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EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA CÍVEL DA COMARCA DA CAPITAL/RJ PEDIDO DE LIMINAR/URGÊNCIA PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA UMA MENTIRA REPETIDA MIL VEZES TORNA-SE VERDADE” frase de Joseph Goebbels, que foi ministro da Propaganda de Adolf Hitler na Alemanha Nazista. ANIELLE SILVA DOS REIS BARBOZA, brasileira, casada, professora, portadora do RG n° 109463273 DIC/RJ e inscrita no CPF nº 105.381.567-08, residente e domiciliada na Rua Aguiar Moreira, nº 663/201, Bonsucesso, Rio de Janeiro, CEP 21041-070, e MÔNICA TEREZA AZEREDO BENICIO, brasileira, solteira, que vivia em união estável com Mairelle Francisco da Silva , arquiteta, portadora do RG nº 206460321 DIC/RJ e inscrita no CPF nº 099.112.647-50, com endereço à Rua Araújos, 111, casa 1, Tijuca, Rio de Janeiro, CEP 20521- 000; vêm, por meio de suas advogadas constituídas através de Procuração anexa e que desde já informam o e-mail: [email protected], perante Vossa Excelência, propor com fundamento no art. 5º, X da Constituição Federal de 1988 e Lei 12.965/14 e demais dispositivos legais aplicáveis à espécie, propor a presente AÇÃO COMINATÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA

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EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA CÍVEL DA COMARCA DA

CAPITAL/RJ

PEDIDO DE LIMINAR/URGÊNCIA

PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA

“ UMA MENTIRA REPETIDA MIL VEZES TORNA-SE VERDADE” frase de

Joseph Goebbels, que foi ministro da Propaganda de Adolf Hitler na Alemanha

Nazista.

ANIELLE SILVA DOS REIS BARBOZA , brasileira, casada, professora,

portadora do RG n° 109463273 DIC/RJ e inscrita no CPF nº 105.381.567-08,

residente e domiciliada na Rua Aguiar Moreira, nº 663/201, Bonsucesso, Rio de

Janeiro, CEP 21041-070, e MÔNICA TEREZA AZEREDO BENICIO , brasileira,

solteira, que vivia em união estável com Mairelle Francisco da Silva, arquiteta,

portadora do RG nº 206460321 DIC/RJ e inscrita no CPF nº 099.112.647-50,

com endereço à Rua Araújos, 111, casa 1, Tijuca, Rio de Janeiro, CEP 20521-

000; vêm, por meio de suas advogadas constituídas através de Procuração

anexa e que desde já informam o e-mail: [email protected],

perante Vossa Excelência, propor com fundamento no art. 5º, X da

Constituição Federal de 1988 e Lei 12.965/14 e demais dispositivos legais

aplicáveis à espécie, propor a presente

AÇÃO COMINATÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA

em face de GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA. , pessoa jurídica de direito

privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n.º 06.990.590/0001-23, com sede na

cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, na Avenida Brigadeiro Faria Lima,

n° 3900, 5º Andar, conjuntos 501 e 502, Edifício Pedro Mariz – Birmann 31,

Itaim Bibi, CEP nº 04538-132, pelos fatos e fundamentos que passam a expor.

DA GRATUIDADE PROCESSUAL:

Inicialmente, as autoras confessam ser pobres no sentido legal, não

podendo arcar com as custas do processo sem o prejuízo de seu próprio

sustento e o de sua família, requerendo desde já os benefícios da Justiça

Gratuita, conforme lhe faculta a Lei 1.060/50 e arts. 98 e ss. do Código de

Processo Civil.

Neste ato faz a juntada da declaração de imposto de renda das autoras

e requer abertura de prazo para juntada da declaração de hipossuficiência de

Anielle Silva dos Reis Barboza, que, em razão do luto, não foi possível de ser

produzido.

DA LEGITIMIDADE ATIVA:

O parágrafo único do artigo 12 do Código Civil prevê expressamente a

legitimação do cônjuge supérstite (parceiro homoafetivo), ou qualquer parente

em linha reta, ou colateral até o quarto grau para exigir que cesse a ameaça,

ou a lesão, a direito da personalidade do morto, e ainda reclamar perdas e

danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a

lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas

e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas

em lei.

Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá

legitimação para requerer a medida prevista neste

artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente

em linha reta, ou colateral até o quarto grau.

Nesse sentido, ANIELLE SILVA DOS REIS BARBOZA e MÔNICA

TEREZA AZEREDO BENICIO são partes legítimas para moverem tal ação. A

primeira como irmã da de cujus e a segunda como sua companheira

sobrevivente.

MÔNICA TEREZA AZEREDO BENICIO era parceira homoafetivo de

Marielle Francisco da Silva. Com um relacionamento de quase 12 (doze) anos,

viveram juntas seus últimos dois anos como se casadas fossem.

Atualmente, resta pacificada a questão da união estável homoafetiva.

Em razão do julgamento da ADPF nº 132 e da ADI nº 4.277, o embate acerca

da isonomia de tratamento jurídico destinado à união estável restou sufragado

pelo Supremo Tribunal Federal. Essa Corte reconheceu a união estável

homoafetiva como entidade familiar, com o mesmo tratamento dado à união

estável tratada na legislação constitucional e infraconstitucional.

A regra contida no art. 226, § 3º, da CRFB, quando trata da união

estável entre homem-mulher, também deve ter plena aplicação às relações

homoafetivas.

Ademais, as mesmas sempre tiveram firme intenção de viver como

companheiras, como é de conhecimento público em declarações na Tribuna, e

postagens da vida em casal nas redes sociais, o que a doutrina denomina de

affectio maritalis, tanto que iriam formalizar a relação marital no ano vindouro.

