potencial

56

em desenvolvimento e uma plasticidade que vai se organizando e reorganizando

frente aos desafios que são lançados pelo Outro. Estas primeiras experiências vão

deixando as suas marcas, seus traços. Este potencial biológico no qual nasce o

bebê humano, é pulsionado pelo desejo do Outro, através da linguagem, pelo olhar,

pelo gesto, pela palavra e toque propriamente dito. O Outro materno estabelece

traços e marcas fundantes para a constituição do sujeito, humanizando-o.

MS 4 (Instituição 2) também dá a sua resposta ao que é ser mãe social, “(...)

ser mãe, é sim, mãe. (pausa) (...), eu sei que é muito bom, não tem como explicar, é bom ser mãe. Às

vezes vem um lá de fora gritando mãe, aí você sente aquela coisa gostosa sabe... Às vezes eles

chamam a gente de mãe, eles sentem falta de chamar alguém de mãe.” Esta profissional ainda

não possui seus filhos biológicos, mas já demonstra estar identificada a esta

posição, como relata, “eu não sou mãe ainda, mas eu me vejo mãe (ri), mais dos pequenininhos,

dos bebezinhos, até os grandes, eles perguntam pra gente, tia você é minha mãe... Sou, sou tua

mãe, sei lá, eu me vejo mãe. Por mais que eu mesma não tenha filho meu mesmo, eu me vejo.”

Há um destaque nestas falas para sensação de realização que MS 4

(Instituição 2) descreve ao ouvir que é chamada de mãe, há uma satisfação desta

mulher ao ser reconhecida assim, o que demonstra o investimento nesta posição de

“mãe” que vem ocupar.

Isto acontece apesar de MS 4 (Instituição 2) ter revelado que na Instituição a

qual trabalha, optou-se por se referir as mães sociais como “tias”, “pois teve muita troca

de mães, tinha dia que os coitados não sabiam quem era a mãe deles. Eu achei melhor assim, aí até

a mãe social eles chamam de tia, tudo tia.” (MS 4 Instituição 2). Mas afirma que às vezes têm

alguns que a chamam de mãe, não escondendo sua emoção de quando isto

acontece.

Já MS 7 (Instituição 3) além de afirmar que se percebe como mãe mesmo, e

contar de duas crianças que depois de um tempo passaram a se sentir mais seguras

tendo os pais, complementa que, “eles gostam dos pais sociais pela comida e pela troca (...)

porque as crianças não entendem eu acho, não sei talvez assim, só amor, porque a gente dá

comidinha na hora certa, banho. Agora é horário de comer, de limpar, e é isso que vai fazendo eles

se apegar mais na gente, querendo ou não já envolve um amor, mesmo que não ta pegando

abraçando e beijando o tempo todo, isso já faz que eles já sintam isso.”

Sobre esta fala, Catão (2008, p.38) afirma que uma instituição pode

desempenhar a função materna/paterna necessária a um bebê em sua constituição

como ser humano – e, frequentemente, desempenha – contanto que não esteja

atenta apenas ao que é da ordem da necessidade (fome, sede). Pois maternar um

57

bebê não se limita, em momento algum, apenas aos cuidados de alimentação e

higiene. Maternar um bebê é também dirigir-lhe palavras. Segundo Cabassu “depois

de uma carência precoce, uma instituição pode estar perpetuando a mesma

carência apesar da qualidade e quantidade de comida e de cuidados que dispensa,

em consequência do anonimato no qual as crianças são deixadas.” (1997, p.29

citado por CATÃO 2008, p. 38).

Ou seja, a MS 7 (Instituição 3) demonstra em sua fala não acreditar no

investimento afetivo necessário que vai além de suprir as necessidades básicas,

mas que são imprescindíveis.

Na Instituição 2, as mães sociais 3 e 4 relatam que chegaram a sair da

Instituição, “eu saí uma época, dois anos atrás eu tinha saído, tava com stress, cansaço, daí saí e

agora voltei (rindo) de volta, daí descansei um pouco e vim.” (MS 3) e MS 4 (Instituição 2) “eu

comecei a ficar em casa, assim, comecei a pensar neles, não conseguia trabalhar em outra coisa,

não conseguia outro serviço, tudo, quando tava pra começar, eu não conseguia. Aí eu pedi, vim,

conversei, pedi pra voltar e dois meses depois eu tava aqui, trabalhando com eles.” “(...) sonhava

com eles a noite, o dia todo eu pensava (...). Não sei sabe... Não sei se conseguiria trabalhar em

outra coisa não, com criança mesmo. Eu faço o que eu gosto.”

Estes trechos representam o apego com que algumas mães sociais, apesar

das dificuldades, possuem pelas crianças. Há uma sensação de prazer e de gozo,

pois não conseguem de certa forma se desligar da Instituição, do papel que ocupam

na vida destas crianças, nem do papel que as crianças ocupam em suas vidas. A

hipótese de que a criança pode ser tomada no lugar do que falta à mãe, isto é, como

objeto de seu desejo e, quando a mãe social se desliga da Instituição, abdica desta

posição também pode ser levada em conta.

Este aspecto aparece também quando as mães sociais se referem ao

momento em que algumas crianças fazem retorno familiar, são adotadas ou mudam

de Instituição. MS 4 (Instituição 2) relata, “quando eles vão embora mesmo assim, nossa, a

gente sente, na verdade a gente sente bem quando eles tão indo embora pra uma família, ah eh uma

coisa que não dá pra explicar (...) com o tempo a gente vai aceitando que a gente tem que cuidar,

eles chegam aqui a gente cuida e eles vão embora depois. Ainda acontece de se apegar mesmo

bastante.” MS 6 (Instituição 3) também se refere a esta situação com dificuldade,

“quando eles vão embora a gente fica muito triste, (...) mas ao mesmo tempo fica feliz, porque sabe

que eles estão indo pra um caminho bom, de uma família. Porque a gente não tem condições de dar

um futuro, um lar pra eles, uma casa de verdade, eles fazendo dezoito anos tem que seguir o

caminho deles.(...).É um apego que pega por eles sem compromisso nenhum, a gente acaba

pegando. Alguns como são bastante carentes através afeto que a gente oferece até eles se apegam.”

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É possível de verificar que existe o desejo de estar com as crianças, mas estas

(mães sociais) reconhecem que a profissão tem seus limites definidos pois são

bebês, crianças que estão somente de forma provisória sob a tutela destas.

Como se vê na fala de MS 6 (Instituição 6) “quando é bebezinho menor a gente

sofre bastante porque acaba se apegando, mesmo não sendo da gente, não é que os outros não

sejam, mas os menores a gente se apega bem mais, você passa mais dias triste, quando entra

dentro da casa parece que falta algo.”

A relação de apego maior com os bebês, crianças pequenas ou com

dificuldades, pode ser destacada em outras entrevistas, MS 4 (Instituição 2) diz, “os

pequenos são bem mais fáceis, eh, os grandes são independentes, você trabalha menos com eles,

eles comem sozinhos, tomam banho sozinhos, os pequenos são mais dependentes de você, mas eu

prefiro os pequenininhos (ri), de dois aninhos. Gosto dos grandes também.”

Este apego maior aos pequenos, bem como a percepção de que é mais

difícil quando é um bebê que se desliga da Instituição, pode estar relacionado ao

fato do bebê depender – de início- totalmente de um Outro. Os bebês precisam ver e

sentir de sua mãe social uma segurança, ou até mesmo, inicialmente, uma extensão

do seu próprio corpo, alguém que lhe forneça subsídios para que se constitua

subjetivamente. Assim, pode haver uma sensação de completude, em que o bebê

ocupa o lugar da falta, mas é uma sensação falsa, pois logo se deparam com o real,

momentos estes em que o bebê acaba falhando como obturador da falta, ou até

mesmo quando saem das Casas Lares.

Assim, a mãe social se encontra em uma situação parecida com que Szejer

descreve,

Do lado da mãe, a castração consiste em dúvida deve se sentir na situação de um prestador de serviços a quem se agradece com sorriso pelo fantástico trabalho realizado, mas a quem depois se agradece secamente, e sem sorriso, porque não se tem mais necessidade dele. É para ela o momento de perceber que, embora seja a autora de seu filho, não é a única. O corpo do filho era locatário do seu, mas nem por isso ela é sua proprietária. (1999 p.162).

MS 5 (Instituição 3) conta de seu gosto de receber nenéns e vê-los crescer,

“é muito gostoso nossa, ele já engordou.” Esta mãe social demonstra sua característica de

se doar, relata episódios de crianças com dificuldades que passaram por sua Casa

Lar e puderam ser cuidadas, “o médico disse que ela sobreviveu por causa do meu carinho e

cuidado. Ela é vitima do alcoolismo fetal, a mãe era soro positivo e ela também é. Ela nasceu muito

pequenininha e frágil, quando eu peguei ela, ela tinha nove meses, sempre os mais doentinhos, com

problemas que precisam de mais cuidado vêm aqui pra casa. (...) Sei lá, aquela afinidade maior, uma

59

criança especial não consegue, você fala vai brincar e ele não consegue, tem que acompanhar, as

outras já fazem. Tem que acompanhar, ter um cuidado, uma dedicação diferenciada com esta

crianças, e com o carinho, com o que a gente consegue passar para eles, isto traz muita segurança

para eles.” Ainda complementa “(...) crianças com problema que a gente cuidava, tinha

enfermeiras que diziam que aquela criança não para, não toma remédio, eu não tinha este problema,

eu agradava, conversava e dava certo, eles aceitavam, não tinha problema em lidar com este tipo de

criança. E aqui os vários que passaram por mim, e ainda tem uma hoje. (...) Eu entreguei um em

dezembro passado ele era um cadeirante, eu fiz ele andar.”

Este desejo de se doar- “instinto materno” manifestado- já está ligado a sua

história de vida, em que seu filho mais velho teve problema de audição, “eu me

dediquei muito a ele, para ele sobreviver. Quando ele nasceu o médico falou que ele não sobreviria.”

(MS 5 Instituição 3). Ou seja, no dizer de Coriat (1997), o Outro -o adulto encarregado

de cuidar da criança- irá manipulá-lo de acordo com o que determinem os

significantes de sua história e de acordo com o lugar que esses significantes

outorguem ao objeto que tem em suas mãos. Esta mãe social tem por preferência

acolher crianças especiais, ou bebês pequenos, pois há uma satisfação narcísica

quando percebe e exibe as crianças fortes e vistosas, é uma forma de mostrar a

maternidade – na visão de MS 5 bem desempenhada- no real.

Ainda pode considerar que as crianças com mais dificuldades necessitam

mais da dedicação de um outro, e MS 5 (Instituição 3) parece encarar isto como um

desafio, onde esta acredita que tem potencial para ajudar, investindo assim a sua

libido nestes casos, e, muitas vezes, acaba tendo resultados que considera positivo.

Sobre a rotina que as mães sociais possuem, pode-se destacar a fala de MS

4 (Instituição 2) “(...) não dá para ficar como se fosse uma babá com a criança, ficar sentada

brincando, não tem tempo aqui. Por isso eles fazem atendimentos fora.”

É importante considerar esta fala, pois pode-se perceber a relação que MS 4

(Instituição 2) faz de mãe social, babá e profissionais que realizam os atendimentos.

A relação com os bebês e as crianças não necessitam só da quantidade de tempo

mas sim a qualidade e a intensidade que a relação pode se estabelecer em

momentos da própria rotina do dia a dia como as refeições, o banho, as trocas de

fralda em relação aos bebês. Em outro momento esta mãe social relata sua rotina,

“(...) chego de manhã, em vez de eu ir lá e fazer meu serviço, não eu fico lá no berço com eles... Aí

às vezes eu converso um pouco com A., V, com o D., acho que eu fico uma hora lá no berço com

eles conversando. Então já é atenção né, já estou dando atenção pra eles. (...) Com os grandes

mesmo a gente vai dar banho a gente começa a conversar com eles, a gente ta trocando, tamo

conversando com eles. (...).”. Ainda complementa, “(...) eh, a gente faz bastante. hoje mesmo

60

quando eu tava dando banho eu colocava ela de pezinho, sentadinha, ensinava a segurar nas

coisas... Cada um faz como pode.”

Então, apesar de, inicialmente, MS 4 (Instituição 2) não querer se equiparar

com uma babá de “gastar” o seu tempo com as crianças, demonstra outros

momentos que pode investir este tempo, estimulando o bebê e satisfazendo-se ao

mesmo tempo.

MS 5 (Instituição 3) também assegura que busca estimular, “gosto de fazer

massagem no banho, estímulo de contato, de conversar, de tudo dizer o que vai fazer, vamos tomar

banho, vamos trocar.” MS 6 (Instituição 3) confirma que “(...) dá sim. Mostra o pé, a mão, no

banho, escova de cabelo, escova de dente, ela adora. Ela gosta quando vou trocar ela, fazer

cócegas, ela fala comigo de manhã, eu fico ouvindo ela e fazendo perguntas e ela fica respondendo,

não sei o que passa na cabeça dela, mas tá estimulando, eu brinco com ela, o pé , a mãe, eu falo

meu nome, e ela repete bem certinho. Todo tempo que ta fazendo uma brincadeirinha, estimula um

monte. Ela abre os armários, antes quando ela começou a engatinhar, andar, eu ensinava ela a

fechar e eu falava parabéns, agora quando ela fecha ela olha esperando o parabéns.”

Esta relação é essencial para o contato do bebê com o mundo, estimular,

nomear o contexto que este é inserido faz função importante na constituição

psíquica do bebê. É salientado também a questão de apostar que ali há um sujeito

em constituição e que vale a pena um investimento. Assim, as mães sociais passam

a conhecer as crianças de uma maneira mais individualizada, aspectos da rotina de

cada uma, dos desejos e vontades, ou seja, de uma maneira mais singular, como se

vê “os nenéns dá pra saber, a gente sabe quando eles tão com fome, bom, eu sei, quando eles tão

com fome, até quando tão com dor mesmo a gente sabe, quando ta de cocô, quando ta de xixi, (...).”

MS 4 (Instituição 2).

Faria (2001, citado por KAMERS, 2004) teoriza que a particularização do

interesse da mãe nos cuidados que ela dedica a seu filho é o que faz do vínculo

mãe-filho não apenas um vínculo fundamental, estruturante, mas estruturante na

medida em que ele é único. Os cuidados maternos, aparentemente universalizáveis

só têm importância na medida em que há essa particularização, na qual cada

criança é marcada por um lugar específico na economia do desejo da mãe.

Sobre isto, MS 2 (Instituição 1) garante que “a gente passa a conhecer cada uma

delas, conhece o gosto de cada uma, do que gosta, do que não gosta, do que gosta de brincar, passa

a conhecer cada uma (...).”

MS 6 (Instituição 3) destaca a forma de mostrar – de uma forma

individualizada- seu carinho pelas crianças, “(...) eu gosto de cada um da sua maneira, o

meu filho eu tenho sentimento diferente por ele, mas eu gosto de cada um de vocês da maneira, eu

61

não posso gostar de duas pessoas da mesma forma, cada um tem uma forma de gostar (...) tem um

que gosta de ficar mais grudado, outro que nem gosta de ficar perto, a gente tem que tomar cuidado

para perceber, não adianta ser carinhosa, amorosa com você, se você não gosta disto, então a gente

tem que saber com cada um devido ao histórico e como chegam aqui (...).”

Chama atenção a tranquilidade na fala desta mãe social em assumir que

gosta de cada criança de uma forma diferente e é esta diferença onde se percebe

que o desejo e o desempenho da função materna está podendo ser investido de

uma forma singular com cada criança.

A maneira com que as mães sociais se dirigiam as crianças quando estas

lhes pediam algo também pode ser observado. Em geral, estavam atentas, de modo

a não deixar as crianças sem acolhimento nas suas necessidades. Mas por serem

várias crianças na mesma casa, é perceptível a tentativa e possibilidade de

negociação das vontades e necessidades, como num grupo de irmãos. A mãe social

não é – e nem deve ser- toda para um só. Isto pode ser visto no recorte com a MS 5

em que, com muita tranquilidade fala com a criança se referindo a si como mãe,

quando esta lhe pede uma laranja, “a mãe não pode descascar a laranja, a mãe tem que

conversar com esta tia e a mãe não tem tempo, come uma banana?” (Instituição 3).

Porém, MS 5 (Instituição 3) ainda complementa “é difícil, sabe, você não consegue

agradar todos do mesmo jeito, tem que ter um jogo de cintura para conseguir. E às vezes se tentar

convencer dois com a mesma palavra, um tu convence, mas o outro não, tem que negociar com eles.

(...) tem que fazer por que tem que fazer e não que vai ganhar alguma coisa. Eu faço trabalho em

grupos com todos juntos, ou acabo fazendo alguma outra coisa, conversando individualmente com

cada um, têm algumas coisas que a gente forma em segredo, com criança é difícil manter em

segredo com eles, mas a gente negocia, (...) então tem que saber negociar com eles se não acaba

brigando e eu não sou de ficar distribuindo tapas, de levantar a mão, eu converso.”

Nestes recortes, pode-se verificar que há a possibilidade de singularização,

mas que em alguns momentos, por serem muitas crianças, outras maneiras devem

ser utilizadas para lidar com elas. E estas outras maneiras mostram que negociar,

conversar, escutar podem ser boas estratégias.

Sobre isto, ainda, MS 4 (Instituição 2) exemplifica a relação que tem com

uma criança que esta saindo da fralda agora, “(...) ele já ta grandão, mas ele não entende

ele não sabe o que é xixi e o que é cocô. Ele pede pra fazer cocô chega lá e faz xixi às vezes e do

contrário, (...). Então, se eu tenho tempo eu lembro ele e falo oh, senta aqui, fica aí que você já faz,

eu fico ali com ele e aí ele consegue fazer, mas quando a gente não tem tempo ele acaba fazendo lá

fora porque ninguém foi lá e chamou ele.” MS 3 (Instituição 2) também diz de uma menina,

com sete meses que está sendo acompanhada pela diretora da Instituição, “ela

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(diretora) leva ela pra casa, estimula ela porque aqui não tem muito tempo assim para ficar com a

criança, desenvolver, (...) porque aqui não tem tempo, nem mesmo com duas mães não dá, elas não

têm tempo de sentar, brincar, estimular, engatinhar. (...).”

Estes exemplos correspondem a mesma Instituição, a qual funciona de

forma distinta das Instituições 1 e 3. Assim, a idéia de uma Casa Lar se constituir

somente com mães sociais, e as funções se misturarem entre cozinheira, limpeza e

mãe social pode representar uma dificuldade de organização, apesar da

possibilidade de investimento de desejo que cada uma das profissionais investe.

Sobre a rotina, MS 5 (Instituição 3) diz que quando chega um recém

nascido, direto do hospital, “a gente acaba fazendo a rotina dele: horário de dormir, de mamar,

banho e a criança acostuma. Agora quando já vem sem rotina nenhuma, sem hábitos de banho, de

higiene, sem horário de comer, o que come, come fora de hora, e a gente começa a estipular um

horário, horário de mamadeira, horário de dormir. Depois elas querem alguma coisa, tem que

negociar uma coisa pela outra, é meio difícil, mas a gente consegue, uma fruta pela outra, ou um

doce pela fruta, elas são espertas, elas pedem. O que uma ganha a outra também quer. Às vezes

não tem, têm que negociar, elas aceitam. E tudo através de horário, se pode ou não. O banho, o

horário de dormir, de passear, de brincar.” Esta fala remete a idéia de que não adianta

somente conhecer as crianças, mas que existem regras, horários, limites na Casa

Lar. Estruturar a rotina, nomeando ao bebê e ás crianças, faz parte da função

materna e a possibilidade da entrada da Lei, pela função paterna, também é.

