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Brasil e Argentina: uma análise macroeconômica comparativa a partir dos planos de estabilização dos anos 90 Morine Alves Fonseca Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação do Instituto COPPEAD de Administração da Universidade Fede ral do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Administração (M.Sc.). Orientadora: Prof a . Margarida Gutierrez D.Sc. em Administração COPPEAD/UFRJ Rio de Janeiro 2006

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Brasil e Argentina: uma análise macroeconômica

comparativa a partir dos planos de estabilização dos anos 90

Morine Alves Fonseca

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de

Pós-Graduação do Instituto COPPEAD de

Administração da Universidade Federal do Rio de

Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à

obtenção do grau de Mestre em Administração (M.Sc.).

Orientadora: Profa. Margarida Gutierrez

D.Sc. em Administração COPPEAD/UFRJ

Rio de Janeiro

2006

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Brasil e Argentina: uma análise macroeconômica comparativa a

partir dos planos de estabilização dos anos 90.

Morine Alves Fonseca

Dissertação de Mestrado submetida à Banca Examinadora do Instituto COPPEAD de

Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos

requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Administração (M.Sc.)..

Aprovada por:

__________________________________________ Presidente da Banca

Profa. Margarida Gutierrez, D.Sc. - Orientadora

(COPPEAD/UFRJ)

________________________________________

Profa. Letícia Casotti, D.Sc.

(COPPEAD/UFRJ)

________________________________________

Prof. Antônio Luis Licha, D.Sc.

(IE/UFRJ)

Rio de Janeiro – Brasil Outubro - 2006

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Fonseca, Morine Alves. Brasil e Argentina: uma análise macroeconômica comparativa a partir dos planos de estabilização dos anos 90/ Morine Alves Fonseca. - Rio de Janeiro: UFRJ/ COPPEAD, 2006. xi, 116f.: il.; 31 cm. Orientadora: Margarida Gutierrez. Dissertação (mestrado) – UFRJ/ COPPEAD/ Programa de Pós-graduação em Administração, 2006. Referências bibliográficas: f. 112-116. 1. Macroeconomia. 2. Análise de políticas econômicas. I. Gutierrez, Margarida. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Pós-Graduação em Administração. III. Título.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, grandes responsáveis por eu ter chegado até aqui, ao me fornecerem não

somente os instrumentos necessários para que eu pudesse escolher meu caminho e

atingir meus objetivos, mas também apoio incondicional nas minhas decisões.

Aos meus irmãos e familiares, pela amizade e apoio.

Ao Marcus, pela compreensão e ajuda.

À Margarida, pela enorme paciência e por me estimular sempre na busca por

melhoramento constante.

Aos meus amigos do mestrado, funcionários e professores do COPPEAD, por

proporcionarem um momento único na minha vida, não só pelo crescimento

profissional que me ajudaram a atingir, mas pelos muitos momentos de alegria, amizade

e companheirismo.

Aos meus amigos, por compreenderem minha ausência e me apoiarem.

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RESUMO

FONSECA, Morine Alves. Brasil e Argentina: uma análise macroeconômica

comparativa a partir dos planos de estabilização dos anos 90. Rio de Janeiro, 2006.

Dissertação (Mestrado em Administração). Instituto COPPEAD de Administração,

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006.

O objetivo deste trabalho é traçar um paralelo entre as políticas econômicas

utilizadas no Brasil e na Argentina a partir dos planos de estabilização implementados

em 1994 e 1991 respectivamente, assim como avaliar os resultados macroeconômicos

que elas produziram em termos de crescimento econômico, estabilização das taxas de

inflação, desempenho do comércio exterior e das contas públicas, dentre outros

indicadores. Tenta-se, com isso, entender os motivos que levaram a Argentina a

abandonar seu plano de estabilização e decretar moratória, enquanto o plano de

estabilização brasileiro, após significativa alteração de rumo em suas políticas em 1999,

permanece até os dias de hoje.

À luz desta análise discute-se também as perspectivas futuras de evolução dos

indicadores macroeconômicos destes países. Os resultados sugerem que as políticas

adotadas pela Argentina nos últimos anos podem levar o país a uma nova espiral

inflacionária, enquanto o Brasil vem adotando políticas macroeconômicas que teriam

maior probabilidade de promover um crescimento de longo prazo.

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ABSTRACT

Fonseca, Morine Alves. BRASIL E ARGENTINA: UMA ANÁLISE

MACROECONÔMICA COMPARATIVA A PARTIR DOS PLANOS DE

ESTABILIZAÇÃO DOS ANOS 90. Orientador: Margarida Gutierrez. Rio de Janeiro:

Instituto COPPEAD de Administração UFRJ – UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO

DE JANEIRO; 2006. Dissertação (Mestrado em Administração).

The main object of this task is to draw a parallel between economic policies in

Brazil and Argentina since their stabilization plans, implemented in 1994 and 1991

respectively, and to evaluate the macroeconomic results they produced in terms of

economic growth, inflation stabilization, external market, public accounts and other

economic indicators. The present task tries to find the reasons that led Argentina to

abandon its stabilization plan and request default in its external public debt repayments,

while Brazil, after having changed its economic policy in 1999, has maintained its

stability plan until today.

By means of this analysis, future perspectives for macroeconomic indicators in

these countries are discussed. The results suggests that the policies adopted by

Argentina in recent years can drive the country to a new inflation growth, while Brazil

is adopting macroeconomic policies with greater possibility of promoting long term

growth.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................. 1 1.1 Motivação e objetivos .............................................................................................1 1.2 Organização ............................................................................................................2 2 REFERENCIAL TEÓRICO............................................................... 4 2.1 Política Monetária...................................................................................................4 2.2 Política Fiscal..........................................................................................................7 2.3 Política Cambial......................................................................................................8 2.4 O modelo IS-LM-BP ............................................................................................11

2.4.1 Sob regime de câmbio fixo ...........................................................................12 2.4.2 Sob regime de câmbio flutuante ...................................................................13

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA...........................................................14 3.1 Regimes Cambiais ................................................................................................14 3.2 Controle de Capitais .............................................................................................23 4 O BRASIL E O PLANO REAL .........................................................28 4.1 Antecedentes .........................................................................................................28 4.2. Implantação do Plano Real ...................................................................................31 4.3. As fases do Plano Real e seus resultados ..............................................................34

4.3.1 Primeira fase .................................................................................................35 4.3.2 Segunda fase .................................................................................................51

5 A ARGENTINA E O PLANO DE CONVERSIBILIDADE ..............71 5.1 Antecedentes .........................................................................................................71 5.2 O Plano de Conversibilidade e a crise ..................................................................73

5.2.1 Política Monetária.........................................................................................74 5.2.2 Política Cambial............................................................................................77 5.2.3 Política Fiscal................................................................................................79 5.2.4 A crise argentina e as políticas pós-crise ......................................................85

5.3 Resultados econômicos.........................................................................................88 6 ANÁLISE COMPARATIVA: BRASIL E ARGENTINA ................ 100 7 CONCLUSÃO.................................................................................. 109 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................. 112

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1 INTRODUÇÃO

1.1 Motivação e objetivos

Diante das recentes crises ocorridas no Brasil, com a mudança de regime cambial e

adoção do câmbio flutuante em 1999, e na Argentina, com o abandono do regime de currency

board nos primeiros dias de 2002, bem como a forte ligação comercial existente entre esses

países, torna-se importante discutir as diferenças e semelhanças entre as políticas

macroeconômicas que vêm sendo adotadas por eles nos últimos anos, e suas conseqüências para

o desempenho econômico e para o crescimento.

As crises que atingiram os países emergentes vinham ocorrendo desde meados da década

de 1990, e se iniciaram com a crise mexicana em 1994, seguida pela crise asiática em 1997 e

pela crise russa em 1998. Estas crises retraíram a liquidez internacional e acabaram levando às

crises brasileira, em 1999, e argentina, em 2001/2002, quando, devido à vulnerabilidade externa

destes países gerada por suas políticas, ocorre fuga de capitais e estes se vêem sem alternativa

que não abandonar seus regimes de âncora cambial e alterar suas políticas econômicas.

O propósito deste trabalho, portanto, é comparar essas políticas a partir dos planos de

estabilização que ficaram conhecidos como Plano Real, no Brasil, e Plano de Conversibilidade,

no caso argentino, quando, após tentativas fracassadas, ambos os países conseguem se livrar dos

processos hiperinflacionários que viveram durante anos e passam a partir de então, a buscar a

consolidação desta estabilidade de preços e a promover o crescimento de suas economias.

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Com o objetivo de avaliar os problemas macroeconômicos existentes nas políticas

adotadas por estes países durante os primeiros anos de estabilização, são analisados os resultados

destas políticas e as alterações ocorridas nos rumos delas após os ataques especulativos que estes

países sofreram, além de se discutir como estas mudanças têm gerado resultados diferentes para

cada um destes países e para as perspectivas futuras de seus indicadores macroeconômicos.

1.2 Organização

O trabalho está dividido em sete capítulos. O capítulo introdutório procurou definir a

análise a ser desenvolvida, os objetivos do trabalho e a estrutura da dissertação. O segundo

capítulo é destinado à descrição do referencial teórico, que explica os principais mecanismos das

políticas monetária, fiscal e cambial, bem como a forma que estas políticas interagem. No

capítulo seguinte é apresentada a revisão bibliográfica, que se baseará na discussão acerca da

adoção da livre mobilidade de capitais por países emergentes e no tipo de regime cambial que

deveria ser adotado por eles, objetivando o melhor desempenho econômico.

O quarto capítulo traz uma análise do Plano Real, incluindo seus antecedentes, as fases de

implantação, e as políticas econômicas adotadas nas duas etapas nas quais o plano foi dividido,

assim como os resultados que estas políticas produziram. No quinto capítulo, analisa-se o Plano

de Conversibilidade, e, tal como no capítulo anterior, inclui seus antecedentes, políticas adotadas

e resultados obtidos.

Após análise detalhada das políticas adotadas no Brasil e na Argentina, o sexto capítulo

traz uma análise comparativa de tais políticas e dos resultados que estas produziram, assim como

busca traçar perspectivas para o desempenho econômico dos países analisados. Finalmente, no

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sétimo capítulo, conclui-se o trabalho, com uma síntese sobre a análise realizada ao longo da

dissertação.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

Antes de iniciar-se uma análise das políticas econômicas adotadas por Brasil e Argentina

a partir de seus planos de estabilização e os resultados macroeconômicos alcançados por estes

países, é importante definir os principais mecanismos e instrumentos das políticas monetária,

fiscal e cambial, bem como de que forma estas políticas interagem. Para analisar as formas de

interação entre estas políticas, e como estas afetam as principais variáveis macroeconômicas,

como demanda agregada e nível de produto da economia, será utilizado o modelo IS-LM-BP.1

2.1 Política Monetária

A política monetária refere-se à atuação do Banco Central na definição das condições de

liquidez da economia, que pode se dar através de alterações na oferta de moeda, no nível da taxa

de juros, ou através de outros instrumentos, conforme será explicado nesta seção. Para que se

entenda o mercado monetário, se faz necessária uma análise tanto do lado da demanda quanto da

oferta de moeda.

Iniciemos pela análise da demanda por moeda, que tem na Teoria Quantitativa da Moeda

(TQM), uma das principais correntes de pensamento a explicar tal demanda. A TQM define que

esta é dependente basicamente da renda, e um aumento na oferta de moeda acima da taxa de

crescimento do produto levaria, no longo prazo, apenas a um aumento no nível dos preços,

enquanto o crescimento do volume físico do produto seria determinado unicamente por fatores

1 Esta análise se baseou predominantemente nas bibliografias de CARDIM (2001), GIAMBIAGI (1999), LOPES (2000) e MANKIW (1997).

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reais. No curto prazo, porém, mudanças na oferta de moeda poderiam influenciar preços e

variáveis reais da economia.

A TQM define que o total de moeda no sistema multiplicado por sua velocidade de

circulação deveria ser igual ao produto nominal da economia, ou seja, o produto real acrescido

de inflação. Por aproximação, a TQM considera a velocidade com que a moeda circula

constante, o que faz com que a quantidade de moeda determine o PIB nominal. Dado que o PIB

real é determinado pela capacidade produtiva da economia, uma variação na quantidade de

moeda ofertada afetaria somente o nível de preços.

Em 1950 Milton Friedman definiu novos conceitos para explicar a função de demanda

por moeda. A visão de Friedman é considerada uma retomada da TQM, pois considera que o

impacto final da política monetária se dará apenas no nível de preços. As abordagens, porém,

possuem algumas diferenças, como a consideração, por Friedman, que a velocidade-renda da

moeda é uma função estável e previsível, ainda que não constante, de algumas variáveis

econômicas.

Segundo a abordagem de Friedman, a quantidade demandada de moeda dependeria,

principalmente: (i) dos gostos e preferências dos detentores de riqueza ; (ii) do custo de

oportunidade da moeda, medido pela taxa de retorno dos demais ativos financeiros; (iii) da

riqueza total já existente, que seria composta de riqueza humana – ilíquida e relacionada à

capacidade produtiva dos trabalhadores – e riqueza não-humana, sendo que, quanto maior a

parcela da riqueza humana para um indivíduo, mais ele demandaria moeda para compensar sua

falta de liquidez.

Uma outra forma de ver a demanda por moeda foi definida por Keynes, cuja visão

ganhou força logo após a Grande Depressão de 1929 e principalmente após a Segunda Guerra

Mundial, defendendo que a presença do Estado na economia seria fundamental para garantir seu

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equilíbrio e estabilidade. Segundo a visão keynesiana, a oferta e a demanda por moeda

definiriam a taxa de juros, sendo a oferta de moeda uma variável exógena, determinada pelo

Banco Central, enquanto a demanda por moeda se daria de acordo com a teoria da preferência

pela liquidez, sendo definida pela taxa de juros, que seria o custo de oportunidade de manter

moeda.

Para Keynes, a taxa de juros se ajustaria de forma a garantir o equilíbrio entre oferta e

demanda por moeda, com alterações na oferta de moeda alterando as taxas de juros, e

consequentemente a quantidade demandada de moeda, diferentemente da TQM, que não

considerava que a taxa de juros impactasse a demanda por moeda.

A oferta de moeda, por outro lado, é controlada pelo Banco Central, porém não

determinada apenas por este, pois bancos comerciais também podem liquidar transações através

de outros tipos de moeda bancária. O Banco Central, portanto, define a base monetária – soma

do papel-moeda em poder do público com as reservas dos bancos –, e os bancos comerciais

podem criar meios de pagamento adicionais, como os empréstimos, por exemplo, expandindo a

oferta de moeda.

Estes bancos comerciais mantêm, ainda, determinada parcela de seus depósitos sob a

forma de reservas, que podem ser compulsórias ou voluntárias, para reduzir o risco de liquidez,

ou seja, de não ter em caixa dinheiro suficiente para atender à demanda por saques nos depósitos

à vista.

O conjunto dos meios de pagamento com característica de liquidez absoluta, e que,

portanto, não rendem juros, constituem o agregado monetário M1, que inclui o papel moeda em

poder do público e os depósitos à vista. Por não oferecer nenhum rendimento, o M1 sofre todo o

impacto da inflação, motivo pelo qual, quando a inflação acelera, observa-se forte redução de

M1, processo chamado de desmonetização.

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Com relação aos instrumentos de política monetária que o Banco Central pode utilizar

para controlar a oferta monetária, os mais importantes são os recolhimentos compulsórios de

parcela dos depósitos, os empréstimos de liquidez, a taxa de redesconto (incidente sobre esses

empréstimos) e as operações de mercado aberto (Open Market).

2.2 Política Fiscal

A política fiscal pode ser definida como a forma que o governo atua em relação à

arrecadação de impostos e gastos, de forma a afetar a demanda agregada da economia, e com o

objetivo de garantir o crescimento econômico e um nível de emprego adequado. A demanda, por

sua vez, pode ser afetada pela política fiscal de duas formas: devido a alterações na renda

disponível à sociedade causada por variações nos tributos, ou devido ao próprio gasto do

governo, que também compõe a demanda agregada.

É interessante destacar a discussão existente sobre se o governo deve ou não tentar

influenciar a economia através de sua política fiscal2. Defensores de uma visão keynesiana

afirmam que a intervenção é legítima para evitar flutuações econômicas. De acordo com Keynes,

os gastos públicos são necessários para eliminar o desemprego e estimular o aumento da renda,

uma vez que redução de impostos ou aumento nos gastos públicos estimularia a demanda

agregada.

De outro lado, críticos questionam o financiamento desses gastos governamentais,

principalmente em momentos de retração econômica, quando a arrecadação de impostos cai

devido à redução na demanda e o governo gasta mais para estimular a retomada do crescimento.

2 Seja através de política fiscal expansionista, com o aumento dos gastos públicos e/ ou redução de impostos com o objetivo de estimular a demanda, ou através de política contracionista, de efeito contrário.

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Tal situação provocaria um aumento da dívida pública e da vulnerabilidade do país, tornando

esta situação insustentável no longo prazo.

Em termos de dívida pública, alguns economistas argumentam que uma redução da carga

tributária que provocasse um aumento desta dívida, acabaria por levar a um crescimento do

consumo e conseqüente redução da poupança nacional, aumentando a taxa de juros e retraindo os

investimentos e o nível de produto no longo prazo.

Por outro lado, a teoria de equivalência ricardiana diz que, caso o governo decida reduzir

impostos sem cortar despesas, o consumidor não iria aumentar seu consumo por entender ser esta

uma situação insustentável, com os impostos subindo no futuro para liquidar a dívida pública que

iria aumentar com essa estratégia. Em suma, o consumidor entenderia que um aumento do

endividamento público no presente significaria aumento de impostos no futuro, o que o levaria a

poupar o excedente de renda disponível com a redução dos impostos, o que, juntamente com a

queda da poupança pública, faria com que a poupança nacional permanecesse inalterada.

No entanto, o consumo seria efetivamente estimulado caso o governo reduzisse impostos

juntamente com o corte de gastos, uma vez os consumidores teriam a percepção de que não

haveria aumento futuro de impostos. A equivalência a que se refere a teoria diz que financiar o

governo através de dívida pública é o equivalente a financiá-lo através de impostos.

2.3 Política Cambial

As políticas cambiais irão variar de acordo com o regime cambial adotado. Nesta seção

serão apresentados os principais tipos de regime cambial, a fim de dar subsídio à discussão,

apresentada na próxima seção através do modelo IS-LM-BP, de como interagem as políticas

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econômicas, assim como à discussão acerca do melhor regime a ser adotado por uma economia

emergente, que será feita no próximo capítulo.

Os dois tipos extremos de regime cambial são o de flutuação pura e o de câmbio fixo

imutável. O regime de flutuação pura é aquele em que a taxa de câmbio é determinada

exclusivamente através da oferta e demanda por moeda, ou seja, quando a demanda por moeda

local aumenta, a taxa de câmbio se valoriza, caso a oferta de moeda estrangeira não se altere. Da

mesma forma, caso haja uma maior demanda por moeda estrangeira, a moeda doméstica se

desvalorizará. Com isso, o balanço de pagamentos sempre se equilibraria e o Banco Central não

precisaria utilizar suas reservas internacionais para atender aos movimentos de oferta e demanda

por divisas, enquanto a economia seria afetada pelo balanço de pagamentos à medida que este

provocasse alterações na taxa de câmbio. Este tipo de regime, por outro lado, leva a constantes

alterações nos preços relativos.

O regime de câmbio fixo, por sua vez, é aquele em que o governo estabelece uma taxa de

câmbio, que não poderá variar com as mudanças na oferta e demanda de divisas. O Banco

Central, portanto, deve agir comprando e vendendo divisas para atender ao mercado, e alterando,

consequentemente, o nível de reservas internacionais. No entanto, o Banco Central pode utilizar

alguns instrumentos para reduzir estas diferenças entre oferta e demanda de divisas, como o

estabelecimento de taxa de juros visando estimular a entrada ou saída de capitais.

Entre as experiências com câmbio fixo, as de maior destaque foram o padrão-ouro e o

currency-board. O padrão-ouro, que vigorou de 1873 a 1913 e de 1925 a 1931, estabelecia a

fixação de uma paridade oficial da moeda doméstica ao ouro, sendo que o país deveria garantir a

conversibilidade da moeda à paridade fixada e manter lastro em ouro para o estoque de moeda.

Segundo este sistema, países deficitários sofreriam perda de ouro através de seus balanços de

pagamentos, reduzindo o estoque de moeda doméstica e o nível de preços. Com isso, a

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competitividade externa seria aumentada, reduzindo o déficit. Através de movimento semelhante

para uma economia superavitária, seria encontrado automaticamente um equilíbrio no balanço de

pagamentos.

O sistema de currency board, por outro lado, se assemelha ao padrão-ouro, pois é

caracterizado por uma paridade fixa entre a moeda nacional e uma moeda estrangeira, por um

lastro em divisas para o estoque da base monetária, e pelo fato do Banco Central só poder emitir

moeda para comprar reservas internacionais. Quando há excesso de demanda por divisas, o

Banco Central vende parte de suas reservas, levando a uma contração monetária. Com isso, a

base monetária passa a ser determinada pelo balanço de pagamentos, e a taxa de câmbio passa a

acompanhar a flutuação da moeda-âncora em relação às demais moedas. Normalmente este

regime é adotado quando há uma falta de credibilidade na moeda ou na política monetária

tamanha que é preferível renunciar ao exercício das políticas monetária e cambial em nome da

credibilidade da moeda.

Os tipos de regimes cambiais, no entanto, não se restringem aos de câmbio flutuante e

fixo puros. Uma outra possibilidade é a flutuação suja, que se assemelha ao câmbio flutuante,

porém, neste caso, o Banco Central em alguns momentos entra comprando ou vendendo divisas

no mercado de câmbio com o objetivo de direcionar e/ ou limitar as variações da taxa de câmbio.

