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CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS Manual Prático de Actuação Volume 2

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CRIME DE BRANQUEAMENTODE CAPITAIS

Manual Prático de Actuação

Volume 2

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República Federativa do Brasil

Ministério das Relações ExterioresAgência Brasileira de Cooperação

Ministro de Estado das Relações ExterioresEmbaixador Antonio de Aguiar Patriota

Secretário-Geral das Relações ExterioresEmbaixador Ruy Nunes Pinto Nogueira

Subsecretaria-Geral de Cooperação, Cultura e Promoção Comercial

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Ministério Público da União

Procurador-Geral da RepúblicaRoberto Monteiro Gurgel Santos

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Coordenador PedagógicoAndré de Carvalho Ramos/MPF

Coordenador de EnsinoDouglas Fischer/MPF

Supervisão TécnicaAndrey Borges de Mendonça/MPFDouglas Fischer/MPFUbiratan Cazetta/MPF

República de Moçambique

Ministério da Justiça

Ministra da JustiçaBenvinda Levi

Procurador-Geral da RepúblicaAugusto Paulino

Diretor do Centro de Formação Jurídica e JudiciáriaAchirafo Abubacar Abdula

Coordenador PedagógicoCarlos Manuel Serra

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CRIME DE BRANQUEAMENTODE CAPITAIS

Supervisor Andrey Borges de Mendonça

AutoresAlda Manjate

Amâncio ZimbaAmérico Mazenga

Dimas MarôaLeonardo Mualia

Brasília-DF2012

Manual Prático de Actuação

Volume 2

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Escola Superior do Ministério Público da União

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Revisão

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Projeto gráfico, capa e diagramação

Rossele Silveira Curado

Impressão

Gráfica e Editora Ideal Ltda. – SIG Quadra 8, 2268

70610-480 – Brasília-DF – Tel.: (61) 3344-2112

E-mail: [email protected]

Tiragem: 1.500 exemplares

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Biblioteca da Escola Superior do Ministério Público da União

C929 Crime de branqueamento de capitais/ supervisor: Andrey Borges de Mendonça ; Alda Manjate … [ et al.]. – Brasília : ESMPU ; Maputo : CFJJ, 2012

98 p. – (Manual práctico de actuação ; v. 3)

978-85-88652-49-1 Publicado também em versão eletrônica, ISBN 978-85-88652-53-8

1. Lavagem de dinheiro. 2. Lavagem de dinheiro – normas internacionais. 3. Lavagem de dinheiro – aspectos penais. 4. Lavagem de dinheiro – Moçambique. 5. Crime organizado – Moçambique. I. Mendonça, Andrey Borges de. CDD 341.15

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Sumário

Prefácio – 9

Introdução – 11

1 Influência da normativa internacional na persecução penal do branqueamento de capitais – 15

1.1 Considerações iniciais – 15

1.2 Revisão da literatura – 17

1.3 Organismos internacionais responsáveis pela definição de padrões normativos – 18

1.3.1 Organização das Nações Unidas – 18

1.3.2 O Grupo de Acção Financeira sobre o Branqueamento de Capitais – 20

1.3.3 O Comité da Basileia de Supervisão Bancária – 21

1.3.4 Grupo Egmont de Unidades de Informação Financeira (UIF) – 22

1.4 Soft Law e Hard Law – 26

1.4.1 O significado de Soft Law – 26

1.4.2 O aparecimento do Soft Law – 26

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1.4.3 O papel do Soft Law – 27

1.4.4 O Hard Law – 27

1.4.5 Influência de Soft Law e Hard Law nas normas internas da República de Moçambique – 28

1.5 Considerações finais – 30

2 Aspectos introdutórios ao crime de branqueamento – 33

2.1 Introdução ao crime de branqueamento − conceito – 33

2.2 Fases do branqueamento e sua importância – 34

2.3 Importância de se reprimir o crime de branqueamento – 38

3 Parte penal – 41

3.1 O bem jurídico tutelado – 41

3.2 Crime antecedente – 43

3.2.1 Análise dos crimes antecedentes – 43

3.2.2 Relação entre crime antecedente e crime de branqueamento – 59

3.3 Investigação e processo – 61

3.4 Como investigar um caso suspeito de branqueamento de capitais – 75

3.5 Autonomia entre o crime antecedente e o branqueamento – 77

3.6 Prova indiciária – 79

3.7 Dificuldade de apreender valores de origem ilícita misturados com os lícitos – 84

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4 Parte administrativa – 87

5 Dificuldades e metas – 95

Referências – 97

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Prefácio

Este trabalho foi realizado no contexto de um protocolo de cooperação rubricado entre os governos de Brasil e Moçambique, e, em particular, entre a Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU) e o Centro de Formação Jurídica e Judiciária (CFJJ). O projecto em causa recebeu a designação de “Capacitação Jurídica de Formadores e Magistrados Brasil-Moçambique” e contou com o apoio da Agência Brasileira para o Desenvolvimento (ABC).

Esse projecto, com a duração de três anos, contempla uma formação em cada ano, com temas diferentes, tendo sido a presente (a primeira) relativa à área penal. Pretende ele contribuir para os esforços do governo de Moçambique em aprimorar o acesso à Justiça, dotando suas instituições de recursos humanos qualificados e motivados para o desempenho de suas atribuições.

Os Manuais ora prefaciados foram o culminar de um processo formativo que teve uma componente teórica, de duas semanas, que decorreu na cidade de Maputo, bem como uma componente prática, de igual período, preenchida por uma visita de trabalho à cidade de Brasília – República Federativa do Brasil.

Esta segunda componente permitiu o contacto directo dos formandos com as instituições e realidades brasileiras, possibilitando uma salutar troca de experiências entre Moçambique e Brasil, e uma

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recolha de elementos adicionais para a etapa seguinte – a produção de manuais.

Finalmente, foram constituídos grupos de redacção de cada um dos quatro manuais previstos no projecto, cuja elaboração contou com uma directa e permanente orientação e acompanhamento dos formadores da ESMPU, culminando no resultado que hoje temos a honra de prefaciar.

Os manuais versam sobre: Branqueamento de Capitais; Corrupção e Crimes Tributários; Tráfico de Seres Humanos, Armas e Estupefacientes; e Crime Organizado – matérias cujo domínio e conhecimento são essenciais para a actividade do magistrado, judicial e do Ministério Público.

Pretende-se que estas obras possam ser utilizadas como ferramenta de trabalho de todos os magistrados, incluindo os que não puderam beneficiar-se directamente da acção de formação levada a cabo pela ESMPU em parceria com o CFJJ.

Este exercício constitui um exemplo para todos os magistrados moçambicanos, que são assim convidados a investigar e a publicar obras de natureza jurídica, contribuindo para o estudo, implementação e, por que não, para a reforma do direito moçambicano.

  Finalmente, este trabalho é igualmente sinal de que dois países do Sul – Brasil e Moçambique –, que partilham a mesma língua, podem estreitar esforços e prosseguir interesses comuns em prol do direito e da justiça, quiçá do desenvolvimento.

O Director do CFJJ

Achirafo Abubacar Abdula(Juiz Desembargador)

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Introdução

Com a globalização, em muitos países do planeta, o direito penal foi apanhado de surpresa, em face do surgimento de novos tipos legais de crimes que são corolários daquela (globalização), o que implica que devem ser tomadas medidas legislativas que visem ao enérgico combate à criminalidade moderna.

Na verdade, perante a transnacionalização do crime, os países estão obrigados a tomar medidas à altura para o seu combate. Se os criminosos constroem uma escada de 5 metros, a Justiça deve erguer um muro de 15 metros, para que a criminalidade organizada não capture o Estado.

Segundo Rômulo de Andrade Moreira, citando o Ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça, em entrevista1 à Revista Época (Edição 335-Outubro/2004),

se lava de dinheiro entre R$ 5 bilhões a R$ 6 bilhões. O que se tem de mais concreto é que o dinheiro lavado por ano no mundo atinge um quarto da economia do planeta. O fato de o Brasil ter diversos sistemas cambiais legais facilita o trabalho dos “doleiros”, pois para cada tipo de investimento há uma brecha. É um supermercado de produtos financeiros, o que dificulta a fiscalização. Outro problema é a economia informal que dá margem a formas precárias de lavagem.

1 Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT825678-1666-1,00.html>.

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Ainda segundo o mesmo autor, citando aquele ministro quando foi este questionado sobre qual era a origem do dinheiro lavado no Brasil, respondeu: “Em grande parte da corrupção. A maioria desse dinheiro vem de crimes contra a Administração Pública. Outros crimes que levam à lavagem de dinheiro […] são os de sonegação fiscal”. Para ele, “as ONGs, por exemplo, são muito utilizadas, porque não são obrigadas a ter o registo no Banco Central. Há também as chamadas igrejas de fachada, de onde se tem notícias de grandes remessas para o exterior”.

Para o agente do delito de lavagem de dinheiro, esta actividade é importante, pois permite obtenção de lucros que são usados para a sofisticação de novos métodos de lavagem, dificultando cada vez mais a sua descoberta, bem assim para o refinanciamento de novos delitos.

Estudos recentes do Banco Interamericano de Desenvolvimento revelam que as lavandarias de dinheiro não visam em primeiro lugar ao lucro, mas sim à protecção dos rendimentos resultantes da acti-vidade ilícita e ao disfarce de sua ilícita origem.

Portanto, a imperiosidade para que se combata a lavagem de dinheiro reside em que, não sendo sua primordial preocupação o lucro, o investimento é normalmente direccionado para actividades ineficientes, prejudicando a economia no seu todo. Por exemplo, quem se dedica à lavagem de dinheiro coloca seus produtos a preços bastante baixos em comparação aos normalmente praticados na praça, sem ter em conta os custos de fabricação, matando a concorrência no sector privado.

Ora, o crescimento de actividades ilícitas organizadas na economia privada traz efeitos macroeconómicos negativos a longo prazo. Em suma, uma das consequências da lavagem do dinheiro será a instabilidade económica do país.

A lavagem de dinheiro é um desses novos delitos que deve merecer combate cerrado pelo nosso aparelho judiciário. É um delito

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que vem assumindo contornos muito marcantes na nossa sociedade e provocando danos de difícil quantificação.

É precisamente na esteira desse desiderato que nos propusemos a produzir o presente Manual Prático de Actuação, como singelo contributo para o combate ao branqueamento de capitais.

A própria terminologia “Manual Prático de Actuação” per se já sugere que se trata de uma ferramenta de trabalho de base para que, com facilidade, os actores da Justiça, fundamentalmente a Polícia de Investigação Criminal, o MP, os tribunais, e não só, possam atacar aquele mal para no final declararmos que, no nosso país, o branqueamento de capitais jamais encontrará sossego.

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Influência da normativa internacional na persecução penal do branqueamento de capitais

1.1 Considerações iniciais

O presente segmento desta obra tem como escopo a influência das normas internacionais (Soft Law e Hard Law) nas normas internas da República de Moçambique, que pedra a pedra constrói a democracia e um Estado de Direito.

É na esteira da construção da democracia e do Estado de Direito que a República de Moçambique, na política externa e, sobretudo, no âmbito do direito internacional, aceita, observa e aplica os princípios da Carta da Organização das Nações Unidas e da Carta da União Africana, na qualidade de membro.

Logo, aquela aderência terá mais vida, mais impacto eficaz e eficiente se as normas internas se inspirarem no Soft Law e Hard Law. O primeiro instrumento encarrega-se de dar um horizonte nutrido de recomendações aos Estados para a tipificação de certos comportamentos humanos; o segundo, por sua vez, se encarrega de dar obrigações entre Estados para o cumprimento de uma determinada norma, ambos no âmbito da prevenção e do combate ao

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crime organizado, sobretudo, o crime de branqueamento de capitais, que actua sem o respeito das fronteiras de cada Estado do globo, ou seja, ocorre dentro e fora de um determinado Estado, portanto, transnacional.

Temos a salientar que as normas internas moçambicanas devem cada vez mais melhorar e ininterruptamente juntar-se à comunidade internacional com actos concretos, mecanismos legais e normas actuais que acompanhem a velocidade do crime organizado e seus agentes para a repressão, uma vez que são delitos e delinquentes que mexem, preocupam e intranquilizam a paz social como, por exemplo, o tráfico transnacional de drogas, tráfico de seres humanos, tráfico de órgãos humanos, a conspiração para a prática de crimes graves e outros crimes antecedentes à lavagem de activos.

Para isso se concretizar, é necessário que as recomendações dadas pelo Soft Law sejam respeitadas e praticadas, bem como que as obrigações impostas pelo Hard Law sejam cumpridas.

Na fundamentação teórica do nosso trabalho, falaremos resumidamente, segundo a visão do mestre Valadão (2003), dos seguintes itens:

� o significado de Soft Law;

� o aparecimento de Soft Law;

� o papel de Soft Law;

� o papel de Hard Law; e

� a influência do Soft Law e Hard Law nas normas internas.

Segundo o escopo do nosso tema, no último ponto, importa referir que se fará uma contextualização prática da influência do Soft Law e Hard Law no direito interno moçambicano sob a perspectiva da padronização da legislação internacional para a prevenção e repressão dos delitos transnacionais.

Convém ressaltar que o tema tem estreita ligação com o crime organizado. Diz-se

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crime organizado qualquer, cometido por pessoas ocupadas em estabelecer em divisão de trabalho; uma posição designada por delegação para praticar crimes que como divisão de tarefa também inclui, em última análise, uma posição para corruptar, uma para corrompido e uma para um mandante (MENDRONI, 2009).

Pela sua natureza, o crime organizado ocorre com maior frequência nos países em vias de desenvolvimento. Aliás, no dizer de Vladimir Aras (2011), Moçambique figura entre os vinte países menos desenvolvidos do planeta, com baixos índices de desenvolvimento humano (IDH), onde são desenvolvidas, com frequência, actividades bastante lucrativas para organizações criminosas locais ou vindas de outros países, como da África do Sul.

1.2 Revisão da literatura

A literatura que trata do Soft Law e Hard Law é vasta, porém, interessa-nos falar sobre a influência das normativas internacionais, no que se refere ao crime organizado, na vertente do branqueamento de capitais/lavagem de activos, de Andrey Borges de Mendonça (2011).

Segundo o autor, o Hard Law e o Soft Law surgem numa grande necessidade de a comunidade internacional enfrentar os delitos de branqueamento de capitais devido aos efeitos nocivos deste crime adicionado à crescente transnacionalidade do delito, que pode ser verificada pelas inúmeras transferências internacionais de capitais, especialmente electrónicas.

Após os ataques terroristas aos Estados Unidos da América, em 2001, registou-se uma preocupação profunda e verificou-se que havia necessidade de ser combatido o terrorismo e o seu financiamento que ocorre com a lavagem de dinheiro.

Nesse contexto, foram criados diversos organismos internacionais que têm o papel de buscar um diálogo entre os países e organismos multilaterais, bem como padronizar a legislação internacional atinente à prevenção e repreensão dos delitos.

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Na padronização da legislação internacional, destacam- -se os tratados e as convenções internacionais − Hard Law −, que criam obrigações entre Estados, e outros que se ocupam em fazer recomendações ou outras formas de pressão que não atingem compromissos jurídicos internacionais, mas trata-se de compromissos políticos − Soft Law.

Assim, pode-se dizer que aqueles organismos internacionais são responsáveis por definir padrões normativos, conforme veremos a seguir.

1.3 Organismos internacionais responsáveis pela definição de padrões normativos

1.3.1 Organização das Nações Unidas

Esta organização internacional é a primeira que tratou a lavagem de capitais e tem importância pelo facto de abranger um grande número de países. A outra importância é de que o Conselho de Segurança possui poder de impor normas obrigatórias aos Estados por meio de resoluções. Nesse contexto, foram criados diversos instrumentos normativos ligados à matéria de lavagem de dinheiro, a saber:

� A Convenção de Viena (Convenção das Nações Unidas contra o tráfico ilícito de entorpecentes e substâncias psicotrópicas, assinada, em Viena, em 1988, com vigência em 11 de Novembro de 1990) pela primeira vez tratou a protecção da lavagem de activos, limitada aos crimes de tráfico como antecedente. Vale referir que é um texto com valor muito especial pelo facto de muitas normas jurídicas de diferentes Estados serem “seguidoras”, ou seja, fazem a repetição.

� A Convenção de Palermo (vigência em 29 de Setembro de 2003), assinada na Assembleia Geral do Milénio, realizada em Nova York em 2000, chamada de Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional.

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De entre outras medidas que se estabeleceram na regulação e prevenção para prevenir e detectar todas as formas de lavagem de dinheiro assinala-se a criminalização a lavagem de capitais e infracções antecedentes. Tem como objectivo fundamental promover a cooperação para prevenir e combater mais eficazmente a criminalidade organizada transnacional.

� A Convenção de Mérida (Convenção das Nações Unidas contra a corrupção) recomenda qualificar como crime o enriquecimento ilícito. O artigo 14 dessa Convenção estabelece medidas para prevenção do branqueamento de capitais e, sobretudo, prevê amplas medidas de regulamentação dos bancos e outras actividades, estimulando a cooperação internacional. No artigo 23 da mesma convenção também há luz que ilumina para que seja tipificado como delito o branqueamento de capitais, com mais vasta gama de crimes antecedentes.

Sobre o enriquecimento ilícito, convém apresentar um caso muito recente, julgado pelo Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, que condenou às penas de prisão maior um antigo ministro dos transportes e comunicações, um presidente do Conselho de Administração (PCA) e outros com funções de administradores dos aeroportos de Moçambique, respectivamente, que, aproveitando-se das suas qualidades, meteram dinheiro nas suas algibeiras, dinheiro que não lhes pertencia, sabendo como tal em prejuízo dos aeroportos de Moçambique.

Não basta, em 2011, no porto de Nacala, Província de Nampula no norte do país, foram apreendidos quinhentos e sessenta e cinco contentores contendo madeira da responsabilidade material de oito empresas dos quais cento e cinquenta e seis contentores continham madeira de primeira classe (pau-preto, pau-ferro, Namuno etc.) não autorizada para exportação em bruto, pronta a ser exportada. Quatrocentos e nove contentores foram exportados com pagamento de sobrevalorização.

