CAPACIDADE DE RESSOCIALIZAÇÃO DAS PENAS …RESUMO Aborda-se neste ensaio, de maneira clara e...
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CAPACIDADE DE RESSOCIALIZAÇÃO DAS PENAS ALTERNATIVAS: prestação de
serviço à comunidade
Igor Ribeiro Cavalcante*
RESUMO
Aborda-se neste ensaio, de maneira clara e objetiva, a importância das penas alternativas, dando-se
ênfase à modalidade, prestação de serviço à comunidade, sua historicidade até os dias atuais,
apontando os obstáculos e como é executada essa modalidade de pena alternativa na reinserção do
apenado à sociedade. Conclui-se então, com o presente estudo, que a ressocialização não é para
todos, pois nem todos que são submetidos a este tipo de sanção alternativa logram êxito, mas
mesmo em comparação à pena de privação da liberdade, esta ainda é a melhor escolha, escolha esta
ficando a critério do juiz na sentença ou se for o caso na execução, gerando assim os melhores
efeitos.
Palavras chaves: Penas alternativas. Prestação de Serviço à Comunidade ou Entidades Públicas.
Obstáculos. Execução das Penas de Prestação de Serviço à Comunidade.
_________________________
*Advogado, Especialista em Direito Penal e Processo Penal, Especializando em Direito Eleitoral, Membro da Comissão de Direitos
Humanos da OAB – PI, Membro da Comissão de Segurança Pública da OAB – PI, Vice Presidente da Comissão de Direito Eleitoral
da OAB – PI.
ABSTRACT
It is approached in this essay, clearly and objectively, the importance of alternative penaltys, giving
emphasis on the model, providing service to the community, its history until nowadays, pointing out
the obstacles and how you run this type of alternative sentence reintegration of inmates into society.
It can be concluded then, with this study that the rehabilitation is not for everyone, because not all
who undergo this type of alternative sanction manage to succeed, but even in comparison to the
penalty of deprivation of liberty, this is still the best choice , this choice left to the discretion of the
judge in sentencing, or if any execution, thus generating the best effects.
Keywords: Sentencing alternatives. Provision of Community Service or Public Entities. Obstacles.
Execution of Penalties of the Community Service Delivery.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................
2 DAS PENAS EM GERAL...................................................................................................
2.1 Evolução histórica............................................................................................................
2.2 Conceitos............................................................................................................................
3 RAZÃO DA SANÇÃO PENAL..........................................................................................
3.1 Sistemas prisionais............................................................................................................
4 CLASSIFICAÇÃO DAS PENAS.......................................................................................
4.1 Penas privativas de liberdade........................................................................................
4.2 Regimes de pena...............................................................................................................
4.3 Penas pecuniárias..............................................................................................................
4.4 Penas restritivas de direito...............................................................................................
5 PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE..........................................................
5.1 Obstáculos às penas de prestação de serviços à comunidade........................................
5.2 Execução das penas de prestação de serviços à comunidade........................................
5.3 Quem são os prestadores da pena de serviços à comunidade.......................................
5.4 Pena de prestação de serviços à comunidade cumprida em empresa privada com fins
lucrativos..................................................................................................................................
6 PERSPECTIVAS DAS PENAS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À
COMUNIDADE......................................................................................................................
7 CONCLUSÃO......................................................................................................................
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................
1 INTRODUÇÃO
Falar da pena de prestação de serviços à comunidade não é tão simples quanto parece, pois
pressupõe uma série de outros conhecimentos, como os conceitos de penas restritivas de direito,
razão da sanção penal, sistemas prisionais, sociedade, política dentre outros. Tudo isso em um
espectro histórico.
O objeto dessa monografia goza de especial relevância no sistema jurídico do país e do
estado, pois visa questionar e contribuir para um aceitável desenvolvimento do sistema prisional
brasileiro, tendo em vista a falência do sistema prisional dominante. Esse é justamente um dos
grandes problemas que enfrenta a sociedade brasileira. A escolha do presente tema acontece em um
momento em que se necessita de soluções rápidas, já que a população de apenados se agiganta em
termos numéricos, e o que se vê é que as instituições penitenciárias não cumprem com seu papel
ressocializador, e são inclusive alcunhadas de “escolas do crime”.
É, pois, um assunto polêmico e de difícil trato, pois envolve toda a sociedade e em maior
espectro os governantes do país. Não se pode, no entanto, apenas assistir o conflito negativo dos
que se eximem da responsabilidade desse contexto. Não se pode também, tratar os apenados como
apenas excrescências da sociedade, e como tal dispensar o tratamento mais degradante a essas
pessoas. Os presos são forçados a ficar em espaços mínimos, tendo sua dignidade ferida, assim
como também suas chances de recuperação.
O conceito de criminoso não pode ser tomado no lugar de um apenado ou condenado. Até
poderia, mas a palavra “criminoso” vem carregada de um sentimento negativo, o que poderia
atrapalhar no entendimento do caráter ressocializador da pessoa. Surgem assim, ramificações desse
problema: os presos não sendo ouvidos, promovem rebeliões, e revolta causa mais revolta e fica-se
a um passo de um Estado Primitivo.
É notório que um dos maiores problemas que assolam a sociedade brasileira nos dias de hoje
é o destino que se deve dar às pessoas que infringiram as leis ditadas pelo Estado.
É preciso conjugar a imposição da pena com a ressocialização do apenado de forma que o
condenado deve estar recuperado quando sair da prisão para que não mais volte a delinquir, nem a
agir em desacordo com a lei.
Há várias teorias que tentam explicar as finalidades das penas. Uns dizem que tem por
escopo a retribuição pelo dano causado; outros alegam que o fim primordial é o aspecto
intimidativo da pena, ou a prevenção geral, ou seja, evitar que atos ilícitos venham a ser cometidos
no futuro. No curso da evolução das sociedades, em especial da sociedade brasileira, essas duas
correntes rivalizavam a hegemonia no tocante à razão de ser da pena. No entanto, a sociedade, ou
pelo menos as ideias mais em consonância com o atual sentido de “vida em sociedade”, caminham
ou convergem para outro objetivo da pena, que é exatamente o caráter educativo, ou melhor,
reeducativo da pena.
Esta monografia atua justamente nesse sentido, de lembrar à sociedade, de uma forma
concreta e objetiva a importância da aplicação das penas alternativas, mormente a pena de prestação
de serviço à comunidade na atividade fim e hodierna da pena, da re-inserção do apenado de volta na
sociedade.
A importância do presente trabalho reside numa explícita inovação: a pena de prestação de
serviço comunitário é aqui tratada não como sendo uma alternativa imediata à pena privativa de
liberdade, no sentido de subsidiariedade à constrição de liberdade. O enfoque dispensado a ela aqui
é no alternativo no sentido de concorrência com aquela pena privativa de liberdade, tendo como
influência principal a função social da lei objetivando tornar o sistema punitivo menos draconiano e
mais racionalista.
Importante ressaltar que as chamadas penas alternativas à privação da liberdade são
consideradas como sanções modernas, pois os próprios reformadores do Direito Penal, como
Beccária, Howard, e Bentham, não as conheciam. Beccária já havia antecipado que é a celeridade e
a certeza da pena, mais que a sua severidade, que produzem a efetiva intimidação. Sabe-se, no
entanto, que a pena privativa de liberdade foi um marco da humanização da sanção criminal, mas
que posteriormente, como propomos a analisar, fracassou em seus objetivos declarados.
Outra observação preliminar a ser feita é com relação ao aspecto da denominação e conceito.
Penas alternativas são as chamadas pela Lei de penas restritivas de direito. Essa denominação,
porém, é mais ampla do que deveria e engloba tanto as penas efetivamente restritivas de direito,
como as restritivas de liberdade (como é o caso da pena de prestação de serviços comunitários),
bem como as pecuniárias.
É importante perceber que o estudo racional e sistemático da pena de prestação de serviço à
comunidade, uma espécie de pena alternativa, sobeja no aspecto prático e pode ajudar a
compreender a sua real efetividade na sociedade brasileira moderna.
Muitas são as penas alternativas existentes, tais como limitação de fim de semana, prestação
pecuniária, interdição temporária de direitos, entre algumas outras, mas é claro e evidente que
nenhuma tem em sua natureza intrínseca o aspecto cidadão tão acentuado. A prestação de serviço
comunitário busca exatamente envolver o apenado na sociedade, com a comunidade e com as
questões sociais, procurando educá-lo ou orientá-lo a não mais delinquir.
Este trabalho reitera que essa modalidade de pena alternativa não deve ser utilizada ante
apenas à falência da pena de prisão. Este é um “plus” decorrente do contexto atual e tenta responder
a seguinte indagação: Será que as penas de prestação de serviço à comunidade prevista no nosso
ordenamento penal têm o condão de obter melhores resultados na ressocialização do preso?
Levando-se em consideração o direito positivo, propõe-se a analisar a importância da maior
utilização da pena de prestação de serviço à comunidade na medida em que sua existência constitui
fato sobre o qual se deparam os operadores do direito, principalmente juízes e promotores de
justiça.
Não adentraremos os fatores causais da delinquência, mas partiremos da sanção imposta
pela reação do Estado. Assim sendo reservaremos algumas linhas iniciais à evolução das penas
tendo em vista seu fim específico até o momento em que culminou a falência das penas de prisão
para formularmos as seguintes questões: É real a presença das penas de prestação de serviço à
comunidade na sociedade brasileira ou não passa de mais um “coma jurídico”? E qual a
quantificação do seu aspecto ressocializador?
O problema de uso e mais adiante da efetividade da prestação de serviço comunitário se
revela de suma importância entre nós, porquanto constitui uma das penas alternativas que visa a
ressocialização do preso.
Chama-nos a atenção não à prestação da referida pena, mas o resultado gerado por essa pena
em detrimento das outras penas, alternativas ou não.
Deve ser ela utilizada porque é uma exigência da natureza humana, que é a vida em
sociedade. Onde há homens há sociedade.
De modo geral, o sistema penitenciário brasileiro possui um grande déficit e é nesse
contexto que as Penas Alternativas, mostram-se as menos onerosas, além de representarem maior
efetividade nos cumprimentos das determinações judiciais. Estão submetidas às Penas Alternativas,
pessoas que cometeram infrações de trânsito, crimes ambientais, delitos de menor potencial
ofensivo como lesões corporais leves, desacatos, ameaças, atos obscenos, pequenos furtos entre
outros.
No Brasil temos a Associação de Proteção e Assistência ao condenado- Apac - onde os
presos não são aprisionados como lixo social que não merece tempo e preocupação da sociedade. O
preso é um preso, mas tratado de forma diferente, como um ser detentor de direitos e deveres, um
cidadão latu sensu. Nesses presídios parece haver à primeira vista um milagre, mas o que este
trabalho quer justificar é que a solução é conhecida, ou pelo menos não é obra de intervenção
divina. O infrator sendo bem tratado, ou sendo tratado com o mínimo de dignidade, tem mais
chances de ser reeducado e de ter o crime, apenas como o seu passado, e de se reintegrar no seio
social, local de onde foi retirada a força.
