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nizacional, renovação organizacional, excelência, desburo- cratização, política organizacional. COLABORAÇÃO INTERNACIONAL - BUSCANDO A RENOVAÇAO: A NOVA ONDA ADMINISTRATIVA * • Stephen J. Wood Senior Lecturer em Relações Industriais na London School of Economics and Political Science, Inglaterra. Traduzido por Angelo dos Santos Soares, professor do Departamento de Informática e Métodos Quanti- tativos da EAESP/FGV e revisto por Gisela Taschner Goldenstein, professora adjunta do Departamento de Fundamentos Sociais e Jurídicos da Administra- ção da EAESP/FGV e editora-chefe da RAE. * RESUMO: In Search Df Excellence de Peters e Wa- terman e The Change Masters de Kanter são obras semi- nais do início dos anos 80 que iniciaram uma nova onda na teoria da Administração, que é caracterizada pela sua ênfa- se em a) manter um alto desempenho ao aprender a gostar de mudança e a atingir a excelência através de uma renova- ção contínua; b) a predisposição para agir e a busca de no- vas atitudes através da ação dos gerentes seniors em lugar de uma estratégia de busca interior e de mais longo prazo de desenvolvimento organizacional; e c) prescrições de for- mas organizacionais mais achatadas, e menos hierárquicas e rígidas do que as formas burocráticas dominantes anteri- ormente. * PALAVRAS-CHAVE: Teoria gerencial, cultura orga- * ABSTRACT: Seminal books of the early eighties, Pe- ters and Waterman's In Search Df Excellence and Kan- ter's The Change Masters set in train what the author describes as a new wave of management theory. This arti- ele explores its development in the late 1980s, the distinc- tiveness of the new wave, and the role of social science within it. The new wave is characterized by its emphasis on: a) maintaining high performance through "learning to love change" and the achievement of excellence through continuai renewal; b) a bias to action and fostering new attitudes through senior management's actions, as oppo- sed to the more long-term soul-eearching strategy of orga- nizational developments; and c) prescriptions for organi- zational forms which are flatter, less hierarchical and rigid than the previously dominant bureaucratic formo * KEY WORDS: Management theory, organizational culture, renewing organizations, excellence, debureau- cracy, organizational politics. * Versão revista do texto "New Wave Management?", publicado originalmente em Work, Employment and Society, 3(3):379-402, se- tembro de 1989, editada pela British Sociological Association. Revista de Administração de Empresas Out./Dez. 1990 5 São Paulo, 30 (4) 05-21

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nizacional, renovação organizacional, excelência, desburo-cratização, política organizacional.

COLABORAÇÃO INTERNACIONAL

-BUSCANDO A RENOVAÇAO:A NOVA ONDA ADMINISTRATIVA *

• Stephen J. WoodSenior Lecturer em Relações Industriais na LondonSchool of Economics and Political Science, Inglaterra.

Traduzido por Angelo dos Santos Soares, professordo Departamento de Informática e Métodos Quanti-tativos da EAESP/FGV e revisto por Gisela TaschnerGoldenstein, professora adjunta do Departamentode Fundamentos Sociais e Jurídicos da Administra-ção da EAESP/FGV e editora-chefe da RAE.

* RESUMO: In Search Df Excellence de Peters e Wa-terman e The Change Masters de Kanter são obras semi-nais do início dos anos 80 que iniciaram uma nova onda nateoria da Administração, que é caracterizada pela sua ênfa-se em a) manter um alto desempenho ao aprender a gostarde mudança e a atingir a excelência através de uma renova-ção contínua; b) a predisposição para agir e a busca de no-vas atitudes através da ação dos gerentes seniors em lugarde uma estratégia de busca interior e de mais longo prazode desenvolvimento organizacional; e c) prescrições de for-mas organizacionais mais achatadas, e menos hierárquicase rígidas do que as formas burocráticas dominantes anteri-ormente.

* PALAVRAS-CHAVE: Teoria gerencial, cultura orga-

* ABSTRACT: Seminal books of the early eighties, Pe-ters and Waterman's In Search Df Excellence and Kan-ter's The Change Masters set in train what the authordescribes as a new wave of management theory. This arti-ele explores its development in the late 1980s, the distinc-tiveness of the new wave, and the role of social sciencewithin it. The new wave is characterized by its emphasison: a) maintaining high performance through "learning tolove change" and the achievement of excellence throughcontinuai renewal; b) a bias to action and fostering newattitudes through senior management's actions, as oppo-sed to the more long-term soul-eearching strategy of orga-nizational developments; and c) prescriptions for organi-zational forms which are flatter, less hierarchical and rigidthan the previously dominant bureaucratic formo

* KEY WORDS: Management theory, organizationalculture, renewing organizations, excellence, debureau-cracy, organizational politics.

* Versão revista do texto "New Wave Management?", publicadooriginalmente em Work, Employment and Society, 3(3):379-402, se-tembro de 1989, editada pela British Sociological Association.

Revista de Administração de Empresas Out./Dez. 1990 5São Paulo, 30 (4) 05-21

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1. Há tradução portuguesa:Vencendo a Crise. São Pau-lo, Harbra, 1983.

2. ELKINGTON, J. & BURKE,T. The Green Capitalists: In-dustry's Search for Environ-mental Excellence.London,Victor Gollancz, 1987; KAN-TER, R. M. When Giants Le-arn to Dance - Managingthe Challenges of Strategy,Management and Careers intne 1990's. London, Simonand Schuster, 1989; KANT-ROW, A. The Constraints ofCorporate Tradition. NewYork e London, Harper andRow, 1987; MORGAN, G.Riding tne Waves of Chan-ge: Developing ManagerialCompetencies for a Turbu-lent World. London, SagePublications, 1988; PE-TERS, T. Thriving on Chaos.Basingstoke, MacMillan,1987. Na tradução portugue-sa, Prosperando no Caos.São Paulo, Harbra, 1989;WATERMAN, R. H. Jr. TheRenewal Factor: Buildingand Maintaining Your Com-pany's Competitive Edge.London, Bantam Press,1980. Na trad. port., O FatorRenovação: como os me-lhores conquistam e man-têm a vantagem competitiva.São Paulo, Harbra, 1989.

3. MINTZBERG, H. The Na-ture of Managerial Work.New York, Harper and Row,1973.

4. STEWART, R. Contrastsin Management. New York eMaidenhead, Berks, Mc-Graw-Hill,1976.

5. KAKABADSE, A.; LU-DLOW, R. & VINNICOMBE,S. Working in Organizations.Harmondsworth, Penguin,1987.

6. BRAVERMAN, H. Laborand Monopoly Capitalism.New York, Monthly ReviewPress, 1984. Na trad. port.,Trabalho e Capital Monopo-lista. Rio de Janeiro, Zahar,1977; NICHOLS, T. Owner-ship, Control and Ideology.London, Allen and Unwin,1969.

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INTRODUÇÃO

NOs anos 80, houve um enorme cresci-mento do número de livros de admi-nistração. Livros como In Search of Ex-

cellence' de Peters e Waterman tiveram ven-das fenomenais em todo mundo, já que fo-ram objeto de maciços investimentos de mar-keting e traduzidos para várias línguas. Seriaoportuno avaliar o impacto desses livros nodesenvolvimento tanto da teoria quanto daprática administrativa. Infelizmente, umaanálise completa está fora do alcance desteartigo. Vou me restringir a discutir seis livrosde administração pós-Peters e Waterman, in-cluindo seus novos livros, com vistas a escla-recer suas idéias básicas e premissas, se hou-ve uma ruptura significativa na teoria da ad-ministração nos anos 80, e a extensão em queidéias e pesquisas das ciências sociais influ-enciam o desenvolvimento da teoria da ad-ministração.

Vou concentrar-me em seis livros publica-dos no final dos anos 80: Thriving on Chaos dePeters; The Renewal Factor de Waterman; TheConstraints of Corporate Tradition de Kantrow;Riding the Waves of Change de Morgan; WhenGiants Learn to Dance de Kanter e The GreenCapitalists de Elkington e Burke', Se a evidên-

cia desses livros influentes é algo para nosguiar, sugiro que uma nova onda de teoria daadministração estabeleceu-se nos anos 80, aqual, apesar de ser densamente orientadapara a consultoria e para prescrições gerais,tem recebido uma influência considerável dasciências sociais passadas.

A ABRANGÊNCIA DA LITERATURA ADMINISTRATIVA

A abrangência da literatura administrativaé, pelo menos superficialmente, muito ampla.Podemos, inicialmente, dividi-la entre livrosacadêmicos e de "consultoria".

Dentro da categoria acadêmica há uma va-riedade de tipos:

a) aqueles que oferecem principalmenteanálise conceitual da administração, sendo o li-vro de Míntzberg' um clássico exemplo disso;

b) os baseados em análises empíricas, sen-do os livros de Rosemary Stewart' bons exem-plos desse gênero;

c) livros-textos, por exemplo, Working inOrganizations de Kakabadse et alii': e

d) análises mais sociológicas e críticas depráticas administrativas, das quais Braver-man e Nichols são exemplos clássicos".

Os livros de "consultoria", caracterizadospela sua ênfase em como administrar e me-

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lhorar a performance organizacional, tambémpodem ser divididos em três tipos principais:

a) os que oferecem análises (com prescri-ções) de um tema abrangente, por exemplo,Theory Z de Ouchi', que se concentrou no mo-delo de administração japonês;

b) os que focalizam métodos para melhorara direção de tópicos específicos, freqüente-mente bem mais restritos, tal como How toMotivate People de Le Boeuf':

c) racontos de estórias de sucesso que inclu-em tanto estudos de empresas, como Virando aPrópria Mesa de Semler", como relatos de con-quistas pessoais de um indivíduo (super-he-rói), tais como o famoso livro de Iacocca'" so-bre como ele mudou completamente aChrysler, ou o de Harvey-Iones" (ex-presiden-te da I.C.!) sobre "como fazer do meu jeito".

A divisão entre livros sociológicos e admi-nistrativos/ de negócios parece estender-sebem além da diferença entre seus níveis devenda. Talvez a maior delas seja entre a preo-cupação acadêmica explícita dos primeiroscom o poder e a autoridade e a relativa desa-tenção dos últimos a tais aspectos e/ou a ten-dência a tomá-los como dados. Essa clivagemnão existiu sempre; o tema da autoridade foiuma preocupação central dos que primeiroescreveram sobre a administração, tal comoBarnard. Todavia, o contraste entre os sociólo-gos e Waterman e seus semelhantes está noseu nível máximo no que se refere a essaquestão. Podemos ilustrar isso, referindo-nosa um recente estudo sociológico de adminis-tração feito por [ackall, Moral Mazes12• O po-der está no núcleo da análise, apesar de suaaparente preocupação com valores: "o que écorreto para a corporação é o que o cara acima devocê quer de você" é a essência da moral que[ackall" pretende mostrar. Na maior parte daliteratura sobre administração, por outrolado, a ênfase está nas organizações sendounidas por valores compartilhados e lideran-ça, que são retratados de forma um tanto as-séptica.