A prática envolve quinze funcionários, dos quais oito do sector da agricultura, cinco das alfândegas e dois da Polícia da República de

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Moçambique. Todos com o propósito de enriquecimento ilícito e sem causa à custa do bem público.

Outro exemplo não menos importante é a exportação de sementes de algodão para o estrangeiro sem a cobrança dos direitos alfandegários, ocorrida no ano de 2011, no porto de Pemba, Província de Cabo Delgado.

� A Convenção Internacional para a Eliminação do Terrorismo (com vigência em 10 de Abril de 2002). Note-se que esta convenção, celebrada após os atentados de 11 de Setembro de 2001, nos Estados Unidos da América, impõe aos Estados--Membros criminalizar as condutas ligadas ao terrorismo e ao seu financiamento.

� A Resolução n. 1373 do Conselho de Segurança estabelece a obrigação de os Países-Membros criminalizarem as acções de financiamento do terrorismo congelando fundos ou bens de pessoas, organizações ou entidades envolvidas em actos terroristas; nega as formas de apoio a grupos terroristas bem como a prestação de auxílio activo ou passivo a terroristas. Ademais, prevê a cooperação entre os países na investigação penal e na prevenção contra planos terroristas.

Impende observar que as Resoluções n. 1267, 1333, 1363, 1390, 1452 e 1455 do Conselho de Segurança exigem aos Estados- -Membros o congelamento dos bens dos Talibãs, de Osama Bin Laden da Al Qaeda e de entidades por ele controladas.

1.3.2 O Grupo de Acção Financeira sobre o Branqueamento de Capitais

O Grupo de Acção Financeira sobre o Branqueamento de Capitais (Gafi) é um organismo intergovernamental criado em 1989 pelos países que integram o G-7, que se dedicam à busca de questões que envolvem a lavagem de activos.

Este organismo possui três principais funções, a saber:

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� Monitorar o progresso dos membros no tema de lavagem de activos.

� Apresentar as tendências modernas de branqueamento, por meio da publicação de relatórios anuais sobre as evoluções da técnica e dos métodos de lavagem com o propósito de instruir os países-membros em praticar acções na prevenção e repressão dos delitos.

� Buscar promover padrões internacionais de combate ao branqueamento de capitais do Gafi a nível global. O Gafi, no âmbito da fiscalização do cumprimento dessas normas, quando verifica que um determinado país não adopta as recomendações deste organismo, pode recomendar às instituições financeiras que monitorem as relações envolvendo países não cumpridores e finalmente faz-se a exclusão do país.

1.3.3 O Comité da Basileia de Supervisão Bancária

Este organismo foi criado em 1974, pelos directores dos bancos centrais do Grupo dos 10, com a finalidade de formular padrões e orientação sobre a supervisão das actividades bancárias. É composto pelos presidentes dos bancos centrais de cada país ou das actividades de supervisão.

Esta organização expediu três grandes padrões de supervisão e orientações referentes ao branqueamento de capitais, a saber:

� Declaração de princípio sobre o branqueamento de capitais que contém procedimentos básicos para eliminar o branqueamento. Em concreto, estabelece quatro princípios: a) o dever de identificação do cliente; b) padrões éticos elevados e cumprimento das leis; c) cooperação com as autoridades policiais, inclusive com a comunicação de operações consideradas suspeitas; d) políticas e procedimentos à observância da declaração, inclusive com a criação de grupos de controlo e auditoria interna. Acerca dessas alíneas, apraz--nos dizer que é uma matéria contida nos artigos 10, 15, 16, 17 e 23, todos da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro.

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Manual Prático de Actuação

� Os princípios fundamentais para bancos (core principles), publicados em 1997, que definem vinte e cinco princípios que são necessários para um sistema de supervisão efectivo. Em 2006, esses princípios foram revistos.

� Por fim, em Outubro de 2001, foi publicado o documento chamado Medida de Vigilância Relactiva a Clientela para Bancos, que tem o intuito de corrigir deficiências do sistema bancário mundial em relação à prevenção de lavagens de activo, aproximando as acções preventivas praticando as recomendações do Gafi.

1.3.4 Grupo Egmont de Unidades de Informação Financeira (UIF)

Este organismo foi criado a partir de 1995, designado Grupo de Unidades de Inteligência Financeira (UIF), cujo objectivo é de incrementar o apoio aos programas nacionais de combate à lavagem de dinheiro dos países que o integram e que inclui a ampliação de cooperação entre as UIF e a sistematização do intercâmbio de experiências e de informações de inteligência financeira, o que melhora a capacidade e a perícia dos funcionários das unidades e gera melhor comunicação por meio da aplicação de tecnologia específica.

Em 2004, a missão desse organismo foi estendida para também combater o financiamento do terrorismo.

Ainda no âmbito da revisão da literatura, segundo Mendonça (2011), os aspectos de direito material levantam questões referentes a crimes antecedentes que gerem necessariamente proveito económico de forma directa ou indirecta, ou seja, aqueles de cuja prática provêm os recursos empregados na lavagem de capitais.

De acordo com o citado autor, a legislação de um país classifica-se em legislação de primeira, de segunda e de terceira gerações. Nessa classificação, importa referir os crimes antecedentes. A legislação brasileira e a moçambicana estão na posição de segunda

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geração, por tipificarem apenas um rol de crimes expressamente indicados como antecedentes.

Diferente disso, a legislação de primeira geração é “aquela que tipifica apenas a lavagem proveniente do crime de tráfico de droga” e a legislação de terceira é “aquela que coloca como crimes antecedentes todos os crimes possíveis ou, ainda, uma generalidade destes (crimes graves)” (MENDONÇA, 2011).

Feita a revisão, cumpre-nos comentar em resumo sobre as quatro organizações internacionais na influência do direito interno moçambicano.

No direito interno moçambicano, quanto à legislação, também se acolhem as considerações dadas por Mendonça, que classifica a legislação como de segunda geração, conforme se depreende da Lei n. 3/1997, de 13 de Março, em seus artigos 33, 35 e 37, assim como os crimes de furto, roubo, ou furto, burla, fabrico, importação e exportação, comércio de armas e explosivos, terrorismo, extorsão, corrupção, peculato, contrabando e descaminho de direitos.

É nossa opinião que Moçambique enfrenta dificuldades para prevenir e combater este tipo de crimes e de criminosos, devido à falta de acompanhamento da velocidade que o crime e seus agentes levam, em função da legislação em vigor ligada à exiguidade de meios financeiros que hoje assolam quase todo o mundo, portanto, crise económica (financeira).

Mais tarde, no ano de 2002, foi aprovada a Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, que, com precisão, objectividade e clareza, estabelece o regime jurídico de prevenção e repressão da utilização do sistema financeiro para a prática de actos de branqueamento de capitais, bens, produtos ou direitos provenientes de actividades criminosas. A mesma lei é conjugada com o Decreto n. 37/2004, de 8 de Setembro, que regulamenta a primeira.

Nesta lei não estão tipificados como crimes antecedentes, por exemplo, outros crimes provenientes do tráfico de pessoas e

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seres humanos, exploração sexual, incluindo a exploração sexual de crianças, o tráfico ilícito de imigrantes, delitos contra o sistema financeiro, crimes contra o ambiente, homicídio e ofensas corporais graves. Também não está criminalizada a associação em organização criminosa, segundo a recomendação do artigo 5º da Convenção de Palermo.

Inadequado seria esquecer que, sobre a exploração sexual, pode-se dar o exemplo mais recente, referente ao conhecido caso Diana (Aldina dos Santos), julgado na vizinha República da África do Sul, em que Diana moçambicana aliciou, levando na sua companhia, umas moçambicanas de idades compreendidas entre 15 a 16 anos para a África do Sul, com promessa de melhores condições de vida (estudos e melhor emprego).

Chegadas à República da África do Sul, as meninas foram colocadas e viviam numa “mansão” que nunca imaginaram viver. Na mansão, com aquela colocação, estavam entregues à exploração sexual de clientes da moçambicana Diana, que criava condições para ter um número de clientes capaz de lhe gerar lucros diários. Infelizmente, não revelou os seus comparsas.

Portanto, este vazio não deve continuar estático, pelo contrário, deve responder na íntegra às recomendações ou outras formas de pressão (Soft Law) e as convenções anteriormente referidas, muito em particular a Convenção de Palermo, no parágrafo 2º do artigo 34, que recomenda a incorporação ao direito interno das infracções previstas nos artigos 5, 6, 8 e 23 do tratado (Hard Law), instrumento esse que obriga os Estados a caminharem para a terceira geração, que coloca como crime antecedente todos os crimes possíveis ou ainda uma generalidade destes.

Em síntese, impende observar que a matéria aqui tratada encontra-se patente nas “Quarenta Recomendações do Grupo de Acção Financeira sobre o Branqueamento de Capitais”.

Estas dão visão e conhecimentos aos países, incluindo Moçambique, para adoptar medidas concretas ao combate do crime

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de branqueamento de capitais e ao financiamento de terrorismo, a saber:

a) sistemas jurídicos, que, em resumo, trata do âmbito de aplicação do crime de branqueamento de capitais;

b) medidas provisórias, em que se refere que os países devem adoptar medidas similares às previstas nas Convenções de Viena e de Palermo, inclusive medidas legislativas, a fim de que as autoridades competentes estejam em condições de declarar perdidos os bens branqueados, os produtos derivados de branqueamento de capitais etc.;

c) medidas a adoptar pelas instituições financeiras e pelas actividades profissionais não financeiras para evitar o branqueamento de capitais e o financiamento de terrorismo;

d) declaração de operações sujeitas e cumprimento das normas;

e) outras medidas preventivas de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo as quais, por exemplo, impõem que os países disponham de sanções eficazes, proporcionadas e dissuasivas de natureza criminal, civil ou administrativa aplicáveis a pessoas singulares ou colectivas sujeitas a estas recomendações que não as obrigações de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento de terrorismo;

f) medidas a adoptar relativamente a países que não cumprem as recomendações do Gafi ou que fazem de modo insuficiente;

g) regulamentação e supervisão, a exigir dos países que assegurem que as instituições financeiras estejam sujeitas à regulamentação e supervisão adequadas e que apliquem efectivamente as recomendações do Gafi;

h) medidas institucionais e outras necessárias ao sistema de combate do branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo;

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i) transparência das pessoas colectivas e outras entidades sem personalidade jurídica (legal arrangements);

j) cooperação internacional e auxílio judiciário mútuo e extradição e outra forma de cooperação.

1.4 Soft Law e Hard Law

Nesta abordagem, falaremos dos seguintes pontos:

� significado de Soft Law;

� aparecimento do Soft Law;

� papel do Soft Law;

� papel de Hard Law; e

� influência do Soft Law e Hard Law nas normas internas da República de Moçambique.

1.4.1 O significado de Soft Law

Relativamente ao primeiro ponto, segundo o mestre Marcos Valadão (2003), falar de Soft Law, na essência, abre-nos horizontes de que se trata de normas exaradas pelas entidades internacionais, ou seja, organizações multilaterais enquanto pessoas jurídicas de direito internacional público, exemplificando, cita a Organização das Nações Unidas (ONU). Possuem característica de universalidade que irradia efeitos tanto no âmbito do direito internacional público como o privado. Isto é, trata-se de norma do direito internacional que se classifica em quartum genus (quarta fonte do DI) nas fontes do direito internacional.

1.4.2 O aparecimento do Soft Law

Na esteira do mestre, quanto ao aparecimento do Soft Law, não há um marco claro. Todavia, sabe-se que, com o surgimento das organizações multilaterais, de natureza pública ou privada, ocorreu com mais frequência no século XX. Neste período, começou a expandir-se com grande influência nas relações internacionais, tendo

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produzido efeitos jurídicos depois da Segunda Guerra Mundial, com o estabelecimento da ONU, do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial e da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Foi assim que, com este aparecimento, notou-se com destaque nas áreas do direito económico internacional e no direito ambiental internacional.

Actualmente, estende-se no ramo do direito criminal no que tange ao crime organizado, com atenção especial ao branqueamento de capitais, transnacional. É precisamente nesta área que ele nos interessa, para satisfazer o nosso tema e tratá-lo com primazia. 1.4.3 O papel do Soft Law

Ainda, com base na fonte anteriormente indicada, diz-nos que, por força das rápidas transformações em curso no mundo globalizado, que deságuam ao crime transnacional, envolvendo grupos criminosos organizados que não comportam regulação pautada em situações antigas, o Soft Law, pela sua flexibilidade em sua formação e aplicação, é chamado a desempenhar o seu papel de dispor ou fazer recomendações com abrangência e uniformemente sobre temas recheados de mecanismos de prevenção e combate mais eficaz ao crime, sobretudo no que refere ao crime de branqueamento de capitais que, dia após dia, vem ganhando níveis alarmantes em prejuízo da estabilidade, paz e harmonia social mundial.

Portanto, o Soft Law tem o papel de influenciar, com recomendações, os Estados, por meio do direito interno, a estabelecerem mecanismos de prevenção e combate mais adequados ao crime organizado transnacional.

1.4.4 O Hard Law

O mestre refere ainda que, quanto ao Hard Law, no âmbito da cooperação internacional e no direito internacional, podem existir acordos ou pactos internacionais estabelecidos entre dois ou mais

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países, tendentes à produção de efeitos jurídicos na resolução ou prevenção de determinados problemas comuns. Esses países assumem compromissos que criam obrigações entre eles, como países-membros, através de tratados ou convenções, sobretudo em torno da prevenção e do combate ao crime organizado transnacional que faz parte integrante do nosso tema.

É oportuno observar que Soft Law e Hard Law complementam--se entre um e outro na medida em que o primeiro abre o horizonte por intermédio de recomendações para a tipificação de certos comportamentos humanos, enquanto o segundo cria obrigações entre os países membros na prevenção e combate, entre outros, ao crime organizado e o branqueamento de capitais.

1.4.5 Influência de Soft Law e Hard Law nas normas internas da República de Moçambique

Como vimos, quanto ao papel de Soft Law e Hard Law, importa a priori demonstrar a influência prática a partir da qual nasceram normas concretas de direito interno em Moçambique com características próprias e sobre a classificação da legislação moçambicana, que ocupa a segunda geração. Com esta classificação, destacam-se as seguintes legislações com influência do Soft Law e Hard Law:

� Tráfico Ilícito de Estupafacientes e de Substâncias Psicotrópicas à luz da Convenção das Nações Unidas de 1988. Moçambique, como membro da ONU e com base na Convenção de Viena (Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas, assinada, em Viena, em 1988, com vigência em 11 de Novembro de 1990), converteu em normas concretas de direito interno sobre o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes, substâncias psicotrópicas, precursores e preparados ou outras substâncias de efeitos similares, através da Lei n. 3/1997, de 13 de Março.

Na referida lei, o legislador, de forma clara disse:

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Havendo necessidade de transpor para o direito interno normas e princípios de direito internacional público, de modo a tornar exequíveis as disposições mais significativas da Convenção das Nações Unidas sobre o Tráfico Ilícito de estupefacientes e de Substâncias psicotrópicas de 1988 e aperfeiçoar os instrumentos jurídicos de combate ao tráfico e consumo ilícitos de droga [...].

Nesse sentido, estamos perante um exemplo vivo do papel e influência do Soft Law.

� Convenção de Mérida (convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção). Exorta a qualificação como crime do enriquecimento ilícito. Este crime, no direito moçambicano, consta na Lei n. 6/2004, de 17 de Junho, cujo objectivo é o reforço do quadro legal vigente para o combate aos crimes de corrupção e participação económica ilícita. Daí que, em resumo, no artigo 2 da mesma lei, no âmbito da sua aplicação, são considerados agentes do crime desde que sejam dirigentes, funcionários ou empregados do Estado ou das autarquias locais, das empresas públicas, das empresas privadas em que sejam participadas pelo Estado ou das empresas concessionárias de serviços públicos.

� Convenção Internacional para Eliminação do Terrorismo. Ainda na esteira da influência do Soft Law nas normas internas de Moçambique, vale referir que, em relação à Convenção Internacional para Eliminação do Terrorismo, embora de forma limitada, esta matéria consta no artigo 13 da Lei n. 19/1991, de 16 de Agosto. Ademais, na mesma lei, estão tipificados: conspiração, alta traição, espionagem, pirataria, mercenarismo, sabotagem, crime contra a organização do Estado, atentado contra a vida do chefe do Estado e atentado contra chefe de Estado ou outra entidade pública estrangeira etc.

� Grupo de Acção Financeira sobre o Branqueamento de Capitais. No mesmo contexto, referente ao Gafi, importa referir que esta matéria vem contida na Lei n. 7/2002, de 5

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de Fevereiro, que estabelece o regime jurídico de prevenção e repressão da utilização do sistema financeiro para a prática de actos de branqueamento de capitais, bens, produtos ou direitos provenientes de actividades criminosas. A mesma lei é conjugada com o Decreto n. 37/2004, de 8 de Setembro, que regulamenta aquela lei.

� Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança. As Leis n. 7/2008, de 9 de Julho, lei de base de protecção da criança, e 6/2008, de 9 de Julho, sobre o tráfico de pessoas, são instrumentos legais que obrigam a República de Moçambique ao seu cumprimento integral, uma vez que aderiu à Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da criança, no que tange à venda de crianças, prostituição e pornografia infantil, através da Resolução n. 43/2002, de 28 de Maio, e Resolução n. 87/2002, de 11 de Dezembro, relactiva à prevenção e punição do tráfico de pessoas respectivamente.

1.5 Considerações finais

Como conclusão, sob forma de resumo, o direito interno moçambicano, no âmbito da prevenção e do combate ao crime organizado transnacional e branqueamento de capitais, “bebeu” e continua a “beber” do Soft Law, muito em particular às recomendações das diferentes convenções (Gafi, Convenção de Viena, Convenção de Palermo, Convenção de Mérida e Convenção Internacional para Eliminação do Terrorismo), para adoptar normas e mecanismos de prevenção e combate ao crime organizado, no dizer de sempre, o crime de branqueamento de capitais.

Entretanto, verifica-se que o direito interno moçambicano ainda precisa adoptar normas de certos comportamentos que não se acham tipificados com vistas a se adequar às normas internacionais para eficazmente prevenir e combater o crime organizado e seus agentes. Conquanto não ficou dito que a legislação de segunda não apresenta aspectos positivos, pois, como exemplo, podem-se citar os artigos 4 e 5 (declaração de bens e fundamentação dos actos

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administrativos respectivamente), artigos 7, 8, 9 e 13, todos da Lei n. 6/2004, de 17 de Junho.

