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Boletim 1º trimestre 2018 – n. 19 ESPECIAL LITERÁRIO O QUE HÁ DE NÓS EM NÓS? A DISTOPIA ORIGINAL DE IEVGUÊNI ZAMIÁTIN inda precariamente referido em bibliografias jurídicas brasileiras, Nós vem sendo reconhecido como a obra mãe da literatura distópica. Publicado em 1924 pelo escritor russo Ievguêni Zamiátin, o romance recebeu prefácio de George Orwell apenas três anos antes de o autor inglês publicar seu aclamado 1984. O enredo da narrativa antecipa – em uma série de questões – a ideologia e os terrores autoritários que acometeriam o mundo durante o fascismo italia no, o nazismo alemão e socialismo soviético. A obra foi censurada pela União Soviética, que a considerou “ideologicamente indesejável”, motivo pelo qual foi lançada em solo norteamericano, após ser “contrabandeada” pela esposa de Zamiátin. Em carta a Stálin, datada de 1931, o autor queixouse da per seguição política e da censura literá ria acachapantes sofridas desde a publicação de Nós: “não importa qual seja o conteúdo de uma obra, o mero fato de ter minha assinatura se tornou razão suficiente para declará la criminosa”. O autor solicitou, na oportunidade, sua deportação da União Soviética, considerando que, para um escritor, “ser privado de escrever é como uma sentença de morte”. O romance de Zamiátin inscrevese em um futuro pós apocalíptico, dominado pela técnica, por princípios científicos, pela mecanicização do ser humano e pela racionalidade lógico matemática. À época, portanto, o autor já erigia forte denúncia contra o processo de unificação do pensamento e a sobreposição da unidade coletiva sobre a personalidade individual. A obra constitui importante alerta, também, sobre os perigos que cer cam uma sociedade que cede perante o controle social exercido pelo governo e pelos seus próprios pares. Conforme se pode perceber, a partir dessa breve introdução, a narrativa fornece matéria fértil para o Direito, ao abranger diversas questões pertinentes ao campo jurídico. Evidentemente, não se pretende, aqui, esgotálas. É de interesse deste breve estudo se deter, de forma mais específica, sobre a alienação da autonomia e da emancipação da sociedade civil em Nós, em face da subordinação ao projeto civilizatório personifica do na figura do Benfeitor. A narrativa se desenvolve através das reflexões de D503, en genheiro e matemático plenamente identificado com os ideais do regime, cujo legado literário favorito da sociedade antiga é Horá rio das estradas de ferro. D503 é responsável pela “Integral”, uma espaçonave que promete expandir o Estado Único para o restante do Universo, a fim de submeter “ao jugo benéfico da razão” civilizações que ainda se encontrem em “estado selvagem de liberdade”. Em seus escritos, D503 abre um canal de interlocução com a humanidade que o precedeu e que ele jamais conheceu. A partir das reflexões em seu caderno de notas, D503 enaltece as virtu des de seu modo de vida e, em especial, declara ser a liberdade individual a grande inimiga e responsável pela hecatombe da espécie humana: Fui obrigado a ler e ouvir muitas coisas incríveis sobre a época em que as pessoas ainda viviam livres, isto é, num estado de des organização selvagem. Mas o que sempre me pareceu mais incrí vel é exatamente isto: como pôde o poder estatal daquela época – ainda que fosse embrionário – permitir que as pessoas vives sem sem algo parecido com a nossa Tábua, sem os passeios obri gatórios, sem regulamentação exata dos horários das refeições? Levantavamse e deitavamse para dormir quando lhes desse na cabeça. Alguns historiadores dizem, inclusive, que naquele tem po as ruas ficavam iluminadas durante a noite inteira, e as pes soas caminhavam e dirigiam a noite inteira. Isso eu não consigo compreender de maneira nenhuma. Afinal, por mais limitada que fosse sua inteligência, eles deveriam, ape sar disso, entender que esse tipo de vida era um verdadeiro as sassinato em massa, cometido aos poucos, dia após dia. O Estado (humanitário) proibia matar um indivíduo, mas não proibia que matassem milhões aos poucos (Nós, p. 31). Na visão dos Números – os cidadãos de Nós –, a privação da liberdade individual justificase em face do próprio pecado origi nal, uma vez que Adão e Eva optaram pela “liberdade, sem felici dade”, em detrimento da “felicidade, sem liberdade”, condenan do a humanidade, assim, a deixar o Paraíso (Nós, p. 92). Isto por que a felicidade – e o Paraíso – dos Números reside na rotina ditada pelo Benfeitor, na obediência aos Guardiões, nas marchas em colunas de quatro ao som do Hino patriótico. Em suma, a sua A

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Boletim 1º trimestre 2018 – n. 19

 

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 ESPECIAL  LITERÁRIO    O  QUE  HÁ  DE  NÓS  EM  NÓS?  A  DISTOPIA  ORIGINAL  DE  IEVGUÊNI  ZAMIÁTIN    

 

inda   precariamente   referido   em   bibliografias   jurídicas  brasileiras,   Nós   vem   sendo   reconhecido   como   a   obra-­‐mãe   da   literatura   distópica.   Publicado   em   1924   pelo  escritor   russo   Ievguêni   Zamiátin,   o   romance   recebeu  prefácio  de  George  Orwell   apenas   três  anos  antes  de  o  

autor   inglês  publicar   seu  aclamado  1984.  O  enredo  da  narrativa  antecipa  –  em  uma  série  de  questões  –  a  ideologia  e  os  terrores  autoritários  que  acometeriam  o  mundo  durante  o  fascismo  italia-­‐no,  o  nazismo  alemão  e  socialismo  soviético.  

A  obra   foi   censurada  pela  União   Soviética,   que  a   considerou  “ideologicamente   indesejável”,  motivo  pelo  qual   foi   lançada  em  solo  norte-­‐americano,  após  ser  “contrabandeada”  pela  esposa  de  

Zamiátin.   Em   carta   a   Stálin,   datada  de  1931,  o  autor  queixou-­‐se  da  per-­‐seguição  política  e  da  censura  literá-­‐ria   acachapantes   sofridas   desde   a  publicação   de   Nós:   “não   importa  qual  seja  o  conteúdo  de  uma  obra,  o  mero  fato  de  ter  minha  assinatura  se  tornou  razão  suficiente  para  declará-­‐la   criminosa”.   O   autor   solicitou,   na  oportunidade,   sua   deportação   da  União   Soviética,   considerando   que,  para   um   escritor,   “ser   privado   de  escrever   é   como   uma   sentença   de  morte”.  

