Assedio Moral e Organizacional

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  • ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL

    Uma anlise da organizao do trabalho

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  • Casa do Psiclogo

    ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL

    LIS ANDRA PEREIRA SOBOLL

    Uma anlise da organizao do trabalho

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  • 2008 Casa do Psiclogo Livraria e Editora Ltda. proibida a reproduo total ou parcial desta publicao, para qualquer finalidade,

    sem autorizao por escrito dos editores.

    1 edio2008

    EditoresIngo Bernd Gntert e Christiane Gradvohl Colas

    Assistente EditorialAparecida Ferraz da Silva

    CapaFlorence Zaninelli

    Editorao EletrnicaSrgio Gzeschnik

    CopidesqueChristiane Gradvohl Colas

    Produo GrficaAna Karina Rodrigues Caetano

    RevisoFlavia Okumura Bortolon

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Soboll, Lis Andra PereiraAssdio moral/organizacional: uma anlise da organizao dotrabalho/ Lis Andra Soboll. So Paulo : Casa do Psiclo-go, 2008.

    Bibliografia.ISBN 978-85-7396-610-7

    1. Ambiente de trabalho 2. Assdio moral 3. Organizao dotrabalho 4. Psicologia Industrial 5. Trabalhadores - Sade 6.Trabalho - Aspectos psicolgicos 7. Violncia psicolgica I.Ttulo.

    08-05725 CDD-158.7

    ndices para catlogo sistemtico:1. Assdio moral e organizacional: psicologia do trabalho 158.7

    Printed in Brazil

    Reservados todos os direitos de publicao em lngua portuguesa

    CasaPsi Livraria, Editora e Grfica Ltda.Rua Santo Antonio, 1010 Jardim Mxico 13253-400 Itatiba/SP BrasilTel.: (11) 4524-6997 Site: www.casadopsicologo.com.br

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  • Nezi, minha me preciosa, que sempre dedica omelhor aos filhos.

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  • Agradecimentos

    Ningum dono nico de um texto. O texto escrito nopertence apenas quele que o constri; pertence tambm ao espao e

    ao tempo vivenciado pelo sujeito e tem como co-autores todos aquelesque participaram de sua histria de vida.

    Artur Roman

    A todos que acreditaram, questionaram, duvidaram e meapoiaram: vocs me fortaleceram muito.

    Aos trabalhadores e atores sociais, que me acolheram comopesquisadora e me ofereceram suas histrias, suas experincias ecompartilharam sentimentos comigo, sem receio e com toda a in-tensidade e confiana.

    Aos professores, que se dedicaram e criaram tempos e espa-os nas suas vidas, que ofereceram sementes de conhecimento semsaber se iriam frutificar. Por acreditarem em mim e terem me aco-lhido nas horas de incertezas, sempre prontos a ouvir, respeitandoo tempo necessrio para meu amadurecimento. Pela postura pro-fissional que me faz acreditar que possvel produzir conhecimentocom seriedade, com muito sentido e com boas companhias: Profa.Gracinha, Profa. Yara Bulgacov, Profa. Luciana Valore, Prof. JosHenrique de Faria, Prof. Maurcio Serva, Profa. Amlia Cohn, Profa.Lys Esther Rocha.

    A Graciele Pereira, Marina Marques e Editora Casa do Psi-clogo, pela companhia, dedicao e apoio na reviso e napublicao do material.

    Aos meus avs, que tiveram coragem e persistncia para daracesso ao estudo para meus pais e ensinaram o valor do trabalho,da famlia e dos afetos.

    Aos meus pais, Mrcio e Nezi que se apresentam com todaousadia, persistncia e afeto e me deram muito mais do que opor-tunidade; ofereceram presena intensa, exemplo, carinho, apoio,

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  • f e acreditaram que eu era capaz. Por sempre lembrarem que eutenho um colo para voltar e um Deus em quem acreditar.

    Aos meus irmos e cunhados, companheiros da Dinastiados Soreiras, por significarem as melhores fontes do meu desen-volvimento e os melhores parceiros do momento, que estimulamminha criatividade e minhas particularidades, que se mostram for-tes, divertidos e que completam o Clube dos Oito.

    Ao meu precioso Danyel, por estar sempre ao meu lado epor ser meu companheiro em todas as circunstncias, nesses 11anos de carinho. Por acreditar em meus projetos e vibrar comigo.Por ter me feito olhar para uma direo nunca percebida e terdado a mim oportunidade de estudar mais, de ousar mais e deviver intensamente. Por ter despertado em mim a coragem de ex-perimentar outros mundos, inicialmente assustadoras experinciasque se transformaram em deliciosas e inesquecveis surpresas. Portudo que me ensina dia-a-dia e por me fazer uma pessoa melhore uma mulher feliz.

    A Deus, que me cuidou antes de eu nascer, que me deu sa-de, capacidade de pensar, de amar e de sonhar.

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  • Sumrio

    Apresentao ...................................................................................11

    1 A origem das discusses sobre assdio moral no Brasil eos limites conceituais, Lins Andra Pereira Soboll e RobertoHeloani ................................................................................17

    2 Assdio moral no trabalho: aspectos histricos econceituais ...........................................................................25

    3 Assdio moral e organizao do trabalho: anlise de casos .....45

    4 Assdio organizacional: a violncia justificada ...................81

    5 A organizao do trabalho e a prtica do assdioorganizacional: uma anlise do trabalho bancrio .................91

    6 Assdio moral e assdio organizacional: expresses daviolncia no trabalho ......................................................... 129

    7 Repercusses da violncia psicolgica na sade e na vidados trabalhadores ............................................................... 147

    8 Posicionamento do trabalhador diante da violnciapsicolgica ......................................................................... 189

    9 Comentrios finais ............................................................. 217

    Referncias bibliogrficas .............................................................. 223

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  • Apresentao

    O livro Assdio moral/organizacional: uma anlise da orga-nizao do trabalho resultado de uma pesquisa desenvolvida eapresentada como tese de doutorado, no Departamento de Me-dicina Preventiva, da Faculdade de Medicina, na Universidade deSo Paulo - USP1 .

    Em 2004, a oportunidade de desenvolver um projeto deacompanhamento psicolgico para trabalhadores que haviamvivenciado situaes de assdio moral, no SINDIQUIM2 , com oapoio da doutora Margarida Barreto, permitiu um novo olhar so-bre a violncia no trabalho. Foi tambm neste ano que a experinciae os estudos de outros pases tornaram-se mais acessveis do encon-tro com o professor ngelo Soares, pesquisador brasileiro atuandona UQAM3 , em Montreal, Canad, a partir que generosamenteofereceu-me algumas esse pesquisador orientaes e materiais bi-bliogrficos para o incio dos estudos sobre o tema. Desde ento abusca por informaes, pesquisas e publicaes sobre o assdiomoral tem sido uma constante. Em 2004, o encontro com essespesquisadores redirecionou os estudos de doutorado, que emborano tenha se desviado do objeto inicial - a relao sade e trabalho -,passou a ter como foco central o assdio moral no trabalho.

    1 Ttulo original da tese: Assdio moral e violncia psicolgica no trabalho bancrio.Apresentada em novembro de 2006 e defendida em fevereiro de 2007.2 Sindicato das Indstrias Qumicas, Plsticas e Similares de So Paulo e Regio.3 Universit du Qubec Montral.

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  • 12 ASSDIO MORAL E ORGANIZACIONAL: ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    A pesquisa, de natureza qualitativa, teve seus dados coletadosa partir de entrevistas semi-estruturadas, realizadas no consultriopsicolgico da pesquisadora, no perodo de junho de 2005 a abrilde 2006, com durao entre quarenta minutos e duas horas. Nototal, foram entrevistados 32 sujeitos, dentre os quais 28 trabalha-dores bancrios da regio sul do pas, dois mdicos do trabalho edois representes sindicais da categoria. A amostra foi intencional epor acessibilidade, construda a partir de trs estratgias de aproxi-mao com os sujeitos potenciais: i) abordagem direta dostrabalhadores no local de trabalho, em horrio de expediente ban-crio; ii) abordagem indireta, por indicaes de colegas jentrevistados, contato via telefone; iii) abordagem indireta, porindicaes do sindicato, com contato via telefone. Ex-funcion-rios e trabalhadores afastados por licena de sade, desligados hmenos de um ano, foram includos na pesquisa4 . A relao entreassdio moral e organizao do trabalho bancrio se constituiucomo o objeto de estudo da pesquisa realizada. Como resultadofoi identificada, com muita recorrncia, a prtica do assdioorganizacional, tambm abordado neste livro.

    Os atores sociais entrevistados utilizaram o termo assdiomoral para descrever presses e abusos inseridos na forma de ges-to e de organizao do trabalho, os quais foram relatados commuito mais incidncia do que os casos tpicos de assdio moral(com perseguio pessoalizada e mal-intencionada). Posteriormente defesa da tese, tomei conhecimento de que um estudo em umacompanhia de telecomunicaes no Reino Unido sinaliza o empre-go do termo assdio moral por parte dos trabalhadores para relatarpresses e descontentamentos diversos com a empresa e seus proce-dimentos5 . Com objetivo de dar destaque violncia como polticade gesto e por reconhecer que se tratava de uma forma diferenci-

    4 A metodologia utilizada para o desenvolvimento da pesquisa est relatada em Soboll(2006), no captulo 04: Procedimentos metodolgicos.5 Liefooghe e Mackenzie Davey, 2001 apud Einarsen et. al., 2003.

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  • APRESENTAO 13

    ada de violncia no trabalho, optei por descrever esses processoscomo uma figura diferente do assdio moral. No mesmo ano daelaborao da pesquisa relatada neste livro, Adriane Reis de Arajo(2006), Procuradora do Trabalho em Braslia, pesquisava o que elachamou de assdio moral organizacional, conceitos como prti-cas de hostilidades difusas e fomentadas pela empresa comoinstrumentos de controle e disciplina.

    Como resultado da divulgao desta pesquisa, agorapublicada em livro, o movimento sindical bancrio iniciou o usoda expresso assdio moral/organizacional nas suas campanhas.A opo pelo termo conjugado fundamenta-se na idia de fortale-cimento da mobilizao j existente em torno do assdio moral,ao mesmo tempo em que se destaca o assdio organizacional, con-ceito que permite descrever com mais clareza as vivncias recorrentesnessa categoria profissional tendo em vista a forma como o traba-lho vem sendo organizado. A expresso utilizada por esse grupotambm pode vir a ser til em outras esferas da sociedade. A utili-zao do conceito de assdio organizacional em palestras eassessorias em empresas, sindicatos e no meio acadmico tem sidorecebida pelos atores sociais como capaz de descrever prticas coin-cidentes com suas realidades de trabalho.