Há ainda o regime de bandas cambiais, no qual são impostos limites mínimos e/ou máximos à

taxa de câmbio dentro dos quais o câmbio poderia oscilar como em um regime de câmbio

flutuante, enquanto quando a cotação atingisse algum dos limites, o regime funcionaria como

sendo de câmbio fixo.

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2.4 O modelo IS-LM-BP

O modelo IS-LM-BP é um dos mais usados para entender como ocorre a interação entre

políticas econômicas, tendo se transformado freqüentemente em base teórica para a implantação

de políticas macroeconômicas em diversos países. Este modelo prevê a possibilidade da

existência de perfeita mobilidade de capitais (economia pequena), de mobilidade imperfeita

(economia grande) ou de ausência de mobilidade de capitais. Como as duas economias que serão

analisadas, Brasil e Argentina, possuem uma participação relativamente pequena na economia

mundial, e suas eventuais tentativas de controlar capitais teriam impacto pequeno para

determinar o fluxo destes, abordaremos apenas a situação de perfeita mobilidade de capitais.

O gráfico do modelo é apresentado para melhorar a visualização da integração entre as

políticas econômicas, e representa no eixo horizontal o produto, ou PIB da economia (Y),

enquanto no vertical fica a taxa de juros (r).

Gráfico 1 – Curva IS-LM-BP

BP

LM

IS

Y

r

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A curva IS é uma função que representa o equilíbrio no mercado de bens e serviços,

sendo determinada pelo consumo, investimento e gastos do governo. Caso qualquer um desses

itens aumente, a curva se deslocará para a direita, levando a uma expansão do produto, e caso se

reduzam, a curva fará o movimento contrário . A curva IS possui ainda uma relação inversa com

a taxa de juros, fazendo com que menores taxas de juros estimulem a demanda interna e levem a

um incremento do produto nacional. Já a curva LM representa o equilíbrio no mercado de oferta

e demanda por moeda, mostrando a relação entre taxas de juros e nível de renda que se

estabelece no mercado de saldos monetários reais. Esta curva se desloca para a esquerda caso a

oferta de moeda diminua e para a direita caso aumente, determinando a taxa de juros.

A curva BP, por sua vez, é determinada pelo equilíbrio no Balanço de Pagamentos, no

qual o saldo deste é nulo . Sua posição horizontal se deve à suposição de perfeita mobilidade de

capitais, pois caso a taxa de juros local fique diferente da internacional, haverá uma entrada ou

saída massiva de capitais em busca de maiores rendimentos, torna ndo insustentável tal situação.

O modelo IS-LM-BP pode ser dividido de acordo com o regime cambial adotado: fixo ou

flutuante. Apresentaremos ambas as análises, uma vez que as economias a serem analisadas

adotaram os dois tipos de regime em momentos diferentes de suas histórias.

2.4.1 Sob regime de câmbio fixo

O modelo IS-LM-BP diz que, no caso de uma economia sob regime de câmbio fixo e

com livre mobilidade de capitais, o impacto da política monetária sobre o produto seria nulo.

Esse mecanismo se daria através da alteração da taxa de juros interna, que ficaria diferente da

taxa internacional e levaria a uma entrada ou saída massiva de capitais. Esta situação não seria

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sustentável, pois o Banco Central, para manter o câmbio fixo, teria que atender a esse excesso de

demanda ou oferta de divisas através de alterações na base monetária, o que faria com que a taxa

de juros voltasse a ficar igual à taxa internacional, cessando o movimento de capitais e voltando

para a situação inicial, sem implicar em alterações no produto.

Em termos de política fiscal, no caso de uma política expansionista, os juros irão

aumentar, provocando forte entrada de capitais e aumento da base monetária. A expansão da

quantidade de moeda, ao mesmo tempo em que permitiria a volta dos juros aos níveis

internacionais, também contribuiria para amplificar os efeitos desta política sobre a expansão do

produto. No caso de uma política fiscal restritiva o efeito seria contrário, contraindo o produto.

2.4.2 Sob regime de câmbio flutuante

Uma política monetária expansionista sob um regime de câmbio flutuante pressiona rá a

taxa de juros para baixo, provocando acentuada fuga de capitais e desvalorização da moeda local.

A taxa de câmbio se desvalorizará até que a IS intercepte a LM ao nível de taxa de juros

internacional, quando cessa a pressão por desvalorização. Com isso, esta política é eficaz para

promover o aumento do produto, ao melhorar o saldo de transações correntes através da

desvalorização. O mesmo mecanismo, porém com efeito contrário, também é verificado para o

caso de uma política restritiva.

Uma política fiscal expansionista, por sua vez, pressionará as taxas de juros para cima,

valorizando a moeda nacional e retraindo as exportações, até que a curva IS volte para sua

posição inicial, fazendo com que a política fiscal (tanto expansionista quanto contracionista) não

tenha efeito sobre o produto.

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3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

A revisão bibliográfica se baseará na apresentação dos principais trabalhos e correntes

relacionados com as políticas econômicas a serem adotadas por um país que objetive o

crescimento sustentável, com enfoque nas discussões sobre se países emergentes deveriam adotar

a livre mobilidade de capitais ou restringir tal mobilidade e sobre qual seria o melhor tipo de

regime cambial a ser utilizado por estes países objetivando o melhor desempenho econômico, no

que se incluiu uma discussão acerca da utilização de uma política monetária baseada em metas

para a inflação.

3.1 Regimes Cambiais

A discussão sobre o melhor regime cambial a ser adotado pelos países emergentes

ganhou força após as sucessivas crises cambiais ocorridas no passado recente em diversos destes

países, como o México, em 1994, Tailândia, Indonésia, Malásia, Filipinas e Coréia do Sul, em

1997, Rússia, em 1998, Brasil, em 1999, Turquia em 2000, e Argentina, em 2001.

Entre as décadas de 1950 e 1970, foi estabelecido um tipo de consenso, descrito por

Shashoua (2002), sobre as principais vantagens e desvantagens dos regimes de câmbio fixo e

flutuante. O câmbio fixo teria como vantagens o favorecimento do comércio e do investimento

ao reduzir o custo de transação e o risco cambial, além de fornecer uma âncora para a

determinação de preços e salários na economia. No entanto, este regime traria como

desvantagens a perda de autonomia da política monetária e um aumento na volatilidade da

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atividade econômica e no nível de preços, que passariam a ser fortemente afetados pelo fluxo de

divisas, além de aumentar a vulnerabilidade a um ataque especulativo contra a moeda,

particularmente em uma situação de grande mobilidade de capitais.

Ainda segundo este consenso, um regime de câmbio flexível teria como principal

vantagem permitir que a política monetária fosse operacionalizada em função dos objetivos

domésticos de preço ou produto, não ficando restrita apenas a garantir que a base monetária

estivesse atrelada às reservas internacionais. Em contrapartida, este regime traria como

conseqüência maior volatilidade da taxa de câmbio, que tornaria a competitividade dos produtos

domésticos mais suscetível aos movimentos do mercado financeiro internacional, além de inibir

os investimentos ao aumentar as incertezas relacionadas ao câmbio.

Dois exemplos importantes de regimes de câmbio fixo são o currency board, já discutido

no capítulo anterior, e a dolarização. Neste último caso, a moeda nacional é substituída pelo

dólar (ou por outro tipo de moeda forte, como o euro), representando um regime mais radical do

que o anterior, pois torna mais difícil o reto rno ao controle da política monetária e o

estabelecimento de um novo patamar para o câmbio.

De acordo com Calcagno e Manuelito (2001), em um regime de currency board, o fluxo

de capital estrangeiro faz com que, no caso de um aumento em sua entrada, o estoque de reservas

internacionais aumente, levando a uma expansão da base monetária e do crédito, com queda na

taxa de juros, o que acaba por estimular a economia, promovendo seu crescimento. Um fluxo

negativo de divisas provocaria o efeito contrário, retraindo a atividade econômica. Além disso, o

estímulo dado pela entrada de divisas geraria um aumento das importações, levando a um ajuste

automático ao provocar uma retração no estoque de moeda estrangeira. Tal ajuste também seria

verdadeiro no caso de uma retração econômica, que retrairia as importações e aumentaria o

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estoque de divisas, possibilitando a retomada do crescimento. Com isso, o sistema tenderia a

produzir ciclos econômicos ao possuir um mecanismo de ajuste automático.

Em defesa do câmbio fixo, Shashoua (2002) argumenta que a adoção de um regime de

câmbio flutuante não seria condição suficiente para a política monetária ser operacionalizada

exclusivamente em função dos objetivos domésticos de preço ou produto, como argumentado

pelos defensores da utilização deste regime, pois esta política deverá ser guiada também a fim de

administrar a conta capital quando houver expectativa de interrupção ou redução do fluxo de

capitais estrangeiros, no caso de uma economia com mobilidade de capitais e déficit em

transações correntes.

Defensores do regime de câmbio fixo argumentavam ainda que os países que adotavam o

regime de câmbio flutuante, na prática, não o deixavam flutuar, o que revelava no fundo a sua

preferência por regimes de câmbio fixo ou de flexibilidade restrita.

Essa era a idéia principal por trás da hipótese do “fear of floating” existente em

economias emergentes, de Calvo e Reinhart (2000a), conhecidos defensores de regimes cambiais

com algum tipo de fixação (“hard peg”), e que se baseava na idéia de que esse medo da

flutuação seria conseqüência do medo de um colapso financeiro e da volta da inflação devido à

existência de fragilidade financeira, baixa credibilidade da política monetária, um elevado pass-

through das alterações do câmbio para a inflação, e efeitos desfavoráveis da incerteza cambial

para o crescimento econômico.

Calvo e Mishkin (2003) rebatem ainda o argumento de que o regime de câmbio flexível

garantiria uma política monetária mais ativa, afirmando que, no caso de países emergentes, este

argumento poderia não ser válido. A justificativa seria que os mercados de capitais destes países

sofreriam forte influência dos grandes centros financeiros do mundo, além de, em um momento

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de crise, os países emergentes serem afetados como um grupo único, o que tornaria difícil para

os bancos centrais destes países operarem, na prática, uma política monetária autônoma.

A dificuldade em operar uma política monetária autônoma se tornaria ainda mais crítica

no caso dos bancos centrais não possuírem credibilidade em relação ao seu comprometimento

com o controle da inflação, o que tornaria tal política ineficaz. Calvo e Mishkin, porém, admitem

que, no caso de um país emergente possuir instituições monetária, financeira e fiscal capazes de

fornecer credibilidade ao mercado, ele poderia ser bem sucedido em operar uma política

monetária ativa para estabilizar a economia. O que os autores questionam é se tais países seriam

capazes de cumprir com esta pré-condição, o que justificaria a adoção de regimes de câmbio

fixo.

No entanto, Calvo e Mishkin enfatizam que a opção por um determinado regime cambial

seria uma questão secundária se comparada com a importância do desenvolvimento de

instituições fiscais, financeiras e monetárias sólidas para garantir o crescimento econômico de

países emergentes, no sentido de melhorar a regulação de seus setores financeiro, efetuar ajuste

fiscal através de redução dos gastos públicos, operar uma política monetária sustentável e

previsível, além de garantir maior abertura para o comércio exterior. Com isso, o foco em

reformas institucionais que objetivassem arranjos institucionais mais profundos, mais do que no

tipo de regime cambial, tornaria os países menos propensos a crises semelhantes às ocorridas na

década de 1990.

No entanto, em estudo recente, Licha (2006) discorda de Calvo e Mishkin, afirmando que

o tipo de regime cambial é importante. Seguindo a linha da teoria da escolha do regime cambial,

desenvolvida nos anos 70, o autor afirma que o regime cambial deve ser escolhido de acordo

com o tipo de choque que predomine na economia, com o câmbio devendo ser mais flexível no

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caso de uma economia mais atingida por choques nominais (ocorridos no mercado monetário), e

baseado em uma âncora cambial no caso de economias mais atingidas por choques reais

(ocorridos no mercado de bens e serviços).

Segundo Licha, essa escolha de regimes cambiais, porém, pode mudar ao longo do tempo

caso a natureza dos choques seja alterada. Além disso, regimes cambiais intermediários podem

ser, em certas condições, mais eficientes do que regimes puramente fixos ou flutuantes.

A partir de meados de 1990, os choques nominais predominaram nas economias

emergentes, tornando o regime de câmbio flexível, em conjunto com a utilização de uma âncora

monetária determinada por metas de inflação, a melhor escolha para estas economias. Nos

últimos anos, porém, os choques reais passaram a prevalecer, e o autor conclui que o regime

cambial mais prudente para os países emergentes nos próximos anos seria aquele que fornecesse

uma flexibilidade limitada através de regimes cambiais e monetários híbridos.

Crítico ao regime de câmbio flexível, Gustavo Franco (1999) afirma que este é o regime

“que melhor convive com o desequilíbrio fiscal”, ao não estimular a disciplina fiscal, e logo após

a alteração no regime cambial no Brasil, em janeiro de 1999, em que o país passou a adotar um

regime de câmbio flexível, afirmou que “alguma rigidez precisa ser introduzida, ou seja, será

preciso mitigar a flutuação cambial”.

Por outro lado, os defensores do câmbio flutuante concordavam que as economias

emergentes de fato não deixavam seu câmbio flutuar livremente, porém argumentavam que o

problema não era intrínseco ao regime cambial e sim às condições nas quais ele era

implementado, que justificavam a absorção dos choques externos não só através da taxa de

câmbio, mas também via variações na taxa de juros. Estas condições incluiriam o medo de uma

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aceleração inflacionária e a existência de um descasamento de moedas, com o excessivo

endividamento destes países, público e privado, denominado em moeda estrangeira.

Em estudo realizado em 183 países, no período de 1974 a 2000, para verificar a relação

entre diferentes regimes cambiais e crescimento econômico, Yeyati e Sturzenegger (2002)

concluíram que, no caso dos países emergentes, o tipo de regime cambial seria importante na

determinação do crescimento econômico, estando os regimes de câmbio menos flexíveis

relacionados com menores taxas de crescimento e maior volatilidade do PIB. As possíveis causas

para este fato estariam ligadas à falta de ajuste na taxa de câmbio, no caso de um regime fixo,

que causaria distorção nos preços relativos e na alocação de recursos, na ocorrência de choques

externos. Com isso, para manter a taxa de câmbio no nível fixado, o produto acabaria variando

mais sob este tipo de regime, afetando o crescimento da economia e anulando os ganhos que o

câmbio fixo traria pelo fato de ser uma política mais estável e previsível, uma das principais

vantagens apontadas pelos defensores deste tipo de regime.

Milton Friedman, já na década de 1950 defendia a adoção de regimes de câmbio

flutuante, com a justificativa de que, no caso de uma crise econômica que requeresse mudança na

taxa de câmbio real, seria muito mais rápido e teria custos menores uma alteração na taxa de

câmbio nominal, permitida pelo regime de câmbio flutuante, do que esperar a queda no excesso

de demanda por bens e no mercado de trabalho, com o ajuste ocorrendo através da redução dos

salários e dos preços nominais, conforme ocorreria no caso de um regime de câmbio fixo,

afetando negativamente o PIB e a taxa de desemprego.

Com o objetivo de aumentar a percepção de comprometimento das autoridades

monetárias com a estabilidade de preços, economistas e policymakers vêm defendendo que

países que optam pelo regime de câmbio flutuante, principalmente no caso de países emergentes,

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devem adotar também um sistema de metas de inflação, que atuaria como âncora à política

monetária.

O regime de metas inflacionárias é caracterizado não apenas pelo anúncio de uma meta

normalmente de médio prazo para a variação da inflação, como também pelo comprometimento

da autoridade monetária com a estabilização de preços como sendo seu principal objetivo, além

da existência de total transparência para o mercado em relação à estratégia de política monetária,

através de clara comunicação sobre os planos, objetivos e decisões a serem adotados.

A utilização de um regime de metas de inflação traz como questões a definição sobre que

tipo de índice seria utilizado como referência para a meta, que deve ser preciso, transparente e de

rápida divulgação, podendo ser adotados aqueles que buscam mensurar o núcleo da inflação

(core inflation), que mediriam a verdadeira tendência da inflação, ao excluir o impacto sobre os

preços de eventos transitórios como quebras na safra agrícola, choque de preços de insumos

básicos e aumento de impostos. No entanto, apesar da utilização de índices de núcleo da inflação

tornarem mais fácil o cumprimento da meta, alguns críticos argumentam que a política monetária

pode perder credibilidade com a utilização de tais índices, pois a população teria dificuldade para

entender a diferença entre o core inflation e a inflação percebida em seu dia a dia.

Uma outra questão envolvendo o regime de metas de inflação se refere às bandas

adotadas com o objetivo de dar mais flexibilidade à política monetária diante de ocorrênc ia de

choques inesperados. A amplitude destas bandas de confiança possui importância na medida que

existe um trade-off entre flexibilidade e credibilidade, haja vista que um intervalo de confiança

muito amplo permitiria oscilação muito grande da inflação e faria com que se perdesse o sentido

de um regime de metas para esta.

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Outro trade-off importante está relacionado com o horizonte de tempo a ser utilizado para

avaliar o desempenho das políticas adotadas, onde o estabelecimento de um horizonte longo

tornaria mais flexível o enfrentamento de choques inesperados, possibilitando uma reação menos

agressiva da política monetária sobre os níveis de produto e emprego, ao mesmo tempo em que

sinalizaria um afrouxamento no compromisso da autoridade monetária com a estabilidade de

preços.

De acordo com Ferreira e Júnior (2005), para a implementação bem sucedida de um

regime de metas de inflação, são apontadas algumas condições importantes. A primeira delas

seria a existência de independência do Banco Central para eleger os instrumentos adequados à

busca do objetivo, além de um pleno conhecimento da dinâmica da economia no que tange os

determinantes da inflação, os mecanismos de transmissão da política monetária, os choques a

que a economia está sujeita, dentre outros fatores.

Sobre a importância da independência do Banco Central para o sucesso de um regime de

metas de inflação, Minshkin (2000b) também enfatiza que esta condição é ainda mais importante

no caso de países emergentes, que possuem, em geral, histórico de ma u gerenciamento da

política monetária devido à forte influência do governo sobre os Bancos Centrais desses países.

Minshkin atenta ainda para a importância de o Banco Central ter como prioridade a estabilidade

de preços, devendo este objetivo estar acima de qualquer outro que a autoridade monetária venha

a possuir, como estabilidade da taxa de câmbio ou redução da taxa de desemprego.

Outra condição para que um país possa adotar um regime de metas de inflação de forma

bem sucedida, segundo Ferreira e Júnior, seria a inexistência de outra âncora cambial, como um

regime de câmbio fixo, que tornaria as metas de inflação inconsistentes uma vez que o regime de

câmbio fixo implica em uma política monetária passiva ao fazer com que o Banco Central

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aumente ou diminua a base monetária em função da compra ou venda de divisas para a

manutenção de uma determinada cotação do câmbio. No entanto, apenas a ausência de um

regime de câmbio fixo não garantiria um ambiente ideal, pois um excesso de volatilidade na taxa

de câmbio também tornaria difícil o cumprimento de metas de inflação.

Uma terceira condição seria a ausência de dominância fiscal, que está relacionada com

contas públicas excessivamente desorganizadas, a ponto de uma decisão da política monetária de

aumentar as taxas de juros causarem significativo aumento da dívida pública. A existência de

dominância fiscal, portanto, faria com que o governo, ao aumentar os juros, afastasse os capitais

internacionais, amedrontados com a capacidade de pagamento do país, ao invés de atraí- los.

Conforme destaca Mishkin (2000), o regime de metas de inflação, quando comparado

com um regime cambial atrelado a algum tipo de agregado ou indicador (“exchange rate peg”),

como no caso de um currency board, tem a vantagem de permitir que a política monetária seja

mais ativa, estando apta a responder a choques na economia. Segundo a autor, o regime de metas

inflacionárias também teria como vantagens o fato de ser mais facilmente compreendido pela

população e de ser mais transparente que os demais, inclusive se comparado a outros regimes de

metas, como o que estabelece limites para a base monetária.

No entanto, Mishkin destaca como uma desvantagem o possível enfraquecimento do

Banco Central no caso do não cumprimento da meta, algo que teria grande probabilidade de

ocorrer, uma vez que o controle dos índices de inflação é algo bastante complexo e sujeito a

desvios, dificultado ainda pela existência de “lags”, ou espaços de tempo, entre a utilização dos

instrumentos de política monetária e seus efeitos sobre a inflação. Segundo o autor, a dificuldade

em cumprir metas para a inflação é ainda maior quando esta vem sendo reduzida a partir de

níveis altos, pois aumenta a dificuldade de previsão, no que ele conclui que um regime de metas

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de inflação seria uma estratégia mais eficaz em um cenário de inflação já em níveis baixos.

Mishkin destaca ainda a necessidade de uma política fiscal austera como condição necessária

para o sucesso de um regime de metas de inflação no longo prazo:

“In the long run, large fiscal deficits will cause an inflation targeting regime to break down: the fiscal déficits will eventually have to be monetized or the public debt eroded by a large devaluation, and high inflation will follow”. (MISHKIN, 2000, p.5)

Calvo (2000b), por outro lado, argumenta que um sistema de metas de inflação teria

semelhanças com um regime cambial do tipo “hard peg” ao impedir que o Banco Central

expanda a base monetária para evitar um aumento da inflação. No entanto, Calvo argumenta que

um sistema de metas de inflação teria como desvantagens uma menor transparência quanto a

seus indicadores, em relação a um regime de câmbio fixo, além de influenciar apenas

indiretamente os preços e exigir grande credibilidade da autoridade monetária. Segundo o autor,

o regime de metas de inflação operaria de forma semelhante ao de um “hard peg”, porém sem os

benefícios de um comprometimento rígido como o fixado para a taxa de câmbio, o que acabaria

fazendo com que as taxas de juros tivessem que se manter em níveis altos e voláteis.