O   romance   de   Zamiátin   inscreve-­‐se   em   um   futuro   pós-­‐apocalíptico,   dominado   pela   técnica,   por   princípios   científicos,  pela  mecanicização   do   ser   humano   e   pela   racionalidade   lógico-­‐matemática.  À  época,   portanto,  o   autor   já   erigia   forte  denúncia  contra  o  processo  de  unificação  do  pensamento  e  a  sobreposição  da   unidade   coletiva   sobre   a   personalidade   individual.   A   obra  constitui   importante   alerta,   também,   sobre   os   perigos   que   cer-­‐cam  uma  sociedade  que  cede  perante  o  controle  social  exercido  pelo  governo  e  pelos  seus  próprios  pares.    

Conforme   se   pode   perceber,   a  partir   dessa   breve   introdução,   a  narrativa   fornece   matéria   fértil  para  o  Direito,  ao  abranger  diversas  questões   pertinentes   ao   campo  jurídico.   Evidentemente,   não   se  pretende,   aqui,   esgotá-­‐las.   É   de  interesse   deste   breve   estudo   se  deter,   de   forma   mais   específica,  sobre   a   alienação   da   autonomia   e  da   emancipação   da   sociedade   civil  em  Nós,   em   face   da   subordinação  ao   projeto   civilizatório   personifica-­‐do  na  figura  do  Benfeitor.      

A  narrativa  se  desenvolve  através  das  reflexões  de  D-­‐503,  en-­‐genheiro  e  matemático  plenamente  identificado  com  os  ideais  do  regime,  cujo  legado  literário  favorito  da  sociedade  antiga  é  Horá-­‐rio   das   estradas   de   ferro.   D-­‐503   é   responsável   pela   “Integral”,  uma   espaçonave   que   promete   expandir   o   Estado   Único   para   o  restante   do   Universo,   a   fim   de   submeter   “ao   jugo   benéfico   da  razão”  civilizações  que  ainda  se  encontrem  em  “estado  selvagem  de  liberdade”.    

Em  seus  escritos,  D-­‐503  abre  um  canal  de  interlocução  com  a  humanidade  que  o  precedeu  e  que  ele  jamais  conheceu.  A  partir  das  reflexões  em  seu  caderno  de  notas,  D-­‐503  enaltece  as  virtu-­‐des  de  seu  modo  de  vida  e,  em  especial,  declara  ser  a   liberdade  individual   a   grande   inimiga   e   responsável   pela   hecatombe   da  espécie  humana:  

 Fui   obrigado   a   ler   e   ouvir  muitas   coisas   incríveis   sobre   a   época  em  que  as  pessoas  ainda  viviam  livres,  isto  é,  num  estado  de  des-­‐organização  selvagem.  Mas  o  que  sempre  me  pareceu  mais  incrí-­‐vel  é  exatamente  isto:  como  pôde  o  poder  estatal  daquela  época  –  ainda  que   fosse  embrionário  –  permitir   que  as  pessoas   vives-­‐sem  sem  algo  parecido  com  a  nossa  Tábua,  sem  os  passeios  obri-­‐gatórios,  sem  regulamentação  exata  dos  horários  das  refeições?  Levantavam-­‐se  e  deitavam-­‐se  para  dormir  quando  lhes  desse  na  cabeça.  Alguns  historiadores  dizem,   inclusive,  que  naquele  tem-­‐po  as   ruas   ficavam   iluminadas  durante  a  noite   inteira,  e  as  pes-­‐soas  caminhavam  e  dirigiam  a  noite  inteira.    Isso   eu  não   consigo   compreender  de  maneira  nenhuma.  Afinal,  por  mais  limitada  que  fosse  sua  inteligência,  eles  deveriam,  ape-­‐sar  disso,  entender  que  esse  tipo  de  vida  era  um  verdadeiro  as-­‐sassinato  em  massa,  cometido  aos  poucos,  dia  após  dia.  O  Estado  (humanitário)  proibia  matar  um   indivíduo,  mas  não  proibia  que  matassem  milhões  aos  poucos  (Nós,  p.  31).  

 Na  visão  dos  Números  –  os  cidadãos  de  Nós  –,  a  privação  da  

liberdade  individual   justifica-­‐se  em  face  do  próprio  pecado  origi-­‐nal,  uma  vez  que  Adão  e  Eva  optaram  pela  “liberdade,  sem  felici-­‐dade”,  em  detrimento  da  “felicidade,  sem  liberdade”,  condenan-­‐do  a  humanidade,  assim,  a  deixar  o  Paraíso  (Nós,  p.  92).  Isto  por-­‐que   a   felicidade   –   e   o   Paraíso   –   dos   Números   reside   na   rotina  ditada  pelo  Benfeitor,  na  obediência  aos  Guardiões,  nas  marchas  em  colunas  de  quatro  ao  som  do  Hino  patriótico.  Em  suma,  a  sua  

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felicidade  consiste  em  identificar  no  Estado  Único  o  destinatário  final  de  suas  ações:    

 Serei   totalmente   sincero:   ainda   não   encontramos   uma   solução  absolutamente  exata  para  a  felicidade  –  duas  vezes  por  dia,  das  16  às  17  horas  e  das  21  às  22,  nosso  poderoso  e  único  organismo  se  divide  em  células  isoladas:  essas  são  as  Horas  Pessoais  estabe-­‐lecidas   pela   Tábua   das   Horas.   Nesses   horários   observam-­‐se   as  cortinas  castamente  fechadas  nos  quartos  de  alguns;  outros  per-­‐correm  ritmadamente  as  avenidas,  como  se  subissem  os  degraus  de  cobre  da  Marcha;  outros,  ainda,  assim  como  eu,  estão  senta-­‐dos  à  escrivaninha  (Nós,  p.  30).    

Em  raciocínio  semelhante,  D-­‐503  torna  a  manifestar   irrefutá-­‐vel  convicção  no  avanço  civilizatório  promovido  pela  ideologia  do  Estado  Único.  Ao   justificar   o   fato   de  que  nenhum  dos  Números  esteve  além  do  Muro  Verde,  que,  desde  a  Guerra  dos  Duzentos  Anos,  protege-­‐os  do  mundo  exterior,  escreve:    

 É  evidente  que  toda  a  história  da  humanidade,  pelo  que  sabemos  dela,  é  uma  história  de  transição  de  uma  forma  de  vida  nômade  para  outra,  cada  vez  mais  sedentária.  Será  que  não  se  deduz  dis-­‐so   que   a   forma   de   vida  mais   sedentária   (a   nossa)   é   ao  mesmo  tempo  a  mais  perfeita  (a  nossa)?  As  pessoas  se  moviam  pela  ter-­‐ra  de  um  extremo  a  outro  apenas  na  época  pré-­‐histórica,  quando  havia  nações,  guerras,  comércio,  descobertas  de  diferentes  Amé-­‐ricas.  Mas  para  que  alguém  precisa  disso  agora?  (Nós,  p.  28).    

