CNIR - parecer - Sérgio Jacomino

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Tendo sido designado pela Presidência do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil para representar os interesses dos registradores brasileiros em reunião convocada pelo INCRA, em Brasília, realizada nos dias 23 e 24 de maio p. passado, apresento à consideração dessa I. Diretoria um relatório...

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São Paulo, 25 de maio de 2000.

Ao Ilustríssimo Senhor Dr. LINCOLN BUENO ALVES, Presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil São Paulo- SP.

Tendo sido designado pela Presidência do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil para representar os interesses dos registradores brasileiros em reunião convocada pelo INCRA, em Brasília, realizada nos dias 23 e 24 de maio p. passado, apresento à consideração dessa I. Diretoria um relatório preliminar dos trabalhos desenvolvidos e elenco de sugestões para encaminhamento do projeto.

A convite da Diretoria de Cadastro Rural do INCRA, o IRIB compareceu nos últimos dias 23 e 24 de maio em Brasília à reunião da comissão designada para definição do anteprojeto de lei que altera dispositivos da lei de Registros Públicos (Lei 6015/73) e de outros diplomas legais que elenca. O anteprojeto visa à criação do CNIR- Cadastro Nacional de Imóveis Rurais e prevê a troca de informações entre este Cadastro e o Registro de Imóveis.

O Irib foi representado pelos professores Andréa F. T. Carneiro e Jürgen Philips, que apóiam o Instituto nas questões técnicas relativas ao Cadastro e por mim, registrador designado pela Presidência. A reunião contou ainda com representantes da Diretoria de Cadastro do INCRA, ANO REG- Associação de Notários e Registradores do Brasil, ANOTER - Associação Nacional dos Órgãos Estaduais de Terra e Ministério Público Federal.

O anteprojeto de lei

O Ministro Raul Belens Jungmann Pinto, fez publicar no Diário Oficial da União a proposta de anteprojeto de lei sobre o Sistema Público de Registro de Terras, visando à maior publicidade e divulgação da proposta do Ministério de Desenvolvimento Agrário.

Foi instalada uma audiência pública para receber e encaminhar sugestões de aperfeiçoamento e alterações do anteprojeto, fixando a data limite de 1 O de junho para aproveitamento das sugestões e consolidação da proposta ministerial. Além disso, criou-se, no âmbito do INCRA, comissão especial para estudos e debates que vem se reunindo periodicamente, composta pelos técnicos do INCRA, ANOREG­BR, ANOTER e Ministério Público Federal, todos já referidos anteriormente.

O anteprojeto cria o Sistema Público de Registro de Terras, alterando dispositivos das Leis 4947/66, 5868/72, 6025/73, 9393/96, Decreto-lei 1989/82 e indiretamente altera dispositivos da lei das escrituras públicas, código civil e dá outras providências.

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Os trabalhos da Comissão

A Comissão a que se aludiu supra vem reunindo os seus membros para aprofundamento de uma proposta de consenso entre os diversos segmentos nela representados a ser consubstanciada num projeto que será encaminhado ao Congresso Nacional.

No que nos toca de perto, a ANOREG-BR foi desde o início representada pela registradora Léa Emília Braune Portugal, que em seus impedimentos e ausências indicou para representá-la seu oficial substituto.

O INCRA elaborou um documento - Cadastro Rural e Registro Imobiliário -como subsídio para as discussões técnicas que se foram sucedendo com a participação das entidades já referidas. O documento aponta vários tópicos para discussão, inclusive trazendo à baila inúmeros temas de grande pertinência aos serviços notariais e de registro.

Não tendo participado das reuniões anteriores, aparentemente as propostas foram analisadas detidamente pelos membros da comissão técnica, inclusive pela ANOREG-BR, tendo sido aproveitadas as sugestões em um novo documento que consubstanciou o anteprojeto já emendado, distribuído aos presentes. Por essa razão, abstemo-nos de tecer comentários acerca dos tópicos apresentados originariamente, cingindo-nos às discussões sobre o texto já consolidado, abaixo referido.

