Breve Abordagem da Usucapião Especial Urbana Coletiva sob...

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1 Breve Abordagem da Usucapião Especial Urbana Coletiva sob o enfoque do Direito Processual Coletivo Brasileiro Silvia de Abreu Andrade Portilho 1 RESUMO: A Usucapião Especial Urbana Coletiva, modo de aquisição do direito de propriedade previsto no Estatuto da Cidade, constitui, no direito brasileiro, um importante mecanismo de tutela coletiva a favor da população de baixa renda. No tema aqui tratado, a usucapião especial urbana coletiva é analisada do ponto de vista do direito processual coletivo brasileiro, enquanto espécie de direito individual homogêneo. Este instituto, ao proporcionar a aquisição do direito de propriedade por grupo de possuidores enquanto coletividade, enquadra-se perfeitamente na categoria das demandas coletivas, que se caracterizam como processos de interesse público. Em se tratando de demanda coletiva, busca-se demonstrar a ampla efetividade do instituto para proteção do grupo de possuidores, seja pela atuação das associações de moradores, ou mesmo com a possibilidade de ajuizamento de ação civil pública, por parte do Ministério Público, para a defesa do direito à moradia desta coletividade. Fica patente, assim, a relevância desta modalidade de usucapião, enquanto demanda coletiva e enquanto instrumento de política pública urbana voltada para a regularização dos inúmeros assentamentos urbanos informais. PALAVRAS-CHAVE: propriedade; posse; Usucapião Urbana Coletiva; direitos coletivos; direitos individuais homogêneos. 1. INTRODUÇÃO O presente artigo tem por objetivo efetuar uma breve abordagem do inovador instituto da usucapião especial urbana coletiva, instituída pela Lei n.º 10.257/01, denominada Estatuto da Cidade, e da interpretação de suas normas no âmbito do direito processual coletivo. A interpretação das normas do instituto da usucapião especial urbana coletiva é efetuada à luz dos princípios e diretrizes consagrados na Constituição da República de 1988, que instituiu, em seu artigo 1º, o Estado Democrático de Direito. 1 Advogada; Mestra em Direito Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Pós- Graduada em Direito Público (Newton Paiva) e Direito Processual Civil (UGF); Professora de Direito Civil, Prática Civil e Hermenêutica Jurídica na Faculdade de Ciências Jurídicas Professor Alberto Deodato.

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Breve Abordagem da Usucapião Especial Urbana Coletiva sob o enfoque

do Direito Processual Coletivo Brasileiro

Silvia de Abreu Andrade Portilho1

RESUMO: A Usucapião Especial Urbana Coletiva, modo de aquisição do direito de propriedade previsto no Estatuto da Cidade, constitui, no direito brasileiro, um importante mecanismo de tutela coletiva a favor da população de baixa renda. No tema aqui tratado, a usucapião especial urbana coletiva é analisada do ponto de vista do direito processual coletivo brasileiro, enquanto espécie de direito individual homogêneo. Este instituto, ao proporcionar a aquisição do direito de propriedade por grupo de possuidores enquanto coletividade, enquadra-se perfeitamente na categoria das demandas coletivas, que se caracterizam como processos de interesse público. Em se tratando de demanda coletiva, busca-se demonstrar a ampla efetividade do instituto para proteção do grupo de possuidores, seja pela atuação das associações de moradores, ou mesmo com a possibilidade de ajuizamento de ação civil pública, por parte do Ministério Público, para a defesa do direito à moradia desta coletividade. Fica patente, assim, a relevância desta modalidade de usucapião, enquanto demanda coletiva e enquanto instrumento de política pública urbana voltada para a regularização dos inúmeros assentamentos urbanos informais. PALAVRAS-CHAVE: propriedade; posse; Usucapião Urbana Coletiva; direitos coletivos; direitos individuais homogêneos.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo efetuar uma breve abordagem do

inovador instituto da usucapião especial urbana coletiva, instituída pela Lei n.º

10.257/01, denominada Estatuto da Cidade, e da interpretação de suas normas

no âmbito do direito processual coletivo.

A interpretação das normas do instituto da usucapião especial

urbana coletiva é efetuada à luz dos princípios e diretrizes consagrados na

Constituição da República de 1988, que instituiu, em seu artigo 1º, o Estado

Democrático de Direito.

1 Advogada; Mestra em Direito Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Pós-Graduada em Direito Público (Newton Paiva) e Direito Processual Civil (UGF); Professora de Direito Civil, Prática Civil e Hermenêutica Jurídica na Faculdade de Ciências Jurídicas Professor Alberto Deodato.

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A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 tem como

principal ideal a plena efetivação dos direitos humanos fundamentais, uma vez

que a dignidade da pessoa humana, a cidadania e o pluralismo são colocados

como fundamentos deste Estado Democrático de Direito. Nas palavras de

Saulo Versiani Penna:

“Diferentemente de algumas Constituições anteriores, nas quais se podia perceber a predominância absoluta de uma camada social superior, a de 1988 foi um trabalho de grupos de interesses bastante diversificados. O resultado alcançado foi, inevitavelmente, um texto bem heterogêneo, com partes que conflitam entre si e às vezes até se contradizem.”2 (p.19-20)

Desta forma, nesse novo paradigma, torna-se fundamental que a

sociedade abandone sua postura, até então passiva, e passe a adotar uma

postura pró-ativa, de luta. Luta pelo acesso à implementação dos direitos

fundamentais instituídos na Constituição da República atual, o que se traduz

em uma efetiva luta pelo exercício e construção da dignidade da pessoa

humana, prevista constitucionalmente.

As mudanças e reformas pretendidas pela Constituição da República

de 1988 podem ser operadas de várias formas, dentre elas com a

implementação de políticas públicas que venham a atender as diretrizes

trazidas pela Constituição, com a participação ativa dos três Poderes –

Executivo, Legislativo e Judiciário, e ainda, com a importante participação dos

cidadãos na construção desta sociedade igualitária e justa, proclamada pelo

Estado Democrático de Direito.

Sem dúvida, o Estatuto da Cidade, lei federal n.º 10.257 publicada

no ano de 2001, com a finalidade de regulamentar os artigos 182 e 183 da

Constituição da República, que tratam da política urbana, se traduz em um

importantíssimo diploma legislativo colocado à disposição dos cidadãos para a

implementação dos direitos fundamentais sociais.

A intenção deste breve artigo, portanto, é focar o instituto da

usucapião especial urbana coletiva, em alguns de seus aspectos processuais

relevantes. Justifica-se esta análise pela imensa importância que assume a

2 PENNA, Saulo Versiani. Controle Processual de Políticas Públicas no Brasil. Orientador: Prof. Dr. José Marcos Rodrigues Vieira. 2009. 314f. Tese (Doutorado em Direito). Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, p. 19-20.

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usucapião especial urbana coletiva no presente momento, como instituto

inovador, especialmente em se tratando de processo coletivo. São poucas as

discussões doutrinárias a respeito, sendo também escassa a jurisprudência.

Somam-se a isto as dificuldades já existentes quanto ao estudo do processo

coletivo no direito brasileiro. Ao que parece, o cidadão brasileiro ainda não está

ciente da importância de tal instituto na implementação de direitos

fundamentais atinentes a uma coletividade.

O instituto da usucapião3 é por demais antigo, e seus requisitos

genéricos e específicos são bem conhecidos por parte dos civilistas. A

doutrina, no entanto, ainda se acha por demais presa à figura da usucapião

individual da lei civil, e esta nova modalidade de usucapião coletiva se

desprende desta figura, pois possui nítido alcance social; é processo que visa

ao interesse público, não somente da coletividade em questão, mas da

sociedade como um todo. Trata-se, portanto, de típico processo coletivo, que

visa à implementação de direitos sociais, já que se propõe a solucionar

conflitos relativos à moradia e à utilização racional da propriedade nas áreas

urbanas.

2. AS AÇÕES COLETIVAS NO DIREITO BRASILEIRO

Por se tratar de aquisição do direito de propriedade por parte de um

grupo de possuidores, a usucapião especial urbana coletiva se enquadra, sem

dúvida, na categoria das demandas coletivas, que se caracterizam como

processos de interesse público.

A ação coletiva surge “em razão de uma particular relação entre a

matéria litigiosa e a coletividade que necessita da tutela para solver o litígio”.4

Vale destacar que a proteção aos direitos coletivos5 assegura a um

grupo de pessoas a possibilidade, por meio da ação coletiva, de solucionar

3 A palavra “usucapião” é aqui utilizada no gênero feminino, já que o vigente Código Civil Brasileiro de 2002, diferentemente do Código Civil anterior, acolheu a expressão “da usucapião”. Tal opção se deve à origem etimológica da palavra: em latim, “capio”, “capionis” é palavra do gênero feminino. 4 DIDIER Jr., Fredie; ZANETI Jr., Hermes. Curso de Direito Processual Civil: Processo Coletivo. Salvador: Editora Jus Podivm, 2009, v. IV, p. 33.

