Beira 73

6
assumiram o compromisso de fazer a Universidade crescer. Nesse aspecto, eu não diria que será um novo modelo, diria que será um modelo diferente, que irá incentivar a participação de todos na construção dessa Institui- ção. A nossa gestão vai valorizar o que foi feito ao longo do tempo e vai tentar corrigir o que for necessário. Tentaremos impor um novo ritmo institucional. BR – Quais serão as prioridades para este primeiro ano de traba- lho? C.M. – A prioridade é concentrar a atenção na melhoria das atividades da graduação. Nós temos que garantir que todos os cursos tenham profes- sores suficientes e capacitados para desempenhar suas atividades; preci- samos garantir que a UFPA funcione, verdadeiramente, como uma univer- sidade multicampi, de maneira que as ações desenvolvidas pelo interior não sejam consideradas de classe menor em relação às atividades da capital. Daremos início a uma cultura de valorização das relações entre as pes- soas. Esse foi um ponto mencionado na campa- nha, pois dizíamos que o patrimônio maior da Universidade são as pessoas que aqui tra- balham. Laboratórios e prédios compõem e dão condições melhores para que as atividades sejam desenvolvidas, mas o patrimônio que deve ser valorizado são as pessoas. A relação interpessoal precisa ser qualificada internamen- te e esse é um ponto que nós vamos olhar com atenção neste primeiro ano de gestão. BR – As propostas apresentadas na cam- panha, agora, são metas a serem cumpridas? C.M. – Sim. Durante o processo de transição, realizamos várias reuniões para discutir, o que, de fato, daquilo que nos comprometemos na campa- nha, será transformado em princípios, diretrizes e metas. Estabeleceremos um cronograma para o cumprimento dessas metas, que fará parte da nossa agenda permanente de gestão e, assim, teremos como alterar a rota para, se necessário, corrigirmos os desvios. BR – Atualmente, duas questões têm sido debatidas nas universida- des brasileiras: o sistema de cotas e o novo modelo do vestibular. Qual a sua opinião a esse respeito? C.M. – Sempre fui favorável ao siste- ma de cotas, por entender que ele não é uma solução em si, mas um meio de promover a participação da minoria. Esse sistema já está instituído, o que precisamos é avaliá-lo permanente- mente e corrigir os desvios. Com re- lação ao novo exame de vestibular, te- nho posição favorável à ideia, em tese. Compreendo algumas dificuldades que isso possa colocar, especialmente, em relação à disputa pelas vagas nos cursos mais concorridos. Mas isso não pode ser motivo para desconsi- derar a possibilidade de unificar ou usar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como método de veri- ficação de ingresso na universidade. Considero positiva a possibilidade de comparar o desequilíbrio regional naquilo que, de fato, será o conteúdo comum para todos os exames de vestibular. Com o Enem, o gover- no terá o retrato claro, qualitativa e quantita- tivamente, das assime- trias regionais. Também será possível melhorar o que é a competência do ensino médio, pois o sistema atual interfe- re, negativamente, na qualidade do ensino, com uma exigência de conteúdo muito elevada e pautada no vestibular. E o que parece ser o grande questionamento contra o exame, pode ser removido. O MEC diz que as universida- des podem usar o Enem como uma das etapas de acesso, ou seja, podemos decidir que iremos usá-lo sem que pessoas de fora estejam disputando as nossas vagas. Com o sistema nacional, teremos um vestibular mais barato, com possibi- lidade de ampliar as taxas de isenção, além de permitir a comparação regio- nal dos resultados. Isso pode ser um instrumento utilizado pelo governo federal para correção de desigualda- des educacionais entre regiões. Beira do Rio – Hoje, qual é a imagem que o senhor tem da Universidade e qual é a que o senhor vislumbra para daqui a quatro anos? Carlos Edilson de Almeida Manes- chy – A imagem que eu tenho, hoje, da UFPA é de uma universidade que avançou em muitos aspectos, sobretu- do, no que diz respeito à qualificação docente, aumentamos a oferta de pro- gramas de pós-graduação, a estrutura física da Instituição foi significativa- mente melhorada. Ampliamos nossa participação no interior, com a oferta de novos cursos. Olhando por esses aspectos, vejo uma universidade que se consolida cada vez mais no cenário amazônico. Isso não significa dizer que ela não tenha problemas. Talvez o aspecto preponderante dessa pro- blemática esteja naquilo que requer maior investimento, que é a melhoria do ensino de graduação. Nós poderí- amos formar profissionais, não apenas com alta qualidade técnica, mas tam- bém com capacidade de compreender a rea- lidade de forma crítica. Essa é uma das missões da Universidade. Nos- sos alunos deveriam ser estimulados a utilizar suas competências e ações empreendedoras para mudar a realidade social. Isto é um pouco do que eu vejo para a Universidade mais adiante: uma integração maior com a sociedade, dando visibilidade àqui- lo que é produzido inter- namente; a valorização e a profissionalização da comunicação insti- tucional, de sorte que os resultados daquilo que a Universidade produz possam ser compreendidos e absorvidos pela sociedade; uma ação institucional voltada para exploração de intercâmbios e parcerias, que be- neficiariam todos os setores da UFPA, além de consolidar cada vez mais a sua marca. BR – A partir de julho, a Univer- sidade contará com uma nova equipe na administração superior e isso sempre gera expectativas. O que a comunidade acadêmica pode esperar? C.M. – A nova equipe chega com o compromisso de fortalecer as ações institucionais, de colocar suas expe- riências, competências e habilidades em prol do fortalecimento da Univer- sidade. São pessoas com experiências consolidadas e que trazem um legado importante, que poderá contribuir para a melhoria das atividades e das inicia- tivas que estão sendo desenvolvidas. A comunidade pode es- perar muita dedicação e trabalho de pessoas que têm a vida ligada, direta e inseparavel- mente, à UFPA. BR – Estaremos dian- te de um novo modelo de gestão? C.M. – Eu não diria um novo modelo. Não se pode esquecer que a gestão é sequencia- da, nada começa com alguém. A Instituição é resultado das experi- ências de pessoas que, inclusive, já não estão mais aqui, mas que co- locaram seus esforços e Engenharia Civil propõe construção de casa ecológica Grupos de pesquisa do ITEC/UFPA apresentam propostas ambientalmen- te viáveis para o reaproveitamento de resíduos. Lajes de garrafa PET, telhas de lama vermelha e tijolo de lodo são alguns exemplos. Págs. 7 e 8 Meio Ambiente Umidade prejudica rotatividade Pág. 9 Pesquisa analisa práticas amorosas Pág. 11 Praça é espaço democrático de lazer Pág. 5 Cemitério Antropologia Diversão Victoria Nahum faz depoimento sobre as cheias na região do Baixo Amazonas. Pág. 2 Opinião Entrevista O reitor Alex Fiúza de Mello fala dos avanços da UFPA nos últimos 10 anos. Pág. 2 Coluna do Reitor Turismo perde fôlego em São Domingos Estudo revela que políticas públicas deram visibilidade, mas não favoreceram potencial econômico do município. Pág. 4 Múltiplos olhares sobre a floresta Após cinco séculos, o olhar estrangei- ro presente em crônicas e relatos de viagem ainda contribui com a produ- ção científica amazônica. Pág. 3 Pororoca Viajantes O professor Carlos Maneschy, eleito 12º reitor da UFPA, estará no comando da Instituição a partir de 02 de julho. Pág. 12 ISSN 1982-5994 Entrevista Rosyane Rodrigues A partir do próximo dia 02 de julho, a Universidade Federal do Pará dará início a um novo ciclo. O professor Carlos Edilson de Almeida Maneschy assumirá o comando da Instituição como o seu 12º reitor. Professor titular da Faculdade de Engenharia Mecânica/ITEC, Carlos Maneschy foi diretor executivo da Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp) e membro do Conselho Universitário e Conselho Superior de Ensino e Pesquisa da UFPA. Em entrevista ao JORNAL BEIRA DO RIO, o reitor apresenta quais serão as prioridades no seu primeiro ano de administração e afirma que a UFPA está diante de um modelo diferente de gestão, que irá incentivar a participação de todos na construção da Universidade. Carlos Maneschy também expõe seu ponto de vista sobre o uso do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em substituição ao vestibular tradicional e o sistema de cotas, temas que vêm sendo amplamente debatidos nas universidades brasileiras. Maneschy assume Reitoria da UFPA a partir de julho “Colocaremos experiências, habilidades e competências em prol do fortalecimento das ações institucionais". 12 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009 “O patrimônio que deve ser valorizado são as pessoas que aqui trabalham” “A prioridade é concentrar a atenção nas atividades da graduação” JORNAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ • ANO VII • N. 73 • JUNhO/JULhO, 2009 Amazônia mais quente e seca A lagamentos, enchentes, propagação de doenças, secas intensas, tempes- tades violentas. Esse cenário “apocalíptico” está cada vez mais próximo de nós. De acordo com os meteorologistas, neste inverno amazônico, os rios da região vi- vem a maior cheia dos últimos cem anos. São milhares de famílias de- sabrigadas, esperando que as chu- vas parem e as águas diminuam. Registros globais mostram que a temperatura e o nível do mar estão aumentando, a cobertua de neve e gelo tem diminuído. Para 2050, há previsão de uma Amazônia mais seca e quente, de poucas chuvas e ventos fortes. Pesquisas realizadas pelos programas de pós-graduação do Instituto de Geociências trazem resultados contundentes que ser- vem de alerta para as consequên- cias do crescimento populacional, da ocupação desordenada e do desmatamento. Pág. 8 Maneschy: “tentaremos impor um novo ritmo institucional” Belém em dia de chuva: ocupação desordenada deixa população mais vulnerável durante as tempestades Exemplo de aplicação da lama vermelha em tijolos, telhas e revestimento Análise foi feita no Benguí e Tapanã FOTOS MÁCIO FERREIRA ALEXANDRE MORAES MÁCIO FERREIRA MÁCIO FERREIRA ACERVO PROJETO

description

Beira do Rio edição 73

Transcript of Beira 73

Page 1: Beira 73

assumiram o compromisso de fazer a Universidade crescer. Nesse aspecto, eu não diria que será um novo modelo, diria que será um modelo diferente, que irá incentivar a participação de todos na construção dessa Institui-ção. A nossa gestão vai valorizar o que foi feito ao longo do tempo e vai tentar corrigir o que for necessário. Tentaremos impor um novo ritmo institucional.

BR – Quais serão as prioridades para este primeiro ano de traba-lho?C.M. – A prioridade é concentrar a atenção na melhoria das atividades da graduação. Nós temos que garantir que todos os cursos tenham profes-sores suficientes e capacitados para desempenhar suas atividades; preci-samos garantir que a UFPA funcione, verdadeiramente, como uma univer-sidade multicampi, de maneira que as ações desenvolvidas pelo interior não sejam consideradas de classe menor em relação às atividades da capital. Daremos início a uma cultura de valorização das relações entre as pes-soas. Esse foi um ponto mencionado na campa-nha, pois dizíamos que o patrimônio maior da Universidade são as pessoas que aqui tra-balham. Laboratórios e prédios compõem e dão condições melhores para que as atividades sejam desenvolvidas, mas o patrimônio que deve ser valorizado são as pessoas. A relação interpessoal precisa ser qualificada internamen-te e esse é um ponto que nós vamos olhar com atenção neste primeiro ano de gestão.