Existem algumas características que as mães sociais nomearam como

importantes para desempenhar a função materna, MS 6 (Instituição 3) afirma que,

“gostar bastante de crianças, e gostar realmente do que faz, se não, eu acho que não consegue,

porque a gente acaba se doando completo.” MS 7 (Instituição 3) acredita que deve-se ter

amor, “amor e gostar, gostar de criança e ter bastante amor, (...) tem que ter paciência porque é o

dia inteiro mãe, mãe, mãe, é vinte e quatro horas, por dia a noite às vezes tem que levantar, cuidar

deles, então tem que ter muita paciência e amor, porque tendo amor aí você vai ter paciência, vai

aguentar muita coisa, né, e se a pessoa não tiver o amor, não gostar do que faz ela vai perder a

paciência e já vai sair, né. Então eu acho que o principal é ter amor e gostar do que faz (...) tem que

ter bastante paciência, bastante né a vontade também, amor pra ficar, se não tiver paciência não

fica.” Ainda complementa, “tem que ter atenção e falar bem com eles, eles acabam aprendendo.

Tem que ter a maior paciência, às vezes você acaba de trocar de roupa eles vão pra areia, pra água

brincar, eu acabo rindo do que eles fazem pois são crianças que estão aprendendo, se descobrindo

sozinhos, é muito lindo a gente aprende muita coisa com eles.” MS 7 (Instituição 3).

MS 5 (Instituição 3) concorda, “(...) nosso trabalho tem que ser por amor mesmo, se

não desiste, não dá para ser só pelo trabalho. (...) Amor pelo que faz, e não fazer por obrigação.

Sempre falo pras minhas meninas, não adianta fazer as coisas chutando, brava, nunca façam as

63

coisas assim, façam por amor, por gostar e não por obrigação, que alguém mandou, porque nada a

gente consegue se sair bem num trabalho, num trabalho de escola, num curso se fizer por obrigação,

eu acho que a pessoa tem que fazer sempre por gostar.”

As características citadas são permeadas pela relação de desempenhar o

trabalho com o amor, pois se não, a mãe social não permanece com seu trabalho.

Assim foi relatado “tem pessoas que vêm aqui, trabalham dois dias e não voltam nem pra receber,

então se vir aqui só por causa do trabalho não fica.” MS 4 (Instituição 2). Esta palavra, amor,

pode representar um grande investimento pessoal das mães sociais.

Na Instituição 1 a resposta de que “tem que ter tudo” apareceu em ambas as

entrevistas, “acho que experiência, com filhos, com as crianças é o principal porque você ta com as

crianças dia e noite, tem que ter bastante vontade. Pra mim é tudo, você tem que ter tudo, tudo que

precisar você tem que fazer.” MS 1 (Instituição 1). “Tem que ter de tudo um pouco (2X), porque se

não ela não consegue controlar, tem que ser carinhosa, saber a hora do carinho, tem que ser rígida,

ter pulso firme dependendo da criança, mas você tem que dar muito (enfatizando) amor, tem que

passar pra eles que você ama eles, eles já vieram de uma situação bem complicada. Se você

trabalha com uma criança e nunca fala que ama, que trabalho que é esse? Aqui a gente vive falando

que gosta demais.” MS 2 (Instituição 1).

Pode-se destacar nestas falas a intensidade das palavras utilizadas pelas

mães sociais, sempre transbordando de afeto, além de serem palavras fortes, com

potência, se referem a um discurso carinhoso e uma identificação com o ser mãe.

Outro aspecto nestes discursos, é a idéia de que se pode ter todas as

características para desempenhar a função de mãe social. Novamente a idéia de

que se pode –ou se deve- ser completa para ser mãe, aparece. Mas em se referindo

a questão das características, pode-se perceber que o vivenciar da função materna

é uma relação específica com cada criança, além de ter suas vicissitudes de acordo

com as características de cada pessoa que vai desempenhar a função. Assim, a

diversidade encontrada nas diferentes mães sociais possibilita a criança presenciar

diferentes maneiras de ser e estar no mundo.

Sobre isto, MS 4 (Instituição 2) afirma que “a gente faz igual, nós três, não discorda

da outra. Quando acontece de entrar alguma pessoa aqui nova que queira fazer diferente da gente, a

gente vai lá e conversa com a diretora, pede uma reunião, tem que fazer todo mundo igual, se não

vão respeitar uma e não vão respeitar outra e fica lá, aquela tia ali é boazinha e aquela é uma bruxa

(rindo), então é todo mundo, tudo igual.” Esta fala deve ser questionada, pois em um grupo

de pessoas, é importante que haja cada uma com seu perfil e características

próprias, conforme dito acima, mas há um medo de ser confundida com uma “bruxa”,

e não como alguém responsável de inserir leis e regras.

64

Apesar das características que elas listam, as mães não são todas

completas para as crianças e por isto revelam que sentem dificuldades em algumas

questões, como, o cansaço que gera estar disponível dia e noite no trabalho, a falta

de privacidade e o quanto tem que cuidar de si no aspecto mental, pois se não,

como afirma a MS 2 (Instituição 1) “ao invés de passar coisa boa a gente ficava ruim.”

Algumas mães sociais não souberam falar de suas dificuldades, o que pode

evidenciar que a função materna possui sim dificuldades, mas que podem ser

lidadas naturalmente conforme as atividades cotidianas de uma mãe com seus

filhos.

A MS 6 (Instituição 3), relatando suas dificuldades revela como seu desejo

está investido, pois alegando que possui “dificuldade de conseguir entender todos eles, no

início, quando cada criança chega, até conseguir colocar as regras, por exemplo, eu não quero

comer, não quero dormir, sinto dificuldade neste momento, porque a gente tem que colocar os limites,

(...).” Este trecho evidencia que há um desejo de singularizar cada criança, com

objetivo de perceber que todos estão inseridos numa lei maior de regras, mas que

cada um tem suas particularidades que podem ser levadas em conta.

Outra questão que apareceu em alguns discursos foi dificuldade em lidar

com seus filhos biológicos, pois estes perdem a exclusividade e passam a dividir

suas mães com alguns “irmãos”. MS 6 (Instituição 3) conta que seu filho ficou com

febre depois que uma criança menor entrou para sua casa, “tem que acabar passando

por cima disto para dar conta, ele falou pra mim, né mãe que eu não sou mais o seu bebê? E aquilo

doía mas ele só sentia febre quando tava perto de mim (...).” Esta posição de mãe social

destaca que o desejo deve estar latente para conseguir suportar o sofrimento de seu

filho. A filha de MS 7 (Instituição 3) está tendo bastante dificuldade na adaptação, há

um receio grande no que se refere a pensar que as outras crianças estão de

passagem por ali, mas sua filha não, “elas vão pra uma família, vão pra alguém, e ela vai ficar

pra sempre, daí a gente fica preocupada no amanhã né, como será, o que vai ser dela. Ela pode

pensar que a minha mãe me abandonou, minha mãe preferiu as outras crianças, ela pensa isso na

realidade. A gente explica, você é filha da barriga, e os outros são do coração. (...).”

Esta mãe social demonstra ainda estar em conflito com algumas questões

de sua profissão, mas isto pode ser considerado normal, pois ela está há três meses

somente e sua Casa Lar ainda não passou por momentos de saída de crianças.

Sobre isto, Licht (2006, p.69) complementa,

65

Para a psicanálise, a função materna é a que introduz a criança no mundo da linguagem, não se refere simplesmente aos cuidados. Ninguém nasce mãe, essa é uma função que não se desenvolve por instinto, mas através de uma construção.

Porém, sendo a mãe social responsável pela estruturação psíquica dos

bebês, a posição de dúvidas e dificuldades podem interferir na relação. Conforme

Mariotto (2009, p.19) destaca que a fragilidade simbólica por parte dos educadores,

pode colocar em risco o processo de subjetivação da criança atendida.

MS 7 (Instituição 3) revela se sentir acuada por não conhecer bem seus

filhos sociais, segue trecho de sua fala: “você não sabe quem é eles realmente, você acaba

conhecendo por fora, o basicão, é teimoso, é briguento, este tipo de coisa, mas assim, assim bem

conhecendo você acaba não conhecendo. Tem crianças que falam aqui, a tia bateu, mas a tia não

bateu, a tia botou de castigo, tem tudo isso, e do teu filho você conhece, se você brigar, colocar de

castigo ele vai falar isso. Agora a criança que vem aqui às vezes dá receio de colocar de castigo

também, é complicado, a gente não bate neles, mas eles podem falar que a gente bateu, entre eles

mesmo eles se batem. A gente fica um pouquinho de receio das atitudes deles próprios, e os filhos da

gente é diferente, a gente se sente mais livre de corrigir, de cobrar e essas crianças nem deve cobrar

muito, nem deve, eu acho, porque acaba lá na frente, a gente não sabe o que pode acontecer. (...) eu

nem sei, os pequenos de menos, mas os mais velhos eu não sei, a criança, a gente não conhece a

família, não conhece a criança, então é muito complicado assim as crianças que vêm, que aparecem

derrepente, derrepente as coisas mudam, ela chega, você é mãe, ela é filha (...).”

Diante deste discurso, o tema do Complexo de Édipo vem a tona, podendo

ser pensado pela via de que esta mãe social se encontra receosa e sob interdição

de uma instância de lei, que pode ser exercida pelo pai, mas neste contexto, vem do

social, havendo receio do que pode ser pensado por serem crianças que estão sob

tutela do Estado, além de MS 7 (Instituição 3) se encontrar cautelosa pois tem receio

por não saber com quem está lidando.

MS 5 (Instituição 3) transmite que as outras pessoas podem ter dificuldades

com suas crianças, mas ela sabe como lidar com eles, isto demonstra que há uma

forma singular na relação mãe-filho que esta mãe social estabelece com “suas”

crianças, como diz na sua fala, “(...) as pessoas de fora, os próprios voluntários que trabalham

com algumas crianças minhas, às vezes veem uma certa dificuldade de contornar uma situação, eu

não vejo porque os meus, me obedecem. Mas às vezes com os outros eles não, não é que eles tem

medo, mas é uma questão de respeito. Eu gostaria que às vezes eles pudessem entender melhor a

mensagem né, às vezes eles não entendem, mas desde um bebê a gente tem que tentar transmitir,

às vezes a gente pensa que não entende. (...) no dizer de uma coisa. Hoje eu tava limpando a casa e

o bebê tava de manha, chorando, eu peguei ele e conversei que a mãe tinha que limpar o chão e ele

tinha que ficar quietinho, que a mãe ia colocar ele pra tomar sol no quarto, ele se espreguiçou e ficou

66

quietinho um pouco, ele é um bebê, é pequenininho, mas a gente tem que ir conversando desde

pequeno.” Ainda demonstra dúvida do quanto os bebês poderiam entender o que fala,

mas com seu desejo anunciado, esta faz uma aposta de que sim, dá para conversar

e falar que é importante.

Após falar sobre suas dificuldades, as mães sociais são interrogadas sobre a

questão central do trabalho - apesar de estar evidente parte dela em outras

questões - ou seja, qual o desejo destas mães sociais em desempenhar a função

materna com filhos que não são seus.

As mães sociais ficaram sem saber colocar palavras nesta resposta, o que

pode ser considerado normal, pois o desejo pode não estar assumido de forma

consciente e clara a elas além de que o desejo fica declarado como algo do que não

pode ser dito, nem entendido, mas percebido e sentido, como se percebe na fala de

MS 2 (Instituição 1) “é tão difícil de falar, eu me sinto tão bem com eles, igual eu te falei, se um

dia eu sair daqui eu vou sofrer tanto, eu acho que sou carinhosa, claro que na hora de por limite, tem

que por limite.” E MS 6 (Instituição 3) “não sei, é uma coisa gratificante pra gente, não sei

explicar assim como, mas acho uma coisa tão legal assim que sei lá, sem explicações, uma coisa

muito legal mesmo. Eu não consigo expressar, sei lá, a gente se sente feliz, se sente triste, toma dor

do outro, é uma coisa sem explicação, é uma coisa que acontece, não sei.”

Outras respostas foram citadas em outro momento, como a dificuldade de ir

embora, ou o desligamento com as crianças. MS 6 (Instituição 3) revela seu desejo

perpassado pela questão do cuidado, “depois de tudo que eles passaram, espero que tudo de

certo, que aqui a gente incentiva muito o estudo, a alimentação, coisas assim que quem sabe aqui

dentro não veja, ou assim eles progredir aqui dentro mesmo, quem sabe lá fora que de tudo certo pra

eles.” MS 4 (Instituição 2) afirma que, “eu acho que pra trabalhar aqui se você vir pelo salário

você não trabalha, tem que vir realmente se você gostar, que a gente fica aqui dentro só se gostar

mesmo, porque tem horas que tira a gente do sério, tem horas que tem que pegar, sair, dar uma

volta, voltar aqui dentro, porque não é fácil.” Isto é importante, pois uma mãe seja social ou

não deve ter seu tempo para si, e isto não significa que não goste de seus filhos e

sim que ela pode desempenhar papéis além de somente o de mãe, e também, de

mulher, de esposa, entre outros, reconhecendo suas potencialidades e limitações.

67

4 CONCLUSÃO As entrevistas realizadas nas três Instituições demonstram que uma mesma

modalidade de acolhimento – a Casa Lar- pode funcionar de diferentes maneiras,

dependendo da estrutura que se tem organizada para tal e do próprio desejo

encontrado nas diferentes mães sociais. E, além disto, até mesmo existindo um

delineamento de cada Instituição na forma de funcionar, cada mãe social tem a

liberdade de vivenciar a sua casa como quiser, com as suas regras, a sua rotina,

seus valores, a sua forma de educar.

Ao se questionar a possibilidade de investimento de desejo no exercício da

função materna em mães sociais, fica evidente que sim, é possível. No decorrer das

entrevistas e da análise das mesmas, as falas das mães sociais vão se delineando

para diferentes formas e apontamentos, tornando possível verificar que há um

investimento de desejo, singular a cada uma e a cada relação “mãe social X

criança”.

O desempenho da função materna é influenciado por fatores conscientes e

inconscientes. Assim, pode se verificar diferentes maneiras de cada mãe social se

relacionar com as crianças, o que sugere uma diversidade importante, pois se

acolhem também, diferentes crianças. O investimento de cada profissional que

desempenha a função materna é singular e diz de uma experiência e história de vida

própria. Conforme já mencionado, não existe um modelo de boa mãe no qual seja

necessário se enquadrar, sob pena de falhar, mas existe, para cada mulher, uma

forma própria de ser para seu bebê, o que Winnicott chama de uma mãe

“suficientemente boa”.

Destaca-se a identificação da mãe social com a mãe biológica -por conta de

seus anseios, dificuldades e divisões subjetivas- de forma positiva, pois o que é uma

mãe social se não a mãe daquelas crianças naquele momento? É a pessoa de

referência que deve desempenhar a função materna com algumas crianças que não

são suas, mas que, neste momento, se encontram sob sua responsabilidade.

Aponta-se então para a divisão psíquica que as mulheres podem se

encontrar. Transitar pelos papéis de mulher, mãe, dona de casa, esposa é algo

bastante comum no dia a dia, porém nem sempre isto acontece sem sofrimento,

como visto em algumas mães sociais que abdicaram de estar na Instituição as vinte

e quatro horas do dia, pois casaram. Algumas já conseguem lidar melhor com esta

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divisão e levar de uma forma “tranquila”, conforme diz MS 6 (Instituição 3). Já outras

podem vir a gozar desta grande quantidade de papéis que “precisa” desempenhar.

Assim, é importante que a mãe social não seja toda só para um papel e se

encontre também como faltante nos diversos papéis que vem a ocupar. Sobre isto,

foi verificado em alguns momentos a sensação de completude das mães sociais,

mas como já foi dito, é uma falsa ilusão, as mães sociais estão a todo o momento se

encontrando com o real, a falta, nos retornos familiares, nas adoções e nas próprias

crianças falhando como obturadores da falta.

Outro aspecto encontrado na função materna, desempenhada pela mãe

social é que é importante permitir a entrada da Lei, da função paterna. Nas falas em

geral pode aparecer – apesar de não ser o foco do trabalho - a entrada de um

terceiro na relação, por desejo da própria mãe social. Assim, as crianças (da

Instituição 1 e 3, pois a 2 não possui o pai social) podem ter tanto o pai quanto a

mãe social como referência, possibilitando uma ressignificação do que é se viver em

família, aspecto fundamental para o decorrer da vida destas crianças.

Algumas dificuldades também puderam ser observadas no lidar com estas

crianças. A rotina de uma Casa Lar é corrida e nem sempre há tempo para se

dedicar singularmente a cada criança, ás vezes é necessário negociar, ser mais

rígido, mas são inúmeras as formas que estas profissionais encontram para

desempenhar as suas funções.

Em muitos trechos das entrevistas as palavras utilizadas para responder as

questões eram permeadas de afeto, seja no reconhecimento das crianças quando

chamam estas profissionais de mãe, seja na forma que as mães sociais percebem o

trabalho delas, vislumbrando os resultados, mas o que pode se destacar é que é

uma relação investida de desejo. As mães sociais ainda relatam que a principal

característica para esta profissão, além de ter paciência, responsabilidade, é ter

amor, amor este que dá força e ânimo para o dia a dia apesar das dificuldades que

existem, e se há amor há aposta de que há um sujeito em constituição, e o desejo,

de alguma forma se encontra investido.

O material apresentado com base nas mães sociais das Casas Lares

estudadas sustenta a conclusão que as possibilidades de investimento de desejo

são diversas e cada mãe social acaba encontrando a sua forma de estar nesta

profissão. Pois, fica claro que quando não há desejo, a profissão não se sustenta e

as mães sociais acabam se desligando.

69

Para finalizar, deve-se sempre estar atentos à importância do bom

desempenho da função materna, mas para isto, realmente, é necessário que haja

desejo, e que ele não seja anônimo.

70

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ANEXOS

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QUESTIONÁRIO

- Como se deu a sua entrada nesta profissão?

- Como funciona? Qual a sua função?

- Quais as vertentes do trabalho (valores, formas de educação)

- O que tem que fazer X desejo de ser feito?

- O que percebe dela própria com as crianças?

- O que interfere nesta relação?

- O que se transmite?

- O que pensam que seria dificuldade no exercício da função?

- Quais são as características que uma mulher deve ter para se tornar uma mãe

social?

- Percebem diferenças nas diferentes mães sociais? Há disputa?

- Como assegurar a individualidade, o ritmo de cada criança?

- Como é possível à mãe supor na criança demandas, vontades, desejos e, em si

mesma, a capacidade de interpretar essas supostas demandas?

- O que soa neste nome, mãe social?

- O que move a cumprir suas funções, que desejo possui para desempenhar a

função materna?

- O que mudou na sua vida depois que se tornou uma mãe social?

-Ser uma mãe social requer dedicação integral. Como é a relação com sua família?

