Cadernos FGV Projetos nº 3 - Gestão & Saúde

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GESTÃO & SAÚDE CADERNOS FGV PROJETOS | ANO 2 | Nº 3 | ABRIL 2007 ENTREVISTA Adib Domingos Jatene ARTIGOS Gestão Pública em Saúde O Gerenciamento da Saúde-Brasileira Desafios para as empresas contratantes e para as operadoras de planos de saúde Incorporação Tecnológica na Área de Saúde Os Indicadores e a gestão da assistência nos serviços de saúde Auditoria e Regulação em Saúde A busca de um novo paradigma Destaques Regulatórios

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A edição do Cadernos FGV Projetos Gestão & Saúde aborda temas relevantes para o setor como gestão pública em saúde, desafios para as empresas contratantes e operadoras de planos de saúde, incorporação tecnológica na área de saúde, indicadores e gestão da assistência nos serviços de saúde, auditoria e regulação, entre outros.

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 1

Indicadores de Desenvolvimento Econômico eSocial do Estado do Rio de Janeiro

1997/2006

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GESTÃO & SAÚDE CADERNOS FGV PROJETOS | ANO 2 | Nº 3 | ABRIL 2007

ENTREVISTA

Adib Domingos JateneARTIGOS

• Gestão Pública em Saúde

• O Gerenciamento da Saúde-Brasileira

• Desafios para as empresas contratantes epara as operadoras de planos de saúde

• Incorporação Tecnológica na Área de Saúde

• Os Indicadores e a gestão da assistêncianos serviços de saúde

• Auditoria e Regulação em SaúdeA busca de um novo paradigma

• Destaques Regulatórios

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 20072 31

Participação Complementar dos ser-viços privados de assistência à saú-de no âmbito do Sistema Único deSaúde (SUS)

Baseada nas demandas sinalizadaspela Constituição Federal (art. 30,inciso VII) e pela Lei Orgânica da Saú-de (art. 18, inciso I, e art. 17, incisoIII), que explicita a necessidade de "ela-borar normas para regular as açõesentre o Sistema Único de Saúde (SUS)e os serviços privados de assistência àsaúde", foi instituída a portaria nº3.277, de 22 de dezembro de 2006.Entre os objetivos da portaria, desta-ca-se a uniformização das contrataçõesrealizadas pelos gestores do SUS (mu-nicípios e estados de forma suplemen-tar). A portaria detalha algumas con-siderações sobre a natureza jurídica dasinstituições correlacionadas com os ins-trumentos de vínculos (convênios, con-tratos administrativos e contrato degestão), além de mencionar algumascláusulas necessárias nos convênios econtratos firmados entre a administra-ção pública e a privada.

DESTAQUES REGULATÓRIOS

Vanessa Chaer Kishima,pesquisadora associada do GVsaúde

Programa de qualificação da Saú-de Suplementar

Por meio da Resolução NormativaRN nº 139, de 24 de novembro de 2006,a ANS (Agência Nacional de Saúde Su-plementar) divulgou os dados obtidosna segunda fase do Programa de quali-ficação da Saúde Suplementar. A idéiacentral do Programa é o reconhecimen-to da saúde suplementar como local deprodução de saúde, considerando asoperadoras de planos como gestoras. OPrograma contempla ainda uma quali-ficação interna da ANS para respondermais adequadamente à tarefa de regu-lar o setor. Cabe ressaltar que existemmuitos questionamentos por parte dasoperadoras avaliadas sobre a pertinênciados indicadores utilizados, principalmen-te daqueles que dependem exclusiva-mente do desempenho dos prestadores,pois as mesmas alegam não tergovernabilidade sobre a atuação dosprestadores. Mais informações, junta-mente com os indicadores das opera-doras, encontram-se disponíveis no sitewww.ans.gov.br.

Emenda 29

Apesar de ter sido aprovada emsetembro de 2000, a Emenda 29 nãofoi regularizada até hoje pelo Congres-so Nacional, sendo que a última ma-nifestação para sua regulamentaçãoaconteceu em abril de 2006. Algunsanalistas sugerem que a não regula-mentação da Emenda favorece a exis-tência de diferentes interpretações so-bre os itens que compõem as despesascom o setor saúde. Cabe ressaltar queesse fato interfere diretamente na su-pervisão e controle dos entes que nãocumprem os limites mínimos de gas-tos de saúde estabelecidos pela Emen-da. O acompanhamento dessa Emen-da é realizado pelo SIOPS (Sistema deOrçamentos Públicos em Saúde) epelos Tribunais de Conta. Os dadosconsolidados de todas as esferas degoverno até o ano 2005 encontram-se no site http://siops.datasus.gov.br.

Padronização de Informações doSetor Suplementar de Saúde

Foi prorrogado o prazo para a to-tal implantação do modelo unificadopara a troca de informações entre ope-radoras e prestadores. O processo come-

çou de forma gradual em novembro de2005, a partir da publicação da ResoluçãoNormativa 114 da Agência Nacional deSaúde Suplementar, que colocou prazosdistintos para o tipo de instituição, sendoque as operadoras, hospitais e pronto-so-corros possuíam o prazo de 270 dias, as

clínicas, de 360 dias, e os consultórios,de 720 dias. A ANS divulgou, em feve-reiro de 2007, que o prazo se estenderáaté o ano de 2008, dadas as dificulda-des encontradas pelas operadoras eprestadores de serviços. Mais informa-ções no site www.ans.gov.br.

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 3

GESTÃO & SAÚDE

EDITORIAL ........................................ 4

ENTREVISTA ...................................... 5

SETOR PÚBLICO .............................. 12

GESTÃO .......................................... 14

GESTÃO NA

SAÚDE SUPLEMENTAR .................... 16

TECNOLOGIA .................................. 20

INDICADORES .................................. 23

AUDITORIA E

REGULAÇÃO EM SAÚDE ................. 27

DESTAQUES REGULATÓRIOS .......... 31

Publicação periódica do Núcleo de Saúde da FGV Projetos.Os artigos são de responsabilidade dos autores e não refletem, necessariamente,a opinião da FGV.

FGV Projetos

Diretor Executivo: Cesar Cunha CamposDiretor Técnico: Ricardo SimonsenDiretor de Controle: Antonio Carlos Kfouri Aidar

Editor Chefe: Ricardo SimonsenEditora Executiva: Ana Maria MalikCoordenadoras: Cecilia Helena Goia e Viviane Jaeger BomfimProdução Gráfica: Marcelo AltFotos: Banco de Imagens

Instituição de caráter técnico-científico, educativo e filantrópico,

criada em 20 de dezembro de 1944 como pessoa jurídica de direito

privado, tem por finalidade atuar no âmbito das Ciências Sociais,

particularmente Economia e Administração, bem como contribuir

para a proteção ambiental e o desenvolvimento sustentável.

Sede: Praia de Botafogo, 190, Rio de Janeiro – RJ, CEP 22253-900 ou Caixa Postal62.591 - CEP 22257-970, Tel.: (21) 2559-5729 , www.fgv.br

Primeiro Presidente Fundador: Luiz Simões Lopes

Presidente: Carlos Ivan Simonsen Leal

Vice-Presidentes: Francisco Oswaldo Neves Dornelles, Marcos Cintra Cavalcantede Albuquerque e Sérgio Franklin Quintella

Conselho Diretor:

Presidente: Carlos Ivan Simonsen Leal

Vice-Presidentes: Francisco Oswaldo Neves Dornelles, Marcos Cintra Cavalcantede Albuquerque e Sérgio Franklin Quintella

Vogais: Armando Klabin, Carlos Alberto Pires de Carvalho e Albuquerque, ErnaneGalvêas, José Luiz Miranda, Lindolpho de Carvalho Dias, Manoel Pio Correa Júnior,Marcílio Marques Moreira e Roberto Paulo César de Andrade

Suplentes: Alfredo Américo de Souza Rangel, Antônio Monteiro de Castro Filho,Cristiano Buarque Franco Neto, Eduardo Baptista Vianna, Félix Debulhões, JacobPalis Júnior, José Ermírio de Moraes Neto, José Júnior de Almeida Senna eNestor Jost

Conselho Curador:

Presidente: Carlos Alberto Lenez César Protásio

Vice-Presidente: Pedro José da Matta Machado (Klabin Irmãos & Cia)

Vogais: Alexandre Koch Torres de Assis, Carlos Alberto Vieira (FederaçãoBrasileira de Bancos), Carlos Moacir Gomes de Almeida, Domingos Bulos (WhiteMartins e Gases Industriais Ltda.), Edmundo Penna Barbosa, Eraldo Tinoco Melo(Estado da Bahia), Heitor Chagas de Oliveira, Jorge Gerdau Johannpeter (GerdauS.A), Lázado de Mello Brandão (Banco Bradesco S.A), Luiz Appolonio Neto(Instituto de Resseguros do Brasil – IRB), Luiz Chor (Chozil Engenharia Ltda.),Luiz Eduardo Alves de Assis (Banco CCF Brasil S.A), Luiz Tavares Pereira Filho(Sindicato das Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e de Ressegurosno Estado do Rio de Janeiro), Marcelo Serfaty, Márcio João de Andrade Forte,Mauro Salles (Publicis Salles Norton), Nicandro Durante (Souza Cruz S.A), SérgioRibeiro da Costa Werlang

Suplentes: Alzira Alves de Abreu, Gilberto Duarte Prado, João Pedro GouveiaVieira Filho (Refinaria de Petróleo Ipiranga S.A), Luiz Roberto Nascimento Silva,Marcelo José Basílio de Souza Marinho (Brascan Brasil Ltda.), Ney Coe de Oliveira,Nilson Teixeira (Banco de Investimento Credit Suisse S.A), Patrick de LarragoitiLucas (Sul América Companhia Nacional de Seguros), Paulo Mário Freire (UniversalComércio e Empreendimentos Ltda.), Pedro Henrique Mariane Bittencourt (BancoBBM S.A), Rui Barreto (Café Solúvel Brasília S.A), Titto Botelho Martins (KMMineração e Metalurgia S.A)

Conselho Consultivo: Cesar Cunha Campos, Daniel Dantas, Eliezer Baptista,Estado de Minas Gerais, Fernando Perrone, Geraldo José Carbone, Luiz Fernandoda Silva Pinto e Roberto Gusmão.

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própria demanda e que as tecnologias nasaúde são cumulativas e não substitutivas,obrigando as OPS a manterem seus audi-tores focados nos estudos de custo-efetividade, a fim de racionalizarem a suautilização.

Outros usos da auditoria:� Atuar como fonte de informação

qualitativa de sinistros, utilizadacomo base para ações de prevençãono caso de doenças já instaladas ede seus agravos, bem como de pro-gramas de promoção à saúde. Osserviços de auditoria estão entre asprincipais fontes de captação debeneficiários portadores de patolo-gias crônicas para estes programas;

� Acompanhar os atendimentosambulatoriais e hospitalares, comvistas à avaliação da performancedas várias equipes, orientando nasrenovações contratuais e exercen-do sua função reguladora na utili-zação dos mesmos;

� Utilizar os bancos de dados existen-tes nas diversas OPS e assessorar o

desenvolvimento de gabaritos cirúr-gicos e de procedimentos diagnós-ticos, alterando a forma de remu-neração dos prestadores de ser-viços, compartilhando o risco dasatividades;

� Assessorar, em conjunto com aepidemiologia gerencial, as opera-doras de planos de saúde na esco-lha do melhor pacote de coberturase benefícios para os beneficiários, le-vando em consideração estudospopulacionais e projeções de neces-sidades;

� Realizar um trabalho integrado comas áreas de controle e creden-ciamento, fornecendo bases pararenovações e negociações de novoscontratos e tabelas com prestadoresde serviços, elaborando projeçõesde custos dos atendimentos previ-amente ao fechamento do contra-to, caminhando para uma novamodalidade de contratação, o cha-mado contrato por preço global,ainda não implantado como praxeno País;

� Elaborar o desenvolvimento de estu-dos para a adoção de diárias globais etaxas compactas nas tabelas hospita-lares, alterando a forma de remunera-ção, oferecendo previsibilidade de des-pesas e agilidade no faturamento, eprivilegiando o aprimoramento técni-co, resultando em melhor assistênciae gestão hospitalares.

A realidade do mercado de saúde exigemudanças rápidas nas atividades da audi-toria de serviços, ampliando as suas res-ponsabilidades, educando e aprimorandoconstantemente os seus integrantes, incen-tivando-os a buscar formas criativas deatuação, a participar da gestão do siste-ma de saúde como um todo, interagindocom todas as áreas envolvidas e focandomais as atividades de regulação com aconstrução de novas formas decontratualização e avaliação, com o obje-tivo de otimizar a utilização do sistema,melhorar a qualidade dos resultados ealcançar a satisfação dos beneficiários.

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EDITORIAL

OCadernos FGV Projetos com otema Gestão & Saúde é a terceiraedição desta publicação, uma ini-

ciativa da FGV Projetos, unidade deconsultoria da Fundação Getulio Vargas,que busca disseminar o conhecimento deseus profissionais, através da abordagemde temas de relevância nacional.

O Núcleo de Saúde da FGV Projetos écomposto por Coordenadores de Projetoe Consultores, além de professores daEAESP e EBAPE - Escolas de Administra-ção da FGV de São Paulo e do Rio de Ja-neiro, pesquisadores, colaboradores,voluntários e ex-alunos. Esses profis-sionais conduziram a elaboração desteCaderno que traz uma entrevista inéditae artigos que tratam de questões e desa-fios dos Gestores de Saúde no Brasil.

O entrevistado é o Prof. Adib DomingosJatene, um verdadeiro notável da Saúde,reconhecido como um dos maiores cirur-giões cardíacos do País. Já foi Secretário

de Estado da Saúde de São Paulo, Minis-tro da Saúde, participou da gestão do Ins-tituto do Coração, do Instituto DantePazzanese de Cardiologia e hoje está naDireção Geral do Hospital do Coração.Além disso, está entre os maiores respon-sáveis pela formação de profissionais paraa área de Cardiologia e Cirurgia Cardíacado Brasil e da América Latina.Sua visãosobre o sistema de saúde, mais do que ade uma testemunha da história, é forma-da com base na experiência de quempode ser considerado um de seus atoresmais influentes.

Os artigos tratam de questões relevantestanto para o setor público quanto para oda Saúde Suplementar. Ambas as áreasapresentam grandes desafios para os ad-ministradores, no sentido de oferecer me-lhores condições de assistência à popu-lação brasileira.

Os temas auditoria e indicadores, tam-bém foram levantados, visto que são ins-

trumentos indispensáveis aos gestorespúblicos e privados. A competência daFGV nessas áreas é reconhecida nacional-mente, em função dos projetos e cursosoferecidos em todo Brasil.

Como nas atividades da FGV Projetos, naárea de Saúde, todos os setores são con-templados, desde a Gestão de Serviçosaté a Gestão de Sistemas de Saúde. A ex-periência de seus técnicos na prestaçãode serviços de consultoria; no alinhamen-to e na formação de gestores e em pes-quisas específicas, permite disponibilizaraos clientes serviços diferenciados e inte-grados, maximizando os resultados de-sejados.

A expectativa é que a terceira edição dapublicação Cadernos, da FGV Projetos,este número com o tema Gestão & Saú-de, possa mais uma vez cumprir com aprincipal missão da Fundação GetulioVargas, de contribuir para o desenvolvi-mento nacional.

DiretoriaFGV Projetos

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O mecanismo de remuneração vigentepara a maioria dos prestadores privilegiaganhos na comercialização de materiais emedicamentos utilizados para pacientesinternados, premiando o consumo (quan-to mais se utiliza mais se ganha). Os médi-cos são pagos segundo a modalidade feefor service, ou seja, remuneração por ser-viços prestados, no qual quanto mais sefaz, mais se fatura.

O resultado final é que os participantes nãosão remunerados pela qualidade e efeti-vidade das suas ações ou serviços presta-dos, premiando o consumo indis-criminado e facilitando o repasseeconômico de eventuais ineficiênciasgerenciais por parte dos prestadores.

Quais os novos enfoques?

Em primeiro lugar, sugere-se deslocar ofoco da conferência de contas de serviçosmédico-hospitalares, deixando de lado asações fiscalizatórias da auditoria, substi-tuindo-as pela avaliação da qualidade dosserviços prestados e da efetividade dosatendimentos nos diversos níveis de com-plexidades. Isto não implica no abandonoda fiscalização, mas eventualmente noredirecionamento de sua ênfase. Os tra-

balhos da auditoria em saúde deverão serdirecionados para as questões relativas àadequação do acesso e da qualidade dosserviços prestados, não apenas daquelesque envolvem altos valores ouexcepcionalidades, mas também tratan-do os serviços como parte integrante deum sistema com níveis diferentes de com-plexidade, no qual todos os níveis de as-sistência devem ser acompanhados, daíresultando em informações a serem apli-cadas na regulação da hierarquização eda uti l ização de todos os serviçosdisponibilizados nos sistemas.

Dificuldade maior será focalizar um tra-balho muito abrangente, considerandodiversos fatores intervenientes, entre osquais a modalidade de vinculação ao pla-no (benefício empresarial ou plano indi-vidual, regulamentado ou antigo), avinculação organizacional do participan-te (executivo ou operário), o gênero (mas-culino ou feminino), sua idade e localiza-ção geográfica, além das análises dasofertas de serviços existentes nas regiões.

O gráfico 3 mostra uma comparação en-tre as pirâmides populacionais do Brasile dos beneficiários de planos de saúde.Enquanto a pirâmide etária brasileira

Gráfico 3 : Pirâmide etária da população brasileira e de beneficiários deplanos de assistência médica

Fonte: Sistema de informações de beneficiários ANS/MS, 2006; População Estimada IBGE, 2005.

mostra tendências de mudanças na suaforma, decorrentes do envelhecimento dapopulação geral, a pirâmide etária dosbeneficiários de planos de saúde já semostra no formato de países de primeiromundo, ou seja, população com faixasetárias proporcionalmente mais elevadas.

Essa realidade tem trazido novos focosde preocupação para os gestores da saú-de suplementar, obrigando-os a buscar aassociação da auditoria em saúde com aepidemiologia gerencial para modelagemde novos produtos e redimensionamentode um novo desenho da rede assistencial,a fim de garantir acesso a serviços de altocusto e alta complexidade.

Abre-se também um novo foco para osauditores da área com a discussão sobrea incorporação de novas tecnologias emsaúde, as quais têm custo de produçãoinicial elevado e incorporação precocepelos prestadores no rol de diagnósticos,sem avaliação do custo-efetividade.

Este tem sido um dos aspectos mais for-tes da atuação da auditoria na regulação,uma vez que as novas tecnologias geramgrandes impactos financeiros na sua ado-ção. De fato, diz-se que a oferta gera sua

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ENTREVISTA

Ana Maria Malik: Considerando sua ex-periência no setor público de saúde,como Secretário do Estado de São Pau-lo e Ministro da Saúde, qual a sua visãosobre a viabilização do setor?

Adib Jatene: Eu tenho discutido muitosobre os motivos pelos quais a saúde che-gou à situação atual. Primeiramente, caberessaltar que, para a elaboração de qual-quer proposta de solução, há necessida-de de um diagnóstico. E o diagnósticodas dificuldades da Saúde é bem claro,está baseado na urbanização aceleradado País. Em 1950, as cidades brasileiras,somadas, que possuiam cerca de 18 mi-lhões de habitantes, têm, atualmente, maisde 150 milhões. Esse crescimento ocor-reu com base numa população de baixonível educacional, baixa capacidadecontribrutiva e baixo nível tecnológico.Ou seja, uma população que não conse-gue contribuir para a provisão dos servi-ços de que necessita. Isso resultou noacúmulo de grandes massas popu-lacionais morando em regiões onde osprofissionais de saúde de que elas neces-sitam não estão disponíveis, principal-mente porque não aceitam morar nessasregiões. Daí vem um grande esforço parapermitir a essa população o acesso aoatendimento médico-hospitalar.

Enquanto existirem as grandes massas depopulação uniformemente pobres, mo-rando em bairros e em municípios pobres,fica muito difícil conseguir levar a essaspopulações o acesso ao atendimento.Essa é a primeira complicação. A segun-da está relacionada com o fato de essaspopulações morarem longe dos locais detrabalho, gerando um problema de trans-porte quase insolúvel.

Por outro lado, ocorreu um grande desen-volvimento científico e tecnológico a partirde 1953, quando a biologia molecular teveinício - até então, a biologia era celular (de-pois da descoberta da estrutura mestra, odenominado DNA, a biologia passou a sermolecular). Veio então a engenharia gené-tica, a fertilização in vitro, o desenvolvimen-to de equipamentos de diagnóstico, novastécnicas cirúrgicas, em suma, um volumeenorme de avanços que são de difícil incor-poração no atendimento à grande massada população.

Cabe ressaltar que a deflagração da corridaespacial, em 1957, foi o gatilho para o de-senvolvimento tecnológico, pois surgiramvárias necessidades: de controlar os sinaisvitais do homem no espaço, de comunica-ção, além de todo um arsenal de diagnósti-co. Ao mesmo tempo, houve um grandeavanço científico na área de medicamen-tos. Quando eu me graduei, não existiammedicamentos como os antialérgicos,diuréticos, ansiolíticos, entre outros. Eramdrogas que vinham das formas naturais.Poucos medicamentos eram sintetizados.Acredito que somente os antibióticos eramsintetizados. Com todas essas inovaçõestecnológicas, houve uma elevação extraordi-nária dos custos, o que precipita uma difi-culdade de equacionamento no atendimen-to à população de baixa renda.

Adicionalmente, há incidência de doençascausadas por agentes não biológicos: asdoenças decorrentes das deficiências so-ciais; o inadequado fornecimento de água,esgoto, habitação, alimentação, salário,lazer, transporte, segurança; problemas eco-lógicos decorrentes da produção deherbicidas, pesticidas, poluição, etc. Todasessas inadequações geram um clima no qual

o Setor da Saúde, que possui uma capaci-dade bem limitada de recursos destinadospara o atendimento, muito além das suasforças, não consegue satisfazer as neces-sidades da população.

Ana Maria Malik: Considerando todas asdificuldades mencionadas, como o senhorvê a possibilidade de manter o Setor?

Adib Jatene: Se considerarmos que a gran-de maioria da população não tem capaci-dade de prover sua assistência à saúde, estadepende, portanto, do setor público. Cabeentão ao setor público equilibrar a situa-ção. O problema é que o poder públicodesconhece aritmética. Aritmética é umacoisa importantíssima; você não pode fugirdesta questão. É necessário saber quantocusta a assistência e, mais importante, di-zer de onde vem o dinheiro. Mas, no Brasil,criou-se a idéia de que, para fazer o atendi-mento, basta vontade política; que vonta-de política é um negócio que resolve qual-quer problema. Não resolve se não tiverdinheiro. Essa que é a grande dificuldade.

Recentemente, realizei um estudo baseadonas propostas que eu tinha feito em 1995e das perdas estimadas que tivemos, relati-vas ao não cumprimento dessas propostas.Nós tínhamos um orçamento do Ministérioperto de R$ 15 bilhões. Na época, a popu-lação era de cerca de 150 milhões de habi-tantes, daí o número de cem reais per capitacom o qual se trabalha há anos. Cem reaisper capita para fazer não apenas assistên-cia médico-hospitalar, mas para cobrir ser-viços de vigilância sanitária, epidemiológicae uma série de outras ações. Sobrava cercade 60% desse valor para a assistência mé-dico-hospitalar, ou seja, sessenta reais percapita. Esse valor era absolutamente insigni-ficante, sessenta reais per capita/ano,

Adib Domingos Jatene

Ana Maria Malik,Professora da FGV-EAESP e coordenadora do GVsaúde

Álvaro Escrivão Junior,Professor da FGV- EAESP e Coordenador Adjunto do GVsaúde

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Tabela 1: Despesas assistenciais (em R$) das operadoras deplanos de saúde, no período de 2001 a 2005

Gráfico 2: Distribuição das receitas dos hospitais - ANAHP 2006

à da regulação, propiciando uma estratégiade gestão para garantir ao cliente acesso aserviços de melhor qualidade, respeitandosuas necessidades e demandas em saúde epreservando o equilíbrio financeiro das OPS,buscando, idealmente, eficiência e coopera-ção entre os atores deste mercado.

O sistema suplementar de saúde brasileironão existe sem sua rede de prestadores deserviços, entre estes, hospitais, clínicasespecializadas, laboratórios e centros dediagnósticos por imagem. Estas organiza-ções são fundamentais para o exercício dasatividades assistenciais, apresentando re-lação de interdependência e conflitos cons-tantes entre elas.

Segundo dados de 2006 da Associação Na-cional dos Hospitais Privados (ANAHP),89% das receitas desses hospitais são ob-tidas com os planos de saúde ou convê-nios médicos, 9% de particulares e 2% doSUS. Trata-se de um mercado estagnadoem que a sustentabilidade do sistema de-pende da capacidade de pagamento dosclientes cujo crescimento está relacionadoao nível de emprego, à disposição dasempresas em investir ou não no benefíciosaúde dos seus colaboradores e ao rela-cionamento entre prestadores e operado-ras, visando à otimização na utilização dosrecursos e no controle dos custos. Estestêm crescido, segundo mostra a tabela 1da ANS. Observou-se 68% de aumento nasdespesas assistenciais, decorrentes não sóda inflação inerente ao setor da saúde,mas, principalmente, pelas novas cober-turas exigidas pela Lei 9656/98.

Denominador comum destes sistemas é ograu de tensão trazido pelos beneficiáriosdesejosos de uma maior coberturaassistencial, mais qualidade e livre escolhanos atendimentos e, no caso particular dosistema de saúde suplementar, prêmiosmensais mais acessíveis. Os prestadores deserviços querem ganhar mais, a renda dasfamílias brasileiras não tem subido alémde 1,5% ao ano desde os anos 1990 e,segundo análises do IPEA com base nosdados do IPCA/IBGE, a inflação na saúderegistrou elevação de 36% entre 2001 e2006.

Fonte: ANS/MS, 11/2006

Como parte deste cenário, desde osprimórdios da organização das OPS, na dé-cada de 70, a auditoria (médica) veio de-senvolvendo suas funções fiscalizatórias,primeiramente, apenas utilizando serviçosde médicos, e, desde 1990, também fa-zendo uso de enfermeiros. Algumas ope-radoras também contam com o auxílio defarmacêuticos para este tipo de atividade.Os métodos de trabalho da auditoria nasaúde suplementar eram os mesmos de-senhados no âmbito do Ministério da Saú-de. Somente a partir de 1998 suas estra-tégias e métodos de trabalho passaram aser diferenciados daqueles empregadospelo Sistema Nacional de Auditoria (SNA),do Ministério da Saúde.

A ação principal da auditoria era apenasfiscalizatória e, na sua maior parte, retros-pectiva, com a verificação de prontuáriose faturas praticadas apenas após a alta dospacientes, tendo como intenção funda-mental coibir fraudes contra o sistema. O

método era chamado de "auditoriaitemizada" de contas médico-hospitala-res e tinha como objetivo específicoidentificar os excessos e puní-los comglosas, ou seja, com o não-pagamentodo que era considerado não-justificado.Este método vem sendo utilizado atéhoje, mas não tem conseguido alcançarresultados mais expressivos, tornando-se necessário desenvolver novos focos deatuação. Segundo a ANAHP, em balan-ço do período de 2002 a 2005, as glo-sas representaram em média 3,7% dascontas dos seus afiliados. Em outros ser-viços não afiliados à ANAHP esta médianão se altera.

Não é difícil entender a necessidade porserviços de auditoria analisando-se o grá-fico 2, no qual 73% das receitas dos hos-pitais são provenientes das cobranças dediárias, taxas e comercialização de materi-ais e medicamentos com alto grau de di-versificação.

Fonte: ANS/MS, 2006

(SADT: serviços de diagnóstico como laboratório e imagem, entre outros)

2001 2002 2003 2004 2005

16.890.544.549,00 19.623.035.104,00 22.284.507.847,00 25.330.501.916,00 28.436.976.505,00

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 20076

quando naquela época os Planos de Segu-ros de Saúde gastavam cerca de seiscentosreais per capita/ano apenas para assistên-cia médico-hospitalar-ambulatorial. E paí-ses desenvolvidos gastavam mais de mildólares per capita/ano. Nos Estados Unidos,por exemplo, esse valor era de cerca de doismil dólares em 1995. Atualmente, chega aseis mil e quinhentos dólares per capita/ano.

Concluímos, então, que nosso gasto é abso-lutamente ridículo. Entretanto, no orçamen-to da União, ele é significativo. A explica-ção para esse fato é que ele representa, emvolume, a segunda maior despesa da União,só perdendo para a Previdência Social. Em1995, depois de retirar do orçamento fe-deral os recursos vinculados e compro-missados, o Ministério da Saúde recebia51%, ficando os 49% restantes para distri-buir aos demais Ministérios. Não haviacomo buscar mais recurso.

Então, eu decidi que ia criar um recurso noorçamento da Saúde. Pensei no IPMF, quetinha sido extinto em dezembro de 1994.Cabe ressaltar que sua existência não ge-rou impactos negativos, não impediu oPlano Real. Não houve reclamações do IPMF.Propus recriá-lo como contribuição. E porque como contribuição e não como impos-to? O imposto possui anuidade e não podeser vinculado. A contribuição não possuianuidade e pode ser vinculada. E, como euqueria vincular o tributo, tinha que ser con-tribuição. Mas eu inseri uma premissa. Apremissa era que o orçamento que o Mi-nistério já possuía, com todas as suas fon-tes, fosse mantido em valor real, e a contri-buição da CPMF ia representar umacréscimo de cerca de 33% no orçamentodo Ministério, o que infelizmente não acon-teceu. Após uma batalha, a CPMF foi apro-vada. E a área econômica do governo reti-rou das fontes que o Ministério possuía umvalor maior do que o que a CPMF trouxe.

Ana Maria Malik: Recentemente, saíramnotícias dizendo que a CPMF, que deve-ria ser encerrada esse ano, foi prorroga-da por mais dez anos.

Adib Jatene: Claro, agora não podem reti-rar essa contribuição. Ela virou fonte. Fazparte do orçamento da União e, embora

ajude a compor o orçamento do Ministé-rio, não está mais vinculada. O que está vin-culada é a parcela da União da Emenda 29.

Mas o que aconteceu foi o seguinte: ocompromisso de manter o orçamento de1995 em valor real não foi cumprido. Istoé, se analisarmos o valor real de 1995 a2004, sem a CPMF, não houve nenhumcrescimento. Quer dizer, estamos, hoje,com valores de 1995. Se considerarmos ainflação do IPC da Fipe, houve, nesse pe-ríodo de dez anos, uma inflação de 130%.Pode-se concluir que esse orçamento, paraser igual ao de 95, precisa de umacorreção de 130%. A situação fica aindamais grave se utilizarmos como índice decorreção o Índice Saúde da Fipe - que nes-se período é de mais de 200% - o que re-presenta mais que uma duplicação do or-çamento referente ao ano de 1995. Seagregarmos as parcelas da CPMF, verifica-remos que há uma imensa perda, compa-rada com os orçamentos executados.

Só para mencionar alguns números: se uti-lizarmos como índice de correção o IPC, aperda é de cerca de R$ 80 bilhões. Se utili-zarmos o Índice de Saúde, chega perto deR$ 120 bilhões que deixaram de seraportados ao Setor da Saúde. O que signi-fica uma perda brutal. E é nessa situaçãoque o Sistema está.

Se compararmos a evolução do orçamen-to da Previdência Social nesse período,se não me engano, a Previdência Socialgastou, em 1995, alguma coisa perto deR$ 32 bilhões. Atualmente, gasta pertode R$ 160 bilhões. A dívida interna, em1995, era de R$ 60 bilhões e, hoje, é deR$ 1 trilhão.

Quando dizem que Saúde tem muito di-nheiro e não falta recurso, mas gestão, tra-ta-se de uma falácia. Falta dinheiro. Se nóstivéssemos um orçamento com os valoresde 1995, corrigidos pelo Índice Saúde agre-gado à CPMF, teríamos, pelo menos, R$ 15bilhões a mais do que o que foi gasto em2004. É essa diferença está fazendo falta.

Ana Maria Malik: Quer dizer, o senhor temcerteza de que, para viabilizar o setor públi-co, nesse momento é preciso dinheiro?

Adib Jatene: Sim, o dinheiro é fundamen-tal para viabilizar as ações. Tomemos comoexemplo a cidade de São Paulo. Em 1999,demonstrei que em 39 distritos na capital,que somam cerca de quatro milhões depessoas, não existiam leitos hospitalares. Emoutros 32 distritos (com três milhões e no-vecentas mil pessoas), existiam 1,2 leito pormil habitantes. Enquanto isso, em 11 dis-tritos com 600 mil habitantes existem 26leitos por mil habitantes e em 14 distritos,onde vivem 1,2 milhão de habitantes, exis-tem 6 leitos por mil habitantes. Como seresolve um problema desses?

Álvaro Escrivão Júnior: Professor, comoé que o senhor analisa a questão da di-ficuldade da expansão do acesso a ser-viços hospitalares, quando existem al-guns hospitais que não param decrescer, como é o caso do Hospital SãoPaulo e do Hospital das Clínicas?

Adib Jatene: Quando era Secretário, fizum estudo para essa questão. Minha pro-posta era que se proibisse construir novosleitos nas áreas já servidas enquanto nãose colocasse, pelo menos, dois leitos pormil habitantes na periferia. Naquela épo-ca, criei uma frase que eu repito:"O pro-blema do pobre não é ele ser pobre; é oamigo dele ser pobre". Porque ele não temcomo falar com quem toma as decisões.O paciente pobre não marca audiência,não faz o projeto, não negocia o financia-mento. Os que têm amigos que estão nogoverno conseguem porque, na verdade,quem tem poder de reivindicação é umaparcela da sociedade que deseja para si onível de atenção que existe nos países doPrimeiro Mundo. É por esse motivo quenós temos essa rede de hospitais. Os hos-pitais estão todos concentrados em dez,onze distritos da capital - dos noventa eseis existentes. Em que, coincidentemen-te, encontra-se a população de mais altarenda. Esse é o poder verdadeiro. O políti-co não está pensando na população; elepensa na população na época de eleição,quando precisa de voto. Mas, no exercíciodo mandato, ele se rende àquela parcelada população que tem maior poder deargumentação e que quer o nível existen-te no Primeiro Mundo.

