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FACULDADE VALE DO JAGUARIBE – FVJ CURSO: DIREITO DISCIPLINA: ECONOMIA APLICADA AO DIREITO PROF. FABRICIO JOSE COSTA DE HOLANDA NOÇÕES GERAIS DE ECONOMIA – CONTINUAÇÃO AULA 05: ESTRUTURAS DE MERCADO 1. INTRODUÇÃO Entende-se por mercado um local ou contexto em que compradores (que compõem o lado da procura) e vendedores (que compõem o lado da oferta) de bens, serviços ou recursos produtivos estabelecem e realizam transações. O lado dos compradores é constituído tanto de consumidores, que são compradores de bens e serviços, quanto de firmas, que são compradoras de recursos (trabalho, terra, capital e capacidade empresarial) utilizados na produção de bens e serviços. Já o lado dos vendedores é composto pelas firmas, que vendem bens e serviços aos consumidores, e pelas famílias que também são proprietários dos recursos (trabalho, terra, capital e capacidade empresarial), que os vendem (ou arrendam) para as firmas ou empresas em troca de remuneração (salários, aluguéis etc.). É importante notar que, para fins de análise econômica, o conceito de mercado não implica, necessariamente, a existência de um lugar geográfico em que as transações se realizam. Na realidade, as mercadorias são vendidas segundo os mais diferentes dispositivos institucionais, tais como feiras, lojas, bolsas de valores etc., podendo o termo mercado aplicar-se a qualquer um deles. Basta, para 1

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FACULDADE VALE DO JAGUARIBE – FVJ

CURSO: DIREITO

DISCIPLINA: ECONOMIA APLICADA AO DIREITO

PROF. FABRICIO JOSE COSTA DE HOLANDA

NOÇÕES GERAIS DE ECONOMIA – CONTINUAÇÃO

AULA 05: ESTRUTURAS DE MERCADO

1. INTRODUÇÃO

Entende-se por mercado um local ou contexto em que compradores (que compõem o lado da

procura) e vendedores (que compõem o lado da oferta) de bens, serviços ou recursos produtivos

estabelecem e realizam transações.

O lado dos compradores é constituído tanto de consumidores, que são compradores de bens e

serviços, quanto de firmas, que são compradoras de recursos (trabalho, terra, capital e capacidade

empresarial) utilizados na produção de bens e serviços.

Já o lado dos vendedores é composto pelas firmas, que vendem bens e serviços aos consumidores, e

pelas famílias que também são proprietários dos recursos (trabalho, terra, capital e capacidade

empresarial), que os vendem (ou arrendam) para as firmas ou empresas em troca de remuneração

(salários, aluguéis etc.).

É importante notar que, para fins de análise econômica, o conceito de mercado não implica,

necessariamente, a existência de um lugar geográfico em que as transações se realizam. Na realidade, as

mercadorias são vendidas segundo os mais diferentes dispositivos institucionais, tais como feiras, lojas,

bolsas de valores etc., podendo o termo mercado aplicar-se a qualquer um deles. Basta, para isso, que

compradores e vendedores de qualquer bem (ou serviço, ou recurso) interajam daí a possibilidade de

comercializar esse bem.

Devemos observar que os mercados estão no centro da atividade econômica. Essa é a razão pela

qual muitos temas importantes em economia estão relacionados com a maneira de funcionar desses

mercados.

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1.1. ESTRUTURAS DE MERCADO DE BENS E SERVIÇOS

Os mercados, tal como os entendemos, então estruturados de maneira diferenciada em função de

dois fatores principais: o número de firmas produtoras atuando no mercado e a homogeneidade

(igualdade) ou diferenciação dos produtos de cada firma. Com base nesses aspectos, podemos classificar

as estruturas de mercado da seguinte forma:

a) Concorrência Perfeita é um tipo de mercado em que há um grande número de compradores e

vendedores (firmas) e cada um tão pequeno que nenhum deles, agindo individualmente, consegue afetar o

preço da mercadoria. Além disso, os produtos de todas as firmas que compõem o mercado devem ser

homogêneos. Vários mercados de produtos agrícolas chegam perto de ser integralmente competitivos.