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ENTREVISTAS Entrevista MS 1- Instituição 1 A entrevista foi feita em sua Casa Lar, enquanto a mãe conversava comigo a Assistente Social dava uma olhada nas crianças. Esta ficou com uma criança no colo a entrevista toda. A assistente social interrompe a entrevista num dado momento elogiando a mais nova mãe social. Durante a entrevista as crianças querem atenção e a MS 1 atende solicitamente e vai ver o que elas querem, na segunda vez as crianças vêm querendo folha, mãe dá atenção novamente, “vão lá desenhar”. R: Estou fazendo um trabalho sobre mãe social e queria saber se você tem uns minutinhos para conversar? MS 1: Tenho sim. R: Queria saber como você começou? MS 1: Eu comecei cuidando de crianças em casa, eu cuidava de vinte na minha casa, desde os nove anos eu cuidava de crianças, desde os nove anos. R: Desde os nove anos você cuidava e como você entrou aqui na Instituição? MS 1: A gente conheceu aqui e gostou. Assistente Social: Nossa mais nova mãe, uma benção na nossa vida, ótima, a gente ta bem feliz com o trabalho dela. Aqui ela ta desempenhando o papel dela jóia aqui também. Ela está iniciando agora, ta bem bacana. Fica com uma criança no colo durante a entrevista. R: E como é? MS 1: É diferente né do que eu fazia lá. R: E o que é isto que é diferente? MS 1: Eles são diferentes, as crianças são diferentes, você tem que dar mais atenção, sabe? E se um ta acontecendo alguma coisa você tem que parar com tudo e ver o que é, né, e os meus lá não né, eu ficava a semana toda com eles e até as sete horas a mãe passava pegar. R: É aqui a mãe não chega, a mãe aqui é você. E tem filhos? MS 1: Tenho dois casados e um de dezenove anos que mora comigo, só que trabalha né e só vem a noite, só pra dormir. R: E como foi pra entrar aqui? MS 1: A gente começou aqui vindo no culto, com o padre e daí a gente viu que era, a gente gostou,não sei, sabe assim quando a gente chega e gosta do trabalho e como nós fizemos o curso e daí entramos aqui. R: E como está sendo para você este cuidado com estas crianças pequenas? MS 1: Eu tinha lá desta idade, eu tinha lá pra você ter uma idéia, de um ano e oito meses até dez anos, então a gente sabe como lidar já com eles, porque já criou os filhos, sabe como que é né, então tudo que fez pros filhos tem que fazer pra eles... R: E como você percebe como ensinar eles, os valores, ser a referência? MS 1: Eu acho que a gente tenta fazer o mais possível com eles, ensinando o que é certo. R: Você tem autonomia na casa para decidir? MS 1: A gente têm que fazer os dois lados. Mas dar amor e dar o limite. Criança vem falar com ela, e sai da entrevista para ver o que ela quer. R: Como funciona sua rotina, seu dia a dia? MS 1: Normal, dona de casa, com uma porção de filhos, crianças de dois anos até cinco anos. R: O que você acha que são as dificuldades?

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MS 1: Até agora nada, faz um mês que estou aqui. A outra mãe saiu de licença maternidade, só estou cumprindo este tempo. Crianças vêm querendo folha, mãe dá atenção novamente, “vão lá desenhar”. MS 1: Só estou cobrindo licença. R: Tem vontade de ficar? MS 1: Tenho, por enquanto estou gostando. Como os meus são pequenos ficam mais por aqui, tem parquinho. Eu lá na minha casa também tinha um parquinho, fazia minhas coisas na casa e eles ficavam tudo brincando quietinho. Aqui fico tranquila porque não tem perigo. As crianças são tudo do mesmo tamanho. Lá em casa não gostava de deixar todos juntos lá, tinha medo. R: Que características você acha que uma mulher deve ter para ser mãe social? MS 1: Acho que experiência, com filhos, com as crianças, e o principal porque você ta com as crianças dia e noite, tem que ter bastante vontade. Pra mim é tudo, você tem que ter tudo, tudo que precisar você tem que fazer. R: E do que eles te chamam? MS 1: De tia, porque a mãe deles é a outra mãe social, ela volta. R: E dá para como compreender cada criança na sua individualidade? MS 1: Dá sim, tem que compreender cada uma delas. Entrevista MS 2- Instituição 1 A entrevista se deu num banco ao lado de fora do berçário, com as crianças circulando e brincando por perto. MS 2 é atendente do berçário. R: Então, o que eu queria saber com você era saber um pouquinho sobre a diferença de mães e atendentes. MS 2: Nós trabalhamos doze por trinta e seis, a gente vem e volta para casa e elas não. Eu já fui mãe social, e vim pro berçário. Antes de ser mãe social, fui atendente, aí depois voltei a ser atendente. Crianças querem motos e ela vai lá dar atenção e volta com uma criança no colo, chorando. R: E que te fez mudar? MS 2: De atendente para mãe porque o berçário era no Jardim Social e ia mudar, aí disseram que ia fechar, então me fizeram a proposta e eu aceitei. Já tenho uns doze anos nesta Instituição mais ou menos. Fiquei alguns anos de mãe social e a gente fica muito cansada, a gente fica muito cansada. Aí senti que não estava bem psicologicamente para cuidar deles, e ao invés de passar coisa boa a gente ficava ruim. Aí pedi para sair, minha mãe e sogra estavam muito doentes, aí realmente a gente não tava bem psicologicamente. Aí vim pra cá (berçário), aqui é mais gostoso, aqui pelo menos fica um dia, volta pra casa, curte a família, e a mãe social você não tem esta privacidade, você está direto. Quando mãe social, era mãe das crianças pequenas. R: Há quanto tempo você trabalha com crianças? MS 2: Trabalho com criança... Eu tenho uma filha de vinte anos, e faz vinte que trabalho com criança. R: Trabalhou em alguma outra Instituição? MS 2: Trabalhei em Paranaguá como mãe social, e em São Paulo tinha trabalhado numa creche. R: E o que te levou a trabalhar como mãe social? MS 2: Quando eu tinha nove, dez, onze anos eu já era babá, já cuidava das crianças do meu primo, sempre gostei. Sempre falo que se eu sair daqui hoje não vou saber fazer outra coisa, sabia? Só com criança que eu gosto de trabalhar, demais.

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R: Como funcionava para você – como mãe social- a casa, a rotina? MS 2: Era mais difícil, né, porque eu levantava as seis da manhã, para arrumar as crianças pra escola, as sete da manhã eles tinham que estar lá na frente. Tinha que acordar cedo para arrumar eles, preparar o café. Eu era a primeira a acordar e a última a dormir, é cansativo, bem cansativo. Mas, tem seus momentos bons, tinha folga, tinha uma pessoa que me ajudava a limpar em casa. Mas a gente não têm a privacidade da gente, às vezes a gente quer sair com o marido, com o filho e não tem como. Os anos que fui mãe social, nunca saí com meu marido a noite, jantar fora. Eu tinha a minha folga, mas saia de folga e ficava com a cabeça aqui, não se desliga, ficava pensando se eles estavam bem. Agora, aqui as sete da noite você sai, e tem uma outra turma que vai cuidar, é bem diferente mesmo. Não sei se todas pensam igual a mim. R: E como você se percebe com as crianças? MS 2: Ri, como que eu vou falar. Crianças querem atenção. R: Como você se percebe com as crianças, neste trabalho. MS 2: Ri novamente. R: Só risada? MS 2: Só, não sei, é tão difícil de falar, eu me sinto tão bem com eles, igual eu te falei, se um dia eu sair daqui eu vou sofrer tanto, eu acho que sou carinhosa, claro que na hora de por limite, tem que por limite. R: Que características a mãe social tem que ter? MS 2: Tem que ter de tudo um pouco (2X), porque se não ela não consegue controlar, tem que ser carinhosa, saber a hora do carinho, tem que ser rígida, ter pulso firme dependendo da criança, mas você tem que dar muito (enfatizando) amor, tem que passar pra eles que você ama eles, eles já vieram de uma situação bem complicada. Se você trabalha com uma criança e nunca fala que ama, que trabalho que é esse? Aqui a gente vive falando que gosta demais. Cai uma criança e chora, ela pega no colo, dá atenção. R: Como que você vê a individualidade e o ritmo de cada um? MS 2: São doze crianças, mas a gente passa a conhecer cada uma delas, conhece o gosto de cada uma, do que gosta, do que não gosta, do que gosta de brincar, passa a conhecer cada uma, porque eles chegam bem pequenos, e conhece cada uma delas. Entrevista MS 3- Instituição 2 A conversa com MS 3 se deu na cozinha, e durante a entrevista, esta foi solicitada para abrir a porta, servir café e também foi dar atenção a uma avó que faz visita a um neto, o qual quer pegar a guarda. Esta encaminha a avó para dar de mamar e dar banho. R: Então, eu quero saber primeiro um pouquinho do que você faz aqui, qual a sua função. MS 3: Minha função é na cozinha, fazer almoço, café da manhã, almoço, lanche, daí a janta e também ajudar com a criança, eh, trocar a fralda, dar banho. É isso... R: E como você chegou aqui para trabalhar? MS 3: Como que eu cheguei? Eu cheguei para trabalhar no Lar das Meninas né... Daí eu trabalhava no Lar das Meninas de limpeza. R: Lar das Meninas? MS 3: É da igreja Adventista, daí uma amiga minha que trabalhava aqui falou que aqui era melhor do que lá, porque era mais organizado né daí eu peguei e se interessei e vim trabalhar.

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R: Ah, você já estava em outro Lar então? MS 3: É, eu saí e fiquei um pouco em casa e depois vim pra cá. R: E como foi isso de trabalhar entrar em Lar, sempre trabalhou em Casas Lares? MS 3: É que... Foi assim, eu tinha curiosidade de saber, conhecer, como que era, geralmente eu trabalhava e ia embora todo dia, mesmo depois que eu fiquei sabendo que daí quando vim tinha que dormir duas três vezes por semana daí dormia e voltava e tinha umas que ficava direto. Daí nós ficamos trocando assim até (pausa), não assim ficar direto, que aqui eu fico sempre na cozinha, agora só que to quebrando o galho ajudando, dormindo junto. R: Ah, você ta dormindo junto... MS 3: Eh, to só por um tempo mesmo, até acharem uma mãe social, que queira morar aqui mesmo... R: E você falou que tinha curiosidade... MS 3: É curiosidade de conhecer assim (ri) de ver como funciona, mas funciona que nem uma casa, eu acho que não tem (pausa) eh, não é que nem um lar assim, funciona que nem uma residência mesmo. R: Você se sente em casa? Acha que as crianças se sentem em casa? MS 3: É, aham, se sentem em casa eu acho que se sentem em casa sim. Daí vão pra escola, fazem a atividade deles e a noite voltam aqui, jantam, depois vão dormir como... um dia normal. R: É o que você imaginava que era? MS 3: Ah, eu imaginava que era ... Ficava fechado, não saia, ficava só com a escola, chegava e não tinha nenhuma atividade, eles não, têm bastante atividades. R: Pouco diferente do que você pensou. MS 3: É, aham. R: E como é que foi, há quanto tempo você está aqui? MS 3: Eu to há cinco anos. R: Cinco anos? MS 3: Eh sim, cinco. R: Daí a outra mãe social saiu. MS 3: É a outra mãe saiu, eu saí uma época, dois anos atrás eu tinha saído, tava com stress, cansaço, daí saí e agora voltei (rindo) de volta, daí descansei um pouco e vim. R: Tava estressada? MS 3: Eh, estava com stress, o médico disse que era stress do trabalho (ri), trabalho direto. Eu e uma amiga minha, ela saiu, agora ta trabalhando em outro lugar, a gente ficava trabalhando, a gente não parava, de noite estendia roupa, sabe, querer lavar calçada, tirar tudo do lugar, daí nós tava trabalhando mais e comendo menos daí que a gente tava com excesso de serviço, daí deu stress. R: Isso aqui né? MS 3: Aqui. R: Não queria parar de trabalhar enquanto estava aqui? MS 3: É, não queria e chegava de noite queria dobrar roupa, daí o medico falou para eu parar, (ri) tem que ir devagar, chegou tal hora, seis horas, sete horas, para vai pro quarto toma banho assiste TV, jornal, novela porque se não você só quer trabalho, trabalho. R: Gosta do que você faz? MS 3: Aham, eu gosto, eu gosto do que faço. R: Aí quando saiu esta mãe social, você... MS 3: É aqui já entrou bastante, já sai, fica dois três meses e já sai...

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R: Como que é isso? MS 3: Ah, porque muitas vêm interessadas no dinheiro que ganha, não dá para dizer assim que ganha. Chega alguém pedindo café e MS 3 diz que não tem. C: Nem de cedo? MS 3: Nem de cedo... MS 3: Daí é isto. R: As mães não param? MS 3: Não, não param, elas falam que fica muito fechado, preso, não sai. R: Você acha que elas vêm pelo dinheiro e daí se frustram? MS 3: Eh, vem, daí trabalha dois meses, arruma um dinheirinho e vai embora. R: E como você vê isso com as crianças? MS 3: Eu vejo que quem trabalha desta maneira não tem nem amor, nem carinho... Quem vem trabalhar só pelo dinheiro (ri), para juntar alguma coisa e ir embora, aí não tem carinho... Não tem amor com as crianças. R: Porque as crianças sentem... MS 3: É, as crianças sentem quando uma sai, ás vezes tem aquela que saiu que deixava tudo agitado, quando tem duas, assim fica bem mais calmo. R: Como? MS 3: Vamos supor, aqui tinha três, tinha uma aqui que era bem doida, falava bem alto nossa, aí as crianças faziam tudo que queriam, as crianças sentiram que não tinha limite nem regras, ficava tudo solto. Daí eles não tinha limite assim, não se comportava nada, achava que podia fazer o que queria, e agora não, eles tão bem calmo, tranqüilos, apesar das briguinhas, tão comportados. R: E daí você então foi convidada para ficar aqui já que a mãe social saiu e precisa de mais alguém que durma? MS 3: É, tem a M. que dorme, mas daí eu to aqui com ela né, daí a diretora vai ligar para uma outra que ia vir, daí ela vem e não preciso mais dormir, aí vou embora todo dia. R: Você tem dormido todo dia aqui? MS 3: Aham, aí eu saio sábado, sexta a noite pra sábado, daí vou para casa depois eu volto domingo. R: E como que é pra você? MS 3: Não, é poucos dias, duas semanas não tem nem um mês ainda que ela saiu. R: E daí, como é a sua rotina, muda um pouquinho? MS 3: Eh, daí a gente ajuda, sempre sábado e domingo trabalha duas e aí a gente ajuda com as crianças, e daí na semana também antes de ir embora dou janta, daí eu lavo a louça e vou embora, daí oito horas to novamente, fico ajudando a dar almoço. R: Teu contato com as crianças é mais nas refeições? MS 3: Eh, mais nas refeições, porque estou aqui na cozinha, café da manhã, almoço, lanche, mais nas refeições. R: E você recebeu suas funções antes de entrar? MS 3: Aham, recebi. R: E é diferente do que você faz ou não? MS 3: Não a gente faz até mais do que falaram, faz até mais... Do que eles falaram. R: Mais tipo o que? MS 3: Não, ás vezes a gente leva a criança num médico, a criança passa mal de noite tem que levar. R: Aí você faz acompanhamento?

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MS 3: Eu fico aqui pra outra mãe social ir ou às vezes ela fica e eu vou, sempre uma ir e outra ficar, não pode ficar as crianças sozinhas, sempre tem que ter uma pessoa, duas. R: E como você acha que é lidar com as crianças? O que você pensa, percebe? MS 3: Ah eu percebo que a gente lidando com eles a gente recebe energia né, carinho deles, tudo, daí é como se fosse uma escola também, está trabalhando numa escola que tem bastante criança, todo dia passa e é a mesma coisa, não é diferente. R: E o que você acha que é de dificuldade de exercer a sua função, pensando mais no seu lidar com as crianças, quais são as dificuldades? MS 3: Dificuldade... Até agora não achei nenhuma dificuldade, tudo é tranqüilo até agora, não achei dificuldade, eu não sinto dificuldade nenhuma. R: Lidar com as crianças, por limites... MS 3: O limite a gente sempre coloca, uma cadeirinha, para pensar, assisto super nanny no sábado daí a gente aprende algumas coisas, a cadeirinha que a cada idade é um minuto que deixa só, três anos, três minutos, eles pensam, obedecem. R: Vocês assistem a super nanny no sábado? MS 3: Aham, às vezes em casa, aqui as crianças não assistem, eles têm o canal do discovery e assistem desenho. MS 3: Dificuldade também assim, tem de, dar educação entre eles, as crianças com dois, três anos, e já vieram de casa com educação diferente daí chega aqui daí é difícil de lidar, qualquer coisa a gente vai no escritório fala com a diretora e ela conversa com eles, ela tem educação bem brava. R: Tem bastante voluntário que ajuda aqui? Visualizando que possui bastante gente percorrendo pela instituição. MS 3: essa é a avó dele que esta visitando para levar ele embora tem uma que mexe no bazar, outra na comida que recebe, tem a voluntária. Daí sempre tem gente, hoje que a casa ta cheia. R: Ah, essa é a avó dele que quer levar, como é acolher esses familiares que visitam? MS 3: Não, é só a avó dele que vem mesmo, o resto, tudo, ninguém pode visitar então só a dele que ta vindo, que liberaram o resto não tão vindo. R: E como vocês recebem eles? Desde que você esta aqui já tiveram outros que vieram... MS 3: Já, já tiveram outros que já saíram, com as famílias mesmo é difícil a gente ter contato, no mais, às vezes quando é, eles vão lá na vara com a diretora, lá no centro. R: As crianças vão com ela? MS 3: Duas crianças que foram embora foram com ela lá pro centro na frente do juiz, daí que eles resolvem, não é aqui. R: Aqui os pais vêm visitar, os que vão adotar? MS 3: Ah, os que vão adotar quando vêm da vara quando é pequeno, com a autorização já leva, já vem aqui já leva embora. R: E como é que é quando a criança vai embora? MS 3: Ah, e fico feliz quando ela vai embora porque né, vai crescer, tem criança que cresceu aqui dez anos, a A., uma menininha que tinha aqui, ela tinha problema de Síndrome de Down daí ela ficou oito, dez anos no lar, imagine, daí esses que estão pequenininhos e já vão embora a gente fica feliz né melhor que ficar aqui, que daí tem outras crianças pra vir (ri). R:E como é que você se apega? Acaba se apegando as crianças?

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MS 3: Eh, às vezes se apega (ri), nós se apegamos agora com a J., a menininha que tá aqui, tem também o A. que a gente gosta muito dele, a V., todos assim, se apega. R: Se apega mais aos nenês? MS 3: É mais aos nenéns, os grandes também, os grandes têm as três irmãs um amor também. R: E como que é, já teve algum que você se apegou e foi embora? MS 3: Não, logo que eu entrei uma vez na casa dois, tinha uma menininha que foi embora, daí depois de três anos a mãe dela trouxe ela pra nos ver, a K. também que foi embora, foi pra Portugal, mas veio morar no Brasil de novo. Ela foi novinha, agora ta com dois, três anos. R: Então é bom quando as crianças vão embora? MS 3: É sim. R: E que características que você acha que uma mulher deve ter para se tornar uma mãe social? MS 3: Primeiro acho que ela tem que, gostar da casa dela, gostar dos filhos, né... Daí eh, primeiro a pessoa tem que gostar dela mesmo pra depois... Ter o gosto de ser mãe social. R: Mas que outras características que essa mãe deve ter? Porque é uma função que exige bastante... MS 3: Eh, responsabilidade, exige responsabilidade, respeito, educação... R: Que mais que passa pela cabeça? MS 3: Ai ai, acho que é isso, e não trabalhar por muito dinheiro (fala rindo), não trabalhar por interesse do dinheiro, de ganhar as coisas. R: Tem que ser mais pelo amor? MS 3: Eh, mais pelo amor... R: Esse retorno financeiro vocês não tem muito? MS 3: Eh, não. R: Não é muito bom o salário? MS 3: Ah, o salário eu acho bom, porque a pessoa que mora aqui ganha livre de tudo, moradia, comida, come do bom e do melhor, eu acho que é bom. R: E como você vê as diferença das mães sociais, você já falou um pouco da mãe que era mais agitada, faz diferença quando ela vai embora? MS 3: Faz diferença quando uma mãe vai embora, bagunceira, ai, fala alto. R: Tem que sair mais quietinha então? MS 3: Ri tem que ser menos espantada. R: Menos espantada? O que é uma mãe menos espantada? MS 3: Responde rindo que tinha uma aqui que as crianças estavam dormindo e ela gritava, eu tava lá no quarto e ela no banheiro ela gritava meu nome, nossa, ela berrava vinte e quatro horas, as crianças dormindo e ela nem se tocava. R: E como vocês percebem aqui o ritmo de cada criança? Os horários são bem fixos ou cada criança faz mais ou menos suas coisas no seu horário? MS 3: Não, os bebês têm horário diferente e os grandes todo mundo almoça junto, no mesmo horário. R: Os bebês cada um no seu ritmo? MS 3: É, os bebês mamam a cada três horas, quatro horas né que tomam mamá e dormem numa hora só os três, sem mistério. R: Quantos bebês são na casa? MS 3: Três e sete grandes.

