Chronica Da Companhia de Jesu Do Estado Do Brasil II

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    C H R O R I C A

    D A C O M P A N H IA D E J E S

    DO

    E S TA D O D O B R A S IL

    VOLUME SEGUNDO

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    C H R O N I C ADA COMPANHIADEJESU

    DO

    E S TA D ODOB R A S I LE DO QUE OBRARAM SEUS FILHOS N'ESTA PARTE DO NOVO MUND

    EM QUE SE TRATA

    D A E N T R A D AD AC O M P A N H I AD EJ E S U N A S P A R T E S D O R RA SI L ,

    DOS FUNDAMENTOS QUE N'ELLAS LANARAME CONTINUARAM SEUS RELIGIOSOS, E ALGUMAS NOTICIAS ANTECEDENTES,

    CURIOSAS E NECESSRIAS DAS COUSAS D'AQUELLE ESTADO

    PELO PADItB

    SIMAOD EV A S C O N C E L L O S ,D A M E SM A C O M PA N H IA .

    TOMO PRIMEIRO (E NICO)

    SEGUNDA EDIO CORRECTA E AUGMENTADA

    VOLUME II

    fim casa do Editor A. J. Fernandes Lopes, rua urea,132 1 34.MDCCCLXY.

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    L I V R O T E R C E I R O

    DA

    C H R O N I C AD A C O M P A N H I A D E

    DO ESTADO DO BRAS*&m&-

    Contm a continuao da Historia desde o anno de1562at o de1 5 6 8 . A notarei misso do Padre Nobrega, e Joseph de nchieta,fim de assentar pazes s terras dos Tamoyos. A dotao do Colkda Bahia. A fundao da Casa dos Ilheos. O progresso, e fim dguerras do Bio de Janeiro, fundaod'aquella cidade, eCollegio d,etla-A visita que fez nesta Provnciao Padre Ignacio de Azevedo, atvol-tar por Procurador a Roma. Amorte d o Padre Diogo Laynes,segundoGeral da Companhia, a quemsuccedeo o Santo Padre Francisco deBorja: e a dos Padres Diogo Jacome, e Antnio Rodrigues.

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    6 LIVRO III DA CHRONICA DA COMPAN HIA DE JKSU

    1 Esto na mo do grande Pai dos cclleiros os tempos prsperos,

    das searas: e assi como acontece muitas vezes, que a annos frteisdem os estreis; assi lgniL|m na nossa serapsjoiritual da Bahia, dade dosannospassadl)l U d d l f l e i Jde 0 f I #illit;>menos copiosa.Foi acausa huma terrvel intemprie de ares, ou corrupo, quea modode pestecontaminou a mr parte da terra. Teve principio da banda da ilha parica, deu sobre a cidade, e d'ahi pela costa martima correndoao Norte,foi levando as aldeas de S. Paulo, S. Joo, S. Miguel, e outras muitpor aquella m rte ^fcivcule hastos^: Gem to,e Kpamfiale deixouviva

    a quarta p dfsnoiMorg l'elj>orMe OMiMneropassante detrinta milaMs, |sm C H t a f lia A A s am t e ft B ec tt ic flopor humaparte misermtrb, por outra pera^ar graas^c^Ceo^CTos^So estes porque parece esteve cubiando o fruto j assazoado dos dous annosdos,dg 4aBt^rfilma8rfeaWzidaa arafa Borjm ai |4^^ kiutismal; fquizap ro tv i | ^ | ^ ^ ; l l a ^J i | 4 q^^ - | r f s | a^ i ) ]^a l p | o fj ^ i| ^a |pod / s s| n | verter-se. Mas se faltou a oceasio de crescimento dos bautizados, npequeno o servio de Deos que estes servos seus obraro em acud

    que cahiro d o j f J H Ia i

    f l f lq i

    M l i l W r q

    lm o f o r 3

    d i t 0

    "sos nos princIplWwMPchrMlIladM"*TOM*ftmblftHios fins dAndavo volantes em varias estncias, onde volta dos j christostizaro in extremis muitos milharesde.adultos gentios, que provavelmentecorrerio perigo, se no fossem em mar to ditosa.

    2 Comeou a doena por graves dores do interior das entranhalhes fazia apodrecer os figi^s^ejsge^e -toSft^eio a dar em bexigpodres, e peonhentas, que lhes caho as carnes a pedaos cheasde bichosmal-cheirosos. No sabio os Padres a quem primeiro acudir; pormesmo tempo espiravo muitas em diversos lugares, e no era podeixar o que j tinha posse, por alud ir ao, que a no tinha. Aponte.Padre Gregoro Serro^ que assistia na aldea de Itparica, estanddando num d'estes a bem morrer, dizer-lhe hum moo", que havia huma ndia n'.aquella mesma hora no nieio do terreiro (cousa commtempo (Faquella doena, pelo' aperto"d dores que causava) e deiparto desamparado,e % se forage que a criana ficava f ponto de morrer;affligid-s' o zefso obreiro,'porque r'necessrio ir acudir qucllao por outra parte havia perigo de deixar esfoutra. No meio d"estas disse o ndio, que estava morrendo: No tomes *pena, Padre', aude

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    DO ESTADO DO BRASIL(NODE 1 63) 7

    alma, que eu esperarei-por ti. Foi' oiPadre, adhou diias crianas^ gmhuma j morta, outra a ponto de morrer: baatizou esta, ftll lla ao Ceo

    o Padre tornou ao^edoetrt$< qn aeftou1

    ainda vivo*-mas esperando porfttomitW floretie. D'este4xenip4o ^pod8tiii tnuiitQs do aperto dt'cbrfa*giokadoena.'iM''"',! ' lm*qni*.>t\> .n\u Uu;;'I3.Mfffeste anno chefcrio ide t optu jal mais qaatfb opewtos.-V) PQuiricio Caxa, e os Irmos Balthasar Alvares, Sebastio de Pina, eLuisCvlto Efete ultimo vinhaVJMH deneaii&lperfmentair os ares ido Brasil, en9d achridO< os as

    tee#30; oallvri^ '^ eiitregrio algdn a outros ndios seus contrripera ^ne1 os mtassemiseiooriieBsenl; e nSoiltvit arrependimento d'estepefecadosi 'EsteMtaidadb Ihd artfavessava a alma? e depois de meditar ainteiros sobre elte, sehtiaem seu coraSo notempp quetrattavacomDegrahdefttWpftlss^de ir metter-se entre aquiles fiarbanos; ou pera acapazes com ltos, on pera acajssr ontre elles-a 'vida. "

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    8 LIVROIII DACIIROMCADACOMPANHIADEJESV

    neravel Irmo Joseph de Aacbieta, bem conhecido, e respeitado j eat onre os ndios; grande lingoa brasilica. Chegaro os dous Mission

    aos primeiros lugares fronteiros dos Tamoyos, e daqui os levou em soa, c cm barca prpria Fraociaco Adorno, nobre genovez, homem ricterra, e grande amigo da Companhia; e tendo partido a 21 de AbrilaG3,chegaro ap lugares principaes das praias dos: Tamoyosa quatro deMaio do mesmo anuo.

    0 Este lugar fronteiro dos Tamoyos, como cousa to celebre, naqutempo por terra barbara, inimiga-, c tragadora da carne de christos, je por ter sida theatro das aces de dous vares to illuatros, que co

    grro aquelles montes, e aquellas praias com sua santidade; ho justocomo foi por elles assinalado, seja tambm por ns conhecido. Distalugar, por coinputa do mesmo Joseph, vinte e seis legoas de S. Viccorrendo ao Norte altura de vinte e trcs gros, e hum quarto. Tem principio vindo da villa, de S, Sebastio da ultima ponta da enseadachamo dos Maramomis, fronteira ilha dos Porcos, correndo ao Stroa enseadas seguintes, dos. Portos, de Uubatyba, e Larangeiras, attestar com o gro Cairuu, penedias disformes, espanto dos navegantpelo serto cerco horrvel do altas serranias, incultas, impenetrveis,ros em fim eternos da natureza, Este erao. sitio d'aquelles brbaros; d'aquisabia o mr terror dos Portugueses d'aquellas partes: e destas praiaspcdio numero, de canoas guerreiras formidvel: e do serto exrcitomorosos do frccheiros, que como feras rompio as mattas, e trepavoapene-dia pera acommetter, e no podio elles ser penetrados, nem acommet

    7 Estas praias me trazem memria as que l ingio os poetas dAehcronte: porque cm chegando noticia daquella gente barbara, tinha desembarcado em as suas gento estranha, armaro logo suasnoas a impedir-lhe o passo (qual outro Acheronte, e Cerbero;) chedo porm aquellas venoradas presenas de Nobrega, e Anchieta, j ccidos d'elles por fama de homens innocentes, amigos de Deos, e pandios: e muito mais ouvindo a eloqncia das saudaes de Joseph emprpria lingoa, ficaro satisfeitos, iro-se d'elles, e entraro na barcmedo algum: ouviro-nos, metero-nos cm porto seguro juntoahum ilheo,e despediro-se. Ao dia seguinte viero os Principaes de duas das apera trattar princpios das. pazes, e deixando no barco doze manceborefns, mandaro que partissem estes a S. Vicente, c elles, levaro terra os padres com mostras d devido respeito,

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    DO ESTADO DO BRASIL (AXNO DE 1 5 6 3 ) 9

    8 Foro hospedados na casa de hum velho por nome C aoqura, entreos Tamoyos Principal, e posto que geeo, de boa indolc, capaz, e pera

    com elles de grande authoridade. Antes de alguma outra cousa, armrioos Padres Igreja entre hum arvoredo, coberta de palmas, pobre, ms impa, e decente: aqui fizero aos nove de Maio o primeiro sacrifcio que viriaentre si aquella gente barbara, primeira aco de graas dos nossos pelasmercs at alli recebidas, e primeiro propkiatorio pelas que esperavo receber em misso tanto do servio de Deos. Com estes sacrifcios coatkmro todos o dias; e era grande o espanto, e reverencia d'aqueUa gente,que nunca vira cousa semelhante. Feita Igreja, em ver. de sino, a*vozes altas convocava santa doutrina, primeiro os meninos, e depois os grandes, que concorrio a bandos, huns novidade do acto, outros i noticiados filhos por curiosidade: porm logo passados breves dias, devras;|ior-que ficavo convencidos da eloqncia de Joseph, e suas palavras, que como setas penetrava os coraes, explicandodhes com frases, semelhanas,e metaphoras prprias de sua nao, de qu elles muito gosto, os myste-rios de nossa santa F; em frma, que refere o mesmo Joseph, que brevemente chegaro a ficar instrudos, e podero ser bautizados, se estiveroem parte segura; e que fazia nelles grande impreso o rigor dos cas*-tigos eternos, com que havio de ser punidos os que comio carne humana, e commetio semelhantes delidos: pasmavo e prometo emendar-se.A mesma doutrina annunciro nas aldeas cireunvizinhas, muitas, e numerosas,e mostravo aflbio aos Padres, tendo-os em conta de homens quetratto com Dos, superiores a todos seus Pays, quetem em conta de pro-phetas.

    9 J chegavao a descobrir-lhes todas juas traas de guerra; e ai quetinho preparado pera de novo acorameter aos Portugueses: por mar erioas canoas duzentas, por terra ero todos os arcos que habitavo as ribeiras do rio Parahiba, com pacto feito, que dessem todos juntos sem cessarat acabar com a Capitania, e senhorearem a terra. Ento dero por maisbem empregados os trabalhos e perigos de sua misso, quando vistadestes aprestos consideravo os dos nossos to diminudos em foras.