Outro exemplo: pense nos cocos que são vendidos nos quiosques da orla da praia. São tantos quiosques

(oferta de coco), que, se algum deles tentar vender o côco por um preço mais alto, os comparadores

simplesmente irão adquiri-lo no quiosque concorrente. Analogamente, nenhum comprador (demanda)

conseguirá comprar o côco por um preço mais baixo, porque existindo um grande número de

consumidores, os vendedores dos quiosques sabem que, se não venderem para um, venderão para outro.

As manicures, porteiros, mecânicos, dentre outros, também fazem parte de exemplos de mercado

de concorrência perfeita (ou livre concorrência). Nesse tipo de mercado, o número de usuários e

ofertantes dos serviços é tão grande que nenhum deles, agindo individualmente, consegue afetar o preço

de mercado (preço estabelecido pela interação entre oferta e demanda).

Em outras palavras, citando um dos exemplos anteriores existindo um grande número de manicures

e o serviço delas tendo a mesma qualidade, uma manicure dificilmente conseguirá cobrar pelo seu serviço

um preço maior do que o de mercado, porque, ao fazê-lo, sua cliente trocará de profissional. Por outro

lado, nenhuma cliente, em meio a tantas outras, conseguirá pagar um preço inferior ao de mercado porque

as manicures sabem que, se não prestarem o serviço para essa cliente especificamente, prestarão para

outra.

b) Monopólio: é uma situação de mercado em que uma única firma vende um produto que não tenha

substitutos próximos. É uma situação totalmente oposta à da concorrência perfeita, uma vez que ao lado

da oferta não há concorrência e nem produto concorrente. Nessas condições, ou os consumidores aceitam

as condições estipuladas pelos monopolistas, ou então abandonam o mercado, deixando de consumir o

produto. Essa situação é encontrada, por exemplo, em indústrias nas quais o único produtor tenha patente

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ou controle sobre uma fonte de recursos essencial para a elaboração do produto. Outro exemplo: até 1995,

a Petrobrás tinha o monopólio da extração e refino de petróleo no Brasil.

c) Concorrência Monopolista ou Concorrência Imperfeita: caracteriza-se pelo fato de que, embora muitas

empresas produzam produtos diferenciados, estes podem ser altamente substituíveis por exemplo,

diferentes marcas de perfumes, sabonetes, refrigerantes, calças jeans, creme dental, detergente, etc.,

aproximando-se mais da realidade do que a concorrência perfeita. Aqui, cada instituição vende uma

marca ou uma versão de um produto, que difere em termos de qualidade, aparência ou reputação, sendo

assim, a única produtora de sua própria marca.

O poder de monopólio, isto é, a capacidade de fixar preços depende do sucesso da diferenciação. A

diferenciação dos produtos ocorre por características físicas: embalagem, promoção das vendas, marca

etc. Assim, os consumidores vêem a marca de cada empresa como algo diferente, e essa imagem, correta

ou não determina a disposição a pagar mais pelo produto determina a disposição de pagar mais pelo

produto. Aquela que é única produtora de uma determinada marca pode, assim, exercer poder de mercado

de forma limitada. Os consumidores estão dispostos a pagar mais pelo produto, mas podem substituí-lo

por um de outra marca, pois é relativamente fácil haja vista que novas firmas entram no mercado com

marcas próprias.

A característica fundamental da concorrência monopolística, baseada na diferenciação de produtos

e serviços, é o uso vigoroso da publicidade pra fixação das marcas utilizadas. Análises críticas da

publicidade argumentam que essa ênfase enseja comportamentos irracionais dos consumidores, levando à

redução da concorrência. Por outro lado, enfoques favoráveis à publicidade consideram que seu uso

aumenta a transparência do mercado por meio do aperfeiçoamento das informações prestadas aso

consumidores, crescendo o nível de competição.

As calças da Gang, por exemplo, e vários outros produtores famosos também fazem parte de

exemplos de concorrência monopolística. Nesse tipo de mercado, o número de compradores (no caso, de

calças) e o número de ofertantes (de calças) é tão grande quanto na concorrência perfeita. Dito assim era

de se presumir que nem compradores nem produtores, agindo individualmente, conseguissem afetar o

preço de mercado (preço estabelecido pelas forças de oferta e demanda).

