Cartilha Código Florestal

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Porque querem acabar com a nossa biodiversidade

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O Código Florestal Brasileiro surgiu em 1934, com uma característica intervencionista do Estado sobre a situação das florestas no Brasil. É importante entender a conjuntura daquele momento: aumento acelerado da população das cidades localizadas na mata atlântica; expansão veloz da cafeeicultura nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, com devastação de grandes áreas de floresta (expansão da fronteira agrícola); corte indiscriminado de espécies nobres, como a Araucária nos estado do Paraná e Santa Catarina.

Durante vinte anos ele foi totalmente ignorado, até que na década de 50 organizou-se uma proposta de reestruturação do Código Florestal. Assim, foram mais de 10 anos de debates e disputas, até que em 1965 foi aprovado o atual Código Florestal. Lembremos que esse era um período de grandes lutas populares, além de importantes revoluções e expansão do socialismo pelo mundo. Portanto, apesar de ter sido aprovado no primeiro ano da ditadura, o código florestal foi concebido em um ambiente progressista.

Um dos maiores exemplos disto é que o Brasil tornou-se, com essa lei, o único Estado capitalista que regula sobre o meio ambiente em propriedades privadas. A Reserva Legal (RL) é uma experiência única no mundo. Pelo fato das florestas e as demais formas de vegetação serem um bem de toda a sociedade brasileira, a propriedade privada de uma terra não pode ter total direito sobre a natureza. Assim, a Reserva Legal é um direito da sociedade brasileira, maior que o da propriedade privada.

Em mais de 40 anos de existência, ocorreram 11 alterações no texto original. As principais foram feitas em 1989 e 2001. A primeira, realizada às vésperas da conferência do meio ambiente Rio-92, estabeleceu a averbação da reserva legal e o registro obrigatório de porte de moto-serra, numa clara tentativa de limpar a imagem do Brasil após as denuncias do líder sindical Chico Mendes e seu assassinato.

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Já a modificação de 2001 foi feita por meio de Medida Provisório do pres idente Fernando Henr ique Cardoso, a qual até hoje não foi votada pelo legislativo. De forma resumida, essa medida provisória cria a categoria “pequena propriedade rural”, excluindo desta definição qualquer debate com movimentos camponeses; altera de 50% para 80% a área de reserva legal na região da Amazônia Legal, tentando amenizar os impactos negativos dos sucessivos recordes de área desmatada de floresta na região; e cria o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE).

Em julho de 2008 o governo federal lançou o decreto 6.514, onde definiu as multas e demais punições para quem não averbasse a RL ou que realizasse qualquer ação indevida em RL ou APP. Esse decreto é mais uma demonstração de como o Estado não deseja implementar o Código Florestal, mas sim seguir pelo caminho da punição direta, principalmente com os camponeses.

Com um imenso passivo ambiental, os latifundiários rapidamente se organizaram para enfrentar essa questão. Seu objetivo era destruir o código florestal, aproveitando o “aperto” dado pelo governo. Para isso, os ruralistas, organizados principalmente pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA) – que tem a senadora Kátia Abreu como presidenta – utilizaram quatro táticas principais: legislativo, executivo, estados e mídia/sociedade.

Na tática estadual, o agronegócio definiu como campo de batalha o estado de Santa Catarina. Não poderia haver escolha que evidencia de forma mais clara a contradição entre agricultura industrial e necessidades do meio ambiente: exatamente um ano antes Santa Catarina havia sido assolada por um gigantesco desastre, em grande parte ocasionado pela ocupação irregular das encostas e APPs.

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No momento em que a sociedade catarinense deveria concentrar-se nas soluções que evitassem um novo desastre, os ruralistas (com apoio direto da presidência da CNA), propuseram o Código Ambiental de Santa Catarina, um compêndio de toda a legislação ambiental do estado. São centenas de artigos, em sua grande maioria um claro crime de agressão ao meio ambiente em geral, que em poucos anos irá trazer conseqüências terríveis para a agricultura camponesa e para as populações que estão na periferia das cidades maiores.

Esta lei possui uma ação de inconstitucionalidade esperando ser votada no STF, pois segundo a constituição brasileira a legislação ambiental dos estados não pode ser mais flexível do que a legislação nacional. No entanto, mesmo que os setores populares consigam esta importante vitória, o objetivo desta tática estará minimamente cumprido: criar o fato político em nível nacional e sinalizar para outros estados qual deve ser o rumo.