No   entanto,   apesar   dos   constantes  enaltecimentos  por  parte  de  D-­‐503,  a  soci-­‐edade   retratada   em   Nós   é   desprovida   de  qualquer   direito   fundamental,   os   cidadãos  são   batizados   Números,   desprovidos   de  cidadania   ou   de   individualidade.  Múltiplos  são  os  exemplos  que  permeiam  a  narrativa  e  que  exemplificam  o  modelo  de  vida   rígi-­‐do,  cruel  e  arbitrário  imposto  aos  Números:  os   criminosos   são  executados  publicamen-­‐te  pela  Máquina;  aquele  que  não  dorme  à  noite  é   criminoso,   assim  como  aquele  que  se   atrasa   para   o   trabalho;   os   sonhos   são  

enfermidades   psíquicas;   o   amor   foi   abolido   e   as   relações   inter-­‐pessoais,   burocratizadas;   não   se   fala  mais   em   família;   o   sexo   é  controlado   para   o   único   fim   de   conceber   bebês   –   que,   após   o  nascimento,   pertencem   à   coletividade;   a   beleza   da   poesia   e   da  música  é  produto  de  lógica;  o  álcool  e  o  tabaco  são  considerados  venenos  e  seu  uso  é  interditado.  

O  objetivo  central  de  cada  Número  é  o  de  conservar  a  unida-­‐de  de  pensamento  e  de  ações  com  os  demais.  O  título  da  obra  é  o  mesmo   do   caderno   de   anotações   de  D-­‐503,   escrito   conforme   o  que  nós  pensamos  (Nós,  p.  17).    

Neste   sentido,   D-­‐503   equipara   a   tomada   de   consciência   em  relação  à  individualidade  a  uma  doença:  

 Estava   consciente   de   mim   mesmo.   Mas,   de   fato,   apensa   são  conscientes   de   si   e   reconhecem   a   própria   individualidade   um  olho   com   um   cisco,   um   dede   machucado,   um   dente   doendo:  olhos,  dedos  e  dentes  saudáveis  –  eles  parecem  não  existir.  Será  que  não  está  claro  que  uma  consciência  individual  é  apenas  uma  doença?  (Nós,  p.  177).  

 A  existência  encontra  sentido  na  unidade  do  corpo  social,  na  

técnica,   na   lógica   algorítmica   e   na   consequente   erradicação  das  individualidades   e   das   posses   privadas.   Conforme   retratado,   os  Números  creem  que  as  regras   impostas  pelo  Estado  Único  são  a  prova  da  evolução  em  relação  à   sociedade  “selvagem”  dos  anti-­‐gos,   cujos   vícios   e   modos   de   vida   equivocados   levaram   à   sua  quase  extinção.    

Neste  contexto,  a  figura  que  personifica  o  Estado  Único  –  e  a  própria   unidade   racional   do   sistema  –   é   a   do  Benfeitor.  Dotado  de  aura  divina,  o  culto  ao  Benfeitor  é  o  mais  próximo  da  religião  que  se  encontra  na  experiência  dos  Números:    

 Com   passos   majestosos   de   sumo   sacerdote,   Ele   desceu   lenta-­‐mente,  e,   sem  se  apressar,  passou  pelas   tribunas,  e,  atrás  Dele,  as  mãos   brancas   e   delicadas   das  mulheres   erguidas   e   uma   tor-­‐menta  de  clamores  dos  unimilhões  de  números  (Nós,  p.  77).    

E  mais  adiante:    

Todos  os  olhos  se  dirigiram  para  cima:  para  o  azul  matutino,  ima-­‐culado,   ainda   não   ressecado   pelas   lágrimas   noturnas.   Lá   havia  uma   mancha   pouco   perceptível,   ora   escura,   ora   coberta   pelos  raios  de  sol.  Era  Ele,  que  descia  dos  céus  até  nós,  o  novo  Jeová  no  aero,  tão  sábio,  tão  afetuoso  e  cruel  como  o  Jeová  dos  antigos.  A  cada  minuto  Ele   chegava  mais  perto,  milhões  de   corações  alça-­‐vam-­‐se  mais  alto  ao  seu  encontro,  Ele  já  nos  via  (Nós,  p.  192).    

As   (re)eleições   do   Benfeitor   ocorrem   anualmente   no   Dia   da  Unanimidade,   consagrado   pelo   Cálice   do   Consentimento.   Nesta  data,   os   Números   voltam   “a   confiar   ao   Benfeitor   as   chaves   da  inabalável  fortaleza  de  sua  felicidade”  (Nós,  p.  188):  

 Sem  dúvida,   isso  não  é  parecido  com  as  eleições  confusas  e  de-­‐sorganizadas  dos  antigos,  quando  –  é  engraçado  dizer  –  o  resul-­‐tado   das   eleições   sequer   era   conhecido   de   antemão.   Construir  um   governo   sobre   casualidades   inteiramente   incalculáveis,   às  cegas  –  o  que  pode  ser  mais  sem  sentido?  E  ainda  assim,  foram  necessários  séculos  para  entender  isso  (Nós,  p.  188).    

A   tomada   de   consciência   de   D-­‐503   é   despertada   somente  após   o   encontro   com  a  misteriosa,   subversiva   e   sedutora   I-­‐330,  responsável   por   contrapor   a   ordem   coerente   e   matemática   do  protagonista   com   a   parcela   de   realidade   caótica,   subversiva   e  

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criminosa,   até   então   desconhecida   por   D-­‐503.   Algo   de   novo   se  revela,  então,  na  sua  vida:  

 Levantei  num  salto  e,  sem  esperar  pela  campainha,  pus-­‐me  a  an-­‐dar  depressa  pelo  quarto.  Minha  matemática,  até  agora  a  única  ilha  sólida  e   imutável  de  toda  a  minha  vida  fora  dos  eixos,  tam-­‐bém  se  rompeu,  flutuava,  girava.  Então,  o  que  significa  essa  ridí-­‐cula  ‘alma’?  Ela  é  tão  real  quanto  meu  unif,  como  minhas  botas,  ainda  que  eu  não  os  veja  agora  (estão  atrás  da  porta  espelhada  do  armário)?  E,  se  as  botas  não  são  uma  doença,  por  que  a  ‘alma’  é?  (Nós,  p.  142-­‐143).  