    10 Estando as cousas iTestes termos to bem assombrados, foi correndo a costa a fama, sempre acrescentada, de como os Padres ero chegados paragem chamada por sua lingoagem Iperoyg, c o a que vinho: e a

    esta voz todos os que habitavo nas partes do Rio de Janeiro, interessadosna mesma guerra, se alteraro, tomando mal o tratto das pazes; Partiro

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    1 0 LIVRO III DA CIIRO.MCA DA COMPA NHIA DE JESU

    sem demora de diversas partes em suas canoas os mais zelozos; dnados a matar os Padres, e conv-sua morte estorvar os concertos. entre todos primdiro com dez canoas a ponto* de guerra esqupadgrande Principal chamario-Aiirroir, amigo dos Francesae sogro de humd'elley;inimlcisRiiiO'doSifortugil!seB, porque fona'assalnado deildo rn hunin barca oom -hfama forropea nasps,;iddnde fugiraa nado;lembrado sempre da injofia,i e tde-natureza to cruel, ^ue por'hum ecoirmteteo ontatielle huma de vinte mulheres que tinha, a mandovita-pelo veptre at morrer.Este*pois ohegadto aldee ondresidoosPadres, (ratou* de noite convosseu, queisem dvida os matassem n

    ofcasio que-^adessem^ e^apoz isso lanassem mtoJdo barco, e dtugueses qutJiiUi os *rohxiIbi' -"'> > .-.*>-* ,41 Feit esto* oonselllo secreto, ao flia seguinte desejaadaos anc

    terra tratar;das pazes, quterolse faahasse pitesftte este Principal canoas, por- ser efitre ellesde.grande-' authoridade: sendo avisadoJnhtapporm com grande multido' de armados, mostrando bem s5 sacrHega. Fatoreeia mais a oceasiorde sua maldade* que notempo-se ach-avavanseiite a madr parte dos pous d aquellas*alde

    a seus- avores. Tudo presentirto os dou6 servos de Deos; porm rao estava fot-te^o^ejogodepadecera mos dos M causa to justa.Chegndosaosvotosdaspazes,o d'este Principalfoi dirigido a seu intento; e aprimeira condio que propor com'grande arrogncia foi, que lhe de entrefpw* primeiro ^tres-Principaes dos tlndros- de S. Vicente, qunfofio apartado dos sews, dando-lhe guerra em favor dos christos, matar, e comer. A esta proposta to iniqua respondero os Padregrande qutetad, e modstia, d.ando razo da impossibilidade: porque poetisa-, ero j da igreja de Deos, e amigos dos Portugueses; assi, no era possive ntregar-Mi^os, porque irio contra a lei de palavra dada: que entre ohristos a primeira cousa que andava aolhos, era a guarda da f,e* lealdade a quem a prometio, e que tendopromettido qqelles Principaes, como querio elles que a quebrasstes daqui era bem que tomassem exemplo pera folgar de ter por osque assi semosfcrfio constantes na palavra dada; e o contrario devtranhar, collegindo* que quando com aquelles se quebrava a fi, tamquebraria com elles: que por Outras vias poderio mostrar os-Portseram amigos seus, mas que no convinha por esta.

    42 Dissero os Padres, c movero com suas razes os circuns

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    DO ESTADODOBRASIL (ANNODE I G 3 ) 1 1

    porm o peito d'este brbaro ficou to duro; como de primeiro, e conccom mais soberba, e arrogania com estas palavras, em seu estyfo:

    que Vs outros sois escos de meus contrrios, que tm morto, e comos meus, eno os'quereis entregar, no tenhamos pazes.* E virou-se detettnnte a outra 'parte,'estfWdo os que o seguio armados, com o n'elle, esperando o ntftrimo acdnb'

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    1 2 LIVRO III DA CURO NIC A DA COMPA NHIA DE JESU

    (dizia elle) he velho, e nem por isso me ha de matar. Tudo isto tinhasado entre elles. Vendo pois os servos de Deos a canoa, sabendo muiquo mal tomada fora sua vinda de todos os do Rio de Janeiro, e qunho conspirado em sua morte, suspeitaro logo o que era, e comearetirar-se ao povoado da aldea, distante como quinhentos passos (podar occasio elles mesmos a seu mo intento, achando-os alli fora dvoado) seno que como era velho, c fraco o Padre Nobrega, vista dtos remeiros hia mui devagar; e o ma)s foi, que havendo de passar ribeiro ao fim da praia, cuja agoa dava pela cintura, fez meno de qtirar as botas, que por respeito de doena trazia; mas como havia de

    tar tempo, e a canoa vinha voando, a grande caridade do companhetomou s costas, e como estas ero fracas por quebradas, quiz pareceo Ceosahir alli com huma representao graciosa; porque a poucos passos angemendo com a carga, deu por fim com o pobre velho na agoa. Que f vista do aperto da morte? Tomaro por conselho, esconder-se entre voredo, e descalando aqui as botas, e despindo a mais roupa molhpor de grande peso. ficou somente com o interior, que no escusavaa modstia, e descalo. Tomou Joseph o fato molhado s costas, e tornar

    intentar o caminho: porm era esta ladeira ngreme, no podia Nobregbil-a, e j hio ouvindo-se as vozes, e bater dos remos dos que chegafoi fora tornar a esconder-se no matto, e pr-se em orao, tratandmais das almas, que das vidas. Eis que no meio desta afflico sueoutra; porque sentiro que entrava no matto huma pessoa que vinha elles: porm foi ajudada do Ceo; porque chegando mais ao perto, achser hum ndio que descera da aldea, e a caso entrara. Este os ajudolevar quasi s costas, e os pz em salvo dentro da casa do Principal dobu, pouco antes que os da canoa chegassem.

    14 Porm no se acabou a comedia; porque estava ausente da casenhor delia, em quem confiavo os nossos, e vinho chegando os corios. Pois que remdio? O Ceo parece que andava de propsito compscenas, pera sahir depois com hum fim alegre: porque entrando o seda canoa acompanhado de muitos seus em casa do pai, achando-o ause aos religiosos postos de joelhos, encommendando-se a Deos,e rezando asvesporas do Santo Sacramento (porque era o dia seguinte do CorpoDeos) esperando por seu ultimo trago: no tempo que chegou a sua sena aquelle animo damnado, concebeo tal terror, e respeito, que licorado, Converteo a fria cm pratica; e ouvindo as palavras, especialm

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    DO ESTADO DO BRASIL (ANNO DE 1 5 6 3 ) 1 3

    de Joseph, eloqente em sua lingoa1, acabou de mudar-se, confessoudeplano o intento com que partira, e com que entrara rfaquella casa; mas em vendo suas presenas, e ouvindo suas palavras; ficava trocado, e persuadido que pessoas taes no vem com treio, ou engano.

    l> Veio de fora o velho Pindobu, senhor da casa, e sabendo do cesso do filho, mostrou rosto alegre, significando que sentiria muito secedera algum mal aos Padres. Era ndio de boa capacidade, e chamanfilho parte, lhe fez huma pratica sobre a gravidade de costumes queem seus hspedes: gbou-lhe sua aprazvel presena, sua grande constde animo, desprezador de todos os trabalhos, e como entre tantos quecuraro offendel-s nunca descomposero sua serenidade; e concordoutudo com o conceito que formarao filho. Huma cousa sobre todasasoutrastinha admirado esta gente, e era esta a grande continncia que guardaporque tendo4hc offerecido os Principaes d'aquellas aldeas liberalmenlhas,e irms (costume commum entre elles, com a mesma chaneza, ecilidade, que se brindaro huma uya, ou copo de vinho) vio que spre os Padres as regeitro. D'isto pasmvo; e chegaroa perguntar-lhes,

    como era possvel aborrecerem o que todos os outros homens apetellespondco-lhes a isto o Padre Nobrega tirando da algibeira humas dplinas, mostrando-lhas, e dizendo, que magoando com aquellas seu casseguravo a continncia, e s defendio de mpetos lascivos, e movitos desordenados da carne. Aqui ficaro elles mais atnitos de cousanova. Tinho aos Padres por amigos de Deos; e entre todos Pindobucessava de praticar aos seus, que ero homens que fallav com Deosquaes elle descobria seus secretos: e aos do Rio de Janeiro dizia, que

    sem que se algum ggVavo lhes fazio, hvio de fazer vir doCeomortandade de'pestes contra elles. Punha-Sies exemplo: Se ns Outros temodo de nossos Pays (so seus feiticeiros) e no ousamos offendl-os: qmais o devemos ter d'estes Abars (assi chamo aos Padres) que sodadeiros Pays, fallo com Deos, e nos lanaro (se quizerem) cmarsangue, e febres malignas, com que todos morramos? Com ests prticPindobu, ningum se atrevia a tratar malosPadres, e tratava-os elle como filhos, e lhes pedia o encommendassm a seu Deos: quenotemessem;que elle, e os seus seporio em terreiro por elles. Consultava-os tododias,ouvindo com grande atteno especialmente os mysterios da creado mundo, e encarnaro do Filho de Deos: e sendo combatido por v

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    l i LIVRO III DA CH ROMCA DA COMPANHIA DE JES

    vezes dos que cada dia vjnho dp Rio, que matassem os Padres,, seos defendeo abominando a tal resoluo. Achava:se sempre presente. missa,e pasmava de ver aquellas sagradas ceremonias; e foi de maneira seuveitamento, que por prmio do Ceo fo^este venturoso Indip Pipdqdepois de perfeito cathecumeno dos Padres, hum grande chmsto,/nentre muitos; e como tal obrouat.o fim da vida. l i

    16 Chegava-se o,tempo de concluir o assento das pazes; entrarotra vez em conselho, presentes os Padres. Aqui desabafaro ento ados ancios, queixando-se de antiguas magoas, pizip, que. os-Portugforo os primeiros que quebraro as pazes firnadas de huma e ou^rate , lhes fizero guerra, e os cattivro, e trataro como bps-tas de caVs outros (dizio elles) quando ns comemosa guerra coptf a Temjrains^gentedo grandeGato,confiados na multido dearcos de nossosinimigos,osaju-dastes, pelejando com elles contrans;mas Deos nos ajudou, epodem ps maiscporm agora... E aqui callro. SabiamuibemoPadreNobrega,,queque dizio era verdade: e parecendo7lhe fazia melhor negocio em concedercom elles, dissq-lhes assi: Eu, porque sei que Deos es,t iradfl>iOQnmeus, me offereci a vir tratar pazes com vs outros, peracom isso.o aman-sar: porm agora pon. sua parte no se ho de quebrarestas:pazes; quppor isso trago eu c a minha cabea, e a de meu companhftifo sem malgum, porque trato verdade. Mas tanabem vos afirmo, d'aqui, que soutros as quebrais,,entendei que a ira de Deos sejia de virar contrae haveis de ser destrudos. Este dito de Nobrega, afrma o Padre Jqueno foi somente ameaa, mas prophecia,, que depoisse viocumprida ris-,ca; porque todos os que quebraro estas pazes, experimentaro os a

    ados castigos. Por prophecia a ti vero os mesmos ndio,e.^omo tala. foro publicando pelas aldeas, e com ella metio medo aos-que tinhosamento contra o que alli assentaro; no que sempre se aphro cotes os moradores do Iperuy, epelo contrario fraqueMo.QS do Juo4evJaneiro ,e Cabo Frio. ,, .