Foram produzidos ao longo desses trabalhos vários documentos, destacando-se:

a) Parecer da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" da Universidade de São Paulo, subscrito pelo Professor Jorge Gustavo da G. Raffo, que enfocou sua análise em dois aspectos fundamentais: ( 1) erronias técnicas nos conceitos utilizados como referência para o levantamento geodésico previsto no anteprojeto (vide abaixo alteração do artigo 176 da Lei 6015/73); (2) problemas relacionados com a capacitação técnica dos responsáveis técnicos pela medição e confecção dos memoriais a que se refere a lei (vide o mesmo artigo).

b) Parecer de Edvaldo Gomes, enfrentando o problema técnico e profissional relacionado com os levantamentos geodésicos.

c) Parecer técnico elaborado pela APEAESP - Associação Profissional dos Engenheiros Agrimensores no Estado de São Paulo. Outra peça técnica enfatizando a importância da perfeita identificação e localização dos imóveis rurais, princípio de toda racional ordenação fundiária.

d) Estudo da Universidade Federal de Viçosa - departamento de engenharia civil, subscrito pelo Prof. Antonio Simões Silva, enfocando aspectos técnicos do levantamento geodésico.

e) Documento intitulado Contribuições da ANOTER ao documento Cadastro Rural e Registro Imobiliário. O texto examina as propostas do INCRA detidamente, encarecendo a integração entre o cadastro fundiário do INCRA e os registros prediais brasileiros. Há no texto várias propostas que afetam o registro predial, em resumo, a saber:

1) Promoção de ações articuladas entre o INCRA, Corregedorias Gerais de Justiça, Ministério Público e OAB para se apurar as irregularidades nos descerramento de matrículas, adotando as medidas administrativas e judiciais previstas na Lei 6739/79. Corrigindo a proposta original do INCRA, a ANOTER reputa importante a participação de um dos maiores interessados no saneamento dos registros: os próprios registradores imobiliários.

2) Atribuição de legitimidade ao INCRA para requerer a unificação de imóveis e fusão de matrículas do mesmo proprietário;

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3) Alteração da Lei 6383/76, facultando ao Presidente da Comissão (previsto na Lei em comento) requerer a unificação das áreas que são objeto de discriminação e abertura de uma só matrícula, sem a cobrança de custas e emolumentos dos proprietários.

4) Medidas correcionais e rigor por parte das Corregedorias Gerais de Justiça -"medidas coercitivas", na dicção dos subscritores - para cumprimento das exigências relacionadas com a aquisição de imóveis rurais por estrangeiros.

5) Criação de regras exceptivas para a legitimação de posses no tocante a imóveis com área inferior à fração mínima de parcelamento;

6) Unificação dos cadastros - INCRA, Receita Federal e órgãos do governo; 7) Estabelecimento de procedimentos legais para averbação da reserva legal no registro

predial, não se permitindo novos registros em matrículas que têm por objeto imóvel rural sem a prévia constituição da reserva legal

8) Outras propostas de caráter geral que podem ser examinadas nos documentos anexos.

As intervenções do Irib

O encaminhamento dos trabalhos deu-se pela releitura do texto consolidado do anteprojeto, discutindo-se artigo por artigo, emendando-se o que necessário e ajustando as imprecisões que foram sendo detectadas.

Os recorrentes ajustes técnicos - principalmente no que se refere a imprecisões conceituais e de redação-, foram sendo discutidos e aprovados, figurando no anteprojeto consolidado, anexado a final. Por essa razão, não nos deteremos em seu ocioso detalhamento, bastando cotejar as duas versões.

Os aspectos me mereceram nossa melhor consideração foram os seguintes:

a)- Os requisitos da escritura pública

O anteprojeto concentra alterações legais que se irradiam em vários diplomas, alguns citados expressamente na ementa, outros não- e bastaria o exemplo da Lei 7433/85 e o próprio Código Civil, no respeitante a requisitos da escritura pública (art.134).