 Com  o  aprofundamento  da  sua  relação  com  I-­‐330,  o  protago-­‐

nista   passa   a   ter   sonhos   e   se   apaixona,   deparando-­‐se   com  dile-­‐mas   éticos   e   morais   –   de   natureza   notadamente   individual   –,  inclusive  quando,  após  o  primeiro  encontro,  deixa  de  denunciá-­‐la  pelo   descumprimento   de   estritas   regras   do   regime.   Naquela  oportunidade,   a  omissão  de  D-­‐503  o   transformara,  mais  do  que  em  amante,  em  cúmplice.  Os  revolucionários  acontecimentos  na  vida   de   D-­‐503   permitem-­‐no,   enfim,   enxergar-­‐se   em   termos   de  “ele”,   isto   é,   de   indivíduo,   cuja   existência   ocorre   individual   e  independentemente   da   unidade   social.   No   entanto,   o   contato  com  os  rebeldes  o  faz  ser  diagnosticado  com  uma  grave  doença  –  a  imaginação  –  e  determinará  tragicamente  o  seu  destino.      

É   neste   contexto,   portanto,   que  Nós   permite   retratar   a   per-­‐versão   de   um   sistema   de   alienação,   em   que   os   indivíduos   não  sabem  que  não  sabem  e  em  que  a  sua  cidadania  foi  entregue  de  bom  grado,   sem  qualquer   resistência,   por   conta  da   aposta   cega  na   figura   do   Benfeitor   como   único  meio   de   salvação   de   si   pró-­‐prios.   Tudo   ocorre,   assim,   para   o   bem   da   própria   sociedade   –  

anestesiada   –,   que   se   revela   inerte   e   condescendente   com   as  arbitrariedades   impostas  pelo   regime  e   com  a  permanente   sub-­‐tração  de  sua  capacidade  de  autonomia  e  de  emancipação.    

Na   atual   quadra,   em   que   se   faz   necessário   o   fortalecimento  do  espaço  público  e  do  debate  público,   com  a  devida  mediação  institucional,  a  aposta  no  paternalismo  ou  no  messianismo  sem-­‐pre   serão   equivocadas.   Trata-­‐se   de   um   atalho   traiçoeiro   e   que  não  pressupõe  o  desenvolvimento  da  esfera  pública  requerida  e  possibilitada  pelo  Estado  Democrático  de  Direito.  

Ou  seja,  cidadãos  que  delegam,  sem  resistência  –  e  com  certo  alívio  –,  a  uma  figura  paternalista,  o  seu  grau  de  autonomia  indi-­‐vidual   e   de   emancipação   caem   em  perigosa   armadilha.   Esse   fe-­‐nômeno  se  observa,  por  exemplo,  diante  do  alto  grau  de  judiciali-­‐zacão   da   política,   o   que   se   agrava   diante   da   postura   ativista   de  setores  do   Judiciário.   É  preciso   (re)fundar,  portanto,  essa  esfera  pública  no  contexto  de  nossa  democracia.  

As  boas  obras  literárias  permitem  que  os  juristas  identifiquem  sintomas  negativos  na  sua  prática  jurídica  cotidiana,  muitas  vezes  obnubilados  por  um  agir  inconsciente  e  acrítico.  Na  mesma  dire-­‐ção,  Daniela  Carpi  afirma  que  a  Literatura  permite  que  antecipe-­‐mos  o  futuro  (CARPI,  2018).  Essas  são  premissas  adequadas  para  saber  o  que,  afinal,  há  de  Nós  em  nós.    

 Dieter  Axt*  

 *  Mestrando  em  Direito  Público  na  Universidade  do  Vale  do  Rio  dos   Sinos   (UNISINOS).   Bacharel   em   Direito   pela   Universidade  Federal  do  Rio  Grande  do  Sul  (UFRGS).  Roteirista  do  Programa  de  TV  Direito  &   Literatura   (TV   Justiça).  Membro   da   Rede   Brasileira  Direito  e  Literatura  (RDL).  Assistente  Editorial  da  Anamorphosis  -­‐  Revista   Internacional  de  Direito  e  Literatura.  Escritor  e  editor  da  Editora  Le  Chien.    Referências  bibliográficas:    CARPI,   Daniela.   Entrevista   com   Daniela   Carpi:   a   Literatura   é   o  cultivo  da  alma.  ANAMORPHOSIS  –  Revista  Internacional  de  Direi-­‐to  e  Literatura,  v.  3,  n.  2,  p.  573-­‐584,  jul./dez.  2017.  CATTONI  DE  OLIVEIRA,  Marcelo  Andrade.  Direito,  Pol[itica  e  Filo-­‐sofia:   constirbui;óes   para   um   teoria   discursiva   da   constituiçãoo  democrática   no  marco   do   patriotismo   constitucional.  Rio   de   Ja-­‐neiro:  Lumen  Juris,  3007.  ZAMIÁTIN,  Ievguêni.  Nós.  Tradução  de  Gabriela  Soares.  São  Pau-­‐lo:  Aleph,  2010.    

 

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NOTÍCIAS  EM  DESTAQUE    1°  CONFERÊNCIA  BRASILEIRA  DE  DIREITO  E  ARTE    

 O  poeta  Fernando  Pessoa,  ao  

escrever  um  texto  para  o  catálo-­‐go  do  I  Salão  dos  Independentes,  em   Lisboa,   observou   que   "toda  arte   é   uma   forma   de   literatura,  porque   toda   arte   é   dizer   qual-­‐quer   coisa.   Há   duas   formas   de  dizer   -­‐   falar   e   estar   calado.   As  artes   que   não   são   a   literatura  são   as   projeções   de   um   silêncio  expressivo.  Há  que  procurar  em  toda  a  arte  que  não  é  literatura  a  frase  silenciosa  que  ela  contém,  ou  o  poema,  ou  o  romance,  ou  o  drama."  

Com  espírito  semelhante,  a  RDL  compartilha  a  notícia  de  que  a   Faculdade   de   Direito   da   Universidade   Federal   da   Paraíba   e   o  Tribunal   de   Contas   do   Estado   da   Paraíba   estão   organizando   a  primeira  edição  da  Conferência  Brasileira  de  Direito  e  Arte  -­‐   jus-­‐tamente  quando   são   comemorados  o  Ano  Europeu  do  Patrimô-­‐nio  Cultural  e  o  aniversário  de  30  anos  da  constituição  federal.  