Nesse passo, seguindo as mesmas disposições atinentes ao casamento,

a união estável homoafetiva em relevo resulta que a autora faria jus a

representação post mortem.

Nesse sentido, inclusive, enunciado 275 da IV Jornada de Direito Civil do

CJF:

IV Jornada de Direito Civil - Enunciado 275 - O rol

dos legitimados de que tratam os arts. 12, parágrafo

único, e 20, parágrafo único, do Código Civil também

compreende o companheiro.

DA LEGITIMIDADE PASSIVA:

Justifica-se a legitimidade passiva de Google Brasil Internet para figurar

nesta ação, pois é a pessoa jurídica controladora do provedor de aplicações

YouTube como empresa subsidiária, portanto YouTube é de propriedade da

Google.

O presente caso versa sobre vídeos publicados e compartilhados na

empresa subsidiária YouTube, mas quem deve figurar no polo passivo é sua

controladora.

DOS FATOS:

As autoras são irmã e companheira, respectivamente, de Marielle

Francisco da Silva, conhecida como Marielle Franco, assassinada no último dia

14 de março.

Marielle Franco foi vereadora da cidade do Rio de Janeiro, pelo Partido

Socialismo e Liberdade, eleita com 46.502 votos, sendo a quinta candidata que

mais recebeu votos no pleito eleitoral de 2016.

Socióloga, feminista e militante de direitos humanos, destacou-se na

Câmara Municipal do Rio de Janeiro porque deu visibilidade a luta das

mulheres negras, a luta da favela, a luta LGBT e pautou todas essas questões

na tribuna e fora dela.

Após seu assassinato, diante da comoção e perplexidade da população,

além de manifestações de amigos e familiares de Marielle, começaram a surgir

nas redes sociais mentiras a respeito da vereadora, com acusações falsas e

criminosas, além de discursos de ódio sobre sua vida pessoal, história e

atuação na política e na defesa de direitos humanos.

As fake news1, os discursos de ódio2 e a divulgação de conteúdos

criminosos e, obviamente, inverídicos, começaram a surgir a partir de quinta-

feira, dia 15/03/2018, e foram tomando vulto na internet. Então, no sábado, dia

17/03/2018, foram tomadas medidas para proteção e preservação da honra e

da memória de Marielle Franco e sua família. No mesmo dia foi disponibilizado

o e-mail: [email protected] para receber tais denúncias e este

endereço eletrônico foi amplamente divulgado na mídia em geral3.

Várias pessoas, do Brasil e do mundo, enviaram mensagens se

solidarizando com a família e denunciando vídeos, comentários falsos e

maliciosos, compartilhamentos e publicações em geral, todas criminosas e

atentatórias à imagem e à memória de Marielle Franco. Foram mais de 16 mil

e-mails e serviram de base para a propositura da presente ação. Foi uma

mobilização coletiva visando combater as fake news e o discurso de ódio.

Destaca-se a gravidade da divulgação, do compartilhamento e da

manutenção “no ar” destes conteúdos falsos, deliberadamente mentirosos,

1 Fake news, tradução livre de notícias falsas, da expressão em inglês, é um termo utilizadopara retratar a publicação deliberada de desinformações, mentiras ou boatos, seja em viaimpressa, na televisão, no rádio, nas mídias sociais e na internet em geral. Em todos os casos,a intenção é levar o leitor incauto a erro e criar a roupagem de veracidade sobre fato falso ecriminoso.2 São mensagens que promovem o ódio e incitação à discriminação,à hostilidade e à violênciacontra uma pessoa ou grupo em virtude de raça, religião, nacionalidade, orientação sexual,gênero, condição física ou outra característica. Destacam-se algumas matérias que apuraram ocaráter anti democrático e nocivo dos discursos de ódio, disponível em:<http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/o-discurso-de-odio/> e<https://oglobo.globo.com/sociedade/brasil-cultiva-discurso-de-odio-nas-redes-sociais-mostra-pesquisa-19841017>.3 Disponível em: <https://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/partido-de-marielle-vai-processar-magistrada-e-rastrear-noticias-falsas-17032018>; <https://www.revistaforum.com.br/equipe-juridica-que-rastreia-calunias-contra-marielle-ja-recebeu-mais-de-2-mil-denuncias/>; <https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/advogadas-fazem-forca-tarefa-contra-posts-falsos-sobre-marielle-na-web.ghtml>. Acesso em 19 de março.

criminosos e atentatórios à honra e à dignidade das pessoas que são vítimas

da difusão das fake news e dos discursos de ódio.

Por ora, já foi possível mapear 40 (quarenta) vídeos com conteúdos

criminosos, falsos, discursos de ódio e atentatórios à dignidade, honra e

memória de Marielle Francisco da Silva, sem prejuízo de outros que venham a

ser indicados. A tabela abaixo demonstra a quantidade de vídeos e classifica

por nome do vídeo, nome do canal que publicou o vídeo, a URL, a data das

postagens (entre os dias 15 e 20 de março) e as visualizações que cada vídeo

teve até o momento do ajuizamento desta ação. Destaca-se que após o

anúncio de que as autoras ingressariam com a medida judicial cabível para

proteger a honra e a memória de Marielle Franco, dois vídeos do rol dos

denunciados pelos e-mails já foram excluídos.

Segue tabela abaixo (DOC. 1):

Até agora foram contabilizadas 13.405.111 (treze milhões, quatrocentos

e cinco mil, cento e onze) visualizações, a honra e a memória de Marielle

Franco foram manchadas para quase treze milhões e meio de pessoas. É um

registro sem precedentes. É um caso sem precedentes!

