Chicos 16 - Maio 2008

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Chicos Maio 2008 Foto Vicente Costa [email protected] Veja a nossa poesia em: http://chicoscataletras.blogspot.com/

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ChicosMaio 2008

Foto Vicente Costa

[email protected]

Veja a nossa poesia em:

http://chicoscataletras.blogspot.com/

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Um dedim de prosa Este mês de maio, como os anteriores, está recheado de notícias ruins. Afora o centenário do Guilhermino César, o que mais temos? As antigas quermesses lá na igreja do Rosário acabaram-se, o dia das mães virou um grande espetáculo comercial. O filho manda um celular de presente para a mãe e mais tarde liga: “ - Oi mãe... Claro que tô Vivo... Qualquer hora apareço aí!”. Concordamos com a letra da música que diz que a televisão está nos deixando burros demais. Em editorial, certo canal paulista que sintomaticamente chama a si de bandeirantes, os primeiros a se embrenharem pelas florestas estuprando e matando índios, chama os índios da Raposa do Sol de invasores de fazendas de arroz. Soa como se o arrozeiro e seu arroz estivessem ali antes do período pré-colombiano e quem sabe até da própria floresta. Não agüentamos mais ver a tragédia humana que abalou a família paulista ser servida pelas tvs como quem serve carne estragada aos abutres. Há algo de podre no ser humano que embalado pelas tv’s, escoiceando a inteligência de todos, faz uma regressão. Não aquela em que o indivíduo busca nas frestas de sua alma encontrar respostas para suas dores e dúvidas, mas uma regressão acelerada rumo a irracionalidade dos quadrúpedes. Não iremos, como o tal do Sílvio Brito na canção, pedir para parar o mundo que a gente quer descer. Tem muita gente ruim que deveria “apear” deste mundo, de preferência, para algo pior. Vamos sim combater toda esta estupidez com a melhor das armas, a poesia. Disparar contra esta estupidez humana as doces balas contidas nos versos, que não fere a carne, mas limpa a alma. Todos andam por aí a fazer balanços de 1968 e seu maio, Zé Antonio, o faz pela ótica de cataguasense. Ronaldo Cagiano reforça a luta pela preservação da casa da Rua Alferes. Ela que virou conto do Zé Vecchi, cenário de curta metragem, esperamos que não fique só no papel e na nossa memória de futuros velhinhos já devotos de Alzheimer. Antonio Jaime mostra que futebol pode ser matéria prima da poesia, achamos que o pessoal tem medo de, ao trabalhar com tal fonte de inspiração, emburrecer feito repórter de campo. Chico Cabral nos presenteia com mais um magnífico poema.

Os Chicos

Ainda mais

*Francisco Cabral

Escrevo a língua do meu avôe tenho a sua carano espelho fugidio onde buscoas marcas do que eu sou.

Vejo o rio passarOs peixes das palavras boquejam espuma e água sujano sulcado perau dos versoso poema flui arrastando em sua caldaa mudez dos afogados e os gritosdos pescadores de areia.

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Um passo atrás, que eu possa veressa procissão que se arrastadesde muito antes do ano de milnovecentos e trinta,quando eu mesmovazei num jato de sangue e soroe gritei pela primeira vez: eu- e não, e nunca na verdade, fui ouvido.

Um passo atrásque o sol está secando as chuvas do poenteum corpo vai-se atirar na direção do naufrágioe a chama de uma velanum barquinho sem lemeserá enviada a procurá-lo

Escrevo a língua do meu avôsem sua permissão,por isso apenas busco seduziros fantasmas que me visitampor isso venho até o riopara olhá-lo nos olhose numa canção inaudívelberçar os seres amáveis que o habitame se coçam nas facas dos peixes

Vejo o rio passar e mal me vejoenquanto envelheço à sua beiraA luz e o silêncio em mim sabem a vidae enquanto respirotudo o que não entendo faz sentido.

