Brincadeiras de Papeis Sociais

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    ResenhasDialogia, São Paulo, v. 6, p. 165-167, 2007.

    Maria Inês PaulistaGraduação em Serviço Social – Unicid;

    Mestranda do PPGE -Uninove.São Paulo – SP [Brasil]

    [email protected]

    Brincadeira é coisa séria. Podemos corroboraressa armação ao conhecer a coletânea de artigos,

    baseada nos estudos de Vigotski, Leontiev e Elkonin,com a proposta de estabelecer uma relação entrebrincadeira de papéis sociais, também denominadade jogo protagonizado, e a aprendizagem. A brin-cadeira, nessa coletânea, é pensada sob diferentes focos: a abordagem da psicologia sócio-histórica, a formação da personalidade, o papel da brincadeirade papéis sociais no desenvolvimento do psiquismohumano, a psicogênese da brincadeira de papéissociais, a brincadeira na sociedade alienada e pro-dutora de alienação no Referencial CurricularNacional para a Educação Infantil.

    O livro, organizado por Alessandra Arcee Newton Duarte, destaca a contribuição dosestudos dos psicólogos russos sobre a infância e odesenvolvimento infantil, a partir do contexto sócio-histórico, com linguagem uente, aprofundando o

    conhecimento dos autores e de suas teorias, poucoexploradas por nossos educadores. Nos seis estudosapresentados, é possível compreender o diálogoentre as atividades psíquicas, sociais, culturais ehistóricas do ser humano em seu desenvolvimento,enfatizando que a marca histórico-social da brin-cadeira como produto humano não é inerente aoser infantil: pode ou não se desenvolver, dependen-

    do da inserção da criança na sociedade, podendoainda, em algumas sociedades, ser camuada,

    negada, ou alienada.O primeiro artigo proporciona uma visão

    panorâmica da psicologia histórico-cultural ela-borada por Vigotski (1896-1934) e seguida porLeontiev e Elkonin. Apresentado por Marilda G.D. Facci, demonstra que o traço fundamental dopsiquismo humano desenvolve-se por meio da ati- vidade social, além de apresentar alguns aspectosrelacionados à periodização do desenvolvimentohumano e requerer a compreensão da questão dosestágios do desenvolvimento infantil elaborados poresses pensadores, armando que é imprescindívelestudar a afetividade e o intelecto como unidade,sendo os principais estágios de desenvolvimento: a)comunicação emocional do bebê com os adultos, b)atividade objetal manipulatória, c) jogo de papéis,d)atividade de estudo, e) comunicação íntima

    pessoal e atividade prossional/estudo. A formação da personalidade, tratada porLígia Márcia Martins no segundo artigo, é umprocesso dinâmico no qual se destacam fases quali-tativamente diferentes, cada uma delas preparandoas seguintes, estruturando-se e desenvolvendo-sea partir de condições sociais. É no interior dessesprocessos que a personalidade encontra campo

    Brincadeira de papéis sociais na educação infantil: as contribuições de Vigotski, Leontiev e Elkoninde Alessandra Arce e Newton Duarte (Org.)São Paulo: Xamã, 2006.

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    fértil para estruturar-se na unidade e [ocorre a?]luta dos contrários eu/outro, indivíduo/sociedade,permitindo armar que a personalidade de cadaindivíduo não é produzida por ele isoladamente,

    e sim resultado da atividade social, e, em certosentido não dependente da vontade do indivíduoisoladamente, mas da trama de relações sociais naqual está inserido.

    Assim, por meio da leitura de Vigotski,Leontiev e Elkonin, pode-se compreender melhora personalidade, o processo de desenvolvimento daconsciência afetivo-motivacional, de capacidadese traços de caráter, a formação moral e suas prin-

    cipais propriedades, além de se compreender quaisas relações entre a brincadeira de papéis sociais ea formação do indivíduo. Toda brincadeira, comoarmam os autores, é ao mesmo tempo uma ati- vidade da criança, uma expressão em si e umaspecto das relações sociais, isto é, uma expressãode condições objetivas de ação e desenvolvimento,em que não se nega à criança o direito e o prazerde brincar, uma atividade carregada de signica-dos e que acompanha as fases do desenvolvimentoinfantil, compreendendo a relação entre infância epersonalidade.

