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Recife, 2012 Conceitos de Física UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO (UFRPE) UNIDADE ACADÊMICA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E TECNOLOGIA (EADTec/UFRPE) Domingos Sávio Pereira Salazar Volume Único

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Material do curso de especialização física Ensino de Ciências e matemática.

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Recife, 2012

Conceitos de Física

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO (UFRPE)

UNIDADE ACADÊMICA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E TECNOLOGIA (EADTec/UFRPE)

Domingos Sávio Pereira Salazar

Volume Único

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Universidade Federal Rural de Pernambuco

Reitor: Prof. Valmar Corrêa de AndradeVice-Reitor: Prof. Reginaldo BarrosPró-Reitor de Administração: Prof. Francisco Fernando Ramos CarvalhoPró-Reitor de Extensão: Prof. Paulo Donizeti SiepierskiPró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Prof. Fernando José FreirePró-Reitor de Planejamento: Prof. Rinaldo Luiz Caraciolo FerreiraPró-Reitora de Ensino de Graduação: Profª. Maria José de SenaCoordenação Geral de Ensino a Distância: Profª Marizete Silva Santos

Produção Gráfica e EditorialCapa e Editoração: Rafael Lira, Italo Amorim e Everton FelixRevisão Ortográfica: Elias VieiraIlustrações: Igor Leite e Mário FrançaCoordenação de Produção: Marizete Silva Santos

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Sumário

Apresentação ................................................................................................................. 4

Conhecendo o Volume ................................................................................................... 5

Capítulo 1 – Mecânica Clássica: Cinemática .................................................................... 7

1.1 Grandezas Físicas e Unidades de Medida ................................................................10

1.2 Ordem de Grandeza .................................................................................................12

1.3 Análise Dimensional ................................................................................................14

1.4 Cinemática: Movimento Unidimensional ................................................................17

1.4.1 Movimento Uniforme .....................................................................................22

1.4.2 Movimento Uniformemente Variado (MUV) ..................................................26

Capítulo 2 – Mecânica Clássica: Dinâmica .................................................................... 36

2.1 Princípio da Relatividade de Galileu ........................................................................36

2.2 As Leis de Newton ...................................................................................................41

Capítulo 3 – Trabalho e Energia Mecânica .................................................................... 69

3.1 Energia Cinética .......................................................................................................69

3.2 Teorema do Trabalho – Energia Cinética .................................................................73

3.3 Tópico Avançado: Produto Escalar ...........................................................................78

3.4 Energia Potencial .....................................................................................................79

3.5 Sistemas Conservativos ...........................................................................................81

3.6 Potência Média ........................................................................................................83

Conheça o Autor .......................................................................................................... 89

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Apresentação

Caro(a) cursista,

Seja bem-vindo(a) à disciplina de Conceitos de Física. Nesta disciplina, vamos estudar conceitos de Mecânica Clássica, começando pelo estudo das grandezas físicas. Em seguida, vamos entender como podemos descrever um movimento a partir de uma função posição. O primeiro capítulo também trata de velocidade e aceleração, completando o assunto de cinemática. Depois, passaremos ao estudo da Dinâmica, marcado pelo conceito de Força, onde resolveremos aplicações simples destes princípios.

O segundo capítulo trata das consequências da aplicação da Mecânica Clássica ao problema da Gravitação. Vamos estudar o satélite natural da Terra, o sol, nosso sistema solar, a órbita da Terra e curiosidades sobre o Universo.

Bons estudos!

Domingos Sávio Pereira Salazar

Professor Autor

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Conhecendo o Volume

Conceitos de Física – Mecânica Clássica

Carga Horária do Volume: 60h/aula.

Objetivo da disciplina: Introduzir conceitos de grandeza física, ordem de grandeza, cinemática, dinâmica qualitativamente para uma formação suficiente dos docentes nos conteúdos de Física na Licenciatura Interdisciplinar em Ciências Naturais.

Conteúdo Programático

» Grandezas Físicas: A matemática da Natureza;

» Cinemática: Movimento Uniforme e Movimento Uniformemente Variado;

» Dinâmica: Causas do Movimento;

» Leis de Newton;

» Trabalho e Energia;

» Leis de Conservação.

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Capítulo 1

O que vamos estudar neste capítulo?

Neste capítulo, vamos estudar os seguintes temas:

» Grandezas Físicas: A matemática da Natureza

» Cinemática: O estudo do movimento unidimensional (Movimento Uniforme e Uniformemente Variado)

Metas

Após o estudo deste capítulo, esperamos que você consiga:

» Compreender o papel da Física, sobretudo da Mecânica como estudo do movimento.

» Resolver problemas simples que utilizem a matemática para problemas de cinemática.

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Capítulo 1 – Mecânica Clássica: Cinemática

Vamos conversar sobre o assunto?

Você já deve ter percebido que as frutas caem das árvores da mesma maneira. Desde quando você era criança até hoje, você nunca deve ter visto uma fruta que caísse da árvore e fizesse algumas piruetas no ar antes de atingir o chão. Nós estamos tão acostumados com a regularidade da natureza, isto é, com o fato dos fenômenos naturais se repetirem da mesma maneira, que não paramos para refletir como isto é fantástico. Estou fazendo um convite bem modesto, gostaria apenas que você sentasse um pouco para refletir comigo sobre este assunto. Você tem anos de experiência neste tema, afinal, desde criança você brinca com a natureza.

Inicialmente, vamos utilizar o termo natureza para representar tudo que você pode ver ou tocar. Por exemplo, a escola, as árvores, as ruas, os carros, as pessoas, o sol, a lua e a Terra fazem parte da natureza. Para começarmos nossa conversa, tente lembrar momentos em que um colega arremessou uma bola em sua direção. Algumas vezes você conseguiu desviar, outras vezes você agarrou a bola no ar, mas, se você não é um vidente, como conseguiu fazer isso? Bem, antes de responder a essa pergunta, vou inventar um personagem. Sempre que possível, faremos perguntas a ele. O nome dele é Luka, uma criança esperta e bem aventureira. Ele vai nos ajudar a resolver este mistério. E já começa respondendo a nossa pergunta sobre o arremesso da bola:

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É verdade. Não precisamos ser um vidente para adivinhar onde a bola vai cair. Mas precisamos treinar um pouco antes de acertar, certo?

Pronto. Vamos utilizar estas duas respostas para aprender duas lições básicas sobre a natureza. Primeiramente, assim como as frutas caem das árvores de maneira muito parecida e as crianças agarram uma bola que viaja pelo ar, existem muitos fenômenos da natureza que acontecem de maneira regular, ou seja, acontecem sempre da mesma maneira. Esta invariância ou regularidade dos fenômenos naturais faz com que as pessoas consigam prever aproximadamente o que acontecerá em certas situações que elas já viram antes. Assim, diante de um fenômeno que você já evidenciou algumas vezes, você conseguiria dar um bom palpite do resultado caso o fenômeno aconteça de novo. Cientes disso, os cientistas começaram a surgir como pessoas que conseguiam explicar certos fenômenos com maior precisão, simplesmente porque eles aconteciam sempre da mesma maneira. Por exemplo, se quando soltamos um corpo ele sempre cai até o chão e este fenômeno sempre se repete quando soltamos um corpo, seria interessante registrar este fato para que pessoas possam usá-lo sempre que precisarem. Claro que este exemplo é muito simples, mas ilustra o funcionamento da ciência, sobretudo da Física. Podemos dizer que:

A Física é a ciência que estuda a natureza e tudo que nela existe, através de teorias, ou modelos, que fazem previsões dos fenômenos.

Imagine como seria confuso se a natureza não apresentasse esta regularidade que comentamos acima. Por exemplo, suponha que você solte uma maçã da sua mão e ela suba até o teto da sala sem ninguém jogá-la para cima, mas suponha que este fenômeno só acontecesse às vezes. Você nunca saberia o que esperar de uma maçã que cai, já que seu comportamento não seria algo regular. Seu comportamento não obedeceria a nenhum padrão. Se as nossas atividades diárias não tivessem esta regularidade, a Física não poderia surgir da maneira que conhecemos hoje. Não teríamos capacidade de previsão e Luka não conseguiria agarrar nenhuma bola. Vamos resumir nossa conversa até aqui em uma lição:

A criação da Física (como conhecemos hoje) deve ter sido possível graças à

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regularidade dos fenômenos naturais.

Podemos aprender mais uma lição. Esta lição diz respeito ao fato do irmão de Luka ser ruim de bola. Se Luka consegue adivinhar onde a bola vai cair com alguma precisão, foi porque já viu esta mesma bola ser lançada por seus colegas várias vezes. Como o comportamento da natureza é quase sempre o mesmo para uma mesma situação, isto faz com que Luka consiga prever sem surpresa o que vai acontecer. O mesmo não seria possível quando Luka chama seu irmão mais novo para brincar, pois o pequeno ainda não está acostumado. Este último não treinou o suficiente para agarrar a bola. A natureza só pode ser compreendida através de experimentos, ou seja, precisamos fazer uma experiência para saber como a natureza se comporta e elaborar nossas teorias. De posse apenas do livre pensamento, podemos tentar imaginar como um fenômeno acontece, mas só a partir da experiência que podemos comprovar como ele realmente ocorre na prática. Esta é a segunda lição sobre as ciências da natureza:

A Física é uma ciência experimental. Isto significa que os cientistas precisam fazer experiências práticas ou observacionais para entender como a natureza funciona.

Essas duas lições são ideias bem simples, mas norteiam todos os fundamentos das ciências naturais. Você deve estar pensando: se a Física estuda todos os fenômenos da natureza, por que existem outras ciências, como química e biologia? Na verdade, a Física realmente se propõe a estudar todos os fenômenos da natureza, mas historicamente houve uma divisão dos fenômenos em classes distintas. A Física ficou responsável pelos fenômenos mais gerais da natureza, do ponto de vista microscópico e macroscópico. Por exemplo, a Física estuda o movimento dos corpos, a luz, a eletricidade, o magnetismo, o movimento dos fluidos, a temperatura e o calor, as ondas, movimento dos planetas dentre outros assuntos. As reações químicas e os organismos vivos, para citar um exemplo, ficaram sob a responsabilidade da química e da biologia, respectivamente, apesar de serem processos e entidades da natureza. Por isso, a Física serve como base para muitos destes estudos e são comuns os químicos e biólogos que recorrem ao estudo da Física para interpretar algumas situações que acontecem em suas pesquisas.

Essa aparente confusão entre a divisão arbitrária dos assuntos das ciências naturais é uma ilusão. A divisão só existe nas nossas cabeças, pois fomos treinados a rotular os conhecimentos em grupos distintos. A realidade natural é apenas uma. Por outro lado, a divisão nos serve nos estudos iniciais, para que não misturemos nossas ideias e possamos estudar um pouco de tudo, mas, no campo da pesquisa, o que existe é uma grande interdisciplinaridade. Um físico pode fazer um trabalho de matemática, ou criar um modelo de biologia ou explicar um complicado processo químico. Neste curso, vamos abandonar um pouco a velha ideia de que a Física é apenas aquele conjunto limitado de assuntos e vamos passar a ter uma compreensão mais moderna das ciências naturais como campo interdisciplinar. É verdade que, para atingir este nível, precisamos conversar um pouco mais sobre fenômenos naturais bem simples que existem no nosso cotidiano.

O primeiro desses assuntos será chamado de Mecânica Clássica. O nome ficará claro mais adiante, mas podemos adiantar que nós estudaremos inicialmente o movimento, que é, para algumas pessoas, o que existe de mais fundamental neste mundo complicado em que vivemos. Além de compreender mais sobre o movimento, este capítulo será o palco do nosso primeiro contato com a Física. Você vai perceber que a maneira como abordamos os estudos e nosso jeito de pensar e resolver problemas se repetirão ao longo das demais disciplinas do curso. Também tenho como objetivo criar um ambiente para que você experimente um pouco a sensação de pensar como um cientista. Nossa primeira etapa neste processo será uma rápida parada na conceituação de Grandezas Físicas.

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1.1 Grandezas Físicas e Unidades de Medida

Até aqui, você entendeu que a Física é a ciência que estuda a natureza e que ela surgiu a partir da observação que os fenômenos naturais são regulares. Além disso, você viu que ela precisa de experimentos para comprovar suas teorias. No entanto, qual a relação entre esses conceitos simples que introduzimos acima e as previsões das teorias da física? Bem, existe uma relação direta. Vamos descobrir esta relação a partir de um exemplo prático. Vamos verificar o que aconteceu hoje na casa de Luka. Sua mãe pediu que ele comprasse frutas. Luka saiu de casa feliz da vida, mas chegou à feira e ficou na dúvida:

Luka está certo, sua mãe se esqueceu de especificar os tipos de frutas que ela queria e a quantidade de cada uma delas. Ele está vivendo um dilema parecido com o nosso, pois precisamos explicar e prever fenômenos regulares da natureza, mas ainda não dispomos, assim como ele, de informações suficientes para isso.

Existe uma maneira bem conhecida para lidar com o problema que Luka enfrentou na feira. Esta maneira é composta de duas partes, a primeira delas é especificar quais os tipos de frutas que sua mãe gostaria que ele comprasse. A segunda parte é especificar a quantidade de cada fruta ele deve comprar. Por exemplo, a situação seria mais agradável se a mãe pedisse duas maçãs e três laranjas.

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Vamos tentar acompanhar como toda essa conversa se encaixa no vocabulário da Física. Se o conteúdo da sacola de frutas de Luka fosse um objeto que estudamos em Física, diríamos que ela é descrita por duas Grandezas. Uma das grandezas poderia ser chamada de maçãs e, neste caso, teria o valor de “maçãs = 2”. A outra grandeza poderia ser chamada de laranjas e teria o valor de “laranjas = 3”. Estas duas informações seriam suficientes para descrever a situação.

Em Física, uma grandeza é uma propriedade geralmente associada a um objeto que serve para descrevê-lo. Geralmente esta grandeza está associada a um valor numérico (ou categórico, mas deixemos esta observação para outra oportunidade), que depende do objeto que estamos estudando. Assim como maçãs e laranjas são as grandezas que descreveram a sacola de frutas de Luka, os valores associados a estas duas grandezas não são iguais para todas as sacolas. É claro que sacolas diferentes possuem diferentes valores de maçãs e laranjas. Mas, se uma sacola possuir os mesmos valores destas duas grandezas, pode-se afirmar que esta sacola deve ter um conteúdo parecido com a de Luka.

Você deve ter percebido como a matemática entrou de forma sutil na descrição da natureza. Os números surgiram pela necessidade dos homens de contar. Caso eles não conseguissem expressar quantidades (e operar matematicamente estas quantidades) tudo seria uma grande confusão. Atribuindo valores numéricos às grandezas do problema, nós podemos entender o que está acontecendo e, finalmente, chegar a teorias mais precisas. Mas como escolhemos quais grandezas são importantes para explicar uma situação?

Bem, em geral esta tarefa é bem intuitiva. Por exemplo, no caso da sacola de frutas, você sabia que o problema de Luka estava justamente em saber o tipo e quantidade de cada fruta que sua mãe gostaria. Por isso, selecionamos grandezas (maçãs e laranjas) capazes de fornecer exatamente a informação necessária. Por exemplo, quando ganhamos ou perdemos “peso”, ficamos de olho na balança da farmácia, pois sabemos que a informação que aparece naquela balança é a grandeza que precisamos medir para entender a situação do nosso “peso” (na verdade, o nome mais formal desta grandeza é massa, que será estudada ainda neste volume). Assim, quando estudarmos uma pequena bola que se move, nós precisaremos apenas de algumas grandezas para descrever o problema como massa,

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posição, velocidade, etc.

O que acontece na prática é que, quando nos pesamos na balança, obtemos um valor em quilogramas (kg). Quando medimos nossa altura com uma fita métrica, obtemos um valor em metros (m) ou centímetros (cm). Cada uma dessas grandezas é medida em unidades diferentes. Diferentemente da sacola de frutas, em que bastava atribuir um número inteiro para cada grandeza, geralmente precisamos especificar quais as unidades de medida das grandezas do nosso cotidiano.

Para evitar uma mistura de unidades de medida, os cientistas resolveram especificar qual a unidade padrão de medida para cada grandeza fundamental em física. Estas grandezas fundamentais e suas respectivas unidades de medida formam o chamado Sistema Internacional de Unidades, ou apenas SI. Nesse sistema, por exemplo, posição de um carro é medida em metros (m), já a massa de um saco de arroz é medida em gramas (g), enquanto a duração de uma aula é medida em segundos (s). Existem outras grandezas no sistema, como você pode ver na Tabela 1.1. Neste volume de Mecânica Clássica, nós precisaremos apenas de três grandezas fundamentais (comprimento, massa e tempo). Você entenderá o significado das demais grandezas em outros cursos de física básica.

Grandeza Unidade Símbolo

Coomprimento metro m

Massa quilograma kg

Tempo segundo s

Corrente elétrica ámpere A

Temperatura Termodinâmica Kelvin K

Quantidade de Matéria mol mol

Intensidade Luminosa candale cd

Tabela 1.1. Grandezas fundamentais e unidades de medida do Sistema Internacional.

Agora que sabemos o que são grandezas e unidades de medida, podemos estudar uma ferramenta interessante que nos permite manipular os valores numéricos encontrados nessas medidas, chamada Ordem de Grandeza.

1.2 Ordem de Grandeza

Luka consegue dizer quantos anos ele tem facilmente. É um número bem pequeno. Certa vez, sua professora falou que os cientistas estimam que nosso Universo tenha 14 bilhões de anos de idade. Então ele pediu para a professora escrever este número no quadro. Ela logo atendeu ao pedido: 14.000.000.000. Luka ficou revoltado com este número.

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Então ele argumentou com a professora que é uma grande perda de tempo escrever tantos zeros atrás de um número. Ele disse que era melhor alguém inventar um símbolo que represente logo todo esse número enorme. E ele realmente tem razão. Em Física, existem inúmeras medidas que resultam em números muito grandes, ou muito pequenos, que sua simples representação daria muito trabalho. Vamos dar alguns exemplos:

– A velocidade da luz é de 300.000.000 metros por segundo.

– A massa da Terra é de aproximadamente 6.000.000.000.000.000.000.000.000 kg.

– A massa de um grão de areia é de aproximadamente 0,00000000035 kg.

Note como é complicado escrever esses números. Qualquer erro na quantidade de zeros ou casas decimais pode acarretar em um erro bem grande. Por isso, os cientistas resolveram escrever os números muito grandes ou muito pequenos de uma maneira especial, utilizando apenas a álgebra que aprendemos na escola. Funciona da seguinte maneira: toda vez que temos um número muito grande, nós contamos quantos zeros existem no final do número e reescrevemos estes zeros como uma potência de dez. Por exemplo,

10 = 101

100 = 10 x 10 = 102

1000 = 10 x 10 x 10 = 103

...

O mesmo raciocínio vale para números muito pequenos. Basta que nos lembremos de como operar casas decimais. Luka ainda não aprendeu este assunto na escola, mas vamos refrescar nossa memória:

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...

Veja como aqueles números monstruosos ficam bem agradáveis com esta nova representação:

– A velocidade da luz no vácuo é de 3 x 108 metros por segundo.

– A massa do planeta Terra é de 6 x 1024 kg.

– A massa de um grão de areia é de 0,35 x 10-9 = 3,5 x 10-10 x 10-9 kg.

Chamamos a potência de dez que aparece no final desta nova representação de ordem de grandeza do número. Além de representar o número de uma maneira mais rápida, ela serve para podermos operar matematicamente os números de uma maneira simples, além de permitir comparações rápidas entre dois números distintos. Por exemplo, se Luka já conhecesse este assunto, sua professor poderia ter escrito simplesmente:

14 bilhões = 14 x 109 = 1,5 x 1010

É importante que o número que permanece na frente dos zeros seja mantido entre 1 e 10. Por exemplo, nós poderíamos ter deixado o número acima como potência de 10 elevado a 9, mas fizemos um esforço adicional para escrevê-lo como potência de 10 elevado a 10 para que o primeiro fator esteja entre 1 e 10 (neste caso, 1.4). Esta passagem se dá apenas para que o método fique bem definido e todas as pessoas concordem quanto à ordem de grandeza de suas medidas. Além disso, o primeiro fator desta multiplicação, o 1.4, tem um nome especial. Chamamos estes números de algarismos significativos. Neste exemplo, a idade do Universo representada pela professora possui dois algarismos significativos, 1 e 4.

