Brasileiro de Psicanálise. Hoje, segundo a psicanalista ... · de um mundo interno rico de...

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Notícias Carta do Editor Ano XI Nº 34 Rio de Janeiro Outubro 2007 Associação Brasileira de Psicanálise discurso de abertura do dr. Cláudio L. Eizirik, no nosso último Congresso Internacional, em Berlim, foi contundente: Zog nit keyn mol az du geyst dem letzten veg, Khotsh himlen blayene farshteln bloye teg; Kumen vet noch undzer oysgebenkte sho, S’ vet a poyk ton undzer trot – mir zaynen do! Nunca digas que este é o último caminho, Ainda que com chumbo se obscureça o céu azul, Pois nossa hora de heroísmo chegará, Ouve-se nossa marcha - estamos aqui! Era o hino dos “partizans”, cantado em iídiche, pela resistência alemã contra as forças nazistas. Em nosso congresso, as palavras do presidente trouxeram à Berlim de hoje a intensidade do que foi uma época que nenhum de nós deseja que se repita. A emoção evocativa daquele momento trágico da história do homem na Alemanha iluminada pelo Século das Luzes fez tremer nossos corações. Ele disse a seu tom: recordemos, para elaborar e não repetir. Descortinou-se assim, um encontro histórico entre psicanalistas, no qual se mesclou história, psicanálise, ética e análise de paradigmas, elaborando-se sentidos sobre os quais poderemos apoiar o nosso fazer futuro. Nosso congresso foi progressista na medida em que apoiou os ideais libertários que habitam o homem, retomando com mais vitalidade o vislumbre de uma praxis sem tantos preconceitos. Em 1922, aconteceu em Berlim o último congresso com a presença de Freud. Pouco depois, ele e sua família são obrigados a abandonar sua amada Viena, pela perseguição nazista. Hoje, mais uma vez, a psicanálise pode oficialmente ocupar espaço na Alemanha e lá celebrar o seu congresso. Éramos três mil congressistas, embalados por uma canção que uniu todos aqueles que acreditam na humanidade dos homens. Talvez, não seja exagero dizermos que a psicanálise, aquela que joga com a vida como os “partizans”o fizeram, também tenha no seu bojo a força que liberta o homem de suas amarras neuróticas, perversas e psicóticas. É verdade que, talvez, não possa fazê-lo sozinha, distanciada de outras ciências ou distanciada de um código de ética implícito, mas sozinhos também não estavam os “partizans” alemães. Berlim 2007 escutou novamente o hino dos “partizans”. Assim, assegurou uma psicanálise que não poderá mais silenciar o homem excluído ou submetido a qualquer tipo de discriminação, tendo assumido o lugar que sempre foi seu por direito, de compromisso com o verdadeiro sentido da palavra e do ser. Um abraço, boa leitura. Leonardo A. Francischelli Eleição na ABP: Rossi é pela continuidade Cláudio Rossi, da SBPSP, é can- didato à presidência da ABP na próxima eleição. Nesta entrevista, sintetizamos o que ele pensa em relação ao papel da entidade e o futuro da psicanálise no Brasil e na sua relação com outras insti- tuições internacionais. Para ele, a hora é de dar continuidade às políticas adotadas até o momento, visando ampliar cada vez mais a participação das federadas no desenvolvimento, na divulgação, na difusão e na defesa da Psicanálise como conhecimento e como profissão. Já a questão profissional o preocupa. “A Psicanálise, to- dos sabemos, necessita de grande investimento e dedicação em sua formação. Nossas instituições precisam trabalhar duro para conseguir formar psicanalistas. Muitas instituições, porém, sem qualquer qualificação para isso, vem dando o título de “psicanalis- ta para quem não tem condições”. Segundo Rossi, quanto mais a IPA reconhecer as federações regionais e as sociedades como forças políticas e se organizar como uma federação, mais poderá cumprir seu papel. (Pág. 3) Suad Andrade: clínica não está em crise “Nosso questionamento é outro. Concordo com Marcelo Viñar quando ele diz que não é a clínica psicanalítica que está em crise, já que ela sempre foi e continuará sendo um lugar de inquietações. O nosso desafio são as transformações sociais, estas sim, afetando diretamente a nós, psicanalistas, que sempre caminhamos na contramão e agora, mais do que nunca, diante desta sociedade apressada, voraz e robotizada”, adverte Suad Andrade, com base nas discussões ocorridas durante o XXI Congresso Brasileiro de Psicanálise. Hoje, segundo a psicanalista, nos deparamos com a forte tendência ao massacre da subjetividade e à procura das soluções “mágicas” para o sofrimento psíquico, mas ela acredita que “existe, escondida, camuflada, a percepção de um mundo interno rico de contradições e também de recursos”. (Pág. 6) Trasngeracional: uma espaço para a transformação Transmitir é fazer passar um objeto de identificação, um pensamento, uma história ou afetos de uma pessoa para outra, de um grupo para outro, de uma geração para outra. Na Transgeracionalidade as transmissões são inconscientes e poderão ser de- terminantes nas patologias de gerações seguintes. Por isso, Ana Rosa Trachtenberg, presidente da SBPdePA, afirma que ela é potencialmente desestruturante para a ge- ração receptora, pois não há circulação de palavras ou afetos. Predominam, em seu lugar, o silêncio e o segredo. Para ela, é no consultório que a Psicanálise encontra as palavras para o não-dito, emoção e elaboração, onde antes nada havia. “Constrói-se uma história intergeracional onde antes havia apenas uma repetitiva prisão trans- geracional. Na morada do silêncio”, conclui. (Pág. 7) O Congresso de Berlim repensa prática psicanalítica Com aproximadamente 3000 participantes, o Congresso Interna- cional de Psicanálise, realizado de 25 a 28 de julho em Berlim, foi um grande passo para a elaboração de novos significados na teoria e na prática psicanalíticas. Promovido pela Associação In- ternacional de Psicanálise (IPA), que tem à frente o brasileiro Cláu- dio Eizirick, o evento tomou como referência um dos trabalhos de Freud – Repetir, recordar e elaborar na Psicanálise – e aprofundou as discussões desde as situações traumáticas criadas por regimes ditatoriais, como o nazismo, até os ganhos com a inter-relação com outras disciplinas, como a neurociência. (Pág. 4)

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NotíciasCarta do Editor

Ano XI • Nº 34 • Rio de Janeiro • Outubro 2007

Associação Brasileira de Psicanálise

discurso de abertura do dr. Cláudio L. Eizirik, no nosso último Congresso Internacional,

em Berlim, foi contundente:

Zog nit keyn mol az du geyst dem letzten veg, Khotsh himlen blayene farshteln bloye teg;

Kumen vet noch undzer oysgebenkte sho, S’ vet a poyk ton undzer trot – mir zaynen do!

Nunca digas que este é o último caminho, Ainda que com chumbo se obscureça o céu azul, Pois nossa hora de heroísmo chegará, Ouve-se nossa marcha - estamos aqui!

Era o hino dos “partizans”, cantado em iídiche, pela resistência alemã contra as forças nazistas.

Em nosso congresso, as palavras do presidente trouxeram à Berlim de hoje a intensidade do que foi

uma época que nenhum de nós deseja que se repita. A emoção evocativa daquele momento trágico da

história do homem na Alemanha iluminada pelo Século das Luzes fez tremer nossos corações. Ele disse

a seu tom: recordemos, para elaborar e não repetir.

Descortinou-se assim, um encontro histórico entre psicanalistas, no qual se mesclou história, psicanálise,

ética e análise de paradigmas, elaborando-se sentidos sobre os quais poderemos apoiar o nosso fazer

futuro. Nosso congresso foi progressista na medida em que apoiou os ideais libertários que habitam o

homem, retomando com mais vitalidade o vislumbre de uma praxis sem tantos preconceitos.

Em 1922, aconteceu em Berlim o último congresso com a presença de Freud. Pouco depois, ele e sua família

são obrigados a abandonar sua amada Viena, pela perseguição nazista. Hoje, mais uma vez, a psicanálise

pode oficialmente ocupar espaço na Alemanha e lá celebrar o seu congresso. Éramos três mil congressistas,

embalados por uma canção que uniu todos aqueles que acreditam na humanidade dos homens.

Talvez, não seja exagero dizermos que a psicanálise, aquela que joga com a vida como os “partizans”o

fizeram, também tenha no seu bojo a força que liberta o homem de suas amarras neuróticas, perversas e

psicóticas. É verdade que, talvez, não possa fazê-lo sozinha, distanciada de outras ciências ou distanciada

de um código de ética implícito, mas sozinhos também não estavam os “partizans” alemães. Berlim

2007 escutou novamente o hino dos “partizans”. Assim, assegurou uma psicanálise que não poderá mais

silenciar o homem excluído ou submetido a qualquer tipo de discriminação, tendo assumido o lugar que

sempre foi seu por direito, de compromisso com o verdadeiro sentido da palavra e do ser.

Um abraço, boa leitura.