Na tática legislativa, os ruralistas se aproveitaram do fato de existirem mais de 30 projetos de mudanças do código florestal e unificaram todos no Projeto de Lei (PL) 6.424/2005, do senador Flexa Ribeiro (PSDB/PA). Toda a pauta de destruição do código florestal está contemplada nesta proposta, tendo como pontos centrais:? *Anistia de multas e de áreas desmatadas;? *Possibilidade de recomposição de APP e RL com espécies exóticas (como Dendezeiro, para biodiesel, Eucalipto, Pinus e Acácia Negra);? *Possibilidade de recompor a RL em qualquer parte do território nacional;? *Redução das áreas de APP.

Este PL 6.424 já foi aprovado no Senado e em 2008 na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados com ampla vantagem dos ruralistas. Apesar das pressões, ele não conseguiu avançar em 2008 na Comissão de Meio Ambiente, onde a correlação de forças era mais equilibrada. Entretanto, a partir de 2009 os ruralistas passaram a ser a maioria dos componentes da referida comissão, não aprovando o PL 6424 apenas devido à grande pressão das ONGs ambientalistas e socioambientais e a movimentos como a Via Campesina.

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Outra articulação, apoiada pelo PT, criou a Comissão Especial sobre o Código Florestal. Diante os embates intermináveis sobre o PL 6.424 e as dezenas de outros projetos, a Câmara dos Deputados resolveu criar uma comissão que se dedicasse exclusivamente à alteração do código florestal. Uma vez aprovado por essa comissão, o projeto de lei segue direto para o plenário da Câmara, não tendo que ser aprovado em outras comissões.

As quatro primeiras sessões desta Comissão, que se iniciou em agosto de 2009, foram marcadas pelo conflito com os ruralistas, que buscavam dominar exclusivamente a mesa diretora da Comissão. Um acordo entre ruralistas e governo definiu a atual mesa: presidência com Micheletto (PMDB/PR) e relatoria com Aldo Rebelo (PC do B/SP). Uma mesa ideal para a demanda ruralista. A intenção do relator é apresentar o texto final da Comissão em março de 2010, para que seja votado em plenário antes do período eleitoral.

Por sua vez, a tática no executivo seguiu pela criação de um grupo de trabalho puxado pelo ministro da agricultura, que contava ainda com a presença do ministério do meio ambiente, ministério do desenvolvimento agrário, frente da agricultura do senado e da câmara (os ruralistas), frente ambientalista do senado e câmara e a CNA, o que já indicava o caráter do grupo. Após a ação unificada de organizações, dentre elas a Via Campesina, o debate deste grupo de trabalho foi dissolvido, visto que sua proposta era ser “informal”, ou, na verdade, secreto.

Já a tática midiática, utilizada sem muitas dificuldades pelas elites, é expressa principalmente pelo discurso de que produção de alimentos não é compatível com a preservação ambiental. Em nome da agricultura camponesa, a CNA se diz porta-voz dos “injustiçados pela legislação ambiental”, nunca assumindo que representa, na verdade, apenas um grupo: os latifundiários.

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A legislação ambiental brasileira é considerada avançada por muitos no que tange a preservação do meio ambiente. Verifica-se que ela não possui um viés conservacionista, e propõe uma utilização sustentável da natureza. O Brasil é o único Estado capitalista que legisla acerca da obrigatoriedade de manutenção de áreas de preservação dentro de propriedades rurais, exigindo uma parcela para proteção e conservação da natureza. Isso demonstra que a natureza é considerada um bem público, pertencente a toda sociedade.

A propagação da idéia de que o Código Florestal (Lei 4771/65) não permite a relação harmoniosa entre a natureza e o ser humano no campo, faz parte do cenário de disputa em favor do desmonte da legislação ambiental. No campo brasileiro, essa legislação não permite uma agricultura baseada nos princípios da Revolução Verde, muito embora as leis não tenham se concretizado em ações efetivas de contenção do agronegócio.

As Áreas de Proteção Permanente (APP) e Reservas Legais (RL), previstas pelo Código à todas as propriedades rurais, são entraves somente para a agricultura empresarial, uma vez que a agricultura familiar camponesa consegue compatibilizar a produção com a conservação ambiental. Ela depende da natureza no processo de produção agrícola, nomeado e definido por Ploeg (2008) como Co-produção.