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determinada questão litigiosa de forma a coibir decisões antagônicas e, de

certa forma, anômalas, que sejam referentes à mesma situação jurídica ou

fática.

Neste sentido, Ricardo de Barros Leonel discorre: “a opção da via

coletiva colima o alcance da economia processual e da efetividade do

processo, evitar o conflito lógico de julgados em situações absolutamente

similares e permitir a imprescindível implementação do acesso à justiça.”6

O Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078/90, tratou das

ações coletivas, classificando, no parágrafo único de seu artigo 81, as

modalidades de interesses ou direitos que podem ser objetos de tutela coletiva

no direito brasileiro, destacando-se, assim, as categorias dos direitos difusos,

dos direitos coletivos em sentido estrito e dos direitos individuais homogêneos.

Percebe-se que a ação coletiva não exclui a possibilidade de

ingresso em juízo individualmente, já que a legitimidade individual do lesado

não pode ser usurpada. A intenção do legislador ordinário foi a de gerar maior

celeridade processual, protegendo direitos de um grupo ou da coletividade, e

não de retirar do titular do direito ameaçado sua possibilidade de ir

individualmente a juízo, o que neste caso acabaria por ferir seu direito

processual constitucional de acesso à justiça, insculpido no inciso XXXV, do

artigo 5º da Constituição da República de 1988: “a lei não excluirá da

apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”

5 Cumpre ressaltar a diferença existente entre as expressões “tutela de direitos coletivos” e “tutela coletiva de direitos”. A primeira expressão diz respeito à proteção dos direitos transindividuais, onde se incluem, segundo o Código de Defesa do Consumidor, os direitos difusos e os direitos coletivos stricto sensu, visto que caracterizados pela transcendência individual da titularidade e pela indivisibilidade da pretensão de direito material. Já a segunda expressão diz respeito à proteção de direitos individuais pela via coletiva, ou seja, a proteção jurisdicional de direitos subjetivos não coletivos por meio de ações coletivas. Nesta última categoria, encontram-se os direitos individuais homogêneos, cuja titularidade é determinada e o objeto é de natureza indivisível; entretanto, por opção legislativa, poderão ser processados coletivamente. (GOZZOLI, Maria Clara; CIANCI, Mirna; CALMON, Petrônio; QUATIERI, Rita (Coord.). Em defesa de um novo sistema de processos coletivos: estudos em homenagem a Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 191). Para Zavascki, direitos coletivos são direitos subjetivamente transindividuais e materialmente indivisíveis, constituindo denominação genérica para as duas modalidades de direitos transindividuais: o difuso e o coletivo stricto sensu. Já os direitos individuais homogêneos são, simplesmente, direitos subjetivos individuais. Assim, quando se fala em “tutela coletiva” de direitos homogêneos, o que se qualifica como coletivo não é o direito material tutelado, mas sim o modo de tutelá-lo, o instrumento de sua defesa. (ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 33-35). 6LEONEL, Ricardo de Barros. Manual do Processo Coletivo. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 98.

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Evidente, desta forma, a importância das ações coletivas no direito

processual constitucional brasileiro, já que se encontram em perfeita

consonância com as diretrizes democráticas traçadas na Constituição da

República de 1988, que proporcionaram, assim, uma verdadeira transformação

no direito processual pátrio, de uma postura individualista para uma postura

“totalizante na percepção e tratamento dos conflitos”7.

É com fundamento nos valores consagrados pelo Estado

Democrático de Direito, consoante já ressaltado, que o instituto da usucapião

especial urbana coletiva deve ser interpretado, já que a compreensão do

Direito e o estudo das normas jurídicas devem refletir, sempre, a ordem jurídica

vigente e a realidade social e política em que é contextualizada.

Dentre os direitos coletivos “lato sensu”, dispostos no já mencionado

artigo 81, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor, entende-se

que o direito do grupo de possuidores de baixa renda, na usucapião especial

urbana coletiva, melhor se enquadra na categoria dos direitos individuais

homogêneos, pelos motivos expostos a seguir.

Os direitos individuais homogêneos, previstos no inciso III do

parágrafo único do artigo 81 da Lei nº 8.078/90, conhecidos como “class action

for damages” nos Estados Unidos, tratam-se daqueles decorrentes de origem

comum. São direitos individuais, mas com a possibilidade conferida pela lei de

tratamento coletivo, em razão da massificação das relações jurídicas e das

lesões delas decorrentes.

Acerca da distinção entre os direitos coletivos stricto sensu e os

direitos individuais homogêneos, cabe ressaltar:

Com o escopo de distinção entre os coletivos e os individuais homogêneos, que na prática pode dar margem à confusão de uma com a outra categoria, pode-se a princípio, imaginar a utilização de vários critérios: o da expansão dos sujeitos (maior ou menor número de lesados), o da extensão do objeto (mais ou menos abrangente), e, finalmente, o do pedido formulado na demanda.8

Diante disso, percebe-se que um dos critérios de diferenciação entre

os direitos coletivos stricto sensu e os direitos individuais homogêneos reside

7 DIDIER JR.; ZANETI JR. Curso de Direito Processual Civil: Processo Coletivo, p. 31. 8 LEONEL, op. cit., p. 100.

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na intensidade. Assim, quando o direito violado se relacionar a número definido

de demandantes, estará evidenciado um direito individual homogêneo; de outro

modo, quando o número de atingidos for maior, apesar de determinável, tal

situação poderá remeter a um direito coletivo stricto sensu.

Evidentemente, tal critério não é único. A principal distinção, aliás,

ocorre quanto à divisibilidade do objeto, no que tange aos direitos individuais

homogêneos. Nesta categoria de direitos, o montante do quinhão ou da

reparação pode ser individualizado e inclusive distinto entre os seus titulares, o

que não ocorre, via de regra, em se tratando de direitos coletivos em sentido

estrito.

É com maestria que Leonel discorre sobre as características dos

direitos individuais homogêneos:

são características destes interesses: serem determinados ou determináveis os seus titulares; serem essencialmente individuais e surgirem em virtude de uma origem ou fato comum, ocasionando a lesão a todos os interessados”.9

Não há, na doutrina, unanimidade quanto à possibilidade de

enquadrar o direito dos possuidores, na usucapião especial urbana coletiva,

como direito coletivo stricto sensu ou como direito individual homogêneo.

A este respeito, o ilustre Benedito Silvério Ribeiro entende serem

individuais homogêneos os direitos dos possuidores na ação de usucapião

especial urbana coletiva:

A ação de usucapião coletiva exige que os interesses individuais sejam homogêneos, isto é, que procedam das mesmas circunstâncias de fato, portanto, que tenham origem comum. Os interesses devem ser de grupo determinável, e os direitos são divisíveis, observando-se os quinhões, que podem variar, mas que encontram um limite (até 250 m2 para cada qual). É possível que para algum dos ocupantes reste a ação improcedente, vindo a não satisfazer os requisitos legais (não prova de ocupação por cinco anos, existência de outro imóvel, oposição ou interrupção da posse).10

Por outro lado, Alexandre Freitas Câmara defende se tratar de

hipótese de direito coletivo stricto sensu:

9 LEONEL, op. cit., p. 387. 10RIBEIRO. Tratado de Usucapião, v. 2, p. 1043.

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A demanda de usucapião urbano coletivo é, a nosso sentir, uma verdadeira demanda coletiva, destinada a permitir que se obtenha tutela jurisdicional para os membros de um grupo, que se apresentam como titulares de interesse coletivo stricto sensu (já que o interesse na aquisição da propriedade urbana coletiva é indivisível, sendo determináveis seus titulares, e ligados entre si por uma relação jurídica base, que é a própria relação condominial que entre eles se estabelece).11

Não obstante o entendimento do ilustre processualista acima

mencionado, adota-se, aqui, o entendimento consagrado por Benedito Silvério

Ribeiro, concluindo-se configurar direito individual homogêneo o direito

postulado pelos possuidores na ação de usucapião especial urbana coletiva,

uma vez que o que vincula os possuidores é a mesma circunstância de fato,

cuja origem é comum e, além disso, todos os possuidores podem ser

identificados singularmente, quanto à titularidade do direito disputado.

