Cap 01 Hemograma

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1 HemogrAmA INTROduçãO E FILOsOFIA dE TRABALHO O hemograma é o exame que avalia quantitativa e qualitativa- mente os elementos celulares do sangue. É o exame complementar mais requerido nas consultas, fazendo parte de todas as revisões de saúde. Levantamentos feitos pelo autor evidenciaram repetidamente sua presença na lista de exames em cerca de 48% dos pacientes que coletaram sangue no laboratório. Essa preferência universal denota que o hemograma, além de fundamental na triagem de saúde, é co- adjuvante indispensável no diagnóstico e no controle evolutivo das doenças infecciosas, das doenças crônicas em geral, das emergências médicas, cirúrgicas e traumatológicas, e no acompanhamento de qui- mio e radioterapia, relacionando-se com toda a Patologia.  Além disso, o hemograma é a  Hematologia. O autor, com consul- tório de hematologia clínica anexo ao laboratório, sempre fez o hemo- grama contemporaneamente às consultas; com a tecnologia atual, em minutos. Inúmeras vezes, fez o diagnóstico pelo resultado do hemo- grama antes de questionar e examinar o paciente. Dispondo-se de facilidades para esse procedimento, uma longa elaboração diagnós- tica é abortada por um relance ao monitor do contador eletrônico, complementado ou não por um minuto de microscopia. A história e o exame físico, direcionados pela hipótese fundamentada, tornam-se rápidos e eficientes. Outros exames, se necessários, são escolhidos dentre os exatamente apropriados ao caso e geralmente feitos com o sangue já coletado; não há perda de tempo nem despesas inúteis. O paciente passa uma hora no consultório e, já da primeira consulta, e tendo gasto apenas com exames específicos para o caso, retorna para casa com o diagnóstico e o tratamento. No caso de tratar-se de uma

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1HemogrAmA 

INTROduçãO E FILOsOFIA dE TRABALHO

O hemograma é o exame que avalia quantitativa e qualitativa-mente os elementos celulares do sangue. É o exame complementarmais requerido nas consultas, fazendo parte de todas as revisões desaúde. Levantamentos feitos pelo autor evidenciaram repetidamentesua presença na lista de exames em cerca de 48% dos pacientes que

coletaram sangue no laboratório. Essa preferência universal denotaque o hemograma, além de fundamental na triagem de saúde, é co-adjuvante indispensável no diagnóstico e no controle evolutivo dasdoenças infecciosas, das doenças crônicas em geral, das emergênciasmédicas, cirúrgicas e traumatológicas, e no acompanhamento de qui-mio e radioterapia, relacionando-se com toda a Patologia.

 Além disso, o hemograma é a  Hematologia. O autor, com consul-tório de hematologia clínica anexo ao laboratório, sempre fez o hemo-grama contemporaneamente às consultas; com a tecnologia atual, em

minutos. Inúmeras vezes, fez o diagnóstico pelo resultado do hemo-grama antes de questionar e examinar o paciente. Dispondo-se defacilidades para esse procedimento, uma longa elaboração diagnós-tica é abortada por um relance ao monitor do contador eletrônico,complementado ou não por um minuto de microscopia. A história eo exame físico, direcionados pela hipótese fundamentada, tornam-serápidos e eficientes. Outros exames, se necessários, são escolhidosdentre os exatamente apropriados ao caso e geralmente feitos com osangue já coletado; não há perda de tempo nem despesas inúteis. Opaciente passa uma hora no consultório e, já da primeira consulta, etendo gasto apenas com exames específicos para o caso, retorna paracasa com o diagnóstico e o tratamento. No caso de tratar-se de uma

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hemopatia séria, sai, no ato, com pedido de internação no hospital

escolhido; quando as alterações hematológicas causais da consultaconfirmarem-se decorrentes de doença de outra especialidade, é de- volvido com um laudo ao colega que o enviou ou aos especialistasapropriados.

Essa prática simplista de hemograma no ato, tão gratificante,econômica e difícil de se igualar em outras especialidades, pois emnenhuma a biópsia é tão pouco invasiva e o exame tão rápido, deveser feita com especial atenção, já que o hemograma varia com a horae com as condições da coleta, discutidas na p. 28.

O hemograma atual é feito em contadores eletrônicos, que aspi-ram o sangue e fazem automaticamente todas as determinações emmúltiplos canais. As câmaras para contagem de glóbulos ao micros-cópio, a centrífuga de hematócrito, o colorímetro para hemoglobina,mesmo os contadores eletrônicos com um só canal de contagem ediluição externa do sangue a examinar são peças históricas, relegadasao museu do laboratório.

 Apesar da generalização da tecnologia eletrônica, ainda há sig-nificativa variação interlaboratorial, pois o hemograma depende daqualidade do equipamento, do grau de especialização do pessoal téc-nico, da filosofia de trabalho do laboratório e das tradições locais.Pode variar até por decisões político-econômicas, de acordo com aprocedência das requisições: em uma instituição fechada, pode haverum hemograma para o corpo clínico (p. ex., apenas o laudo originalda máquina eletrônica) e outro para pacientes e médicos de fora dainstituição. Para interpretar o hemograma, há necessidade do conhe-cimento da tecnologia empregada, dos parâmetros* fornecidos, da

maneira de expressar os resultados e da correlação com a Patologia – so-bre isso versa o presente livro.Os contadores eletrônicos fornecem um hemograma com todas

(ou várias dentre) as determinações feitas diretamente (Tabela 1.1, A) e os parâmetros delas derivados por cálculo, pelo computador(Tabela 1.1, B). Algumas determinações só são fornecidas por equi-

* Os dados numéricos, tanto os gerados pelo contador eletrônico (p. ex., conta-gens de glóbulos, VCM, dosagem de hemoglobina), como os calculados a partirdestes pelo computador da máquina (p. ex., hematócrito, HCM, histogramas),foram inapropriadamente denominados  parâmetros pelos fabricantes desseequipamento. O termo consagrou-se pelo uso.

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TABELA 1.1

Componentes do hemograma

 A) deterinaõe feita iretaente pelo contaore eletrnico

EritrograaContagem de eritrócitos (E) em milhões (M)/µLDosagem de hemoglobina (Hgb) em g/dLMedida do volume dos eritrócitos em fL (média = VCM)Medida da concentração hemoglobínica individual dos eritrócitos (linha

 Advia)

Contagem de reticulócitos (Retics) em % e /µL (vários modelos top of line)Índices reticulocíticos: maturidade (pela carga de RNA), volume, concen-tração hemoglobínica (idem)Contagem de eritroblastos /100 leucócitos e /µL (idem)

LecograaContagem de leucócitos /µLFórmula leucocitária % e /µLPor volumetria (3 tipos celulares, em contadores de pequeno porte)Por volumetria e citometria em fluxo (5-9 tipos celulares e flags ouestimativas para células anormais, em contadores de grande porte)Determinação da fração leucocitária viável (WVF) (top of line da linhaCell-Dyn)Imunofenotipagem restrita ( software especial em alguns modelos top of line)

PlaqetograaContagem de plaquetas (Plaq.) /µLMedida do volume plaquetário (média = VPM) em fLContagem imunofenotípica das plaquetas (top of line da linha Cell-Dyn)Contagem de plaquetas reticuladas (top of line da linha Sysmex)

B) Parâetro erivao pelo coptaor

Hematócrito (Hct): VCM x EHemoglobina corpuscular média (HCM): Hgb ÷ E

Concentração hemoglobínica corpuscular média (CHCM):HCM ÷ VCM (ou Hgb ÷ Hct)

Média (CHCM) e desvio-padrão (HDW) das concentrações hemoglobínicascorpusculares individuais (linha Advia)Conteúdo hemoglobínico dos reticulócitos (HCr) (linha Advia)

Histogramas: curvas de frequência do volume corpuscular(dos eritrócitos) e de diversos outros parâmetros

(Continua)

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pamento de uma procedência ou só pelos modelos mais sofisticados(top of line) de uma ou várias linhas. Algumas são eletivas (feitas sobcomando do operador), outras exigem software especial. Apesar daexcelência da tecnologia, a microscopia persiste necessária em signifi-cativa fração de casos; as máquinas apontam suas próprias dúvidas( flags = avisos), tanto na exatidão das cifras como na identificaçãodas células, e todas devem ser esclarecidas; e as máquinas não veemtudo, e algo do que não veem pode ser clinicamente relevante. Déca-

das de prática diária e amplo conhecimento de Patologia são requisi-tos indispensáveis para o hematologista-laboratorista desincumbir-se a contento dessa tarefa.

Todos os contadores atuais fazem um conjunto de determina-ções básicas, que inclui eritrograma completo e contagens de leucóci-tos e plaquetas. Quase todos os modelos de pequeno porte fazem, aomesmo tempo, uma fórmula leucocitária simplificada (de três tiposcelulares), que deve ser completada pela microscopia. Contadores

eletrônicos de grande porte (e alto preço) fazem uma fórmula leuco-citária completa, com cinco ou seis tipos celulares e outros, apresen-tados como flags; usando-se esses contadores, a microscopia é restritaa hemogramas alterados.