Apesar de suas diferenças, há uma preocu-pação que os autores de administração e os so-ciólogos freqüentemente compartilham, a sa-ber, o problema da burocracia, embora os pri-meiros tendam a ocupar-se menos da análiseda burocracia, e mais do encorajamento de no-vas formas de organização orgânica. A buscade formas mais flexíveis de organização não énova. Há 20 anos, vários autores conhecidosde administração (incluindo Drucker, McGre-gor, Blake e Mouton) estimularam os adminis-tradores a fazerem mudanças significativas. Ecientistas sociais, como Galbraith e Arygris,provavelmente foram mais amplamente lidos

por administradores do que o são hoje. Seráque a diferença entre antes e agora é uma sim-ples questão de visibilidade e escala? Livroscomo In Search of Excellence" de Peters e Water-man são, naturalmente, parte do desenvolvi-mento comercial que eles descrevem e procu-ram aumentar; e uma mudança, certamente, éa maneira pela qual os livros de administraçãoestão sendo altamente comercializados, seria-lizados em jornais, acompanhados por vídeose habilmente engrenados para promover con-sultorias. Mas existe alguma coisa fundamen-talmente distintiva nos escritos de administra-ção dos anos 80? E, de qualquer forma, oquanto eles são homogêneos?

Na cultura dos anos 80, liderança, adminis-tração Just-in- Time (JIT) e controle total dequalidade, todos entraram (ou, no caso da li-derança, reentrou) na teoria da administração,ao lado de preocupações mais gerais sobre fle-xibilidade, novas tecnologias e nichos de mer-cado - as palavras mais presentes nos co-mentários de negócios dos anos 80. Contribui-ções importantes, junto com In Search of Excel-lence de Peters e Waterman, incluem a TheoryZ de Ouchi" (deliberadamente chamada assimpara contrastar com a teoria X e Y de McGre-gor), que apontou várias formas de adaptar aadministração japonesa às economias ociden-tais, particularmente aos EUA, e Change Mas-ters de Kanter", que ressalta a importância danecessidade de a alta administração estender amotivação e a habilidade ao pessoal de nívelhierárquico mais baixo. Entretanto, nenhumdesses livros é tão sólido e instigante quanto oOrganizational Culture e Leadership de Schein",o mais profundo aporte ao elemento "cultura"do "novo" debate. Ainda assim, sob alguns as-pectos, eles podem ser tratados como marcos,pelo menos no gênero mais popular de livrosde administração. Eles foram escritos numaépoca em que a economia americana estavacomeçando a sentir a ameaça do aumento dacompetição e da iminente crise econômica delonga duração; e refletiram a consciência cres-cente de que os processos administrativos po-deriam estar fortemente implicados na nature-za cada vez menos competitiva dos negóciosnorte-americanos. Como Schein" coloca, oconceito de cultura organizacional pareciaconter a promessa de compreender a formapela qual as organizações crescem, mudam,freqüentemente "fazem coisas que parecem nãoter nenhum sentido", assim como fracassar, pro-blemas considerados cada vez mais importan-tes para o desempenho econômico global.

Neste artigo, desejo tecer breves considera-ções sobre parte da literatura mais recente de-rivada desses primeiros livros, em particular

7. OUCHI, W. Theory Z. Rea-ding (Mass.), Addison Wes-ley, 1!:l81.Já traduzido parao portuçuês: Teoria Z - Co-mo as Empresas podem en-frentar o desafio japonês.São Paulo, F.E.B., 1982.8. LE BOEUF, M. How toMotivate Peop/e. London,Sidgwick Softbacks, 1988.9. SEM LER, R. Virando aPrópria Mesa. São Paulo,Best Seller, 1988.10. IACOCCA, L. /acocca: anAutobiography. New York,Bantom, 1986. Trad. port:/acocca, uma autobiografia.São Paulo, Cultura, 1985.11. HARVEY-JONES, J. Mak-ing it Happen.London, Co1-lins, 1988.12. JACKALL, R. Mora/ Ma-zes: The Wor/d of CorporateManagers. New York e Ox-ford, Oxford UniversityPress, 1988.13. Idem, ibidem, p. 6.

14. PETERS, T. & WATER-MAN, R. In Search of Exce/-/ence. New York, Harper andRow, 1984.15. OUCHI, W. Op. cit.

16. KANTER, R. M. TheChange Masters. New York,Touchstone Book, 1983.17. SCHEIN, E. H. Organiza-tiona/ Cu/ture and Leader-ship. San Francisco e Lon-don, Jossey-Bass, 1986.18. SCHEIN, E. H. Op. cit.,pp.1-2.

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19. MAJARO, S. The Cre-ative Gap: managing /deasfor Profit. Harlow, Longman,1988, p. 5.20. PETERS,T. Op. cit., p.3.21. WATERMAN, R. H. Op.cit., p. 108.

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do In Search of Excellence. Os seis trabalhosque vou focalizar (já mencionados no iníciodeste artigo) não são meras versões popularesou atualizadas das idéias originais, pois elesas ampliam e consolidam de maneira signifi-cativa. Mais precisamente, embora continuema ver como problema central as mudanças decultura organizacional, eles também dão maisatenção à questão do excesso de burocracia ede estratos na administração. Parece que Pe-ters e Waterman puseram em marcha umanova onda na teoria da administração, carac-terizada pela ênfase sobre a mudança comoum processo contínuo, ao tentarem abordar oproblema colocado pelo fato de que até em-presas bem-sucedidas podem ser atingidaspor crises (realmente, como tem sido dito, vá-rias das empresas chamadas de "bem-sucedi-das" por Peters e Waterman, tiveram proble-mas logo após a publicação de seu livro). Oque é comum a esses livros e aos de Kantrowe Morgan é o ponto de vista expresso por Ma-jaro, segundo o qual "sem criatividade, não sepode ter inovação e sem inovação, uma organiza-ção não pode ser ou permanecer bem-sucedida"»,A ênfase está na necessidade de levar as orga-nizações a um estado em que elas possammanter continuamente um desempenho ele-vado, através "do aprendizado do amor pela mu-dança", para usarmos uma frase de Peters.Para alcançar esse estado, é necessário maisdo que simplesmente inventar empresas bem-sucedidas; e, sim, o que Peters chama de umarevolução, de tal forma que as organizaçõespossam aprender a prosperar no caos e a re-novar-se continuamente.

PROSPERANDO NO CAOS E SUPERANDO ASCONSTRIÇÕES DA TRADiÇÃO (Watennan, Peters e KantrowJ

Os temas de The Renewal Factor de Water-man e Thriving on Chaos de Peters têm muitoem comum. Como Peters diz (caracteristica-mente com um toque de exagero), "nenhumacompanhia está segura. A IBM é declarada mortaem 1979,a melhor das melhores em 1982,e mortaoutra vez em 1986"20.O Renewal Factor continuaonde o In Search of Excellence parou: empresasbem-sucedidas se renovam, uma vez que "ne-nhuma organização pode manter excelência semrenovação". Ambos, Peters e Waterman, esti-mularam as organizações a adotarem novosprincípios a fim de responderem ao ambientecada vez mais competitivo, e isolaram oitoatributos das empresas "excelentes" ou "bem-sucedidas": predisposição à ação; estar juntodo cliente; autonomia e iniciativa*;produtivi-dade através das pessoas; mãos à obra, orien-tadas por valores; restringir-se ao conhecido;

forma simples, equipes pequenas; proprieda-des flexíveis/rígidas simultâneas.

A ênfase foi retirada da racionalidade ex-cessiva dos teóricos do controle da adminis-tração e da escola das organizações baseadana estratégia/estrutura, a paralisia da análi-se,**para usar um termo de Waterman21

• Em-presas bem-sucedidas davam prosseguimentoàs coisas, eram orientadas para as pessoas,não eram desordenadas pela burocracia e evi-tavam o domínio dos contadores. Peters eWaterman abriram a discussão sobre umnovo pensamento organizacional. Primeira-mente, criticaram as finanças e o mercado fi-nanceiro, que levam a ataques-surpresa nacompra de ações, a aquisições e fusões semprestar atenção suficiente aos problemas in-ternos das empresas, e daí ao papel dos as-suntos organizacionais na vantagem competi-tiva e nos problemas dos EUA. Em segundolugar, eles mostraram-se céticos em relação àsênfases da teoria organizacional, em particu-lar, em relação à tendência dos estruturalistasde tornar as organizações cada vez mais com-plicadas e desajeitadas, como sob o princípiomatricial. Em resumo - para usar os termoscomumente aplicados - as perspectivas docontrole administrativo e financeiro são vistascomo muito rígidas, a perspectiva do desen-volvimento organizacional (DO) como muitobranda, os estruturalistas como quem compli-ca demasiadamente as coisas. Peters e Water-man optaram por uma forma que combina o"rígido" (hard) com o "brando" (soft) - con-troles rígidos sobre os resultados, concedendoconsiderável autonomia nas definições de pri-oridades, decisões e ações.

A mesma estratégia básica de "aprendercom as melhores empresas" é adotada em TheRenewal Factor. Assim, como o In Search of Ex-cellence, o livro é construído em torno das me-lhores empresas que podem fazer e têm feitorenovações. Outra vez identificam-se oitoatributos para as organizações que se reno-vam e um capítulo é dedicado a cada um, detal forma que até mesmo a estrutura do livrosegue a fórmula do In Search of Excellence. Ostemas ou lições que emergem dessas empre-sas inovadoras são:

- oportunismo informado- direção e autonomia- fatos favoráveis e controles apropriados- nova solidariedade- trabalho em equipe, confiança, política epoder

• Nota da Editora: no original, entrepreneurising.•• Nota da Editora: Há uma rima Quese perde na traduçãode ana/ysis para/ysis.

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- estabilidade em movimento- atitudes e atenção- causas e comprometimento

Embora o livro esteja preocupado com aestratégia, a ênfase é outra vez colocada nãono planejamento a longo prazo, mas no esta-belecimento de uma trajetória para o futuro,tratando a estratégia como uma questão de"oportunismo informado". As virtudes daação são outra vez exaltadas. As organizaçõesque se renovam determinam os caminhos,não uma estratégia detalhada para as suascompanhias e comportam-se como oportunis-tas informados. Elas tratam a informaçãocomo sua principal vantagem estratégica e aflexibilidade como sua principal arma estraté-gica, evitando o planejamento a longo prazo.

