Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura ... · caderno de textos, sugestão de...
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Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG
III Módulo Regional Nordeste São Luis (MA), 25 de março a 01 de abril de 2008.
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Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG
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ÍNDICE SUMÁRIO
TextosTextosTextosTextos PáginaPáginaPáginaPágina
01010101 MATRIZ PEDAGÓGICA MATRIZ PEDAGÓGICA MATRIZ PEDAGÓGICA MATRIZ PEDAGÓGICA 01010101
02020202 RELAÇÕES DE GÊNERO ERELAÇÕES DE GÊNERO ERELAÇÕES DE GÊNERO ERELAÇÕES DE GÊNERO E AGRICULTURA FAMILIARAGRICULTURA FAMILIARAGRICULTURA FAMILIARAGRICULTURA FAMILIAR ---- Miriam Nobre 09090909
03030303 RELAÇÕES RACIAIS E AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS NO BRASIL RELAÇÕES RACIAIS E AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS NO BRASIL RELAÇÕES RACIAIS E AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS NO BRASIL RELAÇÕES RACIAIS E AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS NO BRASIL –––– João Carlos NogueiraJoão Carlos NogueiraJoão Carlos NogueiraJoão Carlos Nogueira 18181818
04040404 PROJETO ALTERNATIVO DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL E SOLIDÁRIO – POTENCIALIDADES, AVANÇOS E DESAFIOS NOS ÚLTIMOS 10 ANOS
31313131
05050505 DO DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA AO DESENVOLVIMENTO RURAL DO DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA AO DESENVOLVIMENTO RURAL DO DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA AO DESENVOLVIMENTO RURAL DO DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA AO DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL: algumas consideraçõesSUSTENTÁVEL: algumas consideraçõesSUSTENTÁVEL: algumas consideraçõesSUSTENTÁVEL: algumas considerações – Vilênia V. Porto Aguiar
53535353
06060606 ININININTRODUÇÃO À ECONOMIA SOLIDÁRIATRODUÇÃO À ECONOMIA SOLIDÁRIATRODUÇÃO À ECONOMIA SOLIDÁRIATRODUÇÃO À ECONOMIA SOLIDÁRIA – Paul Singer 88888888
07070707 REFORMA AGRÁRIA AGROECOLÓGICA CONSIDERAÇÕES SOBRE REFORMA AGRÁRIA AGROECOLÓGICA CONSIDERAÇÕES SOBRE REFORMA AGRÁRIA AGROECOLÓGICA CONSIDERAÇÕES SOBRE REFORMA AGRÁRIA AGROECOLÓGICA CONSIDERAÇÕES SOBRE UMA PROPOSTA ALTERNATIVA UMA PROPOSTA ALTERNATIVA UMA PROPOSTA ALTERNATIVA UMA PROPOSTA ALTERNATIVA –––– Marcos Antonio B. Figueiredo
125125125125
08080808 AS RELAÇÕES DE TRABALHO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO DO AS RELAÇÕES DE TRABALHO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO DO AS RELAÇÕES DE TRABALHO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO DO AS RELAÇÕES DE TRABALHO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO DO NORDESTE NORDESTE NORDESTE NORDESTE –––– ENTRE O ATRASO E A MODERNIDAENTRE O ATRASO E A MODERNIDAENTRE O ATRASO E A MODERNIDAENTRE O ATRASO E A MODERNIDADEDEDEDE – Bruno
Ribeiro Paiva
140140140140
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CURSO DE FORMAÇÃO EM CONCEPÇÃO, PRCURSO DE FORMAÇÃO EM CONCEPÇÃO, PRCURSO DE FORMAÇÃO EM CONCEPÇÃO, PRCURSO DE FORMAÇÃO EM CONCEPÇÃO, PRÁTICA SINDICAL E EM METODOLOGIAÁTICA SINDICAL E EM METODOLOGIAÁTICA SINDICAL E EM METODOLOGIAÁTICA SINDICAL E EM METODOLOGIA....
---- III Módulo da Região Nordeste III Módulo da Região Nordeste III Módulo da Região Nordeste III Módulo da Região Nordeste ––––
São LuisSão LuisSão LuisSão Luis/MA /MA /MA /MA –––– 25 de março a 1 de abril/2008.25 de março a 1 de abril/2008.25 de março a 1 de abril/2008.25 de março a 1 de abril/2008.
OBJETIVOOBJETIVOOBJETIVOOBJETIVO:::: Viabilizar a formação de militantes do MSTTR, de modo que aprimorem sua capacidade multiplicadora e
potencializadora da ação formativa em suas áreas de atuação.
OBJETIVOS ESPECIFICOS:OBJETIVOS ESPECIFICOS:OBJETIVOS ESPECIFICOS:OBJETIVOS ESPECIFICOS:
• Socializar e aprofundar referenciais teóricos, políticos e ideológicos que fundamentam e alimentam os ideais e a luta
sindical e popular.
• Re-avaliar e fortalecer a luta sindical, numa visão e prática transformadoras, estimulando processos de mudanças de
atitudes, comportamentos e práticas individuais e coletivas, coerentes com as exigências de implementação do
PADRSS.
• Favorecer a experimentação, sistematização e apropriação de novas metodologias pedagógicas que realimentem a
prática formativa do movimento sindical.
• Contribuir para a constituição de uma rede de formadores/as que assumam e implementem o projeto de formação do
MSTTR.
EIXO TEMÁTEIXO TEMÁTEIXO TEMÁTEIXO TEMÁTICO: ICO: ICO: ICO: Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário
EIXOS PEDAGÓGICOEIXOS PEDAGÓGICOEIXOS PEDAGÓGICOEIXOS PEDAGÓGICO----METODOLÓGICOS: METODOLÓGICOS: METODOLÓGICOS: METODOLÓGICOS: Memória e Identidade / Pedagogia para uma nova Sociabilidade
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25/03 (terça feira) 25/03 (terça feira) 25/03 (terça feira) 25/03 (terça feira)
Conteúdo Conteúdo Conteúdo Conteúdo Objetivos Objetivos Objetivos Objetivos MetodologiaMetodologiaMetodologiaMetodologia Responsáveis Responsáveis Responsáveis Responsáveis
MANHÃMANHÃMANHÃMANHÃ
Credenciamento e distribuição dosCredenciamento e distribuição dosCredenciamento e distribuição dosCredenciamento e distribuição dos materiais didáticos materiais didáticos materiais didáticos materiais didáticos
Reunião da Equipe Pedagógica Nacional com Educandas/os Nacional e FETAEMAReunião da Equipe Pedagógica Nacional com Educandas/os Nacional e FETAEMAReunião da Equipe Pedagógica Nacional com Educandas/os Nacional e FETAEMAReunião da Equipe Pedagógica Nacional com Educandas/os Nacional e FETAEMA
Equipe Pedagógica e Equipe Pedagógica e Equipe Pedagógica e Equipe Pedagógica e
Equipe FETAEMAEquipe FETAEMAEquipe FETAEMAEquipe FETAEMA
TARDETARDETARDETARDE
Abertura Política do II Abertura Política do II Abertura Política do II Abertura Política do II
Curso.Curso.Curso.Curso.
Reafirmar os compromissos, princípios e
objetivos desse Itinerário Formativo da
ENFOC e seus desdobramentos nos
estados....
Coordenação Política Coordenação Política Coordenação Política Coordenação Política
da ENFOCda ENFOCda ENFOCda ENFOC, , , , Dirigentes Dirigentes Dirigentes Dirigentes
do MSTTR do MSTTR do MSTTR do MSTTR e e e e
convidadosconvidadosconvidadosconvidados
Memória e IdentidadeMemória e IdentidadeMemória e IdentidadeMemória e Identidade
---- Identidade Identidade Identidade Identidade
Camponesa Camponesa Camponesa Camponesa
Estimular uma breve reflexão sobre a
identidade camponesa
A partir de símbolos e expressões culturais, estimular a
vivencia das identidades de gênero, raça, geração e
regional nessa construção
EEEEquipe FETAEMAquipe FETAEMAquipe FETAEMAquipe FETAEMA, , , ,
Joyce, Viviane, Bena, Joyce, Viviane, Bena, Joyce, Viviane, Bena, Joyce, Viviane, Bena,
Maciela e Equipe Maciela e Equipe Maciela e Equipe Maciela e Equipe
ENFOCENFOCENFOCENFOC
Organização do Organização do Organização do Organização do
trabalho na família e trabalho na família e trabalho na família e trabalho na família e
na agricultura familiar.na agricultura familiar.na agricultura familiar.na agricultura familiar.
Favorecer uma compreensão sobre a
construção social dos diversos papéis de
homens e mulheres na família e na
agricultura familiar. . . .
Exposições sobre gênero e sobre raça, refletindo sobre
essas relações na família e na agricultura familiar
Nalú Faria e NogueiraNalú Faria e NogueiraNalú Faria e NogueiraNalú Faria e Nogueira
Identificar e refletir sobre alguns aspectos
dos módulos anteriores e que foram
retomados nas exposições, como algumas
inquietações trazidas nas exposições....
A equipe de sistematização apoiada pela equipe
pedagógica apresentará após as exposições e o dialogo
com o plenário, alguns aspectos relevantes para serem
abordados nas considerações finais da/o expositora/or
Equipes de Equipes de Equipes de Equipes de
Sistematização e Sistematização e Sistematização e Sistematização e
Equipe PedagógicaEquipe PedagógicaEquipe PedagógicaEquipe Pedagógica
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26/03 (quarta feira) 26/03 (quarta feira) 26/03 (quarta feira) 26/03 (quarta feira)
Conteúdo Conteúdo Conteúdo Conteúdo Objetivos Objetivos Objetivos Objetivos MetodologiaMetodologiaMetodologiaMetodologia Responsáveis Responsáveis Responsáveis Responsáveis
MANHÃMANHÃMANHÃMANHÃ
Criar um ambiente de Criar um ambiente de Criar um ambiente de Criar um ambiente de
cocococo----responsabilidade e responsabilidade e responsabilidade e responsabilidade e
comprometimcomprometimcomprometimcomprometimento com ento com ento com ento com
o desenvolvimento do o desenvolvimento do o desenvolvimento do o desenvolvimento do
curso.curso.curso.curso.
Apresentar a programação, constituir
acordos e as comissões de apoio ao curso.
De forma breve e explícita apresentar a programação,
caderno de textos, sugestão de acordo de convivência
e, as comissões de apoio ao curso: Organização e
apoio; mística e animação; avaliação; relatoria e
sistematização.
Equipe PedagógicaEquipe PedagógicaEquipe PedagógicaEquipe Pedagógica
ReapropriaçãoReapropriaçãoReapropriaçãoReapropriação
temática 1º e 2º temática 1º e 2º temática 1º e 2º temática 1º e 2º
módulo módulo módulo módulo
Estimular uma releitura do I e II Módulos e
a compreensão da inter-relação estes e o III
Módulo
A partir da Linha do Tempo, revisitar aspectos
temáticos e pedagógico-metodológicos do 1º e do 2º
módulo, apontando pontos de encontro com o 3º
modulo.
Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica
apoiada pelas/os apoiada pelas/os apoiada pelas/os apoiada pelas/os
educandas/os do educandas/os do educandas/os do educandas/os do
Curso NacionalCurso NacionalCurso NacionalCurso Nacional
Concepções de Concepções de Concepções de Concepções de
Desenvolvimento Rural Desenvolvimento Rural Desenvolvimento Rural Desenvolvimento Rural
no Brasil e Nordno Brasil e Nordno Brasil e Nordno Brasil e Nordeste este este este
Favorecer uma leitura critica das diferentes
concepções (modelos) de desenvolvimento
vivenciadas no Brasil a partir dos anos
1960.
Estimular a compreensão sobre as
principais dimensões para a construção do
desenvolvimento rural sustentável e
solidário na atualidade – desafios e
potencialidades....
Exposição dialogada considerando:
• As concepções (modelos) de desenvolvimento
implementadas no país e no nordeste.
• Seus impactos políticos, sociais, econômicos,
ambientais e culturais ontem e hoje.
• Os elementos centrais para a construção do DRSS
na atualidade e, as tendências/desafios para o
campo brasileiro/nordestino.
Vilênia Aguiar Vilênia Aguiar Vilênia Aguiar Vilênia Aguiar
Debate em plenário
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TARDETARDETARDETARDE
Concepções de Concepções de Concepções de Concepções de
Desenvolvimento Rural Desenvolvimento Rural Desenvolvimento Rural Desenvolvimento Rural
no Brasil e Nordesteno Brasil e Nordesteno Brasil e Nordesteno Brasil e Nordeste
Aprofundamento sobre o tema a partir de
texto, dos debates em plenário e no
acumulo do grupo.
A partir da exposição e debate da manhã, os grupos
irão identificar:
• O impacto das diferentes concepções de
desenvolvimento no nordeste, refletindo a partir dos
diversos sujeitos, mulheres e homens de todas as
idades e raças.
• Os principais eixos estruturadores do DRSS na região
nordeste.
• As tendências/desafios para o MSTTR e as demais
organizações sociais na perspectiva do DRSS.
Vilênia Aguiar e Vilênia Aguiar e Vilênia Aguiar e Vilênia Aguiar e Equipe Equipe Equipe Equipe
Pedagógica NacionalPedagógica NacionalPedagógica NacionalPedagógica Nacional
Concepções de Concepções de Concepções de Concepções de
DesenvDesenvDesenvDesenvolvimento Rural olvimento Rural olvimento Rural olvimento Rural
no Brasil e Nordesteno Brasil e Nordesteno Brasil e Nordesteno Brasil e Nordeste
Reflexão em plenário sobre as
contribuições dos grupos de trabalho.
Após cada GT apresentar sua contribuição estabelece-
se o debate em plenário.
Considerações finais da expositora e possíveis
arremates
Vilênia AguiarVilênia AguiarVilênia AguiarVilênia Aguiar
NOITENOITENOITENOITE
Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos
Oficina metodológica sobre Linha do TempoLinha do TempoLinha do TempoLinha do Tempo
De forma lúdica e criativa, o grupo ira refletir sobre os
limites e possibilidades na utilização do recurso
metodológico Linha do Tempo.
Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica
NacionalNacionalNacionalNacional
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27/03 (qu27/03 (qu27/03 (qu27/03 (quinta feira) inta feira) inta feira) inta feira)
Conteúdo Conteúdo Conteúdo Conteúdo Objetivos Objetivos Objetivos Objetivos MetodologiaMetodologiaMetodologiaMetodologia Responsáveis Responsáveis Responsáveis Responsáveis
MANHÃMANHÃMANHÃMANHÃ e TARDEe TARDEe TARDEe TARDE
RuralidadeRuralidadeRuralidadeRuralidade,,,,
TerritorialidadeTerritorialidadeTerritorialidadeTerritorialidade, , , ,
SocioeconômicaSocioeconômicaSocioeconômicaSocioeconômica
SolidáriaSolidáriaSolidáriaSolidária, , , , Soberania Soberania Soberania Soberania e e e e
Segurança Alimentar, Segurança Alimentar, Segurança Alimentar, Segurança Alimentar,
AgroextrativismoAgroextrativismoAgroextrativismoAgroextrativismo, , , ,
Agroecologia Agroecologia Agroecologia Agroecologia e e e e
Segurança HídricaSegurança HídricaSegurança HídricaSegurança Hídrica....
Contribuir para o aprofundamento temático
sobre Ruralidade, Territorialidade,
Economia Solidária, Soberania e Segurança
alimentar, Agroecologia, Agroextrativismo e
Segurança Hídrica tendo como lugar o
nordeste, refletindo a partir dos diversos
sujeitos, homens e mulheres de todas as
idades e raças.
Serão três oficinas simultâneas por período, a cada
período mudam as/os educandas/os por oficina. Ao
final, todas/os participarão de todas as três oficinas
(manha e tarde da quinta-feira e manha da sexta-feira).
Cada oficina terá a moderação de especialista
convidado.
Oficina 1 – Ruralidade, Territorialidade;
Oficina 2 – Sócioeconomia Solidária, Soberania e
Segurança Alimentar;
Oficina 3 – Agroextrativismo, Agroecologia e Segurança
Hídrica.
Oficina Oficina Oficina Oficina 1 1 1 1 –––– Zeke Beze;Zeke Beze;Zeke Beze;Zeke Beze;
OficinaOficinaOficinaOficina 2 2 2 2 –––– Mauricio Mauricio Mauricio Mauricio
Faria;Faria;Faria;Faria;
OficinaOficinaOficinaOficina 3 3 3 3 –––– Felipe Felipe Felipe Felipe
JalfimJalfimJalfimJalfim
NOITENOITENOITENOITE
Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos
Oficina metodológica sobre OficinaOficinaOficinaOficina De forma lúdica e criativa, o grupo ira refletir sobre os
limites e possibilidades da OficinaOficinaOficinaOficina enquanto recurso
metodológico.
Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica Equipe Pedagógica
NacionalNacionalNacionalNacional
28/03 (sexta feira28/03 (sexta feira28/03 (sexta feira28/03 (sexta feira) ) ) )
ConteúdoConteúdoConteúdoConteúdo Objetivos Objetivos Objetivos Objetivos MetodologiaMetodologiaMetodologiaMetodologia Responsáveis Responsáveis Responsáveis Responsáveis
MANHA MANHA MANHA MANHA
Continua as OficinasContinua as OficinasContinua as OficinasContinua as Oficinas
Continua as OficinasContinua as OficinasContinua as OficinasContinua as Oficinas
Continua as OficinasContinua as OficinasContinua as OficinasContinua as Oficinas
TARDETARDETARDETARDE Aprofundamento e reflexão sobre De forma lúdica e criativa, as educandas/os serão
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Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos
Ruralidade, Territorialidade, Economia
Solidária, Soberania e Segurança alimentar,
Agroecologia, Agroextrativismo e Segurança
Hídrica
estimuladas/os a refletir e partilhar as vivências, as
aprendizagens e as lições que marcaram a reflexão
sobre os temas.
Alexandre MerremAlexandre MerremAlexandre MerremAlexandre Merrem
NNNNOITEOITEOITEOITE
FESTAFESTAFESTAFESTA
Ver sugestões com Ver sugestões com Ver sugestões com Ver sugestões com
FETAEMAFETAEMAFETAEMAFETAEMA
28/03 (sexta feira) 28/03 (sexta feira) 28/03 (sexta feira) 28/03 (sexta feira)
ConteúdoConteúdoConteúdoConteúdo Objetivos Objetivos Objetivos Objetivos MetodologiaMetodologiaMetodologiaMetodologia Responsáveis Responsáveis Responsáveis Responsáveis
MANHAMANHAMANHAMANHA LIVRELIVRELIVRELIVRE Equipe FETAEMAEquipe FETAEMAEquipe FETAEMAEquipe FETAEMA
TARDETARDETARDETARDE
Relações de trabalho Relações de trabalho Relações de trabalho Relações de trabalho
no espaço rural do no espaço rural do no espaço rural do no espaço rural do
Brasil e do Nordeste Brasil e do Nordeste Brasil e do Nordeste Brasil e do Nordeste
Estimular a compreensão sobre as relações
de trabalho no campo e suas inter-relações
com as concepções de desenvolvimento
vivenciadas na região....
Exposição dialogada explicitando:
• Explicitar as diferentes relações de trabalho no
espaço rural, sobretudo no nordeste.
• Os impactos dos grandes projetos e da revolução
verde na agricultura familiar e na agricultura patronal.
• Os elementos centrais para a construção do DRSS na
atualidade e, as tendências/desafios para o campo
brasileiro/nordestino.
Bruno Bruno Bruno Bruno RibeiroRibeiroRibeiroRibeiro ––––
FETAPE FETAPE FETAPE FETAPE
NOITENOITENOITENOITE
Construção de síntese temática e pedagógico-metodológica da caminhada destacando dentre outros: as diferentes concepções
Equipes de Equipes de Equipes de Equipes de
Sistematização e Sistematização e Sistematização e Sistematização e
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refletidas; as orientações que indiquem as tendências do desenvolvimento; grandes eixos do DRSS............ PedagógicaPedagógicaPedagógicaPedagógica
30/03 (domingo) 30/03 (domingo) 30/03 (domingo) 30/03 (domingo)
ContContContConteúdo eúdo eúdo eúdo Objetivos Objetivos Objetivos Objetivos Metodologia Metodologia Metodologia Metodologia Responsáveis Responsáveis Responsáveis Responsáveis
MANHAMANHAMANHAMANHA
Reapropriação sobre Reapropriação sobre Reapropriação sobre Reapropriação sobre
as reflexões sobre o as reflexões sobre o as reflexões sobre o as reflexões sobre o
DRSSDRSSDRSSDRSS
Reflexão sobre as grandes tendências do
DRSS e as questões desafiadoras para a
ação sindical....
Breves intervenções do grupo sobre as tendências do
DRSS e as questões desafiadoras para a ação sindical
a partir da socialização de síntese sobre as reflexões
construídas pelo grupo nos dias anteriores sobre o
DRSS.
Equipe de Equipe de Equipe de Equipe de
Sistematização e Sistematização e Sistematização e Sistematização e
Equipe PedagógicaEquipe PedagógicaEquipe PedagógicaEquipe Pedagógica
Atividades InterAtividades InterAtividades InterAtividades Inter----
módulosmódulosmódulosmódulos
Socialização e reflexão sobre as atividades
Inter-módulos desenvolvidas pelos 09
estados.
Socialização e reflexão sobre cada uma das atividades
inter-módulos
Equipe PedagógicaEquipe PedagógicaEquipe PedagógicaEquipe Pedagógica
TARDETARDETARDETARDE
Trabalho em grupo Trabalho em grupo Trabalho em grupo Trabalho em grupo
Favorecer a compreensão sobre a
importância da ação sindical do MSTTR na
região, na perspectiva de implementação
do PADRSS.
A partir de perguntas geradoras o grupo irá refletir a
inter-relação: ação sindical e os elementos trazidos nas
atividades inter-módulos, identificando as
potencialidades, desafios e possibilidades.
Equipe PedagóEquipe PedagóEquipe PedagóEquipe Pedagógicagicagicagica
Plenária de socialização e debate
NOITENOITENOITENOITE
Construção de um painel que expresse o “olhar” do grupo sobre a Ação Sindical do MSTTR na região Nordeste – ele deve
problematizar a ação sindical....