*Francisco Marcelo Cabral (Rio de Janeiro RJ)

Ludopédico*Antonio Jaime

a bola levanta vôoveloz como cometahipnotizaolho por olhoemboca na rede: é gol

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como acertar no cuboque subjaz na esferapor mais de cem mil ladossó um deles dá no couro

metade da torcida explodecomo se um só foguetea outra: “porra! não fode”pronta a baixar o cacete

*Antonio Jaime Soares (Cataguases – MG)

Carta ao Prefeito de Cataguases*Ronaldo Cagiano

Senhor Prefeito

Solidários, desde o início, com a campanha deflagrada pelo escritor Vanderlei Teixeira Cardoso (Pequeno), cuja reivindicação pleiteava a desapropriação do imóvel localizado à Rua Alferes Henrique de Azevedo, em razão não só de sua ociosidade, mas do completo abandono pela família de um patrimônio físico que poderia muito bem servir à população, é alvissareira a notícia de que a Municipalidade cataguasense foi sensível a esse apelo e acaba de declará-la de utilidade pública.

A casa da rua Alferes, como carinhosamente vem sendo denominada (e foi até objeto de um livro de crônicas) tornou-se símbolo não apenas de uma luta pela preservação do imenso patrimônio estético de Cataguases, mas, principalmente, da recuperação de nossa auto-estima cultural e artística, que remonta suas raízes em nossas tradições vanguardistas (do cinema à literatura, das artes plásticas à arquitetura) e que teve em Francisco Inácio Peixoto um de seus mecenas e impulsionadores.

A recuperação do imóvel da rua Alferes e sua transformação não somente em uma biblioteca, mas num centro de múltiplos usos culturais, representa a retomada, pelo poder público, da gestão cultural em nossa cidade. Vale dizer que, nos últimos tempos, as várias expressões artísticas em Cataguases vêm sendo apoiadas por instituições ligadas ao setor privado - tributárias dos benefícios das leis de incentivo estadual e federal – que vêm ocupando um espaço originariamente destinado à Secretaria de Cultura, atuando de forma subsidiária à promoção cultural, com resultados positivos para a população.

Com a aquisição legal da casa da rua Alferes, a Prefeitura se insere novamente no contexto da valorização e do estímulo da cultura local, criando mais uma alternativa para ecoar a atividades

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artísticas do povo, ampliando e democratizando o seu acesso aos bens culturais e criando um novo referencial para a nossa tão antiga e mítica vocação, que deve ser preservada e revalorizada, pois está em jogo a memória e a história de nossa cidade e de nossa gente, e como diz Octavio Paz, “se a memória se dissolve, o homem se dissolve. “

* Ronaldo Cagiano (São Paulo SP)

Desorientação

*Emerson Teixeira

Não me fale mais no pós-moderno. Não quero saber se há ligação entre um microcomputador e um sex shop. Ora, deixe haver. Se a massa consumista é melancólica (posto que fascinada), deixe ser. Assim, você acaba por me deixar mais niilista e, ainda que mal possa perguntar: há mais alguma novidade no ar, além desta folhinha que aprendeu a surfar? Não ligue para os filósofos, você é muito sensível.

*Emerson Teixeira Cardoso ( Cataguases-MG)autor de Similes (poesia)

O meu mil novecentos e sessenta e oito *José Antonio Pereira

O golpe de 64 me pegou lá no grupo da Vila, no curso primário. Nessa época também, pela primeira vez, coloquei os pés no Colégio Cataguases. Fui convidado por um primo a assistir uma sessão de cinema num cineclube.

Percorremos, sentindo o cheiro de flor da noite, a avenida por onde até hoje também correm os trens. Aquele aroma é dos mais antigos que minha memória ainda retém da cidade. O outro era o mau cheiro do Meia Pataca, desaguadouro da lixívia de uma fábrica de papéis, que até hoje relaciono ao cheiro do golpe militar.

Saindo da avenida pegamos uma estrada de terra e nos embrenhamos na escuridão, depois, subimos uma estrada esburacada. Do meio do nada, diante dos meus olhos brilhando de espanto, bem no meio de um restinho de Mata Atlântica, surge no breu da noite, todo iluminado um prédio branco, muito grande, belíssimo, enorme. Sobre o impacto de tão fantástica visão, me sentindo ainda