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AUDITORIA E REGULAÇÃO EM SAÚDE

Márcio Vinicius Balzan,Pesquisador associado do Gv Saúde, Assessor para assuntos de auditoria no Sistema Unimed.

A busca de um novo paradigma

Omercado de saúde brasileiro apre-senta características singulares porser composto, de um lado, pelo sis-

tema público de saúde e, de outro, pelo sis-tema privado. O sistema público é conheci-do como Sistema Único de Saúde - SUS - esua gestão é realizada pelas três esferas degoverno (federal, estaduais e municipais). Se-gundo dados de 2005, a União gastou R$59 bilhões com todos os seus programas desaúde, enquanto os estados e municípiosdespenderam outros R$ 26 bilhões, resultan-do em algo próximo de R$ 530,00 por brasi-leiro/ano, quantia considerada insuficientepelos especialistas da área. Junto a este sis-tema, há o de saúde suplementar, compos-to pelas Operadoras de Planos de Saúde(OPS), que oferece cobertura a 38,5 milhõesde beneficiários, 67% dos quais residentesna Região Sudeste. Este sistema movimentaperto de R$ 35 bi/ano.

As operadoras de planos de saúde se subdi-videm em empresas de medicina de grupo,cooperativas médicas, cooperativasodontológicas, empresas seguradorasespecializadas em saúde, empresas deautogestão e administradoras de planos desaúde. Cada uma delas opera modalidadesdiferentes de gestão, porém utiliza a audito-ria de serviços médico-hospitalares de ma-neira muito parecida.

A participação de cada segmento pode serverificada no gráfico a seguir, considerandoapenas as empresas que oferecem planosmédicos. O segmento "filantropia" registra-do no Gráfico 1 refere-se a planos de saúdeoferecidos por entidades privadas, sem finslucrativos, certificadas como entidades filan-trópicas junto ao Conselho Nacional de As-

Júlio César Cristofoli,Pesquisador associado do Gv Saúde.

sistência Social (CNAS), com operação seme-lhante às empresas de medicina de grupo eatuação preferencialmente local.

Este mercado funcionou durante muitos anossem legislação específica, prevalecendo cri-térios unilaterais sempre a favor das opera-doras, em detrimento das necessidades dosbeneficiários. O ano de 1998 foi o marcoregulatório deste sistema, definido pela Lei9656/98, que passou a regular as OPS e osplanos de saúde. No ano 2000, foi criada aAgência Nacional de Saúde Suplementar(ANS), com o principal objetivo de protegeros beneficiários, garantindo-lhes coberturase proibindo a unilateralidade das ações pe-las diversas operadoras.

Fazendo-se uma rápida análise do panora-ma deste mercado de saúde brasileiro, pode-se dizer que 35,5% dos beneficiários dos pla-nos de saúde são portadores de planosantigos, ou seja, não regulamentados combase na Lei 9656/98. 70,8% dos planos são

Gráfico 1: Distribuição percentual dos beneficiários de planosde assistência médica, por modalidade de operadora

(ANS, 2006)

Fonte: ANS/MS, 09/2006

coletivos (quase sempre contratados porempresas). Finalmente, quanto à sua cober-tura, 57,7% deles oferecem cobertura hos-pitalar e ambulatorial, 15,9% assistênciaodontológica e apenas 11,7% são planosreferência que oferecem ampla cobertura.

Embora a regulamentação setorial tenha sidopositiva para acompanhar a dinâmica dedesejos desta sociedade, trouxe novos cus-tos à operação dos planos de saúde, ampli-ando garantias e direitos dos beneficiários eo controle restritivo de preços no segmentoindividual, obrigando as OPS a buscarem res-postas inovadoras e estratégias criativas parasua sustentabilidade.

O objetivo principal deste artigo é discutir asnovas atribuições da auditoria de serviçosmédico-hospitalares neste mercado, cujasinistralidade média está em torno de 83%,posicionando-a como uma das principais fer-ramentas para os gestores em saúde. A au-ditoria permite associar a ação fiscalizadora

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 7

Álvaro Escrivão Júnior: Traçando um pa-ralelo entre a Saúde e a Educação, ondeas pessoas com um pouco mais de poderaquisitivo estão tentando sanar suas ne-cessidades no setor privado, o senhoracredita que essa é uma tendência tam-bém no Setor da Saúde?

Adib Jatene: Isso faz parte da concentra-ção de renda e do desequilíbrio social. Sevocê permite uma grande concentração derenda, a parcela que concentra a rendavai ter todos os benefícios: morar nas me-lhores áreas das cidades e ter as melhoresinstituições. E aqueles que não têm ren-da, vão ficar com deficiências. Porque aidéia de que o mercado resolve tudo é umequívoco. O mercado não resolve o pro-blema social porque não está interessadono problema social, a menos que comecea se sentir ameaçado, o que de fato estácomeçando a acontecer. Nós temos osmeios de comunicação comercializadoscom o estímulo para que a população debaixa renda venha a ter acesso a eles. Oaparelho de televisão é barato - divide-seo pagamento em não sei quantas vezes. Apessoa quer a televisão e assiste a todotipo de apelo de consumo, o que gera,principalmente nos jovens, uma grandeonda de consumismo. Só que eles não têmo que vender. Como eles não têm o quevender, eles não podem comprar. E, nomomento em que temos uma grande po-pulação que não tem o que vender e jo-vens que possuem anseios, ou vão se apro-priar indevidamente, ou aceitar o que otraficante põe em suas mãos para vender.Ele vende, tem o dinheiro, e isso estimulaa violência. E nós estamos dentro dela, naluta dos traficantes com a polícia. Existemáreas aqui em São Paulo em que não hápolícia, só traficante. Isso começa a ame-açar a parcela que tem recursos, todo omundo está preocupado. Aqueles que têmmuitos recursos andam de carro blinda-do, andam com seguranças, levantammuros, etc. Mas isso tem limite.

Álvaro Escrivão Júnior: Qual a sua opiniãosobre a assistência médica feita pelos pla-nos de saúde privados, aqueles que aten-dem às classes média-média e média-bai-xa? (Só têm a carteirinha sem nada

dentro. Isto é, existe o plano, mas não aassistência).

Adib Jatene: As classes média-média e mé-dia-baixa, junto com as outras classes commaior poder aquisitivo, somam 20% dapopulação. Oitenta por cento da popula-ção está fora desse sistema e depende doSistema Público de Saúde. Por isso, é quedigo: nós só vamos resolver o problemada assistência médico-hospitalar no setorpúblico no dia em que as autoridades, co-meçando pelo Presidente da República epelos Ministros, precisarem de assistênciae forem obrigados a recorrer aos serviçosdo SUS.

Álvaro Escrivão Júnior: Então, a sua visãoé a de que o nosso Sistema deveria sermajoritariamente público mesmo?

Adib Jatene: Sim, porque não tem saída.Não há como fazer com que quem ganhamenos de 3 salários mínimos consiga fazerface às despesas com saúde.

Álvaro Escrivão Júnior: E como fica a si-tuação de São Paulo, onde existe umagrande parcela de serviços privados?

Adib Jatene: Em São Paulo, defendo queos grandes hospitais privados participemda solução do problema de saúde. Eu ti-nha feito uma proposta, considerando anecessidade de, pelo menos, um leito pormil habitantes. Havia, em 1999, a deman-da de, pelo menos, 4 mil leitos. A soluçãoseria a construção de hospitais de 50 lei-tos para fazer um atendimento mais sim-ples: pronto-atendimento, infecções maissimples, casos clínicos, parto normal, paraaliviar a rede que está sobrecarregada poressa população que não possui assistên-cia. Alguns desses hospitais poderiam serpatrocinados pelos grandes hospitais pri-vados, muitos dos quais, filantrópicos.

Seria uma nova maneira de administrar oshospitais públicos para atender à clientelado SUS. E esses hospitais seriam absoluta-mente atualizados, com boa qualidade deatendimento, por um custo menor. Namedida em que você conseguir mais par-ticipação, a coisa vai aliviando. Quem temuma posição privilegiada na sociedade,deve ajudar a resolver o problema da po-

pulação que não tem. É o único caminho.Atualmente, verificamos um grande pro-gresso no Programa Saúde da Família (PSF).Quando eu estava no Ministério, dizia-seque esse era um programa para o Nordes-te, para as zonas pobres. Eu dizia que setratava de um programa para o Nordestee para todas as regiões pobres. Mas, tinhagente que achava que era só para o Nor-deste. Eu achava que não, que era tam-bém para regiões metropolitanas. Em1996, quando eu ainda estava no Minis-tério, e começamos a implantar o Progra-ma em Itaquera, em parceria com o SantaMarcelina, foi uma coisa fantástica. Porexemplo, na área que foi delimitada, aSecretaria tinha seis casos de tuberculo-se cadastrados. Os agentes comunitáriosidentificaram sessenta e dois casos. Issoé uma coisa louca. As gestantes não con-seguiam fazer Pré-Natal. Havia uma ouduas consultas de Pré-Natal e precisavafazer seis, sete. Ou seja, esse é um pro-grama para essas regiões pobres onde hágrande concentração de população. Masvocê não consegue montar o programapara cobrir toda a necessidade, porquenão há recurso.

Álvaro Escrivão Júnior: A maior cobertu-ra gerou uma drenagem de necessidadede profissionais e de atenção secundá-ria. Em sua opinião, quais as implicações?

Adib Jatene: Além de ter uma necessidadede profissionais (médico, enfermeiro, auxi-liar, agente comunitário), há demanda pormedicamentos e coordenação com o nívelsecundário, com uma demanda por espe-cialistas para atender aos casos mais com-plexos, dar cobertura aos médicos de famí-lia. E os médicos de família? Não existem,foram improvisados. São médicos de váriasespecialidades que, ou por dificuldade detrabalho ou, às vezes, até por vocação, vãolá. Mas não estão preparados para isso. AsFaculdades de Medicina preparam muitomal os seus médicos. No exame voluntário(realizado pelo CREMESP para alunos do sex-to ano do curso de Medicina) ocorreu umíndice de reprovação de 38% em um exa-me que pode ser considerado fácil. E euprevia isso em 1988, quando eu era doConselho Regional. Eu propus a criação de

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Os dados do SINHA também mostram cres-cimento entre 2005 e 2006, com a medianapassando de 3,67 para 4,08 dias de perma-nência. No setor privado, a queixa corrente éque estão diminuindo as internações cirúrgi-cas, as quais passaram a ser realizadas nasunidades de curta permanência e cresceramas internações que necessitam procedimen-tos clínicos, aumentando o TMP e o custohospitalar (sem aumento equivalente de re-ceita). Mas como as séries históricasdisponíveis são coletadas há ainda poucotempo e não se encontram até o momen-to informações por diagnóstico no siste-ma suplementar e nos sistemas de com-paração existentes, a análise do setorprivado fica limitada. O sistema suplemen-tar está investindo nessa direção, mas ain-da não estão disponíveis dados de acessouniversal para proceder a essas investiga-ções. Um aspecto-chave quando se olha osetor privado é que o perfil sócio-econô-mico da população coberta por planos desaúde, predominante nos prestadores pri-vados, é muito diferente daquela que ape-nas tem acesso ao SUS. Além disso, a po-pulação que utiliza o sistema supletivo estámuito concentrada nas regiões Sudeste eSul do país e corresponde nacionalmentea menos de 30% dos brasileiros, segundodados da Agência Nacional de Saúde Su-plementar.

Conhecer, monitorar e interferir nas cau-sas que determinam a permanência hos-pitalar é essencial para aprimorar os servi-ços de saúde. O conhecimento sobre operfil clínico e epidemiológico está acessí-vel, existe na grande maioria dos hospitaisbrasileiros e precisa ser mais valorizado eacima de tudo utilizado para direcionarações de melhoria na qualidade da assis-tência oferecida e na priorização dos in-vestimentos em saúde. A necessidade de

investimento no patrimônio clínico dasorganizações e na capacitação de profis-sionais para análise dos indicadores de de-sempenho e de qualidade dos serviços desaúde é uma meta a ser atingida para am-pliar a capacidade de intervençõesdirecionadas, e com incorporação detecnologias mais custo-efetivas nos hospi-tais que possam contribuir para aprimorara eficiência dos sistemas de serviços desaúde no País.

Gráfico 3 - Distribuição anual das médias de permanênciasegundo diagnóstico - Capítulo CID 10ª revisão -

Sistema ùnico de Saúde (SUS) - Brasil - 1998 a 2006

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 20078

um exame para autorizar o médico a exer-cer. Na época, criaram uma grandeceleuma: "O problema não é o estudante;o problema é a Escola". A responsável é aEscola. Mas, sai um médico mal formadoque vai trabalhar no Pronto-Socorro e vaicriar problema para a população. Eu dis-cuti, não houve jeito. Fizeram o CINAEM(Comissão Interinstitucional Nacional deAvaliação do Ensino Médico) - união detodas as entidades para ajudar as Escolas.Eu disse: "Ok, apoio vocês. Mas, garantoque daqui há 10 ou 15 anos o problemavai ficar igual". Resultado: em 1996, nóstínhamos 82 faculdades de Medicina. Hoje,nós temos 157. Quer dizer, em 10 anos secriou o que levou 400 anos para criar. Commensalidades tão altas como de 3.500 até4.000 reais! Quem pode estudar nessasEscolas?

Quem estuda nessa Escola vai fazer aten-dimento na periferia? Quer dizer, o negó-cio está absolutamente equivocado. Poroutro lado, os hospitais de universidadespúblicas - quase todos, estão em uma si-tuação calamitosa. Por quê? Porque elesnão conseguem acompanhar o avançocientífico e tecnológico, que é responsa-bilidade dos Hospitais Universitários. Aspessoas confundem o hospital universi-tário com o hospital assistencial. O hos-pital da universidade não é um hospitalassistencial; ele também presta esse ser-viço, mas é um hospital que deve gerarconhecimento, criar e testar conhecimen-tos; trabalhar na fronteira do conheci-mento, e não, ficar atendendo a coisassimples que podem ser atendidas emqualquer hospital de bairro; para que elepossa comandar os consensos. Então,estamos envolvidos com um problema,desde a formação das carreiras da saúdeaté o atendimento da população de bai-xa renda. E quando você vai até lá paraverificar o que está acontecendo, obser-va que os recursos disponíveis são insufi-cientes para atender às necessidades.

Ana Maria Malik: Um dos argumentosque apareceram no momento em quese criaram as Fundações de Apoio a es-sas universidades foi justamente garan-tir o avanço tecnológico e, a rigor, fixar

os bons profissionais. Esse modelo tem,pelo menos, trinta anos. Como é que osenhor vê o que aconteceu?

Adib Jatene: Olha, vou recuar um poucono tempo. A primeira criação de um supor-te para entidades públicas foi proposta em1955, pelo Doutor Dante Pazzanese. Elehavia criado o Instituto de Cardiologia doEstado e argumentava da seguinte forma:"Um hospital público não pode sobreviverexclusivamente do orçamento que lhe dá oEstado". Porque o orçamento é preparadono ano anterior. Os índices de inflação nãosão adequadamente calculados. Hácontingenciamento durante o exercício e ohospital não pode se submeter, comooutras repartições, a prazos. As coisas têmque acontecer na hora. Por exemplo: que-brou o raio-x? Amanhã tem que estararrumado, pronto para uso. Para tanto, temque ter agilidade. Então, o Doutor Dantepropôs ao governador Jânio Quadros acriação do Fundo de Pesquisas do Institutode Cardiologia do Estado. E esse Fundo eraabastecido por quem? Pelos serviços pres-tados pelo Instituto. Criou-se uma tabelade preços publicada no Diário Oficial dogoverno, com valores cobrados por consul-ta, hemograma, raios-X, eletrocardiograma,enfim, todos os procedimentos. Criaram-setambém, seis categorias: "A", que não pa-gava nada; "C", que pagava integral, e B1,B2, B3 e B4, que pagavam 10 %, 20%, 40%e 60%. Essa classificação era feita pelo Ser-viço Social. O curioso era que as pessoasqueriam contribuir. Elas faziam questão decontribuir com pelo menos 10% ou 15%.Para as pesquisas, esse modelo foi um gran-de sucesso.

Eu fui para o Dante porque o Fundo de Pes-quisas me pagou o salário que eu tinha noHospital das Clínicas. Eu trabalhava em doislugares e achava que deveria trabalhar emum lugar só. Mas, para isso, eu precisavater uma renda mínima necessária. Então, oFundo complementava. Além disso, o Fun-do pagava viagens e estágios para o exte-rior. Quando começou o cateterismo car-díaco, o Dr. Dante mandou o Dr. EduardoSouza para aprender a técnica sem proces-so, sem nada. Ficou lá dois meses. Voltou ecomeçou o cateterismo aqui no Brasil. E nós

começamos a realizar a cirurgia decoronária.

Então, esse Fundo foi copiado pelos váriosinstitutos de pesquisas do Estado todo:Agronômico, Biológico, entre outros. Issoforneceu um grande incremento aos insti-tutos de pesquisa. Até chegar o governodo Paulo Egídio Martins, cujo Secretário daFazenda fez uma reforma administrativa tãoperfeita que não precisava dos Fundos dePesquisa. Extinguiu-os criando o Fundo Es-pecial de Despesa. Eu me lembro, estavapresente na reunião quando o Doutor Leserdisse ao secretário: "Você está criando umpalácio. Não está pronto. E eu tenho umachoupana. Não destruo minha choupanaantes de o seu palácio estar pronto, senãovou tomar chuva". O Fundo Especial deDespesas tinha duas diferenças fundamen-tais em relação ao Fundo de Pesquisa. Pri-meiro: proibiu aplicar em pessoal. Segun-do: passou a ser orçamentado. Os Institutospassaram a ser arrecadadores para a Secre-taria da Fazenda, que fazia descontos cor-respondentes. Perdeu-se, então, o instru-mento de avanço.

Álvaro Escrivão Júnior: A Fundação deApoio não inovou em nada?

Adib Jatene: Bem, em 1979, eu era o Se-cretário, quando foi proposto ao gover-nador o funcionamento do Incor com aFundação Zerbini. Eu disse: "Bom, isso érecriação do Fundo de Pesquisa". Mas, nocomeço, no Incor, as pessoas só admitiamatender a entidades públicas: Petrobras,Banco do Brasil. Havia muita resistência àidéia de atender a convênios; isso era con-siderado um crime. Depois que fui paralá, achei que esse era um grande desafio.Há dois tipos de doentes: há o doente paraquem o hospital, qualquer que seja, é me-lhor que a casa dele; e há o doente paraquem qualquer hospital que seja é pior quea casa dele. Então, uma parcela não recla-ma de nada; aceita tudo. A outra parcelareivindica. No momento em que você co-loca no hospital clientela privada que temacesso ao Einstein, ao Sírio-Libanês e elecomeça a reclamar, então o hospital me-lhora, só que melhora para todo mundo.Você vai fazer a UTI para atender a essedoente, mas é a mesma UTI para onde vai

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da nos hospitais privados financiados peloSUS, sendo que em 2006 a média de am-bos foi de 5,8 dias.

A tendência de diminuição do TMP é um re-sultado aparentemente positivo para o siste-ma, uma vez que pode indicar maiorefetividade e maior oferta de leitos. No en-tanto, para aprofundar a análise e qualificarqualquer afirmação desse tipo, faz-se neces-sário, primeiramente, caracterizar se ocorre-ram, nesse período, alterações na demandacom relação às características demográficase mudanças nos agravos que motivaram ainternação hospitalar. Só assim é possívelbuscar parâmetros para dizer se a média depermanência observada está acima ou abai-xo do adequado, assim como definir metasde aprimoramento. Além disso, a incorpo-ração de novas tecnologias para o diagnós-tico, mas especialmente no tratamento, vemdiminuindo o tempo de permanência hos-pitalar nas organizações de saúde. Vale res-saltar que nos hospitais onde predominamprocedimentos cirúrgicos eletivos, a médiade permanência tende a ser menor, enquan-to que naqueles cujos pacientes exigem tra-tamento clínico, as médias tendem a sermaiores.

Outro aspecto a ser considerado são as in-tervenções dos financiadores, de forma di-versa no SUS ou no sistema suplementar, paracontrole ou diminuição do tempo de perma-nência visando à contenção de custos.

Os diagnósticos responsáveis por cerca de80% das internações, em 2006, foram:gravidez, parto e puerpério, doenças doaparelho respiratório, doenças do apare-lho circulatório, algumas doenças infecci-osas e parasitárias, doenças do aparelhodigestivo, lesões, envenenamentos e ou-tras conse-qüências de causas externas edoenças do aparelho geniturinário. Quan-do se compara com o perfil da demandaem 1998, o volume de internações caiu14% para Gravidez, Parto e Puerpério e21% para Doenças do Aparelho Respira-tório. Essa queda é ainda mais significati-va quando se analisa a taxa de internação(Internações por 100 habitantes) para es-tes diagnósticos (Gráfico 2). Emcontrapartida, o volume de internações

cresceu, entre 1998 e 2006, de 12% paraDoenças do Aparelho Circulatório, 48%para Lesões e Envenenamentos e 78%para Neoplasias. Reforçando o aumentoda complexidade assistencial, observa-seincremento de 22% nas internaçõesde doenças perinatais, sugerindo tam-bém maior complexidade na assistênciamaterno-infantil.

O que isso significa? Em 1998, havia gran-de pressão de demanda para leitos de ma-ternidade e doenças respiratórias (que pre-dominam na infância). Nove anos depois,

Essas variações representam diminuição degastos? Poderia ser esperado que com me-nor TMP o gasto fosse mais baixo, o quetambém não aconteceu. No caso do SUS,observou-se um incremento de 89% no va-lor gasto por internação e de 109% porpaciente-dia. Isto sugere incorporação denovas tecnologias no tratamento dos pa-cientes. Mas será que o resultado está sen-do mais efetivo, ou melhor, estão sendosalvas mais vidas ou mais pessoas estãosobrevivendo com incapacidade? Para res-ponder de forma mais adequada esta in-dagação seriam necessários estudos de

a demanda tem outras características. Por-tanto, em 2006 são necessários mais lei-tos e, de maneira geral, maior quantidadede recursos para doenças cardiológicas,lesões, envenenamentos e neoplasias. Noshospitais gerais brasileiros, de fato, o mixassistencial sofreu grandes alterações nosúltimos 10 anos, com diminuição do TMP.

Uma vez que se observou aumento da com-plexidade assistencial, era de se esperarmaior TMP para as doenças analisadas. Comofica demonstrado no Gráfico 3, o tempomédio de permanência, no período analisa-do caiu 7% nas Doenças do Aparelho Circu-latório (de 6,9 para 6,4), 6% nas Lesões eEnvenenamentos (de 5,3 para 5,0).

impacto para que de fato possa se dizerque os investimentos crescentes estão re-vertendo em melhor resultado assistencial.Seria instigante a comparação desses acha-dos com dados do setor privado. Algunsindícios apontam na direção contrária da-quela indicada pela literatura internacio-nal e pelas análises de tendências. Nos in-dicadores do Boletim de IndicadoresProahsa, os hospitais para os quais a sériehistórica dos dados é mais longa (desde2001) evidenciam aumento no tempo depermanência. Em 2001, a mediana deTMP divulgada para os hospitais aderidosa um sistema de comparação era de 3,4dias. Em 2006, o TMP apresentado foi de4,1 dias.

Gráfico 2 - Distribuição anual das taxas de internação(por 100 habitantes) segundo diagnóstico -

Capítulo CID 10ª revisão - SUS - Brasil - 1998 a 2006

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 9

o doente não tão exigente. Eleva-se o pa-drão do hospital e vai-se oferecendo àque-la população que não reivindica - porquepara ela está tudo bom - o que uma popu-lação exigente quer. E, com isso, há melho-ra no nível de atendimento do hospital.

Por outro lado, o ingresso maior de recur-sos permite suplementar o salário dos fun-cionários; o hospital deixa de ser um localpara treinar profissionais que depois vãotrabalhar nos hospitais privados. Porque ohospital universitário, tradicionalmente, pre-parava a enfermeira, o técnico e quandoele estava no seu melhor momento profis-sional, ganhando pouco, vinha o hospitalprivado e o contratava. Como é que vocêvai fazer um serviço de liderança se o seupessoal não é de liderança? E o pessoal deliderança não se submete a salários indig-nos. Logo, há uma seleção negativa dentrodo hospital: permanece quem não conse-gue trabalhar no privado ou quem tem doisempregos.

Surgiu então a luta das seis horas. A lutadas seis horas não é para a pessoa trabalharmenos, porque oito horas sobrecarregademais, isso não é verdade! O motivo é osegundo emprego: porque o profissionaltrabalha em dois lugares: seis horas maisseis horas. É mais que oito. Mas, o profis-sional precisa do segundo emprego. E sededica mais onde é mais cobrado, e menosonde é menos cobrado. Não tem mistério -isso é claro. Se você não consegue premiara competência, você está afundando a suainstituição, porque os competentes vão sair.Eu assisti a isso largamente. Você preparauma enfermeira de UTI. Quando ela estáno ponto, ela vai embora, porque ofere-cem para ela o dobro do salário. Então, seeu quiser manter essa enfermeira, eu tenhoque pagar a ela o dobro. Só que o Estadonão me permite pagar o dobro devido àisonomia salarial - todo mundo ganha igual.

Na medida em que nós começamos a aten-der à clientela mais rentável dos convênios,verificamos dados muito importantes: 20 a25% dos que eram atendidos pelos convê-nios captavam 60% da receita; e 75 a 80%que eram atendidos pelo SUS captavam40% da receita. Isso representou um extraor-dinário avanço. Aí, veio o Pinotti, com o

estribilho: "Dupla porta". E eu fiz um artigodupla-porta versus dupla-militância. Querdizer, se eu quero uma clientela diferencia-da para vir para o hospital, eu tenho queoferecer uma hotelaria mínima. Por quê?Porque o paciente tem os consultórios pri-vados e os hospitais privados à disposição;ele só virá para o meu hospital se ele tiver omínimo de hotelaria. Mas o centro cirúrgi-co, a UTI, os exames de laboratório e osexames de imagem são iguais. Então, opadrão do que está sendo oferecido parauma clientela de nível "A" é o mesmo queaquele da clientela de nível "B" "C" e "D". Omesmo padrão. Só que há uma captaçãode recurso que permite fazer isso. Foi issoque fez o Incor chegar à posição a que che-gou. Por quê? Eu era diretor científico; ti-nha um trabalho para publicar, para apre-sentar num Congresso Europeu, mas nãotinha como ir. Solicitei as passagens. E, aí,nós começamos a ter uma participação nosCongressos Internacionais sem precedentes.Esse fato que elevou o nível de atendimen-to. O intercâmbio faz o anúncio para a in-trodução de novas tecnologias.

Quando nós recomeçamos os transplantesem 1985, tinha vindo o Jorge Kalil, que es-teve cinco anos na França, com um profes-sor que era Prêmio Nobel. Foi para PortoAlegre. Nós fomos lá buscá-lo. Hoje, ele éprofessor titular, dispõe de um andar, queé o laboratório de imunologia e tecnologiaem transplantes mais completo do País. Éassim que se faz avanço, não é com con-versa. Você tem que preparar e qualificaras pessoas; dar visibilidade para as pessoaspara que haja produção. O modelo do Incorestá sendo copiado como, por exemplo, noInstituto Butantã.

Eu fui lá várias vezes intermediar desenten-dimentos entre o pessoal da pesquisa e oda produção, quando eu era Secretário.Hoje, o Butantã, graças à Fundação deApoio, é um grande produtor de vacinas,do melhor nível. Ribeirão Preto, o hospitalda universidade, era uma dificuldade. Esti-ve lá duas, três vezes para discutir. E váriosoutros lugares fizeram isso. No Rio de Ja-neiro, o Hospital de Laranjeiras não opera-va dois doentes por semana - hoje está ope-rando quatro. O Inca segue o mesmo

movimento. Então, as pessoas dizem: "Que-rem privatizar o funcionalismo público".Você quer eficiência. "Não. Tem que ser sócom recurso público". Mas o recurso públi-co não dá! "Ah, vamos pressionar o gover-no. É porque não tem vontade política".Então, basta olhar o orçamento e verificarque, em 10 anos, pelo IPC, você perdeu de80 a 120 bilhões de reais. É complicado.

Ana Maria Malik: O senhor é noto-riamente reconhecido como um médicobrilhante. Como é que o senhor virougestor na área da Saúde, político na áreada Saúde?

Adib Jatene: Foi bem por acaso. Não estu-dei Medicina para fazer cirurgia cardíaca;estudei Medicina para fazer, depois de for-mado, um ano de Saúde Pública e voltarpara o Acre. Eu me desviei, na faculdade,porque eu fui trabalhar em cirurgia, poisprecisava aprender um pouco. E, por sorteou por azar, eu caí no grupo do Zerbini,num ano que começou a cirurgiaintracardíaca. Eu participei, ainda como es-tudante da primeira comissurotomia mitral.De repente, eu estava metido e não tinhamais como sair.

Mas, eu sempre achei que o problema fun-damental da Saúde é garantir o acesso paraa população de baixa renda. O DoutorDante me chamou um dia e me disse: "Olha,eu estou verificando que o nosso Ambula-tório está ficando muito sobrecarregado. Ea grande maioria são coisas simples, quepodem ser atendidas pelo posto de saúde.Então, você que está mexendo em muitacoisa, estuda esse ambulatório. Vê como éque faz". Aí eu pedi à assistente social: "Vejaa origem dos pacientes". Verificou-se queem grande parte, esses pacientes provinhamde regiões periféricas como São Miguel, Pe-nha, e tantas outras. Então, pensei: "Ago-ra, vamos estabelecer contato com os Pos-tos de Saúde da região". Aí, eu descobri quenão existiam postos de saúde nessas regiões.Peguei o mapa de São Paulo e botei namesa. Pedi à minha secretária: "Você peguetodos os hospitais de São Paulo; marque oendereço". Quando ela acabou o mapa foiincrível, descobri o problema. Destacava-seuma área com raio de quatro quilômetros,tendo por centro a esquina da Pamplona

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1 Tempo Médio de Permanência é o número de pacientes-dia dividido pelo número de saídas

hospitalares no mês, expresso em dias.

rizações de internação hospitalar (AIH), docadastro nacional de estabelecimentos(CNES) e da pesquisa de assistência médicasanitária (PAMS), disponíveis no DATASUS,para os serviços vinculados ao Sistema Únicode Saúde (SUS); o sistema de avaliação dasOrganizações Sociais - instituições vinculadasà Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo;os indicadores do Comitê de Qualidade Hos-pitalar da Associação Paulista de Medicina(apresentados no Boletim Indicadores -Proahsa); Sistema de Indicadores Padroniza-dos para Gestão Hospitalar (SIPAGEH); Siste-ma de Indicadores Padronizados para Ges-tão dos Laboratórios (SIPAGEL); e o Sistemade Indicadores Hospitalares (SINHA), da As-sociação Nacional de Hospitais Privados(ANAHP)

Com exceção dos sistemas vinculados ao SUS,em todos os outros citados, a participação évoluntária e está concentrada em hospitaisprivados não financiados pelo SUS, localiza-dos nas regiões Sudeste e Sul. Hospitais pú-blicos e serviços privados financiados peloSUS também participam do SIPAGEH (Hos-pital de Clínicas de Porto Alegre) e do Pro-grama Compromisso com a QualidadeHospitalar - CQH (principalmente hospitaislocalizados no município de São Paulo), po-rém em menor proporção. No SINHA parti-cipam os 34 hospitais da ANAHP, serviçosprivados financiados pelo sistema suplemen-tar ou diretamente pelos pacientes.

Vale ressaltar os sistemas dirigidos para de-terminadas áreas ou setores do hospital,como é o caso do QUATI (Qualidade em Te-rapia Intensiva) patrocinado pela Associaçãode Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), im-plantado em várias unidades de terapia in-tensiva, principalmente na Região Sudeste.Eles também são de adesão voluntária e apre-sentam cobertura heterogênea e não repre-sentativa dos leitos e unidades de terapia in-tensiva existentes.

O que se pode fazer com esses sistemas deinformação e de comparação? Ainda queeles sejam limitados, dirigidos e eventualmen-te com graus de precisão variáveis, é possível

efetuar análises e planejamentos a partir dasinformações neles disponíveis e terparâmetros que possam nortear a identifica-ção de perfis assistenciais. No entanto, é ne-cessário haver critério e cuidado para sabero limite de sua utilização e interpretação.