Os métodos brasileiros de prisão são desumanos e cruéis, enquanto conquista o título de
campeão mundial da violência e da corrupção. E não se constrói um país assim da noite para o dia.
Os presídios, de vez em quando, tornam-se palcos de carnificina, o que aparece constantemente nos
noticiários nacionais.
Essa violência ocorre dentro de um território que deveria ser administrado exclusivamente
pelo Estado. O que se observa claramente, no entanto, é a omissão das autoridades responsáveis
pelo setor.
Desde o descobrimento do Brasil, tudo se faz, sobretudo nos estabelecimentos que recolhem pessoas privadas da liberdade, em favor da violência, das atrocidades e da crueldade. Falta Lei? Não. Leis existem. O que não existe é a consciência de que devem ser cumpridos, respeitadas. O horror dos presídios brasileiros historicamente só é denunciado (e gera certa sensibilidade) quando gente graúda nele é recolhida.
Governar é prender, conforme dizia Francisco Campos; na realidade contudo, essa premissa
é levada ao absurdo de se prender sem necessidade. Mais de 40% dos presos ainda não foram
condenados ou já foram absolvidos, mas estão cursando as faculdades do crime.
Winston Churchill disse que os métodos penais de uma sociedade são o índice e medida do seu grau de civilização. Dostoievski, por seu turno, afirmou: os standards de civilização de uma nação podem ser aferidos quando abrimos as portas das suas prisões.
Não há duvidas de que o Brasil está atrasado com relação a vários outros países no que diz
respeito ao tratamento dispensado aos condenados. É inconcebível, portanto, que aos plenos olhos
do Estado, nos próprios presídios ocorram episódios de violência estatal.
2 DAS PENAS EM GERAL
2.1 Evolução histórica
Analisando as penas em geral, sob a perspectiva da teoria contratualista, percebe-se que
inicialmente os homens se encontravam em um estado de natureza no qual eram inimigos
recíprocos (todos contra todos). Cada um se preocupava em defender-se da violência praticada
pelos outros de forma independente, não havia classes nem grupos formados, havia a luta de cada
um contra todos, conforme aduz Thomas Hobbes, em “Leviatã”. Numa visão mais branda do
“estado de natureza”, John Locke o tinha como “relativa paz” e harmonia caracterizando-o pela
mais perfeita liberdade e igualdade. Todavia, Locke admitia que em tal estado havia certos
inconvenientes, como, por exemplo, a violação da propriedade, vida, liberdade e bens. Por essas
razões e conflitos constantemente existentes celebraram entre si o contrato social, promovendo a
passagem do estado de natureza para a sociedade civil.
Não obstante, tal situação traz conflitos no seio social, o que dá suporte ao estabelecimento
de certos regramentos objetivando a consecução de um padrão de normalidade das coisas. Tem-se
assim a origem do direito de punir, ou seja, do jus puniendi, promovido pela própria sociedade civil.
O “jus puniendi” é o direito que o Estado tem de aplicar a pena relativa ou cominada no preceito
secundário da norma penal, sendo, portanto, um direito público subjetivo que, no entanto encontra
limites no direito objetivo.
É nesse sentido que surgem as penas tidas como modernas. A origem das penas, porém, é
anterior à própria criação da sociedade organizada, onde era atribuído aos mais antigos grupamento
de homens um caráter divino, pois o descumprimento das obrigações, até então devidas aos
“deuses”, ensejava punições, dentre elas a tortura e a morte.
A evolução das penas teve o seguinte contorno: vingança privada (bem representada pelo
Código de Hamurábi), vingança divina (a punição era forma de aplacar a ira divina e purificar a
alma do delinquente), vingança pública (visando à segurança do próprio Estado), período
humanitário (com Cesare Bonesano, Marquês de Beccaria como um dos pilares dessa filosofia) e o
mais recente movimento científico (que busca compreender cientificamente os fenômenos criminais
e o próprio infrator).
Em sua origem, como já mencionado, a pena se revestia de caráter sacral, ou seja, era reação
contra o desrespeito aos tabus, às coisas míticas e religiosas. O homem acreditava que para obter as
graças das entidades divinas, deveria promover-lhes oferendas e sacrifícios. Castigavam-se os
infratores que provocassem o enfurecimento dos deuses. Um exemplo que destoa desse contexto
são as penas aplicadas pelo povo muçulmano através do Alcorão. O Alcorão foi escrito em 652 d.C.
e ao contrário dos povos ocidentais, o povo mulçumano fundamenta sua organização com base no
Alcorão. Deste modo, quem viola o Alcorão não apenas comete um pecado como também infringe
o ordenamento legal. A obediência a essa "lei" é um dever de fé e um dever social. O Alcorão é uma
lei acima das demais leis jurídicas e nele encontram-se penas de morte, penas de Talião, legitimação
para o assassinato de infiéis, penas de chibatadas e etc.
O que se tem de certo e unânime é que à medida que a sociedade evolui, menos cruéis vão
se tornando as penas e que as penas são imprescindíveis na sociedade, desde a primeira que se tem
notícias de origem bíblica. A primeira pena a introduzir o basilar princípio da proporcionalidade foi
a Lei de Talião: olho por olho dente por dente.
Foi adotado no código de Hamurabi:
Art. 209 – Se alguém bate numa mulher livre e a faz abortar, deverá pagar dez siclos pelo
feto.
Art. 210 – Se essa mulher morre, então deverá matar o filho dele.
Na linha histórica, surgiu em seguida a Composição, que introduzia a reparação do dano
causado como forma alternativa de substituição da pena. A pena de privação de liberdade, aponta os
dados históricos, foi utilizada pela primeira vez pela igreja na Idade Média. “Esta tinha o hábito de
punir seus infiéis com a pena de penitência realizada nas celas”.
Daí a origem da palavra penitenciária. Saindo da Idade Média, para o Iluminismo,
abandonou-se a fundamentação teológica e ascendeu o fim utilitário da pena. É de Beccaria a ideia
de que a pena só é justa, quando necessária e de prevenção geral. Quanto à crueldade das penas,
afirmava que era de todo inútil, odiosa e contrária à justiça. Sobre as prisões de seu tempo dizia que
"eram a horrível mansão do desespero e da fome", todas essas idéias presentes na obra Dos Delitos
e das Penas.
Dos delitos e das penas é uma obra que foi escrita a muito tempo, porém se conserva bem
atual em alguns pontos de modo a ser uma obra muito lida para se solver problemas modernos.
Trata-se de uma obra atemporal com ideias igualmente modernas. “Entre as penalidades e no modo
de aplicá-los proporcionalmente aos delitos, é necessário, portanto, escolher os meios que devem
provocar no espírito a impressão mais eficaz e mais durável, e igualmente, menos cruel no corpo do
culpado.”
O caráter ressocializador da pena só foi dar seus primeiros suspiros nas fases antropológicas
e sociológicas, com Lombroso e Ferri e mais ainda na fase jurídica de sistematização com Rafael
Garofalo. Foi, por exemplo, César Lombroso, autor do livro L’uomo Delinquente, quem apontou os
novos rumos do Direito Penal, através do estudo do delinqüente e a explicação causal do delito. Em
1945, Filippo Gramatica fundou uma nova doutrina, a Nova Defesa Social, que tem influenciado as
legislações penais modernas com algumas idéias inovadoras: a função de proteção da sociedade,
além do caráter expiatório da pena; o caráter ressocializador da pena, além de ser exemplar e
retributivo, e que o tratamento penal seja mais humano.
Com o passar do tempo e evolução da sociedade humana, as penas de suplícios foram
desaparecendo.
No entanto, um fato é certo, em algumas dezenas de anos, desapareceu o corpo supliciado,
esquartejado, amputado, marcado simbolicamente no rosto ou no ombro, exposto vivo ou
morto, dado como espetáculo. Desapareceu o corpo como alvo principal da repressão penal.
A punição deixa de ser espetáculo para ser um procedimento da administração. A execução
da pena não pode ser tomada como um teatro da sociedade, esta não deve ser escrachadamente
pública, mas sim os debates e a sentença que precede a execução. O mundo todo, por muito tempo,
foi mestre na criação de apetrechos e parafernalhas com o único intuito da pena cruel, entretanto,
em princípios do século XIX, penetramos na época da punição sóbria, o que não quer dizer que foi
totalmente abolida.
O ato de julgar também se transformou. Não se indagava mais apenas “quem é o autor”, se
perquiria agora o processo causal que o produziu, a origem do crime, o que realmente significa um
crime. Surgiram nesse contexto, alguns dos vários auxiliares da justiça que se tem hoje, tais como
peritos psiquiátricos, funcionários da administração penitenciária, o que fracionou o poder de punir.
Todas essas modificações ou evoluções como queiram, tiveram reflexos rápidos. “A delinquência
difusa, ocasional, mais frequentes das classes mais pobres é substituído por uma delinquência
limitada e hábil.”
É assim que aumentaram os delitos contra a propriedade em detrimentos dos crimes
violentos.
Na verdade, a passagem de uma criminalidade de sangue para uma criminalidade de fraude
faz parte de todo um mecanismo complexo, onde figuram o desenvolvimento da produção,
o aumento das riquezas, uma valorização jurídica e moral maior das relações de
propriedade, métodos de vigilâncias mais rigorosas, um policiamento mais estreito da
população, técnicos mais bem ajustados de descoberta, de captura, de informação: o
deslocamento das práticas ilegais é correlato de uma extensão e de um afinamento das
práticas punitivas.
2.2 Conceitos
Todo o processo penal existe para se alcançar uma única coisa ao final: a sentença penal. E a
sentença penal condenatória, a aplicação da pena é possivelmente o momento mais importante. A
pena é o objetivo final da ação penal e seria assim o resultante legal da prática de ilícito,
concretizado pelo exercício da acusação na ação penal. A forma primitiva das penas não se
enquadra mais na moderna conceituação de sanção penal.
Devemos, entretanto, analisar o conceito de pena sobre outra perspectiva: para correção do
infrator, o Estado dispõe de vários meios antes de se utilizar da pena. O Estado fracassa quando
utiliza a pena, posto que somente deve ser utilizada como último recurso para corrigir o infrator. De
fato, há duas graves consequências quando se recorre em demasiado ao direito criminal: excesso de
processos no Poder Judiciário e o aumento do gasto público para acolher um número maior de
condenados. É o que Reinhart Franck chama de “hipertrofia penal.”
Alguns doutrinadores aventuram-se na busca por um conceito de pena: Aníbal Bruno diz que
“pena é a sanção, consistente na privação de determinados bens jurídicos, que o Estado impõe
contra a prática de fato definido na Lei como crime”. Basileu Garcia também nos traz um conceito
de pena: “Pena é o sofrimento imposto pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado de
infração criminal.”
Com relação aos sistemas penais, foi no 6° Congresso das nações Unidas que se começou
uma discussão crítica sobre os altos índices de reincidência, concretizada e aprovada no 8°
Congresso da ONU. A proposta foi apelidada de Regras de Tóquio, também conhecidas como
Regras Mínimas das Nações Unidas para a elaboração de Medidas Não Privativas de Liberdade.