Leonardo A. Francischelli

Eleição na ABP: Rossi é pela continuidadeCláudio Rossi, da SBPSP, é can-didato à presidência da ABP na próxima eleição. Nesta entrevista, sintetizamos o que ele pensa em relação ao papel da entidade e o futuro da psicanálise no Brasil e na sua relação com outras insti-

tuições internacionais. Para ele, a hora é de dar continuidade às políticas adotadas até o momento, visando ampliar cada vez mais a participação das federadas no desenvolvimento, na divulgação, na difusão e na defesa da Psicanálise como conhecimento e como profissão. Já a questão profissional o preocupa. “A Psicanálise, to-dos sabemos, necessita de grande investimento e dedicação em sua formação. Nossas instituições precisam trabalhar duro para conseguir formar psicanalistas. Muitas instituições, porém, sem qualquer qualificação para isso, vem dando o título de “psicanalis-ta para quem não tem condições”. Segundo Rossi, quanto mais a IPA reconhecer as federações regionais e as sociedades como forças políticas e se organizar como uma federação, mais poderá cumprir seu papel. (Pág. 3)

Suad Andrade: clínica não está em crise“Nosso questionamento é outro. Concordo com Marcelo Viñar quando ele diz que não é a clínica psicanalítica que está em crise, já que ela sempre foi e continuará sendo um lugar de inquietações. O nosso desafio são as transformações sociais, estas sim, afetando diretamente a nós, psicanalistas, que sempre caminhamos na contramão e agora, mais do que nunca, diante desta sociedade apressada, voraz e robotizada”, adverte Suad Andrade, com base nas discussões ocorridas durante o XXI Congresso Brasileiro de Psicanálise. Hoje, segundo a psicanalista, nos deparamos com a forte tendência ao massacre da subjetividade e à procura das soluções “mágicas” para o sofrimento psíquico, mas ela acredita que “existe, escondida, camuflada, a percepção de um mundo interno rico de contradições e também de recursos”. (Pág. 6)

Trasngeracional: uma espaço para a transformaçãoTransmitir é fazer passar um objeto de identificação, um pensamento, uma história ou afetos de uma pessoa para outra, de um grupo para outro, de uma geração para outra. Na Transgeracionalidade as transmissões são inconscientes e poderão ser de-terminantes nas patologias de gerações seguintes. Por isso, Ana Rosa Trachtenberg, presidente da SBPdePA, afirma que ela é potencialmente desestruturante para a ge-ração receptora, pois não há circulação de palavras ou afetos. Predominam, em seu lugar, o silêncio e o segredo. Para ela, é no consultório que a Psicanálise encontra as palavras para o não-dito, emoção e elaboração, onde antes nada havia. “Constrói-se uma história intergeracional onde antes havia apenas uma repetitiva prisão trans-geracional. Na morada do silêncio”, conclui. (Pág. 7)

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Congresso de Berlim repensa prática psicanalíticaCom aproximadamente 3000 participantes, o Congresso Interna-cional de Psicanálise, realizado de 25 a 28 de julho em Berlim, foi um grande passo para a elaboração de novos significados na teoria e na prática psicanalíticas. Promovido pela Associação In-ternacional de Psicanálise (IPA), que tem à frente o brasileiro Cláu-dio Eizirick, o evento tomou como referência um dos trabalhos de Freud – Repetir, recordar e elaborar na Psicanálise – e aprofundou as discussões desde as situações traumáticas criadas por regimes ditatoriais, como o nazismo, até os ganhos com a inter-relação com outras disciplinas, como a neurociência. (Pág. 4)

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Associação Brasileira de PsicanáliseCarta do Presidente

Expediente

Conselho DiretorPresidente Pedro GomesSecretário Cláudio RossiTesoureiro Rosa Maria Carvalho Reis

Conselho de Coordenação Científica Diretora Telma Gomes de Barros Cavalcanti

Secretária Rosangela de Oliveira Faria

Conselho ProfissionalDiretor Jair Rodrigues EscobarSecretário Sylvain Nahum Levy

Conselho de Relações ExterioresDiretora Leila Tannous Guimarães

Depto de Publicações e DivulgaçãoDiretor Leonardo A. FrancischelliSecretário Sergio NickSecretária auxiliar - PoA Augusta G. Heller

Editor da Revista Brasileira de Psicanálise Leopold NosekEditora Associada Maria Aparecida Quesado Nicoletti

AdministraçãoDiretor Superintendente Sérgio Antônio Cyrino da CostaSecretárias Administrativas Lúcia Lustosa Boggiss e Renata Lang Marcel

DelegadosLuis Carlos MenezesMyrna Pia FavilliAlexandre KahtalianCarlos Roberto SabaAltamirando Matos de Andrade Jr.Bernard MiodownikRuggero LevyJair Rodrigues EscobarIvanise Ribeiro Eulálio CabralAlirio Torres Dantas Jr.Rosaura Rotta PereiraBruno Salésio da Silva FranciscoAna Rosa Chait TrachtenbergLeonardo A. FrancischelliPedro Paulo de Azevedo OrtolanJosé Cesário Francisco JúniorMaria Silvia Regadas de Moraes ValladaresRonaldo Mendes de Oliveira CastroGleda Brandão Coelho Martins de AraújoMirian Catia Bonini CodornizJosé Alberto ZusmanCláudio Tavares Cals de OliveiraCláudio José de Campos FilhoSergio Antonio Cyrino da Costa

Conselho Científico

Carlos de Almeida VieiraFlávio RoithmannLuiz Marcírio Kern MachadoMabel Cristina Tavares CavalcantiMaria Aparecida Duarte Barbosa

Maria da Conceição DavidovichMiriam Catia Bonini CodornizPaulo de Moraes Mendonça RibeiroRegina Helena Manhães NevesSérgio Cyrino da CostaSergio LewkowiczWaldemar Zusman

Conselho Profissional

Gleda Brandão Coelho Martins de AraujoEduardo Afonso Júnior Jair Rodrigues EscobarJosé Luiz MeurerLores Pedro MellerMarina MassiNeilton Dias da SilvaPaulo Cesar LessaSergio Antonio Cyrino da CostaSergio Eduardo NickSuely de Fátima Severino DelboniSylvain Nahum Levy

Edição

JLS Comunicação & AssociadosEditor José Luiz SombraRedatora Andreia Cony e Constança SabençaProjeto Gráfico e DiagramaçãoInterface Designers - Sérgio Liuzzi Amanda Mattos

este nosso terceiro número do ano de 2007, gostaria de destacar alguns aspectos em que a diretoria da ABP vem participando. Como imagino já seja de conhecimento de muitos de nossos colegas, uma parceria com a Revista Psique foi concretizada, resultando em espaços editoriais importantes para a divulgação da psicanálise e da associação brasileira. Trata-se de uma revista de circulação ampla, voltada para o público de uma maneira geral, e que teve uma edição especial chamada “Grandes Pensadores da Psicanálise”, realizada pela ABP. Neste número, os artigos foram escritos por colegas

de nossas federadas. A revista foi lançada em julho passado, vendida nas bancas e foi sucesso absoluto.

Além de nossos autores consagrados como Freud, Bion, Melanie Klein, Lacan, Andre Green, artigos sobre novas concepções da Prática Psicanalítica, sobre a clínica infantil e sobre a psicanálise e a cultura, destaco dois artigos sobre idéias de dois psicanalistas brasileiros, Isaias Melsohn e do nosso saudoso Fábio Hermann, que contribuíram muito para uma psicanálise nossa.

Ainda no final de julho aconteceu também em Berlim o 45º Congresso Internacional de Psicanálise, presidido pelo nosso querido Cláudio Eizirik, presidente da IPA. O Congresso foi um sucesso absoluto com quase 3.000 participantes, tendo uma significativa participação de brasileiros. Além da bela parte científica do Congresso, houve reunião dos Presidentes de Sociedade e Diretores de Instituto para a discussão da implementação dos três modelos de formação, que também foi bem sucedido como já deve estar sendo divulgado nos boletins dirigidos.

Para finalizar, como já registrei no número anterior, a organização do II Congresso Luso-Brasileiro de Psicanálise e o I Encontro de Psicanálise de Países de Língua Portuguesa, já estão na reta final. Estamos agora fazendo sua divulgação e, temos certeza, será um grande sucesso. Esperamos contar com a presença de vocês para que o evento seja uma referência no nosso calendário.

No final deste II Congresso, dia 18/11, teremos nossa Assembléia de Delegados com a eleição da nova diretoria para o Biênio 2006/2008, e o final de nossa gestão. Até lá.

Pedro Gomes

NPedro GomesPresidente da ABP

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Associação Brasileira de Psicanálise Entrevista

Cláudio RossiMembro da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo

Rossi: É hora da continuidade às políticas adotadas pela ABP

O ABP Notícias entrevistou o atual secretário e membro da dire-toria da instituição, Claudio Rossi, que se candidata à presidên-cia da Associação Brasileira de Psicanálise. Nosso objetivo é apresentar aqui algumas das idéias presentes nas propostas do candidato para manter a instituição no mesmo caminho trilhado pela atual diretoria.

1. Quais são as mudanças que você pretende fazer, caso seja eleito, durante a sua gestão na ABP?A ABP há várias gestões vem cumprindo muito bem sua função, que é a de coordenar o movimento psicanalítico brasileiro, buscando cada vez mais a participação das federadas, apoiando e patrocinando a divulgação e a difusão da Psicanálise e participando do movimento de articulação das en-tidades não filiadas à IPA para fazer frente aos desafios profissionais. Além disso, promove a a participação das sociedades brasileiras na IPA e na FEPAL e organiza o Congresso Brasileiro com resultados bastante positivos. Minha intenção, por isso, é dar continuidade às políticas adotadas até o momento, visando ampliar cada vez mais a participação das federadas no desenvolvi-mento, na divulgação, na difusão e na defesa da Psicanálise como conheci-mento e como profissão. 2. Há algum ponto que você considere crítico quanto à gestão da ABP no momento?Não creio que haja propriamente um ponto crítico na gestão atual. A questão profissional, porém, preocupa. A Psicanálise, todos sabemos, neces-sita de grande investimento e dedicação em sua formação. Nossas institu-ições precisam trabalhar duro para conseguir formar psicanalistas. Muitas instituições, porém, sem qualquer qualificação para isso, vem dando o título de “psicanalista” para milhares de pessoas que ficam convencidas que, de fato, têm condições de exercer a profissão. Esses grupos que incluem até agremiações religiosas, têm feito pressão política para regulamentar a pro-fissão de uma forma que descaracterizaria completamente a Psicanálise. Na gestão atual fizemos um estudo jurídico da questão, que foi discutido com os presidentes e na assembléia de delegados e estamos trabalhando para fazer frente a essa situação.

3. Com a chegada à presidência da IPA de Claudio Eizirik, parece que a ABP cum-priu um ciclo. Se foi assim, pensaria em dar início a um novo projeto?Acredito que termos um brasileiro na presidência da IPA é algo muito bom, mas isso apenas estimula a ABP a continuar trabalhando para levar nossas posições, reivindicações, sugestões e contribuições para que a instituição que, também, somos nós, torne-se cada vez mais eficiente e representa-tiva. Quanto mais a IPA reconhecer as federações regionais e as sociedades como forças políticas e se organizar como uma federação, mais poderá cumprir seu papel. Acho que devemos continuar defendendo essa posição que, felizmente, vem ganhando maior apoio dentro da IPA.