    17 Havia dous mezes que residioos,padres entd'eosIndJoi,,enQ,&eacabaro de coneluir as pazes, porque dependio ainda de algumas ciitancias;pera que estas tivessem ejeito, pareeeo ser mui necessriaa presen

    a dos Padres em S. Vicente, e assi lho.significavo os do governo d'aviila; porm os brbaros, que ainda de todo se no davo por segurosionfiario sem duvida, se antes da ultima averiguao se lhe fossem odos das pazes.Peloque,feita n'esta difficuldade orao, resolveo o Padre Jo

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    DO ESTADO DQ BRASU> (ANNO DE1 )63). ,-?| i 15

    seph comsigo, que seria servio de I)eps par.ir,a.coutenda,,e|op)teu;ia liu.

    ma e.outra parte, hindop.padre-Nobrega, e .ficando elle; o assi 11 intimou.Sentia Nobrega haver de partirse sem ujraiiieffeito, e mnjtq m a ^ d ^ no companheiro s entre (brbaros: veodp QOjotudo AJUgokjo qug omeJosep tomara, e tinida por de Deos, q anpcflssidade fluente,de sua ida pebem das pazes, e que icavo assi contentes, os ndios, cujodes-goate serioc-casio de muito damao n'esla matria, rgsqlvQqpartir-sQ. ..u,,.^H.UW,

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    DO ESTADODOBRASIL ( . N . N ODE* 1563 ) 17

    era tal o efeito de sua proteco, que no chegou a elle o mnimo canem ainda fumo d'aquelle fogo infernal.

    22 Aqui fez promessa Senhora de compor a sua vida em verso. Mcomo cantaria versos de Sio em terra alheia, onde nem tinha livros, papel, nem tinta, nem penna? A tudo deo traas o amor da Senhora.ha-se praia do mar, e alli junto ao brando murmurar das agoas, pseando com os olhos no Ceo compunha os versos, e logo virando-os pfazia d'ella branco papel em que os escrevia, pera melhor meel-os namria. Oh que sentimentos! oh que consideraes, e que conceitos aquziaI Deo principio obra por sua purssima Conceio, foi seguindo toos passos de sua vida, chegou a sua felicssima Assumpo, e subio ella ao alto thrqno da sua gloria: no ficou passo da sagrada Escrprophecia, ou ditto celebre de Santo, que no enxerisse em seus eatFoi depoimento commum dos ndios, que viro por vezes n?esta praia huma avezinha graciosamente pintada, que com brando vo andava' comzendo festa, em quanto Joseph hia compondo, e escrevendo, e lhe sabrincando, ora nos hombros, ora nas mos, ora na cabaa: ou pera mtrar a Joseph o. cuidado queo Ceotinha d elle,oupera mostraraosndioso com que havio de respeital-o. Isto que os ndios'affirmrd,1 depoz tambm que vira hum homem Portuguez, que aquellas praias;chegar. E noser esta a vez derradeira, que vejamos em Joph semelhantes favo

    23 O que eu tenho pera mim sobre aquella avezinha, he, que deella a trazer-lhe o despacho tio que pretendia da Virgem, em galardseu trabalho, e amor; e era o dom da confirmao da pureza; por qucantou assi o mesmo Joseph em seus versos, dizendo, que ella o guarpuro, e limpo de todo o pensamento lascivo. E assi o disse depoisdemuitos annos a hum Padre amigo, queixando-se-lhe este de pensamentos

    portunos, e tentaes de sensualidade: aconselhou-lhe, que no pedisDeos lh'as tirasse, mas que lhe desse vencimento ifellas; e acrescenPorque eu sei outro (he certo que fallava de si) que o pedio d'esta neira, e foi ouvido; porque combatido largo tempo'de semelhantes tentaes, favorecido de Deos, e sua Mi santssima, no s no cahio, mrecebeo promessa segura de no cahir jamais. Fez o amigo o que Jolhe aconselhara, e dentro de trs dias o assegurou, que d'alli em dicessaria aquella importuna batalha de suas tentaes": e experiment

    assi.24 No foi este somente o prmio de seu doce cantar; teve tambVOL.u 2

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    1 8 LIVRO III DA CH RONICA DA COMPA NHIA DE JESU

    revelao da Virgem, que passaria grandes assombros, e espantos date entre aquelles brbaros: porm que Do o matario; porque quer

    acabasse, e aperfeioasse sua Vida. Assi o disse o mesmo Joseph poprpria boca; porque tardando a resposta da paz dos de S. Vicente, dados os brbaros, feitos feras cruis, dizendo-lhe humdia:Joseph appa-relha-te, e farta-te de ver o Sol; porque tal dia temos assignado pezer banquete de ti, se at ento no vier reposta dos teus. Responlhes Joseph com o sorriso na boca: Eu sei mui bem que me no hde matar. E perguntado depois porque fallava com tanta confiana, claramente, que pela palavra que a Virgem lhe dera, que no conse

    que algum o matasse antes de acabar sua Vida.23 Parece que hia igualmente poetisando, e prophetizando este sde Deos; porque por este mesmo tempo, em quanto as pazes se acabde averiguar, enfadados de esperar alguns Tamoyos, ou levados de sutural inconstncia, no obstante as tregoas, dero assalto em certa pde S. Vicente, e trouxero a Iperoyg alguns* Portugueses cattivos. TJoseph sobre seu resgate ; o como o preo concertado tardasse maique assentaro, resolvero os brbaros fazer pasto dos Portugueses: rendo executal-o chegou Joseph, e com espirito do Ceo lhes promassi: O dia que vem, quando o Sol chegar atai lugar (mostrando-lh'oo dedo) ho de vir sem duvida alguma os que trazem o prqpo do ress at ento peo que espereis. E disse-lhes os nomes dos homens qtrazio, o numero, e qualidade das peas depanno,e ferramenta (que esteheo dinheiro dos ndios) e conclua, que empenhava sua cabea, e se vique no era verdade, Ufa quebrassem. Satisfeitos os brbaros com perana de to boas peas, dando inteiro credito a Joseph, que tinhoPayguadotfGhristos, desistiro, e viro com seus olhoso effeito, assi comoJosepho pintara: tomaro seu resgate, e entregaro livres os cattivos. Dta to singular prophecia faz menoo Padre Estevo Paternina na Vida quetraduzio de latim em castelhanodoVeneravel Padre Joseph, liv. 2, cap. 5.

    26 Chegaraa esta terra barbara humAyresFernandes, amigo de Joseph,com certa occasio; trattavoos ndios emsegredo de cattival-o, e fazer d'ellehum banquete: foi avisado o pobre homem, e desejava acolher-se d'aqIa praia avara: no tinha porm embarcao: assaz affligido deo contirmo Joseph de seu grande perigo: respondeo-lhe elle: No tendes

    temer, amigo, por que em tal parteda praia haveis de achar amanh hembarcao, em que vos salvareis. Disse, e succedeo assi. Estas s

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    20 L I V R OI I ID A C H R O N I C A D A C O M PA N H IA D E J E S

    29 Aos seis de Julho chegaro as canoas que tinho ido a S. Vcom o Padre Nobrega; e com a vinda d'estas intentou o inimigo, pdiscrdias, armar hum enredo terrvel. Chegaro dizendo que vinhgindo porque lhes dissera hum escravo, que os Portugueses os qmatar; e que com effeito hum Domingos de Braga matara hum ndcompanhia de Aimbir (aquelle Principal, que tinha ido sobre a prda primeira'junta) e fizera que hum seu irmo lhe quebrasse a caCom estas mentiras ficaro triumphantes todos os moradores do Rio,nho vindo com m inteno contra Joseph; e dando-lhe credito, se levlogo,e na seguinte madrugada fugiro, pretendendo levar comsigo seph, e certa gente que tinha vindo de S. Vicente. Porm Pindobuoutros Principaes de Iperoyg, os defendero, reprehendendo aquelmaneira, que hum d'elles corrido cahio na conta de feito to feio poto de hum s escravo, e se ficou dizendo quo queria antes morrer cPortugueses. Seguiro os outros seu caminho; e hum por nome Cao mais poderoso entre todos, teve ao menos poder pera entrar de gem na casa de Joseph, e assombral-o,- dizendo-lhe a modo de am

    Ex-aqui que imos fugindo, porque os teus nos querio matar: a istmandastes a S. Vicente, pera que nos consumissem a todos? Mas dissee foi-se. Ficou Joseph turbado com taes novas, porm logo soube damento d'ellas.

    30 Ainda bem estes no tinho ido, quando chegaro outras denoas do Rio, cuja gente logo veio buscar a Joseph com grandes estroe carrancas: mas chegando a sua presena, nenhum se atreveo a lana mo. Fizero comtudoo pera que s tinho licena do Ceo, e da Virgem

    e por cinco dias contnuos o assombraro, e roubaro a pobreza qnha, intentando leval-o a suas terras, ou ao menos hum Portuguezalli estava sua sombra, chamado Antnio Dias, que tinha ido a resua mulher, e filhos cattivos em as guerras passadas. Resistiro porda aldea valerosamente; at que o Principal Pindobu (que s popeito de segurar as pazes, e serem elles hospedes, tivera pacincia)dado j, se foi a elles com a espada de po na mo, a vozes altas diassi: No querem estes vagabundos seno quebrar cabeas de bcos? pois eu o no hei de consentir, que tenho empenhado minha pae hei de fazer pazes com elles: e saibo que este Pay que aqui teno grande Pay dos Christos, conselheiro de Deos; e se algum o offha de ver a morte sobre si, e os seus: e saibo tambm que aquelle

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    tuguez Antnio Dias faz as casas dos Padres, e do Deos dos Christoto dizia porque era pedreiro) e se algum lhe empecer, que ha Deotornar-se contra elle, como se offendera aos Padres. Isto dizia combraveza, bater de p, e palmas (sinal de desafio) que acudiro os seumados, e houvero de vir s frechadas: porm os contrrios callrgrande fidelidade d'este Principal, mostrava bem o que depois havivir a sr. D'aqui foi ter com o irmo, e lhe disse: Filho Joseph, nnhas medo; porque bem vs o como eu torno por ti: por isso falia bm com Deos, que me d larga vida (no sabia ainda ento mais p

    no hajas medo que te deixe matar, ainda que os teus matem os meuS. Vicente; porque sei que tratas verdade. Ser porm mal, se as cque por aqui se dizem forem assi. Agradeceo-lhe Josepho officio de pai,prometeo-lhe sua intercesso diante de Deos; e com animo assocegadassegurou, que cedo havia de ver que era falso tudo o que se dizia.

    31 No tardou Deos em acudir pelos seus; porque quando mais evo embravecidos aquelles brbaros, chegou praia o prprio ndicompanhia de Aimbir, de quem dizio que fora morto por Domingo

    Braga, e declarou o fundamento do enredo todo: e foi, que este ndiohum medo mal fundado que teve,semeteo pelos mattos, ea cabo de hummez que por elles andou, chegava ento vivo, e so, como todos o mostrando ser mentira tudo o que se dissera. E aps este viero logoparecendo outros ndios, dos quaes se tinho semelhantes desconfiae contaro estes, como o padre Nobrega os levara a Itanha, e fizerzes entre elles e aquelles moradores, abraando-se de parte a partigreja pera mais segurana: e depois os ajuntra em Piratininga, e fo mesmo: e logo assentaro as mesmas pazes com osdo rio Parahiba, e osTupis discpulos dos Padres, de Piratininga, e Mayranhaya, tambmIgreja; e conversavo, e tratavo huns com os outros como amigos mos. Aqui acabaro de ficar envergonhados os que to facilmente cvencido o inimigo, que os perturbara; e todos se mostraro satisfeitopazes, e Joseph livre de seus assombros e tido cada vez em mr conPay gua dos Christos.