Esse congresso significou a aplicação das medidas alternativas na Era Moderna. Medidas
alternativas constituem assim qualquer medida que venha a impedir a aplicação da pena privativa de
liberdade. Penas alternativas, nas lições de Fernando Capez, constituem toda e qualquer opção
sancionatória oferecida pela legislação penal para evitar a imposição da pena privativa de liberdade.
Ao contrário das medidas alternativas, constituem verdadeiras penas, as quais impedem a
privação da liberdade. Compreendem a pena de multas e as penas restritivas de direitos. Outro
conceito bastante similar é o de alternativas penais. Alternativas penais: são todas as opções
oferecidas pela lei penal a fim de que se evite a pena privativa de liberdade. Comportam duas
espécies:
a) as medidas penais alternativas (transação, suspensão do processo etc.);
b) as penas alternativas.
Não é clara a diferença entre penas alternativas e alternativas penais, porquanto na prática da
execução penal só vai existir a pena que vai possibilitar maiores chances de ressocialização.
3 RAZÃO DA SANÇÃO PENAL
A questão da finalidade da pena é um tema que percorre os séculos, envolvendo vários
ramos do conhecimento humano, os quais nos oferecem uma gama imensa de teorias e teses.
Algumas dessas teorias, contudo, advém de concepções primitivas, e hoje tidas como ultrapassadas,
mas que se tornam importantíssimas em uma análise mais sistemática. A pena, dessa forma, pode ter
um caráter aflitivo, retributivo, preventivo, educativo etc. É aflitiva porque consiste na privação de
bens jurídicos fundamentais (liberdade e patrimônio).
É retributiva porque guarda estreita relação com a gravidade do delito e o grau de
culpabilidade do agente.
É preventiva porque combate a criminalidade em perspectiva para prevenir a prática do
delito. Na ótica de prevenção geral, pode-se dizer que as penas pretendem evitar que as pessoas em
geral cometam crimes. Na ótica da prevenção especial, pretende evitar que esse indivíduo volte a
cometer crimes.
Age por duas vias:
1 Ou porque esse indivíduo é segregado e enquanto está cumprindo a pena não tem a possibilidade
de reincidir;
2 Ou então já tem a idéia de regeneração, de recuperação ou de ressociabilização.
O objetivo da pena é essencialmente de exercer uma influência na comunidade geral,
prevenir a prática de crimes. É de Füerbach a teoria psicológica da “coacção”, (impulso de praticas
crime), sendo a função da pena exatamente combater esse impulso de cometer crimes. Intimida-se
as pessoas, com esta “coacção” para que os cidadãos em geral não cometam crimes. Esta prevenção
geral divide-se em:
1 Prevenção geral positiva: revelar o que acontece quando se praticar um crime;
2 Prevenção geral negativa: revelar a intimidação.
A teoria da prevenção especial tem também a ideia de prevenção, mas a prevenção do
indivíduo, ou seja, que o agente não volte a cometer um crime. Deseja evitar a reincidência.
Os principais defensores da teoria da prevenção especial asseguram-na de três formas:
1 Salvaguardar a comunidade do delinquente;
2 Intimidar o autor com a pena;
3 Evitar a reincidência.
O Direito Penal é cada vez mais dirigido à pessoa do criminoso, criando condições para a
socialização.
Na teoria retributiva, que mais se opõe a Teoria da Prevenção, o crime é a própria razão de
ser da pena: a sanção é aplicada porque foi praticado o delito. Na teoria da prevenção, visa-se à
intimidação de todos os componentes do grupo social bem como do próprio condenado. É essa
teoria a que mais condiz com a moderna concepção da pena.
A teoria mista sustenta, por sua vez, que a pena é necessária ao ideal de justiça; na expiação
do criminoso, mas é também modo de defesa social, sendo meio de prevenir delito.
A sanção penal pode assumir diversos contextos: pode ser a um só tempo aflitivo, retributivo
e preventivo. O contexto atual, prudente que se diga de antemão, é o da recuperação do preso de
modo a tentar reinseri-lo à sociedade.
Resultava de reações primárias, quase instintivas, mais de fundo emocional, refletindo a
característica ético-social dos grupamentos sociais, o que se pode vislumbrar no exame das
primeiras espécies de sanções que se conhece, como o escárnio, expulsão da comunidade,
vingança do grupo, vingança privada, etc” p. 104.
A criação e desenvolvimento da pena de prisão possibilitaram a redução da pena de morte, e
em muitos países, até a aboliu. Considera que a pena de prisão vem recebendo diferentes ideias.
Um notável pensador e filantropo inglês, Jonh Howard visitando, de 1775 a 1790, as
prisões de diversos países da Europa, deixou em seu livro State of Prisons descrita a
situação lastimável em que se encontravam os prisioneiros, submetidos a regimes duros, a
penas disciplinares corporais, numa promiscuidade revoltante, mal alimentados, mal
vestidos, metidos em prisões sem higiene alguma; e por isso, foco de febres infecciosas que
os discriminavam e se propagavam para a população livre, deixando aquele livro profunda
impressão nos centros civilizados. Aos seus esforços, se deve a criação das prisões locais,
dotadas de celular e submetidas a regulamentos disciplinares em Horsan (1779) e em
Glericester (1791)..
3.1 Sistemas prisionais
A filosofia de se utilizar a prisão como forma de pena começou somente a partir do século
18. A evolução dos regimes de aplicação de penas está intimamente ligada à evolução dos próprios
sistemas penitenciários.
São três os sistemas penitenciários clássicos: o “pensilvânia” ou “filadélfico”, o
“auburniano” e o inglês ou progressista.
O sistema “filadélfico”, também chamado de belga, porque adotado na Bélgica, tinha como
característica principal o rigoroso isolamento, tanto diurno quanto noturno, a oração e a abstinência
total de bebidas alcoólicas. A saída da cela só era permitida para o pátio fechado. Esse isolamento
exacerbado só levava à loucura ou ao embrutecimento do condenado. Tinha uma forte
fundamentação religiosa, mas já apresentava a influência das idéias iluministas de Beccaria.
No sistema “auburniano”, originário da penitenciária de Auburn, só havia isolamento
noturno. O trabalho era obrigatório no regime de absoluto silêncio. Esse sistema surgiu da
necessidade de se superar as limitações e os defeitos do regime filadélfico, e como forma de
adequar a mão-de-obra penitenciária aos anseios capitalistas, aproveitando o apenado como força
produtiva. O sistema pensilvânico fundamentava-se basicamente em uma orientação religiosa,
enquanto o auburniano motivava-se claramente em razões econômicas.
O sistema progressivo ou inglês, de autoria do inglês Maconichia, primeiramente implantado
na colônia penal de Norfolk (1840) na Inglaterra, o trabalho era como se fosse moeda de troca,
como estímulo à possível redução da pena imposta.
É o regime dos distintivos (estrela verde) que marca o progresso obtido no cumprimento da
pena, com a administração do trabalho externo; as saídas possibilitadas pelo regime semi-
aberto e aberto, com possibilidades de aprimoramento da instrução e cultura do condenado;
só aceito os castigos moderados e de natureza disciplinar, não ofensivos à condição
humana, com as seguintes características:
a) proibição de medidas ofensivas à dignidade humana;
b) que exponham os condenados a perigo relativo à saúde;
c) proibição de isolamento diurno, só admissível em caráter excepcional;
d) separação das mulheres, em regime adequado à sua condição e formação.
A adoção do regime progressivo coincidiu com a ideia da consolidação da pena privativa de
liberdade como instituto penal e da necessidade da busca de uma reabilitação do preso
possibilitando-lhe reintegrar-se à sociedade antes do término da condenação. O sistema progressivo
tinha como fundamento dois princípios: estimular a boa conduta do apenado e obter sua reforma
moral para uma posterior vida no seio da sociedade. A duração da pena baseava-se na conjugação
de três fatores: a gravidade do delito, o aproveitamento do trabalho e pela conduta do apenado.
É preciso entender a evolução da aplicação das penas de privação de liberdade para se
entender seus problemas. Desde sua origem, sua alma é de expiação do corpo do condenado.
Contudo, alem do caráter retributivo do mal causado à sociedade, os grandes doutrinadores
históricos nos ensinam que a pena deve também possuir caráter ressocializador.
4 CLASSIFICAÇÃO DAS PENAS
Há basicamente quatro tipo de penas:
1 Privativas de liberdade: são sanções corporais, pois atingem a liberdade física do apenado, e em
regra, têm a noção de encarceramento através da prisão simples, reclusão e detenção;
2 Restritivas de liberdade: limitam em parte o poder de locomoção, embora não recolham à prisão
de forma absoluta, a exemplo do banimento;
3 Restritivas de direitos: diminuem direitos, que não a liberdade de locomoção (interdição
temporária de direitos, prestação de serviços à comunidade etc);
4 pecuniárias: possuem caráter econômico e acarretam diminuição do patrimônio do apenado (multa
e confisco).
A todas essas penas se aplicam princípios básicos do direito penal, tais como Legalidade,
Personalidade, Proporcionalidade e Inderrogabilidade.
Pelo princípio da Legalidade é necessária previsão legal da pena a ser aplicada. Nula poena,
nullun crimen sine praevia legem de acordo com o art. 1º do Código Penal brasileiro e o art. 5º,
XXXIX da Constituição Federal do Brasil de 1988.
O princípio da Personalidade significa que a pena se restringe a quem tenha praticado o
delito, sendo vedada a terceiros (art. 5, XLV). É através dessa individualização que se alcança a
eficiência do tratamento penal. “Nos termos do nosso novo Código penal, destina-se a pena a
exercer sobre o condenado – uma individualizada ação educativa, no sentido de sua recuperação
social.”
Proporcionalidade porque cada conduta criminosa deve ser reprimida com uma sanção
proporcional ao mal por ela causada.
Inderrogabilidade significa que a pena deve ser certa e deve ser cumprida, se praticado o
delito previsto.
4.1 Penas privativas de liberdade
No Brasil, somente com a Constituição de 1824, em seu artigo 179 §18, declarou-se
expressamente o fim dos suplícios e das penas infamantes. Editou-se o Código Penal de 1890 com a
Proclamação da República, aboliu-se as galês e limitou em 30 anos as penas de prisão, instituiu a
prescrição das penas e mandou computar na pena o tempo de prisão preventiva. A Constituição de
46 restaurou direitos e liberdades individuais, proibindo expressamente, no art. 141 §31, a pena de
morte, banimento, confisco e prisão perpétua.
O ordenamento jurídico brasileiro atual possui mais de 260 infrações no Código Penal,
punidas com pena privativa de liberdade. Essa modalidade de pena é bastante influenciada pelas
teorias das penas já analisadas em momento anterior. Até meados dos anos 60, a pena serve como
retribuição do mal causado, ou na visão de Kant, o “restabelecer a justiça”.
Em momento posterior surgiram as teorias utilitárias ou instrumentais, que vislumbravam na
pena a ideia de prevenção, deduzindo a prevenção geral e especial. Inicialmente a pena privativa de
liberdade se coadunava com essas duas teorias. Observava-se que a pena que devia intimidar não
intimidava. A delinquência era uma conseqüência natural do aprisionamento, ou seja, a prisão
fracassava em seus objetivos declarados.