Equipes de Equipes de Equipes de Equipes de
Sistematização e Sistematização e Sistematização e Sistematização e
PedagógicaPedagógicaPedagógicaPedagógica
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31/03 (segunda31/03 (segunda31/03 (segunda31/03 (segunda----ffffeira) eira) eira) eira)
ConteúdoConteúdoConteúdoConteúdo ObjetivosObjetivosObjetivosObjetivos MetodologiaMetodologiaMetodologiaMetodologia ResponsáveisResponsáveisResponsáveisResponsáveis
MANHAMANHAMANHAMANHA
Ação Sindical e as Ação Sindical e as Ação Sindical e as Ação Sindical e as
Tendências do DRSS no Tendências do DRSS no Tendências do DRSS no Tendências do DRSS no
Nordeste Nordeste Nordeste Nordeste
TARDETARDETARDETARDE
Possibilidades e desafios Possibilidades e desafios Possibilidades e desafios Possibilidades e desafios
para ação sindical frente para ação sindical frente para ação sindical frente para ação sindical frente
às grandes tendências às grandes tendências às grandes tendências às grandes tendências
do DRSS.do DRSS.do DRSS.do DRSS.
Construir entendimentos acerca da Ação
Sindical do MSTTR no Nordeste, tendo o DRSS
enquanto referencia para a reflexão.
Apontar o alcance, limites e possibilidades da
ação sindical para estimular mudanças
concretas na vida dos diversos sujeitos à luz
das tendências identificadas....
Socialização da síntese do acumulo do grupo e uma breve
reflexão coletiva.
Exposição dialogada sobre a ação sindical e o
Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário.
Equipe de Sistematização Equipe de Sistematização Equipe de Sistematização Equipe de Sistematização
e e e e Equipe Equipe Equipe Equipe PedagógicaPedagógicaPedagógicaPedagógica
Manoel dos SantosManoel dos SantosManoel dos SantosManoel dos Santos
TARDETARDETARDETARDE
Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos Diálogos pedagógicos
Construir encaminhamentos comuns para o desenvolvimento da Estratégia da PNF, sobretudo, quanto ao
Itinerário da ENFOC nos Estados (GES e Cursos Estaduais)
FORMATURA (ato político e festa) FORMATURA (ato político e festa) FORMATURA (ato político e festa) FORMATURA (ato político e festa)
01/04 (terça01/04 (terça01/04 (terça01/04 (terça----feira) feira) feira) feira)
ConteúdoConteúdoConteúdoConteúdo Objetivos Objetivos Objetivos Objetivos Responsáveis Responsáveis Responsáveis Responsáveis
MANHAMANHAMANHAMANHA
Oficina de Avaliação
Encerramento do Curso de Formação em Concepção, Prática Sindical e em Metodologia - Mística de encerramento
Equipe de Avaliação e Equipe PedagógicaEquipe de Avaliação e Equipe PedagógicaEquipe de Avaliação e Equipe PedagógicaEquipe de Avaliação e Equipe Pedagógica
Coordenação Pedagógica ENFOC, Coordenação Pedagógica ENFOC, Coordenação Pedagógica ENFOC, Coordenação Pedagógica ENFOC,
Federações e Convidados (as).Federações e Convidados (as).Federações e Convidados (as).Federações e Convidados (as).
TARDETARDETARDETARDE
Retorno aos Estados
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RELAÇÕES DRELAÇÕES DRELAÇÕES DRELAÇÕES DE GÊNERO E AGRICULTUE GÊNERO E AGRICULTUE GÊNERO E AGRICULTUE GÊNERO E AGRICULTURA FAMILIARRA FAMILIARRA FAMILIARRA FAMILIAR
Miriam Nobre
Nos últimos anos, a agricultura familiar tem estado no centro das atenções do
movimento sindical, dos pesquisadores, do Governo e dos organismos internacionais
relacionados com a questão. Ela aparece como a base de um modelo alternativo de
desenvolvimento para o meio rural capaz de reduzir a pobreza, as disparidades de
renda e o uso irracional dos recursos naturais. O debate predominante em torno da
agricultura familiar trata de como torná-la mais eficiente e com maior capacidade de
resistência ao mercado cada vez mais concentrado. Para isso, buscam entendê-la
melhor, definindo características, como tamanho, produção, presença ou não de
empregados e classificando-a em grupos. Infelizmente, muitos ainda pensam essa
atividade apenas como um setor da economia ou, no máximo, enquanto função social
com potencial para conter o êxodo rural, o qual contribui para aumentar o desemprego
nas cidades. Poucos se detêm sobre as pessoas que vivem e trabalham na agricultura
familiar — seus sonhos e anseios, os direitos que constroem e procuram tornar
realidade. Quanto à família, quando considerada, apenas o é na figura do chefe da
família. O trabalho e a visão de mulheres, filhas e filhos são negligenciados, como se
os interesses do pai incluíssem os de todos.
A idéia de um pai que decide pela vida de todos parece uma coisa do passado, pelo
menos no discurso voltado para o meio urbano. Por que então é aceita sem
questionamentos para as famílias de trabalhadores rurais? Talvez porque, para os
agricultores que trabalham a terra por conta própria, a forma de combinar a
disponibilidade de trabalho da família com as exigências das diferentes etapas do ciclo
de produção agrícola propicie uma divisão do trabalho que se naturaliza pelo sexo e
pela idade. A naturalização da divisão sexual do trabalho impede que esta se torne um
problema a ser enfrentado pela sociedade. Mesmo o grande estudioso da produção
econômica camponesa, Alexander Chayanov, ao se deparar com as estatísticas que
apontavam o tempo de trabalho muito maior das mulheres na Rússia do princípio do
século, em relação ao dos homens, afirmou:
“Uma grande parte do trabalho do homem é empregada nas atividades
artesanais, comércio e agricultura. A força de trabalho da mulher se utiliza de
forma predominante no trabalho doméstico. Em geral a mulher trabalha mais do
que o homem, mas seu trabalho não é tão duro. Os adolescentes trabalham
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menos dias que os adultos. A distribuição de seu trabalho nos setores da fazenda
é de acordo com o sexo; em geral os jovens se ocupam mais da agricultura e as
jovens dedicam muitos dias ao trabalho doméstico” (Chayanov, 1985, p. 210).
Ainda hoje a divisão sexual do trabalho parte do princípio de que os homens são
responsáveis pelo trabalho produtivo (a agricultura, a pecuária, enfim tudo o que se
associa ao mercado) e as mulheres, pelo trabalho reprodutivo (o trabalho doméstico, o
cuidado da horta e dos pequenos animais, tudo o que é feito para uso e consumo
próprio, sem contar a reprodução da própria família pelo nascimento e cuidado dos
herdeiros). Nos estudos brasileiros sobre campesinato essa divisão se expressou na
oposição entre casa e roçado.
DIVISÃO SEXUAL DO TRDIVISÃO SEXUAL DO TRDIVISÃO SEXUAL DO TRDIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO NA AGRICULTURABALHO NA AGRICULTURABALHO NA AGRICULTURABALHO NA AGRICULTURA: A: A: A:
UM PESO, DUAS MEDIDAUM PESO, DUAS MEDIDAUM PESO, DUAS MEDIDAUM PESO, DUAS MEDIDASSSS
Beatriz Heredia e outros (1984), estudando pequenos produtores ligados à plantação
açucareira no Nordeste brasileiro, apontam a relação entre roçado e casa como
definidora das áreas de trabalho e de não-trabalho. No roçado se produz farinha, feijão
e milho, considerados, pelos agricultores, fundamentais à sobrevivência, de modo que
as atividades aí realizadas são reconhecidas como trabalho. O pai encarna essas
atividades, logo o trabalho é dele. Mesmo que os filhos e a esposa desempenhem
tarefas no roçado, essas são consideradas “ajuda”. Por oposição ao roçado, a casa é o
lugar da mulher, mãe de família, e as atividades aí desenvolvidas são consideradas um
não-trabalho. O produto das atividades femininas no cuidado de pequenas criações ou
no artesanato é comercializado para a compra de outros bens para a casa, como, por
exemplo, utensílios de cozinha, roupa de cama etc. As mulheres geralmente não
participam da comercialização de produtos. Quando estão nas feiras, localizam-se na
venda de produtos considerados secundários, tais como verduras, frutas e
condimentos.
A idéia de que, em última instância, a hierarquia entre os produtos determina os
conceitos de trabalho e ajuda merece melhor análise. O Deser (Departamento Sindical
de Estudos Rurais) e a Comissão da Mulher Trabalhadora Rural da CUT — Central Única
dos Trabalhadores — do Paraná realizaram uma pesquisa sobre a participação das
mulheres na produção de leite, cujo resultado evidenciou que elas são responsáveis
por grande parte das etapas dessa produção (Deser e CEMTR-PR, 1996). Porém, à
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medida que a produção de leite se tecnifica e passa a contribuir com maior peso para
a renda das famílias, as tarefas passam progressivamente a ser desenvolvidas pelos
filhos maiores e, depois, pelos maridos. Enquanto fruto de uma produção
complementar, o resultado da venda do leite contribui para o pagamento da conta de
luz e para a compra do “rancho” (produtos de consumo doméstico industrializados
como macarrão, óleo de soja, fósforo), o que é essencial para a manutenção dessas
famílias; contudo, tal aspecto não é facilmente reconhecido. Para as agricultoras
presentes ao seminário de apresentação da pesquisa, isso ocorre “porque o dinheiro
sai todo mês e não faz volume”.
Quando a produção agrícola é vendida, entra o “dinheiro grande”, com o qual são
compradas novas roupas para toda a família, eletrodomésticos de maior custo, e
decidem-se os novos investimentos na produção — este último, um assunto que não é
considerado “de mulher”.
A divisão sexual do trabalho estaria então profundamente relacionada com as
representações sociais vinculadas a mulheres e homens. Em estudo publicado em
1975, Verena Martinez-Alier já trazia a fala das mulheres bóias-frias: “O homem
trabalha porque é homem; a mulher porque precisa”. Isto é, o trabalho constitui a
própria identidade masculina, enquanto as mulheres estão como que provisórias no
mundo do trabalho. O título de “provisórias” ou “estranhas” a um mundo onde sempre
estiveram serve a uma desvalorização do trabalho das mulheres. Maria Ignez Paulilo
(1987), analisando os trabalhos agrícolas no sertão e no brejo paraibano, e na cultura
de fumo na região sul de Santa Catarina, percebeu como traço comum entre eles a
distinção entre trabalho leve e trabalho pesado: o primeiro, atribuição de mulheres e
crianças; o segundo, incumbência masculina. Segundo a autora, o trabalho é
considerado leve por quem o executa, e não pela natureza do trabalho em si. Mesmo
que as mulheres e crianças trabalhem o mesmo número de horas que os homens e
suas tarefas exijam habilidade, paciência e rapidez, elas recebem menos, pois o valor
da diária é determinado pelo sexo e idade de quem a recebe.
O esforço físico é sempre apontado como uma das razões para os homens serem
considerados mais importantes do que as mulheres no trabalho agrícola. Mas, quando
se olha para a realidade, não há tarefa que elas não executem se não for possível
prescindir de seus braços. Mulheres já fizeram destoca, araram a terra, puxando o
burro ou “no muque”, e carregaram sacos de 60 kg na cabeça. Mas, toda vez que
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essas tarefas são mecanizadas e, portanto exige menor força física,
contraditoriamente, elas são excluídas, ou seja, é muito mais fácil ver uma mulher
carpindo com a enxada do que dirigindo o trator para a realização do trabalho agrícola.
Outro estudo interessante é o de Maria Aparecida Moraes (1987) sobre as mulheres
agricultoras do Vale do Jequitinhonha (Minas Gerais). Segundo essa autora:
“No tocante às mulheres, não existe uma separação rígida entre casa e roçado.
Ela transita por esses dois espaços. As mulheres fazem ou podem fazer todos os
serviços nessas unidades camponesas, dependendo não só do ciclo produtivo,
como também da ausência ou permanência do marido e filhos adultos na terra”
(p. 9).
Permanece, entretanto, a valorização diferente entre homens e mulheres. Nas regras
para a troca de dias, prática fundamental na organização do trabalho ao longo do ciclo
agrícola, mulheres não trocam dias com homens, havendo mesmo locais em que isso é
proibido. Quando o fazem, elas têm de trabalhar dois dias para pagar um dia de
serviço de um homem.
AS RELAÇÕES DE GÊNERAS RELAÇÕES DE GÊNERAS RELAÇÕES DE GÊNERAS RELAÇÕES DE GÊNEROOOO
A valorização diferente do trabalho de mulheres e homens se explica pela existência de
uma relação de hierarquia entre os gêneros. Essa relação tem sua base material na
divisão sexual do trabalho, mas organiza, sem ordem de prioridades, aspectos
econômicos, sociais, vivências particulares, símbolos e representações em imagens de
constante movimento, como em um caleidoscópio.
Olhar para a complexidade das relações de gênero é querer, mais do que ver suas
formas aparentes, entender sua dinâmica, a forma como produzem e reproduzem
desigualdades para poder superá-las. Um dos aspectos a se considerar é o processo
de socialização de gênero desenvolvendo habilidades e capacidades diferentes nos
homens e nas mulheres. Quando resgatamos, em uma linha da vida, o
desenvolvimento de meninos e meninas, percebemos que, na área rural, eles estão
juntos, sem grandes diferenças até por volta dos 5 anos. Depois, as meninas começam
a seguir as mães, aprendendo com elas o trabalho doméstico e contribuindo para a
realização deste. Os meninos passam a seguir o pai, a aprender com ele e a brincar
entre meninos nas horas de lazer que geralmente são maiores que as das meninas. Os
rapazes também saem mais, vão mais longe, enquanto as moças ficam mais com a
família, não só pelo trabalho, mas pelo medo dos pais de que elas “caiam na vida”.
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Quando se tornam adultos, se ocupam das tarefas consideradas do sexo oposto,
sentem dificuldades pessoais e sofrem reprovações sociais de parentes e amigos. Se a
mulher está de resguardo e o casal não tem filhas com idade suficiente para fazer o
serviço da casa, o homem o faz. E, sempre que necessário, as mulheres fazem o
serviço considerado dos homens. Algumas temem a igualdade derivada do fato de
assumirem “oficialmente” a responsabilidade pelo serviço que muitas vezes já fazem:
“Se eu aprender o serviço dele, ele não vai fazer nem isso”. Ademais, os homens
resistem ao novos aprendizados das mulheres: “Se você souber dirigir, não vai parar
mais aqui”, e elas se sentem pressionadas por uma grande exigência interna e externa
de não poderem errar. Na maioria das vezes, o que acontece é que as aprendizagens
de homens e mulheres no “campo oposto” só servem para complementar o serviço
do/a outro/a ou para cobrir uma ausência, e não para redividir as tarefas de forma
mais permanente, e muito menos o poder e o reconhecimento social que as recobre.
Os estudos sobre a agricultura familiar que utilizam o conceito de gênero como
instrumentos de análise ainda são recentes. Destaca-se o de Ellen Woortmann (1995)
sobre as relações de parentesco entre colonos de origem alemã do Sul do Brasil e
entre sitiantes do Nordeste. A hierarquia de gêneros é aí detectada não só na
produção agrícola, mas na sexualidade, na posição na comunidade (na “oposição
simbólica mulheres à esquerda, homens à direita, no interior da igreja”) e na família.
Entre os colonos alemães do Sul, por exemplo, os nomes masculinos expressam
relações de compadrio e parentesco, e o fazer parte de uma família. Os nomes das
mulheres são “nomes fantasia”, pois elas serão reconhecidas em relação com o nome
do pai e, depois, com o do marido.
Para Ellen Woortmann, a reprodução camponesa depende de sua capacidade de
resistência e adaptação, o que, para ela, se baseia, nos dois casos estudados, “no
valor atribuído à família e ao trabalho familiar, e na lealdade à tradição, mas, ao
mesmo tempo, na dinâmica conservadora de sua organização social”.
Entre os colonos alemães do Sul, a insatisfação da mulher com respeito a esse modelo
tem como resposta a migração para a cidade, onde ela terá “ao menos seu salário”.
Uma leitura possível é, então, a de que a hierarquia entre os gêneros constitui de tal
forma o modelo de existência da agricultura familiar que seu questionamento, por
parte das mulheres, comprometeria a sua própria reprodução enquanto agricultoras.
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Outro estudo, de Maria José Carneiro (1996), analisa as unidades de produção agrícola
familiar da França atual, que combinam o trabalho na terra com o assalariamento em
fábricas da região. Esse fenômeno é conhecido como pluriatividade. Apesar de já ser
comum no Brasil há muitos anos (exemplificado pelos migrantes que trabalham na
cidade e mandam dinheiro para a família no campo), vem chamando a atenção como
uma característica que se projeta no futuro da agricultura familiar. Na França, o
homem sai para trabalhar e a mulher passa a ter o status de chefe do
estabelecimento, para continuar recebendo o incentivo oficial dirigido aos
trabalhadores exclusivamente agrícolas. As mulheres fazem todo o trabalho, inclusive
o manejo das máquinas, mas se vêem como se fossem um “prolongamento dos braços
de seus maridos”. Na prática, as esposas de agricultores não tomam jamais o lugar de
seus maridos na hierarquia familiar, mesmo que elas os substituam no trabalho e
obtenham um estatuto legal junto às entidades que regulamentam a profissão de
agricultor. Da mesma maneira, elas não ocupam posições de poder nos organismos
deliberativos voltados para a agricultura.
A autora conclui, por isso, que o papel da mulher na produção não seria o
determinante para a redefinição da sua posição na família ou na sociedade, mas sim a
ideologia que cimenta as relações de hierarquia entre os gêneros.
As análises de Ellen Woortmann e de Maria José Carneiro têm em comum o fato de
buscarem ir além de uma interpretação exclusivamente econômica da desigualdade
entre os gêneros. Mas a impressão que fica é a de que a cultura, a tradição e a
ideologia são entidades autônomas, não estando profundamente imbricadas na
produção material da vida e dificilmente sendo mudadas. Essas análises nos fazem
refletir sobre as questões estratégicas envolvidas no fortalecimento das mulheres
enquanto agricultoras. O fundamental é ter sempre presente as mulheres como
sujeitos que, por sua ação política, definem quais questões adquirem formas
estratégicas para mudar as relações de gênero.
AS TRANSFORMAÇÕES EMAS TRANSFORMAÇÕES EMAS TRANSFORMAÇÕES EMAS TRANSFORMAÇÕES EM CURSOCURSOCURSOCURSO
Os movimentos de mulheres trabalhadoras rurais, nas suas mais diferentes vertentes
(autônomos, ligados ao movimento sindical, a associações de pequenos produtores
etc.), vêm construindo a identidade política das agricultoras no seu reconhecimento
público. Eles obtêm a cidadania destas por seu acesso à documentação profissional e
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por seu auto-reconhecimento enquanto trabalhadora e pela aceitação, pelos agentes
públicos, da profissão de agricultora na declaração para o Censo, na certidão de
casamento, na emissão da nota conjunta do produtor e no gozo dos direitos
previdenciários (auxílio maternidade e aposentadoria). Apesar de todos esses avanços,
muitos funcionários do INSS ou de cartórios ainda resistem, na prática, a reconhecer
as mulheres enquanto agricultoras, sem contar os gerentes de banco. Por isso, uma
vitória importante do Grito da Terra de 1998 foi a criação de linhas especiais de crédito
para mulheres no Procera (Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária).
A visibilidade e a valorização do trabalho das mulheres, porém, são mais restritos na
sua relação com a família. A maioria das agricultoras não decide sobre o dinheiro que
é fruto de seu suor ou sobre os investimentos que poderiam melhorar suas condições
de trabalho. Por exemplo, nas regiões onde são responsáveis por tirar leite, é comum
as mulheres terem de cuidar de duas a três vacas, que, somadas, atingem a produção
de uma mais produtiva, ou ter de cortar o capim e trazer para os animais, porque não
podem decidir sobre um pequeno pedaço de terra para fazer um piquete.
As propostas para enfrentar essa questão ainda são poucas. Geralmente restringem-se
à de que o marido pague um salário à esposa ou divida a terra em lotes individuais a
serem explorados em separado pelos membros da família. Essas propostas contrariam
a lógica tradicional da agricultura camponesa, de utilizar de forma combinada seu
principal recurso disponível, que é à força de trabalho de todos os seus integrantes
para garantir sua sobrevivência e reprodução.
Outra questão é a da herança da terra. Mesmo quando nos dirigimos diretamente aos
jovens, ela permanece um tabu. A divisão igualitária de tão pouca terra e instrumentos
de trabalho pode significar que nenhum dos filhos e filhas tenha como continuar sua
vida na condição de agricultores. Mas, se permanecerem as regras tradicionais, as
mulheres continuarão a ser excluídas — destinadas ao convento, a receber uma
máquina de costura e uma vaca para viver com a família do marido ou à migração para
a cidade em busca de um emprego. A opção por essa última alternativa tem
aumentado cada vez mais, e começa a chamar a atenção da sociedade (Veja, 05-08-
98). A saída das mulheres do campo pode não se explicar somente por uma maior
oferta de empregos para mulheres na cidade ou por sua maior escolaridade, mas por
uma negação da condição de vida da mãe de família, esposa de agricultor.
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Para o delicado problema da herança, a novidade foi trazida pelo Movimento dos Sem-
Terra, que abriu, pela luta política, a possibilidade de acesso a terra e à condição de
agricultor para os filhos, infelizmente não na mesma proporção para as filhas. A luta
política cria identidades de classe — os sem-terra — e de gênero. Essas identidades
parecem algumas vezes contraditórias, mas a própria luta cria formas de mediação
entre tais interesses, produzindo mesmo novas representações sociais. Por exemplo, a
pesquisa “Mulheres na Produção do Leite” (Deser-CEMTR/PR, 1996) registrou que os
homens que tiram leite, tarefa considerada feminina naquela região do país, eram
identificados como “do PT”. Isso significa que maneiras diferentes de viver em família e
organizar o trabalho dentro dela, pelo menos na idéia, se associam rapidamente com
uma maneira diferente de ver o mundo e querer transformá-lo. Os movimentos sociais
podem, portanto, em interação com outras forças, construir na sua ação política
respostas para dilemas que ainda não estão conscientemente colocados.