    A ênfase do artigo “O papel da brincadeira dospapéis sociais na formação do psiquismo humano”,de João Henrique Rossler, é o processo de formaçãodo indivíduo, por meio da apropriação que ele fazdos produtos materiais e simbólicos da atividade

    histórica e social dos homens, acumulados ao longoda história e transmitidos de uma geração a outra:a linguagem, os costumes, os utensílios, os objetosda cultura etc.

    Alessandra Arce e Rosimeire Simão, em seuartigo, tratam dos estudos de Elkonin, elucidan-do o que é a brincadeira de papéis sociais, quaisseus objetivos, quando efetivamente essa prática

    ocorre, procurando desvelar suas inter-relações,pois o jogo protagonizado, brincadeira de papéissociais, possui como único conteúdo a atividadehumana e as relações travadas entre os homens

    em nossa sociedade, seu trabalho, suas produções(objetos) e sua vida social. A brincadeira permiteà criança satisfazer certas necessidades e motiva-ções que se encontram na esfera afetiva, realizardesejos impossíveis de ser atendidos, e permite queela recorra à imaginação para assumir o papelda mãe, da professora, do aviador, do motorista,usando objetos representativos, tais como pedaçosde madeira simbolizando carros ou mesmo brin-

    quedos, em que ela projeta ações, impõe regras,estabelece diálogos com o mundo adulto, e naqual ela tem liberdade, fantasia e prazer. A criança,portanto, inicia primeiramente representando asações do jogo, como nadar, cozinhar, dar comidi-nha à boneca e, posteriormente, participando dele,atingindo seu ápice na idade pré-escolar.

    A brincadeira infantil, de acordo comLeontiev, não é instintiva, mas, sim, objetiva,carregada de signicados, tendo como referênciasua percepção do mundo dos objetos e símbo-los humanos, os quais determinam a forma e opróprio conteúdo de seu brincar, propiciando quea criança, por meio dessa atividade lúdica, sejacapaz de se apropriar do mundo. Entretanto essaapropriação não ocorre sem a participação deoutros indivíduos que façam a mediação nesse

    processo. A criança observa, imita, inventa, rompe,busca outras signicações para os objetos: assim,uma vassoura perde seu signicado de varrer,limpar, para ser um cavalo, e a situação imaginá-ria permite a ela orientar seu comportamento.

    Importante reexão nos traz Duarte em seuartigo “Vamos brincar de alienação?”, permitin-do-nos entender como essa alienação se produz

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    e reproduz, uma vez que a brincadeira de papéissociais não se desenvolve espontaneamente, e simrequer ações educativas, mediações com um adultoque promovam o surgimento, o desenvolvimento e

    o direcionamento desse tipo de atividade.Com o artigo sobre a brincadeira de papéis

    sociais como produtora de alienação no ReferencialCurricular Nacional para a Educação Infantil(RCNEI), Arce traça um panorama de como oassunto brincadeira é abordado no RCNEI, suas li-mitações e as diculdades de sua prática, além dedemonstrar como o prossional da educação deve

    estar preparado para aproveitar a brincadeira comoalavanca de desenvolvimento da criança e não en- veredar pela alienação e estagnação, impedindo aautonomia, a liberdade e a criatividade, elementos

    signicativos para a evolução do ser humano e dasociedade.

    Evidentemente, este trabalho serve de pontode partida, instigando e sugerindo o aprofunda-mento dos conhecimentos sobre o assunto, além de fornecer subsídios importantes tanto aos prossio-nais da psicologia quanto aos educadores.

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