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R: E os de zero a três anos, uma idade mais delicada também eles entram na rotina? Porque tem aqueles que ainda não sabem comer sozinhos. MS 3: Eh, os de três anos comem sozinhos, dois anos e pouco já começa a comer sozinho. R: Ah, vocês vão estimulando? MS 3: Às vezes damos na boca porque eles têm preguiça de comer. Mas a gente tenta incentivar. R: E como você vê esse nome mãe social? MS 3: Ah, eu vejo, como posso dizer... Ah, eu vejo como um... Como uma dona de casa. R: Eh, têm lugares que são educadoras, aqui é mãe social, você vê uma diferença? MS 3: Acho que não vejo não. R: E como é a sua relação com a sua família, você tem filhos? MS 3: Tenho o de oito anos que ta na escola aqui pertinho e daí ele ta comigo, terça e quinta ele vai no tênis lá no Instituto e a tarde ele vai na escola aqui na Vila, ele ta comigo. R: Nessas semanas que você dorme aqui ele fica com você, é isso? MS 3: É, minha filha estuda lá no adventista e ta lá com a minha mãe, ela fica com o pai e com a avó. Aí final de semana vou pra casa, mas eu sou separada, não moro junto, daí eu final de semana fico com eles dois, cuido, feriado, também fico com eles dois direto todo dia eu falo com ela no telefone. E o dia que to trabalhando é normal, eles têm atividade na escola. Aí final de semana a gente fica junto. R: E como é que é com seu filho aqui dentro? MS 3: Eu trato ele como as outras crianças daqui de dentro de lar, ele gosta também, não tem ciúmes nem nada, ele estuda de tarde e as crianças de manhã, então não fica muito junto, só fica às vezes de noite, quando chega. Mas no mais é tudo tranqüilo, R: Não sente ciúmes então? MS 3: Não, ele fica bem aqui, não sente ciúmes não. R: Mais alguma coisa que você queira falar aí sobre essa função? Na parte do cuidado que você falou que faz no início, a troca de fraldas... MS 3: É eu troco, do banho... R: E como são esses momentos? MS 3: Ah, essas horas são... Daí a gente esquece um pouco da cozinha, daí arruma a água da banheira, dá banho neles, como se tivesse dando banho no filho da gente também. R: E é possível perceber alguma coisa das crianças nesses momentos? MS 3: Ah dá, eles gostam de tomar banho, dá pra brincar, tranquilo. R: E você gosta de brincar com as crianças nesses momentos? MS 3: Eu gosto de brincar com eles, eles gostam de brincar, às vezes eu abro o portão, coloco cadeira, eles ficam brincando de com motocicletinha, bicicleta na calçada, e eu fico olhando. R: E tem criança que engatinha aqui? MS 3: Até agora não, bom, já foram embora às que estavam engatinhando, o que teve, a A. ta quase querendo engatinhar. R: A minha pergunta é mais nesse cuidado individualizado, pois cada criança está numa fase da vida, umas andam, outras só ficam deitadas ainda. MS 3: A A., tem seis, sete meses, agora senta cai, vira pro lado, pega as coisas. Ela é bem desenvolvida. R: Quem tem mais contato com esta parte?

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MS 3: Com a A., é a diretora, porque ela leva ela pra casa, estimula ela porque aqui não tem muito tempo assim para ficar com a criança, desenvolver, por isso tem a fisioterapeuta que eles contratam que faz fisioterapia neles, põe eles para engatinhar, por que aqui não tem tempo, não tem tempo de sentar com elas e brincar, não dá. Mesmo com duas mães não dá, elas não têm tempo de sentar, brincar, estimular, engatinhar, que nem tem um menininho que estava aqui, ele tava fazendo tratamento porque ele estava bem atrasado, tava com um ano e a A. dá de dez nele. Ele com um ano têm que colocar as coisas na mão dele, e a A. com sete meses já pega, nossa, ela é bem ativa e ele bem paradão. Os pequenininhos agora estão estimulando, os dois com três meses já ficam de bruços, ele e a V. já ficam de bruços. Daí estão estimulando eles. R: E quem trabalha é a fisioterapeuta? MS 3: Eh, porque a mãe social não tem tempo pra fazer. R: Muitas atividades a mãe social tem para fazer... MS 3: Tem que cortar unha, daí quando ta tudo os grandes, aí não tem tempo, tem que cortar a unha, arrumar guarda roupa, levar em atendimento, não tem tempo daí. Não dá para ficar como se fosse uma babá com a criança, ficar sentada brincando, não tem tempo aqui. Por isso eles fazem atendimentos fora. R: Daí quando as crianças ficam brincando elas ficam mais sozinhas? MS 3: Ficam brincando no parquinho, de boneca... R: Queria saber um pouquinho mais sobre a sua escolha, o que chama atenção foi esta sua curiosidade de saber como que era uma Casa Lar... Mas tinha vontade de trabalhar com crianças? MS 3: Tinha, eu sempre gostei, com crianças e cozinhar (ri), juntou os dois. R: Desde sempre nestas áreas? MS 3: É sempre nestas áreas... É bem melhor trabalhar com crianças. R: E o que é esse de gostar de crianças? MS 3: Minha mãe é enfermeira e sempre gostava de cuidar de crianças pequenas assim, e de idosos também, daí eu comecei a gostar, trabalhei de babá e comecei a gostar, acho que com criança, é bem melhor trabalhar com criança. R: Trabalhava como babá antes? MS 3: Aham, como babá. Mas é isso, então, muito obrigada. Entrevista MS 4- Instituição 2 A entrevista com MS 4 se deu na cozinha. Esta entrevista ocorre sem interrupções apesar de que no ambiente que estávamos passavam várias pessoas. R: Queria saber o que você faz aqui primeiro, qual a sua função? MS 4: Na verdade eu estou na limpeza, mas a gente não faz só isso, a gente faz de tudo, com as crianças, quando precisa na cozinha eu trabalho na cozinha. Mas sou da limpeza. R: Na limpeza, mas faz de tudo... MS 4: De tudo, eu ajudo porque a gente ta com falta de funcionárias. Ajudo no que precisa, se precisar deixar as coisas da limpeza tem que deixar pra amanhã né... A gente se ajuda aqui, não tem aquela coisa de terminei o meu trabalho e não vou fazer mais nada. R: Tem bastante coisa pra fazer aqui? MS 4: Tem sim. R: E com as crianças o que você faz? MS 4: O que eu faço? Dar banho, trocar, dar comida, tudo, faço de tudo.

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R: E como que deu a sua entrada em Casas Lares? Já tinha trabalhado em outra? MS 4: Na verdade eu não sou daqui, sou do interior, Wenceslau Braz e minha irmã trabalhava numa outra Casa Lar, aí ela ficou sabendo que tavam precisando de alguém para trabalhar aqui, aí acho que ela passou meu telefone para dona da casa e aí ela ligou e eu vim trabalhar. Vim direto aqui pra começar, aí já é o sexto ano que estou aqui. R: Hum, já faz um tempo então... MS 4: Já faz um tempo. No ano passado trouxe minha irmã que tava precisando de mãe social. R: Você não quis passar para a função de mãe social? MS 4: Na verdade eles... Eh... Eu já fui mãe social também, e... Quando precisa também eu faço. Na verdade todas nos somos mães sociais aqui. R: É, vocês são registradas como mães sociais né? Mas, quando foi pra assumir só esta função você não quis? MS 4: Não, na verdade a mãe social pra trabalhar com as crianças ela precisa dormir aqui direto e eu não posso porque sou casada também. E não deu pra mim ficar, mas se fosse... lógico... aceitaria. R: Hum, a questão de dormir... MS 4: Eh, a pessoa não quer trabalhar na limpeza o dia todo e a noite ficar acordada com as crianças né... Também não dá, é chato, mas se fosse, tivesse outro jeito lógico que eu aceitaria. R: E você já trabalhou como mãe social, daí dormindo? MS 4: Já, no começo quando eu vim pra cá, eu vim pra cá morar, eu fiquei dois anos trabalhando como mãe social aqui mesmo e depois que eu casei eu saí. Daí sim a noite, e continuei de dia. R: E como foi quando veio este convite para ser mãe social? MS 4: No começo? Ah, eu fiquei assim meio assustada, imagine uma casa com doze crianças, que quando você não conhece, falam igual a orfanato e você imagina aquelas crianças gritando, batendo... nossa, é totalmente diferente, eu tinha medo. Tanto que no começo quando entrei aqui era só criança grande e grande é pior que pequena, eles eram terríveis, aí depois fui me acostumando e o tempo foi passando (ri). R: Prefere lidar com criança pequena? MS 4: Às vezes sim, os pequenos são bem mais fáceis, eh, os grandes são independentes, você trabalha menos com eles, eles comem sozinhos, tomam banho sozinhos, os pequenos são mais dependentes de você, mas eu prefiro os pequenininhos (ri), de dois aninhos. Gosto dos grandes também. R: Então se assustou um pouquinho, o que você imaginou quando era uma mãe social? MS 4: Ah, sei lá, é muita responsabilidade, é remédio certinho, nossa, é muita responsabilidade mesmo, mas com o tempo a gente vai se acostumando, quando você pega um neném recém nascido, a gente pegou três de uma vez, tudo pequenininho. E eu achei assim no começo que a mãe social tava aqui, ela não vai dar conta (rindo) e ela nossa, foi melhor do que eu. R: Porque você achou isto? MS 4: Não sei, porque no começo que eu trabalhava aqui a gente nunca pegava três nenéns de uma vez, sempre um, e um eu dava conta né, e eu imaginei, ela não vai dar conta de três e deu, e ela conseguiu. R: E o que é este dar conta?

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MS 4: Dar conta... É... Você conseguir dar banho, dar mamadeira pra todos os três, se um ficar doente, tem que correr com o outro, não deixar os três chorar porque a gente não gosta de deixar eles chorar. Eu imaginei assim que ela não ia ter paciência, que ia ficar aqui e logo já ia abandonar o barco e ir embora e não nossa, ela, vou falar... Eu ia me assustar, o dela foi bem no começinho né... Eu ia me assustar, agora ela não, foi bem tranqüilo. R: Parece que você entrou mais por um convite, imaginava trabalhar com crianças? MS 4: Não... Não mesmo... Eu acho que vim de lá assim porque lá não tem trabalho, vim mesmo pra trabalhar e depois com o tempo... com o tempo a gente vai pegando amor por eles. Tanto que... Ano passado, quando fez quatro anos que eu tava aqui eu pedi a conta peguei e saí, aí eu comecei a ficar em casa, assim, comecei a pensar neles, não conseguia trabalhar em outra coisa, não conseguia outro serviço, tudo, quando tava pra começar, eu não conseguia. Aí eu pedi, vim, conversei com a diretora, pedi pra voltar e dois meses depois eu tava aqui, trabalhando com eles. R: Como que era isso de ficar pensando neles? MS 4: Eu não sei... Eu... Eu não sei... Sonhava com eles a noite, o dia todo eu pensava, sempre tem um que a gente se apega mais né, sonhava a noite com eles. Não sei sabe... Não sei se conseguiria trabalhar em outra coisa não, com criança mesmo. R: Descobriu que gostava de criança aqui? MS 4: Eh, no começo não tinha sabe, que nem você falou, foi por um convite e acabei gostando. Mas mesmo assim, até tomando banho eu me pego pensando nas crianças, ta ali... Começo a pensar neles. Bem gostoso. R: Que princípios, que valores que cada uma segue para passar as crianças? Não existe uma norma? Cada um faz o que acha que é certo? MS 4: Quem as crianças? R: Não, vocês pra cobrar as crianças... MS 4: Não, não... Pra cobrar, tipo assim, um castigo, se eu to dando um castigo, se eu coloco lá ninguém vai tirar, eu vou tirar. A gente fala as mesmas coisas com as crianças, não adianta eu falar uma coisa e ela outra, eu por de castigo e ela tirar. Então eles levantam de manhã, arrumam a caminha deles, eu acho bom né, eles arrumam a caminha deles, as três fazem eles fazerem isso. Se eles fazem bagunça lá fora, se foi eles mesmo que eu vejo, faço todos eles arrumar, mesma coisa faz as meninas, às vezes vou sair mais cedo falo para elas falarem para eles arrumar. Então a gente faz igual, nós três, não discorda da outra. Quando acontece de entrar alguma pessoa aqui nova que queira fazer diferente da gente, a gente vai lá e conversa com a diretora, pede uma reunião, tem que fazer todo mundo igual, se não vão respeitar uma e não vão respeitar outra e fica lá, aquela tia ali é boazinha e aquela é uma bruxa (rindo), então é todo mundo, tudo igual. R: E como você se percebe com as crianças? No contato? Como você se vê? MS 4: Olha... Eu não sou mãe ainda, mas eu me vejo mãe (ri), mais dos pequenininhos, dos bebezinhos, até os grandes, eles perguntam pra gente, tia você é minha mãe... Sou, sou tua mãe, sei lá, eu me vejo mãe. Por mais que eu mesma não tenha filho meu mesmo, eu me vejo. R: Eles te chamam de mãe? MS 4: Não, como teve um tempo que teve muita troca de mãe aqui às vezes entrava uma hoje, é tua mãe, é a mãe, daí saia aquela entrava outra, é tua mãe, aí a gente parou, falou assim, não, vamos chamar todo mundo de tia. Não sei quem teve essa idéia, mas eu achei melhor assim. R: As três daí?

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MS 4: As três chamam de tia, às vezes tem alguns tipo a E., ela chama de mãe, às vezes o P. vem lá de fora do nada e chama: mãe. Mas é que confunde a cabeça deles, mãe é uma só, aí chamam só de tia. R: Teve muita troca então? MS 4: Teve muita troca de mães, tinha dia que os coitados não sabiam quem era a mãe deles. Eu achei melhor assim, aí até a mãe social eles chamam de tia, tudo tia. R: E o que você acha que são as dificuldades nesta função de mãe social? MS 4: Eu não sei, não tem dificuldade, não tem mesmo, bom, eu acho que não né, (ri) eu não sinto. R: Você acha que te completa essa profissão? MS 4: Sim, eu faço o que eu gosto. R: Sobre estas saídas das mães, como você vê? O que acha que as mães sociais vêm pensando? MS 4: Olha, eu acho que pra trabalhar aqui se você vir pelo salário você não trabalha, tem que vir realmente se você gostar, que a gente fica aqui dentro só se gostar mesmo, porque tem horas que tira a gente do sério, tem horas que tem que pegar, sair, dar uma volta, voltar aqui dentro, porque não é fácil. Tem hora que os três bebês querem mamar, os três têm que trocar fralda, às vezes, hora de janta, de dar banho, hora de tudo, tem que ficar sozinha aqui, pra dar conta dos dez, agora é dez né, normalmente é doze. E no começo mesmo, na quarta feira que era folga da mãe social eu ficava sozinha com os doze, era terrível, nossa, dava comida pros doze, dava banho nos doze, era o dia todo. Então, se vir lá de fora achando que vai ficar aqui, que vai ficar tranquilo, não fica, porque é muito trabalho. Ainda agora se sai uma de folga a gente fica em duas, mesmo assim. Tem pessoas que vêm aqui, trabalham dois dias e não voltam nem pra receber, então se vir aqui só por causa do trabalho não fica. R: E então, você fala que as crianças, às vezes, fazem tudo ao mesmo tempo, tem como dar uma atenção mais individualizada para cada uma? MS 4: Olha... Veja assim, sentar, ficar mais? R: É, dar uma atenção, por exemplo, não é sempre que o bebê chora que ele quer mamar, de dar esta atenção, ter esta percepção. MS 4: Olha tem, tem vezes, de manhã, eu chego de manhã, em vez de eu ir lá e fazer meu serviço, não eu fico lá no berço com eles... Aí às vezes eu converso um pouco com A., V., com... o K., acho que eu fico uma hora lá no berço com eles conversando. Então já é atenção né, já estou dando atenção pra eles. Com os grandes mesmo a gente vai dar banho, a gente começa a conversar com eles, a gente tá trocando, tamo conversando com eles. Final de semana que a gente trabalha às vezes, a gente trabalha no sábado ou domingo, depois do almoço a gente não faz mais nada, a gente senta tudo aqui na sala e fica com eles, a gente pega um filme pra assistir, às vezes eles sentam com a gente pra brincar, a gente fica lá fora sentado com eles, então dá sim pra dar atenção. Digo assim, a hora do fervo mesmo é a hora do almoço, a tarde na hora do banho e na hora da janta e de manhãzinha quando você chega, agora no meio do dia assim dá, dá pra dar atenção, a gente consegue. R: E cada uma faz mais ou menos como quer, quando ouve o bebê chorar vai quem ouviu? Não tem muito a divisão de funções? MS 4: Não, não tem... Se uma estiver ocupada lá fora a gente larga o que ta fazendo e vai lá ver o que esta acontecendo com a criança. R: Então tem uma atenção aí...