 A visão abrangente de um médico-hematologista, com vida pro-fissional dividida entre a clínica e o laboratório, adiciona um toque deespecialista à numerologia de alta precisão das máquinas eletrônicas:uma sequência de hemogramas transforma-se em uma poderosa listaque suscita hipóteses clínicas e complementações diagnósticas. Médi-

cos com essa ambivalência estão se tornando raros; a pós-graduaçãoem Hematologia não contempla a Patologia Clínica respectiva, dedi-cando-se quase que exclusivamente à oncologia hospitalar. Nos Esta-dos Unidos e Europa, há hemopatologistas, que fazem, a um tempo,

 Amplitude de distribuição do volume corpuscular (RDW)

 Scatterplots da distribuição dos leucócitos

 Amplitude de distribuição do volume plaquetário (PDW)Plaquetócrito (Pct): VPM x Plaq (geralmente deletado)

 Alarmes ou avisos (flags) relativos às três séries

TABELA 1.1

(Continuação)

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Hemograma 25

anatomia patológica e patologia clínica do sangue e dos órgãos hema-

topoéticos; essa especialidade até hoje não se desenvolveu no Brasil.No laboratório, a presença desse hematologista em extinçãogera uma filosofia de trabalho: o fornecimento sistemático de resulta-dos elucidativos, não apenas de listas de números a interpretar. He-mogramas anormais só são fornecidos após elaborada tentativa deesclarecimento ou com sugestões de como esclarecê-los. Para tal fim,esse workaholic não se importa de ultrapassar os limites da requi-sição do médico e dos horários de trabalho. Na falta de dados quepermitam interpretação total, telefonemas aos médicos requisitantes,

para discussão, são largamente utilizados. Telefonemas aos pacientes,entretanto, devem ser usados com muita parcimônia e somente se omédico não for encontrado. Por exigirem diplomacia e autoridade,na opinião do autor, somente devem ser feitos pelo próprio médico-hematologista; como regra, geram gratidão e confiança, porém, noscasos em que são malconduzidos ou envolvem pacientes emocional-mente instáveis, podem gerar apreensão e desconfiança.

 A otimização dos serviços prestados nos termos dessa filosofiade trabalho não é subjetiva nem teórica; o autor a viu comprovada

diariamente em seus 50 anos de atividade profissional. As horas e osinsumos gastos com exames feitos a mais, com repetições para confir-mação, com telefonemas e informações, com discussões internas como pessoal da hematologia, não elevam o preço cobrado pelos exames,elevam só o custo. O ganho de qualidade é obtido às expensas darentabilidade financeira. Gastar-se o mesmo em marketing, ou no es-tabelecimento de relações participativas com médicos ou instituições,talvez fosse mais lucrativo, mas, na opinião do autor, a prática não se

coaduna com uma patologia clínica ética e produtiva: a rentabilidadefinanceira na prestação de serviços médicos não deve ser visada comoum fim, mas como um efeito colateral do inevitável sucesso dessafilosofia.

Do lado do médico requisitante, por sua vez, cria-se o dever daescolha consciente do(s) laboratório(s) que indicará aos pacientes.Sabendo que a referida filosofia, sustentada por uma tecnologia deponta, é tradicional em um laboratório e que não custa mais, é racio-nal e ético indicá-lo, preterindo outros. Afinal, é seu dever escolher o

que há de melhor para os pacientes! A comunicação frequente, escrita, fonada ou pela internet, geraum bom relacionamento recíproco, com compreensão e receptivida-de do médico aos resultados do laboratório. Resultados considerados

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pelo médico requisitante como duvidosos, improváveis ou incompatí-

 veis com os previstos, serão reconferidos após diálogo telefônico como patologista-clínico, fora da presença do paciente. Correções deverãoser aceitas com tolerância pelos médicos requisitantes se decorreremde má transcrição das cifras originais; em um laboratório, onde tran-sitam milhões de dígitos por dia, inevitavelmente algum terá emissãoerrônea não notada. Repetições serão combinadas quando se concluirpela improbabilidade de resultados; todas as reconferências deverãoser gratuitas. Ampliações de requisições médicas, com acréscimo deexames não pedidos, mas percebidos necessários pelo patologista-clí-

nico, são éticas e recomendáveis, mas só serão cobradas do pacientecom aquiescência do médico e por interferência deste.

REGIsTRO E PROCEssAmENTO dE dAdOs

 A manutenção da qualidade total nos laboratórios de patologiaclínica exige permanente controle, do cuidado nos registros iniciais ena identificação das amostras à conferência final e entrega dos resul-

tados. O registro de ingresso dos pacientes deve incluir nome comple-to e data de nascimento, telefone para contato, médico requisitante(digitado pelo número do Conselho Regional de Medicina), lista dosexames pedidos, observações ou comentários do médico (se houver),e os dados contábeis pertinentes. A identificação por código de barrasé sempre recomendável e indispensável em laboratórios grandes. Ocomputador abre um registro numerado para o paciente, distribui osregistros contábeis pelas contas das respectivas instituições requisi-

tantes e mantém a lista dos exames pedidos acessível no sistema atodas as seções técnicas. Exames anteriores do paciente, buscados nocomputador pelo nome e conferindo-se a data de nascimento paraevitar erros de homonímia, devem ser mantidos acessíveis por 3 a 5anos para permitirem comparações quando pertinentes.

 A transferência de resultados do contador eletrônico para ocomputador do laboratório, que emite os laudos finais, no caso de he-mogramas integralmente dentro dos limites de referência arbitradose sem  flags, deve ser feita por interfaciamento direto com as máqui-

nas, sem interferência humana. Com limites precisos e sensatamentedefinidos para hemogramas cujos resultados automatizados dispensemmelhor esclarecimento, esse procedimento zera os erros humanos de

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transcrição e impede a manipulação perigosa dos dados por pessoal

menos qualificado.No caso de hemogramas com interfaciamento rejeitado pela pre-sença de flags ou por cifras fora dos limites arbitrados, o autor sugereque o programa faça imprimir pela máquina um resultado completo(algumas fornecem uma laboratory worksheet detalhada), a ser en- viado para conferência por técnico sênior; este define a necessidadede microscopia e responsabiliza-se por todas as manipulações com-plementares que lhe parecerem necessárias, até o fornecimento doresultado final. Alguns laboratórios preferem incluir as correções e/

ou observações diretamente no resultado no sistema, outros, na cópiaimpressa, com digitação para o sistema do novo resultado final. Emqualquer caso, há possibilidade de erro humano. Para minimizá-lo, oautor faz algumas sugestões:

n Acrescentar observações nos resultados por meio de códigos que geram legendas. Exemplos: código POLI faz imprimir “policroma-tose”, GTOX, “granulações tóxicas nos neutrófilos”, etc., com arespectiva semiquantificação, descrita adiante neste capítulo. Isso

evita erros da digitação de frases longas ou palavras complexas,como anomalia de Pelger-Huët. Códigos numéricos são mais fáceisde usar, mas também mais fáceis de serem trocados por engano.

n Incluir no programa do computador uma série de limites e correla-ções numéricas lógicas entre os parâmetros do hemograma. Exce-ções a essa regra arbitrária passam a ser aceitas no programa, pordigitação ou modificação de resultados no sistema, somente quandoacompanhadas de dígitos de controle preestabelecidos, anotados pelo

técnico sênior. Isto é, pela inclusão do dígito de controle, o técnicoconfirma a veracidade do dado alterado; na falta do dígito, o pro-grama rejeita-o. Exemplos: o programa “sabe” que VCM = Hct ÷E; se o VCM for maior que 110 (número arbitrado), é exigido umdígito de controle significando macrocitose; se o VCM alto dever-se a erro de digitação ou modificação involuntária na contagemde eritrócitos ou hematócrito, o resultado é rejeitado por falta dodígito.

n Delimitar extremos para o possível de cada parâmetro ou de suas

correlações. Exemplos: o resultado absurdo causado pela presençade crioaglutininas, como o da Figura 5.4 (p. 139), não é aceito pelosistema nem que o técnico deseje fornecê-lo. Um Hct = 24% é in-

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compatível com uma Hgb = 14,0 g/dL; a rejeição é automática e

irreversível. Se Hct, HCM, CHCM não corresponderem às respectivasfórmulas de cálculo, nunca serão aceitos.n Digitação feita em duplicata é um método de segurança muito usa-

do, mas insatisfatório: erros feitos pelo técnico no boletim original são digitados igualmente nas duas versões. Salvaguardas incluídas

no sistema são sempre mais fáceis e seguras, portanto preferíveis acontroles por tarefa humana.

COLETA dE mATERIAL

 Apesar de haver diminuição do volume plasmático ao passar-se dorepouso, na horizontal, à posição vertical, por acúmulo gravitacionale transudação nos membros inferiores, o que aumenta as cifras eri-troides do amanhecer ao entardecer em 2-3% (pode chegar a 5-10%em obesos e cardiopatas), e de haver uma elevação circadiana, da ma-nhã para a tarde, na contagem de leucócitos, as diferenças costumamser clinicamente irrelevantes, de modo que a coleta de sangue para

hemograma pode ser feita a qualquer hora. Evita-se apenas coletá-loapós exercício físico, que causa considerável leucocitose (neutrofilia),e nas duas horas que sucedem refeições lautas ou ricas em gordu-ra. Neutropenia em hemograma coletado em condições basais exigeconfirmação com coleta no fim da manhã ou na segunda metade datarde. Poliglobulia em hemograma coletado no fim do dia exige con-firmação em coleta de manhã cedo.

Para hemograma, usa-se sangue coletado de veia superficial da

dobra do cotovelo, com agulha de calibre compatível com o volume acoletar. O autor recomenda os calibres (Ø) seguintes:

nØ 0,6 mm para coletas até 2 mL (berçário e veias afetadas por qui-mioterapia)

n Ø 0,7 mm para coletas até 5 mL (dorso da mão e pulso, pediatria)n Ø 0,8 mm (é o usual) para coletas até 20 mL (para 20 mL comple-

tos, melhor Ø 0,9 mm). Volumes maiores, que não costumam sernecessários para patologia clínica, exigem butterfly .