    32 Dada por boa a confirmao das pazes, fez o Irmo Joseph cmuas e particulares demonstraes- de aces de graas a Deos nossnhor, que por espao de cinco mezes de seu desterro tirara o fim dedo de tantos. Sendo tempo de despedir-se, segundo a ordem que tinhPadre Nobrega, achava ainda diflculdades; porquea affeio que lhe tinho

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    e elle tinha aquelles brbaros, fazia presa na vontade. Elles chorava falta de Joseph seu amigo, o Pay maior, que adivinhava seus successturos, que lhes ensinava a boa doutrina, que os curava, sangrava, solava era suas doenas: e Joseph chorava mais sentidamente, vertantas almas desamparadas.do remdio de sua salvao, to dceis,trudas j i ; e o que mais he, to desejosas do sagrado bautismo. Colhe este sentimento a alma; e era to forosa n'elle a causa de pacomo a de ficar-se. Considerava tambm por outra via aquelle lugafora pera elle outro como desterro de Patmos pera o mimoso Joo

    gelista; porque alli gozara entre o rigor do desterro, e assombros dte , to mimosas illustraes, e favores de Deos, e de sua Mj santsque podia chamar-lhe com razo lugar de suas consolaes, f udo ista,dizer humas suas palavras, que deixou escrittas sobre este desterras seguintes, fallando na terceira pessoa. Assi esteve o Irmo (aJoseph) at meado Setembro entre os Tamoyos, entregue providenvina, e muito consolado, passando muitos tragos da morte, que caos que vinho do Rio, e outros combates espirituaes, de que nosso

    o livrou, etc.33 Houve por fim de partir-se este provado Abraho do lugar Caldeorum; este Moyss mimoso do cattiveiro do Egypto;e* o perseguidoJosephdeseu desterro, aos I 4 de Setembro de 1563 em huma pobre cancasca de hum madeiro, barca fraca pera to fortes mares: porm Jtomara bons pilotos, a Christo, e a Virgem Senhora nossa, mi suprimeiro lugar. Alm d'estes levavo sua conta Cunhambba, grandgo seu, o que trouxera de S. Vicente as ultimas novas das pazes. Ase entregou Joseph como a Superior na viagem, por elle se deixvernar nos perigos grandes que teve. Ainda aqui no cesso embusbre as pazes: chegando a descansar ilha dos Porcos, acharo allicanoa de ndios do Rio (causa de todas as contendas:) estes pretentornar arruinar contra Joseph o corao de Cunhambba. Tu dond(lhe dizem) Sabe que ns outros vimos fugindo, por que os moradoPiratininga quebraro as pazes, mataro a hum nosso, e os Portuviero aps ns at a Britioga, e pretendre matar-nos s arcabuzBastantes causas ero estas pera mudar qualquer corao, quanto de ndios: porm Cunhambba respondeo-lhes assi: Ide embora, bm sei que os christos so bons, e tr.ato verdade: se isso foi asoutros lhe darieis a causa. E deoao remo coma mesma firmeza que dantes.

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    34 Passada esta, entra outra tormenta, conjurada parecepelomesmo inferno, por ver se poderia acabarno mar,o que no poder na terra: bramao vento, descompe-se o mar, e as -ondas aouto a barca, e remechego a ponto de perder-se. Que faria huma barquinha, casca de humvore, ainda no bem seca? Comea a gemer com o peso, a alagar-sea agoa, dando-se por perdidos os ndios: porm no Joseph, que tinhculo da Virgem Mai sua, que no havia de morrer antes de perfeioaVida. Animava os ndios que tivessem confiana emDeos,lanassem foraaagoa, no desamparassem o remo, porque sem duvida havio de

    salvamento. Tudo viro os ndios (no sem admirao da confiana dseph:) applacou a tormenta, chegaro ao porto, saltaro em terra, e recebidos com applausos aos 21 de Setembro: foi levado Joseph comtriumpho por homem do Ceo, vencedor de tantas difficuldades, que aara victorias. Aqui se informou Cunhambba, e achou ser embuste o qusero os da canoa do Rio de Janeiro, e ficou mais firme na verdade dodres.

    35 Restituido Joseph a sua casa, e a seus amados Irmos, recread

    agasalhado nos prprios coraes, especialmentedoPadre Nobrega, o superior, e companheiro de seus trabalhos, que no se fartava de abraaldar-lhe os parabns da chegada, e do successo de seu desterro: o prro tempo que teve acabou de dar cumprimento palavra que dera VirgemSenhora nossa, patrona sua, de perfeioar sua Vida. Comeoua desenrolard'aquelle thesouro felicissimo de sua memria por ordem de livros, cancaptulos, toda aquella comprida serie, no menos que de quatro mil cesetenta e dous versos, que fazem dous mil 8 oitenta e seis dsticos: proso parto de memorial Acabado de limar, e escrever o poema, offereceVirgem sua Mi, com a dedicatria seguinte:

    En tibiquce vovi, Mater sanctissima, quondamCarmina, cmscevocingerer hoste latus.Dum mea Tamuias prcesentia mitigai hostes,Tracto que tranquillum pacis inermis opus:H ic tua materno me gralia fouil amore,

    Te corpus tutum, mcnsqae regente fuit,Scepius optavi, Domino inspirante, dolores,

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    Daraque cumscevofunere vinda pati.At sunt passa tamen meritam mea vota repulsam,Sclicet H eroas gloria tanta decet.

    36 Por esta dedicatria poder ver o que entender da matria, digno de comparar-se nosso poetacomqualquer dos melhores da antigidadeO sentido da dedicatria he este. Eis aqui, Mi Santssima, os versofereci a vossos louvores, quando me vi cercado de inimigos feros, esocegava com minha presena os Tamoyos, e desarmado tratava de ptre armados brbaros. Aqui:teve vossa benevolncia com amor de mi cuiddo de mim, em sombra de vosso amparo vivi seguro no corpo, e almvezes desejei, com divinas inspiraes, padecer dores, prises, e morm no foro admitudos meus desejos, porque a gloria to sublimes os gandes Heras. Pela facilidade, doura, e devao cordial d'ecatria se poder julgar o espirito de todos os mais versos: os quaesderei deixar de tresladar n'este volume sem offensa de to grande ade to pia obra; e ainda do gosto dos que bem sabem de poesia.

    como no podem -verter-se tantos versos em portuguez, pera os qentendem latim; conteotem-se estes com aquelle breve exemplo datria: e,os latinos acharo por extenso todo o poema fielmente esccabo d'este tomo-, onde podero vel-o: porque assi nem perdem sabem este thesouro, nem fico os que no sabem atalhados com eproveitoy no meio: da lio. E acabo-se aqui os refns de Joseph.

    37 No Espirito santo trabalhavo os Padres em aquietar as disprejudiciaes entre Portugueses, e ndios, e especialmente em redus al-

    deas os que d'ellas tinho fugido com pretexto de aggravos; e j co divino favor se hio amansando aquelles coraes magoados: muitoscom boas razes, e muitos com ameaas dos castigos e penas da oda; e tornavo assentar suas alcleas com grande servio de Deos, ecommum; porque alm do que importava a suas almas, fazio estecom os nossos, e ero ajuda de nossa defenso, e temor dos que acavo inimigos. Entre estes se acabaro de recolher os que andavlhados da gente do grande Gato: e por meio de todos os reduzidoperava na Capitania grande melhoria de paz. N'estes sertes ero os trabalhos dos nossos, quando andavo, a modo de pastores, cormattas em busca de ovelhas fugidas; porque no s tinho contra sistncia dos mesmos que buscavo, mas tambm os perigos d'aq

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    quem fugio, por estarem em armas; e era fora que quando os encvo,os tratassem, ao menos com disfavores, com assombros,e terrores damorte. Vio-se-aqui huma proteco especial doCeo;porque encontrando-semuitas vezes por essas mattas os Padres com estes inimigos, e anassanhadas como feras; nunca ousaro, no s matal-os, mas nem apr mos n'elles, pelo respeito grande que lhes tinho, de homens qulavo com Deos, e fazio vida inculpavel; antes dizio, que a ninguderio seus arcos, seno a elles: e davo j esperanas d'isso; porgagora fico em sua pertincia, e com elles ainda alguns dos fugidopertencio s aldeas, a que no foi possvel chegar.38 Cousa commum he andarem os males acompanhados, e quea humapeste se siga logo peste. Experimentaro este teor da natureza (bemcusta) os moradores da Bahia: o anno passado de 1563 passou gemtoda esta Capitania com huma quasi peste, ou corrupo pestilente, rou a vida a.trs partes dos ndios (estrago miservel!) Entra o an1564, e vemos que entra com elle huma terrvel fome, com nova mdade, e no pequena angustia dos Padres que das aldeas tinho cu

    Foi a causa da fome a mesma que a da doena, a intemprie do ar, cada primeiros aos corpos, agora aos frutos: era lastima grande; pnascendo estes formosos, alegrando a vista, e incitando a esperanario no melhor mal logrados; murchando primeiro vencidos da injurtempos, at cahir em terra, seguindo os passos de homens apestadoem grande quantidade os que acabavo cada dia por essas aldeas ad'esta fome tyranna: e era necessrio aos Padres trocar o gnero delho; e o que dantes applicavo converso das almas, applical-o agremdio dos corpos: buscavo-lhes o sustento da vida; porm o mapodio ajuntar, vinha ser nada entre tantos. Curavo-nos, animavpreparavo-nos, sacramentavo-nos, sepultavo-nos; e n'estas obras aem perenne lida, correndo as aldeas adjutores volantes, porque os retes no bastavo.

    39 N'esta fome to deshumana, no acabavo os males comosque mor-rio:porque os vivos das aldeas vizinhas cidade, levados do apertogavo a vender-se a si mesmos por cousas de comer. Houve tal quegou a sua liberdade por huma s cuia de farinha pera livrar a vida;se alugavo pera servir toda a vida ou parte d'ella: outros vendioaos prprios filhos que geraro; outros aos que no geraro, fingindo os studo isto persuade a dura fome, e necessidade (que por isso lhe cha

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    poeta,Mal suada fames, et turpisegestas.) E o que he mais, que sem entrevir contrato algum, com ttulos somente suppostos, ero muitos senreados dos Portugueses, ficando destrudas aldeas num erosas; que comres de tantos annos tinho recolhido os Padres, e reduzido ao grmioigreja das mattas bravas de sua gentilidade. Trs aldeas das mais #emoe das mais populosas, a de Nossa Senhora da Assumpo de Tappitana de S. Miguel de Taprago, e a de Santa Cruz de Jagoaripe, pera ose havia mudado a de Itaparica por causa da fome, e por lhe meteremcabea seus feiticeiros, que procedia esta em castigo de se haverem sutado a Christos, foro desamparadas, espalhando-se os moradores d'epor suas antiguas mattas buscando comedia.

    40 Todos estes desarranjos notveis cortavo o corao aos Padres,pecialmente ao Padre Gram, vendo se hio malogrando frutos to. crdos,no mesmo tempo, em que houvero de madurar; deixando frustraos suores de tantos e to incansveis trabalhadores, que com tanto acto cavaro, plantaro, e podaro. No perdero comtudo as esperanaobreiros do Senhor: torno a penetrar as mattas, vo-se em buscadosquefugio, e depois de feitos largo tempo habitadores das brenhas, convero,seus feiticeiros, e convertidos estes, tornaro a reduzir os inconstanfugitivos. Os Padres Joo Pereira, Ado Gonalves, Jorge Rodrigues, etro Irmo, estivero a ponto de serem mortos dos que fugiro das aldde Taprago, e Tappitanga, onde residio, por querer impedil-os, e caparo por suecesso tido por milagroso. Com os presentes infortniocom os do anno passado, por mais diligencia que posero os Padres, ro s cinco aldeas, que depois se reduziro a quatro, tendo chegadoa ser

    tantas, e to florentes, como temos visto os annos passados. Outro trlho resultou da fugida; porque foi descomposta, e cada qual tirava porde bem lhe parecia, e n'ella morrero alguns ndios: voltaro muitos mulheres, e querio casar; mas comose nosoubesse se ero mortas estas,ou se foro parar a outra parte, era fora esperar talvez longo tempoaveriguar a verdade, no sem grande molstia dos ndios, e dos Pad

    41 Hoirve grandes embaraos, e duvidas de conscincia, nos que cpraro os ndios na rma acima referida. Recorreo-se a Lisboa ao Tr

    nal d i Mesa da Conscincia, e d'elle veio a resoluo seguinte. Que podia em direito venderao filho em caso de apertada necessidade: e que qualquer se podia vender a si mesmo pera gosar do preo. Havida esta rluo, entir? eac onsulta na cidade da Bahia o BispoD.Pedro Leito com

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    o Governador Mem de S, o Ouvidor geral Braz Fragoso, e o Padrevincial Luis da Gram: e pareceo bem que se publicasse ao povo a reo da Mesa da Conscincia, porque com ella ficassem quietos os quepraro na frma conteda, e os que foro comprados fora d?ella se tivessem por livres. Porm como os moradores da Bahia, e de toda a cestavo feitos senhores de to grande quantidade de ndios vendidosdo direito por tios, e irmos, e parentes, que no tinho domnio selles;determinou-se que os taes ero livres: vistas com tudo as grandifliculdades que se allegvo de se largarem todos estes Indios^do se

    dos Portugueses; e porque podio ir outra vez meter-se entre os gencom dispendio de suas, almas, e no sem perigo da republica, foipermit-tido que ficassem em casados queos tinho, com os condies seguintes. Queos ditos ndios assi mal havidos fossem avisadosdesua liberdade; mas que como livres servissem a aquelles queos resgataro em suas vidas, por evitar osinconvenientes que do contrario se podio seguir: e que fugindoos taes ndios,os podessem osamosmandar buscar,e castigar: e com condio queos amos,em reconhecimento de sua liberdade, lhes pagassem em cada hum por seu servio aquillo que justamente lhes fosse taxado: com declarque continuando elles a fugir pera o gentio, sendo depois da primeiraperdessem a soldada de hum anno, em recompensa do que os amosdero em buscal-os. E outro si, que os possuidores dos ditos ndiono poderio vender, nem dar, nem trocar, nem levar fora do Brasilque os no quizesse possuir com as condies apontadas, os podessenar a dar aos que lhos vendero, sem titulo de domnio que tivesse selles, e estes lhe tornassem o preo.