Cabem, ainda, algumas reflexões na tentativa de uma formulação mais próxima da
realidade das agricultoras familiares. Para Delma Pessanha (1997), a sobreposição do
que move a unidade de produção nos interesses da unidade familiar, e de cada um de
seus membros, é simplista e tende a subordinar o segundo ao primeiro por uma
determinação econômica. Esse olhar nos faz entender novas realidades, como, por
exemplo, o manejo de pequenas unidades de produção de cana no interior de São
Paulo ou do Rio de Janeiro, feito por especialistas com o acompanhamento de apenas
um membro da família proprietária, que pode bem ser uma mulher viúva ou solteira.
Mesmo que a família, como uma reunião de sujeitos, e a unidade econômica de
produção possa ter movimentos próprios, estes se relacionam e, para fortalecer a
autonomia das mulheres, é preciso considerar a maneira como elas se inserem em
cada uma dessas dimensões.
Nas oficinas que realizamos, conhecemos Rosa, uma mulher solteira que administra a
propriedade de sua família, onde ainda vivem sua mãe viúva e seu irmão mais novo.
Desde criança, ela preferia ir para a roça a dividir o trabalho ao redor da casa com
suas irmãs. Perto do pai, aproveitava para observar e aprender sua forma de agir, de
organizar o trabalho, de decidir os negócios. Já adulta, era sempre ela que o agrônomo
da ONG local procurava para falar das novidades tecnológicas, pensarem propostas
para a exploração agrícola de sua família. Foi assim que Rosa montou a criação e o
abatedouro de frangos que garante uma renda pequena, mas estável, para o sustento
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de todos. Na região, um antigo e atuante movimento de mulheres cria o ambiente
favorável para que ela não seja a exceção que justifica a regra. Sempre pensando
novas formas de produzir, sustentáveis dos pontos de vista financeiros e ecológicos,
para sua roça e para a comunidade, Rosa tornou-se presidente da associação de
pequenos produtores local. A trajetória pessoal e organizada no movimento de
mulheres e nas iniciativas alternativas de produção se combina na história dessa
mulher, que construiu para si um destino diferente do de muitas de suas amigas e
contemporâneas. Para que outras rosas, margaridas, açucenas floresçam, ainda é
preciso que a desigualdade entre os gêneros na sociedade, inclusive na agricultura
familiar, não lhes tire o viço.
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RELAÇÕES RACIAS RELAÇÕES RACIAS RELAÇÕES RACIAS RELAÇÕES RACIAS
E AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS NO BRASILE AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS NO BRASILE AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS NO BRASILE AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS NO BRASIL1111....
João Carlos NogueiraJoão Carlos NogueiraJoão Carlos NogueiraJoão Carlos Nogueira2222
IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução
As relações sociais no Brasil estão marcadas pelas relações raciais, de gênero e de
classe. Essas formas de relações, não eliminam umas as outras, ao contrário, formam
um intrincado complexo de relações humanas, que desafiam as clássicas áreas do
conhecimento como a sociologia, história, antropologia, economia, a pedagogia e
outras áreas, como o direito, a psicologia, a própria geografia e a arquitetura que
passam a discutir o espaço, o território, o mundo urbano, as cidades articuladas com
os conceitos e categorias produzidas no campo das relações raciais, portanto, a
interdisciplinaridade como metodologia de análise e investigação é o ponto de partida
para alcançar os desafios que os estudos das relações étnico-raciais exigem.
Nas ciências humanas e sociais o tripé Raça, Ciência e Sociedade, desde sempre
orientou e continua orientando várias áreas do conhecimento e, particularmente, nas
últimas décadas do Século XIX e início do século XX, formou as bases do pensamento
político e ideológico das elites brasileiras, acerca do projeto social, cultural e
econômico para as populações negras e indígenas (já condenadas pelo processo de
extermínio, violência e dominação vividos nos séculos passados), cujo projeto as
excluiu tacitamente do desenvolvimento do Estado-Nação. Este modelo de
desenvolvimento excludente praticado pelas elites brasileiras impediu o
desenvolvimento das potencialidades humanas e materiais que o País tinha como
possibilidade em cada região, localidade e território.
1 As questões abordadas neste texto integram o artigo “A construção dos conceitos de raça, racismo e
discriminação racial nas relações sociais” publicado in: NEN. Multiculturalismo e pedagogia multirracial e
popular. Atilènde, 2002.
2 Sociólogo, Secretário Executivo do Núcleo de Estudos Negros - NEN, Consultor do Instituto Interamericano
de Cooperação para a Agricultura - IICA e Doutorando em Gestão do Território pela UTAD - Portugal.
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Desse modo, a presença dos trabalhadores negros principalmente, se dá nas franjas
da sociedade, seja no campo como meeiro, roceiro, diarista, mensalista, raramente
“dono” de uma pequena propriedade rural. O processo de desenvolvimento acelerado
na construção das cidades no início do século XX é também profundamente
excludente, na medida em que a política incentivada de imigrantes europeus,
deliberadamente desqualificava a mão-de-obra nacional, em particular a dos ex-
escravos. Estes são alguns dos elementos que vão estruturando o modelo histórico e
contemporâneo do racismo á brasileira, que foi desenvolvendo-se enquanto prática
social.
Portanto, a ideologia do racismo, a discriminação e preconceitos de toda ordem, foram
também se estruturando nas práticas dos movimentos sociais, nas suas estratégias de
lutas reivindicativas, nos seus propósitos enquanto sujeitos coletivos que pretendiam
formar uma nova cultura política, sobretudo no movimento sindical brasileiro e nos
partidos políticos. Quando recorremos às fontes produzidas à época, é nítida a
negação da presença dos trabalhadores negros como sujeitos ativos (Nogueira,1996;
Araújo, 2000; Bento, 1998; Rodrigues, 2000)
As relações sociais no Brasil são também historicamente marcadas pela violência, seja
nas relações de trabalho no campo ou no meio urbano, do mesmo modo ela se
reproduz nas relações de gênero e classes, de raça, cor, de geração, opção sexual, a
opressão se manifesta como forma de intimidação. Vale destacar, que os métodos
utilizados nas relações de trabalho ao longo desses 500 anos, as formas autoritárias e
violentas sempre foram utilizadas para resolver conflitos, onde o pressuposto
democrático seria a negociação (Weffort, 1980; Nogueira, 2001; Hirata, 2002) A
negação do outro, como sujeito de direitos, permitiu fazer da diferença, instrumento
para a perpetuação das desigualdades, estas marcas sedimentaram a formação do
Estado, dos espaços de poder e da sociedade.
A construção dos conceitos de raça, racismo e a discriminação racial no Brasil estão
diretamente relacionados ao desenvolvimento do capitalismo ocidental. Pretendia-se
uma construção negativa do trabalhador negro escravizado, anteposto a valores
supostamente positivos brancos de origem européia. São estes valores e conceitos do
mundo ocidental como: a ética protestante, liberalismo, individualismo a noção de
propriedade e posse, que alimentaram e retroalimentam as bases da cultura
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hegemônica do ocidente. No universo competitivo dos sistemas produtivos de estímulo
a simples competição nas relações de trabalho, a substituição de mão-de-obra dos
trabalhadores negros pelos imigrantes, a política de branqueamento, as leis de locação
de mão-de-obra incentivos e oportunidades voltados para os imigrantes europeus
(Lamounier, 1988), reduziu quase a zero as possibilidades dos trabalhadores negros
serem bem sucedidos nessa nova fase do desenvolvimento capitalista, conhecida
como capitalismo industrial
Para os sociólogos, antropólogos, historiadores, intelectuais e pesquisadores que
acreditavam no fim do racismo e da discriminação racial com o processo de
industrialização no Brasil e a força do desenvolvimento econômico, ou seja, a
integração passiva dos negros na sociedade de classes, esta constatação mostrou-se
insuficiente. Ao contrário se cristalizaram dado a sua dinâmica e permanência mesmo
nos processos com profundas mudanças sociais como foi o caso das últimas décadas
do século XIX e o século XX, provando com isso, que atualmente os investimentos
públicos para o desmantelamento de suas estruturas, não aceitam atitudes tímidas e
evasivas. Na seara da garantia de direitos iguais e oportunidades equivalentes, os
investimentos precisam ser robustos nas políticas públicas, seja para coibir, persuadir
ou reeducar a sociedade para o exercício pleno da democracia.
O texto pretende abordar aspectos gerais sobre os conceitos de raça, racismo e a
discriminação racial, orientando-se como questão central, a formação do pensamento
racializado (John Rex, 1986) no Brasil e suas capilaridades, com o mundo das relações
sociais.
Identidade, Raça, Classe e a Exclusão Social:Identidade, Raça, Classe e a Exclusão Social:Identidade, Raça, Classe e a Exclusão Social:Identidade, Raça, Classe e a Exclusão Social:
Nossas singularidades enquanto Nação, nossa formação sociocultural e política, cada
vez mais nos dizem quem somos. As afirmações são categóricas: Da população total
170 milhões (IBGE. Censo 2000), 61% dos brancos brasileiros têm sangue índio ou
africano; somos mesmo o país da miscigenação; há brancos que são geneticamente
negros, e vice-versa, ou seja, índios, negros e europeus formam a base genética da
população brasileira. O que parece evidente para alguns, independente da sua
ancestralidade genômica, pode parecer estranho para outros. O mistério nos parece,
não é saber o que cada um de nós é, mas sim, o que queremos ser. Assumindo a
definição que identidade é, sobretudo uma construção social, é o pertencimento a uma
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cultura, é o sentir-se num mundo de significados e valores, é o modo do grupo ou do
indivíduo dar sentido a sua própria existência, cujas raízes localizam-se em algum
lugar.
A cultura política e a identidade enquanto um valor socialmente construído são
categorias conceituais fundamentais para compreendermos o ethos da formação da
sociedade brasileira. Para Renato Ortiz (1985) “toda identidade é uma construção
simbólica” afirma também “que não existe uma identidade autêntica, mas uma
pluralidade de identidades, construídas por diferentes grupos sociais em diferentes
momentos históricos”. Para o autor, “falar em cultura brasileira é falar em relações de
poder. Colocado dessa forma, existe uma história da identidade e da cultura brasileira
que corresponde aos interesses dos diferentes grupos sociais na sua relação com o
Estado”. Outro aspecto importante são as bases autoritárias da formação do Estado
brasileiro que pouco ou nada contribuiu para a formação e preservação da cultura
popular. No caso das culturas negras, viveram longos momentos de proibição.
Principalmente as de manifestações religiosas (Candomblé e Umbanda). Essa política
de negação de si e do outro, ainda atormentam as estruturas das nossas organizações
sociais atualmente no Brasil. E o mesmo “monstro” que atormentou as elites no início
do século XX o de querer serem brancas européias num país de predominância
indígena e negra. A pirâmide da teoria do branqueamento inverteu-se, todas as
previsões pseudo científicas sucumbiram mortalmente. O que permanece e pouco
mudou é o sentido e os efeitos do racismo e da discriminação esta é a base que
precisa ser desmontada.
Para o antropólogo Darcy Ribeiro “poucos países juntaram como o Brasil, tijolos e
cimentos tão díspares em seu processo de constituição. Poucos também
experimentaram vicissitudes que mostram de forma tão clara os caminhos pelos quais
uma nação pode constituir-se não para servir a si mesma, mas atender a interesses
alheios. Efetivamente o Brasil não nasceu como etnia e se estruturou como nação em
conseqüência da soma dos desígnios de seus criadores. Surgiu ao contrário, como
uma espécie de subproduto indesejado e surpreendente de um empreendimento
colonial, cujo propósito era produzir açúcar, ouro e café e, sobretudo gerar lucros
exportáveis” (Ribeiro, pg.19, 1987)
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Desse empreendimento levado a cabo no curso do processo civilizatório desencadeado
pela Revolução Mercantil resultou ocasionalmente um povo e, mais tarde, uma
sociedade nacional. Esta emergiu da condição de feitoria colonial a de nação aspirante
ao comando de seu destino, por força de um outro processo civilizatório de âmbito
mundial – a Revolução Industrial, que embora só afetasse reflexamente a transfigurou
radicalmente. Os países que lideraram a I Revolução Industrial, em especial a
Inglaterra, destinou as nações periféricas e em desenvolvimento, a produção de gente,
mão-de-obra barata e muita miséria, enquanto isso produzia bens de consumo,
tecnologia, conhecimento e poder.
É na esteira da I Revolução Industrial que melhor se cristalizaram os conceitos de
classe operária, divisão do trabalho, como também se alcunham novas categorias
como: raça, etnia, nação, e outros, estas desenvolvidas como forma de melhor
perceber as novas relações sociais e posteriormente, impô-las as suas colônias como
critério científico e metodológico, para interpretar e compreender a realidade.
Como surge o preconceito? Para Oliver C. Cox as formas modernas de relações raciais
surgem por volta de 1493-94, por influência dos portugueses e espanhóis no novo
mundo, e afirma que é a lógica do “espírito capitalista” as causas da discriminação e
do racismo. Para Marvin Harris (ano, pg.) “o preconceito racial surge como uma
justificação ideológica do interesse das nações européias na exploração do trabalho
negro”. Arnold Rose traça a sua origem por volta de 1793, data em que, com a
invenção da máquina de separar o algodão bruto das suas sementes, se renovou o
interesse dos plantadores em manter a escravidão nos EUA. Mas as tentativas de
explicar as bases ou a origem do preconceito racial a partir de uma única fonte tem se
revelado inconsistente e pouco convincente.
O racismo e a discriminação são elementos dinâmicos nas sociedades e nas relações
sociais e interpessoais, ultrapassam as fronteiras de um ou outro marco histórico.
Todavia, os alvos, as vítimas permanecem as mesmas, ou seja, os grupos
discriminados permanecem hierarquizados na estrutura social.
Frantz Fanon coloca de forma extraordinária, os sentidos do racismo no ocidente, o de
“ser não apenas um negro, (um índio) mas um membro dos marginalizados, dos
deslocados, dos diaspóricos. Estar entre aqueles cuja própria presença é vigiada
[overlooked] - no sentido de controle social”. Fanon. F, Black Skin, White Masks in
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Bhabha, 1986.). No seu sonho humanista e socialista Fanon afirma “tudo o que eu
queria era ser um homem entre outros homens. Queria chegar lépido e jovem a um
mundo que fosse nosso e construí-lo em conjunto” (idem).
Como afirmou também o professor e geógrafo Milton Santos à Folha de São Paulo, ao
ser indagado sobre o que seria necessário fazer pelos negros no Brasil, respondeu
sabiamente “que o mais importante para um negro no Brasil é ser cidadão”.
A Construção do conceito de raça, racismo e a discriminação racial. A Construção do conceito de raça, racismo e a discriminação racial. A Construção do conceito de raça, racismo e a discriminação racial. A Construção do conceito de raça, racismo e a discriminação racial.
O conceito de raça é construído na Europa no século XVI, designa pessoas e grupos,
orienta-se por classificações e hierarquias. No caso do Brasil, relacionou-se a negros e
índios e, classificou-se estes dois grupos, como pertencentes à raças/etnias inferiores.
Quando falamos de raça negra estamos nos referindo a uma origem, a um povo, a
várias populações oriundas do continente africano, de aspectos culturais e sociais, de
valores e crenças, de olhares e singularidades. Onde sua história e identidade positiva,
buscam permanentemente desconstruir a carga negativa atribuída ao conceito de raça
(negros na diáspora) no Brasil.
As definições conceituais sobre raça, racismo e discriminação racial, são importantes,
no sentido de compreender suas dimensões político-ideológicas numa sociedade como
a brasileira, que pretende ser democrática e racialmente integrada. As três definições
do conceito de raça, que seguem no texto, procuram atualizar o debate.
Raça como ClassificaçãoRaça como ClassificaçãoRaça como ClassificaçãoRaça como Classificação
Definição de um grupo ou pessoas conectadas por uma origem comum. A palavra
entrou para a língua inglesa no começo do século XVI; desde então e até o começo do
século XIX, foi usada principalmente para se referir a características comuns
apresentadas em virtude de uma mesma ascendência.
Raça como Raça como Raça como Raça como SignificanteSignificanteSignificanteSignificante
Esta definição pretende tratar o conceito de raça no nível do discurso, coloca-se em
oposição aos outros enfoques do tema. Significante – É uma expressão, som ou
imagem cujos significados são viabilizados somente por meio da aplicação de regras
ou códigos. Assim, os significados de raça estão codificados e, portanto, podem ser
decodificados somente nos parâmetros do discurso. O enfoque vai para além da crítica
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ao conceito de raça como um termo biológico equivocado ou até como um sinônimo
para a diversidade cultural: o interesse esta no uso popular do termo.
Raça como SinônimoRaça como SinônimoRaça como SinônimoRaça como Sinônimo
Este conceito foi construído pelas áreas do conhecimento, como a biologia e a
antropologia física, que pretendiam montar um “esquema” para hierarquizar os grupos
humanos. Atualmente para a maioria dos biólogos e principalmente para os
antropólogos, as formas de classificação em: negróides, mongolóides e caucasóides,
está ultrapassada. A discussão fundamental sobre as relações raciais no mundo atual,
não reserva mais espaço para as categorizações biológicas, embora elas ainda
encontrem espaços para sobrevida. Os dados sobre as desigualdades, os critérios de
verificação do desenvolvimento humano e, sobretudo as suas causas, indicam razões
ideológicas e motivações sociais como geradores do preconceito racial, da discriminação e do racismo.
Racismo EstruturalRacismo EstruturalRacismo EstruturalRacismo Estrutural
O racismo no Brasil é estrutural. O tráfico de homens, mulheres e crianças do
continente africano para o Brasil, transformados em escravos ao longo de quase
quatro séculos, mantidos pelas elites permitiu que se construísse ao longo do período
colonial, império e inicio da republica, um sistema social, sustentado pelo Estado, de
discriminação, segregação, preconceitos e racismo. Com isso, estruturou-se como
ideologia traduzida em prática social, uma cultura racial, baseada evidentemente na
dominação e poder em todas as formas de relações sociais. Assim, estruturaram-se
nas instituições públicas e privadas, os valores da inferioridade dos negros, indígenas
e pobres, estes valores, inculcados nas estruturas de pensamento dos indivíduos e
grupos, reproduziram-se no nosso desenvolvimento social e econômico, causando as
profundas desigualdades sociais que conhecemos. Estas, transformadas em
indicadores de pobreza entre negros e brancos na atualidade. É estrutural porque o
Estado e a Sociedade no Brasil se organizaram com base na exclusão dos espaços
públicos, dos territórios e regiões, privilegiaram-se as relações patrimonialistas em
detrimento do universal e republicano. Para desmantelar o conjunto dos sistemas de
dominação e poder, é necessário forte investimento publico e privado, seja para
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persuadir o conjunto da sociedade á uma cultura da diversidade ou para desestruturar
o sistema constituído.
As relações sociais e trabalhistas no campo, baseado no patriarcado no arcaísmo
como projeto, é a base epistemológica para compreendermos as relações que se
desenvolveram ao longo dos séculos no Brasil, tanto na construção da sociedade
agrária, como no desenvolvimento em direção a construção das cidades no inicio do
século XX. São estas relações de dominação que cimentam e estruturam o racismo no
Brasil.
Racismo InstitucionalRacismo InstitucionalRacismo InstitucionalRacismo Institucional
O racismo institucional tal como foi praticado pelo professor Stokeley Carmichael,
militante negro norte americano (Carmichael and Hamilton, 1968), pode ser melhor
compreendido se o localizarmos numa conjuntura histórica bastante singular, mas que
modifica a nossa percepção acerca dos tratamentos possíveis no combate ao racismo.
O racismo institucional permeia as artérias dos sistemas públicos e privados,
apresenta-se como fim em si mesmo nas modalidades dos serviços, equipamentos
sociais, nos concursos, nas carreiras profissionais, nas representações sociais e
políticas, enfim, é um forte instrumento de bloqueio as oportunidades iguais entre
negros e brancos, entre mulheres e homens etc.
Outro conceito que ganha espaço e força, principalmente na sociologia e na teoria
política é a definição de racialização racialização racialização racialização “Termo que surgiu nas análises da década de 70
para se referir ao processo político e ideológico por meio das quais determinadas
populações são identificadas por referência direta ou indireta as suas características
fenotípicas reais ou imaginárias;... o uso e o sentido do termo emergem da análise
histórica” (Cashmore, 1996).
O racismo é uma palavra usada com vários sentidos, até o final da década de 60, era
definida como doutrina, dogma, ideologia ou conjunto de crenças. O substancial dessa
doutrina era que a raça determinava a cultura, e dela derivavam as alegações de
superioridade racial, mantendo a idéia que são as práticas e atitudes que geram a
discriminação racial, produzindo as desvantagens raciais.
Outra abordagem que concorria a essa no mesmo período, afirmava que a expansão
do capitalismo no Novo Mundo necessitou da exploração da mão-de-obra africana,
combinado a isso, criou-se justificativas e crenças a respeito da suposta inferioridade
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dos negros. Essa nova criação histórica, nos séculos subseqüentes foi modificada
juntamente com a estrutura econômica. A esse complexo histórico denominou-se
racismo.
A definição comum sobre racismo, entre a maioria dos autores, correntes de
pensamento e escolas na atualidade está sustentada no seu caráter ideológico, ou
seja, é a imputação de características negativas reais ou supostas a um determinado
grupo social.
Embora o racismo mantenha sempre seus pressupostos básicos de fundamentação e
justificativa, ele é dinâmico socialmente, resignifica-se conjunturalmente. No final dos
anos oitenta e início dos anos 90, dois novos termos apareceram para explicar uma
característica do racismo Norte Americano nos Estados Unidos e nos países Europeus:
Racismo do Meio Ambiente: Racismo do Meio Ambiente: Racismo do Meio Ambiente: Racismo do Meio Ambiente: Este termo tem suas origens num relatório de 1987, da
Comissão de Justiça Social dos Estados Unidos, que detectou em várias áreas
residenciais de maioria negra e latina, a localização de depósitos de resíduos tóxicos e
incineradores. Concluindo que a maior parte dos mais amplos e perigosos lixões era
destinada pelo estado e empresas privadas a essas duas comunidades.