Os vídeos que ainda estão no ar são os seguintes:

https://www.youtube.com/watch?

v=1NrBo6JCSyQ&feature=youtu.be

https://youtu.be/UbmO9wdC2go

https://youtu.be/TBP7XPfRw_o

https://youtu.be/ZEHvMKWxLjw

https://youtu.be/_yP1cglGXz8

https://www.youtube.com/watch?v=ckJRlAHbHhg

https://www.youtube.com/watch?v=HgzRfoBUnvE&t=2s

https://www.youtube.com/watch?

v=g4ZYzBwRR5I&feature=youtu.be

https://www.youtube.com/watch?

v=WnKGEJCK8FM&feature=youtu.be

https://www.youtube.com/watch?v=qWtJ0Xx7Sfs

https://www.youtube.com/watch?v=z7dJ5DoPDug

https://www.youtube.com/watch?

v=4HNJKebLJAw&feature=youtu.be

https://www.youtube.com/watch?v=UOI1DYzQLoE

https://www.youtube.com/watch?

v=1nnyzpegiP8&feature=youtu.be

https://www.youtube.com/watch?v=9bKjTj-JXw8

https://www.youtube.com/watch?v=aUGAcc8LIXA

https://www.youtube.com/watch?v=BCbghFUq-zY

https://www.youtube.com/watch?v=9HRc-zJGqjM

https://www.youtube.com/watch?v=TBP7XPfRw_o

https://www.youtube.com/watch?v=VGBsTfO4_BQ

https://www.youtube.com/watch?v=zc9Z0vO2RR8

https://www.youtube.com/watch?v=bTK-gcolXEs

https://www.youtube.com/watch?v=QQ7JjYIyxN4

https://www.youtube.com/watch?v=WnKGEJCK8FM

https://www.youtube.com/watch?v=02RCAgydw5o

https://www.youtube.com/watch?v=QQ7JjYIyxN4

https://www.youtube.com/watch?v=rh2DwH79sMM

https://www.youtube.com/watch?v=rTNtsNWZh2w

https://www.youtube.com/watch?v=c7qdnwm6pOw

https://www.youtube.com/watch?v=pTT3hqglzPg

https://www.youtube.com/watch?v=6_9OloFYTVs

https://www.youtube.com/watch?v=w5CsS31G_Sk

https://www.youtube.com/watch?v=KBXSLgiP2sI

https://www.youtube.com/watch?v=cO8drc29FPMhttps://www.youtube.com/watch?v=-YWSHhUgIW0

https://www.youtube.com/watch?

v=fBhiIF_iTMo&feature=youtu.be

https://www.youtube.com/watch?v=ckJRlAHbHhghttps://www.youtube.com/watch?v=pQjdU4zYP1E

Ao Poder Judiciário cabe trazer a pacificação social diante de um caso

de grande repercussão e, até mesmo, um leading case de fake news, dado o

volume de notícias falsas, sua repercussão e a mobilização nacional e

internacional para combater as fake news e o discurso de ódio. Destaca-se a

notícia veiculada no jornal O Globo4:

4 Disponível em: <https://oglobo.globo.com/rio/iniciativas-para-combater-informacoes-falsas-contra-marielle-mobilizam-web-22506243>. Acesso em 20 de março.

O movimento coletivo de reação às informações

falsas espalhadas pelas redes sociais e por

aplicativos contra a vereadora Marielle Franco,

assassinada a tiros na última quarta-feira, não

tem precedentes na internet brasileira , afirmaram

especialistas ouvidos ontem pelo GLOBO. O

fenômeno desencadeou ainda uma série de

iniciativas que visam também a exigir punição

jurídica contra os responsáveis pelas fake news.

Concentrada num escritório de advocacia carioca,

uma força-tarefa criada para reunir provas contra

pessoas ou grupos que espalharam as calúnias já

contabilizou 16 mil e-mails com denúncias.

(...)

- Analiso a opinião pública digital há 11 anos, e

nunca vi uma reação tão forte em defesa de

alguém. É a mais estruturada contra uma notícia

falsa e difamação que já vimos - afirmou Manoel

Fernandes, diretor da Bites, consultoria que faz

análise de dados transmitidos na internet. - E acho

que aí tem um aprendizado muito importante para a

sociedade: é possível reagir .

(Grifos nossos).

O que ora se requer ao Poder Judiciário, um dos pilares do Estado

Democrático de Direito, é justamente esta reação, que é possível, na opinião

de Manoel Fernandes; para que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de

Janeiro seja um paradigma na mudança de consciência da coletividade e um

marco para a responsabilização de conteúdos postados na internet.

Os mais 16 mil e-mails recebidos com denúncias de notícias falsas e

criminosas e o discurso de ódio contra Marielle Franco representam um clamor

popular para que o Poder Judiciário se posicione de maneira combativa contra

atos criminosos e atentatórios à honra e à dignidade das pessoas, de difícil

punição, porém, não impossível. Esta enorme quantidade de mensagens

eletrônicas demonstra o quanto a população está atenta e se opõe à

divulgação de notícias falsas e discursos de ódio, já que qualquer um pode ser

vítima.

O caso de Marielle Franco deu maior visibilidade a um ranço que deve

ser combatido. A internet não é e não pode ser tratada como “terra sem lei”,

tanto que os debates acerca de suas limitações e ponderações de interesses

originou o Marco Civil da Internet, Lei Federal nº 12.965, de 23 de abril de

2014. Muitos paradigmas ainda precisam ser regulados e a visibilidade que o

presente caso teve na mídia mostrou o quão danosa essa agressão invisível

pode ser.