 A jugular externa é segura e útil para crianças pequenas e pa-cientes com veias difíceis ou esclerosadas. O risco de punção arterial

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ou de veia profunda é dificilmente justificável para exames rotineiros

de patologia clínica. Só se faz hemograma de sangue capilar em uni-dades de oncopediatria, com coletador e tecnologia especializados. A dor da picada da agulha diminui com o aumento do ângulo

de penetração, mas o risco de ultrapassar a veia aumenta na mesmaproporção. Reação vasovagal por coleta de sangue é infrequente, masocorre. O coletador deve estar atento; se notar palidez, ou o pacientequeixar-se de tontura, imediatamente fazer com que se deite. A rea-ção é fugaz e inócua; o risco é a queda. Contenção do paciente sóse faz com autorização do responsável, sendo, assim, só aplicável a

crianças ou pessoas mentalmente inválidas; pacientes anestesiados oucomatosos fazem exceção óbvia.O sangue é recebido em um tubo contendo 1 a 2 mg de EDTA 

sódico ou potássico por mL coletado. O volume recomendado para otubo deve ser respeitado; desproporção sangue/EDTA causa erro pré-analítico. Se houver preferência por tubo contendo EDTA em solução,a gota deve ser insignificante para o volume de sangue coletado; vo-lume de sangue inferior ao recomendado torna significativa a diluiçãopelo anticoagulante, com diminuição das cifras hematimétricas. Ma-

terial insuficiente exige nova coleta. Como há tubos pediátricos parahemograma, com minidose de EDTA, compatíveis com a coleta de0,5 a 1 mL de sangue, convém tê-los à mão para uma eventual coletaescassa. Coleta lenta e difícil, por falta de fluxo na veia punciona-da, favorece a agregação plaquetária e a coagulação: nunca aceitá-la!É necessário trocar o material e puncionar outro local. A heparinanão se presta como anticoagulante para leucograma e contagem deplaquetas; ela destrói os leucócitos e causa uma coloração de fundo

 violeta nas lâminas, mas é tolerável para o eritrograma, desde queem mínima quantidade para evitar diluição. A diferença entre o he-mograma do sangue de veias e de artérias periféricas é insignificante;o eritrograma pode ser feito com o sangue coletado para gasometriaarterial desde que não seja diluído com excesso de heparina.

 A coleta de sangue de cateteres profundos é necessária em mui-tos pacientes, especialmente nos que estão recebendo quimioterapia.Necessária, mas tecnicamente indesejável. É preciso aspirar inicial-mente um volume significativo de sangue e desprezá-lo, porque esta-

 va em estase e com heparina no cateter. Com esse cuidado, o sangueobtido é satisfatório para eritrograma e leucograma; a contagem deplaquetas, entretanto, sempre será insegura pela perda inevitável no

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trajeto. Em pacientes internados, é recomendável que a coleta seja

feita por pessoal próprio da unidade. A coleta no recém-nascido édiscutida no Capítulo 19. A coleta com seringas e agulhas descartáveis é mais fácil para

o coletador e causa menos hematomas nos pacientes do que a coletacom tubos a vácuo e agulhas bipolares, mas implica em maior riscode ferimento acidental com a agulha. O uso de luvas de borracha érecomendado, mas é certo que o prejuízo ao tato interfere no traba-lho e que as luvas não protegem contra o risco citado, de modo quea recomendação não é universalmente seguida. O uso de luvas é re-

gulamentar e obrigatório para todo o pessoal que manipula materiaisbiológicos nas seções técnicas do laboratório.

Como o coletador trabalha só e tem as mãos ocupadas, cabe aopróprio paciente ou a um acompanhante comprimir o local da punçãopara o estancamento. Mesmo instados com insistência (nas salas decoleta do laboratório do autor havia um pôster mostrando a maneiracorreta de pressionar), geralmente não o fazem com a pressão e otempo adequados. A consequência é um hematoma local, pois o es-paradrapo, sem firme compressão prévia por 3-4 minutos, é ineficazpara evitá-lo.

Mesmo com pessoal de coleta capacitado e experiente, a coa-gulação incipiente ou total de uma amostra de sangue a cada 500 a1.000 costuma ocorrer em todos os laboratórios, tornando-se neces-sária nova coleta.

 A distensão sistemática de lâminas com gotas de sangue nativo,da ponta da agulha, era recomendada por alguns patologistas-clínicospara que as células sempre fossem vistas ao microscópio sem alte-

rações causadas pelo anticoagulante. O risco de trocas, o atraso nasequência da coleta, o desvio da atenção dos coletadores do pacientepara esse trabalho, o aumento do risco de acidentes e a lenta secagemdas lâminas pela dificuldade de se usar um secador na sala de coletafazem preferir-se, hoje, a distensão de lâminas a partir do sangue jáanticoagulado. Deve ser feita, sempre que possível, antes de quatrohoras, no máximo em seis; se o transporte para um laboratório centraldemandar maior prazo, é necessário distendê-las na origem.

 Amostras de sangue enviadas devem ser transportadas a@ 5ºC e

com um mínimo de agitação. Lâminas já distendidas não devem ficarno ambiente refrigerado junto com as amostras, pois podem hemoli-sar pela umidade. Deve-se embrulhá-las separadamente e transportá-las, evitando exposição a temperaturas >32ºC. O sangue transporta-

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Hemograma 31

do deve ter recepção preferencial no laboratório de destino de modo a

passar imediatamente à seção técnica para processamento.

CONTAdOREs ELETRôNICOs

 A contagem eletrônica de glóbulos começou com a patente porWallace Coulter e seu irmão, nos anos 1950, de um dispositivo capazde contar e medir os pulsos de condutividade (impedância) causadospela passagem de partículas através de um orifício pelo qual flui uma

corrente elétrica. O contador primitivo tinha uma haste oca, com ointerior comunicado com o exterior por um orifício de pequeno diâ-metro, com um eletrodo metálico interno e outro externo, e uma fon-te geradora de corrente contínua. Uma bomba pneumática aspiravao sangue, apropriadamente diluído em solução eletrolítica, de forapara dentro pelo estreito orifício, até um volume exato predetermina-do. Ao cruzarem individualmente o orifício, os glóbulos, pela menorcondutividade, desencadeavam pulsos de impedância, sentidos pelogalvanômetro do instrumento. Os pulsos eram contados e medidos, e

a calculadora, levando em conta a diluição e o volume aspirado, con- vertia o resultado em número de glóbulos por µL de sangue.

O método mostrou-se adequado à finalidade a que se propu-nha: contagem e medida dos glóbulos sanguíneos. Os instrumentosprimitivos, que exigiam um diluidor manual externo para as amostrasde sangue a examinar, evoluíram nos anos 1960 e começo dos anos1970 para instrumentos capazes de aspirar o sangue, distribuí-lo emalíquotas apropriadamente diluídas para canais separados, um paracontar e medir plaquetas e eritrócitos, outro para contar e medir leu-cócitos e dosar hemoglobina por espectrofotometria, após hemólisepelo líquido diluidor. Aperfeiçoados na mecânica, na eletrônica e,principalmente, no  software do computador de apoio, os contadores

eletrônicos por impedância, isto é, com tecnologia baseada no princípioCoulter, tornaram-se reprodutíveis e seguros, fornecendo cifras hema-timétricas fidedignas; são fabricados e muito utilizados até hoje, coma designação usual de contadores eletrônicos de pequeno porte.

No fim dos anos 1970, a tecnologia de impedância foi acrescida

da citometria em fluxo, maravilha tecnológica com inúmeras perspec-tivas e variantes para identificação celular, dando origem aos atuaiscontadores eletrônicos de grande porte. As novas máquinas são capazesde fornecer a multiplicidade de parâmetros listados na Tabela 1.1, e

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são utilizadas na generalidade dos grandes laboratórios. A mecânica

dos instrumentos, nos anos 1980, foi automatizada pela técnica deperfuração sequencial, com uma agulha aspiradora ( probe), da tampados frascos de sangue, dispostos em raques móveis, identificados porcódigo de barras. Essa automação elimina o risco da manipulação dosangue pelos operadores e diminui a perspectiva de troca de materialpor erro humano. No fim dos anos 1990, foram criados sistemas ro-botizados, com a anexação aos modelos top of line de algumas linhas,de equipamento automático capaz de distender e corar lâminas ele-tivamente, sob comando de critérios incluídos no  software de uma

central inteligente. Essa melhoria torna o equipamento muito caro,sendo, por isso, pouco difundida no Brasil até hoje. Nos países desen- volvidos, com o elevado custo da mão-de-obra, está se generalizandorapidamente. A robotização acrescenta rapidez e certo aumento desegurança contra erro humano ao procedimento, mas não interfere naqualidade do produto final: o resultado do hemograma. O hemograma feito em contadores de grande porte é o que terá resultados transcritos,discutidos e interpretados neste livro.

Heograa e contaore eletrnico e peqeno porte

Todos os fabricantes fornecem aparelhos de pequeno porte ede baixo custo de aquisição, manutenção e insumos, com tecnolo-gia restrita à contagem e medida de pulsos de impedância (princípioCoulter). No Brasil são usados na virtual totalidade dos laboratóriospequenos, com até 100 hemogramas por dia. Como não performam

automaticamente uma fórmula leucocitária completa, laboratórioscom essas máquinas precisam sempre completar o hemograma comuma fórmula feita ao microscópio (fórmula visual, ou “manual”).