1.3 Análise Dimensional

Algumas vezes, nós encontramos e passamos informações confusas do ponto de vista científico. Um exemplo de informação confusa aconteceu quando Luka disse:

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A professora logo fez a correção, dizendo que uma maneira certa de representar uma velocidade é dizer: 40 quilômetros por hora. Esta correção que a professora fez equivale ao que chamamos de Análise Dimensional em Física. É um procedimento muito simples que nos protege de eventuais erros científicos, assim como as regras gramaticais nos protegem de erros de português.

Neste exemplo, quilômetros por hora não é uma unidade fundamental do sistema internacional, mas sabemos que velocidade é calculada como comprimento dividido por tempo e, por isso, deve ter dimensão de comprimento dividido por tempo, ou seja, km/h. Neste momento, você poderia argumentar que quilômetros e horas não são as unidades das grandezas fundamentais comprimento e tempo, segundo o Sistema Internacional de Unidades. Se olharmos a tabela 1.1, comprimento deveria ser representado em metros e tempo em segundos. Contudo, o Sistema Internacional serve para que as comunicações científicas fiquem padronizadas, mas não impede que as pessoas utilizem unidades de medida mais apropriadas para os fenômenos que estão vivenciando.

Por exemplo, a velocidade de um carro, quando expressa em km/h, apresenta números que já estamos acostumados e temos uma melhor intuição do que representam. Caso as velocidades fossem escritas em metros por segundo, o que pode acontecer em algumas situações, podemos não ter uma intuição do que representam. Sabemos que uma velocidade de 108 km/h é muito alta para um carro, mas será que 30 m/s é também uma

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velocidade elevada? Na verdade, elas são iguais. Vamos aprender a fazer a conversão entre unidades ainda neste volume.

Diante de grandezas mais sofisticadas podemos cometer erros ou não saber exatamente qual unidade de medida em que devemos representá-las. É possível que estejamos cometendo erros como o de Luka diariamente. A análise dimensional nos ajuda a resolver este problema. No caso de Luka, você sabe a resposta, pois já aprendeu que velocidade é dada por comprimento (ou distância) dividida pelo tempo. Logo, a unidade de medida deveria ser a unidade de comprimento (metros ou quilômetros), dividida pela unidade de tempo (segundos ou horas).

Para entender melhor como funciona este processo, vamos estudar uma situação mais complicada. Enquanto estudava fontes de energia na escola, Luka ficou curioso sobre como funciona a eletricidade que chega a sua casa. Seu pai tinha falado que nós gastamos energia elétrica sempre que ligamos alguma luz, usamos algum equipamento elétrico ou eletrônico. Então Luka ficou curioso para descobrir como as pessoas sabem o quanto estamos gastando:

Luka sabia que quilogramas eram usados para medir massa e achou que também poderia ser usado para medir energia. Na verdade, a unidade de energia não pode ser encontrada na tabela 1.1. E agora? Bem, lembramos que velocidade é dada pelo comprimento dividido pelo tempo. Como representar energia? Neste volume, ainda não estudaremos energia elétrica, mas vamos adiantar um exemplo que será visto ainda neste módulo. Veremos que existe um tipo de energia mecânica que pode ser calculada como uma combinação de grandezas fundamentais (massa, comprimento e tempo) pela fórmula:

Onde m é massa de um corpo e v sua velocidade. A análise dimensional consiste em utilizar a unidade de medida de cada uma das grandezas da fórmula acima:

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Ou kg m²/s², ou seja, quilograma metro ao quadrado por segundo ao quadrado, já que massa é dada em kg e velocidade em m/s. Este é um exemplo de Análise Dimensional, pois a partir de uma dada fórmula, pudemos descobrir quais as unidades de medida da grandeza em questão.

Para facilitar ainda mais a comunicação, os cientistas denominam certas unidades com nomes especiais. No caso da energia, visto acima, a unidade é o Joule (J), em homenagem ao renomado Físico britânico James Prescott Joule, do séc. XIX.

1(kg) (m/s)2 = 1 J

No caso de Luka, o correto seria dizer que gastou “Joules” de energia, pois esta uma unidade de medida para a grandeza energia. Quando chegar o momento certo, vamos estudar outras unidades de medida para a energia que são mais interessantes do ponto de vista prático.

1.4 Cinemática: Movimento Unidimensional

Nesta seção, entraremos no estudo de um dos assuntos mais antigos da Física: o movimento. Para simplificar nosso estudo, trataremos inicialmente do problema unidimensional. Isto significa que nosso corpo, ou partícula, pode ser considerado um ponto que se move em uma reta. A cada instante de tempo, o corpo ocupa uma posição diferente, que será representada por um número real. Vamos entender como podemos representar um movimento unidimensional de diferentes maneiras. Antes disso, precisamos de algumas definições. Vamos começar pelos conjuntos numéricos.

Você já deve ter se acostumado com os diferentes tipos de números que existem na matemática. Estes números são divididos nos chamados conjuntos numéricos e eles foram surgindo conforme nossa necessidade de representar situações da natureza. Por exemplo, há centenas de anos, um pastor de ovelhas precisava guardar uma pequena pedra dentro de uma bolsa para cada ovelha que ele possuía. Assim, toda vez que ele precisava contar as ovelhas, bastava ele tirar as pedras da bolsa e verificar se combinavam com a quantidade de ovelhas. Ele não sabia como representar números, mas aprendeu a contar utilizando uma representação com as pedras. Diante da necessidade de contar de maneira mais prática, criou-se o conjunto dos números naturais, que servem para contar unidades:

Com o desenvolvimento do comércio, alguns comerciantes perceberam que podiam representar seu dinheiro com números naturais. Contudo, surgiram situações em que eles precisavam representar matematicamente algo desagradável: quando estavam devendo dinheiro. Por isso, acredita-se que foram criados os números inteiros, como a união entre os números naturais e os seus simétricos.

Posteriormente, a partir da operação da divisão, percebeu-se que um novo conjunto poderia ser criado a partir da razão entre dois números inteiros, com o denominador diferente de zero. Estes números foram chamados de números racionais. Uma maneira formal de representar os números racionais é a seguinte:

Uma leitura direta da sentença acima pode ser feita da seguinte forma: Os números racionais são formados por todas as divisões possíveis dos números inteiros p e q, com q

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diferente de zero. Uma característica interessante dos números racionais é que, quando escritos na forma decimal, eles possuem dízima finita ou periódica. Isto significa que sua parte decimal é finita ou se repete infinitamente. Por exemplo, são números racionais:

Em ambos os casos, a dízima (parte decimal) é possui fim ou é infinita e se repete. Será que este conjunto dos números racionais corresponde a todos os números que nós conhecemos? Ou ainda existem números que não estão nele? Vamos ver o que aconteceu na aula de matemática de Luka.

Quando sua professora disse que a área de um quadrado pode ser calculada apenas multiplicando o lado do quadrado por ele mesmo, todos os colegas de Luka passaram a resolver os exercícios, mas Luka ficou pensativo. A professora perguntou qual era o problema. Luka disse o seguinte:

A professora disse que estava correto o raciocínio de Luka e perguntou por que ele ainda estava tão pensativo se tinha entendido o assunto. Então ele disse:

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Então, a professora explicou que, neste caso, o lado do quadrado não é um número muito conhecido assim. Este número, cujo quadrado é dois, é a chamada raiz quadrada de dois e pode ser representada assim.

Luka ficou satisfeito em saber que o número que ele não conseguia adivinhar, o lado do quadrado cuja área é dois, não era algo que ele conhecia. Luka teve seu primeiro contato com os números irracionais (I). Este conjunto numérico é curioso, pois é formado apenas por números cuja dízima é infinita e não periódica. Isto significa que a parte decimal do número é formada por uma sequência infinita de algarismos que não possuem um padrão de repetição (ou período). Por exemplo, o número que Luka esta procurando era este:

No número acima, representamos apenas o início de sua dízima, que não tem fim e não se repete. Diversos outros números também possuem esta característica e, portanto, são classificados como irracionais. Quando unimos todos os números racionais aos irracionais, obtemos um conjunto numérico chamado de números reais ( ). Estes números correspondem a todos os números que você conhece, exceto por um tipo de número bem estranho chamado número imaginário, cujo estudo está além dos nossos objetivos. Entenderemos agora a importância dos números reais em Física, a partir da definição de uma reta real.

Para estudarmos o movimento, precisamos partir do exemplo mais simples possível, como o movimento de uma pequena bolinha em uma reta. Esta bolinha que estamos tomando no exemplo é tão pequena que pode ser aproximada por um ponto que chamaremos de ponto material. Em geometria, um ponto é adimensional, o significa dizer que ele não tem tamanho. De posse do nosso ponto material, precisamos descrever suas diferentes posições. Uma maneira bem simples de descrever as posições de um ponto em uma reta é através do uso dos números reais.

Primeiramente, selecionaremos um ponto fixo para chamar de origem do nosso eixo. Este ponto será representado pelo número real zero (0). Como os números reais são

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ordenados, cada ponto desta reta será representado por um número real.

Fig 1.1. Reta real e origem.

Em seguida, vamos definir um sentido para esta reta real. O sentido positivo será o sentido do movimento que vai da esquerda para a direita nesta reta real. O sentido negativo, naturalmente, será o sentido do movimento que vai da direita para a esquerda desta reta. Vamos representar o sentido positivo com uma flecha, como na Fig. 1.2. Vamos chamar este eixo de eixo x. Precisamos também definir uma unidade de medida para a grandeza comprimento, que é o metro no caso do Sistema Internacional de Unidades.

Fig 1.2. Eixo Real “x”

Com esta estrutura que acabamos de criar, podemos representar um ponto material se movendo em uma dimensão. Mover-se significa mudar de posição conforme o tempo muda e, neste caso, podemos registrar uma diferente posição do ponto para cada instante de tempo.

Vamos ver como funciona as diversas descrições do movimento na prática. Luka será nosso ajudante nesta experiência. Para isso, vamos utilizar um cronômetro para medir diferentes instantes de tempo bem próximos: 0, 1, 2 e 3 segundos. Em cada um dos instantes de tempo, o desafio de Luka é medir a posição (um número real) da nossa bolinha no eixo real. Vamos ao resultado do experimento:

– No instante t = 0s, a bola está parada na origem (x = 0m).

– No instante t = 1s, a bola está a um metro à direita da origem (x = 1m).

– No instante t = 2s, a bola está a dois metros à direita da origem (x = 2m).

– No instante t=3s, a bolsa está a um metro à esquerda da origem (x = -1m).

Podemos representar este movimento com um gráfico que mostra diferentes fotografias retiradas em diferentes instantes de tempo, como na Fig. 1.3.

Fig 1.3. Fotografias de diferentes instantes de tempo de um movimento unidimensional mostram a bolinha em diferentes posições no eixo x.

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Antes de analisar este experimento, vamos aprender a representá-lo de outras maneiras. Uma representação interessante pode ser obtida a partir de uma simples tabela que represente o instante de tempo (t) e a posição (x), como na Tabela 1.2.

t(s) X(m)

0 0

1 1

2 2

3 -1

Tabela 1.2. Tabela representando a posição de um ponto material para cada instante de tempo.

Outra maneira de representarmos o movimento acima é através de um gráfico de coordenadas cartesianas. Este tipo de gráfico é muito comum em ciências em geral, sobretudo em Física. Ele consiste de um dois eixos perpendiculares, um horizontal e outro vertical. O eixo horizontal, chamado eixo das abscissas, corresponde a uma das variáveis. Neste caso, o tempo. O eixo vertical, chamado eixo das ordenadas, corresponde à variável restante. Neste caso, a posição. O exemplo que estamos estudando está representado nos eixos coordenados na Fig. 1.5. A construção de um gráfico deste tipo é bem simples. Para cada instante de tempo, por exemplo, t = 0, você verifica qual o valor da posição, neste caso, x = 0. De posse destes dois dados, você pode localizar este ponto (t, x) no gráfico. Assim, representamos os diferentes pontos (t, x): (0,0), (1,1), (1,2), (3,-1). As linhas pontilhadas servem apenas como guia para uma melhor visualização da construção e não fazem parte do gráfico.

Fig. 1.5. Representação do movimento através de um gráfico cartesiano.

Como você deve ter percebido, representamos o movimento unidimensional de diferentes maneiras. Estas maneiras de representação são bem conhecidas e funcionam para muitas situações em Física, sempre que precisamos representar uma função. Em matemática, dizemos que representar o movimento é representar a posição em função do tempo. Representamos a posição em função do tempo por x(t). Isto significa dizer que a

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Conceitos de Física

posição do ponto material depende apenas do instante de tempo em que a medição foi feita. Existem várias funções neste curso que serão representadas por um gráfico cartesiano.

Um detalhe curioso é que nós sabemos a posição da nossa bolinha apenas nos instantes em que fizemos medição experimental. Podemos até estimar a posição do objeto em outros instantes, mas seria apenas uma estimativa teórica. Este detalhe sobre a realidade física ser apenas aquilo que verificamos através de medições ainda é um assunto importante das teorias modernas.

Vamos voltar nossa atenção para o intervalo de tempo de 0 a 2 segundos do nosso experimento e exemplificar o tipo mais simples de movimento, chamado Movimento Uniforme.

1.4.1 Movimento Uniforme

Vamos escolher uma visualização do experimento anterior, ou seja, da posição em função do tempo, para estudar o Movimento Uniforme. Para isso, vamos analisar apenas o intervalo de 0 a 2 segundos. Como não sabemos o que aconteceu com o movimento da bolinha entre os instantes de medição, vamos assumir que ela apenas seguiu “sua tendência de movimento”, representada por uma linha pontilhada colorida entre os pontos que foram medidos. Note que utilizamos um vocabulário informal nesta etapa, mas vamos formalizá-lo ao longo da próxima seção. Neste intervalo, o gráfico cartesiano do movimento é dado na Fig. 1.6.

Fig 1.6. Linha colorida mostra o movimento que assumimos para a bolinha, de posse apenas dos pontos que foram medidos (em preto), para o intervalo de 0 a 2 segundos.

Este movimento é simples e especial. Simples, pois sua representação no gráfico cartesiano é o mais simples possível: uma linha reta. Vamos entender agora por que ele é especial. Para isso, vamos definir a velocidade média entre os instantes t1 e t2 de um objeto em um intervalo de tempo como a fórmula:

A grandeza x(t2) - x(t1), calculada como a diferença entre duas posições, é chamada deslocamento. Vamos calcular a velocidade média para o nosso corpo para diferentes instantes de tempo e listá-las abaixo:

– Velocidade Média entre 0 e 1 s:

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Conceitos de Física

– Velocidade Média entre 1 e 2 s:

Você pode verificar através do gráfico que a velocidade média para este movimento ilustrado na Fig. 1.6. é sempre 1m/s. Isto significa que o corpo se move sempre com a mesma velocidade e este movimento é chamado de Movimento Uniforme. Quando um corpo executa este movimento, sua velocidade é sempre a mesma. Isto significa que o gráfico da posição em função do tempo é sempre dado por uma reta que pode ser ascendente ou descendente, a depender da velocidade ser positiva ou negativa. Veja cada caso na Fig. 1.7.

Fig 1.7. Os três casos de Movimento Uniforme representados em um gráfico cartesiano.

Caso o movimento uniforme tenha velocidade positiva, então o corpo segue

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Conceitos de Física

no sentido positivo do eixo real, ou seja, da esquerda para a direita e chamamos este movimento de movimento progressivo. Caso o corpo tenha velocidade negativa, movendo-se da direita para a esquerda, dizemos que o movimento é retrógrado. Seja qual for o tipo de movimento uniforme, podemos afirmar que a posição é sempre uma função linear do tempo, ou seja, pode ser escrita na forma:

x(t) = v0 t + x0

Onde v0 é a velocidade e x0 é a posição inicial do movimento uniforme. O nome linear fica claro quando observamos a Fig. 1.7. Sempre que uma função é escrita da forma acima, o gráfico cartesiano é uma linha reta. Sempre que representamos um movimento pela equação da posição em função do tempo, chamamos esta equação de equação horária do movimento. Agora, vamos treinar um pouco os conceitos desta seção através de exercícios resolvidos.

Exemplo 1: Um automóvel faz uma viagem de uma cidade A a uma cidade C, passando por uma outra cidade B. A velocidade média do carro entre a cidade A e a cidade B foi de 60 km/h e esta etapa da viagem durou duas horas. Já a velocidade média do carro entre as cidades B e C foi de 80 km/h e esta etapa da viagem durou 3 horas. Calcule a velocidade média do automóvel entre as cidades A e C. Veja a Fig. 1.8.

Fig. 1.8. Esquema par ao exemplo 1.

Solução: Este exemplo mostra como podemos cometer um erro por não aplicar a definição de uma grandeza da maneira correta. Antes de resolvê-lo corretamente, vamos dar uma olhada na ideia do Luka e tentar descobrir onde está o erro em sua resolução. Luka tentou o seguinte:

– Acho que a velocidade média é de 70 km/h, porque é a média entre as duas velocidades: 60 km/h e 80 km/h.

Primeiro, vamos verificar se esta velocidade encontrada é realmente a média aritmética das velocidades do problema:

Realmente é a média aritmética das velocidades. Mas será que Luka está certo? Vamos ver. Teremos que aplicar a definição da velocidade média da maneira que aprendemos nesta seção:

Podemos calcular o intervalo de tempo que durou a viagem facilmente (t2 - t1) = 2horas + 3horas = 5horas. Já o deslocamento entre as cidades não é um dado encontrado no enunciado do problema, mas podemos encontrá-lo. Na viagem entre as cidades A e B, temos

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Conceitos de Física

O mesmo pode ser feito para encontrar o deslocamento da etapa 2:

Agora, podemos calcular o deslocamento de toda a viagem:

deslocamento = deslocamento1 + deslocamento2 = 120km + 240km = 360km

Finalmente, vamos calcular a velocidade média por sua fórmula:

Note que nossa resposta, que está correta, foi diferente da resposta encontrada por Luka. Velocidade média significa algo bem definido em física e não pode ser substituído por nossa intuição, como fez Luka, que ainda não estudou esse assunto.

Exemplo 2: Dado o gráfico cartesiano 1.9., encontre a equação horária do movimento uniforme.

Fig. 1.9. Gráfico para o Exemplo 2.