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meio abduzido, fui levado pelo primo para o local da projeção – um antigo refeitório. No caminho, me vi pela primeira vez diante do mosaico de Paulo Werneck e a sedução por aquele lugar tomou meu coração-menino. Só me dei conta do filme lá pelas tantas: um candidato prometia, em preto e branco, casa, comida e roupa lavada em troca de votos. Tempos depois descobri que o personagem era o Coronel Januário em O Canto da Saudade, de Humberto Mauro. Mais quatro anos depois do golpe, eu estava lá no meu terceiro ano ginasial, nas minhas incursões infanto-juvenis pelo jardim Burlemaquiano, diante do prédio do Oscar Niemayer. Nada sabia eu sobre fatos políticos: o ano mal começara e, no dia seguinte ao meu aniversário, na Carolina do Sul, um dos estados unidos do Tio Sam, três jovens estudantes que protestavam contra o segregacionismo racial foram mortos pela polícia. Hoje, também sei que na véspera do meu aniversário, François Truffaut iniciou a filmagem de Beijos Proibidos. Meu interesse era o de desfrutar da piscina e do campo de futebol disponível na nova escola, espaços inexistentes no velho grupo escolar. Havia ali algo encantador. Já na entrada, dávamos com a delicadeza da arte popular exposta em várias vitrines. Parávamos no caminho do auditório para ver as cenas da violência contra Tiradentes no imenso e original mural do Portinari, apelidado pelo nosso poeta maior de Outdoor do Partido Comunista... E nós concordamos com ele.

Ironia. Não se fazem mais comunistas do naipe do próprio Candido Portinari do Oscar Niemayer e Luiz Carlos Prestes. Hoje, os comunas da nossa paroquiana cidade, feito Macunaímas, avacalham com a Doutrina: confessam e comungam aos domingos na missa das dez do Santuário Municipal. O Mural e muitos amigos meus foram levados à força para São Paulo. A obra, para revê-la, é necessário, hoje, ir ao Memorial da América Latina, na Barra Funda. Já os amigos, muitos ainda enfrentam por esse Brasil afora a barra da vida.

No auditório, Dona Lila, professora de canto, ensinava-nos aquela fieira de hinos pátrios, entre eles, a primeira obra do Ari Barroso que sabia na integra, letra e música: Salve o Colégio que é sem par de Cataguases... A música que embalava nossa infantil rebeldia precoce era É proibido proibir , frase que pulara dos muros de Paris para a boca do Caetano Veloso. Cultuávamos mesmo era Simon e Garfunkel cantando a trilha sonora do Primeira noite de um homem, filme de Mike Nichols com Dustin Hoffman. Na minha casa eu já assistia a uma TV novinha, possivelmente, uma Colorado RQ. Controle remoto ainda era delírio de ficção científica e ainda não se tinha nem certeza que veríamos a Copa de 70 ao vivo. O telejornal, não me lembro se era o Repórter Esso, anunciava a ofensiva do Tet no Vietnam. Mais adiante, em imagens tremulantes, víamos as primeiras viagens das Apolos e já nos imaginávamos embarcando para lá do futuro, que seria o terceiro milênio, na Enterprise, com o Spock em nossa jornada pelas estrelas.

Suspiro geral de nossas amigas de escola por Alain Delon, Jerry Adriany e tantos outros que, despeitados, julgávamos sem talento. Com a ajuda intelectual de um amigo, provocávamos, dizendo que os verdadeiros galãs seriam Eli Wallach, Steve McQueen, Charles Bronson e Yul Brinner todos no elenco de Os sete magníficos. Com ele, ficamos sabendo que Vladimir Palanuik era nada mais nada menos que outra celebridade do cinema o Jack Palance. Mais tarde descobrimos que toda aquela boa vontade conosco tinha como pano de fundo sua estratégia de socialização com a turma: deu certo e

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explicam-se assim os nossos fracassos e o seu sucesso com o público feminino do ginásio. Ficamos na rabeira do processo. Meu senso crítico começou a despertar ainda naquele ano, quando um professor de história tecia loas a ausência do racismo no Brasil. Não nos deu também nenhuma explicação sobre o assassinato de Martin Luther King. Execrava o gesto dos punhos cerrados de atletas negros norte-americanos nas Olimpíadas do México – dizia ser coisa dos malucos Panteras Negras. Diante da televisão, minha avó, que além de negra e analfabeta, rezava em latim, excomungava na língua dos orixás os escravocratas de todas as épocas. O genial A Odisséia no Espaço estava sendo escrito naquele momento e se transformaria num dos nossos filmes favoritos mais adiante. Os jornais caiam de pau no fim da Primavera de Praga, sufocada pelos tanques e coturnos soviéticos, mas pouco falavam de Edison Luis, estudante, assassinado pelos coturnos brasileiros no poder.