3.2 Controle de Capitais

As mesmas crises vividas pelos países emergentes na década de 1990, que suscitaram o

debate acerca de qual seria o melhor regime cambial a ser adotado por estes países, fizeram

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surgir também discussões sobre se tais países deveriam adotar políticas de livre mobilidade de

capitais ou se deveriam aumentar o controle sobre este fluxo, na busca por evitar novas crises.

O controle de capitais não era, em geral, adotado antes de década de 1930, quando foi

criado para ajudar a defender as economias da volatilidade econômica internacional. Depois de

vários anos, tais controles passaram a ser removidos, porém, com alguns países, principalmente

os desenvolvidos, somente os eliminando recentemente ou mantendo ainda algum tipo de

bloqueio implícito, sob a forma de restrições regulatórias.

O debate sobre liberalização ou não do fluxo de capitais remonta às discussões entre as

duas grandes correntes do pensamento macroeconômico – uma pró-mercado e anti-estado e

outra, reguladora do mercado –, que vêm desde a publicação original da Teoria Geral de Keynes,

em 1936. John Maynard Keynes foi um dos principais defensores da participação do estado para

definir os rumos das economias, incluindo sua atuação no controle de capitais. Sob a influênc ia

de Keynes, em 1944, durante a Conferência de Bretton Woods, os participantes decidiram

recomendar a utilização do controle de capitais no caso de crises causadas por fuga de capitais.

Os defensores da existência de um controle sobre os fluxos de capitais argumentam que a

liberalização total deste fluxo exporia as economias a turbulências desnecessárias, cujos

benefícios seriam muito pequenos ou inexistentes. Segundo De Paula (1999), o controle de

capitais teria como vantagens garantir o isolamento de um país de contágios externos, reduzindo

sua vulnerabilidade externa, além de atrair capitais de longo prazo.

Conforme destaca De Paula, os custos de implantação do controle de capitais passariam

pela possibilidade de retaliação de outros países, evasão de capitais por canais informais e custos

administrativos. Porém, os benefícios com o controle de capitais superariam estes custos, e

estariam relacionados com: (i) manutenção da estabilidade da taxa de câmbio, reduzindo as

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pressões sobre esta; (ii) poder de escolha entre capitais desejáveis e indesejáveis para o país; (iii)

possibilidade de maior autonomia à política monetária doméstica, ao tornar os fluxos de capitais

menos sensíveis às taxas de juros; (iv) preservação da estabilidade monetária e financeira diante

de eventuais crises no balanço de pagamentos, contendo a saída de capitais.

Cardim e Sicsú (2004) também defendem o controle de capitais, ou o que chamam de

“liberalização cautelosa” do fluxo de capitais, criticando o que definem como suposição

“natural” de que a intervenção do estado é sempre inferior à ação privada livre, pois violaria a

rede de incentivos criada pelo mercado. Os autores atacam o argumento de que o mercado

definiria a melhor alocação dos capitais em uma situação de livre mobilidade, afirmando que as

decisões do mercado são tomadas por agentes econômicos cujas ações são orientadas por

expectativas que apenas em parte são influenciadas por dados objetivos, estando estes agentes

sujeitos a estados de confiança e animal spirits.

Em mercados financeiros, as incertezas seriam ainda mais importantes na tomada de

decisões, já que, ao se negociar ativos, negociam-se ganhos futuros, abrindo espaço para a

influência de variáveis subjetivas e comportamentos nem sempre racionais. Além disso,

possíveis assimetrias de informação contribuiriam para que os mercados financeiros não fossem

eficientes como esperado pelos proponentes da liberalização.

Oreiro (2004) sugere que os argumentos contra o controle de capitais seriam mais

ideológicos do que fundamentados em embasamento teórico e empírico. Segundo o autor, os

argumentos dos defensores da livre mobilidade de capitais de que a adoção de restrições ao

capital representaria uma exclusão dos fluxos de capitais mundiais e, conseqüentemente, dos

benefícios do processo de globalização financeira, seria um exemplo desta visão ideológica.

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Os defensores do livre fluxo de capitais, por sua vez, se baseiam no argumento de

mercados eficientes, segundo o qual as forças de mercado seriam capazes de buscar a alocação

global ótima dos recursos, caso os capitais sejam deixados livres para se mover entre os países. A

livre mobilidade de capitais permitiria uma alocação global mais eficiente das poupanças e

canalização dos recursos para usos mais produtivos, garantindo o crescimento econômico e bem-

estar da população, conforme descrito por Arida (2004):

“(...) a abertura da conta de capital, quando empreendida no bojo de políticas macroeconômicas sólidas e sustentáveis ao longo do tempo, traz ganhos de bem estar por (i) possibilitar a alocação de capital a oportunidades de investimentos mais produtivas em outros países e (ii) diminuir o impacto das flutuações da renda sobre o consumo.”

Os críticos ao controle de capitais alegam que tal controle desestimularia investidores

estrangeiros e contribuiria para manter elevadas as taxas de juros domésticas. Arida (2004)

acrescenta ainda que tal controle poderia passar para o mercado uma sinalização negativa acerca

da qualidade do padrão monetário, ao sugerir a necessidade de aprisionar os ativos financeiros

por via administrativa.

A livre mobilidade de capitais é defendida pelo Fundo Monetário Internacional como

uma política importante para que os países emergentes se beneficiem do fluxo de capitais

internacionais para estimular suas economias. O Fundo, no entanto, após as crises ocorridas nos

países emergentes durante os anos 90, passou a admitir um controle temporário de capitais em

determinadas situações, em determinados países. É importante frisar que este controle deveria

durar apenas um certo tempo, voltando-se posteriormente para um regime de livre mobilidade de

capitais.

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Eichengreen e Mussa (1998), ligados ao FMI e defensores da visão desta instituição,

argumentam que a liberalização de capitais seria inevitável para países interessados em tirar

vantagem dos benefícios de participar de um mercado global aberto, caracterizado por modernas

tecnologias de informação e comunicação. Os autores reconhecem os perigos da liberalização,

como aqueles ligados ao aumento da exposição do s países ao risco, porém argumentam que esta,

quando implementada de forma correta, traz grandes benefícios.

Em estudo realizado por Klein e Olivei (1999) durante o período de 1986 a 1995, no

entanto, chegou-se a conclusão que não haveria ligação entre liberalização do fluxo de capitais e

crescimento econômico, no caso de países emergentes, relação que foi verificada somente no

caso de países desenvolvidos. O estudo conclui que provavelmente esta diferença de resultados

se deve à existência de instituições sólidas, no caso dos países desenvolvidos, que garantiriam os

benefícios trazidos pela liberalização de capitais, o que não ocorreria no caso dos países

emergentes.

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4 O BRASIL E O PLANO REAL

4.1 Antecedentes

A década de 1980 foi para o Brasil um período de baixo crescimento econômico –

principalmente se comparado à média de crescimento de 7,4% a.a do PIB nas três décadas

anteriores –, com variação média do PIB de 3% a.a., e caracterizada por um cenário externo de

baixo crescimento mundial – cuja taxa média de crescimento foi de 2,75% a.a. na primeira

metade da década3 – e escassez de financiamento, demonstrada pela taxa libor média em dólar

durante a década de 1980, que ficou em 10,6% a.a., tendo atingido 16,8% a.a. em 19814.

O Brasil, porém, encontrava-se fortemente vulnerável diante desse cenário externo

adverso, com sua dívida externa chegando a quase cinco vezes o valor das exportações em

meados dos anos 80, devido à política de crescimento baseado em financiamento externo,

implementada durante o regime militar. Em 1987 o país decreta moratória de sua dívida externa,

e busca um ajuste através de políticas econômicas restritivas, que tiveram como conseqüência o

baixo crescimento do país nesta época.

Por outro lado, durante a década de 1980, a inflação já começava seu processo de

aceleração, principalmente a partir da segunda metade da década, o que fez com que o governo

iniciasse o combate a este processo a partir de 1986, com o lançamento de seis planos de

estabilização e cinco mudanças de moeda, no período de apenas oito anos. O primeiro desses

planos foi o Plano Cruzado, em fevereiro de 1986, sendo seguido pelo Plano Bresser em junho

3 De acordo com dados do IFS/ FMI. 4 De acordo com o Banco Central do Brasil.

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de 1987, o Plano Verão em janeiro de 1989, os Planos Collor I e II em março de 1990 e janeiro

de 1991 respectivamente, e finalmente o único bem sucedido no objetivo de controle sustentável

da inflação: o Plano Real, implantado em junho de 1994. Estes planos possuíam como

características comuns serem baseados em âncoras cambiais ou congelamento de preços, ou

ambos, normalmente conseguindo provocar queda na inflação em um primeiro momento, porém,

com retorno do processo inflacionário logo em seguida, conforme é possível ver no gráfico 2.

Gráfico 2 – Inflação (IPCA)

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

Plano Cruzado

Plano Bresser

Plano Verão

Plano Collor 1

Plano Collor 2

Plano Real

Fonte: IPEAData

(% a

.m.)

Com relação à crise externa ocorrida durante os anos 80, os Estados Unidos anunciam um

plano de reestruturação da dívida externa de países com dificuldades de pagamento, denominado

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Plano Brady, em 1989. O Plano consistiu na troca por bônus de emissão do governo do país

devedor, que contemplavam abatimento da dívida, sob a forma de redução do seu principal e/ou

dos juros. No caso brasileiro, a renegociação da dívida externa nos moldes deste Plano foi

concluída em abril de 1994 e permitiu que o país voltasse a ter acesso ao mercado financeiro

internacional, tendo sido ainda mais importante devido ao bom momento pelo qual passava o

mercado internacional a partir do início dos anos 90, com farta liquidez, e baixas taxas de juros,

como mostra a libor média em dólar na primeira metade da década de 1990, que ficou em 5,5%

a.a.5, quase metade da média registrada na década de 1980.

Cabe destacar ainda o processo de abertura comercial e financeira pela qual o país passou

no início da década de 1990, permitindo um melhor aproveitamento deste cená rio externo

favorável. A abertura comercial implementada pelo país pode ser verificada na queda das tarifas

de importação médias, que passaram de 30,8% em 1986 para 11,6% em 19936, enquanto a maior

liberalização financeira e cambial a partir de 1992 eliminou entraves à mobilidade de capitais

através, em grande parte, da maior flexibilização da conta CC-5 e dos Fundos de Investimento no

Exterior.

Em termos fiscais, o governo apresentou superávits primários baixos durante a segunda

metade da década de 1980, cuja média foi de 0,6% do PIB7, devido ao foco do governo no

controle à inflação, tendo sido o déficit público relegado a segundo plano. Na primeira metade da

década de 1990, porém, os resultados primários do governo melhoraram significativamente

devido à mudança na política fiscal, que passou a dar importância ao combate ao déficit público,

fazendo com que a média dos resultados primários apresentassem um superávit de 2,8% do PIB

5 De acordo com dados do Banco Central do Brasil. 6 De acordo com dados do IPEAData. 7 Segundo dados do Banco Central do Brasil.

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31

no período, tendo contribuído para essa melhora também a estratégia de postergação dos gastos

públicos, que eram corroídos pela hiperinflação, enquanto a receita estava indexada à esta.

4.2. Implantação do Plano Real

Diante do cenário traçado anteriormente, o Plano Real aparece como mais uma tentativa

de controle da inflação, numa economia já traumatizada com os inócuos planos anteriores.

Porém, o Plano Real teve como uma das principais vantagens em relação aos demais, o fato de

ter sido anunciado e discutido ante s de sua completa implementação, que pode ser dividida em

três etapas. O Governo buscava com isso, reduzir a resistência da população às medidas que

seriam adotadas, ao divulgá- las antecipadamente.

O Plano Real partiu do diagnóstico de que a inflação no país possuía forte caráter

inercial, e a partir daí, implementou uma reforma monetária com o objetivo de romper com a

tendência que alimentava tal inércia, tendo o plano logrado controlar a inflação, conforme pode

ser visto na tabela abaixo:

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32

Tabela 1 – Índice de Preços ao Consumidor Ampliado – IPCA (% a.m.)

jan/93 30,35 jan/94 41,31fev/93 24,98 fev/94 40,27mar/93 27,26 mar/94 42,75abr/93 27,75 abr/94 42,68mai/93 27,69 mai/94 44,03jun/93 30,07 jun/94 47,43jul/93 30,72 jul/94 6,84

ago/93 32,96 ago/94 1,86set/93 35,69 set/94 1,53out/93 33,92 out/94 2,62nov/93 35,56 nov/94 2,81dez/93 36,84 dez/94 1,71

Fonte: IBGE

A primeira etapa da implantação do Plano Real, iniciada no primeiro bimestre de 1994,

incluiu a edição do PAI – Programa de Ação Imediata –, cujo objetivo principal era sanear as

contas públicas, permitindo a recuperação da capacidade financeira do Estado, e cujas principais

medidas foram a criação de novos tributos, assinatura de um acordo da dívida externa com o

FMI e bancos credores, além da busca por reduzir a sonegação fiscal.

Ainda com o objetivo de eliminar o que considerava ser a principal causa da inflação, o

governo buscou controlar a expansão da dívida pública através da criação do Fundo Social de

Emergência (FSE), que tinha como função desvincular parte das receitas do governo que

estavam comprometidas com destinações específicas8. As mudanças introduzidas pelo PAI e

pelo FSE, porém, não foram suficientes para assegurar o equilíbrio fiscal.

No que pode ser considerada a segunda etapa de implantação do Plano Real, e m março de

1994 foi criada a Unidade Real de Valor (URV) para servir temporariamente como unidade de

8 A Constituição de 1988 havia aumentado consideravelmente a rigidez do orçamento da União ao aumentar o grau de vinculação das receitas públicas a despesas específicas

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33

conta e permitir um ajuste relativo entre preços e salários, ao mesmo tempo em que o Cruzeiro

Real (CR$) permanecia como meio de pagamento, como um primeiro passo para a eliminação

posterior do componente inercial da inflação.

O Banco Central fixava diariamente a paridade entre o Cruzeiro Real e a URV, com base

na variação de três índices de inflação – IPC, IPCA-E, e o IGP-M –, enquanto a URV possuía,

nesta fase, paridade fixa de um para um com o dólar, representando a própria taxa de câmbio. A

idéia era homogeneizar a prática da correção monetária através da URV para devolver à nova

moeda nacional sua função de unidade de conta, e posteriormente de reserva de valor. O repúdio

pelo Cruzeiro Real podia ser medido pelo agregado financeiro M1, que representava apenas

1,3% do PIB em junho de 1994.

O processo de adesão à URV, no entanto, foi lento, uma vez que as negociações entre

comércio e indústria demandaram tempo, e o próprio governo demorou a definir o critério de

conversão das tarifas públicas e dos impostos, dificultando a conversão dos demais contratos.

Apesar do ajuste fiscal e do processo de conversão de todos os setores da economia ainda

não terem terminado, a terceira fase do programa manteve sua data de implantação devido ao

risco de que as expectativas do mercado comprometessem o sucesso do plano, uma vez que, às

vésperas da entrada em vigor da nova moeda, as remarcações de preços foram fortíssimas.

Em 1º de julho de 1994, é criado o Real como nova moeda, no lugar do Cruzeiro Real,

com o estabelecimento das regras de emissão e lastreamento da nova moeda, no que foi

considerada a última fase de implantação do plano . O Real foi criado com valor igual à cotação

da URV do dia da implantação, e a transição foi relativamente tranqüila, pois boa parte das

mudanças introduzidas já haviam sido antecipadas, tendo havido apenas algumas tentativas

pontuais de aumento de preços. Tal comportamento, no entanto, não se sustentou e a pressão

refluiu por não haver condições de sustentar os preços elevados.

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34

Algumas das medidas adotadas neste período foram: obrigatoriedade de que os novos

contratos possuíssem reajuste apenas anual, o que acabava por alongar a correção monetária;

vinculação de parte das reservas internacionais como lastro da nova moeda; e contenção do

crédito através do aumento das taxas de depósitos compulsórios, que passaram de 40% sobre os

depósitos à vista para 100% em junho de 1994.

A política de juros altos, com a taxa Selic acima de 30% a.a. em termos reais durante o

período de transição entre as moedas, em conjunto com o aumento das taxas de depósitos

compulsórios, agiram como pilar de sustentação da política econômica para evitar que a

especulação prejudicasse essa transição, bem como para conter a demanda por crédito.

A política cambial adotada nesta fase foi a de deixar a moeda flutuar livremente para

baixo do teto de 1 para 1 com o dólar, no que ficou conhecido como regime cambial de “banda

assimétrica”, e que será melhor discutido na seção 4.3.1.3.

4.3. As fases do Plano Real e seus resultados

O Plano Real pode ser dividido em dois períodos distintos sob o ponto de vista de

políticas econômicas adotadas. O primeiro período vai de julho de 1994 a janeiro de 1999, e será

descrito na próxima seção, enquanto o segundo vai de fevereiro de 1999 até os dias atuais, e será

analisado na seção seguinte.

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35

4.3.1 Primeira fase

A primeira fase do Plano Real se baseou na combinação de uma política monetária de

juros altos, falta de um ajuste fiscal e utilização de âncora cambial, que permitiram que o plano

fosse bem sucedido em combater a inércia inflacionária, estabilizando os preços, conforme

mostra a tabela 2, que traz o desempenho de alguns índices de inflação.

Tabela 2 – Índices de Inflação (% a.a.)

1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999

IPCA 2.477,15 916,46 22,41 9,56 5,23 1,66 8,94

IGP-DI 2.708,17 1.093,85 14,77 9,33 7,48 1,71 19,99

IPC (FGV) 2.828,63 1.238,09 25,91 11,34 7,23 1,67 9,11

INPC 2.489,11 929,32 21,98 9,12 4,34 2,49 8,43Fonte: IBGE e FGV

4.3.1.1 Política Monetária

A política monetária restritiva adotada nesta primeira fase teve como foco o controle da

demanda para evitar que a forte expansão desta levasse a novos aumentos de preços. A política

de juros altos – cuja taxa média ficou em 21,1% em termos reais no período de 1994 a 1999,

conforme gráfico 3 –, no entanto, serviu não só para conter a demanda como também para atrair

divisas, devido aos crescentes déficits em transações correntes, que saltaram de -US$1,8 bilhão

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36

em 1994 para -US$33,4 bilhões em 1998, e sustentar o regime de câmbio fixo, conforme será

analisado na seção referente à política cambial.

Gráfico 3 – Taxa de Juros Real – Selic over anualizada (deflator: IPCA)

0,00%

5,00%

10,00%

15,00%

20,00%

25,00%

30,00%

35,00%

jul/9

4

jan/

95

jul/9

5

jan/

96

jul/9

6

jan/

97

jul/9

7

jan/

98

jul/9

8

jan/

99Fonte: IPEAData e Banco

(% a

.a.)

Outro importante instrumento utilizado pelo Banco Central para conter a euforia de

consumo após a estabilização de preços, foi o aumento das taxas de compulsório , conforme pode

ser visto no gráfico 4, na busca por restringir o crédito. Apesar de tais taxas começarem um

movimento de queda a partir do final de 1994, ainda permaneceram em níveis altos, se

comparados aos existentes antes do Plano Real.

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37

Gráfico 4 – Alíquota de Recolhimento Compulsório - % sobre depósitos à vista

30

40

50

60

70

80

90

100

mar

/94

set/9

4

mar

/95

set/9

5

mar

/96

set/9

6

mar

/97

set/9

7

mar

/98

set/9

8

Fonte: Relatórios Anuais do Banco Central

Por outro lado, com o objetivo de controlar o processo de remonetização, comum em

países recém saídos de processos hiperinflacionários, estabeleceu-se, no início do Plano Real,

metas para a base monetária. No entanto, já no primeiro trimestre de vigência, as metas foram

largamente ultrapassadas, levando o governo a abandoná-las e também à tentativa de utilização

de uma âncora monetária. Esse processo de aumento da demanda por moeda pode ser verificado

pela parcela dos meios de pagamento denominada M1 (gráfico 5), que registrou aumento de 83%

em termos reais entre julho e dezembro de 1994, indo de R$ 32 bilhões para R$ 59 bilhões no

período.

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38

Gráfico 5 – Agregado Monetário M1 - termos reais *

-

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

jan/94 jul/

94jan

/95 jul/95

jan/96 jul/

96jan

/97 jul/97

jan/98 jul/

98jan

/99 jul/99

(*) Valores trazidos a abri/ 06 pelo IPCA Fonte: Banco Central

R$

milh

ões

Cabe destacar, por fim, um marco importante da política monetária nesta fase, que foi a

criação, em meados de 1996, do Comitê de Política Monetária (Copom), cujo objetivo era

estabelecer as diretrizes gerais da política monetária e definir as taxas de juros básicas da

economia, na busca por dar maior transparência à definição dos objetivos da autoridade

monetária.

Reestruturação do sistema financeiro

O período pós-estabilização trouxe consigo uma reestruturação do sistema financeiro,

tanto dos bancos privados quanto públicos, devido às fortes perdas que estas instituições tiveram

com o fim da receita inflacionária, tendo que se adaptar ao novo contexto de inflação controlada.

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Com isso, o sistema bancário se volta para a expansão dos empréstimos, numa tentativa de

aumentar suas receitas, bem como para um processo de redução de custos. No entanto, os

esforços para a expansão do crédito foram de encontro à política do governo de conter a

demanda, o que fez com que o volume de crédito na primeira fase do plano real não apresentasse

crescimento significativo, conforme pode-se verificar no gráfico 6, que mostra a evolução do

crédito total, incluindo recursos livres e direcionados.