Na verdade, o uso de alguns indicadoreshospitalares tradicionais voltados para avali-ar o desempenho das organizações de saú-de exige muito cuidado e está contra-indicadauma análise simplista. Por exemplo, o tempomédio de permanência (TMP 1) é um indica-dor muito utilizado em todos os sistemas decomparação citados. De um lado, ele estáassociado ao custo hospitalar que se buscacontrolar do ponto de vista do financiadorpúblico ou privado, uma vez que tambémdetermina a oferta de leitos (quanto maior oTMP, menor a oferta de leitos e menor arotatividade de pacientes). De outro, podeestar relacionado com a qualidade da assis-tência oferecida. Considera-se que numapermanência hospitalar de até sete dias, orisco de aquisição de infecções hospitalaresé menor. No entanto, médias de permanên-cia curtas para determinadas afecções po-dem significar falha assistencial, seja porquepodem estar associadas a altas taxas de mor-talidade ou a transferências para outros ser-viços, ou porque podem contribuir parareinternações desnecessárias. A literaturasobre o tema é extensa e muitos países têmutilizado o TMP de patologias marcadoras -

tendo como base diretrizes para prática clí-nica - como padrão de qualidade na assis-tência para a avaliação dos prestadores hos-pitalares e com o intuito de aprimorar aqualidade do cuidado oferecido aos porta-dores desses diagnósticos. No Canadá, porexemplo, o TMP baixo para Acidente VascularCerebral (AVC) foi associado a reinternaçõese a maior custo assistencial, o que determi-nou uma meta, para os hospitais canaden-ses, de Tempo Médio de Permanência míni-mo para esta afecção como parâmetro naavaliação dos hospitais. Ele é um indicadorsensível aos processos assistenciais, mas pou-co específico. Isto significa que é útil nomonitoramento, mas as variações observa-das exigem investigações mais detalhadaspara a compreensão dos fatoresdeterminantes.

Para caracterizar a complexidade da análisesobre os indicadores de desempenho de ser-viços de saúde, observa-se o Gráfico 1, comos dados de média de permanência nos ser-viços que prestam assistência ao SistemaÚnico de Saúde (SUS), sejam estes de natu-reza pública ou privada. Observa-se quedada média de permanência enquanto ten-dência nesses 16 anos de análise. Tendo otipo privado partido de 6,8 em 1990, e che-gando a um patamar de 5,8 dias em 2006.O decréscimo foi maior nos hospitais públi-cos, uma vez que em 1990 a média era de8,3. De um modo geral, nos últimos dezanos, os hospitais públicos apresentarammédia próxima, porém abaixo da observa-

Gráfico 1 - Distribuição anual da média de permanência se-gundo tipo de hospital - Sistema Único de Saúde - 1990 a 2006

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com a Paulista. Quer dizer que nas outrasáreas não tem hospital. Como? E a popu-lação? Aí, veio o governo Maluf. PauloMaluf e criou uns grupos de trabalho. Eeu entrei num grupo de trabalho do Hos-pital das Clínicas. No dia da apresentação,o presidente do meu grupo de trabalhonão foi. Fui solicitado a fazer a apresenta-ção do grupo. E fiz. Acabou a reunião, veioum assessor dizendo que o governadorgostaria de falar comigo. Ele me convidoupara ser o Secretário da Saúde. Aceito oconvite, fui estudar a situação da Saúde.Comecei a ir às Assembléias Populares,comecei a discutir. E o pessoal, quandopercebeu que na verdade eu queria fazeruma coisa séria, aderiu, e fizemos um le-vantamento na área metropolitana, par-tindo do princípio de que você precisariapara cada dez, quinze mil pessoas, ter umaunidade de saúde para que a populaçãopudesse ser beneficiada. Eu tinha propos-to introduzir 10 visitadores sanitários - naépoca, se chamava visitador sanitário - naregião das unidades, com uma seleçãodesses funcionários na região de cada uni-dade. Isso foi negado, não podia, porquetinha que fazer concurso público. E eu dis-se: "Concurso público, eu não quero. Por-que virá gente com qualificação acima doque necessito e não trabalharão direito, evirá gente de um bairro para o outro, for-mando uma confusão". E nós fizemosaquele Plano Metropolitano com 490 Pos-tos de Saúde e 40 hospitais locais. As auto-ridades reclamaram que o plano era umaloucura. Eu disse que loucura era essa ci-dade. Fui ao Banco Mundial arranjar re-curso. O Banco Mundial disse: "Nós só fi-nanciamos na zona rural". Falei: "Porquevocês não conhecem o Brasil. Nosso pro-blema não é mais a zona rural. Nossoproblema são as áreas metropolitanas".

Quer dizer, tudo baseado em quê? Quan-do você tem um compromisso, tem queanalisar as variáveis para montar umaequação minimamente aceitável. E foi aíque se perdeu a oportunidade. Por quê?Eu dizia isso para o Paulo Maluf. Eu dizia:"O senhor está gastando 500 milhões dedólares no Paulipetro. O senhor me dá 20%disso e eu resolvo o problema da Saúde".Mas, eles não dão, porque sabem que

quando se investe em petróleo, assim quese começa a produção, tem-se o retornodos recursos gastos, começa a receita. Seo investimento é em saúde, começa a terdespesa. Então, eles não querem fazer es-sas unidades, porque depois gera umadespesa gigantesca, comprometendo parasempre o orçamento.

Álvaro Escrivão Júnior: Em relação à for-mação dos profissionais que adminis-tram os serviços de saúde, observa-seque vários serviços, atualmente, estãocontratando administradores e enge-nheiros, porque os médicos não teriamcondições. Em contraste, há a opiniãoque para administrar tem que ser médi-co. Qual a sua opinião?

Adib Jatene: Eu sempre distingui direçãoda administração. Quando no Estado, paraser diretor do Dante Pazzanese precisariater curso de Administração Hospitalar, eume rebelei, pois não sou administrador, soudiretor. O diretor é o cidadão que tem avisão do problema e pode antecipar assoluções. É quem tem a capacidade deseparar o que é importante do que não é.O administrador tem que viabilizar o quea direção estabeleceu.

O administrador é uma especialidade deapoio. Eu não tinha tino para o adminis-trativo. Agora, o diretor esse tem que sermédico e ser alguém com visãoabrangente, como tinha o Doutor Dante.Isso eu aprendi com ele. O Doutor Danteera um homem que tinha visão, além deser um grande cardiologista. Ele, por exem-plo, viu que o norte do Paraná seria umaregião de oportunidade. Abriu fazenda láe levou muitos amigos para participar dagrande jornada de desenvolvimento doNorte do Paraná. Os diretores médicospossuem visões que permitem a introdu-ção de inovações determinantes para aassistência. Isso é o diretor: é o sujeito queenxerga, que tem visão, que antecipa ascoisas. E, adicionalmente, tem o adminis-trador que cuida do papel, do dinheiro eda operacionalização.

Por que o Lula pode ser Presidente da Re-pública? Qual é o curso que ele tem? Ele éadministrador? Mas ele é um sujeito

muito inteligente. Ele enxerga lá adiante.Você coloca o problema, ele distingue.É por isso que ele está tendo sucesso.Agora, você bota um camarada especia-lista em administração, ele vai olhar ascontas, e não é isso. Então, eu não meconsidero um administrador, mas sim,alguém que conseguiu ter uma visãoabrangente, que permite selecionar o queé importante do que não é.

Álvaro Escrivão Júnior: Isso pode serconsiderado como um talento seu, umacaracterística pessoal...

Adib Jatene: Não é talento. É bom sen-so. Quando eu cheguei ao Ministério,vieram falar comigo sobre o Programa deAgente Comunitário de Saúde. Tinhamsido criados cento e poucos cargos demédicos de família e vieram pedir minhaopinião. Como já havia tentado fazer emSão Paulo, quando eu era Secretário daSaúde , eu trouxe o programa para ogabinete e dei toda a força para aimplantação.

Ana Maria Malik: Considerando suaexperiência e visão, o que vai aconte-cer com a Saúde no Brasil?

Adib Jatene: Estou otimista. Veja que aEmenda 29 nos tirou dessa situação, queeu disse a vocês, até 2004. Agora, oorçamento vai crescendo de acordo como aumento das receitas públicas. Se estáprevisto 12% do orçamento do Estado eele aumenta, cresce o orçamento daSaúde. Se há previsão de 15% do orça-mento municipal, o orçamento da Saúdeaumenta à medida que o primeiro cres-ce. Se existe uma participação de 5%sobre o aumento nominal do PIB, ano aano, o orçamento também é favorecido.Tem-se garantido um crescimento acom-panhando a inflação. Não teremos asperdas que tivemos anteriormente.

Em 10 anos, tivemos perda de R$ 80 bi-lhões, corrigidos pelo IPC. Essa perda vaiser eliminada. Infelizmente, vamos sair deum patamar baixo, mas vamos crescer.Um dado interessante é que, em 1986,houve uma reunião no Instituto de Estu-dos Avançados da USP - o Reitor era José

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INDICADORES

Denise Schout,Chefe dos serviços de Monitoramento de Indicadores e de Epidemiologia do Núcleo de Informações em Saúde do Hospitaldas Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) e Pesquisadora associada do Gvsaúde.

Os Indicadores e a gestão daassistência nos serviços de saúde

Émoda nos serviços de saúde a reivindi-cação de muitos indicadores em con-dições que apresentem fácil acesso.

Nos últimos anos, passou a ser corriqueiroeste tipo de manifestação por parte dosgestores, e, eventualmente, de profissionaisda área técnica, de interesse e conhecimen-to sobre indicadores do serviço em que es-tão trabalhando. No entanto, quando sebusca olhar com maior proximidade a ques-tão de sistemas de medição da produção eda qualidade da assistência oferecida nosserviços de saúde, parece haver carência deinformações.

Entre as frases mais ouvidas quando se dis-cute o assunto estão:� temos muitos dados e pouca informa-

ção;� temos na empresa um sistema de

Business Intelligence poderoso, mas nãoconsigo visualizar dados consistentes nosistema;

� os relatórios não evidenciam antecipa-damente os problemas que identifico nocotidiano;

� não consigo me comparar com outrosserviços;

� não existem sistemas de comparaçãoadequados para minha área.

Aparentemente, não está clara a definiçãodo que se deseja em termos de informação.Na verdade, cabe perguntar se de fato o pro-blema está no acesso às informações ou emsua utilização adequada.

Para aprimorar o processo de decisão nasorganizações de saúde, tanto na área públi-ca quanto privada, são essenciais informa-ções precisas e oportunas dos processos

assistenciais, especialmente no ambientecompetitivo e dadas as limitações financei-ras crescentes no setor. As principais dificul-dades para a existência de informaçõesconfiáveis, oportunas e consistentes estãoalicerçadas em dois problemas básicos dasorganizações de saúde: a qualidade dos re-gistros clínicos e a forma de implantação edesenvolvimento dos sistemas informatizadosnos serviços de saúde.

A qualidade dos registros clínicos está relacio-nada diretamente à valorização que a altagerência do serviço destina aos prontuáriose ao sistema de informação do hospital. Aqui,não se trata de valorização do sistemainformatizado - o software escolhido pelaorganização - mas sim de como e em quemedida a alta gerência investe em dispor deinformações assistenciais de boa qualidade.Para tanto, contar com uma equipe compos-ta de profissionais especializados em gestãode informação - captação, consolidação,consistência e análise dos dados e das infor-mações assistenciais - seria essencial paraviabilizar essas atividades como rotina nasorganizações.

Nos serviços hospitalares, as Comissões deProntuário e Óbito devem ser representati-vas e atuantes, para possibilitar o desenvol-vimento de formulários semi-estruturados, aserem preenchidos pelos diversos profissio-nais. Mas como essas comissões são forma-das por médicos do corpo clínico, é essenci-al que faça parte desse grupo um profissionalespecificamente qualificado em análise deinformações. Além disso, esse profissionaldeverá trabalhar de forma integrada com oServiço de Arquivo Médico (SAME). O Arqui-vo, por sua vez, deve ser coordenado por

pessoal qualificado, com nível universitário,desvinculado do setor de faturamento, comatribuições bem definidas e com recursospara gerenciar o Patrimônio Clínico da orga-nização. O sistema informatizado do serviçodeve ser alimentado pelos profissionais doSAME, tanto do ponto de vista de codificaçãodos diagnósticos e revisão dos dados de óbi-to quanto em relação ao monitoramento everificação dos dados do censo hospitalar,base para a construção dos indicadoresassistenciais dos hospitais.

O sistema informatizado deve serparametrizado por quem entende de análisee consolidação de dados, uma vez que o focodos sistemas nos serviços é voltado paravisualizar todas as passagens em cada servi-ço, e não o paciente. Ou ainda, é centradona contabilização dos itens consumidos du-rante o atendimento, sendo adequado ape-nas para a emissão de uma conta hospitalarindividual. Quando se quer identificar a va-riabilidade de recursos utilizados segundo de-terminado diagnóstico ou procedimento emum dado grupo etário de pacientes, dificil-mente se consegue fazê-lo diretamente.Quase sempre se requer investimento adicio-nal, o que significa gastos não previstos.

Essas considerações têm o objetivo de carac-terizar e apontar onde se devem concentraras intervenções para garantir informação dequalidade. Entretanto, é um equívoco dizerque na área da saúde não há informaçõesconsistentes. Existem, implantados no Bra-sil, vários sistemas de comparação entre ser-viços de saúde, porque nenhum deles se en-quadra na definição clássica debenchmarking. Os principais entre eles sãoobtidos por meio da consolidação das auto-

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Goldenberg - e foi discutido se o Hospi-tal das Clínicas deveria ser da universida-de ou se deveria continuar a ser umaautarquia, como já era. Perguntei ao pro-fessor Goldenberg qual era o orçamentoda USP e ele respondeu que estava pertodos 300 milhões de dólares. Esse era oorçamento do Hospital das Clínicas. Porisso, disse a ele que trazê-lo para dentroda USP criaria um problema enorme paraa universidade.

Em 1989, o Quércia era governador e es-tava sofrendo pressão muito forte das uni-versidades estaduais. Estabeleceu, então,que 9,17% do ICMS seriam destinados aelas. E isso era dividido entre as três uni-versidades. A USP ficou com cerca de 4%,depois cresceu um pouquinho. Passaram-se 17 anos e o orçamento da USP é supe-rior a R$ 2 bilhões. Já o orçamento doHospital das Clínicas, discutido ano a anosem qualquer vinculação, mesmo somadocom os das fundações de apoio mal che-ga a R$ 1 bilhão. A vinculação de recursospara as Universidades fez com que o orça-mento da USP acompanhasse o aumentode arrecadação do ICMS. A necessidadeda autarquia - Hospital das Clínicas - deficar discutindo recursos no orçamento anoa ano foi reduzindo progressivamente ovalor. Então, no momento em que nós con-seguimos ter recursos vinculados, a ten-dência é crescer. E é claro que a área eco-nômica é contra.

Quando fui começar a CPMF, o Serra eraMinistro do Planejamento. Fui falar comele e expliquei a questão. Ele respondeuque não poderia me ajudar, porque, porprincípio, ele era contra qualquer tipo devinculação. Quando Ministro, patrocinoua Emenda 29 e acertou. E se não fosse oSerra, não se vinculava recurso; e se nãohouvesse recurso vinculado, nós não terí-amos o dinheiro que temos hoje.

Os hospitais do Estado não seriam termi-nados de jeito nenhum. A necessidade deaplicar 12% do orçamento do Estado mu-dou muito a situação. Chegou um momen-to que o Secretário de São Paulo não ti-nha mais onde aplicar; possuía dinheiro enão tinha onde aplicar. Eu concordo queé preciso melhorar a gestão. A gestão foi

muito melhorada. Quando eu entrei, em1995, nós tínhamos internado 10% dapopulação por ano. Eu vi os dados de ou-tros países, não era muito exagerado. Masaí eu tive a idéia de mandar fazer um le-vantamento, município por município. Foimuito interessante. São Paulo internava6,2% e com uma grande parcela da po-pulação muito pobre. Havia municípiosque internavam 12, 15, 20, 40% da po-pulação. Isso não pode ser. Isso é fraude.Foram levantados dados do DATASUS everificou-se que esses dados não tinhamcrítica. Apresentava-se a conta e se man-dava pagar. A fraude consistia na criaçãode escritórios que produziam prontuáriosfictícios, apresentavam a conta e o Siste-ma pagava. Eu me lembro de uma cidadeque não tinha hospital e faturava 200 AIH(internações hospitalares) por mês.

Álvaro Escrivão Júnior: Era uma práticacomum os médicos assinarem AIH (au-torizações de internação hospitalar) embranco. Estas eram preenchidas com aciência do diretor?

Adib Jatene: Para sanar esse problema nósinserimos 135 críticas no sistema deprocessamento de contas. Isso melhoroua gestão. Havia, anteriormente, erros dedigitação e fraudes de internação. Quan-do o Datasus estabeleceu um tempo mí-nimo de internação, a fiscalização melho-rou. Hoje, ninguém fala em fraudes. Falaem fila; em falta de atendimento; em fal-ta de medicamento. Mas não há fraudena assistência.

Existem fraudes nessas contratações de ser-viços de terceiros, de lixo e outros servi-ços. Mas isso é problema das licitações.São fraudáveis. A mais incrível foi quan-do a Fundação Nacional de Saúde queriacomprar vinte milhões de vacinas contraHepatite B; queria vacinar toda a popu-lação. Dessa negociação eu quis partici-par. Aí, eu recebo um telefonema doembaixador de Cuba, me pedindo umaaudiência com o presidente do InstitutoCubano, que me ofereceu um lote a US$2,40 por vacina. O Ministério compravapor US$ 6,70. Tinham, porém, que par-ticipar de uma licitação.

Ficaram três fornecedores no final da lici-tação: o Instituto de Cuba, oferecendo aUS$ 3,85 a unidade; um outro laborató-rio da China, oferecendo a US$ 3,90 aunidade. E um outro Instituto da Bélgi-ca, oferecendo a US$ 3,95 a unidade.Quando isso acontece, você pode chamaros três Institutos e consultar se eles en-tregam todo o lote ao menor preço. Elesconcordaram. A Fundação Nacional deSaúde homologou. Eu cancelei e elesvieram dizer que eu não podia ter feito,ter cancelado, porque não havia nenhu-ma irregularidade na licitação; estavatudo dentro da lei. Só que um dos lici-tantes, que ofereceu 6,5 milhões de do-ses a US$ 3,85, tinha me oferecido 20milhões de doses a US$ 3,00 a unidade.Não pagaria US$ 3,95 por unidade e dis-se para resolvermos na Justiça. E não fo-ram. E o tempo começou a passar. Aí, eurecebi um telefonema do embaixador deCuba, que tinha uma carta do laborató-rio me oferecendo um lote de 40 milhõesde doses, a US$ 2,40 a unidade. Não seicomo é que essas coisas podem ser fei-tas. Passaram-se uns quinze dias, receboum ofício da Bélgica me oferecendo 40milhões de doses a US$ 1,80 a unidade.

Passou um pouco de tempo, o embaixa-dor de Cuba pede uma nova chance. Elevem e diz: "Olha, o comandante, para de-monstrar o apreço pelo Brasil e a neces-sidade de incrementar as nossas relações,me autorizou oferecer 40 milhões de do-ses, a um e quarenta". Depois, chega umsenador do Maranhão, de uma missão daChina, trazendo um ofício do laboratóriochinês que oferecia um lote de quarentamilhões de doses por noventa e nove cen-tavos a unidade.

Mas, com relação à gestão da Saúde, euacredito que melhorou muito, e continuamelhorando. Porque, com o volume de re-cursos que o setor possui, fazer o volumede atendimento que o SUS faz, precisa sermuito eficiente.

Álvaro Escrivão Júnior - É um milagre,não é?

Adib Jatene: Não é verdade? Eu acho.

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2. AQUISIÇÃOO objetivo da fase de aquisição é atenderaos parâmetros exigidos pelo serviço como menor custo. Isto somente será possíveltendo em mãos um memorial descritivoou um RFP (Request for Proposal), no qualtodas as especificações técnicas estejamdescritas. Podem-se relacionar os seguin-tes detalhamentos:� características gerais do equipamento,

incluindo sistemas de comunicação;� condições de pagamento;� valor de contrato de manutenção, com

e sem peças;� up-time, ou seja, tempo útil de fun-

cionamento mensal do aparelho;� condições de modernização do apa-

relho (upgrade);� treinamento do corpo clínico e téc-

nico;� prazo de garantia;� instalação;� manuais em português;� formulário de análise do vencedor da

concorrência de aquisição, não levan-do em conta apenas preço, mas tam-bém custo de insumos e de manuten-ção, entre outros. Utilização de pesoe ponderação dos parâmetros.

Após esta etapa, haverá recebimento depropostas, avaliação, seleção do fornece-dor, recebimento do equipamento e tes-tes de aceite.

3. GERÊNCIA DE EQUIPAMENTOSa) Objetivo geralO objetivo da gerência de equipamentosé estabelecer um controle rigoroso eef ic iente do parque insta lado detecnologia médica, ou seja, seus equi-pamentos médico-hospitalares, desdesua aquisição à obsolescência. Faz par-

te desta atividade inovar e aperfeiçoaras práticas de gestão e controle deequipamentos, dando ênfase aos pro-cessos de aquisição, manutenção cor-retiva e preventiva, controle de risco,comprovação metrológica, capacitaçãode recursos humanos, normalização,controle de patrimônio, obsolescência,controle de documentação e indicado-res de qualidade. A metodologia utili-zada evita a subjetividade, por meio dautilização de recursos computacionais,organização e métodos, confiabilidadeaplicada ao controle de qualidade ecentro de custos.

b) Objetivos específicos:� Implantar sistema de informações,

que permita sua interligação em redepara apoio à decisão, possibilitandoa diminuição do custo operacionalcomo resultado de decisões racionais;

� Prover a alta administração do hos-pital de informações sobre o ciclo devida de todos os equipamentos mé-dicos do hospital;

� Planejar e controlar a manutençãopreventiva e corretiva, interna e ex-terna, incluindo o gerenciamento decontratos de serviços externos;

� Definir programas de treinamentopara técnicos de manutenção eusuários de equipamentos;

� Definir programa de controle de qua-lidade e verificação de desempenhodos equipamentos;

� Definir parâmetros para determinar aobsolescência da tecnologia e plane-jar sua substituição;

� Prevenir situações perigosas e contro-lar os riscos inerentes ao uso de equi-pamentos no ambiente hospitalar;

� Estabelecer procedimentos para aqui-sição de equipamentos médicos;

� Estabelecer indicadores da qualidadepara o acompanhamento do desem-penho do serviço de manutenção, in-cluindo: tempo de indisponibilidade,custo de manutenção por tipo deequipamento, demanda por setor esatisfação do cliente.

Em um ambiente no qual os recursos sãoe sempre serão escassos e finitos, oprocesso de avaliação da incorporação detecnologias em saúde deve contemplar ofuncionamento ou o impacto de utiliza-ção do produto e do serviço. A avaliaçãode uma tecnologia a ser incorporada pelosistema de saúde, público ou privado,caracteriza-se por uma análise criteriosa edeve considerar aspectos comoefetividade, eficiência e viabilidadeeconômica.

Com o grande e rápido desenvolvimentotecnológico, tal processo de avaliação tor-na-se fundamental, não somente por iden-tificar as intervenções de valor para o sis-tema de saúde, mas também pelanecessidade de existir um processo de es-colha entre as inúmeras alternativas querealmente agregam valor.

Diante dos pontos abordados na discus-são acima, é possível concluir que a incor-poração de tecnologia na área da saúdepode ser feita de modo racional, com pla-nejamento, otimizando-se os recursos dis-poníveis, de modo a analisar a diversificadagama de propostas de tecnologias dediagnóstico, tendo como resultado desteprocesso o benefício individual e coletivodaqueles que utilizam o sistema.

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 200712

Por sua Constituição, o Brasil possuium sistema de saúde de acesso uni-versal, ou seja, tem o dever de garan-

tir saúde a todos os seus cidadãos. Essa pro-posição tem um sentido mais amplo do quea visão corrente do simples acesso à assis-tência médica ambulatorial e hospitalar.

A concepção dos serviços de saúde comode interesse público traz implicações im-portantes na construção do Sistema Úni-co de Saúde (SUS), que não deve ser vistoe tratado unicamente como sistema únicopúblico e não abrangendo o setor priva-do. Ao se analisar o SUS no âmbito estritodo setor público, ou seja, como proprie-dade do Estado e quase sempre gerido porele, visualiza-se basicamente o Ministérioda Saúde, seus órgãos subordinados, bemcomo as Secretarias Estaduais e Munici-pais de saúde. Nessas instâncias estão ser-viços de saúde (como unidades básicas,pronto-socorros, hospitais e laboratórios),além de unidades de vigilância sanitária eepidemiológica. Há ainda serviços de saú-de pertencentes e financiados pelo setorpúblico, mas geridos por atores privados,freqüentemente denominados parceirosou contratados. É o caso de alguns hospi-tais geridos mediante contratos de gestão(como as Organizações Sociais no âmbitoda Secretaria de Estado da Saúde de SãoPaulo), de Programas de Saúde da Família(no qual o modelo de parcerias está con-sagrado no município de São Paulo desdeseu retorno ao SUS no ano 2000) e outrastentativas verificáveis pelo Brasil, algumasmelhor sucedidas que outras. Resta umadiscussão a respeito de onde colocar asagências, mais especificamente a ANVISA(Agência Nacional de Vigilância Sanitária)e a ANS (Agência Nacional de Saúde Su-plementar), que são serviços públicos,

porém gerenciados com elevado grau deautonomia.

Não se questiona a escassez de dinheiropara a saúde. No entanto, a solução de pro-blemas da gestão pública em saúde no Paísdeve ser vista além da busca de novos re-cursos: os recursos já existentes precisamser mais bem aproveitados. Nesse sentido,valem os esforços para melhorar a gestãodo setor e não somente cumprir os ditamesda lei. Nenhuma solução estrutural serábem-sucedida sem recursos e capacidadede gestão. Há alguns temas que aparente-mente preocupam ou deveriam preocuparos gestores públicos pelo país, dentre osquais merecem menção:

1. Desenho organizacional e configu-ração jurídica: opções legais possíveis,como: autarquia especial, fundação,parcerias público-privadas, organiza-ções sociais, etc. Embora se busque,constantemente, mais propostas parasolucionar algumas das ineficiênciasencontradas nas já existentes, há quese desmistificar o poder dos modelosna solução dos problemas. Eles não seimplementam sozinhos, dependem decapacidade de gestão.

2. Otimização de recursos ou aumen-to da eficiência administrativa: de-mandas constantes das SecretariasEstaduais e Municipais de saúde. Co-meça a ser verificado no País um fe-nômeno novo, o da disponibilidadede recursos financeiros, tendo em vis-ta a aplicação da emenda 29. Alémdisso, tendo em vista a diretriz da uni-versalidade de acesso, costuma-sediscutir se é possível associar eficiên-cia e eficácia.

3. Planejamento estratégico: desenvol-vimento de novas possibilidades paraos sistemas e serviços de saúde, temade crescente atenção e relevância nosúltimos anos, embora seja praxe a re-alização de um novo processo a cadamudança de gestão, o que retira ocaráter de médio e longo prazo dosplanejamentos.

4. Redistribuição de atribuições e pa-péis de Estados e Municípios: discus-são acentuada desde a definição daConstituição de 1988, e retomada pelaLei Orgânica da Saúde, pelas NormasOperacionais Básicas e pelas NormasOperacionais de Assistência Básica. Adiscussão se prolonga e esses novospapéis ainda não foram totalmenteassumidos, concorrendo para a não-viabilização de muitas propostas deplanejamento e reforma do setor.

5. Descentralização: a partir da assunçãode novas atribuições, por parte das di-ferentes instâncias de governo e dasubstituição de diversas tarefas. Pensare repensar, antes de planejar ou deredesenhar as estruturas, faz sentido,permitindo optar pelo que deve ou nãoser delegado de maneira mais consci-ente. A partir daí, as capacitações dostécnicos e dos gestores podem ser fei-tas de forma mais dirigida.

6. Modernização: termo muito aplicadoe tentador num setor considerado con-servador. Com freqüência, associa-semodernização à informatização, ouaté à disponibilidade de computado-res. Por outro lado, a presença do equi-pamento não significa que ele seja usa-do de maneira adequada, que

SETOR PÚBLICO

Ana Maria Malik,Professora da FGV-EAESP, coordenadora do GVsaúde

Gestão Pública em SaúdePaulo Roberto Motta,Professor da FGV-EBAPE, consultor da FGVProjetos

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mentos pré, durante e pós. Aqueles queestudam tendências na área da saúde játêm divulgado que a Engenharia Clínica,atualmente de grande valia nogerenciamento de artigos e equipamen-tos médicos em serviços de saúde, empoucos anos deixará de ser uma atividadede apoio para atuar junto ao paciente,contribuindo para a melhor compreensãodo processo assistencial.

Fica claro, portanto, que a aquisição de-pende de um conjunto de pessoas e deinformações de qualidade, a respeito doque se pretende comprar (ou alugar, oufazer leasing). Existem agências de pesqui-sa em saúde que centralizam informaçõesrelacionadas à tecnologia da saúde (des-crições, avaliações, problemas encontradosem equipamentos médicos) e à promoçãode conceitos de segurança para seu usomais eficiente e eficaz. A maior organiza-ção mundial dedicada a esta finalidadechama-se ECRI (Emergency Care ResearchInstitute). Trata-se de um centro, sem finslucrativos, colaborador da OrganizaçãoPanamericana de Saúde.

As etapas a serem percorridas para seatingir uma boa escolha de equipamen-tos são:� Planejamento;� Aquisição;� Gerência de Equipamentos.

1. PLANEJAMENTOTem como objetivo principal distribuir osrecursos, finitos, para desejos quase sem-pre infinitos, ou seja, requer análises comparâmetros tangíveis, para uma tomadade decisão com a menor probabilidade deerro, lembrando de parâmetros que algu-mas vezes não são levados em conta, taiscomo: necessidades de instalação,insumos, custos de manutenção, treina-mento para a nova tecnologia.

A análise deve ser feita globalmente, poispode ocorrer da tecnologia definida apre-sentar um custo proibitivo para os recur-sos existentes, e que o serviço seja obriga-do a optar por uma alternativa maisacessível financeiramente. Para ilustrar

essa situação, pode-se mencionar a aqui-sição de um mamógrafo. O rastreamentomamográfico em mulheresassintomáticas ainda é o único métodoeficaz para a detecção precoce de lesõesclínicas ocultas, demonstrando vantagens

por sua vez, mede as conseqüências po-sitivas não em termos monetários, masem uma outra unidade, tal como anosde vida poupados, dias de morbidadeou mortalidade evitadas, entre outras.Permite, portanto, a comparação de cus-

Quadro 1: Comparativo das características dos sistemasconvencional e digital

na redução da taxa de mortalidade. Hou-ve, nos últimos anos, uma crescente pre-ocupação com a melhora na tecnologiaque envolve a qualidade de imagem emmamografia. Por exemplo, a migração dosistema convencional para o sistema di-gital. No Quadro 1 estão descritas algu-mas especificações comparativas entre asdistintas tecnologias.

Definidas as características dos distintos sis-temas pode-se, por exemplo, analisar al-guns parâmetros de extrema importânciapara definir a tecnologia a ser incorpora-da no serviço: Custo/Benefício (CBA), Cus-to-Efetividade (CEA) e Custo-Utilidade(CUA). Estas são técnicas para a compara-ção das conseqüências positivas e negati-vas na utilização de recursos. Na realida-de, nada mais são do que tentativas de sepesarem logicamente os prós e os contrasde uma decisão.

Na CBA, as medidas são em unidades mo-netárias. Isto permite uma comparaçãoentre programas semelhantes. A CEA,

to por unidade de efetividade entre pro-gramas com o mesmo objetivo, mas nãoentre programas com objetivos diferen-tes, porque a efetividade das medidasde resultado difere. Neste caso, apesarde a medida final ser a mesma, osparâmetros utilizados em cada progra-ma não são comparáveis. A CUA enfoca,com atenção no resultado, a qualidadeda saúde obtida por um programa desaúde ou tratamento. Os resultados sãogeralmente expressos como custo porganho em qualidade de anos de vidaajustados.

Com os parâmetros mencionados no Qua-dro 1, e utilizando as técnicas de análisesupracitadas, pode-se optar pelatecnologia mais eficiente e mais eficaz paraum determinado centro de diagnóstico porimagem. No caso de um grande serviçode imagem, que seja referência, ter umaalta demanda de pacientes e composicionamento diferenciado de mercado,a conclusão provavelmente será pela aqui-sição do mamógrafo digital.

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 13

funcione em rede, que haja eletricida-de, ou que sua utilização tenha algumsignificado real. Há quem diga que,até o momento, não existem progra-mas informatizados adequados paracobrir toda a necessidade da gestão eda assistência médico-hospitalar.

7. Qualidade: começam cada vez mais aser disseminados programas de quali-dade e de avaliação externa em servi-ços públicos de saúde, seja para eviden-ciar qualidade de cuidados por meio deum certificado externo, para se prote-ger de críticas, para tranqüilizar a cli-entela, ou ainda para motivar os fun-cionários. Mesmo assim, há diretoresque consideram esta aplicação carac-terística de serviços privados, que ne-cessitam disputar mercado e que têm,alegadamente, mais recursos, conside-rando um desperdício de esforçosaplicá-los no setor público. Como háevidências de que este tipo de iniciativareduz riscos e, a rigor, otimiza a ativi-dade administrativa, este tipo de atitu-de merece ser discutido publicamente.

8. Logística: no setor público, no qualseria fundamental a eficiência e aotimização dos processos, há relativa-mente pouca preocupação com o as-sunto, tanto na área de suprimentosquanto na de fluxos internos, obser-vando-se re-trabalho, duplicação deatividades, cruzamentos desnecessá-rios, impressos desatualizados, entreoutros. Freqüentemente, as instalaçõessão antigas e mesmo mecanismos maismodernos de licitação não garantemque aquilo de que se necessita estejano lugar adequado no momento pre-ciso. O mesmo ocorre com o arma-zenamento de insumos, que acabammenos controlados do que seria ocaso, levando ao vencimento de me-dicamentos de alto custo ou à dete-rioração de outros materiais.