Estes fatos abriram um flanco para que o Poder Judiciário seja o

pioneiro na garantia de direitos fundamentais das pessoas que têm sua

dignidade humana afrontada e, como no caso em tela, das pessoas já falecidas

que têm sua memória e honra igualmente afrontadas, já que existe tutela

jurídica dos direitos da personalidade da pessoa morta. E as autoras, na

qualidade de irmã e ex-companheira, são legitimadas para requerer essa tutela

jurídica.

DOS FUNDAMENTOS:

Da ilicitude dos conteúdos dos vídeos:

Já se tornou fato público e notório que diversas pessoas publicaram

conteúdos falsos, maliciosos e criminosos, devido a ampla e maciça divulgação

nas redes sociais, jornais de grande circulação, programas televisivos e

telejornais. Pessoas do Brasil e de outros países, em solidariedade à família e

à honra e memória da Vereadora Marielle Franco, enviaram mais de 16 mil e-

mails para este escritório, noticiando a prática que ora se combate.

Os vídeos ora indicados nesta exordial, mas que não se limitam aos até

então apurados, contêm fake news, discursos de ódio e prática de calúnia

contra pessoa morta. Os fatos que o site YouTube tem abrigado são

relacionados à: “Marielle era ex de Marcinho VP”; “Marielle foi eleita pelo

comando vermelho”; “Marielle era usuária de maconha”; “Marielle engravidou

aos 16 anos”; “Marielle defendia bandido”; “Marielle mereceu morrer”; “Marielle

era criminosa”; entre outros.

O Código Civil tutela os direitos da personalidade de pessoa morta no

art. 12 e no seu parágrafo único. Igualmente, tutela quem viola o direito da

personalidade quem comete ato ilícito, regulados nos artigos 186 e 187. E,

ainda, tutela a responsabilidade civil, com a obrigação de reparar, daqueles

que cometerem tais atos ilícitos, no art. 927 do referido Código.

Já o Código Penal prevê que caluniar alguém, imputando-lhe falsamente

fato definido como crime, sujeita o infrator a detenção, de seis meses a dois

anos, e multa; sendo punível a calúnia contra os mortos, nos termos do art.

138, § 2º.

Os vídeos acima mencionados têm conteúdo ilícito, pois atentam contra

a dignidade e honra da Vereadora Marielle Franco, pois foram publicados e

compartilhados contendo crime contra a honra e violação ao direito da

personalidade de pessoa morta, causado grande dano e transtorno às autoras

e toda da sua família.

Da limitação à liberdade de expressão nos casos de discursos de ódio –

ponderação de valores e princípios.

É importante mencionar que os discursos divulgados nos vídeos que ora

se atacam são incompatíveis com o respeito à dignidade da pessoa humana de

Marielle Franco, e não estão protegido pela liberdade de expressão, pois

extrapola os limites deste direito fundamental, caracterizando-se como

caluniosos e como um discurso de ódio, por verdadeira afronta à dignidade da

pessoa humana, prevista no art. 1º, III, da Constituição da República. Este

entendimento foi sustentado pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 4274:

O repúdio ao “hate speech” traduz, na realidade,

decorrência de nosso sistema constitucional, que

reflete, nesse ponto, a repulsa ao ódio étnico

estabelecida no próprio Pacto de São José da Costa

Rica. (...) Evidente, desse modo, que a liberdade de

expressão não assume caráter absoluto em nosso

sistema jurídico, consideradas, sob tal perspectiva,

as cláusulas inscritas tanto em nossa própria

Constituição quanto na Convenção Americana de

Direitos Humanos. (...) Há limites que, fundados na

própria Constituição, conformam o exercício do

direito à livre manifestação do pensamento, eis que

a nossa Carta Política, ao contemplar determinados

valores, quis protegê-los de modo amplo, em ordem

a impedir, por exemplo, discriminações atentatórias

aos direitos e liberdades fundamentais (CF, art. 5º,

XLI), a prática do racismo (CF, art. 5º, XLII) e a ação

de grupos armados (civis ou militares) contra a

ordem constitucional e o Estado Democrático (CF,

art. 5º, XLIV).

A doutrina de Cristiano Chaves Faria e Nelson Rosenvald, no mesmo

entendimento, leciona que o chamado hate speech não pode estar sob o manto

da proteção constitucional:

Toda essa coerência de raciocínio também é

aplicável à liberdade de expressão, permitindo

antever a existência de limites ao seu exercício.

Com isso, o chamado hate speech (consistente nas

manifestações de pensamento ilimitadas, contendo

declarações de ódio, desprezo ou intolerância,

normalmente atreladas à etnia, religião, gênero ou

orientação sexual) não é permitido pelo sistema

jurídico brasileiro. Até porque a Constituição não

vedou, tão só, ao poder público a prática de atos

discriminatórios, impondo, por igual, a todo e

qualquer cidadão ou pessoa jurídica tal conduta. Por

isso, impor limites à liberdade de expressão é

manter acesa a luz contra o preconceito e a

intolerância – que atingem, em especial, às minorias

sociais, étnicas e econômicas. (Curso de Direito

Civil. Volume 1. Parte Geral e LINDB. 12º edição.