Ademais, verifica-se ser divisível o objeto da ação de usucapião

especial urbana coletiva, tendo em vista que o artigo 10 do Estatuto da Cidade,

em seu parágrafo terceiro, admite que, na sentença, o juiz atribua frações

ideais diferentes do terreno aos possuidores, em hipótese de acordo escrito

entre os condôminos.

Ainda neste mesmo entendimento, destaca-se a opinião de Jesualdo

Almeida Júnior:

A conclusão de que o direito à usucapião coletiva é individual homogêneo infere-se do próprio texto legal. Como visto, os interesses desta ordem são divisíveis, podendo ser mensurado o quinhão pertencente a cada titular de antemão. (...) Vê-se, então, que o quinhão será idêntico para os substituídos, no caso de sentença judicial onde não houver acordo escrito entre os condôminos usucapientes. E, ainda, permite-se-lhes, por acordo escrito, estabelecerem de antemão suas frações ideais. Tais direitos são, portanto, divisíveis, com base em origem comum e, por conseqüência, devem ser encarados como direitos individuais homogêneos.12

No que tange à origem comum dos direitos individuais homogêneos,

Ricardo de Barros Leonel assim argumenta:

11 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2009, v. III, p. 385. 12 ALMEIDA JÚNIOR, Jesualdo E. As modificações da usucapião em face do Estatuto da Cidade. Artigo disponível em <http://www.zanoti-almeida.com.br/>. Acesso em 03 de abr. de 2012.

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A origem comum, não significa necessariamente uma unidade factual e temporal, uma única conduta no mesmo momento gerando a lesão aos interesses, mas sim a mesma fonte e espécie de conduta ou atividade, ainda que tenha sua ocorrência postergada no tempo em mais de uma ação.13

Desta feita, entende-se tratar a ação de usucapião urbana coletiva

de meio processual de proteção a direitos individuais homogêneos, muito

embora não haja pacificidade na doutrina a respeito. O que se torna relevante

neste momento, mais do que identificar o encaixe perfeito à qualidade do

direito tutelado, se coletivo em sentido estrito ou individual homogêneo, é o fato

de ter sido viabilizado mais um instrumento processual no direito brasileiro de

relevância social em favor da coletividade. Reforça tal novidade legal o

estabelecimento e a efetividade do direito processual coletivo no ordenamento

jurídico de forma a ampliar os meios de promoção e manutenção do Estado

Democrático de Direito.

3. LEGITIMAÇÃO PROCESSUAL ATIVA E PASSIVA NA USUCAPIÃO

ESPECIAL URBANA COLETIVA

As condições da ação, nas ações coletivas em geral, mostram-se

idênticas às exigidas nas ações individuais, sendo elas: a possibilidade jurídica

do pedido, a legitimidade ad causam e o interesse processual, nos termos do

artigo 267, VI do Código de Processo Civil em vigor.

Quanto à legitimidade ativa na ação de usucapião especial urbana

coletiva, cabe destacar que a mesma se encontra expressa no artigo 12 do

Estatuto da Cidade, aplicando-se à mesma, especialmente, os incisos II e III do

mencionado artigo 12.

Assim, o legislador ordinário, na tentativa de garantir à população de

baixa renda a aquisição do domínio, discriminou os meios de legitimação ativa

dos possuidores, seja em estado de composse, ou por meio de associação de

moradores, a qual atuará como substituta processual, uma vez que o direito

13 LEONEL. Manual do Processo Coletivo, p. 99.

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tutelado na ação de usucapião especial urbana coletiva, segundo se sugere,

trata-se de direito individual homogêneo.

Na modalidade de usucapião especial urbana coletiva, quem possui

legitimidade para atuar no polo ativo é o grupo de possuidores de baixa renda,

com o que se exige, obviamente, que se trate de pessoas físicas.

Desta forma, tem-se que os autores da ação de usucapião especial

urbana coletiva serão as pessoas de baixa renda que ocupem áreas urbanas

com mais de 250 m², com a finalidade de morarem sós ou com as suas

famílias. Se casados, os possuidores necessitam da outorga do seu consorte

para a propositura da ação, uma vez que o artigo 10 do Código de Processo

Civil Brasileiro de 1973, em seu caput, preconiza que “o cônjuge somente

necessitará do consentimento do outro para propor ações que versem sobre

direitos reais imobiliários.”

Devem estes possuidores, ainda, serem devidamente identificados,

já que será formado, após a sentença, um condomínio especial indivisível.

Assim entende Cordeiro:

Dessa forma, a identificação de todos os atuais prescribentes é imprescindível para a formação do condomínio, devendo, pois, todos assumirem o polo ativo da ação de usucapião, em litisconsórcio que deve ser necessário, para o preenchimento de todos os espaços da área ocupada, até porque é autora a coletividade de ocupantes da área usucapienda.14

Acerca da legitimidade ativa, o inciso I do artigo 12 da Lei nº

10.257/01 trata, primeiramente, do possuidor, seja isoladamente ou em

litisconsórcio originário ou superveniente. De acordo com tal dispositivo, o

possuidor, em nome próprio, poderia ingressar isoladamente em juízo com sua

pretensão. Cumpre ressaltar, no entanto, que a primeira parte do inciso I do

mencionado artigo não corresponde à modalidade de usucapião especial

urbana coletiva e, sim, tão somente à usucapião especial urbana individual,

uma vez que não é lícito que o possuidor, de forma isolada, reclame o domínio

coletivo da área.

14 CORDEIRO. Usucapião Especial Urbano Coletivo: abordagem sobre o Estatuto da Cidade, p. 161.

10

Assim, “a legitimação ordinária ativa impõe sempre um litisconsórcio,

necessário ou facultativo, segundo possam ou não possam ser os espaços

ocupados destacados sem desfigurar o todo.”15

Interessante mencionar o posicionamento de Alexandre Freitas

Câmara, que entende ser possível que o possuidor demande sozinho, na

qualidade de substituto processual da coletividade, em conformidade com o

previsto na primeira parte do inciso I do artigo 12 do Estatuto da Cidade:

Quando um (ou alguns) dos possuidores demandar sozinho, o demandante estará em juízo não só na qualidade de legitimado ordinário, mas também como legitimado extraordinário, atuando como substituto processual dos possuidores que não estiverem em juízo (já que a sentença de procedência, neste caso, reconhecerá não só a existência do direito do demandante, mas também dos outros possuidores que não forem partes da demanda). Faz-se mister, nestes casos, que a petição inicial indique quem são os substituídos processuais, a fim de que se possa reconhecer o direito de cada um deles a uma certa fração ideal de terreno.16

Ainda nesta linha de raciocínio, este mesmo jurista, de forma

inovadora, entende que o Estatuto da Cidade criou nova espécie de “ação

popular”, no caso em que o possuidor atua, sozinho, em nome da coletividade;

e de “ação civil pública”, quando a legitimidade for exercida pela associação de

moradores aos quais representa:

O Estatuto da Cidade confere legitimidade a qualquer dos co-possuidores para demandar a declaração da aquisição da propriedade coletiva pelos membros da comunidade (o que faz com que se esteja aqui, neste caso, diante de uma nova espécie de “ação popular”, que pode ser ajuizada por qualquer pessoa natural que se apresente como possuidora de uma parte da área usucapienda) ou pela associação de moradores, regularmente constituída (e, neste caso, ter-se-á uma nova espécie de “ação civil pública”, já que a associação é a pessoa adequada para buscar, em juízo, proteção para os interesses de seus associados).17

O inciso I do artigo 12 do Estatuto da Cidade menciona, ainda, a

legitimidade para agir do possuidor em litisconsórcio, seja originário ou

superveniente. Quanto à natureza do litisconsórcio ativo que se instala,

15 LIMA. Usucapião Coletivo e Desapropriação Judicial: Instrumentos de atuação da função social da propriedade, p. 57. 16 CÂMARA, Alexandre Freitas. Aspectos Processuais do Usucapião Urbano Coletivo. Revista da Esmese, Aracaju, n. 02, p. 41-52, 2002. Disponível em http://bdjur.stj.gov.br/xmlui /handle/2011/22242. Acesso em 06 de abr. de 2012. 17 CÂMARA. Lições de Direito Processual Civil, v. III, p. 384.

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necessário ressaltar que, se necessário for, a recusa de alguns possuidores na

participação do processo poderia impor obstáculos à concretização do direito

dos demais.