9. Gestão financeira e orçamento: par-tindo da premissa de que os recursospara a saúde são insuficientes, este as-pecto deveria ser privilegiado neste se-tor, mas na verdade os problemas vêm

de duas ordens. Por um lado, apesarde a Emenda Constitucional 29, de13/09/2000, vincular gastos com açõese serviços de saúde, definindopercentuais mínimos de gastos anuaispor esfera de governo (a União deveriagastar 10% das Receitas Correntes Bru-tas, os estados deveriam gastar 12% daReceita de Impostos e Transferências eos municípios deveriam gastar 15% daReceita de Impostos e Transferências).Não necessariamente estas determina-ções são cumpridas, entre outros moti-vos porque ainda há controvérsiasquanto aos conceitos de "ações e servi-ços de saúde". Por outro lado, a elabo-ração de orçamentos na área da saú-de, não apenas no setor público, aindacostuma ser desvinculada das ativida-des a serem desenvolvidas,enfatizando mais os itens formais queo relacionamento entre o recurso e oseu destino. Finalmente, cortes no or-çamento da saúde não são incomuns.

10. Recursos humanos: tema dos mais re-correntes na área, e sempre a maior des-culpa pelas eventuais falhas do sistema.Nessa dimensão, a lista de dificuldadesé longa e tende a englobar todos osaspectos da gestão de recursos huma-nos. Assim, fala-se de falta de motiva-ção e aponta-se para novos planos decargos, carreiras e salários. Sugerem-sesoluções cosméticas, como mudar a de-nominação da área para gestão de pes-soas ou gestão de talentos, sem ofere-cer opções substantivas de mudança.Discute-se a conveniência de manter oconcurso público, ao mesmo tempo emque se propõe um plano único para oSUS por todo o País.

Não há respostas prontas para essas ques-tões. Tampouco aquelas implantadas numalocalidade no País servem para o Brasiltodo. Não existe o hábito de se avaliar assoluções implantadas. Um exemplo de so-lução paliativa na área de gestão de recur-sos humanos tem sido a adoção do regi-me de plantão, alegadamente paracompensar os baixos salários. Tanto na áreaadministrativa quanto na área assistencial,esse modelo tem sido largamente empre-

gado, sob a alegação da necessidade de setrabalhar em turnos que permitam o segun-do (e às vezes o terceiro) emprego. No en-tanto, essa prática traz a grande desvanta-gem de quebrar a continuidade no trabalho.

Na área assistencial, o plantão se justificatecnicamente em unidades como pronto-socorro e terapia intensiva para algumas ca-tegorias profissionais. No que tange a paci-entes internados e a áreas administrativas ede apoio, não há como considerar que plan-tonistas sejam mais eficazes que diaristas.Apesar disso, esse tema não tem sido pas-sível de discussão no setor público.

Vale ressaltar que temas como quadro depessoal, aumento salarial, figuras jurídicas,orçamentos e estruturas organizacionaisnão são assuntos exclusivamente técnicose de responsabilidade dos poderes executi-vos. Cada modificação efetuada dependedo poder legislativo, com trâmites mais lon-gos e questionamentos mais abrangentes.Por exemplo, a terceirização tende a ser dis-cutida em relação à quantidade de pessoasque se pode contratar conforme o limiteda parcela orçamentária atribuída a pes-soal. Quando a discussão a respeito do as-sunto teve início, dizia-se que qualquer or-ganização somente deveria terceirizar suasatividades-meio, jamais as atividades-fim.No entanto, empresas ou cooperativas deprofissionais de saúde, como médicos ouenfermeiros, já vêm sendo contratadas deforma rotineira, às vezes por serem os úni-cos mecanismos aceitos pelos profissionaispara trabalharem nos serviços, às vezes por-que são um subterfúgio para a contrataçãoou para caberem na legislação de propor-ção de orçamento que pode ser alocada aoitem recursos humanos.

Algumas mudanças potencialmente es-truturais acabam sendo aceitas ou recu-sadas em função de questões ideológi-cas, e não de análises de eficácia. Acapacitação gerencial pode ser um cami-nho para solucionar a equação, mas cer-tamente não é garantia de sucesso. Háquestões técnicas, sem dúvida, mas con-siderar o aspecto político é fundamental.Ter um projeto a seguir, conhecer ou de-finir diretrizes claras para a assistênciadigna à saúde faz a diferença.

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Tecnologia pode ser definida comoum conjunto de conhecimentos sis-tematizados e aplicados em um de-

terminado ramo de atividade, com o pro-pósito de gerar produtos ou serviços.Quando o campo de aplicação é a saúde,o conceito é muito abrangente e pode fa-zer referência tanto a uma técnica cirúrgi-ca quanto a um equipamento diagnósti-co, passando por diferentes insumos comovacinas, medicamentos, materiais médicos,entre outros.

Tem sido crescente o progresso datecnologia na área da saúde. É, portanto,útil analisar esta evolução sempre sob doisângulos:� Favorável, uma vez que sua utilização

tem como objetivo maior incrementodas condições de saúde e de qualida-de de vida, do ponto de vista indivi-dual e coletivo;

� Desfavorável, quando sua aplicaçãoé feita de modo indiscriminado, visan-do atender a interesses econômicos deforma dissociada da ética.

A difusão e adoção de tecnologias estãodiretamente relacionadas à:� Legislação sanitária, definindo regras

de registro de produtos (artigos mé-dico-hospitalares, equipamentos mé-dicos) no Ministério da Saúde, a partirdas quais se torna viável o processode comercialização no Brasil;

� Situação de mercado, ou seja, sufi-ciência (ou não) da oferta de bens eserviços; oportunidades de mercado

interno ou externo; dependência detecnologia do exterior;

� Capacidade e disposição pública ouprivada de alocar investimentos noprocesso de desenvolvimentotecnológico, percorrendo distintasetapas que vão desde incentivos fis-cais, financiamento, proteção de mer-cado até, e principalmente, a forma-ção de recursos humanos qualificadospara esta finalidade;

� Evolução do modelo assistencial, adesospitalização, o incremento de ati-vidades realizadas no âmbito do am-bulatório ou na própria residência doindivíduo, com a expansão de servi-ços de assistência domiciliar.

Detalhando um pouco mais este últimoaspecto, vale citar como exemplo a possi-bilidade atual de se tratar, ambulato-rialmente, um coronariopata por meio dautilização de um stent, ou um pacientecom aneurisma cerebral, por meio de téc-nicas e materiais aplicados por um neuro-radiologista. Há ainda, neste contexto, odestaque que deve ser dado à digitalizaçãode imagens e ao incremento do sistemade informações hospitalares, permitindoinovações no diagnóstico remoto e nas ati-vidades de telemedicina e telerradiologia.

O desenvolvimento e o uso das tecnologiasmédicas durante as últimas décadas têmcrescido rapidamente. É inegável que ino-vações tecnológicas contribuíram para aqueda, em todo o mundo, das taxas demortalidade e morbidade. Porém, mesmo

que estas novas tecnologias tenham pro-duzido mudanças no estado de saúde demuitas populações, é importante reconhe-cer que muitas dessas mudanças têm umcusto muito elevado em relação aos bene-fícios produzidos. Neste sentido, o planeja-mento é indispensável para que os benefí-cios introduzidos por estas tecnologiassejam totalmente aproveitados.

Diante de tanta evolução, da variedade deequipamentos produzidos por distintos fa-bricantes com diferentes funções, da rapi-dez com que a tecnologia atinge a obso-lescência, da dimensão dos investimentosfeitos nestas aquisições, surge a questão arespeito de como uma instituição de saúdedeve se organizar para evitar as freqüentesexperiências a que se assiste, como a deefetuar uma compra de algo que efetiva-mente não se necessita ou cuja manuten-ção não se consegue viabilizar.

O planejamento da tomada de decisão(adquirir ou não um equipamento mé-dico, por exemplo) deveria envolver umgrande contingente de profissionais quecontemple a direção do serviço (é técni-ca e politicamente viável a aquisição?),os usuários (o equipamento é de fácilutilização? É prioridade, no momento?)e a administração (há recursos para in-vestimento nesta operação?).

Falta, neste rol de integrantes do processode decisão, um profissional essencial: oengenheiro clínico. A importância de suaparticipação permeia a aquisição nos mo-

Antonio Jose Rodrigues Pereira,Gerente de Engenharia Clínica do Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicasda Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Inrad/HCFMUSP)

Lucila Pedroso da Cruz,Diretora Executiva do Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdadede Medicina da Universidade de São Paulo (Inrad/HCFMUSP)e Conselheira do GVsaúde.

TECNOLOGIA

Incorporação Tecnológica na Área de Saúde

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 200714

Arevisão dos processos administrati-vos do setor de serviços de saúdetem representado um desafio para

os profissionais e tem sido objeto de es-tudo para as organizações educacionais.Neste processo, torna-se fundamental odesenvolvimento de técnicas gerenciaise de estruturas organizacionais apropri-adas para o alcance dos objetivos e parao enfrentamento das mudanças acelera-das e do aumento de complexidade in-terna. Neste sentido, é importante res-saltar a necessidade de haver ambientede trabalho flexível e capacidade das or-ganizações de atrair e reter profissionaiscada vez mais competentes.

Assim vem se posicionando a FGV ao lon-go destes últimos anos, com programasgerenciais cada dia mais inovativos.

Na Saúde, tentamos relacionar a inser-ção da densa competência estratégicaem todos os "atores" dos setores públi-co e privado, para facilitar o acesso fran-co, com a captura de oportunidades eneutralização de ameaças (estrito e lato

senso).

É dentro dessa linha de exposição quetecemos considerações sobre a gestão,dando ênfase às ações preventivas. Poroutro lado, alinhamos uma série de ob-servações relativas ao processo estraté-gico, balizando os principais aspectos aserem considerados nesse universo tãoespecial e sensível para a sociedade: saú-de e competência estratégica.

O trabalho dos nossos programas econsultorias para essa área resulta naformação de profissionais especializadosna gestão de serviços de saúde. Isto é fun-damental para dotar líderes e executivosdas ferramentas essenciais, bem como ga-rantir a sobrevivência e o crescimento dehospitais, clínicas, laboratórios e demaisserviços de saúde.

Os serviços de saúde fazem parte de umsistema para o qual confluem o individu-al, o coletivo, o biológico, o social, o quan-titativo e o qualitativo. Além destes com-ponentes, existem questões relacionadasa: cobertura, custos, acesso, universalida-de, complexidade, consumo, indicadores,satisfação do usuário e outros. Portanto,ao se avaliar a qualidade desses serviços,são abordados inúmeros aspectos e con-ceitos que se inter-relacionam. É importan-te, também, conhecer os objetivos e pro-cessos de trabalho das instituições quecompõem o sistema de saúde, de forma aconjugar ações que possam melhorar aqualidade do serviço e dos seus profissio-nais, permitindo, assim, buscar permanen-temente a satisfação de todos os envolvi-dos e, em especial, do paciente, usuáriofinal do sistema.

A área da saúde em geral demanda pesa-dos investimentos em recursos humanose tecnologia de ponta. A atualização dosprofissionais, dos equipamentos e técni-cas aplicados deve ser permanente e, por-tanto, requer a destinação de investimen-tos elevados.

O financiamento da saúde no Brasil estámuito aquém das suas reais necessidades.

Nós, gestores de Saúde, temos responsa-bilidade sobre um total de 99.007 entida-des privadas; 52.186 municipais; 2.204 es-taduais e 220 federais, de acordo comdados do Cadastro Nacional de Estabele-cimentos de Saúde (CNES). Ou seja, dis-pomos de um total de 54.610 entidadesde serviços públicos de saúde no Brasilfrente a 99.007 privadas, totalizando153.617 no País.

Temos problemas de gestão e de insufi-ciência de verbas. As tabelas de remune-ração do Sistema Único de Saúde (SUS)estão altamente defasadas. A este cená-rio, somam-se pessoas desacreditadas noSUS, resultando em franca migração parao setor suplementar.

No entanto, não se trata de um trabalhocom base em tabelas de custos. É precisoconstruir políticas públicas na máquinado Estado, como um labor de conexãoentre as forças do coletivo e nos movi-mentos sociais, com a integração das prá-ticas gerenciadas no cotidiano dos servi-ços de saúde.

Na força de trabalho e no desenvolvimen-to e manutenção de programas de treina-mento constantes com as equipesmultidisciplinares, encontra-se a motiva-ção para requerer mudanças no sentidode enfrentar os desafios de novos mode-los e sistemas gerenciais.

GESTÃO

Não existe nada mais difícil de conduzir, nem nada mais incerto eperigoso do que iniciar uma nova ordem das coisas.

Maquiavel

Tania Furtado,consultora da FGV Projetos e Coordenadora Acadêmica do MBA Executivo de Saúde - FGV Management.

O Gerenciamento da Saúde-Brasileira

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hospitalar e a necessidade da manuten-ção dos padrões de qualidade mínimosde assistência tornam a tarefa ainda maisdesafiadora.

O setor necessita cada vez mais de in-formação e conectividade. As empresasque melhor se integrarem no setor sãoas que obterão as maiores vantagenscompetitivas. As pessoas e as tecnologiasde informação e comunicação são os ele-mentos-chave da gestão das operado-ras. As especialidades e os campos deconhecimento a serem gerenciados, têmnos talentos humanos e no uso inteli-gente da TI um fator fundamental noaumento da competitividade (reduçãode custos, aumento de produtividade emelhoria de qualidade) e sustenta-bilidade das operadoras e de seus pla-nos de saúde. Uma nova propostatecnológica, principalmente com osavanços da Internet, sinaliza um novo

padrão de comunicação de dados, voze imagem em um mundo integrado porredes interconectadas que trazem, porum lado, vantagens como a simplifica-ção de processos de autorização e audi-toria, e por outro, desafios como o dagarantia da pr ivacidade econfidencialidade dos dados. A infra-es-trutura das operadoras deve estar pre-parada para essa nova situação.

TENDÊNCIAS

A verticalização do processo produtivodos serviços, ou seja, operadoras quemantêm hospitais próprios para a pres-tação de serviços, sinaliza a intenção porparte dessas operadoras de possuirknow-how relativo à prestação dos ser-viços e de controlar os custos.

A internacionalização do setor, apesardos riscos da atividade, o tamanho e onúmero das instituições participantes, e

o volume de recursos envolvidos com aconcentração dos mercados acabamatraindo o capital globalizado pelo re-torno que os investimentos podem tra-zer. Esse é um setor com alta tecnologia,profissionais especializados, grande vo-lume de recursos e uma demanda signi-ficativa, características essas atrativaspara o capital que se pretende reprodu-zir. No entanto, as experiências deinternacionalização nesse setor carecemde análise mais cuidadosa para se con-firmar e conhecer melhor as caracterís-ticas dessa tendência.

Como se vê, são muitos os desafios paraas operadoras, empresas contratantes eprestadores de serviços do Setor de Saú-de Suplementar brasileiro. Para vencê-los,fica clara a necessidade de adaptação dosetor ao cenário atual acima esboçado, oque exigirá por parte dessas organizaçõessoluções criativas e inovadoras.

Page 15: Cadernos FGV Projetos nº 3 - Gestão & Saúde

GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 15

Estamos diante de desafios, como, porexemplo, os processos de acreditação paraos hospitais e serviços de saúde. Por isso, énecessário apoiar Programas de Qualifica-ção e Acreditação, como os que vêm sendoimplantados na saúde suplementar - volta-dos tanto para as operadoras, quanto paraos prestadores - visando à melhoria dos ser-viços e dos atendimentos oferecidos.

São outros exemplos de desafios a fim dese obter melhores resultados: estabeleci-mento de protocolos clínicos; padroniza-ção de materiais e medicamentos; avalia-ção criteriosa da utilização de órteses epróteses; otimização de processos admi-nistrativos; compras compartilhadas e in-vestimentos em tecnologia da informação.

Hoje, o setor encontra-se ainda atreladoao Código de Proteção e Defesa do Con-sumidor (CDC). Porém, o produto em ques-tão é a saúde do ser humano, a sua pró-pria vida, por isso a necessidade de maisempenho na criação de um Código Nacio-nal de Saúde devidamente respaldado peloNovo Código Civil, a fim de estabelecerdiretrizes, parâmetros e responsabilidadescivis para este setor.

Dentro deste escopo, entende-se que aavaliação da qualidade de um serviço desaúde envolve legislação e processos deregulação específicos e, principalmente,o conhecimento sobre a natureza e as ca-racterísticas do produto avaliado. Nestesentido, o processo de investigação deveresponder às seguintes perguntas: serápossível elaborar um diagnóstico impar-cial da qualidade do serviço de saúde queestá sendo prestado ao usuário da aten-ção médica, diante da multiplicidade deinteresses que envolvem a prestação desteserviço? Será possível aplicar, nos servi-ços de saúde, as técnicas utilizadas naimplementação dos processos demelhoria da qualidade nas demais indús-trias de serviços?

O processo para a coleta de informaçõesprévias sobre a qualidade dos profissionaise serviços, dentro do sistema de saúde, édelicado e difícil para os usuários. Isto im-

plica em nem sempre ser possível saberse, além de adequados, esses serviçosajustam-se às suas necessidades. É impor-tante ressaltar que, na área da saúde, sórecentemente a literatura tem devotadomais atenção ao tema relacionado à ava-liação da qualidade da atenção médica esua organização, em decorrência da com-plexidade crescente da demanda, do pro-cesso de regulação do mercado e do au-mento crescente das legislaçõesconcernentes aos direitos do consumidor.

Sendo assim, organizações responsáveispela prestação de atenção à saúde vêmdesenvolvendo, ao longo de suas existên-cias, projetos de melhoria da qualidade.Ainda que estejam crescendo as experi-ências de implantação de processos demelhoria contínua no âmbito dos servi-ços de saúde, poucos são os resultadosconcretamente sistematizados e publica-dos sobre o assunto.

Nos últimos anos, as organizações de saú-de têm despertado maior atenção paraaspectos e oportunidades de economiaresultantes de melhores processos na ges-tão do trabalho. Essas buscas representamo desafio para o declínio do alto custo dosserviços de saúde e incremento da suaqualidade. Têm como objetivo compreen-der as melhores práticas de gerência e osmecanismos de desenvolvimento de umacultura organizacional, de modo que dêemconta das necessidades e expectativas dosseus atores e, principalmente, do consu-midor final dos serviços de saúde. A ava-liação da qualidade dos serviços de saúdevem se intensificando e gerandoquestionamentos, modificações e transfor-mações importantes nas organizações desaúde, basicamente por fatos relacionadosaos seus custos. Não há mais como igno-rar o confronto que existe entre os aspec-tos éticos, técnicos, econômicos e sociaisda prestação de um serviço de saúde, di-ante dos avanços tecnológicos e da cultu-ra médica.

Por que isto? Eles constituem parte do sis-tema no qual são realizados processos detrabalho que estão definidos como uma

cadeia de fornecedores e clientes; existeum conjunto formado pela união de tare-fas de forma ordenada, planejada,objetivando atingir metas estabelecidas; eo produto de uma "estação de trabalho"serve de insumo para a seguinte, e assimsucessivamente.

Na década de 90, com a criação do Pro-grama Brasileiro da Qualidade e Produtivi-dade (PBQP), todos os setores de produ-ção de bens e serviços, governamentais ounão, são convocados a desenvolver proje-tos na área da qualidade. O setor saúde,representado pelo Ministério da Saúde naépoca, decidiu desenvolver a metodologiade acreditação, que é a estratégia de im-plantação de métodos de gestão e quali-dade para serviços de saúde.

Considerando a necessidade de definirparâmetros de qualificação do atendi-mento humanizado para a populaçãobrasileira, respeitando as diversidades cul-turais, ambientais e locais, a FGV Proje-tos está sempre à frente, monitorando osuporte técnico e educacional no setorda Saúde.

Como realizar estas mudanças?Estamos freqüente e intensivamente nosperguntando e agindo em cada sala deaula e em cada estado deste País para ondelevamos a aprendizagem da Gestão. Sem-pre crendo que a humanização, enquantopolítica de saúde, se constrói com as dire-ções da inseparabilidade entre atenção egestão.

Tais direções indicam o "como fazer" destapolítica que se concretiza como"tecnologias relacionais". É a partir da trans-formação dos modos como os sujeitos egrupos se relacionam que as práticas po-dem ser efetivamente alteradas. Enfim, ficaevidente que a maior preocupação dogestor em administração de serviços deveser a preparação do atendimento e a per-feita execução das promessas prévias fei-tas por este serviço.

A avaliação posterior servirá apenas comouma fotografia do atendimento.

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sidades e conveniências. A administraçãodo benefício fica a cargo de uma terceiraempresa, com fins lucrativos, sem nenhumvínculo com o setor de atividade econô-mica da primeira.

DESAFIOS

As operadoras de planos de saúde con-vivem com aumentos de custos, em ge-ral superiores aos índices adotados paramedidas da inflação no País. Em algunscasos, maiores também quando compa-rados aos índices específicos da área. Asquestões estratégicas postas aosgestores incluem o conhecimento daestrutura organizacional ideal das ope-radoras, do perfil dos recursos humanos- qualificação e quantidade -, dos pro-cessos críticos de sucesso, dos fluxos derelacionamento com os demaisstakeholders do setor e dos indicadoresestratégicos de gestão de desempenhoinstitucional. As respostas a estas ques-tões del ineiam o caminho dessesgestores na busca de maiorcompetitividade das organizações, comotambém no cumprimento do seu papelsocial no setor e na sociedade.

O grande contingente de instituiçõesprestadoras, com inúmeros profissionaisde variadas especialidades, exige dasoperadoras o controle, avaliação e su-pervisão das organizações que atendemaos seus beneficiários, o que implica en-contrar as melhores alternativas paragerenciar prestadores à distância, con-trolar a efetiva prestação de serviços e aqualidade dos mesmos, negociar seuspreços e verificar seus custos, definir ascompetências essenciais das operadorase o papel das mesmas em termos de ser-viços prestados. (Figura1)

No gerenciamento da rede credenciada,as operadoras buscam vencer os desafi-os para a conformação de uma rede efi-caz tanto na prestação de serviços, pro-priamente dita, ( local, distância, oprofissional ou o serviço), quanto naqualidade (indicadores assistenciais, im-pacto tecnológico, indicadores de pro-cesso e de satisfação de usuários) e

quantidade (densidade, concentração daclientela, distribuição geográfica dosserviços, multiplicidade, seletividade, vo-lume e preço). Nesse cenário, torna-seimprescindível que a gestão das opera-doras seja exercida por profissionais comsólida formação em administração emsaúde e competência para utilizar inten-samente a Tecnologia de Informação eadotar formas de gestão inovadoras. Defato, essa necessidade de profissiona-lização envolve todo o capital humanodo setor e implica na formação e atuali-zação daqueles que ocupam cargosgerenciais nos mais variados níveis hie-rárquicos das organizações envolvidas.

Alguns dos fundamentos presentes nodia a dia das operadoras são as técnicasde gestão corporativa, de processos crí-ticos organizacionais, de banco de da-dos, de r iscos e de desempenhoinst itucional, englobando aindacontroladoria organizacional e relacio-namento com o cliente (callcenter). Osgerentes têm que conhecer, vivenciar e apli-car essas técnicas, que são a materializaçãoda profissionalização. É importante reiterara importância do fator inovação. A inova-ção pode se materializar por meio de um

espaço de tempo e recursos (para os pro-fissionais), ou da criação de uma comuni-dade de prática ou mesmo de um labora-tório de inovação.

A regulação das relações do setor, reali-zada pelo Ministério da Saúde, especi-almente por meio de suas agências ANSe ANVISA, pelos Ministérios da Educa-ção, Planejamento e Fazenda e aindapelas Secretarias Estaduais e Municipaisda Saúde, geram efeitos importantes ediversificados, por vezes negativos nasdist intas v isões dos pr incipaisstakeholders. Os dirigentes das opera-doras têm que ter conhecimento e umaparticipação ativa junto a esta cadeiaprodutiva, como forma de melhorar aefetividade de suas instituições.

A cadeia produtiva do setor tem busca-do aperfeiçoamentos no relacionamen-to institucional, maior integração emelhoria do valor agregado. Mas care-ce ainda de um número maior de indi-cadores e parâmetros de produção, pro-dutividade, qualidade e custos destacadeia e das operadoras para uma me-lhor avaliação da evolução do setor. Oscustos crescentes da assistência médico-

Estado: papel regulamentador e julgadorMédicos: players importantesEmpresas contratantes dos planos: financiadorasCidadãos/Clientes: financiadores e usuáriosIndústrias Farmacêuticas e de Equipamentos: fornecedoras de insumosEntidades de Defesa do Consumidor: orientação sobre direitos e deveres

Figura 1 - Cadeia Produtiva do Setor de Saúde Suplementar

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 200716

GESTÃO NA SAÚDE SUPLEMENTAR

INTRODUÇÃOAs organizações que compõem o setorda saúde suplementar são: as operado-ras de planos de saúde, os hospitais, asclínicas, os laboratórios de análises clí-nicas e as clínicas de diagnóstico porimagem, além das organizações vincu-ladas à administração pública, não sócomo prestadoras de serviços, mas tam-bém como reguladoras do setor. Alémdessas, as indústrias farmacêuticas e asempresas produtoras de equipamentose de tecnologia da informação exercemuma influência marcante sobre essa ca-deia de produção.

As operadoras de planos de saúde ocu-pam a função de mediação entre osprestadores de serviços, pelo lado da ofer-ta, e os beneficiários dos planos de saú-de, pelo lado da demanda de serviços. Aharmonização entre os vários interessesdos prestadores de serviços e das distin-tas clientelas em um contexto virtual eintangível é um dos principais papéis dasoperadoras.

As principais dificuldades em se manterviável de uma operadora de planos de saú-de são os custos crescentes, inerentes aoavanço tecnológico na área da saúde, oenvelhecimento da população, demandan-do mais recursos pelo tempo de vida, e oacesso cada vez mais universalizado a to-dos os níveis de atenção à saúde, muitasvezes incompatível com o nível de rendada população beneficiária, mas garantidospela legislação vigente.

Nesse cenário, os usuários dos serviços desaúde estão muito mais exigentes e têmmaior poder de influenciar as operadoraspor meio das empresas contratantes dosplanos de saúde, ou provocando interven-ções da ANS e ações judiciais. Este quadronos remete a uma particularidade da sa-tisfação desses usuários quando compa-rada à dos clientes do mercado geral deconsumo. Na saúde impõe-se a pergunta:o sistema é bom por que oferece o que ousuário quer ou por que oferece o que ousuário precisa? Esta mesma pergunta pre-cisaria ser respondida pelas patrocinado-ras ou contratantes, pessoas jurídicas, quenecessitam oferecer o benefício saúde aosseus funcionários e encontrar a melhorrelação custo x benefício.

MODALIDADES DE OPERADORASDE SAÚDEA área de recursos humanos das empre-sas tem nos planos de saúde oferecidosaos seus funcionários um elemento essen-cial para a manutenção dos seus talentos,sendo esse benefício parte da política deremuneração das empresas. Embora one-rem significativamente a folha de paga-mento, os planos de saúde oferecem re-torno para o empresário, na medida emque são benefícios que aumentam oenvolvimento dos talentos com a organi-zação.

As organizações empregadoras podem op-tar por diversas modalidades de operado-ras de planos de saúde, sendo as principais:Cooperativas Médicas, Medicina de Grupo,Autogestão, Seguradoras e Planos Adminis-

trados. Existem duas formas básicas de fi-nanciamento para os planos de saúde, emfunção da localização do risco: se for assu-mido pela organização empregadora, tem-se um modelo "auto-segurado", chamadotambém de "custo-operacional" e "pós-pa-gamento". No caso do risco ser assumidopela instituição contratada (cooperativamédica, medicina de grupo ou segurado-ra), o financiamento será do tipo "segura-do" ou "pré-pagamento".

As Cooperativas Médicas trabalhavam,quase que exclusivamente, com a comprade serviços de terceiros, incluindo hospitais,laboratórios e consultas eletivas em consul-tórios e clínicas dos seus cooperados. Pres-sionadas pelos custos crescentes desta mo-dalidade de operação, na medida em queos custos da rede credenciada têm se ele-vado em proporções maiores que as suasreceitas, cada vez mais elas têm se esforça-do no sentido de construir e gerenciar seuspróprios equipamentos de saúde.

Os serviços são contratados, na sua maio-ria, na modalidade pagamento por proce-dimento (fee for service), na qual todos osprocedimentos são pagos, item a item,segundo tabelas previamente acordadas.Nas empresas tomadoras deste tipo debenefício para a assistência aos seus cola-boradores, usualmente, o financiamentopraticado é o segurado ou pré-pagamen-to e, em alguns casos, pouco freqüentes,opera-se o regime de custo operacional,acrescido da taxa administrativa. Utiliza-se o direcionamento da assistência paraseus serviços próprios, em busca de me-

Álvaro Escrivão Junior,Professor da FGV- EAESP e Coordenador Adjunto do GVsaúde

Djair Picchiai,Professor da FGV-EAESP e Consultor do GVsaúde

Desafios para as empresas contratantes epara as operadoras de planos de saúde

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nores custos e maior controle, sendo alivre escolha do usuário dirigida para a redede médicos cooperados. A prática doreembolso é pouco utilizada.

Como desvantagem para a empresa con-tratante, pode-se apontar a dificuldadepara controlar a utilização, uma vez que,freqüentemente, ela não possui acesso aosíndices referentes a essa variável. Destaforma, a sinistralidade pode ser a respon-sável por reajustes não previstos nos pla-nos. Outros problemas usuais dessa alter-nativa são o alto preço para cobertura dosaposentados, a perda da identidade coma rede assistencial e as dificuldades naflexibilização dos atendimentos. Porém,essas desvantagens estão presentes tam-bém na maioria das operadoras de planosde distintas modalidades.

As empresas de Medicina de Grupo, ou-tro modelo de agente financiador, operampor meio do sistema de pré-pagamento.Sua principal característica é ser um siste-ma de atendimento médico-hospitalardirecionado para hospitais, médicos e ser-viços auxiliares de diagnóstico próprios. Emalguns casos, permite atendimentos narede credenciada. As vantagens para acontratante são o preço baixo e fixo. Asdesvantagens encontram-se na limitaçãoda rede em algumas regiões, comdirecionamento do atendimento e regraspouco flexíveis, o que gera insatisfação dosusuários. Em geral, os aposentados nãoparticipam do plano empresarial. De fato,os aposentados e agregados têm se tor-nado um enorme desafio para o setor desaúde suplementar, verificando-se umagrande resistência por parte das operado-ras em assumir esses beneficiários.

Nas Seguradoras de Saúde, que recebe-ram em 2002 a denominação de "empre-sas especializadas em saúde", o financia-mento se dá na forma de pré-pagamentoe o valor pré-pago tem relação direta comas exigências de rede referenciada e comos níveis de reembolsos desejados. Nãopossuem serviços próprios, trabalhandocom rede assistencial referenciada. As se-guradoras e grandes empresas contratan-tes estão estimulando seus beneficiários a

utilizarem os serviços da rede referenciadacomo forma de redução dos seus custos.As vantagens dessa modalidade para ousuário incluem menor burocracia paraobtenção de senhas para a maioria dosprocedimentos e exames e, para a patro-cinadora, a possibilidade de contar comalguma flexibilização na modelagem darede referenciada. Essa maior facilidadede utilização gera, por outro lado, umamaior sinistralidade das seguradas em re-lação às outras modalidades.

Na modalidade Autogestão, os sistemasde saúde são administrados diretamentepela instituição patrocinadora ou por umainstituição assistencial ou previdenciária,diretamente vinculada à primeira, e desti-na-se exclusivamente a empregados ativos,aposentados, pensionistas e ex-emprega-dos, bem como seus respectivos gruposfamiliares, segundo critérios definidos elimitados. As empresas administram, semfins lucrativos, seus próprios programasde saúde, gerenciando a participação fi-nanceira do funcionário no plano, a im-plantação e o controle da redeassistencial, o controle da qualidade dosserviços proporcionados pelos diversosprestadores de serv iços médico-assitenciais, entre eles: hospitais, clíni-cas, consultórios e serviços de apoio di-agnóst ico e terapêutico, e ogerenciamento da utilização dos recur-sos por parte dos usuários.

O desenho do programa assistencial é fei-to a partir das necessidades dos usuáriose da própria patrocinadora e as condiçõesdefinidas pela empresa são negociadascom seus funcionários. Os planosassistenciais podem estar estruturados dedistintas formas: produção própria de ser-viços; contratação de serviços, na qual aorganização credencia diretamente osprestadores; e reembolso segundo valores,ou seus múltiplos, da tabela de referênciaadotada. É um sistema do tipo contri-butório, pois o usuário participa no cus-teio do plano. As empresas, em geral, ado-tam a cobrança de um fator moderador,ou seja, o usuário paga um percentualsobre consultas e procedimentos mais sim-ples. Isto representa mais uma medida para

contenção de custos do sistema do queuma fonte de financiamento, além de tero lado do caráter participativo, por en-volver o beneficiário no aperfeiçoamen-to do plano.

A característica mais marcante destaforma de estruturação é o envolvimentodireto da empresa em todo o processo deelaboração e administração do sistema desaúde para os funcionários. As vantagenspara o usuário são a participação na ela-boração do plano de benefícios e naestruturação da rede assistencial, assimcomo na avaliação e controle de quali-dade dos serviços contratados; e a me-nor burocracia para o acesso aos diver-sos níveis de atenção. Para apatrocinadora, as vantagens incluem ogerenciamento de informações no con-trole e uso dos serviços oferecidos pelarede credenciada e o fato de não apre-sentar uma composição de custos onera-da por despesas, como comissões de cor-retagem, propaganda ou até mesmomargens de lucro, o que possibilita me-nores despesas com o benefício saúde.

Nessa modalidade, contudo, o usuáriopoderá ter de aumentar sua contribuiçãopara os gastos de custeio do plano, caso aadministração do mesmo não consigamantê-los dentro da margem operacionalutilizada para os cálculos atuariais, oumesmo quando houver eventos extraordi-nários e de alto custo, elevando significa-tivamente as despesas. As desvantagenspara a operadora são a necessidade demanter equipe e estrutura próprias parasua administração, auxiliadas por tercei-ros em alguns segmentos; e os aumentossucessivos das despesas, caso ogerenciamento não contemple o controleda utilização.