    Portanto, o livro aqui apresentado composto, em sua maio-ria, de consideraes elaboradas em 2006, que sofreram algumasrevises e ampliaes em decorrncia das contribuies dos pro-fessores que avaliaram a tese6 e dos estudos, vivncias e parceriasposteriores. Como um desdobramento da pesquisa inicial, vriasoutras experincias se efetivaram, na forma de avaliao e acom-panhamento psicolgico de trabalhadores, nas assessorias asindicatos e nas consultorias realizadas em empresas. Alm dessasoportunidades, o desenvolvimento de textos, palestras e cursosem eventos acadmicos tem oferecido ricos espaos de troca com

    6 Profa. Dra. Amlia Cohn (orientadora), Prof. Dr. Jos Henrique de Faria, Profa. Dra.Lys Ester Rocha, Dr. Prof. Paulo Elias e Profa. Dra. Snia Rovinski.

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  • 14 ASSDIO MORAL E ORGANIZACIONAL: ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    outros profissionais, pesquisadores e trabalhadores. O resultadodessas interaes a certeza de que as idias aqui colocadas soanlises iniciais, com validade limitada e passveis de serem questio-nadas e reformuladas a cada novo encontro com a realidade e comesses atores sociais.

    Os espaos de troca possibilitaram a elaborao de textos emco-autoria e a organizao de uma coletnea sobre algumas pesqui-sas acadmicas realizadas no Brasil7 . A necessidade de aprofundaressa discusso estimulou a formao de um grupo de trabalhointerdisciplinar em Curitiba, resultando num texto coletivo8 (emfase de publicao) que trata o assdio organizacional e o assdiointerpessoal como formas especficas de assdio moral apresentandoanlises conjuntas numa perspectiva da psicologia, da administra-o, do direito e da sociologia9 . Algumas idias aqui expostas jesto ampliadas em novos textos e coletneas, na busca de um di-logo mais profcuo com outros profissionais e com diferentes reas10 .Essas trocas confirmam que posies extremadas e excludentes emnada auxiliam a compreenso da violncia no trabalho.

    Embora este livro tenha como base de realidade o trabalhobancrio, muitas de suas concluses tm aplicao em outros con-textos, considerando que nenhuma profisso ou setor profissionalest definitivamente imunizado contra a violncia, uma vez quesua incidncia, freqncia e intensidade dependem em grande me-dida da organizao do trabalho11 . A violncia psicolgica notrabalho pode se efetivar em diversas categorias, tendo em vista asnovas configuraes da organizao do trabalho, permeadas decontroles simblicos e psicolgicos, de estratgias que estimulam acompetitividade entre os iguais, num tempo de curto prazo e numa

    7 Soboll, 2008a.8 Texto em fase de publicao (Schatzmam, Gosdal, Soboll, Eberles).9 Participaram do grupo Andr Eberles, Thereza Gosdal, Lis Andra Soboll e MarianaSchatzmam.10 Soboll, 2007; Soboll e Heloani, 2007; Soboll, 2008a; Soboll, 2008b, Gosdal e Soboll(no prelo).11 Khalef, 2003.

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  • APRESENTAO 15

    lgica de supervalorizao dos resultados em detrimento dos pro-cessos. Esses parmetros empurram para a fragilizao dos vnculose promovem a ciso do coletivo, instalando o isolamento. At quan-do vamos nos iludir de que esses so problemas de carter individuale subjetivo e no situaes sociais e coletivas da realidade em quetodos vivemos?

    Espera-se que os resultados deste livro, ao serem conheci-dos e discutidos pelos distintos atores sociais - trabalhadores,representantes sindicais ou de empresas, profissionais da sadeou rea jurdica - colaborem para o processo de reconhecimentosocial da violncia psicolgica que permeia a organizao do tra-balho e possam assim incrementar as aes voltadas para ocombate a essas prticas.

    O contedo do livro est organizado em dez captulos.O Captulo 1 congrega as anlises realizadas, no decorrer

    de 2007, em parceria com o professor Roberto Heloani. Partimosdo texto original da tese12 em busca de alguns avanos nas discus-ses. O primeiro captulo apresenta um breve panorama sobre osestudos iniciais de assdio moral no Brasil e a especificidade desseconceito, comparando-o ao assdio organizacional e s agressespontuais.

    O segundo captulo apresenta uma reviso da literatura dosestudos inicias e o conceito de assdio moral, com base nas contri-buies de autores nacionais e estrangeiros. Tambm so descritosos comportamentos tpicos e as fases de evoluo do assdio mo-ral, parmetros para a anlise dos casos descritos no quarto captulo.

    O conceito, as caractersticas e as expresses mais freqen-tes do assdio organizacional so trabalhados no quinto captulo,o qual apresenta tambm uma comparao entre assdio moral eassdio organizacional.

    12 Soboll, 2006.

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  • 16 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    A partir do estudo do trabalho bancrio e da anlise de ca-sos, o sexto captulo explora a relao entre a forma de organizaodo trabalho e o assdio organizacional.

    O stimo captulo conceitua a violncia no trabalho e loca-liza o assdio moral e o assdio organizacional no bojo da discusso.

    As repercusses da violncia psicolgica na sade e na vidados trabalhadores o tema do oitavo captulo. A dinmicaintersubjetiva da identidade no trabalho, o processo de adoecimento,a relao entre sade e trabalho e a anlise de casos so contem-plados nessa parte do livro.

    Adotando como referncia a anlise de situaes do traba-lho bancrio, o captulo nove sistematiza alguns posicionamentosdos trabalhadores diante da violncia psicolgica no trabalho.

    Os comentrios finais constituem o ltimo captulo do livro.

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  • C A P T U L O 1

    A origem das discusses sobreassdio moral no Brasil e os limites

    conceituais

    Lis Andra P Soboll

    Roberto Heloani1

    A disseminao das discusses sobre assdio moral no Bra-sil, o desenvolvimento de pesquisas acadmicas e a entrada dessapauta no mbito jurdico aconteceram em decorrncia do movi-mento sindical2 , apoiado especialmente no trabalho de pesquisae de atuao profissional de Margarida Barreto. Sua pesquisa demestrado (defendida em 2000), sua atuao como mdica nocontexto sindical e as inmeras palestras, entrevistas e textos de-senvolvidos foram essenciais para dar visibilidade ao assdio moralno Brasil. As contribuies de Margarida Barreto (2000; 2003;2005), de Maria Ester de Freitas (2001), de Roberto Heloani (2003;2004) e a traduo dos livros de Marie-France Hirigoyen (2000;2002) inauguraram as discusses e pesquisas acadmicas sobre oassdio moral na nossa realidade3 . O site www.assediomoral.org

    1 Professor titular livre-docente e pesquisador na FGV-SP e UNICAMP. Foi professorconveniado junto Universidade de Nanterre Sorbonne IX-Frana. Co-fundador dosite www.assediomoral.org. Membro da Comisso de Direitos Humanos do CRP-SP. E-mail: [email protected] A participao do movimento sindical na visibilidade do assdio moral no Brasil estdescrita no texto Soboll (2008b).3 Recentemente, Maria Ester de Freitas, Roberto Heloani e Margarida Barreto publica-ram, em conjunto, o livro Assdio moral no trabalho. Editora Cengage Learning. SoPaulo: 2008.

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  • 18 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    fundado, em 20014, foi um marco neste processo de divulgao econscientizao.

    Os trabalhos e os textos destes profissionais ofereceram umnovo significado para as situaes vividas e/ou presenciadas pordiversos trabalhadores, que encontraram interlocutores e que pas-saram a construir espaos de apoio, enfrentamento e preveno.Atualmente, outros pesquisadores e profissionais procuram parti-cipar na disseminao do conceito e na sensibilizao da sociedade,tanto no mbito poltico, empresarial quanto acadmico, median-te publicao de artigos, na orientao e realizao de pesquisas,como tambm na realizao de palestras, assessorias e orientaespor todo o Brasil. A divulgao e ao sindical tiveram efeito cas-cata, gerando demandas diversas para as reas de sade, deadministrao e de direito , entre outras.

    Mesmo passados oito anos do incio das pesquisas e discus-ses no Brasil, ao ministrarmos cursos e palestras identificamosum desconhecimento acerca de conceitos e textos bsicos sobre otema, ainda quando o pblico composto de profissionais atuan-tes nas reas de sade e gesto. A carncia de suporte para odesenvolvimento de pesquisas no nosso pas dificulta uma siste-matizao do que realmente acontece na realidade brasileira,retardando a elaborao de estratgias interventivas adequadas aesse contexto.

    O tema passou a ser discutido no Brasil com relevncia socialapenas no incio de 2000, com a traduo do livro de Marie-FranceHirigoyen, psiquiatra francesa, e a defesa da dissertao de mestrado,em Psicologia Social (PUC/SP), da mdica Margarida Barreto. Essesdois estudos so citados nacionalmente como marcos para a com-preenso do tema. Autores de referncia em estudos de outros pases

    4 Participaram da fundao do site Margarida Barreto, Roberto Heloani, Jefferson deSouza, Maria Benigna, Terezinha Souza, Carmem Quadros e Fernanda Giannasi.

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  • A ORIGEM DAS DISCUSSES SOBRE ASSDIO MORAL NO BRASIL E OS LIMITES CONCEITUAIS 19

    - a exemplo de Leymann, Einarsen, Hoel, Zapt, Cooper, Di Martino- esto sendo utilizados apenas recentemente em muitas pesquisas ediscusses no contexto brasileiro.

    Em junho de 2004, na Noruega, foi realizada a 4th

    International Conference on Bullying and Harassment in theWorkplace, que congregou alguns dos principais pesquisadores dotema no mbito mundial e oportunizou a divulgao de estudosde diversos pases. Pesquisas brasileiras no foram apresentadas naocasio, o que sinaliza a pouca articulao da produo cientficanacional com a estrangeira nessa rea, em sentido duplo: tanto naincorporao das produes estrangeiras j existentes desde a d-cada de 1980, como na divulgao das pesquisas produzidas noBrasil. Em 2008 acontecer a quinta edio do evento, em Mon-treal, Canad. O evento est sendo organizado por Angelo Soares,brasileiro, professor na UQAM5 , um dos principais pesquisadoresdo tema naquele pas. Estes dados evidenciam a falta de respaldopara o desenvolvimento de pesquisas e o esforo pessoal de profis-sionais interessados para que se efetivem alguns avanos maissignificativos na produo brasileira nesta rea.