Essa estratégia de concentração e atração de disposições legais que são objeto de leis especiais atua no sentido de desarticulação da orientação sistêmica que se pretende imprimir à produção legislativa. Especialmente no caso dos notários, à míngua de um verdadeiro corpus legislativo, vivem esses profissionais há muito na expectativa de um código notarial que pudesse dar um suporte legal sistemático às suas atividades. É notória a dificuldade que se antepõe à atividade do notário consistente na profusão caótica de disposições legais esparsas atinentes à sua profissão e a seu labor técnico. Justamente por essa razão - e por outras, de política legislativa - se reputa essencial dar consistência ao primeiro diploma legal especial que trata das atividades dos notários brasileiros, fazendo tal alteração figurar entre os artigos da Lei 7433, de 18 de dezembro de 1985.

A oportunidade é excelente para fazer migrar do artigo 134 do Código Civil e da própria lei 4947/66 as disposições gerais sobre os requisitos da escritura pública, fazendo-os repousar na lei das escrituras tabelioas, robustecida com as alterações ora propostas.

b) - Retroalimentação do INCRA por dados dos cartórios

O art. 22 da Lei 4947/66, na redação proposta do § 7° do art. 22, prevê um mecanismo de retroalimentação do cadastro do INCRA através do envio de dados pelos registros prediais. Cria-se a obrigação de encaminhamento ao INCRA, mensalmente, das modificações ocorridas nas matrículas,

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decorrentes de "mudanças de titularidade, desmembramento, parcelamento, loteamento, remembramento ou retificação de área" envolvendo imóveis rurais.

O elenco é taxativo. Não estarão obrigados os registradores ao envio de outras mutações sofridas pelo imóvel - como a oneração com servidões administrativas, tais quais as reservas legais, reputadas pelo INCRA como elemento de grande importância para o gerenciamento fundiário. Além disso, ficam de fora dessa comunicação os imóveis que estréiam no fólio, passando de uma realidade extrarregistral para os rigores da publicidade imobiliária. Tal se dá com os imóveis discriminados, usucapidos e o début daqueles imóveis que, figurando em longevos títulos, não estavam sujeitos ao registro. Tinham direito "ao não registro", na expressão de Walter Ceneviva.

As ações judiciais que têm por objeto bens imóveis, além da retificação de registro já referida, repercutem no registro predial. Basta verificar o caso das demarcatórias, desapropriações totais ou parcelares de imóveis não matriculados, especialmente daqueles cuja origem é incerta, onde não há propriamente mudança de titularidade tabular, sem falar das discriminatórias, já referidas, e da hipótese remota, mas não improvável, de matriculação de bens de domínio público, que dispensam a via judicial, consoante entendimento de Afrânio de Carvalho.

Ficam de fora, além das reservas legais cujo interesse avulta para o INCRA, outras servidões administrativas que podem interferir com a especialização do imóvel rural, bem assim as passagens de estradas, vias públicas, tombamentos e outras ocorrências que desfiguram o bem imóvel.

c) - O itinerário inverso e o caso do tombamento

O INCRA encaminhará mensalmente aos serviços de registro de imóveis os códigos dos imóveis rurais para serem averbados de oficio nas matrículas. Diz o texto proposto: "inclusive daqueles objetos de tombamento, parcial ou total, por órgão competente da administração pública".

Embora não tenha sido objeto de maiores discussões, é de se notar que o mecanismo proposto de "retroalimentação" de dados pelos registros prediais e INCRA parte de um pressuposto lógico que se não coaduna com a proposta de criação de um Sistema Público de Registro de Terras. Principalmente não quadra com a idéia que parece informar a proposta de integração entre os cadastros físicos e os registros prediais. O caminho deveria ser o inverso: o cadastro supriria o registro com os dados atinentes ao imóvel como realidade física e o registro supriria o cadastro com a realidade jurídica. Aqueles provêm à mutação objetiva; estes às jurídicas, numa implicação recíproca, conformando a interconexão entre o cadastro e o registro. O fato é que nem os registradores serão capazes de avaliar as peças técnicas elaboradas com o rigor técnico previsto na redação proposta do art. 176 da Lei 6025/73 - memoriais e mapas georrefenciados- nem os técnicos do INCRA deveriam se ocupar das mutações jurídicas da propriedade. A própria idéia de retornar o número de cadastro para o registro, indica já o protótipo de chave lógica para acesso e determinação do imóvel alhures. O lógico, portanto, é que esse número de cadastro pudesse referenciar um corpo físico preciso e determinado cujos atributos pertencem aos domínios de um órgão técnico, especialmente aparelhado para a determinação do bem. Somente por referência- o número do cadastro - o registro predial aludiria ao imóvel, cuja descrição é simples reprodução narrativa dos dados georreferenciados depositados em meios eletrônicos no órgão cadastral.