Francisco Loureiro destaca que, caso os ocupantes que se recusam

a litigar ocupem espaços que possam ser destacados sem desfigurar o todo, o

caso será de litisconsórcio facultativo; entretanto, se as posses dos moradores

que se recusam a litigar estiverem localizadas no interior da gleba e não

puderem ser destacadas do todo, o caso será de litisconsórcio necessário.18

A doutrina aponta uma interessante solução jurídica para tal

impasse, possibilitando ao grupo de possuidores ingressar com a ação coletiva

em juízo e proceder com a citação do possuidor omisso para integrar o polo

ativo da lide. Se este se recusar a participar da lide, caberá ao juiz verificar se a

procedência da demanda será oposta às suas conveniências, ou se esta

recusa configura abuso de direito. Caso o juiz entenda ser a recusa justificada,

o processo será julgado extinto e os demais possuidores deverão ingressar

individualmente, se for o caso, com a ação de usucapião especial urbana

individual.19

No inciso II do artigo 12 do Estatuto da Cidade, o legislador brasileiro

concedeu legitimidade ativa aos possuidores em estado de composse. Nesta

possibilidade de legitimação, os possuidores ingressam em juízo

conjuntamente, por meio de litisconsórcio necessário, que se encontra previsto

no artigo 47 do Código de Processo Civil Brasileiro de 1973.

Para Cordeiro,

Em que pese a possibilidade de composse que justifique a ocorrência de usucapião urbano simples, visto que, verbi gratia, nada impede que um casal, vivendo em união estável e tendo preenchido os requisitos do artigo 9º da Lei nº 10.257/01, ingresse com pedido de usucapião urbano individual, tem-se que a previsão do inciso II do artigo 12, em sua essência, está voltada para a modalidade coletiva.20

18 LOUREIRO, 2004 apud LIMA, Usucapião Coletivo e Desapropriação Judicial: Instrumentos de atuação da função social da propriedade, p. 55-56. 19 SILVA, Julian Gonçalves. As modalidades de usucapião e seus requisitos processuais. Artigo disponível em <http://www.conteudojuridico.com.br/monografia-tcc-tese,as-modalidades-de-usucapiao-e-seus-requisitos-processuais,36053.html>. Acesso em 05 de abr. de 2012. 20 CORDEIRO. Usucapião Especial Urbano Coletivo: abordagem sobre o Estatuto da Cidade, p. 197.

12

Desta forma, o estado de “composse” existente entre os

possuidores, mencionado pelo artigo 12, II do Estatuto da Cidade, não se

confunde com a composse a que faz menção o artigo 10, parágrafo 2º21 do

Código de Processo Civil de 1973. Esta última, como se depreende, diz

respeito tão somente à posse comum, exercida sobre o mesmo bem pelos

cônjuges ou casais em união estável.

Não obstante a divergência, compreende-se que a referência ao

estado de “composse” talvez se trate de imprecisão legislativa, devendo-se

entender que o inciso II do artigo 12 do Estatuto da Cidade permite que o

pedido da usucapião especial urbana coletiva seja realizado pelo grupo de

possuidores, ainda que não sejam membros da mesma família, determinando a

cumulação subjetiva no polo ativo da ação.

No inciso III do artigo 12, o Estatuto da Cidade passou a prever,

ainda, como parte legítima, a associação de moradores, desde que

regularmente constituída e autorizada pelos possuidores, a qual atuará, então,

como substituto processual. A lei exige, tão somente, seja a associação de

moradores devidamente revestida de personalidade jurídica. Assim, não tendo

o Estatuto da Cidade apontado nenhum outro requisito, não há que se falar em

prazo mínimo de constituição da referida associação de moradores, para que a

mesma tenha legitimidade para atuar em juízo em nome do grupo de

possuidores.

Nos dizeres de Cordeiro, o referido inciso retrata no direito pátrio a

legitimação processual extraordinária, tendo em vista o disposto no artigo 6º do

Código de Processo Civil Brasileiro de 1973: “ninguém poderá pleitear, em

nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei.”22

De outra forma, Fábio Caldas de Araújo comenta que:

Na verdade, o legislador confundiu os conceitos de representação e substituição processual, deixando claro que a hipótese versada não será de substituição processual, mas de representação, uma vez que exige a autorização explícita dos associados. A capacidade de representação das entidades associativas tem previsão constitucional

21 Menciona este dispositivo do CPC: “Art. 10. (...) §2º. Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos praticado.” 22CORDEIRO. Usucapião Especial Urbano Coletivo: abordagem sobre o Estatuto da Cidade, p. 205.

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como retrata o art. 5º, XXI da CF/88: as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente.23

Deste modo, o disposto no inciso III traz entendimentos divergentes

quanto à natureza do instituto traçado pelo legislador, se se trata de

substituição processual ou de representação; entretanto, há de se ter em

mente que a intenção do legislador foi beneficiar os possuidores carentes, para

que estes tenham sua posse convertida em direito de propriedade. Assim,

entende-se que, em se tratando de proteção a direitos individuais homogêneos,

a legitimação ativa da associação de moradores constitui modalidade de

legitimação extraordinária por meio da substituição processual, já que a

associação substituirá o grupo de possuidores na demanda, pleiteando, em

nome próprio, pretensão alheia.

Nessa esteira, Leonel discorre que: “na tutela dos direitos individuais

homogêneos, o que fica patente é a substituição processual - legitimação

extraordinária - em que os legitimados postulam em juízo interesse alheio,

fazendo-o em nome próprio”24.

De fato, o dispositivo em questão gera controvérsias, devido à sua

imprecisão técnica; entretanto, face à finalidade social da modalidade coletiva

da usucapião especial urbana, deve-se interpretar a hipótese como sendo de

substituição processual. Se a associação de moradores fosse mera

representante, necessitaria, para estar em juízo, da autorização de todos os

possuidores, sendo que a ausência de autorização de apenas um deles

acarretaria a carência de ação, o que não condiz com os objetivos traçados

pelo legislador no Estatuto da Cidade, ao regular a nova modalidade coletiva

de usucapião especial urbana.

Quanto à legitimação passiva na ação de usucapião especial urbana

coletiva, o Estatuto da Cidade silenciou a respeito; entretanto, como regra geral

aplicável às ações de usucapião de terras particulares, o artigo 942 do Código

de Processo Civil de 1973 determina que no polo passivo da lide devem estar o

proprietário do imóvel, constante da Certidão de Registro do bem usucapiendo,

bem como pelos confinantes deste imóvel.

23ARAÚJO. O Usucapião no âmbito material e processual, p. 263. 24 LEONEL. Manual do Processo Coletivo, p. 153.

14

Desta feita, na ação de usucapião especial urbana coletiva, tanto os

proprietários com seus respectivos cônjuges, se casados forem, bem como os

interessados e os confinantes, deverão ser citados para se defenderem e

tomarem ciência da ação.

Assim sendo, identificando-se os proprietários do bem por meio da

certidão de registro do imóvel, deverão os mesmos constar do polo passivo da

ação, juntamente com seus cônjuges. Estes são os chamados “proprietários

tabulares”25, isto é, os que constam no álbum imobiliário. Em caso de

falecimento do proprietário, os possuidores deverão proceder à citação dos

respectivos herdeiros; não se conhecendo os herdeiros, deverá ser efetuada a

citação destes por edital.

Quanto aos confinantes, cujo dispositivo legal também prevê a

citação, são estes os vizinhos de divisa, também denominados confrontantes.

O fundamento legal para a citação dos confinantes é a interpenetração das

posses, podendo os imóveis lindeiros vir a sofrer prejuízos, seja quanto à

limitação ou à preservação de sua propriedade26. Desta forma, a citação dos

confinantes tem por finalidade a correta delimitação da gleba usucapienda, a

fim de evitar que terrenos adjacentes sejam irregularmente invadidos devido ao

título de domínio a ser conferido ao usucapiente27, o que ensejaria, por parte

dos confinantes, a possibilidade de propositura de ação reivindicatória de

propriedade.

A não observância da correta citação dos legitimados passivos é

causa de extinção do processo por falta de uma das condições da ação, salvo

se entender o magistrado pela intimação dos possuidores para proceder à

emenda à petição inicial, nos termos do artigo 28428 do Código de Processo

Civil brasileiro de 1973.

25 Em latim, tabula significa tábua de escrever. 26 RIBEIRO. Tratado de Usucapião, v. 2, p. 1327. 27 Neste sentido: TJMG, Apelação Cível nº 1.0105.02.062466-1/001 – Comarca de Governador Valadares – Apelante: Altura – Aliança Turística Ltda. – Apelado(s): Wildo Franklin de Alencar e Outro(a)(s) – Relator Des. Irmar Ferreira Campos. Data de Julgamento: 16.08.2007. 28 “Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.”