    Apesar dos obstculos colocados, em maio de 2006 foi rea-lizado o IV Seminrio Nacional de Sade Mental, Trabalho e AssdioMoral, em So Paulo. Em maio de 2004 ocorreu o I SeminrioLatino-Americano de Assdio Moral e Sade Mental no Trabalho,em Recife. No Frum Social Mundial de 2005, sucedeu aestruturao da Rede Latino-Americana de Combate ao AssdioMoral, envolvendo o Brasil, o Uruguai, a Argentina e Cuba. Em-bora exista um movimento de divulgao e de conscientizao,este ainda um tema recentemente abordado de forma sistemticaem nosso pas, no podendo ser comparado com a realidade delocais como Itlia, Frana, Noruega, Espanha, no que diz respeitoao reconhecimento social e ao suporte para o combate a essa prti-ca. Discutir o assdio moral em sociedades que, ainda na dcada

    5 Universit du Qubec Montral.

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  • 20 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    de 1980, iniciaram este estudo e desenvolveram um aparato deconceitos e estratgias muito diferente de abord-lo no contextobrasileiro. Apenas recentemente as teorias sistematizadas no mun-do, sobre esta problemtica, esto sendo consideradas nos estudosbrasileiros.

    Vrios pases, a exemplo da Itlia, da Alemanha, da Frana,da Austrlia, do Canad, da Sua e dos Estados Unidos j tmprojetos e at legislao especfica sobre o assdio moral6 . No Bra-sil, a Constituio Federal (artigo 5, pargrafos I e II), a CLT (483)e o Cdigo Penal (artigos 138, 139, 140 e 146), que regem sobrecrimes contra a honra (calnia, difamao e injria) e constrangi-mento ilegal, tm sido aplicados nos casos de assdio moral e sexual,apesar da dificuldade de penalizao devido ao fator subjetivo queenvolve esses tipos de delito7 . A legislao a mesma, entretanto, aforma de interpret-la se diferenciou com a necessidade de se abor-darem as questes relacionadas ao assdio moral e s outras formasde violncia psicolgicas praticadas no mbito do trabalho.

    A rea de direito vem se notabilizando no estudo e na siste-matizao de alguns conceitos e procedimentos relativos a essassituaes. Deputados e vereadores esforam-se na direo de criaruma legislao especfica para tratar do assdio moral no Brasil8 .Embora j existam algumas leis aprovadas no mbito municipal eestadual e outros projetos de lei tramitando tambm no mbitofederal, no h consenso entre juristas e advogados sobre a neces-sidade de uma lei peculiar. Aqueles que se colocam numa posiocontrria formulao dessas leis justificam que o Cdigo Penal, aCLT e a Constituio so suficientes para o adequado julgamentode tais prticas, com a vantagem de envolver diversos atos e pro-cessos agressivos que poderiam ser excludos numa lei especfica.

    Especialmente por nos encontrarmos no momento de cons-

    6 Heloani, 2004.7 Heloani, 2004.8 As leis e os projetos existentes sobre assdio moral no Brasil e em outros pases estodescritos em Freitas, Heloani e Barreto (2008), captulo 05: O assdio moral e a lei.

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  • A ORIGEM DAS DISCUSSES SOBRE ASSDIO MORAL NO BRASIL E OS LIMITES CONCEITUAIS 21

    truo de parmetros jurdicos e de procedimentos na rea de sa-de e organizacional, essencial termos clareza das prticas agressivasenvolvidas no que tem sido chamando de assdio moral no Brasil.Nossas experincias profissionais e de pesquisa tm evidenciadoque assdio moral um termo que, ao se popularizar, foi amplia-do e tende a perder sua especificidade. Por isso, julgamos necessriotecer alguns esclarecimentos conceituais.

    O assdio moral uma situao extrema de agressividadeno trabalho, marcada por comportamentos ou omisses, repetitivose duradouros. Tem como propsito destruir, prejudicar, anular ouexcluir e direcionado a alvos escolhidos (uma ou mais pessoas emespecial). Caracteriza-se por sua natureza agressiva, processual, pes-soal e mal-intencionada. Pode ter efeito de gesto disciplinar sobreo coletivo, como um resultado secundrio e no como propsitofinal do processo de hostilizao.

    Com freqncia, no Brasil, duas outras circunstncias - asquais respondem a outras configuraes - tm sido equivocada-mente nominadas de assdio moral: as agresses pontuais e o assdioorganizacional.

    As agresses pontuais so atos ou omisses que so hostisou ofendem, praticados de forma descontnua e momentnea, ge-ralmente como uma reao de impulsividade e sem propsito deprejudicar a outra pessoa. Por exemplo, o uso de uma palavra gros-seira ou aumento no tom da voz numa discusso mais spera eacalorada. As agresses pontuais se diferenciam de assdio moral(e tambm do assdio organizacional) por constiturem-se comoeventos isolados, situacionais e geralmente sem a intencionalidadede prejudicar.

    O assdio organizacional, por sua vez, um processo no quala violncia est inserida nos aparatos, nas estruturas e nas polticasorganizacionais ou gerenciais, que so abusivas e inadequadas. Opropsito exercer o gerenciamento do trabalho e do grupo,visando produtividade e controle organizacional. O assdioorganizacional tambm processual e agressivo - como no assdio

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  • 22 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    moral - mas no pessoalizado e nem mal-intencionado (no sentidode querer prejudicar ou destruir). O objetivo do assdioorganizacional no atingir uma pessoa em especial, mas simcontrolar todo o grupo indiscriminadamente. Alguns exemplos deprticas de assdio organizacional: gesto por estresse, gesto porinjria, gesto por medo, exposies constrangedoras de resultados,premiaes negativas, ameaas, cobranas exageradas. Cabeesclarecer que assdio organizacional diferente de uso adequadodo poder diretivo do empregador; reconhecemos este ltimo comolegtimo no que se refere a certas exigncias de desempenho eprodutividade. Tais atitudes deixam de ser legtimas quandopermeadas de condutas abusivas e que atentam contra a dignidadehumana.

    Embora inicialmente essas estratgias possam ser utilizadascomo uma forma de gesto, sem inteno de prejudicar e excluir,elas podem levar aqueles que no suportam as presses a solicita-rem seu desligamento da empresa, do setor ou de um projeto.Essas estratgias de gesto funcionam como uma tcnica de au-mento do envolvimento no trabalho e, tambm podem ter o efeitode um processo de seleo natural dos menos resistentes, ou - nalinguagem organizacional - menos resilientes. Alm de visar melhoria da produtividade, o assdio organizacional pode insti-tuir um verdadeiro darwinismo organizacional, isto , um mtodoque promove de, maneira indiscriminada, a excluso dos menosadaptveis s exigncias da empresa. Ainda assim, assdio moral eassdio organizacional so figuras diferentes.

    Atualmente, a legislao utilizada para avaliar casos de ass-dio moral a mesma aplicada aos casos de assdio organizacional.Mesmo assim, fundamental insistirmos numa especificidadeconceitual; no apenas uma questo semntica ou de formulaoterica, mas apresenta-se como uma questo substantiva, com re-percusses na esfera prtica.

    No assdio moral, a empresa palco da violncia e o objeti-vo prejudicar, excluir ou anular o trabalhador que se transformou

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  • A ORIGEM DAS DISCUSSES SOBRE ASSDIO MORAL NO BRASIL E OS LIMITES CONCEITUAIS 23

    em persona non grata. No assdio organizacional, o objetivo exer-cer o controle sobre a coletividade e garantir o alcance dos objetivosorganizacionais e gerenciais. O papel da empresa no assdioorganizacional de roteirista das aes de violncia; os superioreshierrquicos ou os colegas cumprem o papel de atores, os quais tmespaos limitados de ao dentro de um script preestabelecido pelaempresa. Tanto no assdio moral quanto no assdio organizacional,esses mesmos atores podem desempenhar o papel de tirano porqueencontram na organizao o palco, os espaos e os aparatos necess-rios para a expresso de sua agressividade.

    Como se v, no bojo dessa relao sempre existe um proces-so dialtico, dinmico em si mesmo. O que determina que a pessoarepresente ora o papel de vtima e ora de agressor no so suascaractersticas individuais, mas a forma de organizao do traba-lho e como se d a insero desse personagem na tramaorganizacional.

    No concebemos o assdio moral e o assdio organizacionalcomo oriundos, salvo raras excees, de mentes doentias pro-cura de vtimas indefesas. Em nosso entender, esta uma visoreducionista que em nada ajuda na compreenso e na soluo des-se complexo problema social. Ao analisarmos aqueles apontadoscomo agressores (geralmente superiores hierrquicos), a nossa ex-perincia demonstra que, em muitos casos, as atitudes abusivasgerenciais so produtos, no de uma descompensao mental gra-ve, mas de uma organizao que estimula a competitividade, queenvolve exigncias desmedidas e est estruturada sobre uma dosesignificativa de perversidade. A doena pode ser da organizao eno propriamente do indivduo que apresenta os comportamen-tos inadequados. Por vezes, a agressividade aparece como umaestratgia de defesa psquica diante das mltiplas exigncias, pres-ses e sedues organizacionais9 .

    9 Dejours, 1999; Batista, 2003; Eberle, 2007.

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  • 24 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    Nesta perspectiva, a anlise transcende a causalidade linear,de maneira que os processos de avaliao do assdio moral e doassdio organizacional pressupem articulaes complexas entreo sistema produtivo, a organizao do trabalho e os aspectos indi-viduais e interpessoais.

    Isso no significa que isentamos os atores sociais de suasrespectivas responsabilidades. Eles as tm e precisam responderpor suas atitudes, mas no podem ser vistos como mentores solit-rios dessas prticas. Reconhecemos tambm que h casos em quetrabalhadores mal-intencionados ou desinformados utilizam dosdiscursos de vitimizao de assdio moral na tentativa de se des-viar de seus compromissos e responsabilidades previstas no contratode trabalho. Esse tipo de conduta precisa tambm ser combatida.

    Como a frente e o verso de uma folha de papel, assdiomoral e assdio organizacional no so idnticos, ainda que emalguns casos possa ser minucioso o limiar entre um e outro e quepossa haver coincidncia das duas prticas numa mesma situao.A no diferenciao implica um tratamento generalizado que emnada contribuiu para a construo de estratgias efetivas de pre-veno e enfrentamento. essencial a adoo de terminologiasadequadas que efetivamente sejam reconhecidas as situaes assis-tidas na nossa realidade.

    Os aspectos conceituais e histricos, assim como os com-portamentos tpicos e as fases de evoluo do assdio moral,apontados na literatura, so muito teis para a melhor compreen-so dessas situaes no cotidiano de trabalho. Esses tpicos seroapresentados no prximo captulo.

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  • C A P T U L O 2

    Assdio moral no trabalho: aspectoshistricos e conceituais

    Apesar de ser uma situao cotidiana no mundo do trabalhodesde os primrdios da sociedade, assdio moral conhecido tam-bm como mobbing ou bullying vem sendo tratado como umprocesso importante para a relao entre sade e trabalho a partirda dcada de 1980.