As questões chave são os padrões de estabelecimento de áreas residenciais, onde a
segregação étnico-racial é flagrante. Racismo Europeu: Racismo Europeu: Racismo Europeu: Racismo Europeu: Durante o início da década de 1990, um dos principais fenômenos
da realidade política contemporânea, tanto na Europa ocidental quanto na oriental, foi
o aumento do racismo e o crescimento do debate público a respeito da imigração. Essa
tendência fez-se notar em países tão diferentes da Europa ocidental quanto na França,
na Alemanha, na Áustria, na Bélgica e Itália. Nas sociedades pós-comunistas, tais
como Hungria, Romênia, Polônia, República Theca e as componentes da antiga União
Soviética, houve um verdadeiro desabrochar de movimentos racial-nacionalistas.
A desintegração da Iugoslávia foi acompanhada de tentativas organizadas de remover
grupos étnicos e religiosos inteiros por meio da “limpeza étnica” e do terror. Há nesse
período um crescimento espantoso do racismo e dos movimentos neofacistas.
E esses movimentos tiveram repercussões no Brasil, principalmente nas capitais e
grandes cidades os skinheads (organizações neonazistas) atacaram e perseguiram
negros, nordestinos e homossexuais principalmente.
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Estas manifestações racistas não são localizadas em um ou outro ponto geográfico,
são tendências mundiais do racismo contemporâneo.
Como se construiu e se inculcou no pensamento, no discurso e na prática o racismo no
Brasil? Poderíamos partir de bases explicativas anteriores a Abolição em 1888 e a
Proclamação da República em 1889, no entanto, pretendemos privilegiar as análises
sobre as relações raciais a partir dos finais do século XIX e início do século XX e nessa
opção, ressalta as decisões políticas das elites a época e está diretamente relacionada
ao processo imigratório dos brancos europeus, e os negros e índios no Brasil.
Para Giralda Seyferth (2000, p. 112) “O eixo da discussão sobre política imigratória
passa para a questão racial de forma mais explícita, nas primeiras décadas da
república, sempre vinculada à colonização – ou seja, o imigrante preferencial é aquele
que pretende se fixar como agricultor ou trabalhador rural. O tema preponderante é o
da assimilação associado à miscigenação enquanto processo histórico de formação de
uma “raça” ou “tipo” nacional”.
O Brasil já possuía uma ciência das raças gestada desde 1860, sob influência de Paul
Broca, eminente anatomista e antropólogo francês – conforme periodização em Castro
Faria (1952). Até 1877 são trabalhos esparsos, realizados no âmbito das escolas de
medicina, versando sobre as origens das raças humanas e temas próximos. Em 1877
foi instituído o primeiro curso de Antropologia Física no Museu Nacional – lecionado
por João Batista de Lacerda. A partir daí, os estudos sobre raças tornaram-se mais
sistematizados tanto nos Museus como na Medicina Legal com os pesquisadores
interessados, principalmente na morfologia e classificação de tipos indígenas e de
mestiços. Essa ciência tinha como premissa a desigualdade das raças e construiu
hierarquias baseadas na superioridade da “raça branca”, na inferioridade das “raças
de cor” leia-se negra, e nos “prejuízos” da mestiçagem embaralhada (termo pelo qual
alguns intérpretes da formação racial brasileira se referiam à massa de “trabalhadores
nacionais”). O exemplo mais eminente foi Nina Rodrigues, médico anatomista e
catedrático da Faculdade de Medicina da Bahia que com o livro “Os africanos no
Brasil” sistematizou os estudos e as pesquisas sobre a situação do negro na diáspora
africana. Os antropólogos seguiam o rigor metodológico e estatístico preconizado por
Broca, que sistematizou a Antropometria e estava convencido da inferioridade dos não
brancos como muito outros cientistas da sua época preocupados com a elaboração de
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rigorosas hierarquias raciais. Por outro lado, até a Primeira Guerra Mundial estavam
em evidência às teses darwinistas sociais e o mito ariano (principalmente na forma
inventada por Gobineau, Chamberlain e Lapouge) e a mestiçagem aparece como
elemento negativo em todas elas.
Mas os cientistas brasileiros encontraram meios para contornar a visão negativa
seguida pelo racismo para a mistura de raças ora classificadas como inferiores, ora
como atrasadas: inventaram a tese do branqueamento e os mestiços “superiores”.
Nos termos da sua versão “científica”, através da memória apresentada por J.B de
Lacerda no Congresso Universal das Raças, Londres, 1911, como delegado do governo
brasileiro (Lacerda, 1911), o branqueamento da raça era visualizado como um
processo seletivo de miscigenação que, dentro de um certo tempo (três gerações),
produziria uma população de fenótipo branco (A concepção de seleção natural e social
inspirada no darwinismo social presumia que os mestiços mais bem dotados –
classificados como superiores- procurariam cônjuges de pele mais clara; para os
“mestiços inferiores” (índios e negros) foi vaticinado o desaparecimento progressivo no
contexto de uma civilização em progresso).
Portanto, em termos gerais, o Brasil teria uma raça, ou um tipo ou, ainda, um povo
nacional. Em suma, a característica que faltava para definir a nação. Sendo assim, os
imigrantes tinham um papel adicional a exercer: contribuir para o branqueamento e, ao
mesmo tempo, submergir na cultura brasileira através de um processo de assimilação.
O fluxo imigratório para o Brasil foi mais intenso entre 1880 e 1920, e a década de
1890 concentrou o maior volume de entrada de estrangeiros, mais de 1 milhão e
duzentos mil indivíduos (Carneiro, 1950 citada por Guimarães), a maioria proveniente
da Europa (principalmente da Itália). Na virada do século, as estatísticas serviram para
dar credibilidade á imaginada nação branca do futuro. Os assuntos da colonização e
da imigração, assim, passaram a ser discutidos por cientistas de todos os matizes
como uma questão de “raça”.
Devemos ainda considerar as relações de benefícios cedidas aos imigrantes, e os
sacrifícios impostos aos que produziram nestas terras na condição de trabalhador
escravizado por quase 400 anos. Não se trata somente de uma lembrança, é dar
sentido ao processo histórico, e compreender em grande medida, as razões das
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desigualdades, da concentração de renda, da terra e dos elevados índices de
analfabetismo concentrados na população negra.
Conclusão:Conclusão:Conclusão:Conclusão:
As identidades de um povo formam uma nação, sua soberania. Ao negá-la interrompe-
se sua força de desenvolver-se e sonhar.
A cultura política, compreendida como ação dos sujeitos coletivos e dos indivíduos,
fortalece as bases de uma nação, dos territórios, da sociedade e do estado.
Um novo projeto social, político e econômico, se constroem a cada dia, a partir das
realidades de cada cultura envolvida e envolvente com o todo, com as partes e, com o
universal. É este movimento dialético que permite que uma sociedade seja mais
tolerante com as e entre as pessoas e o meio ambiente.
As teorias, os conceitos, de sorte, não são eternas, uma nova hipótese, uma nova
investigação, um novo movimento em sentido contrário, pode desconstruir o que
parecia verdade absoluta.
Acreditamos que podemos desencorajar as teorias, os discursos e as práticas racista,
sexistas, discriminatórias e preconceituosas discutindo-as abertamente nas esferas
públicas e privadas, nas nossas casas, na escola, nos locais de trabalho. Assegurar
recursos públicos e privados para desenvolver políticas antidiscriminatórias, como está
sendo feito em alguma medida, em vários projetos e programas de governos,
organizações sociais e entidades do movimento negro é também um caminho. No
entanto, todas essas iniciativas serão absolutamente insuficientes sem a mobilização
da sociedade em especial, do movimento negro organizado e dos movimentos sociais
e populares.
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ANAIS DO 9º CONGRESSO NACIONAL ANAIS DO 9º CONGRESSO NACIONAL ANAIS DO 9º CONGRESSO NACIONAL ANAIS DO 9º CONGRESSO NACIONAL
DE TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAISDE TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAISDE TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAISDE TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS
Brasília Brasília Brasília Brasília –––– DF, 28/02, 1º, 2, 3 e 4 de março de 200DF, 28/02, 1º, 2, 3 e 4 de março de 200DF, 28/02, 1º, 2, 3 e 4 de março de 200DF, 28/02, 1º, 2, 3 e 4 de março de 2005555
CONTAG CONTAG CONTAG CONTAG –––– FETAGs FETAGs FETAGs FETAGs –––– STRsSTRsSTRsSTRs
PROJETO ALTERNATIVO DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL PROJETO ALTERNATIVO DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL PROJETO ALTERNATIVO DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL PROJETO ALTERNATIVO DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL
POTENCIALIDADES, AVANÇOS E DESAFIOS NOS ÚLTIMOS 10 ANOSPOTENCIALIDADES, AVANÇOS E DESAFIOS NOS ÚLTIMOS 10 ANOSPOTENCIALIDADES, AVANÇOS E DESAFIOS NOS ÚLTIMOS 10 ANOSPOTENCIALIDADES, AVANÇOS E DESAFIOS NOS ÚLTIMOS 10 ANOS
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
Os anos 80, marcados pelo processo de democratização do país, trouxeram para a cena
pública, diversos e diferentes sujeitos políticos: Movimento Sindical, Movimento Popular,
Movimento Feminista, Movimento Indígena, Igrejas, partidos políticos, etc., que se aglutinaram
em torno da construção de um projeto democrático, popular, justo e igualitário para o Brasil.
Neste momento, era necessário e urgente reorientar e fortalecer as instituições políticas
brasileiras para torná-las aptas à construção deste projeto de sociedade.
No campo, surge o debate sobre a emergência de novos sujeitos de base que se organizam
dentro da estrutura e organização sindical, em especial as mulheres trabalhadoras rurais que
fizeram a opção de articular a luta feminista com a luta sindical, bem como, a juventude e a 3ª
idade.
Os anos 90 ou a era dos governos Collor e FHC se traduziram em momentos de grave crise
política e econômica, mobilizando diversos setores da sociedade brasileira para se contrapor
ao projeto neoliberal.
Neste contexto, em 1991, no seu 5º CNTR, o MSTTR identifica a necessidade de construir um
Projeto Alternativo de Desenvolvimento, que orientasse a ação sindical para a superação dos
problemas oriundos dos modelos de desenvolvimento excludentes, que sempre foram
impostos para o campo brasileiro.
Para se tornar sujeito protagonista no processo de implementação desse projeto era preciso
definir políticas de fortalecimento das nossas entidades sindicais e compreender as diversas
dinâmicas de desenvolvimento rural. Essa tarefa foi fortalecida e tomou uma dimensão mais
estratégica com a filiação da CONTAG a CUT, em abril de 1995.
A partir do 6º CNTTR, foram realizados seminários regionais de diagnostico da realidade, que
subsidiaram a construção do Projeto CUT/CONTAG de Pesquisa e Formação Sindical, que
mobilizou mais de 5 mil trabalhadores e trabalhadoras rurais. Esta pesquisa se somou a
elaboração que vinha sendo realizada pelo MSTTR em torno da construção de um Projeto
Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário - PADRSS, aprovado em 1995, no
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6º CNTTR. As primeiras mobilizações do Grito da Terra Brasil foram, por sua vez, os espaços de
formulação, articulação, proposição e negociação de políticas públicas, que buscaram dar
materialidade às proposições do PADRSS.
O PADRSS foi concebido como estratégia de enfrentamento ao projeto neoliberal e de
superação do modelo agrário e agrícola vigente no país, pautados no latifúndio e no
agronegócio. As bases essenciais para construção deste Projeto de Desenvolvimento são a
realização da ampla e massiva reforma agrária e a ampliação, valorização e fortalecimento da
Agricultura Familiar. Quanto aos assalariados e assalariadas rurais, considerados os
proletariados agrícolas, a estratégia é torná-los protagonistas deste projeto de
desenvolvimento, principalmente nas áreas de maior resistência da agricultura patronal.
O PADRSS, ao propor a construção e implementação permanente e sistemática do
desenvolvimento sustentável no meio rural, definiu que a sustentabilidade deste projeto
depende das lutas das trabalhadoras e trabalhadores pela terra, política agrícola diferenciada,
defesa e ampliação dos direitos trabalhistas e previdenciários, política permanente de
valorização do salário mínimo, erradicação do trabalho infantil e escravo, educação do campo,
saúde integral pública e gratuita, respeito à autodeterminação das populações tradicionais,
preservação do meio ambiente e superação da desigualdade de gênero e de todas as formas
de discriminação, inclusive, a luta dos jovens.
O 7º e 8º CNTTR, bem como o 2º CNETTR, a 1ª PNTTR, os “GRITOS DA TERRA BRASIL”, as
“MARCHAS DAS MARGARIDAS”, as ocupações de terras e de prédios públicos e outras ações
de massa, foram incorporando novas temáticas, ampliando a concepção e fortalecendo a
prática do PADRSS em suas várias dimensões.
Passados quase 10 anos, o 9º CNTTR precisa fazer uma avaliação da prática do MSTTR no
processo de construção e implementação do PADRSS, levando em conta o novo cenário
político brasileiro e as tendências de sustentabilidade do desenvolvimento rural. O país vive
um momento histórico e, por isso, deve ser implantado o PADRSS, para combater o
desemprego e fixar homens e mulheres no campo.
CONCEPÇÃO E PRÁTICA DO PADRSS CONCEPÇÃO E PRÁTICA DO PADRSS CONCEPÇÃO E PRÁTICA DO PADRSS CONCEPÇÃO E PRÁTICA DO PADRSS
E A RELAÇÃO COM AS NOVAS TENDÊNCIAS E A RELAÇÃO COM AS NOVAS TENDÊNCIAS E A RELAÇÃO COM AS NOVAS TENDÊNCIAS E A RELAÇÃO COM AS NOVAS TENDÊNCIAS
SOBRE DESENVOLVIMENTO E SUSTENTABILIDADESOBRE DESENVOLVIMENTO E SUSTENTABILIDADESOBRE DESENVOLVIMENTO E SUSTENTABILIDADESOBRE DESENVOLVIMENTO E SUSTENTABILIDADE
O conceito de desenvolvimento e sustentabilidade utilizado pelo MSTTR é uma idéia
em construção, portanto não existe um caminho único para sua realização. Esta
proposta incorpora e se articula com o pensamento de diversos setores da sociedade
nacional e internacional, que utiliza a noção de desenvolvimento sustentável como
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portadora de um novo projeto de sociedade, capaz de garantir, no presente e no
futuro, a sobrevivência dos grupos sociais e preservação da natureza.
O PADRSS propõe romper com o preconceito anti-rural incorporado na cultura
brasileira de que o campo está associado ao passado e ao atraso. Além deste, se
propõe a romper com outro senso comum de campo, enquanto espaço de guerra por
conta dos conflitos agrários, ou ultramoderno projetado pelo agronegócio.
No PADRSS o meio rural é concebido como um espaço político, social, econômico,
produtivo, ambiental e cultural, que têm sujeitos organizados e dinâmicas de
desenvolvimento potencializadoras da sustentabilidade. Do total de 5.507 municípios
brasileiros existentes até o ano 2000, mais de 4.485 municípios fazem parte do Brasil
Rural, pois têm menos de 50 mil habitantes e cerca de 80 habitantes por Km2. Neste
sentido, o PADRSS se propõe a ser um processo permanente de produção e
reprodução de qualidade vida para o conjunto das trabalhadoras e trabalhadores
rurais, contribuindo para a melhoria de vida das populações rurais e urbanas.
A estratégia a ser adotada pelos STTRs, FETAGs e a CONTAG, deve se orientar pela
participação política e a gestão democrática na comunidade, município, território ou
região, transformando os excluídos e marginalizados em cidadãos e cidadãs; nunca
perdendo de vista a articulação entre o local, regional, territorial com o global, e o rural
com o urbano, na perspectiva de uma sociedade justa, democrática, igualitária e
solidária.
A territorialidade já é uma estratégia adotada pelo MSTTR em diversas ações, inclusive
em parceria com programas e projetos governamentais, como o PDHC – Projeto Dom
Hélder Câmara, Projeto de Capacitação em Desenvolvimento Territorial Sustentável,
com ênfase na Educação do Campo e o Projeto de Formação de Multiplicadores (as)
em Gênero, Saúde e Direitos Sexuais e Reprodutivos.
É necessária a participação efetiva do MSTTR nos processos políticos e eleitorais e nos
espaços de concepção e gestão de políticas públicas, em todos os níveis, para reverter
o processo neoliberal e viabilizar políticas públicas necessárias à implementação do
PADRSS.
Isto porque, a concepção e prática de desenvolvimento rural estão em disputa entre
diversos setores sociais e governamentais. Dessa forma é necessário que o 9º CNTTR
defina estratégias de afirmação e visibilidade do PADRSS, ao nível local, estadual,
regional e nacional.
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É fundamental, também, que os STTRs, FETAGs e CONTAG estabeleçam um diálogo
amplo e permanente com a sociedade, em torno da concepção de espaço rural e do
desenvolvimento sustentável que propomos.
Este diálogo deve se orientar na construção de relações sociais que na prática
incorporem a solidariedade e a cooperação mútua entre os trabalhadores e
trabalhadoras do campo e da cidade, em contraposição ao individualismo, que é a
marca central do neoliberalismo.
O 9º CNTTR aprofundou a discussão e deliberou pela inclusão do termo
“solidariedade” ao nome do PADRS, passando a ser denominado de Projeto Alternativo
de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário - PADRSS.
A POLÍTICA TRANSVERSAL DE GÊNERO, A POLÍTICA TRANSVERSAL DE GÊNERO, A POLÍTICA TRANSVERSAL DE GÊNERO, A POLÍTICA TRANSVERSAL DE GÊNERO,
GERAÇÃO, RAÇA E ETNIA NO PADRSSGERAÇÃO, RAÇA E ETNIA NO PADRSSGERAÇÃO, RAÇA E ETNIA NO PADRSSGERAÇÃO, RAÇA E ETNIA NO PADRSS
O desenvolvimento da pessoa, em sua integralidade, deve orientar a construção e
implementação do PADRSS. Isto significa que o MSTTR deve assumir o compromisso
de transformar as estruturas que sustentam as relações entre as pessoas, pois não
haverá sustentabilidade nos processos de desenvolvimento sem o estabelecimento de
relações sociais, justas, democráticas, igualitárias e solidárias.
Neste sentido o MSTTR deve estar em constante diálogo com todos os sujeitos
políticos que compõem a categoria trabalhadora rural, garantindo a sua participação,
reconhecendo as suas diferenças e especificidades e incorporando as suas
respectivas demandas, especialmente os mais excluídos e discriminados como
mulheres, jovens, 3ª idade, idosos. Esses princípios dão maior legitimidade ao nosso
projeto político.
Alguns avanços significativos já vêm acontecendo, a exemplo da aprovação da cota de
mulheres, participação crescente de mulheres e jovens nos cargos de direção do
MSTTR, ampliação e fortalecimento das comissões de mulheres, ações de massa
como a Marcha das Margaridas, e mais recentemente a criação das comissões de
jovens e pessoas da 3ª idade.
Onde foram desenvolvidas ações do PADRSS/PDLS houve uma maior motivação da
base demonstrando a necessidade de participação das mulheres. Garantir a
ampliação do PADRSS/PDLS para todos os municípios, pois isto permitirá o avanço das
conquistas e da organização das mulheres.
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É importante entender que a cota mínima de participação no MSTTR surge como
instrumento de democratização das relações de poder entre mulheres e homens,
contribuindo para o reconhecimento das mulheres como sujeitos políticos,
assegurando a sua participação direta em todos os espaços formativos e de decisão
da CONTAG, FETAGs e STRs. Embora importantes e necessárias, a cota sozinha e a
estruturação de uma secretaria de mulheres não tem sido suficientes para superar os
problemas relacionados às desigualdades de gênero. É urgente e necessário também
ampliar e fortalecer as comissões de mulheres em todas as instâncias do MSTTR, pois
são nesses espaços que as mulheres se articulam e buscam construir unidade em
torno de questões comuns, refletem sobre sua realidade específica e elaboram
propostas para serem articuladas e incorporadas às lutas gerais do MSTTR.
A participação organizada das mulheres tem motivado, ainda que de forma
diferenciada, a participação organizada de jovens e 3º idade.
Tem sido importante também para incorporar no nosso projeto político o enfoque da
igualdade de gênero, articulado com a dimensão de classe, geração, raça e etnia. Na
prática, isso significa que todas as políticas e ações do MSTTR devem estar voltadas
para o desenvolvimento da pessoa na sua integralidade.
O desafio está em superar alguns equívocos de concepção, investir na formação de
lideranças e dirigentes do MSTTR em torno destes temas, sensibilizando-os e
comprometendo-os para a construção de novas práticas. Para qualificar o PADRSS o
enfoque de gênero deve transversalizar/perpassar todas as políticas e ações do
MSTTR.
Gênero no PADRSS é um conceito em construção, que articula a dimensão de classe,
geração, raça e etnia, e serve para entender as relações de poder e de hierarquia
estabelecidas entre mulheres e homens na família, na comunidade, no local de
trabalho, no sindicato, e na sociedade em geral.
É importante compreender que estas desigualdades estão fundamentadas em
aspectos culturais, estruturais e institucionais, tendo pôr base o modelo de família
patriarcal e a divisão sexual do trabalho. A ideologia patriarcal se sustenta na idéia de
que o homem representa a família em todos os assuntos externos e é o administrador
da propriedade familiar. Já a divisão sexual do trabalho fundamenta a idéia do homem
ser socialmente reconhecido como agricultor e a mulher como doméstica ou
“ajudante”. Essa visão discriminatória revela uma profunda desigualdade nas relações
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entre mulheres e homens, uma vez que não valoriza e não reconhece a quantidade de
tempo que as mulheres dedicam às atividades agrícolas e não-agrícolas produtivas.
Muito menos atribuem um valor econômico ao trabalho doméstico, fundamental para
viabilizar a agricultura familiar, não fazendo a inter-relação entre o trabalho doméstico,
o cuidado com os filhos e a reprodução e manutenção da força de trabalho na
agricultura familiar. Com prejuízo para o acesso aos benefícios da Previdência Social.
Por esta razão, o foco central da nossa política transversal de gênero é contribuir para
a construção de novas relações entre mulheres e homens baseadas na igualdade de
direitos e oportunidades. A estratégia política é reconhecer e empoderar as mulheres
como sujeitos políticos, contrapondo-se à condição de opressão e subordinação
imposta pelo capitalismo e patriarcado. Empoderar as mulheres significa reconhecê-las
como sujeitos políticos, fortalecer sua organização no MSTTR, valorizar suas
habilidades e capacidades políticas, sociais, econômicas, produtivas e culturais,
assegurando sua participação direta nos espaços de decisão e poder do MSTTR e nos
espaços de formulação e gestão de políticas públicas de desenvolvimento sustentável.