15

4. A LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA TUTELA DOS DIREITOS

INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

Consoante se verifica do caput do artigo 127 da Constituição da

República de 1988, o Ministério Público é instituição permanente,

comprometida com a defesa da ordem jurídica e do regime democrático. O

compromisso desta instituição essencial ao Estado Democrático de Direito

consiste, especialmente, na proteção dos interesses sociais e individuais

indisponíveis. Vale também mencionar o inciso III do artigo 129 da Constituição

da República de 1988, que prevê, como função institucional do Ministério

Público, a promoção do inquérito civil e da ação civil pública, para a proteção

do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos

e coletivos.

O Ministério Público, em conformidade com suas atribuições

constitucionais, pode assumir, em um processo, a posição de parte, a posição

de substituto processual ou a de fiscal da lei (custos legis), estando esta última

competência expressa no artigo 82 do Código de Processo Civil Brasileiro de

1973.

Nas ações de usucapião, o Ministério Público age como fiscal da lei,

uma vez que o artigo 944 do Código de Processo Civil Brasileiro de 1973

dispõe que “intervirá obrigatoriamente em todos os atos do processo o

Ministério Público.”

Na ação de usucapião especial urbana, tanto individual quanto

coletiva, é sabido que o legislador ordinário, no Estatuto da Cidade, determinou

expressamente a obrigatoriedade da intervenção do Ministério Público.29 Assim

sendo, determinou a legislação em questão a atuação do Ministério Público na

condição de custos legis, ou seja, fiscal da lei. A intervenção do Ministério

Público na ação de usucapião especial urbana coletiva é, portanto, obrigatória,

uma vez que a lide envolve interesse público evidenciado por sua natureza,

bem como envolve interesse social que também está afeto à sua atuação.

29 Tal disposição consta no parágrafo 1º do artigo 12 do Estatuto da Cidade: “na ação de usucapião especial urbana é obrigatória a intervenção do Ministério Público.”

16

Sendo certa a obrigatoriedade da intervenção do Ministério Público

nas ações de usucapião especial urbana coletiva, no que tange à fiscalização

da regularidade processual bem como da satisfação dos requisitos necessários

para a criação de título hábil ao registro imobiliário em nome dos possuidores,

resta questionar se a sua atuação deve permanecer restrita a esta análise.

De fato, o papel do Parquet, nas ações de usucapião especial

urbana coletiva, não deve ficar adstrito à fiscalização da regularidade

processual. Isto porque a sua participação se faz necessária no processo de

implementação das políticas de desenvolvimento urbano; ademais, faz-se

imprescindível mencionar que a defesa da ordem urbanística, direito difuso,

integra expressamente o rol da ação civil pública, conforme mencionado no

artigo 1º, VI da Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública).

Assim, a ordem urbanística passa a compor a proteção dos

interesses difusos e coletivos a serem objetos de defesa por intermédio da

ação civil pública, de modo a resguardar o interesse social.

A defesa da ordem urbanística, por sua vez, pode beneficiar

interesses difusos, coletivos ou mesmo individuais homogêneos, onde se

enquadram, nesta última categoria, os direitos dos possuidores de baixa renda

à aquisição do direito de propriedade por meio da ação de usucapião especial

urbana coletiva. Não há como negar, portanto, que o Estatuto da Cidade se

integra ao sistema de proteção aos interesses transindividuais e individuais

homogêneos.

Neste raciocínio, defende-se a efetiva possibilidade de atuação do

Ministério Público, não somente na qualidade de fiscal da lei, mas também

como autor, por substituição processual, na defesa dos interesses individuais

homogêneos, entre os quais o direito dos possuidores de baixa renda à

aquisição do domínio pela via da usucapião especial urbana coletiva. Tal

conclusão se prende a dois fundamentos, quais sejam: a relevância social da

matéria e a indisponibilidade do direito tutelado.

Visando a enfrentar os problemas decorrentes do limite entre o que

justifica ou não a atuação do Ministério Público em defesa de interesses

transindividuais divisíveis, o Conselho Superior do Ministério Público de São

Paulo editou a Súmula nº 7, que dispõe:

17

O Ministério Público está legitimado à defesa de interesses individuais homogêneos que tenham expressão para a coletividade, como: a) os que digam respeito à saúde ou à segurança das pessoas, ou ao acesso das crianças e adolescentes à educação; b) aqueles em que haja extraordinária dispersão dos lesados; c) quando convenha à coletividade o zelo pelo funcionamento de um sistema econômico, social ou jurídico. 30

Em essência, a Súmula em questão, não obstante não contenha

valor normativo, serve de orientação aos membros do Parquet, entendendo-se

que o Ministério Público está legitimado à defesa dos interesses individuais

homogêneos, desde que tenham expressão para a coletividade.

Arruda Alvim destaca que os interesses individuais homogêneos

também passaram a ser objeto de proteção por meio da ação civil pública:

Deve-se ter presente que os novos bens, referidos originários e principalmente pela Lei da Ação Civil Pública, já nasceram sob o signo da indisponibilidade, se em si mesmos considerados. Essa indisponibilidade, decorrente do regramento que a esses foi atribuído, revela a importância que a eles tributou o legislador. E, paralelamente, conferiu legitimidade a organismos sociais interessados e ao Ministério Público, aptos à proteção desses bens. O instrumental de direito processual posto à disposição desses legitimados é profundamente diferente daquele do processo tradicional.31

A nova espécie de direito coletivo, incluída no rol da lei nº 7.347/85 –

Lei de Ação Civil Pública – denominada ordem urbanística, trata-se de conceito

jurídico amplo, que abrange o planejamento, a política do solo, a urbanização,

a ordenação das edificações, a correta distribuição da concentração

demográfica, dentre outras, tudo com a finalidade de organizar os espaços

habitáveis e proporcionar melhores condições de vida ao homem.

A ação civil pública, portanto, teve seu objeto ampliado,

possibilitando-se, inclusive, a exigência judicial da implementação gradual das

obrigações sociais do Estado.

Desta forma, considerando-se como direito coletivo lato sensu o

direito dos possuidores de baixa renda à aquisição do domínio, pela via judicial

30 Súmula do CSMP-SP aprovada em 1994, citada por Hugo Nigro Mazzilli, na obra “Em defesa de um novo sistema de Processos Coletivos: estudos em homenagem a Ada Pellegrini Grinover”, p. 264. 31ALVIM, ARRUDA. Ação Civil Pública – sua evolução normativa significou crescimento em prol da proteção às situações coletivas. In: MILARÉ, Édis (Coord.). A Ação Civil Pública após 20 anos: efetividade e desafios. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 83.

18

da usucapião especial urbana coletiva, defende-se, aqui, a possibilidade de

efetiva atuação, como parte, do Ministério Público e demais entes legitimados32

por meio da ação civil pública, na defesa dos direitos deste grupo de

possuidores e em consequente proteção à ordem urbanística, já que, em

consonância com os fundamentos aqui apresentados, tal atuação encontra-se

respaldada no exercício de seu múnus constitucional e legal.

A este respeito, cita-se interessante trecho de sentença proferida,

em primeira instância, pelo juiz da 3ª Vara Cível da Comarca de Ariquemes, do

Estado de Rondônia, em ação civil pública proposta pelo Ministério Público, em

face de Madeireira Rio Formoso Indústria Comércio Importação e Exportação

Ltda., CERON e outros, cujo objeto é a declaração de usucapião especial

urbana coletiva em favor dos cidadãos substituídos:

(...) Apesar de não ter sido instado a manifestar sobre a legitimidade ativa, tendo em vista o art. 12 do Estatuto da Cidade, onde se prevê a legitimidade de quem pode propor a demanda em questão, não incluindo o órgão ministerial, uma pequena abordagem é pertinente. Uma interpretação apressada poderia excluir o Ministério Público do rol de pessoas ou entidades com autorização para propor a demanda. No entanto, deve-se atentar que a lei não o excluiu. Na verdade, entendo que o legislador deu autorização excepcional àquelas pessoas relacionadas nos incisos do art. 12, sem interferir em outras que possuam autorização por conta de diplomas legais diversos. Em relação ao Ministério Público, outra interpretação não seria possível, pois sua legitimação é autorizada pela Constituição Federal, quando o art. 129, inciso III, prevê, como função institucional, a propositura de ação civil pública para proteção de interesse coletivo, como é o caso da Usucapião Coletiva. De qualquer forma, a legitimidade ativa está bem configurada.33

32 Em consonância com o disposto no artigo 5º da Lei 7.347/85 (lei de ação civil pública): “Art. 5º. Tem legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I – o Ministério Público; II – a Defensoria Pública; III – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; IV – a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; V – a associação que, concomitantemente: a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.” 33 Sentença proferida na data de 17.03.08, pelo juiz da 3ª Vara Cível da Comarca de Ariquemes/RO, nos autos do Processo nº 002.2006.007558-7 – Ação Civil Pública. Disponível na íntegra em <http://www.conjur.com.br/2008-jun-20/familias_usucapiao_coletivo_area_invadida>. Acesso em 12 de Out. de 2012.