Porém, embora não possamos dizer que os camponeses são ambientalistas por princípio, podemos perceber que frequentemente a preocupação deles coincide com a conservação do meio ambiente, na defesa de sua própria sobrevivência. Segundo PLOEG, 2008 “[...] a forma de criar, desenvolver, associar, usar e reproduzir recursos do modo camponês é extremamente característica, sendo a sustentabilidade um importante aspecto desta (p.30).

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A manutenção do Código, com inserção de algumas regulamentações e normatizações, já é defendida pelos Movimentos Sociais do campo como uma oportunidade para o fortalecimento da agricultura camponesa. Sendo assim, a utilização da agricultura familiar pela bancada ruralista no Congresso como justificativa para o desmonte do Código Florestal não é legitima. Os reais interesses da CNA (Confederação Nacional da Agricultura), FPA (Frente Parlamentar de Agropecuária) e outras organizações que compõe a bancada ruralista é flexibilizar a legislação ambiental, de forma que possam continuar sua devastação do território nacional e promover a manutenção da hegemonia do agronegócio.

Este texto tem como objetivo analisar uma das mais de trinta propostas de alteração do Código tramitando no Congresso Nacional. Além disso, constitui-se como meio de denunciar as mentiras e táticas utilizadas pelos latifundiários. Escolhemos para isto o Projeto de Lei (PL) nº 5367 de 2009 de autoria do Deputado Federal Valdir Colatto¹.

A seguir analisaremos as principais propostas deste PL:

Art 4º - Inciso II - órgão consultivo e propositivo: o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), com a finalidade de assessorar, estudar e submeter as suas proposições ao Conselho de Governo, diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais no âmbito de sua competência;

¹ Deputado Federal pelo Estado de Santa Catarina, autor do Código Ambiental de Santa Catarina, lei que revoga o Código Florestal nesta Unidade Federativa. Presidente da FPA, compõe o MCT (Movimento dos Com Terra – Pela garantia do direito de propriedade), considerado um dos maiores inimigos da Reforma Agrária no país. Apresentou projeto que tira do Poder Executivo e do Poder Judiciário e passa para o Congresso Nacional a responsabilidade pela desapropriação de terras por descumprimento da função social.

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Esta proposta é reduzir as atribuições do CONAMA, transformando-o em um órgão meramente propositivo e não mais deliberativo como na Lei 6938/81. Tal órgão foi responsável por várias alterações importantes, como a Resolução 369 que permite o uso das APP`s com atividades de baixo impacto ambiental por motivos de interesse social.

Segundo Frei Sérgio (MPA e Via Campesina) este órgão ainda possibilita disputa política, onde o debate pode ser colocado abertamente.

O objetivo desta medida é transferir totalmente o poder de legislar sobre meio ambiente para o Congresso Nacional. Este fato seria um retrocesso, uma vez que atribui responsabilidades para uma instituição governamental incapacitada tecnicamente para legislar sobre esta temática. O CONAMA é um órgão democrático e preparado tecnicamente para responder as demandas ambientais através de representantes do MMA e organizações civis. Ademais, cumpre observar também que a correlação de forças no Senado e Câmara dos Deputados favorece o agronegócio.

Art 7º - Inciso XIV - campos de altitude: vegetação de campo que ocorre em áreas acima de 1.800 m e com temperaturas médias anuais abaixo de 10°C.

Na Lei 4771/65 (Código Florestal) todas as áreas acima dos 1800 metros são consideradas APP`s, independente da vegetação existente no local ou suas características climáticas. Tal medida pode flexibilizar a legislação para atividades de mineração.

Inciso XXII - curso de água: fluxo natural de água, não totalmente d e p e n d e n t e d o e s c o a m e n t o superficial da vizinhança imediata, com a presença de uma ou mais nascentes, correndo em leito entre margens visíveis, com vazão contínua, desembocando em curso de água maior, lago ou mar, podendo

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também desaparecer sob a superfície do solo, sendo também considerados cursos de água a corrente, o ribeirão, a ribeira, o regato, o arroio, o riacho, o córrego, o boqueirão, a sanga e o lageado;

Como ficam os cursos de água intermitentes?

XXXVIII - nascente: afloramento natural de água que apresenta perenidade e dá início a um curso de água;

As nascentes intermitentes, presentes em várias regiões onde se tem definido dois períodos climáticos no ano bem demarcados (um chuvoso e outro seco), deixam, a partir desta medida, de serem consideradas nascentes.