De uma forma geral, desde a Reforma Penal na Alemanha de 1975 que instituiu a pena
unitária privativa de liberdade, passou-se a defender a unificação da reclusão e detenção. Estas são
as duas formas possíveis de privação de liberdade. A Alemanha imperial nos deixou muitas
inovações no que diz respeito à sistemática jurídica, mormente com relação ao direito penal e suas
diversas penas. A legislação imperial alemã arrolava quatro espécies de pena de prisão:
• Reclusão como pena grave e infamante, com trabalho forçado;
• Encarceramento, pena de gravidade média, não infamante, mas com trabalho forçado;
• Detenção, pena leve, não infamante, ordinariamente sem trabalho forçado;
• Prisão em fortaleza, como pena grave, não infamante, ordinariamente sem trabalho forçado.
Na prática, observou-se que a diferença entre a reclusão, entre o encarceramento e a
detenção, era quase nenhuma ou nenhuma. Na teoria, a reclusão era a pena do crime; o
encarceramento, a do delito e a detenção a da contravenção. A reclusão era necessariamente
acompanhada de trabalho forçado e era permitido o trabalho fora do recinto da prisão, desde que os
condenados fossem separados dos trabalhadores livres. O encarceramento permitia aos condenados
(art. 16) serem empregados em trabalhos que se correlacionem com suas aptidões e com suas
condições, desde que assim o pedissem; podiam trabalhar fora da prisão se os condenados
consentissem. Não havia trabalho forçado na prisão em fortaleza. Já era um suspiro da efetiva
aplicação da pena de trabalho comunitário.
Como primeiros precursores das prisões modernas, podem ser consideradas, a prisão
celular de Franci, aberta em Florença em 1677 e a casa de correção construída em Roma,
em 1704, por Clemente XI, destinada aos moços pervertidos; ahi foram pela primeira vez
experimentados com feliz resultado o trabalho em comum sob a lei do silêncio durante o
dia e a prisão celular durante a noite.
No Brasil, mesmo com a Reforma Penal de 1984, manteve-se reclusão e detenção como
espécies do gênero “pena privativa de liberdade”. A doutrina aponta algumas diferenças entre elas:
1 O regime inicial de cumprimento, na reclusão, pode ser fechado, o mais rigoroso de nosso sistema
penal, semi-aberto ou aberto. Na detenção, o regime inicial é o semi-aberto ou o aberto. A detenção
só poderá ser cumprida em regime fechado se houver a regressão. Infere-se que somente os crimes
mais graves são puníveis com pena de detenção, reservando-se a reclusão aos crimes de menor
gravidade;
2 A autoridade policial poderá conceder fiança apenas nas infrações punidas com detenção ou prisão
simples;
3 A pena de reclusão executa-se primeiro depois, a detenção ou prisão simples.
4 Somente os crimes punidos com reclusão, praticados pelos pais, tutores ou curadores contra os
respectivos filhos, tutelados ou curatelados geram a incapacidade para o exercício do pátrio-poder,
tutela ou curatela;
Essas são as diferenças primordiais entre reclusão e detenção. As penas privativas de
liberdade configuram o núcleo de todas as principais formas de punição da sociedade
contemporânea, e é a forma como a sociedade vem costumeiramente buscando que os condenados
“paguem” por seus crimes.
Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto.
A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a
regime fechado.
§ 1º - Considera-se:
a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;
b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou
estabelecimento similar;
c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva,
segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as
hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:
a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime
fechado;
b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8
(oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;
c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá,
desde o início, cumpri-la em regime aberto.
§ 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância
dos critérios previstos no art. 59 deste Código.
4.2 Regimes de pena
O regime carcerário significa a sistemática, a marcha com que se dará o cumprimento da
sanção. São determinados pela espécie, quantidade da pena e pela reincidência, aliadas ao mérito do
condenado num sistema progressivo. São de três tipos:
• Regime Fechado: se o agente for condenado a pena superior a oito anos, deverá iniciar em
regime fechado (art. 33, § 2º, a) sendo cumprida em penitenciárias, com sujeição a trabalho
diurno (na conformidade de suas aptidões ou ocupações anteriores desde que compatíveis com a
execução da pena) e isolamento noturno. Não tem direito a freqüentar cursos e o trabalho
externo só é possível em obras ou serviços públicos, desde que o condenado tenha cumprido
mais de um sexto da pena;
• Regime semi-aberto: se o agente condenado a pena superior a quatro anos e menor que oito for
primário, poderá iniciar nesse regime (art. 33, §2º, b), devendo cumpri-la em colônia agrícola,
industrial ou estabelecimento congênere. Não há previsão para o isolamento durante o repouso
noturno e terá direito a frequentar cursos profissionalizantes, de instrução de 2º grau (médio) ou
superior. Com relação ao condenado reincidente: “Súmula do STJ: 269 - É admissível a adoção
do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro
anos se favoráveis as circunstâncias judiciais.”
• Regime aberto: se o agente condenado a pena igual ou inferior a quarto anos for primário,
poderá iniciar nesse regime. Baseia-se na autodisciplina e no senso de responsabilidade do
apenado. O condenado é recolhido (em casa do albergado) durante o repouso noturno e nos dias
de folga. O condenado deverá trabalhar, freqüentar cursos ou exercer quaisquer outras
atividades autorizadas fora do estabelecimento e sem vigilância. Assim o detento deve
demonstrar que merece a adoção desse regime e que para ele está preparado, sem frustrar os fins
da execução penal, sob pena de ser transferido para outro regime mais rigoroso (art. 36, § 2º do
CP).
• Regras do regime disciplinar diferenciado (RDD): Pela nova redação do art. 52 da Lei de
Execuções Penais, o regime disciplinar diferenciado poderá ser aplicado, sem prejuízo da
sanção correspondente à falta grave, nas seguintes situações:
1ª) prática de fato previsto como crime doloso que ocasione subversão da ordem ou disciplina
internas;
2ª) apresente alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade;
3ª) quando houver fundadas suspeitas de envolvimento ou participação em organizações
criminosas, quadrilha ou bando. Esse regime terá duração máxima de trezentos e sessenta dias
prorrogáveis em caso de reincidência na falta grave até o limite de um sexto da pena aplicada. O
isolamento acontece em cela individual com direito à saída da cela por duas horas diárias para
banho de sol.
É essa mesma espécie de pena que se diz, com bastante verdade, que se encontra em
falência, decorrente de vários fatores: “O Brasil é considerado um dos países que mais desrespeita
os direitos humanos e também leva a fama de que só coloca na cadeia os três (3) ‘p’: preto, pobre e
prostituta.”
O grande problema no Brasil é a desigualdade social, o que se reflete também na política
penal, sendo que vários são os problemas que atingem o Brasil e um deles (mais um) é a inflação de
leis absurdas, contraditórias e inúteis que estão em vigor. E são leis federais, estaduais e municipais.
Tem que ser colocado na equação que o Brasil possui muito mais de 5.000 (cinco mil) municípios.
O Brasil não se satisfaz nem com sua própria Constituição, visto que também são inúmeras
Emendas Constitucionais, sem contar as centenas e milhares de Medidas Provisórias todos os anos.
Toda essa situação no Brasil é um contra-senso tremendo: não obstante a produção de um
número absurdo de leis, o artigo 3° da Lei de Introdução ao Código Civil prescreve que “ninguém
pode escusar-se de cumprir a lei sob o pretexto de não conhecê-la”. O problema é ainda maior se
tratar de matérias de direito penal, posto que é o ramo do direito que alberga situações jurídicas tão
invasivas na vida do ser humano. O Ex. Ministro do Superior Tribunal de Justiça Francisco Assis
Toledo (I, II e III – Themis, Fortaleza, vol. 1, n° 2. p. 125, 132, 1998) afirmou que:
a) o ar que respiramos não é favorável a grandes inovações na área do Direito Penal na medida em
que se nota são condições propícias ao ressurgimento de idéias retrógradas como: endurecimento
das penas, a revogação dos benefícios concedidos aos condenados, a reedição de penas cruéis do
passado, o rebaixamento da idade limite da responsabilidade penal, o que recebe eco da mídia e, por
isso, conquista a adesão de políticos em busca de votos e de apoio popular;
b) Conforme levantamento do Ministério da Justiça foram apontados dados preocupantes no tocante
à pena de prisão: os espaços existentes nos estabelecimentos penais estão ocupados pelo dobro do
número de presos em relação ao número de vagas e o número de mandados de prisão expedidos
pela Justiça e não cumpridos aproxima-se de 300.000;
c) Como se vê, enigma da esfinge aí está: decifra-me ou te devoro. Mas para decifrá-lo teremos de
mudar a postura e rever profundamente nossas convicções tradicionais a respeito da infalibilidade
da pena de prisão como resposta única do Estado a toda e qualquer espécie de crime.
4.3 Penas pecuniárias
O Código penal brasileiro estipula que a pena de multa consiste no pagamento ao fundo
penitenciário da quantia fixada e calculada em dias multa. Essa multa pode ser a sanção principal,
quando cominada abstratamente como pena específica a um tipo penal, ou alternativa ou cumulativa
com a pena privativa de liberdade cominada no tipo, podendo ainda ser instituída como pena
substitutiva.
No Brasil, a pena de multa deve ser paga no prazo de dez dias após transitado em julgado a
sentença penal condenatória. Importante salientar que a execução da pena de multa é considerada
dívida de valor e assim, aplicam-se as normas da chamada dívida ativa da Fazenda Pública. “STF
Súmula nº 693: Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativo a
processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada.”
4.4 Penas restritivas de direito
Von Lirzt, ao seu tempo, lutou para a reformulação do sistema, propondo a substituição das
privativas de liberdade por recursos mais adequados. Uma das primeiras penas alternativas surgiu
na Rússia, em 1926, que foi a prestação de serviços comunitários, arts. 20 e 30 do Código Penal
soviético. Por outro lado, foi na Inglaterra que se aperfeiçoou o trabalho comunitário, com seu
“Comunity Service Order”, a partir de 16 anos. O êxito inglês influenciou inúmeros países. O
sistema penal sueco tem como base se evitar sanções privativas de liberdade, alegando-se que essas
sanções não contribuem com a readaptação à vida em sociedade.
No Brasil, paralelamente às penas privativas de liberdade, a legislação penal também prevê
algumas penas mais brandas, que não atingem de forma direta a liberdade do condenado: são as
penas restritivas de direito, ou penas alternativas.
Com a nova redação dada pela Reforma Penal, passou o artigo 43, do Código Penal, a dispor
o seguinte com relação às penas restritivas de direitos:
Art. 43. As penas restritivas de direitos são:
I – prestação pecuniária;
II – perda de bens e valores;
III – (Vetado);
IV – prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;
V – interdição temporária de direitos;
VI – limitação de fim de semana.
As penas substitutivas foram denominadas penas restritivas de direitos e previstas no artigo
43, com a redação da Lei nº 9.714/98. Ao final de 1998, a Lei 9.714 de 25.11.98 aumentou o rol das
penas restritivas de direitos. Além da prestação de serviços à comunidade, temos previsto na lei a
interdição temporária de direitos, limitação de fim de semana, prestação pecuniária, perda de bens e
valores de serviços a entidades públicas. É cabível a substituição da pena privativa de liberdade
inferior ou igual a quatro anos, não sendo o crime praticado com violência ou grave ameaça à pena.