Na concorrência monopolística, entretanto, a marca (no caso, a Gang) faz com que o produto (no

caso, a calça) torne-se “único” dentre tanto outros com a mesma função (no caso, com a função de vestir

pessoas). Por esse motivo os produtores de marcas famosas conseguem exercer uma influência sobre os

preços de seus produtos muito maior do que conseguiriam se estivessem em um mercado em concorrência 3

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perfeita, em que características como marca (grife), qualidade, padrão de acabamento etc. não fazem

diferença.

Outro exemplo, pense no mercado de vinho. O vinho é facilmente entendido como um produto

genérico. Entretanto, os apreciadores de vinho irão dizer a você que eles reconhecem diferenças entre os

vinhos produzidos pelas vinícolas. Embora vinhos estejam disponíveis aso mais diversos preços que

refletem os processos envolvidos em sua manufatura, em geral a chave é que os produtos de duas

vinícolas diferentes provavelmente diferirão um do outro de alguma maneira.

Existem também exemplos de concorrência monopolística até nos serviços prestados. Um médico,

que é famoso por atender estrelas de televisão, consegue cobrar um preço maior por sua consulta do que

outro profissional que não tenha tanta fama assim.

d) Oligopólio: é uma situação de mercado na qual há apenas um pequeno número de empresas – duas,

três, um punhado. A palavra “oligopólio” vem do grego e significa “poucos vendedores. São exemplos de

oligopólios a indústria automobilística, a indústria de bebidas, entre várias outras. Embora não haja

barreiras explícitas, o poderio das grandes firmas é um fator desestimulante à entrada de novas empresas

no mercado.

Os setores oligopolistas são interessantes porque, dependendo das circunstâncias específicas, as

empresas podem tanto competir brutalmente umas com as outras ou se unir para se comportar de maneira

semelhante a um monopólio. Isto significa que em alguns casos os oligopólios podem ser deixados

sozinhos, porque a concorrência assegura que eles produzam a níveis socialmente ideais, enquanto que,

em outros casos, a regulamentação governamental é necessária para prevenir que eles atuem como

monopólios e se comportem de modo socialmente indesejável.

Em um mercado que há apenas alguns poucos vendedores, cada um produz o suficiente da

produção total pra se capaz de afetar o preço de mercado. Por exemplo, existem duas grandes produtoras

de refrigerantes sabor cola: Coca e Pepsi. Estas duas corporações produzem frações tão altas da produção

total que se qualquer uma delas subitamente aumentasse a oferta, o preço no mercado de refrigerantes

sabor cola cairia drasticamente. Um aumento na produção feito por uma das companhias causaria,

igualmente, a diminuição no preço de outras empresas no mercado.

Em outras palavras, se a Pepsi produzisse duas vezes mais que sua produção normal e, literalmente,

inundasse o mercado, seu preço cairia radicalmente. Mas porque a maioria das pessoas não é 100 por

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cento leal a uma marca ou a outra. Se o preço da Pepsi cair abruptamente, vários consumidores regulares

de Coca passarão a beber Pepsi. Em contrapartida, o preço da Coca cairia também.

A Pepsi a Coca estão envolvidas em uma situação onde cada uma de suas decisões de oferta afeta

não apenas usas próprias vendas, mas também a de seus concorrentes. Os economistas se referem a tal

situação como situações estratégicas, porque as empresas envolvidas têm que decidir que tipo de

estratégia adotar. Em particular, elas têm que decidir se competem ou se são coniventes entre si:

Se elas fizerem um conluio, irão juntas cortar a produção, a fim de conduzir a um aumento

de preços e de seus lucros (Cartel).

Se elas escolherem competir, ambas tentarão aumentar a produção, de modo a baixar os

preços e captar tantos consumidores quanto possível.

Estas duas estratégias, competir ou conluiar, conduz a resultados enormemente diferentes para

ambos, produtores e consumidores:

Para os produtores, o conluio (Cartel) é melhor que a concorrência, porque conduz a lucros

que duram tanto quanto a conivência das empresas.

Para os consumidores, a conivência é pior que a concorrência, porque conduz a altos

preços e baixa produção.

O que é fascinante no mundo real é que os conluios não acontecem em vários setores onde se

poderia espera-los. Por exemplo, Coca e a Pepsi são competidoras ferozes que gastam centenas de

milhões de dólares ao ano em propaganda tentando roubar os consumidores uma da outra.