    Heinz Leymann, psiclogo alemo radicado na Sucia, uti-lizou o termo mobbing para descrever comportamentos agressivosdo grupo no sentido de excluir um dos seus membros. Conformerelatado pelo prprio autor1 , o termo foi inicialmente utilizadopor Konrad Lorenz, um bilogo, para descrever o padro relacionalde algumas espcies de animais que isolam um de seus membrosque, por vrias razes, vai ser expulso do grupo. Mais tarde, em1972, o mdico sueco Heinemann utilizou o termo para identifi-car atitudes altamente destrutivas de um grupo de crianas contrauma nica criana. Ao identificar semelhantes comportamentosnas relaes de trabalho, Leymann seguiu o padro conceitual.

    Leymann desenvolveu pesquisas na Sucia, disseminandoseus estudos inicialmente nos pases escandinavos, at falecer, em

    1 Leymann, 1996.

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  • 26 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    1999. Diversas pesquisas realizadas pelo autor produziram umconhecimento vasto e uma teoria que conceitua esse processo dehostilizao, as fases de desenvolvimento e as repercusses. O pes-quisador tambm elaborou um instrumento para identificao doassdio moral, denominado de LIPT Leymann Inventory ofPsychological Terrorization, a partir de 45 comportamentos identi-ficados como os mais freqentes em casos de mobbing.

    Em Bolonha, Itlia, o psiclogo Harald Ege, seguindo omodelo de Leymann, desenvolveu o LIPT Ege, questionrio LIPTampliado e revisado. Tambm dedicou-se a estruturar o MetodoEge 2002 para quantificao do dano causado pelo mobbing. Egefundou e coordena a PRIMA - Associazione Italiana ControMobbing e Stress Psicosociale2 , que oferece treinamentos tcni-cos, cursos e palestras para profissionais e interessados no tema.

    O material de Leymann tambm referncia para os gruposde Dieter Zapf (Alemanha), de Helge Hoel (Inglaterra), de JosLuiz Gonzlez de Rivera (Espanha) e de Stale Einarsen (Noruega).Em 1997, Einarsen elaborou um instrumento de identificao doassdio moral, com 21 itens, chamado NAQ Negative ActsQuestionnary. O NAQ e o LIPT so os instrumentos utilizados comoreferncia nas principais pesquisas sobre o tema3 . O NAQ foi tra-duzido e validado no Brasil por Maciel e Gonalves4 .

    Leymann5 justifica a no adoo do termo bullying, usadopelos pesquisadores ingleses e australianos, por entender que nomobbing os comportamentos so elaborados com muito cuidado esofisticao e, na maioria das vezes, no ocorre a violncia fsicacaracterstica do bullying. O autor prope que o termo bullyingseja dedicado para indicar o comportamento de grupos de crian-as. Mobbing descreveria, ento, apenas as situaes envolvendo

    2 www.mobbing-prima.it3 Cowie, Naylor, Smith, Rivers e Pereira, 20044 Maciel e Gonalves, 2008.5 Leymann, 1996

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 27

    adultos e seria equivalente a psicoterror e a assdio moral. Por suavez, Zapt e Einarsen6 propem que os termos sejam utilizadoscomo sinnimos, embora no deixem de reconhecer as conotaesespecficas para cada um deles, conforme explicitam na figurareproduzida a seguir (figura 1).

    Figura 1: Bullying e mobbing: perspectiva da vtima e do agressor.

    Fonte: Zapt e Einarsen7

    O bullying descreve a perspectiva do agressor, em que a agres-so originria em uma nica pessoa. So relaes agressivasrepetitivas e regulares, tipicamente entre pessoas com clara desi-gualdade de poder. Os autores sugerem que nos casos de agressesdirecionadas para um grande nmero de pessoas nem todas po-dem ser consideradas vtimas de bullying. O critrio derepetitividade precisa ser vlido em cada caso. Mesmo que as agres-ses sejam repetitivas, elas podem estar distribudas entre osparticipantes do grupo, de maneira a diminuir a freqncia dasagresses direcionadas a cada trabalhador. Os participantes do

    Perpective of the BullyBullying

    Frequent andprolonged

    Bully

    Perpective of the VictimMobbing

    Frequent andprolonged

    Mobbing Victim

    6 Zapt e Einarsein, 2004.7 Zapt e Einarsein, 2004.

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  • 28 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    grupo de trabalho podem ficar expostos aos ataques apenas ocasio-nalmente e ainda assim h possibilidade de encontrarem suportesocial dos pares, evitando ficar em condies de maiorvulnerabilidade8 .

    O mobbing utilizado para indicar agresses de um grupocontra pessoas ou uma nica pessoa, na perspectiva da vtima. Cadapessoa que agride contribui um pouco com a violncia, mas oacmulo de hostilidades e sua repetio so os fatores determinantesdos efeitos negativos desses comportamentos. Bullying tem sido aexpresso mais utilizada na Inglaterra, tendo em vista que em 80%dos casos os supervisores so indicados como agressores, enquan-to em outros pases europeus predomina o termo mobbing, umavez que as agresses perpetradas por grupos so mais freqentes9 .

    Para identificao do bullying, a situao avaliada a partirdo comportamento do agressor, enquanto no mobbing o foco es-taria na avaliao da vtima. A OIT, na terceira edio do relatrioViolence at Work10 , apresenta a diferenciao entre os termos,justificada para especificar a agresso realizada por um indivduo(bullying) ou por um grupo (mobbing). Segundo Einarsen11 o pontocomum entre os diversos conceitos est na durao e na repetiodos comportamentos negativos. As duas perspectivas, de mobbinge de bullying, do importncia central para os efeitos negativos daviolncia no-fsica para quem a vivencia12 .

    A tendncia a considerar os termos equivalentes foi tambmidentificada em alguns estudos mais recentes. Em 2003, Einarsen,Hoel, Zapf e Cooper13 reconhecem a existncia de duas princi-pais abordagens das hostilidades contnuas no trabalho: (i) a

    8 Zapt e Einarsein, 2004.9 Zapt e Einarsein, 2004.10 Chappell e Di Martino, 2006.11 Einarsen, 2000.12 Zapt e Einarsein, 2004.13 Einarsen, Hoel, Zapf, e Cooper, 2003.

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 29

    tradio europia, que aplica os termo mobbing e bullying comoequivalentes, da qual os autores do livro fazem parte; e (ii) a tradi-o americana, que usa o conceito de abuso emocional emaus-tratos, pouco referenciada no Brasil. Ainda em 2003, DiMartino, Hoel e Cooper adotam a expresso mobbing/bullying,considerando-a semelhante a outros termos: harclement moral(Frana), acoso ou maltrato psicolgico (Espanha), coaco moral(Portugual) e molestie psicologiche (Itlia). A OMS14 igualmentereconhece a expresso mobbing como equivalente s outras termi-nologias citadas.

    Hirigoyen15 sugere o termo assdio moral, avaliando-o comomais adequado que mobbing, pois o termo assdio representamelhor os pequenos ataques ocultos e insidiosos tanto de um indi-vduo como de um grupo, contra uma ou vrias pessoas, tpicosdessas situaes. Para a autora, a palavra moral empregada temduplo sentido: sinaliza as agresses de natureza psicolgica e asnoes de bem e de mal, definidas culturalmente. No mobbing, areferncia de ataques de um grupo contra uma pessoa. No Bra-sil, o termo utilizado na rea acadmica e entre os atores sociais,difundido por Margarida Barreto16 , assdio moral, seguindo omodelo francs de Marie-France Hirigoyen17 , descrito como ata-ques repetitivos e intencionais de uma pessoa ou grupo a uma oumais pessoas, para atormentar, prejudicar e provocar, com efeitosnocivos sade.

    No obstante esteja disponvel um nmero significativo depesquisas sobre assdio moral no mundo, a comparao dos estu-dos torna-se difcil, uma vez que no h padronizao conceitual emetodolgica. Segundo os dados da OIT18 , quando o assdio

    14 Cassito, Fattorini, Gilioli, Renzo e Gonik, 2004.15 Hirigoyen, 2002.16 Barreto, 2002, 2005.17 Hirigoyen, 2000.18 Chappell e Di Martino, 2006.

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  • 30 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    considerado na sua definio precisa e se refere a uma experinciarepetitiva e regular, os estudos indicam sua ocorrncia em menosde 5% da populao. Se a ocorrncia do assdio moral for consi-derada de forma ocasional, os ndices atingem 10%. Nos casos emque se considera um ou mais comportamentos hostis no trabalho,a incidncia varia entre mais de 10% at prximo de 40%, nosgrupos estudados.

    As diferenas e nuances prprias aos termos mobbing,bullying e assdio moral esto sistematizados na tabela 01.

    Tabela 01: Mobbing, bullying e assdio moral: diferenas conceituais

    Autorpioneiro

    Autores dereferncia

    Conceito

    Mobbing - Psicoterror

    Heinz LeymannSucia - dcada de 80

    Dieter Zapf - FrankfurtHarald Ege - Itlia

    Perseguio coletiva.Desenvolve-se a partir de umasituao comunicativa hostil, emque um ou mais indivduoscoagem uma pessoa de tal formaque esta levada a uma posiode fraqueza psicolgica.So formas severas de assdiodentro da organizao ou formasparticularmente graves deestresse psicossocial.So manobras hostis freqentese repetitivas no local de trabalho,visando sistematicamente amesma pessoa.Aes repetidas e repreensveisou claramente negativas,dirigidas contra empregados de

    Bullying

    Primeiro a usar otermo, nos estudossobre estresse socialLazarus - 1984 - NewYork

    Helge Hoel - InglaterraCarl Cooper -Inglaterra

    mais amplo que oconceito de mobbing,pois inclui chacotas,isolamento, condutasabusivas de conotaosexual ou agressesfsicas.Tratar com grosseria,com desumanidade ede maneira tirnica.Caracterizado porhumilhaes, vexames,ameaas, intimidaese agresses. Tambmaplicado a agressespsicolgicas em outroscontextos fora do localde trabalho, como

    Assdio Moral(harassment)

    Marie-France HirigoyenFrana - 1998

    Marie-France Hirigoyen- FranaMargarida Barreto -Brasil

    Mais sutil que mobbinge bullying.Caracterizado porqualquer condutaabusiva em relao auma pessoa que possaacarretar um dano sua personalidade, sua dignidade oumesmo suaintegridade fsica oupsquica, podendoacarretar inclusiveperda de emprego oudegradao doambiente de trabalhoem que a vtima estinserida.

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 31

    uma maneira ofensiva, e quepodem conduzir o seu isolamentodo grupo no local de trabalho.Refere-se, atualmente, sperseguies coletivas e violncia ligada organizao.

    3,5% do grupo estudadovivenciam mobbing19

    escola, grupos decrianas.Envolve casos deviolncia individual eno grupal.

    10% do grupoestudado vivenciambullying

    Ataques repetitivos evoluntrios de umapessoa outra, paraatorment-la, min-la eprovoc-la, com efeitosnocivos sade.Pode ocorrer de umgrupo para umindivduo ou de umapessoa para outra.