Sendo culposo o crime, independe de quantum da pena aplicada. Se for doloso o crime, mesmo em
reincidência, o juiz poderá aplicar a pena substitutiva, desde que, em face de condenação anterior, a
medida seja socialmente recomendável e que não seja reincidência em mesmo crime.
Tais penas somente podem ser atribuídas aos réus que não ofereçam periculosidade e que
possam permanecer em liberdade.
Preconizar-se novo sistema de penas, dotado de substitutivos à pena de prisão, revertido de
eficácia pedagógica, de forma a restringir à privação da liberdade a crimes graves
cometidos por delinqüentes perigosos. A busca de outras sanções para criminosos sem
periculosidade diminuirá a ação criminógena do cárcere e atuará como fator de
despopulação das prisões.
Essas penas restritivas de direitos são autônomas, substitutivas e reversíveis. Salienta Juarez.
Cirino dos Santos:
As penas restritivas de direito possuem tríplice caráter (art. 44, inciso e parágrafos, e 54,
CP):
a) são autônomas como espécie independente de pena, existente ao lado das penas
privativas de liberdade;
b) são substitutivas, porque aplicáveis como alternativas da pena privativa de liberdade
aplicada (a única exceção é a interdição de direitos nos crimes com violação de deveres de
profissão, atividade, ofício, cargo ou função, em que a pena restritiva de direitos atua como
autêntica pena carcerária);
c) são reversíveis porque admitem, em determinadas hipóteses, reaplicação da pena
privativa de liberdade substituída, como garantia de eficácia da pena restritiva de direitos
aplicada.
Explicando: são autônomas e substitutivas. Autônomas porque a aplicação de uma delas não
significa aplicação conjunta das outras. Além disso, na sentença, devem ser aplicadas
automaticamente, diretamente pelo juízo das execuções penais. Substitutiva porque as penas
previstas para os crimes são sempre de reclusão ou detenção (ou multa); as restritivas são aplicadas
de modo substitutivo frente a uma pena de reclusão ou detenção. A prestação de serviços
comunitários está prevista no art. 46 CP, ficando ressaltado o caráter de potencial oportunidade de
reeducação para a cidadania. O serviço deve ser prestado de forma gratuita e sem remuneração. As
condições para sua aplicação são:
• Objetivas:
• Ter sido o agente condenado à pena privativa de liberdade;
• Em crimes dolosos, a pena não deve ser superior a quatro anos;
• Não ter sido cometido mediante violência ou grave ameaça à pessoa;
• Em crimes culposos, qualquer que seja a pena imposta;
• O agente não pode ser reincidente em crime doloso.
• Subjetivas:
• Culpabilidade do agente;
• Antecedentes;
• Conduta social;
• Personalidade do agente;
• Motivos e circunstancias que indiquem que a substituição seja suficiente.
As penas restritivas de direito têm a mesma duração da pena privativa de liberdade
substituída e não devem ser penas acessórias, mas são penas autônomas e substitutivas menos
severas. Da leitura do artigo 44 do CP se depreende que as penas restritivas de direito substituem as
privativas de liberdade fixadas em quantidade não superior a quatro anos e desde que o crime não
tenha sido cometido com violência ou grave ameaça à pessoa. Outra possibilidade de aplicação é
em se tratando de crime culposo, qualquer que seja a pena aplicada. É também necessário que o réu
seja reincidente em crime doloso; sendo reincidente em crime culposo ou pela prática de crime
doloso e culposo, o juiz deverá analisar se a medida é socialmente recomendável perante a
condenação anterior, salve a reincidência não seja de um mesmo crime. Não terá problema algum a
substituição se a condenação anterior tenha transitado em julgado após o cometimento do crime
pelo qual está sendo julgado. Na mesma ressalva, se já houver decorrido o prazo de cinco anos do
art. 64, I da CP.
Apesar da pena restritiva de direitos ser autônoma, ela substitui a privativa de liberdade, e
dessa forma não pode o juiz fixá-la diretamente. Primeiro o juiz deve fixar penas privativa de
liberdade e em seguida a substituir, especificando por qual das modalidades possíveis, sob pena de
nulidade. Havendo sentença condenatória, a execução das penas restritivas de direito só se torna
possível com o trânsito em julgado da sentença condenatória, com o que se faz necessário para a
expedição da guia de execução. Sendo necessária a colaboração de entidades públicas, ou
particulares para o efetivamento da pena restritiva de direito, o juiz da execução deve requisitar de
entidades públicas e solicitar a particulares. Aqui está evidenciada a divisão de responsabilidades no
cumprimento dessas alternativas com as pessoas jurídicas de direito público ou privado ou com os
particulares.
Alguns doutrinadores entendem que as penas restritivas de direito, na verdade, para uma boa
técnica, deveria se chamar de penas alternativas e já que algumas dessas sanções não são
propriamente restritivas de direito, a exemplo da perda de bens e valores, multa. Todas essas penas
alternativas não podem ser aplicadas diretamente, isto é, são subsidiárias à pena privativa de
liberdade, somente podendo haver a substituição se presente os requisitos legais. Não podem
também ser aplicadas cumulativamente com a pena privativa de liberdade.
O momento correto para haver a substituição é na sentença. No entanto o art. 180 da LEP
permite que seja feita a conversão na execução. A pena restritiva de direitos converter-se-á em
privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado, ou quando, por outro crime,
sobrevier condenação à pena privativa de liberdade.
Insta acentuar que, embora previstas no art. 43 do Código Penal como “penas restritivas de
direitos”, nem todas as penas dos artigos supramencionados, são restritivas de direitos,
como é o caso da perda de bens e valores, multa e prestação pecuniária, de natureza
pecuniária.
A impropriedade linguística de se chamar pena restritiva de direito ou penas alternativas
assume um tamanho muito pequeno se comparada com o problema da eficácia da sua aplicação.
Deve ser visto então, como questão meramente conceitual, sem quase ou nenhuma aplicação
prática.
Tal como se prevê no Brasil, na Alemanha existe a possibilidade de substituir a pena
privativa de liberdade, à disposição do juiz a ser executada no momento da determinação da pena na
sentença, cabendo-lhe escolher a medida mais adequada, levando em consideração a personalidade
do agente, entre outros requisitos. Na própria definição legal da pena de prestação de serviços
comunitários, está clara a preocupação em estabelecer onde deve acontecer tal prestação. Não se
aceita, a princípio, as entidades privadas que visam lucros. Alguns doutrinadores entendem o
contrário. Em alguns países, as penas são executadas no horário normal de atividades diárias do
apenado, mas no Brasil, será em horário que não coincida com o trabalho diário do apenado, em
respeito aos interesses do considerado e ao processo de reintegração social.
Neste particular, parece-nos que a metodologia brasileira é absolutamente correta, conforme
se verá, pois possibilita ao juiz eleger, com margem de liberdade, a pena mais adequada,
assim como a substituição de uma pena de sérios efeitos negativos por outra menos
dessocializadora.
As penas restritivas de direitos, a exemplo da prestação de serviços à comunidade e
limitação de fim de semana podem ser alteradas durante o seu cumprimento pelo juiz da execução,
se houver motivo determinante, ou se precisar readaptá-las às condições pessoais do condenado. A
entidade beneficiada pelo serviço prestado pelo condenado deve encaminhar mensalmente ao juiz
da execução, um relatório de todas as atividades do condenado; pode também, a qualquer tempo,
comunicar falhas e faltas porventura existentes.
Essa alternativa a prisão não pode ser confundida com a modalidade de trabalhos forçados
que é vedada pela Constituição Federal, ela é modalidade gratuita de serviços, possui tempo
limitado, tem caráter retributivo e ainda devem ser consideradas as aptidões de seu
beneficiário, o que é completamente diferente de trabalhos forçados, nos quais seus
condenados exercem atividades penosas.
Atualmente o Código Penal contempla nove sanções alternativas além da pena pecuniária.
Trata-se, bom frisar, de rol taxativo, não havendo possibilidade de o juiz criar novas sanções
substitutivas. O objetivo dessas penas alternativas está esculpido no art. 5°, XLVI CF/88, que prevê
a pena de prestação social alternativa, diminuindo a superlotação dos presídios, reduzindo os custos
do sistema penitenciário, favorecendo a ressocialização e reduzindo a reincidência. As penas
alternativas restritivas de direito podem ser de dois tipos: penas restritivas de direito em sentido
estrito e as penas restritivas de direitos pecuniários. A prestação de serviço comunitário é da
primeira modalidade.
O Brasil está longe de perceber todos os efeitos da prestação de penas alternativas,
principalmente da prestação de serviço comunitário, que é dentre as penas alternativas, a que mais
se vincula ao caráter pedagógico da pena.
5 PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE
A Constituição do Brasil proíbe as chamadas penas de trabalhos forçados, contudo, não se
está proibindo trabalho ao condenado. A interpretação desse dispositivo deve ser conseguida de
acordo com o princípio da dignidade humana, que veda a aplicação de penas que aviltam a pessoa
do condenado, como aquela imagem do condenado trabalhando com uma bola de ferro presa aos
pés.
Diplomas legais espalhados pelo mundo todo rechaçam a prestação de trabalhos forçados ou
obrigatórios. O trabalho deve ser visto tanto como um direito como dever do condenado, o que pode
demonstrar que o condenado está preocupado em voltar para a sociedade de forma produtiva, além
de ter o direito da remissão da pena: para cada três dias de trabalho, um dia de pena remida. A
própria sociedade não concorda, a princípio, com a ressocialização do apenado. De verdade, só que
não se pode generalizar o termo ressocialização.
A experiência atual mostra claramente que o penitenciarismo, ou seja, a ressocialização por
meio do encarceramento, não consegue alcançar suas expectativas. O que se observa é o
aviltamento da personalidade do preso. A culpa, porém, não é toda desse sistema falido: é também
da má distribuição de renda, do falho sistema de educação, falta de trabalho. Dessa forma “a prisão
não é a melhor alternativa, mormente por saber-se que ela se tem apresentado inútil como meio de
reinserção do condenado na vida comunitária” Com a Lei 7209/84, as possibilidades de penas
aplicáveis passaram a ser três:
- privativas de liberdade (reclusão e detenção);
- restrição de direitos (a principal inovação prevendo as penas de prestação de serviços à
comunidade, interdição temporária de direitos e limitações de fim de semana); e
- multa.
A pena de restrição de direitos não era inovação genuinamente brasileira, porquanto já
existia essa previsão na Rússia de 1926, com a prestação de serviços à comunidade, e em 1960, o
mesmo diploma penal instituiu a pena de trabalhos forçados com o intuito de corrigir e reeducar o
apenado. A Inglaterra, em 1972 também instituiu o trabalho comunitário, influenciando vários
outros países inclusive o Brasil. A primeira das penas restritivas de direito previstas (indicadas) no
dispositivo penal era a pena de prestação de serviços à comunidade.
O trabalho do detento é um fator comprovadamente que ajuda na transformação carcerária.