BR – As propostas apresentadas na cam-panha, agora, são metas a serem cumpridas?C.M. – Sim. Durante o processo de transição, realizamos várias reuniões para discutir, o que, de fato, daquilo que nos comprometemos na campa-nha, será transformado em princípios, diretrizes e metas. Estabeleceremos um cronograma para o cumprimento dessas metas, que fará parte da nossa agenda permanente de gestão e, assim,

teremos como alterar a rota para, se necessário, corrigirmos os desvios.

BR – Atualmente, duas questões têm sido debatidas nas universida-des brasileiras: o sistema de cotas e o novo modelo do vestibular. Qual a sua opinião a esse respeito?C.M. – Sempre fui favorável ao siste-ma de cotas, por entender que ele não é uma solução em si, mas um meio de promover a participação da minoria. Esse sistema já está instituído, o que precisamos é avaliá-lo permanente-mente e corrigir os desvios. Com re-lação ao novo exame de vestibular, te-nho posição favorável à ideia, em tese. Compreendo algumas dificuldades que isso possa colocar, especialmente, em relação à disputa pelas vagas nos cursos mais concorridos. Mas isso não pode ser motivo para desconsi-derar a possibilidade de unificar ou usar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como método de veri-ficação de ingresso na universidade. Considero positiva a possibilidade de comparar o desequilíbrio regional naquilo que, de fato, será o conteúdo

comum para todos os exames de vestibular. Com o Enem, o gover-no terá o retrato claro, qualitativa e quantita-tivamente, das assime-trias regionais. Também será possível melhorar o que é a competência do ensino médio, pois o sistema atual interfe-re, negativamente, na qualidade do ensino, com uma exigência de conteúdo muito elevada e pautada no vestibular. E o que parece ser o grande questionamento contra o exame, pode ser removido. O MEC diz que as universida-des podem usar o Enem como uma das etapas de

acesso, ou seja, podemos decidir que iremos usá-lo sem que pessoas de fora estejam disputando as nossas vagas. Com o sistema nacional, teremos um vestibular mais barato, com possibi-lidade de ampliar as taxas de isenção, além de permitir a comparação regio-nal dos resultados. Isso pode ser um instrumento utilizado pelo governo federal para correção de desigualda-des educacionais entre regiões.

Beira do Rio – Hoje, qual é a imagem que o senhor tem da Universidade e qual é a que o senhor vislumbra para daqui a quatro anos?Carlos Edilson de Almeida Manes-chy – A imagem que eu tenho, hoje, da UFPA é de uma universidade que avançou em muitos aspectos, sobretu-do, no que diz respeito à qualificação docente, aumentamos a oferta de pro-gramas de pós-graduação, a estrutura física da Instituição foi significativa-mente melhorada. Ampliamos nossa participação no interior, com a oferta de novos cursos. Olhando por esses aspectos, vejo uma universidade que se consolida cada vez mais no cenário amazônico. Isso não significa dizer que ela não tenha problemas. Talvez o aspecto preponderante dessa pro-blemática esteja naquilo que requer maior investimento, que é a melhoria do ensino de graduação. Nós poderí-amos formar profissionais, não apenas com alta qualidade técnica, mas tam-bém com capacidade de compreender a rea-lidade de forma crítica. Essa é uma das missões da Universidade. Nos-sos alunos deveriam ser estimulados a utilizar suas competências e ações empreendedoras para mudar a realidade social. Isto é um pouco do que eu vejo para a Universidade mais adiante: uma integração maior com a sociedade, dando visibilidade àqui-lo que é produzido inter-namente; a valorização e a profissionalização da comunicação insti-tucional, de sorte que os

resultados daquilo que a Universidade produz possam ser compreendidos e absorvidos pela sociedade; uma ação institucional voltada para exploração de intercâmbios e parcerias, que be-neficiariam todos os setores da UFPA, além de consolidar cada vez mais a sua marca.

BR – A partir de julho, a Univer-sidade contará com uma nova equipe na administração superior e isso sempre gera expectativas. O que a comunidade acadêmica pode esperar?C.M. – A nova equipe chega com o compromisso de fortalecer as ações institucionais, de colocar suas expe-riências, competências e habilidades em prol do fortalecimento da Univer-sidade. São pessoas com experiências consolidadas e que trazem um legado importante, que poderá contribuir para a melhoria das atividades e das inicia-tivas que estão sendo desenvolvidas.

A comunidade pode es-perar muita dedicação e trabalho de pessoas que têm a vida ligada, direta e inseparavel-mente, à UFPA.

BR – Estaremos dian-te de um novo modelo de gestão?C.M. – Eu não diria um novo modelo. Não se pode esquecer que a gestão é sequencia-da, nada começa com alguém. A Instituição é resultado das experi-ências de pessoas que, inclusive, já não estão mais aqui, mas que co-locaram seus esforços e

Engenharia Civil propõe construção de casa ecológica

Grupos de pesquisa do ITEC/UFPA apresentam propostas ambientalmen-te viáveis para o reaproveitamento de

resíduos. Lajes de garrafa PET, telhas de lama vermelha e tijolo de lodo são alguns exemplos. Págs. 7 e 8

Meio Ambiente

Umidade prejudica rotatividade

Pág. 9

Pesquisa analisa práticas amorosas Pág. 11

Praça é espaço democrático de lazer Pág. 5

Cemitério

Antropologia Diversão

Victoria Nahum faz depoimento sobre as cheias na região do Baixo Amazonas. Pág. 2

Opinião

Entrevista

O reitor Alex Fiúza de Mello fala dos avanços da UFPA nos últimos 10 anos. Pág. 2

Coluna do Reitor

Turismo perde fôlego em São Domingos Estudo revela que políticas públicas deram visibilidade, mas não favoreceram potencial econômico do município. Pág. 4

Múltiplos olhares sobre a florestaApós cinco séculos, o olhar estrangei-ro presente em crônicas e relatos de viagem ainda contribui com a produ-ção científica amazônica. Pág. 3

Pororoca

Viajantes

O professor Carlos Maneschy, eleito

12º reitor da UFPA, estará no comando da

Instituição a partir de

02 de julho.

Pág. 12

issn

198

2-59

94

Entrevista

Rosyane Rodrigues

A partir do próximo dia 02 de julho, a Universidade Federal do Pará dará início a um novo ciclo. O professor Carlos Edilson de Almeida Maneschy assumirá o comando da Instituição como o seu 12º reitor. Professor titular da Faculdade de Engenharia Mecânica/ITEC, Carlos Maneschy foi diretor executivo da Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp) e membro do Conselho Universitário e Conselho Superior de Ensino e Pesquisa da UFPA.

Em entrevista ao JORNAL BEIRA DO RIO, o reitor apresenta quais serão as prioridades no seu primeiro ano de administração e afirma que a UFPA está diante de um modelo diferente de gestão, que irá incentivar a participação de todos na construção da Universidade. Carlos Maneschy também expõe seu ponto de vista sobre o uso do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em substituição ao vestibular tradicional e o sistema de cotas, temas que vêm sendo amplamente debatidos nas universidades brasileiras.

Maneschy assume Reitoria da UFPA a partir de julho“Colocaremos experiências, habilidades e competências em prol do fortalecimento das ações institucionais".

12 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009

“O patrimônio que deve ser

valorizado são as pessoas que

aqui trabalham”

“A prioridade é concentrar a atenção nas atividades da graduação”

JORNAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ • ANO VII • N. 73 • JUNhO/JULhO, 2009

Amazônia mais quente e secaAlagamentos, enchentes,

propagação de doenças, secas intensas, tempes-

tades violentas. Esse cenário “apocalíptico” está cada vez mais próximo de nós. De acordo com os meteorologistas, neste inverno amazônico, os rios da região vi-vem a maior cheia dos últimos cem anos. São milhares de famílias de-sabrigadas, esperando que as chu-vas parem e as águas diminuam. Registros globais mostram que a temperatura e o nível do mar estão aumentando, a cobertua de neve e gelo tem diminuído. Para 2050, há previsão de uma Amazônia mais seca e quente, de poucas chuvas e ventos fortes. Pesquisas realizadas pelos programas de pós-graduação do Instituto de Geociências trazem resultados contundentes que ser-vem de alerta para as consequên-cias do crescimento populacional, da ocupação desordenada e do desmatamento. Pág. 8

Maneschy: “tentaremos impor um novo ritmo institucional”

Belém em dia de chuva: ocupação desordenada deixa população mais vulnerável durante as tempestades

Exemplo de aplicação da lama vermelha em tijolos, telhas e revestimento

Análise foi feita no Benguí e Tapanã

Foto

s M

ác

io F

erre

ira

ale

xan

dre

Mo

raes

cio

Fer

reir

a

cio

Fer

reir

a

acer

vo P

roje

to

Page 2: Beira 73

As principais conquistas da Universidade Federal do Pará, ao longo da primeira década

do novo século, podem ser resumidas em cinco eixos:

1) Qualificação de pessoal2) Reestruturação dos marcos

regulatórios3) Modernização da infraes-

trututura4) Novo Modelo de Gestão5) Consolidação da interioriza-

ção: Universidade Multicampi.Em termos de qualificação de

pessoal docente, o salto foi expressivo. De cerca de 300 doutores, em 2000, a UFPA saltou para mais de 900, em 2009 (chegará a 1.000 em 2010), fruto dos investimentos em titulação de seu quadro permanente e da política de priorização de contratação de doutores por meio de concursos públicos. Tri-plicaram, também, em consequência, no mesmo período, os programas de pós-graduação em nível de doutorado, evoluindo de 6 para 20 – além da dupli-cação dos mestrados, de 20 para mais de 40. Isso significa que, dentro de três anos, a Universidade estará formando, em média, 150 doutores e 400 mestres por ano, assim contribuindo direta-mente para uma mudança de patamar da base científica regional. A seu turno, o corpo técnico-administrativo, com a criação da Pró-Reitoria de Desenvol-vimento e Gestão de Pessoal (PRO-

GEP), passou a receber treinamento sistemático e permanente, nos vários níveis de formação, com desenvolvi-mento de habilidades e competências definido por uma agenda devidamente planejada conforme as necessidades de cada setor.

A reforma completa do Estatuto e do Regimento Geral foi outro marco na história recente da Instituição. Os novos textos aprovados pelo CON-SUN inovam e atualizam os marcos regulatórios da Universidade ao concebê-la como multicampi, definir o status e a estrutura dos campi do interior (que inexistiam nos docu-mentos precedentes) e extinguir os departamentos. Da mesma forma e em consequência, a Reitoria e todas as Unidades Acadêmicas passaram por uma adequação de seus regimentos internos correspondentes.

O crescimento, modernização e reforma da infraestrutura predial, da rede lógica (hoje em gigabytes), dos laboratórios de ensino e pesquisa, das salas de aula e bibliotecas, seja na capital seja no interior, apresentam-se como outro item de particular distin-ção. Um novo Centro de Convenções (com auditório para mil lugares) e investimentos no espaço urbano (do saneamento básico ao recapeamento de vias e reformas de calçadas e pas-sarelas) transformaram a paisagem da Cidade Universitária, dando-lhe mais

beleza e funcionalidade. Em muitas áreas do conhecimento, a UFPA ga-nhou destaque nacional graças aos equipamentos de ponta adquiridos para seus laboratórios, similares aos das melhores universidades do País e, em alguns casos, do mundo.