Enfim, o output dos dados georreferenciados deveria ser o próprio INCRA e não os registros públicos, pela via da especialização do bem consoante previsto no art. 176 da LRP.

Mas consente-se que é um bom início. Na verdade, o INCRA parte de uma constatação inquestionável: há uma verdadeira balbúrdia fundiária, com superposição de glebas, imperfeições descritivas, fraudes e outras mazelas já denunciadas. A iniciativa, portanto, é elogiável sob todos os aspectos e merece ser estudada com o maior afinco e rigor.

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Uma última palavra acerca das reservas legais e dos tombamentos.

Em primeiro lugar é preciso assinalar que as reservas legais e os tombamentos são institutos distintos embora certa doutrina inscreva tanto um quanto outro no gênero servidões administrativas. É o caso do Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello na sua conhecida obra (Curso de Direito Administrativo, 12a ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 677 passim). Já Narciso Orlandi Neto defende que a reserva legal é simplesmente uma limitação ambiental à propriedade, restrição administrativa, na sua dicção (RDI 42). A importância da distinção avulta na consideração de que uma outra categorização dará ensanchas a indenização.

Não é objetivo deste relatório dissecar as distinções acadêmicas e doutrinárias que vincam uma e outra espécie. Basta que se consinta que são institutos distintos.

O tombamento "é a declaração pelo Poder Público do valor histórico, artístico, paisagístico, turístico, cultural ou científico de coisas ou locais que, por essa razão, devam ser preservados, de acordo com a inscrição em livro próprio", na definição clássica de Hely Lopes Meirelles, aproveitando a redação do artigo 1° do Decreto-lei 25/37.

Já a reserva legal vem prevista no Código Florestal (Lei 4771/65) e limita o uso de propriedade em regiões protegidas, restringindo a utilização de parte certa e localizada de cada imóvel.

Tanto uma como outra são objeto de registro - ao contrário do sustentado na reunião. Uma encontra seu fundamento legal no próprio Código Florestal (§ 2° do art. 16 da Lei 4 771 /65). Outra no Decreto-lei 25/37 (artigo 13, que determina a inscrição do ato de tombamento no livro a cargo do oficial de registro de imóveis- hoje registrada no livro 3 e averbada na matrícula).

Mas a qual das espécies estaria se referindo o INCRA? Parece-nos que o INCRA tem especial interesse nas reservas legais, já que o próprio IBAMA será um dos parceiros na constituição do cadastro multifinalitário que se insinua nas discussões.

Então, a proposta feita por nós resume-se a acrescentar essa modalidade de mutação averbável entre os dados que serão enviados ao INCRA.

d) -A retificação unilateral do registro.

Talvez o problema mais agudo a ser enfrentado pelos membros da comissão resida na redação proposta do art. 176 da LRP.

De fato, pela proposta, "nos casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais, a identificação prevista ( ... ) será obtida a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica - ART, contendo as distâncias e azimutes verdadeiros entre os vértices, as coordenadas do ponto inicial georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro expressas até o segundo, se geográficas, ou expressas até metro, se Universal Transversa de Mercator- UTM, sempre acompanhada do respectivo meridiano central".