Quando se pune alguém, deve-se ter em mente que a certeza da punição é fator muito mais
importante nos efeitos da punição, que uma punição mais severa.
Além disso, com esse trabalho buscava-se diminuir os custos com os presos e ainda formar
uma quantidade de novos operários. O mecanismo disciplinar da prisão marca, por mais estranho
que pareça, a humanidade do direito de punir, visto o que existia antes e sendo ela à justa medida
segundo a variável do tempo. Deve a prisão proporcionar isolamento do detento em relação a outro
detento e em relação ao mundo exterior para que o condenado se afaste de tudo de nefasto que o
levou à infração. A solidão suscita, dessa forma à reflexão, um trabalho de sua consciência. “O
trabalho é definido, junto com o isolamento, como um agente da transformação carcerária.”
Isso tudo é baseado no princípio da dignidade humana. A solução, outrora apontada por
muitos, da construção de novos presídios, não passa de uma brisa num vendaval, é necessária, mas
não suficiente. É necessidade inadiável dar novo enfoque à pena de prisão, bem como reformular o
conceito de pena. “Desde que se pretenda propiciar ao delinquente uma efetiva ressocialização.
Ressocialização entendida como proporcionar-se ao delinquente uma formação educacional e
profissional capaz de reajustá-lo ao meio social.”
E isso passa por outro grande problema:
Trata-se da necessidade de modificação da atitude da sociedade frente ao preso e da atitude
do preso frente à sociedade... O primeiro passo deve ser dado pela sociedade. Na medida
em que esta se interessar pelo problema do preso, passará a conhecê-lo melhor e poderá
compreender o drama que existe em cada delinquente.
Sua recuperação interessa a todos e mais ainda à própria sociedade e dessa forma a
sociedade tem que deixar de pensar que o crime e o criminoso são problemas só da justiça e da
polícia. Numa visão mais pormenorizada do fenômeno crime, percebemos que ele não é regido por
leis causais, mas sobretudo por leis estatísticas. Pela observação das pessoas residentes num
presídio qualquer, grande parte é pobre, o que se poderia concluir que a pobreza seja causa de
crime, o que não é verdade, porque igualmente muitos pobres não praticam crimes. O que se pode
concluir é que a pobreza é fator de crime. Temos assim que, além do problema carcerário
enfrentamos o problema penitenciário, que é a terapêutica penal visando à recuperação do
sentenciado.
Não seria nem um pouco ressocializador se não se pudesse alterar determinada pena
restritiva. Deve se levar em consideração, o sujeito da prestação da pena, ou seja, o condenado, se
ele está faltando, se ele pode ser melhor aproveitado em outra atividade etc.
No contexto da formação da definição da criminologia como uma nova ciência, o Brasil se
encontrava-se e ainda se encontra um passo atrás em relação à Europa.
Com uma enorme preocupação com a eficácia da ação judicial, o discurso jurídico no
Brasil no início do período republicano realizou um movimento que ia do trabalho às
práticas repressivas que deveriam ser as mais “modernas e eficientes”, discorrendo
amplamente acerca das penas e da ação ressocializadora da ação judicial. Neste sentido, a
instituição judiciária disparou um conjunto de práticas políticas e ideológicas que visavam
uma atuação decisivamente disciplinar, através a ‘educação para o trabalho.
Apesar da ideologia avançada, os sentenciados ainda eram tratados como mortos e almas, e
os números mostram-nos, como informava relatórios anuais feitos pelo Ministro da Justiça de 1895,
Antônio Gonçalves Ferreira. Nesses relatórios, os sentenciados eram alcunhados de “almas”, isto é,
mortos, sem qualquer chance de retorno ao mundo dos viventes. Passada a República, já em 1903,
foram fundadas instituições no Rio de Janeiro, que viessem a obedecer aos dispositivos processuais
penais de se perseguir a ressocialização: Colônia Correicional de Dois Rios e a Escola Premonitória
Quinze de Novembro. É interessante notar a estreita relação que se observava nessa época.
5.1 Obstáculos às penas de prestação de serviços à comunidade
Vários fatores obstacularizaram seu sucesso efetivo: inexiste uma estrutura de apoio a essa
atividade, falta de conhecimento e/ou medo de obrigar um infrator (medo esse incutido pela própria
imprensa). Essa prestação completa perfeitamente o conceito moderno de “pena”, que abrange o
caráter retributivo, humanitário e ressocializador. Essa é uma das penas capazes de produzir o efeito
benéfico da punição, sem os inconvenientes da prisão.
O sucesso, em verdade, dependerá da participação de todos os envolvidos, do empenho no
sentido de que as modalidades de pena possam alcançar seus objetivos.
A sensibilidade e o engajamento da sociedade, também representam um fator decisivo para
que tal desidarato seja atingido.
Parece-nos que a sociedade não concorda, pelo menos à primeira vista, com a
ressocialização do condenado. O estigma da condenação, carregado pelo egresso, impede-o de
retornar ao normal convívio em sociedade. É interessante notar que a ideia de recuperação pelo e
para o trabalho estava na base da reflexão sobre a modernização institucional do controle social no
Brasil dos primórdios da República, tal como o ocorrido nos países europeus na passagem ao
capitalismo, desde o século XVI, quando os trabalhadores urbanos não tinham ainda, se organizado
politicamente.
A prestação de serviços à comunidade respeita alguns detalhes: quando o somatório das
penas for superior a 6 (seis) meses de privação de liberdade; é possível o serviço em entidades
públicas, hospitais, escolas, orfanatos e outras instituições do gênero. Tem que se respeitar, porém, a
natureza do crime cometido e as aptidões do infrator quando da atribuição de que função prestar.
Em verdade, não podemos generalizar o termo ressocialização, razão pelo qual o processo
de individualização da pena existe. Aquele apenado que nunca aprendeu um ofício externamente,
enquanto gozava de sua liberdade, talvez desperte interesse em aprendê-lo no sistema penitenciário.
Se não tinha instrução básica, não sabia ler ou escrever, ou mesmo se, tendo algum conhecimento,
isso era insuficiente para colocá-lo no mercado de trabalho, talvez o sistema possa ajudá-lo de
alguma forma.
Cada preso tem sua particularidade, sua individualidade, não podendo ser confundido com
os demais. Para alguns, a ressocialização, entendida no sentido de educação e habilitação
para a prática de um ofício, seria um passo importante visando ao futuro egresso. A sua
especialização, em determinada área de trabalho faria com que sua mão-de-obra se tornasse
competitiva, mesmo sendo vista com reservas, considerando que ele traz consigo as marcas
do cárcere, ou seja, o efeito estigmatizante que dificilmente será esquecido, até que
efetivamente demonstre o seu valor.
No que concerne especificamente a prestação de serviço à comunidade ou a entidades
públicas, espera-se que aflore a sensibilidade do condenado, fazendo com que este se sinta inserido
na vida da comunidade. Essa modalidade de pena restritiva tem os seguintes aspectos: caráter
retributivo, intimidativo, ressocializador e alguns desdobramentos deste último, como por exemplo,
não gera desemprego e ainda presta serviços relevantes à sociedade. Deve ser respeitado, na escolha
do serviço, as aptidões do condenado para se dá maior utilidade à comunidade. “Escolhido” qual
serviço e onde, será o condenado intimado, para saber, os dias e horários de sua obrigação, no total
de oito horas semanais. Ao mesmo tempo, o condenado deverá saber que o descumprimento das
tarefas poderá acarretar a conversão da pena restritiva de direito em privativa liberdade, por isso que
será ele submetido a relatório mensal de suas atividades, por parte da entidade receptora dos
serviços. “Para promover a execução, o juiz deve requisitar, quando necessário, a colaboração de
entidades públicas, ou solicitá-las a particulares.” (art. 147).
No que se refere à prestação de serviço à comunidade, esse tipo de pena possui assento
constitucional no art. 9°, XLVI (como prestação social alternativa.) e consiste na atribuição de
tarefas gratuitas ao condenado. Deve ser feito pessoalmente, ou seja, o condenado não pode realizar
o serviço mediante atuação de terceiro.
A Lei de Execução Penal assevera que o trabalho não somente é um direito, mas também um
dever do condenado, inclusive de natureza social Convém ressaltar que a jornada normal de
trabalho não pode ser prejudicada pela prestação de serviço à comunidade. No dizer que Guilherme
Sousa Nucci, a prestação de serviços gratuitos à comunidade depende da colaboração de entidades
assistenciais particulares, ou da atuação de órgãos estatais, com fins assistenciais, sem prejudicar o
trabalho normal do sentenciado.
A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas representa a mais adequada e
generosa modalidade de pena restritiva de direitos, entre todas as outras, concebida para substituir a
pena privativa de liberdade, mas sua aplicação é dificultada por obstáculos comunitários ou
oficinas: nem a comunidade, representada por entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos
etc., nem as entidades públicas, representadas pelos órgãos dos poderes da União, dos Estados e dos
Municípios, parecem receptivos à idéia de admitir a prestação de serviços substitutiva da privação
da liberdade de indivíduos estigmatizados por sentenças condenatórias do sistema de justiça
criminal.
O juiz encarregado da execução da pena é quem deve fazer a execução da prestação de
serviços à comunidade ou a entidades públicas. A intenção da lei não é prejudicar as atividades
normais do condenado, por isso é de uma hora de trabalho por dia, mas se tiver tempo disponível,
poderá trabalhar mais horas e se condenado a pena de mais de um ano, sua pena não poderá reduzir-
se para aquém da metade da pena privativa de liberdade originalmente fixada.
5.2 Execução das penas de prestação de serviços à comunidade
No mundo atual, observamos as modernas teorias unificadas da pena, combinando as teorias
existentes, outrora teorias isoladas. O método utilizado na prisão é a disciplina, a política de coerção
objetivando reconstruir os indivíduos através de três recursos apontados por FOULCAULT:
vigilância hierárquica, sanção artificial normatizadora e o exame.
Antes de dezembro de 2003, com a Lei 10792 modificando a Lei de Execuções Penais, só se
permitia o trabalho do condenado realizado sob a gerência ou empresa pública e com o objetivo da
formação profissional do condenado (arts. 28 e 34, LEP). Com a Lei 10792/03, se admitiu
convênios do poder público com iniciativa privada para implantação de oficinas de trabalho em
instituições penais. As penas restritivas de direito surgiram com a reforma penal de 1984, e não
penas que criam obrigações, limitam direitos e reduzem a liberdade do condenado,
temporariamente.
Por mais que seja importante abordar as execuções de todas as ditas penas alternativas,
resume-se aqui somente à Prestação de Serviços à Comunidade, visto que esta alternativa à prisão
se apresenta como a maneira mais eficaz de frear a reincidência criminal.
A Prestação de Serviços à Comunidade ou Entidades Públicas, encontra-se explícita nos
artigos 43, IV e 46 do CPB. Esta modalidade, como já analisado, consiste na realização de
atividades gratuitas a instituições que visam a atender a comunidade, entendida como a sociedade
em geral, ou entidades públicas como ONG`s, creches, praças, orfanatos, escolas, ruas, hospitais,
Órgãos da Administração Direta ou Indireta, Fóruns entre outros. Os espaços dos hospitais, por
exemplo, por sua dinâmica e pela vivência que oferece, é ideal para o cumprimento da pena de
prestação de serviços pois aumenta o caráter educativo e permite a reinserção do infrator.