Gráfico 6 – Operações de Crédito

300.000

350.000

400.000

450.000

500.000

550.000

600.000

jul/9

4

jan/

95

jul/9

5

jan/

96

jul/9

6

jan/

97

jul/9

7

jan/

98

jul/9

8

jan/

99

jul/9

9

Fonte: IPEAData

R$

milh

ões

* A preços de abri/2006 pelo IPCA (cálculo próprio)

Apesar de na média do período o volume de crédito ter ficado relativamente estável,

verificou-se uma expansão inicial no primeiro ano do Plano Real, que veio acompanhada de

problemas relacionados à sua qualidade, que, em conjunto com o aumento das taxas de juros,

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levaram a um aumento na inadimplência. Esta situação, combinada com a forte perda de receita

inflacionária, levou várias instituições, dentre diversos bancos estatais e importantes bancos

comerciais, a apresentarem problemas de liquidez e solvência. O Banco Central então, se viu

obrigado a intervir, auxiliando neste processo de reestruturação do sistema financeiro através do

Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional

(PROER), instituído em novembro de 1995.

O PROER consistiu de uma linha especial de redesconto, que buscava reestruturar bancos

em dificuldades, com a possibilidade de o Banco Central assumir suas carteiras de crédito,

transferir o controle destas instituições, ou privatizá - las. De 1994 a 1997 o Banco Central

interveio em 47 instituições financeiras, de um total de 271 existentes em 1994, e o valor

aplicado no programa durante este período foi de cerca de R$20 bilhões.

4.3.1.2 Política Fiscal

A situação fiscal após o fim da hiperinflação foi caracterizada por déficits públicos

significativos, devido à utilização de uma política fiscal expansionista e ao fim da possibilidade

de gerenciamento de caixa por parte do Tesouro Nacional com o objetivo de se beneficiar do

processo hiperinflacionário. Esta consistia em indexar as receitas do governo à inflação, mas não

suas despesas, faze ndo com que o adiamento dos gastos corroesse seu valor, facilitando o

controle das contas públicas.

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Tabela 3 – Necessidade de Financiamento do Setor Público - % PIB

Composição 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999

Nominal 26,46 44,31 59,64 24,67 7,15 5,77 5,93 7,46 5,78

Governo central* 6,25 14,87 18,77 7,86 2,25 2,46 2,45 4,93 2,70

Governos estaduais e municipais 9,77 16,90 27,12 12,08 3,57 2,71 3,03 2,01 3,14

Empresas estatais 10,45 12,54 13,75 4,74 1,33 0,61 0,45 0,52 (0,07)

Juros nominais 29,17 45,97 61,83 29,89 7,42 5,68 4,97 7,47 8,97

Governo central 7,23 16,06 19,58 11,11 2,77 2,83 2,17 5,48 5,03

Governos estaduais e municipais 11,17 16,97 27,74 12,84 3,39 2,16 2,29 1,83 3,36

Empresas estatais 10,78 12,95 14,50 5,93 1,25 0,68 0,51 0,16 0,58

Operacional 0,17 1,88 0,79 (1,25) 4,99 3,42 4,30 7,06 1,12

Governo central 0,06 0,73 0,67 (1,68) 1,74 1,29 1,75 4,78 0,88

Governos estaduais e municipais (0,68) 0,65 0,08 0,80 2,37 1,81 2,26 1,78 0,49

Empresas estatais 0,79 0,51 0,03 (0,37) 0,88 0,32 0,29 0,50 (0,26)

(2,92) (0,49)

Primário (2,71) (1,57) (2,19) (5,21) (0,27) 0,09 0,95 (0,01) (3,19)

Governo central (0,98) (1,10) (0,81) (3,25) (0,52) (0,37) 0,27 (0,55) (2,33)

Governos estaduais e municipais (1,40) (0,06) (0,62) (0,77) 0,18 0,54 0,74 0,19 (0,22)

Empresas estatais (0,33) (0,41) (0,76) (1,19) 0,07 (0,08) (0,06) 0,35 (0,65)

Juros reais 2,88 3,46 2,97 4,39 5,26 3,32 3,35 7,07 4,31

Governo central 1,04 1,82 1,48 2,00 2,25 1,67 1,48 5,33 3,21

Governos estaduais e municipais 0,72 0,71 0,70 1,57 2,19 1,27 1,52 1,59 0,71

Empresas estatais 1,12 0,92 0,79 0,82 0,81 0,39 0,34 0,15 0,39

* Inclui Governo Federal e Banco Central

Fonte: Banco Central do Brasil

Como pode ser visto na tabela 3, a pouca importância dada à disciplina fiscal fez com que

as NFSP em termos operacionais9 aumentassem de uma média de 0,4% do PIB em 1991-94 para

4,2% em 1995-99, tendo como grande responsável por esse aumento a piora nos resultados

primários, que passaram de um superávit de 2,9% do PIB para um déficit de 0,5% no mesmo

período. O aumento dos gastos com o pagamento de juros reais, que foram de 3,4% do PIB para

9 Expurga a atualização monetária incidente sobre as despesas com juros, uma vez que esta não deve afetar a demanda agregada.

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42

4,7% no período, embora em menor medida, também contribuíram para a piora dos resultados

operacionais. No mesmo quadro é possível verificar também que a piora nas contas públicas

ocorreu em todos os níveis governamentais.

Um fator importante a contribuir para a deterioração das contas públicas foi a

Constituição aprovada em 1988, que restringiu significativamente a flexibilidade dos gastos do

governo central e aumentou as despesas previdenciárias, e cujos efeitos foram mais sentidos com

o fim da hiperinflação. Um exemplo dessa redução da flexibilidade do governo central foi o

aumento das vinculações, com a parcela de IR e IPI trans ferida para os estados tendo aumentado

40% no período de 1988 a 1993.

No entanto, não só a rigidez dos gastos determinada pela Constituição levou ao aumento

do déficit público. O governo também adotou uma política fiscal expansionista ao elevar gastos

em áreas onde não havia compulsoriedade determinada pela Constituição, como no caso do

reajuste das aposentadorias e pensões acima da inflação e do aumento das OCC – outras

despesas de custeio e capital.

Apesar dos resultados fiscais negativos neste período, houve uma tímida tentativa de

adotar medidas visando à austeridade fiscal, como a determinação de que superávits do Banco

Central fossem utilizados para amortização da dívida pública e a criação do Fundo de

Amortização da Dívida Pública Mobiliária Federal, composto de ações cujos valores de

alienação seriam utilizados para amortização da dívida. No entanto, tais medidas não foram

suficientes para reverter os desequilíbrios fiscais causados pela falta de comprometimento em

conter os gastos públicos neste período.

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43

4.3.1.3 Política Cambial

O regime cambial de “banda assimétrica”, implantado durante a fase de transição entre as

moedas cruzeiro real e real, foi substituído em março de 1995 por um regime de bandas

cambiais. Este regime, que acabou se convertendo em uma âncora cambial, foi o principal pilar

de sustentação do Plano Real nesta primeira fase.

O regime de “banda assimétrica” permitiu que o real se valorizasse frente ao dólar nos

primeiros meses do plano, conforme pode ser visto no gráfico 7, impulsionado por fatores como

a própria estabilização de preços e a farta liquidez internacional, além do reingresso do país no

fluxo voluntário de capitais internacionais devido à conclusão da renegociação de sua dívida

externa.

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44

Gráfico 7 – Taxa de Câmbio Nominal (média mensal) – comercial venda

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

1,4

1,6

jul/94 jan/95 jul/95 jan/96 jul/96 jan/97 jul/97 jan/98 jul/98 jan/99

R$/

US

$

Fonte: Banco Central

No entanto, a partir do segundo trimestre de 1995 o país adota um regime de bandas

cambiais, o que causou apreensão no mercado, especialmente devido à falta de unidade da

equipe econômica em relação ao regime, porém o Banco Central logo tomou o controle da

situação, elevando os juros e reafirmando a nova política. Como pode ser visto no gráfico 7, o

novo regime se caracterizou por desvalorizações constantes da moeda, permitindo que fosse

caracterizado como um regime de crawling peg.

Em relação às reservas internacionais, cuja evolução pode ser vista no gráfico 8, estas

apresentaram três movimentos de queda acentuados, tendo o primeiro se iniciado no final de

1994, e sido causado principalmente pela retração dos capitais internacionais, provocada pela

crise mexicana. Em fins de 1997, com a crise asiática, o país novamente é atingido pelo medo

dos investidores em relação a países emergentes, o que provocou nova fuga de capitais e queda

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45

nas reservas internacionais. Na tentativa de obter a confiança do mercado, o governo buscou

mostrar comprometimento para a implementação de um ajuste fiscal, o que possibilitou a

reversão no fluxo de queda das reservas no início de 1998.

Gráfico 8 – Reservas Internacionais (liquidez internacional)

0

10000

20000

30000

40000

50000

60000

70000

80000

jan/94 jul/94 jan/95 jul/95 jan/96 jul/96 jan/97 jul/97 jan/98 jul/98 jan/99

Fonte: Banco Central

US

$ m

ilhõ

es

No entanto, com o descumprimento do prometido ajuste fiscal, a credibilidade do país

ficou abalada, dificultando o enfrentamento à nova crise que se formava na Rússia no final de

1998, com a desvalorização do rublo e a decretação de moratória da dívida do país. Esta crise se

mostrava mais forte do que a da Ásia, com impacto sobre o spread pago pelos títulos da dívida

externa brasileira em relação aos títulos do Tesouro Americano de prazo comparável, ainda mais

acentuado – na primeira crise, o spread máximo ficou em torno de 800 pontos, enquanto na crise

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da Rússia, esta diferença atingiu cerca de 2.100 pontos. Os mercados internacionais aumentaram

drasticamente sua aversão ao risco, o que atingiu especialmente o Brasil, que passou a ser

considerado o próximo país a entrar em crise.

Com a acentuada fuga de capitais a partir de setembro de 1998, o Banco Central aumenta

os juros para tentar conter a vertiginosa perda de divisas, que caíram de US$67 bilhões em

agosto para US$35 bilhões em dezembro de 1998. Segundo Franco (1999, p.319), tais saídas se

deram através de “(...)operações de arbitragem com Brady bonds, empresas comprando suas

próprias dívidas, saídas de operações não registradas pelas contas CC5 e ‘fugas de capitais’ no

sentido clássico do termo.”

Na busca por tentar impedir um colapso externo iminente, foi fechado acordo com o FMI

e outras instituições internacionais, que incluía um empréstimo de US$41,5 bilhões e que

obrigaria o país a cump rir metas de ajuste fiscal. O acordo foi construído rapidamente, tendo sido

aprovado em dezembro de 1998, porém não foi suficiente para recuperar a confiança do mercado

e o processo de queda das reservas internacionais prosseguiu, culminando no abandono do

regime de bandas cambiais em janeiro de 1999.

4.3.1.4 Resultados da primeira fase

Os primeiros anos do Plano Real foram caracterizados pela retomada do crescimento

econômico, conforme pode ser visto no gráfico 8, com o PIB variando 5,9% em 1994, puxado

pela euforia após a estabilização dos preços. No entanto, em 1998 o crescimento do PIB

arrefeceu, tendo ficado em 0,13%, devido aos efeitos da crise russa, que levaram a um forte

aumento das taxas de juros (ver gráfico 3), conforme já discutido.

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47

Gráfico 8 – PIB – Trimestral (1990 = 100)

100

110

120

130

140

1º T

199

4

3º T

199

4

1º T

199

5

3º T

199

5

1º T

199

6

3º T

199

6

1º T

199

7

3º T

199

7

1º T

199

8

3º T

199

8

Fonte: IBGE

Em termos de desempenho das contas externas, as políticas baseadas em moeda

valorizada e abertura comercial, que buscavam conter reajustes de preços, tiveram como

conseqüência o aumento de 74% no valor das importações entre 1994 e 1998, o que acabou

deteriorando a balança comercial, conforme pode ser visto na tabela 4.

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48

Tabela 4 – Indicadores do Setor Externo

(em US$ milhões)1994 1995 1996 1997 1998

Transações Correntes -1.812 -18.385 -23.501 -30.452 -33.452Balança Comercial 10.466 -3.466 -5.599 -6.753 -6.624Serviços -5.657 -7.483 -8.681 -10.646 -10.108Rendas -9.035 -11.058 -11.668 -14.876 -18.183Transf. Unilaterais 2.414 3.622 2.447 1.823 1.463

Reservas Internacionais 38.806 51.840 60.110 52.173 44.556

Dívida Externa 148.295 159.256 179.935 199.998 241.644

Fonte: Banco Central

Os resultados crescentemente negativos na conta de transações correntes, por sua vez,

foram causados não só pela balança comercial como também pela conta de rendas, cujo aumento

do déficit se deveu ao maior envio de lucros e dividendos para o exterior, devido aos bons

resultados que as empresas vinham obtendo com o crescimento da atividade econômica no país,

e dos juros de empréstimos, cujas taxas se mantiveram altas no período. A dívida externa, por

sua vez, dá um salto de 63% entre 1994 e 1998, puxada pelo aumento dos empréstimos e pelo

financiamento externo às importações.

Estes resultados tiveram como conseqüência um aumento da vulnerabilidade externa do

país, conforme é possível ver na tabela 5, com a relação balança comercial/ PIB caindo de 1,9%

em 1994 para -0,8% em 1998, refletindo na relação transações correntes/ PIB, que foi de -0,3%

para -4,2% no mesmo período. Além disso, a dívida externa saltou de 3,4 vezes o valor das

exportações para 4,7 entre 1994 e 1998, devido ao forte crescimento desta dívida, enquanto as

exportações cresceram apenas 17% no período, com o desestímulo do câmbio valorizado. O

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49

crescimento da dívida externa fez ainda com que a relação dívida externa/ PIB passasse de

27,1% para 30,7% no período 1994-98.

Tabela 5 – Indicadores de Vulnerabilidade Externa

1994 1995 1996 1997 1998

Dívida Externa/ PIB 27,1% 22,6% 23,2% 24,8% 30,7%

Dívida Externa/ Exportações 3,41 3,42 3,77 3,77 4,73

Balança Comercial/ PIB 1,9% -0,5% -0,7% -0,8% -0,8%

Transações Correntes/ PIB -0,3% -2,6% -3,0% -3,8% -4,2%

Fonte: Cálculo próprio a partir de dados do Banco Central e IPEAData.

A política de juros altos e as crises externas vividas pelo país neste período, que retraíram

o fluxo de capitais internacionais, tiveram reflexos também nos investimentos, cuja taxa caiu de

20,5% em 1994 para 18,9% em 1999, conforme é possível ver na tabela a tabela 6. Essa queda

reflete o desestímulo da indústria em investir na ampliação da capacidade produtiva do país,

acabando por inviabilizar um processo de crescimento de longo prazo.

Tabela 6 – Taxa de Investimento

% PIB

1994 1995 1996 1997 1998 199920,75 20,54 19,26 19,86 19,69 18,9

Fonte: IBGE

Em termos de endividamento público, o gráfico 10 mostra que este oscilou entre 28% e

35% do PIB até 1997, quando iniciou uma trajetória de forte crescimento, causada

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50

principalmente pelo aumento nos gastos com juros, cujas despesas passaram de 4,97% do PIB

em 1997 para 7,47% em 1998, e pelo fraco desempenho do PIB em 1998.

Gráfico 10 – Dívida Líquida do Setor Público - % PIB

20

25

30

35

40

45

1994 1995 1996 1997 1998

Fonte: Banco Central

Esta primeira fase do Plano Real, portanto, deixa claro a insustentabilidade de um regime

de âncora cambial em um ambiente de descontrole fiscal e desequilíbrio nas contas externas, que

fragilizam a economia, tornando-a vulnerável a ataques especulativos. A crise de confiança que

atingiu o país no final de 1998 levou à necessidade de completa reformulação das políticas

econômicas, enquanto a baixa taxa de investimento apresentada no período exemplifica a

necessidade de melhorias nos fundamentos macroeconômicos para a sustentabilidade de um

crescimento no longo prazo.

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51

4.3.2 Segunda fase

A segunda fase do Plano Real é caracterizada por políticas econômicas bastante distintas

das políticas da primeira fase, tendo como tripé a adoção de um regime de câmbio flexível,

política fiscal mais restritiva, e o estabelecimento de metas para a inflação para o direcionamento

da política monetária. Nesta fase os índices de inflação permaneceram sob controle, apesar de

uma ameaça de aceleração em 2002, como pode ser visto na tabela 7.

Tabela 7 – Índices de Inflação - % a.a.

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

IPCA 8,94 5,97 7,67 12,53 9,30 7,60 5,69

IGP-DI 19,99 9,80 10,40 26,41 7,66 12,13 1,23

IPC (FGV) 9,11 6,21 7,93 12,15 8,92 6,27 4,93

INPC 8,43 5,27 9,44 14,74 10,38 6,13 5,05Fonte: IBGE e FGV

4.3.2.1Política Cambial

Em janeiro de 1999, o governo é forçado a alterar sua política cambial devido à acelerada

perda de reservas, deixando a moeda flutuar e provocando um overshooting em sua cotação, que

atingiu R$1,91/ US$ em fevereiro de 1999, em comparação com a cotação de R$1,21 / US$

existente em dezembro de 1998, no que representou uma desvalorização de 59% em dois meses.

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O novo regime foi anunciado prevendo a ocorrência de intervenções do Banco Central no

mercado de câmbio , de forma a evitar volatilidade excessiva nas cotações. Após a forte

desvalorização inicial, a autoridade monetária foi retomando gradualmente sua capacidade de

intervir, fazendo com que o regime fosse caracterizado a partir de então por uma flutuação

“suja”. A alteração de regime cambial implicou ainda na revisão do acordo com o FMI, firmado

em dezembro de 1998, com o desembolso de US$ 9,3 bilhões neste ano referente à primeira

parcela de um valor total de US$18,1 bilhões.

Gráfico 11 – Taxa de Câmbio Nominal (média mensal) – comercial venda

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

jan/

99

jul/9

9

jan/

00

jul/0

0

jan/

01

jul/0

1

jan/

02

jul/0

2

jan/

03

jul/0

3

jan/

04

jul/0

4

jan/

05

jul/0

5

jan/

06

R$/

US

$

Fonte: Banco Central

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53

Como pode ser observado no gráfico 11, o período analisado apresentou considerável

volatilidade do câmbio, apesar das intervenções do Banco Central. Após a maxidesvalorização

em janeiro de 1999, a taxa de câmbio apresenta breve recuperação devido à melhora das

expectativas com o sucesso das revisões do acordo com o FMI. No entanto, no final de 2000, a

instabilidade política e econômica da Argentina contribui para o início de um processo de

desvalorização da moeda, que se estende até o final de 2001, quando o país fecha novo acordo de

assistência financeira com o FMI, no valor total de US$15,7 bilhões, tendo US$4,7 bilhões sido

sacados imediatamente.

A partir do segundo trimestre de 2002, a moeda inicia novo processo de desvalorização,

com a cotação do dólar aumentando de R$2,32 em abril de 2002 para R$3,81 em outubro do

mesmo ano. Fatores internos, como as incertezas decorrentes da condução da economia após as

eleições no final do ano, e externos, como o baixo crescimento dos países desenvolvidos – cujo

crescimento médio em 2001 e 2002 foi de 1,15% –, o surgimento de fraudes contábeis em

grandes empresas americanas e as crises observadas em mercados emergentes, com destaque

para a crise Argentina, provocaram aumento na aversão ao risco por parte dos capitais

estrangeiros.

O processo de desvalorização da moeda é revertido a partir do primeiro trimestre de

2003, com a dissipação das preocupações quanto às ações do novo governo, que dá continuidade

às políticas econômicas que já vinham sendo adotadas, a consolidação do ajuste externo, e a

elevação da taxa Selic. O processo de valorização cambial que passa a ocorrer a partir de então

possibilita ao país não renovar o acordo com o FMI em julho de 2005, pagando antecipadamente

ao órgão as amortizações de dívidas contraídas em acordos anteriores.

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54

4.3.2.2 Política Monetária

A política monetária pode ser considerada o principal instrumento para controlar a

inflação durante a segunda fase do Plano Real, tendo se baseado em um regime de metas de

inflação, na busca por influenciar as expectativas inflacionárias do mercado, e taxas de juros

altas para perseguir tais metas. O índice de preços escolhido para servir ao regime de metas de

inflação foi o IPCA –Índice de Preços ao Consumidor Amplo.

Segundo Goldfjan (2002), o regime de metas de inflação passou por diversos desafios ao

longo de sua vigência no Brasil, sendo os três principais a construção de credibilidade por parte

da autoridade monetária, as mudanças nos preços relativos, e a grande volatilidade da taxa de

câmbio.

A credibilidade na condução da política monetária foi adquirida pelo Banco Central

mesmo não havendo uma independência formal deste órgão em relação ao governo, através de

sua posição firme em perseguir as metas estabelecidas mesmo durante choques adversos, além da

condução da política monetária de forma consistente com as diretrizes traçadas pelo Copom, e do

estabelecimento de comunicação clara e transparente com o mercado, inclusive nos momentos

em que as metas não foram cumpridas. Segundo Goldfajn, essa credibilidade continua sendo

construída, e a independência do Banco Central contribuiria para elevá - la.

O aumento dos preços administrados10 acima da variação dos demais preços da economia

representou também um desafio na busca pelo cumprimento das metas de inflação. Estes preços

10 Os preços administrados são aqueles estabelecidos por contrato ou por órgão público, e englobam os preços dos serviços telefônicos, produtos derivados de petróleo, eletricidade, planos de saúde, taxa de água e esgoto, IPVA, IPTU e a maioria das tarifas de transporte público.