À parte a imprecisão técnica apontada de forma irretorquível pelos Professores Jürgen Philips e Andréa Carneiro, representando o IRIB na parte técnica, (vide documento que faz parte integrante deste relatório), a alteração proposta dá azo a que se lute debalde pela eficácia plena do dispositivo, pois, como se verá, da maneira como redigido, o acesso desses memoriais demandará, na esmagadora maioria dos casos, a prévia retificação judicial de registro.

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Os professores chamaram a atenção para a incoerência, existente na proposta publicada no Diário Oficial, entre as grandezas dos valores das coordenadas exigidos, que acarretaria a possibilidade de escolha pelo levantamento de menor custo, portanto de menor precisão. Sugeriu-se que a exigência das coordenadas deveria ser feita através da definição de precisão, de forma a atender às necessidades de todos os usuários das informações, inclusive do Registro de Imóveis. Além desta alteração, outra proposta importante foi a da inclusão do georreferenciamento dos resultados dos autos judiciais, que não estava previsto na proposta inicial. Todas as alterações de ordem técnica foram consideradas necessárias e aprovadas pelos integrantes da comissão, ficando o valor da precisão a ser regulamentado pelo INCRA, de modo a se evitar as superposições de imóveis, um dos principais objetivos do anteprojeto.

Do ponto de vista do registro imobiliário, entretanto, a redação proposta vai acarretar enormes confusões e mal entendidos. O principal deles, sem dúvida, será a ociosa discussão sobre a necessidade de prévia retificação judicial de registro toda vez que houve qualquer desmembramento ou unificação das glebas, com inserção unilateral de novos dados geodésicos.

Ainda que o imóvel esteja descrito e caracterizado de maneira aceitável - preenchidas as formalidades da atual LRP - quando sofrer qualquer seccionamento ou remembramento, com a inserção dos elementos que não constam do registro anterior, tal fato poderá acarretar a necessidade da retificação, tendo em conta que as coordenadas geodésicas podem ensejar linhas de perímetro que podem interferir em imóveis lindeiros. Portanto patente a potencialidade de gravabilidade em direitos de terceiros.

Argumenta-se com o levantamento técnico, elaborado de tal sorte que haja uma perfeita congruência entre o que consta do registro e o que se acha no solo, de tal modo que a nova descrição somente aperfeiçoaria as deficiências notórias do registro público.

Contudo, não nos podemos esquecer que o registro, enquanto não cancelado, produz todos os seus regulares efeitos, consoante regra do art. 214 da Lei 6015/73. É o chamado princípio de legitimação. Até que se retifiquem todos os imóveis, na forma preconizada, haverá sempre potencialidade de conflitos entre os dados levantados e os registros dos confinantes. Tal fato torna-se ainda mais nítido quando sabemos - reconhecidamente até pelos documentos do INCRA -que há superposição de glebas, total ou parcial, o que levará a conflitos que só o judiciário poderá solver.

Como, então, parcelar ou remembrar, com inserção de novos dados, sem que os confinantes sejam cientificados?

Não nos esqueçamos que abertura de matrícula de imóvel deficientemente descrito é concessão que se faz ao imperfeito sistema do Decreto 4857/39. Mas a matrícula será obstada se acaso o imóvel imperfeitamente descrito ensejar desmembramento ou remembramento.

Os tribunais brasileiros decidem nessa mesma direção.

Vale a pena conhecer o teor de um acórdão que se tornou paradigma para os registros feitos pela técnica do fólio real. Já em 1979, o Des. Andrade Junqueira anotava: "A fixação de linhas, pontos, metragens e ângulos tão minuciosos quanto o são os decorrentes de levantamento topográfico alberga a possibilidade de prejuízo aos confrontantes se tais elementos não constam do registro anterior. O unilateral posicionamento físico desenhado pode não corresponder à figuração originária, determinada pelos elementos individuantes da matrícula, donde a gravabilidade teórica de terceiros diante da possibilidade de deslocamento de linhas, deformação da figura geométrica e invasão de propriedade lindeiras". (in Decisões do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, jan. 78- fev. 81, Narciso Orlandi Neto, ementa 317, São Paulo, Saraiva).