Entretanto, a possibilidade de convênio com capitais privados para implantar oficinas de trabalho
em instituições penais (art. 34 §2°, LEP) não inclui a terceirização da disciplina carcerária, porque o
poder disciplinar no sistema penitenciário continua monopólio exclusivo do Estado. Tem-se que,
normalmente, a prestação de serviços à comunidade desenvolve-se em média de 7 horas semanais,
não podendo prejudicar o prestador de serviços no seu horário habitual de trabalho e/ou atividades.
Prestando sem remuneração, seus serviços junto a entidades assistenciais, hospitais,
escolas, orfanatos, e outros estabelecimentos congêneres, além do descongestionamento das
instituições de custódia, tem-se por escopo sua ressocialização, esperando-se que a
experiência lhe sirva de reflexão para o seu crescimento como pessoa, ou no mínimo, para
que o iniba de reincidir em ato criminoso ou contravencional.
Da mesma forma, assevera Edilhermes Marques Coelho na parte geral de seu livro Manual
de Direito Penal: a Dogmática numa ótica garantista que tais tarefas, no entanto, deverão ser
desempenhadas pelo condenado de forma gratuita, sem remuneração. A gratuidade tem singular
importância, pois resguarda o caráter punitivo da pena de prestação de serviços à comunidade.
Ademais, diferencia a prestação de serviços do trabalho do preso – este com jornada de trabalho e
sob remuneração.
Exemplificativamente, se a substituição for de uma pena de detenção de um ano, o juiz
determinará a prestação de 365 horas de serviços à comunidade. Se for de um ano e seis meses,
serão 365+180 = 545 horas, que deverão ser distribuídas a fim de não prejudicar a atividade laboral
do condenado, suas atividades normais, podendo ser prestadas durante a semana nos períodos
noturnos ou nos sábados e domingos.
Como leciona Fernando Capaz, a condenação a prestação de serviços à comunidade ou a
entidades públicas pode ser cumprida também de forma descontínua e em variados dias e com totais
de horas diferenciadas, desde que componha o montante de horas semanais prefixado pelo Juiz
executor.
Tal alternativa prisional é modalidade gratuita de serviços, as tarefas não podem ser
remuneradas, uma vez que se trata do cumprimento da pena principal (Lei de Execuções Penais art.
30) e não existe pena remunerada; possui tempo limitado, tem caráter retributivo e ainda devem ser
consideradas as aptidões de seu beneficiário (condenado), proporciona-lhe aprendizado, dando-lhe
oportunidades por meio do trabalho ter contato com pessoas habituadas a boas condutas e normas
de cidadania, oportunidades de demonstrar habilidades a serem valorizadas e aproveitadas,
transformando seu beneficiário de sujeito do crime para um sujeito social consciente da cidadania,
enfim, permiti-lhe acesso a serviços públicos por meio do exercício do direito de punir.
Analisando ainda sob a ótica da reintegração social, vislumbra-se também outro benefício
desta alternativa penal, uma vez que o fato de não ter sido preso evita o estigma ou alcunha de “ex-
presidiário”, facilitando-lhe oportunidades que são mais difíceis para pessoas egressas do sistema
prisional, a procura de sua reintegração.
Tal modalidade substitutiva à pena de privação de liberdade dá-se apenas quando o fato
processual reúne as condições previstas no art.44 do Código Penal Brasileiro, ou seja, quando a
pena privativa de liberdade aplicada ao caso for inferior a um ano; o réu não for reincidente e a
culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os
motivos e as circunstâncias indicarem que esta substituição seja eficiente. Finalizado ou suspenso o
processo penal com base no art.89 da Lei 9.099/95, o Ministério Público opinará acerca do
cabimento da pena de prestação de serviços à comunidade. Caberá então ao Magistrado, se acolher
as razões do Ministério Público e de acordo com o seu próprio convencimento com relação àquele
acusado e às circunstâncias do caso concreto que o levaram a delinquir, sentenciar o condenado ou
processado (em caso de suspensão do processo), na forma legalmente prevista, pelo tempo que
julgar conveniente ao apenado, e indicar a entidade ou programa comunitário ou estatal onde será
prestado serviço pelo condenado (ou processado). Este, após intimado da sentença será cientificado
do local onde cumprirá a pena e seguirá com a documentação que lhe for fornecida pelo cartório
(ofício à entidade e cópia da sentença).
Art. 149 - Caberá ao juiz da execução:
I - designar a entidade ou programa comunitário ou estatal, devidamente credenciado ou
convencionado, junto ao qual o condenado deverá trabalhar gratuitamente, de acordo com
suas aptidões;
II - determinar a intimação do condenado, cientificando-o da entidade, dias e horário em
que deverá cumprir pena;
...............
Art. 150 - A entidade beneficiada com a prestação de serviços encaminhará mensalmente,
ao juiz da execução, relatório circunstanciado, bem como a qualquer tempo, comunicação
sobre ausência ou falta disciplinar.
Cabe ainda ressaltar que de acordo com o § 1º do art. 181 da LEP (Lei nº. 7.210/84), a pena
de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas será convertida em privativa de
liberdade quando o condenado não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido; não
comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa em que devia prestar serviços; recusar-se,
sem justificativa, a prestar o serviço que lhe foi imposto como pena; e, praticar falta de natureza
grave.
Não é preciso que se elimine a pena privativa de liberdade, mas se deve conservá-la apenas
para os casos em que ela é indispensável. Há casos que essa pena deve ser substituída pelas medidas
e penas alternativas e restritivas de direitos, com resultados muito melhores. A aplicação da pena de
prisão atualmente no Brasil, não está reduzindo a criminalidade. Não funciona a pena privativa de
liberdade quando o sistema penitenciário não é adequado. Dados de pesquisa mostram que a
reincidência é maior a quem se submete à pena privativa de liberdade e menor em relação às penas
alternativas.
5.3 Quem são os prestadores da pena de serviços à comunidade
Para a implementação a contento da efetividade da Prestação de Serviços à Comunidade é
mister delimitar-se quem são, a partir do cometimento de quais crimes ou infrações, pode-se falar
neste substituto penal. Como analisado no item passado, só cabe tal substituição quando a pena
privativa de liberdade aplicada ao caso for superior a seis meses de privação de liberdade (LEP, art.
30); se a pena substituída for superior a um ano é facultado ao condenado cumprir a pena
substitutiva em tempo inferior ao da pena privativa substituída (Código Penal, arts. 55 e 46 §4°)
nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada; cabe igualmente tal substituição se o
réu não for reincidente e deve-se levar em consideração a culpabilidade, os antecedentes, a conduta
social e a personalidade do condenado, bem como se os motivos, as circunstâncias e as
consequências di crime indicarem que esta substituição seja eficiente. São, portanto as infrações
leves, consideradas de menor potencial ofensivo, onde as mais comuns são:
• Lesão corporal leve;
• Embriaguês ao volante;
• Dirigir sem habilitação;
• Desacato ou ameaça;
• Porte de entorpecentes ou substâncias ilícitas;
“O réu não deve ficar encarcerado senão na medida em que se considere necessário para
impedir de fugir ou de esconder as provas do crime.”
Além desses, podemos citar outros tipos penais suscetíveis de substituição com as penas
alternativas: Lesões corporais culposas delito de trânsito (art. 129); Periclitação da vida e da saúde
(arts. 130 a 137); Crimes contra a honra (arts. 138 a 145); crimes contra a liberdade pessoal (arts.
146 a 149); Crimes contra inviolabilidade do domicílio (art.150 e seus parágrafos); Crimes contra
inviolabilidade de correspondência (arts. 151 a 154); Do dano (art. 163 a 167); Da apropriação
indébita (art.168 a 170); Estelionato (art. 171); e contravenções penais.
Fática e estatisticamente, de acordo com o Programa de Prestação de Serviços à
Comunidade feito pelo GADAH, observa-se que há um certo padrão com relação aos infratores que
são alvos ou mais suscetíveis a essa substituição:
• 91% são do sexo masculino;
• 68% entre 18 e 35 anos;
• 47% com ensino fundamental;
• 93% tem vínculo com a região.
Ainda conforme o mesmo estudo, nas Unidades onde o Programa está implantado, os
prestadores de serviços podem desenvolver as seguintes atividades, dentre outras compatíveis
assemelhadas:
• Distribuir, recolher e organizar fichas de atendimento;
• Arquivo em geral;
• Organização de estoques;
• Distribuição de materiais, prontuários e documentos;
• Separação e distribuição de rouparia;
• Recepção;
• Trabalhos de digitação;
• Serviços de manutenção predial, de equipamentos e sub-frota;
• Cuidados nos parques e jardins e ruas;
Dado importante está nas estatísticas que nos apresentaram a respeito da reincidència: o
retorno à criminalidade é maior em relação aos condenados que cumpriram pena privativa de
liberdade; menor no tocante aos submetidos a medidas alternativas, como a prestação de serviço à
comunidade, que tem a preferência da comunidade mundial. E essas informações não são novas. Há
duas décadas que nos Estados Unidos a reincidência do egresso prisional varia de 40 a 80%, na
Espanha, chega a 60% (BITENCOURT, C. R. Falência da pena de prisão, cit. p. 149 “apud” p.
13.)
Em 2002, a Portaria n° 153, de 27/02/2002, instituiu o Programa Nacional de Apoio e
Acompanhamento de Penas e Medidas Alternativas com vistas a expandir ou difundir e ainda
fiscalizar a utilização das penas e medidas alternativas em todos os estados da federação. Este
programa confere eficácia à Lei 7209/84, que introduziu no Brasil a possibilidade de se aplicar a
substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direito, as quais estão arroladas
no artigo 43 do Código Penal.
5.4 Pena de prestação de serviços à comunidade cumprida em empresa privada com fins
lucrativos
Outro ponto a ser discutido entre os doutrinadores é a questão se é admissível que a
prestação de serviços à comunidade seja cumprida em uma empresa de natureza privada com fins
lucrativos.
Importante ressaltar que em nosso ordenamento jurídico, é ausente disposição sobre a
questão. De forma sistemática, conduzindo uma interpretação teleológica da norma, tem-se que é
possível a prestação de tal pena com entidades privadas com fins lucrativos, mas desde que
atendidas certas condições, de modo a não significar que a parceria resulte em exploração de mão
de obra, em relação empregatícia ou, ainda, em enriquecimento ilícito.
Consta no art. 46, § 2.°, do Código Penal, que além de hospitais, estabelecimentos
assistenciais, escolas etc. o Juízo da Execução pode designar outros locais para o cumprimento do
trabalho. Trata-se, portanto, de um rol exemplificativo, que inclui empresas privadas com fins
lucrativos, no processo de ressocialização do apenado.
Esse é o caminho a ser adotado pela política criminal brasileira, uma vez constatada a
falência de seu sistema tradicional de repressão ao crime. Como sabemos, a superlotação nos
presídios torna inviável que autores de delitos, cuja ofensa ao bem jurídico é considerada leve ou
média nos termos da lei vigente, sejam afastados do convívio social. Essa segregação impossibilita
o alcance da realização da finalidade principal da pena, que é a reabilitação do condenado.