Solução: Sempre que temos uma linha reta no gráfico da posição em função do tempo, podemos dizer que o movimento é uniforme e sua equação horária é do tipo:

x(t) = v0 t + x0

Precisamos apenas encontrar o valor das constantes v0 e x0 . Precisamos utilizar dois pontos do gráfico para isso. Por exemplo, o gráfico passa pelo ponto x(2) = 2, portanto:

x(2) = 2v0 + x0 = 2

Além disso, passa pelo eixo x no instante t = 3s. Isto equivale ao ponto x(3) = 0:

x(3) = 3v0 + x0 = 0

Assim, ficamos com um sistema linear de duas equações e duas incógnitas:

2v0 + x0 = 2

3v0 + x0 = 0

Existem alguns métodos de resolução de sistemas lineares. Por exemplo, podemos subtrair as duas equações do sistema linear acima e obter:

(2v0 + x0) - (3v0 + x0) = 2 - 0 → - v0 = 2 → v0 = -2m/s

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Conceitos de Física

Finalmente, podemos utilizar este valor da velocidade em uma das equações para encontrar a posição inicial:

2(-2) + x0 = 2 → x0 = 6m

A equação horária fica dada por:

x(t) = -2t + 6

Exercício 1: Encontre o deslocamento e a velocidade média para os seguintes instantes de tempo no experimento da bolinha que fizemos com Luka, representado na Fig. 1.3.

a) t1 = 0s e t2 = 1s

b) t1 = 1s e t2 = 2s

c) t1 = 2s e t2 = 3s

d) t1 = 3s e t2 = 4s

e) t1 = 0s e t2 = 4s

1.4.2 Movimento Uniformemente Variado (MUV)

O movimento mais simples que existe é, sem dúvida, o movimento uniforme. Mas sabemos que este tipo de movimento ocorre em casos bem especiais. Na prática, é muito difícil encontrar algo que tenha velocidade sempre constante. Por exemplo, quando estamos em um carro, aumentamos ou diminuímos nossa velocidade de acordo com o tráfego. Portanto, um passeio de carro, em geral, não é um exemplo de movimento uniforme. Então, qual seria o próximo tipo de movimento mais natural para nosso estudo? Vamos encontrar a resposta propondo um experimento bem simples:

Luka está em um prédio de cinco andares. Cada andar está aproximadamente 3 metros de distância do andar anterior. Temos cinco pedras parecidas e também temos um cronômetro. Nós pedimos a ele que solte uma pedra do primeiro andar e nós marcaremos o tempo de queda com o cronômetro. Em seguida, pedimos que ele subisse um andar e solte novamente outra pedra para marcarmos o novo tempo de queda. Assim, teremos cinco tempos de queda, um para cada pedra lançada. Os dados obtidos foram representados na Tabela 1.3. :

Altura (m) Tempo ( s)

0 0,00

3 0,78

6 1,11

9 1,36

12 1,56

13 1,75

Tabela 1.3. Tempo de queda da pedra para cada lançamento.

Agora, vamos desenhar um gráfico cartesiano que representa a altura que a pedra

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Conceitos de Física

caiu em função do tempo de queda. Perceba que o gráfico não é uma linha reta. Se a “queda livre”, que é o nome comum deste experimento, fosse um exemplo de movimento uniforme, deveríamos ver uma reta na Fig. 1.10. O que observamos é uma ligeira curvatura para cima neste gráfico, indicando que estamos diante de um novo tipo de movimento. E que movimento seria esse? É o chamado Movimento Uniformemente Variado (MUV), que será o tema desta seção.

Fig.1.10. Gráfico cartesiano do problema do tempo de queda livre das pedras no prédio.

Para analisar o gráfico acima, vamos construir uma tabela de velocidade média da pedra entre os andares. Se o movimento fosse uniforme, a velocidade média deveria ser constante para qualquer intervalo de tempo.

Você pode verificar nos cálculos acima que a velocidade média não se manteve constante. Na verdade, a velocidade média aumenta conforme o corpo cai. Nos primeiros três metros de queda, a velocidade média é pequena. No entanto, após 12 metros de queda, a velocidade média entre 12m e 15m é bastante elevada.

Podemos resumir nossa análise com a definição de uma nova grandeza que representa este aumento de velocidade com o tempo. Esta nova grandeza recebe o nome de aceleração média. Assim como a velocidade média, ela possui uma fórmula que representaremos abaixo:

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Como você deve ter percebido, esta fórmula se parece muito com a fórmula da velocidade média. A diferença é que estamos calculando qual é a taxa de variação da velocidade em relação ao tempo, enquanto a velocidade média calculava a taxa de variação da posição. Note também que um caso especial acontece quando calculamos a aceleração de um corpo que está em movimento uniforme:

. (Movimento Uniforme)

Ou seja, a aceleração média de um corpo que está em movimento uniforme é zero. Outro detalhe importante é encontrar qual a unidade de medida desta nova grandeza. Bem, como a aceleração média é calculada como o quociente entre velocidade (m/s) e tempo (s), então temos:

Este procedimento é o que chamamos de análise dimensional, mencionado anteriormente. Agora que sabemos calcular aceleração, vamos definir um movimento uniformemente variado como sendo um movimento cuja aceleração é constante e diferente de zero. Isto significa que a aceleração média para este tipo de movimento terá sempre o mesmo valor, que chamaremos de a0 ou simplesmente de a:

Esta é chamada equação horária da velocidade no movimento uniformemente variado (MUV). Podemos simplificar ainda mais a equação considerarmos que o instante inicial t1 = 0s e t2 = t:

v(t) = v0 + at

Esta fórmula indica que a velocidade aumenta de valor conforme o tempo passa, caso a aceleração seja positiva. Caso a aceleração seja negativa, a velocidade diminui de valor. Além disso, o crescimento da velocidade é linear, ou seja, o gráfico cartesiano da velocidade em função do tempo é um segmento de reta para o MUV. Mas qual a relação entre o MUV e nosso experimento das pedras? A novidade é que o movimento de queda livre, como em nosso experimento, é um movimento uniformemente variado! Vamos mostrar esta afirmação que fizemos.

No caso do movimento uniforme, é simples de ver que o gráfico cartesiano da posição em função do tempo é um segmento de reta. No caso do MUV, não é tão simples obter o gráfico da posição em função do tempo, mas vamos tentar de maneira bem intuitiva. O raciocínio que vamos empregar nesta dedução é um investimento, pois nele está a semente de ideias mais avançadas que são estudas sob o nome de cálculo diferencial. Primeiramente, você deve concordar que o gráfico da velocidade em função do tempo depende do tipo do movimento que estamos estudando. Representaremos na Fig.1.11 este gráfico para o movimento uniforme e o uniformemente variado:

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Fig.1.11. Perceba a diferença no gráfico da velocidade em função do tempo para o movimento uniforme (a) e o movimento uniformemente variado (b). Ambos são segmentos de reta,

mas o gráfico (a) é uma função constante enquanto o gráfico (b) mostra a velocidade mudando com o tempo, indicando que existe uma aceleração.

Nosso objetivo agora é descobrir a equação da posição em função do tempo para o MUV. Esta equação, chamada equação horária da posição, deve representar uma curva no plano cartesiano que se assemelhe com os dados experimentais obtidos na Fig. 1.10. Para obter esta equação, vamos utilizar uma estratégia bem geral. A partir da fórmula da velocidade média, vamos escrever:

x(t2) - x(t1) = vmédia x (t2 - t1)

Ou ainda, podemos simplificar ainda mais a fórmula se adotarmos uma notação bem conveniente em Física que é ∆t = (t2 - t1) e ∆x = (x2 - x1), onde ∆ é a letra grega Delta maiúscula e sempre representa uma variação. Nestes casos, uma variação de tempo e uma variação da posição. Perceba que o deslocamento (diferença das posições) pode ser escrito como o produto entre a velocidade média e o intervalo de tempo. O interessante é que este produto da velocidade pelo intervalo de tempo é exatamente a área de um retângulo no gráfico cartesiano da velocidade em função do tempo, como representamos na Fig.12.

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Conceitos de Física

Fig.1.11. O deslocamento pode ser calculado como a área abaixo da curva da velocidade no gráfico cartesiano da velocidade em função do tempo.

Desta forma, podemos aplicar esta ideia, de calcular a área sob o gráfico da velocidade em outros tipos de movimento além do movimento uniforme. Por exemplo, podemos calcular a área abaixo da curva da velocidade no caso do MUV. Esta talvez seja o conceito matemático mais difícil de entender no nosso curso e está relacionado a um assunto avançado chamado cálculo integral. Aqui, nosso interesse é bem modesto. Não estudaremos cálculo, mas estamos interessados em calcular a área abaixo da curva da velocidade no nosso caso do movimento uniformemente variado, representado na Fig. 1.12:

Fig.1.12. Vamos utilizar o cálculo do deslocamento como a área abaixo da curva da velocidade no gráfico cartesiano da velocidade em função do tempo.

De uma maneira geral, para posição inicial x(t1) = x0, velocidade inicial v(t1) = v0, e aceleração a constante, a área da figura pintada é exatamente a área de um trapézio, que pode ser escrita como:

Utilizando nossa ideia de que o deslocamento é igual à área, ficamos com:

Substituindo a velocidade MUV pela fórmula: v = v0 + a∆t , ficamos com:

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Conceitos de Física

Finalmente, inserindo: ∆x = x(t) - x0, resulta na fórmula final:

Esta fórmula nos dá a posição de um corpo em função do tempo para o caso de um movimento uniformemente variado. O gráfico cartesiano desta função é uma curva conhecida como parábola. Sua forma é muito parecida com a Fig. 1.10 que obtemos experimentalmente, note na Fig. 1.13 um acordo que existe entre os pontos experimentais e nossa fórmula teórica

Fig.1.13. O gráfico mostra os pontos obtidos no nosso experimento (em azul) com a curva teórica da posição em função do tempo para o movimento uniformemente variado.

É surpreendente o fato de a queda livre ser descrita pelas equações do MUV. Isto significa que os corpos que caem estão submetidos a uma aceleração constante, fazendo com que sua velocidade na queda aumente com o tempo. O fato surpreendente é que esta aceleração não depende da massa do objeto e é aproximadamente a mesma para qualquer queda livre realizada próxima à superfície do nosso planeta. O valor desta aceleração, utilizando apropriadamente as unidades de medida desta grandeza, é de aproximadamente:

a ~ 9.8 m/s2

Esta aceleração está representada com um sinal positivo para concordar com nosso experimento, mas é comum definir o sentido positivo do eixo para cima, indicando que um deslocamento positivo equivale ao corpo subir, enquanto um deslocamento negativo está relacionado a uma queda. Neste caso, a aceleração teria a mesma magnitude, mas com sinal negativo.

Você poderia estar se perguntando o porquê de os corpos caírem com a mesma aceleração, independentemente de sua massa. Na verdade, esta pergunta é bem difícil de ser respondida, mas podemos dizer quer existe um modelo teórico bem antigo que consegue explicar este fenômeno da queda livre, chamado de Gravitação Universal, que estudaremos ainda neste volume. Vamos resolver alguns exemplos sobre Movimento Uniformemente Variado antes de passarmos para o próximo assunto.

Exemplo 3: Uma maçã cai a partir do repouso de uma altura de 49 metros. Calcule (a) Quanto tempo durou a queda e (b) a velocidade final da maçã imediatamente antes de atingir o solo.

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Conceitos de Física

Solução: Vamos utilizar a fórmula da posição em função do tempo para o MUV. Vamos também aproveitar o exemplo para introduzir um novo eixo coordenado. Como o movimento de queda livre é feito sempre no eixo vertical, vamos chamá-lo de y para diferenciá-lo do eixo x. Além disso, vamos chamar a aceleração da gravidade de g, uma vez que este valor é constante.

a) A posição inicial da maçã é de y0 = 49m. A posição final da maçã é y(t) = 0 (que representa a altura do chão). Como a maçã partiu do repouso, isto significa que sua velocidade inicial é zero: v0 = 0. Além disso, como estamos representando o eixo vertical (y) apontando para cima, a aceleração recebe um sinal negativo, indicando que ela aumenta as velocidades para os corpos que caem (e diminui a velocidade dos corpos que sobem). Assim, ficamos com:

b) A velocidade da maçã ao atingir o solo pode ser encontrada utilizando a equação horária da velocidade no movimento uniformemente variado. Novamente, a velocidade inicial é zero, indicando que o corpo caiu a partir do repouso. Já a velocidade final, que é a resposta do problema, depende do tempo total de queda, que foi obtido na letra anterior. Assim, temos:

v = v0 + at → v = 0 - (9.8 m/s2) (3.16s) ~ - 31 m/s

O sinal negativo da velocidade está associado ao sentido positivo do eixo vertical, que é para cima. Assim, uma velocidade negativa significa que o corpo está caindo, como era de se esperar para este problema.

Exemplo 4: Uma pedra é lançada para cima com velocidade inicial de 10.00 m/s a partir do chão. Encontre (a) o tempo total de vôo. (b) a altura máxima que ela atinge. (c) Faça um esboço do gráfico da posição em função do tempo desde o lançamento até a pedra tocar o solo novamente.

Solução: Vamos utilizar novamente as equações do MUV. Como a pedra foi lançada do chão, sua altura inicial é zero (y0 = 0). A altura final é o que queremos obter. A velocidade inicial é 10 m/s.

a) Este problema é um pouco mais complicado, pois precisamos definir qual o instante final do movimento. A altura máxima, como o enunciado pede, é atingida quando a velocidade final é zero. Isto significa que o corpo sobe, fica parado momentaneamente e volta a cair. Neste ponto especial, em que a velocidade é zero, a altura atingida pelo lançamento é máxima. Assim, a partir da equação horária da velocidade, vamos descobrir quanto tempo leva para atingir a velocidade zero.

v(t) = v0 + at → 0 = 10 m/s - (9.8 m/s2)t → t ≈ 1.02 s

Este é o tempo entre o lançamento da pedra para cima e a altura máxima ser atingida. O tempo de subida é igual ao de descida (você pode verificar a partir das equações). Portanto, o tempo de vôo é dado por:

t ~ 2 x 1.02s = 2.04s

b) Para calcular a altura máxima, vamos substituir o valor do tempo na fórmula da

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Conceitos de Física

posição:

c) Esboço do Gráfico:

Fig. 1.14. Esboço do gráfico do lançamento da pedra do Exemplo 4.

Problemas

1. Um motorista dirige um carro em linha reta a 80 km/h a partir do ponto A. Após percorrer 8 km/h, o veículo para por falta de gasolina. O motorista caminha 2 km adiante até o posto de abastecimento em 24 minutos. Calcule:

a) O intervalo de tempo que o motorista passou dirigindo o carro.

b) Transforme em horas o intervalo de tempo que durou a caminhada do motorista até o posto.

c) Encontre a velocidade média do motorista desde o instante em que partiu do ponto A até chegar ao posto. (Dica: Utilize a fórmula da velocidade média, calculando o deslocamento total e o intervalo de tempo total)

2. Um automóvel percorre uma distância de 150 km desenvolvendo, nos primeiros 120 km, uma velocidade média de 80 km/h e, nos 30 km restantes, uma velocidade média de 60 km/h.

a) Qual foi o tempo total da viagem?

b) Qual foi a velocidade média do automóvel do percurso total?

3. Um atleta treina corrida em uma pista retilínea. Em t1 = 0s, parte do marco zero, corre até o marco 200m, para por certo tempo, volta a correr até o marco 400m e retorna ao marco 100m, quando chega em t2 = 100s. Calcule a velocidade média do atleta entre t1 e t2.

4. Um caminhão de carga possui uma velocidade de 10 m/s no instante em que o motorista pisa no acelerador. Isto comunica ao caminhão uma aceleração

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Conceitos de Física

constante, que faz com que sua velocidade aumente de 20 m/s em 5,0s. Considere t = 0 no instante em que o motorista pisa no acelerador.

a) Qual a aceleração do caminhão

b) Supondo que o caminhão foi mantido com essa aceleração até o instante t = 10s, qual a velocidade atingida nesse instante

c) Qual a distância percorrida pelo caminhão desde o início da aceleração até o instante t = 10s.

5. Um veículo está em uma estrada e acelera assim que passa pela placa, cuja posição será x = 0. Sua aceleração é constante e igual a 4 m/s2. No instante t = 0, o veículo se encontra a 5m a frente da placa, movendo a 15 m/s.

a) Determine a posição e velocidade do carro em t = 2s.

b) Determine a posição do veículo quando sua velocidade for de 25 m/s.

c) Faça um esboço do gráfico cartesiano da posição em função do tempo para t > 0. (Dica: Ao desenhar a curva, lembre que este é um movimento uniformemente acelerado).

6. Um corpo é lançado do solo verticalmente para cima com velocidade inicial de 20 m/s Aproximando a aceleração da gravidade por g ~ 10 m/s2, calcule:

a) O tempo gasto pelo corpo para atingir o ponto mais alto da trajetória.

b) A altura máxima atingida pelo corpo.

7. Um homem atira uma pedra para cima, em linha reta, com uma velocidade inicial de 12 m/s. Encontre:

a) O tempo que a bola levou para atingir a altura máxima.

b) A altura máxima.

Gabarito:

1.

2. a) 2h

b) 75 km/h.

3. 1 m/s.

4. a) a = 2 m/s2

b) 30 m/s

c) 200 m.

5. a) x = 43m e v = 23m/s

b) x = 55m.

6. a) 2s

b) 20m.

7. a) 1.2s

b) 7.3m.

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Capítulo 2

O que vamos estudar neste capítulo?

Neste capítulo, vamos estudar os seguintes temas:

» Conceitos de Força e Massa

» Leis de Newton

Metas

Após o estudo deste capítulo, esperamos que você consiga:

» Saber a diferença entre peso e massa.

» Entender e aplicar as Leis de Newton.

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Capítulo 2 – Mecânica Clássica: Dinâmica

Vamos conversar sobre o assunto?

Nós estudamos o movimento com o uso de grandezas físicas como posição, velocidade e aceleração. Estas grandezas conseguem descrever o movimento, mas não conseguem explicar suas causas. Chamamos de Dinâmica a parte da mecânica clássica que estuda as causas do movimento. O cientista que mais contribuiu para o desenvolvimento da Dinâmica foi Isaac Newton (1643-1727), que criou as três leis que levam seu nome. Estas leis de Newton, quando utilizadas apropriadamente, conseguem prever o resultado de muitos experimentos. Contudo, Newton não fez todo o trabalho sozinho. Como ele mesmo disse, ele viu mais longe, pois estava apoiado sobre o ombro de gigantes. Vamos estudar brevemente trabalho de um desses gigantes. Um trabalho bastante original em mecânica que começa com um experimento.

2.1 Princípio da Relatividade de Galileu

Nossa histórica começa dentro de um navio que navega em alto mar em movimento uniforme. É curioso comprovar se a velocidade do navio é de fato constante. Para isso, precisamos de uma corda bem comprida. Nesta corda, vamos escolher uma unidade de comprimento, em metros, e dar um nó na corda a cada unidade de comprimento. Assim, nossa corda terá diversos nós igualmente espaçados. Depois, lançamos uma extremidade da corda no mar e seguramos o resto da corda. À medida que a extremidade lançada ao mar vai se distanciando do navio, vamos contando quantos nós passam em nossas mãos. Se a corda vai deixando o navio a uma taxa constante de nós por unidade de tempo, então a velocidade do navio é aproximadamente uniforme. Esta técnica para medir velocidade de navios é muito antiga ilustra bem o conceito de movimento uniforme.

Vamos levar Luka nesta viagem como um ajudante para nossos experimentos. Sabemos que quando uma pedra é abandonada a partir do alto de um prédio, ela cai em linha reta até o chão e chamamos este movimento de queda livre. No navio, Luka surgiu com uma dúvida bem pertinente:

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Vamos representar a dúvida de Luka na Fig. 2.1.

Fig. 2.1. A dúvida de Luka sobre a pedra que cai em um navio em alto mar. A pedra cai em linha reta, como em terra firme (a) ou “fica para trás” (b)?

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Do ponto de vista histórico, este problema foi pensado pela primeira vez por Galileu Galilei (1564-1642), um físico italiano que, dentre outras contribuições, criou o princípio da relatividade. Este princípio foi formulado após a experiência do navio que descrevemos acima. Antes de enunciá-lo, vamos explicar o que acontece no experimento. Quando Luka soltou a pedra do alto do mastro do navio, percebeu que a mesma cai linha reta, um movimento idêntico ao de queda livre. Portanto, a figura que ilustra de maneira mais correta o experimento real é a Fig. 2.1.(a). Em outras palavras, a pedra se comporta como se o navio estivesse parado. Você pode achar isso um pouco confuso, mas é fácil de entender o que acontece e este experimento contém toda a essência da Dinâmica que vamos estudar aqui. Na verdade, a pedra está se movendo com velocidade constante para a direita, assim como o navio também está se movendo com velocidade constante para a direita. No entanto, como o observador (Luka) e a pedra estão se movendo com a mesma velocidade, a pedra parece estar caindo em linha reta do ponto de vista de Luka e de toda a tripulação do navio.