Mudou, também, o modelo de gestão institucional. Com base informacional avançada e um sistema mais completo de produção e armaze-namento de dados (programa SIE), a Universidade passou a experimentar uma dinâmica de aperfeiçoamento pro-gressivo de suas fontes de informação e de formulação de indicadores, per-mitindo uma melhor avaliação e pla-nejamento de suas atividades, com im-pactos imediatos na economia de seus recursos e na racionalização dos gastos e dos investimentos. Nesse diapasão, a administração inovou com a criação da Agenda de Compras (hoje global e periódica), com a terceirização dos projetos de arquitetura e engenharia (via licitação pública), da manutenção predial e das áreas urbanas externas (também por licitação) e com a mo-dernização do sistema de vigilância (recursos eletrônicos e inteligência preventiva), dentre outros avanços. A prática da colegialidade, exercida por meio dos chamados fóruns de decisão, com o envolvimento dos vários diri-gentes universitários, nos vários níveis de gestão, conferiu um ambiente mais

democrático, transparente e interativo às principais decisões institucionais.

Por fim, o programa de interio-rização – concebido agora sob uma filosofia multicampi – ganhou sua definitiva consolidação, traduzida pela criação de mais de 70 novos cursos de graduação (com destaque para aqueles das áreas tecnológica, das ciências agrárias e das biológicas, antes inexis-tentes); pela implantação de programas de mestrado e doutorado, os primeiros no interior da Amazônia (a exemplo de Bragança, Santarém e Castanhal)); pela contratação de mais de 400 do-centes e 150 técnico-administrativos para o quadro permanente dos campi (ampliando-o em mais de 200% em re-lação à situação anterior); pela descen-tralização de funções comissionadas e gratificadas, reduzindo as assimetrias históricas entre capital e interior e permitindo, agora, maior dedicação e profissionalismo à gestão universitá-ria; e pela expansão da infraestrutura predial e laboratorial (incluído o hos-pital Veterinário de Castanhal), num salto institucional sem precedentes na história da UFPA.

São conquistas significativas que, hoje, colocam a UFPA na rota de seu definitivo amadurecimento acadê-mico, com destaque nacional e interna-cional, apta a enfrentar os desafios do novo século com maior capacidade de inovação, talento e criatividade.

O rio Amazonas sobe todo ano, ao sabor do ciclo hidrológico. De janeiro a maio, as chuvas

castigam diariamente os moradores das beiras dos rios. Essas chuvas sa-zonais são importantes para garantir a produtividade das terras de várzea, pois carregam nutrientes alimentan-do os peixes e fertilizando os solos. Contudo, apesar da sua “previsibi-lidade”, muitas vezes, os habitantes ribeirinhos são pegos despreparados para as enchentes, por falta de recursos materiais ou tecnológicos. O fato é que eles não conseguem superar, de forma aceitável, as intempéries regulares do clima.

Neste ano, os meteorologistas anunciaram uma das maiores cheias dos últimos cem anos. Todavia, ima-ginar o sofrimento dos habitantes ribeirinhos é difícil para quem mora

nos confortáveis condomínios das grandes cidades, protegido da chuva e do sol. O noticiário da TV plasma informa sobre as enchentes e sobre o número de pessoas desabrigadas, no entanto, isso fica na nossa mente, como um filme... o sofrimento do povo parece muito distante de nossa realidade cotidiana.

Por motivo de trabalho, em abril, visitamos algumas das comuni-dades ribeirinhas dos municípios de Óbidos e Santarém. Nosso coração apertou ao ver a situação das mo-radias. Isoladas no meio de lagos e igapós, a única forma de comunicação entre as casas é de canoa. Quem não tem para onde fugir fica rezando para as águas não subirem mais ainda ou para parar de chover. As aulas foram suspensas, os barracões comunitários e as capelas ficaram alagados. Isolados

e rodeados de água, foram fechados na esperança de não se danificarem mais ainda. As crianças, que não têm mais um quintal para brincar, olham tristes pela janela, pulam de rede em rede e só tomam banho em volta da casa, na presença de adultos, por medo dos jacarés e das cobras, que agora estão muito perto das residências, na busca de presas fáceis.

Ao abordarmos com nossa em-barcação perto das casas, alegram-se. Pensam que somos funcionários da Defesa Civil voltando com a madeira necessária para levantar mais um pouco o assoalho das casas e tirar os poucos móveis de dentro da água. Tristes e desiludidos, recebem-nos para ouvir o motivo de nossa pesquisa, que nada tem a ver com os problemas que hoje os afligem.

Ao mesmo tempo, nos fundos

do IBAMA, em Santarém, descansam tábuas e troncos de madeira apre-endida de infratores da Lei. Por que não usá-las nas casas afetadas pela enchente? Não sabemos os motivos burocráticos que impedem medidas simples e, certamente, eficientes como essa.

Prevenção, organização social, planejamento seriam medidas adequa-das para o futuro. Mas como reagir agora, quando já não há mais como prevenir. Só nos resta remediar. De que adianta termos pena se nada podemos fazer? Ou será que ainda podemos?

Victoria Isaac Nahum é doutora em Ciências Marinhas pelo Institut Fuer Meereskunde e coordenadora do Laboratório de Ecologia Pesqueira e Manejo de Recursos Aquáticos/ICB.

BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009 – 11

Coluna do REITOR

OPINIÃO

Os avanços da UFPA na primeira década do milênio

Inundações na terra das águas grandes

Alex Fiúza de Mello

Victoria Judith Isaac Nahum

[email protected]

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

2 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009

lUrd

inH

a r

od

riG

Ues

Discurso e prática amorosa no novo séculoCom algumas modificações, modelo ideal ainda é o conto de fadas

Antropologia

Rua Augusto Corrêa n.1 - Belém/[email protected] - www.ufpa.br

Tel. (91) 3201-8036

[email protected]

ale

xan

dre

Mo

raes

Na avaliação da antropóloga, atualmente, o perfil de pessoas que se amam é o de pessoas carinhosas, que curtem dividir o tempo juntas, têm desentendimentos, mas entendem o amor como um sentimento que precisa ser cultivado diariamente. O amor é requisito para a felicidade, junto com a saúde, a realização profissional e finan-ceira. É por isso que o relacionamento ideal ainda está baseado nos moldes dos contos de fada, em que príncipe e princesa têm todas as condições favoráveis para uma união estável, duradoura, frutífera e feliz.

“O modelo de amor romântico é recorrente nas novelas, nos filmes e acaba se tornando referência. Se des-prender desse modelo é a melhor re-ceita para o sucesso, pois compreende que o amor é também realidade e vida prática. O amor ideal se constrói coti-dianamente”, conclui a pesquisadora.

Jéssica souza

Cupidos, corações flechados, olhares apaixonados, bom-bons de chocolate, buquês de

rosas... O amor está no ar. Mês de junho, mês dos namorados, é tempo de falar de amor. Diferentemente do que muitos pensam, o assunto não está restrito ao romantismo dos casais, dos filmes ou das mídias temáticas. O amor também é pauta de interesse acadêmico. “Falando de amor: discur-sos sobre o amor e práticas amorosas na atualidade” é o tema da tese de doutorado em Antropologia, que está sendo elaborada pela docente da Fa-culdade de Ciências Sociais da Uni-versidade Federal do Pará (UFPA), Telma Amaral Gonçalves.

Como desdobramento de sua dissertação de mestrado na mesma área, intitulada “E o casamento, como vai? Um estudo sobre a conjugali-dade em camadas médias urbanas”, a pesquisadora sentiu necessidade de aprofundar a temática amorosa. “Entrevistei vários casais acerca do que eles pensavam sobre o casamen-to. E quando se falava de casamento, um tema que aparecia sempre era o amor. E quando as pessoas falavam de amor, elas diziam: o amor é respeito, é paixão, companheirismo, diálogo, compreensão, amizade... Então, me surgiu esse questionamento: em que consiste este sentimento de amor?”, explica a pesquisadora.

O trabalho tem como metodo-logia a realização de entrevistas sobre o tema com pessoas que vivem uma parceria amorosa, tanto homo como heterossexual. São nove casais, sendo três parcerias heterossexuais, três par-cerias homossexuais femininas e três parcerias homossexuais masculinas, provenientes de camadas médias. Cada casal mora junto e tem, no mínimo, um ano de relacionamento. “A meta é ouvir dessas pessoas como

elas definem o amor. O que é o amor e como ele se reflete na prática amorosa que essas pessoas vivem. Isso implica pensar o amor teoricamente, enquanto conceito, e como ele se aplica na vida diária, como condiciona a forma de o ser humano ser e estar no mundo”.

A tarefa é desafiadora, pois o assunto ainda está disseminado, socialmente, como algo próprio da intimidade e, de acordo com Telma Amaral, muitas pessoas se sentem retraídas ao serem abordadas sobre o tema. “As minhas questões indagam sobre o que as pessoas fazem para demonstrar o amor que dizem que sentem uma pela outra, se, cotidia-namente, elas se beijam, se abraçam, fazem carinho, quem faz mais ou me-nos demanda sexual, se a vida sexual

tem se modificado com os anos de relação, por exemplo. Trabalho com um grupo inteiramente heterogêneo. São pessoas com idade, identidade sexual e tempo de relacionamento di-ferenciado. O tempo de parceria varia de três a 48 anos de vida em comum. Isso diferencia as demandas, as expe-riências, as histórias”, especifica.

A pesquisa ainda não foi con-cluída, mas a fase de entrevistas já permitiu que a professora fizesse algumas observações. A priori, as conclusões indicam que as parcerias falam de amor, sim, no âmbito da in-timidade, e que eles sempre falam de amor associando-o a outros sentimen-tos. Segundo a pesquisadora, a frase mais dita pelas parcerias entrevistadas é “que o amor não se define”, mas se

concretiza na vivência amorosa, em que se tece uma teia de associações e ressignificações que remetem ao sen-timento amoroso. Em alguns casos, um longo silêncio sucede à pergunta sobre o que é o amor, pois muitas pessoas têm dificuldade de defini-lo referencialmente.

Outra percepção é a de que, apesar das diferenças geracionais ou de orientação sexual, resguardadas as especificidades de cada relação, a vida em comum apresenta inú-meras similaridades. Os conflitos, a administração da vida diária e os sentimentos são muito semelhantes quando se trata de amor. A tese estará concluída dentro de um ano, prazo em que as referidas observações poderão ser ou não comprovadas.

n Amor pode ser construído lentamenteDe acordo com as investiga-

ções de Telma Amaral, uma caracte-rística muito comum às relações do século XXI é a de que pessoas que se amam compreendem que esse amor, um dia, pode acabar. “Nas décadas de 50 e 60, a mulher tinha um papel bem definido: não trabalhava e vivia para o lar e para o casamento. As re-lações nasciam para serem perenes. Em função disso, nas parcerias com

tempo maior de relacionamento, ainda são muito presentes as carac-terísticas daquele modelo em que existiam papéis delimitados e em que o casamento não era, necessariamen-te, baseado no amor, apesar do amor poder surgir como uma consequência dele. O amor estava associado ao conceito de construção”, explica a professora.