Elas se justificam pela própria falência do sistema punitivo lavado na privação de liberdade.
Bem afirma Luiz Flávio Gomes que ”a prisão é um produto caro e reconhecidamente não
ressocializa. Pelo contrário, dessocializa. Em razão da superpopulação, dos seus métodos e
da sua própria natureza, é desumana e cruel; corta o vínculo com a comunidade, com a
família, com o trabalho, com a educação etc. Há séria dúvida, por tudo isso sobre se cumpre
ou não seu papel de intimidação”. Havendo tal ineficiência do conjunto de penas privativas
de liberdade, as penas restritivas funcionariam como alternativas racionalizadoras do
sistema punitivo.
Conclui-se que é sim possível que a prestação de serviços à comunidade seja feita em razão
de celebração de parcerias entre o Estado e empresas privadas, com ou sem fins lucrativos, para a
execução das penas alternativas apropriadas ao caso. Seria adotado o mesmo procedimento
utilizado pelas Centrais de Aplicação de Penas Alternativas em suas parcerias com entidades
públicas e com Organizações Não-Governamentais (ONGs).
Não faria sentido excluir tais entidades privadas, pois não há motivo jurídico ou fático para
tal impedimento, a medida que o aproveitamento dessa prestação supera, em muito eventual ponto
negativo. Proporciona sim uma grande integração, e quando essa integração é com entidades
privadas com fins lucrativos, sendo estas de grande importância econômica para a sociedade, aflora
um sentimento de maior integração na sociedade pelo apenado; faz com que os apenados se sintam
mais úteis na sociedade, concretizando sobremaneira os intentos.
6 PERSPECTIVAS DAS PENAS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE
É consenso geral que as Penas Alternativas, principalmente a de prestação de serviços
comunitários e a entidades públicas tem apresentado resultados bastante satisfatórios no que diz
respeito à recuperação dos condenados para o processo de sociabilidade.
É nesse sentido que se infere claramente as duas funções da pena modernamente: reeducar e
ressocializar. O Estado atua trazendo o infrator para seus cuidados, oferecendo todas as condições
de educação e posteriormente o devolve já recuperado, ao convívio social e familiar normal. De
uma forma geral, a pena tem duas características: preventiva e repressiva contra os ilícitos penais.
Surge e se desenvolve nesse contexto os Juizados Especiais Criminais com a Lei 9099/95.
O Juizado Especial Criminal surge, em princípio, com três propósitos. O primeiro deles
vem ao encontro da modernização do direto penal mundial, com a finalidade de
proporcionar ao infrator a possibilidade de reparar o dano causado, facilitando a
distribuição da justiça pela própria comunidade, evitando, assim, a contaminação do
infrator com o sistema carcerário. O segundo propósito é descongestionar os tribunais de
processos judiciais, cuja infração penal é considerada de menor potencial ofensivo, uma vez
que o acúmulo de processos judiciais dificulta a abreviação do espaço de tempo entre a
infração cometida e a decisão judicial, tornando, muitas vezes, a pena inócua.
Como consequência dos dois primeiros objetivos, surge naturalmente o terceiro, que é a
concretização da economia estatal.
É importante ressaltar, ainda conforme Tailson Pires Costa, que a Lei n° 9099/95 não
descriminalizou nenhum ilícito penal; apenas adotou algumas medidas despenalizadoras com a
finalidade de evitar a aplicação da pena privativa de liberdade. Para que a reeducação do preso seja
viável, é preciso separar o direito penal da execução penal. Enquanto no primeiro existe o
sentimento retribucionista do mal causado, no segundo, a finalidade deve ser extremamente
utilitária.
Outra inovação fundamental da Lei n° 9099/95 está na preocupação, pela primeira vez
demonstrada pela norma, em relação à vítima, ao possibilitar a reparação do dano causado. A pena
de prestação de serviço à comunidade está presente no ordenamento jurídico brasileiro desde
quando o atual Código Penal (Decreto-lei 2848/40) ainda era o projeto Alcântara Machado. “No
Estado Democrático de Direito, o sistema que mais se ajusta à sua natureza é o do direito penal que
visa a ressocializar o delinqüente, reparar o dano sofrido pela vítima e prevenir o delito.”
A pena de prestação de serviço comunitário assume uma função que nenhuma outra pena
alternativa tem a coragem de assumir que é a preocupação com a vítima, com a reparação do dano
causado à sociedade. A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas tem sido um
referencial da magistratura na aplicação da execução penal. Essas penas têm sido também apontadas
como o mecanismo responsável pela suavização do sistema carcerário brasileiro.
Diante da tão decantada falência da pena privativa de liberdade, que não atende aos meios
de ressocialização, a tendência dos legisladores, em consonância com a doutrina, é procurar
substitutivos penais para tal sanção, ao menos no que se relaciona com os crimes menos
graves e criminosos cujo encarceramento por curto período não é aconselhável pelos
evidentes efeitos dessocializadores que decorrem do e encarceramento.
O modelo tradicional repressor e castigador adotado no Brasil, vem perdendo cada vez mais
espaço para as penas modernas, já estudadas neste trabalho monográfico.
Outra tendência observada no Brasil é que seja transferida a execução da pena de prestação
de serviços à comunidade ao juiz da sentença. Tal medida poderia inclusive funcionar como válvula
de escape para a população carcerária, quando significaria uma maior celeridade na resolução dos
processos.
A aplicação de penas alternativas para pequenos delitos foi pedida pelos participantes dos
debates sobre "A questão penitenciária", na I Conferência Internacional de Direitos
Humanos. De acordo com Luiz Flávio Borges D'Urso, presidente da Associação Brasileira
dos Advogados Criminalistas, a privação da liberdade não é o melhor para punir o
indivíduo. Para Julita Lengruber, membro do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária, o modelo prisional em funcionamento é absolutamente fracassado. Hoje seria
preciso, por exemplo, investir no Brasil pelo menos R$ 1,8 bilhão para resolver o problema
das vagas carcerárias.
Julita Lengruber vai mais longe: 45 mil presos que praticaram crimes sem gravidade
custam hoje para o governo cerca de R$ 200 milhões por ano. Com esse dinheiro poderiam
ser construídas 391 escolas, ou 5 mil postos de saúde. ou ainda 20 mil moradias populares.
Para Luiz Flávio D'Urso, há uma falácia de que aumentando a quantidade das penas e do
encarceramento teremos a diminuição da criminalidade. É o que prega, por exemplo, o
movimento Lei e Ordem, responsável pelas alterações no projeto de lei sobre os chamados
crimes hediondos. Para D'Urso, as penas alternativas podem ser uma resposta penal mais
eficaz contra a criminalidade cada vez mais crescente.
José Carlos Brasileiro, preso carioca em liberdade condicional e presidente do Instituto
Nelson Mandela, que faz acompanhamento de presos egressos na sociedade, também pediu
a imediata aprovação de penas alternativas e que o governo crie um sistema de teleducação
em todas as penitenciárias. Ele pediu ainda que o governo conceda indulto aos presos com
bom comportamento, aproveitando a visita do papa João Paulo II ao Brasil.
A conferência sobre "A questão penitenciária" ganhou dois reforços importantes com a
chegada do jurista Evandro Lins e Silva, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, e do
professor Fábio Konder Comparato, da Universidade de São Paulo.
7 CONCLUSÃO
Concluir que a pobreza é causa absoluta do fenômeno “crime” é tão errado quanto atribuir à
cor da pele qualidades e defeitos. Tem-se que analisar o fenômeno social como um todo para buscar
remédios para esse problema. Não é a pobreza a causa única, mas é ela um dos fatores que
contribuem para a criminalidade. Ao lado desse, não podemos olvidar a falta de educação, saúde
moradia, mesmo que possuam laços intimamente ligados à pobreza.
O Brasil, no tocante ao direito Penal, é influenciado por muitas nações, inclusive a
Alemanha. Nesse país foi desenvolvido na sua época imperial, um sistema penal bastante inovador
e interessante, introduzindo o trabalho na aplicação da pena, dentro ou fora da prisão. Fica claro
uma certa influência alemã no atual contexto penal brasileiro.
A criminalidade afluente na em todo o Brasil é um problema social, que deve ser
equacionado da mesma maneira como são visualizados os problemas de saúde, de educação, de
transportes e de infra-estrutura social.
Para a solução desse grave problema, é preciso que se focalize a pena e a sua execução, no
sentido de que a prisão não deve ser enfatizada como solução penal, devem se buscar alternativas à
prisão sempre que possível ser o réu tratado de outra forma, seja em regime de semi-liberdade ou
em regime de liberdade fiscalizada.
Ao longo da história humana, os crimes são punidos com muito rigor, porque se acreditava
que uma pena severa expurgaria o infrator da sociedade e também serviria como exemplo geral,
prevenindo, ou pelo menos buscando prevenir a reiteração.
Sabe-se que tal mentalidade é ultrapassada e somente alguns poucos ainda a defendem,
contrariando a evolução do pensamento penalista, que busca privilegiar a oportunização aos
que incorreram em infrações penais, de formas diversas de repassar o erro.
Preconiza-se novo sistema de penas, dotado de substitutivos à pena de prisão, revertido de
eficácia pedagógica, de forma a restringir à privação da liberdade a crimes graves cometidos por
delinquentes perigosos. A busca de outras sanções para criminosos sem periculosidade diminuirá a
ação criminógena do cárcere e atuará como fator de despopulação das prisões.
Aqui se insere as penas, objeto deste estudo monográfico, da prestação de serviços à
comunidade e para se compreender as penas alternativas, mormente a pena de prestação de serviço
à comunidade, deve se entender suas características principais, que são autonomia, substitutividade
e também os requisitos de aplicação, como a não reincidência.
Observa-se na prática, que a pena de prestação de serviço à comunidade sofre, senão alguns
impedimentos, mas alguns fatores que dificultam sobremaneira sua efetividade, a exemplo do
preconceito. A prestação de serviço à comunidade não pode ser encarada como trabalho forçados, o
que é terminantemente proibida pela nossa Carta Magna. Esse dispositivo proibitivo colima a
consecução do princípio da dignidade humana. Dessa forma, o trabalho, em forma de pena
alternativa deve ser entendida até mesmo como um direito do apenado.
Ficou claro que a ressocialização não é para todos, isto é, nem todos submetidos a penas
com esse intuito lograram êxito. É dessa forma, uma loteria, sendo que o Estado deve apostar em
todos. Não pode o Estado apostar num e noutro não, deve sim oferecer suporte para a
ressocialização de todos, desde que atendidos os pressupostos de aplicação.
Deve-se, a quase todo custo, buscar-se a aplicação de sanções alternativas à pena de
privação de liberdade. Apesar dessa pena de privação da liberdade ter representado a humanização
das penas, ela claramente falhou no objetivo moderno de ressocializar. Uma das alternativas, quiçá
a melhor delas é a prestação de serviços à comunidade, a ser definida à disposição do juiz na
sentença ou se for o caso na execução. É fato que a pena de prestação de serviços, das mais
altruístas, constitui a pena que gera os melhores efeitos.
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