O  objetivo  é  reunir  o  grupo  de  juristas  brasileiros  que  se  inte-­‐ressa  pelo  tema  e  alguns  colegas  estrangeiros  para  discutir  temas  jurídicos   relevantes  para   artistas,   colecionadores,   galerias,   casas  de  leilão,  seguradoras,  museus,  marchands,  antiquários,  adminis-­‐tração  pública  etc.-­‐  atores  de  um  mercado  econômico  de  grande  valor   e   que   toca   em   direitos   fundamentais   (culturais)   dos   cida-­‐dãos.  

Já  há  confirmações  de  vários  palestrantes  estrangeiros  e  naci-­‐onais,  com  diferentes  perfis  profissionais  -­‐  diplomatas,  magistra-­‐dos,   delegados   federais,   colecionadores,   professores  etc.  A   con-­‐ferência  terá  lugar  entre  os  dias  16  e  18  de  maio,  em  João  Pessoa,  no   Centro   Cultural   Ariano   Suassuna,   do   Tribunal   de   Contas   da  Paraíba.   Mais   detalhes   sobre   a   conferência   podem   ser   obtidos  em  https://1cbda.wordpress.com/  

 IV  DIRCIN  –  DIREITO  E  CINEMA  EM  DEBATE    

Nos  dias  23,  24  e  25  de  maio,  será  realizado  o  IV  DIRCIN  -­‐  Di-­‐reito  e  Cinema  em  Debate,  no  campus  de   Jacarezinho  da  UENP.  Além  da  sétima  arte,  o  evento  também  se  propõe  a  investigar  as  relações  da  Literatura  e  da  Música  com  o  Direito.  

O   evento   contará   com   a   participação   do   Prof.   Dr.   Marcílio  Toscana   Franca   Filho,   que  palestrará   sobre   filme   "Ensaio   de  Or-­‐questra"  (1978),  de  Federico  Fellini  com  música  de  Nino  Rota.  

A   conferência  de  encerramento   será  proferida  pelo  Prof.  Dr.  André  Karam  Trindade,  presidente  da  RDL,   com  o   tema  "A  crise  do  direito  e  o  poder  das  narrativas  literárias".  

O  evento  é  organizado  pelo  Prof.  Dr.  Renato  Bernardi.    LIBERTAD  DE   EXPRESIÓN:   DIÁLOGOS   Y   REFLEXIONES   DESDE   EL  DERECHO  Y  LITERATURA    

El   Congreso   Internacional   “Libertad   de   expresión:   diálogos   y  reflexiones  desde  el  derecho  y  la   literatura”,  a  realizarse  los  días  20,  21,  22  y  23  de  junio  de  2018,  en  Quito,  Ecuador  busca  articu-­‐lar  una  plataforma  abierta  y  heterogénea  latinoamericanista  en  la  que   académicos/as/xs   y   estudiantes  de  diferentes  disciplinas   (el  derecho,   la   literatura,   los   estudios   culturales,   la   sociología,   la  historia,   el   periodismo,   etc.)   y   provenientes   de   la   región   y   de  otras  latitudes,  se  encuentren  para  intercambiar  ideas  en  torno  a  la   libertad  de  expresión,  desde   la  vinculación  entre  el  derecho  y  una   concepción  amplia  de   la   literatura,  que   incluya  al   arte   y   los  estudios  culturales.    IV  INTERESCUELAS  DE  FILOSOFÍA  DEL  DERECHO    

La  Maestría  en  Filosofía  del  Derecho  (Facultad  de  Derecho  de  la  Universidad  de  Buenos  Aires),  con  el  apoyo  y  colaboración  del  Departamento   de   Filosofía   del   Derecho   y   con   el   auspicio   de   la  Asociación  Argentina  de  Filosofía  del  Derecho  (AAFD)  y  el  Institu-­‐to   de   Investigaciones   Jurídicas   y   Sociales   "Ambrosio   L.   Gioja",  tiene  el  agrado  de   invitarlas/os  al   IV   INTERESCUELAS  DE  FILOSO-­‐FÍA  DEL  DERECHO  a  realizarse   los  días  31  de  octubre,  01  y  02  de  noviembre   del   presente   año   en   la   Facultad   de   Derecho   de   la  Universidad  de  Buenos  Aires.  

Entre   sus   ejes   temáticos   hay   uno   que   vincula   cuestiones   de  "Derecho  y  lenguaje/literatura".  

Email  para  contacto:  [email protected]    

GARANTISMO  E  LITERATURA      

O  que  a  Literatura  tem  a  nos  ensinar  sobre  o  garantismo?  Para  responder  essa  questão  e  promover   essa   intersecção,   ninguém   mais  indicado  do  que  André  Karam  Trindade.  Uma  das  principais  referências  do  estudo  do  Direito  e   Literatura   no  Brasil,   Trindade   também   con-­‐cluiu   seus   estudos   de   doutorado   com   Luigi  Ferrajoli,  na  Itália.  

O  Projeto  Direito,  Arte  e  Literatura  (UFS),  sob  coordenação  da  Profª.   Drª.   Míriam   Coutinho,   receberá   André   Karam   Trindade  para   uma   palestra   sobre   "Garantismo   e   Literatura",   dia   23   de  abril.    CAFÉ,  DIREITO  E  LITERATURA  DISCUTE  GRANDE  SERTÃO:  VERE-­‐DAS    

No  dia   13  de   abril,   o   35º   Encontro  Café,  Direito   e   Literatura  discutiu  a  obra  "Grande  Sertão:  Veredas",  de  Guimarães  Rosa.  

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BOLETIM da RDL P. 5

No   ambiente   de   uma   cafete-­‐ria,  sem  os  rigores  de  uma  sala  de  aula   e   para   além   dos   muros   das  Instituições,  professores  e  alunos,  não   só   do   Direito,   mas   também  das   Letras   e   de   outros   cursos,  juntamente   com   profissionais   de  fora   do   ambiente   acadêmico,  discutem   as   diversas   interfaces  entre   uma   determinada   obra  literária   e   o  Direito,   a   Sociologia,  a  Filosofia,  a  Psicologia,  a  Psicaná-­‐lise,  enfim,  entre  a  Literatura  e  os  diversos  olhares  sobre  a  vida    AS   RAÍZES  DA   EXPERIÊNCIA   JURÍDICA   -­‐   VIII   CONVENÇÃO  NACI-­‐ONAL  DA  ISLL  

A  próxima  convenção  da  Sociedade  Italiana  de  Direito  e  Lite-­‐ratura   (ISLL)   terá   lugar   em   Catanzaro,   na   Universidade   Magna  Graecia,  entre  os  dias  28  e  29  de  junho  de  2018.  