Subjacente ao livro todo está a necessidadede administradores e organizações "rende-rem-se às memórias" e "quebrarem a armadi-lha do hábito" - em suma, o passado deveser tratado como passado (como dizem os eco-nomistas) e a mudança deve ser tratada comonorma (como os teóricos das organizações es-tão propensos a dizer). Todos esses temas sãoreiterados por Kantrow, Morgan, Peters e Kan-ter. O diagnóstico da forma de muitas organi-zações permanece muito semelhante ao apre-sentado no In Search of Excellence - elas po-dem ser excessivamente burocráticas, e os ad-ministradores estão muito obcecados com pla-nos e muito divorciados das operações.

O livro Thriving on Chaos de Peters é um es-boço compreensivo de todos os elementos deuma estratégia organizacional montada paraobter uma alta receptividade. E dominadopor um conjunto de prescrições apresentadasde maneira muito clara, passo-a-passo. Oponto inicial do conjunto de soluções é que asempresas devem encarar o que Peters chamade a "era da incerteza sem precedentes". A re-volução que Peters propõe vai implicar naaceitação da fragmentação dos mercados e naconstante procura da diferenciação dos pro-dutos, da captura de nichos e do aumento dovalor adicionado. As empresas bem-sucedi-das terão menor número de níveis na estrutu-ra organizacional; serão mais descentraliza-das e compostas de unidades mais autôno-mas; patrocinarão atitudes voltadas para aconsciência de qualidade e de serviço e cres-centemente verão a sua equipe altamente trei-nada e flexível como seu principal meio deadicionar valor.

Isso não é modificar, mas sim usar comobase o que foi proposto em In Search of Excel-lence, na medida em que a importância do pa-gamento relacionado à performance, "adminis-

trar pelo exemplo", a criação de um "senso deurgência", e outros elementos do modelo an-terior são reiterados.

Em contraste com o estilo quase de manu-al de Peters, o livro de Kantrow, The Cons-traints of Corporate Tradition, é altamente dis-cursivo e, tal como o de Waterman, recorre aum material tão extenso que transcende asfronteiras do mundo dos negócios. No casode Kantrow, o meio parece ser parte da men-sagem: seja eclético, leia e pense o mais am-plamente possível para criar um novo con-junto de mentes para a corporação. Seu obje-tivo principal parece ser o de ressaltar não sóa importância da cultura, mas também os pe-rigos inerentes a ela. Muito freqüentemente,as organizações escondem-se atrás da cultura- "essa é a maneira pela qual fazemos as coisasaqui". A recente ênfase sobre a cultura na teo-ria das organizações é importante porque osadministradores dificilmente querem admitirque estão operando com categorias definidasde maneira restrita e dominada por conven-ções. Como Waterman, Kantrow chama aatenção para a tendência predominante daquantificação: "Como alguns economistas de li-vros-textos, preferimos operar e interpretar pormédias e extrapolações, não por exceções ou sin-gularidades histôricasí", As organizações pre-cisam tornar-se mais autoconscientes dos de-talhes do seu passado e do processo históricosubjacente a seu desenvolvimento. "Instru-ções geniais para mudar a cultura de uma organi-zação" podem fazer sentido, mas freqüente-mente "refletem pouca compreensão do que exa-tamente pode ser mudado por uma boa adminis-tração - ou como"", Infelizmente, Kantrowfornece poucos detalhes para sustentar suassugestões. Ele faz pouco mais que um alertaaos administradores sobre os problemas en-volvidos com o emprego da ênfase cultural.Assim, sua contribuição principal é lançar luzsobre o fato de que o objetivo não é negar acultura de uma organização ou começar denovo, mas, antes, o de as organizações desen-volverem um senso de suas histórias e se fun-damentarem nos "processos ocultos pelos quaisas organizações realmente se lembram". A pres-crição parece impor às organizações a manu-tenção de uma espécie de auditoria cultural,que envolverá uma análise dos sucessos e fa-lhas passados, assim como questões detalha-das, tais como "até que ponto a decoração de umescritório é feita para significar alguma coisa?">.

A tese compartilhada por esses três livros éque a cultura é primordial, pois ela estruturao modo pelo qual as pessoas pensam, tomamdecisões e agem nas organizações. SegundoPeters e Waterman, os administradores preci-

22. KANTROW, A. Op. cit.,p.51.

23. Idem, ibidem, p. 157

24. Idem, ibidem, p. 160.

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25. MORGAN,G. Op. cit.26. Idem, ibidem, p. 113.27. Idem, ibidem.28. Idem, ibidem, p. 64.29. Idem, ibidem, idem.30. BURRELL, G. & MOR-GAN, G. tne SociologicalParadigms and Organizatio-na/ Ana/ysis. London, Heine-mann, 1979.

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sam criar uma cultura organizacional forte, naqual todos os membros - tendo sido devida-mente selecionados - são socializados, a fimde unir a organização. As pessoas gozam deconsiderável autonomia na decisão de comoagir, contanto que sejam congruentes com umconjunto de objetivos e direções previamenteacordados ou vindos de cima. Entra a cultura:sai a politicagem. Waterman diz isso explicita-mente: a politicagem, que é baseada em calú-nias e pessoas que não compartilham, é dis-funcional. Leva as pessoas a tornarem-se pos-sessivas em relação a suas idéias e exacerba osproblemas de cooperação, de capital investidoe de comportamentos que se tornam tradi-ções. Nesse ponto, o argumento tem os mes-mos fundamentos do desenvolvimento orga-nizacional. O trabalho em equipe torna-se aforma desejável de operação e espera-se queele dê fim à politicagem. Os livros, entretanto,fornecem poucas sugestões de como isso é al-cançado, e eu quase posso ouvir os adminis-tradores dizendo: "se ao menos fosse tão fácil".O assunto é amplamente uma questão de nos-sas concepções sobre convenções solidifican-do-se em categorias, para usar uma frase deKantrow. O culturalismo é, então, levado aoseu extremo.

Segundo Kantrow, os conceitos são sobrefronteiras, e são estas que precisam ser muda-das. Waterman também leva isso ao seu extre-mo: as fronteiras entre administradores, entretrabalhadores e administradores, e até mesmoentre fornecedores e organizações precisamser dissolvidas. A totalidade de um cenárioorganizacional torna-se sem fronteiras. Namelhor das hipóteses, a única fronteira apa-rentemente permitida seria entre o indivíduo,um grupo e o receptor de sua produção, de talmodo que todo mundo tivesse um cliente e seorientasse em função do cliente. Até mesmo adivisão entre administradores e administra-dos se rompe, na medida em que a organiza-ção moderna é um "time", e não mais "eles enós", ou algo rachado por uma politicagemdesagregadora. Tais organizações estão pro-curando (ou deveriam estar - o argumentonão é sempre claro) um compromisso maior euma contribuição para novas idéias e desen-volvimentos de toda a sua força de trabalho,ou membros, para usar o termo correntemen-te preferido.

CAVALGANDO NAS ONDAS DA MUDANÇA (Morgan)

O trabalho de Morgan situa-se em primeiroplano na literatura sobre a nova onda admi-nistrativa. Segundo Morgan, a taxa de mu-dança continua a aumentar e uma nova abor-

dagem da administração terá que envolveruma remodelagem do ambiente sócio-econô-mico. Isso vai requerer mais que simplesmen-te aprender com as organizações bem-sucedi-das ou excelentes. Em um veio similar ao deWaterman, Morgan move o debate, dessa for-ma, para uma administração renovadora epró-ativa. Ele argumenta que não é suficienteolhar para o que as organizações bem-sucedi-das já estão fazendo, pois também é necessá-rio ser pró-ativo em relação ao futuro: anteci-par algumas mudanças que têm probabilida-de de ocorrer e posicionar as organizações eseus membros para lidar com esses novos de-safios efetivamente".

As mensagens normativas são claras: osantigos modelos burocráticos de organizaçãocom papéis superdefinidos devem ser aban-donados e os responsáveis pela introduçãodas novas tecnologias devem facilitar essatransformação; "assim, as pessoas podem definirsuas próprias conexões e contribuições em relaçãoao coniunto"": Outra vez, a principal área deinteresse é a de atitudes: a necessidade de umconjunto de mentes novo e pró-ativo. Morganalega que baseia o seu livro "nas descobertas deuma pesquisa que envolveu executivos seniors emum projeto de aprendizado-ação delineado para ex-plorar implicações de tendências ambientais chavepara o futuro de suas organizações"?'. Todavia, asidéias apresentadas nesse livro são, com de-masiada clareza, parte de um conjunto deidéias correntes dos autores atuais da admi-nistração, para terem vindo somente desseprojeto, que parece ter como principal contri-buição citações dos executivos usadas liberal-mente, para dar sustentação aos argumentosgerais de Morgan: "todos os líderes nos negóciosdevem aprender a olhar para fora; o mundo é ago-ra uma vila comercial">. "Se nós nos vemos defi-nidos pelas tarefas que estamos executando agora,podemos estar menos aptos a ver o que mais pode-ríamos estar fazendo"; e "a motivação das pessoas- mas temos que achar uma expressão melhor -tem que ser parte da descrição do cargo de um ad-minisirador"?'. Como se podia esperar do co-autor de um livro-texto tão importante de ci-ências sociais sobre organizações", Morgannão está inteiramente desatento aos aspectospolíticos. Mas a concessão que ele faz a taisaspectos é um tanto limitada: eles entram emseu conjunto de idéias, principalmente atra-vés do conceito do "parceiro"* da organiza-ção. As administrações devem reconhecer que

* Nota da Editora: o termo no original inglês é stakeholder erefere-se a um amplo conjunto de pessoas (que não se con-fundem com os acionistas) que têm interesses na organiza-ção.

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são responsáveis não somente em relação aosacionistas, mas também face a um conjuntomúltiplo de "parceiros", que inclui emprega-dos, clientes, distribuidores, a comunidade,políticos e grupos específicos de interesses, aquem têm que prestar contas; é a administra-ção simultânea de interesses múltiplos. Amensagem geral é que é preciso colocar-se nolugar de um "parceiro" externo, a fim deaprender sobre a natureza de sua própria or-ganização, porque tal visão externa nem sofreas constrições dos costumes correntes nemestá contaminada pela política interna.

Morgan guarda a maioria de suas mensa-gens com relação à política para a administra-ção do trabalhador e para as relações intra-organizacionais. Ambas estão, de fato, mu-dando (ou deveriam estar mudando - note-se outra vez o problema do possível estadodo argumento). As fronteiras tanto intra comointerorganizações estão se tomando menosclaras: a chave é a interdependência". A hie-rarquia será substituída pela noção de umarede, que deve ser administrada como um sis-tema de "parceiros" interdependentes. Essaabordagem não deve ficar restrita às relaçõesinternas: "0 objetivo deve ser trabalhar através devalores e normas" nas relações tanto intra comointerorganizacionais. A administração passou(passará?) a ter por foco as relações, e não ati-vidades compartímentadas" e essa ênfase ain-da pode tomar-se um importante traço distin-tivo da teoria administrativa pós-Peters e Wa-terman.