Geração no PADRSS é um conceito que explicita o papel social que cada pessoa
cumpre nas diferentes fases da vida: infância, adolescência, juventude, adulto, terceira
idade e idosos. Estes papéis se alteram de acordo com a época e história de cada
sociedade. Diferente das questões de gênero que dirigem um apelo para o fim da
desigualdade, subordinação e opressão das mulheres, o enfoque geracional faz um
apelo sobre a valorização e as oportunidades de inserção social de jovens, 3ª idade e
idosos na sociedade.
Juventude Rural: Para o MSTTR jovem rural são mulheres e homens que vivem e
trabalham no meio rural, e se encontram na idade de 16 a 32 anos. Ser jovem é uma
condição relativa e transitória, pois logo entrarão nas outras fases da vida. Entretanto,
é na fase da juventude que as pessoas vão afirmando suas identidades sociais e
profissionais, e definindo sua formação física, intelectual, psicológica e emocional.
Dessa forma, é importante estarmos abertos para entender os processos de
mudanças e definições que se apresentam nesta fase da vida. Neste sentido,
ressaltamos que os critérios de faixa etária (18 a 24 anos), estabelecidos pelos
gestores públicos e instituições multilaterais e bilaterais não dialogam com a realidade
da juventude rural, precisando ser avaliados e alterados, para que seja adotado o
conceito de juventude utilizado pelo MSTTR.
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É a partir do 8º CNTTR, em 2001, que a juventude rural se organiza nacionalmente no
MSTTR, dando visibilidade às novas lutas, já que em alguns estados havia
organizações de jovens. O foco central de nossa política é elevar a auto-estima da
juventude, incentivar e fortalecer a sua organização e formação política, apresentar
propostas de políticas sindicais e políticas públicas que promovam e efetivem a
inserção social da juventude no meio rural em nível nacional reafirmando a
consciência de classe e o fortalecimento do trabalho coletivo e solidário.
A construção de políticas voltadas para atender os anseios da juventude é um
investimento que o MSTTR está fazendo para os (as) jovens trabalhadores e
trabalhadoras rurais de hoje e os (as) adultos de amanhã. Neste sentido, as questões
da juventude devem perpassar todas as políticas e ações sindicais. As propostas
políticas da juventude devem ser de responsabilidade compartilhada entre as
Coordenações e Comissões de Jovens trabalhadores e trabalhadoras do MSTTR e as
demais secretarias e setores do movimento sindical.
Sabemos da importância da mobilização de todos os setores, mas não podemos
permitir que esta setorização contribua para a divisão do Movimento Sindical dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais.
3ª idade no PADRSS é uma forma de valorizar os conhecimentos e saberes de
mulheres e homens que estão acima dos 50 anos de idade, que vivem e trabalham no
meio rural. É também uma forma de reconhecer a contribuição dessas pessoas na
construção do Movimento Sindical, na vida familiar, na vida comunitária e na
sociedade em geral.
No MSTTR é predominante a participação de mulheres e homens acima dos 50 anos
de idade nos espaços de direção do MSTTR. É visível também como associados dos
STTRs, até porque é nesta fase da vida que essas pessoas procuram assegurar seu
direito à aposentadoria. Mesmo desempenhando papel importante na vida familiar e
comunitária, infelizmente muitas dessas pessoas sofrem discriminação e preconceitos,
ficando à margem na sociedade. É neste sentido que surge o debate sobre a
organização da 3ª Idade e Idosos na estrutura sindical. A finalidade é elaborar e
implementar políticas sindicais e políticas públicas que elevem a auto-estima dessas
pessoas assegure seus direitos e garantam sua inserção social na vida familiar,
comunitária, sindical e na sociedade em geral.
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Raça e Etnia A pessoa é portadora de diferentes identidades sociais. Além de sermos
mulheres e homens, trabalhadoras e trabalhadores rurais, em diferentes fases da vida,
somos também portadores de uma identidade racial e étnica.
Raça é uma categoria que serve para definir a identidade racial de uma pessoa ou
grupos sociais. Esta categoria considera as características físicas de um determinado
grupo de pessoas que são transmitidas de geração em geração, bem como sua origem
e história de vida. Estas pessoas incorporam e difundem expressões culturais
específicas, como a religião, língua, dança, arte, literatura, etc.
Etnia é uma categoria que serve para entender a identidade de um povo. Cada povo
tem seu território, costumes, hábitos, tradições e formas próprias de organização
social, política, econômica, bem como de convivência com o meio ambiente.
As abordagens transversais de gênero, geração, raça e etnia têm contribuído para
entender alguns fenômenos sociais que vêm ocorrendo no meio rural, como a
feminização da pobreza, a masculinização do campo, o envelhecimento das pessoas
com diminuição das taxas de natalidade (nascimentos) e a tendência de saída da
juventude em busca de outras oportunidades de vida e de futuro. Tem contribuído
também, para quebrar a indiferença frente às discriminações e preconceitos de raça e
etnia.
A transversalidade de gênero, geração, raça e etnia é um dos maiores desafios
colocados para os Movimentos Sociais e Sindical, bem como para o Estado e seus
poderes. Por isso, o 9º CNTTR deve deliberar estratégias para qualificar sua ação neste
campo de atuação.
REFORMA AGRÁRIA E AGRICULTURA FAMILIAR COMO BASES PARA O REFORMA AGRÁRIA E AGRICULTURA FAMILIAR COMO BASES PARA O REFORMA AGRÁRIA E AGRICULTURA FAMILIAR COMO BASES PARA O REFORMA AGRÁRIA E AGRICULTURA FAMILIAR COMO BASES PARA O
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.
O PADRSS se contrapõe aos padrões dos sucessivos modelos de desenvolvimento
rural implementados no Brasil, em que o enfoque econômico- financeiro se sobrepõe à
dimensão social, política, cultura e ambiental das populações.
O MSTTR propõe a construção de um desenvolvimento rural sustentável, em que o
elemento fundamental é a realização de uma ampla e massiva reforma agrária, não
apenas como mecanismo distributivo de terras, mas como medida eficaz para
promover a ampliação, valorização e o fortalecimento da agricultura familiar.
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Para o MSTTR, a realização da Reforma deve interferir na base e estrutura fundiária,
promovendo a ruptura com o desenvolvimento excludente, concentrador de terra e
renda e reprodutor do poder oligárquico, representado pelo Agronegócio e pelo
latifúndio.
Neste sentido, a agricultura familiar é estratégica para a sustentabilidade do
desenvolvimento rural, quando fomenta a interiorização do desenvolvimento
possibilitando a inclusão social, produtiva e política das populações locais.
Esta agricultura familiar incorpora um valor social, econômico, cultural e ambiental,
porque garante à segurança alimentar das famílias, abastece o mercado interno, tem
viabilidade econômica para ser competitiva, amplia as oportunidades de geração de
renda e de ocupações produtivas, se estabelece através de formas cooperativas e
associativas do trabalho, deve estar associada à produção agroecológica e na
convivência equilibrada com o meio ambiente.
A agricultura familiar responde por 38% do Valor Bruto da Produção Agropecuária,
ocupa 77% da mão-de-obra no campo e é responsável por 51% da produção de
alimentos que chegam à mesa da população brasileira. Apesar de seu bom
desempenho, a agricultura familiar ocupa apenas 21% das terras agricultáveis e tem
acesso a menos de 25,3% do volume de crédito que o governo federal disponibiliza
para a agricultura brasileira.
No entanto, existe uma disputa política e ideológica entre diversos setores da
sociedade e setores governamentais, sobre qual modelo de desenvolvimento rural
deve ser implementado no Brasil.
A concepção defendida pelo MSTTR se contrapõe ao modelo de desenvolvimento rural
que o setor ruralista defende. Este setor, representado pela CNA, por numerosa
bancada no Congresso Nacional e pelo Ministro da Agricultura, apoiados pela grande
mídia e alguns intelectuais e economistas, têm defendido o agronegócio como o
modelo de desenvolvimento redentor para o campo e para o Brasil.
Como contraposição a essa concepção do agronegócio a agricultura familiar precisa
resgatar a importância da comercialização de seus produtos excedentes, na
perspectiva da economia solidária.
Para fazer a defesa de sua concepção, os ruralistas e seus aliados se apropriaram do
conceito de Agronegócio, incorporando nele um significado que extrapola a simples
tradução de “negócios da agricultura”. Mais do que os negócios da agricultura, este
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setor defende um modelo de desenvolvimento para o campo baseado na grande
propriedade, na produção de monoculturas para o mercado externo, utilização de
agrotóxicos e de organismos geneticamente modificados, além de tecnologias que
dispensam o uso de mão-de-obra. Tudo isso em nome do lucro e da produtividade, sem
considerar as implicações sociais e ambientais que este modelo acarreta para esta e
para as futuras gerações.
Da mesma forma, os defensores do agronegócio têm afirmado que o problema agrário
e agrícola será resolvido por este modelo, que será capaz de responder à demanda de
produção e de emprego, através do aumento da produtividade e das exportações.
Nesta proposta, caberia ao Estado proporcionar aos trabalhadores e trabalhadoras não
inseridos como força de trabalho do agronegócio, políticas sociais compensatórias
para evitar os conflitos no campo.
No entanto, o discurso da auto-suficiência e eficácia do agronegócio, não tem
sustentação. Pelo contrário, o incremento deste padrão de desenvolvimento concentra
a terra e a renda, aumenta a dependência tecnológica, desrespeita a legislação
trabalhista e ambiental, agrava a exclusão social, promove a degradação ambiental, o
desemprego e a violência no campo. Da mesma forma, se mostra incapaz de superar a
fome e a miséria no País, já que priorizam a produção e exportação apenas do que
seja rentável economicamente, sem se preocupar com as necessidades alimentares
da população, especialmente dos mais pobres.
Os dados do 2º PNRA demonstram que as propriedades rurais com área superior a
2.000 hectares, demandam 67 hectares para gerar uma única ocupação, chegando a
demandar 217 hectares na região Centro Oeste.
Do ponto de vista ambiental, não há como negar os danos irreparáveis que vêm sendo
produzidos pelo agronegócio. Especialmente o cerrado, onde hoje se concentra o
ambiente de expansão da fronteira agrícola, tem apenas 20% de sua área em estado
original e mais de 57% totalmente desmatada. Da mesma forma sofre a Amazônia que
já tem 600 mil Km2 de suas terras desflorestadas, situação que se agrava na região
do arco do desmatamento, que abrange os estados da Amazônia legal, como
Rondônia, Mato Grosso, Tocantins, Pará, Amazonas, e demais estados amazônicos,
onde também está havendo expansão de áreas exploradas com monoculturas.
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É preciso exigir dos grandes latifundiários o cumprimento do percentual definido em lei
de reflorestamento e preservação nas áreas devastadas de suas propriedades,
principalmente nas margens dos rios, priorizando a vegetação nativa.
Ao considerarmos as relações sociais e trabalhistas, constatamos que muitas vezes o
setor patronal da agricultura continua impondo aos trabalhadores e trabalhadoras
rurais, práticas do período colonial. Além da exploração no trabalho, mantendo
inclusive mão de obra escrava, praticam todo tipo de repressão e violência contra as
pessoas que lutam pela democratização da terra. Há um processo acentuado de
expulsão de inúmeras famílias de pequenos posseiros, inclusive populações
tradicionais e povos indígenas que estão tendo suas terras tomadas para ampliar as
grandes fazendas.
É relevante considerar, também, que este processo de expansão pelo agronegócio faz
reduzir a capacidade de se encontrar terras passíveis de desapropriação, já que a
interpretação da legislação agrária é bastante restritiva na constatação do
cumprimento da função social das propriedades. Isto faz estabelecer uma aliança
estratégica entre o latifúndio e o agronegócio.
AVANÇAVANÇAVANÇAVANÇOS, DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A REFORMA AGRÁRIA E A OS, DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A REFORMA AGRÁRIA E A OS, DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A REFORMA AGRÁRIA E A OS, DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A REFORMA AGRÁRIA E A
AGRICULTURA FAMILIAR NO PADRSSAGRICULTURA FAMILIAR NO PADRSSAGRICULTURA FAMILIAR NO PADRSSAGRICULTURA FAMILIAR NO PADRSS
O papel da Reforma Agrária para o desenvolvimento sustentável O papel da Reforma Agrária para o desenvolvimento sustentável O papel da Reforma Agrária para o desenvolvimento sustentável O papel da Reforma Agrária para o desenvolvimento sustentável
Com a construção do PADRSS, a dimensão dada pelo MSTTR ao papel exercido pela
Reforma Agrária no desenvolvimento rural evoluiu, passando a compreendê-la como
medida estratégica para a ampliação e o fortalecimento da Agricultura Familiar.
Apesar da série de entraves e limitações impostas à reforma agrária, os Projetos de
Assentamentos vem se constituindo em espaços importantes de ampliação e
fortalecimento da agricultura familiar.
Os projetos de assentamento, além de possibilitar o acesso a terra e ao crédito, para
uma população historicamente excluída, vem atuando como fator gerador de postos de
trabalho em atividades agrícolas e não agrícolas e com isto, dinamizado o comércio
local com a diversificação e o rebaixamento dos preços de produtos alimentícios.
Outras inovações também têm sido introduzidas, como novas formas de
comercialização e beneficiamento da produção, surgimento de cooperativas e
associações, implantação de pequenas agroindústrias, constituição de marcas
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próprias como sendo “produto da reforma agrária”, resultando, de modo geral, em
melhoria dos rendimentos e das condições de vida e no padrão de consumo das
famílias.
Para que a reforma agrária se constitua, de fato, enquanto instrumento para
ampliação e o fortalecimento da Agricultura Familiar, será necessário que a política de
distribuição de terras, esteja aliada a uma política agrícola forte, que destine linhas de
créditos especiais, assessoria técnica e extensão rural, pesquisa, políticas de saúde,
educação e formação profissional e investimentos em infra-estrutura social e
produtiva, dentre outras ações voltadas à organização da produção e ao bem estar das
famílias no campo.
Em novembro de 2003, o governo Lula lançou o 2º Plano Nacional de Reforma Agrária
- PNRA buscando responder às históricas demandas dos movimentos sociais. O MSTTR
reconhece que o PNRA apresenta avanços importantes, mesmo não contemplando
todas as demandas, especialmente quanto à meta de assentar um milhão de famílias
em 04 anos.
A pressão do MSTTR sobre o governo federal foi importante para que se
estabelecessem metas no PNRA, mesmo que estas tenham sido as de assentar 400
mil famílias pela desapropriação; 130 mil pelo Programa Nacional de Crédito Fundiário
e mais a regularização fundiária para 500 mil famílias de pequenos posseiros (as), até
o ano de 2006.
O PNRA propôs que as ações de reforma agrária sejam realizadas para além do acesso
a terra. A implantação, recuperação e qualificação dos assentamentos, devem se
orientar por planejamento e integração das ações, de modo a promover a viabilidade
econômica, a segurança alimentar, a sustentabilidade ambiental, o acesso a direitos,
promoção da igualdade e o desenvolvimento territorial sustentável, adequando
modelos de reforma agrárias às realidades e demandas específicas de cada região.
Entretanto, para que estas proposições sejam implementadas, será necessário superar
os limites de ordem política, financeira, legal, jurídica, administrativa e social, que
dificultam a solução definitiva para o problema agrário brasileiro.
Buscar o desenvolvimento de tecnologia adequada para a agricultura familiar, para
manter a sobrevivência no campo.
Meio Ambiente Meio Ambiente Meio Ambiente Meio Ambiente
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O debate sobre sustentabilidade, além de refletir sobre o uso racional e adequado dos
recursos naturais, deverá incorporar as discussões quanto à necessidade de se
promover a democratização da terra e da água e a distribuição das riquezas, entre as
nações e internamente em cada País.
A sustentabilidade não pode estar associada ao mero crescimento econômico,
baseado na exploração dos recursos naturais como se estes fossem infinitos, como a
que vem sendo implementada pelos grandes projetos agropecuários, hidrelétricos,
madeireiros, dentre outros.
O grande desafio para a agricultura familiar é o de se afirmar enquanto a alternativa
viável para a construção do desenvolvimento rural sustentável. Para tanto, a
agricultura familiar deverá orientar, cada vez mais, suas formas produtivas e
organizativas de modo a incorporar valores ambientais.
Neste sentido, o PADRSS define a agroecologia como estratégia a ser adotada pela
agricultura familiar, porque que este padrão produtivo, além de significar rentabilidade,
incorpora valores essenciais da sustentabilidade.
A CONTAG, FETAGs e STTRS, deverão ampliar seus esforços para promover a
capacitação e sensibilização do conjunto dos assentados (as) e agricultores (as)
familiares, estimulando para que adotem a agroecologia como forma produtiva que
melhor responde à demanda pelo equilíbrio entre a exploração econômica e a
conservação ambiental. Inclusive promovendo a recomposição e conservação das
matas ciliares e de reserva legal com a utilização de plantas frutíferas.
É urgente incorporar, também, no debate sobre sustentabilidade a discussão sobre o
uso racional e democrático dos recursos hídricos, conscientizando sobre o direito à
água enquanto um direito humano e um bem público, universal e não privatizável.
O cuidado com os mananciais, a recomposição de matas ciliares, investimento em
políticas de saneamento, dentre outras, são medidas essenciais e urgentes. Da
mesma forma, é preciso que o MSTTR aprofunde o debate (que vem sem feito por
vários setores da sociedade), quanto à proposta de construir uma legislação ampla
sobre os valores da água e sua dimensão como um direito humano. Esta é uma luta
será tão árdua quanto à luta pela reforma agrária, já que contraria interesses políticos
e econômicos poderosos. Mas é fundamental que a água não seja compreendida
apenas como um recurso dotado de valor econômico, que pode ser explorado como
qualquer outra mercadoria.
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Organização da produçãoOrganização da produçãoOrganização da produçãoOrganização da produção
Para que a agricultura familiar se torne viável é preciso investir no processo de
organização da produção, acesso ao crédito e aos mercados, assessoria técnica,
pesquisa, infra-estrutura social e produtiva, etc.
O PADRSS identificou que o MSTTR deve atuar nos setores ligados à produção,
estocagem, crédito e comercialização voltados para os trabalhadores e trabalhadoras
rurais, com a criação de instrumentos capazes de assegurar a melhoria da eficiência e
da capacidade produtiva, da renda e da poupança da categoria.
O MSTTR deve intensificar a relação com as entidades econômicas associativas
(Associações, Cooperativas e Grupos informais). O público beneficiário dessas
entidades é o mesmo que o MSTTR representa politicamente. Entretanto, estas
atividades não podem ser assumidas diretamente pelas organizações da estrutura
sindical, sendo necessário a criação de novas estruturas de organização da produção,
que articuladas ao MSTTR, dêem conta dessa tarefa sem perder a perspectiva política
da construção do PADRS. Esta iniciativa se consolidará na medida em que o MSTTR
incorporar em sua pauta de reivindicação as demandas dessas entidades econômicas
associativas, como também fortalecer a Rede de Articulação de Entidades Econômicas
Associativas, visando à promoção de negócios, troca de tecnologias e ajuda mútua.
Na 1ª Plenária Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, realizada em
Brasília no período de 24 a 27/11/03, foi encaminhada a criação do Sistema CONTAG
de Organização da Produção - SISCOP, um sistema integrado por subsistemas de
cooperativas de crédito, de produção e de consumo.
Foi aprovado pelas FETAGs uma ação conjunta de apoio às Cooperativas singulares
que deverão fundar uma Central que será denominada CREDITAG. É claro que a
implementação deste sistema comporta dificuldades consideráveis, já que a criação
das cooperativas depende de autorização e fiscalização do Banco Central. Outra
dificuldade enfrentada pelo sistema diz respeito à articulação das entidades já criadas
e as em fase de criação, com demandas diferenciadas.
Recentemente, com a colaboração e participação da CONTAG e das Federações, foi
criada a Unicafes (União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia
Solidária), uma pré-entidade que organizará a fundação, em 2005, de uma
organização nacional representativa do cooperativismo deste setor. Isto parte da
compreensão de que o SISCOP terá que, necessariamente, se articular com outras
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cooperativas rurais e, em uma segunda etapa, com as cooperativas do setor urbano
para poder fazer frente ao sistema OCB, que efetivamente só faz a representação dos
interesses dos grandes produtores.
Um dos grandes desafios do processo de organização da produção é construir
estratégias políticas que permitam a inserção não-subordinada da agricultura familiar
no mercado. Neste aspecto, o Comércio Justo e Solidário deve ser uma alternativa de
construir outras relações sociais entre produtor e consumidor.
Além disso, é preciso promover a articulação entre a produção e o consumo,
construindo mecanismos de diálogo entre as famílias que produzem com as famílias
que consomem, valorizando, assim, a agricultura familiar e os assalariados e
assalariadas rurais. Há que se estabelecer parcerias com outras instituições, órgãos
públicos (a exemplo da Emater) e provados, capazes de superar a falta de incentivos e
de políticas públicas municipais, promovendo a conscientização dos agricultores e
agricultoras familiares da necessidade de agregação de valor à matéria prima e
esclarecê-los sobre os benefícios da agricultura agroecológica.
AS RELAÇÕES DE TRABALHO NO PADRSSAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO PADRSSAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO PADRSSAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO PADRSS
AssalariAssalariAssalariAssalariados e Assalariadas Rurais ados e Assalariadas Rurais ados e Assalariadas Rurais ados e Assalariadas Rurais
Não podemos falar em desenvolvimento rural sustentável sem levar em consideração
os 5 milhões de assalariados e assalariadas rurais que constituem a parte mais
explorada e marginalizada da categoria trabalhadora rural.
Destes 5 milhões de trabalhadores e trabalhadoras assalariadas rurais, existem 2
milhões de postos de trabalho fixo, em que o contrato é por prazo indeterminado. 1,5
milhão trabalha pelo menos uma vez por ano de 4 a 8 meses, no período da safra
(contrato de safra) e 1,5 milhão trabalha em culturas de curta duração (feijão, milho,
tomate, hortifrutigranjeiros, colheita do café, etc.), neste caso grande quantidade de
trabalhadores (as) não possuem carteira de trabalho assinada e a duração no trabalho
é no máximo de 15 dias. Muitos trabalham em 3 ou 4 estados durante o ano.