    42 Porm nem estas condies se guardaro, nem a resoluo sede mais que de cattivarem mais ndios coni capa de vendidos por si mos,ou por seus pais; porque enganavo os pobres, e quando hioao registar, fazio que dissessm o que querio: sendo que (tirando poucofora da fome sobredita) raramente se achar que ndio se vendesse ou a filho legitimo: nem suas necessidades so taes, que se nopossmediar sem semelhante rigor de vendas, contrarias liberdade naturaestimada d'el!es, e de todos os homens. Nem tambm a condio petida do servio dos ndios por toda a vida; posto que por seu estipen

    deixava de ser violenta, e quasi modo de cattiveiro, a no intervirem des razes verdadeiras, que a cohonestassem.43 No mesmo tempo se fez consulta sobre outra pragamais universal,

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    que despovoava as aldeas: e era esta a capa de huma sentena, que promulgada contra os ndios Caets, dando a todos por escravos, e ta sua descendncia (como j n'outra parte dissemos) pela morte quedao Bispo D. Pedro Fernandes Sardinha. E como nas aldeas da Bahia hgrande quantidadee parentes dos Caets, e no s estes se haviopor cattivos, mas volta d'elles outros que o no ero, com qualqsombra de o ser; despovoavo-se as aldeas de todo. A este grande tendo respeito o mesmo Governador, e o Ouvidor geral, moderaro a tena dada, e excepturo os que se reduzissem s Igrejas onde haviathecismo da F: porque estes no poderio ser escravos. Porm a limitno foi de fruto; porque elles, ou se no acolhio s Igrejas, ou seo faziono; estavo ahi seguros dos Portugueses, e como desesperados fugiomorrio fome, ou se metio com seus prprios inimigos, e morrimos violentas: at que cahindo em tantos desarranjos os Ministros Rerevogaro de todo a sentena; mas foi a tempo que poucos d'elles erovos./

    44 A estes excessos, e a outros semelhantes acudiro os Reis, co

    verdadeiros Catholicos; e por descargo de conscincia, mandaro quefossem cattivos, seno aquelles que fossem tomados em guerra justa (atando juntamente as condies da justia da guerra) e aquelles que fosresgatados das cordas: com declarao, que tanto que estes servissem po bastante pera satisfao do preo que por elles se deo, ficassem livPorm por que ainda assi foro informados os Reis de muitos enganosn'esta matria se commetio, El-ReiD. Philippe Segundo em11de Novembrode 1595, revogando todas as leis de seus antecessores, mandou que

    mente fossem cattivos os que fossem tomados em guerra justa, feitaReal Proviso assinada por elle, e de outra maneira no. Em 30 de Jdo anno de 1609 passou Sua Magestade outra lei, em que revoga toas passadas, e declara em que revoga todas as passadas, e declara tos ndios do Brasil, assi bautizados, como por bautizar, por livres, cforme a direito, e nascimento natural;' e manda que por taes sejo tie havidos; e acrescenta assi: E por quanto sou informado, que em tede alguns Governadores se cattivavo muitos gentios contra a frma dd'El-Rei meu senhor, e pai; hei por bem, e mando, que todos sejo tos em sua liberdade, e se tirem logo do poder de quaesquer pessoasos tiverem, sem embargo que digo que os compraro, e que por catlhes foro julgados por sentena: as quaes compras, e sentenas de

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    por nullas, por serem contra direito. qual lei, suppostoqueseveioembargos na cidade da Bahia . execuo, e se replicou a Sua Mageno obstantes os embargos, e replica, tornou a passar outra lei em Setembro de 1610, em que confirma a passada. E ultimamente estama foi confirmada por El-Rei D. Philippe Quarto, passada em Lisboa deMarode 1640, e registadana Bahia no mesmo anno; em que manda, quenenhum ndio de qualquer qualidade, ainda que seja infiel, possa seitvo, nem posto em servido, por nenhum modo, causa, ou titulo; possa ser privado do domnio natural de seus bens, filhos, ou muaggravando apertadamente as penas passadas, como ahi se pdfe ver

    45 J n'este tempo era o numero de obreiros d'esta Provncia macrescentado: porque na Bahia ero os Padres dez, e os Irmos quinzeVicente, e Piratininga, dezoito por todos; no Espirito santo dous,*douPorto seguro, dous em Pernambuco, e trs nos Ilheos,como logoveremos.E pera que podssem com mais desembarao empregar-se na cultundios, e Portugueses, n'este mesmo anno o Serenssimo ReiD.Sebastio,pai amoroso da Companhia, com animo no menos liberal que christtou o Collegio da Bahia de huma congrua poro, pera sustento de atsenta Religiosos, applicada na redizima d'esta Capitania, que pelo se reduzia a dinheiro, vinte mil ris pera cada sujeito; que vem a1 fazertrs mil cruzados. Tudo consta de sua Real Proviso, passada em Novembro de 1504. Pela qual merc a este Prncipe reconhecemos pdador, com os suffragios costumados em nossa Religio. Verdade hteve El-Rei D. Joo seu av vontade de fundar o ditto Collegio, e dado principio a elle quando falleceo: o que sempre reconheceremoste pio Rei, com os mais favores de pai, que fez Companhia;emparticular de Portugal, e a esta do Brasil. Com tudo, como a doao do

    certo,e determinado, foi feita por El-Rei D. Sebastio, a elle temosfundador. O que quizemos advertir aqui, porque alguns Authores noa El-Rei D. Joo absolutamente fundador do Collegio da Bahia, iguacom o de Coimbra em Portugal, e o de S. Paulo na ndia. Assi o tPadre Antnio de Vasconcellos na Descripo dos Reis de Portugal,naVidad'El-Rei D. Joo: e o Padre Balthasar Telles nas Chronicas de Porparte n, liv. 6, cap. 54, num. 3 , levados parece do fundamento que tei; porque teve vontade de fundar o Collegio, e deo principio a elle

    46 Este mesmo anno em o mez de Fevereiro passou a melhor viCasa professa de Roma o Padre Diogo Laines, Geral de nossa Comp

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    at acabar no porto e rio de Santa Cruz, trs legoas da villa de Portoguro,pouco mais ou menos; porque ainda no esto demarcadas por-eparte as duas capitanias de Ilheos, e Porto seguro. He terra frtil, amregadia, capaz de riquezas, de grandos canaveaes, e engenhos, de ppreciosos, brasis, jacarands, saafrs, e outros, e de todoo gnerodeman-timentos brasilicos. He retalhada de grandes e caudalosos rios. (Deixos menores) o rio do Camam, distante seis legoas de Tinhar, em ade quatorze gros, he hum dos mais capazes rios de toda esta costa grandes povoaes, e commercios. A barra he fcil e espaosa, a modduas, por respeito da ilha chamada de Quipe, que tem junto boca^tro por ella grandes nos chegadas ponta da banda do Sul nadosete ou oito braas. Da barra pera dentro ha huma formosa bahia, de diversas partes correm ribeiras de agoa doce a pagar-lhe tributo. suas agoas muito do interior da terra, posto que no he navegvel que at seis ou sete legoas, por impedimento de huma grande cacho

    49 D'este a seis legoas ha outro rio chamado das Contas. V-se naboca d'elle hum ilheo pequeno, he capaz de navios ordinrios, he navegat oito legoas no mais, por respeito de huma cachoeira. D'esta perama se pde tambm navegar, se l se fizerem acommodadas embarca

    Est em quatorze gros, e hum quarto. Em abono do arvoredo d'estehe celebre aquelle espantoso cedro, que desceo por elle abaixo, e sahpela barra fora se achou lanado praia, de to crescido tronco, e asos braos, que deo s elle a madeira toda fabrica de huma IgrejaSanta Misericrdia, que fez a villa dos Ilheos, sem que algum outroentrasse n'ella: no chego aqui os cedros to gabados do Lbano.

    50 Em distancia de outras seis legoas est o rio chamado Taygpe, daloso em agoas: rega grandes, e remontadas mattas; metem-se n'elletros muitos de menos conta. Tem seu nascimento de huma alagoa fesa, que contm em si duas ilhas cheias de arvoredo. No fao caso detros dous somenos, que entre este e o rio das Contas desembocoao mar,Vemoo, e Japarap.

    51 De Taygpe ao rio de S. Jorge, que he o da villa dosIlheos,ha duaslegoas de distancia, tem trs ilheos na barra, e junto a esteshasurgidouro,e os navios que ho de entrar vo pelo canal, Norte, e Sul, como ilheogrande: so frteis seus arredores, est em quinze gros escaos: do de S. ge a duas legoas est o rioi Curuygpe, de menos conta. D'este a dozgoas desemboca no mar o rio chamado Patype, fecundissimo de matt

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    3 2 LIVRO III DA GHRONICA DA COMPA NHIA DE JESU

    estimado po brasil: se bem pera enriquecer aos homens com estsouro, no he capaz de embarcaes grandes, que fartem por hum

    seus desejos; em barcos menores he fora que o trago dos interiosuas mattas, por falta de barra accommodada. Junto a este, menos cia que de duas legoas, corre o Rio Grande em quinze grcs e mealtura: tem junto boca trs mattas de matto a modo de ilhas: bomgidouro de fora na ponta da barra do Norte, lugar seguro de naviquenos, que podem tambm entrar no rio, e acho na barra ao priduas braas do canal; logo huma, e d'ahi em diante trs, quatro, e He navegvel at oito, dez legoas; de grandes pescarias, e frteis ares:entro n'elle no serto muitos rios, e alagoas, que fazem seu bolatado: acho-se n'elle mais de vinte ilhas habitaveis: e este he aqueque guia a grandes haveres,/ e minas do serto, como j n'outra parsemos; pelo qual abaixo descero em canoas de cascas de arvores mdos companheiros de Antnio Dias Adorno, que subindo pelo rio dasvellas acima desentranhara estes sertes, e descobrira esmeraldas, sae outros mineraes. -J

    52 Depois do Rio Grande cinco legoas, desagoa no mar o rio Boba. D'este a quatro legoas e meia o rio de Santo Antnio; d'ahi o rio de Cernambitygba: todos trs caudalosos, posto que desomenosbarra, e d'este ultimo ao de Santa Cruz correm duas legoas, e he o emporto entraro as nos da ndia de Pedro Alvares Cabral, que descoeste novo mundo: est em altura de dezaseis gros e meio. E temocritto a costa d'esta Capitania.