Da mesma forma, muitas cidades têm apenas um pequeno número de companhias de telefonia

celular competindo. Mas, em vez de conluio, elas competem tão agressivamente que muitas delas estão

constantemente flertando com a falência. Outros setores com concorrência feroz incluem o setor de linhas

aéreas, onde s sacudidas do mercado são rotina.

Um grupo de empresas que conluiem e agem como um único organismo coordenado é conhecido

como um cartel. Porque um cartel age essencialmente como uma empresa gigante, ele efetivamente se

torna um aglomerado de empresas individuais dentro de um único e grande monopólio.

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Infelizmente para as empresas no cartel é frequentemente muito difícil conseguir que todas as

empresas coordenadas coletivamente o nível de produção do monopólio. Há dois fatores que podem

limitar este conluio. São eles:

Como dividir os lucros: obviamente todas as empresas desejam o maior lucro possível.

Cotas de produção: as empresas devem concordar, e acatar, o quanto do total da produção

que cada empresa irá produzir. Cada empresa será constantemente tentada a produzir mais

que sua cota porque, fazendo isto traria maiores receitas.

Os cartéis que normalmente obtêm êxito são aqueles que têm uma firma dominante (ou país) que

age punindo as firmas que transgridem os acordos existentes. Um exemplo de cartel de sucesso é a

Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP).

A Arábia Saudita é o país dominante desse cartel. Em 1973, a OPEP, liderada pela Arábia Saudita,

atordoou as nações industrializadas restringindo a oferta mundial de petróleo. Como resultado, houve um

violento aumento no preço mundial do petróleo, de 2,50 para 11,00 dólares por barril em um período de

apenas seis meses. A influência da OPEP atingiu seu auge em 1979-1982, quando o preço do petróleo

importado atingiu o total de 36 dólares por barril. O cartel perdeu sua força quando países-membros

burlaram o acordo produzindo e vendendo mais do que a cota imposta pela OPEP, com a finalidade de

aumentar suas receitas de exportação. Em 1999, a OPEP novamente se reagrupou e, por meio de

restrições na produção, o cartel conseguiu aumentar o preço do petróleo para aproximadamente 29 dólares

em fevereiro de 2000.

1.2.MONOPSÔNIO

É uma estrutura de mercado análoga ao monopólio, em que existe apenas um comprador.

Suponhamos, por exemplo, uma região em que há um número expressivo de pequenos produtores de leite

e apenas uma grande usina onde este leite pode ser pasteurizado. A usina será a única opção de venda

para os produtores, de modo que ela terá condições de impor os preços de compra que lhe convém. Outro

exemplo hipotético de monopsônio seria a existência de diversos pequenos produtores de tomates

obrigados a vender suas colheitas a um único fabricante de massa de tomate.

No setor de petróleo e gás natural a Petrobras usufrui considerável poder de monopsônio em relação

aos pequenos produtores de petróleo ao concentrar a propriedade do segmento de transporte e refino do

produto. Diante da pequena escala dessas operações de produção, o que inviabiliza a construção de

terminais próprios e a exportação por grandes navios para os mercados externos, os vendedores não 6

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dispõem de compradores alternativos e ficam à mercê do poder de compra da Petrobras. Essa situação

acaba inibindo a entrada de pequenos produtores no segmento de exploração e produção no Brasil, na

medida que prejudica a rentabilidade do negócio.

No que se refere à produção de gás natural, o poder de monopsônio da estatal é ainda maior, devido

aos elevados investimentos e à ineficiência associada à duplicação dos gasodutos para transportar o gás de

um produtor independente, das áreas de produção até o mercado consumidor. Sem o direito de acessar os

gasodutos, o produtor teria que se contentar em vender o gás ao comprador único: a Petrobras.

Assiste-se atualmente ao avanço do poder de mercado da Petrobras no setor alcooleiro. A estatal

planeja investir pesadamente na construção de dutos e terminais para o escoamento de álcool. A crescente

hegemonia da Petrobras no setor alcooleiro traz oportunidades de incrementar o processo de

internacionalização do álcool. Entretanto, deve-se ter cuidado para não se criar um novo monopsônio,

transformando a estatal na grande compradora e transportadora de toda a produção nacional.

A manutenção e o crescimento do poder de monopsônio nos mercados de energia no Brasil é um

problema grave que inibe o crescimento da oferta e afasta investimentos privados. Evidencia, também, o

pouco-caso que o governo faz da promoção da concorrência e dos seus benefícios para a sociedade.