4. Pensa em fazer um trabalho de maior proximidade entre as federadas e a IPA, por exemplo, através do DPPT (Developing Psychoanalytic Practice and Training)?O DPPT é uma boa iniciativa da IPA, que, assim, tem se aproximado das sociedades componentes. Desde que em sintonia com os presidentes das federadas, a ABP pode, como foi feito na atual gestão, aproveitar essas verbas para fortalecer a integração da psicanálise brasileira e promover sua difusão e divulgação. 5. Quanto ao intercâmbio científico, poderiam ser organizados encontros entre as federadas de regiões próximas, visando maior troca entre as Sociedades e, conse-qüentemente, não se limitando aos Congressos Brasileiros, há cada dois anos?A ABP deve, a meu ver, estimular ao máximo o intercâmbio entre as socie-dades. Isso já vem sendo feito e deverá continuar. 6. Com relação aos Institutos, qual a sua posição sobre promover uma aproxi-mação entre os Institutos das Sociedades, com a intenção de auxílio recíproco e integração entre os membros em formação? O encontro entre diretores de Institutos que a atual gestão vem promov-endo é, de fato, uma ótima iniciativa que deverá ser continuada, na minha opinião, nas futuras gestões. 7. Como vê as relações entre ABP e a FEPAL?Nossas relações com a FEPAL são boas e a ABP tem coordenado a participação brasileira, que tem sido significativa. Quanto mais forte for a FEPAL, e essa força depende de ela ser representativa, melhor poderemos trabalhar para que a IPA seja eficiente. A FEPAL, diferentemente da IPA, que é uma associação de membros, já nasceu como federação e é assim que ela deve continuar. Suas estruturas de poder devem representar as diretorias das sociedades componen-tes e evitar a formação de estruturas burocráticas que facilitem a realização de políticas pessoais e a instalação de cargos vitalícios ou de comissões permanen-tes, que por melhor que funcionem, tornam-se pouco representativas. A FEPAL deve ser uma articuladora política da América Latina para que os interesses regionais sejam defendidos na IPA. E deve ser também uma organização que promova, ao máximo, o intercâmbio científico entre suas componentes para que a Psicanálise latino-americana possa se desenvolver da melhor maneira e possa ser divulgada para as outras regiões do mundo. A difusão da Psicanálise em regiões latino-americanas, nas quais ela ainda não existe, também, é um objetivo importante que deve ser visado pela FEPAL.

8. A ABP pensa em alguma estratégia dirigida a transformar algum Núcleo em Grupo de Estudos e promover, com isso, sua ascensão e autonomia?A política da ABP é apoiar os núcleos para que eles possam se desenvolver. Como ? Divulgando suas atividades, ajudando na promoção de eventos e dando todo apoio possível para suas atividades científicas e profissionais. Os núcleos, porém, são sempre patrocinados pelas sociedades componentes e é, através delas e em consonância, que a ABP atua. Em alguns casos, é interesse dos núcleos se desenvolverem na direção de formarem novas sociedades. Out-ras vezes preferem se manter como núcleos. A ABP continuará dando todo apoio que puder para os núcleos e para as sociedades que os patrocinam.

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Associação Brasileira de PsicanáliseFormação Psicanalítica

A Associação Psicanalítica Internacional (IPA) realizou seu 45º Con-gresso Internacional em Berlim, de 25 a 28 de julho, com a presença de quase 3.000 participantes. Este congresso revestiu-se de vários significados especiais. Seu tema oficial “Repetir, recordar e elaborar na Psicanálise e na cultura hoje”, baseado num dos trabalhos clínicos de Freud, permitiu examinar os significados atuais da repetição, da recordação e da elaboração na teoria e na clínica psicanalíticas. Além disso, abriu espaço para pesquisas recentes sobre as distintas formas de memória e a relação entre situações traumáticas pessoais e cole-tivas e eventos posteriores na vida individual e social. O congresso proporcionou ainda uma ampla reflexão conjunta sobre o impacto do nazismo, do stalinismo, do holocausto, das ditaduras latino-americanas e de outras situações traumáticas na mente dos que as viveram e nas gerações seguintes, tema que tem recebido crescente atenção, por meio da análise de filhos e netos tanto de vítimas quanto de perpetradores. A abertura do congresso contou com uma conferência da conhecida escritora alemã Christa Wolff, que abordou o holocausto mesclando suas próprias lembranças e contribuições da literatura e da poesia. Em meu discurso de abertura destaquei o fato de que era o primeiro congresso em Berlim em 85 anos, pois o anterior naquela cidade ocorrera em 1922, sendo aquele o último a contar com a presença de Freud. Naquela ocasião, alguns dos pioneiros da Psicanálise e de áreas vizinhas, como Ferenczi, Alexander, Ernest Jones, Jean Piaget e Melanie Klein apresentaram trabalhos que tiveram ampla influên-cia nas décadas seguintes. Num mundo em transformação, procurei ilustrar com fatos e evidências contemporâneas que a Psicanálise responde à mudança com mudanças e reformulações em sua teoria e práxis. O clima que marcou esse primeiro dia foi de muita emoção, pois se tratava de um reencontro formal da Psicanálise internacional com a cidade que fora um de seus berços, através de seus pioneiros Karl Abraham e Max Eitingon.Em seguida, ocorreu a inauguração de uma réplica da estátua da

Cláudio Laks Eizirik

Congresso de Berlim: momento de revisão e atualização

Gradiva, personagem de uma novela literária que foi analisada por Freud, exatamente defronte ao local em que fôra realizado o con-gresso de 1922, e que depois serviu de escritório para Eichman de-senvolver sua infamante “solução final”, que seria o extermínio dos judeus da Europa. As duas sociedades alemãs filiadas à IPA decidiram realizar essa homenagem para expressar seu repúdio ao nazismo e a vitalidade da Psicanálise da Alemanha de hoje. Ao som de peças de Bach, ao cello, esse entardecer foi outro momento de grande emo-ção e congraçamento entre psicanalistas de vários países do mundo, em especial muitos que viveram as conseqüências daquele terrível período histórico. Em cada um dos dias seguintes, através de uma atividade intitulada “Estar em Berlim”, organizada conjuntamente por analistas alemães e israelenses, foram ouvidos depoimentos de colegas europeus, latino-americanos e norte-americanos sobre a ex-periência de convívio com o terror, com a emigração forçada, com o exílio e com a memória. Essa atividade atraiu um enorme número de participantes e permitiu recordar tais eventos e principalmente procurar elaborá-los, no sentido de um trabalho mental que segue o conceito freudiano de Durcharbeiten, ou seja, trabalhar através, ligar, dar novos sentidos, diminuir a dor e a dissociação e buscar integrações possíveis.O programa científico do Congresso permitiu um amplo estudo das três dimensões citadas – recordar, repetir e elaborar –por meio de discussões teóricas, clínicas, de pesquisa e de relação com a cultura. Conforme estabelecido no trabalho de Freud de 1914, que deu o títu-lo ao congresso, e em contribuições posteriores, o processo psicana-lítico visa promover transformações psíquicas através da elaboração dos conflitos, que leva o paciente a recordar o que foi reprimido (hoje diríamos entender e dar significado ao material inconsciente). Assim, visa evitar sua repetição compulsiva; essa compulsão a repetir condiciona a manutenção e perpetuação da neurose. Como diz An-dré Green, essa compulsão à repetição assassina o tempo, pois não permite que surja o novo, o criativo e obriga o paciente a viver o de

O ABP Notícias divulga artigo do dr. Cláudio Eizirick, que tem como fonte de inspiração o 45o Congresso Internacional da IPA, realizado em Berlim, entre 25 e 28 de julho deste ano. A quem lá esteve, emocionou ver o atual Presidente da IPA, brasileiro, de origem judaica, resgatar a história que cruza com a origem do fundador da Psicanálise, Sigmund Freud, que participou em 1922 do Congresso na mesma Berlim. Foram necessários mais de 80 anos para que a Alemanha pu-desse sediar novamente um encontro como este, reunindo psicanalistas de todo o mundo. Fica o registro da honra que sentimos, como psicanalistas brasileiros, por sermos representados pela pessoa do professor Claudio.

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Associação Brasileira de Psicanálise Artigo

“...a essência do trabalho analítico: ele visa derrubar os muros que mantém a mente estagnada e aprisionada na compulsão à repetição e impedem sua expansão e o desen-volvimento do pensamento livre, crítico e independente.”

sempre, o conhecido, enfim, ficar enclausurado no círculo vicioso da neurose ou de outras formas de sofrimento psíquico. Três trabalhos pré-publicados, de autoria de Norberto Marucco (Ar-gentina), Werner Bohleber (Alemanha) e Jonathan Lear (EUA) serviram como estímulo ao debate, abordando as extensões contemporâneas da metapsicologia e os significados da memória e as relações com a cultura. O Congresso constou de conferências, painéis, supervisões coletivas organizadas pela Associação Internacional dos Psicanalis-tas em formação, encontros com autores destacados, e lançamento de novos livros. Em cada um destes momentos foi possível aprofun-dar áreas específicas e observar a interação de conceitos clássicos com contribuições dos últimos anos, provenientes de distintas esco-las psicanalíticas européias, latino-americanas e norte-americanas. Aliás, cabe destacar que o Comitê de publicações da IPA lançou 9 novos títulos, sobre diferentes áreas da Psicanálise.Cabe destacar a participação marcante de alguns autores que cons-tituem a prova viva de que a Psicanálise é uma obra em constru-ção, que revisa criticamente seus conceitos, aprimora sua acuidade clínica e capacita os analistas a trabalhar com casos mais difíceis e em maior contato emocional com os pacientes, expande e explo-ra novas áreas da mente e desenvolve pesquisas com maior rigor e sofisticação e amplia seu diálogo com outros saberes: Andre Green

(que recebeu na abertura do congresso o prêmio máximo concedido pela IPA), Jean Laplanche, Otto Kernberg, Antonino Ferro, Daniel Wi-dlocher, Leo Rangell, Mark Solms, Janine Puget, Stefano Bolognini, Ricardo Bernardi, Peter Fonagy, Cesar Botella, Luis Kancyper.O 45º Congresso da IPA, assim, percorreu as duas principais avenidas por onde se movem a recordação, a repetição e a elaboração. Na primeira, refletiu sobre a relevância desses três conceitos para a te-oria, a clínica e a pesquisa psicanalíticas. Na segunda, permitiu uma reflexão madura e sóbria sobre tais conceitos para entender situa-ções traumáticas individuais e coletivas, tanto no passado como no presente. O website da IPA, www.ipa.org.uk permite uma visão mais abrangente de conjunto de atividades que ocorreram no 45º Con-gresso da IPA, bem como escutar na íntegra algumas das principais sessões plenárias, painéis e conferências do Congresso.Retomando um aspecto relevante desse 45º Congresso, destacado já em sua abertura, Berlim foi o cenário, em 1989, da queda do muro que dividia a cidade, e tentava manter o outro sistema totalitário que dominou o século XX. A queda do muro oferece uma excelente metáfora para a essência do trabalho analítico: ele visa derrubar os muros que mantém a mente estagnada e aprisionada na compulsão à repetição e impedem sua expansão e o desenvolvimento do pensa-mento livre, crítico e independente.