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MS 4: Tem até um que está saindo da fralda agora, ele já ta grandão, mas ele não entende, ele não sabe o que é xixi e o que é cocô. Ele pede pra fazer cocô, chega lá e faz xixi ou do contrário, vai lá e faz cocô. Então, se eu tenho tempo eu lembro ele e falo oh, senta aqui, fica aí que você já faz, eu fico ali com ele e aí ele consegue fazer, mas quando a gente não tem tempo ele acaba fazendo lá fora porque ninguém foi lá e chamou ele. R: Então depende como está o seu dia... MS 4: Eh... Depende. Hoje ainda ta calmo (ri), que a gente ta com voluntário aí e tal. E quando saem eles pra atividade a gente dá atenção pros pequenos. R: Que características você acha que se deve ter para ser uma mãe social? MS 4: Olha... PAUSA Tem que ser carinhosa, olha... Não sei te falar, chega uma mulher aqui que diz ah, eu já criei meus filhos, já tive meus filhos, mas chega aqui e não... Não tem aquele carinho, sabe, aquela coisa, não sei... Tem que gostar né, tem que gostar de criança. (PAUSA) Chegou uma aqui na semana passada e falou, ah, eu tenho sete filhos eu tava ali de pé e ela aqui... E ela falou, tenho sete filhos, ta tudo lá em baixo com meu marido, que ela morava aqui perto. Ta tudo lá em baixo com meu marido e eu adoro criança, e eu falei assim, mas como que você adora criança se seus filhos estão lá em baixo, tudo abandonados, como você vai cuidar deles? (Ri) Ela pegou e ficou quieta assim, eu falei, não dá, então ela não gosta, os filhos dela tão tudo abandonado lá e como que ela vai cuidar deles vindo aqui? No fim nem deu certo mesmo. Eh, tudo pequeno as crianças dela e ela deixou lá e veio trabalhar aqui. Aí não gosta da criança, tanto que não deu certo ela acabou indo embora. R: Tem que querer dar atenção? MS 4: Aham, aham... R: Como é pra você esta capacidade de interpretar estas demandas, destes pequenos... Nesta idade eles têm muito disto de não poder ainda falar com a palavra, o que quer. Nomear isso que a criança, fez, quer... Como você acha que aqui dá pra supor algo na criança. Dá pra conhecer as crianças bem assim? MS 4: Dá, dá pra conhecer. Os nenéns dá pra saber, a gente sabe quando eles tão com fome, bom, eu sei, quando eles tão com fome, até quando tão com dor mesmo a gente sabe, quando tem de cocô, quando é xixi, até tem os nossos aqui que fingem sabe (rindo), a gente sabe... Então a gente sabe tudo. R: Conhecem as manhas então já também? MS 4: Quando eles tão de manha, começa a se jogar no chão, às vezes até a criança ta com dor né a gente acha que é manha, mas não é não, a gente sabe. R: E dá para estimular as crianças então que estão na fase de zero a três anos, que aprendem e vivenciam novidades... Esta estimulação você acha que é feita? MS 4: É, a gente faz bastante. A A. mesmo hoje quando eu tava dando banho nela eu colocava ela de pezinho, sentadinha, ensinava a segurar nas coisas... Cada um faz como pode, né, no caso não sei se elas fazem, mas eu... Eu faço. R: Já teve algum curso de como lidar com as crianças ou é tudo pela experiência? MS 4: Não, curso, curso a gente não teve, a gente vai aprendendo. No começo quando você entra aqui a gente fica bem perdido depois vai aprendendo. Pelo menos com os neném assim, eu nunca tinha cuidado de neném, depois a gente foi... PAUSA Quando chega um neném você tem que aprender né (ri), de um jeito ou de outro você tem que aprender a cuidar dele. R: E como fica este nome, mãe social pra você? MS 4: Pra mim... PAUSA Olha, no caso PAUSA O que significa pra mim? Ah, pra mim significa mãe, é sim, mãe. PAUSA

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R: Mãe mesmo? MS 4: Eh, mãe. R: E por onde você acha que passa o seu desejo, sua vontade de cumprir estas funções de mãe, de uma criança que não é tua? MS 4: Ah, eu não vou saber te explicar (ri) eu não sei... Eu sei que eu... É uma coisa que não dá pra explicar...Não dá... Até quando eles vão embora mesmo assim, nossa, a gente sente, na verdade a gente sente bem quando eles tão indo embora pra uma família, ah eh uma coisa que não dá pra explicar... No começo que eu entrei aqui quando iam embora as crianças eu sofria bastante, quando ta aqui é tua, mas com o tempo fui me acostumando, fui aceitando que não é... Que eu vim aqui só pra cuidar e eles tinham que ir. Não mudou nada assim de cuidar, não mudou nada, mas com o tempo a gente vai aceitando que a gente têm que cuidar, eles chegam aqui a gente cuida e eles vão embora depois. Ainda acontece de se apegar mesmo bastante. R: Tem espaço pra falar disto aqui? MS 4: Não (ri). R: Deste sofrimento que causa às vezes né... Não tem espaço pra vocês? MS 4: Não, mas sei que é muito bom quando a gente vê eles indo embora com uma família que a gente sabe que vai cuidar. Bem gostoso. R: Bem gostoso de ver? MS 4: Aham. R: E o que você acha que mudou na sua vida depois que você virou mãe social? MS 4: Ah, mudou bastante coisa, eu... Eu acho que eu era tão estressada, eu brigava, eu era irritada, não, agora eu sou mais calma, agora to bem mais calma. Aqui mesmo eu... Em casa chego muito irritada, nossa meu marido, brigo com ele sem ele tar fazendo nada pra mim (ri), mas aqui não, aqui eu fico calma o dia todo, aí quando eu saio, chego em casa e me estresso, qualquer coisinha to brigando, às vezes se ele não me ajuda a lavar uma louça, varrer uma casa eu brigo com ele e não, de dia to aqui tudo normal, rindo, brincando com eles, tem dias que eu chego aqui sabe nervosa e de eu ver uma criança rindo, ou vou lá no berço começo a conversar com os bebês e pronto, já passa aquilo, passa tudo, até esqueço meus problemas em casa. R: Dá pra se focar aqui? MS 4: Aham, aqui a gente esquece de tudo lá de fora, se envolve com eles e esquece mesmo. R: Se envolve com eles? MS 4: Também não dá né, pra você trazer os problemas da tua casa aqui pra eles né, eles não têm culpa também. R: E quando você dormia aqui você não tinha família aqui? MS 4: Não, tinha outra irmã que trabalhava no lar, morava lá, a gente só se encontrava em dia de folga. Se eu não tivesse hoje com meu marido eu acho que taria até hoje aqui, morando com eles, era uma coisa que eu gostava, de por eles pra dormir. De madrugada acordava pra ver se eles tavam cobertos, aí tinha aquela preocupação, daí quando eles dormiam demais a gente fica com medo né, aí eu ia lá olhava, será que tão respirando mesmo? (Rindo) É bem gostoso, eu gostava, no começo assim foi um tempão pra se acostumar. R: Você saiu de dormir aqui pra casar ? MS 4: Só pra casar, se não tivesse com meu marido taria até hoje. R: Mais alguma coisa que você queria falar?

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MS 4: Olha, eu sei que é muito bom, não tem como explicar, é bom ser mãe. Às vezes tem um que vem lá de fora gritando mãe, aí você sente aquela coisa gostosa sabe... Às vezes eles chamam a gente de mãe, eles sentem falta de chamar alguém de mãe. R: Tem alguma mãe biológica que vem visitar? MS 4: Não, só uma avó. Destes pequenininhos a gente que é mãe deles mesmo né, chamam de tia, mas a gente que criou eles. R: Muito obrigado então pela sua participação. Entrevista MS 5- Instituição 3 Antes da entrevista com a mãe social é lido o Termo de Consentimento. Durante este início, toca o telefone, as crianças estão ali, querendo atenção. A mãe social arruma as crianças, pois é avisada que M. vai passar para cortar o cabelo deles. Fala com a criança se referindo como mãe, a mãe não pode descascar a laranja, a mãe tem que conversar com esta tia e a mãe não tem tempo, come uma banana? R: Eu queria começar ouvindo um pouco, pois quando liguei pra cá você quem atendeu, e em conversa com a psicóloga da Instituição, ela diz de você ser a mãe social mais antiga aqui. MS 5: Eu entrei aqui em 2000, vim morar em Curitiba foi em maio de 2000, vai fazer nove anos que estou por aqui. Eu sempre trabalhei em hospital, sou auxiliar de enfermagem, trabalhei vinte anos em hospital, mas quando eu vim embora para Curitiba, eu não conhecia nada aqui, só tinha vindo para cursos de enfermagem e não conhecia Curitiba. Aí meu marido ficou desempregado lá e eu trabalhava e ele falou para virmos para Curitiba que tinha mais opção de emprego. Aí a gente veio, fomos pagar aluguel em Campo Largo, uma vizinha falou que na rádio eles anunciavam emprego. O Z. (marido) trabalhava de segurança a noite e eu de dia ficava ouvindo os anúncios de emprego na rádio e escutei o diretor daqui falando que precisava de uma mãe social para trabalhar aqui, todos os perfis que ele pedia eu tinha, mas um que não tinha era tempo no lugar e o marido tinha que ter de dois a três anos de emprego fixo e isso a gente não tinha. Quem se interessasse era para ligar, eu liguei, dei meus dados e ela disse, aguarde, que quando fosse fazer a seleção chamava, ia investigar a ficha de cada um através dos dados, e nem uma semana depois ela já chamou, aí a gente ia no Centro numa clínica de terapia, fez várias sessões de terapia com uma equipe de Psicólogos e tinha oitenta casais na época daí foi uma seleção mesmo. Cada terça e quinta iam dez casais, eu tava toda semana e os casais não vinham os mesmos, no final ficou três, ficou dois e aí o segundo casal não apareceu, eles não tinham mais chamado, nós já estávamos selecionados, aí a gente veio pra cá. R: O que te fez ligar para este anúncio? MS 5: Pois é, uma das razões, eu tinha uma filha de nove anos que morava comigo, agora já não mora mais. Eu era separada do pai dela desde que ela era pequenininha e sempre eu que cuidei. Como eu vim embora para cidade grande, e a gente era lá do interior, eu tinha muito medo porque a gente via muita notícia de marginalidade na televisão, eu toda vida fui aquela mãezona que protegia muito, tinha medo de deixar ela sozinha, até mesmo para ir para escola, e ficar pegando ônibus pra ir pro trabalho. Quando eu tava vindo pra cá o pai dela falou que se acontecesse alguma coisa com as meninas “você vai ver”. R: Você veio com uma outra pessoa? MS 5: Eu vim pra cá com meu marido que estamos juntos já há dez anos. Eu já era separada ele veio morar comigo, nunca fui morar com ele, ele que veio morar

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comigo (Ri). Então, ele veio morar com nós e a gente veio morar pra cá, um pouco também porque um casal que se separa numa cidade pequena, dá muito que falar, então a gente resolveu sair, dar um tempo, pra não ficarem falando. Em cidade pequena o casal se separa e cai na boca do povo, aí viemos morar aqui pra gente viver em paz. E eu não conhecia nada, então tinha muito medo, pegar ônibus pra ir pro trabalho, ficar pagando aluguel, isto trazia uma insegurança pra minha filha e pra nós também, meu marido trabalhava a noite e eu tinha que ficar em casa. E como eu sempre fazia plantão a noite, eu pensei, que tal que eu arrumo um serviço num Hospital a noite? Com quem minha filha vai ficar? E se acontecer alguma coisa com ela a minha família vai me culpar por isso. Então quando eu vi um anúncio que era um trabalho em casa, que eu não ia precisar sair que eu tinha como cuidar da minha filha, eu me interessei, sabe? Mas aí dependia deles, de uma classificação deles. Como era tudo com Psicólogos, terapia, atendimentos, para ver se a pessoa tinha condições de assumir uma casa com oito crianças que era na época, e tamo aí. Eles estavam no início as casas, e tinha entrado um casal aqui, mas ficou dois meses e não deu certo, aí a M. (diretora) acabou despedindo, e tava sem, e as crianças permaneceram na casa e ela tinha urgência de por alguém. Até hoje a preferência dela é pegar alguém do interior porque ela diz que deu certo. No começo foi difícil, era vida nova pra mim, pro meu marido, pra minha filha que teve que dividir a mãe, tudo com as outras crianças, foi difícil, mas ela gostou, ela morou com nós até os quatorze anos, depois que ela resolveu ir embora com o pai, ela ta lá, ela ta aqui, ela gosta da mãe, ela gosta do pai. O pai nunca mais casou, então ela quer agradar os dois. Mas ela gosta daqui, ela vem sempre. E eu fiquei, nunca mais me interessei em procurar outro emprego. Eu até falei pro meu marido que a hora que eu sair daqui eu vou me aposentar, porque comecei a trabalhar bem nova, quando sair daqui vou ficar em casa. R: Será que aguenta ficar sem os filhos pra cuidar? Rindo MS 5: Sem filho, nossa, complicado né, tirei férias esses dias, daí ficar só em casa só nos dois, eu vim buscar uns deles pra ficar lá junto. R: Levou uns deles? MS 5: Levei o L., vim visitar, semana passada fui lá pra casa levei eles também. R: Para sua casa no interior? MS 5: Não, eu tenho uma casa em Campo Largo. Criança vem contar algo MS 5: E eles têm um carinho muito grande pela mãe, pai, pelo menos os meus são bem tranqüilos. Não sei se assim é pelo tempo que convivem com nós, ou se é pelo jeito de lidar com eles né, eles são bem mais tranquilos. R: Que das outras mães? MS 5: São mais tranquilos. Eu já tenho duas mocinhas, já se passaram mais de cinquenta crianças por nós. E os que foram também, tão bem, tão felizes, é um trabalho gratificante né. R: Você lembra das características de perfil que foram solicitadas e o que você se identificou? MS 5: Lembro, tinha que ser um casal que tivesse um filho ou nenhum, idade de vinte e cinco anos ou acima, pedia uma escolaridade também ele pedia que a pessoa tivesse assim paciência né, e que tivesse assim responsabilidade para assumir uma casa com tantas crianças, e que gostasse de criança e isso nossa eu sempre gostei. R: Como que era sua relação com criança?

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MS 5: É que eu trabalhava em hospital tinha quatorze anos quando entrei no laboratório, e foi indo, foi indo, parece que a parte da pediatria, a parte das crianças, nossa, quando a gente chegava as crianças já ficavam felizes, aquele agrado, aquele carinho. Eu me casei muito nova, tive meus filhos também, sempre assim cuidei deles, protegi o máximo, até hoje, a gente mimou demais, então aquele carinho especial com idosos e crianças. Não que a gente deixe de cuidar dos outros, principalmente com crianças especiais. R: Passaram por aqui crianças especiais? MS 5: Nossa, passaram, e no hospital também, crianças com problema que a gente cuidava, tinha enfermeiras que diziam que aquela criança não para, não toma remédio, eu não tinha este problema, eu agradava, conversava e dava certo, eles aceitavam, não tinha problema em lidar com este tipo de criança. E aqui os vários que passaram por mim, e ainda tem uma hoje. O médico disse que ela sobreviveu por causa do meu carinho e cuidado. Ela é vitima do alcoolismo fetal, a mãe era soro positivo e ela também é. Ela nasceu muito pequenininha e frágil, quando eu peguei ela, ela tinha nove meses, sempre os mais doentinhos, com problemas que precisam de mais cuidado vão aqui pra casa. Eu entreguei um em dezembro passado ele era um cadeirante, eu fiz ele andar. Vários assim, sei lá, aquela afinidade maior, com os outros também, não tenho dificuldade nem problemas, mas eles já são crianças que conseguem se virar, uma criança especial não consegue, você fala vai brincar e ele não consegue, tem que acompanhar, as outras já fazem. Tem que acompanhar, ter um cuidado, uma dedicação diferenciada com estas crianças. Com carinho, com o que a gente consegue passar para eles, isto traz muita segurança para eles. R: Gosta de se doar então? MS 5: Gosto, e é gratificante, porque eles respondem. No hospital quando chegava crianças com problemas, quando tinha que encaminhar pra fora, eu sempre ia atrás para saber como eles estavam, se estavam bem, se deu certo, aquela preocupação. Precisam de um cuidado maior. Meu filho mais velho tem problema de audição, eu tive ele com dezesseis anos e ele teve problema, nasceu com problema, muito doente, hoje ele usa aparelho, é pai, é casado, tem uma vida normal. Mas ele demorou sete anos para falar, demorou para andar, ele vivia no médico, eu me dediquei muito a ele, para ele sobreviver. Quando ele nasceu o médico falou que ele não sobreviria. R: Quantos filhos você tem? MS 5: Tenho três filhos, uma é mãe na casa. Eu sempre cobrava muito estudo deles, estudar e caprichar, pra um dia ser alguém na vida. E perguntei para minha filha que entrou comigo aqui o que ela queria ser quando crescer, ela falou pra mim, mãe social. Aquilo marcou, mãe social. (Rindo). M. chega para levar as crianças ao cabeleireiro, e MS 5., vai vestir as crianças. R: Fala um pouco das suas funções aqui... MS 5: As minhas funções começam as seis da manhã, tirando a noite né?! Já é hora de levantar, aí já chamo as duas que vão para escola, têm dias e horários diferentes, daí tem que acordar eles, arrumar para ir para escola, o cabelo de A. dá um trabalhão pra arrumar, fazer café para os que vão para escola, os da creche não tomam em casa. Aí levar para escola, uma semana cada mãe leva todas as crianças, é duas quadras daqui, assim não fica cansativo. Depois tomo um banho, arrumo meu quarto, e daí já começa a organização da casa, tiro um tempo para o bebê, dar de mamar, troco a fralda, dar banho, colinho. R: Dá tempo para se dedicar a ele?

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MS 5: Dá, sempre dizem que meus bebês são muito mimados, porque dou muito colo pra eles. Daí meu marido quando ta em casa também já chega e já pega, ele trabalha até as 15:00h. Já chega e pega o bebê, anda. Quando tem que levar no médico, levar num atendimento eu vou, e se não for eu que levo, a gente organiza quem leva e quem busca. Se a auxiliar não vem, eu tenho que tomar conta da casa, as duas meninas mais grandinhas ajudam, mas não é que elas fazem, a gente tem que estar sempre no comando, arruma sua cama, por mais que eles arrumem, eu vou junto, acompanho, falo para dar uma esticadinha direitinho, vamos arrumar aqui, deixo eles tentar do jeito deles, depois eu acabo arrumando denovo, daí eu organizo a casa, limpar, aí já tem horário de fazer almoço, já tem aula denovo, 11:30h já tem que pegar na escola, aí já tem que arrumar para alguns que pegam o ônibus. É rotina de mãe mesmo, acomoda um aqui, outro ali, troca um, tem quatro colégios diferentes que eles vão, fora as atividades variadas aqui. Então tem que chamar, acordar, vamo, tá na hora, tem que tomar café, deixar limpo, arrumado para sair pra atividade, porque se deixar por conta, eles não saem do lugar, são crianças, tem que tar sempre falando, hoje você tem isto. Conta de ter esquecido de mandar uma das crianças a escola um dia destes. Aquela rotina toda, mas sempre sobra um tempo para descansar, eu faço artesanatos também, pra vender, faço pra nós, pra mim, e eu do conta, dou colinho pros bebês, sobra um tempo pro marido também. R: Dá pra ser mulher, ser mãe... MS 5: Dá sim, um pouco de tudo. R: E como que é a questão da educação? Cada mãe passa os seus valores para as crianças ou tem um “manual” para ser seguido? MS 5: Não, eu educo, cuido dos meus do meu jeito, a MS 7, que é nova, do jeito dela, e a MS 6 do jeito dela, a gente não interfere. Se ela chama atenção de uma criança eu não falo nada. Só se ver alguma coisa no pátio que a gente vê que estão errados, mas na parte da educação o que pode o que não pode cada mãe educa os seus, a gente não interfere um no outro né e também a gente não dá opinião, cada uma faz do seu jeito. R: E dá certo assim? MS 5: Dá, a gente trabalha, é uma equipe, trabalhamos pelo mesmo objetivo, mas com jeitos diferentes. Por mais que eu consiga convencer os meus do meu jeito, posso não conseguir os outros. E às vezes também, a MS 6 tem dificuldade com outras crianças, eu não interfiro, ela é minha filha, mas eu não interfiro, ela que cuida, ela é responsável. Se ela tiver alguma dificuldade ela fala com diretora, com a psicóloga, se pede uma opinião a gente pode ajudar, mas sem interferir uma no trabalho da outra. Se põe de castigo é quem colocou que tira. R: Que dificuldades você encontra nesta função de mãe social? MS 5: Eu não vejo dificuldades, faz tempo que estou aqui, várias crianças passaram por mim e ainda estão, eu não vejo dificuldade, os outros, as pessoas de fora, os próprios voluntários que trabalham com algumas crianças minhas, às vezes vêem uma certa dificuldade de contornar uma situação, eu não vejo porque os meus me obedecem. Mas às vezes com os outros eles não, não é que eles têm medo, mas é uma questão de respeito, eu não vejo dificuldades nos meus. Eu gostaria que às vezes eles pudessem entender melhor a mensagem né, eles não entendem, mas desde um bebê a gente tem que tentar transmitir, às vezes a gente pensa que não entende. R: Como assim?