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55

possuíam uma participação de 33,63% no IPCA em junho de 200611, e, como é possível ver no

quadro 1, durante todo o período de vigência do Plano Real foram os grandes responsáveis por

estimular o aumento da inflação.

Os reajustes dos preços administrados acima dos demais que compõem o IPCA se

deveram a fatores como: terem sua dinâmica ditada pela dependência dos preços internacionais,

em especial no caso dos derivados de petróleo; sofrerem forte influência da taxa de câmbio em

função de contratos indexados a índices de preços sensíveis às alterações de câmbio 12; e

possuírem forte componente inercial em seus reajustes, estabelecidos por contratos com base na

média da inflação passada.

Quadro 1 – IPCA (% a.a.)

ComercializáveisNão

comercializáveisPreços

administradosTOTAL

1995 10,55% 35,52% 28,17% 22,41%1996 2,24% 13,81% 20,24% 9,56%1997 1,50% 4,39% 18,33% 5,23%1998 1,22% 1,47% 3,23% 1,66%1999 11,26% 1,61% 20,89% 8,94%2000 3,64% 3,71% 12,90% 5,97%2001 7,31% 5,70% 10,78% 7,67%2002 14,88% 7,47% 15,32% 12,53%2003 8,69% 6,66% 13,20% 9,30%2004 6,31% 6,84% 10,20% 7,60%2005 2,74% 6,36% 8,98% 5,69%

Fonte: IPEAData

Com base nesta dinâmica é possível entender o motivo dos reajustes nos preços

administrados terem ficado acima dos preços livres, principalmente no final dos anos 1980 e

11 De acordo com o Banco Central. Para maiores informações sobre os preços administrados, ver BANCO CENTRAL DO BRASIL (2006). 12 Como no caso do IGP -DI (Índice Geral de Preços).

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56

início da década seguinte, quando o preço médio dos combustíveis importados aumentou 210%

entre janeiro de 1999 e janeiro de 2003, e a desvalorização cambial atingiu 216% entre dezembro

de 1998 e outubro de 200213. É importante observar, ainda no quadro 1, a volatilidade nos preços

dos bens comercializáveis, em especial a partir de 1999, quando o câmbio passa a flutuar, que

pode ser explicada pelo fato destes bens serem mais fortemente afetados por estas alterações no

câmbio do que os produtos não comercializáveis.

O terceiro desafio para a política de metas de inflação, segundo Goldfajn, foi a excessiva

volatilidade do câmbio no período, que levou a freqüentes revisões das expectativas de inflação e

dificultou o cumprimento das metas. Conforme já discutido na seção sobre política cambial, a

resposta do Banco Central a este desafio se deu através de intervenções no mercado cambial

buscando reduzir esta volatilidade. Como é possível ver pela continuação da inflação em níveis

baixos, o regime de metas de inflação foi, portanto, bem sucedido no enfrentamento aos desafios

citados.

Analisando o cumprimento das metas estabelecidas para a inflação, é possível ver pela

tabela 8 que nos primeiros dois anos a inflação ficou dentro da meta, mesmo com o impacto da

depreciação do câmbio no início de 1999. Nos três anos seguintes, porém, o governo não

conseguiu cumprir as metas. Em 2001 a inflação ficou maior que o esperado devido ao cenário

externo desfavorável, que acabou desvalorizando a moeda e pressionando a inflação, conforme já

discutido. Os elevados reajustes dos preços administrados também tiveram importante papel na

pressão inflacionária neste ano.

13 De acordo com dados do Banco Central do Brasil.

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57

Tabela 8 – Regime de Metas de Inflação

Meta Meta ajustada

Tolerância IPCA efetivo Meta cumprida

1999 8,00% 2 p.p. 8,94 a

2000 6,00% 2 p.p. 5,97 a2001 4,00% 2 p.p. 7,67 X2002 3,50% 2 p.p. 12,53 X2003 4,00% 8,50%* 2,5 p.p. 9,30 X

2004 5,50% 2,5 p.p. 7,60 a

2005 4,50% 5,10% 2,5 p.p. 5,69 a* Meta ajustada proposta em carta aberta, mas não definida pelo Conselho Monetário Nacional

Fonte: Banco Central

Em 2002 a pressão inflacionária aumenta, puxada principalmente pela crise de confiança

provocada pelas eleições e pela retração dos mercados internacionais, que levou a uma

depreciação cambial de 55% entre abril de 2002 e fevereiro de 2003, impactando principalmente

os preços administrados e de bens comercializáveis (ver quadro 1). Em 2003, mesmo com o

aumento dos intervalos de tolerância, o governo não consegue cumprir a meta, sofrendo ainda os

efeitos inerciais da aceleração inflacionária do ano anterior.

A meta de 2004, por sua vez, ficou dentro do intervalo de tolerância, em um contexto de

crescimento do PIB, queda na relação dívida/ PIB e bom desempenho do cenário externo, com

ausência de choques, câmbio estável, e crescimento mundial de 5,3%, com taxa libor em dólar

média de 1,8%a.a. Em 2005, com a continuação deste cenário favorável, o IPCA volta a fechar

dentro da meta.

O gráfico 12 mostra a evolução da taxa de juros nesta segunda fase do Plano Real, com

destaque para o forte aumento da Selic no momento da transição entre regimes cambiais, visando

conter a saída de capitais e o processo de desvalorização.

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58

Gráfico 12 – Taxa Selic Nominal – efetiva

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50ja

n/99

jul/9

9

jan/

00

jul/0

0

jan/

01

jul/0

1

jan/

02

jul/0

2

jan/

03

jul/0

3

jan/

04

jul/0

4

jan/

05

jul/0

5

jan/

06

jul/0

6

* acumulada no mês anualizada Fonte: Banco do Brasil

% a

a

No segundo semestre de 2002 as taxas de juros apresentam novo crescimento

significativo, devido ao aumento da meta para a Selic, que passa de 18% em outubro de 2002

para 25% em dezembro e para 26,5% em fevereiro de 2003, em resposta às pressões

inflacionárias decorrentes da depreciação cambial, causada por fatores já discutidos

anteriormente.

Por sua vez, o comportamento do crédito neste período, medido em termos reais, pode ser

verificado no gráfico 13, no qual é possível ver uma retração em 1999, devido à insegurança

causada tanto pelo aumento do risco percebido com a mudança no regime cambial e suas

possíveis repercussões no nível de preços, quanto pelas variações das taxas de juros. O baixo

crescimento econômico neste ano também contribuiu para contrair a demanda por crédito.

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Gráfico 13 – Operações de Crédito

400.000

500.000

600.000

700.000

jan/

99

jul/9

9

jan/

00

jul/0

0

jan/

01

jul/0

1

jan/

02

jul/0

2

jan/

03

jul/0

3

jan/

04

jul/0

4

jan/

05

jul/0

5

jan/

06

(*) Valores trazidos a abr/06 pelo IPCAFonte: Banco Central

Em 2000 o Banco Central reduz novamente a taxa de compulsório sobre depósitos à

vista, que cai para 45%, como pode ser visto no gráfico 14, auxiliando na retomada do crédito.

Com a turbulência no mercado cambial no segundo semestre de 2002, o volume de crédito volta

a se retrair, principalmente a partir de fevereiro de 2003, quando a taxa de compulsório sobre

depósitos à vista sobe para 68%. A partir do segundo semestre deste ano, porém, as operações de

crédito iniciam uma trajetória de crescimento, puxadas pela queda na taxa de juros, redução da

alíquota do compulsório, que cai para 53%, e pelo cenário de estabilidade cambial, além do

impulso proporcionado pelo crédito consignado em folha de pagamento, que estimulou o crédito

para pessoa física.

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Gráfico 14 – Alíquota de Recolhimento Compulsório - % sobre depósitos à vista

30

40

50

60

70

80

90

100

jan/

99

jul/9

9

jan/

00

jul/0

0

jan/

01

jul/0

1

jan/

02

jul/0

2

jan/

03

jul/0

3

jan/

04

jul/0

4

jan/

05

jul/0

5

jan/

06

Fonte: Relatórios Anuais do Banco Central

4.3.2.3 Política Fiscal

A partir de 1999 o governo altera sua política fiscal, passando a adotar uma política de

austeridade das contas públicas com o objetivo de atender ao compromisso firmado com o FMI

de implementar um ajuste fiscal, medido através de metas para o superávit fiscal primário, que

podem ser vistas na tabela 9, e que, com exceção do primeiro ano de vigência das metas, foram

cumpridas em todos os demais anos.

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61

Tabela 9 – Metas de Superávit Fiscal Primário

Em % PIB

MetaMeta

ajustadaEfetivo

Meta cumprida

1999 3,25 3,19 X

2000 3,25 3,46 a

2001 3,35 3,64 a

2002 3,50 3,88 3,89 a

2003 3,75 4,25 4,25 a

2004 4,25 4,50 4,59 a

2005 4,25 4,84 aFonte: Banco Central do Brasil

O ajuste fiscal que o país implementou no período se baseou no aumento da arrecadação

para compensar o crescimento dos gastos e possibilitar um resultado primário positivo. Com

conseqüência desta estratégia, a carga tributária aumenta de 29,9% do PIB em 1998 para 37,4%

em 2005, com o volume total arrecadado neste último ano chegando a R$724,1 bilhões, e

representando um aumento real de 67,3% no período, como pode ser visto na tabela abaixo.

Tabela 10 – Carga Tributária

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005Carga Tributária Bruta (% PIB) 29,90 32,15 32,95 33,84 35,53 34,90 35,88 37,37Arrecadação (R$ bilhões) 269,05 306,26 361,57 406,87 473,84 542,75 633,81 724,11Fonte: Receita Federal

Ao mesmo tempo em que a carga tributária aumentou ao longo dos anos, os gastos do

governo central se expandiram 57% entre 1999 e 2005, já excluídos os efeitos da inflação. Parte

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62

da resistência em reduzir os gastos públicos, no entanto, se deveu ao fato de que o governo ter

mais de 80% de seu Orçamento comprometido com despesas obrigatórias, conforme já discutido.

Cabe destacar a importância da aprovação em 2000, do projeto batizado de Lei de

Responsabilidade Fiscal (LRF), cujo objetivo foi determinar maior responsabilidade na gestão

pública, e tendo como escopo um conjunto de definições e compromissos que deveriam nortear o

comportamento das autoridades, balizando a administração das finanças públicas nos níveis

central, estadual e municipal, de forma a atuarem na busca pelo equilíbrio nas contas públicas.

Dentre os principais aspectos do projeto destacam-se o estabelecimento de teto para as despesas

com pessoal e a limitação do endividamento público, prevendo sanções para o caso de

descumprimento das regras da lei.

Como resultado do comprometimento do governo com a disciplina fiscal, os resultados

do setor público vêm melhorando na segunda fase do Plano Real, conforme pode ser visto na

tabela 11:

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63

Tabela 11 – Necessidade de Financiamento do Setor Público (% PIB)

Composição 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Nominal 7,46 5,78 3,61 3,57 4,58 5,08 2,67 3,29

Governo central* 4,93 2,70 2,27 2,11 0,75 3,99 1,53 3,79

Governos estaduais e municipais 2,01 3,14 2,08 2,02 3,83 1,74 1,92 0,28

Empresas estatais 0,52 (0,07) (0,74) (0,56) 0,01 (0,65) (0,79) (0,78)

Juros nominais 7,47 8,97 7,08 7,21 8,47 9,33 7,26 8,13

Governo central 5,48 5,03 4,13 3,94 3,12 6,48 4,50 6,68

Governos estaduais e municipais 1,83 3,36 2,63 2,90 4,62 2,62 2,91 1,38

Empresas estatais 0,16 0,58 0,32 0,37 0,74 0,22 (0,15) 0,07

Primário (0,01) (3,19) (3,46) (3,64) (3,89) (4,25) (4,59) (4,84)

Governo central (0,55) (2,33) (1,86) (1,83) (2,37) (2,49) (2,97) (2,88)

Governos estaduais e municipais 0,19 (0,22) (0,55) (0,87) (0,79) (0,89) (0,99) (1,10)

Empresas estatais 0,35 (0,65) (1,06) (0,93) (0,73) (0,87) (0,64) (0,85)

Juros reais 7,07 4,31 4,64 4,69 1,31 7,10 3,18 7,57

Governo central 5,33 3,21 3,16 2,95 0,05 5,43 2,34 6,35

Governos estaduais e municipais 1,59 0,71 1,23 1,34 0,53 1,47 1,00 1,15

Empresas estatais 0,15 0,39 0,24 0,40 0,73 0,20 (0,15) 0,07

* Inclui Governo Federal e Banco Central

Fonte: Banco Central do Brasil

Essa mudança da política fiscal, para uma postura mais austera, pode ser constatada pela

queda das NFSP, em termos nominais, que eram de 7,46% do PIB em 1998, e foram para 3,29%

em 2005, enquanto neste mesmo período, o resultado primário passou de um superávit de apenas

0,01% do PIB, para 4,84% do PIB. É importante observar ainda a participação dos estados,

municípios e empresas estatais nessa melhoria do desempenho das contas públicas.

Os altos gastos com o pagamento de juros fizeram, porém, com que o resultado nominal

ficasse negativo durante todo o período analisado, com o resultado primário não sendo suficiente

para cobrir os encargos financeiros do setor público.

4.3.2.4 Resultados da segunda fase

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64

O país apresentou um crescimento fraco do PIB no período de 1999 a 2005, com média

de crescimento de 2,3%, reflexo das políticas restritivas, que durante este período tiveram como

principal objetivo a consolidação da estabilidade de preços e o ajuste fiscal.

Gráfico 15 – PIB – Trimestral (1990 = 100)

110

120

130

140

150

1º T

199

9

3º T

199

9

1º T

200

0

3º T

200

0

1º T

200

1

3º T

200

1

1º T

200

2

3º T

200

2

1º T

200

3

3º T

200

3

1º T

200

4

3º T

200

4

1º T

200

5

3º T

200

5 Fonte: IBGE

O bom desempenho do cenário internacional, como pode ser visto pelo crescimento

mundial médio de 4,1% entre 1999 e 200514, juntamente com a mudança de regime cambial,

permitiu uma melhora das contas externas do país, principalmente através da retomada do

dinamismo das exportações, que cresceram em termos reais 73% entre 1999 e 2005, atingindo

US$118,3 bilhões neste último ano. Este crescimento, por sua vez, foi puxado em grande parte

pelo aumento no preço das commodities vendidas pelo país – que pode ser exemplificado por 14 De acordo com dados do IFS/FMI.

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65

alguns dos principais itens da pauta de exportação, como o preço de exportação de combustível,

que aumentou 204% entre 1999 e 2005, o do açúcar, que cresceu 30% e o dos produtos

agropecuários, que aumentaram 21%15 –, fazendo com que as exportações se expandissem

mesmo diante de um cenário de valorização cambial.

Com isso, a balança comercial apresenta crescentes superávits a partir de 1999, que

influenciam fortemente o desempenho do saldo de transações correntes, como pode ser visto na

tabela 12. Em contrapartida, os saldos negativos na conta de rendas foram causados pelo

aumento das remessas para pagamento de juros, lucros e dividendos no período, com destaque

para o significativo aumento do déficit em 2005, puxado pelo crescimento das remessas de

lucros e dividendos provenientes de investimentos feitos no país, impulsionados pelo bom

desempenho da atividade econômica em 2004 e pela valorização da moeda.

Tabela 12 – Indicadores do Setor Externo

(em US$ milhões)1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Transações Correntes -25.398 -24.688 -23.214 -7.718 4.177 11.711 14.198Balança Comercial -1.294 -749 2.650 13.121 24.794 33.641 44.756Serviços -6.962 -7.574 -7.759 -5.038 -4.931 -4.678 -8.148Rendas -18.837 -17.886 -19.743 -18.191 -18.552 -20.520 -25.967Transf. Unilaterais 1.695 1.521 1.638 2.390 2.866 3.268 3.558

Reservas Internacionais 36.342 33.011 35.866 37.823 49.296 52.935 53.799

Dívida Externa 241.468 236.156 226.067 227.689 235.414 220.182 187.397

Fonte: Banco Central

15 De acordo com dados do IPEAData.

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66

Como resultado desse bom desempenho das variáveis externas, o país vem melhorando

seus indicadores de vulnerabilidade, que podem ser vistos na tabela 13, com a melhora da

relação transações correntes/ PIB, que foi de -4,7% em 1999 para 1,8% em 2005, puxada em

grande parte pela melhora da relação balança comercial/ PIB, que foi de -0,2% para 5,6% no

mesmo período. A dívida externa, por sua vez, vem caindo desde 2003 devido ao bom cenário

externo e ao processo de desvalorização ocorrido no período, que vêm possibilitando a

amortização de parte desta dívida, fazendo com que as relações dívida externa/ PIB e dívida

externa/ exportações caíssem fortemente entre 1999 e 2005.

Tabela 13 – Indicadores de Vulnerabilidade Externa

2000 2001 2002 2003 2004 2005

Dívida Externa/ PIB 39,2% 44,3% 49,4% 46,6% 36,5% 23,6%

Dívida Externa/ Exportações 4,29 3,88 3,77 3,22 2,28 1,58

Balança Comercial/ PIB -0,1% 0,5% 2,8% 4,9% 5,6% 5,6%

Transações Correntes/ PIB -4,0% -4,6% -1,7% 0,8% 1,9% 1,8%Fonte: Cálculo próprio a partir de dados do Banco Central e IPEAData.

A dívida pública como relação do PIB, por sua vez, ficou em 53,1% na média da segunda

fase do Plano Real, enquanto na primeira fase, esta participação ficou em 32,9%. O aumento do

endividamento aconteceu apesar da disciplina fiscal adotada, e se deveu principalmente aos

maiores gastos com juros, cuja média ficou em 8,0% do PIB entre 1999-2005 e 6,4% entre 1994-

98.

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67

Gráfico 16 – Dívida Líquida do Setor Público - %PIB

40

45

50

55

60

65

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Banco Central

Conforme é possível ver no gráfico 16, a relação dívida pública/ PIB apresentou

crescimento até o final de 2002, quando atingiu 63,6% em setembro deste ano, principalmente

devido à desvalorização, que fez aumentar o custo da dívida mobiliária indexada ao dólar, que

representava 29,5% da dívida mobiliária total em dezembro de 200116, e da dívida externa

líquida, que aumentou R$134 bilhões17 somente em 2002. Esta relação passa a cair a partir do

final do ano, puxada pelo aumento do superávit primário. A partir do segundo semestre de 2003,

porém, com o baixo desempenho do PIB e os altos gastos com juros, que chegaram a 9,33% do

PIB neste ano, esta relação volta a crescer, tornando a cair em meados de 2004, com o aumento

do superávit primário e a redução destes gastos com juros, puxada pela queda da Selic neste ano,

bem como com o maior crescimento do PIB.

16 De acordo com o Banco Central do Brasil. 17 Cálculo próprio a partir de dados do IPEAData e do Banco Central do Brasil.

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68

Analisando a composição da DLSP ao longo de todo o período do Plano Real, verifica-se

que esta passou de predominantemente externa, com esta parcela representando 63% do total da

dívida em 1991, para se tornar quase que totalmente interna em 2005, com esta representando

95% do total, conforme é possível verificar no Gráfico 17.

Gráfico 17 – Dívida Líquida do Setor Público – Externa e Interna - % PIB

0

10

20

30

40

50

60

70

1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

DLSP Externa DLSP Interna

,

Fonte: Banco Central

A dívida mobiliária federal, que era de R$ 415 bilhões em 1999, e representava 39,1% do

PIB, passou para R$ 980 bilhões em 2005, ou 50,3% do PIB. O governo, porém, vem tentando

melhorar o perfil desta dívida ao longo dos últimos anos, como é possível ver na tabela 14,

reduzindo a parcela indexada à moeda estrangeira – que caiu de 24,2% do PIB em 1999 para

2,7% em 2005 –, e aumentando a participação de títulos pré- fixados, que permitem maior

previsibilidade das despesas. Por outro lado, o prazo desta dívida também vem sendo alongado,

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69

com a duração média dos títulos tendo aumentado de 4,7 meses em janeiro de 1999, para 12,0

meses em dezembro de 200518.

Tabela 14 – Títulos Públicos Federais

Participação percentual por indexador1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Total (R$ milhões) 414.901 510.698 624.084 623.191 731.858 810.264 979.662

Câmbio 24,2 22,3 28,6 22,4 10,8 5,2 2,7

TR 3,0 4,7 3,8 2,1 1,8 2,7 2,1

Índices de preços 2,5 6,0 7,0 12,5 13,5 14,8 15,5

Over/ Selic 61,1 52,2 52,8 60,8 61,4 57,1 51,8

Prefixado 9,2 14,8 7,8 2,2 12,5 20,2 27,9

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: Banco Central do Brasil

Através dos resultados analisados nes ta seção, é possível verificar que, apesar de o país

ter realizado a troca de regime cambial em meio a um ataque especulativo, a economia não

mergulhou em uma recessão, com volta do processo inflacionário. Isso se deveu em grande parte

à política de juros altos, que atuou para conter a pressão inflacionária e estimular a entrada de

capitais no país.

O ajuste fiscal foi outro importante instrumento utilizado para melhorar os fundamentos

da economia e garantir a continuidade do plano de estabilização, porém, ao se basear no aumento

da tributação, este ajuste vem contribuindo para o fraco desempenho do PIB, com o desestímulo

ao investimento, como pode ser visto pela baixa taxa de investimento (tabela 15) existente no

país, que ficou em 19% na média de 1999 a 2005, insuficiente para garantir o aumento da

capacidade produtiva e crescimento econômico sustentável.