Neste experimento, podemos dizer que o navio é o referencial. Sempre que perguntamos alguma informação sobre movimento, seja posição, velocidade ou aceleração, temos que especificar qual o referencial do problema, que é onde o observador está fazendo as medições. As respostas podem ser bem diferentes a depender do referencial que estamos trabalhando. Por exemplo, vimos que para o referencial do navio, a pedra solta do mastro está em queda livre (linha reta), pois o navio e a pedra estão em movimento uniforme. No entanto, para um referencial que está em terra firme, por exemplo, se estivéssemos na praia observando o navio passar, a pedra lançada descreveria uma trajetória curva, como na figura 2.2. Esta trajetória é uma parte de uma curva conhecida como parábola.

Fig 2.2. Para o referencial da praia, a pedra descreve uma trajetória curva (ramo de parábola), indicando que a pedra possui uma velocidade inicial constante para a direita.

Na Fig. 2.2, representamos em diferentes etapas do movimento do navio e combinamos em uma mesma figura. Como o navio está se movendo em relação ao referencial da praia, a cada intervalo de tempo a pedra cai alguns metros e o navio caminha alguns metros em velocidade uniforme. O movimento de queda livre combinado ao movimento uniforme do navio faz com que a trajetória observada pelo referencial da praia seja este ramo de parábola que ilustramos na figura.

Um conceito bastante útil quando tratamos de dois referenciais distintos, como o navio e a praia, é o de referenciais inerciais. A ideia é muito simples: dois referenciais A e B são chamados de inerciais se A, quando observado por B, está parado ou em movimento uniforme. Desta forma, podemos dizer que o navio e a praia são referenciais inerciais, já que o navio está em movimento uniforme em relação à praia. Agora podemos introduzir nosso enunciado do princípio da relatividade de Galileu que resume o experimento do navio:

“As leis da mecânica são as mesmas em diferentes referenciais inerciais.”

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Este enunciado quer dizer que os diferentes fenômenos que envolvem movimento devem obedecer às mesmas leis, não importando o referencial inercial em que estejam. Por exemplo, se você deixa uma pedra cair a partir do repouso do alto de um prédio e espera que ela caia em linha reta, então o mesmo tipo de queda livre em linha reta deve acontecer caso você repita o experimento do alto do mastro do navio apresentado anteriormente. Isto acontece de acordo com o princípio da relatividade, pois o navio está em movimento uniforme, fazendo com que ele e a terra firma sejam referenciais inerciais e, portanto, obedecem as mesmas leis da mecânica.

O que aconteceria caso o navio estivesse em movimento uniformemente variado? Neste caso, o navio e a terra firme não são mais referenciais inerciais. Estes referenciais, chamados de não inerciais, apresentam leis da mecânica diferentes e, como consequência, os resultados dos experimentos são diferentes. Neste exemplo do navio acelerando, o que observaríamos de dentro do navio quando soltamos uma pedra a partir do repouso do mastro é ilustrado na Fig. 2.3. Perceba que a pedra não cai em linha reta neste caso.

Fig. 2.3. A pedra solta do mastro de um navio acelerando não cai em linha reta para os observadores do navio.

Como o navio está acelerando (sua velocidade aumenta com o tempo), então ele e a terra firme não podem mais ser considerados referenciais inerciais. Logo, não vale o princípio da relatividade de Galileu e as leis da mecânica passam a ser um pouco estranhas no referencial do navio. Por exemplo, neste referencial os objetos que caem em queda livre possuem uma trajetória curva.

Você não deveria ficar espantado com referenciais não inerciais, eles fazem parte do seu cotidiano. Por exemplo, quando você está dentro de um ônibus em movimento uniforme, você consegue ficar em pé sem fazer o menor esforço. Isto acontece, pois neste caso o ônibus é um referencial inercial e tudo que você faz normalmente em terra firme você conseguiria fazer no ônibus: andar, pular, etc. Contudo, quando o motorista do ônibus resolve frear o veículo bruscamente, ele impõe uma aceleração negativa para diminuir a velocidade do ônibus. Neste intervalo de tempo, o ônibus não está mais em movimento uniforme. Isto faz com que o ônibus e sua casa, por exemplo, sejam referenciais não inerciais. Logo, o princípio da relatividade de Galileu não se aplica e as leis da mecânica que passam a governar o movimento das pessoas dentro do ônibus ficam diferentes. As pessoas não conseguiriam mais andar e pular da mesma maneira que fazem no chão firme, pois existe algo que as empurra para frente do ônibus. Esta situação está ilustrada na Fig. 2.4.

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Fig 2.4.1. Ônibus em movimento uniforme, representando um referencial inercial para os passageiros. 2. Após o freio do motorista, uma aceleração surge e

o ônibus passa a ser um referencial não inercial.

Vamos ver a opinião de Luka sobre esta situação do ônibus:

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Esta interpretação faz sentido e pode ser considerada correta. No entanto, se olharmos para os corpos em queda livre, você diria que existe algo empurrando os corpos para baixo e por isso eles caem. Na verdade, não existe muita diferente entre as pessoas serem jogadas para frente do ônibus que freia e os corpos que “são jogados” para baixo em queda livre. Para ilustrar nosso argumento anterior, imagine que você tenha nascido dentro de uma caixa preta em um ônibus em movimento e nunca tenha saído dela. De repente, o ônibus freia e você é projetado para frente. Para você, que não sabe da existência de um mundo externo para chamar de referencial inercial, aquela força que o empurrou para frente é uma força da natureza tão importante quanto à força que faz com que os corpos caiam. Para o referencial externo, como as pessoas em um ponto de ônibus, aquela força é imaginária e surgiu apenas pelo fato do ônibus ser um referencial não inercial. Em relação ao tempo de vida da mecânica clássica, esta conversa sobre referenciais não inerciais e gravidade é algo bem moderno. Ele é a semente do chamado princípio da relatividade de Einstein, desenvolvido no século passado e capaz de mudar quase tudo que você sabe sobre mecânica clássica. Vamos conversar sobre este princípio no final deste volume. Para entender os argumentos mais modernos, precisamos nos dedicar bastante ao estudo da mecânica clássica deste capítulo.

2.2 As Leis de Newton

Isaac Newton (1643-1727) foi um matemático e físico inglês que deu um formato à física que sobrevive até hoje. Newton pensava muito sobre a natureza e percebia a mecânica de forma bem particular. Ele percebeu que precisava de uma ferramenta matemática que ainda não tinha sido descoberta para elaborar uma teoria da dinâmica. Como ninguém tinha descoberto ainda esta ferramenta, chamada de cálculo diferencial e integral, Newton exerceu seu papel de matemático e criou o cálculo. Depois de entender como fazer as operações matemáticas, Newton criou as leis da mecânica clássica que levam seu nome. Mas que formato especial é este que ele deu a Física que pode ser percebido até hoje?

Com o uso do cálculo diferencial, Newton foi capaz de escrever equações cujas soluções indicavam sobre como um dado sistema se comportará no futuro. Esta capacidade de previsão que ele agregou à mecânica sob a forma do cálculo diferencial atingiu diversas áreas da Física e surgiu um sentimento estético nos cientistas de que tudo na natureza poderia ser previsto como na mecânica. O Universo seria bastante elegante se fosse desta maneira. Esta ideia de que a natureza funciona como um relógio e de que, no futuro, poderíamos prever todos os fenômenos do universo ficou conhecida como determinismo clássico. Esta é a ideia básica da mecânica newtoniana e da física em geral que tratamos anteriormente: a natureza se comporta de maneira regular, repetindo padrões que podem ser previstos com alguma precisão caso saibamos as leis que governam os fenômenos. O problema é que ainda não explicamos o que é uma lei.

Uma lei da física é uma regra que a natureza parece obedecer. Note que tomei o cuidado de escrever “parece”, pois nunca temos certeza se uma dada regra realmente é obedecida pela natureza. O que podemos fazer é inventar uma regra com base em resultados experimentais e em nossa livre intuição. Depois, deduzimos resultados matemáticos a partir destas leis e, finalmente, colocamos nossas previsões ao teste experimental. Se este conjunto de regras, que podemos chamar de teoria, sobreviver ao teste experimental, não podemos dizer que ela está correta, mas, pelo menos, ela não pode ser descartada. Então, até que alguém invente um experimento capaz de provar que a teoria está errada, então ela pode durar mais alguns anos. Conforme a tecnologia permita experimentos mais precisos, antigas teorias precisam ser reformuladas. Isto não significa que elas estejam

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completamente erradas. Apenas que precisam ser lapidadas para explicar uma nova classe de fenômenos que os teóricos nem imaginavam na época em que criaram. Isto faz com que a ciência esteja evoluindo continuamente. Todo este processo é chamado de método científico.

Apesar de o teste experimental ser o principal guia da ciência, ele não é o único. Imagine duas teorias que façam as mesmas previsões experimentais:

1 Os corpos próximos à superfície da Terra caem com aceleração constante.

2. Os corpos próximos à superfície da Terra caem com aceleração constante devido ao poder do nosso pensamento.

Nos dois casos, pode-se calcular que a trajetória dos corpos em queda livre é um ramo de parábola, se o lançamento for diagonal, ou uma linha reta, se o lançamento for vertical. Note que a segunda “teoria” faz uma afirmação muito forte sobre a origem da queda dos corpos que não pode ser testada experimentalmente. Como não podemos testar esta afirmação final, podemos descartá-la e ficar com a primeira teoria, pois ela é a teoria mais simples que explica a queda livre. Chamamos este princípio norteador da ciência de Navalha de Ockham, em homenagem ao seu criador, o filósofo William Ockham (1285-1349).

Já vimos o conceito de Lei da Física e o método científico, vamos explorar o determinismo clássico através das Leis de Newton:

Primeira Lei

Também conhecida como Lei da Inércia, a primeira lei de Newton pode ser traduzida da seguinte forma:

“Todo corpo persiste com velocidade constante, a menos que um agente externo tente mudar seu estado de movimento”

Vamos interpretar esta Lei. Inicialmente, para o caso em que a velocidade do corpo é zero, é fácil entender que ele está parado e continuará parado a menos que algum agente (uma pessoa, um carro, etc.) tente empurrá-lo. Se nenhum agente tentar mudar o fato dele estar parado, então ele continuará parado. Esta situação é bem fácil de entender.

A situação mais complicada surge quando o corpo já possui uma velocidade constante diferente de zero, em movimento uniforme. A Lei diz que um corpo em movimento uniforme continua com velocidade constante até que algum agente externo tente alterar seu estado de movimento. Ou seja, se você dá um empurrão em uma caixa de sapatos que está no chão, ela deveria assumir uma velocidade constante e continuar com esta velocidade até bater em um objeto. E se você der um empurrão em caixa de sapatos em um campo aberto bem grande, ela percorreria todo o campo com velocidade constante?

Na prática, a caixa de sapato não caminha com velocidade constante, pois o próprio chão e o ar fazem o papel de agentes externos que estão “atrapalhando” o movimento da caixa que, de acordo com a Primeira Lei, deveria ser um movimento uniforme. Então, você poderia fazer uma experiência ainda mais ousada. Se você sair do planeta Terra e for para um lugar do espaço bem distante, bem longe de estrelas e outros planetas. Nessa região do espaço, praticamente não existe gravidade, não existe ar ou chão, apenas o vazio (vácuo). Se você chutar uma caixa de sapatos, ela iniciará um movimento com velocidade constante e continuará assim por muito tempo. Se não encontrar um obstáculo (e não for atraída por nenhuma força), ela continuará para sempre o movimento, de acordo com a primeira Lei.

Precisamos realmente fazer esta experiência no espaço para verificar a Lei de Newton? Na verdade, podemos simular situações em que a contribuição dos agentes

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externos é tão pequena que um experimento pode ilustrar a primeira Lei. Se você tiver uma superfície bem polida, como o gelo de uma pista de patinação, chutar um disco, o atrito entre o disco e o gelo é tão pequeno que o disco caminha alguns metros com velocidade aproximadamente constante, de acordo com a primeira Lei de Newton.

Você deve lembrar o que aconteceu nas Fig. 2.1-2.3., em que uma pedra foi solta de um navio que estava acelerando. Vamos interpretar o resultado do experimento com a primeira Lei. Como a pedra estava caminhando junto com o navio, ela tinha uma dada velocidade para a direita igual à do navio. Quando a pedra foi solta, ela continuou com a velocidade para a direita de acordo com a primeira Lei de Newton, que é a mesma velocidade do navio. Contudo, surgiu uma aceleração para baixo devido à gravidade. Mesmo assim, quando o navio caminhava dez metros para a direita, por exemplo, a pedra também caminhava 10 metros para a direita, mesmo enquanto ela está caindo. Isto causa a sensação de que a pedra está caindo em linha reta para quem está observando de dentro do navio. É que o corpo possui um estado do movimento para cada eixo coordenado. Neste caso, a pedra está em movimento uniforme no eixo horizontal e em queda livre no eixo vertical. Mesmo assim, a primeira Lei pode ser aplicada.

Já no experimento do navio acelerado, quando a pedra foi solta do mastro do navio, ela possui uma velocidade inicial que é idêntica à do navio no momento em que foi solta. No entanto, como o navio está acelerando, a velocidade do navio vai aumentando e superando a velocidade da pedra. Isto faz com que o navio fique cada vez mais rápido que a pedra. A sensação é de que a pedra está ficando para trás para a tripulação do navio.

O exemplo do ônibus, ilustrado na Fig. 2.4, mostra mais um caso que pode ser interpretado pela primeira Lei. Os passageiros estavam no ônibus com uma velocidade constante, igual à velocidade do ônibus. De repente, o ônibus freia bruscamente, com uma aceleração negativa que diminui sua velocidade. O problema é que este agente externo atuou no ônibus e não alterou o estado de movimento das pessoas, que tendem a continuar com velocidade constante, de acordo com a primeira Lei. Como o ônibus está ficando cada vez mais lento e as pessoas continuam com a mesma velocidade alta, elas parecem ser projetadas para frente do ônibus, pois estão mais rápidas que ele. Por isso, elas precisam segurar em alguma coisa ou atingir algum obstáculo para reduzir sua velocidade e igualar à velocidade do ônibus novamente. Por esses motivos, alguns autores afirmar que a primeira Lei é uma definição de referenciais inerciais, necessária para as próximas leis.

Segunda Lei

A Segunda Lei de Newton nos dá uma receita para descobrir como um corpo acelera. A causa deste movimento é chamada de força. O enunciado original da segunda Lei será traduzido de uma forma a utilizar os conceitos que já conhecemos:

“A aceleração de um corpo é proporcional à intensidade de uma força e acontece na mesma linha de ação desta força”.

Vamos interpretar esta Lei. Vimos que a primeira Lei de Newton indica que o estado normal de movimento dos corpos, na ausência de agentes externos, é o de movimento uniforme. Ou seja, caso nada ou ninguém tente alterar o movimento de um corpo, ele continuará com sua velocidade constante. A segunda Lei diz o que acontece nos casos em que um agente externo atua sobre o corpo. Neste caso, a velocidade do corpo sofrerá modificações devido a uma aceleração. A causa desta aceleração, de acordo com a Lei, é uma influência de um agente externo que é chamada de força. Além disso, a aceleração que o corpo sofre acontece na mesma direção que esta força está atuando. Por exemplo, se uma força empurra o corpo para a direita, o corpo sofre uma aceleração para a direita.

Na prática, é fácil identificar uma força. Toda vez que alguém empurra ou puxa uma

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caixa está exercendo uma força sobre a caixa. Quando um corpo está caindo, dizemos que o planeta Terra está exercendo uma força para baixo sobre o corpo, que chamaremos de força gravitacional. Até mesmo neste momento, em que estamos parados, existe uma força do planeta Terra sobre nossos corpos. Luka tem uma observação curiosa sobre esta tal de força:

A dúvida de Luka é bem pertinente, e envolve o conceito de força resultante (Fres). Quando mais de uma força atua sobre um corpo, só podemos encontrar a aceleração do corpo quando calculamos qual a resultante das forças que atuam sobre o corpo. Esta força resultante é uma soma das diferentes contribuições das forças. Como as forças podem atuar em sentidos diferentes, esta força resultante pode até mesmo ser nula. Por exemplo, duas crianças puxam um brinquedo em sentidos opostos e com a mesma força, o brinquedo fica parado. No entanto, existem forças atuando sobre ele. Essa situação não vai de encontro à segunda Lei de Newton, pois as forças que atuam sobre ele se cancelam. Isto implica em uma força resultante igual a zero e aceleração também igual a zero.

Logo, a dúvida de Luka pode ser respondida da seguinte forma. Quando estamos sentados em uma cadeira, existe uma força puxando nossos corpos para baixo dada pela gravidade do nosso planeta. No entanto, existem também outras forças, como a da cadeira empurrando nossos corpos para cima, que resultam em uma força total (ou resultante) igual a zero e permanecemos parados. Já uma pedra que é lançada para cima possui apenas uma força empurrando-a para baixo, que é a força gravitacional, fazendo com que sua aceleração seja para baixo e ela caia eventualmente.

Em resumo, para descobrir a aceleração de um corpo, precisamos somar as contribuições de todas as forças que atuam sobre ele. Se a força resultante for diferente de zero, como o caso da pedra que cai, então existirá uma aceleração e sua velocidade

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começará a mudar.

Luka sabe o que é aceleração e ele entendeu como esta Lei funciona. Força resultante está relacionada à aceleração, mas uma coisa ele ainda não entendeu. O problema é o seguinte:

É verdade que Luka é capaz de empurrar dois corpos distintos com a mesma força. De acordo com a Lei de Newton, sua aceleração deveria ser proporcional a esta força. Acontece que cada corpo possui uma propriedade que está relacionada à dificuldade dele ser empurrado ou puxado. Esta propriedade é chamada de massa inercial, ou simplesmente massa. Esta grandeza física que já conhecemos faz parte das grandezas fundamentais do Sistema Internacional e sua unidade é o quilograma (kg). Apesar de Luka ter empurrado as duas bolas com a mesma força, a massa da bola de boliche é maior, o que resulta em uma aceleração menor que a bola de futebol. Chegou o momento de escrever estas considerações utilizando uma fórmula matemática bem conhecida:

Fres = ma

Note que escrevemos uma equação matemática que envolve a grandeza força. Apesar desta grandeza não fazer parte das grandezas fundamentais do SI, podemos descobrir quais suas unidades de medida a partir da análise dimensional da equação. Vamos utilizar a notação [x] para denotar as unidades de medida da grandeza x. Assim:

[Fres] = [m][a] = (kg) (m/s2)

Concordo que a unidade de kg m/s2 é um pouco inconveniente de ser escrita toda

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vez que queremos falar de força. Em homenagem ao seu criador, esta unidade pode ser abreviada como Newton (N). Assim, toda vez que falamos em uma força, já sabemos que sua unidade de medida é o Newton:

1(kg) (m/s2) = 1N

Vamos verificar rapidamente a interpretação matemática do problema das bolas de Luka. A mesma força FLuka foi responsável por empurrar a bola de futebol (1) e a bola de boliche (2). Vamos escrever a segunda Lei para cada caso:

FLuka = m1a1

FLuka = m2a2

Como a força é a mesma, podemos escrever:

Finalmente, utilizando o fato da massa da bola de boliche ser maior que a massa

da bola de futebol . A aceleração da bola de futebol é maior que a aceleração da bola de boliche:

Esta massa inercial que utilizamos na nossa argumentação é a mesma massa que medimos em uma balança. O interessante é que com esta massa podemos saber o valor da força que o planeta Terra faz sobre nossos corpos. Por exemplo, alguém que tem massa de 70kg sofre uma força causada pelo planeta Terra que pode ser aproximada por:

Fg = ma = mg = (70kg) (9.8 m/s2) ≈ 700N

Esta força é chamada de força gravitacional (Fg) e, na maioria dos casos, vamos chamá-la de força peso e representá-la por P. Antes de estudarmos a Terceira Lei de Newton, vamos aprender um pouco mais sobre forças.