2014. Salvador. Pág. 181 e 182).

Em igual sentido a doutrina estrangeira salienta que utilizar como

subterfúgio o caráter absoluto da liberdade de expressão para acobertar

discursos de ódio se revela em uma irresponsabilidade, uma subversão

completa dos valores constitucionais, ferindo gravemente a dignidade da

pessoa humana das vítimas.5 5 Essa também é a conclusão de DANIEL SOLOVE. Para o autor, a Seção 230 doCommunications Decency Act deveria ser reformada: “Além de falhar na proteção adequada daprivacidade, a lei superprotege a liberdade de expressão. Particularmente, o CDA § 230promove uma cultura de irresponsabilidade quando se trata da liberdade de expressãoonline.”SOLOVE, Daniel. Speech, privacy and reputation on the Internet. in LEVMORE, Saul;NUSSBAUM, Martha. The offensive Internet. Cambridge: Harvard University Press, 2010. p.23. Tradução livre. Apud LONGHI, João Victor Rozatti. Marco civil da Internet no Brasil: breves

É notório que esses perfis, para conseguirem audiência, público, mais

seguidores, sublevam o sacro direito à liberdade de expressão e, travestidos do

princípio que garante o direito à informação, lançam verdadeiras perseguições

e campanhas difamatórias contra as mais variadas pessoas, anônimas ou

públicas, do universo político e artístico, que no presente caso foi a Vereadora

Marielle Franco.

A conduta dos selecionados perfis se torna mais lesiva, pois as notícias

inventadas e distorcidas, divulgadas no YouTube, estimulam o

compartilhamento massivo de informações falsas para todo o sempre, a

respeito da pessoa indevidamente retratada e que, muitas vezes, é de difícil

reparação.

É necessário dar um basta nisso. A internet não pode ser uma “terra

sem lei”, onde as pessoas “acham” que podem fazer o que bem entender e não

serão punidas.

E é necessária uma punição pedagógica, para educar a sociedade e dar

limites nas suas ações, para se evitar danos às vítimas e aos seus familiares. É

necessário dar um basta à impunidade digital.

Repita-se, não se pode legitimar o exercício de um direito constitucional,

o da liberdade de expressão, à medida que manifestamente afronta a outro

direito de igual natureza, o da dignidade da pessoa humana, salientando-se

que, ainda que fossem de hierarquias distintas, tal violação não se justificaria.

Como visto, no choque entre dois princípios constitucionalmente

previstos, deve-se analisar e interpretar o caso concreto a fim de harmonizar o

sistema jurídico, adotando-se como solução a aplicação da razoabilidade e

proporcionalidade, com a inafastável ponderação de valores.

considerações sobre seus fundamentos, princípios e análise crítica do regime deresponsabilidade civil dos provedores.. In: MARTINS, Guilherme Magalhães. (Org.). DIREITOPRIVADO E INTERNET: Atualizado pela Lei no 12.965/2014 (Marco Civil da Internet no Brasil).1ed.: , 2014, v. , p. 109 e ss.

Salienta ainda a lei conhecida como o “Marco civil da internet” (Lei nº

12.965/2015), cujos artigos 2º e 22 disciplinam o uso da internet no Brasil e têm

como fundamento a liberdade de expressão, mas respeitando os direitos

humanos e da personalidade dos cidadãos. E se houver violação a direitos, a

parte interessada poderá, com o propósito de formar conjunto probatório em

processo judicial cível ou penal, em caráter incidental ou autônomo, requerer

ao juiz que ordene ao responsável pela guarda o fornecimento de registros de

conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet, bem como a sua

exclusão.

Os vídeos veiculados na rede mundial de computadores, no conjunto,

configuram crime contra a honra de Marielle Franco, conforme destacado

acima, pelas ofensas ali perpetradas, por terem cunho que maculam a sua

figura como pessoa, sendo o seu direito resguardado no art. 5º, incisos V e X

da CRFB6, devendo os autores ser responsabilizados pelos seus atos, criminal

e civilmente.

Assim, no caso concreto, como a liberdade de expressão não é garantia

constitucional absoluta, deve prevalecer o princípio da dignidade da pessoa

humana, devido às manifestações apresentadas possuir conteúdo imoral,

ilícito, ilegal e discurso de ódio, requerendo a sua exclusão no prazo máximo

de 24 horas dos vídeos destacados na presente exordial, sob pena de ser

responsável civilmente conforme os termos do art. 19 da Lei nº 12.965/20157. 6 Constituição da República - Fundamento da República. art. 1º, III - a dignidade da pessoahumana; e art. 5º, V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além daindenização por dano material, moral ou à imagem; X - são invioláveis a intimidade, a vidaprivada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo danomaterial ou moral decorrente de sua violação; 7 Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedorde aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danosdecorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar asprovidências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazoassinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas asdisposições legais em contrário.

§ 1o A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade,identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita alocalização inequívoca do material.

§ 2o A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a direitosconexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressãoe demais garantias previstas no art. 5oda Constituição Federal.

Da responsabilidade da empresa Google e sua subsidi ária YouTube.

Google é uma empresa multinacional de serviços online e software,

originária dos Estados Unidos, mas com sede no Brasil. YouTube é uma

empresa subsidiária de Google e, como é fato público e notório, é um site de

compartilhamentos de vídeos.

Para tanto, as pessoas precisam criar uma conta no Gmail (provedor de

e-mails do Google), para então conseguir cadastrar seus dados e, finalmente,

criar um canal para poder compartilhar vídeos.

Ao criar uma conta no YouTube, a pessoa precisa inserir os seguintes

dados: e-mail, nome de usuário, data de nascimento, sexo e clicar em “Eu

Aceito”, com orientações da Comunidade e os Termos de Serviço do canal.

Também é necessário inserir um número de telefone, para evitar que contas

falsas ou gerenciadas por robôs (bots) sejam criadas, para tanto, o Google

algumas vezes poderá pedir por verificação de que o criador da conta é um

humano.

Ao ter uma conta no YouTube, a pessoa poderá: criar e enviar vídeos à

comunidade do YouTube; seguir os usuários favoritos inscrevendo-se em seus

canais; gerenciar faixas, vídeos e episódios online prediletos; comentar em

vídeos e socializar com os outros membros da comunidade.