Isso era muito comum no pe-

ríodo em que existiam casamentos arranjados em que os cônjuges eram totalmente estranhos um ao outro. Ainda hoje, continua a pesquisadora, segundo o grupo entrevistado, mes-mo sendo um requisito básico para a formação de um par (não, necessa-riamente, homem/mulher), o amor é algo que também pode ser construído lentamente, no dia a dia, a partir de um conhecimento mútuo.

n E foram felizes para sempre

Os conflitos, a administração do cotidiano e os sentimentos são comuns em casais de diferentes gerações

cio

Fer

reir

a

Reitor: Alex Bolonha Fiúza de Mello; Vice-Reitora: Regina Fátima Feio Barroso; Pró-Reitora de Administração: Simone Baía; Pró-Reitor de Planejamento: Sinfrônio Brito Moraes; Pró-Reitor de Ensino de Graduação: Licurgo Peixoto de Brito; Pró-Reitora de Extensão: Ney Cristina Monteiro de Oliveira; Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-graduação: Roberto Dall´Agnol; Pró-Reitora de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal: Sibele Bitar Caetano; Prefeito do Campus: Luiz Otávio Mota Pereira. Assessoria de Comunicação Institucional JORNAL BEIRA DO RIO Coordenação: Luciana Miranda Costa; Edição: Rosyane Rodrigues; Reportagem: Ana Carolina Pimenta (013.585-DRT/MG) Andréa Mota/ Glauce Monteiro (1.869-DRT/PA)/ Jéssica Souza (1.807-DRT/PA)/ Rosyane Rodrigues (2.386-DRT/PE)/ Suzana Lopes/ Tatiara Ferranti/ Walter Pinto (561-DRT/PA) ; Fotografia: Alexandre Moraes/Mácio Ferreira; Secretaria: Isalu Mauler/Elvislley Chaves/Gustavo Vieira; Beira on-line: Leandro Machado/Le-andro Gomes; Revisão: Júlia Lopes/Glaciane Serrão; Arte e Diagramação: Rafaela André/Omar Fonseca; Impressão: Gráfica UFPA.

Sob a perspectiva da moderni-dade, os estudos de Telma sinalizam que a natureza social das relações sofreu muitas modificações e que in-fluenciam diretamente na qualidade e durabilidade do sentimento amoroso. “hoje, o sexo é mais informal, com-partilhar o mesmo espaço é menos contratual, o assédio de outras pessoas é muito grande e há facilidade de se

envolver em múltiplos relacionamen-tos. As relações surgem e se diluem com maior fluidez e imprevisibilida-de”, comenta.

Segundo Telma Amaral, a necessidade humana de amor advém de um estímulo emocional que pres-supõe o ser humano como um sujeito cultural que precisa se relacionar, não só por instinto ou por conven-

ção social. “Por isso que, quando as relações se rompem ou o amor deixa de ser recíproco, as pessoas tendem a desejar um outro relacionamento ou a desacreditar que um outro amor seja possível”. hoje, a tendência é desmitificar algumas crenças, a partir da compreensão de que o amor não é único, não surge do nada, não é igual para todos e nem é definitivo.

n Fluidez e imprevisibilidade nas relações

Page 3: Beira 73

10 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009 BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009 – 3

Viajantes ainda são fontes de pesquisaCrônicas e relatos de viagem auxiliam produção científica sobre a região

Amazônia

"Três Sentidos" na obra de Paulo PlínioA obra, fruto de dissertação de mestrado, será lançada ainda neste mês

Paixão de LER

Ilustrações de Hans Staden, André Thevet e Jean de Léry mostram o olhar do viajante diante da paisagem e população amazônicas

PRÓXIMOS LANÇAMENTOS LIvRARIA dA PRAÇA

n “MARAJÓ”, de dalcídio jurandir, com participação de rosa assis, responsável por esta edição crítica.

n 3 SENTIdOS dA OBRA dE PAULO PLÍNIO, célia Bassalo.

n POESIAS, Paulo Plínio.

n RIO BRANCO: A CIdAdE dA FLORESTANIA, Mâncio cordeiro e Marianne schmink.

n AS AMAZÔNIAS dO SÉC. XXI, sérgio rivero e Frederico jayme júnior.

n HISTÓRIAS dO XINGU, césar Martins de souza e alírio cardozo.

n Parmenides e Filebo, COLEÇÃO dIÁLOGOS dE PLATÃO. tradução Benedito nunes.

livraria da Praça: instituto de ciências da arte da UFPa. Praça da república s/n Fone: (91) 3241-8369

rua augusto corrêa, n.1, campus Universitário do Guamá.telefax: (91) 3201-7965 Fone: (91) 3201-7911

As nacionalidades, os objeti-vos e a quantidade de viajantes são tão grandes que eles têm sido usados não só como fonte, mas também como objetos de estudo em si: a própria viagem, o próprio viajante. É o caso da tese “Viagem e Turismo, conceitos na literatura e nos relatos de viagem”, do professor do Naea, Silvio Lima Figueiredo. A obra procura compreender, por meio dos relatos e crônicas de viagem, verídi-cos ou ficcionais, como as ideias de viagem, turismo, viajante e turista foram sendo construídas ao longo dos anos.

A tese parte do princípio de que as concepções de viajantes e turistas encontradas nos relatos e na literatura de viagem ajudaram a construir personagens e ações este-reotipadas. Assim, o viajante seria aquele que viaja com propósito mais “nobre”, que procura na experiência da viagem a compreensão do mundo e de sua própria existência. No pas-sado, seriam os descobridores e os naturalistas. Na atualidade, os cien-tistas com suas pesquisas de campo e, até mesmo, mochileiros em busca de novas aventuras e descobrimentos.

Já o turista é visto como o falso viajante, uma alegoria dos monu-mentos e florestas. Silvio Figueiredo

explica que, por trás desse discurso, repousa um preconceito classista; as críticas ao turismo e ao turista são fruto de uma leitura preconceituosa das viagens de turismo de massa, empreendidas pela classe média mundial. “O que se pôde constatar nos textos analisados é uma percep-ção do turismo como a contrapartida da viagem. Ou seja, se, por um lado, a viagem engrandece o espírito, por outro, o turismo é baseado em mode-los de produção em série, em pacotes de entretenimento sem essência”, aponta o autor.

Para o pesquisador, as agên-cias de viagem, responsáveis pelo turismo-mercadoria, reforçam essa visão do turista como um sujeito alienado. Isso conduz a uma outra reflexão: quais são as opções ofereci-das? Na Amazônia, por exemplo, são poucas as iniciativas que conduzem o viajante a uma experiência mais profunda e transformadora. O turis-mo sustentável, por exemplo, ainda é algo muito pontual e restrito para poucos, em sua maioria, estrangeiros. Déjà vu? O fato é que esses viajantes chegaram e continuam chegando à região, mas se, no passado, eram os relatos de viagem, hoje, são os arti-gos, as teses, as imagens de satélites, os blogs...

Ana Carolina Pimenta

A partir de meados do século XVI, tem início, na Amazônia, uma intensa movimentação de

viajantes europeus movidos, sobretu-do, por um vivo desejo de conhecer as riquezas e desvendar os mistérios da floresta tropical. Nos primórdios, eram aventureiros e exploradores em busca do Eldorado e da Terra das Amazonas. Já no século XVIII, desenvolve-se um interesse científico pelo Novo Mundo e surge a figura do viajante naturalista. À medida que

aumentava o número de expedições, crescia, também, o número de relatos e de crônicas acerca da biossociodi-versidade da região. Transcorridos quase cinco séculos, os registros, seja por meio da palavra escrita, seja por desenhos, seja por fotografia, podem ainda ser muito úteis na produção científica atual, em diferentes áreas.

Apesar das interferências de-sordenadas entre populações e ecos-sistemas da região ao longo de todos esses anos, as correspondências e os diários de campo, com ou sem ilustrações, de cronistas, como Pero

Vaz de Caminha, Padre Anchieta, hans Staden, André Thevet e Jean de Léry, e de viajantes, como frei Gaspar de Carvajal, Spix e Martius, Alfred Wallace, henry Bates, Alexandre Rodrigues Ferreira, La Condamine, henri e Octavie Coudreau, ainda são importantes fontes para as pesquisas sobre a Amazônia neste século.

O biólogo e professor do Nú-cleo de Altos Estudos Amazônicos (Naea), Juarez Pezzuti, explica que os relatos dos viajantes europeus ba-lizam estudos acerca da etnoecologia, da ecologia e do manejo da fauna na

Amazônia. Dos relatos de viagem, podem ser extraídas importantes informações sobre os hábitos e os conhecimentos tradicionais dos povos amazônidas de gerações passadas. Narrativas como as do viajante inglês henry Bates mostram, por exemplo, que a caça indiscriminada não é um problema recente: ovos de tartarugas eram colhidos de forma predatória para serem usados na fabricação de óleo para manter a iluminação públi-ca e os peixes-boi eram caçados por sua carne e couro, à luz dos séculos XVIII e XIX.

n Relação homem-natureza O professor esclarece que as

fontes documentais desses naturalis-tas ajudam a compreender, por exem-plo, como determinadas espécies animais sofreram redução drástica no estoque por desempenharem uma im-portância vital para certas populações humanas. Segundo as publicações de Bates, a tradição indígena garantia que, “nos primeiros tempos, tantas eram as tartarugas na água, quanto os mosquitos no ar.” Já a partir do século XVIII, ocorre uma drástica predação dos ovos. No período compreendido entre os anos de 1700 e 1860, estima-se que foram colhidos de 12 a 48 milhões de ovos por ano (!) para a produção de óleo. Atualmente, as tar-tarugas fluviais são protegidas, mas a analogia relatada pelos indígenas já não é mais cabível.

“Às vezes, para compreender-mos como se dava a exploração dos recursos naturais em épocas passadas, os relatos de viagem são nossa única fonte”, observa o professor sobre a escassez de publicações científicas que retratam a relação homem-natu-reza nos séculos XVI ao XIX. Mas, apesar da importância das narrativas e dos registros iconográficos desses viajantes/naturalistas, Juarez Pezzuti diz que os relatos ainda são subapro-veitados nas Ciências Biológicas.

Situação que não pode ser verificada no estudo da história, disciplina em que a produção dos viajantes ocupa lugar de destaque.

A historiadora Moema de Bacelar Alves, que, atualmente, par-ticipa da produção de um livro sobre os viajantes na Amazônia brasileira, acredita que, nas últimas décadas, os relatos dos viajantes vêm sendo mais explorados por fornecerem informa-ções sobre temáticas, como gênero, grupos étnicos e costumes. Alguns deles vêm ganhando destaque para a elaboração historiográfica por suas descrições pormenorizadas sobre a economia, a sociedade e a cultura.