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Associação Brasileira de Psicanálise

Como mantemos vivo o tema do XXI Congresso Brasileiro

Artigo

Em uma jornada ocorrida em Goiânia, há poucos meses, o Sergio Roua-net cobrou dos psicanalistas o fato de não estarem pensando os prob-lemas sociais, não estarem atentos à cultura e às patologias sociais de nossa época. Freud, diz ele, o fez magnificamente com seus escritos sobre religião, moralidade, psicologia das massas, narcisismo etc.; já os psicanalistas estariam só voltados para dentro dos consultórios.“O que Freud fazia quando pensava os problemas sociais, os grupos hu-manos, era chamado de “psicanálise aplicada” e, agora, parece que a psicanálise aplicada é a que se aplica nos consultórios.” Rouanet critica nosso apego à clínica como se ela nos isolasse do mundo quando, na verdade, não há qualquer possibilidade de nos distanciarmos do mundo ao nosso redor. A clínica nos situa na fron-teira entre o íntimo e o social. Não podemos nos furtar a pensar o mundo em que vivemos porque ele entra, com o paciente, para dentro do consultório. E ao pensarmos o homem na sua intimidade estamos contribuindo com o social. Além disso, a clínica é nosso laboratório, onde testamos nossas teorias e de onde partimos para criar novas teorias. A psicanálise nasceu da clínica e é da clínica que tira seu vigor. Nosso questionamento é outro; concordo com Marcelo Viñar quan-do ele diz que não é a clínica psicanalítica que está em crise, já que ela sempre foi e continuará sendo um lugar de inquietações. O nosso desafio são as transformações sociais, estas sim, afetando direta-mente a nós psicanalistas, que sempre caminhamos na contramão e agora mais do que nunca, diante desta sociedade apressada, voraz e robotizada. Gerd Bornheim, no livro “Tempo e História”, falando sobre o novo diz que o “inovar é uma distinção constitutiva da própria condição hu-mana”. Mesmo no universo das artes, onde durante séculos impera-ram a cópia e a imitação, sem dúvida havia uma revolução ocorrendo internamente, dentro das pessoas, dos artistas, que levou finalmente à libertação das artes. E hoje, quando nos deparamos com a forte tendência ao massacre da subjetividade e à procura das soluções “mágicas” para o sofrimento psíquico acredito que existe, escondida, camuflada, a percepção de um mundo interno rico de contradições e também de recursos. E acredito que haverá uma revalorização das relações, da história pessoal, dos valores grupais. O reencontro con-sigo próprio é temido, mas também é desejado. Deixará de ser tão as-sustador um dia e quando isto ocorrer estaremos disponíveis, como

Suad Haddad de AndradeMembro da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo e de Ribeirão Preto

sempre, para oferecer o que há de mais valioso para o ser humano que é a possibilidade de ser acolhido e de encontrar significado para suas turbulências internas. É da natureza humana a capacidade de inovar, de expandir e de criar. Além de estarmos sempre tentando compreender e nos adaptar às mudanças ao nosso redor. Nós, psicanalistas, precisamos de um am-biente institucional acolhedor que nos ajude a suportar as frustra-ções inerentes ao nosso trabalho e nos congregue para juntos de-senvolvermos nossos recursos e dividirmos nossas dúvidas. A troca de experiências é, para os psicanalistas, fundamental suporte para nossas angustias e para nosso desenvolvimento.

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Associação Brasileira de Psicanálise

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Associação Brasileira de Psicanálise Artigo

Alguns anos após o final da segunda guerra mundial, psicanalistas do mundo inteiro, começam a receber em seus consultórios os so-breviventes e/ou descendentes do holocausto judeu – Shoá - em hebraico. Reinauguram-se, a partir daí, os estudos da Transmissão Psíquica entre Gerações, que já haviam sido anunciados por Freud em Totem e Tabu, Introdução ao Narcisismo e Luto e Melancolia. As violências sociais, de estado, familiares, os segredos e os traumas em geral também foram incluídos nessa nova perspectiva psicanalítica.Transmitir é fazer passar um objeto de identificação, um pensam-ento, uma história ou afetos de uma pessoa para outra, de um grupo para outro, de uma geração para outra. Na Transgeracionalidade as transmissões são inconscientes e poderão ser determinantes nas patologias de gerações seguintes.Quando falo de transmissão psíquica de uma geração para outra, refiro-me a duas modalidades básicas: intergeracional e transgera-cional. A primeira delas, a intergeracional, é estruturante, está rela-cionada com as identificações secundárias, transita no mundo das palavras e permite a construção de uma novela individual neurótica. Nela, o sujeito não é somente beneficiário, herdeiro, mas também adquirente singular daquilo que lhe é transmitido. Este trabalho permite a cada geração situar-se em relação às outras, perceber e respeitar as diferenças (de sexo e de geração), tornar-se um elo, e inscrever cada sujeito numa cadeia e num grupo.A transmissão transgeracional, ao contrário, é invasiva e costuma es-tar relacionada a situações de traumas, lutos, violências (pessoais ou sociais), e vergonhas, presentes e/ou passadas. Ela é potencialmente desestruturante para a geração receptora, pois não há circulação de palavras ou afetos. Predominam, em seu lugar, o silêncio e o segredo.A desmentida, a cisão e a formação de criptas, são exemplos de def-esas extremadas contra a ameaça de ruptura psíquica que o contato emocional com o trauma pode representar para a geração que o vivenciou. Para esse sujeito, torna-se intolerável lembrar, rememorar, pensar, sentir, sonhar ou falar. A resultante, que é a não-elaboração do trauma, abre o caminho para a transmissão inconsciente de tais vivências e a repetição transgeracional.A transmissão transgeracional ocorre, portanto, quando não há me-tabolização psíquica: o não elaborado na história dos pais, o indizív-el, o inominável, o inconfessável é transmitido como material bruto, e depositado na geração seguinte, sem ser pensado ou simbolizado. Trata-se de uma forma particular de identificação projetiva, que

aparece na literatura (de todos os continentes) com variados nomes, quando o fenômeno é descrito entre sujeitos de diferentes gerações - identificação alienante, traumática, narcísica, mórbida, extrativa, radioativa, telescopagem de gerações, etc...Nestes casos, o filho deixa de ser um herdeiro - elo na cadeia geracio-nal e passa a ser um escravo - depositário, hospedeiro dos produtos tóxicos dos pais, ou daquilo que lhes excede. Vive uma vida que, ao menos em parte, não é sua. É uma parte alienada do psiquismo, não lhe pertence. A criança carrega, ao obedecer o mandato transgeracional, o indizível, o irrepresentável, o fantasma dos pais, que poderá se fazer presente através de um sintoma ou patologia. Poderíamos dizer, numa fórmula simples, que o que numa geração se “cala”, na outra se “fala”. Tais manifestações sintomáticas são, muitas vezes, “salvadoras” para o psiquismo de uma criança, já que, assim, poderão “gritar” por ajuda terapêutica. A Psicanálise está, na atualidade, preparada para brindar essa ajuda tão silenciosamente buscada, na maioria das vezes.Na interface da Psicanálise com a Cultura as noções de traumas não-elaborados e de repetição transgeracional têm aparecido nas mais diferentes áreas do conhecimento, tais como o cinema, a literatura, a música, a poesia, as artes plásticas, os memoriais, a mídia, etc... Re-centemente o Presidente da IPA, esteve na ONU, discutindo sobre a “Participação da Psicanálise na Prevenção da Transmissão Transgera-cional da Violência”. Penso que são especialmente valiosas as ações de saúde pública, bem como a presença do psicanalista nas comunidades psi e ampla, através de conferências, mesas redondas, entrevistas, etc... A SBPdePA tem se dedicado a isso intensamente nos últimos anos, contando com a valiosa participação da IPA, através do DPPT.E é especialmente em nossos consultórios, no interior mesmo de um processo analítico, através da surpresa na contratransferência que o “sinistro”, subitamente, se faz presente. Nesta ocasião, os fantasmas de um passado, pré-histórico, desconhecido, de nossos pacientes poderão se manifestar. E é lá que a Psicanálise encontra as palavras para o não-dito, emoção e elaboração onde antes não havia. Con-strói-se uma história intergeracional onde antes havia apenas uma repetitiva prisão transgeracional. Na morada do silêncio, do branco e do vazio, dominada pelos mandatos da herança transgeracional podemos instalar as palavras de um espaço de transcrição transfor-madora. Lá, na travessia em direção à sua herança intergeracional, brotarão os sons, as cores e os sentidos, aproximando o sujeito da construção da sua própria historicidade.

Transgeracionalidade o que é isso?

Ana Rosa Chait TrachtenbergMembro fundador, analista titular com função didática da SBPdePA, presidente da SBPdePA

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Associação Brasileira de PsicanáliseArtigo

Uma das questões mais relevantes que nos confronta refere-se às trans-formações culturais que estamos testemunhando e à forma como essas mudanças influenciam o sujeito humano e a sua interação com a cul-tura. Nosso mundo não respeita nem reconhece o individuo em sua sin-gularidade. Premido por um individualismo narcisista e dominado pela massificação, o indivíduo termina esmagado num lugar comum.No início do filme Crash, a voz do narrador diz que numa cidade como Los Angeles, as pessoas já não se tocam, isoladas por vidro e aço. Parecia a ele que as pessoas trombavam umas com as outras, para experimentar o toque, o contato com o semelhante. Essa parece ser uma metáfora bem adequada para o evanescimento do indivíduo no mundo contemporâneo. Nossas sociedades festejam o indivíduo no isolamento narcísico. Somos uma sociedade individualista onde não há, entretanto, espaço para o indivíduo, para o sujeito.O lugar do indivíduo no mundo atual está marcado pela passividade. Somos trabalhadores, prestadores de serviço, vítimas e bandidos, e, so-bretudo, consumidores. Nesta miríade de papéis por onde desliza nossa identidade, o indivíduo não é reconhecido em sua especificidade.Para além de qualquer crise sempre convivemos com o conflito entre os nossos sonhos e a realidade. O mundo das coisas opõe um impor-tante limite aos nossos desejos. Desde a antiguidade, a civilização constitui-se uma fonte inesgotável de frustrações às expectativas dos homens. A história ensina que a cada novo desafio construímos novas fantasias idealizadas do futuro. Somos, invariavelmente, frus-trados pelas nossas próprias ações.