Desse modo, percebe-se que o Legislativo e o governo moçambicano manifestam a vontade de combater todos os males a partir da pobreza absoluta até ao crime organizado e seus agentes, não obstante, por limitação na vertente financeira, não atingirem os níveis de uma classe apreciável como acontece nos países cuja legislação ocupa a terceira geração.

Pois, como sabeis, para atingir esse nível (3ª geração), requerem-se meios humanos e materiais que possam responder eficazmente à velocidade, natureza do crime e modus operandi, quando se tem dinheiro.

Contudo, estamos firmes que Moçambique, que aceita, observa e aplica os princípios da Carta da Organização das Nações Unidas e da Carta da União Africana, na qualidade de membro, pode muito rapidamente, com meios financeiros e humanos existentes, avançar com novos instrumentos jurídicos adequados para combater o crime organizado, sobretudo, o crime de branqueamento de capitais.

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Aspectos introdutórios ao crime de branqueamento

2.1 Introdução ao crime de branqueamento – conceito

O branqueamento pode ser entendido como processo ou actividade, muitas vezes complexo, composto por diversos actos, através do qual se procura dissimular a origem ou proveniência ilícita de bens ou produtos reintroduzindo-os com aparência lícita nos circuitos económicos legais (BRAVO, 2010, p. 129).

Branqueamento é o processo pelo qual o criminoso transforma recursos ganhos em actividades ilegais em activos com uma origem aparentemente legal. Essa prática geralmente envolve múltiplas transacções, usadas para ocultar a origem dos activos financeiros e permitir que eles sejam utilizados sem comprometer os criminosos. A dissimulação é, portanto, a base para toda operação de branquear que envolva dinheiro proveniente de um crime antecedente.

Por meio do branqueamento do dinheiro, o criminoso transforma os recursos monetários oriundos da actividade criminal em recursos com uma fonte aparentemente legítima.

Tendo em vista que a operação se caracteriza pela transformação do dinheiro sujo em dinheiro limpo – simulação de

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licitude de activos originados de um crime –, geralmente se utilizam nas definições vocábulos que exprimem limpeza. Assim, França e Bélgica adoptam a designação de blanchiment d’argent; no Brasil, lavagem de dinheiro; nos países de expressão inglesa, como os Estados Unidos e a Inglaterra, toma-se a designação de money laundering; em Portugal e Moçambique, branqueamento de capitais.

Dois vocábulos são usados como nucleares no conceito de branqueamento; são os termos ocultar e dissimular. Ocultar sugere acção directa de esconder; dissimular significa disfarçar, encobrir, sugerindo acção indirecta de ocultar. Pode-se então dizer que dissimular significa “esconder com astúcia”, portanto, com fraude ou truque.

Dessa forma, os criminosos auferem o dinheiro, produto da sua actividade criminosa, e depois o fazem passar por todo um processo de reciclagem, sendo então utilizado tanto como uma forma de incremento da própria actividade criminosa como também sob a forma de “investimento lícito”, em actividades industriais ou comerciais lícitas.

2.2 Fases do branqueamento e sua importância

É usual distinguirem-se neste processo três fases ou estágios do acto de branquear. A primeira fase é chamada de colocação, placement stage, no qual se procura colocar os bens ou capitais ilícitos no sistema financeiro, designadamente através do sistema bancário ou do sistema financeiro de mercado de valores. Após esse estágio, passa-se pela fase conhecida como ocultação ou transformação layering stage, em que se realizam as operações adequadas e necessárias para ocultar ou despistar a proveniência ilícita de bens ou capitais. Por fim, ocorre a integração pela qual se reintroduzem e reinjetam os bens ou capitais nos circuitos económicos legais (BRAVO, 2010, p. 129).

A fase de colocação geralmente é realizada com o auxílio de contas bancárias, vales postais, cheques e outros instrumentos negociáveis. Na maioria das vezes, o agente criminoso movimenta

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o dinheiro em países com regras mais permissivas e naqueles que possuem um sistema financeiro liberal como os paraísos fiscais2 e centros off-shores3. A introdução do dinheiro em espécie é normalmente direccionada para a instalação de actividades comerciais que, tipicamente, também trabalham com dinheiro vivo. Assim, os recursos ilícitos se misturam com recursos obtidos em actividades legais e são posteriormente depositados em bancos.

A colocação, por ser a primeira fase, é mais vulnerável à detectação, por isso, a investigação deverá ser reforçada por ser mais fácil desvendar o crime tendo em conta o curto lapso de tempo entre o momento do crime e esta primeira etapa.

Na segunda etapa, a ocultação, o agente procura dissociar o dinheiro da sua origem passando-o por uma série de transacções, conversões e movimentações. Mais eficiente será o branqueamento quanto mais o agente conseguir afastar o dinheiro da sua origem. Quanto mais operações, tanto mais difícil a sua conexão com o crime e a sua prova.

O objectivo do criminoso é cortar a cadeia de evidências da ilicitude. Geralmente, o dinheiro é movimentado por transferências electrónicas para contas anónimas e, preferencialmente, em países amparados por leis de sigilo bancário.

Na última fase, a integração, o dinheiro sujo já lavado volta a integrar-se na economia sob veste de dinheiro legítimo, incorporando--se sob a forma de investimento. Esta fase é o estágio final para a transformação de dinheiro sujo em dinheiro aparentemente lícito. É extremamente difícil a investigação do branqueamento nesta fase, pois já passaram outras duas etapas e a esta altura o dinheiro está

2 Paraísos fiscais são países que proporcionam incentivos fiscais aos investidores, isentando ou diminuindo consideravelmente a carga de tributos por determinado período de tempo ou para determinados tipos de aplicações financeiras, ou ainda diminuindo a carga tributária especificadamente para determinados negócios que ali venham a se estabelecer. Não significa e não podem, entretanto, consentir que o dinheiro aplicado ou investido tenha origem criminosa no país de onde provém.

3 São empresas ou filiais de empresas estabelecidas em outros países. Prestam-se, em tese, a administrar “investimentos” financeiros. A tradução literal de off-shore é “litoral” ou “fora da costa”.

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com a aparência significativamente “limpa”. Veja-se a imagem a seguir4.

Como explica Jorge dos Reis Bravo (2010, p. 129 e 130),

entre as técnicas e métodos mais conhecidos de branqueamento podem destacar-se as aproveitadas por actividades desenvolvidas por cambistas, transportadores de fundos (p. ex., Western Union, American Express), estabelecimentos de troca de cheques, transferências telegráficas e cassinos [...]. Pistas de corrida, locais de qualquer tipo de jogo, venda de lotarias, totolotos, totobolas etc., constituem métodos potenciais a qualquer eficaz branqueador, uma vez que todos eles têm um laço em comum: poder-se chegar ao pé do vencedor do jogo e trocar-lhe o seu título, que nos termos da lei estaria sujeito a IRS, logo ilíquido, e pagar-lhe uma quantia igual ou superior, mas líquida. Na sua contraparte, o agente vê, por seu turno,

4 Extraída do sítio <http://www.bb.com.br/portalbb/page251,105,5269,0,0,1,1.bb?codigoNoticia=2970&codigoMenu=580>.

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um cheque colectável à luz das leis fiscais, o que levará a legalização e introdução no sistema financeiro de uma quantia legal.

Por este esquema, o branqueador livra-se do dinheiro sujo, o que entregou ao vencedor do jogo, e fica com o dinheiro limpo, o que recebeu em troca das mãos daquele.

Um exemplo clarividente de branqueamento é o caso conhecido como Franklin Jurado:

O caso de Franklin Jurado (EUA, 1990-1996) ilustra o que seria um ciclo clássico de lavagem de dinheiro. Economista colombiano formado em Harvard, Jurado coordenou a lavagem de cerca de US$ 36 milhões em lucros obtidos por José Santacruz-Londono com o comércio ilegal de drogas.

O depósito inicial5 – o estágio mais arriscado, pois o dinheiro ainda está próximo de suas origens – foi feito no Panamá. Durante um período de três anos, Jurado transferiu dólares de bancos panamenhos para mais de 100 contas diferentes em 68 bancos de nove países, mantendo os saldos abaixo de US$ 10 mil para evitar investigações. Os fundos foram novamente transferidos, dessa vez para contas na Europa, de maneira a obscurecer a nacionalidade dos correntistas originais, e, então, transferidos para empresas de fachada.

Finalmente, os fundos voltaram à Colômbia por meio de investimentos feitos por companhias europeias em negócios legítimos, como restaurantes, construtoras e laboratórios farmacêuticos, que não levantariam suspeitas.

O esquema foi interrompido com a falência de um banco em Mônaco, quando várias contas ligadas a Jurado foram expostas. Fortalecida por leis antilavagem, a polícia começou a investigar o caso e Jurado foi preso6.

5 Depósitos iniciais são usualmente feitos em países onde não há regulamentação. Países com instituições governamentais frágeis são especialmente vulneráveis.

6 Exemplo extraído de Cartilha do Coaf, p. 5. O Brasil criou, no âmbito do Ministério da Fazenda, o equivalente ao nosso Ministério das Finanças, uma instituição denominada Conselho de Controle de Actividades Financeiras (Coaf). A principal tarefa do Coaf é promover um esforço conjunto por parte dos vários órgãos governamentais do Brasil que cuidam da implementação de políticas nacionais voltadas para o combate à lavagem de dinheiro, evitando que sectores da economia continuem sendo utilizados nessas operações ilícitas.

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É no campo da investigação criminal que as instituições de inteligência financeira assumem um papel preponderante no combate ao branqueamento. A estas competirá identificar, nas transacções económicas que pessoas físicas e jurídicas realizam nas suas actividades regulares, aquelas que podem indicar a existência de um crime. A título de exemplo, saques em dinheiro vivo no caixa de um banco não constituem, à partida, qualquer operação ilegal, mas muitos saques, por uma mesma pessoa física ou jurídica, ou o seu valor elevado já são incomuns, daí justificar o monitoramento pela inteligência financeira como operações suspeitas de branqueamento.

Do mesmo modo, a compra de um imóvel em nome de uma empresa também não é uma operação ilegal, mas, a prática corrente das pessoas e das empresas é comprar imóveis para si próprios e não para terceiros. Assim, quando aparece alguém que sistematicamente faz este tipo de operação, compra de imóveis para outras pessoas físicas ou jurídicas, isso já se torna suspeito, pois sugere que pode estar a esconder algo ilegal.

O Estado moçambicano, reconhecendo a importância e a necessidade do combate ao branqueamento, criou, pela Lei n. 14/2007, de 27 de Junho, o Gabinete de Informação Financeira de Moçambique (Gifim), uma unidade complementar para a prevenção e o combate do branqueamento de capitais. Essa instituição tem como função realizar a recolha, centralização, análise e difusão às entidades competentes das informações respeitantes a operações económico- -financeiras susceptíveis de consubstanciar actos de branqueamento de capitais. Esta instituição tem no espírito a mesma função que o Coaf do Brasil.

2.3 Importância de se reprimir o crime de branqueamento

O crime de branqueamento atinge tanto a ordem jurídica como as empresas legítimas, afectando em última análise a organização económica dos países7.

7 Convenção de Viena − A “Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas”, aprovada em Viena, Áustria, em 1988, no âmbito das Nações Unidas, mais

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A propósito, conforme refere Vladimir Aras (2006),

ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a lavagem de dinheiro não se restringe a um problema de criminalidade fiscal. Não é apenas a arrecadação do Estado que está em jogo. Mais do que isso. Está em jogo o desenvolvimento nacional, a higidez da economia, a livre e justa concorrência, a probidade na administração, a saúde pública, a segurança da sociedade e outros tantos bens jurídicos relevantes, sejam eles os tutelados diretamente pelos tipos penais antecedentes, sejam os bens jurídicos de índole econômica protegidos pelo crime de lavagem de dinheiro […].

O dinheiro ilícito, quando inserido na ordem econômica de um país, causa grandes prejuízos devido à concorrência desleal que exerce em relação às empresas legitimamente estabelecidas, bem como atua nas estruturas políticas estatais através do suborno e da corrupção de funcionários públicos e ainda por financiar campanhas de políticos inescrupulosos com vistas a adquirirem o controle e ou a criação de empresas com fins lícitos.

Nessa órbita, os países em vias de desenvolvimento como Moçambique acabam absorvendo os efeitos mais nefastos do branqueamento, porquanto os recursos económicos obtidos pelos criminosos resultam da prática de crimes antecedentes graves como a corrupção e o tráfico de drogas, cuja continuidade fica garantida e fortalecida com as operações de branqueamento que acabam promovendo o financiamento de outras práticas delitivas, num círculo vicioso contínuo sem precedentes.

O dinheiro roubado dos cofres públicos, por exemplo, deixa de ser utilizado para a melhoria das questões sociais como educação de base, transporte, emprego, habitação, que, juntos, diminuiriam a desigualdade social e, consequentemente, os crimes que dela decorrem.

conhecida como “Convenção de Viena”, teve como propósito promover a cooperação internacional no trato das questões ligadas ao tráfico ilícito de entorpecentes e crimes correlatos, dentre eles a lavagem de dinheiro. Trata-se do primeiro instrumento jurídico internacional a definir como crime a operação de lavagem de dinheiro. Moçambique ratificou esta convenção pela Resolução n. 11/1996.

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Estima-se que mais de quinhentos bilhões de dólares sejam oriundos do “dinheiro sujo”, o que representa 2% do PIB da economia mundial8.

A investigação do crime de branqueamento é extremamente complexa, daí ser imprescindível a colaboração de pessoas jurídicas como bancos, casas de câmbio, seguradoras, bolsas de valores. A investigação fica comprometida se não houver a quebra de sigilos bancário e fiscal dos suspeitos dos crimes para reunirem-se provas necessárias à elucidação dos factos.

8 Em reportagem do Diário de Pelotas-RS, em 2.9.2004, a entrevista a Giovanni Quaglia, representante da ONU, referiu: “Brasília – O crime organizado movimenta US$ 2 trilhões por ano, sendo que US$ 1,4 trilhões circula no sistema financeiro. [...] ‘É difícil chegar a dados muito confiáveis em relação ao crime organizado, mas, entre os experts, este é o consenso. A maioria dos valores circula no sistema financeiro e a corrupção é o crime que mais movimenta a lavagem de dinheiro. Dos US$ 2 trilhões, US$ 1 trilhão é da corrupção, de US$ 300 a US$ 400 bilhões são da droga e também entre US$ 300 e US$ 400 bilhões são do tráfico de armas. O restante equivale a tráfico de seres humanos, contrabando e roubo de carga’ , revelou o representante da ONU” (MENDRONI, 2006, p. 2).

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Parte penal

3.1 O bem jurídico tutelado

A lei moçambicana, Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, Lei do Branqueamento de Capitais, estabelece no seu artigo 1 que com esta lei busca-se prevenir e reprimir a utilização do sistema financeiro para a prática de actos de branqueamento de capitais, bens, produtos ou direitos provenientes de actividades criminosas definidas como crime antecedente nesta lei.

Existem várias interpretações sobre qual seria o bem jurídico tutelado no crime de branqueamento. Algumas interpretações consideram a existência de apenas um bem jurídico protegido. São exemplos a administração da justiça; o mesmo bem jurídico do crime antecedente; o património e a ordem socioeconómica. No entanto, há outros que interpretam o bem jurídico atingido pelos crimes de branqueamento como pluriofensivos, misturando uns com outros.

Nesta base, podemos encontrar duas fundamentais teorias:

� A administração da justiça: parte da doutrina entende que o bem jurídico tutelado é a administração da justiça, na medida em que visa suplementar a eficiência na investigação e no

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esclarecimento dos crimes e a punição dos infractores. A criminalização de condutas concebidas como processamento de ganhos ilícitos vem potenciar a aplicação da justiça em relação aos crimes precedentes.

Pela administração da justiça, pretende-se evitar a impunidade do crime antecedente e que o seu autor não lucre com a sua prática, para além de se procurar assegurar que o Estado confisque os bens e produtos resultantes da prática do criminosa (MENDONÇA, 2011, p. 18).

� A ordem socioeconómica: considerando a quantidade astronómica de dinheiro que é lavado no mundo, o impacto na ordem socioeconómica é colossal em todos os níveis. Empresas regulares perdem a concorrência, porque aquelas que utilizam fundos provenientes de acções criminosas conseguem ter capital suficiente para provocar outras infracções como o de dumping9, underselling10, formação de cartel com outras nas mesmas condições. A falência destas empresas gera desemprego, cria o monopólio do mercado, contrariando as regras naturais da economia, como a livre concorrência e a oferta e procura. Na maior parte das vezes, acabam gerando a inflação, pois fixam os preços dos produtos livremente e sem oposição. O branqueamanto também potencia a própria organização criminosa, aperfeiçoando, por exemplo, as formas de tráfico e venda de droga, dificultando o combate a estes males (MENDRONI, 2006, p. 31).

Limitar-mo-nos a uma ou outra tese seria restringir o objecto de protecção do crime de branqueamento e colocar de fora outros interesses juridicamente relevantes. É necessário sim potenciar a administração da justiça para melhor investigar e levar a punição dessas práticas delitivas, mas não só; também importa que se garanta que o sistema financeiro não seja usado para branquear dinheiro ilícito nem que ponha em risco a livre concorrência que deve nortear

9 Acção de exportar mercadoria abaixo do preço do custo, visando eliminar a concorrência.

10 Acção de vender mercadoria, no mercado interno, abaixo do preço de custo visando eliminar a concorrência.

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a actividade económica dentro dos Estados, com os efeitos nefastos daí decorrentes. Estamos a falar de situações como a inflação e o desemprego, que podem levar à desestruturação do tecido social e à degradação da qualidade de vida dos cidadãos.

Assim, a nosso ver, apenas uma solução ecléctica teria mais mérito, integrando ambas as teses na órbita do bem jurídico tutelado pela lei do branqueamento, pelo que consideramos a melhor interpretação aquela que entende que os crimes de branqueamento ofendem, ao mesmo tempo, “a administração da justiça” e a “ordem socioeconómica”.