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MS 5: Assim, no dizer de uma coisa. Hoje eu tava limpando a casa e o bebê tava de manha, chorando, eu peguei ele e conversei que a mãe tinha que limpar o chão e ele tinha que ficar quietinho, que a mãe ia colocar ele pra tomar sol no quarto, ele se espreguiçou e ficou quietinho um pouco, ele é um bebê, é pequenininho, mas a gente têm que ir conversando desde pequeno. A gente pensa que eles não entendem, mas eles entendem. No querer passar uma mensagem para eles entender, mas numa questão de estudo, aprendizado, eles são espertos, eles entendem, tem vezes que eles se fazem não entender. Entra outra mãe social, achando que iam conversar todas juntos com a Psicóloga, num programa que elas têm de acompanhamento quinzenal. Quando esta sai, MS 5 fala desta mãe social, que é nova e assumiu a casa 2, após ficar um ano e pouco fechada por falta de mãe social, está desde janeiro. A diretora não teve muita escolha, era ou ela ou ela, não tinha muita opção, um tempo atrás tinha. Então, na minha época tinha oitenta, e depois foi diminuindo, mas agora é bem difícil. As pessoas às vezes querem, pelo salário, pelo trabalho, mas não tem pique, não tem paciência, daí não dá, se é uma pessoa estressada, com a vida enrolada, aí não dá, tem que tar bem tranqüila, não pode ficar ligando muito por qualquer coisa, se não acaba se estressando daí acaba, como que se diz, ficando louca, não tenho este palavreado comigo. (Ri) R: Que características você acha que tem que ter para ser mãe social? MS 5: Olha, já veio vários casais aqui, a gente olhava e via que não leva jeito. No olhar da pessoa, no conversar, a maioria destas pessoas que tava fazendo um contato com o lar, a diretora mandava conversar comigo e perguntava o que eu achava, e eu dizia, não leva jeito, às vezes não pelo jeito da pessoa, sei lá, mais pelo gênio, no conversar ou vê a pessoa, a gente já vê a pessoa que não leva jeito. A diretora até tentou e não dava mesmo, deu no que eu disse. Mesmo quando uma mãe quer adotar uma criança, a gente já vê hum, não vai dar certo, sei lá, parece que é uma visão, e não dá mesmo. Sempre uma auxiliar, folguista, uma pessoa que vem, a gente já vê se a pessoa vai dar certo ou não. R: E o que você vê aí? MS 5: Ri, uma diferença no contato com a criança, o jeito da pessoa, não adianta nem tentar que não vai dar certo. Mesmo quem tentaram colocar não deu certo. Com a MS 7 ela não tinha opção, não teve questão de aprovar ou não. Ela é nova na área, tem uma filha só, eles passam por dificuldades às vezes, até um problema pela filha dela que a gente vê, mas um pouco ela precisa e vai relevando, a filha dela já gritou aos cantos que queria “ir embora para o nosso mundo”, ela deve ter uns cinco anos. Bem diferente de quando a minha entrou, a minha filha já se dedicava até demais, e ela ali é uma dificuldade de convivência, para mãe e pai ver isso é difícil. Nosso trabalho tem que ser por amor mesmo, se não, desiste, não dá para ser só pelo trabalho. R: Amor a que? MS 5: Amor pelo que faz, e não fazer por obrigação. Sempre falo pras minhas meninas, não adianta fazer as coisas chutando, brava, nunca façam as coisas assim, façam por amor, por gostar e não por obrigação, ou que alguém mandou, nada a gente consegue se sair bem num trabalho, num trabalho de escola, num curso se fizer por obrigação, eu acho que a pessoa tem que fazer sempre por gostar. Faço comparação de fazer almoço, se a mãe for fazer uma comida pra vocês, se a mãe fizer com raiva vocês vão comer? Não vai ficar boa aquela comida. Hoje fiz um almoço simples e eles disseram que tava uma delícia. Uma coisa

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simples, mas faça com jeito, com amor, tudo fica gostoso. Desde o ambiente, a casa. Com brabeza não leva a nada, tem que fazer por gostar mesmo. R: E você gosta... MS 5: Acho que gosto né, fala rindo. R: É possível assegurar a individualidade e ritmo de cada criança? MS 5: É difícil, sabe, você não consegue agradar todos do mesmo jeito, tem que ter um jogo de cintura para conseguir. E às vezes se tentar convencer dois com a mesma palavra, um tu convence, mas o outro não, tem que negociar com eles. Não dá para usar o método, se fizer isto eu faço isto, tem que fazer por que tem que fazer e não que vai ganhar alguma coisa. Eu faço trabalho em grupos com todos juntos, ou acabo fazendo alguma outra coisa, conversando individual com cada um, têm algumas coisas que a gente forma em segredo, com criança é difícil manter em segredo com eles, mas a gente negocia, o segredo em troca de alguma coisa, porque dentro do lar há muita fofoca, briga, discussão entre eles: ah, porque o fulano pegou, ah porque o fulano me disse isso, e daí um pra vingar do outro, então tem que saber negociar com eles se não acaba brigando e eu não sou de ficar distribuindo tapas, de levantar a mão, eu converso. Neném acorda, pergunto o nome e disse que não tem nome e eles não podem dar. R: Como é receber uma criança deste tamanho? MS 5: É muito gostoso nossa, ele já engordou. MS 5 falando para o neném, o papai falou que não pode ficar comento porque a tia M. (diretora) falou que, por favor, não me engorde este guri. MS 5 diz que perguntou a diretora, porque, você vai me dar a conta? A conta não, mas vou te dar um curso de nutrição, eu não gosto de ver o bebezinho magrinho, eu deixo eles muito gordo. R: Ele chega sem nome? MS 5: Quando chega do hospital sem, algumas vezes a gente dava nome, mas dava problema, então não demos mais. Porque teve vários que chegou sem nome, a gente deu e chega os pais e dão outro nome, aí tem que ir no juiz para mudar. Conta de uma criança que passou por vários nomes, e que no nome do posto de saúde não tinha nada na sua ficha de tantas mudanças. R: E como é conhecer cada criança? A rotina? MS 5: Os pequenininhos a rotina a gente faz, o horário do banho, do mama de duas horas e meia, três horas. Não chego a deixar ele chorar, ele começa a embravar e eu já dou de mamar, se ele quer mamar a gente têm que dar. R: Faz dormir no colo? MS 5: Não sou de balançar no colo, mas quando precisa eu tenho que pegar, fica quietinho. Faço chá para dar nos intervalos. R: Como é o apego com crianças menores? MS 5: Quando chega recém nascido, ele é diferente de quando chega mais grandinho, mais carente, aquela perda, tira da mãe e vai pro Conselho, vai pra casa de passagem, vai pro abrigo, já passou em muitas mãos. Quando vem direto do hospital é diferente, porque nasceu no hospital e veio pra cá, e a gente acaba fazendo a rotina dele, horário de dormir, de mamar, banho e a criança acostuma. Agora quando já vem sem rotina nenhuma, muitos vêm sem rotina nenhuma, sem hábitos de banho, de higiene, sem horário de comer, o que come, come fora de hora, e a gente começa a estipular um horário, horário de mamadeira, horário de dormir, acordou depois vai brincar, porque se não, não dá. Depois elas querem alguma coisa, tem que negociar uma coisa pela outra, é meio difícil, mas a gente consegue, uma fruta pela outra, ou um doce pela fruta, elas são espertas, elas pedem. O que uma ganha a outra também quer. Às vezes não tem e dá pra

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negociar, elas aceitam. E tudo através de horário, se pode ou não. O banho, o horário de dormir, de passear, de brincar. R: Tem uma rotina aí? MS 5: Aham. R: E como é para você o nome de mãe social? MS 5: Olha, até pouco tempo diz que essa profissão não existia, parece que segundo as informações não existem. R: Agora já existe uma lei. MS 5: Pois é, pensei, como vai ficar, toda vida fui auxiliar de enfermagem, hoje eu sou mãe social, é uma mudança. Mas existe ou não existe, mais tarde vai dar problema. Estes dias mesmo a MS 7 ligou numa loja para financiar um carro e ela deu a profissão mãe social, e o cara falou, que é isso, isso não existe. (Ri) Mas eu acho que ser mãe social são duas coisas juntas, ser mãe como a gente é com os filhos da gente, que não é social nenhum, é mãe mesmo e mãe social é porque a gente têm um jeito diferente de socializar as crianças, assim de poder fazer coisas diferentes com eles, e não só ser mãe, porque a mãe é casa, comida, carinho e levar para escola, aqui é muito mais do que isso, a gente têm que além, ser mais, como uma roupa social, é uma roupa mais, tem que ensinar eles assim a diferenciar também né, e não assim vamos dizer, meus filhos se criaram, não tinha muito isto de sair, de se introduzir com outras pessoas e os daqui têm, e é um objetivo, isso é ser mãe social. R: E como você vê esta função de mãe social? MS 5: Em primeiro lugar, é gostoso, ser mãe social, é uma coisa diferente, é uma coisa assim mais forte, além de ser mãe, eu acho que é legal. R: E o que mudou na sua vida depois de se tornar mãe social? MS 5: Olha, não mudou muita coisa, diminuiu do que eu era antes, diminui meus compromissos, obrigações, eu acho mais fácil ser mãe social que auxiliar de enfermagem. A minha responsabilidade era muito grande como plantonista da noite. Aqui tenho responsabilidade grande, de mãe e dona de casa, tenho vidas sob minha responsabilidade, mas no hospital era bem diferente, era muito mais responsabilidade. Então hoje vejo que minha responsabilidade é mais tranquila. Hoje eu do remédio, cuido de um bebê a noite, mas é aquela coisa mais light. R: E para encerrar, como é quando eles vão embora? MS 5: É complicado, aí sim pesa, pra nós, mãe, pai, cada desligamento a gente sofre muito, mas eu me colocando no lugar deles eles sofrem muito mais. Hoje tenho crianças grandes que já entreguei, muitos mandam cartas, e-mails, os pais mandam cartas agradecendo pela educação, pelas crianças maravilhosas que são. Eu acho que eles sofrem bem mais, porque a gente é um trabalho, cada criança que é inserida numa família, para nós é uma vitória, é o sonho de cada um ter uma família, uma casa de verdade, eles custam a acostumar, eles sofrem no começo. A maioria dos casais traz para visitar, passear, cada saída de volta eles choram denovo. É sempre uma tentativa de retorno à família, não havendo possibilidade, vai para adoção. É poucos os que não voltam nos visitar. R: E como é para vocês receberem estas famílias? MS 5: Em primeiro momento a gente pensa assim, porque uns saem e não voltam mais, os que vêm trazer a criança de volta pra gente ver, porque tá satisfeito com a criança e dá valor ao nosso trabalho, agora têm uns que não querem mais dizer, ah você saiu daqui, passa uma borracha, essa criança vai sofrer um dia se não contar que foi levado de um abrigo. Aquele pai e aquela mãe que conta, traz de volta, é melhor.

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R: E como fica esta questão de mãe social e mãe? MS 5: Quando eles saem a gente já começa a preparar, que vão para uma mãe de verdade, uma família, que eu vou ficar aqui, que sempre que eles voltarem a mãe vai estar aqui, alguns demoram a voltar, outros já vêm logo, mas quando a criança já ta falando, mais grandinha, já volta chamando de tia. Quando volta para família biológica a gente acompanha, pegamos no pé, para que a família realmente mude. R: Você busca estimular as crianças? MS 5: Muito, principalmente os pequenos. Gosto de fazer massagem, no banho, estímulo de contato, de conversar, de tudo dizer o que vai fazer, vamos tomar banho, vamos trocar. Então muito obrigada por contar um pouco da sua experiência, porque ser mãe é isso mesmo. MS 5: E todo mundo teve a sua. Entrevista MS 6- Instituição 3 R: Você já tem uma mãe que é mãe social, mas como foi a sua entrada? MS 6: Eu entrei em 2003 aqui como auxiliar, eu trabalhei uns dois anos como auxiliar daí saí, retornei como folguista fiquei mais um período bem longo e agora como mãe social fez um ano em fevereiro. É tranquilo, uma experiência nova, eu entrei aqui com dezoito anos, e hoje estou com vinte e quatro, já tive filho aqui de quatorze anos aqui da casa, como eles chamam a gente de mãe, tive este filho com diferença de dez anos, bem complicado, mas normal, a gente faz por que gosta. R: Mas como que foi, você chegou a morar aqui com a sua mãe? MS 6: Não, eu vim, trabalhava durante o dia e as 17:30h eu ia para casa. R: E antes? MS 6: Não, não, meus pais são separados, eu morava sozinha desde os dezesseis anos, quando eles se separaram, tive meu filho com dezessete, hoje sou casada, moro junto aqui, mas não é o pai dele, tenho um filho de seis anos já. Chega uma criança pedindo por uma auxiliar que já saiu em dezembro “caiu a ficha agora”. (MS 6) R: Como que você voltou para uma Casa Lar? Tinha tido contato pela sua mãe, mas quando você decidiu que você queria trabalhar aqui? MS 6: Eu tinha filho pequeno, precisava trabalhar, aí eu vim aqui e a diretora me recebeu e contratou, ela falou que se eu arrumasse outro trabalho eu podia ir. Eu tinha acabado de fazer dezoito anos, aí ela me falou assim e eu fui ficando, fui ficando e eu sempre gostei bastante de criança, o meu sonho de criança era ser professora, para trabalhar com criança, crescendo eu já não quis mais, eu vim trabalhar aqui porque eu gosto realmente de criança, foi isto que me motivou a estar aqui. R: Mas você saiu daqui e voltou? MS 6: Fiquei um período como auxiliar, eu saí, retornei como mãe social/ folguista e saí também, porque mãe social – folguista eu tinha que pegar um ritmo de pegar todas as casas, é bem mais complicado, porque hoje cada um tem a sua folguista, eu não, eu tinha que dar conta de todas as casas, chegava hoje as 17:00h e ficava vinte e quatro horas, aí passava para outra casa e ficava até no outro dia, de casa em casa, era um trabalho muito complicado porque tinha que ter um conhecimento com todas as crianças de todas as casas e mesmo assim eu fiquei quase dois anos, mas era uma coisa muito cansativa. R: Mas daí era três dias por semana?

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MS 6: É, um dia eu ficava a disposição do que precisasse, de sexta a segunda e tinha os outros dias livres, mas mesmo assim era muito cansativo, diferente de ter a sua casa. Porque eu tenho aqui a minha casa, é do meu jeito as crianças aceitam as minhas regras e quando você não é a mãe social sempre tem aquele, você não me manda e pra você conseguir pegar o ritmo de vinte e poucas crianças é complicado, daí eu comecei a cansar. R: E como foi a idéia para ficar como mãe social? MS 6: Eu não vim para ser mãe social, eu fui até embora de Curitiba, aí no ano retrasado a diretora tinha que dar férias para todo mundo e me contratou por três meses, para cobrir as férias de todas elas, e eu aceitei, vim pra cá e nesse período uma mãe social saiu, aí eu acabei assumindo a casa que era a dois e eu trouxe as crianças pra cá (casa três) e assumi essa casa este ano. R: Não quis ficar naquela casa? MS 6: Não, não, é que minha mãe morava antes nesta, daí eu já tinha conhecimento e aquela casa eu nunca tinha tido contato, nesta eu já me sentia em casa, um negócio diferente, eu preferi mudar as coisas de lá pra cá e preferi ficar aqui, já fez um ano em fevereiro. R: E como foi para assumir a casa? MS 6: Foi, sei lá, foi legal no início, mas assim um pouco de medo, um pouco de insegurança, tinha duas crianças especiais que davam muito trabalho, aí uma pessoa inexperiente, não tanto porque eu já tinha conhecimento deles, mas não era o conhecimento de eu tomar as rédias da casa era aquele conhecimento de eu cuido hoje e amanhã vou pra minha casa ou mudo de casa e não vejo mais, foi um pouco de medo mas hoje já não tenho mais. Assim, se me trouxer um ou dez, já não tenho aquele medo assim, já cheguei a pegar uma bebezinha de dez meses, menor eu não pego porque realmente tenho medo. R: Qual a idade da sua casa? MS 6: um ano a doze anos, todas as idades, estou com nove crianças, oito do lar e um meu. R: E como que é sua função? Como você vê a sua função como mãe social? MS 6: Como mãe mesmo, a gente acaba tentando passar pra eles o que passo pro meu filho, faço a lição com eles, sirvo o prato deles, faço a alimentação deles, dou banho, uma vez por semana seja grande ou pequeno dou banho geral. Nos menorzinhos todo dia, os outros um a dois por semana, eles ficam meio envergonhados mas é tranqüilo, porque se não, não lavam atrás da orelha, o pé. Tem dias que a gente acaba achando que nem é trabalho, acaba levando a vida como se fosse a casa da gente mesmo. R: Você já veio casada pra cá? MS 6: Não, eu vim pra tirar os três meses de férias das meninas, ele ficou lá na nossa casa, depois no final do ano ele veio pra conhecer também e aí a diretora conversou com ele também, ele é três anos mais novo que eu, ver se ele aceitava, se era uma coisa que ele queria também, e hoje ele se dá super bem com todas as crianças, ele trabalha no período da tarde e de manhã ele fica aqui, hoje mesmo eu sai cedo e ele fez almoço, fez a lição, ele toma minha função quando eu não estou e a tarde ele saiu e eu fiquei, normal. R: E como que você se percebe com as crianças? MS 6: Não entendi. R: Como você vê a sua relação com as crianças? Porque não são seus filhos, mas te chamam de mãe, é você quem cuida...

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MS 6: A gente se sente assim sabe, quando vem a pequenininha que chegou agora, no segundo dia ela vem, oh mãe, a gente fica até surpreso, mas a gente trata cada um da maneira que merece, da forma que, eu não gosto de todo mundo assim, eu gosto de cada um da sua maneira, o meu filho eu tenho sentimento diferente por ele, mas eu gosto de cada um de vocês da maneira, eu não posso gostar de duas pessoas da mesma forma, cada um tem uma forma de gostar, mas eu nunca assim coloco ou deixo parecer que não gosto, coloco pra eles quando eles fazem alguma coisa errada eu digo que fiquei triste, coisas assim parecida, mas gosto deles de uma maneira diferente. R: É possível manter a individualidade então? MS 6: Dá sim, tem um que gosta de ficar mais grudado, outro que nem gosta de ficar perto, a gente têm que tomar cuidado para perceber, não adianta ser carinhosa, amorosa com você, se você não gosta disto, então a gente têm que saber com cada um devido ao histórico e como chegam aqui. Alguns têm medo e não chegam nem perto, já tive uns que chegaram e não deixavam nem levar até o banheiro, tinham medo de tirar roupa e hoje não, com o tempo a gente vai conhecendo melhor e esperando que eles venham se apegar com a gente e não a gente tentar forçar. R: Deixa vir deles... MS 6: É a gente vai deixando, lógico que a gente não deixa de lado, a gente vai conversando. As duas meninas ficam assustadas com homem, o marido passa de longe dá oi de longe, dá um sorriso, hoje não, ele passa perto elas já chamam, a gente não força nada, não quer, não quer, a hora que eles querem eles mesmo procuram, é uma coisa legal, por exemplo, a palavra mãe eu não sei o que isso significa para eles, eles passam por tantos lugares que chamam de mãe, mãe, mãe, não sei se é uma palavra forte como é pra gente, não sei se esta palavra tem um sentimento pra eles. R: Como é isso de se sentir mãe destas crianças que não são suas? MS 6: Se sente mãe mesmo, quando eles vão embora a gente fica muito triste, dos grandes a gente sabe que é uma coisa legal. Este mês dois foram para adaptação na Itália, aí então a gente fica triste, mas ao mesmo tempo fica feliz, porque sabe que eles estão indo pra um caminho bom, de uma família, por causa da idade. A gente não têm condições de dar um futuro, um lar pra eles, uma casa de verdade, eles fazendo dezoito anos têm que seguir o caminho deles. Quando é bebezinho menor a gente sofre bastante porque acaba se apegando, mesmo não sendo da gente, não é que os outros não sejam, mas os menores a gente se apega bem mais, você passa mais dias triste, quando entra dentro da casa parece que falta algo, os grandes não, porque já tem mais liberdade, já vão pra escola, os menores não, ficam em casa dia e noite com a gente, um sentimento que a gente não consegue explicar, a gente fica triste, feliz, tudo ao mesmo tempo. R: E como que é a estimulação com os pequenos? Andar, falar... MS 6: Como eles ficam o dia todo com a gente, dá sim. Mostra o pé, a mão, no banho, escova de cabelo, escovando os dentes, ela adora. Ela gosta quando vou trocar ela, fazer cócegas, ela fala comigo de manhã, eu fico ouvindo ela e fazendo perguntas e ela fica respondendo, não sei o que passa na cabeça dela, mas estimula, eu brinco com ela, pé, mãe, eu falo meu nome, e ela repete bem certinho. Todo tempo que faz uma brincadeirinha, estimula um monte. Ela abre os armários, antes quando ela começou a engatinhar, andar, eu ensinava ela a fechar e eu falava parabéns, agora quando ela fecha ela olha esperando o parabéns. R: Que dificuldades você vê nesta função de mãe social?