No entanto, a pesquisadora alerta que os relatos dos viajantes europeus que passaram pela Amazô-nia não são a pura expressão do real, mas, sim, representações elaboradas a partir de componentes ideológicos, conceitos, pré-conceitos, noções e toda uma carga cultural que condi-cionam o olhar e as impressões dos viajantes. “O discurso do exótico, que ainda se profere hoje, deita raízes nos inúmeros relatos de viajantes que, durante os séculos XVII, XVIII e XIX, estiveram por aqui produzindo as visões e interpretações do que era a nossa região no momento dessas ‘visitas’”, ressalta.

n Turistas ou viajantes?

Laïs Zumero e Giselda Fagundes

O livro “Três sentidos fundamentais na obra de Paulo Plínio Abreu”, de autoria de Célia Coelho Bassalo, professora

da Universidade Federal do Pará, é produto de sua dissertação de mestrado, recomendada para publicação pela banca composta Benedito Nu-nes, Ápio Campos e Francisco Paulo Mendes, professores eméritos da UFPA.

A publicação é oportuna, pois seu lan-çamento segue a 2ª edição, pela Edufpa, de “Poesia”, única obra do autor, há muito exigida pela Academia e pelos círculos literários pela importância de seu texto poético e de suas tra-duções de Rilke e T.S. Eliot.

O tema central da obra é a produção lite-rária do reconhecido poeta paraense. Trata-se de uma crítica extensiva, uma verdadeira súmula de temas recorrentes do poeta – infância, viagem e morte.

A professora Célia Coelho Bassalo estuda, prioritariamente, a prática artística de Paulo Plí-nio diante dos eventos, a natureza da formação espiritual do poeta e o objeto de sua indagação – a linguagem. É um texto contemporâneo, sob a ótica da estilística e da semiologia, que a Edito-ra, com muito orgulho, entrega à comunidade.

Paulo Plínio surgiu na literatura paraense entre os anos de 1940 e 1950. Seus primeiros poemas foram publicados no Suplemento Arte-Literatura, do Jornal Folha do Norte e nas re-vistas “Novidade” e “Terra Imatura”. O poeta parte de uma visão meditativa e transfiguradora do real, à semelhança dos grandes poetas român-ticos, sobretudo, de Rimbaud, que procuravam apreender, por meio da linguagem, aquilo que o mundo contém de mítico, místico, obscuro e inefável.

Célia afirma que “o texto de Paulo Plínio é sempre (des)-velador de algo que pode estar dentro ou fora da própria realidade. Essa reve-lação ou (re)-velação nos é transmitida por meio de uma prática, a da escritura, a qual abarca o exercício de uma atividade voluntária e defor-madora de tudo o que nos envolve”.

“Nossa intenção é proceder a uma leitura em que os poemas de Paulo Plínio sejam inter-pretados não como códigos estáveis, conhecidos, estereotipados, mas como textos suscitadores, sempre, de outra escritura mental feita pelo leitor, pois, como escritura, possuem, também, um caráter único, autorreferencial, oferecendo ao leitor a marca e o gozo dos textos verdadei-ramente literários”, explica a professora.

Consciente de que o ser humano é li-vre para fabricar e manipular representações, atribuindo-lhes valores de acordo com sua própria vontade, Paulo Plínio cria e enriquece símbolos que, por sua vez, sublinearmente ou não, já representavam outros símbolos. Desse modo, para qualquer direção que o leitor volte os olhos encontrará um tecido não acabado, mas

De acordo com a autora, o livro ajudará o leitor a interpretar os textos do poeta paraense

em constante processo de simbolização.Por meio de um criterioso e acurado trabalho, Célia

Coelho Bassalo divulga, com brilho e originalidade, a obra do poeta, assim contribuindo para que todos desfrutem do talento deste escritor de mérito reconhecido e incontestável, de aguda sensibilidade e de concisa e delicada linguagem.

“Três sentidos fundamentais na obra de Paulo Plínio Abreu” será lançado com a obra de Plínio “Poesia”, neste mês, em evento comemorativo coorganizado pelo Instituto de Letras e Comunicação.

LIvRARIA dO CAMPUS

rePr

od

ão

Page 4: Beira 73

4 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009

Pororoca é cartão postal de São DomingosTurismo

Políticas públicas desarticuladas não favoreceram a economia local

BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009 – 9

Saponificação retarda rotatividadeAnálise comprova fenômeno válido para toda a Amazônia

Cemitérios

suzana Lopes

O município de São Domingos do Capim começou a ganhar visibilidade na mídia regional,

nacional e internacional a partir de 1999, ano da criação do Campeonato de Surfe na Pororoca. Desde então, com investimentos do poder público esta-dual, por meio da Secretaria Executiva de Esporte e Lazer (Seel) e da Prefei-tura, vislumbrou-se a potencialidade do turismo no município e se iniciou a implementação de políticas para o desenvolvimento do setor.

Na dissertação “Nas ondas da pororoca: repercussões socioespaciais da atividade turística no município

de São Domingos do Capim (Pará)”, orientada pelo professor Saint-Clair Trindade, Jorge Alex de Almeida Souza analisou os impactos das políticas de turismo sobre o espaço geográfico e o modo de vida local.

Lançando mão da dialética es-pacial, método teorizado por Lefebvre, Jorge Alex fez um percurso pelo passa-do do município para entender como o fenômeno da pororoca era vivido pela população capimense antes da ativida-de turística mais intensa e como ele se constitui no presente, a fim de vislum-brar possibilidades para o futuro.

Nessa volta à história de São Domingos do Capim, o pesquisador conta, com a propriedade de quem

viveu parte da infância no local, que, antes da pororoca se tornar conhecida pelo campeonato de surfe, a população do município já possuía uma prática social sobre as ondas. “há muito tempo, as pessoas têm uma relação de lazer com a pororoca, que é o “aparar” a pororoca; elas se jogam no rio. Existe até uma relação de poder, na medida em que enfrentar a onda é considerado uma prova de coragem”.

O turismo incorporou ao modo de vida local, essencialmente ribeiri-nho, experiências urbanas, modificando não só a paisagem do município, mas também o espaço das representações, ou seja, o uso, o lazer e as representa-ções sobre a pororoca.

Enquanto a população local "apara" as ondas, os turistas usam jet ski, pranchas e lanchas

n O rio, o barco e o trapiche: objetos significativosÉ praticamente consenso entre

os pesquisadores sociais da Amazô-nia que o modo de vida ribeirinho é composto de três objetos espaciais mais significativos: o rio, o barco e o trapiche.

O rio é o meio de circulação de mercadorias e pessoas, um espaço de comercialização e transporte, mas também um rico desenrolar de va-lores simbólicos, vivências e mitos. Nas palavras de Jorge Alex, “são os cursos fluviais que movimentam so-nhos, desejos, encontros e modos de vida. É por meio dos espelhos d’água que o homem amazônida cria seu próprio mecanismo de usar o espaço e o tempo”.

O barco, por sua vez, além da dimensão material de veículo de transporte, contém aspectos culturais, como as cores, os nomes, o valor afe-tivo do dono pelo objeto. O trapiche é o espaço da convivência, do hibri-dismo dos modos de vida ribeirinho e urbano, onde se localiza o comércio,

o embarque-desembarque, as práticas sociais, as conversas. Na dissertação, Jorge Alex defende que, além desses três elementos, São Domingos do Capim possui mais dois objetos espa-ciais que caracterizam a sua vivência ribeirinha: as igrejas e a pororoca.

“As igrejas e as capelas são referências porque são marcas da colonização feita pela Igreja Católica. Por exemplo: uma influência muito presente em São Domingos do Capim são as comunidades eclesiais de base, que ajudaram a formar várias organi-zações no município. Sem contar que a visão religiosa ainda se manifesta na explicação dos fenômenos, como a própria pororoca”, explica o pesqui-sador. Quanto à pororoca, Jorge Alex considera como um elemento ribeiri-nho marcante no município porque ela sempre faz parte da prática social dos capimenses, na atividade lúdica de “aparar” as ondas.

O modo de vida de São Domin-gos sofreu alterações socioespaciais

com a implementação do turismo. O rio deixa de ser a única via de trans-porte, já que, para facilitar o acesso ao município, foi aberta e asfaltada a Rodovia PA-127. Ao lado dos barcos, outros tipos de embarcações e objetos se fazem presentes, como os veleiros, o jet ski e a própria prancha de surfe. O trapiche passa a ser um local de in-tensa hibridização de temporalidades, onde convivem práticas de estrangei-ros e nativos que concebem e utilizam o espaço de diferentes maneiras.

A religiosidade local perde espaço no período do turismo, pois o fenômeno acontece próximo à Se-mana Santa. Por fim, a própria poro-roca ganha um significado e um uso diferente após o início da atividade turística em São Domingos do Capim. O fenômeno adquire a dimensão de natureza exótica e passa a ser mun-dialmente conhecido e vendido como o lugar do surfe na Amazônia. Em vez de se “aparar” as ondas, agora se passou a surfá-las.

n Eventos não tinham vínculo

Quando, em 1999, se iniciaram as políticas públicas de turismo em São Domingos do Capim, o poder e a população locais viam, na nova atividade, uma potencialidade e uma alternativa para a economia do muni-cípio. Mas a falta de articulação entre as medidas municipais e estaduais e a forma excludente como o processo foi implementado contribuíram para que o turismo perdesse fôlego nos últimos anos.

Enquanto o Estado se voltava para a promoção do Campeonato de Surfe na Pororoca, a Prefeitura or-ganizava o Festival da Pororoca. Os eventos aconteciam simultaneamente, mas sem vínculo efetivo entre si. Ou seja, os poderes públicos atuavam de forma isolada, não implementando uma política consistente de turismo.

Outro problema foi a relativa exclusão da população local das ati-vidades turísticas. Os campeonatos eram pensados e executados para o público visitante e urbano. Os ha-bitantes do município, no máximo, serviam de guias turísticos e comer-cializavam algumas mercadorias.

O resultado é que, em 2005, o turismo começa a perder força e, em 2008, a Seel tira o foco do Cam-peonato de Surfe do município para outras localidades paraenses. Para Jorge Alex, seria necessário investir em outros atrativos turísticos. “Eu posso citar o patrimônio histórico, o ecoturismo e o turismo comunitário, pois existem localidades com gran-des potenciais naturais e culturais”. O maior desafio é implementar um turismo que contemple e inclua o modo de vida local.

São Domingos do Ca-pim e a Pororoca

Município localizado no nor-deste paraense, são domingos do capim tem como base econômica a pecuária, a produção e comerciali-zação da farinha e o extrativismo. a partir de 1999, passou também a integrar atividades turísticas à sua economia, quando se tornou conhecido pelo campeonato de surfe na Pororoca.

Pororoca é o nome indígena que designa o fenômeno natural de ondas fortes e estrondosas, causado pelo encontro das águas dos rios amazônicos com o mar. antes de ser utilizada para a prática do surfe, a pororoca já fazia parte das ativi-dades lúdicas da população local. as pessoas “aparavam” a onda, ou seja, jogavam-se contra o rio ou fixavam-se em um poste e deixa-vam que a onda passasse por elas. atualmente, somente o Festival da Pororoca é realizado, com intensa programação cultural, em março.