As utopias: as idealizações e as desilusões

A palavra Utopia designa uma expressão nostálgica de nossa alma. Um país imaginário, onde um governo organizado da melhor ma-neira proporciona ótimas condições de vida a um povo equilibrado e feliz. Esta ilha descrita por Tomas More (1516) como o local de uma vida social e política perfeita, terminou por representar, de modo amplo, situações ideais onde vigorem normas ou instituições políti-cas altamente aperfeiçoadas. Mas também significa o ideal inexis-tente, as fantasias e projetos irrealizáveis. Em sentido original, utopia é a expressão do ideal inexistente, a síndrome do ‘nenhum lugar’, a doce herdeira dos nossos sonhos e de nossas desilusões.

Eu creio que a utopia permite uma reflexão muito apropriada sobre a função intrapsíquica dos ‘ideais’. Nos dois campos, o “ideal” define um lugar perfeito e harmônico, onde reina o equilíbrio e a felicidade. Nos dois campos esta perfeição pertence a um tempo ou a um lugar jamais vividos. O sentimento dominante é o da nostalgia e o des-tino inevitável será uma desilusão. Nas duas situações há uma clara referência a experiência de uma perda, em cujo lugar constrói-se uma demanda em direção ao idealizado.O confronto da realidade com as utopias não pode destruí-las. Uto-pias são como sonhos, vicejam livres de contradição e de coerência no espaço construído pelo desejo. Não sonhamos por causa das ex-periências vividas na realidade. Sonhamos em busca da realização de nossos desejos, e sonhamos para elaborar a frustração vivida. Frustra-dos nestes sonhos, os homens costumam oscilar entre movimentos pendulares de acomodação à realidade e de exaltações idealizadas.As utopias possuem uma importante função no mundo interno e no mundo social. Como nos sonhos, ela permite que as experiências vividas sejam elaboradas. Satisfatórias ou decepcionantes estas ex-periências precisam ser digeridas e incorporadas ao aparelho de pen-sar por meio de representações carregadas de significado emocional. Por meio destas representações carregadas de emoção, a pessoa pode discriminar a experiência, e transformar a desilusão em nova identificação. Novas utopias, novos sonhos, asseguram ao homem que ele pode transcender a sua impotência e fragilidade por meio de sua vinculação a um outro ‘ideal’.Tal como aconteceu na infância, o fracasso do investimento nar-císico e a descoberta da castração não levam o homem ao vazio. Ele não estaciona na frustração porque as novas idealizações, as no-vas utopias, permitem que ele se reencontre na esperança. Neste sentido, a utopia desempenha uma função análoga à dos sonhos, quando permite a elaboração da experiência. E desempenha outra função, semelhante à do ‘ideal do ego’, porque sustenta uma identi-ficação idealizada que nos permite reinvestir novamente no mundo das coisas. Sem a esperança que estes ‘ideais’ inatingíveis nos traz, seria muito mais difícil lidar com o desequilíbrio constante com que o mundo de objetos, tão contraditório e cambiante, nos leva a reviver os sentimentos de desilusão.

Alirio Dantas JrMembro da Sociedade Psicanalítica de Recife

Utopia e desilusão na vida contemporânea

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Associação Brasileira de Psicanálise

O sujeito humano e a crise de valores sociais

A crise dos valores e dos laços sociais que vivemos é, sem nenhuma dúvida, um desa-fio gigantesco para esta geração. Viver tem a ver com uma inquieta insatisfação que nos faz investir em novos vínculos e a construir novos significados para a experiência emo-cional. Embora esta inquietação seja fonte de muita dor é, sobretudo, a fonte de muito prazer e de todo desejo. O desejo humano é determinado pela criança mágica e impo-tente que habita em todos nós. A herança legada por Freud nos ensina que a mente primitiva é, no sentido mais pleno desse termo, imperecível (Freud, 1915).Em seu artigo sobre as “Reflexões para os tempos de guerra e morte” Freud lembra que nós acolhemos as ilusões porque ela nos poupam sentimentos desagradáveis e nos permite em troca gozar de satisfa-ções. “Portanto, não devemos reclamar se, repetidas vezes, essas ilusões entrarem em choque com alguma parcela da realidade e se despedaçarem contra ela.” (Freud, 1915, pg. 317).O mundo moderno, dominado pela virtualidade da imagem, tenta tor-nar viável o impossível. Neste mundo não há lugar para nada que seja diferente do idealizado. Contudo, este é um caminho muito perigoso porque não há, na experiência humana, qualquer equivalência ao ide-al. Tornar o ‘ideal do ego’ mais próximo e verossímil tornará maiores as exigências impostas ao ego. A frustração inevitável cuidará de impor as mais pesadas desilusões, tornando progressivamente maior a dis-tância que separa o ego do seu ‘ideal’.Nada disto, contudo é novo. Como qualquer outro sonho o progresso também é idealizado enquanto meio capaz de garantir a felicidade. Em 1798, Schlegel falou desta quimera de um modo que vive em sua atualidade: “Uma vez tomadas pela fome de progresso, as pes-

Artigo

“O que sentimos aqui como beleza um dia nos surgirá como verdade”.Schiller - Os artistas, 1789

soas comuns, que geralmente não têm a menor sensibilidade para o futuro, correm literalmente para ele. Cabeça baixa e olhos fechados, como se o espírito do progresso tivesse braços e pernas. Se por acaso não quebrarem o pescoço, então das duas uma: ou se detêm, ou se voltam”. Nos seus ‘ideais’, os homens buscam encon-trar um estado de felicidade e perfeição que somente foi experimentado, por breve tempo, nas fantasias onipotentes e no pensamento mágico infantis. Eles buscam o que nunca possuíram movidos pelo an-gustiante conflito entre os seus desejos e suas realizações. Espremido entre as suas expectativas e as suas limitações, o indi-víduo equilibra-se entre o seu sofrimento e a perda dos seus ‘ideais’.Nós desejaríamos conservar nossos son-hos e nossos ‘ideais’. O que não queremos é a desilusão que pode resultar deles. Não gostamos que o mundo seja imperfeito, que a felicidade seja provisória, e que nos-sos desejos sejam contraditórios. Temos

dificuldades em ver nossos sonhos diminuídos, e em alguns casos destruídos pelos limites da realidade. Não transcendemos as nossas experiências em razão de nossa origem, de nosso sucesso, ou da nossa capacidade de haver, no passado, encontrado satisfação para os nos-sos desejos. Transcendemos a realidade em razão dos nossos sonhos, em razão da grandeza e criatividade de nossa alma subjetiva. É sempre o sonho aquilo que nos move. Todo investimento que fazemos representa uma esperança de realização do desejo. Chame-se a isto o prazer, o gozo ou a felicidade. Vivemos em busca de re-encontrar, no futuro, um estado de satisfação e de alegria. Se isto é uma utopia, se é uma nostalgia de um tempo que nunca vivemos, pouco importa. Aquilo que sustenta a vida é o desejo e não a sua satisfação.

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cado à questão e parando, assim, com o sintoma, foi exaustivamente discutida e ampliada à luz dos novos conhecimentos oriundos da prática clínica. Emocionantes depoimentos de psicanalistas judeus que emigraram da Alemanha, relatando a experiência do exílio, le-varam a importantes debates com os colegas alemães. As discussões em torno da memória, tal como é vista pela moderna neurociência em face dos achados na clínica, evidenciaram a im-portância do referencial analítico para a compreensão dos distúr-bios mnêmicos. Dentre as pesquisas na interface Neurociência/Psi-canálise, destaca-se uma que demonstra que a terapia psicanalítica favorece a recuperação de pacientes com doenças neurológicas. Foi também discutido o papel da memória na recuperação da identi-dade, funcionando como um fio condutor da continuidade do self ao longo do tempo e dando um colorido novo ao sujeito na medida em que as resignificações vão se processando. Mas a grande questão em discussão neste Congresso Mundial foram as últimas descobe-rtas clínicas em psicanálise. Passado um século, o que ficou e o que muda no tratamento/prática psicanalítica? Há hoje uma convergên-cia de que as patologias que chegam aos consultórios são mais de narcisismo do que neuróticas. “O problema nos últimos tempos é que as patologias estão ligadas à imagem, ao corpo, a uma sensação de vazio, onde a dificuldade de representar o acontecimento leva a um novo tipo de descarga emocional. O contexto cultural mudou a forma de representação. Sai Édipo e entra Narciso”, afirma o coorde-nador do Comitê de Divulgação da IPA.Dentro das reuniões administrativas, ratificou-se a proposta dos três modelos de formação psicanalítica. Para que uma sociedade imple-mente a mudança, foi aprovada a idéia do “oversight”, que será ai-nda melhor discutida e regulamentada. Ainda durante o Congresso, o Núcleo de Campo Grande passou a ser Sociedade Psicanalítica de Mato Grosso do Sul.

