As raízes históricas da impunidade no Brasil
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As raízes históricas da impunidade no Brasil
Cláudio Henrique de Castro
Estão nos primeiros documentos históricos “as cartas de doações e
forais de capitanias” que encontramos o embrião da impunidade de
Portugal para o nascente Brasil.
Consta naquele documento que criminosos, ainda que já condenados
por sentença até em pena de morte, excetuados somente os crimes de
heresia, traição, sodomia e moeda falsa, estariam homiziados se fossem
morar no Brasil (1).
Lembremos que nas Ordenações Afonsinas de 1446, no livro V,
possuía 121 títulos de crimes (2) e nas Ordenações Manuelinas de 1521
possui 113 títulos de crimes (3), desta forma a anistia para criminosos na
colônia foi ampla e generosa.
O perdão das penas estava inscrito nas Sete Partidas medievais e se
dava por diversas razões, dentre as quais, vencer os inimigos do rei (4).
Assim, a empresa colonial perdoou praticamente todos os crimes.
Na época das capitanias os criminosos eram o maior número dos
habitantes europeus em terras brasileiras (5).
Na sequência, nas Ordenações Filipinas de 1603, havia a previsão no
livro 5, títulos 112 e 113, das coisas que se não podiam levar fora do Reino
sem licença do Rei e que não se tirasse ouro nem dinheiro para fora do
Reino (6).
Adiante no Código Penal do Brasil Império de 1830 havia o crime de
suborno do art. 133, que narra o verbo criminoso como “deixar-se
corromper”, em comentários ao código o Desembargador Paula Pessoa, em
obra de 1877, anotava que subornar alguém era engajá-lo por sedução, a
fazer alguma coisa contra o seu dever (7).
Após e referido código de 1830 houve evolução na matéria por meio
de códigos penais e atualizações posteriores de 1890, 1832, 1940 e 1984.
Finalmente, a Constituição de 1988 previu no art. 37 o inovador princípio
da moralidade administrativa.
Para o nosso início histórico de anistia para criminosos até o
princípio constitucional da moralidade, avançamos sensivelmente, foram
quase quinhentos anos de história e muitas leis.
Em resumo, temos mandamentos constitucionais que ainda não se
refletem na realidade jurídica, política e institucional no Brasil.
Temos a previsão do bem jurídico constitucional da moralidade, mas
vivenciamos um estado imoral e por vezes, amoral. Onde a corrupção ainda
brota nas instituições e se perdeu o assombro pela impunidade.
Banaliza-se o recebimento de dinheiros provenientes de propina e
corrupção aos detentores de grandes e pequenos postos no Estado
brasileiro. É o que lemos em jornais e semanários.
Será que ainda nos ronda nos palácios do poder, o emblemático D.
Pedro, descrito por Oliveira Martins como títere coroado nas mãos de
Andrada, D. Pedro, arrogante, colérico, despótico por temperamento, por
sangue e por educação, que não tinha a força que faz os imperadores nem a
inteligência que dirige os estadistas? (8)
Faltam-nos estadistas, suficientes políticos ou homens públicos
sérios, pessoas de bem, gente engajada em combater a corrupção e a
impunidade no Brasil, que rejeitam privilégios e são pela coletividade?
Conseguimos chegar num momento histórico no qual as instituições
vão funcionar e cumprir a Constituição ou apenas teatralizá-la?
O tempo vai nos responder.
Notas
1. MARTINS JÚNIOR, J. Izidoro. História do Direito Nacional. Rio de
Janeiro. Typographia da Empreza Democratica Editora, 1895, p. 263.
2. AFONSINAS, Ordenações. Livro V. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, edição fac-simile de 1792.
3. MANUELINAS, Ordenações. Livro V. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, edição fac-simile de 1797.
4. SANCHÉZ-ARCILLA, José. Las Siete Partidas (El libro del fuero
de las leyes). Alfonso X, el Sabio. Título XXXII, Madrid: Editorial
Reus, 2004, p. 982.
5. TRÍPOLI, César. História do Direito Brasileiro. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1936, p. 90.
6. FILIPINAS, Ordenações, Livro V. Lisboa, 1792.
7. PESSOA, V. A. de Paula. Código Criminal do Império do Brasil
anotado até o fim de 1870, Rio de Janeiro: Livraria Popular, 1877, p.
224.
8. MARTINS JÚNIOR, idem, p. 253.