Além dessas modalidades mais freqüentes,ainda existem os Planos Administrados,cujas características principais são o finan-ciamento auto-segurado e a ocorrênciados custos em função do nível de utiliza-ção de serviços. Esta modalidade possibi-lita a participação da organização patro-cinadora na elaboração do benefício, quepode ser estruturado segundo suas neces-

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GESTÃO NA SAÚDE SUPLEMENTAR

INTRODUÇÃOAs organizações que compõem o setorda saúde suplementar são: as operado-ras de planos de saúde, os hospitais, asclínicas, os laboratórios de análises clí-nicas e as clínicas de diagnóstico porimagem, além das organizações vincu-ladas à administração pública, não sócomo prestadoras de serviços, mas tam-bém como reguladoras do setor. Alémdessas, as indústrias farmacêuticas e asempresas produtoras de equipamentose de tecnologia da informação exercemuma influência marcante sobre essa ca-deia de produção.

As operadoras de planos de saúde ocu-pam a função de mediação entre osprestadores de serviços, pelo lado da ofer-ta, e os beneficiários dos planos de saú-de, pelo lado da demanda de serviços. Aharmonização entre os vários interessesdos prestadores de serviços e das distin-tas clientelas em um contexto virtual eintangível é um dos principais papéis dasoperadoras.

As principais dificuldades em se manterviável de uma operadora de planos de saú-de são os custos crescentes, inerentes aoavanço tecnológico na área da saúde, oenvelhecimento da população, demandan-do mais recursos pelo tempo de vida, e oacesso cada vez mais universalizado a to-dos os níveis de atenção à saúde, muitasvezes incompatível com o nível de rendada população beneficiária, mas garantidospela legislação vigente.

Nesse cenário, os usuários dos serviços desaúde estão muito mais exigentes e têmmaior poder de influenciar as operadoraspor meio das empresas contratantes dosplanos de saúde, ou provocando interven-ções da ANS e ações judiciais. Este quadronos remete a uma particularidade da sa-tisfação desses usuários quando compa-rada à dos clientes do mercado geral deconsumo. Na saúde impõe-se a pergunta:o sistema é bom por que oferece o que ousuário quer ou por que oferece o que ousuário precisa? Esta mesma pergunta pre-cisaria ser respondida pelas patrocinado-ras ou contratantes, pessoas jurídicas, quenecessitam oferecer o benefício saúde aosseus funcionários e encontrar a melhorrelação custo x benefício.

MODALIDADES DE OPERADORASDE SAÚDEA área de recursos humanos das empre-sas tem nos planos de saúde oferecidosaos seus funcionários um elemento essen-cial para a manutenção dos seus talentos,sendo esse benefício parte da política deremuneração das empresas. Embora one-rem significativamente a folha de paga-mento, os planos de saúde oferecem re-torno para o empresário, na medida emque são benefícios que aumentam oenvolvimento dos talentos com a organi-zação.

As organizações empregadoras podem op-tar por diversas modalidades de operado-ras de planos de saúde, sendo as principais:Cooperativas Médicas, Medicina de Grupo,Autogestão, Seguradoras e Planos Adminis-

trados. Existem duas formas básicas de fi-nanciamento para os planos de saúde, emfunção da localização do risco: se for assu-mido pela organização empregadora, tem-se um modelo "auto-segurado", chamadotambém de "custo-operacional" e "pós-pa-gamento". No caso do risco ser assumidopela instituição contratada (cooperativamédica, medicina de grupo ou segurado-ra), o financiamento será do tipo "segura-do" ou "pré-pagamento".

As Cooperativas Médicas trabalhavam,quase que exclusivamente, com a comprade serviços de terceiros, incluindo hospitais,laboratórios e consultas eletivas em consul-tórios e clínicas dos seus cooperados. Pres-sionadas pelos custos crescentes desta mo-dalidade de operação, na medida em queos custos da rede credenciada têm se ele-vado em proporções maiores que as suasreceitas, cada vez mais elas têm se esforça-do no sentido de construir e gerenciar seuspróprios equipamentos de saúde.

Os serviços são contratados, na sua maio-ria, na modalidade pagamento por proce-dimento (fee for service), na qual todos osprocedimentos são pagos, item a item,segundo tabelas previamente acordadas.Nas empresas tomadoras deste tipo debenefício para a assistência aos seus cola-boradores, usualmente, o financiamentopraticado é o segurado ou pré-pagamen-to e, em alguns casos, pouco freqüentes,opera-se o regime de custo operacional,acrescido da taxa administrativa. Utiliza-se o direcionamento da assistência paraseus serviços próprios, em busca de me-

Álvaro Escrivão Junior,Professor da FGV- EAESP e Coordenador Adjunto do GVsaúde

Djair Picchiai,Professor da FGV-EAESP e Consultor do GVsaúde

Desafios para as empresas contratantes epara as operadoras de planos de saúde

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nores custos e maior controle, sendo alivre escolha do usuário dirigida para a redede médicos cooperados. A prática doreembolso é pouco utilizada.

Como desvantagem para a empresa con-tratante, pode-se apontar a dificuldadepara controlar a utilização, uma vez que,freqüentemente, ela não possui acesso aosíndices referentes a essa variável. Destaforma, a sinistralidade pode ser a respon-sável por reajustes não previstos nos pla-nos. Outros problemas usuais dessa alter-nativa são o alto preço para cobertura dosaposentados, a perda da identidade coma rede assistencial e as dificuldades naflexibilização dos atendimentos. Porém,essas desvantagens estão presentes tam-bém na maioria das operadoras de planosde distintas modalidades.

As empresas de Medicina de Grupo, ou-tro modelo de agente financiador, operampor meio do sistema de pré-pagamento.Sua principal característica é ser um siste-ma de atendimento médico-hospitalardirecionado para hospitais, médicos e ser-viços auxiliares de diagnóstico próprios. Emalguns casos, permite atendimentos narede credenciada. As vantagens para acontratante são o preço baixo e fixo. Asdesvantagens encontram-se na limitaçãoda rede em algumas regiões, comdirecionamento do atendimento e regraspouco flexíveis, o que gera insatisfação dosusuários. Em geral, os aposentados nãoparticipam do plano empresarial. De fato,os aposentados e agregados têm se tor-nado um enorme desafio para o setor desaúde suplementar, verificando-se umagrande resistência por parte das operado-ras em assumir esses beneficiários.

Nas Seguradoras de Saúde, que recebe-ram em 2002 a denominação de "empre-sas especializadas em saúde", o financia-mento se dá na forma de pré-pagamentoe o valor pré-pago tem relação direta comas exigências de rede referenciada e comos níveis de reembolsos desejados. Nãopossuem serviços próprios, trabalhandocom rede assistencial referenciada. As se-guradoras e grandes empresas contratan-tes estão estimulando seus beneficiários a

utilizarem os serviços da rede referenciadacomo forma de redução dos seus custos.As vantagens dessa modalidade para ousuário incluem menor burocracia paraobtenção de senhas para a maioria dosprocedimentos e exames e, para a patro-cinadora, a possibilidade de contar comalguma flexibilização na modelagem darede referenciada. Essa maior facilidadede utilização gera, por outro lado, umamaior sinistralidade das seguradas em re-lação às outras modalidades.

Na modalidade Autogestão, os sistemasde saúde são administrados diretamentepela instituição patrocinadora ou por umainstituição assistencial ou previdenciária,diretamente vinculada à primeira, e desti-na-se exclusivamente a empregados ativos,aposentados, pensionistas e ex-emprega-dos, bem como seus respectivos gruposfamiliares, segundo critérios definidos elimitados. As empresas administram, semfins lucrativos, seus próprios programasde saúde, gerenciando a participação fi-nanceira do funcionário no plano, a im-plantação e o controle da redeassistencial, o controle da qualidade dosserviços proporcionados pelos diversosprestadores de serv iços médico-assitenciais, entre eles: hospitais, clíni-cas, consultórios e serviços de apoio di-agnóst ico e terapêutico, e ogerenciamento da utilização dos recur-sos por parte dos usuários.

O desenho do programa assistencial é fei-to a partir das necessidades dos usuáriose da própria patrocinadora e as condiçõesdefinidas pela empresa são negociadascom seus funcionários. Os planosassistenciais podem estar estruturados dedistintas formas: produção própria de ser-viços; contratação de serviços, na qual aorganização credencia diretamente osprestadores; e reembolso segundo valores,ou seus múltiplos, da tabela de referênciaadotada. É um sistema do tipo contri-butório, pois o usuário participa no cus-teio do plano. As empresas, em geral, ado-tam a cobrança de um fator moderador,ou seja, o usuário paga um percentualsobre consultas e procedimentos mais sim-ples. Isto representa mais uma medida para

contenção de custos do sistema do queuma fonte de financiamento, além de tero lado do caráter participativo, por en-volver o beneficiário no aperfeiçoamen-to do plano.

A característica mais marcante destaforma de estruturação é o envolvimentodireto da empresa em todo o processo deelaboração e administração do sistema desaúde para os funcionários. As vantagenspara o usuário são a participação na ela-boração do plano de benefícios e naestruturação da rede assistencial, assimcomo na avaliação e controle de quali-dade dos serviços contratados; e a me-nor burocracia para o acesso aos diver-sos níveis de atenção. Para apatrocinadora, as vantagens incluem ogerenciamento de informações no con-trole e uso dos serviços oferecidos pelarede credenciada e o fato de não apre-sentar uma composição de custos onera-da por despesas, como comissões de cor-retagem, propaganda ou até mesmomargens de lucro, o que possibilita me-nores despesas com o benefício saúde.

Nessa modalidade, contudo, o usuáriopoderá ter de aumentar sua contribuiçãopara os gastos de custeio do plano, caso aadministração do mesmo não consigamantê-los dentro da margem operacionalutilizada para os cálculos atuariais, oumesmo quando houver eventos extraordi-nários e de alto custo, elevando significa-tivamente as despesas. As desvantagenspara a operadora são a necessidade demanter equipe e estrutura próprias parasua administração, auxiliadas por tercei-ros em alguns segmentos; e os aumentossucessivos das despesas, caso ogerenciamento não contemple o controleda utilização.

Além dessas modalidades mais freqüentes,ainda existem os Planos Administrados,cujas características principais são o finan-ciamento auto-segurado e a ocorrênciados custos em função do nível de utiliza-ção de serviços. Esta modalidade possibi-lita a participação da organização patro-cinadora na elaboração do benefício, quepode ser estruturado segundo suas neces-

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 15

Estamos diante de desafios, como, porexemplo, os processos de acreditação paraos hospitais e serviços de saúde. Por isso, énecessário apoiar Programas de Qualifica-ção e Acreditação, como os que vêm sendoimplantados na saúde suplementar - volta-dos tanto para as operadoras, quanto paraos prestadores - visando à melhoria dos ser-viços e dos atendimentos oferecidos.

São outros exemplos de desafios a fim dese obter melhores resultados: estabeleci-mento de protocolos clínicos; padroniza-ção de materiais e medicamentos; avalia-ção criteriosa da utilização de órteses epróteses; otimização de processos admi-nistrativos; compras compartilhadas e in-vestimentos em tecnologia da informação.

Hoje, o setor encontra-se ainda atreladoao Código de Proteção e Defesa do Con-sumidor (CDC). Porém, o produto em ques-tão é a saúde do ser humano, a sua pró-pria vida, por isso a necessidade de maisempenho na criação de um Código Nacio-nal de Saúde devidamente respaldado peloNovo Código Civil, a fim de estabelecerdiretrizes, parâmetros e responsabilidadescivis para este setor.

Dentro deste escopo, entende-se que aavaliação da qualidade de um serviço desaúde envolve legislação e processos deregulação específicos e, principalmente,o conhecimento sobre a natureza e as ca-racterísticas do produto avaliado. Nestesentido, o processo de investigação deveresponder às seguintes perguntas: serápossível elaborar um diagnóstico impar-cial da qualidade do serviço de saúde queestá sendo prestado ao usuário da aten-ção médica, diante da multiplicidade deinteresses que envolvem a prestação desteserviço? Será possível aplicar, nos servi-ços de saúde, as técnicas utilizadas naimplementação dos processos demelhoria da qualidade nas demais indús-trias de serviços?

O processo para a coleta de informaçõesprévias sobre a qualidade dos profissionaise serviços, dentro do sistema de saúde, édelicado e difícil para os usuários. Isto im-

plica em nem sempre ser possível saberse, além de adequados, esses serviçosajustam-se às suas necessidades. É impor-tante ressaltar que, na área da saúde, sórecentemente a literatura tem devotadomais atenção ao tema relacionado à ava-liação da qualidade da atenção médica esua organização, em decorrência da com-plexidade crescente da demanda, do pro-cesso de regulação do mercado e do au-mento crescente das legislaçõesconcernentes aos direitos do consumidor.

Sendo assim, organizações responsáveispela prestação de atenção à saúde vêmdesenvolvendo, ao longo de suas existên-cias, projetos de melhoria da qualidade.Ainda que estejam crescendo as experi-ências de implantação de processos demelhoria contínua no âmbito dos servi-ços de saúde, poucos são os resultadosconcretamente sistematizados e publica-dos sobre o assunto.

Nos últimos anos, as organizações de saú-de têm despertado maior atenção paraaspectos e oportunidades de economiaresultantes de melhores processos na ges-tão do trabalho. Essas buscas representamo desafio para o declínio do alto custo dosserviços de saúde e incremento da suaqualidade. Têm como objetivo compreen-der as melhores práticas de gerência e osmecanismos de desenvolvimento de umacultura organizacional, de modo que dêemconta das necessidades e expectativas dosseus atores e, principalmente, do consu-midor final dos serviços de saúde. A ava-liação da qualidade dos serviços de saúdevem se intensificando e gerandoquestionamentos, modificações e transfor-mações importantes nas organizações desaúde, basicamente por fatos relacionadosaos seus custos. Não há mais como igno-rar o confronto que existe entre os aspec-tos éticos, técnicos, econômicos e sociaisda prestação de um serviço de saúde, di-ante dos avanços tecnológicos e da cultu-ra médica.

Por que isto? Eles constituem parte do sis-tema no qual são realizados processos detrabalho que estão definidos como uma

cadeia de fornecedores e clientes; existeum conjunto formado pela união de tare-fas de forma ordenada, planejada,objetivando atingir metas estabelecidas; eo produto de uma "estação de trabalho"serve de insumo para a seguinte, e assimsucessivamente.

Na década de 90, com a criação do Pro-grama Brasileiro da Qualidade e Produtivi-dade (PBQP), todos os setores de produ-ção de bens e serviços, governamentais ounão, são convocados a desenvolver proje-tos na área da qualidade. O setor saúde,representado pelo Ministério da Saúde naépoca, decidiu desenvolver a metodologiade acreditação, que é a estratégia de im-plantação de métodos de gestão e quali-dade para serviços de saúde.

Considerando a necessidade de definirparâmetros de qualificação do atendi-mento humanizado para a populaçãobrasileira, respeitando as diversidades cul-turais, ambientais e locais, a FGV Proje-tos está sempre à frente, monitorando osuporte técnico e educacional no setorda Saúde.

Como realizar estas mudanças?Estamos freqüente e intensivamente nosperguntando e agindo em cada sala deaula e em cada estado deste País para ondelevamos a aprendizagem da Gestão. Sem-pre crendo que a humanização, enquantopolítica de saúde, se constrói com as dire-ções da inseparabilidade entre atenção egestão.

Tais direções indicam o "como fazer" destapolítica que se concretiza como"tecnologias relacionais". É a partir da trans-formação dos modos como os sujeitos egrupos se relacionam que as práticas po-dem ser efetivamente alteradas. Enfim, ficaevidente que a maior preocupação dogestor em administração de serviços deveser a preparação do atendimento e a per-feita execução das promessas prévias fei-tas por este serviço.

A avaliação posterior servirá apenas comouma fotografia do atendimento.

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sidades e conveniências. A administraçãodo benefício fica a cargo de uma terceiraempresa, com fins lucrativos, sem nenhumvínculo com o setor de atividade econô-mica da primeira.

DESAFIOS

As operadoras de planos de saúde con-vivem com aumentos de custos, em ge-ral superiores aos índices adotados paramedidas da inflação no País. Em algunscasos, maiores também quando compa-rados aos índices específicos da área. Asquestões estratégicas postas aosgestores incluem o conhecimento daestrutura organizacional ideal das ope-radoras, do perfil dos recursos humanos- qualificação e quantidade -, dos pro-cessos críticos de sucesso, dos fluxos derelacionamento com os demaisstakeholders do setor e dos indicadoresestratégicos de gestão de desempenhoinstitucional. As respostas a estas ques-tões del ineiam o caminho dessesgestores na busca de maiorcompetitividade das organizações, comotambém no cumprimento do seu papelsocial no setor e na sociedade.

O grande contingente de instituiçõesprestadoras, com inúmeros profissionaisde variadas especialidades, exige dasoperadoras o controle, avaliação e su-pervisão das organizações que atendemaos seus beneficiários, o que implica en-contrar as melhores alternativas paragerenciar prestadores à distância, con-trolar a efetiva prestação de serviços e aqualidade dos mesmos, negociar seuspreços e verificar seus custos, definir ascompetências essenciais das operadorase o papel das mesmas em termos de ser-viços prestados. (Figura1)

No gerenciamento da rede credenciada,as operadoras buscam vencer os desafi-os para a conformação de uma rede efi-caz tanto na prestação de serviços, pro-priamente dita, ( local, distância, oprofissional ou o serviço), quanto naqualidade (indicadores assistenciais, im-pacto tecnológico, indicadores de pro-cesso e de satisfação de usuários) e

quantidade (densidade, concentração daclientela, distribuição geográfica dosserviços, multiplicidade, seletividade, vo-lume e preço). Nesse cenário, torna-seimprescindível que a gestão das opera-doras seja exercida por profissionais comsólida formação em administração emsaúde e competência para utilizar inten-samente a Tecnologia de Informação eadotar formas de gestão inovadoras. Defato, essa necessidade de profissiona-lização envolve todo o capital humanodo setor e implica na formação e atuali-zação daqueles que ocupam cargosgerenciais nos mais variados níveis hie-rárquicos das organizações envolvidas.

Alguns dos fundamentos presentes nodia a dia das operadoras são as técnicasde gestão corporativa, de processos crí-ticos organizacionais, de banco de da-dos, de r iscos e de desempenhoinst itucional, englobando aindacontroladoria organizacional e relacio-namento com o cliente (callcenter). Osgerentes têm que conhecer, vivenciar e apli-car essas técnicas, que são a materializaçãoda profissionalização. É importante reiterara importância do fator inovação. A inova-ção pode se materializar por meio de um

espaço de tempo e recursos (para os pro-fissionais), ou da criação de uma comuni-dade de prática ou mesmo de um labora-tório de inovação.

A regulação das relações do setor, reali-zada pelo Ministério da Saúde, especi-almente por meio de suas agências ANSe ANVISA, pelos Ministérios da Educa-ção, Planejamento e Fazenda e aindapelas Secretarias Estaduais e Municipaisda Saúde, geram efeitos importantes ediversificados, por vezes negativos nasdist intas v isões dos pr incipaisstakeholders. Os dirigentes das opera-doras têm que ter conhecimento e umaparticipação ativa junto a esta cadeiaprodutiva, como forma de melhorar aefetividade de suas instituições.

A cadeia produtiva do setor tem busca-do aperfeiçoamentos no relacionamen-to institucional, maior integração emelhoria do valor agregado. Mas care-ce ainda de um número maior de indi-cadores e parâmetros de produção, pro-dutividade, qualidade e custos destacadeia e das operadoras para uma me-lhor avaliação da evolução do setor. Oscustos crescentes da assistência médico-

Estado: papel regulamentador e julgadorMédicos: players importantesEmpresas contratantes dos planos: financiadorasCidadãos/Clientes: financiadores e usuáriosIndústrias Farmacêuticas e de Equipamentos: fornecedoras de insumosEntidades de Defesa do Consumidor: orientação sobre direitos e deveres

Figura 1 - Cadeia Produtiva do Setor de Saúde Suplementar

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 200714

Arevisão dos processos administrati-vos do setor de serviços de saúdetem representado um desafio para

os profissionais e tem sido objeto de es-tudo para as organizações educacionais.Neste processo, torna-se fundamental odesenvolvimento de técnicas gerenciaise de estruturas organizacionais apropri-adas para o alcance dos objetivos e parao enfrentamento das mudanças acelera-das e do aumento de complexidade in-terna. Neste sentido, é importante res-saltar a necessidade de haver ambientede trabalho flexível e capacidade das or-ganizações de atrair e reter profissionaiscada vez mais competentes.

Assim vem se posicionando a FGV ao lon-go destes últimos anos, com programasgerenciais cada dia mais inovativos.

Na Saúde, tentamos relacionar a inser-ção da densa competência estratégicaem todos os "atores" dos setores públi-co e privado, para facilitar o acesso fran-co, com a captura de oportunidades eneutralização de ameaças (estrito e lato

senso).

É dentro dessa linha de exposição quetecemos considerações sobre a gestão,dando ênfase às ações preventivas. Poroutro lado, alinhamos uma série de ob-servações relativas ao processo estraté-gico, balizando os principais aspectos aserem considerados nesse universo tãoespecial e sensível para a sociedade: saú-de e competência estratégica.

O trabalho dos nossos programas econsultorias para essa área resulta naformação de profissionais especializadosna gestão de serviços de saúde. Isto é fun-damental para dotar líderes e executivosdas ferramentas essenciais, bem como ga-rantir a sobrevivência e o crescimento dehospitais, clínicas, laboratórios e demaisserviços de saúde.

Os serviços de saúde fazem parte de umsistema para o qual confluem o individu-al, o coletivo, o biológico, o social, o quan-titativo e o qualitativo. Além destes com-ponentes, existem questões relacionadasa: cobertura, custos, acesso, universalida-de, complexidade, consumo, indicadores,satisfação do usuário e outros. Portanto,ao se avaliar a qualidade desses serviços,são abordados inúmeros aspectos e con-ceitos que se inter-relacionam. É importan-te, também, conhecer os objetivos e pro-cessos de trabalho das instituições quecompõem o sistema de saúde, de forma aconjugar ações que possam melhorar aqualidade do serviço e dos seus profissio-nais, permitindo, assim, buscar permanen-temente a satisfação de todos os envolvi-dos e, em especial, do paciente, usuáriofinal do sistema.

A área da saúde em geral demanda pesa-dos investimentos em recursos humanose tecnologia de ponta. A atualização dosprofissionais, dos equipamentos e técni-cas aplicados deve ser permanente e, por-tanto, requer a destinação de investimen-tos elevados.

O financiamento da saúde no Brasil estámuito aquém das suas reais necessidades.

Nós, gestores de Saúde, temos responsa-bilidade sobre um total de 99.007 entida-des privadas; 52.186 municipais; 2.204 es-taduais e 220 federais, de acordo comdados do Cadastro Nacional de Estabele-cimentos de Saúde (CNES). Ou seja, dis-pomos de um total de 54.610 entidadesde serviços públicos de saúde no Brasilfrente a 99.007 privadas, totalizando153.617 no País.

Temos problemas de gestão e de insufi-ciência de verbas. As tabelas de remune-ração do Sistema Único de Saúde (SUS)estão altamente defasadas. A este cená-rio, somam-se pessoas desacreditadas noSUS, resultando em franca migração parao setor suplementar.

No entanto, não se trata de um trabalhocom base em tabelas de custos. É precisoconstruir políticas públicas na máquinado Estado, como um labor de conexãoentre as forças do coletivo e nos movi-mentos sociais, com a integração das prá-ticas gerenciadas no cotidiano dos servi-ços de saúde.

Na força de trabalho e no desenvolvimen-to e manutenção de programas de treina-mento constantes com as equipesmultidisciplinares, encontra-se a motiva-ção para requerer mudanças no sentidode enfrentar os desafios de novos mode-los e sistemas gerenciais.

GESTÃO

Não existe nada mais difícil de conduzir, nem nada mais incerto eperigoso do que iniciar uma nova ordem das coisas.

Maquiavel

Tania Furtado,consultora da FGV Projetos e Coordenadora Acadêmica do MBA Executivo de Saúde - FGV Management.

O Gerenciamento da Saúde-Brasileira

19

hospitalar e a necessidade da manuten-ção dos padrões de qualidade mínimosde assistência tornam a tarefa ainda maisdesafiadora.

O setor necessita cada vez mais de in-formação e conectividade. As empresasque melhor se integrarem no setor sãoas que obterão as maiores vantagenscompetitivas. As pessoas e as tecnologiasde informação e comunicação são os ele-mentos-chave da gestão das operado-ras. As especialidades e os campos deconhecimento a serem gerenciados, têmnos talentos humanos e no uso inteli-gente da TI um fator fundamental noaumento da competitividade (reduçãode custos, aumento de produtividade emelhoria de qualidade) e sustenta-bilidade das operadoras e de seus pla-nos de saúde. Uma nova propostatecnológica, principalmente com osavanços da Internet, sinaliza um novo

padrão de comunicação de dados, voze imagem em um mundo integrado porredes interconectadas que trazem, porum lado, vantagens como a simplifica-ção de processos de autorização e audi-toria, e por outro, desafios como o dagarantia da pr ivacidade econfidencialidade dos dados. A infra-es-trutura das operadoras deve estar pre-parada para essa nova situação.

TENDÊNCIAS

A verticalização do processo produtivodos serviços, ou seja, operadoras quemantêm hospitais próprios para a pres-tação de serviços, sinaliza a intenção porparte dessas operadoras de possuirknow-how relativo à prestação dos ser-viços e de controlar os custos.

A internacionalização do setor, apesardos riscos da atividade, o tamanho e onúmero das instituições participantes, e

o volume de recursos envolvidos com aconcentração dos mercados acabamatraindo o capital globalizado pelo re-torno que os investimentos podem tra-zer. Esse é um setor com alta tecnologia,profissionais especializados, grande vo-lume de recursos e uma demanda signi-ficativa, características essas atrativaspara o capital que se pretende reprodu-zir. No entanto, as experiências deinternacionalização nesse setor carecemde análise mais cuidadosa para se con-firmar e conhecer melhor as caracterís-ticas dessa tendência.

Como se vê, são muitos os desafios paraas operadoras, empresas contratantes eprestadores de serviços do Setor de Saú-de Suplementar brasileiro. Para vencê-los,fica clara a necessidade de adaptação dosetor ao cenário atual acima esboçado, oque exigirá por parte dessas organizaçõessoluções criativas e inovadoras.

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 13

funcione em rede, que haja eletricida-de, ou que sua utilização tenha algumsignificado real. Há quem diga que,até o momento, não existem progra-mas informatizados adequados paracobrir toda a necessidade da gestão eda assistência médico-hospitalar.

7. Qualidade: começam cada vez mais aser disseminados programas de quali-dade e de avaliação externa em servi-ços públicos de saúde, seja para eviden-ciar qualidade de cuidados por meio deum certificado externo, para se prote-ger de críticas, para tranqüilizar a cli-entela, ou ainda para motivar os fun-cionários. Mesmo assim, há diretoresque consideram esta aplicação carac-terística de serviços privados, que ne-cessitam disputar mercado e que têm,alegadamente, mais recursos, conside-rando um desperdício de esforçosaplicá-los no setor público. Como háevidências de que este tipo de iniciativareduz riscos e, a rigor, otimiza a ativi-dade administrativa, este tipo de atitu-de merece ser discutido publicamente.

8. Logística: no setor público, no qualseria fundamental a eficiência e aotimização dos processos, há relativa-mente pouca preocupação com o as-sunto, tanto na área de suprimentosquanto na de fluxos internos, obser-vando-se re-trabalho, duplicação deatividades, cruzamentos desnecessá-rios, impressos desatualizados, entreoutros. Freqüentemente, as instalaçõessão antigas e mesmo mecanismos maismodernos de licitação não garantemque aquilo de que se necessita estejano lugar adequado no momento pre-ciso. O mesmo ocorre com o arma-zenamento de insumos, que acabammenos controlados do que seria ocaso, levando ao vencimento de me-dicamentos de alto custo ou à dete-rioração de outros materiais.

9. Gestão financeira e orçamento: par-tindo da premissa de que os recursospara a saúde são insuficientes, este as-pecto deveria ser privilegiado neste se-tor, mas na verdade os problemas vêm

de duas ordens. Por um lado, apesarde a Emenda Constitucional 29, de13/09/2000, vincular gastos com açõese serviços de saúde, definindopercentuais mínimos de gastos anuaispor esfera de governo (a União deveriagastar 10% das Receitas Correntes Bru-tas, os estados deveriam gastar 12% daReceita de Impostos e Transferências eos municípios deveriam gastar 15% daReceita de Impostos e Transferências).Não necessariamente estas determina-ções são cumpridas, entre outros moti-vos porque ainda há controvérsiasquanto aos conceitos de "ações e servi-ços de saúde". Por outro lado, a elabo-ração de orçamentos na área da saú-de, não apenas no setor público, aindacostuma ser desvinculada das ativida-des a serem desenvolvidas,enfatizando mais os itens formais queo relacionamento entre o recurso e oseu destino. Finalmente, cortes no or-çamento da saúde não são incomuns.

10. Recursos humanos: tema dos mais re-correntes na área, e sempre a maior des-culpa pelas eventuais falhas do sistema.Nessa dimensão, a lista de dificuldadesé longa e tende a englobar todos osaspectos da gestão de recursos huma-nos. Assim, fala-se de falta de motiva-ção e aponta-se para novos planos decargos, carreiras e salários. Sugerem-sesoluções cosméticas, como mudar a de-nominação da área para gestão de pes-soas ou gestão de talentos, sem ofere-cer opções substantivas de mudança.Discute-se a conveniência de manter oconcurso público, ao mesmo tempo emque se propõe um plano único para oSUS por todo o País.

Não há respostas prontas para essas ques-tões. Tampouco aquelas implantadas numalocalidade no País servem para o Brasiltodo. Não existe o hábito de se avaliar assoluções implantadas. Um exemplo de so-lução paliativa na área de gestão de recur-sos humanos tem sido a adoção do regi-me de plantão, alegadamente paracompensar os baixos salários. Tanto na áreaadministrativa quanto na área assistencial,esse modelo tem sido largamente empre-

gado, sob a alegação da necessidade de setrabalhar em turnos que permitam o segun-do (e às vezes o terceiro) emprego. No en-tanto, essa prática traz a grande desvanta-gem de quebrar a continuidade no trabalho.

Na área assistencial, o plantão se justificatecnicamente em unidades como pronto-socorro e terapia intensiva para algumas ca-tegorias profissionais. No que tange a paci-entes internados e a áreas administrativas ede apoio, não há como considerar que plan-tonistas sejam mais eficazes que diaristas.Apesar disso, esse tema não tem sido pas-sível de discussão no setor público.

Vale ressaltar que temas como quadro depessoal, aumento salarial, figuras jurídicas,orçamentos e estruturas organizacionaisnão são assuntos exclusivamente técnicose de responsabilidade dos poderes executi-vos. Cada modificação efetuada dependedo poder legislativo, com trâmites mais lon-gos e questionamentos mais abrangentes.Por exemplo, a terceirização tende a ser dis-cutida em relação à quantidade de pessoasque se pode contratar conforme o limiteda parcela orçamentária atribuída a pes-soal. Quando a discussão a respeito do as-sunto teve início, dizia-se que qualquer or-ganização somente deveria terceirizar suasatividades-meio, jamais as atividades-fim.No entanto, empresas ou cooperativas deprofissionais de saúde, como médicos ouenfermeiros, já vêm sendo contratadas deforma rotineira, às vezes por serem os úni-cos mecanismos aceitos pelos profissionaispara trabalharem nos serviços, às vezes por-que são um subterfúgio para a contrataçãoou para caberem na legislação de propor-ção de orçamento que pode ser alocada aoitem recursos humanos.

Algumas mudanças potencialmente es-truturais acabam sendo aceitas ou recu-sadas em função de questões ideológi-cas, e não de análises de eficácia. Acapacitação gerencial pode ser um cami-nho para solucionar a equação, mas cer-tamente não é garantia de sucesso. Háquestões técnicas, sem dúvida, mas con-siderar o aspecto político é fundamental.Ter um projeto a seguir, conhecer ou de-finir diretrizes claras para a assistênciadigna à saúde faz a diferença.

20

Tecnologia pode ser definida comoum conjunto de conhecimentos sis-tematizados e aplicados em um de-

terminado ramo de atividade, com o pro-pósito de gerar produtos ou serviços.Quando o campo de aplicação é a saúde,o conceito é muito abrangente e pode fa-zer referência tanto a uma técnica cirúrgi-ca quanto a um equipamento diagnósti-co, passando por diferentes insumos comovacinas, medicamentos, materiais médicos,entre outros.

Tem sido crescente o progresso datecnologia na área da saúde. É, portanto,útil analisar esta evolução sempre sob doisângulos:� Favorável, uma vez que sua utilização

tem como objetivo maior incrementodas condições de saúde e de qualida-de de vida, do ponto de vista indivi-dual e coletivo;

� Desfavorável, quando sua aplicaçãoé feita de modo indiscriminado, visan-do atender a interesses econômicos deforma dissociada da ética.

A difusão e adoção de tecnologias estãodiretamente relacionadas à:� Legislação sanitária, definindo regras

de registro de produtos (artigos mé-dico-hospitalares, equipamentos mé-dicos) no Ministério da Saúde, a partirdas quais se torna viável o processode comercialização no Brasil;

� Situação de mercado, ou seja, sufi-ciência (ou não) da oferta de bens eserviços; oportunidades de mercado

interno ou externo; dependência detecnologia do exterior;

� Capacidade e disposição pública ouprivada de alocar investimentos noprocesso de desenvolvimentotecnológico, percorrendo distintasetapas que vão desde incentivos fis-cais, financiamento, proteção de mer-cado até, e principalmente, a forma-ção de recursos humanos qualificadospara esta finalidade;

� Evolução do modelo assistencial, adesospitalização, o incremento de ati-vidades realizadas no âmbito do am-bulatório ou na própria residência doindivíduo, com a expansão de servi-ços de assistência domiciliar.