Notícias e Programação

A Associação Psicanalítica Internacional (IPA) realizou seu 45º Con-gresso Internacional em Berlim, de 25 a 28 de julho, com a presença de quase 3.000 participantes. Seu tema oficial “Repetir, recordar e elaborar na Psicanálise e na cultura hoje”, baseado num dos trabalhos clínicos de Freud, atualizou as discussões para a elaboração de novos significados na teoria e na clínica psicanalíticas. Além disso, abriu es-paço para pesquisas recentes sobre as distintas formas de memória e a relação entre situações traumáticas pessoais e coletivas. Para o presidente da IPA, Cláudio Eizirick, o Congresso “proporcionou ainda uma ampla reflexão conjunta sobre o impacto do nazismo, do stalinismo, do holocausto, das ditaduras latino-americanas e de outras situações traumáticas na mente dos que as viveram e nas gerações seguintes, tema que tem recebido crescente atenção, por meio da análise de filhos e netos tanto de vítimas quanto de perpe-tradores”. “O enorme sucesso de público corrobora a impressão de vivacidade da prática psicanalítica por nós sentida durante o con-gresso da ABP em Porto Alegre, dando-nos alento para prosseguir no caminho que une todos os colegas da ABP/IPA”, afirma o diretor do comitê de divulgação da IPA, Sergio Nick. A delegação brasileira foi representada por cerca de 130 psicanalistas da Associação Brasileira de Psicanálise (ABP) e seus filiados, que apre-sentaram inúmeros trabalhos para discussão. Houve também o lan-çamento de nove livros, dois dos quais com a participação de colegas da ABP. O Congresso Mundial apresentou uma particularidade: pela primeira vez, psicanalistas retornaram à Alemanha para um evento que analisou em detalhes a questão do Holocausto. Por isso, um dos pontos importantes em debate foi a questão do sofrimento humano e a memória, cuja repressão acaba levando o indivíduo a repetir padrões de comportamento, automaticamente, como ocorre no neurótico ob-sessivo-compulsivo. A proposta freudiana de cortar esse ciclo, dando um novo signifi-

Psicanalistas realizam seu 45º Congresso Mundial em Berlim

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Associação Brasileira de Psicanálise Notícias e Programação

SPR realizou a XII Jornada de Psicanálise A Sociedade Psicanalítica de Recife realizou entre 20 a 22 de setembro,

a XII Jornada de Psicanálise e o VIII Encontro de Psicanálise da Criança e

do Adolescente. O tema escolhido foi “Psicanálise e Contemporaneidade”.

O propósito da SPR foi reunir nesse encontro científico psicanalistas, so-

ciólogo, antropólogos, escritores, médicos, psicólogos, juristas, educado-

res e assistentes sociais para o aprimoramento da prática profissional. Os

temas abordados na Jornada foram: “Psicanálise e Solidão de Nossos Dias”,

“Psicanálise e Medicina”,” Psicanálise e Comunicação”, “Psicanálise e Litera-

tura”, “Psicanálise e Ética”, “A clínica psicanalítica hoje”, “O Masculino e o

Feminino em Psicanálise”, “Quando a agressividade Transborda” e “Criança

– Onde andam os limites?”

A SPR lançará ainda este ano o 5° volume da Psicanálise em Revista. Este

número contará com dois artigos inéditos de Robert Carper e Antonino

Ferro. Além disso, a revista possui artigos de David Zimerman e Mario

Smulever, que foram apresentados na última Jornada de Psicanálise da

SPR em 2006. No número, tem ainda um artigo de Andréa Sabbadini, re-

sponsável pelo evento de psicanálise e cinema na Europa e coordenador

do Programa de Psicanálise e Arte na Sociedade Psicanalítica Britânica.

Ainda na sessão de Psicanálise e Cinema, foram editados trabalhos de

Alexandre Figuerôa e Suzana Tonim.

Núcleo de Belo Horizonte tem a XV Jornada AnualO Núcleo Psicanalítico de Belo Horizonte promoveu de 16 a 18 de agosto

a XV Jornada Anual - Sempre a Clínica Psicanalítica. No dia 18 de agosto

foi realizado simultaneamente o I Encontro de Núcleos da IPA no Brasil e

o Encontro do Conselho Profissional da ABP. No dia 4 de setembro, na PUC

Minas, aconteceu o Projeto Criatividade e Pós Modernidade - “Estamira em

Debate”. Além disso, em todos os sábados pela manhã ocorreram os Diálogos

Psicanalíticos e o Curso de Psicoterapia de Orientação Psicanalítica, sendo

este último realizado quinzenalmente.

SBPSP promoverá Congresso Interno em outubro A SBPSP realizará Congresso Interno, no período de 26 a 28 de

outubro, em Atibaia (SP), com a idéia de estimular e fornecer sub-

sídios para a discussão entre membros e candidatos sobre o tema:

“A análise do analista e nosso sistema de formação”. Na ocasião, a

diretoria do Instituto e a Comissão Organizadora composta por Luís

Carlos Menezes (coordenador), Antônio Carlos Eva, Cláudio Rossi,

Miriam M. Brambilla Altimari, Myrna Pia Favilli e Nilde J. Parada

Franch estarão promovendo alguns eventos no segundo semestre,

sempre nos finais de semana, para favorecer a presença de todos.

Já em agosto, a SBPSP teve a presença de Raul Hartke, diretor da

SPPA, com a palestra: “Diálogos sobre a formação psicanalítica:

desafios, propostas e perspectivas”. Este evento fez parte do Eixo

Conceitual promovido pela Comissão Científica e foi patrocinado

pela Comissão de Integração dos Institutos da ABP. Em setembro,

a entidade teve a presença de Luiz Meyer (SBPSP) com a palestra

“A análise didática deve ser mantida?”, trabalho que foi apresen-

tado no 45º Congresso da IPA, em julho, na cidade de Berlin. Em

outubro, nos diass 06 e 07, a SBPSP será sede do 11º Encontro dos

Institutos da FEPAL, com o Comitê de Educação da Fepal. Além das

discussões sobre a “A análise dos analistas”, o evento trará a opor-

tunidade de trocas de experiências nas seis supervisões cruzadas

programadas.

NPCR promoveu a II Jornada de Psicanálise da Criança e do Adolescente

O Núcleo de Psicanálise de Campinas e Região realizou, nos dias 21 e 22 de

setembro, a II Jornada de Psicanálise da Criança e do Adolescente. Durante o

evento foram apresentados temas livres, pôsteres e trabalhos relacionados

ao assunto do encontro. O NPCR, agora tem novo endereço: Avenida

Francisco José de Camargo Andrade, nº 630 Jardim Chapadão – Campinas

– SP. CEP: 13.070-055. Telefone: (19) 3243-6166. E-mail: secretaria@npcr.

com.br. Página na internet: www.npcr.com.br.

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Associação Brasileira de Psicanálise

SBPdePA comemora filiação à IPA A SBPdePA está comemorando no ano de 2007 seus 15 anos de filiação à

IPA. Para a ocasião, organizou atividades que vão desde um jantar comem-

orativo com todos os membros da instituição e convidados especiais, até

a inauguração de uma galeria de quadros/memória de todas as diretorias

que já passaram pela SBPdePA. O fechamento do ano comemorativo será

a jornada anual, que terá como convidado especial o psicanalista francês

Renè Roussillon.

Paralelamente, a IPA autorizou a SBPdePA (através da COCAP - Child and

Adolescent Psychoanalysis Committee ), a dar início à formação de psica-

nalistas de infância e adolescência no seu Instituto. A decisão foi tomada

na reunião do board da IPA, em Berlim. Em setembro, começaram os Semi-

nários Clínicos, que acontecem todas quintas-feiras. O evento tem a coor-

denação do dr. Renato Trachtenberg.

Cine-Forum A SBPdePA continua sua programação com a comunidade (parcialmente

financiada pelo fundo DPPT/IPA), através de grupos de estudos e o Cine-

Forum para estudantes e profissionais da área da saúde e educação. Os

cine-foruns são dirigidos ao público interessado em cinema a psicanálise. A

entrada é grátis e as sessões acontecem aos sábados. No dia 11 de agosto

foi apresentado o filme Perfume e no dia 27 de outubro será a vez do Por

amor a Nancy.

Programação da série Brasileira na Cultura: Em setembro: Amor na novela brasileira; Em 31 de outubro: Amor no filme “Amores Possíveis”; Em 28 de novembro: Amor no filme “Cidade dos Anjos”.

Notícias e Programação

Núcleo de Aracajú promove I Jornada Sergipe/Bahia de PsicanáliseO Núcleo Psicanalítico de Aracajú (NPA) estará realizando, em parceria com o Centro de Estudos Psicanalíticos de Salvador (CEPssa), a I Jornada Ser-gipe/Bahia de Psicanálise, de 4 a 6 de outubro, no Aquarios Praia Hotel. Na mesma ocasião, será realizado a VIII Jornada de Psicanálise de Aracaju e o VII Encontro de Psicanálise da Criança e do Adolescente. O tema central do evento será “Desafios à clínica: doenças da contemporaneidade”, distribuído em três conferências, seis mesas-redondas e uma discussão clínica. Já es-tão confirmadas as presenças de Pedro Gomes (SBPRJ, Presidente da ABP), Cristina Gondim (SBPSP, Presidente do CEPssa), Leda Delmondes (Presi-dente da ABMP, Regional Aracaju), Adalberto Goulart (Presidente do NPA), Claudio Rossi (SBPSP), Rosa Reis (SPRJ), Telma Barros (SPR), Jair Escobar (SPPA), Leonardo Francischelli (SBPdePA), Sérgio Nick (SBPRJ), Sérgio Cyrino (APERJ), Leila Guimarães (SPMS), Aparecida Nicoletti (SBPSP), Carlos Vieira (SPB/SPR/NPA), Fernando Santana (SPR/NPA), Marinella Benez (CEPssa), Stela Santana (SPR/NPA), Leopold Nosek (SBPSP), e das candidatas do NPA Angélica Hermínia Serôa, Vanda Pimenta e Petruska Passos. Informações e inscrições pelos telefones: (79) 3246-5729 e (71) 3271-5024.

Já de 27 a 29 de março de 2008, o NPA estará realizando, com co-laboração do Istituto Psicoanalitico di Formazione e Ricerca A.B. Ferrari, de Roma, o Congresso Internacional sobre o Corpo em Psicanálise, que terá como temas principais “A construção da identidade de gênero na adolescência”, “Processos maníaco-depressivos” e “Porque se inicia uma análise?”. Além do congresso, haverá também um curso sobre a hipótese do Objeto Originário Concreto. Durante os eventos estarão presentes psi-canalistas italianos, franceses, ingleses, latino-americanos e brasileiros.