3.2 Crime antecedente

3.2.1 Análise dos crimes antecedentes

O crime de branqueamento é um crime que se pode considerar parasita na medida em que depende da existência prévia de um outro tipo legal de crime. Embora haja autonomia entre eles, não existirá crime de branqueamento sem um crime antecedente.

Segundo Jorge dos Reis Bravo (2010, p. 132),

o crime de branqueamento de capitais pressupõe uma infracção principal (predicated offense) – a prática anterior de um dos crimes precedentes ou subjacentes constantes do “catálogo” [...]. Tal circunstância faz com que se tenha convencionado classificar doutrinalmente o crime de branqueamento como um pós-delito.

O crime antecedente é o que cria o dinheiro ilícito que depois será processado ou lavado no branqueamento. Importa, nesta ordem, conhecer quais os crimes que integram a classe dos crimes antecedentes aptos a gerar o crime de branqueamento.

Tem sido usual classificar a legislação de um país como sendo de primeira, segunda ou terceira geração. A de primeira geração é aquela que tipifica apenas a lavagem proveniente do crime de tráfico de drogas. Este crime é historicamente o primeiro a gerar o crime de

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branqueamento no mundo, mercê das avultadas somas de dinheiro que movimenta.

Em Moçambique, até o ano de 2002, a legislação era de primeira geração, na medida em que tipificava apenas o branqueamento proveniente do tráfico de drogas. Actualmente, tal como até recentemente ocorria no Brasil11, a legislação moçambicana é de segunda geração, pois tipifica uma gama de crimes expressamente designados como antecedentes. A legislação de terceira geração, como a espanhola, é aquela que coloca como crime antecedente todos os crimes possíveis ou, ainda, uma generalidade deles considerados como “crimes graves” como também ocorreu recentemente no Brasil. A comunidade internacional cada vez mais incentiva os Estados a adoptarem esta classificação de modo a abarcar um conjunto mais alargado de crimes graves.

Segundo refere Andrey Borges de Mendonça (2011, p. 14),

Na espanha, se alterou recentemente o Código Penal para abarcar todos os delitos graves, o que foi aplaudido pela doutrina daquele país, embora haja vozes discrepantes. Os que criticam afirmam que tal definição – crimes graves – acaba por excluir apenas os crimes leves, o que torna a sua definição extremamente ampla e imprecisa. Gomes Iniesta propõe, então, na linha seguida pelo legislador italiano, a introdução, junto à categoria dos crimes graves, de um catálogo meramente exemplificativo, de forma a evitar o carácter excessivamente genérico da expressão crimes graves. Para Isidoro Blanco Cordeiro, a vantagem do tipo antecedente ser aberto é que se evitam lacunas e, também, que isso orientasse a criminalidade organizada a buscar outras atividades delitivas geradoras de grandes quantias e que não se subsumissem ao delito em referência. Bastaria portanto, a referência à procedência

11 O Brasil passou a ser legislação de terceira geração com a edição da Lei n. 12.683, de 9 de Julho de 2012, que, entre outras modificações, alterou a redação do artigo 1º da Lei n. 9.613/1998, que passou a estar assim redigido: “Art. 1º  Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal” (grifos nossos). Assim, a partir de 10 de julho de 2012, qualquer infração penal – incluindo crimes ou contravenções – pode ser crime antecedente do crime de branqueamento, desde que sejam aptos a gerar bens, direitos ou valores.

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delitiva, ou seja, que se tratasse de um fato típico e antijurídico, inclusive aqueles de escassa lesividade ou de bagatela.

Relativamente às recomendações do Gafi, refere ainda Andrey Borges de Mendonça (2011, p. 15) a Recomendação n. 1, de 2003:

os países deveriam aplicar o crime de branqueamento de capitais a todos os crimes graves, por forma a abranger o conjunto mais alargado de infracções subjacentes. As infracções subjacentes podem ser definidas por referência a todos os crimes ou por referência a um limiar, ligado ou uma categoria de infracções graves, ou a uma moldura penal aplicável à infracção subjacente critério do limiar, ou a uma lista de infracções subjacentes, ou ainda a uma combinação destes critérios. Segundo a mesma recomendação do Gafi, qualquer que seja o critério adoptado, o país deveria incluir pelo menos os seguintes delitos: participação num grupo criminoso organizado e em acções ilegítimas para obtenção de fundos, nomeadamente através de chantagem, intimidação ou outros meios; terrorismo, incluindo o financiamento do terrorismo; tráfico de seres humanos e tráfico ilícito de migrantes; exploração sexual, incluindo a exploração sexual de crianças; tráfico de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas; tráfico de armas; tráfico de bens roubados e de outros bens; corrupção e suborno; fraude; contrafacção de moeda; contrafacção e pirataria de produtos; crimes contra o ambiente; homicídio e ofensas corporais graves; rapto, detenção ilegal e tomada de reféns; roubo ou furto; contrabando; extorsão; falsificação; pirataria; e utilização abusiva de informação privilegiada e manipulação do mercado. [g.n.]

Em Moçambique, o regime jurídico da prevenção e do combate da utilização do sistema financeiro para a prática de actos de branqueamento de capitais, bens e produtos ou direitos provenientes de actividades criminosas encontra-se previsto na Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, o qual veio a ser regulamentado pelo Decreto n. 37/2004, de 8 de Setembro. Neste diploma, pretendeu-se condensar todas as formas de punição do branqueamento.

De acordo com o artigo 4 daquela lei, são os seguintes os crimes antecedentes do crime de branqueamento:

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a) Infracções constantes dos artigos 33, 35 e 37 da Lei n. 3/1997, de 13 de Março, quais sejam os crimes de tráfico de estupefacientes e outras actividades ilícitas (art. 33), utilização indevida de equipamento, material e percursores (art. 35) e tráfico- -consumo (art. 37).

Art. 33 (Tráfico e Outras Actividades Ilícitas)

1. Todo aquele que, sem estar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outra pessoa, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver fora das circunstâncias no artigo 55, plantas, substâncias ou preparados constantes das tabelas I a III, será punido com a pena de 16 a 20 anos de prisão maior.

2. Todo aquele que, agindo de modo contrário aos termos da autorização concedida, ceder, introduzir ou diligenciar para que seja colocado no comércio, plantas, substâncias e preparados incluídos no número anterior, será punido com a pena de 16 a 20 anos de prisão maior, agravada nos seus limites mínimos e máximos.

3. Incorrerá na pena prevista no número anterior aquele que cultivar plantas, produzir ou fabricar substâncias ou preparados diversos dos que constam do título de autorização.

4. Quando se tratar das substâncias ou preparados constantes da tabela IV, a pena será a de 12 a 16 anos de prisão maior.

Art. 35 (Utilização Indevida do Equipamento, Material e Precursores)

1. Aquele que, sem estar autorizado, fabricar, importar, exportar, transportar ou distribuir equipamento, materiais, substâncias ou preparados constantes das tabelas V e VI, sabendo que são ou vão ser utilizados no cultivo, produção ou fabrico ilícito de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, preparados ou outras substâncias de efeitos similares será punido com a pena de 8 a 12 anos de prisão maior.

2. Aquele que, sem estar autorizado, detiver por qualquer título, equipamento, materiais ou substâncias incluídas nas

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tabelas V e VI, sabendo que são ou vão ser utilizados no cultivo, produção ou fabrico ilícitos de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, será punido com pena agravada em termos gerais de 2 a 8 anos de prisão maior e multa de 30 a 100 milhões de meticais.

3. Quando o agente for titular da autorização nos termos do capítulo II, será punido:

a) no caso do n. 1, com a pena de 12 a 16 anos de prisão maior;

b) no caso do n. 2, com a pena de 8 a 12 anos de prisão maior.

Art. 37 (Traficante-Consumidor)

1. Quando, com a prática dos factos previstos no artigo 33, o agente tiver por objectivo único conseguir plantas, substâncias ou preparados destinados ao seu uso pessoal, incorrerá nas penas de prisão de um a dois anos e multa de 10 milhões de meticais, se aqueles estiverem incluídos nas tabelas I a III.

2. Quando os factos descritos no número anterior respeitarem a substâncias ou preparados compreendidos na tabela IV, o seu agente incorrerá na pena de prisão até 1 ano e multa até 5 milhões de meticais.

b) Crimes de furto, art. 421º do CP

Aquele que cometer o crime de furto, subtraindo fraudulentamente uma coisa que lhe não pertença, será condenado:

1º – A prisão até seis meses e multa até um mês, se o valor da coisa furtada não exceder dez salários mínimos;

2º – A prisão até um ano e multa até dois meses, se exceder a esta quantia, e não for superior a quarenta salários mínimos;

3º – A prisão até dois anos e multa até seis meses, se exceder a esta quantia e não for superior a cento e vinte cinco salários mínimos;

4º – A prisão maior de dois a oito anos, com multa até um ano, se exceder a esta quantia e não for superior a oitocentos salários mínimos;

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5º – A prisão maior de oito a doze anos, se exceder a oitocentos salários mínimos.

§ único – Considera-se como um só furto o total das diversas parcelas subtraídas pelo mesmo indivíduo à mesma pessoa, embora em épocas distintas.

c) Crimes de roubo, art. 432º do CP

É qualificada como roubo a subtracção da coisa alheia, que se comete com violência ou ameaça contra as pessoas.

§ único – A entrada em casa habitada, com arrombamento, escalamento ou chaves falsas, é considerada como violência contra as pessoas, se elas efectivamente estavam dentro nessa ocasião.

d) Burla, art. 451º do CP

Será punido com as mesmas penas de furto, segundo o valor da coisa furtada ou do prejuízo causado, aquele que defraudar a outrem, fazendo que se lhe entregue dinheiro ou móveis, ou quaisquer fundos ou títulos, por algum dos seguintes meios:

1º – Usando de falso nome ou de falsa qualidade;

2º – Empregando alguma falsificação de escrito;

3º – Empregando artifício fraudulento para persuadir a existência de alguma falsa empresa, ou de bens, ou de crédito, ou de poder supostos, ou para produzir a esperança de qualquer acidente.

§ 1º – A pena mais grave de falsidade, se houver lugar, será aplicada.

§ 2º – É aplicável às infracções previstas neste artigo o disposto no artigo 430 e no artigo 431 e seus parágrafos relativamente ao furto.

e) Fabrico, importação, comércio de armas e explosivos, art. 253º do CP

Aquele que fabricar, ou importar, ou vender, ou subministrar, ou guardar qualquer mecanismo, tendente a determinar

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explosão, que possa servir à destruição de pessoas ou de edifícios, será condenado na pena de prisão maior de oito a doze anos, sem prejuízo da agravação que lhe possa competir por cumplicidade em qualquer crime dessa natureza.

§ 1º – Aquele que, sem licença da autoridade administrativa, fabricar, ou importar, ou vender, ou subministrar quaisquer armas brancas ou de fogo, e bem assim aquele que delas usar sem a mesma licença, ou sem autorização legal, será condenado a prisão até seis meses e multa correspondente.

§ 2º – Na mesma pena serão condenados os indivíduos compreendidos no parágrafo antecedente, a quem tiver sido cassada a respectiva licença, e que, não obstante, dela continuem usando como se estivesse em vigor.

§ 3º – A simples detenção na casa de residência ou do detentor, ou em outro local, será punida com a multa de oito dias a um mês.

§ 4º – Não se compreendem nas disposições deste artigo e seus parágrafos as armas que devem ser consideradas como objectos de arte e de ornamentação.

§ 5º – Em todos os mais casos, declarados neste artigo e seus parágrafos, as armas serão apreendidas e perdidas a favor do Estado.

f) Terrorismo, art. 13 da Lei n. 19/1991, de 16 de Agosto (Lei dos Crimes contra a Segurança do Estado)

1. Comete o crime de terrorismo, punível com a pena de dezasseis a vinte anos de prisão maior, todo aquele que:

a) Colocar ou fizer colocar, por qualquer meio, em nave ou aeronave, em local ou instalação pública ou privada, bem como em qualquer equipamento de uso público ou privado, qualquer artefacto ou engenho capaz de destruir ou danificar os mesmos, pondo em perigo a segurança de bens, locais e vidas humanas ou animais, com o intuito de criar insegurança social, terror ou pânico na população ou de pressionar o Estado ou alguma organização de carácter económico, social ou político a realizar ou abster-se de realizar certa ou certas actividades;

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b) adulterar substâncias ou produtos alimentares ou outros destinados ao consumo das populações, animais ou unidades sócio-económicas no intuito de provocar a morte ou graves perturbações à saúde ou à vida económica, com o fim de criar insegurança social, terror ou pânico.

2. A importação, fabrico, guarda, compra, venda ou cedência por qualquer título, bem como o transporte, detenção, uso e porte de substâncias ou instrumentos inflamáveis, explosivos, armas de fogo, asfixiantes, tóxicos ou agentes químicos ou biológicos, ou de qualquer outro elemento de cuja combinação possam obter-se produtos da mesma natureza dos acima descritos ou qualquer outra substância ou artefacto, fora das condições legais ou em contrário das prescrições das autoridades competentes, são punidos, se os seus autores os destinavam ou devessem ter conhecimento que se destinavam à perpetração de qualquer crime contra a segurança do Estado, com a pena de doze a dezasseis anos de prisão maior, ou nos demais casos, com a pena de três meses a dois anos de prisão e multa correspondente.

3. À pena de terrorismo acresce a dos demais crimes praticados, procedendo-se à sua agravação sempre que concorra o crime de homicídio.

g) Extorsão, arts. 314º, 440º e 452º do CP

Art. 314º (Concussão)

Todo o empregado público que extorquir de alguma pessoa, por si ou por outrem, dinheiro, serviços ou outra qualquer coisa que lhe não seja devida, empregando violências ou ameaças, será punido com a pena de prisão maior de dezasseis a vinte anos.

§ único – Esta pena porém, poderá ser atenuada, substituindo--se-lhe a pena de prisão, segundo as circunstâncias.

Art. 440º (Extorsão)

Aquele, que por violência ou ameaça, extorquir a alguém a assinatura ou a entrega de qualquer escrito ou título, que contenha ou produza obrigação ou disposição, ou desobrigação,

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será punido com as penas declaradas para o roubo, segundo as circunstâncias do facto.

Art. 452º (Extorsão e chantagem)

Aquele que por meio de ameaça verbal ou escrita de fazer revelações ou imputações injuriosas ou difamatórias, ou, a pretexto de as não fazer, extorquir a outrem valores, ou coagir a escrever, assinar, entregar, destruir e falsificar, ou, por qualquer modo, inutilizar escrito ou título que constitua, produza ou prove obrigação ou quitação, será condenado às penas de furto, agravadas, mas só terá lugar o procedimento criminal havendo queixa prévia do ofendido.

§ 1º – Se os valores não forem extorquidos, nem o título ou escrito foi assinado, entregue, escrito, destruído, falsificado, ou por qualquer modo inutilizado, a pena será a do § único do artigo 379.

§ 2º – Aquele que, com o pretexto de crédito, ou influência sua ou alheia para com alguma autoridade pública, receber de outrem alguma coisa, ou aceitar promessa pelo despacho de qualquer negócio ou pretensão, e bem assim o que receber de outrem alguma coisa, ou aceitar promessa com pretexto de remuneração ou presente a algum empregado público, será punido com o máximo da prisão e a multa até um ano, sem prejuízo da acção que compete ao empregado público pelo crime de injúria.

h) Corrupção, arts. 318º e 321º do CP e arts. 7, 8, 9 e 10 da Lei n. 6/2004 (Lei Anticorrupção)

Art. 318º (Peita, suborno e corrupção de empregado público)

Todo o empregado público que cometer o crime de peita, suborno e corrupção, recebendo dádiva ou presente, por si ou por pessoa interposta, com sua autorização ou ratificação, para fazer um acto de suas funções, se este acto for injusto e for executado, será punido com pena de prisão maior de dois a oito anos e multa correspondente a um ano; se este acto porém não for executado, será condenado em suspensão de um a três anos, e na mesma multa.

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§ 1º – Se o acto injusto e executado for um crime, a que pela lei esteja decretada pena mais grave, terá lugar a pena que, segundo lei, deve ser imposta.

§ 2º – Se for um acto justo que o empregado seja obrigado a praticar, será suspenso até um ano, e condenado na multa correspondente a um mês.

§ 3º – Se a corrupção teve por fim a abstenção de um acto das funções do mesmo empregado, a pena será a de demissão ou suspensão de um a três anos, e multa correspondente, segundo as circunstâncias.

§ 4º – A aceitação de oferecimento ou promessa será punida, observando-se as regras gerais sobre a tentativa; mas sempre haverá lugar a pena de demissão, se o acto for injusto e executado.

§ 5º – Se o empregado repudiou livremente o oferecimento ou promessa que aceitara, ou restituiu a dádiva ou presente que recebera, e livremente deixou de executar o acto injusto, sem que fosse impedido por motivo algum independente da sua vontade, cessará a disposição deste artigo.

§ 6º – As disposições deste artigo e seus parágrafos terão lugar também nos casos em que o empregado público, arrogando- -se dolosamente ou simulando atribuição de fazer acto, aceitar oferecimento ou promessa, ou receber dádiva ou presente, para fazer acto ou não fazer, salvas as penas mais graves da falsidade, se houverem lugar.

§ 7º – São igualmente aplicáveis aos árbitros as disposições deste artigo e seus parágrafos.

§ 8º – As penas determinadas nos artigos antecedentes são aplicadas aos peritos e a quaisquer outros que exercerem alguma profissão a respeito dos seus actos que forem, segundo a lei, requeridos para o desempenho do serviço público, excepto quando a lei os autorizar a regular com as partes o seu salário.

§ 9º – Nos casos dos dois últimos antecedentes parágrafos, a pena de demissão ou de suspensão será substituída pela suspensão do exercício da profissão ou pela suspensão dos direitos políticos não inferior a dois anos, salvo o disposto no

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artigo 241º, e sem prejuízo da pena mais grave em que possam ter incorrido por motivo dos referidos actos.

Art. 321º (Corrupção activa)

Qualquer pessoa que corromper por dádivas, presentes, oferecimentos ou promessas qualquer empregado público, solicitando uma injustiça, comprando um voto ou procurando conseguir ou assegurar pela corrupção o resultado de quaisquer pretensões, será punida com as mesmas penas que forme impostas ao empregado corrompido, com a declaração de que as penas de demissão ou suspensão serão substituídas pela suspensão dos direitos políticos, não inferior a dois anos.