Nosso outono cinzento que começara no primeiro de abril de 1964, ainda se tornaria, com o ai-5 o longo e nebuloso inverno da ditadura brasileira. Eu e meus amigos mergulhamos no escuro dos cinemas da cidade, sentíamo-nos mais seguros ali, era para nós uma espécie de útero materno e a tela o nosso cordão umbilical com o mundo, tendo como nossos guardiões Bonnie and Clyde.

*José Antonio Pereira (Cataguases -MG)

A máquina parada*Zeca Junqueira

Os pingos doem nos nervos como lâminas de gelo:- chove escuro pesado triste no fim da tarde nocentro da cidade: - é por dentro que chove

chove sujo como baldes de água ruim jogada de qualquer jeito em cima doformigueiro humano: - vozes abafadas espasmos buzinas latas de gente encalhadas como estranhosnavios sem origem e sem destino na superfície negra alagada do asfalto.

Tudo estacado:

é como se uma gigantesca máquina invisívelhouvesse deixado de funcionar de repente sem ter sido programada para isso: - as engrenagens descobertas parando num estrondo, resfolegando, soltando fumaça, o motor rugindo abafado, silenciando-se, o Moloch imobilizado no aguaceiro no

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centro da cidade assustadoramente visívelparado perplexo afogado.

Chove como se o céu chorasse no centro da cidade. *Zeca Junqueira (Rio de Janeiro-RJ) jornalista, poeta e

autor da peça “O Rei Lagarto – Tributo a Jim Morrisson”Constelações

*Tânia DinizNoite –

a curvatura do dorso o singelo pescoço...

na placidez, o boi rumina rubis e baba, leitosos, quartzos róseos,

onde cintila aldebarã. De manhã _

presepeiro, pesado, ás vezes ligeiro, boi de canga, boi de farra,

bumbo meu boi.E touro bravo, de sangrenta arena,

me volto manso,sem qualquer pena.

No laço fácil do teu abraço, vaca leiteira, lambe-lambê-las,

rumino estrelas.*Tânia Diniz (Belo Horizonte MG)

escritora e editora do Mulheres Emergentes

Meu nome agora é Jaque

*Eltânia André

O meu nome é José, até pouco tempo atrás fui chamado também pelo apelido de Tizé, mas depois que me aposentei estão me nomeando Jaque. Cuidado com o pensamento maldoso! Não é Jaque de Jaqueline. Posso ter sido promovido, forçadamente, a Jaque, mas nunca virei à casaca. Não aceito afrontamento nem em pensamento. Entendeu?

Bom, sabe por que virei essa espécie para alguns? Pensam que a pessoa depois que aposenta só serve para obedecer. Eu tive essa certeza de uns tempos pra cá, ou seria melhor dizer, de umas décadas pra cá? Estou com quase 70 anos, mas desde que fiz cinqüenta, escuto portas se fechando. Fico furioso, mas é verdade! O espaço vai sendo invadido pelo preconceito. Envelheça um pouco e

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verá um muro enorme vindo em sua direção. Afunilamento de oportunidades! O mais triste é que a gente continua a querer... continua a desejar, a beleza que vemos nas coisas é a mesma de antes, a alma não tem limites. Sabe, é difícil aceitar o espelho... às vezes vejo um homem feio, neste instante tenho a sensação que estou o tempo todo me despedindo, principalmente de mim mesmo. A culpa é de quem? Não sei! Talvez minha.

Ah, vou te dizer uma coisa, detesto quando uma jovenzinha fala assim comigo: “lindinho”; “coitadinho”; “que gracinha”... fico arrasado com os “inhos”. Ridículo passar a ser tratado como uma criança. Eu sou igualzinho aquele cara da televisão tolerância zero. Você nem queira imaginar o que eu respondo nessa hora. Ainda bem que nos momentos íntimos a minha senhora me chama é de outros nomes que agora não posso dizer, mas adianto... são bons de ouvir.