As recentes descobertas dos geofísicos no estudo de cemitérios foram realizadas com auxílio de uma nova tecnologia de leitura de subsuperfície, o radar de penetração do solo (GPR), modelo SIR – 3000, da GSSI com antena de 400 Mhz. Semelhante a uma enceradeira, o radar atua como um escâner que faz leitura de subsuperfície até a profundidade de 15 metros. Empre-gando o GPR e o método Slingram, o professor Waldemir Gonçalves Nascimento realizou o estudo “In-vestigação geofísica ambiental e forense nos cemitérios do Benguí e do Tapanã”, sob orientação de Lúcia Costa e Silva. O trabalho tornou-se a primeira dissertação de mestrado em Geofísica Forense do Brasil.

No Benguí, o GPR foi empre-gado na detecção do nível hidrostá-tico, considerando que, na implanta-ção de um cemitério, a informação mais importante é a profundidade do aquífero. No Tapanã, utilizou-se o GPR e o Slingram em levantamentos mensais a fim de detectar a profundi-dade do aquífero, monitorar a conta-minação e, especialmente, encontrar alvos forenses num campo de testes instalado naquele cemitério, autori-zado pela Prefeitura de Belém.

O Campo de Testes Controla-dos de Geofísica (Foramb) ocupa uma área de 13x10 m. Foi construído de modo a permitir testes de interesse da criminologia, uma recente aplica-ção com vistas à detecção de covas clandestinas, restos mortais, pessoas vítimas de soterramentos, túneis sub-terrâneos e armamentos enterrados.

Nele, foram enterrados o corpo de um indigente cedido pelo Instituto Médico-Legal; uma caixa oca, simu-lando um túnel para fugas construído em penitenciárias e uma caixa fecha-da contendo metais com peso equiva-lente a um conjunto de armas, a fim de simular armamento enterrado para despistar seu roubo.“Na literatura, são comumente encontrados campos de testes realizados com animais, em geral suínos”, informa Waldemir Nascimento.

A pesquisa mostrou que a utilização do GPR na Geofísica Forense consegue localizar extre-mamente bem cadáveres e túneis. A caixa simulando armamentos não foi detectada nos primeiros meses, mas somente após o começo das chuvas. Além disso, evidenciou que a fase de decomposição humana também deixa registro, seja pela ampliação do sinal produzido pelo cadáver, seja pela observação do sinal que acompanha o fluxo hidráulico.

Uma característica importante do campo de testes é que ele vem sendo usado por dezenas de alunos de graduação e de pós-graduação e está aberto para acompanhamento dos testes por profissionais relacionados à área forense.

Walter Pinto

A pesquisa científica quando sai dos laboratórios e faz do ambiente seu campo de prova,

defronta-se, muitas vezes, com reali-dades que, por mais desagradáveis, não podem ser negligenciadas pelos pesquisadores, sob pena de se torna-rem impactos ambientais de graves consequências. O estudo, coordenado pela professora Lúcia Maria da Costa e Silva, em 1996, por exemplo, com-provou que o cemitério do Benguí, em Belém, estava contaminando o fluxo de água subterrânea que segue para a área residencial vizinha. A pesquisa, junto com a análise da água, motivou o fechamento do cemitério.

A legislação estadual que dis-põe sobre requisitos e condições téc-nicas para implantação de cemitérios, a segunda implementada no Brasil, determina que, após o fechamento de um cemitério, seja realizado o moni-toramento das águas subterrâneas por um período de dez anos. A Secretaria do Estado de Meio Ambiente deveria solicitar à Secretaria Municipal de Meio Ambiente a análise das águas

a cada seis meses. A lei estadual não está, contudo, sendo cumprida, obser-va Lúcia Costa e Silva, que participou da elaboração da referida lei.

Os novos cemitérios públicos de Belém, como o do Benguí e o do Tapanã, foram implantados dentro do conceito de rotatividade. Periodica-mente, a Prefeitura realiza a exumação observando o tempo de inumação – sete anos para homens e três para crianças até sete anos – período em que o processo de putrefação já teria cumprido suas quatro fases.

Exumação – No entanto, pesquisa-dores da Faculdade de Geofísica da UFPA comprovaram um fenômeno no cemitério do Benguí: a saponificação dos corpos. Trata-se de processo de conservação cadavérica que interrom-pe qualquer um dos quatro estágios da putrefação, postergando-o e, con-sequentemente, retardando em vários anos qualquer tentativa de exumação. A saponificação é provocada pela umi-dade excessiva no terreno ao redor da cova, transformada, então, numa espé-cie de tanque de conservação. Lúcia Costa e Silva observa que a legislação

municipal, baseada em normas do período colonial, está em flagrante oposição à realidade amazônica e que, em outros países, onde a ocorrência da saponificação é remota, a exumação só é realizada após 25 anos.

O cemitério do Benguí foi de-sativado em 1997. Ocupa uma área de 450x600 m² absolutamente imprópria para abrigar um cemitério, porque o nível hidrostático é inferior a 1,20 m no inverno, ou seja, a água entra nas sepulturas, caso não reportado na literatura. O que mais surpreendeu os pesquisadores da área de geofísica da UFPA é que o fenômeno da saponifi-cação não está restrito ao baixo terreno do cemitério desativado. Também no Tapanã, edificado sobre um terreno alto, com nível hidrostático em torno de 7,5 metros, os estudos registraram o fenômeno.

No Benguí, a exumação e a limpeza da área são necessárias para eliminar a contaminação e para uma futura reutilização em outra finalida-de. Quanto ao Tapanã, a exumação é parte do processo de rotatividade, liberando sepulturas para novos en-terramentos.

No cemitério do Tapanã, umidade excessiva do terreno faz da cova uma espécie de tanque de conservação cadavérica

n Argila facilita saponificação no TapanãDiferentemente da situação ex-

trema do Benguí, o Tapanã, aparente-mente, apresenta condições ideais para abrigar um cemitério, mas a análise da subsuperfície apresentou uma caracte-rística típica da Amazônia: a presença excessiva de argila. Impermeável, ela retém a água da chuva, formando um grande bolsão de lama em torno do ca-dáver, cujo desenvolvimento, durante vários meses, foi monitorado pelos pesquisadores com instrumentação sofisticada. É essa lama a responsável pela saponificação.

Os coveiros do cemitério in-formaram aos pesquisadores que a saponificação está impedindo a rea-

lização de exumações periódicas. A situação tende ao agravamento, pois o cemitério já enfrenta problemas de superlotação, que motivaram o uso das passarelas de terra para sepulta-mentos, bem como a construção de um novo ossuário, eliminando, assim, o depósito num dos banheiros. A porção final do cemitério, por sua vez, não pode ser ocupada, porque o lençol de água subterrânea está muito próximo da superfície.

“Nossos estudos mostram que a saponificação é frequente. Isso vale para a Amazônia inteira. A solução mais viável é o forno crematório”, alerta Lúcia Costa e Silva, diante da

proposta da Prefeitura de construir um cemitério vertical. Comparando os dois tipos, a pesquisadora ressalta que a cremação é rápida, eficiente, agride menos o ambiente e precisa, apenas, de um bom dispositivo para filtrar odores, enquanto o cemitério vertical requer tratamento de gases e líquidos produzidos. Pesquisa de opinião re-alizada pelos pesquisadores mostra que, ao contrário do que muitos po-dem pensar, a cremação é aceita pela população. O Pará é o único Estado brasileiro com dois crematórios parti-culares. Em muitos países, há centenas de crematórios, caso dos EUA, Japão e Alemanha, entre outros.

n Pioneirismo na Geofísica Forense

cio

Fer

reir

a

sain

t-cl

air

trin

dade

Page 5: Beira 73

Aquecimento Global

8 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará –Junho/Julho, 2009 BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009 – 5

Amazônia deve ficar mais seca e quente

Praça é espaço democrático de lazerEstudo faz mapeamento das áreas de turismo e diversão em Belém

Políticas Públicas

Consequências das mudanças climáticas já são sentidas nos centros urbanos

EM dIA

Engana-se quem pensa que a substituição da floresta por pastagem reduz as chuvas. A dissertação “A influência do arco do desmatamento sobre o ciclo hidrológico da Amazô-nia”, de Josivan Beltrão, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais do IG/UFPA, indica que essa redução ocorre em determinadas regiões, mas aumenta em outras, tanto no período chuvoso como no período de estiagem.

Segundo Josivan Beltrão, que considerou, na pesquisa, o modelo de superfície de terra com vegeta-ção dinâmica, no Estado do Pará, há redução de 25% do índice pluvio-métrico no período chuvoso, tendo diminuído, em até 15%, na estiagem. Porém, no Estado do Amazonas, é no verão que acontece a maior redução de chuva, tanto em volume quanto em área de abrangência.

Para o período de 1850 até 2000, registros globais mostram que a temperatura e o nível do mar estão

aumentando e a cobertura de neve e gelo tem diminuído. Considerando o cenário de desmatamento para o ano de 2050, a pesquisa aponta aumento da temperatura e do vento e diminuição, em 20%, de chuva na zona costeira.

“Se os índices de desmata-mento se mantiverem, podemos esperar uma Amazônia mais seca e quente nos próximos 50 anos”, esti-ma Josivan Beltrão. O pesquisador ainda alerta ser necessário que a comunidade esteja atenta aos danos que a retirada da cobertura vegetal do planeta possa gerar, “as pessoas precisam ter consciência de que o desmatamento atual pode provocar uma seca mais violenta no futuro e dias mais quentes”. Os desmatamen-tos e as queimadas já são responsá-veis pela maior parte das emissões brasileiras de CO2 na atmosfera.

Segundo a professora e orien-tadora da dissertação, Julia Cohen, o estudo foi mais específico, pois

avaliou o impacto do desmata-mento sobre o clima na Amazônia utilizando um modelo atmosférico de alta resolução (30 Km), o que permitiu examinar o papel dos rios, da topografia e de diferentes tipos de cobertura de vegetação. Também foram utilizados cenários de desma-tamento, e não o desmatamento por completo.

Mas, que outros problemas o aquecimento global pode causar? Segundo a professora Julia Cohen, alagamentos, doenças, problema com a produção de grãos, especial-mente na Ásia, onde é crescente o risco de inundações, a perda da biodiversidade da Amazônia e a mudança no fluxo dos rios.

O documentário “Uma ver-dade inconveniente”, dirigido por Davis Guggenheim e vencedor do Oscar, faz um questionamento ins-tigante: “o planeta nos traiu ou nós traímos o planeta? Será esta a maior crise da história?”.

ale

xan

dre

Mo

raes

Tatiara Ferranti

Furacões, chuvas prolongadas, ciclones, propagação de doen-ças, como malária e dengue,

extinção de espécies animais e vege-tais, enchentes, secas, alagamentos, estiagens prolongadas ou deserti-ficação de algumas áreas e, princi-palmente, aumento da temperatura da atmosfera. Essas são as princi-pais consequências do aquecimento global, fenômeno que se refere à elevação da temperatura média dos oceanos e do ar próximo à superfície terrestre.

A dissertação de mestrado “Tempestades severas na Região Metropolitana de Belém: avaliação das condições termodinâmicas e impactos socioeconômicos”, de João

Paulo Nardin Tavares, defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais do Instituto de Geociências da UFPA, com apoio do Museu Paraense Emílio Goeldi e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agro-pecuária (Embrapa), aponta questões relevantes quanto à incidência de chuvas extremas no período de 1987 a 2007.

