Criocirurgia na Clínica Dermatológica...

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Página 26 www.anclivepa-sp.org.br Artigo Científico Criocirurgia na Clínica Dermatológica Veterinária A criocirurgia é hoje uma opção segura e acessível ao clínico de pequenos animais para o tratamento de diversas lesões cutâneas em cães e gatos. Este artigo discute os aspectos importantes que envolvem o procedimento. INTRODUÇÃO A criocirurgia é o método de tratamento através de baixas temperaturas, utiliza-se mais comumente o nitrogênio líquido. É indicada para o tratamento de vários tipos de lesões cutâneas, entre elas formações benignas, pré-malignas e malignas. Promove destruição dos tecidos acometidos por congelamento e alterações da resposta imunológica. É uma opção terapêutica importante, que traz ótimos resultados e permite ao clínico veterinário tratar de maneira segura e eficaz seus pacientes. O congelamento da pele foi, inicialmente, usado por dermatologistas após obterem-se a liquefação do ar e o desenvolvimento do frasco para estoque do oxigênio, nitrogênio e hidrogênio, por Dewar, no início do século passado. Em 1899, White descreveu ensaios clínicos usando ar líquido em spray ou swab para tratar lesões benignas e epiteliomas precoces. Muitos anos depois, Pusey usou neve de dióxido de carbono coletada em uma bolsa de couro e comprimida em bastão. Esses criógenos foram usados até 1940, quando o nitrogênio líquido, se tornou disponível. O nitrogênio foi aplicado com swab para o tratamento de verrugas e queratoses, mas a profundidade da destruição estava limitada a poucos milímetros. Mais tarde, os pesquisadores foram aperfeiçoando os equipamentos e seus derivados, permitindo maior tempo de aplicação do criógeno e, assim, maior destruição dos tecidos. Os gases mais utilizados, atualmente, para o tratamento das lesões cutâneas têm sido o nitrogênio líquido, dióxido de carbono solidificado, óxido nitroso, freon e hélio. HISTÓRICO E FUNDAMENTOS DA CRIOCIRURGIA O efeito letal da criocirurgia sobre as células, depende basicamente de cinco fatores: tipo de célula a ser congelada, velocidade do congelamento, temperatura final (deve ser abaixo de 20°C), velocidade do descongelamento e repetição do ciclo (congela-descongela). As alterações biológicas ocorrem por causa da perda rápida de calor quando o criógeno em spray toca a pele, e, havendo congelamento, haverá destruição tecidual. Quando se utiliza a técnica da sonda, o jato de nitrogênio passa por uma placa metálica condutora, que, ao ser congelada e tocar a pele, transmitirá o resfriamento. Boullie e Lauret em 1977 descreveram os efeitos do frio sobre o tecido. O congelamento provoca dois efeitos: cristalização da água intra e extracelular que conduz à morte da célula e trombose vascular gerada pelo congelamento dos vasos da região que complementam a necrose tissular. A criocirurgia produz destruição seletiva do tecido, e o estroma promove trama para reparação posterior da ferida. A resistência das fibras de colágeno e cartilagem ao dano do congelamento é favorável à cicatrização.

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Artigo Científico

Criocirurgia na Clínica Dermatológica Veterinária

A criocirurgia é hoje uma opção segura e acessível ao clínico de pequenos animais para o tratamento de diversas lesões cutâneas em cães e gatos.

Este artigo discute os aspectos importantes que envolvem o procedimento.

INTRODUÇÃO

A criocirurgia é o método de tratamento através de baixas temperaturas, utiliza-se mais comumente o nitrogênio líquido.

É indicada para o tratamento de vários tipos de lesões cutâneas, entre elas formações benignas, pré-malignas e malignas.

Promove destruição dos tecidos acometidos por congelamento e alterações da resposta imunológica.

É uma opção terapêutica importante, que traz ótimos resultados e permite ao clínico veterinário tratar de maneira segura e eficaz seus pacientes.

O congelamento da pele foi, inicialmente, usado por dermatologistas após obterem-se a liquefação do ar e o desenvolvimento do frasco para estoque do oxigênio, nitrogênio e hidrogênio, por Dewar, no início do século passado.

Em 1899, White descreveu ensaios clínicos usando ar líquido em spray ou swab para tratar lesões benignas e epiteliomas precoces. Muitos anos depois, Pusey usou neve de dióxido de carbono coletada em uma bolsa de couro e comprimida em bastão. Esses criógenos foram usados até 1940, quando o nitrogênio líquido, se tornou disponível. O nitrogênio foi aplicado com swab para o tratamento de verrugas e queratoses, mas a profundidade da destruição estava limitada a poucos milímetros.

Mais tarde, os pesquisadores foram aperfeiçoando os equipamentos e seus derivados, permitindo maior tempo de aplicação do criógeno e, assim, maior destruição dos tecidos.

Os gases mais utilizados, atualmente, para o tratamento das lesões cutâneas têm sido o nitrogênio líquido, dióxido de carbono solidificado, óxido nitroso, freon e hélio.