Detalhando um pouco mais este últimoaspecto, vale citar como exemplo a possi-bilidade atual de se tratar, ambulato-rialmente, um coronariopata por meio dautilização de um stent, ou um pacientecom aneurisma cerebral, por meio de téc-nicas e materiais aplicados por um neuro-radiologista. Há ainda, neste contexto, odestaque que deve ser dado à digitalizaçãode imagens e ao incremento do sistemade informações hospitalares, permitindoinovações no diagnóstico remoto e nas ati-vidades de telemedicina e telerradiologia.

O desenvolvimento e o uso das tecnologiasmédicas durante as últimas décadas têmcrescido rapidamente. É inegável que ino-vações tecnológicas contribuíram para aqueda, em todo o mundo, das taxas demortalidade e morbidade. Porém, mesmo

que estas novas tecnologias tenham pro-duzido mudanças no estado de saúde demuitas populações, é importante reconhe-cer que muitas dessas mudanças têm umcusto muito elevado em relação aos bene-fícios produzidos. Neste sentido, o planeja-mento é indispensável para que os benefí-cios introduzidos por estas tecnologiassejam totalmente aproveitados.

Diante de tanta evolução, da variedade deequipamentos produzidos por distintos fa-bricantes com diferentes funções, da rapi-dez com que a tecnologia atinge a obso-lescência, da dimensão dos investimentosfeitos nestas aquisições, surge a questão arespeito de como uma instituição de saúdedeve se organizar para evitar as freqüentesexperiências a que se assiste, como a deefetuar uma compra de algo que efetiva-mente não se necessita ou cuja manuten-ção não se consegue viabilizar.

O planejamento da tomada de decisão(adquirir ou não um equipamento mé-dico, por exemplo) deveria envolver umgrande contingente de profissionais quecontemple a direção do serviço (é técni-ca e politicamente viável a aquisição?),os usuários (o equipamento é de fácilutilização? É prioridade, no momento?)e a administração (há recursos para in-vestimento nesta operação?).

Falta, neste rol de integrantes do processode decisão, um profissional essencial: oengenheiro clínico. A importância de suaparticipação permeia a aquisição nos mo-

Antonio Jose Rodrigues Pereira,Gerente de Engenharia Clínica do Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicasda Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Inrad/HCFMUSP)

Lucila Pedroso da Cruz,Diretora Executiva do Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdadede Medicina da Universidade de São Paulo (Inrad/HCFMUSP)e Conselheira do GVsaúde.

TECNOLOGIA

Incorporação Tecnológica na Área de Saúde

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 200712

Por sua Constituição, o Brasil possuium sistema de saúde de acesso uni-versal, ou seja, tem o dever de garan-

tir saúde a todos os seus cidadãos. Essa pro-posição tem um sentido mais amplo do quea visão corrente do simples acesso à assis-tência médica ambulatorial e hospitalar.

A concepção dos serviços de saúde comode interesse público traz implicações im-portantes na construção do Sistema Úni-co de Saúde (SUS), que não deve ser vistoe tratado unicamente como sistema únicopúblico e não abrangendo o setor priva-do. Ao se analisar o SUS no âmbito estritodo setor público, ou seja, como proprie-dade do Estado e quase sempre gerido porele, visualiza-se basicamente o Ministérioda Saúde, seus órgãos subordinados, bemcomo as Secretarias Estaduais e Munici-pais de saúde. Nessas instâncias estão ser-viços de saúde (como unidades básicas,pronto-socorros, hospitais e laboratórios),além de unidades de vigilância sanitária eepidemiológica. Há ainda serviços de saú-de pertencentes e financiados pelo setorpúblico, mas geridos por atores privados,freqüentemente denominados parceirosou contratados. É o caso de alguns hospi-tais geridos mediante contratos de gestão(como as Organizações Sociais no âmbitoda Secretaria de Estado da Saúde de SãoPaulo), de Programas de Saúde da Família(no qual o modelo de parcerias está con-sagrado no município de São Paulo desdeseu retorno ao SUS no ano 2000) e outrastentativas verificáveis pelo Brasil, algumasmelhor sucedidas que outras. Resta umadiscussão a respeito de onde colocar asagências, mais especificamente a ANVISA(Agência Nacional de Vigilância Sanitária)e a ANS (Agência Nacional de Saúde Su-plementar), que são serviços públicos,

porém gerenciados com elevado grau deautonomia.

Não se questiona a escassez de dinheiropara a saúde. No entanto, a solução de pro-blemas da gestão pública em saúde no Paísdeve ser vista além da busca de novos re-cursos: os recursos já existentes precisamser mais bem aproveitados. Nesse sentido,valem os esforços para melhorar a gestãodo setor e não somente cumprir os ditamesda lei. Nenhuma solução estrutural serábem-sucedida sem recursos e capacidadede gestão. Há alguns temas que aparente-mente preocupam ou deveriam preocuparos gestores públicos pelo país, dentre osquais merecem menção:

1. Desenho organizacional e configu-ração jurídica: opções legais possíveis,como: autarquia especial, fundação,parcerias público-privadas, organiza-ções sociais, etc. Embora se busque,constantemente, mais propostas parasolucionar algumas das ineficiênciasencontradas nas já existentes, há quese desmistificar o poder dos modelosna solução dos problemas. Eles não seimplementam sozinhos, dependem decapacidade de gestão.

2. Otimização de recursos ou aumen-to da eficiência administrativa: de-mandas constantes das SecretariasEstaduais e Municipais de saúde. Co-meça a ser verificado no País um fe-nômeno novo, o da disponibilidadede recursos financeiros, tendo em vis-ta a aplicação da emenda 29. Alémdisso, tendo em vista a diretriz da uni-versalidade de acesso, costuma-sediscutir se é possível associar eficiên-cia e eficácia.

3. Planejamento estratégico: desenvol-vimento de novas possibilidades paraos sistemas e serviços de saúde, temade crescente atenção e relevância nosúltimos anos, embora seja praxe a re-alização de um novo processo a cadamudança de gestão, o que retira ocaráter de médio e longo prazo dosplanejamentos.

4. Redistribuição de atribuições e pa-péis de Estados e Municípios: discus-são acentuada desde a definição daConstituição de 1988, e retomada pelaLei Orgânica da Saúde, pelas NormasOperacionais Básicas e pelas NormasOperacionais de Assistência Básica. Adiscussão se prolonga e esses novospapéis ainda não foram totalmenteassumidos, concorrendo para a não-viabilização de muitas propostas deplanejamento e reforma do setor.

5. Descentralização: a partir da assunçãode novas atribuições, por parte das di-ferentes instâncias de governo e dasubstituição de diversas tarefas. Pensare repensar, antes de planejar ou deredesenhar as estruturas, faz sentido,permitindo optar pelo que deve ou nãoser delegado de maneira mais consci-ente. A partir daí, as capacitações dostécnicos e dos gestores podem ser fei-tas de forma mais dirigida.

6. Modernização: termo muito aplicadoe tentador num setor considerado con-servador. Com freqüência, associa-semodernização à informatização, ouaté à disponibilidade de computado-res. Por outro lado, a presença do equi-pamento não significa que ele seja usa-do de maneira adequada, que

SETOR PÚBLICO

Ana Maria Malik,Professora da FGV-EAESP, coordenadora do GVsaúde

Gestão Pública em SaúdePaulo Roberto Motta,Professor da FGV-EBAPE, consultor da FGVProjetos

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mentos pré, durante e pós. Aqueles queestudam tendências na área da saúde játêm divulgado que a Engenharia Clínica,atualmente de grande valia nogerenciamento de artigos e equipamen-tos médicos em serviços de saúde, empoucos anos deixará de ser uma atividadede apoio para atuar junto ao paciente,contribuindo para a melhor compreensãodo processo assistencial.

Fica claro, portanto, que a aquisição de-pende de um conjunto de pessoas e deinformações de qualidade, a respeito doque se pretende comprar (ou alugar, oufazer leasing). Existem agências de pesqui-sa em saúde que centralizam informaçõesrelacionadas à tecnologia da saúde (des-crições, avaliações, problemas encontradosem equipamentos médicos) e à promoçãode conceitos de segurança para seu usomais eficiente e eficaz. A maior organiza-ção mundial dedicada a esta finalidadechama-se ECRI (Emergency Care ResearchInstitute). Trata-se de um centro, sem finslucrativos, colaborador da OrganizaçãoPanamericana de Saúde.

As etapas a serem percorridas para seatingir uma boa escolha de equipamen-tos são:� Planejamento;� Aquisição;� Gerência de Equipamentos.

1. PLANEJAMENTOTem como objetivo principal distribuir osrecursos, finitos, para desejos quase sem-pre infinitos, ou seja, requer análises comparâmetros tangíveis, para uma tomadade decisão com a menor probabilidade deerro, lembrando de parâmetros que algu-mas vezes não são levados em conta, taiscomo: necessidades de instalação,insumos, custos de manutenção, treina-mento para a nova tecnologia.

A análise deve ser feita globalmente, poispode ocorrer da tecnologia definida apre-sentar um custo proibitivo para os recur-sos existentes, e que o serviço seja obriga-do a optar por uma alternativa maisacessível financeiramente. Para ilustrar

essa situação, pode-se mencionar a aqui-sição de um mamógrafo. O rastreamentomamográfico em mulheresassintomáticas ainda é o único métodoeficaz para a detecção precoce de lesõesclínicas ocultas, demonstrando vantagens

por sua vez, mede as conseqüências po-sitivas não em termos monetários, masem uma outra unidade, tal como anosde vida poupados, dias de morbidadeou mortalidade evitadas, entre outras.Permite, portanto, a comparação de cus-

Quadro 1: Comparativo das características dos sistemasconvencional e digital

na redução da taxa de mortalidade. Hou-ve, nos últimos anos, uma crescente pre-ocupação com a melhora na tecnologiaque envolve a qualidade de imagem emmamografia. Por exemplo, a migração dosistema convencional para o sistema di-gital. No Quadro 1 estão descritas algu-mas especificações comparativas entre asdistintas tecnologias.

Definidas as características dos distintos sis-temas pode-se, por exemplo, analisar al-guns parâmetros de extrema importânciapara definir a tecnologia a ser incorpora-da no serviço: Custo/Benefício (CBA), Cus-to-Efetividade (CEA) e Custo-Utilidade(CUA). Estas são técnicas para a compara-ção das conseqüências positivas e negati-vas na utilização de recursos. Na realida-de, nada mais são do que tentativas de sepesarem logicamente os prós e os contrasde uma decisão.

Na CBA, as medidas são em unidades mo-netárias. Isto permite uma comparaçãoentre programas semelhantes. A CEA,

to por unidade de efetividade entre pro-gramas com o mesmo objetivo, mas nãoentre programas com objetivos diferen-tes, porque a efetividade das medidasde resultado difere. Neste caso, apesarde a medida final ser a mesma, osparâmetros utilizados em cada progra-ma não são comparáveis. A CUA enfoca,com atenção no resultado, a qualidadeda saúde obtida por um programa desaúde ou tratamento. Os resultados sãogeralmente expressos como custo porganho em qualidade de anos de vidaajustados.

Com os parâmetros mencionados no Qua-dro 1, e utilizando as técnicas de análisesupracitadas, pode-se optar pelatecnologia mais eficiente e mais eficaz paraum determinado centro de diagnóstico porimagem. No caso de um grande serviçode imagem, que seja referência, ter umaalta demanda de pacientes e composicionamento diferenciado de mercado,a conclusão provavelmente será pela aqui-sição do mamógrafo digital.

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 11

Goldenberg - e foi discutido se o Hospi-tal das Clínicas deveria ser da universida-de ou se deveria continuar a ser umaautarquia, como já era. Perguntei ao pro-fessor Goldenberg qual era o orçamentoda USP e ele respondeu que estava pertodos 300 milhões de dólares. Esse era oorçamento do Hospital das Clínicas. Porisso, disse a ele que trazê-lo para dentroda USP criaria um problema enorme paraa universidade.

Em 1989, o Quércia era governador e es-tava sofrendo pressão muito forte das uni-versidades estaduais. Estabeleceu, então,que 9,17% do ICMS seriam destinados aelas. E isso era dividido entre as três uni-versidades. A USP ficou com cerca de 4%,depois cresceu um pouquinho. Passaram-se 17 anos e o orçamento da USP é supe-rior a R$ 2 bilhões. Já o orçamento doHospital das Clínicas, discutido ano a anosem qualquer vinculação, mesmo somadocom os das fundações de apoio mal che-ga a R$ 1 bilhão. A vinculação de recursospara as Universidades fez com que o orça-mento da USP acompanhasse o aumentode arrecadação do ICMS. A necessidadeda autarquia - Hospital das Clínicas - deficar discutindo recursos no orçamento anoa ano foi reduzindo progressivamente ovalor. Então, no momento em que nós con-seguimos ter recursos vinculados, a ten-dência é crescer. E é claro que a área eco-nômica é contra.

Quando fui começar a CPMF, o Serra eraMinistro do Planejamento. Fui falar comele e expliquei a questão. Ele respondeuque não poderia me ajudar, porque, porprincípio, ele era contra qualquer tipo devinculação. Quando Ministro, patrocinoua Emenda 29 e acertou. E se não fosse oSerra, não se vinculava recurso; e se nãohouvesse recurso vinculado, nós não terí-amos o dinheiro que temos hoje.

Os hospitais do Estado não seriam termi-nados de jeito nenhum. A necessidade deaplicar 12% do orçamento do Estado mu-dou muito a situação. Chegou um momen-to que o Secretário de São Paulo não ti-nha mais onde aplicar; possuía dinheiro enão tinha onde aplicar. Eu concordo queé preciso melhorar a gestão. A gestão foi

muito melhorada. Quando eu entrei, em1995, nós tínhamos internado 10% dapopulação por ano. Eu vi os dados de ou-tros países, não era muito exagerado. Masaí eu tive a idéia de mandar fazer um le-vantamento, município por município. Foimuito interessante. São Paulo internava6,2% e com uma grande parcela da po-pulação muito pobre. Havia municípiosque internavam 12, 15, 20, 40% da po-pulação. Isso não pode ser. Isso é fraude.Foram levantados dados do DATASUS everificou-se que esses dados não tinhamcrítica. Apresentava-se a conta e se man-dava pagar. A fraude consistia na criaçãode escritórios que produziam prontuáriosfictícios, apresentavam a conta e o Siste-ma pagava. Eu me lembro de uma cidadeque não tinha hospital e faturava 200 AIH(internações hospitalares) por mês.

Álvaro Escrivão Júnior: Era uma práticacomum os médicos assinarem AIH (au-torizações de internação hospitalar) embranco. Estas eram preenchidas com aciência do diretor?

Adib Jatene: Para sanar esse problema nósinserimos 135 críticas no sistema deprocessamento de contas. Isso melhoroua gestão. Havia, anteriormente, erros dedigitação e fraudes de internação. Quan-do o Datasus estabeleceu um tempo mí-nimo de internação, a fiscalização melho-rou. Hoje, ninguém fala em fraudes. Falaem fila; em falta de atendimento; em fal-ta de medicamento. Mas não há fraudena assistência.

Existem fraudes nessas contratações de ser-viços de terceiros, de lixo e outros servi-ços. Mas isso é problema das licitações.São fraudáveis. A mais incrível foi quan-do a Fundação Nacional de Saúde queriacomprar vinte milhões de vacinas contraHepatite B; queria vacinar toda a popu-lação. Dessa negociação eu quis partici-par. Aí, eu recebo um telefonema doembaixador de Cuba, me pedindo umaaudiência com o presidente do InstitutoCubano, que me ofereceu um lote a US$2,40 por vacina. O Ministério compravapor US$ 6,70. Tinham, porém, que par-ticipar de uma licitação.

Ficaram três fornecedores no final da lici-tação: o Instituto de Cuba, oferecendo aUS$ 3,85 a unidade; um outro laborató-rio da China, oferecendo a US$ 3,90 aunidade. E um outro Instituto da Bélgi-ca, oferecendo a US$ 3,95 a unidade.Quando isso acontece, você pode chamaros três Institutos e consultar se eles en-tregam todo o lote ao menor preço. Elesconcordaram. A Fundação Nacional deSaúde homologou. Eu cancelei e elesvieram dizer que eu não podia ter feito,ter cancelado, porque não havia nenhu-ma irregularidade na licitação; estavatudo dentro da lei. Só que um dos lici-tantes, que ofereceu 6,5 milhões de do-ses a US$ 3,85, tinha me oferecido 20milhões de doses a US$ 3,00 a unidade.Não pagaria US$ 3,95 por unidade e dis-se para resolvermos na Justiça. E não fo-ram. E o tempo começou a passar. Aí, eurecebi um telefonema do embaixador deCuba, que tinha uma carta do laborató-rio me oferecendo um lote de 40 milhõesde doses, a US$ 2,40 a unidade. Não seicomo é que essas coisas podem ser fei-tas. Passaram-se uns quinze dias, receboum ofício da Bélgica me oferecendo 40milhões de doses a US$ 1,80 a unidade.

Passou um pouco de tempo, o embaixa-dor de Cuba pede uma nova chance. Elevem e diz: "Olha, o comandante, para de-monstrar o apreço pelo Brasil e a neces-sidade de incrementar as nossas relações,me autorizou oferecer 40 milhões de do-ses, a um e quarenta". Depois, chega umsenador do Maranhão, de uma missão daChina, trazendo um ofício do laboratóriochinês que oferecia um lote de quarentamilhões de doses por noventa e nove cen-tavos a unidade.

Mas, com relação à gestão da Saúde, euacredito que melhorou muito, e continuamelhorando. Porque, com o volume de re-cursos que o setor possui, fazer o volumede atendimento que o SUS faz, precisa sermuito eficiente.

Álvaro Escrivão Júnior - É um milagre,não é?

Adib Jatene: Não é verdade? Eu acho.

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2. AQUISIÇÃOO objetivo da fase de aquisição é atenderaos parâmetros exigidos pelo serviço como menor custo. Isto somente será possíveltendo em mãos um memorial descritivoou um RFP (Request for Proposal), no qualtodas as especificações técnicas estejamdescritas. Podem-se relacionar os seguin-tes detalhamentos:� características gerais do equipamento,

incluindo sistemas de comunicação;� condições de pagamento;� valor de contrato de manutenção, com

e sem peças;� up-time, ou seja, tempo útil de fun-

cionamento mensal do aparelho;� condições de modernização do apa-

relho (upgrade);� treinamento do corpo clínico e téc-

nico;� prazo de garantia;� instalação;� manuais em português;� formulário de análise do vencedor da

concorrência de aquisição, não levan-do em conta apenas preço, mas tam-bém custo de insumos e de manuten-ção, entre outros. Utilização de pesoe ponderação dos parâmetros.

Após esta etapa, haverá recebimento depropostas, avaliação, seleção do fornece-dor, recebimento do equipamento e tes-tes de aceite.

3. GERÊNCIA DE EQUIPAMENTOSa) Objetivo geralO objetivo da gerência de equipamentosé estabelecer um controle rigoroso eef ic iente do parque insta lado detecnologia médica, ou seja, seus equi-pamentos médico-hospitalares, desdesua aquisição à obsolescência. Faz par-

te desta atividade inovar e aperfeiçoaras práticas de gestão e controle deequipamentos, dando ênfase aos pro-cessos de aquisição, manutenção cor-retiva e preventiva, controle de risco,comprovação metrológica, capacitaçãode recursos humanos, normalização,controle de patrimônio, obsolescência,controle de documentação e indicado-res de qualidade. A metodologia utili-zada evita a subjetividade, por meio dautilização de recursos computacionais,organização e métodos, confiabilidadeaplicada ao controle de qualidade ecentro de custos.

b) Objetivos específicos:� Implantar sistema de informações,

que permita sua interligação em redepara apoio à decisão, possibilitandoa diminuição do custo operacionalcomo resultado de decisões racionais;

� Prover a alta administração do hos-pital de informações sobre o ciclo devida de todos os equipamentos mé-dicos do hospital;

� Planejar e controlar a manutençãopreventiva e corretiva, interna e ex-terna, incluindo o gerenciamento decontratos de serviços externos;

� Definir programas de treinamentopara técnicos de manutenção eusuários de equipamentos;

� Definir programa de controle de qua-lidade e verificação de desempenhodos equipamentos;

� Definir parâmetros para determinar aobsolescência da tecnologia e plane-jar sua substituição;

� Prevenir situações perigosas e contro-lar os riscos inerentes ao uso de equi-pamentos no ambiente hospitalar;

� Estabelecer procedimentos para aqui-sição de equipamentos médicos;

� Estabelecer indicadores da qualidadepara o acompanhamento do desem-penho do serviço de manutenção, in-cluindo: tempo de indisponibilidade,custo de manutenção por tipo deequipamento, demanda por setor esatisfação do cliente.

Em um ambiente no qual os recursos sãoe sempre serão escassos e finitos, oprocesso de avaliação da incorporação detecnologias em saúde deve contemplar ofuncionamento ou o impacto de utiliza-ção do produto e do serviço. A avaliaçãode uma tecnologia a ser incorporada pelosistema de saúde, público ou privado,caracteriza-se por uma análise criteriosa edeve considerar aspectos comoefetividade, eficiência e viabilidadeeconômica.

Com o grande e rápido desenvolvimentotecnológico, tal processo de avaliação tor-na-se fundamental, não somente por iden-tificar as intervenções de valor para o sis-tema de saúde, mas também pelanecessidade de existir um processo de es-colha entre as inúmeras alternativas querealmente agregam valor.

Diante dos pontos abordados na discus-são acima, é possível concluir que a incor-poração de tecnologia na área da saúdepode ser feita de modo racional, com pla-nejamento, otimizando-se os recursos dis-poníveis, de modo a analisar a diversificadagama de propostas de tecnologias dediagnóstico, tendo como resultado desteprocesso o benefício individual e coletivodaqueles que utilizam o sistema.

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 200710

com a Paulista. Quer dizer que nas outrasáreas não tem hospital. Como? E a popu-lação? Aí, veio o governo Maluf. PauloMaluf e criou uns grupos de trabalho. Eeu entrei num grupo de trabalho do Hos-pital das Clínicas. No dia da apresentação,o presidente do meu grupo de trabalhonão foi. Fui solicitado a fazer a apresenta-ção do grupo. E fiz. Acabou a reunião, veioum assessor dizendo que o governadorgostaria de falar comigo. Ele me convidoupara ser o Secretário da Saúde. Aceito oconvite, fui estudar a situação da Saúde.Comecei a ir às Assembléias Populares,comecei a discutir. E o pessoal, quandopercebeu que na verdade eu queria fazeruma coisa séria, aderiu, e fizemos um le-vantamento na área metropolitana, par-tindo do princípio de que você precisariapara cada dez, quinze mil pessoas, ter umaunidade de saúde para que a populaçãopudesse ser beneficiada. Eu tinha propos-to introduzir 10 visitadores sanitários - naépoca, se chamava visitador sanitário - naregião das unidades, com uma seleçãodesses funcionários na região de cada uni-dade. Isso foi negado, não podia, porquetinha que fazer concurso público. E eu dis-se: "Concurso público, eu não quero. Por-que virá gente com qualificação acima doque necessito e não trabalharão direito, evirá gente de um bairro para o outro, for-mando uma confusão". E nós fizemosaquele Plano Metropolitano com 490 Pos-tos de Saúde e 40 hospitais locais. As auto-ridades reclamaram que o plano era umaloucura. Eu disse que loucura era essa ci-dade. Fui ao Banco Mundial arranjar re-curso. O Banco Mundial disse: "Nós só fi-nanciamos na zona rural". Falei: "Porquevocês não conhecem o Brasil. Nosso pro-blema não é mais a zona rural. Nossoproblema são as áreas metropolitanas".

Quer dizer, tudo baseado em quê? Quan-do você tem um compromisso, tem queanalisar as variáveis para montar umaequação minimamente aceitável. E foi aíque se perdeu a oportunidade. Por quê?Eu dizia isso para o Paulo Maluf. Eu dizia:"O senhor está gastando 500 milhões dedólares no Paulipetro. O senhor me dá 20%disso e eu resolvo o problema da Saúde".Mas, eles não dão, porque sabem que

quando se investe em petróleo, assim quese começa a produção, tem-se o retornodos recursos gastos, começa a receita. Seo investimento é em saúde, começa a terdespesa. Então, eles não querem fazer es-sas unidades, porque depois gera umadespesa gigantesca, comprometendo parasempre o orçamento.

Álvaro Escrivão Júnior: Em relação à for-mação dos profissionais que adminis-tram os serviços de saúde, observa-seque vários serviços, atualmente, estãocontratando administradores e enge-nheiros, porque os médicos não teriamcondições. Em contraste, há a opiniãoque para administrar tem que ser médi-co. Qual a sua opinião?

Adib Jatene: Eu sempre distingui direçãoda administração. Quando no Estado, paraser diretor do Dante Pazzanese precisariater curso de Administração Hospitalar, eume rebelei, pois não sou administrador, soudiretor. O diretor é o cidadão que tem avisão do problema e pode antecipar assoluções. É quem tem a capacidade deseparar o que é importante do que não é.O administrador tem que viabilizar o quea direção estabeleceu.

O administrador é uma especialidade deapoio. Eu não tinha tino para o adminis-trativo. Agora, o diretor esse tem que sermédico e ser alguém com visãoabrangente, como tinha o Doutor Dante.Isso eu aprendi com ele. O Doutor Danteera um homem que tinha visão, além deser um grande cardiologista. Ele, por exem-plo, viu que o norte do Paraná seria umaregião de oportunidade. Abriu fazenda láe levou muitos amigos para participar dagrande jornada de desenvolvimento doNorte do Paraná. Os diretores médicospossuem visões que permitem a introdu-ção de inovações determinantes para aassistência. Isso é o diretor: é o sujeito queenxerga, que tem visão, que antecipa ascoisas. E, adicionalmente, tem o adminis-trador que cuida do papel, do dinheiro eda operacionalização.

Por que o Lula pode ser Presidente da Re-pública? Qual é o curso que ele tem? Ele éadministrador? Mas ele é um sujeito

muito inteligente. Ele enxerga lá adiante.Você coloca o problema, ele distingue.É por isso que ele está tendo sucesso.Agora, você bota um camarada especia-lista em administração, ele vai olhar ascontas, e não é isso. Então, eu não meconsidero um administrador, mas sim,alguém que conseguiu ter uma visãoabrangente, que permite selecionar o queé importante do que não é.

Álvaro Escrivão Júnior: Isso pode serconsiderado como um talento seu, umacaracterística pessoal...

Adib Jatene: Não é talento. É bom sen-so. Quando eu cheguei ao Ministério,vieram falar comigo sobre o Programa deAgente Comunitário de Saúde. Tinhamsido criados cento e poucos cargos demédicos de família e vieram pedir minhaopinião. Como já havia tentado fazer emSão Paulo, quando eu era Secretário daSaúde , eu trouxe o programa para ogabinete e dei toda a força para aimplantação.

Ana Maria Malik: Considerando suaexperiência e visão, o que vai aconte-cer com a Saúde no Brasil?

Adib Jatene: Estou otimista. Veja que aEmenda 29 nos tirou dessa situação, queeu disse a vocês, até 2004. Agora, oorçamento vai crescendo de acordo como aumento das receitas públicas. Se estáprevisto 12% do orçamento do Estado eele aumenta, cresce o orçamento daSaúde. Se há previsão de 15% do orça-mento municipal, o orçamento da Saúdeaumenta à medida que o primeiro cres-ce. Se existe uma participação de 5%sobre o aumento nominal do PIB, ano aano, o orçamento também é favorecido.Tem-se garantido um crescimento acom-panhando a inflação. Não teremos asperdas que tivemos anteriormente.

Em 10 anos, tivemos perda de R$ 80 bi-lhões, corrigidos pelo IPC. Essa perda vaiser eliminada. Infelizmente, vamos sair deum patamar baixo, mas vamos crescer.Um dado interessante é que, em 1986,houve uma reunião no Instituto de Estu-dos Avançados da USP - o Reitor era José

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INDICADORES

Denise Schout,Chefe dos serviços de Monitoramento de Indicadores e de Epidemiologia do Núcleo de Informações em Saúde do Hospitaldas Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) e Pesquisadora associada do Gvsaúde.

Os Indicadores e a gestão daassistência nos serviços de saúde

Émoda nos serviços de saúde a reivindi-cação de muitos indicadores em con-dições que apresentem fácil acesso.

Nos últimos anos, passou a ser corriqueiroeste tipo de manifestação por parte dosgestores, e, eventualmente, de profissionaisda área técnica, de interesse e conhecimen-to sobre indicadores do serviço em que es-tão trabalhando. No entanto, quando sebusca olhar com maior proximidade a ques-tão de sistemas de medição da produção eda qualidade da assistência oferecida nosserviços de saúde, parece haver carência deinformações.

Entre as frases mais ouvidas quando se dis-cute o assunto estão:� temos muitos dados e pouca informa-

ção;� temos na empresa um sistema de

Business Intelligence poderoso, mas nãoconsigo visualizar dados consistentes nosistema;

� os relatórios não evidenciam antecipa-damente os problemas que identifico nocotidiano;

� não consigo me comparar com outrosserviços;

� não existem sistemas de comparaçãoadequados para minha área.

Aparentemente, não está clara a definiçãodo que se deseja em termos de informação.Na verdade, cabe perguntar se de fato o pro-blema está no acesso às informações ou emsua utilização adequada.

Para aprimorar o processo de decisão nasorganizações de saúde, tanto na área públi-ca quanto privada, são essenciais informa-ções precisas e oportunas dos processos

assistenciais, especialmente no ambientecompetitivo e dadas as limitações financei-ras crescentes no setor. As principais dificul-dades para a existência de informaçõesconfiáveis, oportunas e consistentes estãoalicerçadas em dois problemas básicos dasorganizações de saúde: a qualidade dos re-gistros clínicos e a forma de implantação edesenvolvimento dos sistemas informatizadosnos serviços de saúde.

A qualidade dos registros clínicos está relacio-nada diretamente à valorização que a altagerência do serviço destina aos prontuáriose ao sistema de informação do hospital. Aqui,não se trata de valorização do sistemainformatizado - o software escolhido pelaorganização - mas sim de como e em quemedida a alta gerência investe em dispor deinformações assistenciais de boa qualidade.Para tanto, contar com uma equipe compos-ta de profissionais especializados em gestãode informação - captação, consolidação,consistência e análise dos dados e das infor-mações assistenciais - seria essencial paraviabilizar essas atividades como rotina nasorganizações.

Nos serviços hospitalares, as Comissões deProntuário e Óbito devem ser representati-vas e atuantes, para possibilitar o desenvol-vimento de formulários semi-estruturados, aserem preenchidos pelos diversos profissio-nais. Mas como essas comissões são forma-das por médicos do corpo clínico, é essenci-al que faça parte desse grupo um profissionalespecificamente qualificado em análise deinformações. Além disso, esse profissionaldeverá trabalhar de forma integrada com oServiço de Arquivo Médico (SAME). O Arqui-vo, por sua vez, deve ser coordenado por

pessoal qualificado, com nível universitário,desvinculado do setor de faturamento, comatribuições bem definidas e com recursospara gerenciar o Patrimônio Clínico da orga-nização. O sistema informatizado do serviçodeve ser alimentado pelos profissionais doSAME, tanto do ponto de vista de codificaçãodos diagnósticos e revisão dos dados de óbi-to quanto em relação ao monitoramento everificação dos dados do censo hospitalar,base para a construção dos indicadoresassistenciais dos hospitais.

O sistema informatizado deve serparametrizado por quem entende de análisee consolidação de dados, uma vez que o focodos sistemas nos serviços é voltado paravisualizar todas as passagens em cada servi-ço, e não o paciente. Ou ainda, é centradona contabilização dos itens consumidos du-rante o atendimento, sendo adequado ape-nas para a emissão de uma conta hospitalarindividual. Quando se quer identificar a va-riabilidade de recursos utilizados segundo de-terminado diagnóstico ou procedimento emum dado grupo etário de pacientes, dificil-mente se consegue fazê-lo diretamente.Quase sempre se requer investimento adicio-nal, o que significa gastos não previstos.

Essas considerações têm o objetivo de carac-terizar e apontar onde se devem concentraras intervenções para garantir informação dequalidade. Entretanto, é um equívoco dizerque na área da saúde não há informaçõesconsistentes. Existem, implantados no Bra-sil, vários sistemas de comparação entre ser-viços de saúde, porque nenhum deles se en-quadra na definição clássica debenchmarking. Os principais entre eles sãoobtidos por meio da consolidação das auto-

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 9

o doente não tão exigente. Eleva-se o pa-drão do hospital e vai-se oferecendo àque-la população que não reivindica - porquepara ela está tudo bom - o que uma popu-lação exigente quer. E, com isso, há melho-ra no nível de atendimento do hospital.

Por outro lado, o ingresso maior de recur-sos permite suplementar o salário dos fun-cionários; o hospital deixa de ser um localpara treinar profissionais que depois vãotrabalhar nos hospitais privados. Porque ohospital universitário, tradicionalmente, pre-parava a enfermeira, o técnico e quandoele estava no seu melhor momento profis-sional, ganhando pouco, vinha o hospitalprivado e o contratava. Como é que vocêvai fazer um serviço de liderança se o seupessoal não é de liderança? E o pessoal deliderança não se submete a salários indig-nos. Logo, há uma seleção negativa dentrodo hospital: permanece quem não conse-gue trabalhar no privado ou quem tem doisempregos.