DOMINANDO O DESAFIO DO MUNDOPÓs-ENTREPRENEURIAL (Kanterl

A mensagem de Kanter é muito semelhanteà dos outros autores considerados até aqui: elasalienta a onipresença da mudança, as trans-formações revolucionárias em grandes organi-zações, necessárias para responder à economiacada vez mais competitiva e globalizada. As-sim como Peters e Waterman, ela incita as em-presas a se aterem mais aos seus negócios, ou,como prefere ela colocar, a centrarem seu foconaquilo que fazem, e a abandonarem suas es-tratégias de diversificação adotadas no passa-do. Também como eles, ela recorre a exemplosde empresas que estão concentrando seu foco,"emagrecendo" e reorganizando-se radical-mente para alcançar uma nova estrutura e cul-tura pós-entrepreneurial. Kanter também, tal-vez mais que os outros autores aqui examina-dos, indica que tais exemplos estão se toman-do mais e mais difundidos:

"À medida que maiores inovações vêm aconte-cendo ... as observações de mudança que escuto

têm aumentado em volume para soar mais e maiscomo uma revolução de longo alcance na adminis-tração de empresas".

Ela chama essa revolução de "pós-entrepre-neurial" porque está "aplicando princípios de en-trepreneurship à empresa tradicional, criando umcasamento entre a criatividade entrepreneurial e adisciplina corporativa, a cooperação e o trabalho emequipe':". Ela também sugere que empresasmais novas e menos tradicionais estão se de-senvolvendo ao longo dessa mesma linha. As-sim, a autora contrasta o recente desenvolvi-mento da Kodak, para personificar a empresatradicional, com o da Apple, uma empresanão tradicional, que estava dentro do que elaclassifica como o modo cowboy de começar,para mostrar que elas estão chegando ao mes-mo ponto, embora tenham iniciado de modosmuito diferentes, a Kodak sendo burocráticademais, e a Apple sendo excessivamente entre-preneurial.

No entanto, Kanter parece menos certa deque a revolução esteja sendo levada a cabo comsucesso total ou dando a devida atenção paraos problemas que podem surgir. Ela escreve:

"A mudança já está acontecendo, e a Américaestá começando a se ajustar. Mas o problema é quenossa ação ocorre à frente do nosso entendimento.Muitas empresas, muitos administradores, muitosempregados comuns e suas famflias não estão ain-da preparados para enfrentar efetivamente as im-plicações das mudanças que estão oioendo?"

Kanter está particularmente empenhadaem salientar os problemas envolvidos no de-senvolvimento de estruturas e culturas orga-nizacionais apropriadas à era pós-entrepreneu-rial, e as implicações que eles podem ter paraa mobilidade e as identidades pessoais. Estátambém mais preocupada do que qualqueroutro autor aqui analisado com as oportuni-dades que isso pode proporcionar às mulhe-res e à intensificação da participação nos ní-veis mais baixos das organizações.

Kanter partilha as mesmas preocupaçõesbásicas de Peters, Waterman e outros, a saber,a de questionar a concepção superformal deestratégia, que provavelmente estava embuti-da na literatura inicial sobre administração es-tratégica e consultoria; a de alertar os admi-nistradores sobre assuntos negligenciados naadministração estratégica, notadamente oproblema da implementação; e a de esboçaras qualificações de liderança e as estruturasorganizacionais necessárias à sustentação dasnovas estratégias de foco mais concentradoque as empresas estão (deveriam estar) bus-cando. Entretanto, sua abordagem difere dade Peters e Waterman de modo potencialmen-te significativo, pois ela gasta mais tempo dis-

31. MORGAN, G. Op. cit., p.129.32. Idem, ibidem, p. 130.

33. KANTER, R. M. WhenGiants Learn to Dance. Op.cit., p.10.

34. Idem, ibidem, p.54.

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cutindo os problemas e dificuldades envolvi-dos na adaptação à nova era que ela antevê.

Primeiramente, essa autora apresenta astrês principais dimensões da estratégia pós-entrepreneurial - as quais chama de promo-ção de sinergias, alianças e novos fluxos denegócios. Mas, não se contenta simplesmenteem descrever cada elemento, ou como elespodem ser desenvolvidos, posto que ela tam-bém aponta as questões que os administrado-res têm enfrentado ou tendem a ignorar quan-do se voltam para esses princípios, as tensõesenvolvidas na tentativa de alcançá-los, e seusproblemas e vantagens. Por exemplo, em rela-ção às organizações que se reestruturarampara se tornarem mais focalizadas em seusprodutos e atividades administrativas, Kanternos diz que muitos de seus administradoresseniors têm fracassado porque eles negligen-ciaram os problemas de transição e superesti-maram o grau de cooperação que obteriam.Eles também, freqüentemente de maneira in-consciente, criam competições entre vencedo-res e perdedores potenciais. De modo maisgeral, ela trata a realização da nova forma or-ganizacional não-hierárquica, apropriada aopós-entrepr~neurialism, como um problema empotencial. E como se ela dissesse que tem ra-zoável confiança em que as empresas estão(ou estarão) tentando buscar a estratégia pós-entrepreneurial para os negócios, tornando-se,por exemplo, mais focalizadas, mas que elaconfia menos (talvez muito menos) em queelas estejam lidando satisfatoriamente com osaspectos organizacionais e com as conseqüên-cias humanas da sua realização. Os adminis-tradores podem, por exemplo, estar fazendouma reestruturação, mas de um modo que, aseu ver, é anti-pessoas, que exarceba rivalida-des políticas, que não se preocupa com osperdedores e que reduz, mais do que aumen-ta, a cooperação entre as funções. A ocorrên-cia desse caso torna-se especialmente prová-vel quando a reestruturação é feita como umresultado da especulação financeira, em vezde o ser para aumentar a capacidade a longoprazo; é até mesmo provável, ela especula,que subtraia em vez de adicionar valor aosnegócios. Aparentemente, os mesmos movi-mentos em direção a organizações mais enxu-tas, menos hierarquizadas e mais focalizadaspodem, se manejados numa direção ao invésde outra, produzir resultados muito diferen-tes e, na verdade, guiar a aventura para forado seu curso, de volta a uma situação alta-mente conflituosa, na qual o imediatismo, apoliticagem e as desigualdades no poder per-manecem a norma.

Kanter também é mais cautelosa quanto às

virtudes de inovações específicas. Isso é maisacentuado no capítulo de seu livro sobre ossistemas de pagamentos, que é, talvez, o me-lhor capítulo de todos os livros aqui conside-rados. Primeiro, ela torna claro que não é sufi-ciente simplesmente optar por uma das "no-vas" formas de sistemas de pagamento quesão freqüentemente incorporadas sob um úni-co título, tal como Administração de RecursosHumanos. Para ela, é pouco provável que adistribuição dos lucros, um método em moda,produza o tipo de comportamento pós-entre-preneurial requerido; e o objetivo principal éescapar do pagamento por status, isto é, dopagamento igual para as pessoas que estão namesma posição hierárquica, e pagar por con-tribuição. Segundo, ela é cuidadosa, esboça asforças e fraquezas de técnicas específicas, eadmite - o que causa alívio - que nenhum'}delas garante os desempenhos desejados. Eessa admissão das dificuldades para se reali-zar a mudança nas organizações e a renova-ção permanente que a separa dos outros auto-res. Além disso, Kanter presta mais atençãoaos efeitos sobre as carreiras, e às outras con-seqüências humanas provenientes tanto datransição quanto da forma real da nova orga-nização. As carreiras, por exemplo, não serãomais definidas em termos de hierarquias cor-porativas, e finalmente será uma responsabili-dade dos indivíduos a de se manterem em-pregáveis; a segurança deles residirá precisa-mente na sua empregabilidade. E, contraria-mente à visão japonesa, é provável que au-mente a mobilidade entre as empresas e queos planos de carreira se tornem mais comple-xos, tanto em termos de pertinência à organi-zação, como de perfis de qualificação. Elatambém está atenta aos possíveis problemasdecorrentes do excesso de empenho, o que éum antídoto muito útil para o estilo-Peters de"obsessão" com qualidade e trabalho duro.

Kanter também não restringe a sua atençãoàs políticas corporativas, visto que no seu ca-pítulo de conclusão discute várias questões-chave para a política nacional. Por exemplo,haverá necessidade de os governos repensa-rem e se envolverem em políticas de treina-mento, assim como de uma rede de segurançapara os trabalhadores deslocados. No entanto,o motor central da mudança permanece,como nos outros livros, na liderança da in-dústria. Kanter, ainda assim, está insistindoem que uma das áreas mais negligenciadas éexatamente a do desenvolvimento do novoconjunto de qualificações de que esses líderesnecessitam. Uma das qualificações importan-tes que ela ressalta é o respeito pelo processode implementação, assim como à substância

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do que é implementado, o que ela chama defoco do processo.

Apesar de, na discussão das dificuldadesda transição, Kanter estar mais atenta aos pro-blemas de poder que podem se desenvolver,ela tampouco enfrenta os maiores problemasdo poder subjacentes aos argumentos, parti-cularmente o de como sairemos de uma situa-ção que, em seus termos, é um flagrante dese-quilíbrio de poder para outra onde haja maiordivisão desse poder, tanto dentro das organi-zações como entre elas. Por exemplo, como éque um pequeno fornecedor de componentespara a Ford, que insiste numa entrega ]ust-in-Time, mesmo que seja abordado por um re-presentante que tem todas as qualificações daadministração proposta por Kanter, realmenteconsegue estar em uma posição simétrica depoder e status face a tal companhia? Como osrepresentantes sindicais expressam suas rela-ções com os administradores numa posiçãocompletamente nova, quando as empresasque estão ocupadas em desenvolver estraté-gias de relações industriais cooperativas comeles também estão substancialmente ocupa-das em aumentar os seus investimentos noexterior e, freqüentemente, de um modo bas-tante fechado? Como Kanter negligencia essasquestões, embora seu trabalho seja diferencia-do - não chega a haver um divisor de águasfundamental entre ela e os outros autores.

A ATRAÇÃO DA NOVA ONDA

Em contraste com livros de sucesso comoThe One Minute Manager" de Blanchard e[ohnson, que é direcionado para o administra-dor individual, Peters, Waterman e outras no-vas estrelas dirigem suas mensagens e receitasà organização como um todo. Não é o indiví-duo por si que tem que mudar seu comporta-mento, ou o nível individual que deve ser oobjetivo da intervenção, mas a organização.Permanece, no entanto, a implicação de que éno nível dos administradores seniors que sedeve buscar iniciativa, liderança e mudança, eé para eles que as mensagens são dirigidas,em primeira instância. Apesar disso, parte damensagem da maior parte da literatura é queos papéis de liderança se propagam (ou deve-riam propagar-se) crescentemente abaixo donível da diretoria ou do executivo (note-se ou-tra vez a dificuldade de se dizer se a mensa-gem é normativa ou positiva).