HISTÓRICO E FUNDAMENTOS DA CRIOCIRURGIA

O efeito letal da criocirurgia sobre as células, depende basicamente de cinco fatores: tipo de célula a ser congelada, velocidade do congelamento, temperatura final (deve ser abaixo de 20°C), velocidade do descongelamento e repetição do ciclo (congela-descongela).

As alterações biológicas ocorrem por causa da perda rápida de calor quando o criógeno em spray toca a pele, e, havendo congelamento, haverá destruição tecidual. Quando se utiliza a técnica da sonda, o jato de nitrogênio passa por uma placa metálica condutora, que, ao ser congelada e tocar a pele, transmitirá o resfriamento.

Boullie e Lauret em 1977 descreveram os efeitos do frio sobre o tecido. O congelamento provoca dois efeitos: cristalização da água intra e extracelular que conduz à morte da célula e trombose vascular gerada pelo congelamento dos vasos da região que complementam a necrose tissular.

A criocirurgia produz destruição seletiva do tecido, e o estroma promove trama para reparação posterior da ferida. A resistência das fibras de colágeno e cartilagem ao dano do congelamento é favorável à cicatrização.

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INDICAÇÕES GERAIS DA CRIOCIRURGIA EM DERMATOLOGIA

Mais detalhadamente observa-se que a transformação macroscópica inicial é a formação do campo de gelo na pele, em alguns minutos inicia-se o descongelamento, revelando-se, no tecido alvo, um tom violeta periférico. A profundidade se relaciona com o raio do congelamento.

Após o cilco de congelamento a pele pode ter coloração clara ou escura, com formação de bolha hemorrágica ou preenchida por líquido, além do edema local, tal processo se resolve em poucos dias, dando local a uma cicatrização com formação de necrose do tecido congelado pode surgir na área central. Essas alterações tendem a se resolver em duas semanas, a cicatrização total varia de 15 à 30 dias. (Lucas e Larson 2002).

Do ponto de vista microscópico, cristais de gelo são vistos imediatamente, mas as primeiras alterações celulares ocorrem em torno de 30 segundos, quando o citoplasma se torna eosinofílico. No núcleo, há também marginação e vacuolização da cromatina. Uma hora depois da injúria pode haver morte celular.

Nas horas seguintes ocorrem homogeneização do citoplasma e picnose nuclear. A microscopia eletrônica mostra degranulação do retículo endoplasmático. A bolha parece formar-se na junção dermoepidérmica.

Estudos apontam que o congelamento ativa uma ação imunológica com efeitos benéficos, sobretudo na doença metastática, inibindo-a.

Os equipamentos tornaram sua utilização prática, temos disponíveis no mercado desde sprays descartáveis de freon até as modernas pistolas recarregáveis (nitrogênio líquido), existem ainda acessórios adaptados aos mais variados tipos de lesões e condições individuais.

O nitrogênio líquido fica estocado na própria clínica em containers que permitem o estoque de volumes pequenos, em geral de 20 litros. As pistolas de aplicação, em geral são pequenas e de fácil manuseio e nelas se coloca o líquido que, sob pressão, se volatiliza, e esse gás é aplicado sobre as lesões.

As formas de aplicação variam de jato aberto, quando o spray é aplicado livre sobre a pele, através de sondas fechadas, pontas fechadas ou através de swab´s, existem diversas pontas, aplicadores e extensões disponíveis no mercado, facilitando a sua aplicação.

A forma de aplicação depende da origem e da forma da lesão a ser tratada, além do manejo e da experiência do

cirurgião, podemos citar aplicações pontuais, difusas, em pincel, de contato direto, indireto ou derramamento.

Os procedimentos devem ser realizados com o paciente sob anestesia geral, preferivelmente, apesar de relatos de utilização de anestesia local em lesões muito pequenas, com bom resultado.

Segundo Drake, em geral utiliza-se eficazmente de 2 a 3 ciclos de congelamento e descongelamento. O congelamento é feito de forma rápida e o descongelamento se faz de forma espontânea, considera-se como temperatura satisfatória quando o congelamento é aparente e a pele recobre-se de gelo, fica branca e firme, tornando-se nitidamente delimitada. (Lucas e Larsson 2002)

MODO DE AÇÃO E EQUIPAMENTOS

Com o aumento da experiência dos cirurgiões dermatologistas veterinários, ampliam-se progressivamente as dermatoses que têm indicação para a CR, como tratamento único ou como adjuvante aos tratamentos medicamentosos ou cirúrgicos convencionais.

Podkonjak relatou o uso da criocirurgia em uma série de problemas dermatológicos. A taxa de sucesso após o tratamento varia entre 80 e 90%.

Em geral tratam-se uma infinidade de lesões epiteliais benignas e malignas, as mais freqüentes são dos tipos: melanoma, carcinoma de células escamosas, fibrossarcoma, papiloma, tumor de células basais, hemangioma, histicitoma, tricoepitelioma, adenoma, cistos foliculares, cistos sebáceos, tecido proliferativo da orelha externa, ulceras não cicatrizadas, tecido de granulação, hiperplasia de glândula da cauda, dermatite acral por lambedura, fistulas perianais e adenomas perianais. Na cavidade oral, tratam-se ainda os carcinomas de células escamosas, melanomas e épulis.