18 Todos os dados referentes à dívida mobiliária têm como fonte o Banco Central do Brasil.

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Tabela 15 – Taxa de Investimento - % PIB

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

18,9 19,29 19,47 18,32 17,78 19,58 19,93

Fonte: IBGE

Apesar de o ajuste fiscal ser imprescindível para permitir uma redução da taxa de juros e

estimular o crescimento, uma vez que uma relação dívida/ PIB alta obriga à manutenção de altas

taxas de juros para compensar o aumento do risco percebido pelos agentes, há que se atentar para

a qualidade deste ajuste. O ajuste fiscal deve se basear na redução dos gastos mais do que no

aumento da arrecadação, bem como na melhoria na alocação destes gastos, com foco na redução

das despesas com custeio e manutenção da máquina estatal, o que não vem ocorrendo no país.

Com isso, apesar de o país estar seguindo o caminho correto ao melhorar seus

fundamentos do ponto de vista macroeconômico, torna -se de suma importância daqui para frente

a implementação de uma melhora na qualidade do ajuste fiscal implementado, com vistas a

impulsionar o crescimento econômico de forma sustentável através da redução da carga tributária

e retomada dos investimentos.

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71

5 A ARGENTINA E O PLANO DE CONVERSIBILIDADE

5.1 Antecedentes

A economia argentina sofreu com o baixo desempenho econômico na década de 1980,

tendo sido atingida por um cenário externo de recessão, com baixo crescimento mundial e

escassez de financiamento, conforme já discutido no capítulo anterior, o que fez com que o PIB

do país apresentasse uma queda média de 0,7% durante os anos 80. O país vivia nessa época

ainda, um processo de transição para um regime democrático, após o fim do regime militar em

1983.

Diante de taxas de juros internacionais altas, o país sofreu um aumento de sua dívida

externa, tendo este período sido caracterizado por uma série de acordos com órgãos

internacionais, principalmente o FMI19, na busca por financiamento para suas contas externas

negativas. Os altos gastos com o pagamento do serviço da dívida externa fizeram com que a

conta corrente apresentasse sucessivos déficits neste período, tendo acumulado um resultado

negativo de cerca de US$ 16 bilhões20 entre 1982 e 1990.

A década de 1980 foi ainda caracterizada por apresentar déficits fiscais primários em

todos os anos, com uma média de déficit de 3,9% do PIB21, devido à pouca preocupação com a

questão fiscal neste período, que também foi caracterizado por um processo de aceleração

inflacionária, como pode ser visto no gráfico 18. A partir da segunda metade da década de 1980

o país realiza algumas tentativas de conter este processo, primeiro com o Plano Austral, em 19 Para mais detalhes sobre os acordos firmados entre o FMI e a Argentina, ver WIJNHOLDS (2001). 20 Ver DAMILL (1994) 21 De acordo com dados da Secretaría de Hacienda.

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1985, e depois com o Plano Primavera, em 1988. Em comum, estes planos conseguiram uma

redução temporária das taxas de inflação, porém com o retorno do processo inflacionário

posteriormente.

Gráfico 18 – Inflação – IPC *

375

0,0

50,0

100,0

150,0

200,0

250,0

jan/

84

jul/8

4

jan/

85

jul/8

5

jan/

86

jul/8

6

jan/

87

jul/8

7

jan/

88

jul/8

8

jan/

89

jul/8

9

jan/

90

jul/9

0

jan/

91* Referente à Grande Buenos Aires Fonte: INDEC

Plano Bonex

(%a.

m.)

Plano Austral

Plano Primavera

" troca de governo "

Em 1988, com a deterioração econômica do país e o descumprimento de acordos

anteriores, o país teve negado um novo desembolso do FMI, o que acabou culminando em uma

moratória não declarada de sua dívida externa. Diante desta crise, a inflação inicia nova escalada

no início de 1989. Em julho deste ano, ocorre mudança de governo e o estabelecimento de

políticas baseadas em abertura comercial e privatizações, além do refinanciamento da dívida

externa, que, inicialmente, contiveram a inflação.

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73

No entanto, a elevada dívida pública voltou a alimentar a oferta monetária e a inflação

torna a aumentar no segundo semestre de 1989. Em janeiro de 1990 é lançado o Plano Bonex,

que reduziu a liquidez drasticamente e refinanciou a dívida pública. Porém a situação voltou a se

deteriorar no início de 1991, resultando no anúncio, em abril, de um novo plano, denominado de

Plano de Conversibilidade, e que será discutido na próxima seção.

5.2 O Plano de Conversibilidade e a crise

O Plano de Conversibilidade teve como base uma reforma monetária que transformou o

Banco Central basicamente em uma Caixa de Conversão, transferindo o poder de desvalorizar a

moeda para o Congresso e retirando do Banco Central um de seus principais instrumentos de

política monetária, além de dar à moeda nacional maior credibilidade, ao atribuir à ela um valor

previsível e respaldo em reservas de moeda forte, atrelando a base monetária ao nível de divisas.

A Lei de Conversibilidade, de março de 1991, instituiu o regime de currency board,

fixando a taxa de câmbio de 1 austral para 1 dólar (o peso argentino substitui o austral em janeiro

de 1992), estabelecendo a livre conversibilidade entre a moeda local e qualquer outra moeda

estrangeira e autorizando a realização de contratos no país em qualquer moeda.

Como é possível ver na tabela 16, o novo plano consegue reduzir drasticamente as taxas

de inflação, que caíram de 1.344,5% a.a. em 1990, para 84,0% a.a. em 1991 – levando em

consideração um primeiro trimestre de índices de inflação ainda altos – e 17,7% em 1992, tendo

mantido a tendência de queda até atingir um nível de inflação zero em 1996.

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Tabela 16 – Índice de Inflação

% a.a.1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997

IPC* 1344,5% 84,0% 17,7% 7,3% 3,7% 1,7% 0,0% 0,4%

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

IPC 0,6% -1,9% -0,8% -1,4% 40,9% 3,5% 6,1% 12,3%Fonte: INDEC* Referente à Grande Buenos Aires

Nas próximas seções serão analisadas de forma separada as políticas econômicas

adotadas durante o Plano de Conversibilidade até o abandono do regime de currency board, em

2001, quando, a partir de então, as políticas serão analisadas em conjunto.

Cabe destacar a dificuldade de obtenção de dados anteriores à segunda metade da década

de 1990 junto a órgãos oficiais, inclusive no caso de indicadores macroeconômicos importantes

como os relacionados às finanças públicas e à dívida externa, o que pode fazer com que a análise

de alguns dados fique prejudicada.

5.2.1 Política Monetária

A Lei de Conversibilidade estabeleceu que a base monetária não poderia exceder o valor

em dólares das reservas internacionais, além de fixar em 20% o nível máximo da base que

poderia ser constituída por títulos do governo denominados em dólares, proibindo o Banco

Central de financiar os déficits do governo. A Lei proibiu também a indexação nos mercados de

bens e trabalho, permitindo-a apenas nas operações de crédito.

Page 82: Brasil e Argentina: uma análise macroeconômica comparativa ... · obtenção do grau de Mestre em Administração ... O segundo capítulo é ... Em 1950 Milton Friedman definiu

75

Essa permissão para que uma parcela da base monetária pudesse ser formada por títulos

públicos possibilitou ao Banco Central operar uma política monetária e de crédito limitadas,

inclusive como emprestador de última instância em momentos de crise, na medida em que a

quantidade de títulos no mercado normalmente esteve abaixo do limite estabelecido pela Lei de

Conversibilidade.

A retirada da capacidade da autoridade monetária em operar uma política monetária plena

foi uma medida radical, normalmente adotada em países nos quais tal autoridade já não possui

credibilidade perante o mercado, que, por sua vez, precisa se certificar que esta não irá atuar de

forma equivocada, prejudicando o bom funcionamento da economia. Esta situação se verificava

na Argentina, após várias tentativas de estabilização fracassadas e descumprimentos de acordos

firmados junto a órgãos internacionais. Complementando as medidas que buscavam dar maior

credibilidade ao sistema monetário, foi dada também ao Banco Central maior autonomia através

da independência de sua diretoria, cujos membros passaram a ter mandatos com prazo

determinado e nomeação ratificada pelo Congresso.

Em relação à política de juros, com o fim da hiperinflação e a forte entrada de capitais,

estimulada pelo novo cenário de estabilidade e pela melhora do cenário externo, refletida na

queda da taxa de juros mundial22, que passou de 10,6%a.a. na média da década de 1980 para

5,5% a.a. na primeira metade da década de 1990, as taxas de juros internas caíram, conforme

pode ser visto no gráfico 19.

22 Taxa libor em dólar americano, segundo dados do Banco Central do Brasil.

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Gráfico 19 – Taxa de Juros Nominal – Money Market

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

(% a

.a.)

Fonte: Mecon e FMI

No mesmo gráfico, é possível verificar três significativos aumentos das taxas de juros: em

1992, 1995 e durante os anos de 2001 e 2002, este último causado pela crise com a mudança de

regime cambial, e que será analisado mais à frente. No final de 1992 as taxas subiram para conter

uma breve corrida contra a moeda devido a um receio de desvalorização, que logo se mostrou

infundado, enquanto o aumento dos juros em 1995 teve como objetivo conter a saída de capitais

provocada pela crise do México, que retraiu o fluxo de capitais internacionais para países

emergentes.

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77

5.2.2 Política Cambial

O principal pilar do Plano de Conversibilidade foi a adoção do regime de currency board,

onde a taxa de câmbio entre o peso e o dólar americano foi estabelecida em 1:1, estando a base

monetária 100% atrelada às reservas internacionais. Com isso, durante todo o período que durou

o currency board, a política cambial se restringiu a prover divisas e constituir reservas de acordo

com a demanda do mercado.

A adoção do sistema de currency board trouxe consigo, no entanto, o problema de

exacerbação da influência do setor externo sobre o desempenho da economia, com o fluxo de

capital estrangeiro determinando a liquidez interna e influenciando a oferta de crédito e,

conseqüentemente, a demanda agregada, bem como o financiamento dos déficits em conta

corrente e a variação nas reservas internacionais. Esse fluxo de capitais, anteriormente

controlado, passou a ter livre mobilidade após a implantação do Plano de Conversibilidade.

Com isso, o acesso aos capitais externos tornou-se extremamente importante, tendo sido

abundante nos primeiros anos do Plano de Conversibilidade, principalmente devido ao fim, em

1992, da renegociação da moratória decretada no final da década anterior, através do Plano

Brady, e que possibilitou que o país voltasse a ter acesso ao financiamento externo no mesmo

momento em que as condições para este financiamento se recuperavam, com a taxa libor em

dólares tendo caído de 10,6%a.a. na média da década de 1980 para 5,5% nos primeiros cinco

anos da década seguinte23. Esses capitais constituíram-se principalmente da repatriação de

dólares de propriedade dos próprios argentinos, e capitais destinados à compra de empresas

públicas no processo de privatização, que será discutido na próxima seção.

23 Dados do Banco Central do Brasil.

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78

As políticas econômicas adotadas após o abandono do sistema de currency board serão

abordadas na seção 5.2.4, porém convém dar destaque à trajetória da taxa de câmbio após o fim

do câmbio fixo, que pode ser vista no gráfico 20. A sobrevalorização do peso argentino durante a

vigência do câmbio fixo pode ser confirmada pelo overshooting que ocorreu logo após a

mudança cambial, com a taxa de câmbio atingindo $3,60/ US$ em apenas 6 meses, o que

representou uma desvalorização de 157%.

Gráfico 20 – Taxa de Câmbio (média)

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

jul/0

1

jan/

02

jul/0

2

jan/

03

jul/0

3

jan/

04

jul/0

4

jan/

05

jul/0

5

jan/

06

pes

o /

US

$

Fonte: FMI - IFS (IpeadData)

Após esse movimento, a taxa de câmbio se valoriza nos meses seguintes, estabilizando a

partir daí em um nível um torno de $3,00 /US$, com o Banco Central comprando dólares para

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manter a moeda desvalo rizada e continuar a estimular as exportações, bem como para recompor

suas reservas internacionais.

5.2.3 Política Fiscal

Apesar dos esforços para controlar o desequilíbrio fiscal após a implantação do Plano de

Conversibilidade, como a proibição do Banco Central de financiar os déficits do governo, o país

não conseguiu implementar um ajuste fiscal, e apresentou déficits nominais nas contas públicas

na maior parte do período após a implantação do plano, como é possível ver na tabela 17. Neste

trabalho os resultados fiscais estarão sendo analisados de forma nominal devido à não

disponibilização de série histórica com os resultados primários.

Mesmo com resultados fiscais negativos, as contas do governo apresentaram desempenho

melhor após a implantação do Plano de Conversibilidade, quando a média dos resultados

nominais de 1993 (último dado disponível) a 2001 foi de -1,4% do PIB24, do que durante a

década de 1980, quando a média foi de -3,9% do PIB25. Esta melhora se deveu tanto à mudança

de postura do governo, que passou a dar maior importância à questão fiscal, quanto a fatores

como a estabilização promovida pelo plano, que possibilitou o fim da erosão inflacionária das

receitas tributárias e a ampliação da arrecadação tributária, que pode ser vista na tabela 17, e que

foi estimulada pelo crescimento da atividade econômica e das importações, como será discutido

na seção 5.3.

24 Segundo dados da Secretaria de Hacienda, referentes ao setor público não financeiro – base caixa (metodologia internacional) 25 Segundo relatório “ Ejecución del Sector Publico Argentino. Cuenta Ahorro-Inversion Financiamiento”, da Secretaría de Hacienda, referente ao setor público não financeiro.

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Tabela 17 – Resultado Fiscal Nominal *

% PIB

1994 1995 1996 1997 1998 1999

-0,03% -0,92% -2,52% -1,48% -1,36% -1,68%

2000 2001 2002 2003 2004 2005

-2,39% -3,25% -1,46% 0,48% 2,60% 1,77%

Fonte: Secretaría de Hacienda/ MECON.

* Referente ao setor público não financeiro - base caixa (metod. Internacional)

A mudança de postura do governo, no sentido de buscar um ajustamento fiscal, foi em

grande parte determinada pela rigidez do regime de currency board, que fazia com que a política

fiscal contracionista fosse um dos poucos instrumentos disponíveis na busca por aumentar a

confiança do mercado e possibilitar a redução das taxas de juros e a retomada do crescimento.

Esta necessidade de ajustamento se tornou ainda mais importante após a mudança do cenário

internacional com as crises asiática e russa.

Um outro fator importante a auxiliar na melhora dos resultados do governo foi o

ambicioso processo de privatização, que se iniciou no final dos anos 80, e se concentrou

principalmente na primeira metade da década de 1990, momento em que o fluxo de capital

estrangeiro estava ávido por investir em mercados emergentes. Esse programa incluiu a

privatização das principais empresas públicas, e, além do aumento da arrecadação, permitiu o

fim dos prejuízos que parte destas empresas geravam para o governo. Alguns dos setores

privatizados foram os de telecomunicações, energia elétrica, água, combustível, e transportes

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81

aéreo e ferroviário, tendo a receita arrecadada até 1995, quando se concentraram as vendas das

principais empresas, sido de cerca de US$ 30 bilhões26.

Apesar de não haver dados disponíveis na série histórica usada como base27, através de

outra fonte28, é possível verificar que nos primeiros anos do Plano de Conversibilidade os

resultados fiscais melhoraram significativamente, com o resultado nominal passando de -3,1%

em 1990 para 1,69% em 1992. Essa melhora foi impulsionada pela forte entrada de capitais e a

redução dos custos financeiros no mercado internacional de crédito, já discutidos anteriormente,

que possibilitaram uma queda no custo da dívida pública em dólares, o que fez com que as

despesas com juros caíssem, em termos reais, 50% entre 1989 e 199429.

Como é possível ver na tabela 17, os resultados fiscais voltam a piorar entre 1994 e 1996,

puxados pelos efeitos da crise mexicana, que retraiu a liquidez internacional e aumentou as taxas

de juros – vide taxa libor em dólares, que passou de uma média de 3,7%a.a. em 1992 e 1993,

para 5,6%a.a. entre 1994 e 199630. Esses efeitos provocaram aumento no custo da dívida pública

externa, que neste período representou entre 70-80% da dívida pública total. A queda na

arrecadação com o processo de privatização também contribuiu para deteriorar as contas

públicas, com as receitas caindo de uma soma de $29 bilhões entre 1990 e 1994 para $1,5 bilhão

entre 1995 e 200031.

Convém destacar que foi realizada uma reforma previdenciária em 1994, de grande

importância, e na qual alterou-se o mecanismo de capitalização do sistema, passando a coexistir

26 De acordo com dados do MECON. 27 Série referente ao setor público não-financeiro, base caixa, metologia internacional, calculada através de dados da Secretaría de Hacienda e do MECON, e disponível na tabela 17. 28 Relatório “Ejecución del Sector Publico Argentino. Cuenta Ahorro-Inversión Financiamiento”, da Secretaría de Hacienda, referente ao setor público não financeiro. 29 De acordo com relatório “Ejecución del Sector Publico Argentino. Cuenta Ahorro -Inversión Financiamiento”, da Secretaría de Hacienda. 30 Dados do Banco Central do Brasil. 31 De acordo com dados do MECON.

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um sistema novo e privado de capitalização, e o antigo sistema público, no qual permaneceram

os trabalhadores já aposentados e parte dos ativos que optaram por tal. Essa reforma foi

importante para garantir a sustentabilidade do sistema, porém ajudou a piorar as contas públicas

inicialmente, uma vez que grande parte dos contribuintes preferiu migrar para o sistema privado,

fazendo com que as receitas previdenciárias para o sistema público caíssem 38% entre 1994 e

1996 em termos reais 32.

Após recuperação em 1997 e 1998, o resultado voltou a piorar em 1999, com o impacto

das crises russa e brasileira, que levaram à retração de 3,4% do PIB argentino em 1999 33. Os

déficits fiscais continuaram a aumentar até 2001, mesmo com as medidas adotadas pelo governo

objetivando o equilíbrio fiscal e que incluíram cortes nos salários de funcionários públicos,

redução de aposentadorias, reestruturação de órgãos públicos e corte no repasse às províncias. O

corte nas transferências para as províncias, por sua vez, agravou a crise política e teve impacto

sobre a capacidade destas em honrar despesas, levando a um processo de crise de liquidez e

agravamento da recessão. As províncias, por sua vez, para atenuar esse problema de falta de

liquidez e honrar seus pagamentos, passaram a emitir títulos, que eram aceitos pelo setor privado

em suas transações de compra e venda.

32 Cálculo próprio utilizando dados do INDEC e da Secretaría de Hacienda. 33 De acordo com dados do INDEC.

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Tabela 18 – Carga Tributária

1991 1993 1995 1997 1999

Carga Tributária Bruta (% PIB) 16,94% 21,98% 20,71% 20,85% 21,37%Arrecadação Bruta Total ($ milhões) 30.652 51.983 53.426 61.058 60.594

2001 2002 2003 2004 2005

Carga Tributária Bruta (% PIB) 21,14% 20,30% 23,79% 26,70% 27,03%Arrecadação Bruta Total ($ milhões) 56.807 63.440 89.439 119.533 143.855 Fonte: MECON

O forte aumento da arrecadação tributária a partir de 2003, que pode ser visto na tabela

18, permitiu que as contas públicas melhorassem mesmo com o significativo aumento dos gastos

no mesmo período (ver gráfico 21). Estes gastos foram puxados pelo aumento das transferências

às províncias através de recursos co-participados, o que, provavelmente, está relacionado com o

próprio aumento da arrecadação. No gráfico 21 é possível ver ainda que as despesas com juros

sofreram acelerado aumento entre 1994 e 2001, principalmente devido ao aumento das taxas de

juros internacionais e do volume da dívida.

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Gráfico 21 – Gastos Públicos *

0

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

140.000

1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Em

$ m

ilhõ

es

Desp. operacionais Juros Desp. previdenciárias Transferências Outros

Fonte: Secretaria de Hacienda* Referente ao setor público não financeiro - base caixa (metod. Internacional)

Convém enfatizar mais uma vez que uma das principais características do endividamento

público neste período foi seu intenso financiamento externo, que será melhor discutido nas

próximas seções, estimulado pelo cenário internacional favorável até a primeira metade da

década de 1990, o que, no entanto, acabou por aumentar a vulnerabilidade do país a alterações no

fluxo de capitais internacionais. Esta fragilidade contribuiu decisivamente para que o país

declarasse moratória de sua dívida pública externa em 2001, no auge da instabilidade política e

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85

econômica, e posteriormente abandonasse o regime de currency board, como será discutido na

próxima seção.

5.2.4 A crise argentina e as políticas pós-crise

O regime de currency board na Argentina passou por diversos desafios ao longo de sua

existência, causados principalmente por turbulências no mercado externo. O primeiro destes

desafios foi a crise do México, em dezembro de 1994, quando a desvalorização do peso

mexicano afetou o fluxo de capitais para a América Latina, o que impactou especialmente a

Argentina, fragilizada pela forte dependência de capitais externos.

A percepção pelo mercado de que o peso argentino estaria sobrevalorizado e que o

governo poderia recorrer a uma desvalorização da moeda para enfrentar a saída de capitais fez

com que a Argentina fosse ainda mais afetada pela crise mexicana do que os demais países

emergentes. Além disso, o país havia anunciado o abandono do Acordo de Facilidades com o

FMI, no mesmo momento em que vinha apresentando tendência ao desequilíbrio fiscal, o que era

especialmente perigoso em um país que adotava o regime de câmbio fixo.

Em 1997, com a crise asiática, em 1998, com a moratória decretada pela Rússia, e em

1999 com a maxidesvalorização do câmbio no Brasil, o país enfrenta novos desafios. Os choques

externos, no entanto, não eram o único problema do país, que viu seu cenário interno se

deteriorar nesse período, com a incapacidade do governo de implementar um ajuste fiscal, além

da existência de elevada dívida externa, que atingiu 54% do PIB em 1999 (ver tabelas 21 e 22).