Os  dois  dias  de  conferência   serão   introduzidos  por  duas   ses-­‐sões   plenárias,   dedicadas,   respectivamente,   às   raízes  musicais   e  literárias  do  direito.  

http://www.lawandliterature.org/index.php    JAMES  BOYD  WHITE:  45  ANOS  DE  THE  LEGAL  IMAGINATION    

Para   celebrar   os   45   anos   da   publicação   da   obra   clássica  The  Legal   Imagination,   de   James   Boyd   White,   a   editora   holandesa  Wolters   Kluwer  preparou  essa   edição   especial.  O   lançamento   já  está  disponível  para  encomenda.  

Reverenciado  por  ser  pioneiro  no  movimento   do   Direito   e   Literatura,  The  Legal   Imagination  celebra  o  seu  45º   ano   de   estudantes   e   leitores  inspirados  em  todo  o  mundo.    

Nesta   edição   especial   de   aniver-­‐sário,   introduzida   com   um   novo  prefácio   pelo   autor   James   Boyd  White,  o   texto  original  e   integral   foi  cuidadosamente   reproduzido   para  desafiar  uma  nova  geração  de   leito-­‐res   a   entender   a   linguagem   da   lei  através   do   prisma   da   literatura.   Os  tópicos   abordados   em   The   Legal  

Imagination   são   tão   ecléticos   quanto   seus   leitores,   justapondo  exemplos   de   escrita   legal   ao   lado   de   poesia,   filosofia   e   crítica  literária.    

White  molda  discussões  instigantes  sobre  tópicos  que  cruzam  o  discurso  legal  e  não-­‐legal,  como  ler  a  retórica  de  Edmund  Burke  ao   lado   da   persuasão   homicida   de   Lady  Macbeth,   ou   comparar  poesia   elegíaca   com   a   terminologia   de   um   testamento   e   testa-­‐mento  final.    White  pede  a  seus  leitores  não  apenas  que  analisem  a   literatura   jurídica  e  não   legal,  mas  considerem  o  poder  da   lin-­‐guagem   e   como   ela   pode   ser   reimaginada.   Autores   extraídos  incluem   Fyodor   Dostoiévski,   Benjamin   Cardozo,   Albert   Camus,  Claude  Lévi-­‐Strauss  e  Emily  Dickinson.      

Publicado   pela   primeira   vez   em  1973,  The  Legal  Imagination  quebrou  a  convenção   e   instou   os   alunos   a   com-­‐preenderem   a   lei   além   da   memoriza-­‐ção,  incentivando  os  leitores  a  confiar  e  seguir  sua  própria  curiosidade  e  a  acei-­‐tar  a  natureza  e  os  limites  potenciais  da  linguagem  jurídica.  A  obra  deve  ser  lida  não  apenas  por  pessoas  do  Direito,  mas  por   qualquer   um   que   tenha   interesse  em   linguagem   e   poder,   e   em   escrever  como  forma  de  pensar  e  criar.      

O   livro  tem  uma  qualidade  atemporal.   James  Boyd  White  es-­‐creve  no  Prefácio,  acho  que,  de  fato,  pode  ser  de  maior  relevân-­‐cia  agora  do  que  quando  foi  publicado  pela  primeira  vez,  pois  sua  preocupação  central  é  com  a  integridade  da  lei,  da  linguagem,  do  indivíduo  em  uma  época  em  que  a  própria   integridade  às   vezes  parece  ser  ameaçada  como  um  valor.    

POESÍA  EN  VALLADOLID;  ARTES  Y  DERECHO  EN  MALAGA    

No  dia  13  de  abril,  o  Prof.  Dr.  José  Calvo  González  palestrou  no  painel   Direito   e   Literatura   das   II  Jornadas   "Poesía   en   Valladolid:  Poesía  y  Migraciones".  A  palestra  do   Professor   Calvo   González   dis-­‐correu   sobre   o   tema   "Escritura  jurídica:  La  institución  literaria  del  Derecho".  

Na  data  de  3  de  maio,   encer-­‐ra-­‐se  o  primeiro   ciclo  do   seminá-­‐rio   Artes   y   Derecho   promovido  pela   Cátedra   Abierta   de   Derecho  y   Literatura,   na   Universidade   de  Málaga   (ESP).  A   sessão  de  encerramento  discutirá  a   série  Game  of   Thrones   e   o   Direito,   com   exposição   do   Prof.   José   Francisco  Alenza  García  (Universidade  Pública  de  Navarra).    DIREITO  E  PSICANÁLISE  EM  CONEXÃO  NA  FACULDADE  DE  DIREI-­‐TO  DE  VITÓRIA  (ES)  

A  Escola  Lacaniana  de  Psicanálise  de  Vitória  e  a  Faculdade  de  Direito   de   Vitória   (FDV)   vão   realizar   mais   um   evento   da   série  Conexão   entre  Direito   e   Psicanálise   com  o   tema   “Grafiti   –   faço,  logo   existo”,   um   diálogo  sobre   “Arte   e   Cultura   como  espaço   de   reconstrução   de  identidades  e  memória  cole-­‐tiva”.  

O  evento  terá  como  con-­‐vidado   Starley   Bonfim   Silva,  grafiteiro,   artista   visual,  fundador   do   coletivo,   “FG-­‐Crew”,   estudante   de   artes  visuais  da  UFES.  As  vagas  são  limitadas   e   as   inscrições  podem   ser   realizadas   na  Escola  Lacaniana  e  na  FDV.  

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BOLETIM da RDL P. 6

 

NOVIDADES  EDITORIAIS    

 ROSA,    Alexandre  Morais  da.  Para  entender  a  delação   premiada   pela   teoria   dos   jogos:  táticas   e   estratégias   do   negócio   jurídico.  Florianópolis:  EModara,  2018.    

O   livro   Para   Entender   a  delação   pre-­‐miada  pela  teoria   dos   jogos  estuda   os  seguintes   capítulos:   Introdução   a   partir  do   case   Joesley   Batista;   Para   entender  a  teoria   dos   jogos  aplicada   à   delação:  noções   preliminares;   O   lugar   da   delação  premiada   no   dispositivo   do  processo  penal  transformado   em   mercado:   a   bar-­‐ganha  e  o  matching;   Jogadores   e   suas   funções  no   jogo  da  dela-­‐ção:   compradores,   vendedores  e  homologadores;  As   regras   (ne-­‐gociais)  do   jogo  da  delação  premiada;  As  recompensas  dos   joga-­‐dores;  As  táticas  e  estratégias  dos   jogadores;  Os  novos  mecanis-­‐mos   e   a  delação   premiada  a   partir   da   Lei   12.850/13;   A  delação  premiadacomo   ela   é.   O   que   significa   negociar:   barganha   como  novo  modelo  de  verdades  e;  Considerações  finais:  impasses  aber-­‐tos  ao  diálogo.  