É importante a classificação histologia prévia para identificação do tumor ou lesão candidatos a criocirurgia.

O pós-cirurgico imediato apresenta edema e rubefação, com graus variados, foram após 3 à 6 dias observava-se necrose bem delimitada, a progressão da cicatrização forma-se uma crosta úmida ou seca, gerando um esfacelo em torno de 15 dias, a epitelização ocorre geralmente a partir do quarto dia após o desprendimento do tecido necrosado, o tecido resultante da cicatrização de uma criocirurgia geralmente é mais espesso e liso em relação a pele tornando-se em geral alopécico.

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A criocirurgia dirigida a clínica de dermatologia veterinária é hoje um método seguro, de fácil acesso e custo relativamente baixo, exigindo do profissional conhecimento apurado das lesões que pretende tratar, bem como da técnica a ser utilizada no tratamento de cada alteração, oferecendo ao paciente uma forma menos cruenta de tratamento e ao proprietário oferece confiabilidade alem de um manejo pós cirúrgico menos trabalhoso.

Gostaria de dedicar este artigo ao amigo Professor Doutor Ronaldo Lucas, grande dermatologista veterinário, pessoa em que me espelho profissionalmente, que sempre apoiou minha dedicação a dermartologia, a especialidade das especialidades e instruiu-me sobre a técnica de crioterapia

NOTA DE FALECIMENTO

Com profundo pesar, a diretoria e toda a família Anclivepana expressam a consternação e os sentimentos à família de nosso querido associado MARCEL BENEDETI.

Médico veterinário formado em 1985, Marcel era associado da Anclivepa-SP desde o ano de 1991. Escritor espírita, vegetariano e defensor dos animais, atualmente ele apresentava o programa Nossos Irmãos Animais, na Rádio Boa Nova.

Por seus feitos, por seus livros e, especialmente, por uma vida dedicada aos animais, a Medicina Veterinária não o esquecerá.

MV Alexandre Pasternak- Clínica Veterinária Pasternak - “Excelência em Dermatologia”- Diretor do (tesoureiro) SINPAVET- Diretor da (tesoureiro) ANCLIVEPA-SP- Coordenador do III Curso Intensivo de Dermatologia Veterinária da ANCLIVEPA-SP- Sub-comissão de Cursos de Especialização da ANCLIVEPA-SP - Comissão de Comportamento Animal da ARCA-Brasil- Membro da: Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais Sociedade Brasileira de Dermatologia Veterinária, Sociedade Paulista Medicina Veterinária Colégio Brasileiro de Cirurgia e Anestesiologia Veterinária,Federación Iberoamericana de Asociaciones Veterinarias de Animales de Compañia, World Small Animal Veterinary Association.

CONCLUSÃO

- LUCAS, R.; LARSSON, C. E. Crioterapia na clinica veterinária: avaliação da praticidade, exequibilidade e efetividade em dermatopatias de caninos. Anais Brasileiros de Dermatologia, v. 77, n. 3, 2002, p. 291-299.

- GOLOUBEFF B.; OLIVEIRA H. P. Tratamento criocirurgico de tumores e fistulas e cães. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v. 51, n. 5, 1999.

- SCOTT, D. W.; MILLER JR., W. H.; GRIFFIN, C. G. Small animal dermatology. Philadelphia: Saunders. 1996, p. 233-235.

- KUFLIK EG. Cryosurgery for cutaneous malignancy. An update. Dermatol Surg. 23, 1987, 1081-7.

- DRAKE LA, CEILLEY RI, CORNELISON RL, DOBES WL, DORNER W, GOLTZ RW et al. Guidelines of care for cryosurgery. J Am Ac Dermatol. 31, 1994, 648-53.

- PODKONJAK, K. R. Veterinary cryptherapy – 2. Veterinary Medicine: Small Animal Clinician, V-77, 1982, p. 183.

- BOULLIE MC, LAURET PH. La cryochirurgie des carcinomas cutanés. Ann Dermatol Venereol.114, 1987, 761-5.

- DAWBER R, COLVER G, JACKSON A. Criocirurgia cutânea. Princípios e prática clínica. São Paulo: Manole. Capítulo 2, Bases históricas e científicas da criocirurgia; 1999, p.15-25.

- DAWBER R, COLVER G, JACKSON A. Criocirurgia cutânea. Princípios e prática clínica. São Paulo: Manole. Capítulo 3, Equipamentos e técnicas. 1999, p. 27-33.

- KUFLIK EG. Cryosurgical treatment of cutaneous lesions. In: ROENIGK RK, ROENIGK Jr HH. In: Dermatologic surgery. Principles and practice. 2 ed. New York: Marcel Dekker Inc. 1996 p. 245-72.

REFERÊNCIAS