Forças e Vetores

A massa de um corpo é uma grandeza física expressa em quilogramas (kg). Para esta grandeza, toda informação necessária está contida em uma quantidade e sua unidade de medida. Por exemplo, se um corpo tem 25kg, nenhuma informação adicional sobre a massa desse corpo se faz necessária, já que sabemos a unidade de medida (kg) e quantidade (25). A massa é uma grandeza escalar, pois pode ser representada por um número. Será que todas as grandezas em física são escalares?

Imagine que uma bola está parada em um campo de futebol. Você tem a missão de descrever a posição desta bola. Se a bola estiver no centro do campo, é fácil dizer que ela está “no centro” ou na “origem”. Contudo, se a bola estiver em uma posição diferente, você pode ter dificuldade de tentar descrevê-la. Se a posição da bola no campo fosse uma grandeza escalar, bastaria que você informasse um número e sua unidade de medida. Por exemplo, x = 30m. Neste caso, eu perguntaria: trinta metros a partir de que posição? Bem, se você estiver medindo a posição a partir do centro do campo (origem), eu ainda não saberia em que direção você está medindo. Este número é necessário para localizar a bola, mas certamente não é suficiente. Você precisa dar uma informação adicional, outra coordenada.

Por exemplo, a informação completa poderia ser do tipo x = 30m e y = 10m, ou P = (30m,10m). A primeira coordenada representa a posição na direção x (horizontal), enquanto a segunda coordenada representa a posição na direção y (vertical). Ambas as posições são medidas em relação ao centro do campo, usualmente chamado de origem. Ilustramos a posição da bola na Fig. 2.5.

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Fig. 2.5. Representação da posição de uma bola em um campo de futebol. Duas coordenadas são necessárias, indicando que a posição é uma grandeza vetorial.

Desta maneira, concluímos que nem todas as grandezas na física são escalares. Algumas precisam de mais informação do que simplesmente um número. Estas grandezas, que precisam de mais coordenadas para serem descritas, são chamadas de grandezas vetoriais. Elas são representadas por vetores. Este assunto é mais bem estudado em um curso de Geometria Analítica. Aqui, vamos introduzir de maneira intuitiva os elementos necessários para nosso estudo de dinâmica.

Como ilustrado na Fig. 2.5, um vetor é um segmento de reta orientado. Um segmento de reta é um “pedaço” de uma reta que liga dois pontos distintos. A orientação do vetor é representada por uma seta (“ponta de flecha”) que desenhamos para indicar seu sentido, ou seja, para onde ele aponta. A posição, por exemplo, é uma grandeza vetorial e podemos representá-la por um vetor que começa na origem do sistema de coordenadas (ponto (0,0)) e termina no ponto P.

É comum utilizarmos símbolos para representar vetores. O símbolo mais comum é uma pequena flecha desenhada em cima de uma letra (ou letras). Sabemos que o segmento de reta que vai de O ao ponto P é representado por . Já o vetor que vai de O ao ponto P é representado por . Note que existe uma ligeira diferença entre as notações e, no caso de

vetores, o vetor que vai de O a P é diferente do vetor que vai de P a O , pois o sentido para onde a flecha está apontando faz toda a diferença.

Um vetor possui algumas características que precisam ser definidas para um melhor entendimento das Leis de Newton. São elas: direção, sentido e intensidade (ou módulo).

Como um vetor pode ser representado por um segmento de reta orientado, a direção do vetor fica definida como a reta suporte do segmento de reta. Por exemplo, no caso ilustrado na Fig. 2.5, a direção do vetor está representada pelo desenho da flecha em negrito. Dada a direção do vetor, o vetor pode ter dois sentidos. No caso da Fig. 2.5, o sentido é do ponto O ao ponto P, representado pela “flecha” que aponta par ao ponto P.

A intensidade de um vetor (ou módulo do vetor) é o “tamanho” do segmento de reta que representa o vetor. Você precisa usar um pouco de geometria plana para descobrir quanto mede um segmento de reta. O módulo é representado por duas barras da forma

. Assim, apesar de ser um vetor, o módulo é um número positivo. No exemplo ilustrado na Fig. 2.5, o módulo do vetor posição da bola pode ser encontrado usando o teorema de Pitágoras:

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É interessante que mesmo sem desenhar o vetor você poderia ter descoberto seu módulo utilizando apenas as coordenadas do vetor posição:

E como você deve interpretar esta nomenclatura? Bem, vamos visualizar este par ordenado como sendo uma regra de construção de vetores da seguinte maneira: para chegar ao ponto desejado (P) saindo da origem (O), você deve andar 30m para a direita e depois andar 10m para cima. Esta ideia pode ser representada matematicamente de uma maneira muito elegante. Vamos representar nossos passos para a direita por um vetor de

módulo unitário (ou seja, seu tamanho é 1) chamado de e os passos para cima serão representados por um vetor de módulo unitário chamado . Ilustramos esta situação na Fig. 2.6.

Fig. 2.6. Decomposição de um vetor em coordenadas.

Matematicamente, representamos esta situação da seguinte forma:

Apesar de usarmos um símbolo conhecido (+), esta soma que apareceu na última equação não é uma soma de números. É uma soma de vetores. Na própria Fig. 2.6, você pode verificar o resultado da soma de dois vetores e . Chamamos esta representação de decomposição em vetores unitários. O procedimento para desenhar o vetor soma é muito simples. Primeiro desenhamos um dos vetores, em seguida, a partir do final do primeiro vetor, começamos a desenhar o segundo vetor. Depois, ligamos o começo do primeiro vetor (O) ao final do segundo (P) e obtemos o vetor soma. Este procedimento está representado de maneira clara para na Fig. 2.7.

Fig. 2.7. Representação do vetor soma.

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A maior utilidade da decomposição em vetores unitários é que fica muito fácil realizar somas e subtrações com vetores. Basta que estas operações sejam realizadas em suas componentes. Vamos exemplificar estas operações que mencionamos com alguns exemplos a partir dos vetores e :

Estas operações são bem mais fáceis que representar o vetor com desenhos. No entanto, os desenhos podem ser úteis para uma visualização do problema. Aprendemos a calcular o módulo do vetor a partir de suas componentes. E como calcular as componentes do vetor de posse de seu módulo? Bem, precisamos de uma informação adicional, por exemplo, o ângulo que o vetor faz com o eixo horizontal. Este é um problema simples de trigonometria:

Fig 2.8. Cálculo das componentes de um vetor a partir do módulo e do ângulo com a horizontal.

Você deve estar confuso sobre o motivo pelo qual resolvemos parar de falar de dinâmica por algumas páginas. Na verdade, vetores estão também relacionados com dinâmica, sobretudo com a representação de Forças. O conceito que falamos de força resultante só pode ser mais bem entendido se considerarmos que as forças são vetores e que a força resultante é a soma vetorial de todas as forças que atuam em um corpo. Matematicamente, no caso de N forças atuando sobre o corpo:

De acordo com a Segunda Lei de Newton, a força resultante tem que ser igual ao produto da massa pela aceleração do corpo. No entanto, se a força é um vetor e aceleração é um vetor, como podemos dizer que dois vetores são iguais? Com a nossa notação de vetores unitários, fica fácil dizer quando dois vetores são iguais. Para que eles sejam iguais, todas as suas coordenadas precisam ser iguais. Assim, a Segunda Lei de Newton pode ser escrita de outra forma:

Onde Fres X e Fres Y representam as componentes X e Y do vetor força resultante e ax e ay representam as componentes X e Y do vetor aceleração. Vamos ver alguns exemplos de como esta maneira de representar a Segunda Lei funciona. No caso da força gravitacional, temos que a aceleração na direção Y é –g (aponta para baixo), enquanto a direção X não

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possui nenhuma aceleração. Matematicamente:

Com isso, podemos dizer que a força gravitacional atua apenas na direção Y e não altera o estado de movimento na direção X. Pela primeira Lei de Newton, se o corpo estiver em movimento uniforme na direção X, mesmo que esteja caindo sob efeito da força gravitacional, continuará em movimento uniforme na direção X.

Esta notação que aprendemos sobre vetores será de extrema utilidade ao longo do estudo da dinâmica. Muitos dos exercícios da lista serão baseados no conceito de Força como grandeza vetorial. Portanto, é importante que você saiba exatamente o que significa o módulo, direção e sentido de um vetor. Além disso, você precisa saber operar matematicamente (somas e subtrações) com vetores a partir de sua decomposição em componentes. Encontrar as componentes de um vetor a partir de seu módulo e direção também é fundamental. Todas estas ferramentas serão utilizadas na lista de exercícios no final do capítulo.

É comum nos exercícios de Física que seja solicitado um desenho das forças ou diagrama de forças. Este esquema é apenas uma representação de todas as forças que atuam no corpo, dado que estas são grandezas vetoriais. Veremos exemplos de diagramas de força quando estudarmos os diferentes tipos de forças da natureza mais adiante.

Terceira Lei

Quando empurramos uma caixa, vimos que estamos alterando seu estado de movimento através de uma força que faz com que a caixa apresente uma aceleração. No entanto, não percebemos que a caixa também exerce uma força sobre nossos corpos. Caso você tente empurrar uma caixa muito pesada, fica evidente que empurrar a caixa é difícil, precisamos de uma força muito maior para criar uma pequena aceleração e, com uma força ainda maior, a caixa parece exercer uma força ainda maior sobre nossos corpos. Esta força exercida pela caixa em nossos braços é uma reação à força exercida pelos nossos braços na caixa. A Terceira Lei de Newton resume este fenômeno das forças de reação.

Esta Lei geralmente é interpretada de maneira incorreta pelas pessoas. Vamos enunciá-la e explicar qual sua interpretação mais correta:

“Para cada ação, existe uma reação igual e em sentido oposto. As forças entre dois corpos são iguais em magnitude e de sentidos contrários.”

Em outras palavras, a Terceira Lei diz que todas as vezes que um corpo A exercer

uma força sobre um corpo B, que chamaremos de , então o corpo B exercerá uma força

sobre o corpo A. Esta força, chamada , possui a mesma intensidade que , mesma direção e sentidos opostos.

A interpretação incorreta da Lei decorre da primeira frase do enunciando, que indica que cada ação possui uma reação. Quando utilizada fora do contexto correto de mecânica clássica, as pessoas devem tomar muito cuidado ao utilizar o conceito “ação e reação” no cotidiano. Newton fez referência apenas ao par ação e reação das forças em mecânica, algo que possui uma definição bem precisa. A Terceira Lei não se aplica a ação e reação de eventos que vivenciamos nas nossas vidas. Fique atento ao uso do nome de Newton e de suas Leis por quem não teve oportunidade de estudá-las e pretende utilizar de maneira irresponsável o nome do cientista para provar seus pontos de vista.

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Quando pensamos em termos de pessoas empurrando caixas, é fácil entender que a pessoa empurra a caixa e é empurrada pela caixa. Mas a Terceira Lei fez uma pequena confusão na cabeça de Luka e acredito que quase todos nós devemos ter esta dúvida:

Realmente, esta situação levantada por Luka é muito estranha. Inicialmente, vamos explicar melhor o que ele quer dizer com esta pergunta. Como sabemos, nós somos

puxados pelo planeta Terra em direção ao seu centro. Esta força, chamada força gravitacional é exercida pelo planeta em nossos corpos. De acordo com a Terceira Lei de

Newton, deveria existir uma força exercida pelos nossos corpos no planeta Terra. Esta força, com a mesma magnitude da força gravitacional, deveria puxar o planeta Terra em nossa

direção. É verdade?

Sim, é verdade. Cada um de nós puxa o planeta Terra, assim como a Terra nos puxa. A força gravitacional é um pouco mais complicada de ser entendida, pois é uma força entre dois corpos exercida a uma distância qualquer.

Outro motivo de dúvida é a confusão entre o corpo que exerce a força e o corpo que recebe a força. Como vimos, uma força exercida pelo corpo A em um corpo B (podemos chamar de ação) possui uma força (reação) exercida pelo corpo B em A. É um erro comum assumir que a força de reação é exercida também em B, o que resultaria no cancelamento das forças, que seria absurdo. Portanto, um par de forças de ação e reação nunca poderá “ser cancelado”, pois as forças atuam em corpos distintos. Vamos estudar algumas forças comuns em problemas de mecânica clássica e estudá-las do ponto de vista das Leis de Newton.

Força Gravitacional

Já mencionamos nos parágrafos anteriores as características da força gravitacional.

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Em resumo, a força gravitacional é uma força entre dois corpos que atua a uma distância qualquer. Como veremos no próximo capítulo, quanto maior a massa dos corpos, maior o valor da força gravitacional. Similarmente, quanto menor a distância entre os corpos, maior o valor da força gravitacional.

O caso geral desta força será assunto do próximo capítulo. Portanto, vamos apenas nos limitar à força gravitacional exercida pelo planeta Terra nos corpos próximos à superfície do planeta. Neste caso, a força pode ser escrita como:

Fg = mg

Esta força aponta para baixo, no sentido do centro do planeta, como ilustrado na Fig. 2.5. Como você pode verificar, ela depende da massa do corpo e da aceleração da gravidade. Interessante é que, como vimos você exerce uma força da mesma magnitude sobre o planeta.

Fig 2.5. Representação do planeta Terra exercendo atração gravitacional em uma goiaba. Note que a goiaba também exerce força sobre o planeta, de acordo com a Terceira Lei de Newton.

Contudo, a massa do planeta é tão grande e estas forças são exercidas em todas as direções que, quando calculamos a força resultante sobre ele, é praticamente nula. A única força que realmente faz a diferença sobre o movimento do nosso planeta é uma força que (1) seja causada por um corpo muito “pesado” e (2) o corpo esteja relativamente próximo. Estas são duas características do sol que, como veremos, é o rei do nosso sistema solar em muitos sentidos.

Força Normal

A força Normal é um tipo de força muito comum no nosso cotidiano. Toda vez que empurramos alguma coisa, sentimos a força normal causada pelo objeto nos nossos corpos. Quando ficamos em pé, não caímos em direção ao centro da Terra, pois o chão exerce uma força normal em nossos corpos. Em resumo, sempre que um corpo está em contato com alguma superfície, seja ela o chão, a parede ou outros corpos, dizemos que o corpo sente uma força normal. A força normal tem uma característica especial: o vetor que representa a força normal é sempre perpendicular (ou normal) à superfície causadora da força. Verifique as ilustrações de diferentes casos em que encontramos força normal na Fig. 2.6.

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Fig.2.6. Diferentes aplicações da força Normal: (a) Pessoa sente uma força normal causada pelo chão. (b) Força normal causada pela caixa quando tentamos empurrá-la. (c) Força normal atuando sobre

um corpo que está em um plano inclinado.

É um erro muito comum entre os alunos dizer que a força normal é uma força de

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reação à força gravitacional, como na Terceira Lei. Vamos explicar a situação em que ocorre este erro. Como na Fig. 2.6.(a), a força gravitacional atua sobre nossos corpos, mas não caímos, pois a força normal “equilibra” (ou cancela) a força gravitacional. Já que as forças se cancelam, então a força resultante sobre nossos corpos é nula e, de acordo com a primeira Lei, nós permanecemos parados ou em movimento uniforme. Matematicamente temos:

Fres = 0 → P + N = 0 → N = -mg

Neste caso, como a força gravitacional e a força normal possuem mesma intensidade, mesma direção e sentidos opostos, é comum que os alunos confundam esta situação com as forças de ação e reação discutidas Terceira Lei. Realmente a força gravitacional e a força normal se cancelam, mas não são ação e reação por um motivo simples. A força gravitacional de reação é exercida pelo corpo da pessoa na Terra, já a força normal de reação é exercida pelo corpo da pessoa no chão. Um par de forças (ação e reação) da Terceira Lei de Newton atua em corpos distintos. Na Fig. 2.7, mostramos exatamente onde estão as forças de reação desta situação estudada.

Fig 2.7. Representação dos pares de ação e reação da força gravitacional (ou peso P) e da força Normal. Perceba que a reação da força peso atua no centro da Terra, enquanto a reação da Normal

atua na mesa.

Força de Atrito

De acordo com a Primeira Lei de Newton, quando chutamos um disco no chão para que ele deslize, ele deveria continuar eternamente em movimento uniforme até atingir algum obstáculo. Na prática, sabemos que o disco fica cada vez mais devagar até parar. O que está acontecendo neste caso é uma violação da Primeira Lei de Newton?

Na verdade, a Lei não foi violada. O problema é que existe uma força que não

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Conceitos de Física

estamos vendo responsável por desacelerar a caixa até que ela pare. Esta força é chamada força de atrito e, diferentemente da força normal, atua paralelamente às superfícies. Por esse motivo, a caixa possui uma força resultante que não permite que ela se mova com velocidade constante. Representamos diferentes situações da força de atrito na Fig. 2.8.

Fig. 2.8. (a) Disco que desliza no chão “perde” velocidade devido à força de atrito. (b) Nós andamos devido à força de atrito entre nossos pés e o chão. (c) Caixa em plano inclinado pode permanecer

parada devido à força de atrito.

A situação do disco que desliza está representada em 2.8.(a). Quando lavamos o chão e jogamos água e sabão, porque ficamos com medo de escorregar? Bem, a força de atrito entre nossos pés e o chão é o que faz que possamos andar. A água e o sabão

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diminuem bastante o atrito e, quando tentamos andar nesta situação, podemos levar uma queda. Portanto, a força de atrito é a força que permite que nós possamos andar como na Fig. 2.8.(b). Já um bloco pode repousar em uma rampa sem cair por causa da força de atrito, que atua sobre o bloco e compensa a força peso.

Note que existem duas situações distintas em que surge a força de atrito. Na Fig. 2.8.(a), o disco está se locomovendo e sente força de atrito atuando sobre ele. Neste caso, em que há movimento relativo entre as superfícies, dizemos que há uma força de atrito cinético . Nos casos da Fig. 2.8.(b) e (c) as superfícies não deslizam entre si, então dizemos que há uma força de atrito estático .

O valor da força de atrito cinético depende das superfícies que estão em contato. O atrito entre o disco e uma pista de gelo é bem diferente de um disco e o asfalto. Portanto, vamos definir um número, chamado coeficiente de atrito cinético (µc) cujo valor depende das superfícies que estão em contato. Além da superfície, a força de atrito depende também da intensidade da força Normal que atua sobre o corpo. Um corpo muito leve quando está no chão, possui uma força normal também muito pequena e o atrito será baixo. De outra forma, em uma caixa muito pesada atua uma força Normal muito intensa e a força de atrito será maior.

Assim, podemos unir estas informações e propor uma fórmula para o cálculo da força de atrito cinético:

Já o cálculo da força de atrito estático é um pouco diferente. O problema é que a força de atrito estático pode assumir qualquer valor, de zero até um valor máximo. Por exemplo, quando tentamos empurrar uma caixa e não conseguimos, é porque a força de atrito estático é igual à força que estamos exercendo na caixa. Luka tem uma dúvida:

Em outras palavras, como sabemos que a força de atrito não é maior que a força

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que estamos exercendo? De acordo com a Primeira Lei de Newton, como você observa a caixa parada, então a força de atrito estático tem que ser exatamente igual à força que você exerce sobre ela. É simples, se a força de atrito fosse maior que a força que você exerce sobre a caixa, existiria uma força resultante para trás e caixa começaria a andar para trás, que seria muito estranho.

Fig. 2.9. Quando a caixa está parada, a força de atrito estático é igual à força que exercemos sobre ela. Caso contrário, ela se moveria.

Quando chamamos alguém mais forte para empurrar a caixa e ela ainda continua parada, então a força de atrito estático agora aumentou para igualar a nova força externa que está sendo exercida sobre a caixa pelo nosso colega mais forte. Por isso não existe uma fórmula para calcular a força de atrito estático, seu valor depende da situação. No caso da Fig. 2.9, seu valor depende da força de quem está empurrando a caixa. Uma pergunta rápida: A força de atrito e a força externa da Fig. 2.9 formam um par (ação e reação) de forças no sentido da Terceira Lei? Não, pois são forças que atuam na mesma caixa. A reação da força F atua no corpo do sujeito e a reação da força de atrito atua no chão.