    33% do grupoestudado vivenciamassdio moral20

    Lista decomportamentoshostis, a partir de 4categorias:1) deterioraoproposital dascondies de trabalho;2) isolamento e recusade comunicao; 3)atentado contra adignidade e 4)violncia verbal, fsicae sexual.

    Hirigoyen1998 - Le harclementmoral: la violenceperverse au quotidien2001 - Malaise dans letravailBarreto2000 - Uma jornada dehumilhaesFreitas, Heloani eBarreto2008 - Assdio moralno trabalhoAssdio Moral(harassment)

    Estatsticas

    Instrumentodiagnstico

    Obras dereferncia

    Ocorrncia de 5 % a 40% conforme os critrios de definio utilizados21

    LIPT - Leymann Inventory of Psychological TerrorizationLista 45 comportamentos hostis. Critrio: 1 ou maiscomportamentos se repetem no mnimo uma vez porsemana, por no mnimo 6 meses.NAQ - The Negative Acts Questionnaire22.22 comportamentos negativos, avaliados por 4 pontos deescala de Likert, por freqncia.

    Leymann1993 - Mobbing: la perscution au travail1990 - The Mobbing Encyclopedia (web)Einarsen1996 - Bullying and Harassment at workEinarsen, Hoel, Zapf e Cooper2003 - Bullying and emotional abuse in the workplace.International perspectives in research and practice

    Mobbing - Psicoterror Bullying Assdio Moral(harassment)

    19 Leymann, 1996.20 Barreto, 2002.21 Chappell e Di Martino, 200622 Einarsen e Raknes, 1997.

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  • 32 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    Na prxis social, os fenmenos descritos em termos de ass-dio moral, bullying e mobbing so expresses de violncia psicolgicaextrema no mbito do trabalho, diferenciando-se teoricamente apartir da realidade social vivenciada, da formao terica e da pr-tica profissional dos autores. A diferena central entre os conceitosest em quem os construiu e nos termos que descrevem esse tipo deviolncia no trabalho, ressaltando uma ou outra caracterstica, apartir de determinada perspectiva de anlise, fundamentada emreas especficas do conhecimento e em situaes de realidade pr-prias da cultura dos autores, situados cada um em seu tempo e emseu espao especfico.

    Sem desmerecer as especificaes reservadas para cada ter-mo, adotamos a expresso assdio moral, terminologia jconsagrada no Brasil a qual se encontra em processo de reconheci-mento social.

    Reservamos o termo assdio moral para descrever situaesextremas de violncia psicolgica no trabalho, de natureza proces-sual, pessoalizada, mal-intencionada e agressiva. Entendemos que oassdio moral se configura como um conjunto articulado de arma-dilhas preparadas, premeditadas, repetitivas e prolongadas. Oscomportamentos hostis ocorrem repetidas vezes e por um perodode tempo estendido. Sua prtica permeada de intencionalidade nosentido de querer prejudicar, anular ou excluir um ou alguns alvosescolhidos.

    Os elementos essenciais para que uma conduta sejaidentificada como assdio moral so os seguintes:

    Habitualidade23: os comportamentos hostis devem ocorrerpor repetidas vezes, num perodo prolongado de tempo. Atosisolados no se configuram como assdio moral. No h con-senso sobre um perodo exato de tempo, sendo essencial, no

    23 Rezende, 2006.

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 33

    entanto, identificar a prtica continuada e insistente para ca-racterizar o assdio moral. O assdio moral se define no tempoe, portanto, no pode ser diagnosticado imediatamente apsa primeira hostilidade;

    Ataques psicolgicos: incluem condutas e omisses que in-duzem ao desconforto psicolgico, que ofendem e humilhame que apresentam gravidade significativa.

    A inteno de prejudicar, anular ou excluir: o objetivo doscomportamentos hostis destruir a pessoa, anular seus espa-os de ao ou forar um desligamento (voluntrio ou no)de um projeto, funo ou do emprego. Os ataques se apre-sentam na forma de armadilhas, sutis ou explcitas,premeditadas e direcionadas sempre para a(s) mesma(s)pessoa(s).

    Pessoalidade: o assdio moral envolve pessoalidade, ou seja,o alvo das agresses uma pessoa especfica e no ocorre demaneira generalizada para um grupo todo. Duas ou mais pes-soas de um mesmo grupo podem ser alvo das agressessimultaneamente, mas o processo de perseguio direcionadoe pessoal.

    Esses critrios so aqui sistematizados, considerando os con-ceitos elaborados por renomados pesquisadores do tema.

    Leymann24 conceitua mobbing como:

    (...) una comunicacin hostil y desprovista de tica que es administrada

    de forma sistemtica por uno o unos pocos individuos, principalmente

    contra un nico individuo, quien, a consecuencia de ello, es arrojado a

    una situacin de soledad e indefensin prolongada, a base de acciones

    de hostigamiento frecuentes y persistentes (definicin estadstica: al menos

    una vez por semana) y a lo largo de un prolongado periodo (definicin

    estadstica: al menos durante seis meses).

    24 Leymann, p. 04, 1996

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  • 34 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    O autor esclarece que conflitos temporrios no esto inclu-dos nesta definio e se diferenciam do mobbing no pelo o que enem pelo como se faz, mas pela freqncia e durao do que se faz,a ponto de traduzir-se em condies patolgicas, de natureza psi-quitrica ou psicossomtica.

    Einarsen e colaboradores25 tambm destacam como essen-ciais para caracterizar o mobbing a repetitividade, a durao e aregularidade dos comportamentos hostis:

    Mobbing at work means harassing, offending, socially, excluding someone

    or negatively affecting someones work tasks. In order for the label

    mobbing to be applied to a particular activity, interaction or process it

    has to occur repeatedly and regularly (e. g. weekly) and over a period of

    time (e. g. about six months). Mobbing is an escalating process in the

    course of which the person confronted ends up in an inferior position

    and becomes the target of systematic negative social acts. A conflict

    cannot be called mobbing if the incident is an isolated event or if two

    parties of approximately equal strength are in conflict.26

    Para os autores de referncia no Brasil, os critrios de defi-nio so os mesmos apontados por Leymann27 e Einarsen ecolaboradores28 .

    Hirigoyen29 conceitua o assdio moral como

    25 Einarsen, et al., p. 15, 2003.26 (traduo livre) Mobbing no trabalho significa aborrecer, ofender, dessocializar, ex-cluir algum ou ainda afetar as tarefas do trabalho de algum. Diante disso, o rtulomobbing aplicado a uma atividade, interao ou processo que deve ocorrer repetida eregularmente (por exemplo, semanalmente) e acima de certo perodo de tempo (porexemplo, seis meses). Mobbing um processo gradativo no curso dos acontecimentosem que a pessoa confrontada acaba em uma posio inferior e se torna o alvo de sistem-ticos atos sociais negativos. Um conflito no pode ser chamado de mobbing se oincidente um evento isolado ou se as duas partes tm aproximadamente mesma fora,poder.27 Leymann, 1996.28 Einarsen, et al., 2003.

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 35

    Qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude...)

    que atente, por sua repetio ou sistematizao, contra a dignidade ou

    a integridade psquica ou fsica de uma pessoa, ameaando seu empre-

    go ou degradando o clima de trabalho.

    Seguindo a mesma perspectiva, para Freitas, Heloani e Barreto30

    O assdio moral uma conduta abusiva, intencional, freqente e repe-

    tida, que ocorre no ambiente de trabalho e que visa diminuir, humilhar,

    vexar, constranger, desqualificar e demolir psiquicamente um indiv-

    duo ou um grupo, degradando as suas condies de trabalho,

    atingindo a sua dignidade e colocando em risco a sua integridade

    pessoal e profissional.

    O que diferencia o assdio moral de outras formas de violn-cia no trabalho a associao entre a dimenso temporal e adimenso de moral: durao no tempo e objetivo de destruir apessoa alvo das agresses31 .

    Quanto intencionalidade, a descrio de Heloani32 bas-tante esclarecedora:

    O assdio moral caracteriza-se pela intencionalidade; consiste na cons-

    tante e deliberada desqualificao da vtima, seguida de sua conseqente

    fragilizao, com o intuito de neutraliz-la em termos de poder. (...). Sem

    dvida, trata-se de um processo disciplinador em que se procura anular a

    vontade daquele que, para o agressor, se apresenta como ameaa.

    Os comportamentos tpicos e as fases de evoluo do ass-dio moral, descritos a seguir, evidenciam a natureza pessoal,mal-intencionada, processual e agressiva do assdio moral, de

    29 Hirigoyen, p. 17, 2002.

    30 Freitas, Heloani e Barreto, p. 37, 2008.31 Guedes, 2003.32 Heloani, p. 05, 2004.

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  • 36 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    maneira a oferecer adequada compreenso e identificao dessasprticas no cotidiano do trabalho.

    Comportamentos caractersticosnas situaes de assdio moral

    Os comportamentos mais freqentes de assdio moral fo-ram descritos por Leymann33 e Hirigoyen34.

    Em funo das conseqncias, os comportamentos que ca-racterizam o mobbing podem ser listados em cinco grupos, conformeproposto por Leymann35 . O mobbing afeta as possibilidades dotrabalhador para:

    (i) Comunicar-se adequadamente: as autoridades fazem ameaasverbais, boatos com o fim de isolar, ataques verbais sobre a qua-lidade de seu trabalho, fazem o trabalhador silenciar e lhe ne-gam a possibilidade de comunicao adequada.

    (ii) Manter contatos sociais: os colegas o evitam, no falam comele; as autoridades probem que falem com ele; designado alugares de trabalho isolados; rejeitado, considerado ningum.

    (iii) Manter sua reputao pessoal: submetido a ridicularizao ezombaria; caoam de alguma falta de habilidade, de sua heranatnica, da maneira de se movimentar ou de falar.

    (iv) Manter sua situao de trabalho: no designam tarefas ou desig-nam tarefas sem sentido.

    (v) Manter sua sade fsica: designam trabalho perigoso; praticamagresso fsica e assdio sexual.

    Hirigoyen36 classifica as atitudes hostis em quatro categoriasgerais que, respeitando o critrio de repetio e intencionalidade,

    33 Leymann, 199634 Hirigoyen, 2002.35 Leymann, 199636 Hirigoyen, 2002.

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 37

    caracterizam o assdio moral no mbito do trabalho, conformedescrito na tabela 06: 1) deteriorao proposital das condies detrabalho; 2) isolamento e recusa de comunicao; 3) atentado con-tra a dignidade e 4) violncia verbal, fsica e sexual.