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MS 6: Dificuldade de conseguir entender todos eles, no início, quando cada criança chega, até você conseguir entender, até conseguir colocar as regras, por exemplo, eu não quero comer, não quero dormir, sinto dificuldade neste momento, porque a gente têm que colocar os limites, desde quando chega, lógico que a gente é um pouco mais tolerante, no limite, hora de comer é de comer, hora de dormir, é de dormir, nesta hora eu sempre fico meio perdida, depende da criança, alguns a gente consegue em dias, outros em mês, aí surge um pouco de dificuldade. R: Mais na adaptação então? MS 6: Isso. R: Que características você acha que uma mulher deve ter para ser mãe social? MS 6: Deve gostar bastante de crianças, e gostar realmente do que faz, se não, eu acho que não consegue, porque a gente acaba se doando por completo. Conta que seu filho ficou com febre depois que outra menor entrou, tem que acabar passando por cima disto para dar conta, ele falou pra mim, né mãe que eu não sou mais o seu bebê? E aquilo doía mas ele só sentia febre quando tava perto de mim, quando fazia as atividade não sentia nada, era chegar final de tarde, entrar pra casa que começava a arder em febre, não tinha garganta, não tinha nada, aí a gente entendeu quando ele pode se expressar que não era mais o bebê, que ele tava sentindo que tinha um bebê menor que ele. Eu sempre dou atenção pra ele, mas ele come o que todo mundo come, brinca com todo mundo, eu gosto dele bem diferente de todos outros, mas na hora de todo mundo é todo mundo, eu sempre digo que ninguém é melhor que ninguém. R: Mas ele sai com você nas folgas né? MS 6: Quando to de folga levo ele comigo, os outros ficam com um pouco de inveja mas eu explico pra eles, não, quando são os voluntários que saem para passear, quando é uma atividade no geral o filho participa, mas quando é dormir na casa de alguém, voluntário, padrinho, ele nunca vai, os outros eu libero pra ir, mas ele nunca vai, daí então eu faço esta colocação. Até quando vai na casa da diretora ele vai junto, eu fico com coração na mão, (Ri) eu não sei deixar ele sair, e ele também, aí quando ele volta pergunta e aí mãe, tudo bem? Sim, tudo bem, daí ele vai brincar, mas ele também fica ansioso, ou ele liga dizendo que ta bem. Quando ele vai na mãe posar também, ele liga dizendo que ta bem, quando ela leva ele pra Campo Largo que ela tem casa. Ele fica ansioso para chegar aqui e eu também, parece que falta alguém aqui dentro, a gente acostuma né, e até mesmo com outros a gente acaba se acostumando, fica tanto tempo, depois a pessoa mesmo que abandonou recupera novamente, ou vai pra adoção. R: E como que é isso? MS 6: Tem o espacinho deles guardado, eu tenho um de dois aninhos que era meu e ficou só um período bem curto comigo e foi adotado, ele vem aqui me visitar, quando chega no portão aqui o coração dele acelera. No começo ele não entendia, fez um bolo na cabeça dele, eu era a mãe, a mãe era a mãe, os pais também, ele não sabia com quem ele queria ficar, aí eles deram um prazo mais longo para vir visitar novamente e desta vez ele falou “MS 6” você é minha “MS 6”, meu amor. É uma demonstração linda, ele lembra daqui, muito querido, a gente não consegue esquecer. Até mesmo os dois especiais que a gente teve muito trabalho, mas eles foram transferidos, final do ano passado, a gente sente falta. Quando cozinho uma comida penso, ele gostava, uma roupa quando a vê, isso é a cara deste, ou daquele. Mesmo sabendo que foram transferidos pra um lugar melhor a gente lembra deles e gosta do mesmo jeito. R: Eh, uma dedicação e investimento em cada criança...

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MS 6: Pois eh, alguns cresceram aqui dentro e foram transferidos. É um apego que pega por eles sem compromisso nenhum, a gente acaba pegando. Alguns como são bastante carentes através do afeto que a gente oferece até eles se apegam. Hoje a menina de dois anos tava passando e eu saindo com um saco de roupas para levar para o barraco e ela me perguntou pra onde eu tava indo e eu falei que tava indo embora ela entrou em desespero, ela chorou tanto aí eu voltei e perguntei o que foi? Você vai “embola”, eu não quero, eu falei bem assim, você quer ir junto? E ela “quelo”, aí me deu a mão e foi comigo até o barraco, eu falei não, vou guardar essas coisas no barraco. A perda dela foi tão recente que de certo ela pensou, ta indo embora e vai me deixar também, vai me abandonar, dois aninhos, mas já tem um histórico de abandono e agora mais um, aí voltei e abracei ela e disse que eu não ia embora, aí ela veio me mostrar que ganhou bolacha, ela é muito querida assim. Sei lá daí por mais que converse assim, têm varias coisas assim que acabam dando errado, você fala não (repete 4 vezes) e a criança não tá nem aí, é sim e pronto, parece que você é um nada ali falando. Aí às vezes lá na frente, uma semana, duas, a criança pega e faz sem você mandar, a gente fica muito feliz, porque não sai na hora mas depois a criança por conta própria acaba entrando naquele ritmo e a gente fica feliz, não pegaram no momento mas vai servir em algum momento pra eles. R: É, isto pode funcionar a longo prazo, precisa de repetição, sempre estar falando. MS 6: Algumas vezes a gente pensa, não adianta, mas eu mesmo peguei eles sem limites, sem horários, sem nada, aí peguei eles e comecei a colocar rotina, organizar, eu sempre tive os grandes, o último organiza o banheiro, não fica nada de roupa no banheiro, no início eu falava e parecia coisa de outro mundo, hoje é tudo organizado, depois do banho o banheiro está seco, levantam o tapete. Eles revezam as coisas da casa, depois eu elogio por mais que fique sujo, eu organizo depois. É uma coisa que foi assim em um ano, pode parecer um tempo grande, mas pra eles foi muito difícil, e hoje ninguém tem medo de ser o último a tomar banho, no início ninguém queria e hoje não interessa. Se alguém esquece, o outro veio e falou que tava desorganizado e foi lá arrumar. R: Não é como um castigo e fica algo da rotina... MS 6: Eles acabaram aderindo assim e não fazem por obrigação, eles fazem brincando, conversando, às vezes ficam três, quatro dentro do banheiro, um tirando, outro limpando, daí eles dizem que terminaram e gostam que depois diga parabéns, ficou bonito, eu gostei. Eu to feliz assim sabe, eles adoram que a gente elogia, eles ficam todo cheio. R: E como você vê o nome, Casa Lar? MS 6: Eu creio que eles se sentem em casa, não conheço outras Casas Lares, só conheço aqui mesmo e a gente pode deixar o portão aberto eu nunca vi ninguém dizendo que ta indo embora, não quero ficar, eles se sentem seguros aqui dentro, quando eles saem passear, vai chegando final da tarde eles começam a dizer que tem que ir para casa. Pelo meu ver eles se sentem bem aqui, uns já falam eu não quero ir embora, querem morar aqui, eles veem como uma casa e não como um abrigo, eu acredito que seja assim. R: E o que te move a cumprir suas funções? Que desejo possui para fazer essa sua função materna? MS 6: Depois de tudo que eles passaram, espero que tudo de certo, que aqui a gente incentiva muito o estudo, a alimentação, coisas assim que quem sabe aqui dentro não veja, ou assim eles progredir aqui dentro mesmo, quem sabe lá fora que de tudo certo pra eles.

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R: E você falava que entrou por gostar de crianças, já tinha vínculo pela sua mãe, foi um processo até que veio e ficou, está aqui, como que você vê esse seu desejo de estar aqui, administrando uma casa com estes filhos? MS 6: Não sei, é uma coisa gratificante pra gente, não sei explicar assim como, mas acho uma coisa tão legal assim que sei lá, sem explicações, uma coisa muito legal mesmo. Eu não consigo expressar, sei lá, a gente se sente feliz, se sente triste, toma dor do outro, é uma coisa sem explicação, é uma coisa que acontece, não sei. R: E o que mudou na sua vida depois que você se tornou mãe social? MS 6: Eu amadureci bastante, mudou assim um monte de coisa, sei lá, eu creio que eu aprendi bastante coisas assim. Quando eu entrei não sabia nem trocar uma fralda, com o tempo assim sabe, como eu digo, se eu tivesse meu filho hoje, eu falo nossa, tem tanta coisa que eu não fiz pra ele, tanta estimulação, tanta coisa que hoje eu sei fazer, e assim, ninguém veio dizer, com o tempo, indo, vendo, fazendo, e com o tempo assim sabe, então o amadurecimento foi uma coisa. A aprendizagem que eu tenho hoje, hoje se me derem um bebê de um dia eu acho que tenho aquela condição, eu tenho medo lógico por ter os demais, mas eu acho que sou capaz hoje de desempenhar coisas que há cinco anos atrás eu não conseguia. R: E como é a relação entre as mães sociais, sem esquecer que uma delas é sua mãe, mas como é a relação entre as mães? MS 6: É relação bem aberta assim, aqui todo mundo trabalha em grupo né, se eu tenho uma dificuldade eu procuro ajuda, não é assim o caso de uma se intrometer na outra, cada uma cuida da sua casa, mas a gente sempre se ajuda, por exemplo, se uma criança fala que ta precisando de ajuda a gente ajuda, a gente assim, sabe, é bem unida, é um grupo que quando precisa a gente fala. Eu, com as mães sociais e as outras pessoas da Instituição, é todo mundo bem unido, fica uma coisa bem legal assim, a gente acaba se sentindo em família também, todo mundo. Que nem os da minha mãe são filhos né, chamam ela de mãe, os meus chamam minha mãe de nona, porque meu filho a chama de nona, também a gente têm o costume de fazer almoço, de lanchar juntos, coisa assim de família mesmo, vão dormir lá, eu já trouxe uns pra dormir comigo, aquele negócio de rotina de família mesmo bem gostoso. R: Como fica sua relação com seu marido, com sua família, sendo que aqui requer dedicação integral, quando você pensa, já não pensa só nos três... MS 6: Somos onze. Não tenho mais ninguém em Curitiba fora eu, meu marido, meu filho e minha mãe. Eu não tenho parentes, então a gente usa o tempo de folga, mas não batem os meus dias com ele, ele trabalha em supermercado, não tem feriado, trabalha das 13:00h às 21:00h, é um horário complicado. Algumas vezes bate uma folga junto, aí viajamos, mas assim com o filho, como a gente têm um quarto restrito, dá um tempo assim, mas do mesmo jeito, acaba se enturmando, dá pra ser mãe mulher tudo junto, come junto todo mundo, lancha junto, vê TV todo mundo junto, apesar de ter TV nos quartos a gente prefere ficar assistindo junto, fica mais a vontade, tem com quem comentar, a gente acabou se tornando mesmo uma família mesmo assim aqui dentro também. Pro marido um pouco mais difícil porque eu já tinha o conhecimento, já tinha um filho também, ele não, ele entrou com dezenove anos, hoje tem vinte e um anos, então pra ele foi uma experiência, mas eu nunca vi ele dizendo to estressado, ou não quero, ou não consigo, hoje ele diz que se eu tiver cansada e quiser tirar folga, posso deixar ele que ele fica tranquilo, eu disse, não obrigado. Apesar de que ele é tranquilo, final de semana que ele ta em casa, ele lava louça, ele ajuda, organiza, hoje fez o almoço, uma das meninas, a mais velha

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de doze anos, foi lavando a louça, ele disse que ficaram bem companheiros ali na cozinha então a gente acaba tendo uma vida junto, todo mundo, uma família. MS 6: A gente nem pode dizer que é um trabalho, eu não consideraria, por mais que seja, mas é uma coisa que a gente acaba, sei lá, é a casa, a gente fica assim, eles perguntam pra gente, você não trabalha não? (Ri) Lógico que trabalha, como eles se sentem em casa também, eles veem poxa vida, porque você não trabalha. Se é a tua casa, todo mundo diz a minha mãe trabalha, meu pai trabalha, porque você não trabalha? Aí às vezes a gente fala, eh mesmo, preciso arrumar um trabalho, mas aí quem vai fazer as lições, o almoço pra vocês? Aí eles desistem (ri). Os meus eu costumo a fazer lição todos os dias com eles, os voluntários que ajudam nisso vão ajudar e eles falam pra eles, não eu já fiz com a minha mãe, não preciso, porque tipo assim, a gente acaba brincando, o marido já é mais rígido, se a letra não ta bonita ele diz que vai passar caligrafia pra eles, então eles só querem fazer comigo. A gente acaba se apegando, é uma rotina natural. Às vezes na escola vêm questionários, onde você mora, o que teu pai faz, o que tua mãe faz, aí de certo da branco, o que que minha mãe faz? Minha mãe fica em casa e hoje em dia é raro uma mãe ficar em casa, é muito difícil, a maioria das mães trabalham. R: Quando perguntam dos pais eles se referem a vocês? MS 6: Sim, quando perguntam nome do pai, nome da mãe sim, sempre colocam o nome da gente completo, nunca vi um dizer não é. Entrevista MS 7- Instituição 3 R: Gostaria de saber como você entrou para trabalhar aqui, como você entrou na função de mãe social? MS 7: Pois é, eu trabalhava com crianças antes né, na Igreja, trabalhava com crianças, trabalhei três anos com crianças, dois com adolescentes, daí por último tava mais com senhoras, fazia reunião em casa com senhoras. Daí tive minha filha né, ela tem seis anos agora, só tenho uma e vim tendo dificuldades com ela na educação porque ela era sozinha e a gente não pretende ter mais filhos. Daí a gente pensou, eu pensei em fazer algo que ajudasse a ela e a mim também né, na educação dela, aí eu pensei em fazer pedagogia, trabalhar numa creche, alguma coisa assim, sabe, daí eu já tava trabalhando com as crianças e automaticamente eu iria ajudar ela também na educação, aprender coisas novas né, e daí nesse meio surgiu a oportunidade de vir pra cá. R: Como é que surgiu esta oportunidade? MS 7: A empregada da diretora né, a secretária dela que convidou a gente, daí a gente foi em Psicólogo, viemos aqui, conversamos com ela e gostamos, meu marido adorou, ele adora aqui, a filha também gostou, daí eu deixei de fazer o curso de pedagogia que eu ia fazer porque eu falei pra ela que seria a mesma coisa, aqui mexe com criança e lá eu ia mexer com criança, então pra mim seria a mesma coisa, aí eu achei melhor vir pra cá. Daí a gente tamo levando aí, três meses já. R: Três meses já... MS 7: Três meses já, mas estamos gostando sim... É uma experiência nova, (ri) bastante coisa já mudou... R: Eh? Que é isso que já mudou? MS 7: Assim, como que posso dizer, o relacionamento com a filha, que tipo assim, minha filha não tinha horário pra nada, como era só ela então, qualquer hora ela comia, qualquer horário saía, não tinha horário para levantar, só de manhã né. O dia que ela não queria ir pra aula, reclamava que tava chovendo a gente acabava não

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levando. Hoje não, ela tem limites pra tudo né, o mesmo que é pra um é pra ela, tem horários, de levantar, de dormir, então bastante coisa mudou. R: Como é para você colocar ela... MS 7: Ai dói um pouquinho, às vezes, depende a coisa assim me dá uma dozinha assim sabe... Eu sou bem assim firme com ela, sou bem firme com ela. Ontem mesmo ela dormiu comigo até, a noite inteira. De vez em quando ela levanta, diz que não quer dormir, que tem medo, e vai pro quarto. Ontem ela queria ir embora, (ri) fez as malas e queria ir embora. Perguntei aonde você vai? Vou pra casa do meu tio. (Ri) Mas é só chantagem, ela só pegou as bonecas né, então era chantagem (conta rindo). Ela tava com medo e dormiu comigo, então é assim, no meio da noite ela levanta, vai pro meu quarto, às vezes eu nem vejo, quando eu acordo ela já ta no meio da gente, mas assim... R: Ela sente esta diferença? MS 7: Ela sofre mais, ela sofre bastante, sabe. Eh... No primeiro mês, tive que ir na escola, conversar com psicóloga, pedagoga, que ela começou a reclamar que sentava na última carteira e que ela não queria sentar na última carteira, daí a gente foi lidando com ela, conversamos com a Psicóloga aqui, fomos levando. Daí fui na escola, cheguei na escola não era a última carteira, ela sentava assim na penúltima carteira. Mas não era este o problema dela, o problema dela era aqui, não era lá. Daí fomos conversando, ela queria atenção minha, queria que eu fosse lá. Aí de uns dias pra cá começou dor na barriga, dor na cabeça, mas tudo dor psicológica. Daí fui lá, conversei com a pedagoga e pedi para transferir ela para de manhã, ela vai começar a semana que vem, porque daí ela fica a tarde comigo, ela tá bem carente mesmo, ela quer ficar comigo o tempo todo. Ela vai pra escola e fala que tem uma dor para voltar, mas ela adora estudar, gosta da professora. O problema é aqui em casa, a gente conversou todos nós, a psicóloga aqui e achamos melhor transferir daí ela vai de manhã e todas as minhas meninas vão a tarde, daí vai ficar sozinha e posso dar atenção maior pra ela. Acho que vai melhorar né, um pouco... R: Fica um pouco insegura com esta questão? MS 7: Eh... Fico preocupada na verdade, porque as crianças elas vêm e elas passam, elas vão pra uma família, vão pra alguém, e ela vai ficar pra sempre, daí a gente fica preocupada no amanhã né, como será, o que vai ser dela. Ela pode pensar que a minha mãe me abandonou, minha mãe preferiu as outras crianças, ela pensa isso na realidade. A gente explica, você é filha da barriga e os outros são do coração, eu falo pra ela que eles vão pra uma família, família deles, ou vão voltar pra família, ou outra família vai pegar eles pra cuidar, a mãe só ta aqui para dar atenção pra eles, carinho, explico pra ela mas ela ainda não entendeu, não entendeu ainda não. A gente até acha que ela vai entender quando sair uma criança, que dos meus ninguém saiu, o dia que alguma criança aqui voltar pros pais, aí acho que ela vai entender melhor: Ah, realmente, minha mãe falou que ia sair e ia voltar pros pais e voltou mesmo. Daí eu acredito que quando isso acontecer ficará mais tranquilo, estamos esperando. R: Então a tua entrada foi mais por acaso, de ficar sabendo? MS 7: Isso... E tinha um ano que a casa tava fechada aqui, tinha um ano que a diretora tava esperando aqui, ela tava pedindo e não achava ninguém pra ficar, daí eu tive coragem, (ri) eu tive coragem de vir porque não é fácil né, é bem... Tem que ter bastante paciência, bastante né a vontade também, amor pra ficar, se não tiver paciência não fica. Que eu tenho oito, cada uma diferente da outra, as meninas brigam, brigam por atenção, tudo, no começo até tive um problema com as quatro, elas entraram e eu dei bastante carinho e atenção, e elas achavam que tinham o