O alto nível de endividamento público externo se mostrava insustentável e passou a

alimentar incertezas quanto à capacidade do país de sustentar o regime de currency board e

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honrar suas obrigações externas. Em meados de 2001 o governo ainda tenta equilibrar as contas

públicas através da renegociação da dívida com credores internos e externos, com destaque para

a troca de títulos de curto prazo por títulos de longo prazo, no valor de US$29 bilhões. Porém

este não consegue alterar as expectativas do mercado e superar as restrições de acesso ao crédito

externo, e o quadro recessivo se agrava em 2001, com o aumento dos conflitos políticos e

sociais, que levam a um cenário de instabilidade e retração econômica, com queda de 15% no

nível de atividade e de 4,4% no PIB em 200134.

Diante deste quadro, os investidores empreendem uma fuga maciça de capitais, através de

uma corrida bancária, – que contraiu os depósitos bancários em US$19,5 bilhões de janeiro a

novembro de 2001, representando uma queda de 21%35 –, bem como de uma fuga de capitais

estrangeiros, que se traduziu em queda de US$10,7 bilhões nas reservas internacionais no mesmo

período36.

Com o agravamento da crise, o governo adota medidas visando a restringir os saques e

limitar o envio de divisas ao exterior, no que ficou conhecido como “corralito”. Tais medidas

incluíram a imposição de limites aos saques das contas correntes e poupanças 37 e apenas

pioraram a crise, paralisando o comércio e a produção com a súbita queda de liquidez.

Como conseqüência da crise, o então presidente Fernando de la Rua renuncia em

dezembro, mergulhando o país em um caos institucional, que resultou na nomeação de cinco

presidentes em duas semanas. Com um mandato de apenas alguns dias, Adolfo Rodriguez Saá

decreta a suspensão do pagamento da dívida externa devido à incapacidade de pagamento do

país. Indicado pelo Congresso, Eduardo Duhalde assume a presidência no final de dezembro, 34 Dados do MECON. 35 Dados do BCRA. 36 Dados do IFS/FMI. 37 As devoluções foram sendo feitas ao longo de vário meses, através de cronogramas diferenciados, de acordo com o valor a receber. Os depósitos em dólares foram convertidos em pesos a uma taxa de $1,40/ US$, enquanto a cotação do câmbio em junho de 2002 atingia $3,60/ US$.

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87

ratificando a decisão de moratória e anunciando, nos primeiros dias de 2002, o fim do regime de

currency board.

Após um processo de forte desvalorização da moeda com a implantação do novo regime

de câmbio flutuante, como já discutido na seção 5.2.2, esta passa a flutuar a partir do segundo

trimestre de 2003 em um nível um pouco abaixo de $3,00/ US$ (ver gráfico 20), com

intervenções do Banco Central no mercado de câmbio.

Como conseqüência do abandono do currency board seguido deste overshooting cambial,

o país viu suas taxas de juros dispararem, como é possível ver no gráfico 19, na tentativa de

conter a fuga de capitais. No entanto, após este período de turbulência, estas voltam a se

estabilizar em um nível abaixo de 10% a.a. a partir do final de 2002, com a melhora dos cenários

tanto externo quanto interno, bem como com o estabelecimento de uma política de juros baixos,

com o objetivo de estimular o crescimento econômico.

Outra conseqüência dessa alteração do regime cambial foi a forte expansão da base

monetária, como é possível ver no gráfico 23, devido ao fim da necessidade de se ter esta base

atrelada às reservas internacionais. Tal expansão refletiu também a política cambial de

manutenção do peso desvalorizado, com a emissão de pesos por parte do Banco Central para

comprar dólares.

Em termos fiscais, após o fim do regime de currency board, os resultados do governo têm

sua trajetória alterada, com a obtenção de crescentes superávits, impulsionados pela forte

expansão da arrecadação fiscal, que aumentou 42% em termos reais entre 2002 e 2005, atingindo

$143,8 bilhões neste último ano38. Tal melhora pode ser atribuída ao forte crescimento da

atividade econômica a partir de 2003. Os gastos públicos, porém, também se expandiram no

38 Cálculo próprio a partir de dados da Secretaría de Hacienda e MECON.

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88

período, com aumento real de 10,5% 39, apesar da redução das despesas com juros provocada pela

moratória.

No início de 2005 chega ao fim a renegociação da dívida externa, em moratória desde o

final de 2001, tendo a adesão de 76% dos credores, que aceitaram deságios de até 75% do valor

que teriam a receber, com a média de desconto sobre o valor devido tendo ficado em cerca de

65%, considerando os juros. Com isso, a dívida pública externa, que era de US$ 115,9 bilhões

em 2004, passou para US$ 65,4 bilhões em 2005, como é possível ver na tabela 22.

5.3 Resultados econômicos

O regime de currency board permitiu um forte crescimento econômico nos primeiros

anos após sua implementação, como é possível ver no gráfico 22, que apresenta os dados da

evolução do PIB trimestralmente a partir de 1994, uma vez que os dados de anos anteriores

somente estavam disponíveis em percentual ao ano, tendo sido de -1,84% em 1990, 10,58% em

1991, 9,61% em 1992, e 5,72% em 1993 40.

39 Idem. 40 De acordo com dados do INDEC.

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Gráfico 22 – PIB – Trimestral *

-18,0%

-14,0%

-10,0%

-6,0%

-2,0%

2,0%

6,0%

10,0%

14,0%1º

T 1

994

1º T

199

5

1º T

199

6

1º T

199

7

1º T

199

8

1º T

199

9

1º T

200

0

1º T

200

1

1º T

200

2

1º T

200

3

1º T

200

4

1º T

200

5

Fonte: MECON* Variação e m relação a igual trimestre do ano anterior.

O crescimento econômico até meados dos anos 90 foi impulsionado pelo cenário

internacional de farta liquidez e baixa taxa de juros, como já discutido, que permitiu o

financiamento externo dos déficits públicos e dos saldos negativos em transações correntes,

assim como possibilitou um aumento da liquidez da economia, permitindo uma maior

flexibilidade da política monetária. O amplo programa de privatização implementado neste

período também contribuiu para o fluxo de divisas que inundou o país neste período.

Convém destacar o efeito da estabilização sobre a base monetária (ver gráfico 23), que

cresceu significativamente nos primeiros anos do plano. A partir de 1995, no entanto, este

crescimento cessa, em grande parte devido à crescente substituição da moeda e dolarização da

economia, apesar dos baixos níveis de inflação. O processo de dolarização era ainda estimulado

pela autorização dos bancos em prover a população com quaisquer das duas moedas, e pode ser

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verificado através da parcela dos depósitos em dólar nos bancos, que em janeiro de 1994 (último

dado disponível)41 era de 46% e em dezembro de 2001 atingiu 71%.

Gráfico 23 – Base Monetária – Nominal – R$ milhões

-

10.000

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: BCRA

Como já discutido na seção anterior, a partir de 1997 o país é atingido por sucessivas

crises externas, que acabaram comprometendo seu desempenho econômico, ao retraírem o

acesso ao financiamento externo, o que era especialmente crítico para um país altamente

endividado em moeda estrangeira e sob um regime monetário rígido. Em 2001 o país não resiste

e é obrigado a abandonar o regime de currency board, mergulhando a economia em uma crise

que fez seu PIB cair 10,9% em 2002, e a taxa de investimento se retrair 37% em termos reais

entre 1998 e 2002, como é possível ver na tabela 19.

41 De acordo com dados do Mecon, elaborado a partir de informações do BCRA.

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91

Tabela 19 – Taxa de Investimento

% PIB1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999

19,1% 19,9% 17,9% 18,1% 19,4% 19,9% 18,0%

2000 2001 2002 2003 2004 200516,2% 14,2% 12,0% 15,1% 19,2% 21,4%

Fonte: Cálculo próprio com base em dados do INDEC.

A partir de 2003 a economia inicia um processo de recuperação, calcada no crescimento

do consumo, que aumentou 26% em termos reais entre 2002 e 200542, e das exportações, que

cresceram 56% no mesmo período, diante de um cenário externo favorável, com o PIB mundial

variando 4,73% entre 2003 e 2005, e a taxa libor média em dólares ficando em 2,3% a.a. no

mesmo período 43.

Em termos inflacionários, o regime de currency board permitiu que a inflação

permanecesse controlada até 2001, com uma média de 2,7%a.a. entre 1992 e 2001. No entanto, a

desvalorização da moeda no momento da troca de regimes cambiais fez com que a inflação

atingisse 30% no primeiro semestre de 200244, refletindo o aumento dos custos. A partir do

segundo semestre deste ano o nível de preços volta a cair, ficando, porém, em níveis mais altos

do que os observados antes da crise (ver tabela 16), tendo sido puxado principalmente pelos

preços dos setores produtores de bens, que sofreram aumento de 126% entre 2001 e 2005 por

42 Segundo dados do INDEC. 43 Dados do Banco Central do Brasil. 44 De acordo com dados do INDEC.

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92

serem mais influenciados pelo câmbio, enquanto o setor de serviços aumentou seus preços em

41% no mesmo período45.

Como é possível verificar na tabela 16, a inflação vem indicando uma tendência de alta

desde 2003. No entanto, com receio de adotar uma política monetária contracionista que viesse a

comprometer o crescimento econômico, o governo vem buscando conter a inflação através de

medidas não monetárias, como acordos com a indústria para evitar remarcações de preços,

enquanto mantêm os juros baixos – a média da taxa de juros real ficou em 2,7% a.a. entre 2003 e

2005.

O mercado de crédito, por sua vez, como pode ser visto no gráfico 24, cresceu até 2001,

estimulado pelas baixas taxas de juros, pelo fluxo de capitais estrangeiros e pelo crescimento da

atividade econômica. Entre 2001 e final de 2003, no entanto, o crédito se retrai, devido à crise

vivida pelo país e conseqüente aumento da taxa de juros. A partir de 2003, porém, o mercado de

crédito volta a se recuperar, estimulado pelo crescimento econômico e baixas taxas de juros.

45 Dados do MECON com base nos preços implícitos no PIB.

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93

Gráfico 24 – Empréstimos de Entidades Financeiras * – R$ milhões

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

70.000

80.000

90.000

1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Fonte: Mecon* Nominal

Em termos de dívida pública, convém destacar a trajetória de crescimento observada

desde a implantação do Plano de Conversibilidade, como resultado dos sucessivos déficits

públicos ocorridos no período, conforme pode ser visto na tabela 20. Com isso, esta dívida, que

em 1992 representava cerca de 28% do PIB, chegou a 54% em 2001.

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94

Tabela 20 – Dívida Pública/ PIB

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

27,9% 30,1% 31,8% 34,4% 36,4% 35,4% 38,2%

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

43,5% 45,7% 53,7% 149,9% 137,9% 124,9% 70,2%

Fonte: Cálculo próprio a partir de dados do MECON e BCRA

Com o overshooting que se seguiu à flutuação do câmbio em 2001 e a queda do PIB com

a retração da economia, a dívida pública atingiu níveis insustentáveis, passando a representar

cerca de 150% do PIB em 2002, uma vez que 72% desta dívida estava atrelada ao dólar e 19% ao

euro46, em 2001. Com a moratória no final de 2001 e a renegociação da dívida em default em

2004, a relação dívida pública/ PIB cai para cerca de 70% em 2005.

Em termos de comércio exterior, a manutenção da moeda artificialmente valorizada sob o

regime de currency board fez com que a balança comercial, que, ao longo da década de 1980

apresentou superávits, ficasse deficitária na maior parte da década seguinte, como é possível ver

nas tabelas 21 e 22, diante de um crescimento de 89% das exportações entre 1990 e 1999,

enquanto as importações deram um salto de 208% no mesmo período47.

Somente em 1991 e 1992 as importações aumentaram 100% e 80% respectivamente,

tendo chegado a US$13,8 bilhões neste último ano, o que acabou por transformar um superávit

comercial de US$8,6 bilhões em 1990 em um déficit de US$4,1 bilhões em 199448. O

46 Segundo boletim fiscal publicado pelo MECON. 47 De acordo com dados do INDEC. 48 De acordo com dados do INDEC.

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crescimento das importações foi puxado principalmente pelas compras de bens de capital, que

apresentaram crescimento de 325% entre 1991 a 1994.

Essa explosão das importações foi provocada não só pelo câmbio favorável, como

também pelo rápido crescimento da economia nos primeiros anos após a implantação do Plano

de Conversibilidade, e pela grande quantidade de capitais que inundou a economia argentina

neste período, além da maior abertura comercial, que pode ser exemplificada pelo acordo

firmado com o Mercosul, no qual diversos produtos negociados entre os países participantes

passaram a ter tarifas de importação zero a partir de 199549.

A partir de 2001, com a adoção do câmbio flutuante e o processo de desvalorização

cambial, a balança comercial melhora seu desempenho. A recessão econômica contribuiu para a

queda de 65% das importações entre 2000 e 2002, refletida na forte retração do segmento de

bens de capital e bens intermediários, cujas importações caíram 61%50, enquanto as exportações

permaneceram relativamente inalteradas no mesmo período, o que possibilitou a existência de

substanciosos superávits comerciais. Com a recuperação da economia a partir de 2003, no

entanto, a balança comercial começa a ter seus superávits reduzidos, com a expansão de 222%

das importações entre 2002 e 2005, contra um crescimento de 56% das exportações no mesmo

período, apesar do estímulo dado pela política de manutenção do câmbio desvalorizado.

49 As importações do Mercosul representavam cerca de 27% do total importado na média de 1995 a 2000, segundo dados do INDEC. 50 De acordo com dados do INDEC.

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Tabela 21 – Indicadores do Setor Externo – 1992/ 1998

(em US$ milhões)

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Transações Correntes -5.548 -8.206 -10.979 -5.118 -6.769 -12.137 -14.482Balança Comercial -1.396 -2.364 -4.139 2.357 1.760 -2.123 -3.097Serviços -2.557 -3.326 -3.779 -3.436 -3.547 -4.385 -4.444Rendas -2.384 -3.069 -3.559 -4.636 -5.464 -6.144 -7.405Transf. Unilaterais 789 552 497 597 482 515 464

Reservas Internacionais 10.200 14.002 14.551 14.515 18.325 22.338 24.769

Dívida Externa * ND ND 87.524 101.462 114.423 129.964 147.634 Dívida Pública Externa ND ND 61.268 67.192 74.113 74.912 83.111

Fonte: INDEC/ MECON

* Em 2001 há mudança de metodologia, com o saldo total sendo alterado de US$149 milhões para US$166 milhões

Tabela 22 – Indicadores do Setor Externo – 1999/ 2005

(em US$ milhões)

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Transações Correntes -11.944 -8.981 -3.291 8.668 7.982 3.278 5.407Balança Comercial -795 2.452 7.385 17.178 16.805 13.239 12.714Serviços -4.111 -4.284 -3.863 -1.589 -1.397 -1.666 -1.666Rendas -7.491 -7.548 -7.237 -7.484 -7.970 -8.922 -6.312Transf. Unilaterais 453 399 424 564 545 627 671

Reservas Internacionais 26.268 25.148 14.553 10.490 14.154 18.981 27.281

Dívida Externa * 152.563 155.015 166.272 156.748 164.918 171.115 117.209 Dívida Pública Externa 84.750 84.936 87.907 91.247 105.895 115.884 65.355

Fonte: INDEC/ MECON

* Em 2001 há mudança de metodologia, com o saldo total sendo alterado de US$149 milhões para US$166 milhões

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A conta de rendas, por sua vez, apresentou déficits crescentes e significativos no período

analisado, puxados pelo aumento das despesas com juros devido ao forte crescimento da dívida

externa, e às remessas de lucros e dividendos ao exterior como conseqüência principalmente do

processo de privatização ocorrido na primeira metade da década de 1990, no qual o capital

estrangeiro teve forte participação.

Como resultado destes movimentos, o saldo de transações correntes foi deficitário ao

longo de toda a vigência do regime de currency board, tendo passado a produzir superávits

apenas com a reversão dos déficits comerciais, em 2002. Estes déficits foram financiados através

de endividamento externo, como é possível constatar nas tabelas 21 e 22.

A trajetória da dívida externa, por sua vez, mostra que esta veio crescendo desde 1994 até

2000 (ver tabelas 21 e 22), estimulada pelo bom cenário externo, que fazia com que, tanto o

governo quanto a iniciativa privada se financiassem através de capitais externos. Como é

possível observar neste mesmo quadro, em 2005 a dívida pública externa cai 44%, o que foi

causado pela renegociação da dívida em moratória desde o final de 2001, conforme já discutido.

Desde a crise econômica de 2001, o país vem sofrendo ainda com a falta de investimentos

estrangeiros diretos, devido à desconfiança dos investidores em relação às políticas econômicas

adotadas pelo país. As políticas atuais de contenção de preços através de congelamentos e

pressão governamental para evitar reajustes acabam por inibir ainda mais estes investimentos.

Como conseqüência, de 2001 a 2005, a Argentina ficou com apenas 5% do total dos

investimentos diretos externos (IED) destinados à América Latina e Caribe, enquanto o Brasil

ficou com 28% deste total 51.

51 Segundo dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe. Para mais detalhes ver CEPAL (2006)

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As reservas internacionais, por sua vez, vieram apresentando crescimento desde a

implantação do Plano de Conversibilidade, possibilitado pelo cenário externo de grande liquidez.

A crise de 2001, no entanto, provoca forte retração destas reservas devido ao ambiente de

incerteza interna e a ocorrência de saldos negativos no balanço de pagamentos, o que fez com

que o estoque de divisas caísse de US$25,4 bilhões em fevereiro de 2001 para US$14,6 bilhões

em dezembro deste ano, às vésperas do abandono do regime de câmbio fixo, e para US$9,0

bilhões em julho de 2002, quando atingiu seu nível mínimo. No entanto, a partir de 2002, com a

retomada do crescimento econômico, e puxadas pelos superávits na balança comercial, as

reservas começam a se recompor.

Tabela 23 – Indicadores de Vulnerabilidade Externa

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998Dívida Externa/ PIB ND ND 34,0% 39,3% 42,0% 44,4% 49,4%Dívida Externa/ Exportações ND ND 5,46 4,79 4,76 4,92 5,59Balança Comercial/ PIB -0,6% -1,0% -1,6% 0,9% 0,6% -0,7% -1,0%Transações Correntes/ PIB -2,4% -3,5% -4,3% -2,0% -2,5% -4,1% -4,8%

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005Dívida Externa/ PIB 53,8% 54,5% 61,8% 153,6% 127,3% 111,7% 63,9%Dívida Externa/ Exportações 6,55 5,88 6,26 6,11 5,51 4,95 2,92Balança Comercial/ PIB -0,3% 0,9% 2,7% 16,8% 13,0% 8,6% 6,9%Transações Correntes/ PIB -4,2% -3,2% -1,2% 8,5% 6,2% 2,1% 2,9%Fonte: INDEC e MECON

Analisando os índices de vulnerabilidade externa através da tabela 23, verifica-se que o

forte crescimento da dívida externa fez com que sua participação no PIB aumentasse de 34% em

1994 para 62% em 2001 e para 154% no ano seguinte. Neste último ano, o aumento foi causado

pelo efeito estatístico da queda do PIB, causada pela maxidesvalorização da moeda ocorrida

neste ano. Em 2005 esta relação cai drasticamente com o fim da renegociação da moratória

decretada em 2001.

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É possível verificar ainda a piora na capacidade de pagamento desta dívida, medida pela

sua proporção em relação à geração de divisas por meio de exportações, mesmo com o aumento

desta última durante todo o período analisado, relação que só passa a melhorar a partir de 2003,

com a queda da dívida devido à referida renegociação. Outros indicadores da vulnerabilidade do

país, a proporção do saldo da balança comercial e da conta corrente em relação ao PIB, mostram

que somente houve melhora a partir de 2002, devido principalmente ao câmbio desvalorizado,

que permitiu a melhora na balança comercial.

As políticas adotadas pela Argentina durante o regime de currency board, portanto, se

mostraram insustentáveis, ao aumentar a vulnerabilidade externa do país e retirar a flexibilidade

da economia para enfrentar crises externas. Com o abandono do regime, no entanto, as políticas

que passaram a ser adotadas também ainda não são suficientes para promover um crescimento

sustentável da economia, uma vez que os gastos públicos continuam a aumentar e a inflação

acena para um risco de nova aceleração, com o governo se mostrando incapaz de controlá-la.

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100

6 ANÁLISE COMPARATIVA: BRASIL E ARGENTINA

Com base nas políticas econômicas adotadas por Brasil e Argentina desde seus planos de

estabilização, é agora apresentada uma análise comparativa em termos de resultados alcançados

e perspectivas para estas duas economias.

É importante destacar que o Brasil apresentou políticas econômicas distintas nas duas

fases que caracterizaram o Plano Real, tendo, com isso, obtido resultados macroeconômicos

diferentes também. Na primeira fase, caracterizada por taxas de juros altas, abertura comercial,

política fiscal expansionista e âncora cambial, baseada em uma taxa de câmbio valorizada, que

foi o principal instrumento utilizado para controlar a inflação, o país teve como resultados a

deterioração de suas contas externas, com o fraco desempenho da balança comercial e da conta

de rendas, além do aumento da dívida externa e da dívida pública.

Ao produzirem tais desequilíbrios e aumentarem a vulnerabilidade externa do país, estas

políticas econômicas se mostraram insustentáveis, o que fez com que, em 1999, o país sofresse

um ataque especulativo e passasse a adotar um regime de câmbio flutuante, no que ficou

caracterizado como o início da segunda fase do Plano Real. Nesta fase, o governo também

passou a implementar um ajuste fiscal e a adotar uma política de metas inflacionárias, utilizando

como principal instrumento para atingi-las, as altas taxas de juros.