    Tabela 02: Lista de atitudes hostis que caracterizam o assdio moral

    LISTA DE ATITUDES HOSTIS

    1) Deteriorao proposital das condies de trabalho Retirar a autonomia da vtima. No lhe transmitir mais as informaes teis para a realizao de tarefas. Contestar sistematicamente todas as suas decises. Criticar seu trabalho de forma injusta ou exagerada. Priv-lo do acesso aos instrumentos de trabalho: telefone, fax, computador... Retirar o trabalho que normalmente lhe compete. Dar-lhe permanentemente novas tarefas. Atribuir-lhe proposital e sistematicamente tarefas inferiores s suas competncias. Atribuir-lhe proposital e sistematicamente tarefas superiores s suas competncias. Pression-la para que no faa valer seus direitos (frias, horrios, prmios). Agir de modo a impedir que obtenha promoo. Atribuir vtima, contra a vontade dela, trabalhos perigosos. Atribuir vtima tarefas incompatveis com sua sade. Causar danos em seu local de trabalho. Dar-lhe deliberadamente instrues impossveis de executar. No levar em conta recomendaes de ordem mdica indicadas pelo mdico do trabalho. Induzir a vtima ao erro.

    2) Isolamento e recusa de comunicao A vtima interrompida constantemente. Superiores hierrquicos ou colegas no dialogam com a vtima. A comunicao com ela unicamente por escrito. Recusa-se todo o contato com ela, mesmo o visual. posta separada dos outros. Ignoram sua presena, dirigindo-se apenas aos outros. Probem o colega de lhe falar. J no a deixam falar com ningum. A direo recusa qualquer pedido de entrevista.

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  • 38 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    3) Atentado contra a dignidade Utilizam insinuaes desdenhosas para qualific-la. Fazem gestos de desprezo diante dela (suspiros, olhares desdenhosos, levantar de ombros) desacreditada diante de colegas, superiores ou subordinados. Espalham rumores a seu respeito. Atribuem-lhe problemas psicolgicos (dizem que doente mental). Zombam de suas deficincias fsicas ou de seu aspecto fsico; imitada ou caricaturada. Criticam sua vida privada. Zombam de sua origem ou de sua nacionalidade. Implicam com suas crenas religiosas ou convices polticas. Atribuem-lhe tarefas humilhantes. injuriada com termos obscenos ou degradantes.

    4) Violncia verbal, fsica e sexual Ameaas de violncia fsica. Agridem-na fisicamente, mesmo que de leve; empurrada, fecham-lhe a porta. Falam com ela aos gritos. Invadem sua vida privada com ligaes telefnicas ou cartas. Seguem-na pelas ruas, espionada diante do domiclio. Fazem estragos em seu automvel. assediada ou agredida sexualmente (gestos ou propostas). No levam em conta seus problemas de sade.

    Fonte: Hirigoyen37

    Os comportamentos tpicos e as limitaes impostas decor-rentes do assdio moral sintetizam uma amostra das expressesmais reincidentes do assdio moral. Na realidade, muitos outroscomportamentos podem ser utilizados de forma mal-intencionadaconfigurando um processo de assdio moral. Portanto, equivo-cado supor que os indicadores aqui listados so definitivos esuficientes para um adequado diagnstico em qualquer realidade.As fases de evoluo do assdio moral, que articulam os compor-tamentos e seus efeitos, podem tambm ajudar na identificaodesses casos.

    37 Hirigoyen, 2002.

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 39

    Fases do assdio moral

    Leymann38 descreve, em fases, a evoluo dos acontecimen-tos que tipicamente caracterizavam o mobbing, considerando opadro tpico encontrado nas pesquisas realizadas na Finlndia,ustria e Escandinvia. Quatro fases so descritas a partir da din-mica da efetivao de uma situao de assdio moral: (i) incidentecrtico; (ii) assdio e estigmatizao; (iii) interveno dossupervisores; (iv) excluso.

    Harald Ege39 , pesquisador italiano, reclassificou a evoluodo assdio moral em seis etapas, alm de inserir uma pr-fase,considerando a condio daquele que alvo das agresses e o con-texto: (0) condio zero; (i) conflito direcionado; (ii) incio doassdio moral; (iii) primeiros sintomas psicossomticos; (iv) errose abusos da administrao de pessoas; (v) srio agravamento dasade psicofsica; (vi) excluso do mundo do trabalho. Guedes40

    considera que a semelhana cultural entre os povos de origem la-tina coloca a proposta de Ege como de maior utilidade para arealidade brasileira, em comparao com as fases de Leymann.Entretanto, importante destacar que a principal contribuio dessasegunda classificao a sinalizao do que denominou CondizioneZero, como uma pr-fase, um pressuposto indispensvel para a ocor-rncia do assdio moral. As demais fases so detalhamento e adaptao realidade italiana, construdas a partir da sistematizao de Leymann,conforme comparadas na tabela abaixo (tabela 03).

    Neste texto, as fases sero descritas e utilizadas para anlisedos casos, considerando as etapas colocadas por Leymann41 , cominsero das idias de Ege42 . As etapas de referncia esto

    38 Leymann, 1996.39 Texto disponvel em http://www.mobbing-prima.it/princ_it.htm. Sem ano de publi-cao. Acesso em junho de 2006.40 Guedes, 2003.41 Leymann, 199642 Ege, S/D.

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  • 40 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    classificadas em: (0) condio zero; (i) incidente crtico; (ii) assdioe estigmatizao; (iii) interveno dos supervisores; (iv) excluso.

    Tabela 03: Fases de evoluo do assdio moral

    Heinz Leymann----I incidente crticoII assdio e estigmatizao

    III interveno dos supervisores

    IV excluso

    Harald Ege0 Condio zeroI Conflito direcionadoII Incio do assdio moralIII Primeiros sintomaspsicossomticosIV Erros e abusos da administraode pessoasV Srio agravamento da sadepsicofsicaVI Excluso do mundo do trabalho

    FASES DE EVOLUO DO ASSDIO MORAL

    (0) Condio Zero Conflito fisiolgico

    Para Ege43 , a situao inicial que constitui essa pr-fase conflito fisiolgico, assim denominado por ser aceito e visto comonormal na cultura italiana. Trata-se de um conflito generalizado,que coloca todos contra todos, sem uma vtima definida. Faz-senotar em discusses, acusaes menores, banalizao da opiniofalada, provocaes, como manifestaes da tentativa de ser res-peitado pelo outro. No conflito fisiolgico no h desejo deprejudicar, mas de sobrepor-se ao outro. O conflito fisiolgico um terreno frtil para o desenvolvimento do assdio moral.

    (i) Fase 1 Incidente crtico

    Nessa fase, o conflito fisiolgico inicial torna-se especfico edirecionado44 . O objetivo no somente de se sobrepor, mas de

    43 Ege, S/D,44 Ege, S/D.

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 41

    prejudicar e excluir. As agresses podem ter origem: (i) na ausn-cia do conflito, diante de circunstncias nas quais normalmenteestaria presente45 ; ou (ii) na presena de um conflito que desviado seu curso freqente de resoluo46 . Diante das duas circuns-tncias o processo de assdio se instala por meio da modificaono padro relacional, que passa a ser dominado por contradiese armadilhas.

    Nessa fase, o incidente crtico inicial pode estar oculto ouainda envolto em contradies. O trabalhador no entende o queest acontecendo, pois no percebe uma relao direta entre oincidente inicial e o tipo de tratamento contraditrio que est re-cebendo. Esse contexto coloca o trabalhador em estado dedesorientao e questionamento de suas percepes, atitudes ecomportamentos, em busca de uma justificativa. A pessoa percebeque a dinmica relacional sofreu uma alterao, mas no identifi-ca o motivo exato e fica sem compreender o que acontece. Senteculpa e busca explicaes em erros pessoais, de maneira a colocarsua autoconfiana em questionamento. Alguns chegam a pensarque essa vivncia fruto meramente de sua imaginao. Aautoverificao das tarefas repetidas vezes, a dedicao exacerba-da e o cuidado exagerado nos procedimentos realizadosfreqentemente esto presentes nessa fase.

    Para Ege,47 os ataques ainda no so suficientes para causarsintomas ou doenas psicossomticas, mas j suscitam sensao dedesconforto e incmodo. Insegurana e tenso constantes j estopresentes na primeira fase, que pode ser muito curta e ainda difcil identific-la como um processo de assdio moral48 .

    45 Hirigoyen, 2002.46 Leymann, 199647 Ege, S/D.48 Leymann, 1996

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  • 42 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    (ii) Fase 2 Assdio e estigmatizao

    na segunda fase que h elementos suficientes para configu-rar uma situao de assdio moral. Este pode ser composto porvrios comportamentos, que numa interao social normal, no soindicativos de agresso ou rejeio, mas que naquele contexto, ofen-dem, visam a prejudicar e punir e se constituem como manipulaoagressiva49 . A durao e a repetio desses comportamentos, ao longode um perodo de tempo, podem mudar a conotao de noagressividade e resultar na estigmatizao de uma pessoa.

    Na perspectiva italiana de Ege50 , essa fase se caracteriza pelaevoluo crescente da intensidade das agresses e a situao deassdio pode ser percebida mais claramente. nessa etapa que otrabalhador recebe a marca da perseguio e se torna alvo explci-to de humilhaes, constrangimentos e agresses repetitivas, numacampanha de agresses. As repercusses na sade so mais eviden-tes, surgindo sintomas psicossomticos, como insegurana, insniae problemas digestivos.

    (iii) Fase 3 Interveno dos supervisores

    Devido estigmatizao precedente, muito fcil que a si-tuao seja interpretada, por terceiros, como falha da pessoasubjugada. Os diretores e superiores hierrquicos tendem a adotaras opinies criadas durante as fases precedentes. Os colegas e ossupervisores por vezes procuram explicaes para a situao nascaractersticas pessoais, mais do que nas circunstncias ambientais51 .

    Erros de avaliao, por parte da administrao de pessoas daempresa, ocorrem freqentemente por falta de conhecimento das pr-ticas de assdio moral e de suas caractersticas. Conseqentemente, os

    49 Leymann, 199650 Ege, S/D.51 Leymann, 1996

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  • ASSDIO MORAL NO TRABALHO: ASPECTOS HISTRICOS E CONCEITUAIS 43

    procedimentos adotados so inadequados e muitas vezes prejudi-cam o trabalhador envolvido nas agresses. Os problemas nocotidiano de trabalho tendem a agravar-se52 . As ausncias por pro-blemas de sade se intensificam. Por fim, a pessoa afetada se senteculpada e pode acreditar que de fato a nica causa de tudo doque est vivendo, entregando-se ainda mais aos sintomas dedescompensao emocional e psicossomticos53 . O agravamentodos problemas no trabalho, os julgamentos sociais negativos e asrepercusses na sade, j facilmente perceptveis, marcam a entra-da da quarta fase do assdio. Somente um intenso e efetivoacompanhamento de representante da empresa, da rede de apoiosocial do trabalhador e de profissionais de sade pode vir a inter-romper o processo, considerando a gravidade da terceira e da quartafases do assdio moral.