Nesses contadores, o resultado fornecido é uno e indivisível.Pedidos parcelados de leucograma, hematócrito ou contagem de leu-cócitos pertencem à tecnologia extinta. Há uma exceção aceitável.Havendo interesse só na série vermelha – como na seleção de doa-dores em banco de sangue, em exames periódicos da gravidez ou depacientes renais crônicos em diálise – e sabendo-se que o laboratório

do serviço (ou contratado) trabalha com contador eletrônico de pe-queno porte, isto é, sem fórmula leucocitária automatizada, justifica-seo pedido isolado de eritrograma. Nessa eventualidade, o laboratórioeconomiza o trabalho de distender lâmina e fazer a tediosa fórmula

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Hemograma 33

ao microscópio, fornecendo só o eritrograma desejado com econo-

mia de custo ou preço. Também não tem sentido o pedido isoladode contagem de plaquetas*, pois a máquina não se presta a fazê-lasem as demais contagens; a contagem de plaquetas é sempre partedo hemograma.

Um resultado típico de contador de pequeno porte (Coulter T/MD) é visto na Figura 1.1.

RBC

FIGuRA 1.1Resultado de hemograma no Coulter T/MD.

 

05/25/90 128ID 89217783742LAB 120

WBC 4.3LY 56.7MO 9.2GR 54.1EO # ( .7BA # ( .2

SAMPLE ANALYSISNORMAL DISTRIBUTION

RBC 3.98HGB 12.9HCT 37.0MCV 93.0MCH 32.4MCHC 34.9RDW 15.0

PLT 418.

MPV 7.0

50

50 2PLT

WBC

ARELNO.

100

100 10

200

200 20

300 400

* Em algumas localidades do Brasil, ainda se mantém uma ridícula disputa entreentidades (públicas e privadas) tomadoras de serviços médicos e laboratóriosde patologia clínica. Aquelas mantêm a contagem de plaquetas e o hemograma

separados nas tabelas de preços, exigem requisição médica, especificando um,outro, ou ambos, e pagam de acordo. Os laboratórios, em contrapartida igual-mente ridícula e antiética, sonegam do resultado do hemograma a contagemde plaquetas, e vice-versa, quando não pedidos ambos especificamente.

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O histograma superior é o do leucograma; a medida das células,

simultânea à contagem, mostra um pico entre 35 e 95 fL, que corres-ponde aos linfócitos (inclui os basófilos), e uma elevação rasa entre160 e 400 fL, que corresponde aos granulócitos. Entre ambas, aos 90-160 fL, situam-se monócitos, alguns granulócitos não-segmentadose eosinófilos e, quando presentes, granulócitos imaturos e linfócitosativados. A fórmula numérica, vista na coluna à direita, é incomple-ta e imprecisa, mas permite distinguir neutrofilias de linfocitoses. A fórmula ao microscópio é indispensável para um resultado completo,com eosinófilos e basófilos; essa trabalhosa necessidade, por outro

lado, faz com que esses hemogramas de “tecnologia pobre” mante-nham a característica histórica de evidenciar dados citológicos nãomais notados pela eletrônica (por exemplo, pequenos desvios à es-querda, eliptocitose sem anemia e outros).

O 2o histograma é o do volume corpuscular eritroide. É similarao obtido nos contadores de grande porte, que será discutido adiante.Os resultados numéricos relativos ao eritrograma são vistos na colunaà direita. São satisfatoriamente reprodutíveis e exatos.

O 3o histograma é o do volume plaquetário; a curva é semilo-garítmica. A contagem de plaquetas, definidamente inferior em fide-dignidade à oriunda de contadores maiores, e o VPM estão anotadosà direita.

Heograa e contaore eletrnico e grane porte

Os contadores eletrônicos de grande porte atuais, capazes de fa-

zer as determinações da Tabela 1.1, são variados, de múltiplas proce-dências e com extensa gama tecnológica. O autor teve ampla experi-ência pessoal com os instrumentos MAX’M e STKS (Coulter), Cell-Dyn3500 e 4000 (Abbott) e Sysmex XE 2100; teve, também, oportunida-de de familiarizar-se com a tecnologia e os resultados do Advia 120(na ocasião Bayer, agora Siemens). São as linhas de instrumentos demaior expressão internacional, e todas estão representadas no Brasil;as empresas fabricantes e/ou distribuidoras locais oferecem contratosde leasing e comodato, que incluem o fornecimento de insumos e as-

sistência técnica, com pagamento por exame, com um número mínimopreestabelecido e preços variando favoravelmente de acordo com onúmero mensal atingido.

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Hemograma 35

Segue-se uma lista simplificada, mas abrangente, da tecnologia

dessas quatro linhas de instrumentos: 1. Medida e contagem dos pulsos de impedância, causados pelos gló-

bulos, ao cruzarem um orifício pelo qual flui uma corrente contínua(princípio Coulter): contagem e medida do volume de eritrócitose plaquetas em todos os instrumentos; contagem de leucócitos namaioria.

 2. Medida da condutividade elétrica dos glóbulos, em radiofrequência,no orifício de impedância: sensível à estrutura interna das células,

usada para diferenciação dos tipos de leucócitos na fórmula daslinhas Beckman Coulter e Sysmex. 3. Análise, em vários ângulos, da dispersão* da luz (foco luminoso

de tungstênio ou laser) focalizada nos glóbulos em citometria emfluxo: identificação (em alguns, contagem) dos tipos celulares emtodas as linhas de instrumentos.

 4. Dispersão e absorvância da luz (laser) após reação da mielope-roxidase: identificação dos granulócitos (peroxidase +) na linha Advia.

 5. Idem, após efeito lítico preferencial do solvente sobre o citoplasmados leucócitos: identificação dos basófilos, resistentes à lise, em várias linhas de instrumentos; identificação de células imaturas(resistentes por falta de lipídios na membrana) na linha Sysmex.

 6. Idem, após coloração supravital do ácido ribonucleico (RNA):identificação dos reticulócitos na linha Beckman Coulter.

 7. Dispersão de luz polarizada: identificação dos eosinófilos pelo efeitodespolarizante, em várias linhas de instrumentos.

 8. Avaliação da fluorescência após marcação do RNA citoplasmáticocom derivados da fluoresceína: identificação dos reticulócitos naslinhas Cell-Dyn, Sysmex e Advia.

 9. Avaliação da fluorescência do DNA nuclear após marcação com io-deto de propidium: identificação de leucócitos inviáveis (membranapermeável ao marcador) e eritroblastos na linha Cell-Dyn.

 10. Avaliação da fluorescência em leucócitos após permeabilização damembrana por solvente e marcação com um corante fluorescente de

* Dispersão da luz (light scatter ou laser scatter) tem aqui o sentido de “dispersãopor reflexão e refração”, não de abertura do espectro cromático.

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polimetina: identificação dos leucócitos e de plaquetas reticuladas

na linha Sysmex. 11. Avaliação da fluorescência após marcação das células com anticor-pos monoclonais fluorescentes (imunofenotipagem limitada), feitacom software especial por alguns modelos top of line: contagem deplaquetas (com anti-CD61) e de linfócitos CD3, CD4 e CD8 na linhaCell-Dyn. Outras aplicações ainda em estágio experimental.

 12. Espectrofotometria: é usada de modo universal para a dosagem dehemoglobina; as diversas linhas de instrumentos diferem quantoà conversão da Hgb antes da colorimetria: cianometemoglobina

(Beckman Coulter), hemoglobina-lauril-sulfato de sódio (Advia eSysmex), metemoglobina-imidazol (Cell-Dyn).

Todos as linhas de contadores utilizam-se do princípio Coul-ter (item 1, acima) como método básico das contagens; eritrócitos eplaquetas, distinguidos por limiares de volume, geralmente compar-tilham um mesmo canal de impedância. Da mesma forma, o hemoli-sado destinado à dosagem espectrofotométrica da hemoglobina (item12, acima) também é usado para a contagem de leucócitos. As linhasCoulter e Sysmex usam o trajeto de impedância para a medida decondutividade dos leucócitos (ver item 2, na página anterior).

Os demais princípios para identificação celular (itens 3 a 11, aci-ma) dependem da técnica de citometria em fluxo ( flow cytometry ); osglóbulos são direcionados para uma tubuladura delgada, onde fluemum atrás do outro, envoltos em uma bainha de solvente e focadospor técnica hidrodinâmica. Ao entrarem nos múltiplos canais do siste-ma, alíquotas são diluídas, e as células, suspensas em uma variedade

de fluidos, com características específicas de tonicidade, de atividadecomo solvente, com ou sem corantes, sejam de impregnação, enzimá-ticos ou imunológicos, alguns fluorescentes. Finalmente passam porum ponto do trajeto ( flow cell) onde são contados e submetidos aosdiversos processos de identificação.

Na flow cell, os glóbulos em coluna são alvejados individualmen-te por raios luminosos em diversos ângulos para analisar a difração daluz e por lasers para estimular fluorescência nos que tomaram os co-rantes marcados com fluoresceínas. Múltiplos fotodetectores recebem

a luz difratada, outros identificam a fluorescência em um ou várioscomprimentos de onda. A energia é convertida em pulsos elétricos,que são digitalizados e enviados ao computador. O software recebe asinformações dessas dezenas de milhares de células que passam pelo

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Hemograma 37 

trajeto em segundos e distribui a imensa quantidade de dados em

clusters de identificação predeterminados, permitindo uma avaliaçãoqualitativa e quantitativa integral das populações em teste. O termo“fantástico” é extrapolado por essa tecnologia.