19

Evidentemente, a questão é controversa, e tal possibilidade só

poderia ser reconhecida levando-se em consideração a efetiva conveniência

da atuação do Ministério Público em defesa destes interesses individuais

homogêneos.

Ressalta-se, deste modo, a necessidade de um maior debate

doutrinário sobre a questão, uma vez que não se pode afirmar que o Ministério

Público não possa defender interesses individuais homogêneos. Se a defesa

de tais interesses envolver acentuado interesse social, deverá, sim, ser

efetuada por esta instituição. Afinal, a defesa da função social da propriedade

em prol da coletividade carente também permeia a seara de atuação do

Parquet.

5. DO RITO SUMÁRIO NA AÇÃO DE USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA

COLETIVA

Como se verifica do artigo 14 do Estatuto da Cidade, o rito a ser

observado na ação de usucapião especial urbana coletiva é o sumário.

A intenção do legislador, ao estabelecer textualmente a adoção do

rito sumário, foi trazer celeridade na tramitação desta modalidade de

usucapião. Cabe, entretanto, tecer algumas considerações críticas à adoção do

rito sumário em ação de usucapião, consoante ressaltado pela doutrina:

O procedimento sumário é inapropriado para causas como as referentes à usucapião de imóvel, dada uma série de providências que devem ser levadas em conta. Não se trata de chamar à lide a parte passiva tão somente, sendo necessária a citação daquele cujo nome esteja registrado o imóvel, dos confrontantes e dos réus em lugar incerto e dos eventuais interessados.34

A adoção do rito sumário foi também estabelecida para a ação de

usucapião especial urbana individual, com inspiração na disposição já contida

na Lei nº 6.969/81, relativa à usucapião especial de imóvel rural.

Destarte, verificam-se, no rito sumário, algumas limitações no que

tange à produção de provas, como ocorre a exemplo da prova pericial, tantas 34RIBEIRO. Tratado de Usucapião, p. 1045.

20

vezes indispensável na ação de usucapião especial urbana coletiva. A prova

pericial poderia ser dificultada em caso de citação dos réus por edital, o que

poderia gerar adiamentos das audiências, com novas designações de datas e

intimações.

Assim sendo, diante das dificuldades que poderão surgir para a

adaptação do feito ao rito sumário, poderão os juízes aplicar o disposto no § 5º

do artigo 277 do Código de Processo Civil Brasileiro de 1973, que assegura a

conversão do rito sumário em ordinário.35

Cumpre ao magistrado no caso particular, portanto, analisar se a

adoção do rito sumário, em lugar de imprimir maior celeridade na tramitação do

feito, irá acarretar prejuízos ao grupo de possuidores quanto ao alcance do

provimento jurisdicional, o que efetivamente não condiz com a finalidade social

do instituto.

6. SOBRESTAMENTO DE AÇÕES

O artigo 11 da Lei nº 10.257/01 - Estatuto da Cidade - dispôs

expressamente sobre o sobrestamento de quaisquer espécies de ações

propostas posteriormente ao ajuizamento da ação de usucapião urbana

coletiva, no seguinte sentido: “Na pendência da ação de usucapião especial

urbana, ficarão sobrestadas quaisquer outras ações, petitórias ou

possessórias, que venham a ser propostas relativamente ao imóvel

usucapiendo”.

Conforme preceitua Benedito Silvério Ribeiro, a norma em questão,

trazida pelo Estatuto da Cidade,

Trata-se de nova hipótese de suspensão do processo que perdurará até o trânsito em julgado do processo de usucapião. Descoberto que seja o processo petitório ou possessório, mas em grau de recurso, deverá ser anulada a sentença. 36

35SALLES. Usucapião de Bens Imóveis e Móveis, p. 323-324. 36RIBEIRO. Tratado de Usucapião, v. 2, p. 1025.

21

José Carlos de Moraes Salles, ao comentar o dispositivo em

questão, aponta a existência de certo antagonismo existente entre o artigo 923

do Código de Processo Civil Brasileiro de 1973, que dispõe que “na pendência

do processo possessório é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar a ação

de reconhecimento do domínio”, e o citado artigo 11 do Estatuto da Cidade:

Poder-se-á, entretanto, argumentar que, no art. 923 do CPC o ajuizamento do processo possessório é anterior ao da ação de usucapião, ao passo que, no caso do art. 11 do Estatuto, a ação de usucapião especial urbana é que é anterior às petitórias ou possessórias “que venham a ser propostas relativamente ao imóvel usucapiendo”. Assim as situações não seriam exatamente iguais! Todavia, do ponto de vista prático, não vemos grande diferença entre uma e outra situação. Ambas as normas visam impedir a concomitância da ação de usucapião e das petitórias ou das possessórias. O objetivo evidente é o de evitar decisões contraditórias, que poderiam decorrer do processamento concomitante ou simultâneo de ambas as ações.37

Interessante ressaltar que a norma contida no Estatuto da Cidade,

no que se refere ao sobrestamento das ações, dispõe em sentido contrário à

norma expressa no artigo 1.210, § 2º do Código Civil Brasileiro de 2002 que

determina que “não obsta a manutenção ou reintegração na posse a alegação

de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa”.

Na verdade, o privilégio concedido ao possuidor pelo Estatuto da

Cidade, no que diz respeito ao sobrestamento das ações, acabou por prestigiar

a propositura anterior da ação de usucapião especial urbana em prol da função

social da posse, o que, evidentemente, pode vir a ensejar conflitos entre

possuidores e proprietários.

O tema mostra-se conturbado na doutrina, pois posicionamentos

divergentes quanto à real intenção do legislador e o que a referida norma pode

gerar no Judiciário brasileiro, acabam por criar brechas a interesses

antagônicos.

Favorável ao dispositivo, Caramuru Afonso Francisco aduz seja

obrigatória a averbação da ação de usucapião na matrícula do imóvel

usucapiendo, o que deverá ser determinado de ofício pelo juiz na decisão

37 SALLES. Usucapião de Bens Imóveis e Móveis, p. 314.

22

liminar, para permitir que se torne efetiva a disposição legal a efeito do

sobrestamento.38

Analisando-se a questão à luz do disposto nos artigos 103 e 105 do

Código de Processo Civil Brasileiro de 1973, cabível seria, a princípio, a

conexão entre a ação de usucapião especial urbana e a ação reivindicatória,

em lugar do sobrestamento das ações petitórias e possessórias.39

Demonstradas as divergências doutrinárias a respeito, fato é que o

sobrestamento alcança apenas as ações propostas após a propositura da ação

de usucapião especial urbana. Desta forma, verificada a situação que a lei

prevê como apta à paralisação, ao juiz caberá tão somente proferir despacho

visando a sobrestar a ação possessória ou petitória em questão.

7. A USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA COLETIVA COMO MATÉRIA DE

DEFESA

A Lei nº 10.257/01, em seu artigo 13, prevê expressamente a

possibilidade de invocar a usucapião especial de imóvel urbano como matéria

de defesa. Tal possibilidade não se trata de novidade trazida pelo legislador,

posto que a Lei nº 6.969 de 1981, que trata da usucapião especial de imóveis

rurais, já continha disposição a respeito40.

Uma vez alegada a usucapião em defesa, o réu terá que produzir

provas para a demonstração de seu direito à aquisição do domínio, seja

testemunhal, pericial ou documental. Via de regra, a sentença que reconhece a

exceção de propriedade fulcrada em usucapião rechaça o direito do

proprietário.

Para Ribeiro, tendo em vista a possibilidade de aquisição do domínio

por meio da usucapião especial urbana alegada em defesa,

38 FRANCISCO, 2001 apud RIBEIRO. Tratado de Usucapião, v. 2, p. 1025. 39 NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e Legislação Processual em vigor. 35 Ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 207. 40 Lei nº 6.969/81: “Art. 7º. A usucapião especial poderá ser invocada como matéria de defesa, valendo a sentença que a reconhecer como título para transcrição no Registro de Imóveis.”

