Asa de murmúrios - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. · entendendo que as nossas vidas já...
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Viagem a Andara oO livro invisível
Asa de murmúrios
Vicente Franz Cecim
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3
para onde te voltes
não estás
diz
Asa de murmúrios
para não esquecer que és alguém
onde não há ninguém
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Asa de murmúrios
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um dia ele chegou a Andara, era o Sem Nome e então nós o chamamos de
Sem Nome
mas ele cortou nossas cabeças para não o chamarmos Sem Nome
e nãoEusou
passou a se dizer a nós toda a sua presença que era mais uma Ausência de
tudo como nunca antes
então
o víamos passar em nossos sonhos rastejando sua Sombra Imensa que
cobria o Sol
todos os sóis
sobre nós
a perder de vista
se apagaram
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e começou para nós a Vida Escura
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com os dias passando mas os dias já não passavam mais aquelas noites que
vieram havendo se tornado agora uma Treva sem fim fomos
entendendo que as nossas vidas já não eram Iluminadas antes dele chegar
e o nãoEusou
onde mais haveria de se sentir em casa senão na Penumbra em que
vivíamos entre ser de claridade e a escuridão de não ser
isso foi o que o chamou
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é
foi isso
foi
um de nós dizia eu avisei acendam as luzes acendam as luzes
foi isso
dizíamos
nos dizendo
é
foi os outros concordassem mas
não eram os nossos corpos que falavam eram Elas Lá
pois o nãoEusou lançara todas no Abismo
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ah se houvéssemos acendido as luzes
ah se houvéssemos
aquelas vozes
distantes
e as nossas cabeças falavam e falavam e livres dos corpos sempre de costas
para si mesmos agora olhavam em todas as direções
pois haviam recebido um Dom oh
e que Dom fosse Esse
o de poder ver toda a Vida do fundo do Abismo
agora lançadas nessa Graça
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doada pelo nãoEusou
havia todo o Circulo do horizonte ao redor delas para agora sim verem
girando velozmente
e por trás dele o circulo da Noite Imensa trazida pelo nãoEusou
onde quem sabe vissem o que já não víamos as estrelas antes a perder de
vista e agora todas apagadas devêssemos ser gratas por isso se dizendo
umas às outras
é concordavam
devíamos ser gratas ao nãoEusou
pois agora podemos ver tudo como nunca antes
sim Agora podemos elas
se diziam
e dançavam no Abismo Fundo
e cantavam no Abismo profundamente canções profundas de Gratidão
solenemente
dançando no Lá
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enquanto nossos corpos aqui nós ouvíamos suas vozes
vindo do fundo de nós
do Abismo
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ora
como pudesse ser isso
se agora sendo só os nossos corpos vagando na Tristeza o que restara isso
de ver a Dança das nossas cabeças girando
de mãos dadas oh víamos as mãos dadas Lá no abismo Profundo
e esse outro isso ouvir aqueles Cantos sem os nossos ouvidos
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é
isso um de nós se dizia sua Voz Escura só agora o meu corpo o que restou
ah se houvéssemos acendido as luzes
ah se houvéssemos
uns Lamentos
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e do Abismo
as nossas cabeças vissem os nossos corpos chorando se contorcendo
no escuro
como se dançassem
mas não dançávamos
elas dançassem quem sabe o que dá nas cabeças quando ficam livres dos
corpos
elas dançando no Abismo profundo
e cantavam no Abismo profundamente canções profundas de Gratidão
solenemente
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foi quando o Osso Pai nos abandonou
e se deu o Desmoronamento
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e depois cada vez mais então tudo se dando em Se
nossa vida se tornando vida de Hipóteses Escuras cada vez mais
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agora sejamos o Fosse nos dizíamos
é sejamos
nos dizendo
estamos na Noite do Fosse Seria teria Sido
penetrássemos na vida por uma Fenda entre o Sido e um Sendo o que não
era mais
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e veio
O Desmoronamento