A pesquisa revela que, nesse período, a cidade cresceu e as chuvas ficaram até duas vezes acima da média climatológica (que é de 2.000 mm por ano). Isso aconteceu em decorrência da elevação dos valores das condições termodinâmicas. “De 1987 a 2007, houve um aumento significativo de 0,5°C nas temperaturas máximas do dia em Belém devido ao aquecimento global, o que resultou em tempestades

mais intensas e frequentes”, informa João Paulo Tavares.

Segundo o estudo orientado pela professora Maria Aurora Mota, a incidência de tempestades na capital aumentou a partir dos anos 80, quan-do o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) mostra o início do aquecimento global. Já em 1990, é constatada uma maior frequ-ência de tempestades e o aumento da temperatura da terra.

A partir de 1994, há um volume maior de chuvas que, segundo João Paulo Tavares, ocorre em decorrência do crescimento desordenado das cida-des. “Os centros urbanos se tornam mais quentes do que a periferia e isso pode causar fortes chuvas por causa do aumento da temperatura e da polui-ção concentrada. Se continuar assim,

as tempestades ficarão cada vez mais severas”, alerta.

De acordo com o pesquisador, o crescimento populacional e a ocu-pação desordenada aumentam a vul-nerabilidade da sociedade aos eventos extremos. “Na estação chuvosa, as tempestades podem durar mais de 24 horas. Em tempo de seca, elas são mais intensas, com rajadas de vento, pancadas de chuva de curta duração, raios e, eventualmente, granizo”, avalia João Paulo Tavares.

As consequências são: pessoas desabrigadas, cidades sem iluminação e prejuízos financeiros. João Paulo Ta-vares defende a preservação e a criação de áreas verdes na cidade, além da educação ambiental, que minimizaria os impactos das tempestades e ameni-zaria a temperatura da cidade.

Aumento de temperatura e poluição concentrada são causas das fortes chuvas que atingem os grandes centros

Soluções para diminuir o aquecimento global

• Colaborar para o sistema de coleta seletiva de lixo e de reciclagem;• Usar, ao máximo, a iluminação natural nos ambientes domésticos;• Não desmatar nem provocar queima-das nas florestas. Pelo contrário, plantar mais árvores;• Diminuir o uso de combustíveis, como gasolina, dísel e querosene, e aumen-tar o consumo de biocombustíveis e etanol;• Regular, constantemente, os automó-veis para evitar a queima de forma desregulada e usar catalisador em escapamentos de veículos;• Instalar sistemas de controle de emis-são de gases poluentes nas indústrias;• Ampliar a geração de energia por meio de fontes limpas e renováveis: hidrelétrica, eólica, solar, nuclear e maremotriz. • Deixar o carro em casa e usar trans-porte coletivo ou bicicleta, sempre que possível;• Usar técnicas limpas na agricultura para evitar a emissão de carbono.

n Previsão é de calor e ventos fortes

Fonte: (http: //www.suapesquisa.com/pesquisa/solucoes _aquecimento_global.htm)

A pesquisa também inves-tigou outras percepções sobre a temática “lazer”. Foram entrevis-tadas cerca de 30 pessoas, esco-lhidas aleatoriamente, nas praças Batista Campos e da República. Um dos questionamentos era: existem políticas públicas de lazer em Belém? 57% dos entrevista-dos afirmaram ignorar qualquer política nesse sentido. Os dados revelam que as reivindicações de ações nessas áreas são pequenas, pois o lazer ainda não é reconhe-cido como um direito. Mas, o que seriam políticas públicas de lazer? Para 63% dos entrevistados, po-lítica pública de lazer refere-se à

criação e manutenção de espaços públicos voltados para esse fim.

Diante da multiplicidade de indagações, algumas questões aparecem: afinal, o que seria la-zer? O lazer estaria diretamente relacionado à criação de espa-ços? Jéssika França defende o lazer como cultura em sentido amplo - qualquer atividade pode ser considerada lazer desde que gere prazer ao ser humano. Nesse sentido, Jéssika França trabalha na compreensão de que nem todo trabalho pode ser percebido como alienante e penoso nem todo lazer pode ser visto como prazeroso, “uma vez que é resultado da mes-

ma sociedade excludente e de seu modo de produção”.

Para a professora, “a di-nâmica dos espaços está sendo pensada dentro de uma lógica mercadológica de construção de redes de infraestrutura, deixando para último plano as experiências resultantes das vivências de lazer, as possibilidades de sociabilidade, a humanização e o exercício da cidadania”. Para modificar esse quadro, a pesquisadora incentiva maior participação da sociedade civil na construção de ações pú-blicas no campo do lazer, a fim de melhor contemplar os anseios e as necessidades de todos.

Andréa Mota

De segunda a sexta, às 6h da manhã, Belém acorda. Trânsito, carrinhos de ta-

pioca, Ver-o-Peso movimentado. É hora de trabalhar! Nos fins de sema-na, a cidade ganha outra dinâmica. há quem vista sua melhor roupa na hora de sair e se divertir, aprovei-tando a folga da rotina. Mas, e se as pessoas pudessem ter lazer todos os outros dias em vez de só nos fins de semana, ? É com essa reflexão que a professora Jéssika Paiva França de-senvolveu a dissertação “Políticas públicas de lazer no município de Belém-PA: concepções e interven-ções”, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Serviço Social, da Universidade Federal do Pará, sob a orientação da professora Olinda Rodrigues.

Pensar o lazer como ele-mento do cotidiano faz parte de discussões recentes. Segundo a pes-quisadora, o tema só passou a ser investigado pelas Ciências Sociais em meados do século XX, durante o processo de industrialização e urba-nização no mundo. Entretanto, um lazer pensado ainda como “tempo livre, enquanto sobra do tempo de trabalho”. Acompanhando as con-cepções do tema, os debates sobre direito, cidadania e participação

impulsionaram as reflexões do lazer no âmbito das políticas públicas. Na constituição de 1988, o lazer se configurou como direito social, direito do trabalhador, práticas desportivas para promoção social e dever das famílias sobre crianças, jovens e idosos.

Diante da compreensão de lazer no âmbito do direito social, a pesquisadora estudou as possibili-dades de haver políticas voltadas à manutenção desse direito nos dias atuais. Em sua dissertação, Jéssika

Paiva França analisou, além das políticas públicas, características e concepções do tema, da criação e da organização de espaços públicos e fez o mapeamento das áreas de lazer e turismo existentes no município de Belém. Para a pesquisa, foram considerados como espaços públi-cos de lazer: praças, áreas verdes, teatros, igrejas históricas, museus, ou seja, “todos criados pelo poder público, mesmo que mantidos por outras organizações”, assegura a autora.

n Políticas não são comuns a todo o Estado O primeiro passo da pes-

quisa foi bater à porta de quem intervém nas dinâmicas do tema na cidade: o governo. Foram ou-vidas a Secretaria de Estado, Es-porte e Lazer (Seel); a Secretaria Municipal de Juventude e Lazer (Sejel); a Companhia Paraense de Turismo (Paratur) e a Coordena-doria Municipal de Turismo (Be-lemtur). Atualmente, esses órgãos funcionam como agentes prove-dores do esporte, lazer e turismo na região. Entretanto, grande parte das ações desenvolvidas é voltada às atividades desportivas e ao turismo. “A Seel tem um

orçamento anual de, aproxima-damente, R$50 milhões, no qual uma média de 15 a R$20 milhões é utilizada com o lazer”, afirma a professora. Dessa investigação, uma constatação veio à tona: as políticas públicas de lazer não são comuns a todo o Estado. Mas, por quê? A justificativa da Seel seria a de que “a própria sociedade é responsável pela dinamização de seu lazer”.

De acordo com a pesquisa, as praças foram apontadas como os principais espaços públicos de lazer, por serem gratuitas e democráticas. Além disso, con-

figuram como locais atrativos às diferentes culturas, religiões, faixas etárias e níveis socioe-conômicos. “A gratuidade é o elemento principal no processo de escolha, uma vez que alguns espaços foram apontados como excludentes e segregadores por exigirem a cobrança de taxa”, assegura Jéssika França.

A pesquisadora defende que a franquia de ingressos seja ampliada para os finais de se-mana, contemplando a realidade social, sem exclusão das classes trabalhadoras, com seus poucos recursos e tempo disponível.

n Sociedade não reconhece lazer como direito

Praça da República reúne diferentes culturas, religiões e faixas etárias

Rádio WebOs ouvintes já podem conferir a programação definitiva da Rádio Web UFPA. Acessada por meio do Portal da Universidade, a Rádio está 24h no ar, com entrevistas, debates e boletins informativos. Fazem parte da grade os programas UFPA Pesquisa, UFPA Ensino, UFPA Comunidade, UFPA na Ma-drugada, Universidade Multicampi e o Boletim Beira do Rio. A inclu-são de um jornal diário está prevista para o segundo semestre.

Seminário on lineNo período de 1º a 05 de junho, o Programa Pobreza e Meio Ambien-te na Amazônia (Poema) promove o seminário on line “Barbárie ou o quê? Sobre o Futuro da Espécie humana no Século XXI”. Os inte-ressados devem acessar o site do Poema http://www.poema.org.br/ e ler os textos disponíveis. Mais informações: 3201.7700 ou [email protected]

Severa Romana IO Centro de Memória da Amazônia (CMA) realiza, no período de 31/06 a 02/07, o seminário “A Memória de Severa Romana: de mulher a santa popular”.A programação acontecerá sempre das 14h às 18h30, no Centro de Convenções da UFPA. As inscrições podem ser realizadas na sede do CMA até o dia 30 de junho.

QuímicaDe 12 a 18 de julho, Belém abrigará o XIV Congresso Regional dos Estudantes de Engenharia Quími-ca das Regiões Norte e Nordeste. A programação conta com mini-cursos e palestras que serão minis-tradas por professores da UFPA e da Universidade Federal de Alagoas. As inscrições podem ser feitas até o dia 26 de junho. Mais informa-ções no site do evento http://www.coreeq2009.ufpa.br

Colóquio KantJá estão abertas as inscrições para seleção de trabalhos a serem apre-sentados no “I Colóquio Kant e o Kantismo”, que ocorrerá nos dias 08 e 09 de outubro, em Belém, promo-vido pela Faculdade de Filosofia, da UFPA. Mais informações pelo site http://kant.kantismo.zip.net

acer

vo P

esq

Uis

ad

or

Page 6: Beira 73

6 – BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009 BEIRA DO RIO – Universidade Federal do Pará – Junho/Julho, 2009 – 7

Instituto de Tecnologia da UFPA propõe construção de casa ecológica Pesquisadores da Faculdade de Engenharia Civil apontam soluções ambientalmente viáveis para reaproveitamento de resíduos

Meio ambiente

Glauce Monteiro

O que uma garrafa de refrige-rante, um vaso de cerâmica, uma folha de papel, um pe-

daço de alumínio e a água que chega a nossas torneiras têm em comum? Para produzir cada um deles, geramos rejeitos, substâncias que ameaçam o meio ambiente e que não possuem uma finalidade. Aliás, não possuíam. Pes-quisadores da Universidade Federal do Pará estudaram cada um desses proble-mas e apresentam propostas para o uso

desses materiais como matéria-prima para a construção.