23

Não se deve desobrigar aquele que alega usucapião em defesa de juntar planta do imóvel e de nominar os confrontantes e a pessoa que consta no registro imobiliário. Deve o contestante pedir a cientificação dos representantes das Fazendas Públicas, bem como as citações dos réus em lugar incerto e eventuais interessados, por edital, além dos réus certos. Ademais, convém que requeira a participação do Ministério Público.41

Já Carvalho Filho, em sentido contrário, entende que não se aplica a

esta modalidade de usucapião urbanística o litisconsórcio necessário expresso

no artigo 942 do Código de Processo Civil Brasileiro:

Por outro lado, não se aplicará ao usucapião urbanístico o litisconsórcio necessário a que alude o art. 942 do Cód. Proc. Civil, decorrente da citação dos confinantes, dos réus que estejam em lugar incerto e dos eventuais interessados. Tal exigência procedimental sobre o litisconsórcio ocorre ‘ex vi legis’ no processo normal de usucapião, mas não se estende ao usucapião urbanístico pelo fato de ser este previsto em lei especial.42

Vale ressaltar que, nas demais modalidades de usucapião, não

obstante a aplicabilidade da Súmula 237 do Supremo Tribunal Federal, que

dispõe que “o usucapião pode ser arguido em defesa”, não pairam dúvidas de

que “a supressão do domínio exige cognição exauriente e obediência ao

procedimento específico”43. Sendo assim, faz-se necessária propositura de

ação própria de usucapião de imóvel particular, para que o possuidor possa

fazer jus à aquisição do domínio. Diferentemente, na ação de usucapião

especial de imóvel rural (Lei nº 6.969/81), bem como nas ações de usucapião

especial de imóveis urbanos, consoante prevê o Estatuto da Cidade, a

usucapião alegada em defesa possui o condão de, além de possibilitar a

improcedência da ação proposta pelo autor, declarar a aquisição do direito de

propriedade do possuidor (ou possuidores) que reunir os requisitos previstos

em lei.

Assim, caso os possuidores, como réus, aleguem em defesa a

usucapião especial urbana coletiva, e desde que reunidos os requisitos para

sua concessão, esta sentença judicial poderá ser utilizada para o registro no

cartório de imóveis. É este o entendimento de Carvalho Filho:

41 RIBEIRO. Tratado de Usucapião, v. 2, p. 1027. 42 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Comentários ao Estatuto da Cidade. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, p. 147. 43 ARAÚJO. O Usucapião no âmbito material e processual, p. 327.

24

Como se pode observar, o possuidor de imóvel urbano que pretenda o reconhecimento do usucapião especial tem situação de vantagem em relação ao possuidor no usucapião comum. Este, para ter o título, deve ser o autor da ação, ao passo que aquele tanto pode ser autor como réu, que a sentença lhe servirá como título.44

O legislador brasileiro, como se verifica, adotou medida que propicia

economia processual, atendendo à natureza social do instituto e à sua

peculiaridade como instrumento de tutela urbanística. Deste modo, ocorrerá

uma verdadeira ampliação do próprio conteúdo da sentença, que decidirá tanto

sobre o pedido reivindicatório do autor, como também sobre a declaração de

propriedade pretendida pelo grupo de possuidores. Exatamente pelas

peculiaridades acima analisadas, é que se pode afirmar o caráter especial de

tal procedimento.

8. A SENTENÇA E A COISA JULGADA NA USUCAPIÃO ESPECIAL

URBANA COLETIVA

A Lei nº 10.257/01 dispõe, em seu artigo 10, parágrafo 2º, que “a

usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz,

mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro

de imóveis”

Diante de tal dispositivo legal, faz-se necessário perquirir,

primeiramente, acerca da natureza jurídica da sentença na ação de usucapião.

A este respeito, Fábio Caldas de Araújo assegura que: “comumente se afirma

que a ação de usucapião é declaratória porque a sentença nada cria, apenas

aponta que em certo momento, alguém adquiriu o domínio pela posse

prolongada.”45

A posição aqui defendida, em consonância com a doutrina

majoritária, é de que a natureza jurídica da sentença de usucapião, incluindo a

sentença proferida na ação de usucapião especial urbana coletiva, é

44 CARVALHO FILHO, op. cit., p. 146. 45 ARAÚJO. O Usucapião no âmbito material e processual, p. 274.

25

meramente declaratória, já que a sentença não constitui o direito do grupo de

possuidores à aquisição do domínio; ao contrário, sendo a usucapião modo de

aquisição originária do direito de propriedade, considera-se adquirido o

domínio, por parte destes possuidores, com a simples reunião dos requisitos

expressos em lei para o seu reconhecimento. A sentença, desta forma, não

atribui e sim reconhece o domínio, e servirá como título para registro no

competente Cartório, dando publicidade à aquisição da titularidade deste

domínio por parte dos possuidores.

A sentença de procedência do pedido na ação de usucapião

especial urbana coletiva, sendo meramente declaratória, tem eficácia

retroativa, ex tunc. Desta forma, entende a doutrina que a sentença retroage à

data em que se completou o tempo para aquisição do domínio (ou outro direito

real) por meio da usucapião46. Também neste sentido é o entendimento do

Superior Tribunal de Justiça, ao declarar que, face aos efeitos retroativos da

sentença proferida nas ações de usucapião, eventuais ônus reais pendentes

sobre o bem imóvel usucapido não prevalecem47.

Importante ressaltar que o Estatuto da Cidade, em seu artigo 13,

trouxe a possibilidade de alegação da usucapião especial urbana coletiva em

defesa; neste caso, segundo o dispositivo legal, a sentença que a reconhecer

valerá como título para registro no Cartório de Registro de Imóveis. Assim, a

sentença de improcedência do pedido do autor, em caso de reconhecimento da

usucapião especial urbana coletiva alegada em defesa, terá o condão de

formar coisa julgada formal e material, declarando a aquisição do direito de

propriedade ao grupo de possuidores, o que impede que o anterior proprietário

venha a discutir o domínio do bem imóvel usucapido em ação posterior.

Quanto à sentença de improcedência proferida na ação de

usucapião especial urbana coletiva, necessário se faz tecer algumas

considerações. Sendo o pedido julgado improcedente devido à ausência do

46 Neste sentido, Alexandre Freitas Câmara, na já citada obra Lições de Direito Processual Civil, v. III, p. 436. 47 “USUCAPIÃO. PRESCRIÇÃO AQUISITIVA. A questão posta no REsp consiste em definir se a prescrição aquisitiva (usucapião) está sujeita a eventuais limitações relacionadas com a anterior constituição de ônus real sobre o bem usucapido. A Turma entendeu que, consumada a prescrição aquisitiva, a titularidade do imóvel é concedida ao possuidor desde o início de sua posse, presentes os efeitos ex tunc da sentença declaratória, não havendo de prevalecer contra ele eventuais ônus constituídos, a partir de então, pelo anterior proprietário.” STJ, REsp 716.753-RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 15 de dez. de 2009.

26

direito do grupo de possuidores, ocorrerá certamente, no âmbito coletivo, coisa

julgada formal e material. Entretanto, entende a doutrina que, sendo julgado

improcedente o pedido devido à ausência do lapso temporal suficiente à

aquisição do domínio, nova ação de usucapião poderá ser proposta referente

ao mesmo bem. Alexandre Freitas Câmara faz importante observação, acerca

da possibilidade de propositura de nova demanda em caso de improcedência

na ação de usucapião:

Em primeiro lugar, é de se afirmar que a sentença de improcedência do pedido alcança a autoridade de coisa julgada. É certo que o mesmo autor poderá, posteriormente, ajuizar novamente ‘ação de usucapião’ referente ao mesmo imóvel. Haverá, porém, modificação da causa de pedir, já que nesta nova demanda o autor terá de alegar suporte fático ao menos parcialmente diverso do apresentado na primeira demanda (basta ver que o termo final do prazo de usucapião na segunda demanda será, necessariamente, diferente do apontado na primeira). Sendo diversa a demanda, não há qualquer impedimento ao desenvolvimento normal do segundo processo, já que a coisa julgada substancial impede, tão somente, a repetição da mesma demanda, anteriormente julgada.48

Além disso, em caso de improcedência da sentença na ação de

usucapião especial urbana coletiva, não há impedimento para que os

possuidores venham a pleitear a aquisição do domínio a título individual, desde

que reunidos os requisitos necessários para tal modalidade de usucapião.

Demonstrada a natureza jurídica e as peculiaridades atinentes à

sentença na ação de usucapião especial urbana coletiva, cumpre analisar os

seus efeitos processuais para fins do entendimento quanto ao alcance da coisa

julgada advinda deste procedimento.

Os efeitos da sentença irão determinar a natureza da coisa julgada,

que dela irá emergir. Em se tratando de sentença de mérito ou definitiva, na

qual toda a matéria será objeto de análise e decisão, produzirá efeito formal e

material, formando-se a coisa julgada material. Ao contrário, em se tratando de

sentença terminativa, ou seja, que põe fim ao processo sem resolução do

mérito, a coisa julgada será apenas formal, deixando em aberto a análise da

matéria controvertida.

