Carvoaria Amazônia - · PDF filede carvão vegetal, que é um subproduto...

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    Publicado em maio de 2012Revisado em dezembro de 2012

    Carvoaria AmazniaComo a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos

  • Greenpeace Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos

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    Seo 1 Introduo

    Uma das regies mais desmatadas e violentas da Amaznia, Carajs que engloba partes do Par, do Maranho e do Tocantins , teve um crescimento explosivo nas ltimas dcadas, desde que o governo decidiu, nos anos 80, transformar a regio em polo de produo de ferro. Ali, o nvel de devastao florestal inversamente proporcional presena do Estado. Daquela poca em diante, as reas desmatadas aumentaram significativamente, e a produo de ferro gusa matria-prima do ao tambm, puxada por uma demanda do mercado externo. Os investimentos do governo atraram mais de 40 altos-fornos para a regio, operadas por 18 empresas guseiras, gerando carvoarias por todos os lados. Os recursos para evitar os impactos sociais e ambientais, no entanto, no chegaram. No histrico da indstria, devastao florestal, conflitos de terra, trabalho escravo, poluio e outros problemas se arrastam at hoje sem soluo. E o governo segue fechando os olhos para tudo.

    Uma investigao de dois anos feita pelo Greenpeace mostra que essa lista de problemas continua de p, e est atravessando as fronteiras do Brasil: largamente exportado para os Estados Unidos, o ferro gusa tem alimentado a indstria norte-americana de automveis, que o transforma em ao para fabricar peas.

    A pesquisa revela que as grandes montadoras naquele pas, incluindo Ford, General Motors, Nissan, Mercedes e BMW, bem como o gigante de equipamentos agrcolas John Deere, carregam desmatamento e trabalho anlogo ao escravo em sua cadeia de fornecimento (processo conhecido como escravido moderna). Alertados h alguns anos pelos artigos publicados na imprensa geral e especializada, essas empresas continuam negligenciando as evidncias de que alguns dos seus fornecedores descumprem as leis ambientais e trabalhistas do Brasil, causando enormes impactos sobre a Amaznia e seus povos.

    Como vrias outras reas na Amaznia, a maior parte das terras desmatadas em Carajs hoje ocupada por pastagens e plantaes de soja e pastagens. Mas, ali, h outros fatores que tambm alimentaram essa destruio: a retirada intensa e predatria de madeira e a produo de carvo vegetal, que um subproduto dessa extrao madeireira. 1 Ao longo dos anos, dezenas de carvoarias se espalharam pela regio, impactando terras indgenas e outras reas protegidas.2

    A maior mina de ferro do mundo, controlada pela Vale S.A., segunda maior mineradora do mundo3, fica encravada em Carajs. Desde o final dos anos 1980, esse gigantesco depsito de minrio de ferro atraiu dezenas de guseiras 4. Elas so alimentadas com grandes quantidades de minrio e de carvo vegetal para o processamento do ferro gusa, material intermedirio na produo do ao. Por meio do Programa Grande Carajs, o governo brasileiro fez pesados investimentos na produo de ferro gusa, no setor de minerao e na infraestrutura da regio. O financiamento desse projeto veio quase todo do Banco Mundial, da Comunidade Econmica Europeia (que precedeu a Unio Europeia) e do governo japons, na dcada de 80.5Desde ento, a indstria do ferro gusa e seus fornecedores de carvo vm causando grandes impactos negativos. Alm de alimentar o desmatamento, as carvoarias tm uma notria tradio de uso de trabalho anlogo ao escravo.6 A corrida pela posse de terras para a explorao da madeira e produo de carvo tambm acabou impulsionando a violncia e os conflitos fundirios. Mais de 70% de todo o ferro gusa exportado da regio destinado aos Estados Unidos para ser usado como componente primrio na fabricao de ao ou ferro fundido.7 A soluo do problema exigir medidas imediatas a serem tomadas pelo governo brasileiro. Mas tambm pela indstria americana do ao e por alguns de seus maiores clientes: Ford, General Motors, BMW, Mercedes, Nissan e John Deere.

    Introduo1 Introduo 032 Da floresta ao carvo 053 Desenvolvimento devastador na Amaznia Oriental 114 Destruio da Amaznia em sua garagem 195 O que fazer: as solues propostas so viveis? 236 Concluso 27

    Notas 28

    Escrito porGreenpeace

    Capa Greenpeace / Rodrigo BaleiaCarvoarias no Par. Desde a dcada de 1980, quando a regio de Carajs se transformou em polo siderrgico, as carvoarias se espalharam feito plvora.