Que tal construir uma casa feita com tijolos fabricados com o resíduo do tratamento de água? Suas paredes podem ficar mais resistentes utilizando o rejeito da indústria cerâmica mistu-rado com cimento. Quer construir um segundo andar? Então façamos uma laje com garrafas PET. É mais leve e barato. As telhas podem ser fabricadas com a lama vermelha que sobra do pro-cesso de beneficiamento do alumínio, no nordeste do Pará. Seu lar doce lar

poderá ficar mais bonito se o mesmo resíduo for usado para colorir paredes e pisos em tons avermelhados, inclusive as calçadas. Mas, se sua preocupação é com os custos da construção, você pode economizar 30% do valor da obra adotando um novo método para moldar e escorar as colunas e paredes de sua casa, sem utilizar madeira. Essa casa ecológica está sendo “construída” diariamente, parte por parte, com as pesquisas realizadas pelos professores e alunos da Faculdade de Engenharia Civil, da UFPA.

O lodo gerado na Estação de Tratamento do Bolonha pode ser reaproveitado para fabricação de tijolos

Lama vermelha pode ser usada em tijolos, telhas e artefatos cerâmicos

n Paredes de lodo defendem o meio ambienteProblema: o beneficiamento de água gera um resíduo chamado lodo, que ameaça o equilíbrio ecológico em cursos d’água. Solução: transformar a ameaça em produto, utilizando o resíduo na fabricação de tijolos.

Construir uma casa com ti-jolos fabricados com lodo tem o desafio de enfrentar dois graves problemas ambientais. De um lado, criar uma utilidade para o que sobra no processo de tratamento da água e que pode prejudicar os ecossistemas aquáticos de rios e igarapés. De ou-tro, diminuir a extração desordenada de argila para uso cerâmico ou para a construção civil, prejudicando a várzea e os manguezais.

Para que a água chegue até a torneira de nossas casas, ela passa por um processo de tratamento que retira resquícios de terra ou folhas. Essas impurezas formam o lodo. “É um subproduto que contém matéria orgânica, sílica e outros elementos, mas é composto, principalmente, das substâncias químicas utilizadas durante o processo de tratamento de água. Ele contém considerável

teor de alumínio, que é o produto químico utilizado em Belém, e tem um aspecto de lama, mas, pratica-mente, não apresenta mau cheiro”, explica a professora Luiza Girard, pesquisadora da Faculdade de En-genharia Sanitária e do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFPA.

Para cada 100 litros de água que entra na Estação de Tratamen-to do Bolonha, restam 3,56 litros de lodo. Em um mês, são gerados, aproximadamente, 370.000 m3 desse resíduo, que precisa ter destinação adequada. O Grupo de Estudos em Gerenciamento de Águas e Reuso de Efluentes (Gesa) pesquisa este rejeito desde 2003. “Nosso objetivo é encontrar uma aplicação para o lodo a fim de evitar que ele seja despejado novamente no meio ambiente, preju-dicando, inclusive, o abastecimento de água potável dos centros urbanos. O aproveitamento dessa substância para a indústria da cerâmica é uma alternativa viável que imobiliza o resíduo e lhe dá uma função benéfica na sociedade”, conta a professora.

Cabe à Elzilis Muller, a tarefa

de propor uma forma de utilizar o lodo como componente de tijolos. Aluna do curso de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFPA, orientada pela sanitarista Luiza Girard, Elzilis testa fórmulas e formas de misturar o rejeito na composição das peças cerâmicas. O estudo é o segundo no Brasil, desenvolvido em escala real, ou seja, testa a possibilidade de ser aplicado em uma verdadeira escala de produção. A mistura de lodo e argila foi usada para a fabricação de 500 tijolos em uma empresa cerâmica localizada em Benfica, no nordeste paraense. “Analisamos a composição do material antes e depois da fabricação das peças e percebemos que ele atende inteira-mente às normas, com uma excelente produtividade. É viável ambiental, estrutural e economicamente”, ga-rantem as pesquisadoras.

“Além de reduzir os impactos ambientais, esse produto teria um custo mais acessível, melhorando a oferta desse insumo para a cons-trução, especialmente para pessoas de baixa renda”, defende Luiza Girard.

n O colorido e a resistência da lama vermelha nas paredes e pisosProblema: a produção de alumí-nio gera, como resíduo, a lama vermelha. Solução: utilizá-la na produção de cimento, tijolos, telhas e insumos coloridos.

Você já pensou em decorar sua casa com tijolos, azulejos, te-lhas, paredes, fachadas ou calçadas coloridas? Que tal fazer tudo isso ajudando a promover o desen-volvimento sustentável da região amazônica? O Grupo de Análise Experimental de Estruturas e Ma-teriais (Gaema), da UFPA, mostra que isso é possível.

O alumínio que encontramos em diversos produtos, como latas de refrigerante e panelas, é obtido pelo processo de beneficiamento do minério de bauxita. O Brasil possui a terceira maior reserva mundial desse material, sendo que 95% dele são encontrados no Estado do Pará. Para produzir alumínio, transformamos a bauxita em alumina por um método conhe-cido como “processo Bayer”. Mas, apesar das inúmeras utilidades do alumínio, ele representa um sério risco ambiental.

Especialistas estimam que, para cada tonelada de alumina produzida na Região Norte, a mesma quantidade de lama ver-

melha é gerada. Lama vermelha é um resíduo sólido prejudicial ao meio ambiente e à saúde humana que, sem destino, apenas pode ser continuamente armazenada. Entre os anos de 1999 e 2004, o Pará produziu 9,6 milhões de toneladas de alumina no município de Barca-rena, no nordeste do Estado, o que significa que a mesma quantidade de lama vermelha foi produzida e estocada.

“Precisamos propor alterna-tivas para a utilização desse rejeito sob pena de que, ao explorarmos o minério paraense, além de per-dermos as riquezas naturais, ainda tenhamos que dar um destino às milhares de toneladas de resíduos geradas pelo processo de benefi-ciamento da bauxita”, defende Al-cebíades Macedo, pesquisador do Instituto de Tecnologia da UFPA e um dos coordenadores do Gaema.

O Grupo de Pesquisa, em uma série de projetos e análises, estudou as possíveis aplicações da lama vermelha na construção civil. “Podemos obter quase todos os elementos de uma casa com a uti-lização de lama vermelha. Tijolos, telhas, cimentos, artefatos cerâmi-cos, ladrilhos de piso, blocos para pavimentação podem levar, em sua composição, percentuais de lama

n Garrafas PET para fazer a laje?

Problema: em 2007, apenas 53,5% das garrafas PET que circularam no Brasil foram recicladas. Solução: utilizar o material na fabricação de lajes de plástico.

Você quer construir um se-gundo andar em sua casa? Que tal utilizar garrafas PET? Fabricadas com Poli Tereftalato de Etila, as garrafas representam uma grave ameaça ambiental. Para o professor Adalberto Lima, é possível ofere-cer uma alternativa socioambiental para o problema. “Pensamos em um projeto que fosse uma alternativa ao acúmulo de garrafas que contami-nam rios e causam sérios problemas urbanos, e que também gerasse em-prego e renda. A produção de lajes fabricadas a partir das garrafas PET tem essa dupla natureza”.

Foram coletadas cerca de três mil garrafas, que, depois de selecio-nadas e limpas, passaram por um tri-turador. Os flocos de plástico foram derretidos e colocados em uma fôrma padrão para a fabricação de blocos cerâmicos para laje. “Os próximos passos da pesquisa serão a análise do produto criado e a construção de uma laje no centro comunitário que nos ajudou a coletar as garrafas”, detalha Adalberto Lima.

vermelha, mantendo a mesma segu-rança que os materiais tradicionais oferecem, ao mesmo tempo em que apresentam uma utilidade para o resíduo da produção mineralógica paraense”, revela o pesquisador.

Uma das aplicações da lama vermelha é seu uso como pigmento pozolânico, a pigmentação utiliza-da para a construção civil. Utilizar um concreto naturalmente colorido evita o uso de revestimentos e tin-

tas, diminuindo gastos com a obra. “A lama vermelha proporciona maior resistência e homogeneidade quando usada como pigmento po-zolânico para ser misturada ao con-creto”, garante Fádia Lima, em sua tese de mestrado, pela qual com-provou que a lama vermelha pode alcançar tonalidades de vermelho em vários materiais, oferecendo uma opção eventualmente mais barata e ecologicamente correta.

na estrutura:

n laje com garrafas Pet.

n tijolos fabricados com o re-síduo do tratamento de água (lodo).

no teto:

n as telhas podem ser fabricadas com a lama vermelha que sobra do processo de benefi-ciamento do alumínio no nordeste do Pará

no revestimento:

n lama vermelha para colorir pa-redes e pisos em tons avermelha-dos, que podem ser usados tam-bém na calçada.

Seu lar doce lar pode ficar ecologicamente correto

ca

rlo

s so

dré

/aG

. Pa

acer

vo P

roje

to

Problema: para moldar colunas e estruturas, as obras utilizam muita madeira. Solução: nova técnica de pré-moldagem que dispensa o uso de madeira.

Se você passar em frente a uma obra durante a fase de construção das fundações e vi-gas, perceberá o uso excessivo de madeira para moldagem. Apenas no ano de 2004, foram extraídos cerca de 24,5 milhões de metros cúbicos de madeira em tora da Amazônia. Desse total , 63% foram comercializados para a construção civil. Pesquisadores da Faculdade de Engenharia Ci-vil, da UFPA, desenvolveram um novo método de moldagem para colunas e fundações, utilizando elementos pré-moldados que dis-pensam o uso de madeira.

Elementos pré-moldados são aqueles em que os elementos estruturais são formados fora do local da obra, o que traz a neces-sidade de transportar essas peças até a construção. Um desafio, se levarmos em conta o peso de uma coluna ou de uma viga, por exemplo. “Desenvolvemos um elemento pré-moldado que dispensa a madeira em todas as etapas, com a vantagem de ser mais leve que os outros modelos do tipo, o que soluciona o proble-ma do transporte. O material é tão leve que dois homens são capazes de carregá-lo e sua resistência no estágio final da montagem é a mesma dos modelos tradicionais”, revela o engenheiro civil Dênio Ramam.

Para usar essa tecnologia, é preciso ter o projeto da obra com as dimensões de cada peça. Então, é confeccionada uma espécie de molde com placas delgadas de concreto, do tamanho exato de cada parte da estrutura. Essa pré-forma já contém um espaço para que sejam encaixadas as armadu-ras de aço. O material, então, está pronto para ser levado até a obra, onde receberá, por fim, o concreto formando a viga ou coluna.

O Grupo de Análise Experi-mental de Estruturas e Materiais (Gaema) já utilizou essa tecnolo-gia para a construção de prédios, obras de saneamento, muros de contenção de cursos d’água e solo, cortinas e paredes. “Em uma obra comum, os custos com moldes de madeira podem chegar a 30% do valor total da estrutura da construção e tudo isso vai para o lixo depois. Com a dificuldade que temos para adquirir madeira, usar a disponível como molde descartável é uma prática compli-cada econômica e ambientalmen-te”, afirma Dênio Ramam.

n O desafio da madeira