XLVII - região rural consolidada: aquelas nas quais já havia atividades agropecuárias e florestais, ao longo do tempo, inclusive por meio da existência de lavouras, plantações e instalação de equipamentos e acessões;

Art. 10.º Para os efeitos deste Código e demais normas de caráter ambiental, as atividades rurais de produção de gêneros alimentícios, vegetal e a n i m a l , s ã o c o n s i d e r a d a s atividades de interesse social.

Tal medida coloca a produção agropecuária como de interesse social e não mais de interesse econômico, ganhando-se um “peso” adicional. Qual atividade agropecuária é de interesse social? O agronegócio de exportação? Quem produz alimentos para a mesa do povo brasileiro é a agricultura familiar camponesa e, sendo assim, deveria ser tratada diferencialmente, como de interesse social e estratégico para soberania nacional, não a deixando a mercê das flutuações do mercado.

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Parágrafo único. O ZEE, na distribuição espacial das atividades, levará em conta a importância ecológica, as limitações e as fragilidades dos ecossistemas e as potencialidades de cada região es tabe lecendo as restr ições n e c e s s á r i a s e o f e r e c e n d o alternativas de exploração do território, podendo determinar, quando for o caso, a realocação de atividades incompatíveis com suas diretrizes gerais.

Art. 3º Parágrafo único. O ZEE, na distribuição espacial das atividades econômicas, levará em conta a importância ecológica, as limitações e as fragilidades dos ecossistemas, e s t a b e l e c e n d o v e d a ç õ e s , restrições e alternativas de exp lo ração do te r r i tó r io e determinando, quando for o caso, inclusive a relocalização de atividades incompatíveis com suas diretrizes gerais.

Art. 66. O requerimento de l icenciamento ou autor ização amb ien ta l , desde que tenha apresentado toda a documentação necessária, terá que ser respondido no prazo de até sessenta dias após o protocolo, sendo que o não cumprimento deste prazo implica em aprovação automática do contido no requerimento.

No Decreto presidencial vigente (4297/02) o Zoneamento Econômico Ecológico:

A alteração novamente flexibiliza as atividades, não existem mais vedações, tendo o órgão estadual competente somente o poder de impor restrições ou indicar alternativas

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Art. 75º São áreas protegidas:

I – Vegetação Ciliar-[...]II – Unidades de Conservação-[...]III – Áreas Frágeis: (Não existirão APP`s.) aquelas que por determinada característica ou função dependem de regime de utilização diferenciado, tais como declividades acentuadas em solos suscetíveis a erosão, topos de morros ou montanhas, vegetação fixadora de dunas ou protetora de m a n g u e s e o u t r a s . ( S e r ã o c l a s s i f i c a d a s a p a r t i r d o Zoneamento econômico ecológico) IV – Reservas Ambientais

Art. 75. O percentual de vegetação a ser mantida em cada estado ou região, de terminado pe lo ZEE, será considerado pela soma das áreas protegidas em todas as suas categorias.

Art. 77. A proteção da vegetação ciliar em cada corpo hídrico e reserva tó r io a r t i f i c i a l se rá determinada pelo órgão ambiental estadual, com base em estudos técnicos e deverá garant ir o cumprimento das finalidades descritas em sua definição.

Tal proposta transfere da União para estados e municípios a prerrogativa de fixar o tamanho das áreas de proteção permanente nas margens dos rios e córregos. Com isso, interesses econômicos locais terão maior margem para flexibilizar a legislação ambiental e destruir a natureza.

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Art. 78. A faixa de vegetação ciliar determinada para cada corpo hídrico poderá ser alterada em áreas específicas mediante parecer de técnico devidamente habilitado a ser aprovado pelo órgão estadual competente.

Art. 80. A supressão de vegetação ciliar nativa protetora de nascentes ou corpos hídricos naturais poderá ser autorizada quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos necessários ao adequado aproveitamento socioeconômico da propriedade ou de utilidade pública ou interesse social, garantindo-se a viabilidade das atividades intrínsecas às áreas protegidas.

Parágrafo único. As atividades que somente tiverem como alternativa o uso de área de vegetação ciliar deverão ser devidamente licenciadas.

Art. 85º § 2º As áreas denominadas Reserva Legal, criadas por força da Lei 4.771/65, já consolidadas na data desta Lei com cobertura florestal nativa existente, poderão ser descaracterizadas como tal após a definição do percentual mínimo de reservas ambientais no Estado pelo ZEE, sendo sua conversão de uso limitada pelas normas gerais do uso do solo local, ou utilizadas nos processos previstos neste artigo.

Este artigo já esta previsto pela Resolução 369/2006 do CONAMA.