Com esta alteração das políticas econômicas, na segunda fase do Plano Real a inflação

passa a apresentar maior volatilidade devido à adoção do câmbio flutuante, enquanto a relação

dívida pública/ PIB tem seu ritmo de crescimento reduzido, e o país reverte seus déficits

comerciais e de transações correntes, tendo o crescimento das exportações sido o grande motor

desta melhora, puxada pelo câmbio desvalorizado e o cenário externo favorável. Como

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conseqüência da política de juros altos combinada com um ajuste fiscal baseado em aumento de

carga tributária, a economia apresenta crescimento econômico menor nesta segunda fase.

À luz do quadro 2, portanto, é possível comparar as duas economias em termos dos

resultados produzidos pelas po líticas econômicas adotadas:

Quadro 2a – Quadro Comparativo – Indicadores Macroeconômicos (1994-99)

1994 1995 1996 1997 1998 1999

BRASIL

PIB (var. a.a.) 5,9% 4,2% 2,7% 3,3% 0,1% 0,8%Inflação (%a.a.) 916,5% 22,4% 9,6% 5,2% 1,7% 8,9%Taxa de Juros Real (%a.a.) 10,8% * 30,7% 17,8% 19,6% 27,1% 16,6%Taxa de Investimento (% PIB) 20,8% 20,5% 19,3% 19,9% 19,7% 18,9%Arrecadação Tributária (% PIB) 29,5% 29,7% 29,0% 29,0% 29,9% 32,2%Result. Fiscal Primário/ PIB 5,2% 0,3% -0,1% -1,0% 0,0% 3,2%Dívida Pública/ PIB 32,5% 31,1% 30,1% 33,4% 37,8% 50,4%Dívida Externa/ PIB 27,1% 22,6% 23,2% 24,8% 30,7% 45,0%Dívida Externa/ Exportações 3,4 3,4 3,8 3,8 4,7 5,0 Transações Correntes/ PIB -0,3% -2,6% -3,0% -3,8% -4,2% -4,7%Reservas Internac. (US$ milhões) 38.806 51.840 60.110 52.173 44.556 36.342

ARGENTINA

PIB (var. a.a.) 5,8% -2,9% 5,5% 8,1% 3,9% -3,4%Inflação (%a.a.) 3,7% 1,7% 0,0% 0,4% 0,6% -1,9%Taxa de Juros Real (%a.a.) 4,0% 7,8% 6,2% 6,2% 6,2% 8,9%Taxa de Investimento (% PIB) 19,9% 17,9% 18,1% 19,4% 19,9% 18,0%Arrecadação Tributária (% PIB) 21,9% 20,7% 20,0% 20,8% 21,2% 21,4%Result. Fiscal Primário1/ PIB 1,2% 0,7% -0,8% 0,5% 0,9% 1,2%Dívida Pública/ PIB 31,8% 34,4% 36,4% 35,4% 38,2% 43,5%Dívida Externa/ PIB 34,0% 39,3% 42,0% 44,4% 49,4% 53,8%Dívida Externa/ Exportações 5,5 4,8 4,8 4,9 5,5 6,5 Transações Correntes/ PIB -4,3% -2,0% -2,5% -4,1% -4,8% -4,2%Reservas Internac. (US$ milhões) 14.551 14.515 18.325 22.338 24.769 26.268

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Quadro 2b – Quadro Comparativo – Indicadores Macroeconômicos (2000-05)

2000 2001 2002 2003 2004 2005

BRASIL

PIB (var. a.a.) 4,4% 1,3% 1,9% 0,5% 4,9% 2,3%Inflação (%a.a.) 6,0% 7,7% 12,5% 9,3% 7,6% 5,7%Taxa de Juros Real (%a.a.) 11,5% 9,6% 6,6% 14,0% 8,6% 13,4%Taxa de Investimento (% PIB) 19,3% 19,5% 18,3% 17,8% 19,6% 19,9%Arrecadação Tributária (% PIB) 33,0% 33,8% 35,5% 34,9% 35,9% 37,4%Result. Fiscal Primário/ PIB 3,5% 3,6% 3,9% 4,3% 4,6% 4,8%Dívida Pública/ PIB 49,6% 52,0% 57,3% 56,6% 54,9% 51,2%Dívida Externa/ PIB 39,2% 44,3% 49,4% 46,6% 36,5% 23,6%Dívida Externa/ Exportações 4,3 3,9 3,8 3,2 2,3 1,6 Transações Correntes/ PIB -4,0% -4,6% -1,7% 0,8% 1,9% 1,8%Reservas Internac. (US$ milhões) 33.011 35.866 37.823 49.296 52.935 53.799

ARGENTINA

PIB (var. a.a.) -0,8% -4,4% -10,9% 8,8% 9,0% 9,2%Inflação (%a.a.) -0,8% -1,4% 40,9% 3,5% 6,1% 12,3%Taxa de Juros Real (%a.a.) 9,0% 26,3% 0,4% 0,2% -4,1% -8,2%Taxa de Investimento (% PIB) 16,2% 14,2% 12,0% 15,1% 19,2% 21,4%Arrecadação Tributária (% PIB) 21,7% 21,1% 20,3% 23,8% 26,7% 27,0%Result. Fiscal Primário1/ PIB 1,0% 0,5% 0,7% 2,3% 3,9% 3,7%Dívida Pública/ PIB 45,7% 53,7% 149,9% 137,9% 124,9% 70,2%Dívida Externa/ PIB 54,5% 61,8% 153,6% 127,3% 111,7% 63,9%Dívida Externa/ Exportações 5,9 6,3 6,1 5,5 5,0 2,9 Transações Correntes/ PIB -3,2% -1,2% 8,5% 6,2% 2,1% 2,9%Reservas Internac. (US$ milhões) 25.148 14.553 10.490 14.154 18.981 27.281

Fontes: Banco Central do Brasil, IBGE, IPEAData, IFS/ FMI, INDEC, MECON

* Taxa média mensal a partir de ago/1994, após a implantação do Plano Real.1 Cálculo próprio com base em dados da Secretaría de Hacienda.

Através do quadro comparativo, é possível verificar que o desempenho do PIB brasileiro

diminuiu com a alteração nas políticas econômicas a partir de 1999, quando o país viveu uma

crise cambial, enquanto a Argentina, após a retração ocorrida entre 1999 e 2002, quando o país é

atingido pela crise brasileira e em seguida abandona seu regime de currency board, volta a

apresentar acelerado crescimento nos últimos três anos.

Pelo quadro é possível verificar ainda que, enquanto a inflação brasileira parece ter se

estabilizado em um dígito – com exceção de 2002, ano de crise, quando a inflação atingiu

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12,5%a.a. –, a inflação argentina tem dado sinais de aceleração nos últimos anos. O que torna a

situação do país ainda mais preocupante é que, diante desse cenário de pressão inflacionária, a

estratégia utilizada pelo governo tem sido a de impedir reajustes de preços através de

congelamentos e pressões governamentais, que já se mostrou incapaz de evitar processos

inflacionários na história recente de diversos países – Argentina e Brasil inclusive –, aumentando

o risco de uma nova aceleração da inflação, já que os preços defasados terão que ser corrigidos

em algum momento no futuro.

Quando se comparam as taxas de juros reais, fica clara a política argentina de manter suas

taxas em níveis baixos (em 2004 e 2005, inclusive ficaram negativas) a partir de 2001 para

estimular a atividade econômica, o que tem, no entanto, contribuído para aumentar a pressão

inflacionária. O forte aumento dessas taxas em 2001 se deveu à crise que o país vivia e à

necessidade de se tentar conter a fuga de capitais. O Brasil, porém, com exceção do ano de 2001,

apresentou taxas de juros reais mais altas que a Argentina durante todo o período que vai de

1994 a 2005, uma vez que, ao longo do Plano Real, o país adotou política de juros altos, na

primeira fase para atrair capitais estrangeiros e fechar suas contas externas principalmente, e na

segunda, como instrumento de controle da inflação.

O quadro 2 destaca ainda um dos pontos mais críticos das políticas adotadas por Brasil e

Argentina: suas taxas de investimento em níveis baixos. Enquanto no Brasil estas taxas se

alteraram pouco, tendo ficado em média em 19,4% do PIB entre 1994 e 200552, na Argentina,

após terem caído fortemente em 2001 e 2002 – ficando em 14,2% e 12% do PIB respectivamente

–, estas vêm se recuperando desde então, tendo fechado em 21,4% do PIB em 2005 53. No

entanto, em ambos os casos, estas taxas ainda são muito baixas para garantir um crescimento

52 De acordo com dados do IBGE. 53 Cálculo próprio, de acordo com dados do INDEC.

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sustentável da economia, sendo que, especialmente no caso da Argentina, que vem apresentando

crescimento econômico acelerado, o baixo nível de investimento é um fator a contribuir para a

pressão inflacionária, uma vez que o país tem crescido calcado principalmente na utilização da

capacidade ociosa da indústria – que foi de 48% em janeiro de 2002 para 69% em dezembro de

200554 –, levando à necessidade de novos investimentos no aumento desta capacidade, sob risco

da indústria não ser capaz de expandir a oferta diante de uma demanda aquecida.

Em termos fiscais, cabe destacar que, apesar de ambos os países terem se baseado em

aumento da tributação para melhorar seus resultados, a carga tributária brasileira é bem maior do

que a argentina, tendo alcançado 37,4% do PIB em 2005, enquanto na Argentina, esta carga

ficou em 27,2% no mesmo ano. Auxiliado por esta alta carga tributária, o Brasil vem

apresentando desde 1999 superávits fiscais primários, como conseqüência também do ajuste

fiscal que vem sendo implementado, enquanto a Argentina apresenta melhora em seus resultados

fiscais a partir de 2002, puxada pela queda nos gastos com juros, esta, por sua vez, provocada

pela moratória da dívida pública externa.

Em relação à dívida pública como percentual do PIB, esta deu um salto em 1999, no caso

do Brasil, devido à maxidesvalorização ocorrida neste ano, tendo reduzido seu ritmo de

crescimento desde então, e até caído em alguns anos, com as medidas de austeridade fiscal que

vêm sendo adotadas, com exceção dos anos de 2002 e 2003, quando esta relação dá um salto

para 57,3% e 56,6% respectivamente, devido ao forte aumento dos juros nestes anos. Enquanto

isso, a Argentina, que tinha uma relação dívida pública/ PIB semelhante à brasileira até 2001, vê

esta relação explodir para 149,9% a partir de 2002, após a forte desvalorização da sua moeda.

Em 2004 esta relação novamente despenca, para 70,2%, com o fim da renegociação da dívida em

moratória, porém, ainda permanecendo em um nível mais alto do que o registrado no Brasil. 54 De acordo com dados do INDEC.

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Em termos de endividamento externo, no entanto, os dois países possuem indicadores

bastante distintos, com o Brasil apresentando um endividamento mais baixo se comparado ao da

Argentina, que aumentou muito sua vulnerabilidade externa devido ao alto endividamento ao

longo do período de vigência do currency board, conforme já discutido. Esta relação dívida

externa/ PIB cai drasticamente em 2005 devido à renegociação da dívida em moratória, porém,

permanecendo ainda quase o triplo da relação existente no Brasil, o que mostra a maior

vulnerabilidade da Argentina a choques externos em comparação com o Brasil.

A relação dívida externa/ exportações é outro indicador a mostrar a maior vulnerabilidade

externa da Argentina, dado que esta relação sempre esteve mais alta do que a apresentada pelo

Brasil. Vale destacar a queda na vulnerabilidade dos dois países em 2005, puxada principalmente

pela redução de suas dívidas externas. O indicador transações correntes/ PIB, por sua vez, mostra

que ambos os país vinham apresentando déficits em conta corrente até 2001, quando,

estimulados pelo aumento de suas exportações, passam a apresentar melhora neste indicador.

No quadro é possível verificar ainda que o Brasil possui um estoque de divisas

significativamente maior do que a Argentina, com este tendo vindo se recompondo desde a crise

de 1999, que o fez cair a US$33 bilhões em 2000. A Argentina, por sua vez, sofreu uma forte

queda em suas reservas em 2002, quando estas caíram para US$10,5 bilhões, porém, vem

apresentando recomposição destas, principalmente com a política de compra de dólares pelo

Banco Central para manter o peso desvalorizado. No entanto, mesmo com essa política, o nível

de reservas do país ainda era a metade do brasileiro em 2005.

Com base na análise destes indicadores, conclui-se que as políticas econômicas adotadas

pela Argentina resultaram em um país mais vulnerável externamente do que o Brasil, mesmo

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após o abandono do regime de currency board, que foi o maior responsável pelo aumento dessa

vulnerabilidade.

Apesar de os dois países se basearem em âncoras cambiais durante os primeiros anos de

seus planos de estabilização, o regime brasileiro era menos rígido em termos monetários e

cambiais, o que permitiu que a economia brasileira não se fragilizasse tanto quanto a argentina,

ao dispor de mais instrumentos para responder às crises externas dos anos 90 . Além disso, as

políticas econômicas que vêm sendo adotadas pelo Brasil, principalmente no que se refere ao

ajuste fiscal, tem maiores chances de serem bem sucedidas no objetivo de promover um

crescimento econômico de longo prazo 55. No entanto, caso a qualidade deste ajuste não seja

melhorada, ou seja, caso não haja um corte nos gastos públicos com custeio, a obtenção de

superávits primários nos próximos anos ficará comprometida, assim como o próprio ajuste, uma

vez que o aumento da carga tributária tem um limite tolerado pela sociedade.

A Argentina, por outro lado, ainda não conseguiu implementar um ajuste fiscal, apesar de

ter melhorado seus resultados fiscais nos dois últimos anos, puxados principalmente pela queda

nos gastos com juros devido à moratória. O país, porém, possui como vantagem sobre o Brasil na

questão fiscal, a realização de uma reforma previdenciária que criou um sistema privado de

capitalização e possibilitou a redução dos gastos previdenciários em termos reais 56, em 24%

entre 1999 e 2005, enquanto no Brasil estas despesas cresceram 76% acima da inflação no

mesmo período 57, aumentando sua participação no PIB de 6,0% para 7,5%.

55 Em relação a esta discussão é importante destacar que um dos pré-requisitos para garantir um crescimento sustentável é a implementação de um ajuste fiscal de longo prazo, que deverá reduzir a vulnerabilidade do país e evitar nova aceleração inflacionária. Este ajuste deve ser de boa qualidade, se baseando no corte de despesas com o custeio da máquina administrativa e otimização dos gastos públicos, e na redução da carga tributária para estimular a atividade econômica. 56 Cálculo próprio, com base em dados do INDEC e Secretaría de Hacienda/ MECON. 57 Cálculo próprio, com base em dados do IPEAData e Secretaria do Tesouro Nacional.

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A falta desse ajuste fiscal na Argentina que permita o equilíbrio das contas públicas,

continua a dificultar a melhora dos fundamentos macroeconômicos do país. O governo não acena

com um comprometimento com metas para a melhoria das contas fiscais, o que deve fazer com

que a dívida pública volte a aumentar como proporção do PIB, após a redução ocorrida com a

renegociação da dívida pública externa em 2004.

As perspectivas para o Brasil em relação à questão fiscal, porém, não são boas, a

continuarem as características do ajuste que vem sendo feito, baseado em aumento da carga

tributária, que já se encontra próxima ao limite do tolerável pela sociedade, e aumento dos gastos

públicos, o que leva a uma expectativa de queda nos superávits fiscais. Com isso, a trajetória de

queda dos juros se reverteria devido ao aumento do risco percebido em relação ao país, inibindo

os investimentos e comprometendo o crescimento da economia.

Por outro lado, a valorização recente da moeda brasileira lança a discussão acerca de suas

conseqüências sobre a balança comercial, cujo desempenho deve piorar, com o desestímulo às

exportações e estímulo às importações. Além disso, esta sobrevalorização da moeda também

contribui para inibir investimentos, ao tornar os importados mais competitivos, retraindo a

produção nacional. No entanto, o país deve passar por um processo de desvalorização no médio

prazo, uma vez que não se espera que as condições externas favoráveis permaneçam nos

próximos anos. O bom crescimento econômico mundial deve arrefecer, levando a uma queda nos

preços das commodities vendidas pelo Brasil, prejudicando sua balança comercial e levando a

uma desvalorização do câmbio.

As políticas adotadas por ambos os países, adicionalmente, têm se mostrado incapazes de

estimular os investimentos, pré-condição para um crescimento econômico sustentável. Mesmo a

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economia argentina, que vem apresentando um crescimento nesta taxa, deve apresentar um freio

neste aumento caso prossiga com seu processo de aceleração inflacionária.

Em resumo, o Brasil vem adotando políticas distintas das da Argentina, e que, com base

nos resultados obtid os, têm se mostrado mais corretas, com taxas de juros reais altas e câmbio

valorizado, buscando controlar a demanda e conter a inflação, além da implementação de um

ajuste fiscal. A continuar com estas políticas, e mesmo com a redução gradual das taxas de juros

que vem ocorrendo, o país não deve apresentar risco de uma aceleração inflacionária, inclusive

devido à importância dada ao controle desta através do estabelecimento de metas para a inflação.

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7 CONCLUSÃO

Este trabalho buscou apresentar as diferenças entre as políticas econômicas adotadas por

Brasil e Argentina após seus planos de estabilização e os resultados que estas produziram ao

longo dos anos, buscando identificar quais seriam as melhores políticas a serem adotadas na

busca de um crescimento econômico de longo prazo.

O Brasil, que no início do Plano Real se baseou em políticas de juros altos, abertura

comercial, política fiscal expansionista e âncora cambial, produziu como resultados a

deterioração de suas contas externas e o aumento da dívida externa e da dívida pública. Com a

alteração de suas políticas econômicas a partir de 1999, estas passaram a se basear em um regime

de câmbio flutuante, implementação de um ajuste fiscal e adoção de metas inflacionárias.

A economia argentina, por sua vez, durante o Plano de Conversibilidade, foi

caracterizada pela pouca preocupação com a questão fiscal e por uma política monetária com

pouca flexibilidade para responder a choques externos, com a adoção do regime de currency

board, além de ter tornado o país mais dependente do setor externo, com a liquidez interna

dependendo da entrada e saída de divisas, fazendo com que este fluxo tivesse forte impacto no

desempenho econômico do país, ao influenciar a demanda e o mercado de crédito.

O forte financiamento externo contribuiu ainda mais para aumentar a vulnerabilidade do

país, uma vez que havia muita liquidez internacional nos primeiros anos de implantação do

plano. Enquanto este fluxo de capitais estrangeiros esteve favorável, o país conseguiu crescer e

não apresentou problemas de sustentabilidade de seu regime, porém, quando este cenário se

reverte, a partir do final dos anos 90, o país não consegue sustentar o regime de currency board,

e este é abandonado no início de 2002.

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As políticas adotadas por estes países, apesar de possuírem alguma semelhança durante

os primeiros anos da estabilização, passam a se diferenciar a partir de 1999, quando o Brasil

muda o rumo de suas políticas, que vinham se mostrando insustentáveis, enquanto a Argentina

mantém as suas, mesmo após o abandono do regime de currency board.

Após análise comparativa dos principais resultados produzidos pelas políticas

econômicas dos dois países, conclui-se que as políticas adotadas pelo Brasil possuem maiores

chances de promover um crescimento de longo prazo, principalmente devido ao ajuste fiscal que

o governo vem buscando implementar nos últimos anos, através do estabelecimento de metas

para o superávit primário, enquanto a Argentina, apesar da melhora de seus resultados fiscais,

não parece buscar um compromisso formal de melhoria das contas públicas, o que pode

comprometer a continuidade desses resultados.

Apesar disso, o ajuste fiscal que o Brasil vem promovendo tem se baseado em aumento

tanto da carga tributária quanto dos gastos, o que caracteriza um ajuste de má qualidade. Caso a

qualidade deste ajuste não melhore, o risco é de que tal ajuste se torne inviável, uma vez que há

um limite tolerável pela sociedade para o aumento da carga tributária, enquanto este limite não

existe para o aumento dos gastos públicos.

Outra vantagem da política econômica brasileira sobre a argentina se refere à estabilidade

de preços. O Brasil, através de um regime de metas de inflação, tem mostrado comprometimento

com o cumprimento dessas metas, e a inflação tem se mostrado controlada nos últimos anos,

enquanto na Argentina tem havido um aumento da pressão inflacionária, que vem se acentuando

desde 2005, e que em 2006 parece ganhar ainda mais força com as políticas adotadas pelo país

visando a estimular o crescimento, com taxas de juros reais baixas, câmbio artificialmente

desvalorizado – cuja política de intervenção pressiona a base monetária – e aumento dos gastos

públicos, em detrimento do controle inflacionário, que vem sendo tratado com medidas não

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monetárias. Portanto, apesar das políticas adotadas estarem possibilitando um crescimento

econômico acelerado do país, impulsionado ainda pela recuperação em relação à forte crise

vivida em 2001 e 2002, a iminência de uma aceleração inflacionária pode provocar queda na

renda real da população e retração do crescimento econômico.

Cabe destacar ainda, que nenhum dos dois países tem se mostrado capaz de elevar as

taxas de investimento a níveis suficientes para que estas garantam um crescimento sustentável da

economia, uma vez que estas taxas permanecem na ordem de 20% ao longo dos últimos anos,

nível que tem se mostrado insuficiente para estimular a atividade industrial nestes países.

A principal questão que se coloca para estes dois países, portanto, é a necessidade de um

ajuste fiscal de qualidade, que permitirá a queda dos juros e a melhora dos fundamentos

macroeconômicos, sem o qual estes não conseguirão promover um crescimento sustentável e de

longo prazo, com o estímulo aos investimentos.

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