Os instrumentos das quatro linhas discutidas fornecem, de modoidêntico, embora por tecnologia variada, contagens e volumetria deeritrócitos e plaquetas, contagem e fórmula diferencial de leucócitos,dosagem de hemoglobina, índices hematimétricos, histogramas do volume corpuscular (eritroide e plaquetário),  scatterplots leucocitá-rios usados para a diferenciação celular, flags e comentários codifica-

dos ou escritos sobre anormalidades. A tecnologia empregada nas contagens de glóbulos em cada linhaé resumida na Tabela 1.2. A da fórmula leucocitária, pela grande dis-paridade entre os instrumentos, é descrita individualmente no textocorrespondente, junto com inovações, características e parâmetrosúnicos de cada linha.

Para uma discussão técnica detalhada, o leitor deve consultar,na internet, os sites das empresas fabricantes e os manuais de instru-ção de cada instrumento em particular, obtidos com os distribuidores

locais.

Beckan Cell-dyn sye AviaColter Abbott Roche sieen

Eritrócitos Impedância Impedância Impedância Impedânciae óptica

Leucócitos Impedância Óptica e Impedância Ópticafluorescência e óptica

Plaquetas Impedância Óptica e Impedância; Ópticaimpedância; óptica/fluo-imunofluo- rescênciarescência (alternativa)(opcional)

Reticulócitos Coloração Fluorescência Fluorescência Fluorescência(opcional) com novo- com CD4K530® com polimetina com oxazina

azul-de- 750metileno

TABELA 1.2

Tecnologia usada nas contagens de glóbulospelas quatro linhas de instrumentos discutidas no texto

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Linha Beckman Coulter (Coulter STKS, GEN*S e LH750)

No eritrograma, destaca-se a alta qualidade do histograma,alongado na abcissa, baixo na ordenada e com traçado firme, porqueo software edita pulsos aberrantes. Na opinião do autor, é mais fácilde interpretar do que os histogramas das demais linhas e, por isso,predomina nas ilustrações deste manual.

O leucograma é feito com a tecnologia que a Coulter denomina“VCS”:

n   V olume (medido por impedância);n  Condutividade (em frequência de ondas de rádio);n   Laser Scatter.

 A figura plana do scatterplot do leucograma é o plano frontal deuma imagem tridimensional, um cubo, elaborada pelo computadordo aparelho, com as medidas VCS distribuí das pelas três arestas quepartem da origem. Os resultados obtidos para cada célula são plo-tados e geram conglomerados espaciais, que a máquina separa por

planos móveis, vistos em frontal como linhas. Há um conglomeradode linfócitos (LY), de neutrófilos (NE), de monócitos (MO) e de eosi-nófilos (EO); os basófilos (BA), atrás dos linfócitos, só são vistos emoutra incidência. No display do instrumento, o  scatterplot é coloridocom um código de cores correspondente ao número de eventos emcada ponto (Figura 1.2, A). São listadas as porcentagens de cada tipocelular (fórmula relativa) bem como sua conversão em números porµL (fórmula absoluta).

Há  flags na série leucocitária para desvio à esquerda e granu-

lócitos imaturos, linfócitos atípicos e blastos, e um mais amplo  slidereview; na plaquetária, há flags para excesso de pulsos junto aos ex-tremos do intervalo volumétrico e presença de agregados. A máquinafornece uma interpretação de fábrica, que imprime macrocitose oumicrocitose, hipo ou hipercromia, etc., de acordo com os limites dereferência que atribui às cifras; identifica e aponta até  população di-mórfica pela análise do histograma.

O canal de reticulócitos (determinação opcional) fornece a conta-gem, o volume médio dos reticulócitos e a fração reticulocítica imatura.

O mais avançado e recente modelo (top of line) da série, o Coul-ter LH750, pode ser fornecido anexado a equipamento capaz de dis-tender e corar lâminas (Figura 1.3) em obediência a critérios de umacentral inteligente.

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Hemograma 39

FIGuRA 1.3Contador Coulter LH750, acoplado a equipamento automatizado para dis-tender e corar lâminas.(Cortesia do Laboratório do Hosp. St. Louis, Paris, 2007.)

FIGuRA 1.2 Scatterplots vistos no monitor, de leucogramas do Coulter STKS ( A ) e do Cell-Dyn 4000 (B). O pontilhado verde excessivo em (B) indica eosinofilia.

 A B

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Linha Cell-Dyn Abbott (Cell-Dyn 4000 e Sapphire)

 A linha tem as seguintes características, algumas inovadoras:

n Óptica com laser de argônio, com potência capaz de excitar fluores-cência nas células marcadas com iodeto de propidium para o DNA,e com uma fluoresceína própria (CD4K530®) para o RNA, o quepermite identificar a fração de leucócitos inviáveis, os eritroblastos,e fazer a contagem de reticulócitos.

n Leitura simultânea de todos os dados na flow cell, com laser scatter em quatro ângulos e fluorescência. Impedância aperfeiçoada porfluxo forçado. As células são marcadas com códigos de cor. Umexemplo do scatterplot no monitor é visto na Figura 1.2 (B); o pon-tilhado verde excessivo ilustra presença de eosinofilia. Um exemplocompleto da worksheet em cores, fornecida como opção para uso nolaboratório, de hemograma muito alterado de um recém-nascido,pode ser visto na Figura 19.1, p. 312.

n Contagem de leucócitos reprodutível até 250.000/µL.n Contagem de plaquetas por dupla tecnologia, automaticamente es-

tendida em casos com trombocitopenia; mantém satisfatória precisãoentre 5.000 e 2 milhões/µL. Há, ainda, uma contagem imunofeno-típica opcional, com marcação fluorescente do CD61, consideradacomo método de referência para contagem de plaquetas.

n A mesma coloração imunofluorescente permite, de modo opcional,a contagem de linfócitos CD4 e CD8.

O modelo Cell-Dyn 4000 saiu de linha, substituído pelo novomodelo Cell-Dyn Saphire visto na Figura 1.4. A Abbott fornece outros

dois modelos de contadores de grande porte, mais simples e econômi-cos: Cell-Dyn 3500 e 3700.

Linha Sysmex Roche (Sysmex XE 2100)

O uso de tecnologia de impedância com corrente elétrica dedupla frequência assemelha-se ao da linha Coulter. O sistema é ali-nhado em foco hidrodinâmico, com bainha de solvente, impedindofalsos pulsos. Os leucócitos são contados no sistema de impedância e,

novamente, na citometria em fluxo. A identificação é feita por light scatter frontal (mede o tamanho) e lateral (avalia o conteúdo, princi-palmente as características nucleares). A fluorescência é avaliada emfotodetector lateral.

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Hemograma 41

O canal de reticulócitos, com um software apropriado fornecidocom o instrumento, permite uma avaliação em unidades arbitrárias(RET Y e RBC Y) do volume dos reticulócitos e dos eritrócitos e umacontagem de plaquetas reticuladas (ver Cap. 18, p. 301).

 A linha Sysmex é bem aceita no Brasil na competição por qua-lidade/preço. A Sysmex-Roche também oferece um modelo com tec-nologia de preparo automático de lâminas em casos selecionados por

uma central inteligente (ver Figura 1.5) e um modelo, também degrande porte, mas mais simples e econômico (XS-1000).

Linha Advia Siemens (Advia 120)

Desde os primeiros modelos nos anos 1970, essa linha origi nal-mente japonesa de contadores eletrônicos utiliza duas técnicas únicas:

n Coloração citoquímica de mieloperoxidase para identificação degranulócitos no leucograma; o canal de peroxidase é eficaz na dife-renciação e permite o diagnóstico imediato da deficiência genética,não-rara, de mieloperoxidase.

FIGuRA 1.4Cell-Dyn Saphire.(Cortesia do Laboratório Richet, Rio de Janeiro, 2008).

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FIGuRA 1.5Dois conjuntos Sysmex XED-SP 1000 com dispositivos automáticos para distensãoe coloração de lâminas.(Cortesia do Laboratório Weinmann, Porto Alegre, 2008.)

FIGuRA 1.6Instrumento Advia 120 na bancada de trabalho.(Cortesia do Laboratório da Santa Casa de Misericórdia, Porto Alegre, 2008.)

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Hemograma 43

n A contagem e a medida de eritrócitos (após esferação isovolumétrica)

e de plaquetas é feita por laser scatter em dois ângulos; o índice derefração correlaciona-se com a densidade celular e permite a deter-minação da concentração hemoglobínica individual dos eritrócitos. A máquina fornece a média (CHCM = cell hemoglobin concentration

mean) e uma curva de frequência dos valores individuais, quantifi-cando hipocromia e hipercromia com números estatísticos. A técnicaé extensiva ao canal de reticulócitos: obtém-se o volume (VCMr) eo conteúdo hemoglobínico ( HCr) reticulocíticos médios.

 A Figura 1.6 mostra o instrumento Advia 120. O preço e a di-ficuldade de manutenção da linha Advia no Brasil tornam-na menoscompetitiva do que a Sysmex; daí ser menos difundida.

mICROsCOPIA

Embora a observação tradicional ao microscópio persista in-substituível em casos particulares, a impossibilidade de manter um

 staff , com técnicos experientes, capazes de examinar centenas oumilhares de lâminas por dia, venceu a resistência e os escrúpulosdos mais ferrenhos adeptos da microscopia universal. Em todos osgrandes laboratórios que usam contadores com fórmula leucocitá-ria completa, o exame ao microscópio atualmente só é feito em ca-sos selecionados. Em locais onde essa política, agora geral, aindacompete com hemogramas feitos à moda antiga, com contadores depequeno porte e fórmula visual (manual), essa orientação deve ser

anotada no resultado. Com exceção do hemograma de instituições

fechadas (como hospitais universitários), em que o corpo clínicoestá formalmente informado dos novos tempos, cabendo inclusiveao médico requisitante solicitar exame microscópico complementarquando julgar necessário.