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Art. 90. Serviços ambientais são serviços úteis oferecidos pelos ecossistemas para o homem, como a regulação de gases pela produção de oxigênio e seqüestro de carbono, conservação da biodiversidade, proteção de solos, regulação das funções hídricas, entre outros.

Art. 121. Entende-se por uso consolidado a atividade que esteja em desenvolvimento na data da publicação desta Lei.

Art. 122. Ficam mantidas as atividades consolidadas localizadas nas atuais APPs, exceto nos casos em que haja dano efetivo ao meio ambiente, comprovado por laudo de técnico habilitado.

Art. 123. O art. 6º da Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 6º. Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:I - a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente;II - os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;III - a situação econômica do infrator, no caso de multa;IV – o bem causado ao ambiente pelo desenvolvimento da atividade ou empreendimento.

Parágrafo único. As penas restritivas de direitos a que se refere este artigo assim como as pena privativa de liberdade serão, sempre que possível, substituídas por reparação do dano ambiental ou ação que vise a melhoria da qualidade do meio ambiente.” (NR)

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As punições exercidas aos que cometem crimes ambientais serão perdoadas pela reparação do dano ambiental.

O debate sobre a alteração do Código Florestal é retratado na mídia como um embate entre os ruralistas e ambientalistas. O termo ambientalista é colocado de forma pejorativa e não caracteriza todos os sujeitos questionadores do movimento de desmonte da legislação ambiental. O que está em disputa no Congresso, nas audiências públicas e na mídia, não é simplesmente o prestígio pelo amor a natureza ou pelo poder econômico. Ali se trava um embate de qual projeto de campo brasileiro nós defendemos. Um campo onde se predomina o agronegócio de exportação, baseado na monocultura, no latinfúndio, na dependência de insumos e capital externo? Ou no desenvolvimento de um campo com reforma agrária, sustentabilidade, com autonomia dos camponeses e conseqüente soberania alimentar? Qual modelo você defende?

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“Lutar pelo verde,tendo a certeza de que sem o homem e

mulher o verde não tem cor”- Paulo Freire

Iara Jaime de Pina

Primeiro MotivoO Código Florestal Brasileiro considera as diferentes

formas de agricultura que existem em nosso país. Dessa forma, ao analisarmos a agricultura camponesa, familiar ou posse rural familiar, este último como é denominado no código florestal, percebe-se a importância que elas possuem na produção de alimentos em nosso país como é notável no último censo agropecuário (IBGE, 2006) que afirma que a agricultura familiar é responsável por 87% da produção nacional de mandioca, 70% da produção de feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz, 58% do leite, 59% do plantel de suínos, 50% das aves, 30% dos bovinos e 21% do trigo; além de 75% da mão-de-obra no campo. Apesar dos camponeses serem historicamente os conservadores da agro biodiversidade, é de se concordar que a agricultura camponesa e a agricultura familiar apresentam maiores dificuldades, tanto econômicas quanto técnicas, no que diz respeito à adequação ambiental da propriedade em relação aos médios e grandes imóveis rurais. Por compreender isso, o código e as resoluções do CONAMA trazem dispositivos que facilitam a readequação ambiental dessas propriedades aliando também a possibilidade de inserção de produtos de origem florestal dentro das atividades econômicas já desenvolvidas na propriedade.

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No artigo 1°, parágrafo 2°, o código traz a definição do que se entende por pequena propriedade ou posse rural familiar que engloba parâmetros de tamanho de propriedade de acordo com a realidade da cada região, haja vista que em cada localidade o tamanho mínimo de uma propriedade para o sustento familiar é diferente. E ainda engloba o parâmetro da mão-de-obra empregada nessas propriedades e a quantidade mínima de renda que deve ser proveniente da atividade agroflorestal ou extrativismo. Essa diversidade de parâmetros traz a essência da agricultura camponesa que não se baseia simplesmente no tamanho da propriedade baseado no módulo fiscal, mas na importância desses modos de vida na produção de alimentos e na manutenção da agro biodiversidade que existe em nosso país. Reafirmar essa importância e conceber benefícios a partir disso é uma forma de amenizarmos o envelhecimento do campo (já que o código reconhece que a mão-de-obra nessas propriedades deve ser essencialmente familiar) e aliarmos produção de alimentos e conservação de nossas riquezas naturais, ainda mais em um país que há 500 anos tem uma cultura preponderante baseada no agronegócio e na produção de commodities onde o êxodo rural trouxe e as demais conseqüências desse modelo de produção acarretaram em inúmeros problemas sociais no meio rural e urbano.