RBP sugere temas para 2008A Revista Brasileira de Psicanálise propõe os seguintes temas para a sua publicação trimestral: • O que eu faço é psicanálise. O que você faz, não; • Winnicott: um novo paradigma?; • Cultura na clínica; • Meltzer: a evolução do analista. Além dos textos temáticos, a revista continuará recebendo artigos variados que se enquadrem na linha editorial e que estejam de acordo com as normas que se encontram publicadas no último número de cada volume, na página na internet (www.rbp.org.br) e no portal de periódicos eletrônicos em psicologia – PePSIC (www.bvs-psi.org.br) . O editor da Revista Brasileira de Psicanálise, Leopold Nosek, quer contar com a maior colaboração possível.

Evento reúne NPMR e SBPSPNos início de julho, o Núcleo de Psicanálise de Marília e Região(NPMR)

recebeu as visitas do dr. Luís Carlos Menezes, presidente da Sociedade

Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP) e do dr. Humberto Silva

Menezes Júnior (diretor regional da entidade). O principal objetivo do

evento foi a troca de experiências, promovida pela SBPSP com sua

Diretoria Regional. Os visitantes tiveram a oportunidade de conhecer

o funcionamento do Núcleo com a apresentação de relatórios das

diversas comissões coordenadas pelo Conselho Diretor.

O NPMR foi criado em 1994 e tem feito um trabalho de divulgação

da psicanálise para a comunidade por meio de prestação de serviços,

através de atendimento clínico a custos reduzidos e cursos para

estudantes e terapeutas com atividades periódicas, reunindo pessoas

interessadas em refletir sobre os aspectos das relações humanas

contemporâneas. Além disso, o NPMR oferece à comunidade dos

terapeutas da região Curso de Especialização em Psicoterapia

Psicanalítica, em parceria com a UNIVEM. Este curso é reconhecido

como pós-graduação pelo MEC.

Grupo de Guadalajara promove diálogo entre homens e mulheresO Grupo Psicanalítico de Guadalajara realizará nos dias 30 e 31 de Maio de 2008, um diálogo entre homens e mulheres, em comemoração do 10° an-iversário da COWAP (Comitê de Mulheres e Psicanálise). O tema do diálogo será “Gênero e Psicanálise: Contribuições contemporâneas”. O evento será realizado no hotel Victória Express, na Av. López Mateos Sur, n°1360, na ci-dade de Guadalajara, estado de Jalisco, México. As reservas podem ser feitas através do e-mail: [email protected]

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Palestras e cinema no NPMNo dia 13 de agosto, o Núcleo Psicanalítico de Maceió promoveu uma palestra, seguida de debate, sobre a “Evolução de uma paciente em análise”, proferida pela dra. Maria de Fátima Montenegro do Amaral Costa, psicóloga e candidata a SPR . Outra palestra organizada pelo NPM foi realiza-da no dia 3 de setembro, que teve como tema “O declínio da função paterna e seu reflexo na clínica de adolescentes”. Foi ministrada pela dra. Jerzuí Thomaz. No ciclo Cinema e Psicanálise houve a exibição do filme “Os Companheiros”, no dia 25 de agosto, comentado pelo prof. Radjalma Cavalcante.

Notícias e Programação

APRio3 promove reuniões científicas Em junho, o departamento Científico da APRio3 inaugurou uma série de reuniões científicas, que tem como objetivo despertar a discussão em torno de aspectos relacionados ao “Paciente que nos procura”, tendo como cenário a sociedade contemporânea. As reuniões contaram com a apresen-tação do trabalho dos drs. José Alberto Zusman e Waldemar Zusman.

Em julho, membros da Sociedade participaram do curso promovido pela ABP em parceria com a Associação Brasileira de Psiquiatria: “Concepção Psi-canalítica de Temas Psiquiátricos - Caminhos para a atenção integrada em Saúde Mental”. No evento, Débora Regina Unikowski falou sobre “Psicanálise de Crianças” e Marisa Helena Monteiro sobre o “Transtorno Borderline”.

Em agosto, a APRio3 foi representada no evento “Supervisões Cru-zadas” por Patrícia Mussoi, como apresentadora de material clínico, e por Cláudio Cals de Oliveira, como supervisor. Este evento é o início de uma série, que se sucederão no decorrer deste ano e terá como sede a Rio 2.

SPPA promove IX Simpósio de Psicanálise da Infância e da AdolescênciaO IX Simpósio de Psicanálise da Infância e da Adolescência, promovido pela Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, e o II Encontro SPPA/APdeBA de Psicanálise da Infância e Adolescência, realizados entre os dias 27 e 29 de setembro, reuniram psicanalistas de Porto Alegre e da Argentina para debater o tema “Parentalidade e suas implicações no processo psicanalítico”. Os eventos contaram com a participação do convidado dr. James Herzog, psicanalista da Associação Psicanalítica Americana. A SPPA realizou também nos dias 29 e 30 de junho seu IV Simpósio de Investigação em Psicanálise, que nesta edição debateu “A observação, o observador e a realidade psíquica”. A atividade contou com a participação do pesquisador Ivan Izquierdo (PUC-RS) e dos psicanalistas Benzion Vinograd, da Sociedade Argentina de Psicanálise e Julieta Ramalho, da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.No dia 6 de julho, a SPPA recebeu a visita do dr. Norberto Marucco, presidente da Associação Psicanalítica Argentina, para debater seu trabalho “Entre el recuerdo y el destino: la repetición”, que foi posteriormente apresentado no 45º Congresso Internacional de Psicanálise, realizado em Berlim. A SPPA organizou e lançou em 11 de julho o livro “Psicanálise e Cultura: homenagem aos 150 anos de Sigmund Freud”. Reunindo trabalhos apresentados em atividades comemorativas do sesquicentenário de nascimento de Freud (2006) e artigos escritos por convidados, o livro, editado pela Casa do Psicólogo, foi lançado durante o XXI Congresso Brasileiro de Psicanálise.Para encerrar a programação, que ao longo de um ano abordou o Método Psicanalítico, a SPPA recebeu nos dias 25 e 26 de maio, a visita da dra. Sonia Abadi, psicanalista da Associação Psicanalítica da Argentina, para debater Winnicot na atualidade. Já nos dias 10 e 11 de agosto, foi a vez do dr. Paul Denis, psicanalista da Sociedade Psicanalítica de Paris, visitar a entidade para debater seu trabalho “A pulsão de dominação” e supervisionar casos clínicos. E nos dias 24 e 25 de agosto, o dr. Arnaldo Chuster, psicanalista da Associação Psicanalítica do Rio de janeiro – Rio-4, esteve na SPPA para proferir conferência com o tema “As origens do inconsciente em Bion”.

Ainda em agosto, a SPPA, em conjunto, com a Federação Israelita do RS e as entidades Wizo e Na’mat Pioneiras, promoveu, no Auditório da Federação Israelita, uma sessão de cinema para debater o filme “Our Children”, realizado em 1946 e que aborda as vivências de crianças sobreviventes da II Guerra Mundial.

No dia 23 de agosto, a SPPA realizou uma atividade de homenagem ao centenário de nascimento do psicanalista Cyro Martins, um dos pioneiros da psicanálise em Porto Alegre.

Em setembro, começaram os Seminários Clínicos, que aconte-cem todas quintas-feiras. O evento tem coordenação do dr. Renato

Trachtenberg.

SBPRJ divulga Programação CientíficaEm agosto, ocorreu a sessão Clínica “Psicanálise do adolescente” apre-sentada por Wania Peçanha de Oliveira e comentada por Paulo Humberto Bianchini. Houve ainda o Fórum Livre de Psicanálise, apresentado por Carlos Doin e o Encontro clínico entre os quatro Institutos do Rio, com supervisões cruzadas - Parte II. Além disso, reunião com apresentação do pôster exibido no Congresso de Berlim pelo Grupo de Estudos sobre Envelhecimento e Mesa-redonda SBPRJ / ABPsiquiatria / COWAP sobre o tema “Sexualidade, compulsão: uma questão de gênero?

Em setembro, houve o Fórum Livre de Psicanálise, apresentado por Carlos Doin; Reunião Científica “Vim obrigado”, apresentado por Bernard Miodownik e restrita aos membros da IPA.

Em outubro, no próximo dia 4 haverá Sessão Clínica, apresentada por Altamirando Matos de Andrade Jr; no dia 18, Fórum Livre de Psicanálise, apresentado por Carlos Doin, no dia 26, Fórum Psicanálise e Interface So-cial “Rio: que cidade é essa?”, uma realização SBPRJ /Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ. Finalmente, em novembro, no dia 08, Sessão Clínica apresentada por Maria do Carmo Andrade Palhares e comentada por Edna Vilete, e nos dias 09 e 10, evento preparatório para o Congresso Internacio-nal de Bion - Roma 2008.

A SBPRJ informa ainda que o tema do próximo número da Revista TRIEB será “Psicanálise e Literatura” e que o Café Literário acontece todas as segundas 6ª feiras do mês, às 17 h, e é aberto ao publico externo.

SBPRJ - Rua David Campista, 80 – Humaitá – Rio de Janeiro.

Tel: (21) 2537-1333. E-mail: [email protected]