1.3. OLIGOPSÔNIO

É uma estrutura análoga ao oligopólio, sendo que o domínio do mercado esta nas mãos de um

pequeno número de compradores.

A indústria automobilística, por exemplo, que é constituída por um pequeno número de

empresas, tem um poder oligopsonista em relação a indústria de autopeças, uma vez, que é

responsável por um grande volume de compras da produção desta ultima.

REPORTAGEM DA REVISTA VEJA EM 28/07/1999

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Cartel às avessas: Supermercados aumentam ritmo das aquisições e ganham poder para barrar aumento

Lojas do Pão de Açúcar e do Carrefour, em São Paulo:

febre de aquisições das redes varejistas mudou a relação

entre industriais e comerciantes

Pela aparência, a guerra que as grandes redes de supermercados começaram a travar no

começo do ano não vai terminar tão cedo. O Pão de Açúcar, cadeia comandada por Abilio Diniz,

já comprou três redes menores neste ano. O grupo Sendas, do Rio de Janeiro, anunciou na

semana passada um investimento de 250 milhões de reais até o final do ano que vem, para a

abertura de dez novos hipermercados. E o Carrefour, que em 1999 engoliu três cadeias de

supermercados fora de seu centro de poder, que fica em São Paulo, acaba de engolir mais uma. É

a rede Mineirão, de Minas Gerais, com 33 lojas e faturamento anual de 425 milhões de reais. A

esgrima não pára aí. Os cinco maiores grupos ainda têm no caixa 1 bilhão de reais para continuar

lutando pela melhor posição. Em disputa está um setor que faturou 47 bilhões de dólares em

1998, mais do que toda a indústria automobilística nacional. "Essa febre continuará. No final,

teremos companhias comerciais enormes, vendendo em escala nacional", afirma Fábio Silveira,

especialista em comércio varejista da consultoria Tendências, de São Paulo.

O que se observa é um processo de concentração que está alterando profundamente as

relações entre comércio e indústria. Em anos recentes, os industriais impunham preços aos

comerciantes. Ditavam prazos de pagamento, juros, compras mínimas. E os supermercados, por

sua vez, aceitavam qualquer coisa sem reclamar, já que lucravam mais com a inflação do que

propriamente com as vendas. Além disso, como eram redes frágeis e miúdas se comparadas aos

fornecedores do porte da Nestlé e da Sadia, pouco tinham a fazer a não ser dizer amém.

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O casamento torto virou de cabeça para baixo, pelo menos no caso das grandes

cadeias de supermercados. São elas que estão ditando as normas em sua relação com a

indústria. As cinco maiores redes do país vão responder neste ano por negócios da ordem

de 22 bilhões de reais, cerca de 40% das vendas do setor. É um poder tremendo,

principalmente porque alguns setores da indústria – alimentos e produtos de limpeza, por

exemplo – têm nos supermercados seu principal meio de chegar ao consumidor.

Uma amostra das novas relações entre comércio e indústria pôde ser

vista no início do ano. Logo após a desvalorização do real, em janeiro,

várias indústrias refizeram suas tabelas de preços, alegando que a alta

do dólar estava encarecendo as matérias-primas. Encontraram uma

oposição violenta nas cadeias de supermercados. "Passamos a negociar

individualmente com cada empresa que reajustou preços", diz

Valdemar Machado Júnior, diretor comercial do Pão de Açúcar.

Planilhas de custos foram abertas e, no final, grande parte das

indústrias aplicou porcentuais de aumento bem menores do que os

pedidos inicialmente. Quem não aceitou – e alguns fabricantes decidiram pisar firme para forçar

a alta de preços – teve o produto tirado da prateleira e substituído imediatamente por marcas

concorrentes. Tudo se normalizou em alguns dias, depois que os fabricantes cederam. "Conter a

inflação é algo que interessa tanto a nós quanto ao governo. A força do nosso nome está nos

preços baixos", observa o superintendente do Carrefour, Jean Duboc.