§ único – Quando o suborno tiver lugar em causa criminal a favor do réu, por parte dele mesmo, do seu cônjuge ou de algum ascendente ou descendente, ou irmão ou afim nos mesmos graus, a pena será a de multa de um a seis meses.

Art. 7 (Corrupção passiva, para acto ilícito)

1. As entidades previstas no artigo 2 que, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitarem ou receberem dinheiro ou promessa de dinheiro ou qualquer vantagem patrimonial, que lhe sejam devidos, para praticar ou não praticar acto que implique violação dos deveres do seu cargo, serão punidos com pena de prisão maior de dois a oito anos e multa até um ano.

2. As penas previstas no artigo 318º do código Penal serão também aplicadas às entidades previstas no artigo 2.

3. A mesma pena será aplicada quando a vantagem solicitada ou recebida pelos agentes previstos no artigo 2 tenham carácter não patrimonial, desde que seja para a prática de acto que implique violação dos deveres dos cargos ou omissão de acto que tenham o dever de praticar, que consiste, nomeadamente:

a) Na dispensa de tratamento de favor a determinada pessoa, empresa ou organização;

b) Na intervenção em processo, tomada de ou participação em decisão que impliquem obtenção de benefícios, recompensas, subvenções, empréstimos, adjudicação ou celebração de

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contratos em geral, reconhecimento ou registo de direitos e exclusão ou extinção de obrigação com violação de lei;

c) Em facultar informações sobre concursos públicos em prejuízo da competição leal;

d) Em facultar fraudulentamente informações sobre provas de exame.

4. Se o acto não for, porém, executado, a pena será a de prisão até um ano e multa até dois meses.

5. Tratando-se de mera omissão ou demora na prática de acto relacionado com as suas funções, mas com violação dos deveres do seu cargo, a pena será, respectivamente, no caso dos n. 1 e 2, a pena de prisão até dois anos e multa correspondente e no caso do n. 3, a prisão, até um ano e multa até seis meses.

6. Se o oferecimento ou promessa aceites forem voluntariamente repudiados ou restituído o dinheiro ou valor da vantagem patrimonial antes da prática do acto ou da sua omissão ou demora, cessam as disposições deste artigo.

Art. 8 (Corrupção passiva para acto lícito)

As entidades previstas no artigo 2 que, por si ou interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitarem ou receberem dinheiro ou promessa de dinheiro ou qualquer vantagem patrimonial ou não patrimonial, que não lhes sejam devidos, para praticarem actos contrários aos deveres do seu cargo e cabendo nas suas funções, serão punidos com pena de prisão até um ano e multa até dois meses.

Art. 9 (Corrupção activa)

1. Quem der ou prometer a entidades previstas no artigo 2, por si ou por interposta pessoa, dinheiro ou outra vantagem patrimonial ou não patrimonial que a elas não sejam devidos, com os fins indicados no artigo 8, será punido com as penas daquela disposição.

2. Se, todavia, o crime tiver sido praticado para evitar que o agente, os seus parentes ou afins até ao 3º grau se exponham

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ao perigo de serem punidos ou de serem sujeitos a uma sanção criminal, pode o juiz atenuar extraordinariamente a pena.

3. A previsão do n. 6 do artigo 7 só aproveita ao agente da corrupção activa se ele, voluntariamente, aceitar o repúdio da promessa ou a restituição do dinheiro ou vantagem patrimonial que havia feito ou dado.

4. O agente é igualmente isento de pena nos casos em que o cometimento do crime tiver resultado de solicitação ou exigência de funcionário, como condição para a prática de actos da respectiva competência e o primeiro participar o crime às autoridades.

Art. 10 (Participação económica em negócio)

1. As entidades previstas no artigo 2 que, com intenção de obter para si ou para terceiro, participação económica ilícita, lesar em negócio jurídico os interesses patrimoniais que, no todo ou em parte, lhe cumpre, em razão das suas funções, administrar, fiscalizar, defender ou realizar, será punido com a pena de dois a oito anos de prisão maior e multa até um ano.

2. A mesma pena será aplicada às entidades previstas no artigo 2º que, por qualquer forma, receber vantagem patrimonial por efeito de um acto jurídico-civil, relativo a interesses de que ele tinha, por força das suas funções, no momento do acto, total ou parcialmente à disposição, administração ou fiscalização, ainda que sem os lesar.

3. Nos mesmos termos serão punidas as entidades previstas no artigo 2 que receberem por qualquer forma, vantagem económica por efeito de cobrança, arrecadação, liquidação ou pagamento de que, por força das suas funções, total ou parcialmente, estejam encarregados de ordenar ou fazer, posto que se não verifique prejuízo económico para a Fazenda Pública ou para os interesses que assim efectiva.

i) Peculato, art. 313º do CP

Todo o empregado público que em razão das suas funções tiver em seu poder dinheiro, títulos de crédito, ou efeitos móveis pertencentes ao Estado, ou a particulares, para guardar, dispender ou administrar ou lhes dar o destino legal, e alguma

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coisa furtar, maliciosamente levar, ou deixar levar ou furtar a outrem, ou aplicar a uso próprio ou alheio, faltando à aplicação ou entrega legal, será condenado na pena correspondente ao crime de roubo, nos termos do artigo 437º.

§ 1º – Se der dinheiro a ganho, ou emprestar ou pagar antes do vencimento, ou se, estando encarregado da arrecadação ou cobrança de alguma coisa pertencente ao Estado, der espaço ou espera aos devedores, será condenado na pena correspondente ao crime de furto, segundo o valor.

§ 2º – Se der ao dinheiro público um destino para o uso público diferente daquele para que era destinado, será suspenso até seis meses e condenado em multa de 500$ a 3000$00.

§ 3º – As disposições deste artigo e seus parágrafos compreendem quaisquer pessoas que pela autoridade legítima forem constituídas depositários, cobradores ou recebedores, relativamente às coisas de que forem depositários públicos, cobradores ou recebedores.

j) Contrabando e descaminho de direitos, arts. 199, 200 e 201 da Lei n. 2/2006, de 22 de Março (Lei dos Crimes Tributários)

Art. 199 (Fraude fiscal)

1. Será punível com pena de multa de 30.000.000,00Mt até 500.000.000,00Mt, quem determinar a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias, quando:

a) ocultar ou alterar factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou de escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração tributária especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável;

b) ocultar ou alterar factos ou valores que devam ser revelados à administração tributária;

c) celebrar negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas.

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2. Para efeitos do disposto nos números anteriores, os valores a considerar são os que, nos termos da legislação aplicável, devem constar de cada declaração a apresentar à administração tributária.

3. A tentativa e a frustração são puníveis nos termos do Código Penal.

4. A cumplicidade e o encobrimento são puníveis nos termos do Código Penal.

5. No caso de reincidência nos comportamentos previstos neste artigo ou acumulação de infracções, a pena de multa acresce a pena de prisão até 2 anos.

Art. 200 (Fraude fiscal qualificada)

1. Os factos previstos no artigo anterior serão puníveis com pena de prisão maior de 2 a 8 anos e com pena de multa de 100.000.000,00Mt a 3.500.000.000,00Mt, quando se verifiquem as circunstâncias seguintes:

a) O agente for funcionário público e tiver abusado gravemente das suas funções;

b) O agente se tiver socorrido do auxílio de funcionário público com grave abuso das suas funções;

c) O agente falsificar ou viciar, ocultar, destruir ou inutilizar livros, programas ficheiros informáticos e outros documentos ou elementos probatórios exigidos pela lei tributária;

d) O agente utilizar os livros ou quaisquer outros elementos referidos no número anterior, sabendo-os falsificados ou viciados por terceiros;

e) Tiverem sido utilizadas pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território moçambicano e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável;

f) O agente tiver actuado juntamente com outro ou outros com quem se encontre em relações especiais.

2. A tentativa e a frustração são puníveis nos termos do Código Penal.

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3. A cumplicidade e o encobrimento são puníveis nos termos do Código Penal.

4. Os comportamentos descritos nas alíneas c) e d) do n. 1 são puníveis autonomamente se pena mais grave lhes couber.

5. Se no mesmo facto concorrer mais do que uma das circunstâncias referidas no n. 1, só é considerada para a determinação da pena aplicável a que tiver efeito agravante mais forte, sendo a outra ou outras valoradas na medida concreta da pena, como circunstâncias e carácter geral.

Art. 201 (Abuso de confiança fiscal)

1. Quem se apropriar total ou parcialmente de prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar a entregar à administração tributária, será punido com pena de multa de 15.000.000,00Mt a 300.000.000,00Mt.

2. Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se também prestação tributária a que for deduzida por conta daquela, bem como aquela que tendo sido recebida, haja obrigação legal de a liquidar, nos casos em que a lei preveja.

3. Se nos casos previstos nos números anteriores a prestação não entregue for superior a 500.000.000,00MT, o agente será punido com pena de multa de 500.000.000,00MT a 3.000.000.000,00MT.

4. Para efeitos do disposto nos números anteriores, os valores a considerar são os que devam constar de cada declaração a apresentar à administração tributária.

5. A tentativa e a frustração são puníveis nos termos do Código Penal.

6. A cumplicidade e o encobrimento são puníveis nos termos do Código Penal.

7. No caso de reincidência no comportamento previsto no n. 3 deste artigo ou acumulação de infracções, a pena de multa acresce a pena de 2 a 8 anos de prisão maior.

8. Para efeitos do presente artigo, considera-se haver apropriação quando decorridos mais de 90 dias sobre o termo

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do prazo legal para a entrega da prestação sem que esta se tenha verificado.

Este é o leque de infracções relativamente às quais são possíveis a incriminação e a punição pelo crime de branqueamento que tenha na sua origem a prática de um desses delitos12.

Atendendo ao estabelecido naquela recomendação do Gafi, verificamos que Moçambique ainda não incluiu na tipificação de crime antecedente os crimes praticados pela organização criminosa contra o sistema financeiro, o tráfico de seres humanos e tráfico de emigrantes; a exploração sexual, incluindo a exploração sexual infantil; a contrafacção e pirataria de produtos; crimes ambientais; homicídio e ofensas corporais graves; rapto, detenção ilegal e tomada de reféns e utilização abusiva de informação privilegiada e manipulação do mercado. Não obstante se tratar de normas que não são vinculativas para os Estados, elas constituem um padrão internacional de combate ao branqueamento pelo que se impõe a sua inclusão no nossa lei de modo a adequar-se às normativas internacionais.

3.2.2 Relação entre crime antecedente e crime de branqueamento

Existe uma relação de acessoriedade material entre o crime de branqueamento e o crime antecedente de tal forma que, sem a ocorrência deste, não há como tipificar aquele. Se, por exemplo, o crime antecedente deixar de ser tipificado como crime, por consequência, desaparecerá o crime de branqueamento baseado nesse crime. Contudo, a melhor doutrina ensina que tal acessoriedade não é máxima, mas sim limitada, ou seja, para se punir alguém pelo crime de branqueamento, basta a prática de um facto típico e

12 Para Jorge dos Reis Bravo (2010, p. 139), o problema do conteúdo do “catálogo” de crimes é, em grande medida, um problema de opção político-criminal, que partirá de pré-compreensões do legislador em função da realidade criminológica e económico-financeira com que se depara. Naturalmente que, sem pretender beliscar a legitimidade do legislador moçambicano, que reserva a punibilidade do branqueamento a infracções de natureza exclusivamente criminal − o que se aplaude − poderia o processo legislativo moçambicano evoluir no sentido das tendências que emanam de instrumentos normativos internacionais e que preconizam a consideração como crime precedente de infracções puníveis com pena de prisão de duração mínima de seis meses e máxima de superior a cinco anos.

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antijurídico anterior, não sendo necessária a verificação dos elementos culpabilidade e punibilidade. Assim, por exemplo, mesmo que o agente do crime antecedente seja absolvido por questões formais, como a falta de provas, é possível a punição do autor do crime de branqueamento, atento à autonomia de um crime em relação ao outro.

Em conclusão, podemos aferir que o crime de branqueamento depende do crime antecedente, mas apenas em parte.

Questão muito debatida na doutrina é a de saber se, caso o agente do crime antecedente seja também do crime precedente, estaríamos em face de um concurso material de infracções, no sentido daquele ser punido tanto pelo crime antecedente como pelo do branqueamento.

Se a conduta do agente preenche, abstractamente, as previsões normativas dos crimes antecedentes e do branqueamento, teremos efectivamente uma situação de concurso de normas. Só pode, de facto, ser punido pela prática, em concurso real, de dois crimes quem puder ser autor de ambos. Se o autor do crime precedente não puder ser o autor do crime posterior, o branqueamento, não haverá possibilidade de, em relação a ele, se colocar o problema do concurso. O mesmo se pode dizer quando sejam diversos os agentes do crime precedente e o do branqueamento, pois que, nesta situação, teremos dois agentes, cada um respondendo pelo seu crime, um pelo antecedente, outro pelo branqueamento.

Há, contudo, que indagar se, sendo o(s) mesmo(s) agente(s) do crime precedente e do branqueamento, pode(m) ser responsabilizado(s) por ambos os crimes, em concurso efectivo. Por outras palavras, o autor do crime antecedente pode ser autor do crime de branqueamento? Não estaríamos a violar o princípio ne bis in idem?

A solução do problema depende, em grande medida, da resposta que dermos sobre qual o bem jurídico protegido num e noutro crime.

Afigura-nos ser mais conforme aos princípios e razões de ordem político-criminal que se deve aceitar a solução da punibilidade em concurso real, efectivo, pelos crimes antecedentes

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e o de branqueamento, quando seja(m) o(s) mesmo(s) o(s) agente(s) responsáveis pelas respectivas condutas típicas. Por exemplo, se o autor do crime precedente de tráfico de estupefacientes é o mesmo do crime de branqueamento, este deve ser punido em concurso efectivo por um e por outro crime, visto serem diferentes os bens jurídicos subjacentes em cada uma das condutas. Há condutas típicas que preenchem o tipo legal do crime antecedente que são diferentes das condutas típicas do crime de branqueamento.

3.3 Investigação e processo

A lavagem de capitais pode ser definida de várias maneiras, entretanto, a maioria dos sistemas adopta a definição oferecida pela Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas, de 1988 (Convenção de Viena), e pela Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional, de 2000 (Convenção de Palermo). Naquelas, o branqueamento é definido como a conversão ou a transferência de bens, quando o autor tem o conhecimento de que os bens são provenientes de qualquer infracção ou de participação em tal infracção com o fito de dissimular ou ocultar a origem ilícita desses bens ou de ajudar qualquer sujeito incurso nessas infracções a furtar-se à acção da justiça ou às consequências jurídicas da sua conduta ou ainda como a dissimulação ou ocultação da verdadeiara origem, localização, disposição, movimentação, propriedade de bens ou direitos a eles relacionados, tendo o agente plena consciência de que advém de uma actividade ilícita ou de uma infracção.

No branqueamento, o agente utiliza e transforma produtos de origem criminosa com vistas a dissimular a sua origem ilícita, legitimando os ganhos ou proventos gerados na actividade criminosa.

Nos termos da legislação moçambicana em vigor, no caso, da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, norma que estabelece o regime jurídico de prevenção e repressão da utilização do sistema financeiro para a prática de actos de branqueamento de capitais, bens, produtos ou direitos provenientes de actividades criminosas, o branqueamento

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de capitais é definido como sendo a actividade que consiste na transformação lícita de bens, produtos ou direitos provenientes de actos ilícitos.

Portanto, a lavagem de dinheiro é um processo de legitimação de capital sujo, com a finalidade de ocultar ou disfarçar a sua proveniência ou origem criminosa.

Uma das principais vias utilizadas pelos branqueadores de capitais são os bancos, pois, para além de facilmente lograrem seu propósito principal, qual seja, a introdução do dinheiro sujo no sistema financeiro formal, procuram garantir a segurança dos valores, reconhecida que é a eficácia de alguns bancos neste particular aspecto.

Ora, se assim é, então, os operadores bancários devem manter uma estrita e permanente colaboração com o MP e outras entidades, tal como o Gifim, envolvidas no combate a este mal.

Assim, por exemplo, os bancos devem adoptar políticas internas que permitam actualização periódica do cadastro de seus clientes para um melhor conhecimento, comunicando urgentemente ao sector de supervisão bancária sobre aquelas operações que à partida se afiguram suspeitas e, por sua vez, a supervisão bancária, por dever de ofício, accionará o Ministério Público.

As instituições financeiras devem prestar atenção naquelas transacções que envolvem somas monetárias bastante elevadas, cobrando documentação de prova que legitime a sua proveniência. Na falta de tal documentação, deverá abster-se de executar a operação, accionando imediatamente o MP, por via do sector de supervisão bancária.

Na verdade, para reduzir tanto quanto possível a acção dos branqueadores de capitais, as instituições financeiras devem, no âmbito permitido por lei, promover e estabelecer estritos intercâmbios com autoridades judiciais e policiais, sem pôr de lado a possibilidade de indicar um funcionário que actuará como uma espécie de charneira,

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neste eixo, o qual receberá todas as denúncias sobre operações suspeitas de branqueamento de capitais.

Assim, quando as instituições financeiras tomam conhecimento de factos que resultem presunção razoável de que os fundos usados na celebração de contratos de parceria, concessão de créditos e outras formas de financiamento, apólices de prémio único, entre outras originam-se de actividades criminosas, devem ser tomadas medidas apropriadas que sejam consistentes com a legislação em vigor e tendo em atenção as obrigações contratuais, como, por exemplo, a recusa em prestar assistência ao cliente ou cessar vínculo com este e congelar o resgate da apólice, entre outras medidas atinentes.

O objectivo primordial dos lavadores de dinheiro não é o lucro, mas, como dito precedentemente, a dissimulação da origem do capital. Ora, se eles não estão preocupados com o lucro e injectam o dinheiro no sistema financeiro dessa forma, o que vai acontecer é a distorção da economia do país e da própria soberania do Estado. Na verdade, os lavadores de dinheiro fazem-no por via de negócios que seriam considerados “muito ruins”13, segundo regras de economia e os princípios da administracção. Isso pode acontecer, por exemplo, quando se utiliza da técnica de compra de passivos: empresas endividadas ou falidas são compradas por preços irreais e usadas mais tarde como fachadas para novas transacções.