No entanto, sabemos que se colocarmos uma força muito alta, a caixa eventualmente entrará em movimento. Isto acontece porque a força de atrito estático iguala a força externa que atua sobre a caixa até um determinado limite. Este limite, chamado de força de atrito estático máximo depende das superfícies (da caixa e do chão) e da força Normal sobre a caixa de acordo com a fórmula:

O número µe é chamado de coeficiente de atrito estático, e você deve imaginar porque há certa confusão com este tipo de força. Como a fórmula é muito parecida com a força de atrito cinético, os alunos tendem a utilizar esta fórmula em todas as situações, mesmo quando o atrito estático não está em seu valor máximo. Isto pode gerar alguns absurdos.

Por exemplo, se a força de atrito estático máximo for de 40N e nós empurramos uma caixa com uma força de 30N, o correto seria dizer que a caixa não se move, pois a força externa é menor que a força de atrito estático máxima. Neste caso, a força de atrito seria de -30N, para compensar nossa força e a caixa permanecer parada. Algum aluno poderia cometer o erro em dizer que, como a força de atrito é de 40N e a força que exercemos é de 30N, a caixa tem uma força resultante de 10N para trás, o que seria um absurdo.

Vamos fazer uma breve experiência para resumir o conceito de força de atrito estático e cinético. Inicialmente, considere uma caixa em cima de uma superfície qualquer.

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A caixa está parada, pois a força peso e a força normal se cancelam. Vamos aplicar uma força de 1N sobre a caixa. Ela não se move, pois existe uma força de atrito estático de mesma intensidade no sentido contrário. Quando aplicamos 2N, a caixa permanece parada pelo mesmo motivo. Vamos registrar diferentes forças externas aplicadas no eixo X, enquanto calcularemos a força de atrito no eixo Y na Fig. 2.10.

Fig. 2.10. Experiência para estimar força de atrito estático e cinético. Note que o atrito estático vai de zero a um valor máximo, enquanto o atrito cinético é sempre o mesmo.

Uma rápida análise do gráfico nos mostra alguns detalhes interessantes sobre a força de atrito. Inicialmente, como já mencionamos, a força de atrito estático possui um valor variável, que depende do problema, e vai de zero até um valor máximo. Depois de atingir o valor do atrito estático máximo, a força a caixa começa a entrar em movimento e esta passagem é marcada por uma ligeira queda observada na força de atrito. A partir deste ponto, não importa mais a força que estamos exercendo sobre a caixa, pois a força de atrito cinético terá sempre o mesmo valor, dada pela fórmula que já estudamos .

De acordo com o gráfico, é interessante que o atrito estático máximo seja maior que o atrito cinético, pois isto implica que o coeficiente de atrito estático (que serve para calcular o valor máximo da força de atrito estático) é maior que o coeficiente de atrito cinético.

µe > µc

Esta situação é bem conhecida para quem já tentou empurrar alguma coisa pesada. Para fazer um objeto pesado entrar em movimento, precisamos exercer uma força bem

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elevada, mas quando o objeto começa a entrar em movimento, empurrá-lo fica um pouco mais fácil.

Resistência do Ar

A resistência do ar é um tipo de força de atrito. Como ela não está relacionada ao atrito entre superfícies, podemos falar desta força separadamente. Suponha que você deixe cair do alto de um prédio dois corpos: uma pena de galinha e uma bola de boliche. Você já deve ter percebido que uma pena de ave e uma bola de boliche caem de maneira diferente. A bola de boliche atingirá o solo mais rapidamente que a pena de galinha, que apresenta uma trajetória complicada. De acordo com o que estudamos na força gravitacional, elas deveriam cair com a mesma aceleração. Será que a gravitação está realmente correta ou nossa experiência está nos enganando?

Na verdade, a teoria da gravitação está correta: realmente os corpos caem com a mesma aceleração, quando estamos próximos à superfície da Terra. Contudo, nossa experiência com a bola de boliche e a pena de galinha não foi realizada em condições “ideais” para medir o efeito gravitacional. O problema é que nesta experiência existe um fator externo que está fazendo uma grande diferença no fenômeno que queremos medir. Este agente externo é a resistência do ar.

A pena de galinha, pelo seu formato achatado, parece sofrer maior efeito devido à presença do ar, pois como ela é leve, qualquer movimento do ar altera sua trajetória. Já a bola de boliche parece não alterar seu rumo devido à presença do ar, mas mesmo ela sente os efeitos da resistência do ar e diminui sua velocidade de queda, como se houvesse algum tipo de freio. Caso não houvesse ar e os dois corpos (pena e bola de boliche) fossem soltos, os dois cairiam exatamente no mesmo instante de tempo, como ilustrado na Fig. 2.11.

Fig. 2.11. Experiência com bola de boliche e uma pena de galinha caindo de um prédio. Note que, na ausência de ar (vácuo), os dois corpos caem juntos, como previsto pela gravitação.

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A presença do ar em nossa atmosfera também traz utilidades para a mecânica clássica. Basta lembrar que o avião consegue levantar vôo, pois faz uso da presença do ar em seu favor. Vamos estudar como funciona a asa de um avião em uma ocasião em que estivermos estudando o movimento dos fluidos.

Tração

Esta é a força que surge quando resolvemos puxar uma caixa através de uma corda. Um detalhe importante é que esta força aparece apenas quando a corda está tensionada, ou seja, quando ela está esticada o suficiente. Representamos diferentes aplicações da força de tração na Fig. 2.12.

Fig 2.12. Diferentes aplicações da força de Tração: (a) Uma caixa sendo puxada por uma corda. (b) Duas caixas ligadas por uma corda que passa por uma polia. (c) Um pêndulo simples.

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Algumas características desta “corda ideal” que utilizamos nos exemplos de mecânica precisam ser esclarecidas. Primeiro, a corda é considerada inextensível. Isto significa que não importa a força a qual a corda está submetida, ela nunca mudará de tamanho (nem será rompida). Outra aproximação é que a corda transmite a força colocada em uma ponta de forma instantânea para a outra ponta. A força tem o mesmo valor, isto é, se um rapaz puxa uma caixa por uma corda, como na Fig. 2.12.(a), então a caixa é puxada com tração T e o rapaz sente uma tração –T causada pela corda.

O mesmo vale para a Fig. 2.12.(b), em que as duas caixas que são ligadas por uma polia são puxadas pela mesma tração. Uma polia é um disco que pode deslizar suavemente em torno do seu eixo de rotação. Em nossos estudos, vamos considerar que a polia não possui massa. Entre outras consequências, uma polia sem massa implica que, na situação da Fig. 2.12.(b), as caixas sejam puxadas por forças de mesma intensidade.

Nem todas as cordas são ideais. Algumas cordas sofrem algum tipo de alteração em sua estrutura quando são esticadas. Veremos uma situação bem interessante no estudo da força elástica.

Força Elástica

A força elástica é um tipo de força diferente das outras que estudamos até aqui. A razão desta diferença é que o valor da intensidade da força elástica depende de quão deformada está uma mola. Você já deve ter visto uma mola antes. Elas existem em todos os lugares, de amortecedores de carro a brinquedos. As molas funcionam de maneira muito simples: quando estão em repouso, não há presença de forças entre suas extremidades. Quando são comprimidas, elas apresentam uma força “para fora” e quando são esticadas, apresentam uma força que puxa suas extremidades para o centro da mola. Vamos representar as diferentes situações de uma mola na Fig. 2.13.

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Fig. 2.13. Diversas aplicações da Força Elástica (Fel): (a) Mola em repouso não apresenta força elástica. (b) Em uma mola comprimida, existe força elástica apontando “para fora”

do centro da mola. (c) Em uma mola esticada, a força elástica puxa as extremidades para o centro da mola.

Por estas características apresentadas pela força elástica, dizemos que ela é uma força restauradora, pois ela tende a restaurar sua posição inicial, não importa a deformação que fazemos.

O detalhe mais interessante sobre a força elástica é que sua intensidade varia com a deformação da mola. Isto significa que se você comprimir a mola ainda mais, a força que ela vai exercer sobre as extremidades será ainda maior. Foi um físico inglês chamado Robert Hooke que propôs pela primeira vez uma fórmula para a força elástica de uma mola. Esta fórmula, que ficou conhecida como Lei de Hooke, é relaciona a intensidade da força de uma mola em função da deformação da mesma. Matematicamente, a fórmula é a seguinte:

Fel(x) = -kx

Onde Fel é a força elástica, x é a deformação da mola (em relação ao centro da mola, que foi identificado como a origem do sistema de coordenadas) e k é a constante da mola, um número que depende da mola que estamos trabalhando e tem dimensões de Newton por metro (N/m). A FIg. 2.13 mostra uma massa presa a uma mola com a representação do sistema de coordenadas.

Fig. 2.14. Corpo preso a uma mola e sujeito à força elástica. Note que a origem do eixo X corresponde à posição de repouso da mola.

Vamos verificar como a Lei de Hooke funciona. Por exemplo, se tivermos a posição de x = 0, então estaremos exatamente na posição de equilíbrio da mola e a fórmula da força resulta em:

Fel(0) = -kx = 0

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Que é uma força nula, como esperado para uma mola que não está deformada. Similarmente, se estivermos com uma posição à direita da posição de equilíbrio, ou seja, x > 0, então a força resulta em:

Fel(x > 0) = -kx < 0 → Fel(x) < 0

Pois o produto entre uma constante positiva (k) e um número negativo (-x) resulta em uma força negativa. Desta forma, a força estaria apontando para a esquerda, como era esperado para uma mola que foi esticada. Finalmente, se estivermos em uma posição à direita da posição de equilíbrio, ou seja, com uma mola comprimida (x < 0), ficaremos com:

Fel(x < 0) = -kx > 0 → Fel(x) > 0

Perceba que x < 0 → -x > 0, logo a força aponta para a direita. Neste caso, uma mola comprimida apresenta uma força “para fora”, como verificado pela Lei de Hooke. Assim, podemos confirmar que a Lei de Hooke descreve uma força restauradora, pois a força que surge neste problema tende a restaurar a posição da mola para seu estado de equilíbrio.

Apesar da Lei de Hooke ser uma boa descrição das forças que governam uma mola, vale lembrar que ela é uma aproximação. Como todo modelo ou teoria, as Leis da física oferecem uma descrição matemática que descrevem a natureza até certa precisão. Conforme criamos instrumentos de medida mais sofisticados, podemos perceber que existem leves desvios às Leis. Por exemplo, sabe-se que o movimento das molas reais não é exatamente descrito pela Lei de Hooke, mas esta Lei consegue descrever boa parte deste fenômeno. Para nosso estudo, vamos considerar que todas as molas obedecem esta Lei.

Problemas

1. Suponha que você esteja dentro de um elevador que se move em movimento uniforme para cima. Você segura uma maçã na altura do seu rosto. De repente, você deixa a maçã cair nos seus pés. Responda:

a) O elevador é um referencial inercial ou não inercial em relação ao chão do edifício?

b) Você espera que o tempo de queda da maçã seja maior, menor ou igual ao tempo de queda no caso do elevador estar parado?

c) Este tipo de experiência ilustra que princípio da mecânica clássica? Explique.

2. Suponha que você esteja dentro de um ônibus que se move em um movimento uniformemente variado (aceleração positiva).

a) O ônibus é um referencial inercial ou não inercial em relação à rua?

b) Descreva qualitativamente o que acontece com a trajetória da queda de uma maçã que você derrubou dentro do ônibus. (Ela tende a cair em linha reta ou sofre algum desvio? Este desvio é no sentido da frente ou do fundo do ônibus?)

3. Suponha que você esteja em uma nave espacial parada no espaço. Você está longe dos astros, de forma que você não sente força gravitacional. Desta maneira, você pode flutuar dentro da nave. De repente, o capitão da nave dá ordem de partida. Então, a nave começa a acelerar com a = 9.8m/s2 para “cima” (de forma que você consegue ficar em pé na nave, como em um elevador).

a) Agora que você está em pé, você solta uma maçã das suas mãos. Ela flutuará

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ou cairá nos seus pés? Explique usando o princípio da relatividade.

b) O tempo de queda da maçã é igual, maior ou menor que o tempo de queda de uma maçã que cai da mesma altura no planeta Terra?

c) Se você subir numa balança, o visor acusará que você está mais leve ou está mais “pesado” que seu peso no planeta Terra?

Obs.: Esta experiência mental levou Einstein a concluir que a gravidade que sentimos em nosso planeta pode ser entendida como uma força que surge em um referencial acelerado. A Teoria da Relatividade Geral é construída sobre este princípio e previu corretamente, dentre outras coisas, que a luz desvia sua trajetória quando passa por uma região de forte atração gravitacional.

4. Imagine uma situação muito estranha em que o planeta Terra pare de girar em torno do seu eixo de forma instantânea. O que aconteceria com as pessoas, animais e objetos que estão sobre a superfície da Terra? Qual Lei da Física você usou na sua resposta? Pergunta adaptada do vestibular UNIFOR-CE-010.

5. Um avião sobrevoa uma cidade destruída para localizar um grupo de pessoas e entregar mantimentos. Os mantimentos estão em uma caixa blindada que suporta o impacto da queda. Suponha que o avião esteja em movimento uniforme. Por que razão o piloto libera a caixa metros antes de sobrevoar o local combinado? Que movimento descreve a caixa quando é liberada? Ela cai em linha reta? Explique utilizando uma Lei da Física.

6. Um corpo de 2kg se move com aceleração de 4m/s² para a direita. Sabe-se que duas forças atuam sobre este corpo na direção horizontal e sentidos opostos. A força que aponta para a direita tem intensidade 10N. Calcule a intensidade da força que aponta para a esquerda.

7. Uma pessoa puxa uma caixa de 5kg por uma corda que passa a mover-se para a direita, de acordo com a Fig. 2.15. A corda faz com a horizontal um ângulo de 45°. A força tem intensidade de 50N. Despreze o atrito entre a caixa e o chão.

Fig. 2.15. Ilustração para o problema 7.

a) Faça um diagrama das forças que atuam na caixa. (Dica: Além da tração da corda, lembre da força gravitacional e da força normal).

b) Calcule a intensidade da Força Peso.

c) Decomponha a tração em duas componentes: uma vertical e outra horizontal.

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Conceitos de Física

d) A caixa se move na direção do eixo Y? Então, qual a componente da força resultante no eixo Y?

e) Utilize a resposta da letra anterior para calcular a intensidade da força Normal.

f) Utilize a componente horizontal da tração e encontre a aceleração da caixa.

8. Um goleiro segurou uma bola no peito. A bola tinha velocidade de 20m/s e uma massa de 0.4kg. Considerando que o choque durou 0.1s, calcule a força média que o goleiro aplicou na bola. (Baseada em questão da FUVEST-SP).

9. Uma caixa de 10kg se encontra em repouso em uma rampa inclinada que forma 30° com a horizontal. As forças que atuam sobre ela são: força gravitacional, força normal e força de atrito. (Dados: Cos(30°)=0.87 e Sen(30°)=0.50).

a) Faça um diagrama das forças que atuam na caixa.

b) Utilize como exemplo a Fig. 2.6 para decompor a força peso em uma componente normal e outra paralela à superfície da rampa. Calcule o valor de cada componente.

c) Calcule a intensidade da força de atrito estático. Lembre que ela não necessariamente está com seu valor máximo.

d) Calcule a intensidade da força normal.

(Dica: Se o corpo está em repouso, então a força resultante tem que ser zero. Para isso, basta que a componente da força resultante paralela ao plano seja zero e a componente normal ao plano também seja zero).

10. Suponha que um homem salte de um avião que voa em uma altitude muito elevada, a fim usar seu paraquedas. Ele parte com velocidade zero no eixo vertical, mas começa acelerar devido à aceleração da gravidade. De repente, sua velocidade de queda se aproxima de uma constante.

a) De acordo com a primeira Lei de Newton, o que você pode dizer sobre a força resultante que atua neste saltador?

b) Faça um diagrama das forças que atuam no corpo. A força gravitacional é a única força que atua sobre ele?

c) O que aconteceria se o homem tivesse saltado no vácuo e a única força que atuasse sobre ele fosse a força gravitacional? Sua velocidade de queda ficaria constante em algum momento, sempre aumentaria ou sempre diminuiria?

11. Você solta duas folhas de papel do alto de um prédio. Uma delas está amassada em forma de uma bola e a outra está aberta. De acordo com a teoria gravitacional, ambas deveriam cair ao mesmo tempo. No entanto, sua experiência mostra que a folha amassada cai mais rápido. A teoria gravitacional estaria errada? Explique o que acontece nesta experiência.

12. Um homem está dentro de uma caixa, que está presa a uma corda, como na Fig. 2.16. O homem pode puxar a corda que, por sua vez, puxa a própria caixa onde ele se encontra por meio de uma polia. A caixa possui massa de 10kg e o homem possui massa de 90kg.

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Fig. 2.16 Ilustração para o problema 12.

a) Faça um diagrama de forças para o homem. Lembre de representar a força normal que o homem sente em seus pés devido à caixa. Represente também a força que a corda realiza em suas mãos e a força gravitacional.

b) Faça o diagrama de forças para a caixa (desenhe apenas a caixa). Lembre de desenhar a força gravitacional sobre a caixa, a força que o homem faz na caixa (com seus pés) e a força de tração da corda que puxa a caixa por cima.

c) Suponha que o homem seja muito forte e realize uma força de 1000N na corda, puxando-a para baixo. Calcule a aceleração do sistema homem + caixa, indicando claramente sua direção e sentido. (Dica: Considere que ambos formam um corpo de 100kg e seus cálculos devem ficar mais fáceis. Lembre que a tração da corda é transmitida para o outra ponta da corda pela polia).

d) Utilize a letra anterior para encontrar a força normal que a caixa exerce no homem.

13. Certa mola obedece à lei de Hooke. Como não sabemos a constante elástica desta mola desconhecida, fizemos o seguinte teste. Colocamos um corpo pendurado pela mola, como mostrado na Fig. 2.17. A caixa possui 20kg e encontra-s em equilíbrio sobre a ação da força gravitacional e da força elástica. Sabendo que a deformação da mola foi de 10cm em relação à sua posição de equilíbrio, encontre a constante elástica da mola.

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Fig. 2.17. Ilustração para o problema 13.

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Capítulo 3

O que vamos estudar neste capítulo?

Neste capítulo, vamos estudar os seguintes temas:

» Trabalho realizado por uma Força.

» Energia Mecânica

» Teorema do Trabalho-Energia Cinética

» Leis de Conservação

Metas

Após o estudo deste capítulo, esperamos que você consiga:

» Calcular o trabalho realizado por uma força constante.

» Calcular a energia cinética e a energia potencial de um corpo.

» Aplicar o Teorema do Trabalho-Energia cinética em problemas.

» Entender a Lei de Conservação de Energia.

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Capítulo 3 – Trabalho e Energia Mecânica

Vamos conversar sobre o assunto?

Uma das características mais interessantes da natureza é que ela parece obedecer a regras bem simples. O início deste capítulo trata de uma destas regras. Dado um sistema físico, podemos estimar certa grandeza especial, chamada Energia e, mesmo após o sistema passar por algumas modificações, a Energia, quando calculada novamente, resulta no mesmo valor. Dizemos que este número, que permanece o mesmo não importa o que fazemos no sistema, é conservado. Esta parece ser uma verdade absoluta na natureza. Funciona como uma regra que os cientistas descobriram e que deve estar presente nas teorias que descrevem a realidade física. A energia não é a única grandeza que é conservada, mas vamos estudá-la primeiro no nosso curso. Você deve ter algumas perguntas em mente. O que é Energia? Existe algum sistema em que a energia simplesmente surge ou desaparece?