Como a concorrência entre as redes é feroz, quem dormir no ponto poderá perder espaço

estratégico para o inimigo. O interessante, nessa guerra, é que ela é travada com um único

argumento: menor preço. Os economistas usam um palavrão para definir a relação que se

estabeleceu entre os supermercados e seus fornecedores. Trata-se de um oligopsônio , uma

situação em que um pequeno número de compradores dita regras do mercado a um grupo

maior de vendedores. O oligopsônio dos supermercados resultou em benefícios para os

consumidores brasileiros. Formou-se uma espécie de cartel às avessas, em que os

supermercados se sentem obrigados a passar um rolo compressor sobre a indústria para

manter os preços baixos.

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As consequências das mudanças ocorridas nos últimos

anos no setor de varejo foram rapidamente se tornando

visíveis para o consumidor. O tamanho médio das lojas

cresceu 35% e nas grandes cidades são raros os mercados

que ainda têm caixas registradoras. Em seu lugar

surgiram as máquinas leitoras de código de barra, que

estão ligadas diretamente ao departamento de compras da

empresa. Assim, cada vez que uma mercadoria passa pelo

caixa a empresa sabe que precisa fazer nova encomenda

para repor o estoque. Em alguns casos, as lojas estão interligadas via satélite com os depósitos

centrais, para que esse processo seja ultra-rápido.

O aumento da concorrência faz parte de uma série de transformações sofridas pelo

comércio varejista brasileiro desde o Plano Real. Antes de 1994, os supermercados viviam do

lucro financeiro: vendiam à vista para o consumidor, pagavam os fornecedores a prazo e

mantinham o dinheiro aplicado nesse meio tempo. Os investimentos eram pequenos e ninguém

tinha interesse em melhorar a estrutura de distribuição, que era precária. Seria um gasto a mais.

A mudança começou com o fim da inflação e, em consequência, do lucro derivado das

aplicações financeiras. A estabilidade da economia provocou uma invasão multinacional no

setor. Até o final da década passada, a única multinacional de supermercados presente no país

era a francesa Carrefour, que desembarcou por aqui em 1976. Depois disso chegaram os

portugueses da Sonae e do Jerônimo Martins, os americanos do Wal-Mart e os holandeses do

grupo Ahold (que são donos de metade da rede pernambucana Bompreço).

Enquanto o mercado da Europa e dos Estados Unidos vem se mantendo estável nos últimos

anos, as vendas nos supermercados brasileiros cresceram 26% entre 1994 e 1998. Mesmo com a

possibilidade de a economia brasileira encolher 1% ou mais neste ano, há estimativas de que as

vendas nos supermercados possam crescer até 4%. Para fazer frente aos estrangeiros, que podem

obter financiamento a juros baixos no mercado internacional, a rede Pão de Açúcar adotou uma

série de mudanças nas lojas, abriu seu capital e passou a negociar ações na Bolsa de Nova York.

Está inaugurada a era da competição entre os supermercados brasileiros.

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LEITURA COMPLEMENTAR 01

MATÉRIA ESPECIAL: SIEMENS AFIRMA QUE GOVERNO DE SP "DEU AVAL"

AO CARTEL DO METRÔ, DIZ JORNAL

A empresa alemã Siemens apresentou ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica

(Cade) documentos em que afirma que o governo de São Paulo sabia e deu aval à formação de

um cartel para licitação de obras do metrô no estado, segundo reportagem publicada nesta sexta-

feira (2) pelo jornal "Folha de S.Paulo".

Em entrevista coletiva na manhã desta sexta, o secretário chefe da Casa Civil do governo

de São Paulo, Edson Aparecido, disse que o governo nega ligação com o suposto cartel em

licitações do Metrô, que a apuração sobre as denúncias está sendo feita também pela

Corregedoria do Estado e que a investigação do Cade está sendo usada como "instrumento de

polícia política". Em resposta às declarações, o Cade disse em nota que "repudia" acusações de

"instrumentalização política" das investigações.

Presidente da Corregedoria de São Paulo, Gustavo Ungaro afirmou que o estado é parte

interessada no processo, "uma vez que, se confirmado o cartel, o estado de São Paulo terá sido

vítima deste conluio de empresas privadas". Ele disse também que uma ação será proposta pela

Procuradoria Geral do Estado para que o governo estadual tenha acesso aos documentos, uma

vez que "as solicitações feitas pela Corregedoria não foram até o momento atendidas".