Em muitos hospitais, os médicos recebem o resultado direta-mente do contador, on-line, com o sistema de computadores da enti-dade. O requisitante sabe o que vai receber ao solicitar o hemograma.Mas, em laboratórios abertos ao público e aos médicos em geral, temsido difícil difundir o conhecimento de que receberão um hemograma

inacreditavelmente exato quanto aos números, mas limitado à visãodas máquinas na identificação celular. Apesar da maravilhosa tecnolo-gia eletrônica, as máquinas não veem tudo, e o que não veem pode serclinicamente significativo ou, ao menos, biologicamente relevante.

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Critério para inicao e icrocopia

 A consulta a vários laboratórios de grande porte em Porto Alegremostrou certa homogeneidade de critérios; costumam ir à microsco-pia lâminas dos hemogramas que se enquadram em certos critériosde identificação e procedência, que tenham  flags das máquinas ouresultados numéricos fora dos limites de referência, todos discutidosa seguir:

 1. Idade: <5 anos. Motivo: a frequência de desvio à esquerda por

diarreia ou viroses e a dificuldade de definir valores de referêncianesse grupo etário. 2. Idade: >75 anos. Motivo: a grande prevalência de doenças crônicas

subclínicas; mesmo com números normais poderá haver policro-matocitose (anoxemia?), rouleaux , neutrófilos hipersegmentados,etc.

 3. Procedência: hemogramas vindos de clínicas onco-hematológicas,todos os pacientes internados ou apenas os da UTI, ou de outrossetores em que predominem pacientes graves.

 4. Em laboratório de hospital ou clínica em que a informática permitadelta-check: fazê-lo, limitando-o a 30 dias e tolerando ± 10% de variação.

 5. Pedidos médicos específicos: pesquisa de linfócitos atípicos, deesferócitos, pedido de monoteste, etc.

 6.   Flags emitidos pelo aparelho: não costumam diferir muito entreos diversos contadores eletrônicos. Geralmente são:  ImmGrans/ bands, Blasts, Variant lymphs, NRBC , Plt.Clumps, Review slide. Todosexigem microscopia.

 7. Limites de referência dos parâmetros numéricos: variam pouco en-tre os laboratórios consultados. Os números do quadro apresentadona página seguinte são os recomendados pelo autor:

 A concordância de critérios entre os laboratórios locais não impli-ca em concordância internacional. Seguem-se exemplos ilustrativos.

O laboratório do Hospital Saint Louis (Paris) opta por uma políti-ca simplista: os médicos recebem apenas uma transcrição interfaciadados dados numéricos fornecidos pelas máquinas, sem qualquer parti-

cipação humana, salvo no controle de qualidade; só é feita microsco-pia mediante solicitação escrita do médico requisitante.

Por outro lado, os laboratórios do St. Mary’s Hospital (Londres)e do New York-Presbiterian (Cornell Medical Center, New York) carac-

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Hemograma 45

terizam-se por detalhar extensos procedimentos operacionais-padrãopara essa escolha.*

No St. Mary’s, o procedimento começa pelo exame do resultado

na tela por técnico do laboratório ( Registered Biomedical Scientist).Cabe-lhe decidir pela validade das contagens; dispõe dos resultadosanteriores do paciente, se houver. Tem autoridade para aceitar oumandar repetir as contagens da máquina, mas há critérios recomen-dados: alterações da CHCM, valores inesperados ou inexplicados paraHgb alta ou baixa, diminuição desta (em relação a anteriores), idempara VCM, contagens de leucócitos e plaquetas (nesse caso, examinaa amostra para coagulação), basofilia. O técnico, nessa etapa, temautoridade para indicar e fazer proceder a microscopia de lâmina,

ou dispensá-la. Há, entretanto, critérios obrigatórios de microscopia:requisição do médico, dados numéricos alterados em casos novos(plaquetas < 60.000/µL, Hgb < 12,5 [ ] e < 10,5 [ ] /dL, leucó-citos < 3.500/µL], índices hematimétricos improváveis, linfocitosesinexplicadas e flags. Também são examinadas lâminas em casos comanotação clínica de linfonodomegalias, suspeita de linfoma, pedidosde contagem de bastonados e pré-eclâmpsia.

No New York Presbiterian, o procedimento-padrão inclui as açõesque devem ser tomadas em relação a cada  flag da extensa lista do

* Com agradecimentos à Dra. Barbara Bain (St. Mary’s Hospital) e ao Dr. RichardSilver (New York Hospital).

Eritrócitos < 3,8 > 6 M/µL

Hemoglobina < 11 > 17 g/dLVCM < 78 > 100 fLCHCM < 31 > 36 %RDW > 15 %Leucócitos < 3500 > 12000 /µLNeutrófilos < 1500 > 7000 /µL

< 30 > 75 %Linfócitos < 1000 > 4000 /µLMonócitos > 1500 /µL

Eosinófilos > 1500 /µLBasófilos > 2 %Plaquetas < 120000 > 400000 /µL

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Beckmann-Coulter e à igualmente extensa lista de achados anormais

nas contagens. Exige-se microscopia em todas as anemias com microou macrocitose ou RDW > 20. No leucograma, leucócitos < 2.000 ou> 20.000 /µL, linfócitos > 60%, monócitos > 15%, basófilos > 5%,eosinófilos > 30%, eritroblastos > 5% e plaquetas < 20.000 /µL.

Laboratórios consultados em Buenos Aires optam por critériossimilares aos usados em Porto Alegre.

Com os critérios descritos, no laboratório do autor eram feitase examinadas lâminas em 20 a 30% dos hemogramas dos pacientesde ambulatório. A porcentagem era alta, porque o laboratório atendia

a clínica de vários hematologistas e serviços de oncologia. Em labo-ratórios para pacientes oriundos de ambulatórios de atendimento demassa, a porcentagem a examinar, com esses critérios, costuma estarentre 10 e 20%.

Se levar-se em conta que, na verdade, essas porcentagens sãocoerentes com o número de hemogramas efetivamente anormais, asmedidas tomadas parecem estatisticamente corretas. O problema é queos 20% (por hipótese) anormais não são exatamente os mesmos 20%examinados: há falso-positivos e falso-negativos em ambos os grupos!Sempre são examinados desnecessariamente alguns normais, em de-trimento de alguns anormais não examinados.

 Na experiência do autor, após uma década (anos 1990) de usocontínuo dos contadores eletrônicos descritos, com observação micros-cópica complementar feita em todos os hemogramas, as alterações da Ta-bela 1.3 costumam passar despercebidas pela tecnologia.

Embora a lista de “dados perdidos” seja extensa, há que se re-conhecer que:

 1. A maioria das alterações listadas costuma acompanhar-se de alte-rações numéricas (p. ex., anemia), que indicariam necessidade demicroscopia complementar.

 2. Algumas, embora biologicamente relevantes, não têm significaçãoclínica. A ovalocitose sem anemia e a anomalia de Pelger-Huët sãoestigmas curiosos, sem consequências para os portadores; mas justifica-se fazer hemograma num laboratório de alto conceito ereceber um resultado sem a percepção dessas anomalias? É o que

ocorre agora, com a vitória da automação sobre o artesanato. 3. O fato de fazer-se observação microscópica complementar como

rotina não significa, por outro lado, que as alterações citadas serão

notadas. Da Tabela 1.3, algumas são quase sempre notadas (ovalo-

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Hemograma 47 

citose, rouleaux , desvio à esquerda e Pelger, granulações tóxicas,linfócitos atípicos e plasmocitose); outras, menos vezes.

Por outro lado, nos exemplos a seguir, os dados perdidos teriamgrande importância se fossem notados:

 1. Policromatocitose sem anemia: com hemoglobina próxima aolimite superior da normalidade, é sinal de anoxemia; próxima

ao limite inferior, sugere perda sanguínea recente.2. Esferocitose, mesmo sem anemia, é um diagnóstico relevante;

explicaria litíase, subicterícia, etc. Às vezes, a máquina nota-a pelaelevação da CHCM.

TABELA 1.3

O que as máquinas não veem

No eritrograaPolicromatocitosePecilocitose (de um modo geral)Pecilócitos específicosInclusões (Jolly, pontilhado basófilo, outras)Eritroblastos < 5% (salvo alguns modelos top of line)

  Rouleaux

No lecograaDesvio à esquerda (há flag Imm Grans/Bands em 80% dos casos comneutrofilia, mas em menos de 40% dos casos sem neutrofilia); aanomalia de Pelger-Huët nunca é notada

Granulações tóxicas e corpos de DöhlePlasmócitosLinfócitos atípicos (há flag Variant lymphs em 80% dos casos com

linfocitose, mas, em menos de 30%, sem linfocitose; identificam muitoscomo monócitos)

Linfócitos linfomatosos ou leucêmicos em pequeno número(há Flag Blasts quando mais de 5-10%)

Linfócitos com granulação ou vacuolização anormais  Hairy cells geralmente aparecem como monócitos

No plaqetograaAgregação, quando discreta (agregação acentuada sempre causa

Flag Plt aggregation)Satelitismo plaquetário (há trombocitopenia sem flag)

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 3. Acantocitose e corpos de Howell-Jolly indicam hipofunção esplê-

nica. Se forem notados em paciente esplenectomizado, o achado éirrelevante (porque já sabido); em paciente não-esplenectomizado,entretanto, é altamente relevante, pois sugere doença inflamatóriacrônica do trato digestivo, geralmente de difícil diagnóstico.