Segundo dados da PNAD/IBGE - Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2002 existem cerca de 3,1 milhões de
trabalhadores (as) com vínculo empregatício sem carteira assinada na área rural.
Muitos desses profissionais moram nas periferias das pequenas e médias cidades, e
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devido ao alto índice de desemprego e baixos salários pagos, essas pessoas também
se constituem no setor mais empobrecido da categoria.
Não é preciso muito esforço para se perceber o lucro gerado pela produção agro-
industrial das grandes e médias propriedades rurais. A regra geral é de empresas ricas
em municípios pobres, onde o lucro acaba indo para o sistema financeiro e/ou
investidos nos grandes centros urbanos. Já os assalariados e assalariadas rurais
gastam os seus salários nos municípios onde moram, dinamizando o comércio e a
economia local.
Neste sentido, a melhoria na remuneração dos assalariados e assalariadas rurais tem
repercussões diretas e concretas no local. Com melhoria do poder de compra dos
assalariados e assalariadas rurais ocorrerá ampliação do mercado consumidor local
com possibilidades de crescimento de venda dos produtos da agricultura familiar.
O principal instrumento para a melhoria do salário e das condições de trabalho dos
assalariados e assalariadas é a negociação coletiva (convenção coletiva, acordo
coletivo ou dissídio coletivo). Infelizmente, existem poucos assalariados e assalariadas
rurais protegidos por convenções ou acordos coletivos de trabalho.
Outro instrumento por melhores condições de segurança e saúde no trabalho, são as
ações de fiscalização realizadas pelos auditores fiscais do trabalho, vinculada às
Delegacias Regionais do Trabalho, importantíssimos para avançar no cumprimento da
legislação trabalhista, previdenciária, de medicina e segurança no trabalho. Neste
processo, são imprescindíveis o envolvimento do Sindicato dos Trabalhadores (as)
Rurais e das FETAGs quando da denúncia de irregularidades nas relações de trabalho
e de denúncias relacionadas ao trabalho escravo. Nesse sentido, exige-se a ratificação
imediata da Convenção 184 da OIT.
As mulheres no trabalho assalariadoAs mulheres no trabalho assalariadoAs mulheres no trabalho assalariadoAs mulheres no trabalho assalariado
O aumento das oportunidades de trabalho e emprego para as mulheres assalariadas
no campo, especialmente as mais jovens, não significa dizer que há igualdade de
oportunidades entre os trabalhadores do sexo feminino e masculino. A mão–de-obra
feminina tem sido absorvida nas atividades temporárias, sem garantia de direitos e
benefícios, sem investimento na formação profissional e sem nenhum equipamento de
uso coletivo nos locais de trabalho, como creches, banheiros, refeitórios.
O tipo de inserção que as mulheres tem no mercado de trabalho assalariado reproduz
a divisão-sexual do trabalho. Ao selecionar e contratar mulheres, as empresas
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destinam a elas funções consideradas “tipicamente femininas”. Exemplo disso é o uso
massivo da mão-de-obra feminina na fruticultura (morango, uva) , hortigranjeiros , etc.
Em muitas situações, para se manter empregada, a mulher precisa apresentar
produção igual ou maior do que a do homem, ainda que isto implique no recebimento
de salários menores.
POLÍTICAS SOCIAIS NO PADRSSPOLÍTICAS SOCIAIS NO PADRSSPOLÍTICAS SOCIAIS NO PADRSSPOLÍTICAS SOCIAIS NO PADRSS
Educação do CampoEducação do CampoEducação do CampoEducação do Campo
A Pesquisa CUT/CONTAG, em 1996, já apontava para a necessidade do MSTTR investir
na promoção da educação básica, formação política e formação profissional,
articulada com as redes de pesquisa, tecnologia e extensão rural ou de assistência
técnica.
Em 2000, realizamos o IV Fórum CONTAG de Educação que mobilizou todas as
instâncias do MSTTR, universidades, organismos internacionais, ONGs, etc. O resultado
foi uma agenda de trabalho visando acumular um debate sobre as bases de uma
política específica de educação voltada para o desenvolvimento rural sustentável.
No ano de 2001, o MSTTR e outras entidades parceiras que têm experiência com
educação formal e não-formal3 sistematizaram uma proposta de política pública,
constituída por princípios e diretrizes da educação do campo que já vem sendo
implementada em alguns municípios rurais.
Essa proposta foi apresentada e debatida nas audiências públicas do Conselho
Nacional de Educação – CNE realizadas no final do ano de 2001. O conteúdo proposto
foi incorporado ao documento aprovado pelo Conselho Nacional de Educação ao
instituir as “Diretrizes Operacionais de Educação Básica para as Escolas do Campo”,
através da Resolução n.º 01, de 03 de abril de 2002.
Nas Diretrizes Operacionais da Educação Básica das Escolas do Campo a educação
não se restringe ao espaço da escola, ela acontece também nos diferentes espaços
em que os sujeitos vivem e trabalham, alimentando e fortalecendo o vínculo entre a
cultura, a educação escolar e a educação não-escolar (formação política, formação
profissional, etc.).
3 MOC – Movimento de Organização Comunitária, SERTA, Secretaria Municipal de Educação de Curaçá/BA,
IRPAA/BA, ARCAFAR, UNEFAB, GT/UnB, Instituto Agostim Castejon, Escola de Formação da CUT da
Amazônia, Escola do Campo Casa Familiar Rural de Pato Branco/PR, dentre outros.
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As escolas do campo incorporam os espaços da floresta, da pecuária, das minas, da
pesca, dos ribeirinhos, dos extrativistas e da agricultura (agricultura familiar,
assalariados, assentados e acampados).
O que vai definir a identidade das escolas do campo não é necessariamente a sua
localização geográfica, mas seu projeto político pedagógico e os sujeitos a quem ela se
destina. Entretanto, é fundamental que essas escolas, em todos os níveis e
modalidades de ensino, estejam localizadas nas comunidades, povoados,
assentamentos, etc.
O projeto político pedagógico das escolas do campo deve estar a serviço da promoção
do desenvolvimento humano e sustentável, e ter como referência a concepção e
prática pedagógica construída pelos movimentos sociais e sindical que atuam no
campo. Ou seja, os seus objetivos, conteúdos programáticos, metodologia e processos
de aprendizagem e de avaliação devem levar em conta os sujeitos desse processo
educativo e a sua realidade.
Este novo momento aponta para a necessidade do MSTTR potencializar e desenvolver
nos estados e municípios estratégias de sensibilização e formação de dirigentes e
lideranças sindicais, em especial a juventude rural, e parceiros de outros movimentos
sociais. A sensibilização e formação de gestores públicos também se fazem
necessárias, uma vez que cabe a estes a responsabilidade de implementar esta
política.
O MSTTR deve, também, intervir nos espaços de formulação e gestão dos Planos
Municipais, Estaduais e Nacional de educação, com a finalidade de incorporar a
política de educação do campo.
Saúde IntegralSaúde IntegralSaúde IntegralSaúde Integral
Com o PADRSS o MSTTR foi redimensionando o conceito de saúde passando a
concebê-lo em sua integralidade física, mental, emocional e psicológica, além das
interfaces: saúde do trabalhador, saúde da mulher, saúde da criança e do adolescente,
saúde do idoso, saúde mental, saúde sexual e reprodutiva, saúde nutricional, atenção
primária ambiental, inclusive tratando a violência sexual e doméstica, uso de drogas e
do álcool como também problema de saúde.
O MSTTR está presente nos conselhos nacional, estaduais e municipais de saúde. Na
maioria dos municípios rurais somos nós que estamos representando a população
rural e os usuários do SUS. Entretanto esta representação só faz sentido se estivermos
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mantendo uma interlocução permanente com a população local, apresentando suas
demandas no espaço de formulação e gestão das políticas públicas de saúde
articulando com o desenvolvimento local, integrando a política de saúde a um conjunto
de políticas publicas que elevem o padrão de vida da população como, saneamento,
preservação ambiental, habitação, acesso a terra, acesso à água de qualidade, lazer,
etc.
Exigir um atendimento com qualidade, integralizado e humanizado, exigindo do
governo o efetivo funcionamento do SUS e a capacitação dos servidores para
atendimento à população rural.
A existência de bolsões de fome e miséria, a crescente violência no campo, os baixos
indicadores de desenvolvimento humano, indicadores sanitários, epidemiológicos
(doenças) e de saúde ambiental, somados à mobilização e pressão política dos Gritos
da Terra Brasil e Marcha das Margaridas, levaram o Ministério da Saúde a assinar um
convênio com a CONTAG para implementar em todos estados brasileiros, no período
de 2004 a 2006, o “Projeto de Formação de Multiplicadores (as) em Gênero, Saúde e
Direitos Sexuais e Reprodutivos”. Este projeto articula diversas áreas da saúde (sexual,
reprodutiva, mental, bucal, nutricional, etc.), está voltado para as pessoas nos vários
ciclos da vida, e tem por finalidade a formação de atores/atrizes sociais. Este projeto
deverá contribuir na formulação e adequação de uma Política Pública de Saúde para a
População do Campo.
Em maio de 2004, o Ministério da Saúde constituiu um grupo denominado “Grupo da
Terra”, com representação de diversas áreas técnicas do Ministério da Saúde e
movimentos sociais e sindical. A este grupo cabe a responsabilidade de formular a
política de saúde para a População do Campo em parceria com outros ministérios.
Esta política em construção tem por base a intersetoralidade da saúde com outras
políticas voltadas para o desenvolvimento sustentável; uma nova sistemática de
financiamento para a Atenção Básica assegurando um adicional de 50% nos valores
pagos por equipe de saúde da família em 100% dos municípios da Amazônia Legal
com população inferior a 50 mil habitantes e indicadores de desenvolvimento humano
muito baixo (0,7). E também em 100% dos municípios com população inferior a 30 mil
habitantes e indicadores de desenvolvimento humano muito baixo (0,7), bem como
áreas de assentamento e de quilombos.
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A Política Pública de Saúde para a População do Campo, entretanto, só atingirá os
resultados se os estados e municípios assumirem a sua parte, uma vez que lhes
competem à responsabilidade de promover a assistência integral médica, laboratorial,
hospitalar e farmacêutica à população, em especial a rural. Entretanto esta
responsabilidade não vem sendo cumprida pela maioria de estados e municípios, uma
vez que estes não aplicam corretamente o recurso repassado pelo Ministério da Saúde
e muito menos o que é de sua responsabilidade enquanto gestor público municipal.
Diante dos desafios, se faz necessária a intervenção efetiva e qualificada do MSTTR
nos conselhos estaduais e municipais de saúde com a finalidade de fiscalizar a
implementação desta política e aplicação desses recursos. Realizando cursos de
capacitação para todos/as os/as conselheiros/as que representam os diversos
conselhos em seus respectivos municípios, através das FETAGs.
Políticas fundamentais para a saúde da população, como saneamento básico e
construção de moradia para o campo ainda são inexpressivas, necessitando, portanto,
ações efetivas relacionadas ao abastecimento de água e de esgoto sanitário, como
forma de melhoria das condições de vida e saúde da população rural, e da
preservação do meio ambiente.
Outro tema, que merecerá discussão por parte do MSTTR foi aprovado na 3ª
Conferência de Saúde Bucal, que é o Programa de Saúde Bucal e que deve ser
implementado e assumido pelos governos estaduais e municipais.
Previdência SocialPrevidência SocialPrevidência SocialPrevidência Social
No PADRSS a Previdência Social é um instrumento importante para alavancar
processos de desenvolvimento e distribuição de renda. Na área rural, houve uma
evolução significativa de proteção social devido à universalização dos benefícios da
Previdência Social ocorrida a partir do início de 1990. O Movimento Sindical de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – MSTTR destaca-se neste cenário, como um
importante protagonista em função da luta histórica e permanente em defesa da
Previdência Social.
O resultado prático das ações do MSTTR pode ser mensurado pelo contingente de
trabalhadores e trabalhadoras rurais que obtiveram acesso aos benefícios
previdenciários até o momento.
São aproximadamente, 7 milhões de benefícios rurais pagos mensalmente pela
previdência social, cujo volume de recursos tem dinamizado a economia dos
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municípios brasileiros, notadamente no comércio; tem causado impacto direto na
redução do nível de pobreza do país; tem se constituído como espécie de seguro
agrícola, servindo como fonte de financiamento da agricultura familiar e tem ajudado a
garantir a permanência de homens e mulheres no campo.
PAPEL DA FORMAÇÃO NO PADRSSPAPEL DA FORMAÇÃO NO PADRSSPAPEL DA FORMAÇÃO NO PADRSSPAPEL DA FORMAÇÃO NO PADRSS
O papel da formação é qualificar a ação sindical enquanto agente transformador da
realidade, dialogando e colaborando com o processo de formulação e implementação
do PADRSS. Para isso, é preciso que a formação a contribua para que a categoria
analise criticamente a sua realidade social, potencializando a construção de
alternativas de enfrentamento e transformação social. Esta é uma das razões para que
o MSTR compreenda a formação enquanto investimento e não como despesa.
Aspectos da FormaçãoAspectos da FormaçãoAspectos da FormaçãoAspectos da Formação
A formação é um instrumento político - pedagógico, que favorece a expressão e
afirmação da pluralidade de idéias e pensamentos, abrindo caminho para a construção
da unidade política sindical.
Princípios Pedagógicos da FormaçãoPrincípios Pedagógicos da FormaçãoPrincípios Pedagógicos da FormaçãoPrincípios Pedagógicos da Formação
São princípios pedagógicos da formação do MSTTR:
• Analisar os fatos a partir de uma visão de movimento, onde tudo está em constante
mudança;
• Compreender formação de modo sistêmico, ou seja, a formação não é só um
instrumento meio que permeia toda a ação sindical, mas também um início e um fim,
que tem por finalidade construir produtos/resultados claros;
• Interpretar e entender os interesses das partes a partir da dinâmica do todo;
• Compreender que a ação formativa é uma ação política, nela não há neutralidade;
• Compreender que a ação sindical é sempre uma ação formativa;
• Trabalhar não só com uma única verdade, mas perceber as possibilidades de
estabelecer consensos, entre as várias verdades existentes sobre um dado
conhecimento;
• Direcionar sua ação no caminho do fortalecimento da cooperação, da não-violência e da
justiça social;
• Avaliação permanente da prática sindical;
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• Repensar a ação e a organização sindical de forma que ambas estejam pautadas num
amplo processo de democratização das relações políticas no interior do MSTTR. Nesta
perspectiva, as relações sociais de gênero, geração, raça e etnia devem ser trabalhadas
enquanto base para a superação da exclusão e aumento da participação das mulheres,
das pessoas da terceira idade e dos jovens nos processos de formulação das políticas e
das instâncias de decisão.
• Recomenda-se que os STRs, FETAGs e CONTAG adotem a utilização da sigla MSTTR.
A abordA abordA abordA abordagem metodológica da formagem metodológica da formagem metodológica da formagem metodológica da formaaaaçãoçãoçãoção
Deve estar centrada no enfoque da construção coletiva, na garantia da afirmação e
negociação entre os diversos saberes, desejos, necessidades e potencialidades das
pessoas envolvidas na definição dos procedimentos e dos conteúdos trabalhados. O
objetivo é estabelecer um processo de cooperação ativa entre os participantes,
desenhando de forma progressiva, consensos táticos e estratégicos;
Deve ter como ponto de partida o resgate e a garantia do diálogo entre os interesses
de todos os envolvidos. A perspectiva política é potencializar, ampliar e radicalizar o
conceito e a prática da democracia.
Deve ser planejada com indicadores de resultados definidos para que se saiba o que
se quer alcançar, acompanhadas de avaliações periódicas. O processo deve ser
realimentado pela análise dos serviços que estão sendo prestados à categoria. A
análise coletiva da prática é o referencial de avaliação a ser utilizado. Para termos
segurança se o que estamos avaliando é verdadeiro ou falso precisamos identificar
alguns indicadores de resultados. Desta forma, devem ser garantidos recursos
financeiros, humanos e técnicos próprios, para executar as propostas planejadas, pois
do contrário, o MSTTR continuará fazendo formação de forma esporádica e amadora.
A metodologia de formação deve propiciar a inserção dos diversos segmentos que
fazem parte da classe trabalhadora (mulheres, homens, jovens, pessoas da terceira
idade, etc.) no processo político pedagógico, respeitando suas especificidades e
favorecendo a troca de aprendizagem.
Realização permanente de atividades de capacitação do PADRSS dentro do MSTTR,
que além dos dirigentes alcance os trabalhadores e trabalhadoras rurais, ressaltando
os aspectos da busca da igualdade, preservação ambiental e da solidariedade.
Capacitar e mobilizar as mulheres trabalhadoras rurais para uma participação mais
qualificada nos fóruns e conselhos, onde ocorre a construção do PADRSS.
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DO DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA AO DESENVOLVIMENTO RURAL DO DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA AO DESENVOLVIMENTO RURAL DO DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA AO DESENVOLVIMENTO RURAL DO DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA AO DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL:SUSTENTÁVEL:SUSTENTÁVEL:SUSTENTÁVEL:
algumas consideraçõesalgumas consideraçõesalgumas consideraçõesalgumas considerações
VilêVilêVilêVilênia V. Porto Aguiarnia V. Porto Aguiarnia V. Porto Aguiarnia V. Porto Aguiar
Introduzindo a discussãoIntroduzindo a discussãoIntroduzindo a discussãoIntroduzindo a discussão
Os debates sobre a necessidade de novos projetos de desenvolvimento rural tornaram-se
comuns após o notório fracasso do modelo agrícola mundial, onde os sistemas produtivos
agrícolas sofreram modificações importantes, sobretudo no período do pós-guerra, dando início
a um processo crescente de homogeneização, cuja matriz foi o modelo norte-americano.
A concepção subjacente a este modelo, e também implementada em nosso país, obedeceu
fielmente à lógica de Schultz (1965), economista neoclássico norte-americano que
fundamentou economicamente os princípios da Revolução Verde. Analisando os camponeses
da América central, esse autor concluiu que os agricultores eram pobres, mas eficientes.
Portanto, o problema não estava no uso dos fatores de produção disponíveis, mas no fato de
que esses fatores disponíveis não propiciavam o retorno necessário para superar altos índices
de pobreza em que se encontravam. Por isso, seria necessário um conjunto de “novos fatores”
(sementes melhoradas, adubos químicos, máquinas, etc.), que romperia com o ciclo ali
estabelecido e superaria a pobreza. (Cf. Mattei, 1998)
Enfim, tratou-se de um modelo que, assentado nos princípios da Revolução Verde, teve por
objetivo a obtenção de ganhos de produtividade, através da incorporação de “novos fatores de
produção” (Schultz,1965), destacando-se aí o uso de sementes melhoradas, de adubos
químicos, dos agrotóxicos e da maquinária agrícola.
O modelo anteriormente descrito, bem como suas contradições e crise, também estiveram e
estão presentes no Brasil. A partir da modernização da agricultura brasileira, prevaleceu o
ideário da revolução verde. Este pressupunha que o simples desenvolvimento agrícola (visão
da agricultura como um setor econômico distinto) levaria ao desenvolvimento rural. Decorre
daí todo aparato institucional construído no pós-guerra (centros de pesquisa, empresas de
pesquisa e de extensão rural, etc.) e as políticas públicas implementadas nesta direção. Esse
processo fortaleceu a concepção do espaço rural meramente como um meio de produção e
não como um ambiente de desenvolvimento rural. (cf. Mattei, 1998)
A opção brasileira pelo modelo de desenvolvimento modernizante que foi implantado foi feita
ainda nos anos 504, quando a indústria passou a assumir o comando da economia destinando
ao “setor agrícola” determinadas “funções” e “papéis” a ser desempenhados no processo de
4 Vale salientar que no NE, apenas a partir dos anos 60 as atividades urbanas, especialmente,, as atividades industriais, passarem a ganhar crescente espaço no ambiente econômico, passando a comandar o crescimento da produção na região.
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desenvolvimento econômico, tido como necessário para o desenvolvimento urbano/industrial.
A essas funções5 relacionaram-se:
• Liberação de mão de obra para o setor industrial;
• Fornecimento de alimentos e matérias- primas a custos baixos;
• Suprimento de capital para o financiamento de investimentos industriais;
• Suprimento de divisas estrangeiras, através da exportação de produtos agrícolas;
• Criação do mercado interno para os produtos secundários quer para a própria indústria de
insumos e máquinas para a agricultura, quer para a indústria em geral. (cf. Mior,1997)
E assim, contrariando previsões dos analistas das décadas de 50 e 60, o setor agrícola, a
partir de finais dos anos 60, absorveu quantidades crescentes de crédito agrícola, incorporou
os chamados "insumos modernos" ao seu processo produtivo, tecnificando e mecanizando a
produção, e integrou-se aos modernos circuitos de comercialização (Palmeira, 1998). O
aumento da produtividade permitiu o aumento da produção de matérias-primas e alimentos
para a exportação, mas também para o mercado interno. Mesmo a produção de alimentos
para abastecimento das cidades, apesar de dificuldades que teriam a ver com orientações da
política econômica, teria sido, no entender de alguns estudiosos, "bastante razoável"
(GRAZIANO da SILVA, 1987: 25).
Segundo Beus & Dunlap (1990) a agricultura que se desenhou e se reforçou a partir da
definição do modelo de desenvolvimento agrícola adotado, assentou-se num paradigma
marcado, segundo pelas seguintes características:
• Centralização: produção de larga escala, concentração da produção, privilegiamento de
grandes produtores;
• Dependência: utilização intensiva de capital e tecnologia, geralmente obtidos fora da
unidade produtiva; centrado em conhecimentos científicos especializados;
• Competição: centrada na propriedade como unidade de negócios, relegando a um segundo
plano, ou mesmo se opondo, às pequenas comunidades rurais.
• Poupador de mão de obra;
• Dominação da natureza: dissociação entre homem e meio ambiente físico.