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Aprender com o pacienteExistem diferenças nos três modelos de treinamento reconhecidos pela IPA; eles têm em comum, no entanto, o tripé constituído de seminários teóricos, análise pessoal e supervisão. Contudo, diferen-temente dos dois primeiros elementos desse tripé, não se encontra bem definido o que um supervisor ou um supervisionando estão re-almente fazendo, quando dizem que se encontram realizando uma supervisão. É do nosso conhecimento que algumas duplas supervi-sor/supervisionando se debruçam sobre o material integral das qua-tro ou cinco sessões semanais do paciente. Outras, sobre o material de duas sessões, acompanhado ou não do resumo das demais. Não faltando as que se ocupem de uma única sessão semanal ou de ape-nas um fragmento de sessão. Apesar dessas diferenças, todos esses procedimentos são denominados ‘supervisão’. A primeira questão que cabe ser considerada é se um candidato que supervisionou apenas uma sessão semanal de dois pacientes durante 160 semanas - totalizando, portanto, 160 sessões - e um candidato que supervisionou quatro sessões semanais de dois pacientes duran-te o mesmo período - totalizando 640 sessões - receberam o mesmo treinamento. Alguém poderá argumentar que tal diferença revela apenas uma questão quantitativa, a qual não leva em consideração a qualidade do trabalho realizado. Não obstante, é em relação à ex-tensão do material supervisionado a que se refere André Green: “Uma sessão só se compreende em seu movimento. Não serve para nada tomar um dos seus elementos e dizer: <Impactou-me isto ou aquilo...>. É o que às vezes acontece em uma supervisão. Terminado o relato das sessões, pergunta-se ao candidato: <O que você pensa do que acabou de ler?>. Ele responde: <Impactou-me tal coisa...> e cita um elemento da sessão. Isto não vale nada”. Ampliando o ponto de vista de Green, podemos dizer igualmente que uma semana de análise ou, ainda, uma análise como um todo só se compreende em seu movimento, não podendo ser examinada

de uma forma mutilada. Na verdade, a compreensão de um frag-mento de sessão ou de uma única sessão retirada de uma seqüência, além de, inevitavelmente, desprezar as particularidades relacionadas com o início e o fim do período de tempo considerado, não leva em conta as motivações inconscientes implicadas no processo de seleção do material, comprometendo o objetivo geral da supervisão que, de acordo com o minucioso relatório sobre formação analítica elaborado pelo Instituto de Psicanálise da SPMS , é proporcionar a integração das aquisições da análise, dos seminários e a vivência com o paciente”. Ao basear-me na minha experiência de formação como supervisio-nando, que resulta na forma como trabalho como supervisor, en-tendo a supervisão como uma oportunidade de o supervisionando aprender com o supervisor a “aprender com o paciente”, não dis-pensando, por essa razão, nada do quanto ele e o paciente dizem e fazem ao longo do tratamento. Em contrapartida, um fragmento semanal e, com toda a certeza, uma passagem impactante de sessão se prestam mais para o supervisionando “aprender com o supervi-sor”, ou seja, com os seus conhecimentos mobilizados pelo material clínico apresentado. Essa prática se superpõe à experiência dos se-minários teóricos e, mais particularmente, ao chamado “seminário clínico” – no qual o material clínico é apresentado com o objetivo de corroborar e enriquecer a teoria. Por último, levando em consideração as duas citações acima, per-gunto-me se é possível considerar um processo de fragmentação do discurso do paciente, e por via de conseqüência do supervisionando, fora do sistema defensivo, não se podendo excluir nesse procedi-mento eventuais conluios inconscientes supervisor/supervisionando com vista à escotomização de determinados temas, estes sim, verda-deiramente “impactantes”.

Gley P. Costa Membro titular e didata da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre (SBPdePA)

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Associação Brasileira de Psicanálise Cultura

Há muito tempo, diariamente, estamos sobrevivendo, algo bem diferente de viver. Para o nosso alívio, veio os Jogos do Pan e nos agarramos a ele, ávidos por um momento de relaxamento, um pouquinho de alegria, paz e de sonhos. Afinal, o Rio está lindo e cheio de esperança. Nosso hino é cantado a cada medalha conquistada, embalada pelo coro “sou brasileiro com muito orgulho”. Vivemos alguns poucos dias como se estivéssemos em paz, sem tiroteio, balas perdidas, novas denúncias de corrupção, embora lá no fundo todos nós soubéssemos - mas não queríamos reconhecer - que tudo continuava acontecendo. De repente, como se acordássemos de um sonho, a realidade se impõe mais uma vez: um avião explode, levando quase 200 vidas. Não importa se foi uma falha mecânica, a chuva, a pista. Só podemos falar em tragédia quando um fato acontece inesperadamente. Não podemos admitir como tragédia algo que vinha se anunciando. Por se anunciar, ela mesma está nos dando chance de evitá-la, clamando por ações.Após o ocorrido, resta a sociedade chorar, se culpar para aliviar a própria culpa, culpar e pedir indenização. Mas o que vamos indenizar? Quanto vale os abraços que os filhos que ficaram órfãos deixarão de receber?Quanto vale o vazio deixado em uma família pela ausência de um filho que esta-va iniciando a vida ou uma carreira? Quanto vale uma vida interrompida abruptamente? E os sonhos não realizados? E as lembranças traumáticas e a culpa que padecem os que sobreviveram?O que constatamos é como estamos desamparados. A cada acidente, a cada falcatrua descoberta aparecem pessoas que sabiam, relatórios que as-sinalavam, pessoas que se omitiam, ou que quiseram se beneficiar. A outra tragédia, também anunciada, está relacionada à ignorância e a omissão. Por que nos omitimos? Talvez por estarmos nos sentindo comple-tamente impotentes, sem esperança e sem confiança no outro e no futuro. Podemos nos conformar e pensar:“ A vida é assim”. Mas quem faz a vida ser assim? O ser humano tem a capacidade de se desenvolver e, através de sua experiência de vida, pode se tornar uma pessoa integrada, íntegra e útil para a sociedade. Para isso, entretanto, ele necessita que o meio lhe ofereça condições favoráveis. Nós , psicanalistas, nos preocupamos com as conseqüências das invasões, dos traumas e da violência do ambiente, pois acarretam paradas e distorções no desenvolvimento, especialmente, na criança, mas também no adulto.Estamos a todo o momento experimentando a sensação de que algo muito ruim vai nos acontecer. Na verdade, tememos o que já aconteceu. Já fecha-mos nossas casas, colocamos grades em nossos prédios. Dia a dia, mais e mais, vamos nos isolando. Em contato com tanta violência e hostilidade, que tipo de cidadão esta-remos criando? Pessoas que se submetem à violência e à força ou pesso-as que reativamente usam da mesma violência para esconder seu próprio medo e sua fragilidade. Quando a sociedade não está cuidando do cidadão, oferecendo condições de vida, resta-nos apenas, como na guerra, tentar

Apagão, corrupção, violência... por que nos omitimos ?

sobreviver e, como conseqüência, deixamos de entrar em contato conosco e, assim perdemos as possibilidades de criar , amar, cuidar e confiar em si e no outro. A sensação de imprevisibilidade e a destruição da confiança nos levam à construção de defesas que utilizamos para não reviver a angústia do desamparo, da rejeição. Uma vez experimentada esta angústia, lutamos ferrenhamente para não revivê-la. Quando a Psicanálise foi criada, se reconhecia repressão como uma defesa, comumente utilizada, para fazer desaparecer da consciência sentimentos ruins, negativos, não oportunos. Hoje percebemos, com freqüência, pessoas com um funcionamento mental onde o que prevalece como mecanismo de defesa é uma cisão nas partes que formam a nossa personalidade. Não há mais conflito. Pais defendem seus filhos que espancaram e roubaram uma empregada doméstica ou uma prostituta, “porque são jovens”. Esta cisão permite o vale tudo nas relações pessoais, políticas, de negócios etc. Na repressão, deveria haver um conflito entre as várias instâncias psíquicas (supergo, ego e id, o ego tentando “negociar” com as outras duas partes). Se uma parte da personalidade busca colocar toda a sua violência e, des-trutividade sobre o outro, haveria uma outra parte para dizer que isto não é aceitável. Partiríamos, então, para a negociação interna, dentro de nós mesmos, ou para a repressão. Agora não, a personalidade efetivamente se divide e o lado que quer destruir fica separado daquele que poderia nos lembrar das conseqüências dos nossos atos para nós e para os outros.Assim, a pessoa que desvia um dinheiro destinado a cuidar da saúde da população não se sente responsável pela morte do cidadão que não recebeu assistência adequada, porque não relaciona o dinheiro desviado à impos-sibilidade da compra de aparelhos, remédios ou pagamentos dos profissio-nais necessários. Da mesma forma, quem consome drogas não se sente responsável pelo aumento da violência relacionado ao tráfico ou, quem faz da educação um comércio, não se responsabiliza pela qualidade do ensino. Quem permite a decolagem de uma aeronave com problemas ou a constru-ção ou liberação de uma pista de pouso com eventuais problemas não se sente mais responsável pelas conseqüências de suas ações.Estamos num momento bem diferente de 40 anos atrás, quando havia hos-pitais e escolas que tinham condições de atender à população. Hoje, temos a saúde e a educação usadas como um bem de consumo e não um bem precioso que todo cidadão deveria ter acesso. Isto faz parte da violência que vai destruindo a pessoa e também a Nação.Elegemos líderes que não cumprem as promessas de campanha. Depois de eleitos se tornam privilegiados, recebendo mordomias, bons salários e aplausos, deixando de ver o cidadão que é submetido a todo tipo de des-respeito. Cidadão que luta para sobreviver, sem as condições mínimas que o façam crescer como pessoa para desenvolver a sua capacidade de relaxar, criar e refletir, contribuindo assim para a sociedade. Ao não investir e res-peitar o cidadão, a Nação perde sua grande chance , abrindo caminhos para sua própria destruição.

Rosa ReisMembro efetivo da SPRJ e diretora da ABP

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No meio do caminhoNo meio do caminho tinha uma pedratinha uma pedra no meio do caminhotinha uma pedrano meio do caminho tinha uma pedra.Nunca me esquecerei desse acontecimentona vida de minhas retinas tão fatigadas.Nunca me esquecerei que no meio do caminhotinha uma pedratinha uma pedra no meio do caminhono meio do caminho tinha uma pedra.

Carlos Drummond de AndradeEm Alguma PoesiaEd. Pindorama, 1930

os 84 anos, em 17 de agosto de 2002, morria Carlos Drummond de Andradde, con-siderado o mais importante dos poetas modernos. Seus poemas foram traduzidos em, pelo me-nos, 12 idiomas. Sua obra refle-tia o comportamento humano. Seus olhos vasculhavam o Brasil e o mundo. Resultado: Mais de 80 livros publicados entre con-tos, poesias, ensaios e crônicas. Mineiro de nascimento, carioca por adoção. Contestado e for-temente criticado pelo poema No meio do caminho (publicado nesta página), hoje sabemos me-lhor do que ninguém a quantas e que pedras Drummond se refe-ria. Tropeçamos em muitas delas diariamente em todas as áreas.Acreditem, mas quando estuda-va no colégio Anchieta em Nova Friburgo, região serrana, do Rio, foi expulso por “insubordinação mental”. E mais: foi um buro-crata, funcionário público até se aposentar em 1962. Como é di-fícil viver de arte neste país. Mas a história dá mil voltas. Em 1987, a escola de samba Mangueira ganhava o desfile de Carnaval, tendo Drummond como enre-do. E hoje, ele descansa sentado, em forma de escultura, olhando com sabedoria a paisagem, num banco da praia de Copacabana, bairro onde morou grande parte de sua vida.

Drummond: 20 anos de uma ausência sentida

Cultura