Secretário de Transportes no governo Covas, Claudio de Senna Frederico afirma que não

pode confirmar ou não se houve a formação de cartel entre as empresas para a construção do

Metrô. Diz que desconhecia o fato até então e que não houve nenhuma conivência ou

consentimento da pasta na época.

Em nota, o PSDB afirmou que "nunca compactuou, nem nunca há de compactuar, com o

erro e com a falta de conduta ética" e que ao governo de São Paulo "interessa buscar

ressarcimento e punir os eventuais responsáveis pela suposta formação de cartel". O partido disse

que "causa estranheza, no entanto, que o Cade se negue a fornecer o conteúdo das investigações

para que a Corregedoria de São Paulo faça seu trabalho" e criticou o órgão por fazer 11

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"vazamentos seletivos" com o "claro objetivo de confundir e de produzir efeitos políticos e

eleitorais".

O ex-governador de São Paulo José Serra divulgou nota na qual endossa "integralmente as

declarações já feitas pelo Governo de São Paulo". Além disso, negou ter tido qualquer

informação sobre irregularidades. "Não tomamos em nenhum momento conhecimento de

qualquer cartel feito por fornecedores e muito menos se deu aval a qualquer coisa nesse sentido",

disse Serra.

A empresa alemã Siemens divulgou nota em que afirma ter conhecimento das

investigações do Cade sobre um suposto cartel em licitações no Metrô de São Paulo, mas nega

ter sido fonte das informações divulgadas na imprensa de que teria fornecido documentos e

provas do conluio.

A negociação entre a empresa alemã e representantes do estado está relatada em diários

entregues às autoridades brasileiras, diz a "Folha". Em julho, segundo a publicação, a Siemens

denunciou ao Cade a existência de um cartel para a construção e a manutenção de linhas de trens

e metrô e também para a compra de equipamentos ferroviários em São Paulo e no Distrito

Federal.

De acordo com a reportagem, o cartel em São Paulo teria sido formado em 2000, no

governo de Mário Covas (PSDB), para a construção da linha 5 do Metrô. A empresa, segundo o

jornal, teria assinado um documento em que garantiria a imunidade caso o esquema fosse

descoberto.

O Cade apontou, afirma ainda o jornal, que o esquema se estendeu ao governo de Geraldo

Alckmin (2001-2006) e também ao primeiro ano do governo de José Serra (2007).

O ex-secretário de Transportes durante o governo Covas, Cláudio de Senna Frederico,

afirmou à "Folha de S.Paulo" que não tinha conhecimento do cartel. O governo Alckmin disse ao

jornal que, se confirmado o esquema, pedirá a punição dos envolvidos. Serra não foi localizado,

de acordo com a publicação.

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Conforme reportagem da "Folha", a Siemens apresentou às autoridades a lista de 18

empresas, sendo algumas de um mesmo grupo, e 23 executivos que teriam participado do cartel.

Subsidiárias de multinacionais como a francesa Alstom, a canadense Bombardier, a espanhola

CAF e a japonesa Mitsui estão na relação, de acordo com o jornal.

Edson Aparecido disse que está ocorrendo "um processo de vazamento seletivo" que

afirmou ser "absolutamente inacreditável" por ferir o acordo de leniência feito com a empresa

investigada. "Acaba fazendo um processo de vazamento seletivo, que nós temos acompanhado

pela imprensa", disse o secretário. "A ação não nos parece que seja de esclarecimento, mas seja

muito mais de uma ação política".

Segundo ele, uma reunião na quarta (1º) foi realizada com oito procuradores do Ministério

Público, com o presidente do Metrô, com o presidente da CPTM, com a Procuradoria Geral do

Estado e com o corregedor de São Paulo para conseguir acesso a documentos do Cade.

Aparecido disse haver "desvirtuamento" do papel do conselho, que deveria "garantir a livre

concorrência" e não trabalhar como "instrumento de polícia política".

A Procuradoria do estado, de acordo com o secretário, deve tomar medida judicial para

obter as informações junto ao Cade. Ele disse acreditar que será impetrado um mandado de

segurança.

"O estado de São Paulo é o maior interessado. [...] Se houve irregularidade, vai ter o

ressarcimento dos cofres públicos", disse o secretário. Para ele, há "uma tentativa de

desmoralizar o programa de mobilidade urbana". "É uma troca de informações de funcionários e

empresas. Não diz ali que havia esse tipo de conhecimento por parte do governo de São Paulo".