• Especialização: estreitamento da base genética, na monocultura, na sucessão de cultivos
não complementares, na divisão em produção agrícola e pecuária, assim como na
padronização dos sistemas de produção;
• Exploração intensiva: centrado no aumento da produção e da produtividade física dos
produtos, numa visão de curto prazo, ignorando os custos sociais e ambientais.
5 Além das funções aqui relacionadas, cabe destacar que um outro papel atribuído à agricultura, no final dos anos 70, foi o de gerar energia em função da crise do petróleo.
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Este padrão tecnológico, denominado de agroquímico, foi mais adequado ao sistema de
organização da produção na grande propriedade agrícola (patronal), em detrimento dos
sistemas de produção familiares. Mas, de qualquer forma, boa parte dos objetivos atribuídos à
agricultura, como vimos, foram alcançados e o Brasil foi elevado a um patamar surpreendente
de desenvolvimento agrícola, sugerido pela ampliação da produção e da produtividade de boa
parte dos produtos agrícolas.
Contudo,
“O desenvolvimento rural, além de não ter sido alcançado, foi agravado, já que o padrão
tecnológico da produção agrícola adotado e as políticas públicas impactaram
negativamente as variáveis conformadoras do bem estar no meio rural como: i) perfil de
distribuição de renda setorial e intersetorial; ii) democratização do acesso a terra; iii)
qualidade de vida; iv) conservação dos recursos naturais; v) descapitalização e êxodo
rural (Mior, 1997: 898)
É importante salientar, o caso da região Nordeste do país. Uma região caracterizada por
ocupar 20% do território brasileiro, concentrando aí 46 % da população rural brasileira e
trazendo como traço marcante a pobreza. Nessa região, segundo Tânia Bacelar, convive áreas
dinâmicas de modernização intensa com áreas tradicionais. No primeiro caso temos o
complexo petroquímico de Camaçari, o pólo têxtil e de confecções de Fortaleza, o complexo
minero-metalúrgico de Carajás; além do pólo agroindustrial de Petrolina-Juazeiro (com base na
agricultura irrigada do submédio São Francisco), das áreas de moderna agricultura de grãos
(que se estendem dos cerrados baianos atingindo, mais recentemente, o sul dos estados do
Maranhão e do Piauí), do moderno pólo de fruticultura do Rio Grande do Norte (com base na
agricultura irrigada do Vale do Açu), e dos diversos pólos turísticos implantados nas principais
cidades litorâneas do Nordeste. Em relação às áreas tradicionais, temos as zonas cacaueiras,
canavieiras e o sertão semi-árido que manteve um padrão dominantemente tradicional frente
a uma modernização restrita e seletiva.
Ainda, segundo Tânia Bacelar, na Zona da Mata, o processo de concentração fundiária tem
aumentado nos anos recentes, e o monopólio da cana sobre as áreas cultiváveis se amplia. No
semi-árido, das secas, também se verifica o agravamento da já elevada concentração das
terras em mãos de pouquíssimos produtores: "na seca, pequenos proprietários inviabilizados
vendem suas terras a baixos preços e os latifúndios crescem", como bem explica Andrade
(1988). Simultaneamente, os incentivos à pecuária fortaleceram e modernizaram tal
atividade, que sempre foi à principal da unidade produtiva típica do sertão e do agreste
nordestino. A hegemonia crescente da pecuária nos moldes em que foi realizada agravou a
questão fundiária do Nordeste, além de provocar outros consideráveis efeitos, como a redução
da produção de alimentos e a intensificação da emigração rural. Mesmo onde a irrigação
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introduziu uma agricultura moderna no semi-árido, a modernização foi conservadora, inclusive
da estrutura fundiária. A base técnica modernizou-se, a questão fundiária agravou-se
(Graziano da Silva, 1989).
O fato concreto é que o processo de modernização gerou uma enorme diversidade regional e
intra-regional - contradição entre regiões com elevados índices de modernização e outras
extremamente retardatárias - e acentuou as desigualdades sociais, sobretudo entre as
distintas categorias de produtores rurais, evidenciando, assim, os chamados efeitos perversos
da modernização da agricultura: concentração de renda, êxodo rural, super-exploração dos
empregados rurais, concentração de renda, degradação ambiental, entre outros.
Este modelo começou a dar sinais de esgotamento já na década de 70 e resultou em uma
crise6 de enormes proporções na década de 80, a chamada década perdida. É, inclusive, é a
partir dessa década que a crise da agricultura passa a fazer parte do discurso dos mais
diferentes setores e agentes envolvidos nessa problemática. Fala-se insistentemente a
linguagem da crise, e nesse contexto emergiu a necessidade da construção de novos modelos
de desenvolvimento para agricultura brasileira, que viabilizassem a sua superação.
As razões dessa crise se situam, pois, nas órbitas econômica, social e ambiental, levando “a
emergência de um consenso na literatura internacional sobre a necessidade de se repensar
os processos de desenvolvimento rural, os quais não podem mais ser analisados na forma
tradicional”. (Mattei, 1998)
Assim, alguns estudiosos passaram afirmar que o desenvolvimento agrícola não levaria,
necessariamente, ao desenvolvimento rural, ao contrário o desenvolvimento rural é maior que
o desenvolvimento agrícola.
Desenvolvimento agrícola ou desenvolvimento rural? Desenvolvimento agrícola ou desenvolvimento rural? Desenvolvimento agrícola ou desenvolvimento rural? Desenvolvimento agrícola ou desenvolvimento rural?
Historicamente, a opção feita pelo governo brasileiro foi o desenvolvimento agrícola,
via modernização da agricultura, onde esta passa a ser pensada enquanto um setor da
economia, operando como se fosse ela mesma uma indústria de um ramo qualquer da
produção, devendo não apenas comprar a força de trabalho e os insumos que
necessita de certas indústrias, como também venderem os seus produtos, os quais se
convertem, em sua grande maioria, em matérias-primas para outras indústrias.
Embora se afirme que processo produtivo perderia aquelas características “artesanais”
próprias de atividades ditas “camponesas” (Cf. Graziano da Silva, 1997), é possível
6
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perceber que ela se manteve, principalmente, em regiões de alta vulnerabilidade
econômica como é o caso do Nordeste do país.
De qualquer modo, não há como negar que os papéis que a agricultura e o meio rural
desempenharam, no Brasil, ao longo do processo de modernização estavam balizados
pela predominância do setor urbano-industrial. Segundo Mior (1997):
“O setor econômico agrícola foi caudatário do setor urbano industrial no modelo de
desenvolvimento e o meio rural foi visto como espaço de produção e não como espaço
de desenvolvimento” (Mior, 1997: 896).
Esta perspectiva informava uma dicotomia rural-urbano, que considerava o urbano
como “locus” das atividades não agrícolas, ou seja, indústria e serviços; e que atribuía
ao rural às atividades propriamente agrícolas. Derivando daí expressões como
desenvolvimento urbano e desenvolvimento rural.
Mas o que diferencia desenvolvimento agrícola do desenvolvimento rural?Mas o que diferencia desenvolvimento agrícola do desenvolvimento rural?Mas o que diferencia desenvolvimento agrícola do desenvolvimento rural?Mas o que diferencia desenvolvimento agrícola do desenvolvimento rural?
Segundo Mior (1997), o desenvolvimento agrícola envolve aspectos vinculados com o
crescimento da produção e produtividade agrícola. Já o desenvolvimento rural
relaciona-se, de um lado, a melhorias no nível e na distribuição de renda setorial -
incluindo-se questões relativas à geração de trabalho e/ou emprego, concentração da
terra e fontes de renda dentro e fora da unidade produtiva-; e, de outro, aos aspectos
relacionados com a qualidade de vida no meio rural em suas múltiplas dimensões.
Nessa perspectiva, os indicadores de desenvolvimento agrícola estão relacionados aos
aspectos ligados ao setor econômico da produção, centrando-se basicamente no
aumento da produção agrícola, no aumento da produtividade das culturas e criações,
na melhoria da qualidade dos produtos e matérias primas, e, por fim, na ampliação da
competitividade da agricultura no contexto da globalização da economia e abertura
dos mercados.
Contudo, a história tem nos mostrado que o alcance de melhores resultados nos
indicadores acima não foi suficiente e nem condição necessária para se atingir o
desenvolvimento rural, pois não se alcançou a melhoria da qualidade de vida da
população rural, que envolve aspectos relacionados com o meio rural como espaço de
vida e desenvolvimento, e não apenas de produção.
No Brasil, a atenção prioritária das políticas públicas se dirigiu predominantemente
para o desenvolvimento agrícola. A forma com que as forças políticas encaminharam a
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questão agrícola (o que e quanto produzir) agravou, nos dizeres de Graziano da Silva
(1985) a questão agrária (como e quem produz), e não contribuiu com o
desenvolvimento rural.
Ou seja, o desenvolvimento agrícola não levou ao desenvolvimento rural. E os impactos
negativos do modelo modernizante, baseado nos princípios da Revolução Verde ao se
fazer sentir colocou a necessidade de se propor alternativas que tivessem no seu
campo de preocupações, não somente os aspectos econômicos, mas que
contemplassem fundamentalmente as variáveis sociais, culturais e ambientais, sem as
quais tornar-se-ia praticamente impossível a conformação de um modelo sustentável
ao longo do tempo. Essa problemática passará, então, a ser estudada, especialmente,
sob duas categorias analíticas distintas: ruralidade e sustentabilidade, por isso agora
vamos nos deter sobre a especificidade de cada uma dessas categorias.
Gostaria de ressaltar que “ruralidade” e “sustentabilidade” não são meros conceitos,
mas são campos de disputa sobre diferentes concepções de sociedade.
1)1)1)1) RURALIDADERURALIDADERURALIDADERURALIDADE
Antes de tudo é preciso compreender que o espaço rural é um fenômeno social. Ele é
produto da ação dos homens sobre o meio natural. Nele e com ele as relações estão
em constante transformação. Enquanto fenômeno social o espaço rural é construído
historicamente. Portanto, as idéias, as noções e as representações que se faz do rural
sofrem transformações no tempo e no espaço.
Assim, por exemplo, se voltarmos no tempo, antes da Revolução Industrial, na Europa,
a principal função do espaço rural era a produção de alimentos para a subsistência,
tendo a agricultura como atividade econômica dominante e os camponeses como
grupo social de referência. No Brasil, na mesma época, a produção de produtos para a
exportação era a principal função do espaço rural, tendo a grande lavoura como
atividade econômica dominante e os escravos como grupo social de referência.
Após a Revolução Industrial, com o predomínio da indústria e a concentração da
população nas cidades, o mundo rural perde a centralidade econômica, social, política
e simbólica, passando a fornecedor de mão-de-obra desqualificada e barata para a
indústria e serviços e a agricultura volta a sua produção para os centros urbanos.
Aliás, foi especialmente após a revolução industrial que a noção de rural esteve
atrelada à idéia de atraso em contraposição à cidade associada ao progresso, símbolo
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da modernidade. A relação que se estabelecia era de oposição: cidade e
desenvolvimento X campo e atraso/subdesenvolvimento. Pareciam coexistir dois
mundos: um marcado pela urbanização, divisão do trabalho, industrialização, atrelado
ao futuro e à modernidade – a cidade; e outro, marcado pela agricultura, exploração
da natureza, atrelado ao passado e ao tradicional – o campo, o rural que
inevitavelmente estaria fadado ao desaparecimento.
Mesmo as principais concepções nas ciências sociais, desde as clássicas de
Durkheim, Marx e Weber até as de teóricos mais recentes, haviam previsto um
paulatino desaparecimento das sociedades camponesas tradicionais, e dos espaços
rurais, em decorrência de uma urbanização progressiva, bem como projetaram a
transformação da agricultura em mais um ramo da indústria. Porém, presenciamos,
atualmente, mudanças políticas e econômicas nas sociedades contemporâneas que
não vão nesta direção.
A modernidade sempre construiu o sentido rural-urbano da mudança social. A
continuidade foi sempre esta, pressupondo que o movimento deveria se dar,
necessariamente, na direção do campo para a cidade. Muitas correntes de
pensamento, nas décadas anteriores, foram influenciadas por esta perspectiva. Uma
outra vertente teórica com forte influência na academia brasileira, particularmente na
Antropologia, estuda, no rural, o campesinato como uma classe subordinada,
explorada (referenciados em autores como Wolf, Redfield, Godelier, entre outros).
Vendo o rural do ponto de vista da diferenciação interna, capitalistas e assalariados
rurais, outros autores, sobretudo sociólogos, sublinham o desaparecimento do
campesinato, fundamentados nos trabalhos de Lênin e Kautski, elaborando categorias
como proletarização do campo e trabalhadores para o capital.
Em decorrência destas representações, reforça-se a perspectiva dualista na
abordagem do rural, na medida em que se verifica, nestas linhas de pensamento, uma
omissão dos pontos intermediários que não são nem capitalistas nem proletários, pois
o que não cabia nos modelos era considerado como sobrevivência de formas pré-
capitalistas, modelos em transição ou formas subordinadas formalmente ao capital.
Entretanto, as profundas transformações resultantes dos processos sociais mais
globais - urbanização, industrialização, modernização da agricultura - não se
traduziram por nenhuma “uniformização” da sociedade que provocasse o fim das
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particularidades dos espaços rurais ou dos grupos sociais que ali vivem, ainda que
sobre eles tenham causado um grande impacto e significativas transformações.
É inegável, por exemplo, o impacto que a modernização da agricultura brasileira
provocou nos espaços rurais. Ela caracterizou-se, basicamente, por: i) aplicação da
tecnologia à produção agrícola; ii) Concentração de terras; iii) ajuda estatal. Assim,
promoveu o aumento da produtividade agrícola e, no primeiro momento, o aumento
dos rendimentos dos agricultores. Em contraposição, promoveu também o aumento
das disparidades regionais e sociais e a degradação ambiental (poluição e destruição
de ecossistemas)
Com a modernização as disparidades regionais e sociais no mundo rural se
acentuaram. Passaram a coexistir áreas que desenvolveram uma agricultura
moderna, que apresentam proximidade dos centros urbanos ou que se encontram
afastadas desses mesmos centros; áreas rurais marginalizadas onde se pratica uma
agricultura tradicional; áreas rurais que tendem ao crescimento e modernização e
outras onde se processa a diminuição e envelhecimento da população, etc.
Além disso, a modernização da agricultura ao incentivar a exploração intensiva da
natureza pondo em causa a sua capacidade de renovação contribuiu para a
degradação ambiental, promovendo, muitas vezes, o abandono do meio rural a si
próprio, com o abandono da agricultura, dos terrenos de cultivo, das florestas.
A modernização, em seu sentido amplo, redefiniu as questões referentes à relação
campo/cidade, ao lugar do agricultor (a) na sociedade, à relevância social, cultural e
política do espaço rural. Mas, são os questionamentos lançados pela crise provocada
pelos impactos do modelo urbano-industrial na sociedade moderna que recolocam o
rural no cerne das discussões das ciências sociais. Apesar das divergências, incertezas
e pertinências quanto ao uso do conceito, o certo é que o “rural” vem ocupando um
espaço relevante quando se trata de pensar desenvolvimento, de refletir sobre a
sociedade. Assim, as questões da ruralidade voltam. Dito de outro modo, estamos
assistindo a um “renascimento do rural”, nos dizeres de Kayser (1990), onde
discussões em torno da agricultura familiar, espaço, meio ambiente, desemprego,
exclusão, modo de vida, entre outras ganham evidência.
Assim, o rural passa a ser visto, por algumas tendências de pensamento, de uma
forma mais valorizada, ou seja, uma representação mais positiva do papel e do espaço
ocupado pela ruralidade na sociedade contemporânea. Ou seja, no momento atual da
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sociedade, em que o modelo urbano-industrial está sendo questionado, o rural adquire
importância enquanto maneira de se pensar desenvolvimento, de refletir sobre a
sociedade.
A “questão rural” enfrentada pelas sociedades modernas, sob formas e intensidades
diferentes, se constitui na necessidade de inserir plenamente os espaços e as
populações rurais na dinâmica econômica e social moderna e de assegurar a
preservação dos recursos naturais presentes no meio rural, como um patrimônio de
toda a sociedade.
Pelo exposto podemos perceber que o rural não diz respeito apenas a uma base física,
mas a um território que possui um tecido social e inter-relações complexas que vão
além dos seus atributos naturais. Enquanto território, o rural é um espaço socialmente
organizado, com relações de bases históricas e políticas que vão além da análise
econômica, configurando-se no ambiente político institucional onde se mobilizam
atores em prol do seu projeto de desenvolvimento.
Segundo Abramovay (2003), ruralidade é um conceito de natureza territorial e não
setorial; não pode ser encarada como etapa do desenvolvimento social a ser vencida
pelo avanço do progresso e da urbanização. A agricultura, a indústria, o comércio são
setores econômicos: a ruralidade é e será cada vez mais um valor para as sociedades
contemporâneas. Um valor ao qual o mundo contemporâneo atribui crescente
importância, por seu significado na preservação da biodiversidade e no estilo de vida
cada vez mais procurado pelos habitantes dos grandes centros.
O meio rural tem sido definido por alguns estudiosos a partir de três atributos básicos:
i) A relação com a natureza: a ruralidade supõe, em última análise, o contato muito
mais imediato dos habitantes locais com o meio natural do que nos centros urbanos; ii)
A relativa dispersão da sua população em contraposição com as imensas
aglomerações metropolitanas; iii) A relação com as regiões urbanas. Mas o próprio
crescimento e a interiorização das grandes e médias cidades abrem a oportunidade de
novas atividades e da valorização de atributos do meio rural até então desprezados. É
fundamentalmente da renda urbana que depende o dinamismo rural: não só daquela
constituída por mercados consumidores anônimos, distantes e destinatários de
commodities, mas sobretudo da que se volta ao aproveitamento das virtudes mais
valorizadas no meio rural, como a produção territorializada de qualidade, a paisagem,
a biodiversidade, a cultura e um certo modo de vida. O pressuposto aí é que o meio
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rural justamente não se “urbanize”, mas que ele tenha, ao mesmo tempo, um conjunto
de organizações que planejem o aproveitamento econômico de atributos que os
mercados convencionais dificilmente serão capazes de revelar.
O rural está sendo redescoberto, deixando de ser visto como espaço único para a
produção agropecuária e sendo vinculado a atividades ligadas à preservação
ambiental – sendo o ecoturismo uma delas - e à manutenção da agricultura familiar.
São equivocadas as previsões de que o rural acabaria conforme avançasse o processo
de desenvolvimento ou de que a agricultura familiar seria suprimida com o progresso.
A agricultura familiar, por exemplo, não foi suprimida com o progresso. Isso não
aconteceu nem mesmo nos países desenvolvidos, onde a agricultura é de natureza
familiar e o trabalho assalariado excepcional. No Brasil, ela conseguiu se afirmar em
setores extremamente modernos: na produção de aves, suínos, fumo, produtos ligados
a mercados internacionais. E responde por cerca de um terço do valor da produção de
toda a agricultura. Aliás, a agricultura familiar tem sido um ator importante nesse
“renascimento do rural” no Brasil. A sua participação garante a existência de um tecido
social que vai gerar diversas atividades além da própria agricultura. E o rural, por sua
vez, cada vez menos se associa ao estritamente agrícola. E o agrícola cada vez mais
será marcado por exigências de qualidade, de distinção e de atributos ligados à
localização e aos conhecimentos de cada região. Isso já é comum na Europa: o produto
rural (agrícola e não agrícola) é valorizado por sua capacidade de exprimir uma
tradição, um modo de fabricação em que se recuperam culturas e se colocam à mostra
estilos de vida que os habitantes dos grandes centros têm buscado.
Esse “renascimento do rural” traz elementos novos para se pensar o desenvolvimento
e o próprio espaço rural. Um aspecto a ser destacado nesta discussão é que se rompe
a concepção "produtivista" tradicional, que identificou, por muito tempo, o
desenvolvimento rural em termos setoriais, uma vez que as avaliações se
concentravam apenas nos níveis da produtividade das atividades agrícolas e na
eficiência dos sistemas de produção agropecuários. Embora importantes, estes
elementos não são suficientes para avaliar o estágio do desenvolvimento rural, como
vimos, que pressupõe a incorporação de outros indicadores que transcendem os
aspectos meramente produtivos, com destaque para as condições de vida da
população; as relações de trabalho; o acesso aos meios de produção, especialmente a
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terra; a qualidade dos produtos; a conservação dos recursos naturais; os níveis de
renda dos produtores rurais, etc.
Um outro aspecto importante diz respeito às novas funções sociais e econômicas
desempenhadas pelo "espaço rural", mostrando que as funções a ele atribuídas
também têm se transformado com o tempo. Se, inicialmente, a sua função estava
relacionada à produção de alimentos para subsistência, posteriormente foi a ela
incorporada a produção de alimentos para os mercados urbanos e fornecimento de
mão-de-obra barata para a indústria. Em seguida, com a modernização da agricultura,
o espaço rural torna-se cliente da produção industrial e fornecedor de produtos
agrícolas para as indústrias agro-alimentares. Hoje, novos sistemas de produção
agrícola, têm se desenvolvido apoiados, por exemplo, na agroecologia e outras funções
tais como, serviços, local de moradia, turismo e lazer, industrialização da produção,
conservação do patrimônio e proteção do ambiente. Tudo isso paralelo à sua vocação
primordial de continuar produzindo alimentos e matérias-primas.
Assim, hoje convivemos com diferentes perspectivas de ruralidade. O seu conceito,
como vimos, tem se transformado com o tempo.
Nos anos 60/70, a modernização da agricultura dividiu o mundo rural em duas
realidades distintas: o mundo rural moderno (urbano-industrial) e o mundo rural
tradicional (rural). O conceito de ruralidade identificava-se com o mundo rural
tradicional, com uma população escassa e marginalizada, dedicada a agricultura de
subsistência.
A partir da década de 90, verificam-se transformações no mundo rural, além da
agricultura, se desenvolve a indústria e o artesanato, e os serviços, ligados, sobretudo
ao turismo, lazer, etc., a agricultura familiar é reconhecida como ator social e se impõe
como ator político, há uma valorização discursiva do patrimônio natural e cultural das
zonas rurais e dos modos de vida tradicionais. Com isso, a própria significação do que
é o “rural” tem sido objeto de aceso debate entre os estudiosos e seus significados
vêm sendo redimensionados, deixando para trás sua identificação com o meramente
agrícola (Navarro, 2001; 10). Assim, muitos falam no renascimento do rural.