Os livros de "consultoria" freqüentementeaparecem com o propósito de proporcionarconselhos que administradores de todos os ní-veis possam seguir. Isso estende-se desde o deum proeminente homem de negócios (citado

por Waterman), de tomar longos banhos de ba-nheira ao invés de chuveiro, de modo a ter umtempo para meditar e pensar criativamente,até o de Kantrow", mais solidamente baseado,de que cálculos, técnicas e planos estratégicosdevem ser usados como estimulantes e nãocomo substitutos de um esforço de pensamen-to. Tais "dicas" sozinhas não explicam o gran-de impacto desses livros. Mais fundamentalpara seu significado é o fato de que suas idéiasrepercutem com mudanças importantes naconcepção de certas (muitas?) pessoas sobrecomo a sociedade deve ser gerida. Eles certa-mente parecem consistentes com a direção ge-ral que muitas administrações têm tomado oupensam ter tomado, nos anos 80. Isso é algoque poderia ser proveitoso explorar mais.

O apelo de Peters, Waterman e dos outrosautores provavelmente relacionava-se tanto àformação de identidades quanto ao valor dastecnologias ou formas organizacionais que elespropõem. A administração percorreu um lon-go caminho desde a declaração de Rooseveltde que os líderes das grandes corporações re-velavam uma forte incompetência e eram umaautocracia indefensável. Mas a administraçãopermanece uma ocupação sem uma identida-de profissional clara; um papel cheio da tensãode harmonizar interesses diferentes dentro (efora) da moderna organização; e uma carreiracheia de incerteza, riquezas em potencial e sta-tus elevado, e possíveis decepções e estagna-ção. Esses livros retratam a administração sobum olhar generoso, no caso de Waterman qua-se explicitamente procurando apresentarexemplos positivos, para contrapor às imagensnegativas apresentadas, por exemplo, em Dal-las e Dinastia na televisão; como uma empresacom um potencial altamente criativo em igual-dade de condições com a aventura e excitaçãoda pesquisa científica e dos negócios rotativosdo mundo financeiro; e como o elemento cru-cial na criação da riqueza. Em contraste comRoosevelt, os administradores são apresenta-dos como competentes nas raias da excelência,resumindo, diretores altamente defensáveis enão autocratas.

A ADMINISTRAÇÃO TORNA-5E VERDE

O que torna o livro de Elkington tão inte-ressante é que ele partilha uma nova confian-ça encontrada na administração. Num primei-ro momento, ele parece muito diferente dosdemais livros aqui resenhados; numa inspe-ção mais cuidadosa, fica nítido que se trata deum livro de administração, o qual certamenterepresenta uma indicação da influência quePeters e Waterman têm exercido. Elkington

35. BLANCHARD, K. &JOHNSON, S. The One Mi-nute Manager. London, Fon-tana, 1983. Tradução portu-guesa: O Gerente Minuto.Rio de Janeiro, Record,1981.

36. KANTROW, A. Op. cit.,p.14.

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37. ELKINGTON, J. & BURKE,T. Op.cit., p. 202.

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começa observando que Peters e Watermanignoram completamente a agenda verde oucomo suas empresas bem-sucedidas ou exce-lentes lidam com a questão ambiental. Entre-tanto, nos termos de Elkington, isso não refle-te as empresas bem-sucedidas, mas somentePeters e Waterman: assim, ele continua ten-tando mostrar, com inúmeros exemplos de-sordenados através do livro, quantas das em-presas bem-sucedidas estão introduzindopensamentos sobre a questão ambiental, elas"têm construído uma reputação por excelênciaambiental". Além disso, essa omissão é a únicacrítica feita a Peters e Waterman por Elking-ton, que, na verdade, adota os métodos e fór-mulas deles; Elkington concentra-se no relatode empresas bem-sucedidas e confia no queelas dizem estar fazendo; em última instância,ele não vê problemas ou mesmo implicaçõesde custos, na busca da excelência em todas asdimensões, seu objetivo básico é conclamartodas as empresas a seguirem o exemplo dasempresas excelentes; o autor coloca a grandeempresa moderna no centro da política social;e até acaba adotando a fórmula de Peters eWaterman para esboçar os passos (nesse casosão dez) necessários para se alcançar a exce-lência. Sua argumentação é parcialmente ba-seada na demonstração de que há fontes delucro em produtos "verdes", e de que as em-presas serão crescentemente forçadas a en-frentar esses problemas - como as empresasde amianto têm enfrentado - no mínimo,

porque terão dificuldades com o seguro. El-kington é mais confiante que isso, todavia; seas empresas buscam excelência, elas inevita-velmente acabarão tomando consciência daquestão ambiental.

Na verdade, Elkington retrata uma visãootimista, segundo a qual "as indústrias de pon-ta já estão conscientes de que no planeta de ama-nhã a excelência econômica e a ambiental estarãode mãos dadas". A intenção, como a de Peters eWaterman, é de ajudar a difundir essa atitudee Elkington, ele mesmo um consultor, está, arigor, fazendo publicidade de seus produtos,esperando atrair empresas que estão pensan-do em "tornar-se verdes" para procurar suaajuda. Ele leva o argumento de Morgan a seuextremo lógico e literal; a preocupação cres-cente das empresas em monitorar o ambientesignificará que elas acolherão a questão "ver-de": "se a excelência ambiental tornar-se uma me-dida-padrão para o sucesso de um negocio, devehaver uma boa chance de podermos ter tanto in-dústria como peixes, permanecendo aberta a opçãode lavarmos nossa roupa nas margens do rio"?'.

Além disso, a abordagem global e as técni-cas prescritas pelos comentadores da admi-nistração moderna levarão a uma fusão dosnegócios com as questões ambientais; pois,mesmo se, como Waterman, eles evitarem oplanejamento a longo prazo, excessivamenteformal, os horizontes de tempo vão se esten-der para cada vez mais além dos dois ou trêsanos seguintes. Mais do que isso, a substitui-

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ção do controle de qualidade pelo controle to-tal de qualidade (ou segurança de qualidade,como Elkington a chama) levará a produção eseus efeitos poluidores no contrafluxo até odesign e o marketing, e mais adiante estimularáuma abordagem integrada da administração.Assim, longe de anular a visão instrumentaldo meio ambiente, Elkington amarra-a maisfirmemente a um ar otimista, enraizado numaapreciação do pensamento administrativomoderno (ou, pelo menos, de uma parte deleque é altamente influente). Sua abordagem re-flete, deste modo, uma falha mais geral deboa parte da teoria da administração; ela nãoobjetiva desfazer a visão utilitária das rela-ções sociais e do meio ambiente, que tem do-minado o século vinte, e à qual as primeirasteorias das organizações, tais como a de rela-ções humanas e a sócio-técnica, fizeram pelomenos menção. Mais do que qualquer outracoisa, é o uso liberal que Elkington faz da lin-guagem administrativa de Peters e Water-man, e particularmente da atual palavra deordem - excelência - que de fato sugereque, talvez, uma "nova onda" de teoria da ad-ministração tenha começado nos anos 80 e pa-rece provável que continue. Daqui para afrente vou mencionar essa possibilidade comoa nova onda, sem aspas, mas os leitores de-vem notar que isso é apenas para facilitar acomunicação.

A ESPECIFICIDADE DO PENSAMENTO DA NOVA ONDA

Os cientistas sociais têm-se inclinado aapresentar a história da teoria da administra-ção em termos de um cantinuum. Bravermannão estava só ao ver todas as noções pós-tay-loristas como simples polimentos no modelobásico de controle taylorista. Em um nívelmuito geral de análise, as várias abordagensda administração poderiam ser tratadas comopartes de uma mesma perspectiva mais im-portante. Todavia, isso é insatisfatório, pois senos aprofundarmos em questões mais especí-ficas, tais como o que estaria envolvido emuma mudança de estratégia, e seguíssemoscada uma das várias teorias, as diferenças ra-pidamente viriam à tona. A nova onda é cla-ramente distinguível do taylorismo por su'Jênfase nos papéis frouxamente definidos. Etambém igualmente distinguível de algumasteorias mais recentes. Ela difere do Desenvol-vimento Organizacional (0.0.)na sua reênfa-se sobre a importância da ação, do desempe-nho da tarefa, e do conteúdo, ao invés dosprocessos de tomada de decisão. Ela partilhacom o 00 a preocupação de eliminar a politi-cagem, mas suas prescrições diferem da auto-

análise do 00. Ao contrário, a ênfase é colo-cada nos administradores como estadistas dascorporações, em formas não hierárquicas deorganização e em abordagens direcionadaspara as tarefas de desenvolvimento dos gru-pos. A mudança é de uma postura reativapara uma pró-ativa e do controle para o estiloentrepreneurial de administração.

A nova onda também se coloca em contra-posição à escola da estratégia/estrutura. Pe-ters e Waterman eram, no momento em queescreveram In Search af Excellence, consultoresna McKinsey' s, que tinha experimentado umconsiderável crescimento e proeminência àmedida que a indústria de consultoria de ad-ministração começou a se internacionalizar,no final dos anos 60 e nos anos 70. Ela se es-pecializou em reorganizações estruturais e fi-cou famosa por introduzir M.B.O. (Adminis-tração por Objetivos - Management by Objecti-ves), Administração Divisional e um sólidosistema de relatórios. Na Grã-Bretanha, porexemplo, a McKinsey's foi intensamente usa-da no setor público, incluindo o Serviço deSaúde, o Banco da Inglaterra e a BBC.No fi-nal dos anos 70, o Boston Consultancy Groupcomeçou a ganhar uma considerável eminên-cia, e suspeita-se de que tenha tomado umaparcela do mercado da McKinsey's e de ou-tros consultores. Eles tinham um pacote parti-cular que, de várias formas, seguia o modelode estratégia/ estrutura de Chandler". Segun-do a versão normativa desse modelo, a orga-nização é desenhada à luz da estratégia doproduto da empresa e, portanto, depois que aestratégia da corporação tenha sido decidida.Armado com esse modelo, o consultor pri-mordialmente encorajaria as empresas a iden-tificarem "seus negócios" (a um desses tiposde negócios foi dado o nome de (cash caw) eentão inseriria isso em uma fórmula, que de-terminaria a forma organizacional apropria-da. Os livros de Peters e Waterman aqui anali-sados constituem um ataque ainda mais claroa essa abordagem do que o feito no In Searchaf Excellence, pois, de acordo com eles, ela temuma visão excessivamente racional do desen-volvimento estratégico e ignorou o fato deque o mais importante componente do ativode uma empresa são suas qualificações coleti-vas, e, dessa forma que, em um sentido muitoreal, a organização precede a estratégia doproduto,

E mais difícil especificar a relação entre anova onda, tal como foi discutida até aqui, eoutros desenvolvimentos recentes na teoriadas organizações, tais como a administraçãode recursos humanos e a administração japo-nesa, no mínimo porque estes podem ser defi-

38. CHANDLER, A.K. Stra-tegy and Structure. Cam-bridge (Mass), Mil Press,1962.

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39. LEGGE, K. Human Re-source Management - A Cri-ticai Analysis (mimeo). Lon-don, University of LondonImperial College, School ofManagement, 1988.40. MORGAN, G. Op. cit., p.102.41. SCHONBERGER, R. J.Japanese ManufacturingTechniques. New Vork, TheFree Press, 1982.42. SCHONBERGER, R.J ..World Class ManufacturingCasebook. New Vork, TheFree Press, 1987.