Para além daqueles sofisticados mecanismos, segundo o relatório final do Seminário sobre o branqueamento de capitais, realizado em Matola em Junho de 2003, os branqueadores usam a estratégia de preços fictícios, declarações de transacções inexistentes, incentivo ao contrabando, recurso à utilização de contas móveis através de transferências de fundos com destino a uma multiplicidade de contas num curto período de tempo, constituição de off shore trusts como meio de escamotear o real proprietário dos fundos oficiais provenientes de ajuda para utilização em fins pessoais, falsos benefícios que aparentemente advêm dos fundos branqueados face

13 Confira: <http://siteresource.worldbank.org/>.

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às necessidades financeiras dos países (quanto maior for o nível de ajuda externa que um país da sub-região de África é receptor, maior será a sua vulnerabilidade ao branqueamento de capitais), existência de indivíduos que desejam perpetuar-se mediante a construção de “altos muros circundando as suas posições/cargos” para fortalecimento dessas mesmas posições de modo que, efectivamente, o branqueamento de capitais possa prosseguir o seu curso, relutância em adoptar nas empresas códigos de ética e conduta, para que elas possam actuar como melhor lhes aprouver, o depósito de cheques cruzados em contas distintas das dos beneficiários, entre outros.

Os cassinos constituem outra via de lavagem de dinheiro, mormente, pelo emprego de combinações de apostas que se destinam a não perder muito ou nenhum dinheiro, como é o caso de apostas que se cancelam mutuamente.

Obviamente, este tipo de criminalidade visa, em parte, obter lucro ou vantagem patrimonial e, então, reconhecendo os branqueadores a ilícita proveniência dos valores, bens ou direitos, empregam uma série de artifícios na sua gestão para que não sejam facilmente descobertos pelas autoridades.

A prática mais comum para lograr aquele objectivo há de ser a ocultação das fontes, dos proprietários, sempre que possível transferindo os valores, movimentando-os tantas vezes quantas possível, criando interpostas pessoas, sejam elas singulares sejam elas colectivas (testas de ferro), distanciando-os cada vez mais da origem, tornando dessa forma difícil a recomposição das pistas que possam levar os investigadores à descoberta do crime.

Uma vez alcançada a ocultação ou a dissimulação, o agente reinveste o valor numa actividade inserida na economia legal, de tal sorte que transpareça tratar-se de bem cuja proveniência ou origem é lícita.

Portanto, ao agente branqueador de capitais é fundamental aquela actividade, pois que, por meio dela, para além do resultado imediato, que é o lucro, aplica o dinheiro em novos crimes, mas sempre com a preocupação de ocultar as suas operações, por forma

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a minimizar o risco de ser descoberto pelas autoridades policiais ou do MP.

Assim, o lucro não é o principal objectivo de quem pratica a lavagem de dinheiro, pois que casos há em que o dinheiro é investido em actividades pouco rentáveis, em claro prejuízo à economia do país, como foi dito precedentemente. Na verdade, o agente preocupa--se é com a protecção dos seus ganhos, disfarçando tanto quanto possível sua ilícita origem.

Nos termos da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, os tipos legais de crimes que se relacionam com a lavagem de capitais são os elencados no artigo 4, n. 1.

Parece que a lei nos fornece uma enumeração taxativa, atento à expressão determinativa empregue, qual seja, “dos crimes”. Ora, se assim é, abre-se uma lacuna legal, na medida em que existem infracções que, pela sua natureza, envolvem muito dinheiro, quais sejam, o tráfico de pessoas, de emigrantes, de órgãos humanos, entre outras, que hodiernamente vão ganhando corpo no nosso país, daí que sugerimos uma reforma pontual da lei para nela se introduzir uma redacção que possa abranger mais infracções.

O crime de branqueamento de capitais depende da existência de um crime antecedente que por força daquele comando normativo deverá ser um dos ali elencados.

Como foi dito, quem pratica a lavagem de capitais preocupa--se tanto quanto possível em administrar os proventos da actividade de tal forma que a sua movimentação ou o seu uso não desperte atenção.

A lavagem de capitais não é problema apenas de Moçambique, pois que tem dimensão mundial, agregando organizações criminosas de reconhecido poder, que, por via de suas actividades e dinheiro “sujo”, põem em causa o sistema económico e financeiro e a soberania do Estado, podendo minar o Estado de Direito.

Portanto, é um problema que preocupa a globalidade dos países, pois que a lavagem de dinheiro é usada por organizações

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criminosas sofisticadas envolvidas em criminalidade perigosíssima, de natureza económica, financeira, com vistas a introduzir no sistema financeiro legal fundos provenientes de actividades ilícitas. Depois de “purificado”, o dinheiro é utilizado por essas organizações para, por exemplo, ascenderem a posições vitais da economia, na sociedade e na arena política. Daí que, em 1989, foi constituído o Gafi (Group d`Áction Financière surle blanchiment de capitaux) ou (FATF) (Financial Action Task Force on Money Laundering), com o propósito de combater acções dos criminosos em branquear os rendimentos de actividades criminosas através do sistema financeiro.

Visando aquele propósito, o Gafi preparou quarenta recomendações cobrindo o sistema judicial na área penal e aplicação das leis, o sistema financeiro e a sua regulamentação e a cooperação internacional contra o branqueamento de capitais.

Em Outubro de 2001, o Gafi expandiu o seu âmbito, passando a abarcar a temática relacionada com o financiamento ao terrorismo, tendo produzido recomendações específicas relativas a esta questão do financiamento ao terrorismo, as quais voltaram a ser objecto de actualização em Outubro de 2004.

Refira-se que estes dois últimos pacotes de recomendações, que acabaram por ser baptizados de “40+9”, vieram fixar um quadro transnacional para identificar, prevenir e suprimir as actividades de branqueamento de capitais e de financiamento ao terrorrismo, mas antes aquelas quarenta recomendações do Gafi14 foram objecto de revisão em Junho de 2003.

Segundo o mencionado relatório do Seminário sobre o branqueamento de capitais15, as principais modalidades de branqueamento de capitais são duas, designadamente, a implementação de medidas para escamotear a conexão entre fundos/valores activos e as ofensas/crimes que deram origem à existência de tais fundos e o

14 Em 16 de fevereiro de 2012, o Gafi publicou as Recomendações Gafi revisadas, sob o título “Padrões Internacionais de Combate à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo e da Proliferação”, em que revisou e identificou as jurisdições com base nas 40+9 Recomendações Gafi, de 2003.

15 Relatório final do Seminário sobre o branqueamento de capitais, 2003, p. 5.

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recurso a procedimentos para escamotear a verdadeira propriedade/ligação aos fundos já branqueados, num esforço pra esconder os crimes que originaram os fundos branqueados, bem como dissimular a fase primária do processo de branqueamento.

Ainda segundo o mesmo relatório, o branqueamento de capitais está ligado, entre outras, às seguintes actividades:

� tráfico de drogas;

� obtenção de fundos provenientes de assaltos a meios de transporte de valores (código “ice” na RSA) com recurso a armas de fogo;

� prática de actos de corrupção (que geram o branqueamento de fundos que são exportados – outward laundering – sendo o caso mais conhecido os milhões de dólares drenados pelo falecido presidente nigeriano Abacha);

� geração de fundos com origem primária no contrabando de armamento;

� roubo e transacções de viaturas roubadas;

� existência de sindicatos de crime e suas ligações transnacionais;

� ligações entre o branqueamento de capitais e outros crimes, designadamente, contrafacção de notas, tráfico de drogas, contrabando de armas, prática de actos de pirataria, terrorismo e actos de corrupção;

� acordos e contratos ilegais com minerais e outros recursos naturais preciosos (um dos métodos usados na região austral de África é o denominado pela polícia sul-africana por salting, em que um determinado prospector, após haver sido legalmente licenciado para explorar diamantes numa certa área concessionada, passado algum tempo dá a conhecer às autoridades do sector que descobriu minerais, para o que lhe é concedida licença para exploração comercial do produto, mas a declaração de proventos não será a de diamantes daquela área que consta do registo das autoridades, mas de uma outra zona. A referida

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área serve de base pra obtenção de certificação de diamantes originários de outros locais, sobretudo, de zonas sob situações de conflito);

� existência de transacções não documentadas (ou seja, realizadas sem registo), especialmente no sector informal da economia, associadas à existência de economias predominantemente assentes em transacções em dinheiro vivo. Tal ocorre nas transacções com bens sujeitos a registo em que o título de propriedade (title deeds) sequer é registado, porque tal procedimento nem sequer é parte integrante da ordem jurídica de alguns países da região, por exemplo, o Quénia), muito embora o cidadão possa, nesses mesmos países, ser proprietário de bens imóveis;

� existência de imigração ilegal;

� envolvimento directo de centros financeiros off shore (centros financeiros fora do controlo fiscal), como chegaram a sê-lo as Ilhas Maurícias no período anterior àquele em que este país optou por tomar um conjunto de medidas visando proteger o seu sistema financeiro contra as operações dos branqueadores de fundos. Aliás, a lavagem de dinheiro faz parte do mundo da

criminalidade organizada e esta, como é sabido, regra geral, sempre andou à frente do direito penal, ou seja, desenvolve para sua protecção meios (humanos e tecnológicos) mais sofisticados que os colocados a dispor da investigação criminal.

Quem pratica a lavagem de dinheiro não é nenhum tolo, não se expõe, por isso, às garras da Justiça e, para lograr este propósito, investe o próprio dinheiro que obtém da actividade ilícita na aquisição de sofisticados meios de protecção ou encobrimento do crime.

Os mecanismos comumente usados no branqueamento de capitais têm sido a utilização de contas “bancárias móveis”, constituição de off shores trusts, funcionamento dos off shores trusts nos off shores centres, smurfing, contrabando, aquisição de negócios falidos (para “emprestar” uma face legal aos negócios através dos

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quais se procede à canalização de fundos ilegais), uso de preços fictícios, declaração de transacções inexistentes, constituição de “empresas de fachadas ou empresas fantasmas16.

Na verdade, o branqueamento de capitais é por vezes levado a cabo por autênticas organizações criminosas que se caracterizam por estrutura hierarquizada do estilo piramidal, muito comum no tráfico de drogas, de tal sorte que os diversos agentes envolvidos não se conhecem. Isso não é por mero capricho organizacional, mas antes para evitar que, com a descoberta de um, se possa “queimar” a cadeia piramidal.

Ora, agindo o agente nestes termos, fácil se depreende que a investigação sobre a lavagem de activos não é tarefa fácil, exigindo, por isso, actuação eficaz dos agentes da Polícia de Investigação Criminal, dos magistrados do MP e sempre com a imprescindível colaboração das instituições financeiras e de outras que possam ajudar a encontrar a trilha do dinheiro sujo. As instituições financeiras devem empenhar-se na determinação da verdadeira identidade de todos os clientes.

Todos os bancos comerciais, casas de câmbios, seguradoras, entre outras devem instituir procedimentos efectivos para obter a identificação de novos clientes.

Como medidas adicionais tendentes ao combate ao branqueamento de capitais, as instituições financeiras devem:

� adoptar procedimentos apropriados referentes à manutenção interna dos registos relativos aos seus clientes;

� estabelecer procedimentos e políticas que possam habilitar os seus profissionais em ferramentas que lhes permitam detectar indícios de transacções suspeitas que devem ser imediatamente denunciadas às autoridades competentes, no caso, o Ministério Público;

� potenciar na permanente formação dos seus trabalhadores em matéria de identificação de operações suspeitas de branqueamento de capitais;

16 Relatório final do Seminário sobre o branqueamento de capitais, 2003, p. 12.

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� adoptar mecanismos eficazes para identificação daqueles clientes que se enquadrem nas chamadas Pessoas Politicamente Expostas (PEPs) – pessoas singulares que exerçam ou tenham exercido proeminentes funções públicas, dentro ou fora do país, por exemplo, funcionários públicos séniores, oficiais de justiça, oficiais militares, políticos influentes ou de relevo, ex-presidentes da República ou chefes de governo).

É necessário, outrossim, que se invista na especialização de corpos de magistrados judiciais e do Ministério Público (e não na criação de tribunais especiais) com vistas ao combate deste mal. As acções não devem parar pela formação, mas também na regular capacitação desses magistrados e ainda na criação de meios materiais, financeiros e logísticos necessários aos desafios que o combate ao branqueamento de capitais apresenta à Justiça moçambicana.

Para além do factor organizativo, os agentes branqueadores de capitais introduzem o dinheiro sujo na economia legal, atribuindo-o aparência lícita. Então, como investigar este tipo legal de crime gizado meticulosamente ao pormenor pelos seus mentores?

Doutrinariamente são avançadas duas vias para investigação do branqueamento de capitais, a saber:

a) sentido cronológico ou directo e;

b) sentido inverso ou da UIF.

Pelo primeiro sentido, entende-se que a investigação tem de partir do crime antecedente para se apurar a lavagem.

Pela segunda via, a investigação deve partir da lavagem de capitais até se descortinar o crime antecedente. Entretanto, a esta segunda via aponta-se-lhe inconveniente que tem a ver com a dificuldade de se apurar o crime antecedente do branqueamento, naqueles casos em que se mostra imprescendível o envolvimento, no processo investigativo, de outros países, cujos sistemas jurídicos--penais não tipificam como crimes, por exemplo, a evasão de divisas ou a sonegação.

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Ora, para investigar com eficiência casos de lavagem de dinheiro, não basta que as instituições financeiras tenham pessoal dotado de conhecimentos para identificar indícios de lavagem; não basta que aquelas instituições adoptem medidas que assegurem uma fiscalização ou supervisão para verificar com certa regularidade o cumprimento dos procedimentos inerentes à actividade de branqueamento de capitais; não basta a sua colaboração com as autoridades policiais e judiciais; é imprescindível a especialização dos magistrados judiciais e do Ministério Público e dos auxiliares deste, no caso, da PIC, para o combate deste tipo de criminalidade, sem se deixar de parte o providenciamento de recursos à altura do problema.

Na verdade, não basta um quadro legal ou medidas legislativas despidas de recursos financeiros para sua materialização, pois, de contrário, transformar-se-ão em letra morta, ou seja, candidatar-se-ão irremediavelmente ao malogro.

Portanto, no caso do nosso país, Moçambique, é imprescindível, conforme dito precedentemente, que, para o combate daquele tipo de delito, os magistrados, quer do Ministério Público, quer judiciais, tenham especialização para lidar com o problema que é uma das maiores fontes de distorção da economia do país, na medida em que, tendo por fito ocultar a origem ilícita do capital e dificultar as investigações, os agentes envolvidos no branqueamento de capitais aplicam o valor em actividades ineficientes, ou seja, as decisões do seu investimento não decorrem de uma motivação económica normal, mas sim do objectivo de injectar, misturando o rendimento de actividade ilícita com dinheiro limpo, ou de proveniência lícita.

O branqueamento de capitais não se combaterá apenas com adopção de medidas legislativas. Moçambique possui legislação inerente, designadamente, a Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, e a Lei n. 14/2007, de 27 de Julho (Gifim), todavia, elas não terão eficácia desejada sem especialização de recursos humanos que devam combater o delito, nem sem alocação de recursos financeiros à altura.

A par daquelas duas medidas, é necessária a pronta colaboração das instituições financeiras ou dos operadores bancários

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e outras instituições onde se suspeite que para lá haja sido injectado ou aplicado dinheiro de origem ilícita.

O Ministério Público deve ter acesso directo aos dados necessários para alavancar a investigação em caso de suspeita de branqueamento de capitais. Na verdade, não faz o mínimo sentido que o Ministério Público não tenha acesso, por exemplo, às certidões de registo predial, de registo de entidades legais, de registo de importação de viaturas, de organizações não governamentais, dos extractos de conta bancários, de chamadas telefónicas, entre outros.

O mecanismo processual usual no nosso sistema judicial, que consiste na obtenção daqueles dados por via de expedição de ofício, não é tecnicamente compatível com a velocidade com que actua a criminalidade organizada. Enquanto a justiça prepara um ofício a alguma instituição financeira para recolher determinada informação, o visado pode facilmente tomar conhecimento do facto e aí desfazer as provas ou tomar medidas tendentes a ocultar aqueles aspectos indiciadores do branqueamento de capitais.

Não funcionarão ainda aquelas leis se elas não sofrerem alteração pontual, permitindo-se, por exemplo, o emprego de determinadas técnicas de investigação, como sejam, a infiltração de agentes, a vigilância controlada, uso de alvíssaras ou recompensa, escutas telefónicas, intercepção de correspondência, a protecção de testemunhas e declarantes, para além, claro, do alargamento do leque de crimes relaccionados, pois, conforme dito precedentemente, a Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, faz uma enumeração taxativa dos tipos legais de crimes que possam estar relacionados com o branqueamento de capitais.

Para além daquela inconveniente limitação, naquela lei surpreendemos uma contradição que merece esclarecimento a bem da justiça.

Com efeito, os n. 1 a 4 do artigo 2 daquele diploma legal parece indicar limitar o âmbito da sua aplicação a “pessoas colectivas”, pois ali não há referência alguma a pessoas singulares ou físicas. Todavia, e aqui reside a contradição, na tipificação, cujo texto consta do artigo

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4, constatamos o emprego de um termo (“Todo aquele que […]”) que parece admitir que a lei aplica-se também às pessoas singulares.

Reforçamos ainda a nossa percepção de que a lei possa ser aplicada a pessoas singulares quando, no artigo 10, é imposta às instituições financeiras a rigorosidade na identificação de seus clientes.

Aliás, pela leitura ao disposto no n. 5 do mesmo artigo, constatamos que se admite a possibilidade de não se tratar de pessoa colectiva.

Conforme dito precedentemente, é preciso que se faça o devido esclarecimento, sabido que, em matéria criminal, não é permitida a interpretação extensiva.

Na investigação de um caso de lavagem de dinheiro, é importante preliminarmente prestar atenção para a forma como a informação ou a notícia sobre a existência do delito chega ao conhecimento das autoridades – se por anonimato ou fonte aberta – e em seguida verificar a probabilidade da sua investigação e depois determinar o sentido do que foi apurado.

