Crónicas Italianas António Mega Ferreira

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À memória de Gabriela Cerqueira (1941-2018),amiga inesquecível,

que talvez tivesse gostado de ler este livro

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«In Italia la linea più breve tra due punti è l’arabesco.» 1

Ennio Flaiano

1 «Em Itália, a linha mais curta entre dois pontos é o arabesco.»

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Índice

Partenza: nos passos de Stendhal 11

Uma parede em Prato 16

Fiammetta, uma paixão de Boccaccio? 28

Maquiavel, a liberdade e o poder 42

O poeta e a duquesa: um amor de verão 57

Cervantes, com a Itália no pensamento 74

Montaigne em Itália: a seu bel-prazer 90

Carta de Fillide Melandroni a um escritor indiscreto 104

Beatrice Cenci e o rosto de Judite 111

De que fala Don Giovanni quando fala de liberdade 124

Via di Ripetta, 22 135

Stendhal e Rossini: um mal-entendido? 155

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Manzoni, para lá do bem e do mal 167

Freud a caminho de Roma: uma inibição? 186

Rilke em Florença ou a instrução do amante 200

Proust e Veneza: do desejo à epifania 212

Aventuras de três italianos na Índia 226

Uma triangulação literária: Sciascia, Lampedusa, Stendhal 239

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Partenza: nos passos de Stendhal

Há muitos anos que me seduz o título daquele livro de Stendhal a que Romain Colomb, que o editou e fez publicar em 1855, já depois da morte do escritor, deu o nome de Chroniques italiennes. A perfeição do título encontrado vem-lhe da sua própria natureza: por um lado, não diz nada sobre o conteúdo do livro, é um título razoavelmente «branco»; por outro, descreve minima-mente aquilo que o leitor lá pode encontrar, apenas his-tórias que se passam em Itália.

Penetrando um pouco no segredo deste título anó-dino, vale a pena recordar que Stendhal tinha a inten-ção de publicar um conjunto de Historiettes romaines, que resultavam diretamente (diz ele) da cópia de uma importante coleção de manuscritos adormecidos na bi-blioteca de uma família romana, aos quais tivera acesso em 1833 e 1834. Estes manuscritos eram crónicas de acontecimentos mais ou menos melodramáticos ocorri-dos em Itália nos séculos xvi e xvii. Em 1839, Stendhal deu à estampa três delas: A abadessa de Castro, Vittoria Accoramboni e Os Cenci. Mais tarde, foi Romain Co-lomb, seu executor testamentário, que as preparou para edição em livro, a estas acrescentando outras (entre as quais Vanina Vanini, que Stendhal escrevera muito

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antes, em 1829), e as fez publicar, já depois da morte do escritor, que ocorreu em março de 1842. A insistência de Stendhal em sublinhar que a sua intervenção sobre os manuscritos se limitou à simples tradução, é, em si mesma, um sinal de que, bem à sua maneira, todas as crónicas devem ser lidas como exercícios de ficção. As duas partes em que foi dada a primeira das Chroniques, A abadessa de Castro, são caracteristicamente datadas de Palermo, respetivamente em 15 de setembro de 1838 e 6 de fevereiro de 1839; ora, Stendhal nunca esteve na Si-cília. A ficção evidente tenta «mascarar» a verdade: que se trata de ficções, não de meras traduções. E o artifício é análogo, mas um pouco posterior, ao usado por Alessan-dro Manzoni em I promessi sposi (Os noivos, na tradução portuguesa), no qual o autor milanese afirma reproduzir um manuscrito que conta uma história do século xvii. O romance de Manzoni saíra em primeira edição, com o título Fermo e Lucia, no ano de 1823, e, com o título defi-nitivo, em nova versão, em 1827, e talvez fosse conhecido por Stendhal, que gabará os poemas de Manzoni, mas, no entanto, nunca se refere a I promessi sposi.

O interesse por este título stendhaliano data dos meus vinte anos, quando entrou na modesta biblioteca que eu afeiçoava uma edição do Livre de Poche com as histórias escolhidas para figurar com esse título. Andei com ele metade da vida ou algo mais; infelizmente, já não o encontro, talvez porque o ofereci a alguém, por dupli-car a edição integral dos «Romances e Novelas», publi-cada pelas Editions du Seuil em 1969. Esta última foi aliás a edição que usei no início do nosso século, quando traduzi uma delas, a excelente Vanina Vanini, que saiu em edição da Assírio & Alvim em 2002.

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Olof Johan Södermark, Retrato de Stendhal, 1840

Há alguns anos, um editor que me é próximo sugeriu--me que escrevesse sobre Stendhal. De uma forma ou de outra, tenho ensaios publicados sobre Balzac, Proust, Camus; porque não abordar também a figura e a obra do autor de La Chartreuse de Parme, que tem lugar re-servado nas minhas preferências literárias? Cheguei a reunir uma curta mas escolhida bibliografia que me habi-litasse a mergulhar em profundidade na obra do escritor, que era francês mas se queria «milanese». Convém não forçar as coisas, no entanto. Como provavelmente já não vou escrever sobre Stendhal (à parte um ensaio incluído no meu livro Roma, exercícios de reconhecimento, que conheceu a primeira edição em 2003), presto-lhe aqui a minha homenagem: chamo a este livro, que contém histórias, evocações, reflexões e deambulações relacio-nadas com temas italianos, Crónicas Italianas. E resgato

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do seu belíssimo (ainda que fantasioso) relato a história de Beatrice Cenci, à qual dei aqui uma tournure bem di-ferente, relacionando-a com a pintura de Artemisia Gen-tileschi, uma distinta seguidora da lição de Caravaggio. Além disso, em outro curto ensaio abordo a história de uma deliciosa mistificação: a da suposta intimidade entre Stendhal e Rossini. Aludindo, aqui e ali, a ela, o nosso escritor acabou a compor a sua Vie de Rossini; mas o se-gundo negou que alguma vez tivesse frequentado o pri-meiro. O mal-entendido é tipicamente stendhaliano. De resto, o sopro do génio de Stendhal inspira algumas das histórias aqui contadas, como a de Leonor da Fonseca Pimentel, «a portuguesa de Nápoles». E, aqui e além, ao dobrar de um texto, como uma figurinha recortada de algum pop-up da infância, ressurge o rosto redondo e satisfeito do mais italiano dos escritores franceses – mas «muito francês e pouquíssimo italiano», segundo Leonardo Sciascia. A ideia do livro apareceu-me desde o início com este título. Que o «lecteur bénévole» (fórmula retintamente stendhaliana) me perdoe esta apropriação, levando-a à conta de reconhecimento do muito que devo, em ensinamento e em prazer, ao autor de Le rouge et le noir.

Resta acrescentar que, com Crónicas Italianas, dou por encerrada essa espécie de «trilogia italiana» iniciada com Roma, exercícios de reconhecimento (2003, última reedição em 2019), e continuada com Itália, práticas de viagem (2017). E que, dos dezassete textos que compõem este livro, apenas dois conheceram publicação prévia: Maquiavel, a liberdade e o poder na revista Egoísta, n.° 69, setembro de 2019, aqui retocado; e Carta de Fillide Me-landroni a um poeta indiscreto na revista Colóquio Letras,

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n.° 202, setembro de 2019. O último capítulo utiliza, de-senvolvendo-as muito, algumas passagens de um texto anterior, inserido em O deserto ocidental, publicado pela Assírio & Alvim em 2007.

Abril de 2020

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