43. PETERS, T. Op. cit., p.117.

44. MAJARO, S. Op. cit.

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nidos e interpretados de várias maneiras. Naverdade, talvez esses autores, a quem me re-feri como a nova onda, evitem o termo admi-nistração de recursos humanos a fim de pas-sar ao largo de problemas espinhosos, tantode definições como de valores (conforme Leg-ge39). Eles também evitam tornar-se muitodeslumbrados pela moda da administraçãojaponesa, e implicitamente aconselham os ou-tros a fazerem o mesmo. Técnicas tais comoKanban e Controle de Qualidade Total são im-portantes, mas não são substitutas para a mu-dança organizacional e o desenvolvimento devalores compartilhados. Na verdade, elas nãoserão bem-sucedidas se forem tratadas comotécnicas que podem ser simplesmente trans-plantadas: Morgan" relata a sugestão de doisexecutivos de que Just-in- Time é um processoque "envolve uma mudança cultural tanto quantouma mudança técnica". Mesmo Schonberger",que se concentra no Just-in- Time como ummétodo da administração da produção e apa-rentemente subestima a cultura em seu trata-mento da administração japonesa, não está in-sensível aos aspectos relacionados a atitudes.

Na verdade, quando arranhamos a superfí-cie dos diversos livros de administração, mui-tas das suas aparentes diferenças se dissol-vem e um argumento "culturalista", da "novaonda" aparece em comum, como um cavalei-ro em sua armadura brilhante, pronto parabatalhar com a competição japonesa. Sua ar-madura não é a dureza dos métodos quantita-tivos e das concepções deterministas da estra-tégia corporativa, mas o que, em contraste, échamado de lado soft da administração, que éuma administração mais qualitativa e orienta-da para as pessoas.

A PREDISPOSiÇÃO PARA AGIR

Nessa nova onda, todavia, a participaçãonão é mais a panacéia para todos os males,nem é autocrática. As pessoas não marchammais para a guerra armadas apenas com a úl-tima técnica das escolas de administração oupara executarem as últimas instruções ou pro-jetos concebidos por estrategistas intocáveisda corporação, para estar vulneravelmenteexpostas à força da cultura japonesa. Hoje emdia, elas estão protegidas por uma culturaigualmente purificada. Mas, como é ela? Issopermanece obscuro; mas nela se encorajam aação e o correr riscos - somos todos entrepre-neurs assim como administradores. Vista des-sa forma, é uma "cultura" entrepreneurist (ouo que tem sido denominado entrepreneurshipinterno ou intrapreneurship) que pode resolvero problema que tende a atormentar qualquer

analista organizacional culturalista, a saber,como podemos fazer mudanças significativasna organização, na ausência de uma grandemudança prévia nas atitudes, a qual pode,por sua vez, requerer um longo programa dedesenvolvimento organizacional (como ospromotores dessa abordagem admitiram li-vremente)? A resposta encontra-se na predis-posição para a ação.

E através das ações dos administradores -estabelecendo objetivos, operacionalizando es-quemas de pagamento relacionados ao desem-penho, iniciando mudanças a partir do topovisando mais criatividade - que podemos es-perar adotar novas atitudes e valores compar-tilhados. Os administradores, no entanto, de-vem estar mais conscientes do elemento sim-bólico em suas ações. Colocada dessa forma, anova onda pode ser vista como revertendo asuposição de boa parte do 0.0. (assim comocertas versões das novas relações industriais),de que as atitudes afetam a ação. A beleza dis-so é que ela resolve um dos muitos dilemasque cercam a confrontação do poder competi-tivo do Japão, a saber, se suas práticas admi-nistrativas estão enraizadas em sua culturamais ampla. Se esse for o caso, então a possibi-lidade de responder ao sucesso japonês sim-plesmente através da imitação torna-se alta-mente questionável. Se, todavia, o núcleo desuas inovações for isolado e capaz de sertransplantado para um solo estrangeiro, os ad-ministradores seniors, fora do Japão, podemdormir mais confortavelmente à noite. Entre-tanto, a ênfase da nova onda sobre a ação sig-nifica que não precisamos deliberar sobre a ex-tensão da especificidade cultural dos métodosjaponeses. Os métodos de produção Just-in-Time aliados a outras mudanças (por exemplo,nos sistemas de recrutamento, recompensa eavaliação) envolvem ações cujas dimensõessimbólicas devem encorajar mudanças nas ati-tudes, e uma maior disciplina e autogerencia-mento. Resumindo, o JIT encoraja a iniciativa.Como Schonberger" diz, por exemplo, depen-de de se dizer aos trabalhadores, "se algumacoisa estiver errada, você pára a produção, procuraa causa, faz o conserto e somente então você reco-meça a produção". Ou, como Peters" fala dos re-presentantes de venda, ele os encoraja a seremmais que "vendedores que não saem de trásdo balcão", e sim analistas das operações e ne-cessidades de seus clientes.

Comum a todos os autores do tipo consul-tor aqui analisados, está a noção de que mui-tas das técnicas de negócios, e certamente astécnicas para melhorar a criatividade (veja,por exemplo, Majaro)", devem ser usadasmuito mais amplamente nas organizações do

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que o são no momento. Dessa forma, os círcu-los de qualidade não devem ficar confinadosapenas aos trabalhadores, pois brain storminge outras técnicas de criatividade, usualmenterestritas às pessoas mais elevadas na hierar-quia, são tão apropriadas para os trabalhado-res quanto para os administradores. Na ver-dade, precisamos nos livrar da visão do pro-cesso criativo como uma atividade de especia-listas, somente apropriada para os departa-mentos de pesquisa e desenvolvimento, demodo que "a importância da criatividade sejaamplamente aceita por todos". Talvez seja esse oobjetivo último dos autores da nova onda, umfim para o plateau do pensamento entre os ad-ministradores e para as exigências mínimasfeitas aos trabalhadores.

Embora tais idéias possam não ser novas,talvez seja tanto o contexto no qual elas estãosendo desenvolvidas quanto o seu próprioconteúdo, o que lhes proporciona um signifi-cado renovado. Em particular:

1) Há o modo pelo qual os "produtos" es-tão sendo desenvolvidos, de maneira quemais e mais empresas vendem um serviço enão somente um produto manufaturado.Uma empresa de computadores como a IBMéhoje, essencialmente, uma empresa de siste-mas, e não está mais apenas competindo comum ou dois outros fabricantes. Por exemplo,ela estará oferecendo consultores de contabili-dade e de administração para trabalhar noBritish National Health Service. Grandes em-preiteiros da construção civil, como Costains,na Grã-Bretanha, estarão competindo com es-pecialistas em administração de projetos, taiscomo a empresa de contabilidade Coopers eLybrand.

2) A importância crescente do setor terciá-rio, e a conseqüente ênfase em serviços paraos clientes e na visibilidade dos clientes paramaior parcela da força de trabalho.

3) A natureza mais fluida dos arranjos notrabalho, à medida que a administração deprojetos e designações de curto-prazo tor-nam-se cada vez mais importantes.

4) Há uma crescente preocupação com umarelação mais próxima entre fornecedores e cli-entes baseada na confiança e aprendizadomútuos.

5) A atenção crescente aos níveis de mão-de-obra dentro da administração e a médiagerência como o local mais óbvio para a racio-nalização.

MANTENDO AS COISAS SIMPLES?

Se penetrarmos além da superfície, não en-contraremos talvez diferenças mais funda-mentais no interior da nova onda? Certamen-te, quanto mais leio esses novos livros de ad-ministração, mais os argumentos perdem suaindividualidade. Eles todos parecem ser partede uma tendência geral de desburocratizaçãodas organizações que começou já nos anos 50.Existe, certamente, um diagnóstico comumsubjacente dos males das organizações: a poli-ticagem e o carreirismo individual asfixiam asorganizações: as formas de pensamento con-vertem-se com demasiada rapidez em edifíciosde tradições. Os diferenciais de status, parti-cularmente entre administradores e trabalha-dores, criam e sustentam atitudes (tais comoeles/nós) que se assumem para dominar mui-tas relações industriais, pelo menos na Grã-Bretanha e nos EUA; e os sistemas de recom-pensas não são suficientemente relacionadosao desempenho. Conquanto reconheçam osperigos da supersimplificação dos problemas,Waterman e todos os outros compartilhamuma predisposição a "manter as coisas sim-ples", pois eles percebem que, no passado,muitas companhias (nos EUA pelo menos)gastaram tempo demais analisando proble-mas, de forma que seus administradores, comexcessiva freqüência, ficavam paralisadospela análise. Até mesmo Morgan, que estápreocupado em falar da complexidade dosproblemas, parece compartilhar essa tendên-cia. As organizações não devem ficar atoladasem análises ou na criação de novas noções ousímbolos, para o seu próprio bem.

Não é fácil detectar diferenças entre os au-tores da nova onda, pois é precisamente nasáreas em que eles não se aprofundam que elastêm maior probabilidade de existir. Há silên-cio sobre os detalhes precisos das mudançaspropostas. Além do mais, estamos falando deum conjunto de mudanças e nem sempre ficaclara qual é a maior prioridade de cada umdos autores, ou se eles admitem que as mu-danças devem ou não ser implementadas demodo sincronizado, como uma totalidade. Ebem possível que haja diferenças de ênfase.Por exemplo, Peters pode estar nos incitandoa levar as coisas ao extremo. Para ele, a revolu-ção não é uma questão de simples introduçãode novos sistemas e de mudança de cultura,mas de fazer isso com considerável prazer. As-sim, a questão-chave que envolve os sistemasde recompensas é quanto do pacote de paga-mento está em risco, mais do que simplesmen-te relacionar o pagamento ao desempenho,pois, a menos que seja uma proporção razoa-

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45. PETERS, T. Op. cit., p.356.46. MORGAN, G. Op. cit., p.131.47. LAWLER, E. E. PayandOrganizational Effectiveness.New York, McGraw-Hill,1971.48. CROZIER, M. LePhénomene Bureaucratique.Paris, Ed. du Seuil. 1964.Trad. port.: O Fen6meno Bu-rocrático. Brasília, Ed.U.N.B., 1981, 450 p.49. BURNS, T. "On Pluralityof Social Systems". In:BURNS, T. (org.) IndustrialMan. Harmondsworth, Pen-guin, 1967, p. 232-49.50. SIMON, H. AdministrativeBehaviour. New York. Mac-Millan, 1957.51. KANTROW, A. Op. cit.,p.50.