Ao  trabalhar  o  instituto,  a  obra  aborda  a  importância  da  nar-­‐ratividade  e  cita  farta  bibliografia  sobre  Direito  e  Literatura.  

 MUSIL,  Robert.  Uniões:  A  Perfeição  do  Amor  e  a   Tentação   da   Quieta   Verônica.   Kathrin   H.  Rosenfield   (org.   e   ensaios).   Tradução   Kathrin  Rosenfield   e   Lawrence   Flores   Pereira.   São  Paulo:  Editora  Perspectiva,  2018.      

Vagando  e  divagando  pelo  corpo,  sen-­‐sações  e  pensamentos  de  duas  mulheres,  Robert  Musil,  célebre  autor  de  O  Homem  Sem  Qualidades,  constrói  em  Uniões  uma  narrativa   intensamente   dramática   e   fra-­‐gmentada,  de  absoluta  radicalidade.    

Traduzido  e  comentado  pela  primeira  vez  em  português  por  Kathrin  Rosenfield  e  Lawrence  Flores  Pereira,  Uniões  revive  agora  em  novo  contex-­‐to,  no  qual  os  conflitos  de  gênero  se  tornam  tão  acirrados  quan-­‐to  inevitáveis.  Uniões  reúne  dois  contos:  'A  Perfeição  do  Amor'  e  'A  Tentação  da  Quieta  Verônica',  protagonizados,  respectivamen-­‐te,  por  Claudine  e  Verônica.    

Os   traumas  psicológicos   vividos   pelas   personagens,   ainda  na  infância,   se   fazem   notar   já   na   idade   adulta   pelo   problema   da  entrega  de   corpo,   alma  e  mente   ao  homem  amado.  No  esforço  de  lidar  com  as  consequências  impostas  por  pulsões  sexuais  des-­‐controladas,   a   primeira   procura   proteger   seu   casamento,   en-­‐quanto   a   segunda   se   refugia   em   idealizações   fantasiosas   que   a  impedem  do  contato  humano  real.    

Comparável  às  tramas  psicológicas  de  Clarice  Lispector,  Musil  recorre   a   ferramentas   narrativas   muito   a   frente   de   seu   tempo  para  encontrar  dimensões  afetivas  onde  os  desafios  são  os  mes-­‐mos,  tanto  para  homens  quanto  para  mulheres.  

 

GIDDENS,   Thomas.   On   Comics   and   Legal  Aesthetics.  London:  Routledge,  2018,  

 Quais   são   as   implicações   dos   qua-­‐

drinhos   para   a   lei?   Enfrentando   essa  questão,   On   Comics   and   Legal   Aes-­‐thetics  explora  as  dimensões  epistemo-­‐lógicas   dos   quadrinhos   e   a   maneira  como   esse   meio,   outrora   difamado,  pode  ajudar  a  pensar  -­‐  e  a  remodelar  -­‐  a   forma   do   direito.   Atravessando   os  estudos  em  quadrinhos,  crítica  e  cultu-­‐ra   jurídica,  busca  enriquecer   a   teoriza-­‐ção  dos  quadrinhos  com  uma  estética  crítica  que  amplia  seu  valor  e  significado  para  a  lei,  assim  como  o  conhecimento  em  geral.    

Argumenta-­‐se   que   a   multimodalidade   dos   quadrinhos   -­‐   sua  estrutura   híbrida,   que   representa   um   ponto   de   encontro   entre  texto,  imagem,  razão  e  estética  -­‐  abre  a  compreensão  dos  limites  dos   textos   racionais   da   lei   ao  mudar   entre  múltiplos   quadros   e  modos  de  apresentação.    

Os  quadrinhos,  portanto,  expõem  o  modo  como  todas  as  for-­‐mas  de  conhecimento  são  moldadas  a  partir  de  um  universo  não  estruturado,   tornando-­‐se  uma  máscara   sobre  esse   "além"  caóti-­‐co.  Essa  máscara  de  conhecimento  permanece  assombrada  -­‐  por  aquilo  que  nunca  pode  capturar  ou  representar  totalmente.    

Os   quadrinhos,   portanto,   modelam   o   conhecimento   como  uma   infinidade   de   quadros   aninhados,   assombrados   pelo   caos  sem   estrutura.   Em   tal  modelo,   os  múltiplos   aspectos   do   direito  tornam-­‐se   uma   vasta   cascata   de   perspectivas   -­‐   um  multiframe  infinito   que   se   estende   muito   além   dos   confins   tradicionais   da  página  de  quadrinhos,  tornando  o  direito  ilimitado.  

   STRAIN.  Virginia  Lee.  Legal  Reform  in  English  Renaissance  Literature  Edinburgh:   Edinburgh   University   Press,  2018.       Este  livro  investiga  práticas  retóricas  e   representacionais   que   foram   usadas  para  monitorar  o  direito   inglês  na  vira-­‐da  do  século  XVII.  Os  fatos  históricos  do  período  foram  bem  documentados.       O   que   passou   despercebido,   no  entanto,  é  o  grau  em  que  a  própria   lei  foi   o   foco  da   reforma  dos   legisladores,  do   judiciário,   dos   pregadores   e   dos  escritores.       Enquanto  a  maioria  dos  estudos  de  Direito  e  Literatura  carac-­‐terizam  a  lei  como  uma  força  de  coerção  e  subjugação,  este  livro  trata,  em  maior  profundidade,  da  própria  vulnerabilidade  da   lei,  tanto  à  corrupção  quanto  à  correção.       Nas   leituras   de   Faerie   Queene,   Spenser,   Gesta   Grayorum,  Donne  Satyre  V  e  Shakespeare  (Measure  for  Measure  e  The  Win-­‐ter's  Tale),  Strain  argumenta  que  os  termos  e  técnicas  da  reforma  legal   propiciaram  modos  de   análise   através   dos   quais   as   autori-­‐dades  legais  e  escritores  literários  imaginavam  e  avaliavam  forma  e  caráter.        