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Nem mesmo levantamento pericial levado a efeito em processo de inventário é suficiente para inserção unilateral de dados (Ap. Civ. 682-0, DOJSP 13.jan.l982).

A orientação permanece firme e uniforme.

Ainda recentemente a Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo decidiu que se não admite a criação de nova unidade imobiliária contendo descrição perfeita, por fusão de matrículas, quando um dos imóveis unificados não dispõe de todas as medias tabulares. E mais: imóvel com figura imprecisa não pode gerar, por fusão ou desmembramento, nova unidade (matrícula) com figura e descrição precisas. (Processo CG I 002/97, DOJSP de 2.jul.l997, Taubaté).

De outra decisão se extrai que o interessado não pode incluir no cadastro alteração unilateral das características do imóvel. Consente que a matrícula possa ser descerrada com exata coincidência com o registro anterior, mas um imóvel com figura geodésica imprecisa não pode gerar, por fusão ou desmembramento, nova matrícula com figura e descrição geodésica precisas. (Processo CG 1241/96, DOJSP. 7.jun.l996, Jundiaí).

O Conselho Superior da Magistratura também é firme na mesma direção, afastando inclusive alteração unilateral que conste de títulos judiciais. Confiramos: "não se admite penhora sobre parte certa e determinada de gleba maior com inovação descritiva, inserção de medidas perimetrais, rumos e ângulos de intersecção. Tal afronta o princípio de especialidade". (Ap. Civ. 16923-0/4, DOJSP 24.jun.l993, Rei. Des. Weiss de Andrade).

Há centenas de outras decisões no mesmo diapasão. Dispenso-me de enumerá-las, brevitatis causa.

Enfim, a redação proposta, mesmo com as emendas sugeridas pelo IRIB, através dos Professores Jürgen Philips e Andréa Carneiro, padece de vício que vai inocular nos procedimentos relacionados com o levantamento geodésico o vírus da litigiosidade potencial, demandando sempre, pela atual sistemática, o remédio judicial.

A proposta que se faz é dispensar a retificação de registro, quando os confrontantes tabulares (com os títulos registrados) manifestarem-se administrativamente, concordando com os termos do levantamento, fixando a responsabilidade administrativa, civil e penal do profissional encarregado dos levantamentos geodésicos.

Propõe-se, ainda, que a redação do artigo 176 possa ser discutida amplamente com a ANOREG­BR e especialmente com o consultor jurídico, Dr. Gilberto Valente da Silva.

Era o que me competia informar ao Presidente, o que faço com minhas cordiais saudações.

São Paulo, junho de 2000.

Sérgio Jacomino, Registrador.

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MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO

GABINETE DO MINISTRO

DESPACHO DO MINISTRO

O Ministro de Desenvolvimento Agrário, nos termos do art. 15 do Decreto n° 2.954, de 29 de janeiro de 1999, torna pública a proposta de anteprojeto de lei sobre o "Sistema Público de Registro de Terras" que altera dispositivos das Leis n°s. 4.947, de 6 de abril de 1966, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, Decreto-lei n° 1.989, de 28 de dezembro de 1982, Lei n° 9.393, de 19 de dezembro de 1996.A relevância da matéria recomenda a ampla divulgação da proposta, a fim de que todos possam contribuir para o seu aperfeiçoamento. Sugestões deverão ser encaminhadas, até 30 dias após a publicação deste, ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, Diretoria de Cadastro Rural, Ed. Palácio do Desenvolvimento 17° andar, Setor Bancário Norte, CEP 70057-900, Fax OXX-61-326-5687 e para o SITE www.incra.gov.br no LINK Sistema Público de Registro de Terras/ Audiência Pública.

RAUL BELENS JUNGMANN PINTO

ANEXO

Anteprojeto de Lei

Altera dispositivos das Leis n°s 4.947, de 6 de abril de 1966, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 6.0 15, de 31 de dezembro de 1973, Decreto-Lei no 1.989, de 28 de dezembro de 1982, Lei no 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e dá outras providências.