Hoje, já se admite que o mundo rural é um fenômeno complexo e pluridimensional,
pois engloba comunidades e territórios distintos, embora interligados; desempenha
uma multiplicidade de atividades (agricultura,artesanato, turismo, comércio); e
apresenta uma grande heterogeneidade.
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Mas, apesar da sua heterogeneidade, o espaço rural apresenta algumas
especificidades comuns:
� Dependência em relação aos processos naturais e ligação dos agentes sociais
ao espaço que habitam;
� Importância das relações de interconhecimento;
� Persistência do grupo doméstico enquanto unidade de produção, consumo e
moradia.
Em relação à dependência aos processos naturais e a ligação dos agentes sociais ao
espaço que habitam, alguns aspectos merecem ser destacados. O primeiro deles é
que, apesar da modernização da agricultura, persiste a relação agricultura/agentes
sociais/natureza, embora essa relação seja a um só tempo de cooperação e conflito.
Um segundo aspecto, diz respeito ao fato de que em virtude das poucas oportunidades
econômicas e profissionais oferecidas pelo espaço rural, observa-se um
enfraquecimento da ligação dos agentes sociais com este espaço. Um terceiro aspecto
está relacionado ao fato da terra continuar sendo um fator de segurança e estabilidade
e a importância do trabalho agrícola como gerador de renda, mesmo em regiões onde
ele apenas complementa a renda familiar.
Quanto à importância das relações de interconhecimento, é possível perceber que nos
espaços rurais as relações interpessoais são fortes devido à reduzida dimensão e
densidade populacional do espaço rural. Existe, ainda, um controle maior da
coletividade sobre todos os seus membros, que partilham e aceitam um conjunto de
valores, normas e comportamentos, embora esses traços venham se tornando menos
intenso devido ao êxodo rural, ao impacto da mídia, à nucleação das escolas, à
presença de citadinos no meio rural, etc.
Enfim, a respeito da persistência do grupo doméstico7 enquanto unidade de produção,
consumo e residência é interessante atentarmos para alguns aspectos. Anteriormente,
o grupo doméstico vivia exclusivamente da atividade agrícola. Com as transformações
do espaço rural nas últimas décadas (aparecimento de novas atividades,
envelhecimento da população, etc.), muitos desses grupos passam a dispor de outras
fontes de rendimento para além da atividade agrícola, como indústria caseira, serviços,
comércio, turismo, aposentadoria etc. Anteriormente, o grupo doméstico assentava
7 Grupo doméstico - conjunto de pessoas que habita a mesma casa e partilha as funções de produção, consumo e reprodução.
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numa família numerosa (avós, pais, filhos, netos...), hoje, com a saída dos jovens do
campo e o envelhecimento da população, o grupo doméstico já não tem por base uma
família extensa, ainda que muitas vezes a família rural seja encarada também do
ponto de vista dos ausentes, daqueles que continuam a manter relações com o meio
rural de origem.
Entretanto, a despeito das especificidades e diferenças, o fato é que o conceito de
ruralidade passa a ser entendido como um espaço social organizado e com valores
próprios, cujo patrimônio natural e cultural deve ser preservado. Deixa de fazer sentido
a oposição mundo rural/mundo urbano, estimulando-se a interdependência e a
solidariedade entre ambos.
2) SUSTENTABILIDADE2) SUSTENTABILIDADE2) SUSTENTABILIDADE2) SUSTENTABILIDADE
A sustentabilidade de um modelo de desenvolvimento se constitui num conjunto
integrado de fatores que potencializem ao mesmo tempo a manutenção do capital
natural dos territórios, a sustentação dos ecossistemas, qualidade de vida, cidadania,
eficiência na gestão dos recursos, equilíbrio demográfico, valorização da identidade
popular, fortalecimento da organização social e equidade. É um conceito de grande
abrangência, que se refere de uma forma geral às condições de reprodução da
sociedade no longo prazo.
São várias as concepções de desenvolvimento sustentável e a forma como ela é
incorporada por diferentes grupos sociais dependendo dos seus interesses. Portanto, a
melhor forma de abordar o conceito é percorrendo a sua história.
Resgatar a origem do conceito de desenvolvimento sustentável nos remete
necessariamente ao debate social e ambiental dos anos 60 e 70, que despontou
primeiramente nos países industrializados do hemisfério norte e generalizou-se no
mundo ocidental, criticando a noção de desenvolvimento. (Scotto; Carvalho,
Guimarães, 2007).
Tal crítica se dirigia à idéia de desenvolvimento como possibilidade de progresso
(material) e crescimento ilimitado, idéia que se constituiu como fundamento da
sociedade industrial ocidental, particularmente após a Segunda Guerra Mundial. O
grande desafio do pós-guerra era: i) reconstruir as sociedades afetadas pela guerra; ii)
“estabelecer uma ordem internacional hegemônica num contexto de grandes
disparidades entre as nações centrais, urbanizadas e industrializadas e os países
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periféricos predominantemente rurais e com baixa industrialização” (Scotto; Carvalho,
Guimarães, 2007:15). De acordo com este ponto de vista, com a liderança dos EUA e
com o apoio da Europa capitalista, os países do chamado “Terceiro Mundo” foram
“disputados e integrados na esfera de influência do bloco capitalista”, que queria se
consolidar como pólo oposto e concorrente ao bloco socialista, o qual se encontrava
em disputa, caracterizando um cenário denominado de “guerra fria”.
Assim, com as noções de desenvolvimento, subdesenvolvimento e modernização o
bloco dos países capitalistas conduziu sua política internacional. O desenvolvimento
era então identificado com o crescimento econômico, tecnológico e urbano. Era
preciso internalizar a lógica da acumulação e da produção capitalista em todas as
esferas da vida social (...) O paradigma de desenvolvimento a ser alcançado era a
sociedade de consumo norte-americana. Foi assim que o desenvolvimento tornou-se
um objeto maior de política pública de governos e organismos internacionais como a
ONU e o Banco Mundial. (Scotto; Carvalho, Guimarães, 2007:16).
A ideologia do desenvolvimento ou da modernização era postulada como ideal de
progresso. Para os países chamados subdesenvolvidos ingressarem nesta condição de
bem-estar e consumo era necessário crescer economicamente, industrializar-se,
urbanizar-se e à medida que entravam na corrida para o desenvolvimento, passaram a
ser chamados também em desenvolvimento, sugerindo que poderiam chegar ao nível
de um país desenvolvido. Esta política desenvolvimentista, além da marginalização
cultural de muitos setores populares e tradicionais, gerou uma outra situação que foi a
contração de empréstimos e financiamentos que se traduziram numa pesada dívida
externa que acompanhou este momento de “ajuda” internacional para o
desenvolvimento. (Scotto; Carvalho, Guimarães, 2007:18).
Este modelo de desenvolvimento foi criticado pelos efeitos perversos que promoveu. O
desenvolvimento tecnológico associado á concentração de renda, por exemplo, gerou
na América latina o que se convencionou chamar de ”modernização dolorosa” (Scotto;
Carvalho, Guimarães, 2007:18). Modernização que a despeito das promessas não
conseguiu reduzir a pobreza, mas ao contrário, aumentou as disparidades sociais,
levando Celso Furtado a falar no mito do desenvolvimento econômico.
Já na década de 60 os movimentos de contracultura e os movimentos ecológicos
questionavam o modelo materialista, bélico, individualista, competitivo e degradador
do meio ambiente da sociedade industrial. Essa crítica é acentuada nos anos 70 com a
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grande crise do petróleo e com as constatações do fracasso do desenvolvimentismo
na solução dos problemas globais, denunciando a exploração ilimitada dos bens
ambientais e a insustentabilidade social e ambiental por ele gerada. (Scotto; Carvalho,
Guimarães, 2007:19).
Em 1962, Rachel Carson lançou o livro A Primavera Silenciosa, mostrando que o DDT
(pesticida introduzido para uso no combate às pragas) penetrava na cadeia alimentar e
acumulava-se nos tecidos gordurosos dos animais, inclusive do homem com o risco de
causar câncer e dano genético. A grande polêmica movida pelo livro é que não só ele
expunha os perigos do DDT, mas questionava de forma eloqüente a confiança cega da
humanidade no progresso tecnológico.
Em 1968, ocorre em paris a Conferência Intergovernamental de Especialistas sobre as
Bases Científicas para Uso e Conservação Racionais dos Recursos da Biosfera,
conhecida como Conferência da Biosfera, que foi organizada pela UNESCO. Esta
conferência também muito importante foi direcionada somente para os aspectos
científicos da conservação da biosfera e pesquisas em Ecologia. Ainda em 1968,
constituiu-se o Clube de Roma, composto por cientistas, industriais e políticos, que
tinham como objetivo discutir e analisar os limites do crescimento econômico levando
em conta o uso crescente dos recursos naturais.
A preocupação com o meio ambiente e os impactos do modelo de desenvolvimento
para o futuro do planeta, faz com que a ONU promova a I Conferência sobre Meio
Ambiente Humano (Estocolmo, 1972). No mesmo ano, Dennis Meadows e os
pesquisadores do “Clube de Roma” publicaram o estudo Limites do Crescimento. O
estudo concluía que, mantidos os níveis de industrialização, poluição, produção de
alimentos e exploração dos recursos naturais, o limite de desenvolvimento do planeta
seria atingido, no máximo, em 100 anos, provocando uma repentina diminuição da
população mundial e da capacidade industrial. O estudo recorria ao neo-
malthusianismo como solução para a iminente “catástrofe” provocada pelo
crescimento acelerado da população, sugerindo o controle populacional como maneira
de evitá-la. As reações vieram de intelectuais do Primeiro Mundo (para quem a tese de
Meadows representaria o fim do crescimento da sociedade industrial) e dos países
subdesenvolvidos (já que os países desenvolvidos queriam “fechar a porta” do
desenvolvimento aos países pobres, com uma justificativa ecológica).
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O relatório Meadows revelava uma tensão entre crescimento econômico, expansão
humana, avanço tecnológico e conservação da natureza, causando assim reações
tanto dos países industrializados para quem a tese de Meadows poderia representar o
fim do crescimento da sociedade industrial quanto dos países em desenvolvimento
que alertavam para a intenção dos países desenvolvidos limitarem o crescimento aos
países pobres, com uma justificativa ecológica. Os ecologistas acusavam o relatório de
ser uma tentativa de equalização dos problemas ambientais dentro da lógica do
capitalismo, já alguns intelectuais afirmavam que ele não chegava a romper com os
pressupostos do modelo de desenvolvimento que estava na raiz da crise ambiental.
(Scotto; Carvalho, Guimarães, 2007:22).
Neste embate de propostas e críticas aos limites do desenvolvimento, surge o conceito
precursor do desenvolvimento sustentável: o eco desenvolvimento, lançado em 1973
pelo canadense Maurice Strong, cujos princípios foram formulados por Ignacy Sachs.
Os caminhos do desenvolvimento seriam seis: satisfação das necessidades básicas;
solidariedade com as gerações futuras; participação da população envolvida;
preservação dos recursos naturais e do meio ambiente; elaboração de um sistema
social que garanta emprego, segurança social e respeito a outras culturas; programas
de educação. Esta teoria referia-se principalmente às regiões subdesenvolvidas,
envolvendo uma crítica à sociedade industrial. Foram os debates em torno do eco
desenvolvimento que abriram espaço ao conceito de desenvolvimento sustentável,
com sendo aquele que atende às necessidades presentes sem comprometer a
possibilidade de que as gerações futuras satisfaçam as suas próprias necessidades, e
para tal, devendo estar baseado no tripé: economicamente viável, socielamente justo e
ambientalmente correto.
Ignacy Sachs (1991) coloca ainda que todo o planejamento do desenvolvimento deva
levar em conta cinco dimensões de sustentabilidade:
� Sustentabilidade social - entendido como processo de desenvolvimento onde o
crescimento está a serviço da construção de uma civilização com maior
equidade na distribuição de renda e bens, de modo a reduzir as diferenças
entre ricos e pobres.
� Sustentabilidade econômica - possível através da alocação mais eficiente dos
recursos públicos e privados. A eficiência econômica deve ser avaliada em
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termos macros sociais, e não apenas através do critério da rentabilidade
empresarial de caráter microeconômico.
� Sustentabilidade ecológica - é dada pela capacidade de suporte dos
ecossistemas, pela redução do uso dos recursos não-renováveis, pela redução
da emissão de resíduos, pelo equilíbrio no consumo dos recursos naturais entre
países ricos e pobres, pela pesquisa de tecnologias menos poluidoras, de baixo
custo e eficientes, tanto para o meio rural como para o meio urbano, e
finalmente, ela é dada pelas normas adequadas que visem à proteção do
ambiente.
� Sustentabilidade espacial - dirigida para a obtenção de uma configuração rural-
urbana mais equilibrada e uma melhor distribuição territorial dos
assentamentos humanos e das atividades econômicas.
� Sustentabilidade cultural - inclui a procura de raízes endógenas de processos
de modernização e de sistemas agrícolas integrados, processos que busquem
mudanças dentro da continuidade cultural e que traduzam o conceito normativo
de eco desenvolvimento em um conjunto de soluções específicas para o local, o
ecossistema, a cultura e a área.
O cenário de crise econômica, social e ambiental aprofunda, nos anos 80, a critica à
idéia de desenvolvimento, considerada como noção central do modelo social
hegemônico. A constatação da falácia e da falência do modelo desenvolvimentista e a
percepção da crise ambiental geram um debate que busca construir propostas que
tanto procura caminhos de superação deste modelo, como tentam reformulá-lo dentro
dos marcos da lógica capitalista que o gerou. (Scotto; Carvalho, Guimarães, 2007:19).
No início da década de 1980, a ONU retomou o debate das questões ambientais.
Indicada pela entidade, a primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland,
chefiou a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, para estudar o
assunto. O documento final desses estudos chamou-se Nosso Futuro Comum ou
Relatório Brundtland. Apresentado em 1987, o documento, que se propunha a
apresentar “uma agenda global para a mudança” introduz pela primeira vez, no
cenário político, o conceito de desenvolvimento sustentável, buscando apontar
caminhos de reconciliação entre os ideais do desenvolvimento e a necessidade
premente de reconhecer os limites ambientais e de diminuir a pobreza no mundo.
(Scotto; Carvalho, Guimarães, 2007:29). Entretanto, o conceito foi definitivamente
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incorporado – ou popularizado - durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento, a Cúpula da Terra de 1992 – Eco-92, no Rio de janeiro e
serviu como base para a formulação da Agenda 218, aí ganhando força. Os destaques
são, entre outras questões, para a relação entre pobreza e degradação ambiental e a
necessidade de buscar novos padrões de produção e de consumo sustentáveis para
estas e para as futuras gerações (Barbieri, 1997: 26).
Entretanto, Scotto (2007) chama a atenção para as diferentes perspectivas,
abordagens, matrizes discursivas e visões que refletem as maneiras implícitas de se
pensar as questões relacionadas a (in) sustentabilidade, a partir das quais apresenta
as classificações utilizadas por alguns estudiosos. Tentamos assim agrupá-las:
1) Sustentabilidade via regulação do mercado1) Sustentabilidade via regulação do mercado1) Sustentabilidade via regulação do mercado1) Sustentabilidade via regulação do mercado
A arma fundamental para evitar o “colapso” social e ambiental é a “força competitiva”
do mercado. Ou seja, a melhor solução para combater a escassez de recursos naturais
é através de mecanismos de mercado, fundamentalmente através do preço. O
problema ambiental é redefinido como uma questão de alocação eficientes de
recursos (eco-eficiência). Trata-se de uma perspectiva que vai ao encontro da
abordagem econômico-liberal de mercado, que pressupõe a necessidade de
crescimento econômico como fator de garantia da redução da pobreza e promoção de
8 Agenda 21Agenda 21Agenda 21Agenda 21 foi um dos principais resultados da conferência ECO-92. É um documento que estabelece a
importância de cada país, através de seus respectivos governos, empresas, ONG’s, movimentos sociais e todos os
setores organizados da sociedade, debater e cooperar no encaminhamento de soluções para os problemas sócio-
ambientais e na construção política das bases de um plano de ação e de um planejamento participativo em nível
global, nacional e local, de forma gradual e negociada, tendo como meta um novo paradigma econômico e
civilizatório. Cada país desenvolve a sua Agenda 21 e no Brasil as discussões são coordenadas pela Comissão de
Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 nacional (CPDS). Suas ações prioritárias são os
programas de inclusão social ( acesso de toda a população à educação, saúde e distribuição de renda), a
sustentabilidade urbana e rural, a preservação dos recursos naturais e minerais, a ética política para o
planejamento na construção do desenvolvimento sustentável, o planejamento de sistemas de produção e consumo
suatentáveis contra a cultura do disperdício. A Agenda 21 é um plano de ação para ser adotado global, nacional e
localmente, por organizações do sistema das Nações Unidas, governos e pela sociedade civil, em todas as áreas em
que a ação humana impacta o meio ambiente.
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um desenvolvimento mais compatível com as exigências ambientais. Ela utiliza-se de
uma matriz discursiva da “eficiência” e da “escala”. É através da “eficiência”que se
combate o desperdício da base material do desenvolvimento, sendo necessário
estender a racionalidade econômica ao “espaço não-mercantil”. Aqui evidencia-se uma
visão de mercado, pois são os mecanismos de mercado e as relações entre produtores
e consumidores os meios mais eficiêntes para conduzir e regular a sustentabilidade do
desenvolvimento. Dentro dessa perspectiva é muito presenta a idéia de que a grande
ameça à sustentabilidade em termos globais provém dos países do sul (América latina
e Ásia principalmente). Aí estariam localizadas as origens dos riscos ambientais, a
pobreza e o perigo de desestabilização mundial. Assim, a arena principal para o ajuste
ambiental são esses países, sendo demandado que eles tomem medidas necessárias -
em especial, as de controle populacional – para que seja evitado um colapso
ambiental. (Scotto; Carvalho, Guimarães, 2007, Parte II.4).
2222) Sustentabilidade via regulação do Estado) Sustentabilidade via regulação do Estado) Sustentabilidade via regulação do Estado) Sustentabilidade via regulação do Estado
A qualidade ambiental é um bem público e como tal deve ser normatizada, regulada e
promovia pelo Estado, com a complementariedade das demais esferas sociais, em
plano secundário (o mercado e a sociedade civil) (Scotto; Carvalho, Guimarães, 2007:
65).
3333) Sustentabilidade via desenvolvimento comunitário ) Sustentabilidade via desenvolvimento comunitário ) Sustentabilidade via desenvolvimento comunitário ) Sustentabilidade via desenvolvimento comunitário
As organizações da sociedade civil desempenham papel predominante na transição
para uma sociedade sustentável. O pressuposto aqui é o de que não há
desenvolvimento sustentável sem democracia e participação social e que a vida
comunitária é a única que torna isso possível. Trata-se de uma abordagem política de
participação democrática, mas a partir das comunidades. Encontramos aqui a
incorporação de uma matriz discursiva da auto-suficiência, que busca assegurar a
capacidade de auto-regulação comunitária das condições de reprodução da base
material do desenvolvimento, o que pressupõe a desvinculação de economias
nacionais e sociedades tradicionais dos fluxos de mercado mundial. (Scotto; Carvalho,
Guimarães, 2007: 64).
4444) Sustentabilidade ecológica via acordos globais.) Sustentabilidade ecológica via acordos globais.) Sustentabilidade ecológica via acordos globais.) Sustentabilidade ecológica via acordos globais.
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG
III Módulo Regional Nordeste São Luis (MA), 25 de março a 01 de abril de 2008.
74
A grande vítima da “insustentabilidade” do desenvolvimento é o planeta, e é ele que
deve ser urgentemente salvo antes que pereça. O Planeta Terra é tomado como objeto
de intervenção científica e política. A solução para problemas globais ( buraco na
camada de ozônio, efeito estufa, chuva ácida etc) devem ser igualmente globais, sendo
necessário um planejamento racional das condições planetárias, exigindo, pois a
gestão global de soluções e de recursos financeiros. Aí se insere os acordos globais
como por exemplo, a Convenção sobre Mudança do Clima.9 A arena para o ajuste
ambiental é o globo inteiro.Trata-se de uma perspectiva que vai ao encontro da
abordagem eológico-tecnocrata de planejamento, para a qual a ação deverá estar
norteada pelo primado da sustentabilidade ecológica e da conservação da natureza, o
que exige a presença de instituições com amplas forças de controle, de imposição e
intervenção. Percebe-se aí a utilização de uma matriz discursiva da ética, ao inscrever
a apropriação social do mundo material em um debate sobre os valores de bem e de
mal, evidenciando as interações da base material do desenvolvimento com as
condições de continuidade da vida no planeta. (Scotto; Carvalho, Guimarães, 2007,
Parte II.4: 63,64).
5555) Sustentabilidade econômica baseada em princípios de justiça e equidade global) Sustentabilidade econômica baseada em princípios de justiça e equidade global) Sustentabilidade econômica baseada em princípios de justiça e equidade global) Sustentabilidade econômica baseada em princípios de justiça e equidade global
A principal preocupação é com as maneiras de se garantir os meios de subsistência
fundamentalmente dos grupos sociais muito atingidos pela crise ecológica e a
degradação ambiental, tais como camponeses, indígenas e outras populações que
dependem da terra e do acesso aos recursos naturais. O objetivo aqui é produzir
alternativas para o desenvolvimento econômico, incorporando à discussão os
9 A Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança dConvenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança dConvenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança dConvenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Climao Climao Climao Clima de 1992 é uma de uma série de acordos
recentes por meio dos quais países de todo o mundo estão se unindo para enfrentar esse desafio. A Convenção
sobre Mudança do Clima enfoca o seguinte problema: nós estamos mudando a forma com que a energia solar
interage com a atmosfera e escapa dela e corremos o risco de alterar o clima global. Entre as conseqüências
possíveis, estão um aumento na temperatura média da superfície da Terra e mudanças nos padrões climáticos
mundiais Em 1997, é assinado em Kyoto, Japão, o Protocolo de Kyoto, um novo componente da Convenção, que
contém, pela primeira vez, um acordo vinculante que compromete os países do Norte a reduzir suas emissões (no
acordo esses países deveria reduzir as suas emissões em 5,2% - em relação aos níveis de 1990 – para o período
de 2008-2012).