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o Osso Pai nos abandonou
de vez
ah se o Osso Pai nos abandonar se dará o Desmoronamento os nossos ossos
sabiam e temiam um Acontecimento de Ruínas
ah as recém-nascidas vertebrazinhas em nós se chegando aos nossos ossos
mais antigos buscando amparo
e o Desmoronamento se deu
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partindo o Osso Pai
pelo menos os outros fiquem
nos dizíamos
consolávamos as nossas recém-nascidas vértebras
mas não foi assim que se deu
pois todos os nossos ossos se foram com ele sigamos o Osso Pai
se diziam
é sigamos
aquela Tristeza se afastando ouvíamos cada vez mais longe as suas vozes
de ossos e então após as Danças um novo Canto das nossas cabeças
vindo
nos dissemos Elas tenham descoberto as fontes da Alegria
Lá no Abismo
e esse canto seja Celebração
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ah
só quando as nossas carnes se desfazendo se transformando em águas
que
a Terra bebia e tanta era a Sede daquele Deserto com um Abismo no
Centro em que agora estávamos
ah
só quando as nossas carnes
fossem as nossas carnes se tornando a água que a Terra bebia para ir se
tornar a Fonte da Alegria
entendíamos
as nossas cabeças as havendo chamado do fundo do Abismo
para serem
que força tinham aquelas cabeças livres de corpo agora Puras Esferas e nós
aqui nessa Noite de Hipótese neste Deserto em que nãoEusou fosse Fenda
da vida entre o Sido e um Sendo o que não Era mais
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pelo menos isso
nos dizíamos pelo menos
é
nos dizíamos
pelo menos nossas carnes indo novamente se reunir às nossas cabeças
que nossas Cabeças nos amparem que Elas as Esferas no Abismo nos
amparem gritávamos
cheios de silêncios em nossa Ausência cada vez mais de tudo
pois já sem o Amparo do Osso Pai
e nossos ossos todos também havendo partido
e nossas carnes de águas indo
ah as sedes da Terra
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nossas cabeças cantassem pela chegada das águas das nossas carnes Lá
no Abismo
seus Cantos de Alegria
pelo menos
isso
pois os Cantos Solenes haviam cessado
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agora
do fundo da Terra
fossemos nós que rumorejássemos umas antigas Vozes Solenes
jorrando por entre as Raízes
indo
numa Agonia de sombras de terra
só nossas águas de sombra de terra por dentro da Sombra da Terra
para sermos a Fonte da Alegria de nossas cabeças no Abismo
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e do Fundo da Terra
rumorejando
oh
como queríamos que em nós nascessem Asas
para nos elevar
pois víamos sobre nos arvores dando Frutos em sonhos e
fundos de lagos cheios de afogados nos chamando como irmãos
mas
como haveriam de nascerem asas em nós sem as nossas omoplatas ah
pois houvessem partido com o Osso Pai todos os nossos ossos
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ah
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ó Dias Ausentes à tona
rumorejávamos entre Raízes
ó Ausência de Tudo submersa
rumorejávamos escurecendo ainda mais no Fundo da Terra
tragam para nós uma gota de luz ò Dias Ausentes
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e cada vez mais a Terra nos bebendo avidamente
como tinha Sede de nós aquele nãoEusou
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aquilo sim é que fosse o Sido Sendo
o que nos acontecia
e
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ó Abismos sem sementes quem colheu as Origens das coisas
ó Ausências Sombrias
e íamos jorrando rumorejando
entre raízes
em nós
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em nós foi quando vindo Aquela voz em nosso Escuro
que cada um ouvisse dentro de si
nos dizendo
Faz jorrar uma fonte de lágrimas dia e noite e não te dês descanso nem o
teu olho seque
e se dizendo
As minhas lágrimas se tornaram o meu pão dia e noite
e pedindo
Quem dará água à minha cabeça e aos meus olhos a fonte de água amarga
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ah
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como queríamos que em nós nascessem Asas ah nos elevar
rumorejando
no fundo da sombra da sede da Terra
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com o tempo
mas que tempo eu me dizendo Ó Sem Tempo
e que eu fosse eu
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S
ubmerso