Para responder à primeira pergunta, precisamos adotar uma postura filosófica diante da Física. Após aprofundarem os conhecimentos em ciências, todos os professores deveriam abraçar alguma abordagem filosófica em relação à Física para responderem dúvidas deste tipo que os alunos certamente terão. Na visão do autor deste material, a pergunta “O que é Energia?” não faz sentido. Ou melhor, a pergunta não precisa ser respondida pela Física. A pergunta que devemos responder como físicos é “Um modelo matemático que contenha ‘energia’ serve para explicar fenômenos observados na natureza?“. Como a resposta é afirmativa, nossa preocupação deve ser como calcular esta grandeza e como estimá-la nos experimentos. Este argumento é de origem positivista, pois delega à Física a tarefa de discutir apenas o que pode ser medido e observado. Desta forma, a energia é um número que pode ser calculado e auxilia os físicos a realizarem sua tarefa de prever ou “explicar” o que acontecerá com o resultado dos experimentos.

Este número sempre se conserva, contudo ele pode se manifestar das mais variadas formas. Nestes casos, uma energia que era essencialmente mecânica pode ter se transformado em energia elétrica ou energia térmica. Neste curso, estamos interessados apenas no estudo da Energia Mecânica, que é uma forma de energia relacionada a forças e movimento. Vamos definir como a energia mecânica pode ser calculada em um sistema e apresentar o conceito de energia potencial. Em seguida, vamos relacionar a Energia Mecânica com o trabalho realizado por uma força.

3.1 Energia Cinética

A Energia Mecânica é uma forma particular de energia. Por motivos didáticos, dividimos esta energia em dois tipos distintos. Vamos estudar o primeiro tipo, chamado de Energia Cinética (K). Esta forma de energia é relacionada ao movimento. Ou seja, toda vez que um corpo está em movimento, dizemos que ele possui energia cinética. Quanto mais rápido está um corpo (maior velocidade), maior é sua energia cinética. Luka entendeu nossa explicação, mas ele tem uma dúvida:

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Na verdade, o corpo que possui maior massa possui maior energia cinética. Vamos apresentar a fórmula:

Onde m é a massa do corpo em kg, a velocidade v em m/s. A energia, neste caso, fica dada em unidades de kg x m2/s, que é denominada de Joule (J), em homenagem ao físico britânico James Prescott Joule (1818-1889).

1 J = 1 kg x m2/s

Vamos comentar um pouco mais sobre a fórmula da energia cinética. A letra que representa a energia cinética (K) está relacionada à origem Grega da palavra kinesis, que significa movimento. Já a fórmula apresenta um termo quadrático da velocidade do corpo. Isto significa que não importa se o corpo está em movimento para cima, para trás ou para baixo: a energia cinética não depende da direção do vetor velocidade. A energia cinética depende apenas do módulo da velocidade, não importando sua direção o sentido. Desta forma, a energia cinética, assim como outras formas de energia, é uma grandeza escalar.

Note também que o quadrado da velocidade é um termo positivo, assim como a massa do corpo. Isto faz com que a energia cinética de um corpo seja uma grandeza escalar não negativa, ou seja, ela pode assumir apenas valores positivos ou zero. Para que a energia cinética seja zero, a única situação que podemos imaginar é se a velocidade do corpo for zero. Ou seja, a energia cinética de um corpo parado é zero. Se a massa do corpo for zero, a energia também deveria ser zero, mas esta situação (partículas de massa zero) não é encontrada em mecânica clássica e pertence a outra escala de observação da natureza (outra teoria mais sofisticada do século passado).

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Talvez a dúvida mais complicada seja referente à fórmula da energia cinética. Por que aparece o quadrado da velocidade na fórmula e não a velocidade elevada à quarta potência, por exemplo? Este problema parece complicado, mas surgiu apenas por motivos didáticos. Quando apresentamos o tema de energia mecânica e começamos pela energia cinética estamos trocando a ordem em que as descobertas foram feitas. Assim, a fórmula da energia cinética tem esse formato bem particular (e não outro) para que a Mecânica obedeça a uma Lei que ficará clara a partir do estudo do trabalho realizado por uma força na seção seguinte.

Trabalho

Quando você empurra uma caixa, você faz certo esforço. Intuitivamente, você poderia dizer que gastou energia. Em Mecânica, existe uma grandeza que representa este esforço que uma força “gasta” (ou realiza) quando empurra ou puxa um objeto. Esta grandeza é o trabalho. Dizemos que uma força realiza trabalho (dado em Joules) quando

ela atua sobre um objeto que se desloca no espaço. No caso mais simples de uma força constante na direção x e sentido positivo (cuja direção, sentido e intensidade não mudam com o tempo) e um deslocamento na direção (∆x), temos que o trabalho (W) é dado por:

Onde é o módulo (intensidade) do vetor força. Esta fórmula é simples, pois considera que a força aponta no sentido positivo do eixo x, mesma direção que o deslocamento. Contudo, a partir desta fórmula podemos concluir que o trabalho realizado por uma força é proporcional ao deslocamento do objeto e proporcional à intensidade da força. Um caso particular também é fácil de ser percebido: caso o deslocamento seja zero, o trabalho realizado pela força (de acordo com esta fórmula) deve ser zero.

Agora que entendemos como funciona o trabalho realizado por uma força, vamos escrever uma fórmula mais geral que a anterior. A nova fórmula terá como caso particular a fórmula anterior, mas também será útil em situações que a força constante está apontando em uma direção diferente da direção do deslocamento. Verifique esta situação na Fig. 3.1, em que uma força puxa uma caixa fazendo um ângulo θ com a direção do deslocamento.

Fig. 3.1. Força constante fazendo ângulo ϑ com a direção do movimento.

Neste caso, a força realiza trabalho, mas a fórmula precisa levar em conta um detalhe que foi desprezado na fórmula anterior. Como a força não aponta na mesma direção e sentido que o deslocamento, pode-se dizer informalmente que nem toda a intensidade da força foi utilizada na realização do trabalho. Apenas uma componente da força serviu para realizar o movimento da caixa na direção x. Por isso, para calcularmos o trabalho realizado pela força, precisamos decompor esta força em duas componentes. A componente da força que está na direção x é exatamente a “parte” da força que realiza trabalho. Para entender como funciona a decomposição da força, veja a Fig. 3.2.

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Conceitos de Física

Fig. 3.2. Decomposição da força em componentes X e Y.

Decompor o vetor força nas direções x e y é o mesmo que encontrar as coordenadas de um ponto. Encontramos uma componente paralela (Fx) à direção do movimento que, neste caso, é a direção x. Além disso, encontramos uma componente perpendicular (Fy) à direção do movimento. Como você pode perceber intuitivamente, apenas a componente paralela ao deslocamento “empurra” o corpo na direção x. A outra componente (Fy) tenta empurrar o corpo na direção y, onde não há deslocamento. Portanto, vamos utilizar nossa primeira fórmula do trabalho para calcular o trabalho realizado por esta força como a soma de dois trabalhos diferentes: um trabalho devido ao movimento na direção x e outro trabalho devido ao movimento na direção y.

W = Fx . ∆x + Fy . ∆y

Neste exemplo, não houve deslocamento na direção y. Portanto, o trabalho na direção y é zero. Ficamos com:

W = Fx . ∆x

Para terminar a fórmula do trabalho, precisamos encontrar a componente Fx. Para isso, vamos fazer um cálculo simples de geometria.

Fig. 3.3. Decomposição da força em componentes X e Y.

O cosseno do ângulo θ é dado por:

Assim, ficamos com a fórmula do trabalho dada por:

Este é um número real que foi obtido a partir de dois vetores (já que o deslocamento, no caso geral, também é um vetor). Este produto é conhecido como produto escalar entre vetores. Alguns casos particulares da fórmula do trabalho podem ser obtidos a partir da última fórmula. Por exemplo, se o ângulo entre a força e o deslocamento for

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Conceitos de Física

agudo (0 < θ < 90°), então o cosseno do ângulo é positivo e o trabalho realizado pela força também é positivo. Caso o ângulo entre a força e o deslocamento seja obtuso (90° < θ < 180°), o cosseno do ângulo é negativo e o trabalho também será negativo. Portanto, o trabalho é uma grandeza escalar que pode ser positiva ou negativa, a depender da direção que a força aponta. Além disso, caso a força faça um ângulo reto (θ = 90°) com a direção do deslocamento, o cosseno do ângulo entre os vetores será zero e a força realizará trabalho nulo. Este é um resultado importante: uma força perpendicular à direção do movimento realiza trabalho nulo.

3.2 Teorema do Trabalho – Energia Cinética

Até agora, aprendemos que a energia cinética é uma forma de energia, assim como o trabalho realizado por uma força. Precisamos relacionar estas duas grandezas. Este é um desafio matemático e precisamos ficar bem atentos. É natural que você sinta dificuldades na leitura desta seção pela primeira vez. É importante que você leia novamente e tire suas dúvidas com o professor. Para realizar este desafio matemático de relacionar as duas grandezas que aprendemos neste capítulo, vamos considerar uma situação simples em que um corpo de massa m acelera sob o efeito de uma força de módulo F na direção x do movimento. Já conhecemos as equações horárias do movimento uniformemente variado:

Vamos fazer uma manobra matemática para obter uma equação para a velocidade final que não dependa explicitamente do tempo. Para isso, vamos explicitar o tempo na segunda equação horária para obter:

Onde v denota a velocidade final após um tempo t. O próximo passo é substituir este intervalo de tempo na equação horária da posição. Assim, vamos obter:

Finalmente, substituindo ∆x = x(t) - x0 na equação acima e multiplicando ambos os lados por a, ficamos com:

Após cancelamento dos termos, encontramos a chamada equação de Torricelli:

v2 = v02 + 2a∆x

Exercício 3.1: Repita as etapas da dedução equação de Torricelli detalhadamente.

Esta equação é cinemática, pois trata apenas de velocidade e aceleração. Você deve estar em dúvida sobre a relação que uma equação puramente cinemática possui com o assunto Trabalho ou Energia Cinética. A verdade é que a equação de Torricelli pode nos ensinar alguma coisa sobre como o trabalho realizado por uma força está relacionado com a energia cinética que um corpo ganha ou perde. Para isso, vamos lembrar a Primeira Lei de Newton. De acordo com esta lei, a força resultante que atua em um corpo de massa m é uma função da aceleração do corpo:

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Conceitos de Física

F = ma

A partir da multiplicação da equação de Torricelli por m/2, obtemos a seguinte relação:

De acordo com a Segunda Lei de Newton, podemos substituir a última parcela da equação anterior por um termo de força resultante.

Agora, podemos utilizar os conceitos introduzidos neste capítulo para interpretar cada termo da equação acima. O primeiro termo é precisamente a energia cinética final do corpo. O segundo termo da equação é a energia cinética inicial do corpo. Finalmente, o último termo da equação é o trabalho realizado por uma força constante. Assim, podemos escrever:

K - K0 = W

Em outras palavras, descobrimos um importante resultado da mecânica clássica. O chamado Teorema do Trabalho – Energia Cinética. De acordo com este resultado, a energia cinética de um corpo varia quando uma força resultante exerce trabalho sobre ele. Desta maneira, se o trabalho realizado pela força for positivo, a variação de energia cinética será positiva. Como a energia cinética é a energia do movimento, podemos afirmar que a velocidade do corpo aumentou.

W > 0 → K > K0

Por outro lado, se a força resultante realizou um trabalho negativo sobre o corpo, puxando o corpo no sentido contrário ao movimento, podemos afirmar que houve uma diminuição da energia cinética do corpo e, logicamente, uma diminuição em sua velocidade.

W < 0 → K < K0

Finalmente, se a força resultante exerce trabalho nulo sobre o corpo, como no caso de uma força que atua perpendicularmente à direção do movimento, então não houve variação na energia cinética e a velocidade final do corpo é igual à velocidade inicial.

W = 0 → K = K0

O teorema do Trabalho – Energia Cinética é a ferramenta que precisamos para resolver problemas que solicitam a velocidade do corpo após o trabalho realizado por uma força. Como vamos ver na seção seguinte, este teorema permite também a conceituação de uma Lei de Conservação de Energia. Antes disso, vamos treinar um pouco o que aprendemos sobre Energia Cinética e Trabalho.

Exemplo 3.1: Uma bola de massa 400g é solta do repouso a partir de uma altura de 10m. Considere a aceleração da gravidade g ≈ 10m/s2 . Desconsidere a resistência do ar. Calcule:

a) Sua energia cinética inicial.

b) O trabalho realizado pela força peso.

c) Sua energia cinética final.

Solução: A partir da fórmula da energia cinética, como a velocidade inicial é zero (o corpo parte do repouso):

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Conceitos de Física

O trabalho realizado pela força peso é dado pela fórmula a seguir, com o deslocamento calculado na direção y:

W = F . ∆y . cosθ = |(-Mg)||0 - 10m|(cos0°)

= |-0.4kg . 10m/s2| . |-10m| . (1) = 40J

Note que o deslocamento é negativo, pois a posição final (0m) é menor que a posição inicial (10m). Além disso, a força peso é negativa, pois aponta no sentido negativo do eixo y (para baixo). Contudo, tanto a força peso e o deslocamento aparecem na fórmula acima dentro do módulo, de forma que importa apenas a intensidade destas grandezas. Perceba também que a combinação de unidades resulta exatamente na unidade de Joule, já que todas as grandezas estão no sistema internacional. Por isso, tivemos que transformar a unidade da massa do corpo de gramas para quilogramas.

A energia cinética final do corpo pode ser calculada facilmente a partir do teorema trabalho-energia cinética:

K - K0 = W → K = 40 J.

Lembre que a força resultante é apenas a força peso. Assim, o trabalho da força resultante, que é a soma de todos os trabalhos, é igual ao trabalho da força peso. Você também conseguiria fazer esta questão de posse apenas dos conhecimentos de cinemática. Para isso, você utilizaria as equações do movimento uniformemente variado para encontrar a velocidade final do corpo e, em seguida, utilizaria a fórmula da energia cinética com esta velocidade encontrada. No entanto, este método que utiliza o teorema do trabalho-energia cinética é mais simples e funciona mesmo quando o movimento do corpo é mais sofisticado que o movimento uniformemente variado.

Exemplo 3.2: Uma caixa de massa 1kg desliza com velocidade constante em um plano inclinado cujo ângulo com a horizontal é 30°. Considere a força de atrito entre a caixa e o chão. Considere g ≈ 10m/s2.

a) Desenhe o diagrama de forças atuando no bloco. Faça outro esquema decomponha as forças em componentes paralelas e perpendiculares ao plano inclinado.

b) Calcule as componentes das forças desenhadas no item anterior.

c) Indique se o atrito é estático ou cinético. Calcule o coeficiente de atrito.

d) Calcule o trabalho realizado por cada força do item (a) após o bloco deslizar o equivalente a 1 metro de altura (medida na direção y).

e) Calcule o trabalho da força resultante. Mostre que esta resposta está de acordo com o Teorema do Trabalho-Energia Cinética.

Solução:

a) O diagrama de forças desta caixa em um plano inclinado está representado abaixo:

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Conceitos de Física

Fig. 3.4. Diagrama de forças para o exercício 3.2.

Podemos desenhar também um diagrama em que as forças são decompostas em componentes paralelas e perpendiculares ao plano, como solicitado:

Fig. 3.5. Diagrama das componentes das forças (paralelas e perpendiculares ao plano) para o exercício 3.2.

Apenas a força peso precisou ser decomposta em duas componentes, já que a força normal e a força de atrito já estão perpendicular e paralela ao plano, respectivamente.

b) Para começar, sabemos que a força peso tem intensidade dada por:

As componentes x e y da força Peso podem ser escritas usando um pouco de geometria:

Fig. 3.6. Componentes da força peso calculados por geometria.

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Conceitos de Física

Atenção para o sinal negativo da componente y da força peso, pois ela aponta no sentido negativo do eixo y (para baixo).

Agora, vamos utilizar as Leis de Newton para descobrir a intensidade das forças (ou das suas componentes). Como o corpo se encontra em movimento uniforme, sua aceleração é zero. Portanto, a força resultante sobre o corpo é o vetor nulo:

Se um vetor é nulo, então suas componentes x e y são (FRx, FR

y = (0,0). Por isso, tanto a componente x quanto a componente y da força resultante deve ser nula.

FRx = 0

FRy = 0

Quando olhamos a Fig. 3.5, observamos que as componentes x e y da força resultante são dadas por:

FRx = Px - fat = 0

FRy = N - Py = 0

Assim, obtemos valores para as componentes da força de atrito e força Normal:

fat = -mgSenθ

N = mgCosθ

A componente x da força de atrito é negativa, pois ela aponta para “trás” (sentido negativo do eixo x da Fig. 3.6). Já o sinal é positivo na componente y da força Normal, pois esta força aponta para cima (sentido positivo do eixo y). A força de atrito possui componente y nula e a força Normal possui componente x nula, como mencionamos anteriormente. Usando os dados do problema, obtemos:

Px = mgSenθ = (1kg) (10m/s2) Sen(30°) = 5N

Py = -mgCosθ = -(1kg) (10m/s2) Cos(30°) ≈ -8.6N

N = mgCosθ ≈ 8.6N

fat = -mgSenθ = -5N

c) O atrito deste exercício é cinético, pois há movimento relativo entre a caixa e o plano (caixa desliza no plano). Desta maneira, temos a fórmula do atrito cinético:

fat = -µcN = -5N → µc ≈ 5/8.6 ≈ 0.58

d) Vamos começar pela força peso. Neste caso, calculamos o trabalho como sendo:

O trabalho da força normal é:

Como já esperávamos, já que a força normal é perpendicular à direção do movimento, então ela não realiza trabalho.

Finalmente, o trabalho da força de atrito é dado por:

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Conceitos de Física

Note que a força de atrito é paralela à direção de deslocamento. Contudo, ela faz um ângulo de 180° com o vetor deslocamento, pois aponta no sentido contrário. Por isso, surge um sinal negativo no trabalho realizado por esta força. Além disso, apesar da altura correspondente ao deslocamento ser de 1m, precisamos usar geometria plana novamente para descobrir que o deslocamento ao longo do plano é de 2m.

Este resultando para o trabalho da força resultante é esperado pelo teorema do trabalho energia cinética, pois como a velocidade do corpo é constante, significa que sua energia cinética inicial é igual à energia cinética final. Desta forma, temos que o trabalho da força resultante fica dado por:

WR = K - K0 = 0J.

Nesta seção, argumentamos que o trabalho da força resultante (soma vetorial de todas as forças que atuam sobre o corpo) é igual à soma dos trabalhos de cada força individualmente. Será verdade? Vamos aproveitar esta dúvida de física para introduzir uma nova ferramenta matemática sobre vetores na próxima seção.

3.3 Tópico Avançado: Produto Escalar

Nós estudamos vetores e aprendemos que eles podem ser representados matematicamente por coordenadas. As coordenadas de um vetor dizem tudo que precisamos saber sobre ele. Quando estudamos trabalho realizado por uma força, surgiu uma fórmula para o trabalho que é calculada como o produto entre os módulos de dois vetores (força e deslocamento) e o cosseno do ângulo entre eles. Este produto entre vetores é chamado de produto escalar, representado por “ · ”.

Onde θ é o ângulo formado entre os dois vetores. Dados dois vetores, o produto escalar é uma maneira especial de associá-los de forma única a um número Real. Este produto escalar parece muito com o produto de números reais que estamos acostumados. Ele possui as seguintes propriedades:

Dados os vetores , e e um número real λ:

1. (comutativa)

2. (distributiva)

3.

Por simplicidade, vamos nos limitar a problemas em que os vetores estão em apenas duas dimensões. Isto significa que eles possuem coordenadas x e y apenas. Os argumentos que utilizaremos aqui funcionam para três (ou mais) dimensões de forma análoga.

A primeira propriedade é a de comutatividade, que é também é obedecida por números reais. Desta maneira, não importa a ordem da multiplicação do produto escalar, pois o resultado é o mesmo. Já a segunda propriedade indica como deve ser feita a distribuição de um produto escalar na soma de vetores. A terceira propriedade explica como o produto escalar deve se comportar na presença de um número real multiplicando o vetor.