Assim, identificando-se qual o crime precedente, adaptar--se-á o sentido normal. Aqui o investigador deverá identificar o mecanismo usado na lavagem do dinheiro, empregando as técnicas anteriormente indicadas, incluindo-se aqui as diligências judiciais de buscas e aprensões e expedindo-se ofício ao Gabinete de Informação Financeira de Moçambique (criado pela Lei n. 14/2007, de 27 de Junho) para apurar se sobre a pessoa investigada teria havido alguma comunicação suspeita.

Desconhecendo-se o crime precedente, deve-se procurar saber se a informação provém de terceiros, colher informação do Gifim quanto a se houve ou não participação anterior contra o suspeito, recolhendo-se toda documentação inerente no caso afirmativo. Depois, será necessário verificar se o suspeito já esteve envolvido anteriormente em algum dos crimes antecedentes elencados na lei e relaccionados com a lavagem de capitais.

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Ao apurar seu anterior envolvimento, deve-se solicitar o respectivo processo para ali verificar se houve similitude no modus operandi.

O âmbito das investigações poderá estender-se às pessoas próximas ou das relações do visado, com vistas a apurar-se a teia criminosa.

É preciso não perder de vista que, por vezes, alguns responsáveis de instituições financeiras têm tido actuação conivente ou cúmplice face às operações que, à partida, indiciam lavagem de dinheiro, as chamadas operações suspeitas; daí que, para além de as investigações terem de ser extensivas às pessoas próximas do suspeito, elas terão de ser igualmente extensivas aos responsáveis das instituições financeiras, os indiciando pelo delito de branqueamento de capitais.

Ainda relativamente à conivência por parte dos trabalhadores das instituições financeiras, que pode ser caracterizada pela não comunicação ao Gifim sobre operações suspeitas, aquela decorre por vezes do facto de os donos daquelas instituições serem indivíduos da elite política do país ou a elas ligadas ou de alguma forma influentes.

Assim, tendo tais pessoas conhecimento de que suas firmas foram propositadamente criadas com o fim último de branqueamento de capitais, ou estão sendo usadas para aquele fim, obviamente que não deixarão de instruir os seus empregados para que tenham atitude omissiva perante operações que se enquadrem naquele âmbito.

Um dos maiores desafios ou obstáculos ao combate do crime de branqueamento de capitais reside precisamente quando os envolvidos são as chamadas personalidades da elite política do país, as quais têm também participação na vida empresarial, pessoas economicamente influentes, ainda que não sejam necessariamente políticas, e também pessoas que por qualquer razão ou mister ganham alguma notoriedade no meio social onde se acham inseridas.

Nesses casos, entendemos que as investigações deverão abranger os proprietários dessas instituições financeiras, sem olhar para a sua posição no xadrez político nacional, sua notoriedade,

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sua influência, em suma, sua privilegiada situação socioeconómica, procedendo-se ao garimpo de toda a informação que for pertinente para apurar o seu envolvimento ou não no delito de lavagem de capitais.

Neste caso concreto, dever-se-ia estimular a denúncia recompensada e não se deve recear por despesas decorrentes deste tipo de denúncia, pois aquelas seriam largamente compensadas pela recuperação dos activos.

É preciso que se diga que, neste particular caso, os investigadores enfrentarão enormes dificuldades no seu trabalho em razão das privilegiadas posições dos visados.

Julgamos que não basta a existência do quadro legal que preconize o combate ao delito de branqueamento de capitais, sendo, pois, necessário que os investigadores estejam dotados de mecanismos que os permita trabalhar sem depender da vontade política, daí, no nosso entender, o recurso aos serviços de inteligência, que deverão trabalhar em estreita colaboração com o Ministério Público, tal como acontece em países como o Brasil.

3.4 Como investigar um caso suspeito de branqueamento de capitais

Atente-se para a seguinte hipótese: a cidadã MANUELA VIAJANTE, titular de uma conta no Banco “SACO AZUL”, efectuou, no dia 13 de Janeiro de 2012, depósito de dois milhões de Meticais em numerário, tendo declarado, quando questionada pelo empregado bancário que a atendeu, que se tratava de dinheiro deixado a título de herança pela avó, que em tempos trabalhou numa fábrica de calçados, localizada algures na cidade da Matola. Entretanto, quando mais uma vez questionada por um outro empregado do mesmo banco sobre a proveniência do montante, respondeu que eram poupanças de seus ganhos fora do país, nomeadamente na África do Sul e Suazilândia, onde era “garota de programa em clubes nocturnos”.

Perante um caso desse, que procedimentos devem ser tomados?

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a) O empregado bancário deve colher identificação completa, comprovando-a com documento válido, caso seja novo cliente (tratando-se de quem já é titular de uma conta naquele banco, já deixou registada sua identificação no acto de sua abertura), seguidamente dará a conhecer (denúncia nos termos dos artigos 160º, n. 1, do CPP, e 6 e 9 do Decreto-Lei n. 35.007, de 13 de Outubro de 1945) sobre a operação ao Sector de Supervisão do Banco que, por sua vez, está obrigado igualmente a informar o Ministério Público, nos termos do n. 1 do artigo 20 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro.

b) Uma vez remetido o processo contendo a informação suspeita ida do sector de supervisão bancária ao Ministério Público e tratando-se de crime de natureza pública, esta instância promoverá o competente procedimento criminal, dando-se assim o início da instrução preparatória (DL n. 35.007, de 13 de Outubro de 1945, arts. 12 e ss), no âmbito da qual se solicitará ao poder judicial (ao Juiz de Instrução Criminal) a quebra do sigilo bancário, do sigilo telemático e telefónico, nos termos do n. 1 e 2 do artigo 1 da Lei n. 9/1992, de 6 de Maio, para que se possam verificar e analisar o movimento bancário, pessoas com quem se comunica a pessoa visada. Deverão ser requisitadas, nos termos do disposto no artigo 92º do CPP, cópias ou originais de todos os documentos exigidos ao visado no acto de abertura da conta e outros que porventura os haja oferecido a posterior, alterando ou actualizando algum deles. Deverá ser colhida informação sobre ocupação profissional da visada, seus rendimentos e sobre outras contas que possa ter dentro e fora do país. Às autoridades de Migração deverá ser solicitado o movimento migratório da visada de e para África do Sul e Suazilândia. Caso a visada tenha avançado com indicação de nomes dos clubes nocturnos por si frequentados naqueles dois países estrangeiros, os investigadores deverão, caso se mostre necessário, aferir a existência física de tais estabelecimentos, por carta rogatória. Serão ainda realizadas diligências de prova tendentes à confirmação da alegada relação laboral da avó da

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visada e, se possível, seu salário ou a totalidade de montante salarial que auferiu durante os anos em que esteve ligada a tal fábrica de calçado que, para tanto, deverá ser identificada e confirmada sua existência legal, junto à conservatória das entidades legais. Na instrução preparatória, deverá ser levado em conta, de entre outros, o facto de a indiciada ter oferecido justificações contraditórias relativamente à proveniência do dinheiro, uma vez que é sintomático de ilicitude.

c) Finda a instrução preparatória e havendo sido produzida prova indiciária bastante, o MP deduzirá a acusação, observando o disposto no artigo 359º do CPP, ou seja, o nome do acusador, sua profissão e morada, se não for o MP, o nome da arguida, sua profissão e morada, quando conhecidos, e quaisquer outras indicações necessárias para determinar a sua identidade, a narração discriminada e precisa dos factos que constituem a infracção, indicando, se possível for, o lugar e tempo em que foram praticados, o motivo por que o foram, o grau de participação que nele teve a acusada e as circunstâncias que precederam, acompanharam ou seguiram a infracção e que possam constituir agravantes ou atenuantes. A indicação da lei que proíbe o facto e o pune. O rol de testemunhas, com seus nomes, profissões e moradas ou outros sinais necessários para a sua identificação e indicação das demais provas. Por fim, o local, a data e assinatura do acusador.

Em face do caso prático acima enunciado, o seu julgamento poderá levar-nos à conclusão de que a visada estava incursa no delito de branqueamento de capitais ou então num outro, que poderá ser de natureza fiscal.

3.5 Autonomia entre o crime antecedente e o branqueamento

O crime de branqueamento exige a preexistência de um delito, de um facto tipificado como crime, ou seja, conforme dissemos

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anteriormente, depende da existência de um crime anterior, sendo que não se exige que se faça prova da autoria ou que tal autor haja sido responsabilizado (condenado), bastando tão somente que existam elementos típicos que apontem para a existência de um crime antecedente.

O crime de lavagem de dinheiro não tem por objecto o crime antecedente, daí que não se mostra necessário fazer-se a prova dos elementos materiais daquele delito, mas sim que se faça prova que o objecto do delito da lavagem é fruto de um crime precedente, exigindo-se desta forma prova da existência do crime antecedente. Dito doutro prisma, é normalíssimo que possa haver punição do crime de branqueamento, ainda que o crime antecedente não tenha sido punido, bastando, pois, que sejam recolhidas ou apuradas provas bastantes sobre a ilícita proveniência dos bens.

Na mesma esteira de pensamento, não se levantam aspectos que tenham a ver com autoria ou culpa do crime relacionado.

Pelo o acima dito, conclui-se que existe certa autonomia material entre o crime antecedente e a lavagem de capitais e que se não deve condicionar a punição do crime da branqueamento à do crime antecedente ou relacionado.

Aliás, o n. 2 do artigo 4 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, nos ajuda a sustentar aquela conclusão, quando ali se afirma que “a punição dos crimes previstos no n. 1 daquela lei tem lugar, ainda que os factos que os integram tenham sido praticados fora do país”.

Assim, ainda que o crime antecedente não haja tido lugar em Moçambique e, consequentemente, não tenha sido instaurado o competente procedimento criminal por tal crime, o delito de branqueamento terá censura jurídico-penal.

Este critério punitivo revela a preocupação do legislador moçambicano em sancionar o branqueamento, pois, de outra sorte, seria bastante difícil a sua repressão, atendendo que hodiernamente o delito de lavagem de capitais vai ganhando contornos de perfeição na sua execução, com o envolvimento de mais de um agente numa organização piramidal em que os actores sequer se conhecem, o

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envolvimento de mais de uma pessoa colectiva, o uso de testas de ferro, dos chamados laranjas e com teias transnacionais, entre outras acções tendentes a dificultar a descoberta da trilha do delito.

Portanto, no interesse primordial do combate ao branqueamento de capitais, deve-se aceitar a autonomia processual entre o delito antecedente e o branqueamento.

É perfeitamente normal que surjam casos em que se torna impossível a congregação dos dois delitos, ou seja, do antecedente e do branqueamento. Todavia, sendo possível, pode-se chegar à conclusão que não é curial o julgamento simultâneo dos crimes.

Rematando, significa dizer que, fazendo-se depender a punição do branqueamento à punição do crime antecedente, estar- -se-ia a oferecer aos agentes do crime uma autêntica “carta branca”.

3.6 Prova indiciária

Conforme dito precedentemente, o crime de branqueamento de capitais vem tomando, na actualidade, formas muito sofisticadas com o propósito último de dificultar a descoberta da sua existência e dos agentes envolvidos.

Na verdade, tendo o dinheiro sido obtido ilicitamente, os agentes, usando as mais diversas formas possíveis, introduzem-no em determinado sector de actividade, misturando-o com dinheiro licitamente obtido.

Então, mostrando-se difícil o processo de colheita de provas no crime de branqueamento de dinheiro, a solução passará pela adopção de dois critérios, quais sejam: apurar se o bem que é objecto de lavagem é de origem ilícita e se o agente tinha ou não consciência da ilícita proveniência do bem, não se podendo, porém, admitir a inversão do ónus de prova como justificativa pela difícil recolha desta.

Assim, neste delito de branqueamento de capitais, parece que a saída para o problema há de ser a admissão de prova indiciária, prova indirecta, tida como a “rainha” das provas naquele delito.

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A admissão da prova indiciária, na impossibilidade de se obter a prova directa (pelas dificuldades que resultam da profissionalização em que os envolvidos acobertam o delito), mostra-se de elevado valor processual, pois, de contrário, estar-se-ia a abrir espaço para a legitimação da lavagem de dinheiro.

Entretanto, formalmente, o acusador terá de determinar de maneira clara os indícios em que assentou a peça acusatória, por forma a que uma vez introduzidos os feitos em juízo aqueles se mostrem bastantes para concluir que efectivamente se está perante a um delito de branqueamento de capitais.

Não é necessariamente exigido que seja mais do que um indício, pois, sendo um, este deverá ser suficientemente pejado de carga probatória.

Existindo mais de um indício, estes deverão estar inter- -relacionados, por forma a criarem maior coesão probatória.

Podem constituir indícios bastantes para iniciar uma investigação (garimpo) por crime de branqueamento de capitais quando, por exemplo, se constatar que:

� O visado ostenta sinais exteriores de enorme riqueza, a avaliar pelos bens móveis e imóveis, incompatíveis com seus rendimentos.

� Movimentação de elevadas somas monetárias em espécie ou o chamado dinheiro vivo, quer com finalidade de depositar no banco, quer circulando ou transitando com elas em qualquer meio de transporte ou mesmo a pé. Segundo Rômulo de Andrade Moreira (2009),

Tudo que for propício à movimentação de dinheiro em espécie com maior número de pessoas anônimas torna fácil a lavagem. É o caso dos bingos. Há também as transações imobiliárias, a criação de avestruzes, de gado, os bilhetes de lotarias. Os lavadores sempre são criativos. Também apelam para restaurantes, compra de apartamentos de luxo, hotéis.

� Abertura de várias contas em bancos distintos.

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� Participação em várias sociedades.

� Frequentes participações em jogos nos cassinos.

� Existência de falsas sociedades.

� Participação em leilões.

� Construção de cadeias de imóveis e sua posterior venda (negócio de imobiliária).

� Ofertas ou doações de valiosos bens, incluindo dinheiro e serviços em campanhas ou eventos políticos, não só como também em apoio a pessoas necessitadas.

� Frequentes patrocínios a eventos de naturezas várias.

� Excessivos gastos financeiros por rubrica publicitária em meios de comunicação social, principalmente a televisão, entre outros.

As medidas cautelares no crime de branqueamento de capitais mostram-se de importância capital, pois constituem uma das formas mais eficazes para se reprimir e desencorajar os agentes daquele tipo legal, os quais possam ganhar vantagem patrimonial, caso aquelas medidas não sejam accionadas.

No ordenamento jurídico moçambicano, aquelas medidas se acham reguladas no artigo 5 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, que deve ser conjugado com os artigos 75º, n. 1, do CP, e 202º e ss do CPP.

Tais medidas consistem, nos termos daqueles dois dispositivos legais, na perda a favor do Estado dos bens que tenham servido ou estavam destinados a ser usados na prática de alguma das infracções previstas na Lei contra o Branqueamento de Capitais (Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, art. 6).

O n. 2 do artigo 5 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, vai mais longe ao permitir que as apreensões de bens que tenham servido ou estavam destinados a ser usados na prática de alguns dos crimes relacionados com o branqueamento de capitais e posterior declaração

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a favor do Estado possa ter lugar mesmo que nenhuma pessoa possa ser punida ou condenada, ou ainda que tenha sido absolvida.

Assim deve ser porque o que se exige nestes delitos é a existência de indícios bastantes da ilícita proveniência dos bens ou da existência do delito. Aquela construção legal, permitindo a perda de bens a favor do Estado ainda que não haja sido condenada determinada pessoa, visa atender às exigências de repressão do lucro proveniente da actividade económica exercida para acobertar a lavagem.

O legislador moçambicano, nos artigos 5, 6, 7 e 8 trata a apreensão de bens oriundos de actividades inseridas no branqueamento de capitais de forma que pode ser considerada suficientemente abrangente ou ampla, determinando que tais bens sejam depois entregues ao Estado.

Para que se concretize a aprensão, é imprescindível a identificação do bem e a conclusão sobre maior probabilidade de este ter proveniência ilícita. Assim, proceder-se-á à sua judicial apreensão, com rigorosa observância do disposto nos artigos 202º e ss do CPP.

Com efeito, a aprensão deverá ter por base uma ordem emitida pelo poder judicial, ou seja, por um juiz da causa ou da instrução criminal, conforme o feito haja sido introduzido em juízo ou esteja na fase de instrução preparatória, oficiosamente, a requerimento do Ministério Público e da parte acusadora, se a houver (art. 203º e ss do CPP).

Esta ampla abrangência tem sua vantagem, pois somente com medidas amplas e agressivas pode-se combater eficazmente o delito de branquemento de capitais.

Ao consagrar aquela disposição, o legislador moçambicano pretendeu reprimir de forma vigorosa os proventos, os lucros advindos da actividade ilícita.

Diferentemente da legislação moçambicana, a brasileira elencou como medidas cautelares a apreensão e o sequestro (art. 4); àquelas duas medidas se acrescem o arresto e a hipoteca, embora não estejam elencadas naquela lei. Julgamos que, para um eficaz combate

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ao delito de branqueamento de capitais, é necessário que sejam acolhidas para o nosso ordenamento jurídico algumas das práticas cautelares do sistema brasileiro, nomeadamente, a acção controlada (apreensão no momento considerado ideal ou oportuno por forma a constituir prova da existência do delito), o sistema electrónico do Bacen-jud que permite que o poder judicial possa urgentemente, ou seja, em tempo real, solicitar às instituições, mediante conhecimento do banco emissor, uma ordem judicial de bloqueio ou congelamento da conta ou activos do suspeito, bem como solicitar informações, tais como saldos, número da conta, extractos, domicílio do cliente, entre outros dados relevantes, pela internet.

A adopção desse sistema é bastante vantajosa pois:

� os magistrados em muitíssimo curto espaço de tempo recebem os dados que necessitam;

� diminui o risco de o visado fazer dissipar os seus valores ou activos para impedir que se lance mão sobre eles;

� diminui os custos de processamento das ordens e solicitações judiciais, tanto no âmbito judicial como no Banco Central e nas instituições de crédito;

� minora o prejuízo do visado pelo longo tempo de manutenção dos activos ou bens cativos;

� reduz a margem de erros propícios da natureza humana;

� garante o sigilo da informação do cliente pelo reduzido números de intervenientes na sua disponibilização ao poder judicial;

� confere ao judicial a possibilidade de fazer o acompanhamento das respostas aos ofícios expedidos;

� reduz o risco do insucesso por eventual interferência de pessoas influentes que possam ter interesse na causa.