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velmente grande (pelo menos 50%), isso nãoconstitui uma revolução. Também o In Searchof Excellence, inequivocamente, deu primaziaaos valores compartilhados, em detrimentodas questões estruturais. Agora, nessa leva delivros, concede-se uma ênfase maior - se nãoigual - ao tema das estruturas mais descen-tralizadas e mais achatadas, como Peters" ex-plicitamente reconhece.

Embora possa haver alguma diversidade,em termos dos valores subjacentes à aborda-gem, é difícil chegar-se a um julgamento defi-nitivo dessa questão. Não é fácil, por exemplo,concluir com certeza que eles têm um mesmocompromisso com os valores individualistas.Enquanto todos os livros falam da necessida-de de um forte conjunto de valores comunsdentro das organizações, nenhum deles expli-ca claramente se um conjunto é tão bom quan-to o outro. Uma leitura de Peters e Watermanpoderia sugerir que o fato de se ter um con-junto de valores comuns é mais importante doque o conteúdo deles. O individualismo extre-mo, no qual todas as relações estão reduzidasa uma troca econômica e destituídas de qual-quer senso de dever ou obrigação, é excluído.Um tema comum a todos os livros, como vi-mos, é a necessidade de esquemas de traba-lhos em equipe e altamente cooperativos.

Morgan dá muita ênfase à responsabilida-de coletiva e à liderança construída sobre umnovo sentido de identidade coletiva. Aindaassim, todos os autores relacionam a lideran-ça à promoção do desenvolvimento de visões,valores, direções e responsabilidades compar-tilhados a fim de dar conta das crescentes in-terdependências, sobreposições e definiçõesflexíveis de papéis e redes de relações organi-zacionais. Na organização da "renovação"ideal, os objetivos do indivíduo - em termosdos quais ele/ela é recompensado/a - sãoderivados de seus superiores e dos objetivosmais importantes da organização. As respon-sabilidades individuais e coletivas são recons-tituídas; como diz um dos executivos de Mor-gan, "a chave é a combinação?".

TEORIA DA ADMINISTRAÇÃO E CIINCIAS SOCIAIS

Em princípio, pode-se dizer que a literaturasobre a nova onda administrativa não é ciênciasocial aplicada, em qualquer sentido estrito dotermo. Primeiramente, os autores usam umagrande quantidade de fontes, e certamente nãose limitam às pesquisas sociais bem delineadas.Em segundo lugar, as soluções oferecidas nãosão diretamente elaboradas a partir das ciênciassociais, nem tampouco encorajam a aplicaçãode uma dada teoria (no sentido em que La-

wler" aplicou a teoria da expectativa aos proje-tos de sistemas de incentivos). Algumas vezes,eles também evitam, explicitamente (e, maisfreqüentemente, implicitamente) muitos dosextremos das ciências sociais aplicadas, notada-mente os excessos do desenvolvimento organi-zacional, com sua ênfase nos processos organi-zacionais às custas do desempenho da tarefa.

O diagnóstico que a nova onda faz dosproblemas das organizações ajusta-se bem amuito do que foi escrito pelas ciências sociais.Ele ecoa, por exemplo, o Le PhénomêneBureaucratique de Crozier"; a pluralidade desistemas de Burns", com sua ênfase nos siste-mas político e de carreira, assim como na or-ganização formal; uma grande quantidade decomentários sobre relações industriais; e a te-oria da expectativa, que prevê desempenhoinadequado onde as recompensas percebidasou não são valorizadas ou são inadequada-mente relacionadas ao desempenho. Existeum elemento - na verdade um elemento cen-tral - das ciências sociais na solução que anova onda dá aos problemas.

Colocada de maneira simples, a cultura éjulgada importante nessa nova onda de admi-nistração, precisamente porque ela diz respeitoaos "significados" subjacentes à vida organiza-cional e às premissas sobre as quais as decisõessão tomadas. A cultura não deve ser simples-mente equiparada às tradições e, em decorrên-cia, ser vista como algo que necessariamenteinibe o desempenho, e de que as organizaçõesdevem se livrar, a fim de capacitar seus partici-pantes a tomarem decisões racionais. As orga-nizações inevitavelmente têm culturas - oproblema para os administradores é se eles ad-ministram a cultura e lutam por um sistema devalores forte e homogêneo; ou se simplesmen-te a abandonam ao acaso ou permitem a per-manência de visões divergentes, na esperançade que mil flores venham a desabrochar.

A CIINCIA SOCIAL DA NOVA ONDA

Boa parte da recente teoria da administra-ção está construída sobre duas vertentes da li-teratura de ciências sociais, ambas citadas noslivros aqui analisados. A primeira é a literatu-ra sobre tomada de decisão que, a partir deSimon", procura retratar a tomada de deci-sões organizacional de um modo menos racio-nal que a economia convencional, a pesquisaoperacional e a teoria da tomada de decisãofaziam (ou ainda fazem). Assim, por exemplo,Kantrow", aprovativamente cita Ackoff: "Ad-ministradores não resolvem problemas: eles admi-nistram desordens". A segunda, relacionada àprimeira, é a literatura sobre burocracia, que,

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com exceção da teoria da motivação, se locali-za no fulcro do desenvolvimento da teoria daorganização dos anos 60. Essa literatura levoualguns cientistas sociais à teoria da contingên-cia, com sua ênfase nos modelos determinis-tas de formas organizacionais alternativas,enquanto outros continuaram a enfatizar olado mais "desordenado" das organizações, asaber: os sistemas político e de carreira. Parti-cipantes notáveis dessa última são March (ateoria da lata de lixo da tomada de decisão or-ganizacional) e Karl Weick; ambos estavam naStandford Business School quando Peters rea-lizou seu doutorado sob a orientação deWeick. Weick52 atacou a visão super-racionalda organização por causa da natureza alta-mente política das organizações modernas ebaseado na idéia de que as pessoas tendem aficar atoladas no dia-a-dia, com sua ênfase noaqui e agora dos pedidos e da aprovação deseus superiores.

A imediata aplicabilidade dessas duas lite-raturas nunca foi fácil de detectar. Por isso,não é surpreendente que em seu auge elasnão tenham produzido prontamente umanova escola de administração, construída emtorno de um conjunto de receitas ou soluçõesfacilmente atingíveis. Watson", recorrendo aWeick, retratou suas implicações em termosgerais, particularmente para o papel dos ad-ministradores - eles são vistos mais comoevangelistas do que como contadores tecno-cratas, pois estão administrando mitos, sím-bolos e imagens. Apesar disso, a nova ondapode ser vista, em alguns sentidos, como umaresposta atrasada, dentro da teoria da admi-nistração, a grande parte da teoria das organi-zações dos anos 60 e 70.A questão interessan-te, então, torna-se não quão pouco de conteú-do das ciências sociais existe, mas como, atra-vés de caminhos diversos e indiretos, asidéias derivadas das ciências sociais emergemembaladas em novas formas. E o que acontecea elas nesse processo? Pois, no final do dia, asíntese da literatura sobre tomada de decisãoe política organizacional é alcançada às custasda política. O problema é que assim como, nofinal das contas, Cyert, e March e Simon -como Burns" tão claramente mostrou há unsvinte anos atrás - colocaram de lado os obje-tivos conflitantes, a politicagem e as aspira-ções individuais de carreira, o mesmo faz essenovo pensamento administrativo.

AS ciêNCIAS SOCIAIS COMO COMENTÁRIO: O GRANDESILÊNCIO DA NOVA ONDA?

Há três coisas sobre esses livros da novaonda que têm mais probabilidade de chamar a

atenção dos cientistas sociais: primeiro, o tra-tamento improvisado dos aspectos políticos;segundo, a conceituação inadequada de ter-mos-chave, tais como cultura; terceiro, a faltade pesquisa sistemática e a natureza anedóticade muitos dos dados que os sustentam, e aforma recorrente pela qual esse número extre-mamente limitado de exemplos aparece (oprojeto do Ford Taurus nos EUA é um exem-plo clássico disso). Termina-se sem uma con-cepção clara e inequívoca de como, exatamen-te, as mudanças presumidas acontecem. Amudança bem-sucedida é uma simples ques-tão de administrar com base em recompensasadequadas, eliminação da hierarquia, e bonsobjetivos? Como a organização alcança valo-res comuns, um modo de pensar e uma estru-tura sem fronteiras? Nenhuma teoria do de-senvolvimento cultural e nenhuma análise po-lítica real fundamenta esses argumentos. Parteda razão dessa falha de confrontar explicita-mente os sistemas políticos das organizaçõespode bem refletir sua verdadeira natureza.Uma característica da política nas organiza-ções, como Burns" novamente nos lembra, éprecisamente que não podemos discutir a po-lítica ou o comportamento político abertamen-te. Na medida em que a nova onda silencia so-bre política, ela reforça essa tendência.

Pode-se argumentar, todavia, que a politi-cagem está sendo considerada dentro da pre-disposição para agir; as pessoas continuam afazer suas coisas, em vez de reagirem defensi-vamente aos eventos, motivadas pelos seus li-mitados interesses investidos. Além disso, tal-vez dentro de tal cultura orientada para objeti-vos, torne-se possível (até mesmo uma virtu-de) falar de assuntos anteriormente considera-dos tabus, tais como aspirações individuais decarreira. Além do mais, as dimensões políticasestarão implícitas no conjunto de objetivos50ft, ao lado de sua contraparte mais hard. Atémesmo as políticas de relações industriais se-rão reenfatizadas, à medida que a ligação maispróxima entre o pagamento e o desempenho eo parcelamento dos gerentes em centros de lu-cros encorajam uma reformulação dos objeti-vos. Isso leva os administradores a adotarempolíticas que impliquem no fim de idéias hámuito tempo estabelecidas sobre eqüidade,harmonização, pagamento justo e pagamentopor esforço, assim como o abandono de políti-cas de rendimentos. Apesar de tais possibili-dades, eu argumentaria que permanecem for-tes dúvidas sobre o tratamento superficial danova onda aos aspectos políticos, particular-mente a visão aparentemente irrealista de quecom a renovação das organizações, a politica-gem tenha cessado (ou cessará) de existir.

52. WEICK, K. The SocialPsychology of Organizing.Reading (Mass.), AddisonWesley, 1979.53. WATSON, T. Manage-ment, Organization and Em-ployment Strategy. London,Routledge and Kegan Paul,1986.