    (iv) Fase 4 Excluso

    O desligamento do trabalhador do seu posto de trabalhosinaliza o xito do processo de assdio moral, seja por demissovoluntria, dispensa, licena de sade, aposentadoria parcial ouantecipada ou ainda de formas extremas, como suicdio ou com-portamentos insistentes de vingana, como o homicdio54. Namedida em que as condies de trabalho no so resolvidas, fre-qente que o trabalhador agredido abandone o trabalho bem antesdo perodo natural de aposentadoria.

    Adotando como parmetros as fases e os comportamentostpicos descritos, ser realizada, no prximo captulo, a anlise dealguns casos de assdio moral identificados na pesquisa sobre otrabalho bancrio, visando tambm a caracterizar de que maneiraa organizao do trabalho pode proporcionar a ocorrncia do as-sdio moral.

    52 Ege, S/D.53 Ege, S/D.54 Ege, S/D.

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  • C A P T U L O 3

    Assdio moral e organizao dotrabalho: anlise de casos

    A organizao do trabalho desempenha um papel centralquando avaliamos a ocorrncia do assdio moral e tambm doassdio organizacional. Mais do que permitir que a violncia acon-tea, alguns aspectos da forma como o trabalho est organizadopodem estimular ou evitar a ocorrncia dessas prticas. Para a de-vida avaliao desses casos faz-se necessrio olhar detalhadamentecomo o trabalho est estruturado. Este captulo destaca os aspec-tos que propiciam a prtica do assdio moral. A relao entreassdio organizacional e a organizao do trabalho o tema doprximo captulo.

    A organizao do trabalho pode ser observada por meio dadiviso do trabalho e pela diviso de homens1 . A diviso de traba-lho consiste na diviso de tarefas e no modo operatrio prescrito(como o trabalho deve ser feito), suscitando o sentido e o interessedo trabalho para o sujeito. A diviso de homens representadapela hierarquia, controle e comando, mobilizando as relaes en-tre pessoas e investimentos afetivos.

    1 Dejours, Abdoucheli, e Jayet, 1994.

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  • 46 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    importante relembrar que, embora caractersticas indivi-duais participem na concretizao da violncia, a anlise dos casosaqui se limita a abordar os aspectos determinantes na organizaodo trabalho. Os relatos apresentados no necessariamente con-templam todos os critrios definidores do assdio moral, massinalizam aspectos da organizao do trabalho bancrio que po-dem favorecer a sua ocorrncia. Para melhor entendimento doscasos faz-se necessrio conhecer, em linhas gerais, essa organiza-o, descrita a seguir.

    Um breve panorama da organizaodo trabalho bancrio

    O trabalho bancrio atual uma atividade desenvolvida en-tre as demandas dos clientes, as cobranas dos supervisores e asmetas impostas pela empresa. A contradio entre as exigncias deatendimento em tempo reduzido, as demandas reais dos clientes ea necessidade de efetivar venda de produtos intensificam o ritmode trabalho e exigem habilidades de tomada de decises, priorizaodas atividades, agilidade no atendimento sem queda de qualidade.

    Apesar das diferentes tarefas realizadas, organiza-se com basena atividade de venda de produtos. H uma omisso do trabalhoreal e uma supervalorizao dessa tarefa (uma entre muitas ou-tras), central na avaliao de desempenho e para os parmetros deprodutividade. O trabalhador encontra-se pressionado entre asdemandas reais dos clientes, os processos automticos de registrodas atividades realizadas, a vigilncia dos superiores e as metas devendas. Por vezes o bancrio realiza diversas atividades, mas ne-nhuma conta na sua avaliao de desempenho ou adquirevisibilidade para futuras promoes.

    A venda de produtos balizada por metas abusivas, crescen-tes e irreais em relao ao mercado, determinada sem a participaodos trabalhadores, impondo dedicao extrema para que se alcance,

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  • ASSDIO MORAL E ORGANIZAO DO TRABALHO: ANLISE DE CASOS 47

    s vezes, o patamar imposto pela organizao. A agressividadegerencial acaba sendo um recurso utilizado com freqncia parapressionar o grupo a buscar resultados considerados inatingveis.O desenvolvimento na carreira dentro da organizao dependequase que exclusivamente dos resultados das vendas individuais,em relao ao padro determinado pelas metas e aos resultadosalcanados pelos pares.

    Profissionais bons vendedores tornam-se supervisoresfocados em resultados, muitas vezes sem preparo ou perfil para afuno, utilizando estratgias desumanas ou inadequadas degerenciamento do grupo. Palavras ofensivas, gritos, xingamentos,rebaixamentos, desprezo fazem parte do rol de atitudes gerenciaisempregadas para alavancar a produtividade. A presso flui via hie-rarquia, reproduzindo a violncia. Os mesmos mtodos utilizadospor gestores despreparados so tambm praticados por diretores.Portanto, h nesse caso um abuso do poder formal, que com fre-qncia se repete em todos os nveis hierrquicos.

    Para os que no alcanam o rendimento desejado, esto re-servadas as humilhaes, os constrangimentos diante dos pares, aslimitaes impostas e as ameaas. Isso ocorre independentementedos resultados anteriores, importando apenas a produtividade atual.Vencer sempre a nica maneira de ser tratado dignamente e degarantir temporariamente sua existncia na organizao.

    O isolamento e a comparao entre os pares - impostospelas metas individualizadas e pelo uso de rankings de produtivi-dade - definem o colega de trabalho como inimigo. Para servencedor preciso superar a si mesmo e ao outro. Ser vencedorsignifica impor ao outro o papel de fracassado e perdedor, dignode ser excludo e humilhado. O isolamento a estratgia centralpara que o sistema de controle seja efetivo, destacando os valoresorganizacionais como nico cdigo vlido. Sem apoio dos pares,sem espaos para reconhecimento, o trabalhador encontra-se so-litrio, vulnervel diante das prticas de hostilizao no trabalho.

    A maneira como a organizao do trabalho bancrio contri-

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  • 48 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    buiu para as prticas de assdio moral esto exemplificadas noscasos descritos a seguir.

    Anlise de casos

    As fases de evoluo do assdio moral (descritas no captuloanterior e sintetizadas na tabela 1) sero utilizadas como parmetrospara a anlise da prtica do assdio moral no trabalho bancrio.

    No contexto de trabalho, o conflito de todos contra todos,fase zero do assdio moral, pode estar configurado numa estrutu-ra organizacional permissiva e complacente, com competioexagerada, hierarquias supervalorizadas, cultivo da indiferena einsensibilidade. O discurso transcrito a seguir oferece algumas in-dicaes do conflito de todos contra todos no trabalho bancrio.

    O J. (colega de trabalho) tem uns 5 anos de banco e tem um cargo que

    substitui o gerente mdio. Normalmente ele tem a mesma funo que

    eu, o mesmo posto e salrio. Quando substitu o gerente pela 1 vez ele foi

    l para o gerente, dizendo que ele era mais capacitado para isso, que ele no

    concordava com esta minha promoo porque eu tinha pouco tempo de

    banco e ele achava que eu no eu era capaz o suficiente, esse tipo de coisa.

    Para acabar fazendo talvez, certa intriga, no sei se era proposital isso dele,

    ele chegava para outro funcionrio (...) e dizia assim olha s o clubezinho

    que eles esto formando entre eles, s promovido quem do lado deles.

    Acaba gerando uma certa animosidade e inveja entre os funcionrios para

    quem ele fala isso e comigo. Fica desagradvel. Eu acho que normal,

    FASES DO ASSDIO MORAL0 Condio zero: conflito de todos contra todosI Incidente crticoII Assdio e estigmatizaoIII Interveno dos supervisoresIV Excluso

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  • ASSDIO MORAL E ORGANIZAO DO TRABALHO: ANLISE DE CASOS 49

    porque todo mundo vai querer estar em um posto um pouco maior, s que

    eles ficam ressabiados porque eles esto l h 4 ou 5 anos de banco e eu no

    estou nem h 1 ano e j estou um pouco frente deles. Os que no se

    sobressaem acabam me minando por trs, existe alguma coisa assim meio

    desleal, e isso chato para mim, mas dentro da medida do possvel procuro

    manter um bom relacionamento com todos (20 anos, sexo masculino, 1

    ano em banco pblico, escriturrio, entrevista 06).

    O conflito de todos contra todos se instala como padrorelacional de disputa e rivalidade. Depreciar o outro uma formade se sobressair. A inveja um sentimento (...) que surge inevita-velmente a partir do momento em que as pessoas esto em situaode se comparar uma outra ou em posio de rivalidade 2 . Ainveja gera tanto o temor das conseqncias de sua prpria invejacomo o medo de ser alvo da inveja dos outros3 . Dessa maneira,ningum digno de confiana, abrindo espao para o individua-lismo dentro dos grupos de trabalho.

    Um ambiente horrvel de trabalho. Eu falava que s faltava o demnio

    estar na porta quando abria a porta do banco para a gente ir trabalhar

    com o tridente. S faltava isso, porque o resto tinha. Um clima de um

    querer passar a perna no outro, nenhum coleguismo, falavam uma coisa

    na tua frente e pelas costas falavam outra, todo mundo se cobrando, se

    deixando humilhar, sendo humilhados uns na frente dos outros, gritaria,

    nenhuma calma. Tudo isso em busca de dinheiro, sem nenhum propsi-

    to mais palpvel (28 anos, feminino, ex-funcionria de banco privado,

    gerente de contas, pediu demisso, entrevista 24).

    A forma de organizao do trabalho que estimula a com-petio e expe os pares comparativamente. A transformao dascircunstncias organizacionais que promovem o conflito de todos

    2 Hirigoyen, p. 39, 2002.3 Vries, 1992.

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  • 50 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    contra todos, para a perseguio at a excluso, caracterstica doassdio moral, apenas uma intensificao e um agravamento daviolncia que est infiltrada na organizao do trabalho. Esse pro-cesso pode ser percebido nos casos descritos e analisados a seguir.

    Descrio do caso 1

    L., 26 anos, sexo feminino, funcionria concursada de umbanco pblico, admitida no final de 2003, numa cidade do inte-rior, na regio sul do pas. Formada em contabilidade e comps-graduao na rea jurdica, atuava como escriturria nesta rea,numa cidade vizinha sua cidade de origem. Nessa agncia, suasavaliaes estavam acima da mdia e recebia elogios constantesrelacionados ao seu trabalho. Desejava mudar de cidade porqueestava esgotada com as viagens freqentes, chegando a ficar inter-nada por desgaste fsico. Esteve em acompanhamento psicolgicovisando ao controle do estresse entre janeiro e julho de 2005. Rela-ta que conseguiu transferncia para sua cidade de origem em umprocesso de seleo interna, com alta concorrncia, em julho de2005. Na agncia atual, num perodo de trs meses, ficou subordi-nada a cinco supervisores diferentes.