§ 3o As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdosdisponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade,bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores de aplicações deinternet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.

§ 4o O juiz, inclusive no procedimento previsto no § 3o, poderá antecipar, total ouparcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, existindo prova inequívoca dofato e considerado o interesse da coletividade na disponibilização do conteúdo na internet,desde que presentes os requisitos de verossimilhança da alegação do autor e de fundadoreceio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Portanto, Google tem acesso aos dados pessoais das contas de

pessoas que têm canal e publicaram os vídeos com discurso de ódio, fake

news e conteúdos contra a honra de Marielle Franco. Desta forma, é lícito

requerer, por meio de ordem judicial, que a empresa seja obrigada a fornecer

os registros de conexão ou os registros de acesso a aplicações de internet,

para que as autoras formem um conjunto probatório para futuro processo

judicial cível e penal, que ajuizará em face dos responsáveis pela publicação

dos vídeos, como autoriza o art. 22, da Lei nº 12.965/2014.

É responsabilidade da parte ré em retirar do ar, no prazo de 24 horas,

todos os vídeos que ora se notifica, sob pena de configuração do direito à

reparação, previsto no art. 19, da Lei nº 12.965/2014.

Destaca-se, ainda, a viabilidade técnica de controle de conteúdo dos

vídeos no YouTube a ensejar a ordem judicial para que a parte ré se abstenha

de publicar e compartilhar vídeos com conteúdos criminosos e que violam o

direito a personalidade de Marielle Franco. A título de argumentação, o marco

civil da internet, Lei nº 12.965/2014, já prevê no seu art. 21 que:

Art. 21. O provedor de aplicações de internet que

disponibilize conteúdo gerado por terceiros será

responsabilizado subsidiariamente pela violação da

intimidade decorrente da divulgação, sem

autorização de seus participantes, de imagens, de

vídeos ou de outros materiais contendo cenas de

nudez ou de atos sexuais de caráter privado quando,

após o recebimento de notificação pelo participante

ou seu representante legal, deixar de promover, de

forma diligente, no âmbito e nos limites técnicos do

seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo.

Na prática, o YouTube tem viabilidade técnica para identificar vídeos

contendo pornografia e cena de nudez ou de atos sexuais, como os previstos

em lei e, ainda, o YouTube tem viabilidade técnica para identificar vídeos

protegidos por direito autoral. Em ambos os casos o YouTube impede sua

publicação e compartilhamento por meio de análise de dados e sistemas de

filtros. Portanto, ao YouTube pode ser ordenado o comando para que não

permita a publicação e o compartilhamento de vídeos com conteúdos

criminosos e atentatórios à honra e dignidade da Vereadora Marielle Franco.

De outro norte, entende-se que o YouTube já deveria ter feito esse filtro

e retirado todos os vídeos caluniosos e de incitação ao ódio de MARIELLE

FRANCO dedes que tomou conhecimento, a partir do dia 17/03/2018, tendo em

vista a ampla e maciça divulgação nas redes sociais, jornais de grande

circulação, programas televisivos e telejornais.

A empresa omitiu-se e continua inerte, trazendo grande mal e

transtornos para as autoras e todos da família de Marielle Franco, necessitando

recorrer ao judiciário.

Ora, o art. 21 da lei 12.965/2014 não pode ser interpretado de forma

literal ou gramatical. A responsabilidade objetiva da empresa ré não pode ser

aplicada apenas para os casos exposto do comentado artigo, de cunho sexual,

a interpretação deve ser extensiva, axiológica.

O que se tem discutido na presente exordial é a vinculação de vídeos

com imputação de crime e com incitação ao ódio, deixar vincular vídeos que

fazem ligação de Marielle Franco ao Comando Vermelho, por exemplo, é tão

grave ou até mais do que vincular vídeos de cunho sexuais ou nudes. Isso

porque os vídeos que proferem mentiras caluniosas ou incitação ao ódio

abalam não apenas a imagem retrato da vítima, mas a imagem atributo.

Ademais, levantamos a discussão do que se pode gerar ao vincular e

espalhar esse tipo de notícias nas redes sociais para terceiros, tendo em vista

que quase treze milhões e meio de pessoas já visualizaram esses vídeos. A

título de ilustração, dependendo da notícia vinculada, pode-se levar o

assassinato de pessoas inocentes como foi o caso do linchamento da dona de

casa Fabiane Maria de Jesus, que morreu no dia 05/05/2014, após ter sido

espancada por dezenas de moradores de Guarujá/SP, devido um boato gerado

por uma página em uma rede social que afirmava que a dona de casa

sequestrava crianças para utilizá-las em rituais de magia negra.8

É necessário por um fim nisso. Não se pode fechar os olhos para esse

tipo de impunidade.

Desta forma, as autoras não autorizam que o YouTube publique e

compartilhe vídeos que violam a dignidade da pessoa humana de Marielle

Francisco da Silva, conhecida como a Vereadora Mari elle Franco e, desde

já notificam a empresa para que não o faça, sob pen a de responsabilidade

subsidiária, já que, acima do direito à intimidade (conferindo

interpretação extensiva ao art. 21 da Lei nº 12.965 /2014), está a dignidade

da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de Direito,

previsto no art. 1º, III, da Constituição da Repúbl ica .

Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça se manifestou nos

seguintes termos:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.306.157 SP(2011/0231550-1)

DIREITO CIVIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃOFAZER. VÍDEOS DIVULGADOS EM SITE DECOMPARTILHAMENTO (YOUTUBE).CONTRAFAÇÃO A ENVOLVER A MARCA EMATERIAL PUBLICITÁRIO DOS AUTORES.OFENSA À IMAGEM E AO NOME DAS PARTES.DEVER DE RETIRADA. INDICAÇÃO DE URL'S.DESNECESSIDADE. INDIVIDUALIZAÇÃOPRECISA DO CONTEÚDO DO VÍDEO E DO NOMEA ELE ATRIBUÍDO. MULTA. REFORMA. PRAZOPARA A RETIRADA DOS VÍDEOS (24 H).MANUTENÇÃO.