    53 D*estafezmerc El-ReiD.Jooo Terceiroa Jorge de Figueiredo Corra, Escrivo de sua Real Fazenda: mas como este por razo de seu no podesse vir povoar em pessoa, mandou em seu lugar a FrancisRo

    meiro, Cavalleiro Castelhano, homem prudente, e animoso, com humaprovida de aprestos, e moradores necessrios pera a nova povoao custa do senhor da terra. Partio de Lisboa esta frota, chegou costa,e foidesembarcar no porto de Tinhar. Comeou a povoar no alto do moS. Paulo: mas descontentando-lhe o sitio depois de descoberto o rIlheos (chamado assi pelos trs que tem junto barra, dos quaes no s a villa, mas toda a Capitania, o nome) passou-se pera ellecom todaa gente; e era esta em grande parte da boa nobreza de Portugal, quvrios respeitos vinho a povoar estas partes-

    54 N'esta parte se foi fortificando, e assentando a villa, a que p

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    3 4 LIVROIII DA.CHRONTCADACOMPANHIADE JESU

    g d'elles, e lhe ordenou que fosse Bahia, e ahi estivesse s ordenGdvrnado!*' gerai seutio; porque queria que d?aquella cidade fosse a huma emprea de seu servio!i enseada do Rio df Janeiro."57 - Chegou Estado de S Bahia, e abertas as cartas da Rainha,

    tinho ifdpos de dar-se por bem servida do que com seu valor on'aqlt; enseada o Governador-Mem de S) que considerando o temaccommodado, assi pelo bom sccesso passado de nossas armas,comope>-las1pfees, que depois d'issO se assentaro com os ndios Tamoyos; pareciocc&-d meter gente nossa no Rio de Janeiro, senhorear a terraar de todo fora o Franeefc,; e comear a povoar n'aquellaparte:peraoquelhe mandava aquelle Capito' de effeito com duas nos de guerra, qugrgadsao poder do Estado, serio bastantes pera 'a empreza; e tudcasse a sua ordem, e disposio. O cuidadoso Governador, que nenhutr Cousa mais desejava, vendo-se com to bom Capito, e soccorrogregndo a elle os navios da costa, e alguma gente militar, com a presteza' que pde aviou a frota, e a despedio no principio do anno rente, *Cohi o gimento seguinte. Que fosse demandar a barra do RJaneiro, e entrasse n'ella som de guerra, e observasse alli as dispes, e conselhos do inimigo, e se achasse "ocasio qu prometessperana dvictoria, procurasse tirar o inimigo ao mar alto, e ahi romse cm eBe;, fazendo sempre por conservaraspazescom ondios Tamoyos:e ordertandodhe por fim1 do regimento, que podendo tomar conselho como Padre Nobrega,'no obrasse cousde importncia sem elle, pelo grconceito'qu tinha de qa virtude, e prudncia.

    58 CHg o Capito mr Estaco de S barra do Rio de Janeirmez!d Fevereiro: e a primeira cousa que fez, foi despedir d'alli hum

    co a S. Vicente com cartas ao Padre Nobrega, pedindo-lhe quizesse atar-se com elle em pessoa, por servio d'EKRei, na conformidade quGferndOr seu tio o dispunha em seu regimento, o mais presto que fpossvel. Entretanto foi correndo a costa, e postos d'ella, e achou por de hum Francez que tomaro, que os Tamoyos do Rio de Janeiro tinaltradd fe pazes* e estavo em guerra. Duvidaro os homens do malguns soldados; mas logo custa de seu sangue, se desenganro, poentrando em bteis da barra pera dentro a fazer aguada em huma rib

    hum d'elles que mais se empenhou, foi acommetido de sete canoas demoyos, d cujas mos, supposto que escapou, foi com morte de qumarinheiros frechados; Declarou este sccesso a duvida, e logo a foi

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    trando mais s claras a experincia; pdrtfue estava tudo ardendoem apres-tos d guerra: os portos por onde podia ser acommetido o inimigo, cotos de canoas armadas: as praias cheias de Tamoyos empennados7ferio cho, e os ares, ameaando rompimento de guerra: tudo disposiesdustriadas'pela nao Francesa, inteirado de tudo o Capito mr EstacS (depois de feita alguma''experiertoia de mertor empehho-,'sahmdoidocontros feridos alguns (soldados,1"^ outros mortos seih ellitof portdo-fcniconselho'o que vio do grande poder do inimigo,* e de cmousivde tela, rio querendo sahir o mar a batalha; e como no era bastante

    der com que s achavo per sahir em terra, por falta principalmenteembarcaes pequenas: e sobre tudo porque teve noticia por via de hcattivo dos TmoyOs fugido, que estava S! Vicente em guerra (ditto concordava com a trdanado1 Padre Nob^egat;)-r5veo que- era -bem iraquella Capitania; porque:ide sua ida resultavo miiitosiibens^socorrer.aterra, avistar-se com o Padre Nobrega, t prover-se de einbWfOes dmo,e mantimentos. 'h ! -" ' 'i![l!ll-| ; ''" ivir-n-q r.u

    59 Porm- aconteceu aqui hum sccesso 'fido por milagrosoj!porqtie partida a armada no mez de Abril, em numa quinta feira da semana santa,' losexta seguinte meia noite chegou o Padre Nobrega emhumalancKa, mais dous companheiros, e como vinha com vento tormentoso,' desejde abrigar-se d7,lle,'lsuppondo que tinha entrado a armada, embocaro abarra, e surgiro de dentro:' seno que quando contentes do-sccessoprimeiro arraiar da nianhaa; comearo !descobriro horizonte, om vez dasnossas nos de guerra,'se vem metidos entre -infinidade de canoas adas inimigas:'"e o que mais he, sem remdio de-poder tornar-p7n*'d fporque o vento, que na entrada lhe fora favorvel, sabida lhe ticava

    trario. Que faria humaihehinha s desarmada, 'entre to'grandes estdos de guerra entre1 gente feroz, e desliumana, que-hein- nonie sabe tte*bom quartel? Davo-se por perdidos os marinheiros, encommendndoDeos os Padres, e sobre todos mostrava'graddt eonfianaNolireg-. Exno meio d"esla aiflio cmeoa apparecer os velames dos galees, epouco espao ehtro a barra, e lanao ferro jint aos nossos; E foi o cque o mesmo contraste de tormenta que trouxera os Padres, fez arribgalies, (pie no dia antecedente tinho partido. vista de to grande cesso,se prostrro de joelhos todos, reconhecendo a merc do Ceo: e lo seguinte Domingo de Paschoa sairo em terra na ilha chamada Villaga

    f- li

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    3 6 LIVROm DCHRONICADACOMPANHIADEJES

    onde dissero missa,e fez Nobrega hum sermoao povo, em aco de graas,60 Avistado aqui o Capito mr com o Padre Nobrega, e tomando dnovo conselho com elle, conviero que era bem irem a S. Vicente refaz

    assi de mantimentos, como de embarcaes de remo, com que podessassistiro tempo necessrio,eacommeter ligeiraospostos ondenopodiochegar navios grandes. Dero vela, e dentro em breves dias chegaroaoportode Santos. Achou o Capito que continuavo aqui as pazes firmes comos Tamoyos de Iperoyg, entre os quaes estivera Nobrega, e Joseph; e quemomuitos d'elles entre os Portugueses, e com sua frecha os defendio d

    guns Tupis inimigos: especialmente o fiel Cunhambba, que assentaracom tuda sua gente fronteiro aos mesmos Tupis, s por nossa amizapelo contrario achou que os Tamoyos do Rio de Janeiro tinho feitotoda aquella costa varias hostilidades, inimigos de toda a paz, e socEm S. Vicente comeou o Capito mr a experimentar graves difficuldacerca da empreza, movidas por varias pessoas da mesma armada,squaesno parecia bem acommeter em tal oceasio de tem po. Dizio que migo era innumeravel, fortificado em casa prpria, com mantimentos mo,com embarcaes to ligeiras, com o mesmo vento, com armas que jalhe podio faltar, industriados na guerra pela gente Francesa, cujos prpios tinho experimentado: e que tudo o contrario achvamos emns;porqueramos poucos, acommetiamos como peito frecha, em terra alhea, onde nosabamosdospostos que podem fazeranosso intento, os mantimentos acabados*,a terra impossibilitada a dar-nos outros, pelos assaltos contnuos inimigos, as embarcaes grandes, e pesadas, a munio limitada, e ngente Portuguesa pouco destra no pelejar dos ndios: que poderia suechuma desgraa, que desse que chorar: que sempre foi prudncia, noriscar a graves perigos, onde a empreza he voluntria, e pde esperaoceasio segura. Isto dizio; e a esie fim movio muitas traas', huns zelo, outros com receio, outros por enfadados.

    61 O Padre Nobrega, que tinha gastado muitas noites em orao Deos sobre o sccessod'esta empreza, e tinha sentimento do Ceo,que havia de sahir com effeito, que^e havia de povoar o Rio, e que os estoero invenes do inferno: oppz-se firmemente a todos os pareccontrrios. Dizia que as emprezas grandes no se acabavo sem balho, nem sem perigo; e que vista da importnciad'esta, nenhumtrabalho, ou perigo devia reputar-se por grande: porque se pomos didos olhos a Capitania d'El-Rei assolada; o inimigo pujante, e resolu

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    acabal-a; a pouca potncia da terra pera resistir-lhe; e o poder de Por

    gal, e Brasil empenhado pera libertal-a, parece qne nem a Portugal, neao Brasil, nem Capitania, nem reputao portuguesa, convm que fmallogrado cabedal, que tem custado tanto, e tantos annos ha que queesperado. Que dir Portugal, o Brasil, esta Capitania, e os prprios inigos, se depois de to grande fama de poder, virem que voltamosascostassem sangue? Mais honra seria em tal caso mostrar essas costas feridaspeleja, que sans sem pelejar; porque feridas mostrariam desgraa da fona, e sans mostrario desdouro da fama. Quanto mais, que nem o inimhe to formidvel, nem suas fortificaes so muralhas, nem suas armasmito fogo, como as nossas; somente excede em mantimentos, e canligeiras: porm eu (dizia elle) aindo que com to poucas posses, me obra remediar esta falta a Vossa Senhoria. Conclua, que dilatasse o coracom grandes esperanas em Deos, porque de sua parte lhe pronosticasccesso venturoso, e entendia que era servido o Ceo, que d'esta vez se ficasse cidade Real no Rio de Janeiro.

    62 Era grande o conceito que tinha o Capito mr da prudncia, virtude de Nobrega, at ento por fama, agora j por experincia. Tomper modo de orculo do Ceo as palavras do Pdare, e propz de cumpri risca. E na verdade a santidade do sujeito, a resoluo com que falla impresso que fez no Capito, o fim que teve no sccesso, tudo mosque foi mais que humana sua resoluo. Joseph de Anchieta diz n'esta mtria as palavras seguintes, O Padre Nobrega, como tinha por traadaDeos esta jornada, e grandssima confiana, por no dizer certeza, quehavia de povoar o Rio de Janeiro, poz-se contra todos com grande cotncia. At aqui as palavras de Joseph. Mostrou ainda mais o intento

    tra reposta que deo o mesmo Nobrega n'esta ocasio; porque dizendo-o Capito mr no principio, entrado ento, ao que parece, das razes ctrarias: Padre Nobrega, e que conta darei a Deos, e a El-Rei, se laar a perder esta armada? Respondeo elle com confiana mais que humna: Senhor, eu darei conta a Deos de tudo; e se fr necessrio irei psena do Rei, e responderei ahi por vs.