54. BURNS, T. Op. cit.

55. Idem, ibidem.

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56. BEAUMONT, P. The De-cline of Trade Union Organ-izations. London, CroomHelm, 1987.57. Veja, por exemplo, BRAD-LEV, K. & HILL, S. "QualityCircles and Managerial Inte-rests". Industrial Relations,26(1): 68-82; EDWARDS, P.K. Managing the Factory.Oxford, Blackwell, 1987;PARKER, M. Inside tne Gir-ele. Detroit, Labor Notes,1985; WOOD, S. "BetweenFordism and Flexibility? TheUS Car Industry". In: HV-MAN, R. & STREECK, W.(org.) New TechnologyandIndustrial Relations. Oxford,Blackwell, pp. 101-27.58. BRAVERMAN, H. Op. cit.

59. MURRAV, R. "Ufe AfterHenry (Ford)". Marxism To-day, October, 1988, pp. 8-13.

50. Idem, ibidem, p, 12.61. Idem, ibidem.

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Um modelo que fragmenta as organizaçõesem unidades compartimentadas, pelas quaisadministradores individuais tenham uma cla-ra responsabilidade (como no modelo divisio-nal) tende a conter tensões. Por exemplo, oque acontece quando há sobreposição de res-ponsabilidades de administradores que com-petem entre si em áreas do mercado que tam-bém se sobrepõem ou são interdependentes.Alguns autores podem desejar tratar essesproblemas como puramente técnicos; mas aquestão fundamental é se faz sentido dividiras organizações dessa maneira. Talvez sejapara tais questões que o conceito de rede deMorgan - que sugere que sob pressão suassoluções diferirão da orientação mais indivi-dualista, enraizada na administração centradano lucro, de Peters e Waterman - possa termaior valia. A estrutura e as recompensascorrentes comensuráveis com as prescriçõesde Peters e Waterman podem entrar em cho-que com a cooperação e a exploração de solu-ções integradas para o problema dos clientes.

Aliado ao aspecto político, está o descasocom o sindicato que, enquanto não desculpá-vel, não é novo. Segue uma longa tradição dosteóricos das organizações (incluindo alguns so-ciólogos) que têm tentado escrever sobre o de-senvolvimento em grandes organizações semmesmo mencionar o crescimento dos sindicatose fontes compensatórias de fidelidade e poder.

A transformação das relações industriais,levando em consideração o pensamento e aprática administrativa recentes, e especial-mente o envolvimento do empregado, é, natu-ralmente, uma preocupação central dos espe-cialistas em relações industriais. Alguns, taiscomo Beaumont=, têm prejulgado a questão efalam de novas relações industriais refletindonovas iniciativas administrativas; outros sãomais circunspectos (por exemplo, Bradley eHill; Edwards; Parker e Wood)57.Mas o que anova onda de literatura sugere é que mudan-ças significativas nas práticas de relações in-dustriais tendem a acontecer somente quandoos administradores se substituem no seu pró-prio mercado, e mudam as formas organiza-cionais e as práticas administrativas opera-cionais. Estudos de casos detalhados de em-presas que realizaram importantes mudançase seus efeitos sobre as relações industriais (porexemplo, o impacto do JIT no papel dos dele-gados sindicais e dos supervisores) são vital-mente necessários, posto que esses aspectossão totalmente ignorados em todos os livrosaqui analisados. Isso deveria ser confrontadocom estudos que lidam com a mudança na na-tureza dos sistemas político e de carreira, quese desenvolvem sob os regimes da nova admi-

nistração, na tentativa das organizações de setransformarem na imagem da nova onda.

o USO DO PENSAMENTO DA "NOVA ONDA" NASCIÊNCIAS SOCIAIS

A relação entre ciências sociais e teoria daadministração não é certamente uma relação li-near simples, uma vez que a segunda não éuma aplicação direta da primeira. Essa aplica-ção se faz com atraso; como já vimos, muito daliteratura em administração está enraizada nasociologia e na psicologia social das organiza-ções dos anos 60 e 70. Ela pode, todavia, postar-se à frente também, como pode ser ilustradopelo modo como a pesquisa em ciências sociaissobre administração estratégica tem raízes pro-fundas nas definições da teoria da administra-ção do final dos anos 70. Talvez, inevitavelmen-te, as ciências sociais, e até mesmo a sólida teo-ria administrativa fiquem a reboque dos desen-volvimentos do pensamento e da ação admi-nistrativos. De fato, os autores têm usado comfreqüência - de modo um tanto acrítico - tex-tos de administração, para auxiliar na descriçãode tendências e desenvolvimentos dentro dasociedade, mais ou menos como Braverman"usou Taylor.Os proponentes atuais do Pós-For-dismo estão, na verdade, usando a literatura daadministração da nova onda. Por exemplo, aversão de Murray" do Pós-Fordismo utilizaquase as mesmas palavras que a literatura daadministração da nova onda - "Como para aprodução a palavra-chave é flexibilidade - de plan-ta e maquinário, assim como de produtos e traba-lho ... As organizações estão engrenadas para respon-der aos mercados, mais do que para os regular. Elassão vistas como molduras para o aprendizado, assimcomo instrumentos de controle?". A própria litera-tura da nova onda tem uma menção aqui: "Naestante, Peters e Waterman substituem F.W Tay-lor''". O consumo da nova onda não precisa sertomado tão literalmente. Uma leitura críticados livros pode ajudar-nos a colocar questõesque podem ser igualmente dirigidas ao Pós-Fordismo.

Existe a questão óbvia, mas no entanto va-liosa, de saber se seria necessário publicar li-vros censurando os modelos e práticas buro-cráticas remanescentes, se o mundo estivessena realidade mudando tão rapidamente em di-reção a uma nova era. De modo quase tecnicis-ta, os escritores do Pós-Fordismo desculpamqualquer problema organizacional envolvidona adaptação de novas tecnologias, novos mé-todos e da administração "pós-moderna". Des-sa forma, eles espelham tanto as fraquezasquanto os argumentos da nova onda. Porexemplo, eles tendem a negligenciar o fato de

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que o equilíbrio - principalmente entre flexi-bilidade e eficiência- continua a existir.Tantoteórica como praticamente, não é possível paratodas as empresas buscar flexibilidade de pro-duto ou de processo, mesmo se existe ~ma ten-dência para aumentar a flexibilidade. E, então,a diversidade entre as empresas que outra vezse torna significativa. Vale lembrar que essa foiuma das razões básicas pelas quais os especia-listas em relações organizacionais e industriais,inicialmente, se interessaram pela estratégia".Corremos o perigo de esquecer isso, ao sermosseduzidos pela nova onda.

Peters e Waterman e seus companheiros es-tão preocupados com a generalização a partirde exemplos da prática ou excelência que elestrazem à luz ou ajudaram, como consultores, acriar. Isso pode ser utópico. Parte do que anova onda - especialmente as "pequenas di-cas" - tem para oferecer tem relevância paratodas as organizações. E a provisão de um con-duto para essas novas idéias pode ser significa-tiva para os administradores de todos os tiposde organização. Mas uma parte equivalente danova onda deixa de considerar as condiçõesnecessárias para o seu projeto global. Porexemplo, a introdução de programas de treina-mento sobre percepção do cliente em empresasnão sindicalizadas é uma coisa; em situaçõessindicalizadas levanta-se imediatamente aquestão da flexibilidade e da delimitação doscargos. Sem uma apreciação completa da va-riedade de contextos organizacionais, não tere-mos uma base adequada para a teoria das or-ganizações. Uma preocupação central doscientistas sociais deve permanecer sendo a di-versidade de práticas entre as organizações.

CONCLUSÕESNo passado, talvez os cientistas sociais te-

nham sido indevidamente pouco receptivos atoda a questão da administração. Existe aindauma tendência para desprezar a onda atualnuma variedade de formas - por exemplo, elaé vista como um tanto óbvia ou só como retóri-ca, ou ainda como uma outra estratégia decontrole que pode ser enquadrada dentro dotaylorismo. Eu espero ter mostrado que ela nãodeve ser descartada com tanta arrogância, por-que ela tem algo de novo e implica em mudan-ças consideráveis nas organizações; e na medi-da em que salienta a importância do nível sim-bólico para a administração, ela nos força a re-pensar a própria natureza dessa "retórica".

A teoria da administração, da nova ondaou outra, merece ser estudada em si mesmacomo uma força cultural. Ela também podeajudar a proporcionar insights para o desen-

volvimento conceitual e os projetos de inves-tigações empíricas. Por exemplo, a idéia deWaterman do oportunismo informado podeajudar a desenvolver conceitos sobre os tiposde construção de políticas administrativasque são mais sofisticadas que a usual dicoto-mia direta entre administração estratégica ead hoc (por partes). Finalmente, apesar de suanatureza um tanto utópica e da propagandaexcessiva que a envolve, a "nova onda" podeconter elementos importantes, particularmen-te em termos de colocar as pessoas em conta-to com as culturas organizacionais em queelas vivem, e através do apelo a divisões me-nos rígidas de status. Desse modo, muitos dosdiagnósticos soam verdadeiros - muitas or-ganizações estão inundadas de dados e, ape-sar disso, têm pouca informação relevante; osobjetivos não estão claros e o desempenho éinadequadamente orientado para eles; o trei-namento, os serviços e o controle de qualida-de freqüentemente são pobres; o papel do tra-balho é minimizado e as demandas de envol-vimento são baixas. Por outro lado, todavia,existem perigos na maneira freqüentementedescontraída e persuasiva com que esses au-tores da administração euforicamente abor-dam tais problemas. Sobretudo a predisposi-ção para agir pode ricochetar e bater de voltacontra a administração. Isso pode bem teracontecido quando alguns administradoresagiram com base em suas observações do Ja-pão, tentanto impor novas formas de envolvi-mento do empregado. O desejo de ser visto,de estar agindo pode ter interferido na com-preensão da dinâmica da situação. Mais ain-da, muito disso pode ser relevante para todasas organizações, mas permanece o perigo deque uma das mensagens básicas da teoria dacontingência - horses for courses* - seja es-quecida.

Acima de tudo, o desafio que a nova ondaapresenta às ciências sociais é como nós investi-garemos o simbolismo nas ações administrati-vas, e mais importante, os seus efeitos sobre odesempenho econômico.Na medida em que osadministradores realmente comecem a agircom base nas idéias da nova onda, eles estarãoprovendo locais ideais de pesquisa para tais ex-plorações. O desafio, particularmente para osque são céticos sobre seus prováveis efeitos delongo prazo, será primeiro o de divisar critériose métodos pelos quais possamos avaliá-Ios.O

* Nota da Editora: essa expressão não tem equivalente emportuguês. Literalmente, significa que para cada tipo de usoé necessário um cavalo com características diferentes. Nocontexto em que está sendo usada pelo autor, refere-se à ne-cessidade de receitas específicas, para se fazer face a cadasituação particular.

62. THURLEY,R. & WOOD,S.(Orgs.) Management StrategyandlndustriaIRemüon~Cam-bridge, Cambridge UniversityPress,1982.

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