 4. Leptocitose indica doença hepatobiliar; rouleaux indica eritrossedi-mentação elevada.

 5. A presença de eritroblastos e de mielócitos pode ser sinal de me-tástases ósseas de tumor, mas é rara sem anemia.

 6. O desvio à esquerda, as granulações tóxicas e os corpos de Döhle

são discutidos no leucograma. A plasmocitose e os linfócitos atípicossão fundamentais para o diagnóstico de viroses.

 7. É desnecessário comentar a importância do achado de célulaslinfomatosas e leucêmicas. Não é raro vê-las em pequeno número,ainda sem linfocitose significativa nem alterações numéricas dasdemais séries.

 A lista de exemplos poderia ser infindavelmente alongada. É fá-cil compreender que o ganho geral na precisão dos números acompa-nhou-se de certo retrocesso na citologia de casos pontuais.

Técnica e ciao para a icrocopia

São distendidas lâminas para exame das amostras incluídas noscritérios anteriores. Nos laboratórios de grande porte, com centenasde hemogramas/dia, os parâmetros de referência para esse fim costu-

mam estar incluídos no sistema: resultados que dispensarem micros-copia são liberados por interfaciamento com o computador central,sem interferência humana. Naqueles que não passarem no crivo, oresultado é impresso para avaliação pelo técnico sênior, e lâminas sãorequisitadas. Havendo uma central inteligente e equipamento automa-tizado, as lâminas são distendidas e coradas automaticamente a man-do do sistema. Laboratórios menores imprimem todos os resultadospara apreciá-los e julgá-los um a um.

O autor recomenda identificar as lâminas com o número do

registro do paciente, escrito na extremidade fosca da lâmina, a lápisou com tinta indelével. A coloração é feita em equipamento automa-tizado ou manualmente, se o número de lâminas for pequeno, comcorantes Wright-Giemsa ou May-Grünewald-Giemsa. A procedência

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Hemograma 49

e a qualidade dos microscópios depende da disponibilidade financei-

ra do laboratório, mas o autor recomenda que todos sejam equipa-dos com objetivas de imersão de 50 aumentos e oculares Wide Fieldde 10 aumentos. Essa combinação gera um campo microscópico no-tavelmente amplo e nítido. O alto preço dessas objetivas é amplamen-

te compensado pelos resultados. Objetivas a seco não permitem igualqualidade de visão; objetivas de imersão de 100 aumentos, mesmoem microscópios de ótima qualidade, perdem em nitidez o que seganha em ampliação, limitam a extensão do campo examinado eaumentam o tempo gasto para observar um número significativo de

células. O autor utiliza-as raramente, e só para ver células especiaisou inclusões celulares.O exame microscópico exige rigorosa disciplina. Começa-se pela

inspeção da série vermelha; para isso, devem ser focados camposonde os eritrócitos tocam-se quase sem superposição; observam-se aforma, as dimensões e a anisocitose (comparando com o VCM, o RDWe examinando o histograma), a coloração (com especial atenção parapolicromatocitose) e o empilhamento; deve-se julgar se os dados nu-méricos, que devem estar sempre disponíveis ao observador, são con-

dizentes com o que é visto. A seguir, estima-se o número de plaquetase compara-se com a cifra contada.

Passa-se à série branca; para iniciar, comparando a contagemfornecida com o número de leucócitos vistos por campo. Se o equi-pamento não fornecer a fórmula, ou fornecer só fórmula simplificada(de três elementos), a fórmula é feita, identificando-se e anotando-se100 leucócitos, mas o exame é prorrogado a 200 se houver leucoci-tose, porcentagem elevada de células de baixa frequência (basófilos,

plasmócitos) ou células anormais. Anotam-se os neutrófilos bastonadosem separado dos segmentados; como a fórmula é visual, cabe registrardesvio à esquerda, se houver. Deve-se atentar para atipias linfocitárias(especialmente se houver linfocitose ou neutropenia). Observa-se se afórmula é compatível com o grupo etário do paciente e com a fórmulade três elementos fornecida pela máquina, se for o caso.

 A experiência do observador não deve ser invocada para justificarum encurtamento aquém de 90 segundos do tempo de observação. Ha- vendo fórmula automatizada completa, analisam-se da mesma maneira

a série vermelha e as plaquetas e, se a fórmula for normal e o scatterplot mostrar boa separação dos tipos celulares, observa-se (sem contar) aomenos 20 neutrófilos para excluir desvio à esquerda (já que a máquinanão distingue bastonados e segmentados). A seguir, revisa-se a mor-

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fologia dos linfócitos; se for normal, sem plasmócitos, mielócitos ou

células mais raras, libera-se a fórmula fornecida pela máquina para ocomputador do laboratório; o tempo gasto com essa microscopia semfórmula cai a cerca de 30 segundos.

 As alterações notadas à microscopia devem ser transcritas nosresultados. Dentre as usuais, algumas são objeto de quantificação pelopróprio contador eletrônico: macro e microcitose pelo VCM, anisoci-tose pelo RDW, etc. Outras, como a presença de leucócitos imaturos(mielócitos, blastos) ou inconstantes (plasmócitos) transcrevem-seincluindo-os nos 100 leucócitos da fórmula leucocitária.

Há alterações, entretanto, que não se relacionam com os dadosfornecidos pelas máquinas, e que é impossível ou inviavelmente tra-balhoso converter em números ou porcentagens, como a policromato-citose, a frequência dos vários tipos de pecilócitos entre os milhões deeritrócitos, de linfócitos atípicos dentre os linfócitos normais – pois háformas de transição – e várias outras.

E não basta anotar, de modo simplista, presença de policromato-

citose: identificar um eritrócito policromático a cada 10 campos mi-croscópicos não é o mesmo que notar 10 eritrócitos policromáticos acada campo! Até a gravidez pode causar o primeiro achado; só umaanemia hemolítica, raramente uma pós-hemorrágica, causa o segun-do. Anotação idêntica em ambos os casos é um desserviço: há queanotar a policromatocitose quantificada.

 A adjetivação da magnitude de uma alteração ou da frequên-cia de um elemento anormal é prática corrente e tradicional. Termoscomo

(para grau da alteração) (para frequência do elemento)

leve nítida raros váriosdiscreta acentuada ocasionais muitos(as)moderada considerável alguns numerosos(as)

são amplamente empregados. A grandeza expressa por esses adjeti-

 vos, entretanto, é subjetiva: depende demais dos olhos e da imagina-ção dos que veem a lâmina e dos que leem os resultados.

O problema não é só brasileiro ou da língua portuguesa. Eminglês são usados os seguintes termos:

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Hemograma  51

 slight moderate rare a few

mild marked occasional many 

 Além deles, até a indesejável observação high band (ou low band)é usada para dispensar a numeração de 100 leucócitos na fórmula visual (manual), para obtenção de um valor percentual para os neu-trófilos bastonados.

Publicações internacionais e uma recomendação antiga da OMSpreconizam semiquantificação de 1+ a 4+ como critério mais repro-

dutível e uniforme. Os fabricantes das principais linhas de contadoreseletrônicos já a adotaram nos comentários sobre os resultados; pre-feriram, entretanto, simplificá-la para 1+ a 3+. O autor recomendaesse procedimento nos termos da Tabela 1.4.

TABELA 1.4

Semiquantificação de 1+ a 4+

1+ = alteração notada só com especial atenção(p. ex., policromatocitose em grávida)

2+ = alteração notada no exame de rotina, mas não chamativa(p. ex., acantócitos em esplenectomizados)

3+ = alteração óbvia, imediatamente notada(p. ex., granulações tóxicas em paciente recebendo filgrastima)

4+ = alteração máxima, presente em grande número de células(p. ex., policromatocitose em anemia hemolítica autoimune,eritrócitos em alvo na hemoglobinopatia C homozigótica)

(Na preferência por apenas 1+ a 3+, os conceitos 1+ e 2+ acima corresponderão a1+, e os demais serão idênticos, só que para 2+ e 3+.)

ERROs mAIs COmuNs

Há erros, ditos pré-analíticos, que decorrem de imperfeição daamostra de sangue levada à máquina, não de mau processamento.São numerosos e comuns:

 1.  Sangue coagulado: a demora na aspiração do sangue à coletapermite ativação das plaquetas e da coagulação antes da açãodo EDTA. Quando a coagulação no tubo é completa, é facilmente

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notada pelo operador; o sangue é desprezado e nova coleta solici-

tada. Quando a coagulação é parcial, há consumo progressivo dasplaquetas, formação de filamentos dispersos de fibrina, às vezespequeno coágulo junto à rolha, e pode não ser notada. Algumas vezes, a fibrina impede a aspiração ou entope a agulha aspiradorado instrumento, e o resultado é rejeitado com o flag apropriado.Outras vezes, a máquina aspira soro, com mais ou menos glóbulos, variavelmente retidos na fibrina; o resultado é totalmente errado,mas enganoso, pois mostra pancitopenia, porém a anemia temíndices eritroides coerentes. Qualquer citopenia sem causa óbvia

exige cuidadosa inspeção da amostra de sangue. 2.   Plasma derramado: a perda de plasma, por derramamento ao

abrir-se a rolha ou por vazamento, quando os glóbulos estãosedimentados, causa um aumento harmônico das contagens e dahemoglobina que facilmente passa despercebido. O operador deveatentar para tubos sujos por fora, e o técnico sênior deve estranhar valores hematimétricos elevados sem razões óbvias.