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mesmo direito da minha filha, não o mesmo direito, achavam que eu era mãe mesmo, aí começaram: mãe compra um tênis pra mim, mãe compra isto pra mim (ri) e eu falava, mas a mãe não pode comprar tudo, primeiro que a mãe não tem dinheiro, não é assim, aí comecei a explicar pra elas que não era assim, que tinha a lojinha assim, que a gente vai lá e busca um calçado, que a mãe não é responsável pelas roupas dela pra comprar, que só da filha, explicar, e daí a filha compra bastante, agora menos, mas ela ficava mãe, mãe, mãe, o dia inteiro, agora diminuiu, mas elas começaram também o dia inteiro, mãe, mãe, (ri) sabe? Daí chegou um ponto que assim eu tava (...) (conta rindo). Daí a gente conversou bastante com elas e aí nossa deu uma melhorada, expliquei pra elas daí hoje elas entendem e falam, mãe, é a tia M. (diretora) que tem que comprar pra nós as coisas né?! É, ou se tiver na lojinha a gente pega lá. R: Como é essa lojinha? MS 7: Nós temos uma lojinha que é um barraco, que tem roupas calçados deles, brinquedos que a gente ganha de doação, daí chega uma criança nova a gente vai lá e pega roupas pra eles, roupas novas, roupas usadas, conforme o tamanho, se tá faltando tênis, se estragou ou não serve mais, a gente vai lá e procura. Elas andam bem vestidas, bem arrumadas, mas elas achavam que eu que tinha que comprar, mãe compra um calçado, da hello kitty, ai meu D-us, não posso, antes elas cobravam bastante, agora não, elas já entendem, entendem bastante. R: Todas as suas crianças entraram faz três meses? MS 7: Isso, entrou junto comigo, só três que são mais novos, que entraram há dois meses, o de dez meses, um de dois anos e uma de cinco aninhos. E os outros entrou todos juntos, tenho de um ano e três meses, a irmã dele, oito, e o irmão dois. Dois grupos de três irmãos e uma sozinha (dez anos) e a minha filha. A mais velha dá uma mão pra mim, dar comida, vestir eles, de manhã ajuda a lavar o rosto, se estou atendendo os bebês ela ta com os outros maiorzinhos. R: Conversando com a Psicóloga ela diz ter sido uma escolha sua ter mais bebês na casa... MS 7: Foi, foi uma escolha minha, eu gosto mais, os maior esquenta mais a cabeça e o bebê te ocupa mais o tempo, cansa mais fisicamente, mas menos a cabeça (ri), então eu preferi bebê. Mas o de dez meses é um anjo, e o de um ano é um furacão, a gente até chama ele de furacãozinho...Vem cá furacãozinho. R: Ele já ta começando a andar? MS 7: Ele já anda bastante, mas ele chora o tempo todo, ele é uma criança assim que chora a toa, vai trocar ele chora, do nada ele começa a gritar, gritar, assim parece que você ta espancando ele, se alguém chegar na janela e ouvir o choro parece que to batendo nele e é do nada. R: Com tanto bebê é possível manter a individualidade, saber o que cada um quer? MS 7: Dá, dá pra ver. Dá pra sentir bastante assim, a maioria eles querem colo, mas isso é o de menos que a gente pode dar aqui, porque não dá tempo, não tem tempo de dar colo, porque é super corrido durante o dia, levanta as sete da manhã, daí sempre tem compromisso, um vai pro colégio, outro vai pra outro curso, Psicóloga, nisso eu levanto preparo o café, a mamadeira do bebê, nisso boto um no chiqueiro, outro no tapete, outros vão pra fora, outros já saem, e assim já tem outros compromissos assim vai e tem pouco tempo pra eles no colo, é mais a noite, a tarde. Meu esposo gosta muito, adora eles, deita no chão, pega eles, coloca todos no chão, mais a noite, pois de dia é super corrido e o que eles mais gostam é de colo, todos mesmo a de dois aninhos, todos colo, querem bastante atenção. A mais velha tem madrinha, aí algumas vezes no final de semana a madrinha leva pra passear

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daí fica sete, às vezes outros saem com alguma madrinha daí aqueles que sobram eu posso dar um pouco mais de atenção, porque daí é menos. Se dá pra um, vem todos e você acaba não dando pra ninguém e às vezes você ta sozinha, chega um começa a te cheirar, querer colo, daí a gente pode dar. Até esses dias brincamos com eles com bola, enchemos balão e começamos a brincar com eles na sala, aí a de oito anos disse que foi o dia mais feliz da vida dela. Então tudo assim pra eles é novidade e a gente vai aprendendo assim junto com eles a lidar... Tudo... A vida, porque antes era só nós três, nunca imaginava assim, hoje é totalmente diferente. Eu tenho uma folga por semana, às vezes é minha folga saímos eu, meu esposo e minha filha só, os outros ficam com a folguista e ela vem e fica com eles e só sai nós três, aí posso dar uma atenção maior pra ela, mas ela sai dizendo de ir embora, quero ir embora, não quer ficar aqui mas quando chega lá quer ir embora, é mais ou menos isso. R: E como você vê a sua função aqui? MS 7: Como assim? R: A tua função, como funciona pra você nesse lidar com as crianças, como que é? Uma pessoa que trabalha em tal lugar tem tal função. MS 7: Acho que é uma mãe mesmo, uma mãe, uma protetora, dá segurança. Conta de duas crianças que depois de um tempo passaram a se sentir mais seguras tendo os pais, com a tranquilidade que eles estariam ali com eles. Eu nem acho que eles gostam da gente tanto pelo amor, é pela comida e pela troca. R: Como assim? MS 7: Porque as crianças não entendem eu acho, não sei talvez assim, só amor, porque a gente dá comidinha na hora certa, banho. Agora é horário de comer, de limpar, e é isso que vai fazendo eles se apegar mais na gente, querendo ou não já envolve um amor, mesmo que não ta pegando, abraçando e beijando o tempo todo, isso já faz que eles já sintam isso. Vamos bastante na Igreja, eles adoram. R: Isso é sua casa? MS 7: Aham, é a nossa casa, vai só as nossas crianças. Eles falam que vão ver Jesus, mãe, eu vou ver Jesus hoje? Vão, vão ver Jesus. (Rindo). Eles adoram, isso ajuda bastante eles. R: Vocês são evangélicos? MS 7: Sim, somos. O pessoal da Igreja vem visitar aqui, traz coisas pra eles, eles gostam, a minha família também é super apegada, é tio, é avô, eles ligam, falam com cada um deles. Eles se apegaram bastante assim, e nós também a eles, a família inteira, meus irmãos, minha sobrinha, ela ficou aqui uma semana, e foi embora chorando. Toda semana tem visita em casa, da minha família, ou vem almoçar, ou faz festinha aqui. Ou às vezes a gente vai lá tomar um café da tarde no domingo. E eles gostam, ficam super alegres, o que eles mais gostam é de passear. Chega lá todo mundo ajuda a cuidar, é um carinho muito grande. O bebê é muito dado, tudo pra ele tá bom, no colo, no chão, ele ri pra tudo. Todos se apegam muito com ele. Eu também me apeguei com ele, acaba dando mais atenção. Alguns que querem fazer tudo sozinho, menos dependência. Os outros acabam se apegando mais porque têm que ajudar em tudo. R: Então é bem livre para passar a sua forma de educação. MS 7: Sim, esses dias veio tarefa da escola, que religião ela era, e ela colocou, sou católica, aí alguma pergunta sobre os pais, e ela se confundiu. A mãe vai pra Assembléia de D - us, você acompanha a mãe, pode colocar isso, eu nunca passo que tem que ir, eles vão porque gostam, são livres, ela colocou, sou católica mas vou na Assembléia de D - us com a minha mãe. Eu nunca passo que tem que ser

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assim, a única coisa que faço é levar, porque alguma coisa tem que ir, como sou de lá, levo lá. Nunca falaram que não querem ir, lá tem escolinhas pra eles, e eles frequentam, lá eles cantam, fazem lição, contam historinha. R: Era lá que você trabalhava? MS 7: É, mas não nessa Igreja, eu morava em Pinhais. Nesta função. E eu trabalhava com os pequenininhos, de dois a três anos, era gostoso. Os maiorzinhos que era mais complicado. R: Tem uma resistência com os maiores? MS 7: Eu trabalhei com os adolescentes, eles não prestam atenção no que a gente ta falando, mas eles estão escutando, mas estão brincando, mas sabem certinho o que você falou. Eu prefiro mil vezes crianças, rindo conta que na Igreja diz que queria trabalhar com as crianças, adolescentes não. R: E como você se percebe com as crianças? Como você se vê? MS 7: Eu acho que sou rígida com eles, o pai é mais solto assim, até porque eu fico o dia inteiro com eles e ele só chega a tarde, então tudo é dez. E como é o dia inteiro, o dia inteiro, sou uma pessoa rígida com eles, como poderia dizer, eu cobro mais deles, mas brinco bastante com eles, passo a mão em bastante coisa, se for cobrar o dia inteiro tudo que eles fazem, meu \d - us. Ponho eles de castigo na cadeirinha da disciplina, assim, que põe de castigo quando faz alguma arte. R: É geral aqui? Ou cada família tem o sue método? MS 7: O castigo é geral, mas cada um tem seu método, eu sempre ponho na cadeirinha, ou boto no quarto, as meninas boto no quarto, vão lá pro quarto e ficam lá, elas vão e ficam, mas se for cobrar o dia inteiro, o dia inteiro criança apronta, daí acaba assim, só brigando, só cobrando. Acho que eu sou mais leve, eu cobro, sou muito de falar, falo bastante, mas eu não cobro muito deles não, muito pouco castigo deles, até porque eu acho que eles já têm bastante regras, horários, acaba cobrando cobrando demais, então automaticamente eles já crescem com esse compromisso dos horários, da rotina, acorda tal horário, faz isso, faz aquilo. R: Você acha que é muito limite já? MS 7: Eu acho que pros meus que são pequenos, eu acho que eles são obedientes, eu acho que acabo cobrando demais deles, eu acho. R: Mas você acha que tem muito limite aqui a casa? MS 7: Não, não, cada um faz a sua, essa aqui é minha família, eu que lido com a minha família. Do jeito que eu criei a minha eu crio eles, eu adaptei aquilo aqui e continuo, eu acabo falando muito, vou por você de castigo, vou por você no quarto, mas acabo deixando, relevando um pouco para evitar muito castigo porque eu acho que vai prejudicar eles. R: E você percebe alguma dificuldade no exercício desta função? MS 7: Dificuldade? R: Eh MS 7: Eu acho que não seria nem dificuldade, eu acho que a gente que é mãe que tem o filho da gente é diferente, a gente pode cobrar mais do filho porque ele é teu, lidar com as crianças é diferente, você não sabe quem é eles realmente, você acaba conhecendo por fora, o basicão, é teimoso, é briguento, este tipo de coisa, mas assim, assim bem conhecendo você acaba não conhecendo. Têm crianças que falam aqui, a tia bateu, mas a tia não bateu, a tia botou de castigo, é tudo isso, e do teu filho você conhece, se você brigar, colocar de castigo ele vai falar isso. Agora a criança que vem aqui às vezes dá receio de colocar de castigo também, é complicado, a gente não bate neles, mas eles podem falar que a gente bateu, entre eles mesmo eles se batem. A gente fica um pouquinho de receio das atitudes deles

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próprios, e os filhos da gente é diferente, a gente se sente mais livre de corrigir, de cobrar e essas crianças nem deve cobrar muito, nem deve, eu acho, porque acaba lá na frente, a gente não sabe o que pode acontecer. R: O que você pensa aí? MS 7: Não, não, eu nem sei, os pequenos de menos, mas os mais velhos eu não sei, a criança, a gente não conhece a família, não conhece a criança, então é muito complicado assim as crianças que vêm, que aparecem derrepente, derrepente as coisas mudam, ela chega, você é mãe, ela é filha, e assim, uns certos costumes que nunca viu na vida, eh... Certos costumes que se fosse sua filha você deixaria de castigo, e talvez não é o caso daquela ali, né?. É muito complicado eu acho assim, neste fato. R: E que características uma mulher deve ter para se tornar uma mãe social? MS 7: Eu acho amor, amor e gostar, gostar de criança e ter bastante amor, se você não tiver amor por eles não vai conseguir ficar aqui, tem que ter paciência porque é o dia inteiro mãe, mãe, mãe, mãe é vinte e quatro horas por dia, a noite de vez em quando tem que levantar, cuidar deles, então tem que ter muita paciência e amor, porque tendo amor aí você vai ter paciência, vai aguentar muita coisa, né, e se a pessoa não tiver o amor, não gostar do que faz ela vai perder a paciência e já vai sair, né, então eu acho que o principal é ter amor e gostar do que faz. Eu acho que é isso. R: E como que é supor, você que tem crianças pequenininhas, como é a estimulação, supor a vontade das crianças? Alguns ainda não falam... Como identificar os choros? MS 7: Como assim? Quanto a alimentação, o brinquedo? R: Eh... Em tudo... MS 7: A gente acaba aprendendo, começa como um filho, eu comecei a conhecer cada um, ah essa hora quer mamar, essa hora ta com birra, a gente acaba conhecendo cada um individualmente, então a gente sabe que este é uma criança calma, outro chora bastante, então vejo que vou dar de comer de três em três horas, neste intervalo dou bolachinha, aguinha, coloco eles no chão, se eles querem dormir, eu já percebo, quando começa a reinar já sei que quer dormir se não é hora de comer. Boto ele na cama e ele já dorme. O A. é uma criança complicada que não sei explicar, ele chora, mas quanto a alimentação eu sei o horário, tem vezes que ele acabou de mamar ele chora, ele não quer brincar porque dou brinquedo ele chora, fico esperando como ele vai reagir, quando ele chora muito muito, coloco ele no quarto sozinho, sem nada que ele possa se machucar, quando eu volto ele já está calminho, às vezes trago ele pra cá já começa a chorar de volta. Os de dois aninhos são espertos. As crianças vão, e vem me mostrar, mãe, olha isso, olha aquilo. Outros só vêm quando chamo, mas sempre fico de olho, ou as meninas quando vão brincar peço para elas darem uma olhada nos meninos. Como os meus são menorzinhos eles se machucam mais, tenho mais atenção, os bebês ficam dentro de casa comigo. O A. consome 90% das minhas energias e 10 vai para os outros sete (fala rindo). R: E como você vê este nome, mãe social? MS 7: Ri... Ai sei lá, acho que não sei explicar. R: Não sabe explicar? Já parou pra pensar? MS 7: Não... É bem complicado sabe, só sei que eles acabam se apegando a gente e a gente neles. R: Como que é cuidar destas crianças que não são suas?

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MS 7: Desta parte eu não vejo diferenças, lógico teu filho é teu filho, é diferente com certeza, mas acaba pegando amor neles e trata como se fosse teu, ainda mais eu que tenho os piazinhos menores. Eu acho que é a mesma coisa que ser mãe mesmo. R: E quando vem as mães biológicas, mãe adotivas? MS 7: Elas ficam com ciúmes da gente porque daí eles chamam a gente de mãe, aí elas começam, mas eu sou sua mãe. Teve um que chamava a mãe de tia e queria chamar eu de mãe, mas isso foi só no começo, quando eles recém chegaram, depois foi normal, chama eu de mãe, a mãe dele de mãe, os pais também. A tua mãe um vai vir hoje (ri). Agora eles nem choram muito mais, é claro que o amor é bem maior por ela. Ele chora um pouco e quer eu, mas fica um pouco e já volta para mãe dele. Eu to com uma mãe de três e uma avó de três que estão visitando. R: O que você acha que mudou sua vida depois que virou mãe social? MS 7: Tudo (ri), tudo, tudo, tudo, tudo tudo porque é totalmente diferente. Era nós três, agora é em dez, começa com a alimentação, eu sirvo todos eles, eu quem cozinho, são oito chamando o dia todo, colocando pijama, fazendo tarefa de casa, antes eu pegava uma arrumava e saia, agora é bem diferente. O marido, eu que fiquei com ciúmes, porque ele me dá oi e vai brincar com as crianças, muda bastante é como se tivesse dez filhos. Agora repartimos o amor por todos. Meu marido se refere aos meus filhos aos oito, e não só a filha. Eu também, não penso só na filha e sim nas crianças, então muda bastante. Pra mim mesmo, um outro mundo, bem diferente, R: Nunca tinha imaginado? MS 7: Não, imagina ir na creche, cuidar das crianças e ir embora, agora ficar assim, eu nem sabia que exigia, pra mim é tudo novidade. R: Qual foi sua primeira impressão? MS 7: Eu achei bem legal, primeiro veio três e não todos de uma vez, daí mais uma, e mais uma e agora três de uma vez, aí que foi o baque maior, mas eu já tava aqui, até hoje eu me perco, vou fazer comida e perco a mão, faço muita, ou na conta. Vai se adaptando devagar. R: Teve alguma preparação para entrar? MS 7: Na realidade alguns têm, eles vão dando cursos, ainda não fiz, só lá na Igreja mesmo, no Lar ainda não, estou pra fazer um mais ainda não. Tem auxílio da psicóloga que a gente passou antes de entrar, a gente demorou dois meses antes de entrar, conversando, pra depois entrar. R: Tem uma preparação grande? MS 7: Tem sim, bem demoradinho, eu acho que peguei bem no começo, não demorou muito tempo para entrar no fervo. Eu tenho uma criança que tem problema de rim, a comida não pode ser muito salgada, não pode ter muito óleo, tenho que acompanhar ela no médico, eu acho que me saí bem, neste intermédio perdi minha mãe que eu não esperava, já tive que viajar e deixar eles, a filha começou a cobrar, então eu achei que superei rápido assim, achei que ia ser pior, achei que não ia aguentar. Eu to super bem, se estou triste vou no quarto, brigas com meu marido eles nunca veem, eu acho assim que está tranquilo, eu acho que eu estou indo bem, eu tento mostrar para eles o melhor, né, mesmo que eles não aprendam, (ri) tento mostrar pra eles a vida melhor que possa existir, porque eles já vêm de uma família complicada, aí chegam aqui a mãe tá triste de um lado, é legal conviver na paz, para saberem que existe uma família feliz, lógico que todo mundo tem seus momentos tristes, mas... Dá pra mostrar outra realidade. Meu marido adora aqui, gosta de estar com as crianças, no final de semana folgo, se não fica muito cansativo.

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Buscamos sair com eles, pois eles acabam ficando tristes, estressados de ficar sempre aqui, as mesmas pessoas, escola, casa, comer e dormir, aí vão pro parque, e nós vamos passear com a nossa família, isto descontrai bastante. R: Tem mais alguma contribuição a dar sobre esta função, estas crianças menores? É nesta fase que elas estão se constituindo... MS 7: Eu acho que o que eles aprendem aqui eles levam para a vida, os de dois aninhos aprendem tudo: obrigado, por favor, é lindo ver eles falarem, pedirem, a gente fica até emocionado de ver as reações deles, o quanto eles já aprenderam, eles imitam o que a gente fala. Uma criança vai estimulando a outra também. Alguns chegam sem falar, com fralda, e eles aprendem bem, alguns têm bastante facilidade. Tem que ter atenção e falar bem com eles, eles acabam aprendendo. Tem que ter a maior paciência, às vezes você acaba de trocar de roupa eles vão pra areia, pra água brincar, eu acabo rindo do que eles fazem pois são crianças que estão aprendendo, se descobrindo sozinhos, é muito lindo a gente aprende muita coisa com eles. Os três meses que estão aqui já vale dez anos de experiência, todo dia uma novidade diferente principalmente os pequenos, o de um aninho já tava querendo falar mamãe, é uma graça. Coisas interessantes que vão ensinando pra gente, super interessante, é a parte que eu gostei mais. Quanto a filha, super bom pra ela, eu não soltava ela da porta de casa porque tinha medo, e aqui tem vinte e oito crianças pra brincar, foi tudo novidade pra gente. Ela já passeia com as crianças daqui, eu me preocupo bem menos com ela, antes não tinha sossego, eu me sentia preocupada e insegura e hoje não, então foi bem útil pra ela e pra mim e é um trabalho que está sendo uma escola pra mim.