No que se refere às APP’s, o código permite à pequena propriedade ou posse rural familiar atividades de manejo agroflorestal sustentável que não descaracterizem a cobertura vegetal e não prejudiquem a função ambiental da área mediante aprovação do órgão ambiental competente (Artigo 4° e Artigo 1°, parágrafo 2°, V, b).

Em relação às Reservas Legais, à pequena propriedade ou posse rural familiar é permitido manejo florestal sustentável, computar os plantios de árvores frutíferas ornamentais ou industriais, compostos por espécies exóticas, cultivadas em sistema intercalar ou em consórcio com espécies nativas (Artigo 16, parágrafo 2° e 3°). Além do que a reserva legal é de uso sustentável independente do tipo de propriedade. No caso da averbação da reserva legal para a pequena propriedade ou posse rural familiar é gratuita e o poder público deve prestar assistência técnica e jurídica (Artigo 16, parágrafo 9°). No que se refere à

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recomposição da reserva legal o código estabelece que o órgão ambiental competente deve apoiar tecnicamente a agricultura familiar (Artigo 44, parágrafo 1°).

Assim, fica claro que o código florestal permite à pequena propriedade ou posse rural grande flexibilidade quanto à adequação da propriedade. Não se trata, portanto, de se alterar a legislação ou modificá-la para que se alie produção de alimentos à conservação, mas de colocar o código que já existe em exercício e políticas públicas que de fato possibilitem condições materiais (créditos não retornáveis para a restauração florestal, implantação de sistemas agroflorestais, pagamento por serviços ambientais para os pequenos produtores, apoio e assistência técnica) para o agricultor familiar adequar sua propriedade.

Vale colocar que as resoluções do CONAMA destrincham melhor essas possibilidades para a agricultura e posse familiar e agricultura camponesa, por isso a necessidade de também conhece-lãs por se tratar de um complemento ao código.

Segundo MotivoO Código Florestal Brasileiro, apesar de ser um marco

legal reconhecido internacionalmente não é restrito de forma a ser um empecilho à agricultura do país, muito pelo contrário, à medida que estabelece parâmetros para a conservação deixa claro que existem inúmeras possibilidades de contorná-lo conforme a necessidade e mediante autorização do órgão competente.

Ao definir no artigo 1, parágrafo 2°, IV e V, utilidade pública e interesse social, o código engloba desde atividades de segurança nacional e proteção sanitária até atividades de proteção à integridade da vegetação nativa, não mencionando aqui as obras, planos e projetos que são definidos e regulamentados nas resoluções do CONAMA. E se tratando de atividades de utilidade pública ou interesse social é permitido a supressão de APP, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto e mediante autorização do órgão ambiental estadual competente (Artigo 4, parágrafo 1°). Em nascentes, “olhos d’água”, restingas fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues a retirada da APP é permitida em casos de utilidade pública (Artigo 4, parágrafo 5°). A supressão de

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APP em áreas urbanas também é possível a partir de um parecer técnico (Artigo 4, parágrafo 2°). Dentro das APPs também é permitido o acesso de pessoas e animais, caso não comprometa a regeneração e manutenção da vegetação (Artigo 4, parágrafo 7°).

O Código permite ainda o cômputo de APPs no cálculo do percentual de Reserva Legal, desde que não implique em conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo, e quando a soma da vegetação nativa em área de preservação permanente e reserva legal exceder as porcentagens delimitadas para cada região (Artigo 16, parágrafo 6°).

Diversas atividades são permitidas com licença ou autorização do órgão ambiental responsável: Comércio de plantas vivas oriundas de florestas, ampliação do registro de pessoas físicas e jurídicas que extraem, industrializam e comercializam produtos e sbprodutos florestais, supressão , manejo e condução das florestas, formações florestais ou formações sucessoras– com exceção de APP e RL, emprego de fogo no manejo agropastoril ou florestal caso as peculiaridades locais demandem, compensar a reserva legal dentro e fora da mesma micro-bacia (Artigos 13°, 14°, 16°, 19°, 27°, 37-A e 44°).

Enfim, grande parte das atividades econômicas são possíveis a partir da licença do órgão ambiental. Ou seja, o código não proíbe estas, apenas exige que sejam regulamentadas.