Surgiu então a luta das seis horas. A lutadas seis horas não é para a pessoa trabalharmenos, porque oito horas sobrecarregademais, isso não é verdade! O motivo é osegundo emprego: porque o profissionaltrabalha em dois lugares: seis horas maisseis horas. É mais que oito. Mas, o profis-sional precisa do segundo emprego. E sededica mais onde é mais cobrado, e menosonde é menos cobrado. Não tem mistério -isso é claro. Se você não consegue premiara competência, você está afundando a suainstituição, porque os competentes vão sair.Eu assisti a isso largamente. Você preparauma enfermeira de UTI. Quando ela estáno ponto, ela vai embora, porque ofere-cem para ela o dobro do salário. Então, seeu quiser manter essa enfermeira, eu tenhoque pagar a ela o dobro. Só que o Estadonão me permite pagar o dobro devido àisonomia salarial - todo mundo ganha igual.

Na medida em que nós começamos a aten-der à clientela mais rentável dos convênios,verificamos dados muito importantes: 20 a25% dos que eram atendidos pelos convê-nios captavam 60% da receita; e 75 a 80%que eram atendidos pelo SUS captavam40% da receita. Isso representou um extraor-dinário avanço. Aí, veio o Pinotti, com o

estribilho: "Dupla porta". E eu fiz um artigodupla-porta versus dupla-militância. Querdizer, se eu quero uma clientela diferencia-da para vir para o hospital, eu tenho queoferecer uma hotelaria mínima. Por quê?Porque o paciente tem os consultórios pri-vados e os hospitais privados à disposição;ele só virá para o meu hospital se ele tiver omínimo de hotelaria. Mas o centro cirúrgi-co, a UTI, os exames de laboratório e osexames de imagem são iguais. Então, opadrão do que está sendo oferecido parauma clientela de nível "A" é o mesmo queaquele da clientela de nível "B" "C" e "D". Omesmo padrão. Só que há uma captaçãode recurso que permite fazer isso. Foi issoque fez o Incor chegar à posição a que che-gou. Por quê? Eu era diretor científico; ti-nha um trabalho para publicar, para apre-sentar num Congresso Europeu, mas nãotinha como ir. Solicitei as passagens. E, aí,nós começamos a ter uma participação nosCongressos Internacionais sem precedentes.Esse fato que elevou o nível de atendimen-to. O intercâmbio faz o anúncio para a in-trodução de novas tecnologias.

Quando nós recomeçamos os transplantesem 1985, tinha vindo o Jorge Kalil, que es-teve cinco anos na França, com um profes-sor que era Prêmio Nobel. Foi para PortoAlegre. Nós fomos lá buscá-lo. Hoje, ele éprofessor titular, dispõe de um andar, queé o laboratório de imunologia e tecnologiaem transplantes mais completo do País. Éassim que se faz avanço, não é com con-versa. Você tem que preparar e qualificaras pessoas; dar visibilidade para as pessoaspara que haja produção. O modelo do Incorestá sendo copiado como, por exemplo, noInstituto Butantã.

Eu fui lá várias vezes intermediar desenten-dimentos entre o pessoal da pesquisa e oda produção, quando eu era Secretário.Hoje, o Butantã, graças à Fundação deApoio, é um grande produtor de vacinas,do melhor nível. Ribeirão Preto, o hospitalda universidade, era uma dificuldade. Esti-ve lá duas, três vezes para discutir. E váriosoutros lugares fizeram isso. No Rio de Ja-neiro, o Hospital de Laranjeiras não opera-va dois doentes por semana - hoje está ope-rando quatro. O Inca segue o mesmo

movimento. Então, as pessoas dizem: "Que-rem privatizar o funcionalismo público".Você quer eficiência. "Não. Tem que ser sócom recurso público". Mas o recurso públi-co não dá! "Ah, vamos pressionar o gover-no. É porque não tem vontade política".Então, basta olhar o orçamento e verificarque, em 10 anos, pelo IPC, você perdeu de80 a 120 bilhões de reais. É complicado.

Ana Maria Malik: O senhor é noto-riamente reconhecido como um médicobrilhante. Como é que o senhor virougestor na área da Saúde, político na áreada Saúde?

Adib Jatene: Foi bem por acaso. Não estu-dei Medicina para fazer cirurgia cardíaca;estudei Medicina para fazer, depois de for-mado, um ano de Saúde Pública e voltarpara o Acre. Eu me desviei, na faculdade,porque eu fui trabalhar em cirurgia, poisprecisava aprender um pouco. E, por sorteou por azar, eu caí no grupo do Zerbini,num ano que começou a cirurgiaintracardíaca. Eu participei, ainda como es-tudante da primeira comissurotomia mitral.De repente, eu estava metido e não tinhamais como sair.

Mas, eu sempre achei que o problema fun-damental da Saúde é garantir o acesso paraa população de baixa renda. O DoutorDante me chamou um dia e me disse: "Olha,eu estou verificando que o nosso Ambula-tório está ficando muito sobrecarregado. Ea grande maioria são coisas simples, quepodem ser atendidas pelo posto de saúde.Então, você que está mexendo em muitacoisa, estuda esse ambulatório. Vê como éque faz". Aí eu pedi à assistente social: "Vejaa origem dos pacientes". Verificou-se queem grande parte, esses pacientes provinhamde regiões periféricas como São Miguel, Pe-nha, e tantas outras. Então, pensei: "Ago-ra, vamos estabelecer contato com os Pos-tos de Saúde da região". Aí, eu descobri quenão existiam postos de saúde nessas regiões.Peguei o mapa de São Paulo e botei namesa. Pedi à minha secretária: "Você peguetodos os hospitais de São Paulo; marque oendereço". Quando ela acabou o mapa foiincrível, descobri o problema. Destacava-seuma área com raio de quatro quilômetros,tendo por centro a esquina da Pamplona

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1 Tempo Médio de Permanência é o número de pacientes-dia dividido pelo número de saídas

hospitalares no mês, expresso em dias.

rizações de internação hospitalar (AIH), docadastro nacional de estabelecimentos(CNES) e da pesquisa de assistência médicasanitária (PAMS), disponíveis no DATASUS,para os serviços vinculados ao Sistema Únicode Saúde (SUS); o sistema de avaliação dasOrganizações Sociais - instituições vinculadasà Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo;os indicadores do Comitê de Qualidade Hos-pitalar da Associação Paulista de Medicina(apresentados no Boletim Indicadores -Proahsa); Sistema de Indicadores Padroniza-dos para Gestão Hospitalar (SIPAGEH); Siste-ma de Indicadores Padronizados para Ges-tão dos Laboratórios (SIPAGEL); e o Sistemade Indicadores Hospitalares (SINHA), da As-sociação Nacional de Hospitais Privados(ANAHP)

Com exceção dos sistemas vinculados ao SUS,em todos os outros citados, a participação évoluntária e está concentrada em hospitaisprivados não financiados pelo SUS, localiza-dos nas regiões Sudeste e Sul. Hospitais pú-blicos e serviços privados financiados peloSUS também participam do SIPAGEH (Hos-pital de Clínicas de Porto Alegre) e do Pro-grama Compromisso com a QualidadeHospitalar - CQH (principalmente hospitaislocalizados no município de São Paulo), po-rém em menor proporção. No SINHA parti-cipam os 34 hospitais da ANAHP, serviçosprivados financiados pelo sistema suplemen-tar ou diretamente pelos pacientes.

Vale ressaltar os sistemas dirigidos para de-terminadas áreas ou setores do hospital,como é o caso do QUATI (Qualidade em Te-rapia Intensiva) patrocinado pela Associaçãode Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), im-plantado em várias unidades de terapia in-tensiva, principalmente na Região Sudeste.Eles também são de adesão voluntária e apre-sentam cobertura heterogênea e não repre-sentativa dos leitos e unidades de terapia in-tensiva existentes.

O que se pode fazer com esses sistemas deinformação e de comparação? Ainda queeles sejam limitados, dirigidos e eventualmen-te com graus de precisão variáveis, é possível

efetuar análises e planejamentos a partir dasinformações neles disponíveis e terparâmetros que possam nortear a identifica-ção de perfis assistenciais. No entanto, é ne-cessário haver critério e cuidado para sabero limite de sua utilização e interpretação.

Na verdade, o uso de alguns indicadoreshospitalares tradicionais voltados para avali-ar o desempenho das organizações de saú-de exige muito cuidado e está contra-indicadauma análise simplista. Por exemplo, o tempomédio de permanência (TMP 1) é um indica-dor muito utilizado em todos os sistemas decomparação citados. De um lado, ele estáassociado ao custo hospitalar que se buscacontrolar do ponto de vista do financiadorpúblico ou privado, uma vez que tambémdetermina a oferta de leitos (quanto maior oTMP, menor a oferta de leitos e menor arotatividade de pacientes). De outro, podeestar relacionado com a qualidade da assis-tência oferecida. Considera-se que numapermanência hospitalar de até sete dias, orisco de aquisição de infecções hospitalaresé menor. No entanto, médias de permanên-cia curtas para determinadas afecções po-dem significar falha assistencial, seja porquepodem estar associadas a altas taxas de mor-talidade ou a transferências para outros ser-viços, ou porque podem contribuir parareinternações desnecessárias. A literaturasobre o tema é extensa e muitos países têmutilizado o TMP de patologias marcadoras -

tendo como base diretrizes para prática clí-nica - como padrão de qualidade na assis-tência para a avaliação dos prestadores hos-pitalares e com o intuito de aprimorar aqualidade do cuidado oferecido aos porta-dores desses diagnósticos. No Canadá, porexemplo, o TMP baixo para Acidente VascularCerebral (AVC) foi associado a reinternaçõese a maior custo assistencial, o que determi-nou uma meta, para os hospitais canaden-ses, de Tempo Médio de Permanência míni-mo para esta afecção como parâmetro naavaliação dos hospitais. Ele é um indicadorsensível aos processos assistenciais, mas pou-co específico. Isto significa que é útil nomonitoramento, mas as variações observa-das exigem investigações mais detalhadaspara a compreensão dos fatoresdeterminantes.

Para caracterizar a complexidade da análisesobre os indicadores de desempenho de ser-viços de saúde, observa-se o Gráfico 1, comos dados de média de permanência nos ser-viços que prestam assistência ao SistemaÚnico de Saúde (SUS), sejam estes de natu-reza pública ou privada. Observa-se quedada média de permanência enquanto ten-dência nesses 16 anos de análise. Tendo otipo privado partido de 6,8 em 1990, e che-gando a um patamar de 5,8 dias em 2006.O decréscimo foi maior nos hospitais públi-cos, uma vez que em 1990 a média era de8,3. De um modo geral, nos últimos dezanos, os hospitais públicos apresentarammédia próxima, porém abaixo da observa-

Gráfico 1 - Distribuição anual da média de permanência se-gundo tipo de hospital - Sistema Único de Saúde - 1990 a 2006

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 20078

um exame para autorizar o médico a exer-cer. Na época, criaram uma grandeceleuma: "O problema não é o estudante;o problema é a Escola". A responsável é aEscola. Mas, sai um médico mal formadoque vai trabalhar no Pronto-Socorro e vaicriar problema para a população. Eu dis-cuti, não houve jeito. Fizeram o CINAEM(Comissão Interinstitucional Nacional deAvaliação do Ensino Médico) - união detodas as entidades para ajudar as Escolas.Eu disse: "Ok, apoio vocês. Mas, garantoque daqui há 10 ou 15 anos o problemavai ficar igual". Resultado: em 1996, nóstínhamos 82 faculdades de Medicina. Hoje,nós temos 157. Quer dizer, em 10 anos secriou o que levou 400 anos para criar. Commensalidades tão altas como de 3.500 até4.000 reais! Quem pode estudar nessasEscolas?

Quem estuda nessa Escola vai fazer aten-dimento na periferia? Quer dizer, o negó-cio está absolutamente equivocado. Poroutro lado, os hospitais de universidadespúblicas - quase todos, estão em uma si-tuação calamitosa. Por quê? Porque elesnão conseguem acompanhar o avançocientífico e tecnológico, que é responsa-bilidade dos Hospitais Universitários. Aspessoas confundem o hospital universi-tário com o hospital assistencial. O hos-pital da universidade não é um hospitalassistencial; ele também presta esse ser-viço, mas é um hospital que deve gerarconhecimento, criar e testar conhecimen-tos; trabalhar na fronteira do conheci-mento, e não, ficar atendendo a coisassimples que podem ser atendidas emqualquer hospital de bairro; para que elepossa comandar os consensos. Então,estamos envolvidos com um problema,desde a formação das carreiras da saúdeaté o atendimento da população de bai-xa renda. E quando você vai até lá paraverificar o que está acontecendo, obser-va que os recursos disponíveis são insufi-cientes para atender às necessidades.

Ana Maria Malik: Um dos argumentosque apareceram no momento em quese criaram as Fundações de Apoio a es-sas universidades foi justamente garan-tir o avanço tecnológico e, a rigor, fixar

os bons profissionais. Esse modelo tem,pelo menos, trinta anos. Como é que osenhor vê o que aconteceu?

Adib Jatene: Olha, vou recuar um poucono tempo. A primeira criação de um supor-te para entidades públicas foi proposta em1955, pelo Doutor Dante Pazzanese. Elehavia criado o Instituto de Cardiologia doEstado e argumentava da seguinte forma:"Um hospital público não pode sobreviverexclusivamente do orçamento que lhe dá oEstado". Porque o orçamento é preparadono ano anterior. Os índices de inflação nãosão adequadamente calculados. Hácontingenciamento durante o exercício e ohospital não pode se submeter, comooutras repartições, a prazos. As coisas têmque acontecer na hora. Por exemplo: que-brou o raio-x? Amanhã tem que estararrumado, pronto para uso. Para tanto, temque ter agilidade. Então, o Doutor Dantepropôs ao governador Jânio Quadros acriação do Fundo de Pesquisas do Institutode Cardiologia do Estado. E esse Fundo eraabastecido por quem? Pelos serviços pres-tados pelo Instituto. Criou-se uma tabelade preços publicada no Diário Oficial dogoverno, com valores cobrados por consul-ta, hemograma, raios-X, eletrocardiograma,enfim, todos os procedimentos. Criaram-setambém, seis categorias: "A", que não pa-gava nada; "C", que pagava integral, e B1,B2, B3 e B4, que pagavam 10 %, 20%, 40%e 60%. Essa classificação era feita pelo Ser-viço Social. O curioso era que as pessoasqueriam contribuir. Elas faziam questão decontribuir com pelo menos 10% ou 15%.Para as pesquisas, esse modelo foi um gran-de sucesso.

Eu fui para o Dante porque o Fundo de Pes-quisas me pagou o salário que eu tinha noHospital das Clínicas. Eu trabalhava em doislugares e achava que deveria trabalhar emum lugar só. Mas, para isso, eu precisavater uma renda mínima necessária. Então, oFundo complementava. Além disso, o Fun-do pagava viagens e estágios para o exte-rior. Quando começou o cateterismo car-díaco, o Dr. Dante mandou o Dr. EduardoSouza para aprender a técnica sem proces-so, sem nada. Ficou lá dois meses. Voltou ecomeçou o cateterismo aqui no Brasil. E nós

começamos a realizar a cirurgia decoronária.

Então, esse Fundo foi copiado pelos váriosinstitutos de pesquisas do Estado todo:Agronômico, Biológico, entre outros. Issoforneceu um grande incremento aos insti-tutos de pesquisa. Até chegar o governodo Paulo Egídio Martins, cujo Secretário daFazenda fez uma reforma administrativa tãoperfeita que não precisava dos Fundos dePesquisa. Extinguiu-os criando o Fundo Es-pecial de Despesa. Eu me lembro, estavapresente na reunião quando o Doutor Leserdisse ao secretário: "Você está criando umpalácio. Não está pronto. E eu tenho umachoupana. Não destruo minha choupanaantes de o seu palácio estar pronto, senãovou tomar chuva". O Fundo Especial deDespesas tinha duas diferenças fundamen-tais em relação ao Fundo de Pesquisa. Pri-meiro: proibiu aplicar em pessoal. Segun-do: passou a ser orçamentado. Os Institutospassaram a ser arrecadadores para a Secre-taria da Fazenda, que fazia descontos cor-respondentes. Perdeu-se, então, o instru-mento de avanço.

Álvaro Escrivão Júnior: A Fundação deApoio não inovou em nada?

Adib Jatene: Bem, em 1979, eu era o Se-cretário, quando foi proposto ao gover-nador o funcionamento do Incor com aFundação Zerbini. Eu disse: "Bom, isso érecriação do Fundo de Pesquisa". Mas, nocomeço, no Incor, as pessoas só admitiamatender a entidades públicas: Petrobras,Banco do Brasil. Havia muita resistência àidéia de atender a convênios; isso era con-siderado um crime. Depois que fui paralá, achei que esse era um grande desafio.Há dois tipos de doentes: há o doente paraquem o hospital, qualquer que seja, é me-lhor que a casa dele; e há o doente paraquem qualquer hospital que seja é pior quea casa dele. Então, uma parcela não recla-ma de nada; aceita tudo. A outra parcelareivindica. No momento em que você co-loca no hospital clientela privada que temacesso ao Einstein, ao Sírio-Libanês e elecomeça a reclamar, então o hospital me-lhora, só que melhora para todo mundo.Você vai fazer a UTI para atender a essedoente, mas é a mesma UTI para onde vai

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da nos hospitais privados financiados peloSUS, sendo que em 2006 a média de am-bos foi de 5,8 dias.

A tendência de diminuição do TMP é um re-sultado aparentemente positivo para o siste-ma, uma vez que pode indicar maiorefetividade e maior oferta de leitos. No en-tanto, para aprofundar a análise e qualificarqualquer afirmação desse tipo, faz-se neces-sário, primeiramente, caracterizar se ocorre-ram, nesse período, alterações na demandacom relação às características demográficase mudanças nos agravos que motivaram ainternação hospitalar. Só assim é possívelbuscar parâmetros para dizer se a média depermanência observada está acima ou abai-xo do adequado, assim como definir metasde aprimoramento. Além disso, a incorpo-ração de novas tecnologias para o diagnós-tico, mas especialmente no tratamento, vemdiminuindo o tempo de permanência hos-pitalar nas organizações de saúde. Vale res-saltar que nos hospitais onde predominamprocedimentos cirúrgicos eletivos, a médiade permanência tende a ser menor, enquan-to que naqueles cujos pacientes exigem tra-tamento clínico, as médias tendem a sermaiores.

Outro aspecto a ser considerado são as in-tervenções dos financiadores, de forma di-versa no SUS ou no sistema suplementar, paracontrole ou diminuição do tempo de perma-nência visando à contenção de custos.

Os diagnósticos responsáveis por cerca de80% das internações, em 2006, foram:gravidez, parto e puerpério, doenças doaparelho respiratório, doenças do apare-lho circulatório, algumas doenças infecci-osas e parasitárias, doenças do aparelhodigestivo, lesões, envenenamentos e ou-tras conse-qüências de causas externas edoenças do aparelho geniturinário. Quan-do se compara com o perfil da demandaem 1998, o volume de internações caiu14% para Gravidez, Parto e Puerpério e21% para Doenças do Aparelho Respira-tório. Essa queda é ainda mais significati-va quando se analisa a taxa de internação(Internações por 100 habitantes) para es-tes diagnósticos (Gráfico 2). Emcontrapartida, o volume de internações

cresceu, entre 1998 e 2006, de 12% paraDoenças do Aparelho Circulatório, 48%para Lesões e Envenenamentos e 78%para Neoplasias. Reforçando o aumentoda complexidade assistencial, observa-seincremento de 22% nas internaçõesde doenças perinatais, sugerindo tam-bém maior complexidade na assistênciamaterno-infantil.

O que isso significa? Em 1998, havia gran-de pressão de demanda para leitos de ma-ternidade e doenças respiratórias (que pre-dominam na infância). Nove anos depois,

Essas variações representam diminuição degastos? Poderia ser esperado que com me-nor TMP o gasto fosse mais baixo, o quetambém não aconteceu. No caso do SUS,observou-se um incremento de 89% no va-lor gasto por internação e de 109% porpaciente-dia. Isto sugere incorporação denovas tecnologias no tratamento dos pa-cientes. Mas será que o resultado está sen-do mais efetivo, ou melhor, estão sendosalvas mais vidas ou mais pessoas estãosobrevivendo com incapacidade? Para res-ponder de forma mais adequada esta in-dagação seriam necessários estudos de

a demanda tem outras características. Por-tanto, em 2006 são necessários mais lei-tos e, de maneira geral, maior quantidadede recursos para doenças cardiológicas,lesões, envenenamentos e neoplasias. Noshospitais gerais brasileiros, de fato, o mixassistencial sofreu grandes alterações nosúltimos 10 anos, com diminuição do TMP.

Uma vez que se observou aumento da com-plexidade assistencial, era de se esperarmaior TMP para as doenças analisadas. Comofica demonstrado no Gráfico 3, o tempomédio de permanência, no período analisa-do caiu 7% nas Doenças do Aparelho Circu-latório (de 6,9 para 6,4), 6% nas Lesões eEnvenenamentos (de 5,3 para 5,0).

impacto para que de fato possa se dizerque os investimentos crescentes estão re-vertendo em melhor resultado assistencial.Seria instigante a comparação desses acha-dos com dados do setor privado. Algunsindícios apontam na direção contrária da-quela indicada pela literatura internacio-nal e pelas análises de tendências. Nos in-dicadores do Boletim de IndicadoresProahsa, os hospitais para os quais a sériehistórica dos dados é mais longa (desde2001) evidenciam aumento no tempo depermanência. Em 2001, a mediana deTMP divulgada para os hospitais aderidosa um sistema de comparação era de 3,4dias. Em 2006, o TMP apresentado foi de4,1 dias.

Gráfico 2 - Distribuição anual das taxas de internação(por 100 habitantes) segundo diagnóstico -

Capítulo CID 10ª revisão - SUS - Brasil - 1998 a 2006

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 7

Álvaro Escrivão Júnior: Traçando um pa-ralelo entre a Saúde e a Educação, ondeas pessoas com um pouco mais de poderaquisitivo estão tentando sanar suas ne-cessidades no setor privado, o senhoracredita que essa é uma tendência tam-bém no Setor da Saúde?

Adib Jatene: Isso faz parte da concentra-ção de renda e do desequilíbrio social. Sevocê permite uma grande concentração derenda, a parcela que concentra a rendavai ter todos os benefícios: morar nas me-lhores áreas das cidades e ter as melhoresinstituições. E aqueles que não têm ren-da, vão ficar com deficiências. Porque aidéia de que o mercado resolve tudo é umequívoco. O mercado não resolve o pro-blema social porque não está interessadono problema social, a menos que comecea se sentir ameaçado, o que de fato estácomeçando a acontecer. Nós temos osmeios de comunicação comercializadoscom o estímulo para que a população debaixa renda venha a ter acesso a eles. Oaparelho de televisão é barato - divide-seo pagamento em não sei quantas vezes. Apessoa quer a televisão e assiste a todotipo de apelo de consumo, o que gera,principalmente nos jovens, uma grandeonda de consumismo. Só que eles não têmo que vender. Como eles não têm o quevender, eles não podem comprar. E, nomomento em que temos uma grande po-pulação que não tem o que vender e jo-vens que possuem anseios, ou vão se apro-priar indevidamente, ou aceitar o que otraficante põe em suas mãos para vender.Ele vende, tem o dinheiro, e isso estimulaa violência. E nós estamos dentro dela, naluta dos traficantes com a polícia. Existemáreas aqui em São Paulo em que não hápolícia, só traficante. Isso começa a ame-açar a parcela que tem recursos, todo omundo está preocupado. Aqueles que têmmuitos recursos andam de carro blinda-do, andam com seguranças, levantammuros, etc. Mas isso tem limite.

Álvaro Escrivão Júnior: Qual a sua opiniãosobre a assistência médica feita pelos pla-nos de saúde privados, aqueles que aten-dem às classes média-média e média-bai-xa? (Só têm a carteirinha sem nada

dentro. Isto é, existe o plano, mas não aassistência).

Adib Jatene: As classes média-média e mé-dia-baixa, junto com as outras classes commaior poder aquisitivo, somam 20% dapopulação. Oitenta por cento da popula-ção está fora desse sistema e depende doSistema Público de Saúde. Por isso, é quedigo: nós só vamos resolver o problemada assistência médico-hospitalar no setorpúblico no dia em que as autoridades, co-meçando pelo Presidente da República epelos Ministros, precisarem de assistênciae forem obrigados a recorrer aos serviçosdo SUS.

Álvaro Escrivão Júnior: Então, a sua visãoé a de que o nosso Sistema deveria sermajoritariamente público mesmo?

Adib Jatene: Sim, porque não tem saída.Não há como fazer com que quem ganhamenos de 3 salários mínimos consiga fazerface às despesas com saúde.

Álvaro Escrivão Júnior: E como fica a si-tuação de São Paulo, onde existe umagrande parcela de serviços privados?

Adib Jatene: Em São Paulo, defendo queos grandes hospitais privados participemda solução do problema de saúde. Eu ti-nha feito uma proposta, considerando anecessidade de, pelo menos, um leito pormil habitantes. Havia, em 1999, a deman-da de, pelo menos, 4 mil leitos. A soluçãoseria a construção de hospitais de 50 lei-tos para fazer um atendimento mais sim-ples: pronto-atendimento, infecções maissimples, casos clínicos, parto normal, paraaliviar a rede que está sobrecarregada poressa população que não possui assistên-cia. Alguns desses hospitais poderiam serpatrocinados pelos grandes hospitais pri-vados, muitos dos quais, filantrópicos.

Seria uma nova maneira de administrar oshospitais públicos para atender à clientelado SUS. E esses hospitais seriam absoluta-mente atualizados, com boa qualidade deatendimento, por um custo menor. Namedida em que você conseguir mais par-ticipação, a coisa vai aliviando. Quem temuma posição privilegiada na sociedade,deve ajudar a resolver o problema da po-

pulação que não tem. É o único caminho.Atualmente, verificamos um grande pro-gresso no Programa Saúde da Família (PSF).Quando eu estava no Ministério, dizia-seque esse era um programa para o Nordes-te, para as zonas pobres. Eu dizia que setratava de um programa para o Nordestee para todas as regiões pobres. Mas, tinhagente que achava que era só para o Nor-deste. Eu achava que não, que era tam-bém para regiões metropolitanas. Em1996, quando eu ainda estava no Minis-tério, e começamos a implantar o Progra-ma em Itaquera, em parceria com o SantaMarcelina, foi uma coisa fantástica. Porexemplo, na área que foi delimitada, aSecretaria tinha seis casos de tuberculo-se cadastrados. Os agentes comunitáriosidentificaram sessenta e dois casos. Issoé uma coisa louca. As gestantes não con-seguiam fazer Pré-Natal. Havia uma ouduas consultas de Pré-Natal e precisavafazer seis, sete. Ou seja, esse é um pro-grama para essas regiões pobres onde hágrande concentração de população. Masvocê não consegue montar o programapara cobrir toda a necessidade, porquenão há recurso.

Álvaro Escrivão Júnior: A maior cobertu-ra gerou uma drenagem de necessidadede profissionais e de atenção secundá-ria. Em sua opinião, quais as implicações?

Adib Jatene: Além de ter uma necessidadede profissionais (médico, enfermeiro, auxi-liar, agente comunitário), há demanda pormedicamentos e coordenação com o nívelsecundário, com uma demanda por espe-cialistas para atender aos casos mais com-plexos, dar cobertura aos médicos de famí-lia. E os médicos de família? Não existem,foram improvisados. São médicos de váriasespecialidades que, ou por dificuldade detrabalho ou, às vezes, até por vocação, vãolá. Mas não estão preparados para isso. AsFaculdades de Medicina preparam muitomal os seus médicos. No exame voluntário(realizado pelo CREMESP para alunos do sex-to ano do curso de Medicina) ocorreu umíndice de reprovação de 38% em um exa-me que pode ser considerado fácil. E euprevia isso em 1988, quando eu era doConselho Regional. Eu propus a criação de

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Os dados do SINHA também mostram cres-cimento entre 2005 e 2006, com a medianapassando de 3,67 para 4,08 dias de perma-nência. No setor privado, a queixa corrente éque estão diminuindo as internações cirúrgi-cas, as quais passaram a ser realizadas nasunidades de curta permanência e cresceramas internações que necessitam procedimen-tos clínicos, aumentando o TMP e o custohospitalar (sem aumento equivalente de re-ceita). Mas como as séries históricasdisponíveis são coletadas há ainda poucotempo e não se encontram até o momen-to informações por diagnóstico no siste-ma suplementar e nos sistemas de com-paração existentes, a análise do setorprivado fica limitada. O sistema suplemen-tar está investindo nessa direção, mas ain-da não estão disponíveis dados de acessouniversal para proceder a essas investiga-ções. Um aspecto-chave quando se olha osetor privado é que o perfil sócio-econô-mico da população coberta por planos desaúde, predominante nos prestadores pri-vados, é muito diferente daquela que ape-nas tem acesso ao SUS. Além disso, a po-pulação que utiliza o sistema supletivo estámuito concentrada nas regiões Sudeste eSul do país e corresponde nacionalmentea menos de 30% dos brasileiros, segundodados da Agência Nacional de Saúde Su-plementar.

Conhecer, monitorar e interferir nas cau-sas que determinam a permanência hos-pitalar é essencial para aprimorar os servi-ços de saúde. O conhecimento sobre operfil clínico e epidemiológico está acessí-vel, existe na grande maioria dos hospitaisbrasileiros e precisa ser mais valorizado eacima de tudo utilizado para direcionarações de melhoria na qualidade da assis-tência oferecida e na priorização dos in-vestimentos em saúde. A necessidade de

investimento no patrimônio clínico dasorganizações e na capacitação de profis-sionais para análise dos indicadores de de-sempenho e de qualidade dos serviços desaúde é uma meta a ser atingida para am-pliar a capacidade de intervençõesdirecionadas, e com incorporação detecnologias mais custo-efetivas nos hospi-tais que possam contribuir para aprimorara eficiência dos sistemas de serviços desaúde no País.

Gráfico 3 - Distribuição anual das médias de permanênciasegundo diagnóstico - Capítulo CID 10ª revisão -

Sistema ùnico de Saúde (SUS) - Brasil - 1998 a 2006

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 20076

quando naquela época os Planos de Segu-ros de Saúde gastavam cerca de seiscentosreais per capita/ano apenas para assistên-cia médico-hospitalar-ambulatorial. E paí-ses desenvolvidos gastavam mais de mildólares per capita/ano. Nos Estados Unidos,por exemplo, esse valor era de cerca de doismil dólares em 1995. Atualmente, chega aseis mil e quinhentos dólares per capita/ano.

Concluímos, então, que nosso gasto é abso-lutamente ridículo. Entretanto, no orçamen-to da União, ele é significativo. A explica-ção para esse fato é que ele representa, emvolume, a segunda maior despesa da União,só perdendo para a Previdência Social. Em1995, depois de retirar do orçamento fe-deral os recursos vinculados e compro-missados, o Ministério da Saúde recebia51%, ficando os 49% restantes para distri-buir aos demais Ministérios. Não haviacomo buscar mais recurso.

Então, eu decidi que ia criar um recurso noorçamento da Saúde. Pensei no IPMF, quetinha sido extinto em dezembro de 1994.Cabe ressaltar que sua existência não ge-rou impactos negativos, não impediu oPlano Real. Não houve reclamações do IPMF.Propus recriá-lo como contribuição. E porque como contribuição e não como impos-to? O imposto possui anuidade e não podeser vinculado. A contribuição não possuianuidade e pode ser vinculada. E, como euqueria vincular o tributo, tinha que ser con-tribuição. Mas eu inseri uma premissa. Apremissa era que o orçamento que o Mi-nistério já possuía, com todas as suas fon-tes, fosse mantido em valor real, e a contri-buição da CPMF ia representar umacréscimo de cerca de 33% no orçamentodo Ministério, o que infelizmente não acon-teceu. Após uma batalha, a CPMF foi apro-vada. E a área econômica do governo reti-rou das fontes que o Ministério possuía umvalor maior do que o que a CPMF trouxe.

Ana Maria Malik: Recentemente, saíramnotícias dizendo que a CPMF, que deve-ria ser encerrada esse ano, foi prorroga-da por mais dez anos.

Adib Jatene: Claro, agora não podem reti-rar essa contribuição. Ela virou fonte. Fazparte do orçamento da União e, embora

ajude a compor o orçamento do Ministé-rio, não está mais vinculada. O que está vin-culada é a parcela da União da Emenda 29.

Mas o que aconteceu foi o seguinte: ocompromisso de manter o orçamento de1995 em valor real não foi cumprido. Istoé, se analisarmos o valor real de 1995 a2004, sem a CPMF, não houve nenhumcrescimento. Quer dizer, estamos, hoje,com valores de 1995. Se considerarmos ainflação do IPC da Fipe, houve, nesse pe-ríodo de dez anos, uma inflação de 130%.Pode-se concluir que esse orçamento, paraser igual ao de 95, precisa de umacorreção de 130%. A situação fica aindamais grave se utilizarmos como índice decorreção o Índice Saúde da Fipe - que nes-se período é de mais de 200% - o que re-presenta mais que uma duplicação do or-çamento referente ao ano de 1995. Seagregarmos as parcelas da CPMF, verifica-remos que há uma imensa perda, compa-rada com os orçamentos executados.

Só para mencionar alguns números: se uti-lizarmos como índice de correção o IPC, aperda é de cerca de R$ 80 bilhões. Se utili-zarmos o Índice de Saúde, chega perto deR$ 120 bilhões que deixaram de seraportados ao Setor da Saúde. O que signi-fica uma perda brutal. E é nessa situaçãoque o Sistema está.