8 http://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2014/05/mulher-espancada-apos-boatos-em-rede-social-morre-em-guaruja-sp.html

1. Atualmente, saber qual o limite daresponsabilidade dos provedores de internetganha extrema relevância, na medida em que, deforma rotineira, noticiam-se violações àintimidade e à vida privada de pessoas eempresas, julgamentos sumários e linchamentospúblicos de inocentes, tudo praticado na redemundial de computadores e com danossubstancialmente potencializados em razão danatureza disseminadora do veículo. Osverdadeiros "apedrejamentos virtuais" são tanto maiseficazes quanto o são confortáveis para quem ospratica: o agressor pode recolher-se nosrecônditos ambientes de sua vida privada, aomesmo tempo em que sua culpa é diluída noanonimato da massa de agressores quereplicam, frenética e instantaneamente, o mesmocomportamento hostil, primitivo e covarde deseu idealizador, circunstância a revelar que oprogresso técnico-científico não traz consigo,necessariamente, uma evolução ética etransformadora das consciências individuais.Certamente, os rituais de justiça sumária e delinchamentos morais praticados por intermédio dainternet são as barbáries típicas do nosso tempo.Nessa linha, não parece adequado que o Judiciárioadote essa involução humana, ética e social comoum módico e inevitável preço a ser pago pelaevolução puramente tecnológica, figurando nessecenário como mero expectador.2. Da leitura conjunta da inicial e do que ficoudecidido nas instâncias de origem, o presenterecurso especial cinge-se à obrigação remanescenterelativa aos vídeos com o título difamante, tenhamsido eles indicados precisamente pelas autoras (coma menção das URL's), ou não, mas desde queexistentes no site, com aquele preciso título, depoisde o provedor ter sido formalmente notificado de suaexistência.3. Por outro lado, há referência nos autos acercade perícia já realizada na qual se constatou aviabilidade técnica de controle dos vídeos no siteyoutube, concluindo o perito judicial que apenaspor questões de conveniência e oportunidade oprovedor não o realiza.4. Com efeito, dada a moldura fática delineada, ediante da precisão do conteúdo do vídeo indicado eda existência de perícia nos autos a sugerir apossibilidade de busca pelo administrador do site,reafirma-se entendimento segundo o qual o

provedor de internet - administrador de redessociais -, ainda em sede de liminar, deve retirarinformações difamantes a terceiros manifestadaspor seus usuários, independentemente daindicação precisa, pelo ofendido, das páginas emque foram veiculadas as ofensas (URL's).5. A jurisprudência da Casa é firme em apregoar quea responsabilidade dos provedores de internet,quanto a conteúdo ilícito veiculado em seus sites,envolve também a indicação dos autores dainformação (número de IP).6. Multa cominatória reajustada para que incidasomente a partir deste julgamento, no valor de R$500,00 (quinhentos reais) por dia dedescumprimento, mantido o prazo de 24 (vinte equatro) horas para a retirada dos vídeos difamantes.7. Recurso especial parcialmente provido, apenas notocante ao valor das astreintes.(Grifos nossos).

Desta forma, reitera-se, as autoras requerem que o YouTube seja

obrigado a não publicar vídeos cujos conteúdos viol em a dignidade de

Marielle Francisco da Silva, conhecida como Mariell e Franco, e notificam

a empresa para que não o faça, sob pena de responsa bilidade subsidiária.

É de se destacar que Google hospeda e desenvolve uma série de

serviços e produtos baseados na internet e gera lucro principalmente através

da publicidade pelo AdWords.

Portanto, ad argumentandum, pode-se dizer que esta é uma relação de

consumo, caracterizada pela remuneração indireta, pois é pago diretamente

pelos anunciantes, para fazer a publicidade dirigida, já que os usuários,

destinatários finais não remunerados, têm uma relação de consumo

aparentemente gratuita, mas essencialmente onerosa, pois os dados pessoais

dos usuários são coletados e processados para fins de publicidade dirigida,

com marketing cruzado. Corrobrando esse entendimento, segundo Guilherme

Magalhães Martins e João Victor Rozatti Longhi, “a responsabilidade civil dos

prestadores de serviços nas redes sociais virtuais pelos danos à pessoa

humana decorrentes do meio é objetiva, na forma do art. 14 do CDC”. 9

Por essas razões, existe um defeito nesta prestação de serviço, o que

resulta da obrigação objetiva de reparar os danos causados, nos termos do art.

14 do Código de Defesa do Consumidor, combinado com o art. 19 da Lei nº

12.965/2014.

DA TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA:

Tradicionalmente, a tutela antecipada se dá nas ações cujo provimento

jurisdicional pleiteado é de natureza condenatória, executória e mandamental,

como é o caso concreto.

Trata-se de ação de obrigação de fazer que consiste, prioritariamente,

na retirada de exibição na rede mundial de computadores as matérias

ofensivas, de incitação ao ódio e caluniosas referentes à Vereadora Marielle

Franco, que, resumidamente, vem ferindo a sua honra e imagem, trazendo

constrangimento e dor às requerentes.

O art. 300 e o § 2º do Código de Processo Civil preveem a possibilidade

de concessão liminar da tutela de urgência quando houver elementos que

evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano.