O Congresso Nacional decreta:

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1 o Os art. 20 e 22 da Lei n° 4.947, de 6 de abril de 1966, passam a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 20- Ingressar e permanecer sem autorização dos seus órgãos competentes, em terras da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ou de suas entidades vinculadas.

Pena: Detenção de seis meses a três anos, ou multa.

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§ 1 o As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço, quando houver a intenção de ocupar as terras a que se refere o caput.

§ 2° As penas cominadas neste artigo não se aplicam à ocupação de boa fé e comprovadamente de caráter sócio-econômico, assim entendidas as situações previstas no art. 102, da Lei n° 4.504, de 1964, e no art. 29 da Lei n° 6.383, de 7 de dezembro de 1976, respeitada a propriedade familiar, desde que não ocorra em área de floresta primária ou de preservação permanente".

"Art. 22 ................................................................................................................................... .

§ 3° A apresentação do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural - CCIR, exigida neste artigo e nos parágrafos anteriores, far-se-á, sempre, acompanhada prova de quitação do pagamento de Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR.

§ 4° Dos títulos de domínio destacados do patrimônio público constará obrigatoriamente o número de inscrição do CCIR, nos termos da regulamentação desta Lei.

§ 5° Nos casos de usucapião, o juiz intimará o INCRA do inteiro teor da sentença, para fins de cadastramento do imóvel rural.

§ 6° Além dos requisitos previstos no art. 134 do Código Civil e na Lei no 7.433, de 18 de dezembro de 1985, os serviços notariais são obrigados a mencionar nas escrituras os seguintes dados integrantes do CCIR:

I -código do imóvel; 11 - nome do detentor; III - nacionalidade do detentor;

IV- denominação do imóvel; e V -localização do imóvel.

§ 7° Os serviços de registro de imóveis são obrigados a encaminhar ao INCRA, mensalmente, as modificações ocorridas nas matrículas imobiliárias decorrentes de mudanças de titularidade, desmembramento, parcelamento, loteamento, remembramento oo retificação de área,

envolvendo os imóveis rurais, inclusive os destacados do patrimônio público.

§ 8° O INCRA encaminhará mensalmente aos serviços de registro de imóveis, os códigos dos imóveis rurais de que trata o parágrafo anterior, para ser averbados de ofício, nas respectivas matrículas , inclusiv0 daqu0l0s obj0to d0 tombam0nto, parcial ou total, por órgão comp0t0nt0 da administração pública."

Art. 2° Os art. 1°, 2°, 3° e 8°, da Lei n° 5.868, de 12 de dezembro de 1972, passam a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 1 ° ............................................................................................................................... .

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§ 1 o As revisões gerais de cadastros de imóveis a que se refere o § 4° do art. 46 da Lei n° 4.504, de 30 de novembro de 1964, serão realizados em todo o País nos prazos fixados por ato do Poder Executivo, para fins de recadastramento, e de aprimoramento do Sistema de Tributação da Terra- STT e do Sistema Nacional de Cadastro Rural - SNCR.

§ 2° Fica criado o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais - CNIR, que terá uma base comum de informações, gerenciada conjuntamente pelo INCRA e Secretaria da Receita Federal -SRF, produzida e compartilhada pelas diversas instituições públicas federais e estaduais produtoras e usuárias de informações sobre o meio rural brasileiro.

§ 3° Além d~ informaçõ~s mínimas~ ~strutHrais, a s~r d~finidas ~m r~gülam~nto, a base comum do CNIR adotará um código único, a ser institüído por ato conjunto do INCRA e da SRF, para os imóveis rurais cadastrados que facilit~ a sua identificação e o compartilhamento das informações entre as instituições participantes.

§ 4° Farão, também, parte do CNIR, as bases próprias de informações produzidas e gerenciadas pelas instituições participantes, constituídas por dados específicos de seus interesses, que poderão por elas ser compartilhados, respeitadas as normas regulamentadoras de cada entidade."

"Art. 2 o .................................................................................................................................. .