    63 Ficou com todas estas cousas to convencido, e resoluto o Capitmr, que nenhuma cousa da terra (dizia elle) jamaiso trocaria. Porm pera

    persuadir aos soldados descontentes, foi necessria nova lida de Nobreandava, e desandava aquellas duas legoas, que ha de S. Vicente a Santonde estavo com o Capito: praticava com os de mais razo, mostrav

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    3 8 LIVROI I I DA C H ROMC A .DA COMPANHIA D^JESC

    lhes,a muita;que,havia perigue no. deitassem em flor esperanas.d

    tps^tp, .ganijeji,,,a,, gloria,que.se lhes .seguiria,da; victoria,.,ejoj^sarquecqntrajiirio ,da. retirada. Fazia-lhes fcil,o ^presto, offerecia-se abpqrtfs.d'elle, judava-os, .favoreca-ps em su,as(peitiees, e cpnvenci.a-lhesosanjmos^^yau-os,a recrear acossaGasa.de,SvVicente por algunsidias, ejilla^e1Piratinina,)ou4ros; onde foro, mui,bem agasalhados.^aviros cuidados, iom^lp, grande variedade de, vistas, e, com verem,os.de nossas, aldeaSi armados a seu:.modo,Q animados pera a mesma, empreza.: Aqui fez.que.seassentassem, pazes na presena do Capito, mor, e emnome do Govarnadpr geral,seu.tio,.entre, os .ppssos, calguns-Principserto, que estavo era guerra. Descero seguros sobre, sua palavra,e, rendero os arcos, e, e..offerpc7q muitos |d'elles: jornada, e ajudaro .comseus m3ntimentps'::)com qne ficrpo ps, PprUiguese^ mais ,cpn/irmad.qs,quDeos traaya,o fim|desejado7e na, verdade^ cf aqui, houvero grande, pardo que necessitava^ assi de gente, como ,(le manUmentps. E,v:eio a strs effeitos esta sahida a Piratininga: confirmou-os nimos dossolddeixou.em. pazjaquelle, spr,t|o, ,e proveo do que necessitava,3.armadai A lFP*tC) ^Qjdijto, desceodasserras Wnpr-ega, o no .martima cprreqasvilas,e, lugares,todos, mais com espirito, que.,com, foras, da carne ^pva, e aninjava.eni publico, e eim particular sobro o.apresto.deemprijHoimportant,,;publiaodo>per^es1;dprd]itos;em nome dp Governador ge-8T#. ^que;se.embai;cassein; p.-cm.sua mdpstjia(|e aullioridadp,a juntouIram isoecrrp. pnsideraypl d^Portu^uesps.nstios,'",ndios, e dq ce basmentps, queJiuntos 3,'putros, "qupilpgqchegaro.da Bahia, Q,Esp,iri-.

    to.santop,. fizero provimento cabal, c bem fora do .que suppunio ovptrp pela)pa$e11cpnFaria;.|e.pm",ele.se aprpsiava a armada. Pormcq-

    moj esta no lia',,de. sahir aq( fim.'quepretewle.seno,qin, principio do,an-,no seguinte;

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    armada, que partiria a seu intento, contentes os soldados,,.e eom esperan

    a de victoria*. Com estas novas respirou a Bahia, que tinha raetido-enhos grandes, e arreceava vt-os mallogrados. , -, , i66 No nosso Collegio da Companhia, accrescentou o Padre Provin

    os estudos com huma nova classe de Latim, e com huma lio deThegia moral, a qual lia o Padre Quiricio Caxa, da matria de virtudes, ecios.No cuidado da converso dos ndios no descansava o espirito Padre Gram: traou fazer este anno nas aldeas o mr apparato dei celdade dos Officios da semana santa, que at ento houvera, com jnbque pedira a Roma, pera os trs dias ltimos: porque quantomaisestavo diminudos aquelles povos das desgraas passadas, tanto mais lherecia necessrio animar esses poucos, porque'tornassem ao fervor antie no foi sem fruto; porque os assistentes afervorro-se; e dos ausemuitos largaro o serto, e acudiro fama do celebridades

    67 N'este mesmo anno houve em Roma Congregao dos Padres pfessos da Companhia, e n'ella foi eleito em Geral perpetuo de toda elsanto Padre Francisco de Borja, Duque que fora de Gandia, e espelho;ento era de santidade, em lugar do Padre Diogo Laines de boa memque o anno antecedente passara a melhor vida. Logo que foi eleito meira posse de seu generelado, elegeo por Visitador geral d'esta: Provdo Brasil em nome seu o Padre Ignacio de Azevedo, que se acharaCongregao por Procurador geral da ndia, e Brasil: aquelle grande elho de perfeio religiosa, qu depois veio a consagrar os mares com prprio sangue, e de quarenta companheiros, derramado pela F Cathca, a mos de hereges Hugonotes, como em seu lugar se dir; que porsomente se alegra esta Provincia com a boa nova desua.eleio; esperan

    do alegrar-se o anno seguinte com sua boa vinda. . - ' - ' '68 Na villa do Espirito santo acabou o curso d'esta presente peregnao o Padre Diogo Jacome. Foi este Padre Coadjutor espiritual na Cpanhia, grande servo de Deos, e de abrasadas entranhas na salvao almas. Pela converso d'estas deo o ultimo vale ptria, e aos cbllegde Europa, e se veio metter nos desertos entre a gentilidade do Braem companhia do Padre Manuel de Nobrega no anno de 1540., Na Bexperimentou com elle as ingratidqes, e dureza d'aquea matta at

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    nes; e foi companheiro deveras nas asperezas dos princpios d'aque

    converso, vivendo em estreita pobreza, e spera penitencia: ajudandpedir de porta em porta o corporal sustento; correndo valles, passarios, atravessando serras, por frios excessivos, e sempre roto, e a p, bem das almas.!

    69 Este humilde servo do Senhor, foi dos primeiros que comearintroduzir com zelo santo o exercitarem-se os nossos em obras manuquandono>tinho:que fazer, por exerccio de humildade, eoccupao honesta d corpo imitao idos antiguos Padres do erm o. sua contamou-elle o de torjieirpi(oficio .que por habilidade somente aprendeotodo o tempo

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    queza com elle. No he novidade n'esta gente; cuja natureza he to recida por silvestre, que em qualquer doena trabalhosa desamparpais aos filhos, e os filhos aos pais: assi o fizero muitos n'esta, acodo-se o que pera isso tinha foras, pera o serto, sem respeito algunatureza, ou da graa.

    71 Cansado pois de to excessivo trabalho, consumido a puro deto de to triste sccesso, vendo to brevemente desfeita, assolada, eamparada huma numerosa aldea, que cordialmente amava, por quemra, e trabalhara tanto, perdeo o alento, e foras, e entrou em huma

    de febre. Com esta foi trazido Casa davilla:e ainda aqui quizDeuspro-val-o com novo refino de trabalho, e de obedincia: porque cuidanSuperior, passados alguns dias, que estava melhor, vendo a grande nsidade d'aquella aldea quasi despovoada, convidou s por alto o Padra tornar a ella: porm aquelle que em toda sua vida fora exemplo ddincia, no quiz na morte diminuir o lustre d'ella. E supposto que gor vital lhe significava o contrario, poz-se comtudo nas mos do Sue foi. Porm servio a ida de voltar presto com mais hum acto de viherico; mas com o alento j to perdido, que quasi chegou mortopouco tempo que lhe restou de vida, tudo era suspirar ao Ceo, com abrazados, pedindo a Deos misericrdia, pera si, e pera os que virabar n'aquella cruel peste, to faltos de soccorro espiritual. Chegouo quintodia depois de sua vinda, e recebidos os Sacramentos todos, abraadohuma devota Imagem, deixou esta carne mortal, e foi, como se crzar este bom servo do descanso eterno, no mez de Abril do anno de Jaz sepultado na nossa Igreja de San-Tiago d'aquellavilla.D'este varo deixou huma lembrana o Padre Joseph de Ancheta, e falia d'elle com

    vras maiores, chamando-lhe varo de muita obedincia, de grande zsalvao dos ndios, que trabalhou muito entre elles, com grande chde at acabar a vida; e finalmente que veio a morrer por obedincna verdade dois quilates enxergo grandes n'esta morte: que arriscouservo de Deos a vida pela chardade dos ndios,a quem pretendeo acudir;e pela obedincia do Superior, a quem pretendeo satisfazer. Escrd'este servo fiel, o Padre Francisco Sacchino nas Chronicas de nossapanhia, part. iii, liv. i, do numero cento e cincoenta e oito por dianpadre Balthasar Telles nas Chronicas de Portugal, part. i, liv. m, capE o Padre Joseph de Anchieta nos Notados, pag. 22.

    72 Em S. Vicente achava-se j o Capito mr Estacio de S com

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    arn^ada preparada, e prestes; seis navios de guerra, alguns barcos lige nove,canoas,de Mestios, e ndios. Com,estes mandava o Padre Nodous.Religiosos, Gonalo de Oliveira, e Joseph de Anchieta, pera mal-os e dirigil-os;em huma e outra lingoa, em que ero peritos. Partirdo porto, chamado pela lingoa dos ndios Buriqujca; a vintede.Janeirod'este presente anno,,,dia dedicado a S. Sebastio, que por bom prontico-tomaro,por patro :daem presa, por ser to grande martyr, e ser, nonie, de seu.Rei D- Sebastio. Chegaro a occupar a barra do RiJanpiro:ao.principio do mez de Maro: aqui lanaro ferro junto s il

    que estp:prximas a, ella, esperando pela no Capitania, que medisua grandeza,.iP contraste de mar, ede ventos, poucofavoraveis, vinhadevagar.' ..

    73^ Aconteeeo aqui hum caso digno de memria, demostrador do scesso futuro. Porque os ndios do Espirito, santo impacientes com a ra da Capitania,: e mantimentos, que tambm tardavo, e sobre tudsua natural inconstncia, estayo amotinados pera partir-se com suanoas pera, suas terras, e desamparar os Portugueses. Chega vo a pon

    executar-a teno: ex que Joseph em lugar distante, sentio em si imso de ir visitai-os; e chegando falia com elles, sem ouvir-lhes nada,estranhou sua resoluo. Vendo-se descobertos, dero,a causa, que evoafii morrendoi fome, e no podio mais esperar. Ento, com grconfiana no,Ceo, lhes empenhou Joseph sua palavra: que no seria sepo..que, antes que,o Sol chegasse a tal parte do Ceo, mostrando-lb/a,chegario, sem.duvida.os;mantmontos, e aps elles pouco depois aCapitania. Cousa, marayilhosa! No ero dittas as palavras- quando recrq;,tres; barcos, que ero, mandados a buscal-os ao Espirito sanPasmaro, josjndios, e fizero conceito do sccesso mais que humanodecero, a ..tudo, resolutos a ajudar na empresa: e logo em a manhguinte .chegou tambm a no Capitania, tudo em cumprimento daditpnecia.do Padre, Joseph.