 3.   Material hemolisado in vitro: causa desproporção entre a dosa-gem de hemoglobina, que permanece correta, e a contagem deeritrócitos, erroneamente diminuída, com aumento impossível daconcentração hemoglobínica corpuscular média (CHCM). Deve-seobservar a cor do plasma, no sangue sedimentado ou centrifugado,sempre que CHCM > 35%. Quando há hemólise significativa, osestromas interferem na contagem de plaquetas, com resultadosaberrantes, geralmente com flag. O julgamento caso a caso podepermitir que resultados de amostras com hemólise leve, com CHCMainda normal, sejam aceitos.

 4.   Anticoagulante ( EDTA) em excesso, geralmente por volume desangue inferior ao apropriado ao tubo, causa desidratação doseritrócitos, só parcialmente corrigida pelo solvente usado nocontador eletrônico, e há diminuição do volume corpuscular edos parâmetros dele derivados. Quando o tubo contém EDTA emsolução, o sangue dilui-se excessivamente, com baixa paraleladas contagens e da hemoglobina. O hemograma, feito do sanguecoletado em tubo para testes de coagulabilidade (nove partespara uma de solução de citrato de sódio), expressa essa diluição;

a contagem de plaquetas baixa desproporcionalmente, porque ocitrato não impede a agregação.

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Hemograma  53

 5.  Sangue velho ou malconservado: o sangue, in vitro, tem durabilidade

limitada. A temperatura alta e a trepidação no transporte aceleram adeterioração: há hemólise, cariólise, cariorrexe e citólise dos leucó-citos e agregação e lise das plaquetas. Conservado a mais de 20°C,começa a putrefação após 48 horas. Os prazos usuais de conservaçãoadequada para contagens eletrônicas em sangue coletado em tubo es-téril, mantido sem agitação, são: 26 a 35°C = 4 horas, 8 a 25°C = 12horas, 1 a 7°C = 24 a 48 horas. O laboratório deve ser informado dahora de coleta e das condições de transporte de materiais enviados.Em postos de coleta afastados, a coleta tardia (após a passagem do

transporte diário) é possível: coleta-se o sangue, distendem-se duaslâminas (identificadas e guardadas em caixa fechada, à temperaturaambiente) e conserva-se o sangue em refrigerador até o transportee o processamento na manhã seguinte. O contador Cell-Dyn 4000identifica no canal de fluorescência e conta os leucócitos em necro-biose, pois a permeabilidade alterada das membranas permite-lhesabsorver fluoresceína, que marca os núcleos. A fração leucocitária viável (WVF ) aparece no resultado como decimal da unidade; nossangues recentemente coletados, WVF > 0,980.

 6.   Falta de homogeneização do sangue ao entrar na máquina: causaaspiração incorreta, com excesso de plasma ou de glóbulos. Oresultado é totalmente errado, mas, como há compatibilidadeentre as cifras e os índices hematimétricos são coerentes, o errofacilmente passa despercebido. Há necessidade de alto grau de des-confiança para estranhar eritrocitoses ou anemias sem justificativaaparente ou contagens de leucócitos incompatíveis com o aspectoà microscopia. Nos aparelhos atuais, com transporte automático

das amostras e agitação incluída no sistema, o erro por falta dehomogeneização geralmente decorre de um excesso de sangue notubo, faltando espaço aéreo para a agitação apropriada.

 7.  Crioaglutinação: é um defeito intrínseco do sangue em exame,mas pode ser dito  pré-analítico, porque o fenômeno ocorre peloresfriamento à temperatura da sala (ou do refrigerador), antes daentrada na máquina. A aglutinação dos eritrócitos faz contar dou-

blets ou triplets como um só glóbulo, a contagem é grosseiramentefalseada para menos, e o VCM para mais, gerando uma CHCM

impossível. Um resultado do Coulter STKS é visto na Figura 5.4, p.139. Para corrigir o problema, geralmente basta aquecer o sangue

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em banho-maria a 37°C e processá-lo imediatamente. Em salas frias,

pode haver necessidade de aquecer os solventes com estufas sob asmesas. Em casos extremos (crioaglutininas com título > 1.000), ascontagens podem ser impossíveis. Crioglobulinas em concentraçõesaltas podem causar gelificação do plasma e interferir na aspiraçãoda amostra; alguns instrumentos geram flag nessa eventualidade.Podem também interferir na contagem de plaquetas, raramente nade leucócitos.

Em todos os casos em que o problema pré-analítico gera defeitoirreversível na amostra (itens 1 a 5, anteriores), a repetição do exa-me repetirá o erro. Nova coleta torna-se indispensável. A diplomáticafunção de pedir o retorno do(a) paciente para esse fim é uma tarefadiária em laboratório que coleta mais de mil hemogramas por dia.

Há erros analíticos, decorrentes de mau funcionamento ou ma-nipulação inadequada dos contadores eletrônicos e de interpretaçãoincorreta dos resultados da máquina e dos achados da microscopia.Para notá-los, persiste a necessidade do alto grau de desconfiança, dos

operadores aos técnicos seniores, até a liberação dos resultados. Mes-mo porque há erros inexplicáveis: a máquina fornece uma série dehemogramas impecáveis e, no meio deles, um, com a série vermelhaerroneamente elevada e/ou leucocitopenia espúria; repete-se, e tudoestá normal. Os erros analíticos serão discutidos com as determina-ções hematimétricas especificamente afetadas.

 Além desses erros, podem ocorrer trocas de material, erros na iden-tificação, na transcrição, no fornecimento verbal, telefônico, por fax ou

internet dos resultados, no processamento de dados, etc. Não há umasolução geral para esse problema; sempre haverá uma previsão de errose consequente tolerância das partes envolvidas, quando ocorrerem.

 Assim, qualquer resultado que suscite dúvidas na interpretaçãoexige reconferência e/ou repetição do(s) exame(s). O autor recomen-da uma linha telefônica de ligação gratuita com esta frase impressanos resultados: dúvidas na interpretação ou inconformidades, consulte-

nos pelo fone 0800...Quando um resultado duvidoso for proveniente de um labora-

tório que mereça confiança, deve ser repetido no mesmo, após con-tato direto entre o médico requisitante e o patologista-clínico, paraesclarecimentos. Os pedidos de reconferência devem ser recebidos nolaboratório com o maior respeito e, naturalmente, a preço zero.

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Hemograma  55

ExPREssãO dOs REsuLTAdOs

 A Figura 1.7 mostra o layout recomendado pelo autor.

HEMOGRAMA

Linha e modelo do contador eletrônico usado (informar, aqui ou no fim)

ERITROGRAMA

Eritrócitos* milhões/µLHemoglobina g/dL

Hematócrito %VCM fLHCM pgCHCM % (ou g/dL)RDW %

AQUI: observações (se houver) sobre a série vermelha, interpretação do histograma (se alterado),reticulócitos % e /µL (se foram contados)

LEUCOGRAMA

Leucócitos /µLNeutrófilos % /µL

(distinguir bastonados e segmentados , se for notado desvio à microscopia )Linfócitos % /µLMonócitos % /µLEosinófilos % /µLBasófilos % /µL(mielócitos , blastos e outros , se houver )

Com (ou sem) observação microscópica complementar (anotar a opção havida no caso)

AQUI: observações sobre a série branca (se pertinentes)

PLAQUETAS /µL

VPM fL (se o laboratório tiver comprovação da estabilidade do VPMe valores de referência próprios)

AQUI: observações sobre as plaquetas (se pertinentes)

FIGuRA 1.7Layout recomendado para resultado de hemograma.

* Eritrócitos, hemácias e  glóbulos vermelhos são sinônimos perfeitos. O autorprefere eritrócitos pela derivação grega coerente com leucócitos e demais nomesde células, e pelo uso consagrado de derivados, eritrocitose, eritrocitopenia,eritropoese e outros, impossíveis de derivar de hemácias. Glóbulo vermelho éuma tradução popular de eritrócito.

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Salvo em instituições fechadas, com médicos iniciados na tecno-

logia do hemograma automatizado, os laboratórios não fornecem aospacientes e/ou médicos requisitantes os resultados originais, geradosnas impressoras dos contadores eletrônicos. As razões são várias:

n As abreviações e siglas, em inglês, os gráficos e flags são ininteligíveispara os não-iniciados nessa tecnologia. Mesmo o aprendizado dainterpretação dos resultados de um tipo de máquina não implicana compreensão dos resultados de outras; são todas diferentes.

n A entrega do resultado original, junto com uma transcrição para a

forma convencional, curioso costume de alguns laboratórios bra-sileiros que usam contadores de pequeno porte, não deve ser feita.Causa confusão ou a preferência pela transcrição com desprezoda original; trabalho perdido. A inserção de células não descritaspela máquina na fórmula, mas notadas à microscopia, geraria umresultado duplo e ambíguo com risco de decisões médicas errôneaspor interpretação afoita de resultados incompreendidos.

n O interfaciamento entre os contadores e os computadores do la-boratório permite a transmissão automática de todos os valores

numéricos originais para um layout próprio, com terminologia porextenso, em português. A transmissão dos histogramas, por outrolado, mantém-se difícil ou impossível. As valiosas curvas são sone-gadas nos resultados, daí a necessidade de substituí-las por frasesesclarecedoras.