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REDE BRASILEIRA DIREITO E LITERATURA

BOLETIM da RDL P. 7

   Revue   Droit   &   Littérature.   N°2-­‐2018     (402   pp.)  Editeur  :  L.G.D.J  

 Lançada  em  2017,  a  Revue  Droit  &  Littéra-­‐

ture  lança  o  seu  segundo  número:  Le  thème    Victor  Hugo  et  le  droit  ·∙  Victor  Hugo  et  les  magistrats,  Marcel  Foulon  ·∙  Victor  Hugo  et   la  peine  de  mort   :  une  ques-­‐tion  de  droit  ?,  Jean-­‐Luc  Gautero    ·∙  Hugo  juge  du  bagne,  Mansour  Bouaziz    ·∙  Variations  autour  de  l'équité  à  partir  de  l'oeuvre  de  Victor  Hugo,  Denys  Mas    ·∙  Les  Travailleurs  de  la  mer  :  baraterie,  barathrum,  Odile  Gannier    ·∙  Le  droit  mutilé  dans  L'Homme  qui  rit,  Sylvie  Ballestra-­‐Puech    ·∙  La  force  du  mot,  Yves  Strickler  Variétés  ·∙  Ce  que  le  droit  ne  dit  pas  que  la  littérature  dit,  Jean-­‐Marc  Chon-­‐nier  ·∙  Les  prophéties  rétrospectives,  Peter  Brooks  ·∙  Un  avocat  hors  la  loi,  Mathieu  Simonet  ·∙  Juger  sous  le  fascisme,  Franck  Laffaille  ·∙  Arbitrage  et  médiation  dans  la  littérature,  Charles  Jarrosson  ·∙   Juger  sans  règle.  Le   jugement  de  Salomon  et   le   jugement  d'Az-­‐dak,  Michel  Troper  ·∙  Poésie  et  Constitution,  Peter  Häberle  ·∙  La  transcendance  républicaine  en  question,  Alexandre  Viala  ·∙  Contentieux  et  différends,  François  Ost  ·∙   Imaginaire   littéraire  et   réalité   judiciaire,  Vincent  Caron  et   Jéré-­‐mie  Torres-­‐Ceyte  ·∙  Dire  et  représenter  la  pauvreté,  Yves-­‐Édouard  Le  Bos  ·∙   Le  droit  dans   les  Historiettes  de  Tallemant  des  Réaux,   Jean-­‐Pol  Masson  ·∙  Qui  est  le  propriétaire  de  l'or  du  Rhin  ?,  Jérémie  Leroy-­‐Ringuet  ·∙  Littérature  et  droit  de  la  communication,  Didier  Truchet    Un  texte  ·∙  «  Le  plagiat  par  anticipation  »  de  Pierre  Bayard,  Gaël  Chantepie    L'entretien  ·∙  Regards  d'un  professeur  de  droit  allemand  sur  le  juge  d'instruc-­‐tion  et  la  littérature  Entretien  avec  Heike  Jung    Chroniques  La  littérature  saisie  par  le  droit    ·∙  La  création  littéraire,  Michel  Vivant    ·∙  Les  oeuvres  littéraires,  Jean-­‐Michel  Bruguière  Le  droit  saisi  par  la  littérature    ·∙   Romans,   Audrey   Darsonville,   J.-­‐B.   Thierry,   Lionel   Miniato    ·∙  Le  théâtre,  Emmanuelle  Saulnier-­‐Cassia    

 

ARTIGOS  E  PUBLICAÇÕES  CUNHA,  Paulo  Ferreira  da.  Veredas  da  Retórica  &  Direito.  In:  Interpreta-­‐ção,   Retórica   e   Linguagem.   Coordenação   de   George   Salomão   Leite   /  Lenio  Luiz  Streck.  Salvador:  Juspodium,  2018,  pp.  215-­‐236.  

GONZÁLEZ,  José  Calvo.  Imago  iuris  en  la  'Allegorie  van  Justitia  met  Dood-­‐zonden'.   Cultura   visual   del   Derecho:   la   pictura   del   sistema   inquisitivo  

europeo  durante  el  s.  XVI”.  Revista  Jurídica  de  Investigación  e  Innovación  educativa  (Nueva  Época)  17  (enero  2018),  pp.  11-­‐26.  Accesible  en:    

http://www.revistas.uma.es/index.php/rejie/article/view/4157/3907  

OLIVEIRA,  Alana   Lima  de;  RIVERA,  Carolina  Quarteu;  ARAÚJO,   José  Aél-­‐son   Pereira   de.  As   desigualdades   de   gênero   no   âmbito   jurídico-­‐político  denunciadas   nas   obras  Direitos   das  mulheres   e   injustiça   dos   homens  e  Sejamos  todos  feministas.    

 

AGENDA    1a  Conferência  Brasileira  de  Direito  e  Arte  Local:  Centro  Cultural  Ariano  Suassuna,  do  Tribunal  de  Contas  da  Paraíba  Data:  16  a  18  de  maio    'Law   and   Literature'.   Dehradun   Community   Literature   Festival  2018  3rd  Edition.    Local:  Dehradun  (Uttarakhand.  India)  Data:  19,  20  e  21  de  abril      Curso   de   curta   duração   –   Direito,   Arte   e   Literatura:   Minority  Report:  uma  nova  lei?  Local:  FDV  Início:  8  de  março  Ministrante:  Prof.  Dr.  Nelson  Camatta  Moreira    Seminário  Recht  und  Literatur  Local:  Universidade  de  Salzburg  Data:  11  de  abril    Garantismo  e  Literatura  Local:  Universidade  Federal  de  Sergipe  Data:  23  de  abril    Conexão  entre  Direito  e  Psicanálise:  “Grafiti  –  faço,  logo  existo”  Local:  Faculdade  de  Direito  de  Vitória  Data:  25  de  abril    IV  DIRCIN  -­‐  Direito  e  Cinema  em  Debate  Local:  Campus  de  Jacarezinho  da  UENP  Data:  23  a  25  de  maio    As   raízes   da   experiência   jurídica   -­‐   VIII   convenção   nacional   da  ISLL  Local:  Catanzaro,  na  Universidade  Magna  Graecia  Data:  28  e  29  de  junho    Libertad  de  expresión:  diálogos  y  reflexiones  desde  el  derecho  y  la  literatura  Local:  Quito,  Ecuador  Data:  20  a  23  de  junho    IV  Interescuelas  de  filosofía  del  derecho  Local:  Facultad  de  Derecho  de  la  Universidad  de  Buenos  Aires  Data:  31  de  outubro  a  2  de  novembro