    74, Juntas j, as embarcaes, entraro todas a barrado,Rio de Janeiro:.saltaem.terra a infanteria, e comea a fortificar-se com trincheirasfossos,.:no lugar onde depois chamaro Villa velha, junto a hum penedtssimo,, que pela forma se diz Po de assucar, ,e outra penedia, queoutro lado cercava, com que ficavo em parte defendidos. Huma s cdescontentava do lugar, que depois de roadas as mattas, acharo agoalagoa, e ella to grossa, e nociva, que arrecero causasse doenas

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    soldados.O queconsiderando, hum Joseph Adorno,; Gpnpvez nobre, mo

    dorde S.Vicente,e humPedro Martins Namorado, tomaro isua conta(entreasmais occupaes) fazercom suagentehumpooi pu, (Cacimba,;donde Jbet}ero. agoa. doce. D'este lugar liayiodesahiraconquistarosnossos,e haviodeser,conquistado?comdesigual poder; porque suppos-to queero espantosas aosjndjpsnqssas armasde fogo, e nossas nos,ppssantes:eramuita mais formidvel a,grande multido,ide canoas voltes ,^guerreiras,;a centos,e infinidadedeamoyo^armados,qm eobrioos mares,e as praias todosa somde -guerra:.elles!emi seusflugares cercados,, vaiados, ipsolentesdasvictorias passadas,,e sobre tudo 'ajudados,ejanimadps-com nosdealto bordodanao Francesa.Soestes;Tamoyosentre todas asnaes do Brasil ousados no acommeter,-.. sagazes nas .ciladas,no arco, destrissimos;- despedem,:a seta: com talrfora- que.passai o escudo, e chegaap,brao:: tal vezsuQcedei passadoi.o corpotodo,eontinuarafrecha,,e pregar qualquer arvore ainda,'tremulando. Com esta genteo havio,os nossos,. . . . . , .

    73 Joseph,e seueompanheiro Oliveira, fazio .praticasaossoldadosEuropeos, no acostumadosa talmodo deguenra. DizioJhes,queera usodo gentioo quevio;mas que vistadaquelles StrondoSje ferocidade,em. vendoo fogo de. nossos;areabuzes,-seacobardo,.e fogem:queacometessem; constantes,e experimentario.queero verdadeiros,osPadres.Aos ndios nossos confederados praticavo-emsualingoa pnopria; lmbra-vo-Uiesa perfdia contraria,com quequebraro seus inimigosa palavradas pafes; os insultosque noobstaqtes ellas lhes fizero, cattivando,mat andoe co an d oa s mulheres, efilhosdemuitos d'elles,- pretendendo!assolar,e acabarsuaCapitania: sobre tudo lhes trazio memriaos feitosvalpoteS de,seus antepassados;que he omais finodarhetorica pera persuadir esta gente. . -fi ; . i l - i .

    76 OCapitomrEstaciodeSimandandolajntar a infantaria, fallou-lhes n'esta forma: Soldados,companheiros, poucas palavras bastoa ani-mps resolutos:nohe ide hontemnossa1 empresa; depoisde largo tempo.e devarias fortunas, vimosa ver o quehavemosdegozar.A humpdntochegamos,que ou nos ha decustara vida, ou nshavemosdetiral-aatodos estes brbaros. Desta estncianoh j fazer patraz: por hum lado

    nos,cerco estes penedos-poroutroasagoasdoOceano; pela mo direitae esquerda nossos contrrios:se d'este cerco houvermosde sair, hefora queseja rompendo inimigos: estesno so todurosdevencer,

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    como os penedos; nem to difficultsos de passar, como o Oceano: aseus estrondos calo os ouvidos, mas no os coraes: o som demosquetaria cala-lhes ouvidos, e peitos: vista d'esta os vereis locair, ou fugir: no podem medir-se seus arcos com nossos arcabuzesuas frechas com nossos pelouros. Tenho por escusado pr diante doas justas causas que aqui nos trouxero: de todos he sabida a arrod'estes selvagens licenciosos, os dios antiguos, e presentes, com qupre nos quebraro a f, e lealdade, desprezando a confederao degente, e admittindo a de nossos contrrios: os intentos de destruir-n

    assaltos de mar, e terra, com que perturbo toda a costa, roubandtivando, matando, e comendo como feras as carnes humanas dos ne bebendo-lhes o sangue. Assaz de justificada est nossa vinganser bem que continuem tantos damnos, nem que se diga pelo muntendo metido na empresa tanto poder, Portugal, o Brasil, Rei e o Eficaro huns e outros frustrados. Acabe-se de huma vez com esta tirem-se de assombro os moradores, livre-se a terra, levantemos n'dade, e fique esta por memria de nossa resoluo e trabalhos; e

    exemplo dos vindouros, e freio de semelhantes brbaros. E como animados os soldados, diro os successos seguintes.77 O primeiro assalto que dero os inimigos aos nossos, foi

    depois de alojados, aos seis de Maro, quasi provando sua disposvalor. Acommetero, segundo seu costume, empennados, com repalaridos, estrondo de vozes, e arcos, que entre aquella grande penesitio fazia pavor, e espanto. Acharo porm valor, e resistncia, qucuidavo: pelejou-se por huma e outra parte com esforo; e sabemparou o estrondo na morte somente de hum ndio nosso j Christnaturaes dos campos de Piratipinga, o qual- podero fazer prisiontanto que o houvero s mos, pera terror de seus contrrios, o amro em Iram po, fazendo d'elle alvo de suas frechas, a cujo rigor avida. Saio-lhes com tudo cara a valentia; porque em lugar de se acrem, ficaro os nossos com tanto brio vista de tal crueldade, qupendo tranqueiras sairo fora aps elles, mataro a muitos, poservos em desconcertada fugida, e fizero presa rias canoas em quevindo, e se aproveitaro os ndios de seus costumados despojes.

    78- Aos doze do mesmo mez tivero noticia os nossos, que omoyosestavo em cilada com vintee sette canoasde guerra, em postos onde dfora havia de ir a dar nossa gente. Aprestaro dez canoas com du

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    trttvadds mares, e os niorites; e s pde cidal-os, quem sabe cme d'estes brbaros. L-riav cada qual a frecha mais empehnada, e demais estimai sobre ' arraial, por1 principio de guerra, e como desafio. Ndesfallecem porm os coraes dos nossos; e primeiro que tudo bem-os com"semelhantes sinaes de festa, disparando sobre elles quande artilharia, arcabuzaria, com to boni emprego, qii a capitaniamlg^fTerids, e perturbados os marinheiros) foi dar Costa entre pendi, d'ond apnafs depois de grande fora, alguns mortos, a tperd' 0 mr1. Slv a Capitania; acommetro os inimigos em ordem

    guerra1

    :1

    as tfes'1

    ' nos Francesas (quf outro Ethna) dsfazendo-s em fode pelurs, bombas; alahzias: os TamyOs' Cobrindo os ates com nde freChaisT q vindo caindo sobre o arraial a som do estrondo da aria,' representava hum'fflutfelr1 ntr troves medonho. Porm servi deampf- a procteo d insighe M^rtyr S.; Sebastio-, que com f invocaro;'pnrque psada a tormenta,"cbrrerid-s*as stncas, no; se achou mortoalgum; setdqne da parte inimiga/o foro'muitos;1 es tvos ptists em fugida; porque ho estava'tambm ociosa n mesmo tempo d tormenta artilharia '''* li::; !"

    82M'Aqui refere1 o Padre Joseph de Anchiet hum caso tido pof milagroso n'aqll arraial. Eslava no tempo do combate "referido, na Ig1posta em orao o Padre Gonalo d Oliveira, encommendando Dsfccesso (qual Moyses dos filhos de Israel:) era esta feita de palmcomo' as frechas vinho de alto,' trespassaro o tecto, lados; e foi cahjrrelj*que1 sendo'm grande quantidade," ficaro todas a redor do Pdre, pregadas1 no cho, sm que alguma d'ls lti tocasse. Viro' isto que -i-cbnflSHe quando em quando Igreja, e espantados do sccque tinho por milagre, cobravo novnanimo pra tornar guerra:! "

    *-' Tornando;aoj intento: 0 Capito'Estacio de Sa,no satisfeito de'defend er- dentro dd arraial, quiz mostrar que tinha poder pera' buscinimfgtf-fr d'lle: commeto as ns Francesas, ,' fez n'ells destromuitos mortos, e feridos com a artilharia 'de sua Capitania. Despedimesmo tempo'esquadras, que acommetessem as aldeas dos contrriostras! as canoas de pesca, que ero grande numero; e em todas fizero bpresas: de diis'; aldeas especialmente fizero prisioneiros os moradoretodos: com que ficou 1 assz atormentado o inimigo.

    84 -Aos quinze de Outubro seguinte foi outro sccesso digno d hna. Sahirb sette canoas nossas em busca de presa, mas viro-se a p

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    serem ellas prisioneiras do inimigo:-porque lhes salwrode fciada sessentae quatro, que-dandoaoremo velocssimo,em breve tempo posero-m

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    87 No Espirito santo fez Joseph de caminho o officio a que fora mdado; e foi hum alivio geral de toda aquella villa. Em nossa Casa colou, e animou os Religiosos, tristes ainda da fresca morte do bom comnheiro o Padre Diogo Jacome, e lastimados do rigor da cruel pesticia passada. Visitou as aldeas, e chorou com os ndios suas misriacom sua costumada eloqncia na prpria lingoa brasilica, os animouvar com pacincia aquelle aoute, que Deos lhes quiz mandar por altos juizos, e por ventura pera salvao dos que n'elle acabaro a vDispoz e remediou muitas cousas na Casa, e aldeas, de maior perfeiservio de Deos: e deixando, edificada aquella villa com suas praticconhecida santidade, se embarcou, seguindo sua viagem pera a cidadBahia.

    88 O anno de mil e quinhentos e sessenta e seis continuava na Bao Padre Lus da Gram na reformao das aldeas, que, como vimosannos passados ficaro assoladas de doenas, e fomes: mas j com seuvor, e ajuda das duas cabeas, ecclesiastica e secular, ambas zelozabem dos ndios, tinho tornado a seu teor antiguo, posto que no ao mero de sua gente, as cinco que ficaro. No Collegio continuava o aum

    to das classes de Latim, e Casos, com freqncia de estudantes, e refoo de doutrina. Chegou a este Collegio o Irmo Joseph de Anchieta, no fim do anno passado dissemos partira pera esta cidade com escalla capitania do Espirito santo. Foi recebido commummente de todos comorecio suas grandes virtudes, notrias j em todo o Brasil. Este hospconton mais por extenso ao Governador Mem de S (como quem fora tparte em tudo) o estado da guerra do Rio, as maravilhas que Deos tobrado por meio do Capito mr Estacio de S, e seus soldados; por

    dizia, que como ero os inimigos innumeraveis, de fora se havio dextinguindo de vagar com to limitado poder, como era o nosso: quequeria Sua Senhoria, que a guerra se acabasse por huma vez, seria nesrio meter mais cabedal; e que com este lhe parecia que estava cerultima vetoria: e poderamos ento fundar a cidade, que Sua Alteza prdia, afugentados por huma vez os Tamoyos pera seus sertes, o presidas por algum tempo as estncias martimas. Toda esta pratica de Josagradou muito a Mem de S, por-ser conforme s mais verdadeiras ncias,e experincia. O Bispo D. Pedro Leito ordenou logo de ordenscras ao Irmo Joseph, com grande alegria dos coraes de am bosBispo, porque estava vendo os servios de Deos que havio de resu

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    daquellas ordens a toda a Igreja do Brasil: de Joseph, porque deseempregar-se com mais fructo no servio das almas.

    89 Esperava-se com grande cuidado o padre IgnaCio d Azevedo,o anno passado dissemos fora eleito na Congregao de Roma por Visgeral d'esta Provncia (e foi o primeiro que teve) com grandes podergraas do Padre Geral, e de Sua Santidade o Papa Pk) Quinto, que governava a Igreja de Deo. Por este tempo tinha chegado de RomPortugal, buscado companheiros, embarcado-se pera o Brasil, centrseus desejos; e achava-se ento nas ilhas d Cabo verde. Aqui deo mde quem era, no publico, e no particular ajudando aquelles morador

    exerccio de nossos ministrios, per si, e per seus companheiros, comvvel fructo. Saha pelas praas, imitao de hum Xavier no Orienttoava o signal da Cruz, e aps elle ensinava a Doutrina Christa aos nos,e volta destes aos grandes, com melhoramento de muitos peccres.Ouvia-se como hum prego do Ceo n'aquella terra, com grande do espiritual de todo o povo, e do Bispo que ento era d'aquella Dieque pedio lh