    Publicado por Greenpeace Av. Joaquim Nabuco, 2367 Centro69020-031, Manaus AM Brasil

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    Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos 3 2 Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos

    Fornos de carvo irregulares construdos prximos ao rio Tocantins, no municpio de Tucuru, Par, desrespeitando a distncia mnima exigida por lei.

  • 034 Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos 5

    Greenpeace Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos

    Seo 2 Da floresta ao carvo

    Vendo do cu ou do cho, a cena parece tirada de um filme antigo: na regio de Carajs, dezenas de carvoarias se espalham por reas que um dia j foram densas matas. Nessas carvoarias, a floresta se transforma em carvo, que depois queimado nos altos-fornos para produzir ferro gusa. Quase sempre ilegais, as carvoarias so instaladas em questo de dias em reas de difcil acesso. Se so fechadas pelas autoridades, frequentemente ressurgem em outro local. Elas se localizam junto s reas de desmatamento, em reas protegidas e terras indgenas. Os trabalhadores, que com frequncia acabam morando na prpria carvoaria e, por vezes, trabalham em condies anlogas escravido, abastecem os fornos e acendem o fogo para queimar a madeira por at sete dias, transformando-a em carvo.8 Em seguida, o carvo levado em caminhes e distribudo pelos mais de 40 altos-fornos das guseiras da regio, servindo para converter o minrio de ferro bruto em ferro gusa.9 O ferro gusa um ingrediente essencial na produo de ao e ferro fundido.

    Geralmente associado a churrasco e fornos a lenha, a grande maioria do carvo produzido no Brasil tem outro destino. O Plano Nacional sobre Mudana do Clima de 2007, do governo brasileiro, reconhece oficialmente que o ferro gusa um fator que contribui para a emisso de gases do efeito estufa oriundos do desmatamento.10

    O carvo como combustvel para a produo de ferro gusaSegundo a Associao International de Ferro Gusa, o carvo representa mais de um tero do valor de produo do ferro gusa.11 Em geral, os altos-fornos de ferro gusa consomem o combustvel mais barato possvel. As carvoarias da regio costumam contratar mo de obra anloga escrava e usar madeira de origem ilegal para reduzir despesas e aumentar o lucro. 12 A madeira ilegal oferece aos produtores de carvo uma imensa oportunidade de lucro, j que seu custo estimado em cerca de um dcimo da madeira de reflorestamento.13

    Da floresta ao carvo

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    Carvoaria ilegal em Tucuru, no Par

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    4 Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos

  • 66 Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos 7

    Greenpeace Carvoaria Amaznia Como a indstria de ao e ferro gusa est destruindo a floresta com a participao de governos

    Seo 2 Da floresta ao carvo

    Escravido o lucro se sobrepe aos direitos humanosCondies de trabalho que beiram a escravido so frequentes nas carvoarias da regio. Longe de ser um segredo, a prtica j foi tema de relatrios da Organizao das Naes Unidas e da Organizao Internacional do Trabalho,14 e 15 e o Ministrio do Trabalho dos Estados Unidos incluiu o carvo brasileiro em sua Lista de Bens Produzidos por Trabalho Infantil ou Trabalhos Forados.16

    Segundo o Ministrio do Trabalho e Emprego, a produo de carvo vegetal, uma das principais fontes de trabalho anlogo ao escravo no pas.17 Segundo o Ministrio do Trabalho, em 2010 o Par foi o estado brasileiro com o maior nmero de casos registrados de trabalho anlogo ao escravo, enquanto o Maranho foi o stimo.18 O caso tpico de trabalho forado se assemelha a uma relao credor-devedor: um recrutador, conhecido como gato, percorre pequenas cidades da zona rural oferecendo aos homens oportunidades de trabalho em locais distantes. Os homens so levados para as carvoarias, em reas remotas, e so informados de que tm uma dvida exorbitante, correspondente aos custos da viagem. Eles so, ento, forados a trabalhar, muitas vezes sob ameaa de violncia, para pagar essa dvida criada. Alm da baixa remunerao, as carvoarias costumam economizar mantendo os empregados em ms condies sanitrias e com pouca comida. As condies de trabalho so insalubres e os operrios muitas vezes precisam retirar o carvo dos fornos em alta temperatura sem equipamento de proteo.19

    No trecho a seguir, auditores do Ministrio do Trabalho relatam o depoimento de um empregado que, em 2009, foi encontrado em uma carvoaria de Aailndia (MA) sob condies contrrias s disposies de proteo ao trabalho:

    [O empregado declara] Que veio trabalhar na carvoaria no servio de bater tora, encher forno com lenha e tirar o carvo; (...) que para chegar at a carvoaria fez a viagem a p, andando cerca de 5 km; que tambm trabalha co