em Si como um homem
esquecido pelas paisagen
S
E vagando
Como se um mundo Não existisse
Um mundo não
como um mundo Sim
E convivendo com Ausência e Sombra
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Quase deitado na linha do Horizonte, e sem temer a Lâmina, e com os pés
pisoteando estrelas:
dança,
mas não é O Dançarino
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quem sabe é só o Vento nos contando esta história
um de nós se disse
é quem sabe
quem sabe quem sabe
quem sabe
fossemos só Crianças no fundo da Terra ouvindo os Rumores da
Mãe
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é
estamos no Fundo da Mãe nos dizíamos
é
isso nos dizíamos
rumorejando
e os lençóis de água da Terra nos embrulhando
como filhos
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e um oh ao longe também um Rumorejar de Ossos
longe
pois ao longe ainda ouvíssemos as vozes dos nossos ossos partindo
seguindo
o Osso Pai
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chegassem
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descendo da Treva Pura que agora envolvia a Terra por todos os lados
uns ventos com Aves sem asas nascendo na escuridão daquela Treva Pura e
clarões
vimos a Imensa
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enquanto dos céus que não havia
o Clarão descendo
vindo iluminar nossas carnes de água onde esquecido o humano
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agora o Um em nós se elevasse nossas águas misturadas
a Gota Imensa o umano
e primeiro demos de beber aos minerais profundos
pois no fundo da Terra havia aquela Sede sem fim agora umanos sabíamos
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ó Sede Imensa
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dando de beber as nossas Carnes de Águas a tudo que tem sede no fundo da
Terra nossos rumorejares agora o Único Rumor
profundo ia ao encontro do Canto da Alegria do Abismo
onde nossas cabeças L
á
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Esferas
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o Silêncio que se fez
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pois vimos Sem Olhos a Imensa
Profundamente no fundo da Terra subia para os céus de Aves sem asas que
não havia
subindo
Aquilo
ainda mais belo que a Treva Pura que envolvia toda a Terra
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aqueles fossem passos do Osso Pai retornando
sem ossos
o humano havendo se cumprido em nós se enlevecendo o umanoh
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e vimos a Imensa
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ó Árvore de Negros Corais
ó Árvore de Negros Corais
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cantamos
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quando passas, em Si se esconde a Árvore
dos Negros Corais
tu passeias sem Clamor
quem sabe: Até cantes
e o Caminho não é longo
não colheste nenhum fruto,
mas os Corais vão contigo
e teus Passos vão deixando Rumor de treva e água profunda, pois
te seguem, Negros, os Corais
a Árvore dos Negros Corais
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ó Árvore de Negros Corais
quando passas em Ti
se esconde
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e então se abriu para nós o Caminho longo
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e fomos
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OoO
o
O
oO
Oo
OoO
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um dia ele voltará a Andara será o Sem Nome mas nós o chamaremos
nãoEusou
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e para Eles cantaremos com voz Una a Um ana
h
Um só Eu cantand
oO
na Noite das nutrições profundas
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Para nutrir o Lodo,
tu não escreves Tu
és o Livro
que se lança em todas as direções nas Regiões Escuras: Agora
oO Círculo
cintilante
que te envolve
E nos limites da Esfera,
se te voltas para te ver Fonte
que se jorra,
vê:
o Outro,
Água que no Centro da Esfera ainda Lá és tu de novo, murmurando:
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Tu
és o Livro na Areia,
que se lança: Chama
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vê:
o Outro,
Água que no Centro da Esfera ainda Lá és tu de novo, murmurando:
Fim de Asa de murmúrios
A Viagem a Andara não tem fim