Terceiro MotivoO Código Florestal além de trazer parâmetros técnicos e

jurídicos de conservação das riquezas naturais traz também a preocupação em processos educativos que englobem a questão ambiental e também a popularização desta questão a partir dos meios de comunicação. Ou seja, o código não é apenas um instrumento punitivo, mas traz a possibilidade de por meio dos processos educacionais a incorporação dessas riquezas para a manutenção vida.

Dessa forma, prevê inclusão nos livros escolares de textos sobre educação florestal, textos e dispositivos de interesse florestal nas estações de rádio e televisão (no mínimo de 5 minutos), inclusão dos Parques e Florestas Públicas nos mapas e cartas oficiais e a instituição da Semana Florestal em todo território brasileiro (Artigos 42° e 43°).

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Se o sistema educacional ainda não incorporou esses conteúdos, assim como as estações de rádio e televisão, não foi por ausência de leis que deliberassem sobre o tema, mas por falta de compromisso e fiscalização (principalmente no que diz respeito às empresas que detém os meios de comunicação de massa), de diálogo entre o Conselho Federal de Educação e o órgão Florestal Federal e de condições concretas (econômicas e estruturais) para a realização da Semana Florestal.

Quarto MotivoO Código estabelece inclusive que o IBAMA deve zelar

para que dentro de cada município onde haja atividade florestal baseada nas florestas plantadas deve haver área destinada à produção de alimentos básicos e pastagens (Artigo 46°). Como foi a problemática vivenciada em São Luiz do Paraitinga-SP onde as florestas plantadas passaram a ocupar áreas historicamente reservadas a manutenção da bacia leiteira da região pondo em risco a manutenção da mesma e dos pequenos agricultores que sobreviviam a partir dessa atividade, assim delimitou-se limites aos cultivos de florestas plantadas no município.

Ou seja, o código além de prever mecanismo de conservação ambiental trabalha de forma integrada para contribuir com a segurança alimentar das comunidades locais.

Quinto MotivoA lei 4.771, apesar de ser única para todo território

brasileiro, considera as peculiaridades de cada região haja vista a dimensão de nosso país. Notável nos diferentes percentuais de Reserva Legal de acordo com cada região, na possibilidade de manejo de fogo caso seja uma necessidade local, como já citado acima.

E também prevê ampliação e redução da reserva Legal pelo Ministério do Meio Ambiente ou pelo Ministério da Agricultura e do Abastecimento, caso seja indicado pelo Zoneamento Ecológico Econômico - ZEE e pelo Zoneamento Agrícola (Artigo 16, parágrafo 5°).

Além de permitir que o Poder Público Federal ou Estadual pode prescrever outras normas quem atendam às peculiaridades locais, conforme consta o artigo 14.

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Dessa forma fica claro que já temos uma legislação consolidada em nosso país que não se trata simplesmente de um marco proibitivo, mas de um instrumento que traz em si esclarecimentos técnicos, jurídicos e de cunho educativo. Ao mesmo tempo em que prevê peculiaridades locais e abre possibilidades para que cada região possa estabelecer alguns parâmetros locais. E também não se trata de um código que traz empecilhos à produção agropecuária do país, pelo contrário, privilegiam aqueles que historicamente garantiram a segurança alimentar de nosso país, os agricultores camponeses e familiares.

Assim, se temos um instrumento de regulamentação do uso dos recursos naturais reconhecido internacionalmente, não existe a demanda de alterá-lo ou modificá-lo, até porque não houve condições materiais de colocar esse código em prática e se não sabemos como seria tê-lo de fato em vigor, não há razões para mudanças. Não são leis que garantem a conservação de nossas florestas, mas medidas concretas que possibilitem a adequação das propriedades rurais e são justamente essas medidas que carecem para que o código seja efetivamente exercido na prática.

O que existe é a necessidade de um amplo programa de adequação das propriedades quanto código florestal. Que conforme a proposta dos movimentos sociais da Via Campesina envolve:

-Interromper a devastação florestal imediatamente e criar condições e prazos compatíveis para a adequação e regularização dos que estão em desconformidade com o Código, pois a maioria foi induzida a esta desconformidade por políticas do próprio Estado, vide o PAC e as políticas de colonização na década de 60;

-um programa amplo com créditos para reflorestar; constituir agroflorestas, sistemas agroflorestais e agrosilvipastoris para as pequenas propriedades ou posse rural familiar;

- Recursos não retornáveis para acompanhamento técnico e assistência técnica nas comunidades camponesas e familiares e para coleta de sementes e construções de viveiros de mudas em todo o território nacional;