O artigo 467 do Código de Processo Civil Brasileiro de 1973, em

conceito falho e por demais criticado pela doutrina, traz a definição de coisa

48 CÂMARA. Lições de Direito Processual Civil, v. III, p. 381.

27

julgada material: “denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna

imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou

extraordinário.”

O legislador brasileiro, ao estabelecer tal definição, incorreu em

graves imprecisões, levando-se em conta tão somente a imutabilidade e

indiscutibilidade da sentença, o que também pode ser observado no caso da

coisa julgada formal, e não a imutabilidade e indiscutibilidade das relações

jurídicas, o que seria fundamental para a configuração do instituto.

Para o reconhecimento da coisa julgada material, a mais adequada

teoria a ser adotada é a da identidade da relação jurídica, uma vez que a

coisa julgada material impede toda e qualquer posterior discussão acerca do

direito material objeto da decisão definitiva, ainda que, em nova demanda, o

pedido seja diferente49.

Nos processos individuais, quanto à extensão, a regra é a de que a

coisa julgada irradia seus efeitos apenas entre as partes do processo, o que

ocorre independentemente do resultado da demanda, se procedente ou

improcedente (coisa julgada pro et contra). Nas ações coletivas, onde se

enquadra a ação de usucapião especial urbana coletiva, os efeitos da sentença

irão variar, seja de acordo com a natureza do direito discutido, com o resultado

da lide, ou com a suficiência ou não da prova produzida (coisa julgada

secundum eventum litis vel probationis e in utilibus).

As regras aplicáveis à coisa julgada nas ações coletivas estão

dispostas, basicamente, no artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor

(Lei nº 8.078/90). Tal dispositivo leva em consideração a natureza do direito

discutido no litígio coletivo - se difuso, coletivo em sentido estrito ou individual

homogêneo.

Em se tratando de direitos individuais homogêneos, como se

acredita ser o caso do direito dos possuidores na ação de usucapião especial

urbana coletiva, a sentença fará coisa julgada erga omnes, apenas na hipótese

de procedência do pedido, para beneficiar todos os possuidores e seus

sucessores (coisa julgada secundum eventum litis). Sendo considerado

improcedente o pedido, o parágrafo terceiro do mesmo artigo 103 do Código de

49 Entendimento defendido pelos autores Elpídio Donizetti e Marcelo Malheiros Cerqueira, na obra Curso de Processo Coletivo, São Paulo, Editora Atlas, 2010, nas páginas 352-353.

28

Defesa do Consumidor dispõe que os interessados que não tiverem intervindo

no processo como litisconsortes poderão propor ação a título individual.

Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr. afirmam que não deve ser

efetuada uma interpretação literal do dispositivo do artigo 103, III do Código de

Defesa do Consumidor, uma vez que a ação envolvendo direitos individuais

homogêneos deve ser tratada como autêntica ação coletiva, pois tais

interesses pertencem, por ficção, a um grupo de indivíduos. Neste sentido:

Assim, parece que, aplicando o princípio hermenêutico de que a solução das lacunas deve ser buscada no microssistema coletivo, pode-se concluir que se a ação coletiva for julgada procedente ou improcedente por ausência de direito, haverá coisa julgada no âmbito coletivo; se julgada improcedente por falta de provas, não haverá coisa julgada no âmbito coletivo, seguindo o modelo já examinado para os direitos difusos e coletivos em sentido estrito.50

Desta forma, no que se refere aos direitos do grupo de possuidores

na ação de usucapião especial urbana coletiva, pode-se afirmar que, uma vez

julgada improcedente a demanda por falta de provas, não ocorrerá a coisa

julgada material, podendo a associação ou os possuidores ajuizar nova

demanda coletiva, desde que fundada em nova prova.

Outra peculiaridade dos efeitos da coisa julgada em relação aos

interesses individuais homogêneos é a de que os eventuais autores de

demandas individuais em curso, que tenham o mesmo objeto da demanda

coletiva proposta pela associação, não serão beneficiados pela decisão

coletiva, se não for requerida a suspensão das respectivas demandas

individuais, no prazo de trinta dias a contar da ciência, no feito, do ajuizamento

da ação coletiva, previsão esta disposta no artigo 104 do Código de Defesa do

Consumidor. Conclui-se assim que, caso os autores tenham ajuizado

demandas individuais e não tenham pleiteado sua suspensão ao tomar

conhecimento da ação coletiva com o mesmo objeto, estes não serão atingidos

pela sentença coletiva de procedência, assim como não poderão se valer desta

se não tiverem êxito nas ações individuais que se mantiveram em andamento

concomitante à ação coletiva. Destarte, verifica-se que não se pode falar em

litispendência entre ações individuais e ação coletiva, ainda que sob o mesmo

objeto. 50 DIDIER JR.; ZANETI JR. Curso de Direito Processual Civil: Processo Coletivo, p. 369.

29

Acerca do prazo legal de trinta dias previsto para a suspensão da

ação individual, entende-se que não cabe interpretação literal do mencionado

dispositivo legal. Há que se lembrar que a usucapião especial urbana coletiva é

instrumento de política urbana, regulamentada no Estatuto da Cidade, que visa

a beneficiar a população carente; portanto, a finalidade política e social do

instituto em questão deve ser levada em conta, bem como a necessária

flexibilização da interpretação das normas de direito processual que lhe serão

aplicadas.

CONCLUSÕES

É sabido que a evolução do conceito do direito de propriedade no

ordenamento jurídico brasileiro demonstra, claramente, a mudança de seu foco

de proteção, que tem como centro a pessoa humana em seu contexto social.

Como consequência deste novo enfoque do direito de propriedade, evidencia-

se a maior proteção ao fenômeno social da posse e ao direito constitucional à

moradia, aliados à proteção dos interesses sociais da coletividade.

Neste contexto, a usucapião especial urbana coletiva, estabelecida

no Estatuto da Cidade, torna-se mais um instrumento, à disposição dos

cidadãos, de fundamental importância para a viabilização dos ideais de justiça

social, já que constitui mecanismo de aquisição da propriedade voltado

especificamente à proteção da coletividade de baixa renda.

Como meio de tutela processual coletiva, a usucapião especial

urbana coletiva objetiva o mais amplo acesso da coletividade à justiça.

Defende-se, dentre os direitos coletivos lato sensu, que o direito do grupo de

possuidores na ação de usucapião especial urbana coletiva é direito individual

homogêneo, devendo ser aplicados, a este instituto, as normas do direito

processual coletivo brasileiro, previstas no Microssistema de Processos

Coletivos.

Defende-se, ainda, que a interpretação das normas atinentes ao

instituto, previstas no Estatuto da Cidade, deve ser efetuada de forma larga e

flexível, sempre em conformidade com sua finalidade social e em conformidade

30

com a Constituição da República vigente, por meio dos métodos de

interpretação teleológico e sistemático, pois, caso contrário, as imprecisões

técnicas existentes na lei constituirão óbice ao exercício deste direito conferido

à coletividade de baixa renda.

O cidadão, e também o Poder Judiciário, devem assumir

participação ativa na implementação deste direito conferido pelo Estatuto da

Cidade, e por isso são necessários maiores estudos sobre este tema, para que

este instrumento passe a ser mais conhecido por parte dos cidadãos, e

consequentemente efetivado, cumprindo, assim, seu alcance social.

Como meio de tutela coletiva, o Ministério Público possui ampla

legitimidade para a defesa dos direitos do grupo de possuidores, inclusive para

a propositura da ação de usucapião especial urbana coletiva, na qualidade de

substituto processual. Trata-se, no caso, de proteção a interesses de

relevância social. E mais, a defesa da ordem urbanística é um dos objetos de

proteção da Lei de Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/85), o que legitima o

Ministério Público a ajuizar ação civil pública para a defesa dos interesses

individuais homogêneos da coletividade de baixa renda, no que tange à

aquisição do domínio.

Faz-se necessário, deste modo, (re)interpretar as disposições

atinentes ao instituto da usucapião individual, tradicionalmente de direito

privado, pois com a modificação na estrutura do direito de propriedade, este

somente pode ser protegido na medida em que cumpre seu papel socializante;

assim, a propriedade não mais pode ser tratada apenas sob a ótica

individualista do tradicional direito civil, e sim como um instrumento de

efetivação do direito fundamental à moradia, em consonância com os ideais de

justiça social e proteção à dignidade da pessoa humana.

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