Se compararmos a evolução do orçamen-to da Previdência Social nesse período,se não me engano, a Previdência Socialgastou, em 1995, alguma coisa perto deR$ 32 bilhões. Atualmente, gasta pertode R$ 160 bilhões. A dívida interna, em1995, era de R$ 60 bilhões e, hoje, é deR$ 1 trilhão.

Quando dizem que Saúde tem muito di-nheiro e não falta recurso, mas gestão, tra-ta-se de uma falácia. Falta dinheiro. Se nóstivéssemos um orçamento com os valoresde 1995, corrigidos pelo Índice Saúde agre-gado à CPMF, teríamos, pelo menos, R$ 15bilhões a mais do que o que foi gasto em2004. É essa diferença está fazendo falta.

Ana Maria Malik: Quer dizer, o senhor temcerteza de que, para viabilizar o setor públi-co, nesse momento é preciso dinheiro?

Adib Jatene: Sim, o dinheiro é fundamen-tal para viabilizar as ações. Tomemos comoexemplo a cidade de São Paulo. Em 1999,demonstrei que em 39 distritos na capital,que somam cerca de quatro milhões depessoas, não existiam leitos hospitalares. Emoutros 32 distritos (com três milhões e no-vecentas mil pessoas), existiam 1,2 leito pormil habitantes. Enquanto isso, em 11 dis-tritos com 600 mil habitantes existem 26leitos por mil habitantes e em 14 distritos,onde vivem 1,2 milhão de habitantes, exis-tem 6 leitos por mil habitantes. Como seresolve um problema desses?

Álvaro Escrivão Júnior: Professor, comoé que o senhor analisa a questão da di-ficuldade da expansão do acesso a ser-viços hospitalares, quando existem al-guns hospitais que não param decrescer, como é o caso do Hospital SãoPaulo e do Hospital das Clínicas?

Adib Jatene: Quando era Secretário, fizum estudo para essa questão. Minha pro-posta era que se proibisse construir novosleitos nas áreas já servidas enquanto nãose colocasse, pelo menos, dois leitos pormil habitantes na periferia. Naquela épo-ca, criei uma frase que eu repito:"O pro-blema do pobre não é ele ser pobre; é oamigo dele ser pobre". Porque ele não temcomo falar com quem toma as decisões.O paciente pobre não marca audiência,não faz o projeto, não negocia o financia-mento. Os que têm amigos que estão nogoverno conseguem porque, na verdade,quem tem poder de reivindicação é umaparcela da sociedade que deseja para si onível de atenção que existe nos países doPrimeiro Mundo. É por esse motivo quenós temos essa rede de hospitais. Os hos-pitais estão todos concentrados em dez,onze distritos da capital - dos noventa eseis existentes. Em que, coincidentemen-te, encontra-se a população de mais altarenda. Esse é o poder verdadeiro. O políti-co não está pensando na população; elepensa na população na época de eleição,quando precisa de voto. Mas, no exercíciodo mandato, ele se rende àquela parcelada população que tem maior poder deargumentação e que quer o nível existen-te no Primeiro Mundo.

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AUDITORIA E REGULAÇÃO EM SAÚDE

Márcio Vinicius Balzan,Pesquisador associado do Gv Saúde, Assessor para assuntos de auditoria no Sistema Unimed.

A busca de um novo paradigma

Omercado de saúde brasileiro apre-senta características singulares porser composto, de um lado, pelo sis-

tema público de saúde e, de outro, pelo sis-tema privado. O sistema público é conheci-do como Sistema Único de Saúde - SUS - esua gestão é realizada pelas três esferas degoverno (federal, estaduais e municipais). Se-gundo dados de 2005, a União gastou R$59 bilhões com todos os seus programas desaúde, enquanto os estados e municípiosdespenderam outros R$ 26 bilhões, resultan-do em algo próximo de R$ 530,00 por brasi-leiro/ano, quantia considerada insuficientepelos especialistas da área. Junto a este sis-tema, há o de saúde suplementar, compos-to pelas Operadoras de Planos de Saúde(OPS), que oferece cobertura a 38,5 milhõesde beneficiários, 67% dos quais residentesna Região Sudeste. Este sistema movimentaperto de R$ 35 bi/ano.

As operadoras de planos de saúde se subdi-videm em empresas de medicina de grupo,cooperativas médicas, cooperativasodontológicas, empresas seguradorasespecializadas em saúde, empresas deautogestão e administradoras de planos desaúde. Cada uma delas opera modalidadesdiferentes de gestão, porém utiliza a audito-ria de serviços médico-hospitalares de ma-neira muito parecida.

A participação de cada segmento pode serverificada no gráfico a seguir, considerandoapenas as empresas que oferecem planosmédicos. O segmento "filantropia" registra-do no Gráfico 1 refere-se a planos de saúdeoferecidos por entidades privadas, sem finslucrativos, certificadas como entidades filan-trópicas junto ao Conselho Nacional de As-

Júlio César Cristofoli,Pesquisador associado do Gv Saúde.

sistência Social (CNAS), com operação seme-lhante às empresas de medicina de grupo eatuação preferencialmente local.

Este mercado funcionou durante muitos anossem legislação específica, prevalecendo cri-térios unilaterais sempre a favor das opera-doras, em detrimento das necessidades dosbeneficiários. O ano de 1998 foi o marcoregulatório deste sistema, definido pela Lei9656/98, que passou a regular as OPS e osplanos de saúde. No ano 2000, foi criada aAgência Nacional de Saúde Suplementar(ANS), com o principal objetivo de protegeros beneficiários, garantindo-lhes coberturase proibindo a unilateralidade das ações pe-las diversas operadoras.

Fazendo-se uma rápida análise do panora-ma deste mercado de saúde brasileiro, pode-se dizer que 35,5% dos beneficiários dos pla-nos de saúde são portadores de planosantigos, ou seja, não regulamentados combase na Lei 9656/98. 70,8% dos planos são

Gráfico 1: Distribuição percentual dos beneficiários de planosde assistência médica, por modalidade de operadora

(ANS, 2006)

Fonte: ANS/MS, 09/2006

coletivos (quase sempre contratados porempresas). Finalmente, quanto à sua cober-tura, 57,7% deles oferecem cobertura hos-pitalar e ambulatorial, 15,9% assistênciaodontológica e apenas 11,7% são planosreferência que oferecem ampla cobertura.

Embora a regulamentação setorial tenha sidopositiva para acompanhar a dinâmica dedesejos desta sociedade, trouxe novos cus-tos à operação dos planos de saúde, ampli-ando garantias e direitos dos beneficiários eo controle restritivo de preços no segmentoindividual, obrigando as OPS a buscarem res-postas inovadoras e estratégias criativas parasua sustentabilidade.

O objetivo principal deste artigo é discutir asnovas atribuições da auditoria de serviçosmédico-hospitalares neste mercado, cujasinistralidade média está em torno de 83%,posicionando-a como uma das principais fer-ramentas para os gestores em saúde. A au-ditoria permite associar a ação fiscalizadora

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 5

ENTREVISTA

Ana Maria Malik: Considerando sua ex-periência no setor público de saúde,como Secretário do Estado de São Pau-lo e Ministro da Saúde, qual a sua visãosobre a viabilização do setor?

Adib Jatene: Eu tenho discutido muitosobre os motivos pelos quais a saúde che-gou à situação atual. Primeiramente, caberessaltar que, para a elaboração de qual-quer proposta de solução, há necessida-de de um diagnóstico. E o diagnósticodas dificuldades da Saúde é bem claro,está baseado na urbanização aceleradado País. Em 1950, as cidades brasileiras,somadas, que possuiam cerca de 18 mi-lhões de habitantes, têm, atualmente, maisde 150 milhões. Esse crescimento ocor-reu com base numa população de baixonível educacional, baixa capacidadecontribrutiva e baixo nível tecnológico.Ou seja, uma população que não conse-gue contribuir para a provisão dos servi-ços de que necessita. Isso resultou noacúmulo de grandes massas popu-lacionais morando em regiões onde osprofissionais de saúde de que elas neces-sitam não estão disponíveis, principal-mente porque não aceitam morar nessasregiões. Daí vem um grande esforço parapermitir a essa população o acesso aoatendimento médico-hospitalar.

Enquanto existirem as grandes massas depopulação uniformemente pobres, mo-rando em bairros e em municípios pobres,fica muito difícil conseguir levar a essaspopulações o acesso ao atendimento.Essa é a primeira complicação. A segun-da está relacionada com o fato de essaspopulações morarem longe dos locais detrabalho, gerando um problema de trans-porte quase insolúvel.

Por outro lado, ocorreu um grande desen-volvimento científico e tecnológico a partirde 1953, quando a biologia molecular teveinício - até então, a biologia era celular (de-pois da descoberta da estrutura mestra, odenominado DNA, a biologia passou a sermolecular). Veio então a engenharia gené-tica, a fertilização in vitro, o desenvolvimen-to de equipamentos de diagnóstico, novastécnicas cirúrgicas, em suma, um volumeenorme de avanços que são de difícil incor-poração no atendimento à grande massada população.

Cabe ressaltar que a deflagração da corridaespacial, em 1957, foi o gatilho para o de-senvolvimento tecnológico, pois surgiramvárias necessidades: de controlar os sinaisvitais do homem no espaço, de comunica-ção, além de todo um arsenal de diagnósti-co. Ao mesmo tempo, houve um grandeavanço científico na área de medicamen-tos. Quando eu me graduei, não existiammedicamentos como os antialérgicos,diuréticos, ansiolíticos, entre outros. Eramdrogas que vinham das formas naturais.Poucos medicamentos eram sintetizados.Acredito que somente os antibióticos eramsintetizados. Com todas essas inovaçõestecnológicas, houve uma elevação extraordi-nária dos custos, o que precipita uma difi-culdade de equacionamento no atendimen-to à população de baixa renda.

Adicionalmente, há incidência de doençascausadas por agentes não biológicos: asdoenças decorrentes das deficiências so-ciais; o inadequado fornecimento de água,esgoto, habitação, alimentação, salário,lazer, transporte, segurança; problemas eco-lógicos decorrentes da produção deherbicidas, pesticidas, poluição, etc. Todasessas inadequações geram um clima no qual

o Setor da Saúde, que possui uma capaci-dade bem limitada de recursos destinadospara o atendimento, muito além das suasforças, não consegue satisfazer as neces-sidades da população.

Ana Maria Malik: Considerando todas asdificuldades mencionadas, como o senhorvê a possibilidade de manter o Setor?

Adib Jatene: Se considerarmos que a gran-de maioria da população não tem capaci-dade de prover sua assistência à saúde, estadepende, portanto, do setor público. Cabeentão ao setor público equilibrar a situa-ção. O problema é que o poder públicodesconhece aritmética. Aritmética é umacoisa importantíssima; você não pode fugirdesta questão. É necessário saber quantocusta a assistência e, mais importante, di-zer de onde vem o dinheiro. Mas, no Brasil,criou-se a idéia de que, para fazer o atendi-mento, basta vontade política; que vonta-de política é um negócio que resolve qual-quer problema. Não resolve se não tiverdinheiro. Essa que é a grande dificuldade.

Recentemente, realizei um estudo baseadonas propostas que eu tinha feito em 1995e das perdas estimadas que tivemos, relati-vas ao não cumprimento dessas propostas.Nós tínhamos um orçamento do Ministérioperto de R$ 15 bilhões. Na época, a popu-lação era de cerca de 150 milhões de habi-tantes, daí o número de cem reais per capitacom o qual se trabalha há anos. Cem reaisper capita para fazer não apenas assistên-cia médico-hospitalar, mas para cobrir ser-viços de vigilância sanitária, epidemiológicae uma série de outras ações. Sobrava cercade 60% desse valor para a assistência mé-dico-hospitalar, ou seja, sessenta reais percapita. Esse valor era absolutamente insigni-ficante, sessenta reais per capita/ano,

Adib Domingos Jatene

Ana Maria Malik,Professora da FGV-EAESP e coordenadora do GVsaúde

Álvaro Escrivão Junior,Professor da FGV- EAESP e Coordenador Adjunto do GVsaúde

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Tabela 1: Despesas assistenciais (em R$) das operadoras deplanos de saúde, no período de 2001 a 2005

Gráfico 2: Distribuição das receitas dos hospitais - ANAHP 2006

à da regulação, propiciando uma estratégiade gestão para garantir ao cliente acesso aserviços de melhor qualidade, respeitandosuas necessidades e demandas em saúde epreservando o equilíbrio financeiro das OPS,buscando, idealmente, eficiência e coopera-ção entre os atores deste mercado.

O sistema suplementar de saúde brasileironão existe sem sua rede de prestadores deserviços, entre estes, hospitais, clínicasespecializadas, laboratórios e centros dediagnósticos por imagem. Estas organiza-ções são fundamentais para o exercício dasatividades assistenciais, apresentando re-lação de interdependência e conflitos cons-tantes entre elas.

Segundo dados de 2006 da Associação Na-cional dos Hospitais Privados (ANAHP),89% das receitas desses hospitais são ob-tidas com os planos de saúde ou convê-nios médicos, 9% de particulares e 2% doSUS. Trata-se de um mercado estagnadoem que a sustentabilidade do sistema de-pende da capacidade de pagamento dosclientes cujo crescimento está relacionadoao nível de emprego, à disposição dasempresas em investir ou não no benefíciosaúde dos seus colaboradores e ao rela-cionamento entre prestadores e operado-ras, visando à otimização na utilização dosrecursos e no controle dos custos. Estestêm crescido, segundo mostra a tabela 1da ANS. Observou-se 68% de aumento nasdespesas assistenciais, decorrentes não sóda inflação inerente ao setor da saúde,mas, principalmente, pelas novas cober-turas exigidas pela Lei 9656/98.

Denominador comum destes sistemas é ograu de tensão trazido pelos beneficiáriosdesejosos de uma maior coberturaassistencial, mais qualidade e livre escolhanos atendimentos e, no caso particular dosistema de saúde suplementar, prêmiosmensais mais acessíveis. Os prestadores deserviços querem ganhar mais, a renda dasfamílias brasileiras não tem subido alémde 1,5% ao ano desde os anos 1990 e,segundo análises do IPEA com base nosdados do IPCA/IBGE, a inflação na saúderegistrou elevação de 36% entre 2001 e2006.

Fonte: ANS/MS, 11/2006

Como parte deste cenário, desde osprimórdios da organização das OPS, na dé-cada de 70, a auditoria (médica) veio de-senvolvendo suas funções fiscalizatórias,primeiramente, apenas utilizando serviçosde médicos, e, desde 1990, também fa-zendo uso de enfermeiros. Algumas ope-radoras também contam com o auxílio defarmacêuticos para este tipo de atividade.Os métodos de trabalho da auditoria nasaúde suplementar eram os mesmos de-senhados no âmbito do Ministério da Saú-de. Somente a partir de 1998 suas estra-tégias e métodos de trabalho passaram aser diferenciados daqueles empregadospelo Sistema Nacional de Auditoria (SNA),do Ministério da Saúde.

A ação principal da auditoria era apenasfiscalizatória e, na sua maior parte, retros-pectiva, com a verificação de prontuáriose faturas praticadas apenas após a alta dospacientes, tendo como intenção funda-mental coibir fraudes contra o sistema. O

método era chamado de "auditoriaitemizada" de contas médico-hospitala-res e tinha como objetivo específicoidentificar os excessos e puní-los comglosas, ou seja, com o não-pagamentodo que era considerado não-justificado.Este método vem sendo utilizado atéhoje, mas não tem conseguido alcançarresultados mais expressivos, tornando-se necessário desenvolver novos focos deatuação. Segundo a ANAHP, em balan-ço do período de 2002 a 2005, as glo-sas representaram em média 3,7% dascontas dos seus afiliados. Em outros ser-viços não afiliados à ANAHP esta médianão se altera.

Não é difícil entender a necessidade porserviços de auditoria analisando-se o grá-fico 2, no qual 73% das receitas dos hos-pitais são provenientes das cobranças dediárias, taxas e comercialização de materi-ais e medicamentos com alto grau de di-versificação.

Fonte: ANS/MS, 2006

(SADT: serviços de diagnóstico como laboratório e imagem, entre outros)

2001 2002 2003 2004 2005

16.890.544.549,00 19.623.035.104,00 22.284.507.847,00 25.330.501.916,00 28.436.976.505,00

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 20074

EDITORIAL

OCadernos FGV Projetos com otema Gestão & Saúde é a terceiraedição desta publicação, uma ini-

ciativa da FGV Projetos, unidade deconsultoria da Fundação Getulio Vargas,que busca disseminar o conhecimento deseus profissionais, através da abordagemde temas de relevância nacional.

O Núcleo de Saúde da FGV Projetos écomposto por Coordenadores de Projetoe Consultores, além de professores daEAESP e EBAPE - Escolas de Administra-ção da FGV de São Paulo e do Rio de Ja-neiro, pesquisadores, colaboradores,voluntários e ex-alunos. Esses profis-sionais conduziram a elaboração desteCaderno que traz uma entrevista inéditae artigos que tratam de questões e desa-fios dos Gestores de Saúde no Brasil.

O entrevistado é o Prof. Adib DomingosJatene, um verdadeiro notável da Saúde,reconhecido como um dos maiores cirur-giões cardíacos do País. Já foi Secretário

de Estado da Saúde de São Paulo, Minis-tro da Saúde, participou da gestão do Ins-tituto do Coração, do Instituto DantePazzanese de Cardiologia e hoje está naDireção Geral do Hospital do Coração.Além disso, está entre os maiores respon-sáveis pela formação de profissionais paraa área de Cardiologia e Cirurgia Cardíacado Brasil e da América Latina.Sua visãosobre o sistema de saúde, mais do que ade uma testemunha da história, é forma-da com base na experiência de quempode ser considerado um de seus atoresmais influentes.

Os artigos tratam de questões relevantestanto para o setor público quanto para oda Saúde Suplementar. Ambas as áreasapresentam grandes desafios para os ad-ministradores, no sentido de oferecer me-lhores condições de assistência à popu-lação brasileira.

Os temas auditoria e indicadores, tam-bém foram levantados, visto que são ins-

trumentos indispensáveis aos gestorespúblicos e privados. A competência daFGV nessas áreas é reconhecida nacional-mente, em função dos projetos e cursosoferecidos em todo Brasil.

Como nas atividades da FGV Projetos, naárea de Saúde, todos os setores são con-templados, desde a Gestão de Serviçosaté a Gestão de Sistemas de Saúde. A ex-periência de seus técnicos na prestaçãode serviços de consultoria; no alinhamen-to e na formação de gestores e em pes-quisas específicas, permite disponibilizaraos clientes serviços diferenciados e inte-grados, maximizando os resultados de-sejados.

A expectativa é que a terceira edição dapublicação Cadernos, da FGV Projetos,este número com o tema Gestão & Saú-de, possa mais uma vez cumprir com aprincipal missão da Fundação GetulioVargas, de contribuir para o desenvolvi-mento nacional.

DiretoriaFGV Projetos

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O mecanismo de remuneração vigentepara a maioria dos prestadores privilegiaganhos na comercialização de materiais emedicamentos utilizados para pacientesinternados, premiando o consumo (quan-to mais se utiliza mais se ganha). Os médi-cos são pagos segundo a modalidade feefor service, ou seja, remuneração por ser-viços prestados, no qual quanto mais sefaz, mais se fatura.

O resultado final é que os participantes nãosão remunerados pela qualidade e efeti-vidade das suas ações ou serviços presta-dos, premiando o consumo indis-criminado e facilitando o repasseeconômico de eventuais ineficiênciasgerenciais por parte dos prestadores.

Quais os novos enfoques?

Em primeiro lugar, sugere-se deslocar ofoco da conferência de contas de serviçosmédico-hospitalares, deixando de lado asações fiscalizatórias da auditoria, substi-tuindo-as pela avaliação da qualidade dosserviços prestados e da efetividade dosatendimentos nos diversos níveis de com-plexidades. Isto não implica no abandonoda fiscalização, mas eventualmente noredirecionamento de sua ênfase. Os tra-

balhos da auditoria em saúde deverão serdirecionados para as questões relativas àadequação do acesso e da qualidade dosserviços prestados, não apenas daquelesque envolvem altos valores ouexcepcionalidades, mas também tratan-do os serviços como parte integrante deum sistema com níveis diferentes de com-plexidade, no qual todos os níveis de as-sistência devem ser acompanhados, daíresultando em informações a serem apli-cadas na regulação da hierarquização eda uti l ização de todos os serviçosdisponibilizados nos sistemas.

Dificuldade maior será focalizar um tra-balho muito abrangente, considerandodiversos fatores intervenientes, entre osquais a modalidade de vinculação ao pla-no (benefício empresarial ou plano indi-vidual, regulamentado ou antigo), avinculação organizacional do participan-te (executivo ou operário), o gênero (mas-culino ou feminino), sua idade e localiza-ção geográfica, além das análises dasofertas de serviços existentes nas regiões.

O gráfico 3 mostra uma comparação en-tre as pirâmides populacionais do Brasile dos beneficiários de planos de saúde.Enquanto a pirâmide etária brasileira

Gráfico 3 : Pirâmide etária da população brasileira e de beneficiários deplanos de assistência médica

Fonte: Sistema de informações de beneficiários ANS/MS, 2006; População Estimada IBGE, 2005.

mostra tendências de mudanças na suaforma, decorrentes do envelhecimento dapopulação geral, a pirâmide etária dosbeneficiários de planos de saúde já semostra no formato de países de primeiromundo, ou seja, população com faixasetárias proporcionalmente mais elevadas.

Essa realidade tem trazido novos focosde preocupação para os gestores da saú-de suplementar, obrigando-os a buscar aassociação da auditoria em saúde com aepidemiologia gerencial para modelagemde novos produtos e redimensionamentode um novo desenho da rede assistencial,a fim de garantir acesso a serviços de altocusto e alta complexidade.

Abre-se também um novo foco para osauditores da área com a discussão sobrea incorporação de novas tecnologias emsaúde, as quais têm custo de produçãoinicial elevado e incorporação precocepelos prestadores no rol de diagnósticos,sem avaliação do custo-efetividade.

Este tem sido um dos aspectos mais for-tes da atuação da auditoria na regulação,uma vez que as novas tecnologias geramgrandes impactos financeiros na sua ado-ção. De fato, diz-se que a oferta gera sua

Page 30: Cadernos FGV Projetos nº 3 - Gestão & Saúde

GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 3

GESTÃO & SAÚDE

EDITORIAL ........................................ 4

ENTREVISTA ...................................... 5

SETOR PÚBLICO .............................. 12

GESTÃO .......................................... 14

GESTÃO NA

SAÚDE SUPLEMENTAR .................... 16

TECNOLOGIA .................................. 20

INDICADORES .................................. 23

AUDITORIA E

REGULAÇÃO EM SAÚDE ................. 27

DESTAQUES REGULATÓRIOS .......... 31

Publicação periódica do Núcleo de Saúde da FGV Projetos.Os artigos são de responsabilidade dos autores e não refletem, necessariamente,a opinião da FGV.

FGV Projetos

Diretor Executivo: Cesar Cunha CamposDiretor Técnico: Ricardo SimonsenDiretor de Controle: Antonio Carlos Kfouri Aidar

Editor Chefe: Ricardo SimonsenEditora Executiva: Ana Maria MalikCoordenadoras: Cecilia Helena Goia e Viviane Jaeger BomfimProdução Gráfica: Marcelo AltFotos: Banco de Imagens

Instituição de caráter técnico-científico, educativo e filantrópico,

criada em 20 de dezembro de 1944 como pessoa jurídica de direito

privado, tem por finalidade atuar no âmbito das Ciências Sociais,

particularmente Economia e Administração, bem como contribuir

para a proteção ambiental e o desenvolvimento sustentável.

Sede: Praia de Botafogo, 190, Rio de Janeiro – RJ, CEP 22253-900 ou Caixa Postal62.591 - CEP 22257-970, Tel.: (21) 2559-5729 , www.fgv.br

Primeiro Presidente Fundador: Luiz Simões Lopes

Presidente: Carlos Ivan Simonsen Leal

Vice-Presidentes: Francisco Oswaldo Neves Dornelles, Marcos Cintra Cavalcantede Albuquerque e Sérgio Franklin Quintella

Conselho Diretor:

Presidente: Carlos Ivan Simonsen Leal

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Vogais: Armando Klabin, Carlos Alberto Pires de Carvalho e Albuquerque, ErnaneGalvêas, José Luiz Miranda, Lindolpho de Carvalho Dias, Manoel Pio Correa Júnior,Marcílio Marques Moreira e Roberto Paulo César de Andrade

Suplentes: Alfredo Américo de Souza Rangel, Antônio Monteiro de Castro Filho,Cristiano Buarque Franco Neto, Eduardo Baptista Vianna, Félix Debulhões, JacobPalis Júnior, José Ermírio de Moraes Neto, José Júnior de Almeida Senna eNestor Jost

Conselho Curador:

Presidente: Carlos Alberto Lenez César Protásio

Vice-Presidente: Pedro José da Matta Machado (Klabin Irmãos & Cia)

Vogais: Alexandre Koch Torres de Assis, Carlos Alberto Vieira (FederaçãoBrasileira de Bancos), Carlos Moacir Gomes de Almeida, Domingos Bulos (WhiteMartins e Gases Industriais Ltda.), Edmundo Penna Barbosa, Eraldo Tinoco Melo(Estado da Bahia), Heitor Chagas de Oliveira, Jorge Gerdau Johannpeter (GerdauS.A), Lázado de Mello Brandão (Banco Bradesco S.A), Luiz Appolonio Neto(Instituto de Resseguros do Brasil – IRB), Luiz Chor (Chozil Engenharia Ltda.),Luiz Eduardo Alves de Assis (Banco CCF Brasil S.A), Luiz Tavares Pereira Filho(Sindicato das Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e de Ressegurosno Estado do Rio de Janeiro), Marcelo Serfaty, Márcio João de Andrade Forte,Mauro Salles (Publicis Salles Norton), Nicandro Durante (Souza Cruz S.A), SérgioRibeiro da Costa Werlang

Suplentes: Alzira Alves de Abreu, Gilberto Duarte Prado, João Pedro GouveiaVieira Filho (Refinaria de Petróleo Ipiranga S.A), Luiz Roberto Nascimento Silva,Marcelo José Basílio de Souza Marinho (Brascan Brasil Ltda.), Ney Coe de Oliveira,Nilson Teixeira (Banco de Investimento Credit Suisse S.A), Patrick de LarragoitiLucas (Sul América Companhia Nacional de Seguros), Paulo Mário Freire (UniversalComércio e Empreendimentos Ltda.), Pedro Henrique Mariane Bittencourt (BancoBBM S.A), Rui Barreto (Café Solúvel Brasília S.A), Titto Botelho Martins (KMMineração e Metalurgia S.A)

Conselho Consultivo: Cesar Cunha Campos, Daniel Dantas, Eliezer Baptista,Estado de Minas Gerais, Fernando Perrone, Geraldo José Carbone, Luiz Fernandoda Silva Pinto e Roberto Gusmão.

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própria demanda e que as tecnologias nasaúde são cumulativas e não substitutivas,obrigando as OPS a manterem seus audi-tores focados nos estudos de custo-efetividade, a fim de racionalizarem a suautilização.

Outros usos da auditoria:� Atuar como fonte de informação

qualitativa de sinistros, utilizadacomo base para ações de prevençãono caso de doenças já instaladas ede seus agravos, bem como de pro-gramas de promoção à saúde. Osserviços de auditoria estão entre asprincipais fontes de captação debeneficiários portadores de patolo-gias crônicas para estes programas;

� Acompanhar os atendimentosambulatoriais e hospitalares, comvistas à avaliação da performancedas várias equipes, orientando nasrenovações contratuais e exercen-do sua função reguladora na utili-zação dos mesmos;

� Utilizar os bancos de dados existen-tes nas diversas OPS e assessorar o

desenvolvimento de gabaritos cirúr-gicos e de procedimentos diagnós-ticos, alterando a forma de remu-neração dos prestadores de ser-viços, compartilhando o risco dasatividades;

� Assessorar, em conjunto com aepidemiologia gerencial, as opera-doras de planos de saúde na esco-lha do melhor pacote de coberturase benefícios para os beneficiários, le-vando em consideração estudospopulacionais e projeções de neces-sidades;

� Realizar um trabalho integrado comas áreas de controle e creden-ciamento, fornecendo bases pararenovações e negociações de novoscontratos e tabelas com prestadoresde serviços, elaborando projeçõesde custos dos atendimentos previ-amente ao fechamento do contra-to, caminhando para uma novamodalidade de contratação, o cha-mado contrato por preço global,ainda não implantado como praxeno País;

� Elaborar o desenvolvimento de estu-dos para a adoção de diárias globais etaxas compactas nas tabelas hospita-lares, alterando a forma de remunera-ção, oferecendo previsibilidade de des-pesas e agilidade no faturamento, eprivilegiando o aprimoramento técni-co, resultando em melhor assistênciae gestão hospitalares.

A realidade do mercado de saúde exigemudanças rápidas nas atividades da audi-toria de serviços, ampliando as suas res-ponsabilidades, educando e aprimorandoconstantemente os seus integrantes, incen-tivando-os a buscar formas criativas deatuação, a participar da gestão do siste-ma de saúde como um todo, interagindocom todas as áreas envolvidas e focandomais as atividades de regulação com aconstrução de novas formas decontratualização e avaliação, com o obje-tivo de otimizar a utilização do sistema,melhorar a qualidade dos resultados ealcançar a satisfação dos beneficiários.

Page 31: Cadernos FGV Projetos nº 3 - Gestão & Saúde

GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 20072 31

Participação Complementar dos ser-viços privados de assistência à saú-de no âmbito do Sistema Único deSaúde (SUS)

Baseada nas demandas sinalizadaspela Constituição Federal (art. 30,inciso VII) e pela Lei Orgânica da Saú-de (art. 18, inciso I, e art. 17, incisoIII), que explicita a necessidade de "ela-borar normas para regular as açõesentre o Sistema Único de Saúde (SUS)e os serviços privados de assistência àsaúde", foi instituída a portaria nº3.277, de 22 de dezembro de 2006.Entre os objetivos da portaria, desta-ca-se a uniformização das contrataçõesrealizadas pelos gestores do SUS (mu-nicípios e estados de forma suplemen-tar). A portaria detalha algumas con-siderações sobre a natureza jurídica dasinstituições correlacionadas com os ins-trumentos de vínculos (convênios, con-tratos administrativos e contrato degestão), além de mencionar algumascláusulas necessárias nos convênios econtratos firmados entre a administra-ção pública e a privada.

DESTAQUES REGULATÓRIOS

Vanessa Chaer Kishima,pesquisadora associada do GVsaúde

Programa de qualificação da Saú-de Suplementar

Por meio da Resolução NormativaRN nº 139, de 24 de novembro de 2006,a ANS (Agência Nacional de Saúde Su-plementar) divulgou os dados obtidosna segunda fase do Programa de quali-ficação da Saúde Suplementar. A idéiacentral do Programa é o reconhecimen-to da saúde suplementar como local deprodução de saúde, considerando asoperadoras de planos como gestoras. OPrograma contempla ainda uma quali-ficação interna da ANS para respondermais adequadamente à tarefa de regu-lar o setor. Cabe ressaltar que existemmuitos questionamentos por parte dasoperadoras avaliadas sobre a pertinênciados indicadores utilizados, principalmen-te daqueles que dependem exclusiva-mente do desempenho dos prestadores,pois as mesmas alegam não tergovernabilidade sobre a atuação dosprestadores. Mais informações, junta-mente com os indicadores das opera-doras, encontram-se disponíveis no sitewww.ans.gov.br.

Emenda 29

Apesar de ter sido aprovada emsetembro de 2000, a Emenda 29 nãofoi regularizada até hoje pelo Congres-so Nacional, sendo que a última ma-nifestação para sua regulamentaçãoaconteceu em abril de 2006. Algunsanalistas sugerem que a não regula-mentação da Emenda favorece a exis-tência de diferentes interpretações so-bre os itens que compõem as despesascom o setor saúde. Cabe ressaltar queesse fato interfere diretamente na su-pervisão e controle dos entes que nãocumprem os limites mínimos de gas-tos de saúde estabelecidos pela Emen-da. O acompanhamento dessa Emen-da é realizado pelo SIOPS (Sistema deOrçamentos Públicos em Saúde) epelos Tribunais de Conta. Os dadosconsolidados de todas as esferas degoverno até o ano 2005 encontram-se no site http://siops.datasus.gov.br.

Padronização de Informações doSetor Suplementar de Saúde

Foi prorrogado o prazo para a to-tal implantação do modelo unificadopara a troca de informações entre ope-radoras e prestadores. O processo come-

çou de forma gradual em novembro de2005, a partir da publicação da ResoluçãoNormativa 114 da Agência Nacional deSaúde Suplementar, que colocou prazosdistintos para o tipo de instituição, sendoque as operadoras, hospitais e pronto-so-corros possuíam o prazo de 270 dias, as

clínicas, de 360 dias, e os consultórios,de 720 dias. A ANS divulgou, em feve-reiro de 2007, que o prazo se estenderáaté o ano de 2008, dadas as dificulda-des encontradas pelas operadoras eprestadores de serviços. Mais informa-ções no site www.ans.gov.br.

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GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007GESTÃO & SAÚDE ABRIL 2007 1

Indicadores de Desenvolvimento Econômico eSocial do Estado do Rio de Janeiro

1997/2006

1

GESTÃO & SAÚDE CADERNOS FGV PROJETOS | ANO 2 | Nº 3 | ABRIL 2007

ENTREVISTA

Adib Domingos JateneARTIGOS

• Gestão Pública em Saúde

• O Gerenciamento da Saúde-Brasileira

• Desafios para as empresas contratantes epara as operadoras de planos de saúde

• Incorporação Tecnológica na Área de Saúde

• Os Indicadores e a gestão da assistêncianos serviços de saúde

• Auditoria e Regulação em SaúdeA busca de um novo paradigma

• Destaques Regulatórios

32

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