§ 3° Ficam também obrigados todos os proprietários, os titulares de domínio útil ou os possuidores a qualquer título a atualizar a declaração de cadastro sempre que houver alteração nos imóveis , em relação à área ou à titularidade, bem como nos casos d~ tombam~nto para fins de preservação, conservação e proteção de recursos naturais.

§ 4° Quando duas ou mais áreas rurais contíguas, pertencentes ao mesmo proprietário, constarem de matrículas autônomas, ou de transcrições anteriores à Lei n° 6.0 15, de 31 de dezembro de 1973, ou se encontrarem registradas por ambos os sistemas, poderá o INCRA notificar o proprietário para proceder à unificação das matrículas no registro de imóveis."

"Art. 3° .................................................................................................................................... .

Parágrafo único. Os documentos expedidos pelo INCRA, para fins cadastrais, não fazem prova de propriedade ou de direitos a ela relativos, ainda que neles constem referências a termos de reconhecimento, cartas de sentença, ou qualquer outro documento originário do Poder Público."(NR)

"Art. 8° .................................................................................................................................... .

§ 3° São considerados nulos e de nenhum efeito quaisquer atos que infrinjam o disposto no presente artigo, não podendo os serviços notariais lavrar escrituras dessas áreas, nem ser tais atos registrados nos Registros de Imóveis, sob pena de responsabilidade administrativa, civil e criminal de seus titulares ou prepostos."(NR)

Art. 3° Os arts. 169 e-176, vigorar com as seguintes alterações:

da Lei no 6.0 15, de 31 de dezembro de 1973, passam a

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"Art. 169 ................................................................................................................................ .

11 -os registros relativos a imóveis situados em comarcas ou circunscrições limítrofes, que serão feitos em todas elas, devendo os registros de imóveis fazer constar dos títulos registrados tais ocorrências".(NR)

"Art. 176 .................................................................................................................................. .

3) a identificação do imóvel, que será feita mediante:

a) se rural, o código do imóvel, os dados constantes do CCIR, denominação e a indicação de suas características, confrontações, localização e área.

b) se urbano, indicação de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e sua designação cadastral, se houver.

§ 3° Nos casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais a identificação prevista no § 1°, 11, 3, "a" será obtida a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica- ART, contendo as distâncias @ azimut@s V@rdad@iros @ntr@ os vértic@s, as coord@nadas do ponto inicial g@orr@fer@nciadas ao ~ist@ma Ü@odésico Brasil@iro @Xpr@ssas até o s@gundo, S@ g@ográficas; ou @Xpr@ssas até m@tro, S@ Univ@rsal Transv@rsa d@ M@rcator UTM, S@mpr@ acompanhada do F@Sp@ctivo m@ridiano C@ntral.

Art. 4° O art. 2°, do Decreto-lei n° 1.989, de 28 de dezembro de 1982, passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 2 ° ................................................................................................................................... .

a) quanto aos imóveis rurais com área até 20 ha (vinte hectares): à razão de 2 (duas) UFIR vigentes ao início do exercício correspondente;

b) quanto aos imóveis rurais com área acima de 20 ha (vinte hectares) e até 1.000 ha (mil hectares): ao cálculo procedido na forma da alínea "a", acrescentar-se-ão 2 (duas) UFIR para cada 50 ha (cinqüenta hectares) ou fração excedente;

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Page 12: CNIR - parecer - Sérgio Jacomino

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c) quanto aos imóveis rurais com área acima de 1.000 ha (mil hectares): ao cálculo procedido na forma da alínea "b", acrescentar-se-ão 2 (duas) UFIR para cada 1.000 ha (mil hectares) ou fração excedente." (NR)

Art. 5° O art. 16 da Lei n° 9.393, de 19 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte alteração:

"Art. 16 ................................................................................................................................... .

§ 3° A Secretaria da Receita Federal, com o apoio do INCRA, administrará o CAFIR e o colocará à sua disposição com as informações nele contidas para fins de levantamento, pesquisas e proposição de ações administrativas e judiciais." (NR)

Art. 6° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, de de 2000. 179° da Independência e 112° da República

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