Indagado se o governador Geraldo Alckmin (PSDB) sabia da suposta ligação de

funcionários com o esquema. Aparecido disse que não. Ele também disse que a memória do ex-

governador Mário Covas está sendo "enxovalhada" e se disse indignado com a afirmação de que

funcionários do governo na época da gestão Covas tivessem relação com o cartel.

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"A Corregedoria já está apurando, está ouvindo pessoas físicas e jurídicas citadas na

reportagem", disse o secretário.

Secretário de Transportes no governo Covas, Claudio de Senna Frederico afirma que não

pode confirmar ou não se houve a formação de cartel entre as empresas para a construção do

Metrô. Diz que desconhecia o fato até então e que não houve nenhuma conivência ou

consentimento da pasta na época.

"Faz 13 anos isso. Houve uma licitação, uma empresa ganhou, os trens foram fornecidos

no preço e prazo contratados e, agora, surgiu uma informação, que está sendo investigada, de que

teria havido um acordo, um entendimento entre eles (as empresas). Eu não posso dizer que

houve, nem que não houve. Eu não fui informado de nenhum acordo, mas certamente já vi isso

acontecer muitas vezes na vida", disse ele ao G1.

"O que eu vi do lado de cá foi um fornecimento, como qualquer outro. A linha 4 foi a mais

barata, e com resultado", afirmou. "Se existia uma conversa entre eles ou não, eu não tinha o

conhecimento. Com freqüência eles pediam reuniões para esclarecimento de detalhes. Se eles

tinham uma combinação por trás, eu não sabia e isso não foi feito através da secretaria", afirmou.

"Quando os fornecedores falam em governo, é uma palavra amorfa, não se sabe quem. Da minha

parte não havia ciência e nem de meus subordinados".

O Cade informou nesta sexta-feira ao G1 que analisa desde o começo de julho documentos

que apontam suspeitas de envolvimento de 13 empresas na formação de cartel para supostas

fraudes em seis licitações para aquisição de trens, além de manutenção e construção de linhas

ferroviárias e de metrô, em São Paulo e no Distrito Federal.

Em São Paulo, segundo o Cade, irregularidades teriam ocorrido na construção da primeira

fase da linha 5 e da extensão da linha 2 do metrô da capital paulista, além da aquisição de trens

pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).

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O Cade informou que o processo é sigiloso e que, por isso, não pode confirmar se a

empresa envolvida é a Siemens. O conselho confirma que a investigação começou após a

assinatura de um acordo de leniência, que equivale a uma delação premiada.

De acordo com o Cade, não é possível afirmar, no atual estágio de apuração, a abrangência

do suposto cartel em licitações para aquisição de carros de trens, manutenção e construção de

linhas de trens e metrôs.

O conselho disse que o atual inquérito administrativo é uma fase preliminar de

investigação. "Apenas após a análise de todo material apreendido pelo Cade durante a operação

de busca e apreensão realizada no dia 4 de julho e eventual instauração de um processo

administrativo é que poderão ser identificadas as empresas e pessoas físicas envolvidas, os

projetos e cidades afetadas e o período em que o cartel teria atuado", diz o Cade em nota.

A Alstom esclareceu que recebeu um pedido do Cade para apresentar documentos

relacionados a um procedimento administrativo referente à lei concorrencial. A empresa disse

que está colaborando com as autoridades.

Veja o esquema a seguir:

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Fontes:

ANTONIONI, Peter. Economia para leigos. Rio de janeiro, Alta books, 2012.

MONTELLA, Maura. Economia, administração contemporânea e engenharia de produção: um estudo de firma. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2006.

MONTELA, Maura. Decifrando o economês: 300 perguntas e respostas. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2005.

PASSOS, Carlos Roberto Martins & NOGAMI, Otto. Princípios de Economia. 5 ed. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.

TEBCHIRANI, Flávio Ríbas. Princípios de economia: micro e macro. 2 ed. ampl. Curitiba: Ibpex, 2005.

http://oglobo.globo.com/economia/cade-apura-suposto-cartel-de-postos-de-combustiveis-em-uberlandia-10919068.

http://www.unica.com.br

http://www.jcrnet.com.br

http://veja.abril.com.br/280799/p_131.html

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