Vamos mudar um pouco o rumo da prosa, sem muitos desvios? Chega de lero-lero! Desde pivete que eu estou de frente com o trabalho e o que recebo em troca? Umas migalhas

do governo e um título de Sr. Jaque de outro lado. Falando em Brasil... Oh, governozinho fracassado! Só tem ladrão e incompetente e desavisado.

Dá vontade até de falar palavrão... governo de araque. Eles prometem, prometem e prometem e cadê que cumpre. Quer um exemplo simples? As estradas... Deus me livre e guarde! Outro dia, quando estava indo para Pirapetinga – minha cidade de nascimento – me deu vontade de ligar pra casa dos safados e perguntar se eles não têm vergonha dos buracos. Aliás, buracos não, aquilo tudo pareciam panelas gigantes, não panelas não... arapucas do inferno. Pensando bem, quem voa como eles não está nem aí pra estradas mesmo não. Esse povo até finge que estuda no estrangeiro, fala bonito que só vendo, mas a mim não enganam. Na hora de votar eu não voto em safado e sem-vergonha. Confesso que é difícil de escolher, mas não perco meu voto. Este país está perdido! Só um milagre mesmo, não está adiantando a rezaria do povo. O que resolve mesmo é a cadeia! E como tem ido figurão pra atrás das grades. Ah, mas depois solta tudo! Aí eles candidatam de novo e o povo rezador esquece até da barriga roncando. Esse assunto me aborrece, melhor fingir de morto.

Como eu estava falando, depois que a gente aposenta vira uma espécie diferente, até o nome da gente muda. Eu percebi isso aos poucos. É que sou burro mesmo! Burro só não! Burro e agora velho! Sabe o que é, depois da aposentadoria as pessoas começaram a falar assim: “Já que você está aposentado, vai ali pagar uma conta pra mim. – Já que você está por aqui compra uns trecos para mim ali”. Até parafuso o “Jaque” foi comprar. É um tal de já que... Agora virei garoto de mandado. Eu nesta idade, na hora de aproveitar minha liberdade condicional, virei “Jaque”. Minhas sobrinhas agora só me chamam de Tio Jaque. Faz isto pra mim, conserta aquilo, me leva ali, vem aqui... e o bobão do Jaque vai pra lá e pra cá.

Puta que pariu, virar Jaque é uma merda!.

*Eltânia André (Cataguases – MG) autora do livro de contos “Meu nome agora é Jaque” - [email protected]

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Solidão metropolitana Relendo Miguel Torga

* José Antonio Pereira

Tanto faz. Não importa onde.Seja numa rua central de Sampa ou do Rioonde verde é apenas a cor de um delírio.Sou mais um corpo na correnteza humanacaminho como um primata sem florestasereto, mudo, em interiorana presençaperdido na ruidosa solidão da cidade

O concreto treme no vapor do verãoo céu através do véu cinza não é azulcorações desritmados batem na ansiedade da pressasomos movidos pela batuta do semáforoVidas fingidas a caminho de bancos repartições e a bolsaQuando o dia se apaga e a noite se acendebovinamente retornamos as nossas celas-quitinetes.

*José Antonio Pereira (Cataguases -MG)

Desterro

*Emanuel Medeiros Desterro cumpriu-me e cumpriu-se. O rio começava atrás de casa (como eu), e foi embora – afluentes.

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Vento sul, Campo do Manejo, Rita Maria, Rio da Avenida, Miramar, bala queimada, Catecipes, Praia do Muller, procissão do Senhor Morto, Cine Rox, gibis, Grupo Escolar Dias Velho, Chico Barriga D’Água, paixão camuflada pela menina da Rua de Cima – ela nunca soube.) Só enuncio: acumulo – sobrecarregado. O rio foi embora. Casa demolida, mãe na soleira da porta, pitanga no quintal, regata na Baía Sul, matracas, turíbulos, trapiche da Praia de Fora, gaita-de-boca, groselha, tainha frita, fogão de lenha, beliches, pé de amora. Perdeu-se o rio: não sei do seu delta. Perdi-me: tiro certeiro na gaivota. A rua pequena, era a maior do mundo – coração. Desterro inunda-me: outrora/agora.

*Emanuel Medeiros Vieira (Brasília DF)

Breve a Editora Cataletras estará lançando o livro A ilha do horizonte de Vanderlei Pequeno

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