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-Implantação imediata de um Programa de Pagamento por Serviços Ambientais no campo para os que preservarem matas, solo, agroflorestas, fontes e nascentes, rios, encostas, mangues, restingas e todo e qualquer serviço ambiental relevante no campo com pagamento mensal e permanente em valores de R$ 150,00 a R$ 400,00 por família (corrigidos anualmente pela correção do Salário Mínimo), de acordo com a situação de renda e da área ambiental protegida;

- Criação de um fundo nacional de adaptação às mudanças climáticas com imposto sobre grandes fortunas, indústrias poluentes e eletrointensivas, empresas acumuladoras de lixo, sobre produção e consumo de produtos petrolíferos e carboníferos, sobre a indústria do cimento, empresas do agronegócio, etc... Este fundo financiaria o pagamento por serviços ambientais nas pequenas propriedades e os custos da adequação da agricultura familiar às exigências ambientais.

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Quando se propõe uma alteração no Código Florestal Brasileiro que visa impedir o cultivo de espécies exóticas em áreas de Mata Atlântica, à primeira vista pode parecer uma decisão acertada, considerando-se que este tipo de intervenção pode acarretar uma série de desequilíbrios ecológicos inesperados.

Contudo, se levarmos em consideração o que pode significar esse impedimento para os agricultores de base ecológica que trabalham ou pretendem implementar alguma espécie de Sistema Agro-Florestal em suas propriedades, percebemos que pode ser uma determinação arbitrária que não leva em conta as especificidades de cada tipo de intervenção.

A prática de agricultura segundo as técnicas agroflorestais se mostra uma excelente alternativa para obtenção de recursos e geração de renda sem a necessidade de desmatar áreas de florestas nativas. Ainda se mostra como uma técnica de recuperação de áreas degradadas que visa uma evolução do sistema ao longo do tempo, permitindo que se recomponha a vegetação que protege o solo, atraindo animais silvestres, reestabelecendo o ciclo hidrológico, entre outros benefícios ambientais, ao mesmo tempo que não impede o produtor de obter renda nesse processo, renda que aumenta progressivamente à medida que se desenvolvem as culturas perenes de ciclo longo, que fornecem produtos de maior valor, com menor necessidade de manutenção do sistema.

Em um sistema agroflorestal é importante se priorizar o uso de espécies nativas, principalmente para que ocorra uma real interação entre estas áreas e a dinâmica dos ecossistemas locais. Porém, mostra-se necessária a introdução de algumas espécies exóticas, indispensáveis não somente para a geração de renda -principalmente nos estágios iniciais do processo de sucessão (como as Bananeiras – Musa paradisiaca L.) – mas que também realizam importante papel no aspecto de regeneração

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das condições do local, através da fixação de nutrientes, incremento de matéria orgânica, descompactação do solo.

Os modelos de exploração do solo que hoje se desenvolvem plenamente no Brasil, utilizando espécies exóticas como o Eucalipto (Eucalyptus spp) em larga escala e em monocultivo, são causadores de grandes impactos ambientais e sociais, como a exaustão de mananciais, isolamento de fragmentos florestais, bem como a pressão sobre comunidades tradicionais para que abandonem seus territórios- como indígenas e quilombola, entre outros impactos.

Quando se contrapõem estes modelos, percebe-se que há uma necessidade de diferenciar qual tipo de intervenção está sendo realizada, se causa de fato um impacto positivo ou negativo na sociedade e no bioma, se está promovendo a regeneração do ecossistema ou sua degradação, se está de acordo com os interesses de uma economia de mercado ou se atende às necessidades da população do entorno. Tudo isso precisa ser considerado, e não vai ser através de uma proibição taxativa de qualquer introdução de espécies exóticas nestas áreas que vamos avançar no sentido de um Código Florestal justo, eficiente em proteger nossa biodiversidade e eficiente em garantir a convivência equilibrada entre o Camponês e as Florestas.

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E a luta segue organizada

com muita determinação

derrubando as cercas da morte

e o poder do tubarão

Nas mãos de quem nela trabalha

e o fim dessa concentração

pois ela sim é mão dos pobres

nesta causa nobre da revolução

(Zé Pinto).

E a luta segue organizada

com muita determinação

derrubando as cercas da morte

e o poder do tubarão

Nas mãos de quem nela trabalha

e o fim dessa concentração

pois ela sim é mão dos pobres

nesta causa nobre da revolução

(Zé Pinto).