    Fiquei duas semanas com cada gerente. Apesar de o trabalho ser o mesmo,

    cada um tem uma maneira de fazer o trabalho. Ento, no mnimo, eles

    teriam que ter um ms de trabalho comigo para poderem me passar alguma

    coisa e poderem me avaliar. Eu me senti uma bola de tnis, jogada de um

    lado para outro.

    A forma de o gerente geral se relacionar com a trabalhadoraera permeada de desrespeito. Na seqncia, foram transcritasalgumas palavras utilizadas pelo gerente numa conversa com L.,na frente dos colegas de trabalho.

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  • ASSDIO MORAL E ORGANIZAO DO TRABALHO: ANLISE DE CASOS 51

    Voc uma incompetente mesmo, no serve em lugar nenhum. Voc tem

    certeza que formada e tem ps-graduao? Seus diplomas no so falsos

    no? Eu no sei o que fao com voc, pois, em nenhum lugar voc serve,

    todos os gerentes reclamam de voc.

    L. relata que falou com os cinco supervisores e que nenhumdeles confirmou o que o gerente geral tinha dito, mesmo estandopresente no momento da conversa.

    Uns disseram que no tinham nada do que reclamar e outro disse que nem

    tinha como me avaliar. Ento eu acho que o [gerente geral] que no gosta

    de mim mesmo e est pegando no meu p. Eu at tentei falar com o [outro

    gerente], mas ele nem deu bola. Eu no sei o que que eu fiz para ele

    [gerente geral] me tratar assim.

    Mesmo com formao e experincia na rea jurdica, a fun-cionria foi colocada no setor de auto-atendimento, trabalhandosozinha, em condies fsicas inadequadas, para orientar e entre-gar cartes e cheques devolvidos aos clientes.

    Eu nunca tinha trabalhado tanto tempo em p. Eu ficava em p o dia

    inteiro, agora peguei a cadeira da sala de caf que horrvel, muito baixa

    para o balco, mas melhor do que ficar em p o dia inteiro. Ento comecei

    a sentir dores e ardncia nas costas e fui consultar o mdico ortopedista, que

    pediu exames e disse que a minha musculatura estava pssima. Fiz 10

    sesses de fisioterapia e melhorei um pouco. Depois descobri que a cada 50

    minutos de trabalho os funcionrios de atendimento expresso tinham o

    direito de descansar 10 minutos. Isso foi omitido, ningum falou. Essa

    norma existe exatamente por causa da sade da gente. E ningum avisou,

    no esto nem a.

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  • 52 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    Depois de um tempo no setor, sem me explicar o motivo, cortaram as

    minhas horas-extras. Isso diminuiu meu salrio. Mesmo quando pedi para

    fazer de novo as extras, eles disseram que no tinha necessidade e deram

    todas as horas extras para a (outra funcionria).

    No foi realizada nenhuma avaliao de desempenho de L.desde que ela entrou na agncia, embora a organizao tenha comopadro a execuo de uma avaliao semestral. No registro funcio-nal, L. est sob a superviso de um gerente, mas na prtica, seusupervisor hierrquico outro, que o responsvel pela realiza-o das avaliaes.

    A trabalhadora excluda das reunies, marcadas fora doseu horrio de trabalho. L. no recebe informaes sobre a reali-zao das reunies, nem mesmo por meio dos colegas ou do sistemade correio eletrnico interno. Fica sabendo que h reunio quan-do chega ao trabalho e a agncia est silenciosa. Os seguranasavisam que todos os demais funcionrios esto em reunio. Diz sesentir muito mal quando isso acontece. Com freqncia, suas ini-ciativas so desmerecidas.

    Quando ocorreram as promoes do seguro residencial, e seguro de vida,

    ao mesmo tempo o banco havia criado um estacionamento para os clien-

    tes, mas os clientes no tinham ainda conhecimento das promoes e nem

    do estacionamento. Ento tive a idia de divulgar, digitando em uma fo-

    lha A4, para distribuir para os clientes que iam ao auto-atendimento, e

    tambm deixei exposto no painel. Levei essa idia para [o gerente geral]

    que autorizou que fosse feito. Depois de passado alguns dias ele mesmo

    pegou a folha que estava no painel, amassou e jogou fora na minha frente.

    Tivemos as lixeiras de metal do auto-atendimento roubadas, como con-

    seqncia os clientes jogavam os papis no buraco, que acabavam indo

    para o cho. Tive a idia de fazer com cartolina americana preta, com-

    prada com meu prprio dinheiro, para os papis no carem no cho,

    mas com o tempo foi amassando as bordas da cartolina. Ento resolvi

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  • ASSDIO MORAL E ORGANIZAO DO TRABALHO: ANLISE DE CASOS 53

    comprar potes de plstico, tambm com meu prprio dinheiro, para substi-

    tuir as lixeiras at chegarem as originais. Fazia duas semanas que os potes de

    plstico j tinham sido substitudos pelas lixeiras originais, que haviam

    chegado. Quando numa segunda-feira [o gerente geral] que quase no

    aparece no meu setor, falou para mim: as lixeiras chegaram, eu respondi:

    sim j faz duas semanas, e ele disse: Claro que no. Eu passei aqui

    domingo e ainda estavam esses potes de bala que eu no agentava mais

    ver. Ainda bem que o [gerente de expediente], estava prximo, ouviu a

    conversa e confirmou o que eu disse. Eu me senti humilhada, o prprio

    lixo. (...) Por mais que eu me esforce, eles sempre acham do que reclamar.

    Eles no valorizam.

    Relata que, h mais de quatro meses, tem perdido a vontadede viver, que no tem nimo para sair da cama, sente-se triste echora com freqncia. Afirma que tem pensado em suicdio. Con-tou que um dia chegou a se auto-agredir com uma faca no pescoodurante uma discusso sem importncia com a me. Seu relato foiintercalado por momentos de choro. Est em acompanhamentopsicolgico e tratamento psiquitrico, com uso de medicao. Oplano de sade oferecido pelo banco no cobre esses atendimen-tos na cidade e a trabalhadora tem assumido os custos de consultase medicamentos. Na ocasio da entrevista, em abril de 2006, esta-va afastada do trabalho havia poucos dias em virtude de dores nosmembros superiores, direito e esquerdo. Mora com os pais e norefere nenhuma situao estressante na vida fora do trabalho.

    Anlise do caso 01

    Com base no relato da trabalhadora, podemos supor a ocor-rncia do assdio moral pela existncia de comportamentos hostisrepetitivos e persistentes4 , direcionado somente a ela, h mais de

    4 Hirigoyen, 2002.

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  • 54 ASSDIO MORAL/ORGANIZACIONAL: UMA ANLISE DA ORGANIZAO DO TRABALHO

    nove meses, como: (i) deteriorizao proposital das condies detrabalho - nas condies fsicas de trabalho, nas crticas injustas eexageradas ao seu desempenho e na atribuio de tarefas inferio-res s suas competncias, sua experincia e sua formao; (ii)isolamento - concretizado pelos escassos contatos e pelodistanciamento dos supervisores e dos colegas, pela excluso dasreunies da agncia; (iii) atentado dignidade - pelos gestos dedesprezo, por ser desacreditada diante de colegas e supervisores,por injrias e desqualificaes; (iv) violncia verbal e fsica, evi-denciada por negligncia quanto sade. Seus efeitos se evidenciampelas repercusses na sade e na vida social.

    Chama ateno o perfil da bancria: 26 anos, ps-gradua-da, com histrico positivo na agncia anterior, trabalhado h apenasdois anos na empresa. Essa descrio ressalta a contradio entre aqualificao, a histria anterior e a descrio atual. H umadesvinculao entre passado e presente. Os relatos de L. sobre aescriativas para resolver pequenos problemas ou melhorar o traba-lho so coerentes com a desenvoltura profissional descrita em relao primeira agncia. Entretanto, na segunda agncia, esto sinaliza-dos comportamentos de rebaixamento da funo e de isolamento,por parte do supervisor e dos colegas.

    Pode parecer contraditrio que a violncia se concretize nopor uma ao, mas pela omisso. Essa uma circunstncia tpicado assdio moral, que no deixa marcas visveis, mas somente pis-tas encobertas. Neste sentido, Hirigoyen5 ressalta que o assdiomoral ocorre no devido a um conflito, como colocado porLeymann6 , mas pela ausncia e ocultao do conflito, o no fala-do e o escondido. Para Hirigoyen7 , no conflito h a possibilidadede defesa, de confronto e de resoluo. Entende-se que h casosem que o conflito no est explcito e por isso as possibilidades de

    5 Hirigoyen, 2002.6 Leymann, 1996.7 Hirigoyen, 2002.

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  • ASSDIO MORAL E ORGANIZAO DO TRABALHO: ANLISE DE CASOS 55

    resoluo so restritas, colocando a pessoa numa espiral de des-truio. Portanto, nessa fase inicial o conflito de todos contra todosse evidencia, de forma exacerbada, em direo funcionria. Noh um conflito desencadeador marcante, mas um processo oculto,e contraditrio, nos moldes descritos por Hirigoyen8 . Para L., noh clareza do incidente crtico que teria iniciado o processo dehostilizao. Ela procura identificar o que teria feito para merecertal tratamento.

    A campanha de agresses, como a segunda fase de evoluodo assdio moral, se confirma nesse caso com as sucessivas circuns-tncias impostas de isolamento, de desprezo, de agresses verbais,de desvalorizao da pessoa, com uso de gestos hostis. Percebe-se asutileza das agresses ao se avaliar cada situao em separado, asquais poderiam ser consideradas como conflitos inerentes ao traba-lho ou ainda hipersensibilidade da trabalhadora. H possibilidadede algum questionar Mas ela ficou assim s porque o gerenterasgou um papel ou porque os colegas se afastaram?. Entretanto,quando contextualizadas e articuladas no tempo, a mensagem repe-tida em cada situao desagradvel de desprezo, questionamentode capacidade, desvalorizao, com ataques auto-segurana e dignidade. H um movimento que aos poucos vai atingindo a iden-tidade de L. devido perda de sentido9 : ser colocada margemsem entender os motivos desestruturante. Hirigoyen10 descreveque no assdio moral as ofensas so de natureza aleatria e variamconforme o dia. Alm das injrias e dos gestos hostis esto presentesofensas silenciosas, concretizadas pela omisso e pelo distanciamento.A degradao progressiva das condies de trabalho sutil e perce-bida mais claramente em comparao com a situao dos pares.

    Como evidncia da terceira fase de evoluo do assdiomoral, no caso de L. embora no haja um pedido de ajuda claro,

    8 Hirigoyen, 2002.9 idem.10 ibidem.

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