Para que as medidas cautelares produzam seu efeito útil, é importante que elas sejam ordenadas ainda no decurso da tramitação processual.

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Paralelamente àquelas medidas, o legislador moçambicano preconiza, à luz das convenções internacionais sobre a matéria, a perda dos bens por parte do visado mesmo que não haja prévia condenação penal (Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, art. 5, n. 2) e ou a inversão do ónus de prova, ou seja, que seja o visado a demonstrar que o bem é de proveniência lícita.

3.7 Dificuldade em apreender valores de origem ilícita misturados com os lícitos

A miscelânea entre valores de origem ilícita com os de proveniência lícita é uma das estratégias usadas pelos agentes do mundo da lavagem criminal, com o propósito último de dificultar a sua descoberta.

Nestes casos, a apreensão do dinheiro tem sido por vezes difícil e a solução mais consentânea será a apreensão de valores estimados.

Nos termos do artigo 6 da lei sobre branqueamento de capitais (Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro), os valores, objectos, bens, lucros, juros, créditos, recompensas, vantagens ou direitos atribuídos, prometidos ou dados aos agentes de infracções previstas naquela lei, destinadas a eles ou a terceira pessoa, deverão ser declarados perdidos a favor do Estado.

Aquela norma autoriza ainda que, caso o bem não seja susceptível de apropriação em espécie, se exija ao agente da infracção o pagamento pelo mesmo valor ao Estado. Entende-se que tal valor há de resultar de uma avaliação pericial ou do valor de aquisição do bem.

A perda dos bens a favor do Estado está também prevista no n. 1 do artigo 75º do CP e no § 2º do artigo 450º do CPP.

Ainda relativamente aos bens apreendidos e que sejam deterioráveis ou de alguma forma possam perder seu significativo valor comercial, o magistrado judicial deve ordenar a sua venda, nos termos do n. 3 do artigo 6 do Decreto n. 21/1971, de 29 de Janeiro.

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A apreensão dos bens ao agente de infracção é, quanto a nós, uma solução bastante pertinente, pois, para além de desencorajar a prática do delito de branqueamento, permite ao Estado a recuperação dos activos que poderão ser potenciados para o seu emprego em acções de combate de mais delitos de gênero ou para seu uso em acções de terapia das vítimas do delito. A este propósito, vide o texto do artigo 9 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro.

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Parte administrativa

As instituições financeiras e as dos diversos sectores da economia, no interesse não só da economia do país, mas também de si mesmas, devem colaborar com as instituições de justiça com vistas a prevenir e combater o branqueamento de capitais. Aliás, este dever é recomendado por organizações internacionais, conforme recomenda o Gabinete de Informação Financeira de Moçambique.

A lavagem de dinheiro é considerada pelo Banco Mundial como causadora de efeitos económicos, sociais e políticos potencialmente devastadores para os países em vias de desenvolver as economias nacionais17.

Por sua vez, o FMI considera que a lavagem de dinheiro apresenta uma vasta gama de consequências macroeconómicas e que a comunidade internacional tornou prioritária a luta contra a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo. De entre os esforços daquela organização, perfilam a protecção da integridade do sistema financeiro internacional, o corte dos recursos disponíveis para os terroristas e o aumento da dificuldade para os criminosos lucrarem com seus crimes.

O FMI está especialmente preocupado com as possíveis consequências da lavagem de dinheiro na economia dos países em

17 Confira: <http://gtld.pgr.mpf.gov.br/lavagem-de-dinheiro/danos>.

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razão dos riscos à saúde e à estabilidade das instituições financeiras e dos sistemas financeiros, do aumento da volatilidade dos fluxos de capital internacional, das mudanças imprevisíveis na procura de dinheiro e do aumento das taxas de câmbio como consequência do volume imprevisto de transferências transnacionais18.

Aquela recomendação do Gafi é dirigida às instituições financeiras em razão de constituírem um dos priviligiados veículos usados para a lavagem de dinheiro e então se mostra imperiosa a tomada de um conjunto de medidas com vistas à protecção, à reputação e à fiabilidade que o sistema financeiro merece nas suas transacções com a clientela.

Na verdade, podem ocorrer problemas de liquidez e de corrida aos bancos quando grandes somas de dinheiro “lavado” chegam às instituições financeiras ou delas rapidamente desaparecem. A lavagem de dinheiro pode provocar a quebra de bancos ou de outras instituições, além de crises financeiras. Pode manchar a reputação e a confiabilidade de uma instituição financeira (como ocorre, por exemplo, quando se torna público que um determinado banco se presta a grandes operações de lavagem de dinheiro).

Os prejuízos são perfeitamente imensuráveis quando, em razão do envolvimento com esse tipo de actividade, a instituição vem sofrer penalizações, tais como a imposição de pesadas multas, a inabilitação temporária ou cessação de autorização para operação ou funcionamento.

A partir do momento em que isso acontece, os efeitos prolongam-se para além do sector, afectando advogados, contadores e outros profissionais. Essa reputação negativa pode provocar a diminuição das oportunidades profissionais lícitas e a atração das actividades criminosas, resultando em efeitos negativos para o desenvolvimento económico de um país na economia global19.

Reconhecendo-se que as transacções financeiras se comunicam mundialmente, ou seja, envolvem hodiernamente mais de um banco, entre nacionais e estrangeiros, o Gafi produziu tais

18 Confira: <http://gtld.pgr.mpf.gov.br/lavagem-de-dinheiro/danos>.

19 Idem.

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recomendações para que as instituições financeiras adoptem medidas que se conformem com os padrões internacionais.

Na verdade, em conformidade com as normas vigentes, as instiuições financeiras devem definir políticas, procedimentos e mecanismos de controlo com vistas à prevenção e ao combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo.

Uma das medidas emanadas das quarenta recomendações do Gafi adoptadas pelo Banco Central do nosso país (BM) é a criação de uma norma impondo a obrigatoriedade de todas as instituições de crédito, sem excepção, fazerem o screening de depósitos de valores acima de 10.000 Usd (dez mil dólares), ou seja cobrar a justificação comprovativa da sua proveniência.

Todavia, não basta que tais recomedações tenham por destinatário as instituições financeiras, porquanto vários e diversificados sectores não enquadrados no ramo financeiro podem ser usados como ponto de refúgio à cerrada vigilância concentrada no sector financeiro, para então ali actuarem à vontade. Aliás, é peculiar dos agentes do crime, particularmente da criminalidade organizada, como a do branqueamento de capitais, a adopção de constantes mecanismos para lograrem os seus propósitos, fugindo à vigilância das autoridades.

Assim, para que o nosso sistema financeiro não possa ser usado como um canal de acesso livre para acções de branqueamento de capitais, as instituições que o compõem devem adoptar medidas e procedimentos que estejam de acordo com as regras internacionalmente recomendadas para a repressão da lavagem de dinheiro, ou seja, adoptar o chamado dever compliance ou simplesmente adequação.

Conforme dito precedentemente, a legislação moçambicana já prevê as regras de compliance, nomeadamente no artigos 10 a 23 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro.

Nos termos daquelas regras, as instituições financeiras (bancos comerciais, casas de câmbios, seguradoras e outras) devem esmerar-se na determinação da verdadeira identificação de todos os clientes que solicitem seus serviços.

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Na verdade, nos termos do disposto no n. 1 do artigo 10 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro,

as entidades financeiras devem exigir a identificação dos seus clientes ou seus representantes legais, mediante a apresentação de documento comprovativo válido em que se exiba uma fotografia, sempre que estabeleçam relações de negócios e, em especial, quando abram uma conta de depósitos ou caderneta de poupança, ofereçam serviços de guarda de valores ou de investimentos em valores mobiliários, emitam apólices de seguro ou giram planos de pensões.

Nos termos do n. 2 daquele comando normativo, aquela exigência de identificação se estende às situações em que o cliente ou entidade financeira efectua transacções ocasionais em que não tenha havido identificação nos termos previstos no n. 1 e cujo montante, isoladamente ou em conjunto, seja igual ou superior ao valor correspondente a 441 salários-mínimos.

Tratando-se de cassinos, estes têm o dever de identificar os clientes que adquiram, tragam consigo ou troquem fichas e moedas num montante igual ou superior a 441 salários-mínimos.

Os domicílios dos clientes devem ser verificados através de documento oficial (BI ou outro documento considerado oficial pelo Conselho de Ministros), no caso de pessoas singulares. Tratando-se de pessoas colectivas, o seu domicílio deve ser comprovado mediante a carta estatutária respectiva ou através da licença ou alvará, sendo que os gestores ou corpos sociais deverão ser igualmente objecto desta rigorosa identificação.

Esta exigência mostra-se de capital importância, pois o Gafi, na sua 5ª Recomendação, insta as instituições financeiras para que não aceitem contas anónimas ou por nomes supostos ou ainda fictícios.

O artigo 12 do diploma legal que temos vindo a citar insta as instituições financeiras a procurarem obter informações sobre a verdadeira identidade da pessoa por conta e em nome de quem o cliente actua, através do próprio cliente, bem como dos beneficiários de um seguro, da operação do ramo-vida ou de fundo de pensões,

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sempre que exista suspeita fundada de que os montantes inscritos tenham uma proveniência decorrente de actividades criminosas referidas naquela lei, ainda que os montantes da operação sejam inferiores a 441 salários-mínimos.

Portanto, conforme se pode constatar, a primeira regra consiste no dever de identificação do cliente, dever este que se acha regulamentado no capítulo III (arts. 8 a 13 do Decreto n. 37/2004, de 8 de Setembro, Regulamento da Lei do Branqueamento de Capitais).

Mas não basta a identificação colhida numa primeira ocasião, pois as instituições financeiras deverão actualizar regularmente os dados de seus clientes, pois doutra sorte não os conheceria profundamente, com a natural inconveniência que tal representaria para os propósitos da repressão do branqueamento de capitais.

A segunda medida de adequação consiste na contínua monitoria e controlo dos dados colhidos e, para isso, as instituições financeiras devem dotar-se de meios ou de organização interna para o efeito. Aquelas instituições devem desenhar mecanismos claros, procedimentos cristalinos que permitam a adequada identificação e posterior controlo de transacções envolvendo as chamadas Pessoas Politicamente Expostas, tendo em conta os riscos decorrentes da sua reputação e outros conexos.

Na verdade, o estabelecimento de relações transaccionais com parentes ou pessoas próximas às PEPs pode resultar no linchamento público da sua imagem, daí que deva existir um sistema apropriado para determinar se uma pessoa pode ser considerada como PEP ou não.

Por PEPs, como dito, entendem-se pessoas que exerceram ou tenham exercido funções públicas proeminentes num determinado país ou fora deste, por exemplo, ex-chefes de Estado e de governo, políticos influentes, funcionários públicos séniores, oficiais de justiça ou militares, membros executivos de empresas públicas, estatais, representantes de partidos políticos, ou da sociedade civil, entre outros.

Uma terceira regra de compliance é a manutenção de registos, ou seja, as instituições financeiras devem criar e implementar

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procedimentos apropriados que viabilizem a conservação e manutenção dos dados de seus clientes.

Como eloquente demonstração da preocupação do nosso legislador, este determina no n. 1 do artigo 15 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, que as entidades financeiras devam conservar os documentos de identificação dos clientes durante um período de 15 anos, contados da data do encerramento das contas daqueles ou da cessação do vínculo jus-laboral entre os contratantes.

Refira-se que o Gafi na sua recomendação fixou como tempo mínimo de conservação dos dados 5 anos, e o nosso sistema fixou como tempo máximo 15 anos, o que possibilita concluir que o tempo de conservação da documentação é de 5 a 15 anos.

A quarta regra tem a ver com o dever de imediata comunicação ou participação de transacções suspeitas ao Ministério Público. Assim, as instituições financeiras ou de crédito devem estar internamente organizadas, regra geral, por via de actuação do sector de supervisão e formação ou treinamento do pessoal, para que saibam identificar uma operação suspeita e participar o caso imediatamente ao MP, colaborando com este e outras autoridades judiciais competentes.

O que foi dito no parágrafo que antecede consta dos artigos 16 e 17 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, conjugado com os artigos 17, 18 e 19 do Decreto n. 37/2004, de 8 de Setembro.

A comunicação ao Ministério Público deve ser feita pelo sector de supervisão da instituição financeira, devendo nesta sua actuação agir de boa-fé. Todavia, qualquer outra entidade ou pessoa poderá, nos termos gerais fixados na lei penal, participar o caso ao MP. A este propósito, importa frisar que, tratando-se de infracção de natureza pública, a denúncia pode ser apresentada ao MP por qualquer pessoa do povo (Decreto-Lei n. 35.007, de 13 de Outubro de 1945, art. 8).

O dever das instituições financeiras não se esgota na denúncia, mas também na permanente colaboração com as autoridades judiciais e do MP, sempre que tal se mostrar necessário para o esclarecimento do caso. Aquelas actuariam como uma espécie de auxiliares do MP na fase de instrução do processo e de testemunhas ou declarantes,

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conforme tenham ou não interesse na causa, uma vez introduzidos os feitos em juízo.

Portanto, as instituições financeiras no exercício das suas actividades devem pautar pela observância de princípios éticos e de legalidade, fundamentalmente relativos às normas que regem as transacções financeiras.

Elas podem não estar dotadas de ferramentas técnicas, ou conhecimentos técnicos que os possa permitir identificar uma operação suspeita, ou seja, se determinada transacção provém de alguma actividade criminosa ou se é complemento dela ou parte integrante, todavia, elas devem recusar seus serviços quando tenham fundadas suspeitas de que tal transacção possa estar relacionada com lavagem de dinheiro.

O que dissemos no parágrafo que antecede vem regulado no n. 1 do artigo 19 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro, cuja epígrafe é “Dever de abstenção”. Com efeito, tendo a instituição financeira criado certo juízo de suspeita de que determinada transação financeira possa estar relacionada com lavagem de dinheiro, deve abster-se de dar curso a ela, ficando a sua execução dependente da decisão expressa do órgão titular da acção penal em Moçambique, no caso, o Ministério Público, que deve proferi-la dentro de 24 horas e ser confirmada pelo poder judicial, no caso, pelo juiz da instrução criminal (Juiz da instrução e não Juiz de instrução criminal, conforme vem erradamente escrito no n. 2 do artigo 19 da Lei n. 7/2002, de 5 de Fevereiro) no prazo de 48 horas, findo o qual a operação deve ser executada pela instituição financeira.

Percebe-se aquela presuntiva autorização de viabilização da operação, pois que as transacções financeiras ou comerciais exigem necessária fluidez, devido ao seu impacto na economia dos países.

No entanto, a eficácia daquela obrigatoriedade muito depende da consciência de quem deve denunciar e das acções de monitoramento nesses sectores, pois, de outra sorte, as influências dos notáveis, dos políticos que são simultaneamente operadores económicos poderão remeter o combate deste delito a um eterno fracasso, diluindo-se o conteúdo daquelas disposições e todo o espírito da lei.

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Importa referir que operação suspeita é toda aquela que não se enquadra nos padrões normais de determinado sector de actividade. Assim, o normal na banca é que os clientes, regra geral, tragam para depósito dinheiro em cheque, já o aparecimento de um cliente pretendendo depositar avultadas somas de dinheiro em numerário é algo que desvia do padrão normal do perfil dos clientes, para o que deve ser considerada operação suspeita.

A quinta e última regra de adequação refere-se ao sigilo que deve ser mantido em torno das operações atípicas detectadas ou suspeitas relativamente a algum cliente. Assim é que o n. 1 do artigo 18 da nossa Lei de Branqueamento de Capitais dispõe que

Os titulares dos órgãos directivos das pessoas colectivas, os gerentes, os mandatários ou qualquer outra pessoa que exerçam funções a serviço das entidades financeiras, estão proibidos de revelar ao cliente ou a terceiros a declaração das informações específicas nos termos dos n. 1 e 2 do art. 17 da presente Lei, bem como a informação de que se encontra em curso uma investigação criminal.

O n. 2 daquele artigo fixa um regime sancionatório instando--se os representantes legais das entidades financeiras para que instaurem procedimento disciplinar e consequente expulsão, caso haja sido provada a violação daquele sigilo, por parte de determinado trabalhador.

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Dificuldades e metas

As dificuldades coexistem onde se desenvolve determinada actividade, sendo que a diferença há de residir na frequência da sua verificação e no seu grau, pois tudo depende da complexidade do objecto de trabalho.

Não é novidade para qualquer um que o branqueamento de capitais assenta em técnicas bastante sofisticadas com vistas a dificultar a sua descoberta pelas autoridades, pois o propósito dos envolvidos é o lucro, o património.

Então, o seu combate e prevenção passam pela permanente qualificação do investigadores, especialização dos magistrados do MP e judiciais para este tipo legal de crime, disponibilização de recursos financeiros e materiais, entre outros que se mostrarem imprescendíveis para a sufocação daquele delito.

Naturalmente que, na falta daquelas condições, os investigadores passarão mais tempo a clamar por condições ou meios de trabalho e menos tempo a investigar.

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Ainda assim, não podemos baixar os braços, pois as pequenas e bem-sucedidas acções na medida do possível colocarão os agentes em permanente insegurança e é por vezes fácil descobrir quem está nestas circunstâncias. A “esperança é a última que morre”, pedra a pedra construiremos o espaço em que acantonaremos os agentes branqueadores de capitais.

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Referências

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MOREIRA, Rômulo de Andrade. Curso temático de direito processual penal. 2. ed. Salvador: jusPodivm, 2009.

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Page 98: CRIME DE BRANQUEAMENTO DE CAPITAISmpf.mp.br/.../crime-de-branqueamento-de-capitais.pdf · Crime de Branqueamento de Capitais que vem assumindo contornos muito marcantes na nossa sociedade

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Manual Prático de Actuação

VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. O soft law como fonte formal do direito internacional público. 2003. Disponível em: <http://www.marcosvaladao.pro.br/pdf/O%20SOFT%20LAW%20COMO%20FONTE%20FORMAL%20DO%20DIP.pdf>. Acesso em: 27 ago. 2012.

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