Não restam dúvidas que a medida, além de ser de urgência, é

necessária, posto que os fatos mentirosos que o site YouTube tem abrigado

relacionados à: “Marielle era ex de Marcinho VP”; “Marielle foi eleita pelo

comando vermelho”; “Marielle era usuária de maconha”; “Marielle engravidou

aos 16 anos”; “Marielle defendia bandido”; “Marielle mereceu morrer”; “Marielle

9 MARTINS, Guilherme Magalhães; LONGHI, João Victor Rozatti. A TUTELA DO

CONSUMIDOR NAS REDES SOCIAIS VIRTUAIS RESPONSABILIDADE CIVIL PORACIDENTES DE CONSUMO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO in Revista de Direito doConsumidor | vol. 78/2011 | p. 191 - 220 | Abr - Jun / 2011 | DTR\2011\1573

era criminosa”, são todos FALSOS, conforme se demonstrou exaustivamente

na presente exordial e melhor tratado no site, especialmente desenvolvido para

esclarecer as mentiras que estão circulando na internet:

<https://www.mariellefranco.com.br/quem-e-marielle-franco-vereadora>.

Ocorre que a família tem sofrido com os ataques desses vídeos, que

ainda permanecem circulando nas mídias sociais, com o intuito de desonrar a

imagem de quem não vive mais para se defender.

Para reforçar a imprescindibilidade do deferimento da tutela de urgência

antecipada, destaca-se que a Diretoria de Análise de Políticas Públicas da FGV/FGV-

DAPP analisou os dados do Twitter, entre os dias 15 e 19 de março, sobre a evolução

das fake news sobre a Marielle Franco e, posteriormente, a evolução do desmentido. O

gráfico é o seguinte:

O gráfico revela que quando as fake news começaram a ser combatidas

(linha vermelha), as publicações espalhando boato começaram a diminuir (linha

azul). Portanto, é urgente a concessão da tutela antecipada requerida, como

medida a combater as fake news, discursos de ódio e a divulgação de

informações criminosas e atentatórias à honra e memória de Marielle Franco.

Assim, vem requerer à V. Exa. a concessão dos efeitos da TUTELA

ANTECIPADA para que a ré retire no prazo de 24 (vinte e quatro horas) todo o

conteúdo selecionado na presente inicial, sob pena de multa diária, em caráter

de astreinte, em caso de descumprimento da decisão liminar e

responsabilidade civil por desobediência à ordem judicial, a ser arbitrado por

esse r. juízo, conforme os termos do art. 19 da Lei 12.965/2015.

DO PEDIDO.

Diante do exposto, requer a V.Exa. o seguinte:

1. que liminarmente os vídeos do sítio administrado pela ré (site de

busca Google e YouTube), links apontados na inicial, sejam retirados

do ar no prazo de 24 (vinte e quatro horas) sob pena de multa diária,

em caráter de astreinte, a fim de que à Marielle Francisco da Silva,

conhecida como Marielle Franco, à sua irmã Anielle Barboza e à sua

companheira Mônica Benicio, possam ser assegurados seu direito

constitucional à intimidade, honra e a privacidade e a imagem;

2. que caso a liminar deferida não seja cumprida no prazo de 24 horas,

seja a ré responsabilizada pelos danos causados, nos termos do art.

19 da Lei nº 12.965/2014;

3. que a ré seja obrigada a não publicar vídeos cujos conteúdos violem

a dignidade de Marielle Francisco da Silva, conhecida como Marielle

Franco, e que seja judicialmente notificada para que não o faça, sob

pena de responsabilidade subsidiária, em interpretação extensiva do

art. 21 da Lei nº 12.965/2014;

4. a citação da parte ré, por via postal com AR, para, se quiser,

apresentar contestação;

5. condenação da ré a retirar da internet todas as matérias que

caluniam e ofendam a imagem de MARIELLE FRANCO, a fim de

manter a decisão proferida em liminar, sob pena de, cometendo

desobediência, a empresa ré responda civilmente, conforme os

termos do art. 19 da 12.965/2015;

6. que seja obrigada a fornecer a identificação dos IPs e dos usuários,

para futuras ações de reparação civil e criminal;

7. ad argumentandum, que seja a parte ré obrigada a reparar às

autoras pelos danos causados, nos termos do art. 14 do Código de

Defesa do Consumidor, combinado com o art. 19 da Lei nº

12.965/2014.

8. a condenação nas custas e honorários de sucumbência em 20%

sobre o valor total da condenação.

9. deixam claro as autoras que NÃO tem interesse em realização de

audiência de conciliação e mediação, nos termos do art. 334 do

Código de Processo Civil.

10. pedem o deferimento da Justiça Gratuita para ambas as partes,

conforme os termos do Lei 1.060/50 e arts. 98 e ss. do Código de

Processo Civil e a abertura de prazo para juntada da declaração de

hipossuficiência de Anielle Silva dos Reis Barboza, que, em razão do

luto, não foi possível de ser produzido.

Protesta pela produção de todas as provas

admitidas em direito, especialmente, prova testemunhal, documental, pericial,

depoimento pessoal, bem como quaisquer outras que esse MM. Juízo entender

necessário para o prosseguimento do feito.

Informa ainda que todas as intimações e atos do

processo devem ser informados em nome da patrona das autoras, EVELYN

MELO SILVA , OAB/RJ 165.970, JULIANA DURÃES DE OLIVEIRA LINTZ ,

OAB/RJ 173.536 e SAMARA MARIANA DE CASTRO , OAB/RJ 206.635, cujo

endereço profissional é o constante no timbre desta petição e endereço

eletrônico qual seja [email protected].

Dá-se à causa, o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de Reais),

para fins meramente fiscais.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Rio de Janeiro, 21 de março de 2018.