Nos problemas de duas dimensões (x e y), vamos utilizar uma base ortonormal. Apesar de o nome parecer estranho, nós já fazemos esta utilização desde que apresentamos os vetores. Quando escrevemos um vetor, por exemplo:

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Conceitos de Física

Estamos utilizando a base ortonormal . O vetor é o vetor de tamanho unitário que aponta no sentido positivo da direção x. Já o vetor é o vetor de tamanho unitário que aponta no sentido positivo da direção y. Estudar todas as propriedades dos vetores faz parte de um curso de Geometria Analítica, mas estamos interessados apenas na aplicação que os vetores possuem na Mecânica Clássica. Sobretudo, qual a aplicação que o produto escalar tem no cálculo do trabalho realizado por uma força.

A ferramenta mais importante que vamos aprender é a seguinte. Quando temos dois vetores ortogonais, por exemplo, e , temos que o produto escalar entre eles é zero:

Como o módulo de cada vetor da base ortogonal é 1 (pois o ângulo entre dois vetores idênticos é zero e seu cosseno é 1):

Podemos calcular o produto escalar entre e utilizando as propriedades do produto escalar.

Utilizando que o módulo dos vetores da base é unitário e que a base é ortogonal, obtemos:

Esta é a fórmula para o produto escalar de dois vetores a partir de suas coordenadas em uma base ortonormal.

Uma das consequências imediatas das ferramentas que aprendemos nesta seção é que o trabalho da força resultante:

A força resultante é o somatório vetorial de todas as forças que atuam sobre o corpo.

A partir da propriedade distributiva do produto escalar, mostramos que o trabalho da força resultante é igual ao somatório dos trabalhos das forças individuais, o que responde nossa dúvida inicial e encerra esta seção. Vale lembrar que este assunto requer um pouco de atenção a um nível de matemática superior ao que estamos acostumados e não devemos perder o interesse se o conteúdo parecer complicado no início.

3.4 Energia Potencial

Aprendemos que a energia cinética é a forma de energia associada ao movimento.

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Conceitos de Física

Nesta seção, vamos descobrir uma nova forma de energia. Do ponto de vista físico, não existe diferença entre os tipos de energia. No entanto, criamos algumas formas ou tipos de energia para facilitar o entendimento dos nossos modelos matemáticos sobre a natureza. Um destes tipos de energia é chamado de “Energia Potencial”. Se a energia cinética está relacionada ao movimento, podemos dizer informalmente que a energia potencial está relacionada à posição em que a partícula se encontra.

Em outras palavras, se uma partícula estiver na posição e com velocidade , sua energia mecânica total pode ser calculada como a soma da energia cinética e a energia potencial:

Note que representamos a energia cinética (K) como uma função da velocidade. Similarmente, representamos a energia potencial (U), como uma função da posição. Diferentemente da energia cinética, a energia potencial depende da situação, ou seja, depende do sistema em que a partícula se encontra. Para você entender intuitivamente como funciona a energia potencial, vamos usar a gravidade como exemplo.

Se um corpo se encontra em uma altura de 10 metros sob o efeito da força gravitacional, sabemos que este corpo pode cair e sua velocidade passa a aumentar. Por isso, dizemos que este corpo deve possuir uma energia que tem potencial de tornar-se a energia do movimento. Por isso, chamamos esta energia de energia potencial. Perceba que um corpo que está em uma altura de 20 metros possui mais energia potencial que um corpo que está em uma altura de 10 metros, já que o corpo que está mais alto chega ao chão com velocidade maior. Com isso, podemos dizer que a energia potencial depende da posição em que o corpo se encontra. O problema seria dizer que tipo de dependência a energia potencial tem em função do tempo. Bem, se a energia potencial é um tipo de energia “guardada” que pode ser transformada em energia do movimento, podemos analisar a situação do corpo em queda livre para encontrar como a energia potencial depende da posição:

Neste problema, o corpo parte do repouso. Assim, o trabalho realizado pela força peso, que é a força resultante, é dado por:

Pelo teorema do trabalho-energia cinética, o trabalho realizado pela força resultante é igual à variação de energia cinética.

Como a energia potencial depende apenas da posição do corpo e ela foi transformada em energia cinética, uma candidata natural a ser a energia potencial deste problema, de acordo com a última equação, é a fórmula:

U = mgH

Esta fórmula não é apenas uma candidata, ela é a própria fórmula da energia potencial gravitacional. Cada sistema é governado por diferentes tipos de força. A cada força pode estar associada uma energia potencial diferente. A fórmula acima, por exemplo, depende da massa do corpo, da aceleração da gravidade e da altura em que o corpo se encontra. De acordo com esta fórmula, também podemos afirmar que a energia potencial gravitacional do solo (H = 0) é zero, mas isto é apenas uma convenção. Poderíamos associar ao solo (H = 0), outro valor para a energia gravitacional que os resultados dinâmicos dos

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Conceitos de Física

cálculos seriam os mesmos. Isso é possível, pois a variação de energia cinética depende da variação de energia potencial, e não do seu valor absoluto. Um problema mais sofisticado seria dizer como é que a fórmula geral da energia potencial, que seja aplicável a qualquer sistema.

Para isso vamos partir do mesmo raciocínio que utilizamos para o corpo em queda livre. Agora vamos escrever o problema em um caso geral, no qual a força resultante que atua sobre ele não é a gravitacional, é uma força geral F. Assim, a variação de energia cinética pode ser calculada, de acordo com o teorema do trabalho-energia cinética.

Vamos supor que este sistema possui uma energia potencial e vamos definir a variação de energia potencial como sendo:

∆U = -WF

Para cada força, temos uma energia potencial diferente. Além disso, como o trabalho realizado por uma força depende da posição inicial e da posição final, a variação energia potencial também depende desta posição. Para o caso da força gravitacional, já sabemos calcular imediatamente seu trabalho e, como consequência, sua energia potencial:

∆Ug = -Wg = -(-mg(yf - yi)) → ∆U = mg(yf - yi)

Para outras forças que não são constantes, calcular a sua energia potencial equivale a calcular o trabalho realizado por estas forças. O cálculo do trabalho de uma força que não é constante (como uma força elástica, por exemplo), necessita de uma ferramenta mais sofisticada de matemática, chamada cálculo integral, que foge do nosso objetivo do curso de Conceitos de Física. Vamos focar nosso estudo no conceito de energia mecânica e potencial a partir da análise dos sistemas conservativos.

3.5 Sistemas Conservativos

A partir da equação que relaciona a variação de energia potencial de um corpo entre uma posição inicial e uma posição final, temos que ficamos com a seguinte equação:

∆K + ∆U = 0

A partir da equação acima, percebemos que a variação de energia cinética somada à variação de energia potencial resulta em zero. Isto significa que a energia mecânica inicial é igual à energia mecânica final:

K - K0 + U - U0 = 0 → K + U = K0 + U0

E = K + U e E0 = K0 + U0

Este é um resultado conhecido como conservação da energia mecânica (E). Em outras palavras, a energia mecânica inicial é igual à energia mecânica final. Será que isso sempre é verdade? Será que a soma da energia cinética à energia potencial não muda de valor em um dado sistema?

Esta seção responderá a esta dúvida. Para chegarmos a esta conclusão, nós assumimos que existia uma energia potencial para o sistema. Em outras palavras, nós assumimos que o trabalho realizado por uma dada força dependia apenas da posição inicial e da posição final do corpo. Mas será que esta hipótese é sempre verdadeira? Vamos fazer alguns testes. Suponha que um corpo cai em queda livre, vimos que o trabalho realizado pela força gravitacional depende apenas da altura inicial e da altura final da queda. Portanto,

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Conceitos de Física

a força gravitacional possui um trabalho que pode ser escrito como uma variação de energia potencial.

Quando calculamos o trabalho realizado pela força gravitacional em uma trajetória fechada, facilmente encontramos o valor zero. Isto se dá, pois a posição final é igual à posição inicial, de forma que não há variação de energia potencial. Portanto, sempre que tivermos uma força cujo trabalho não depende da trajetória tomada pelo corpo, dependendo apenas da posição inicial e da posição final, dizemos que esta força é conservativa. Como o trabalho de uma força conservativa pode ser escrito como uma variação de energia potencial (já que depende apenas das posições iniciais e finais), então se pode dizer que em sistemas conservativos, ocorre a conservação de energia. Em outras palavras, em um sistema em que atuam apenas forças conservativas, a energia mecânica nunca muda de valor, mas ocorre uma troca entre energia cinética e energia potencial de forma que sua soma seja sempre a mesma. A força gravitacional é uma força conservativa, assim como a força elástica.

No entanto, se tomarmos a força de atrito, temos um problema diferente. Imagine o cálculo do trabalho realizado pela força de atrito em uma situação em que a posição inicial do corpo é igual à posição final, como mostrado na FIg. 3.7.

Fig. 3.7. Trabalho realizado pela força de atrito em uma trajetória fechada.

Na ida, sentido positivo do eixo x, a força de atrito aponta num sentido contrário ao do movimento. Neste caso, podemos afirmar que o trabalho da força de atrito na ida é negativo. Similarmente, na volta, a força de atrito também aponta no sentido contrário ao do movimento e, novamente, o trabalho também é negativo. Concluímos que o trabalho realizado pela força de atrito em uma trajetória fechada é negativo. Como o trabalho não é nulo, podemos afirmar que a força de atrito não é uma força conservativa. Isto implica que a força de atrito não possui uma “energia potencial” associada a ela.

Neste caso, na presença de forças não conservativas, como ficaria a conservação de energia mecânica? Se em um sistema existir alguma força não conservativa, dizemos que o sistema não é conservativo. O teorema do trabalho-energia cinética continua válido:

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Conceitos de Física

Mas, neste caso geral, algumas forças do sistema são conservativas e outras são não conservativas. Na seção sobre produto escalar, mostramos que o trabalho realizado pela força resultante é a soma dos trabalhos individuais realizados por cada força. Assim, vamos somar apenas os trabalhos realizados por forças conservativas e chamar esta soma de WC. Similarmente, vamos chamar a soma dos trabalhos das forças não-conservativas de WNC.

∆K = WC + WNC

As forças conservativas podem ser escritas como uma variação de energia potencial. Neste caso, a equação acima fica simplificada:

∆K = ∆U + WNC → ∆K + ∆U = WNC

Finalmente, podemos escrever a energia mecânica do sistema como a soma da energia cinética e da energia potencial para obter:

∆E + WNC

Caso o sistema seja conservativo, não existem forças não conservativas e o trabalho realizado pelas forças não conservativas é zero. Portanto, a variação de energia cinética seria zero. Por outro lado, caso exista no sistema alguma força não conservativa, a variação de energia mecânica é precisamente igual ao trabalho realizado por estas forças, como a força de atrito, por exemplo. No caso da força de atrito, o trabalho realizado é negativo e a energia mecânica teria uma variação negativa, ou seja, uma diminuição em seu valor.

Podemos concluir que a energia simplesmente desaparece no caso de um sistema não conservativo? Não, isto não é verdade. Na presença de forças não conservativas, a energia mecânica desaparece do sistema. Contudo, a energia mecânica não é o único tipo de energia. Isto significa que a energia total não desaparece, apenas é transformada em outras formas de energia diferentes da energia mecânica. Por exemplo, na presença da força de atrito, ocorre uma diminuição da soma da energia cinética e a energia potencial do sistema (energia mecânica), mas surgem outras formas de energia que antes não estavam presentes no sistema, como energia térmica. Portanto, em sistemas não conservativos, dizemos que a energia mecânica não se conserva, pois a energia é transformada em outros tipos de energia, como calor, som, radiação, etc.

3.6 Potência Média

Assim como a velocidade média pode ser calculada a partir de dado deslocamento e intervalo de tempo, podemos calcular a potência média de uma força a partir do trabalho realizado por esta força e um intervalo de tempo. Desta maneira, a fórmula da potência média fica dada por:

Onde W é o trabalho realizado por uma força e ∆t é o intervalo de tempo no qual a força atuou no sistema. Esta potência é dada em unidades de Joule por segundo, unidade que recebe o nome de Watt (W):

Portanto, a potência média é uma razão, ou taxa, entre energia e tempo. Ela indica

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Conceitos de Física

quanto de energia uma determinada força dá (ou retira) do sistema por segundo.

Exemplo 3.3. Uma massa de 2kg é lançada para cima com velocidade inicial de 20 m/s. A altura máxima que o corpo atingiu foi de 16 metros. Considere g = 10 m/s2. Calcule

a) A Energia Mecânica do sistema no instante no lançamento.

b) A energia potencial final e o trabalho da força peso.

c) A energia cinética final.

d) A Energia Mecânica Final

e) O trabalho das forças não conservativas.

Calcule a força de atrito média que atua sobre o corpo.

Solução:

a) A energia mecânica do sistema antes do lançamento é dada pela soma da energia cinética e energia potencial:

E = K + U

A energia cinética é dada pela fórmula:

Diferentemente da energia cinética, a energia potencial depende da posição que desejamos considerar como o zero de potencial. Este ponto pode ser onde quisermos. Por conveniência, vamos escolher o zero da energia potencial no chão, de onde o corpo foi lançado:

U = 0

b) A energia potencial final é a energia potencial gravitacional, dada pela fórmula que já conhecemos:

U = mgh = (2kg) (10m/s) (16m) = 320J.

Já o trabalho da força peso pode ser encontrado através da fórmula que também conhecemos:

c) A energia mecânica final é apenas a soma das duas formas de energia, cinética e potencial:

E = K + U = 0 + 320J = 320J

Note que a energia cinética final é zero, pois o corpo se encontra parado momentaneamente.

d) Como você deve ter percebido, a energia mecânica final é menor que a inicial. Esta variação de energia mecânica se dá pela existência de trabalho de forças não conservativas que retiram energia mecânica do sistema:

WNC = ∆E = EF - Ei = 320J - 400J = -80J.

e) O conceito de força média é novo. Para calcular a força média, temos que resolver o seguinte problema: descobrir qual é a força constante que realiza o mesmo trabalho que uma dada força percorrendo o mesmo percurso. Desta maneira:

f)

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Conceitos de Física

Exemplo 3.5. Um sujeito escorrega em uma rampa sem atrito a partir do repouso. A rampa tem comprimento L e ele chega ao final com velocidade de 6m/s. Para que essa velocidade passe a ser 12m/s, seria necessário aumentar o comprimento da rampa de ∆L. Encontre a razão ∆L/L. Obs.: Considere g = 10m/s2.

Solução:

Vamos relacionar o comprimento da rampa com a velocidade final do sujeito. Como não há atrito, existe conservação da energia mecânica. Por conveniência, vamos considerar o zero da energia potencial como a base da rampa. Desta forma, temos:

Perceba que a altura do corpo é dada pelo comprimento da rampa e o Seno do ângulo entre a rampa e o chão, com auxílio da mesma fórmula trigonométrica empregada nas Figs. 3.5 e 3.6. Novamente, como não há atrito, temos:

A mesma igualdade entre as energias mecânicas pode ser feita com a rampa modificada, em que o seu comprimento aumentou de ∆L. Neste caso, temos:

Finalmente, podemos igualar as energias:

Como a rampa não muda sua inclinação em relação ao chão, então podemos cancelar o Senθ na razão:

Problemas

1) Um rapaz solta uma pedra de massa 20 g a partir do repouso do alto de uma ponte de 6 m de altura em relação ao solo. Considerando g = 10 m/s2, determine a velocidade e a energia cinética da pedra ao atingir o solo. (Despreze os efeitos do ar).

2) Um objeto com massa de 15kg é lançado verticalmente para cima a partir do solo com velocidade de 40m/s. Despreze os efeitos do ar. Determine a energia potencial gravitacional, energia cinética e energia mecânica total de cada instante a seguir:

a) No instante quando é lançado.

b) No instante em que atinge a altura máxima.

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c) No instante em que atinge a metade da altura máxima.

d) Caso você considere a resistência do ar, você espera que a energia cinética final seja maior ou menor que o caso em que o ar foi desprezado? E a velocidade final do objeto seria maior ou menor que o caso sem resistência do ar? Explique sua resposta com base na conservação da energia mecânica.

3) Um corpo de massa 2 kg é lançado verticalmente para cima com velocidade de 50 m/s. Sabendo que, devido ao atrito com o ar, o corpo dissipa 100 J de energia sob a forma de calor, determine a altura máxima atingida pelo corpo. Adote g = 10 m/s².

4) Uma esfera parte do repouso em A e percorre o caminho representado sem nenhum atrito (Fig.3.8). Encontre:

a) A velocidade da esfera no ponto B.

b) O trabalho realizado pela força Peso do ponto A ao ponto B

Fig 3.8. Esquema para o problema 4.

5) Leia as sentenças e marque Verdadeiro ou Falso. Nos casos das sentenças falsas, indique qual o erro e proponha uma correção ou um contra exemplo para mostrar o absurdo da sentença.

a) Quando a força resultante que atua sobre um corpo é nula, então o trabalho da força resultante necessariamente é nulo

b) Quando o trabalho da força resultante é nulo, então a força resultante necessariamente é nulo.

c) O trabalho realizado por uma força que faz um ângulo agudo ou nulo com o vetor deslocamento é positivo.

d) O trabalho realizado por uma força que faz um ângulo obtuso com o vetor deslocamento é negativo.

e) De acordo com a fórmula da energia cinética, ela depende da intensidade, direção e sentido do vetor velocidade do corpo.

f) O trabalho realizado pela força resultante em um sistema é igual à variação de energia cinética apenas se o sistema for conservativo.

g) Em um sistema conservativo, a energia mecânica inicial é igual à energia mecânica final.

h) O trabalho das forças não conservativas de um sistema é igual à variação da energia mecânica.

6) Uma bola de borracha cai a partir do repouso de uma altura H0. Toda vez que a bola

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toca o solo, ela perde 20% de sua energia mecânica e sobe novamente. Encontre:

a) A altura máxima que a bola atinge após o primeiro choque com o chão, que chamaremos de H1.

b) A razão entre duas alturas máximas sucessivas .

c) Quantos choques são necessários para que a altura máxima da bola seja menor que a metade da altura inicial.

d) Considerando que a colisão com o solo seja perfeitamente elástica, ou seja, a energia cinética se conserva na colisão, encontre a razão entre duas alturas máximas sucessivas.

7) Um pêndulo simples possui uma pequena esfera de massa m presa por uma corda ideal. O corpo parte do repouso a partir de uma altura H, como na Fig. 3.9. Responda:

0

Fig. 3.9. Esquema do pêndulo simples para o problema 2.

a) Faça o diagrama de forças do problema. (Dica: Lembre da Tração da corda). Suponha que o sistema é livre de forças de atrito.

b) Calcule o trabalho realizado pela força Peso e pela Tração do instante inicial (1) ao instante em que a esfera chega ao ponto mínimo da trajetória (2). (Dica: Lembre que a tração é perpendicular à trajetória da esfera. Este detalhe é fundamental para encontrar o trabalho realizado por ela).

c) Calcule a energia cinética do instante 2.

d) Assumindo a existência de uma força de atrito que consome 50% da energia mecânica do sistema na queda, calcule a velocidade da esfera no instante 2.

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Referências

Halliday, David. Resnick, Robert. Walker, Jearl. Fundamentos de Física 2. Rio de Janeiro, RJ. LTC – Livros Técnicos e Científicos Editora S.A., 1996.

Nussenzveig, H. Moysés. Curso de Física Básica 2. Rio de Janeiro, RJ. Edgard Blücher, 4ª Ed. 2008.

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Conheça o Autor

Domingos Sávio Pereira Salazar

Sou formado em Física pelo Departamento de Física da Universidade Federal de Pernambuco. Fiz doutorado na área de Física teórica na mesma instituição e também lecionei por 2 anos um curso de física geral na UFPE. Já executei várias disciplinas no EAD-UFRPE e escrevi livros na área de mecânica clássica e termodinâmica.