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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa Universidade Federal da Paraíba 15 a 18 de agosto de 2017 ISSN 2236-1855 6227 CULTURA MATERIAL ESCOLAR RADIOFÔNICA NO ESTADO DO PARÁ: ANÁLISE DAS CARTILHAS DE ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (1960-1980) Rogerio Andrade Maciel 1 Maria do Perpetuo Socorro Gomes de Souza Avelino de França 2 Cesar Augusto Castro 3 Introdução O presente estudo tem como objetivo analisar a cultura material escolar radiofônica nas cartilhas de alfabetização para os jovens e adultos em duas escolas radiofônicas no Estado do Pará, no período de 1960 a 1980. Sousa (2007), compreende a cultura material escolar como um amplo e renovado programa de pesquisa, do qual emergem e intercruzam-se os campos de investigação e temáticas, tais como: a história da leitura, das disciplinas escolares, do currículo, da profissionalização docente, entre outras. Para Julia (1995), a cultura material escolar possui um conjunto de normas que definem os saberes a ensinar e as condutas a inculcarem um conjunto de práticas sobre determinados comportamentos nas instituições educativas. Neste caso, ao se transmitir saberes, práticas e condutas de comportamento, expressam- se a formação de valores educativos em cada sujeito e ao mesmo tempo uma identificação da cultura escolar presente em cada contexto. De acordo com Bencosta (2013), a cultura material escolar tem invadido os estudos das ciências humanas, propiciando uma análise das relações com os sujeitos, de uma análise sobre os modos de vida de cada população, ela se exprime como um conjunto de significações que está mergulhada pela ciências da sociologia, antropologia, da história que convergem para uma análise sobre o objeto de disputa, tensão, conflito da sociedade. 1 Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará-UFPA. 2 Profa. Dra. do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará- UEPA. 3 Prof. Dr. do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará- UFPA.

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CULTURA MATERIAL ESCOLAR RADIOFÔNICA NO ESTADO DO PARÁ: ANÁLISE DAS CARTILHAS DE ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO

DE JOVENS E ADULTOS (1960-1980)

Rogerio Andrade Maciel1

Maria do Perpetuo Socorro Gomes de Souza Avelino de França2

Cesar Augusto Castro3

Introdução

O presente estudo tem como objetivo analisar a cultura material escolar radiofônica nas

cartilhas de alfabetização para os jovens e adultos em duas escolas radiofônicas no Estado do

Pará, no período de 1960 a 1980.

Sousa (2007), compreende a cultura material escolar como um amplo e renovado

programa de pesquisa, do qual emergem e intercruzam-se os campos de investigação e

temáticas, tais como: a história da leitura, das disciplinas escolares, do currículo, da

profissionalização docente, entre outras.

Para Julia (1995), a cultura material escolar possui um conjunto de normas que

definem os saberes a ensinar e as condutas a inculcarem um conjunto de práticas sobre

determinados comportamentos nas instituições educativas. Neste caso, ao se transmitir

saberes, práticas e condutas de comportamento, expressam- se a formação de valores

educativos em cada sujeito e ao mesmo tempo uma identificação da cultura escolar presente

em cada contexto.

De acordo com Bencosta (2013), a cultura material escolar tem invadido os estudos das

ciências humanas, propiciando uma análise das relações com os sujeitos, de uma análise

sobre os modos de vida de cada população, ela se exprime como um conjunto de significações

que está mergulhada pela ciências da sociologia, antropologia, da história que convergem

para uma análise sobre o objeto de disputa, tensão, conflito da sociedade.

1 Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará-UFPA. 2 Profa. Dra. do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará- UEPA. 3 Prof. Dr. do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará- UFPA.

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Para esta assertiva buscou-se responder as seguintes questão científica: Que elementos

da cultura material escolar radiofônica estão presentes nas cartilhas de alfabetização para os

jovens e adultos no período de 1960 a 1980?

Com base na pesquisa documental, foi possível identificar nos Livros de Tombos do

memorial de D. Eliseu o manual pedagógico da escola radiofônica do Município de Bragança

– PA, a cartilha de alfabetização “Viver é lutar” e os documentos da implantação da Rádio

rural do Município de Santarém, com a cartilha de alfabetização “O Ribeirinho”.

Diante do exposto, no primeiro tópico deste artigo aborda-se a contextualização

histórica da cultura material escolar e seus desdobramentos na história da educação europeia

e brasileira. No segundo tópico do artigo, “Análise das cartilhas de Alfabetização e as

concepções de jovens e adultos no Brasil e no Pará”, apresenta-se uma análise deste objeto

sobre as concepções de jovens e adultos no Brasil e no Pará. Por fim, tecemos nas

considerações finais, uma síntese da realidade que nos propomos a investigar.

A contextualização histórica da cultura material escolar e seus desdobramentos na história da educação europeia e brasileira.

É preciso considerar que os estudos sobre a cultura material escolar está imbuída de

diversos acontecimentos históricos que ultrapassaram séculos para se materializar enquanto

um campo do conhecimento nas ciências humanas.

A composição do material escolar remonta diversos períodos históricos, desde os textos

de Comenius no século XVI, a intervenção da lousa com a utilização dos novos artefatos, a

construção dos prédios escolares no século XVIII e o surgimento do moderno mobiliário

escolar no século XIX, advindos da constituição dos sistemas nacionais de ensino e o

desenvolvimento do capitalismo, nos permitem considerar a cultura material escolar em cada

contexto histórico (SOUZA, 2007).

No século XIX, a ideologia do progresso pela técnica e pela ciência mergulhavam no

âmbito industrial, econômico e social, possibilitando a expansão dos objetos escolares que

incidem nas mais variáveis formas de ensino.

Um dos propósitos para a expansão desta modernidade está constituída pela lógica das

exposições pedagógicas, realizadas nos países europeus e nos Estados Unidos, cuja proposta

era a circulação dos produtos industriais de modernização educacional, ou seja, a propagação

dos materiais escolares que figuravam-se com uma única finalidade, simples produtos das

empresas (SOUZA, 2007).

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Nesse campo de socialização de exposições pedagógicas os países demonstravam cada

vez mais o grau de civilidade e modernidade e o papel da educação passa a ser redefinido nas

exposições. Tanto é que os métodos, programas e propostas de educação popular passam a

obter uma perspectiva de identificar a nacionalidade de cada país por meio dos diversos

materiais escolares.

Os mais variados suportes materiais estavam contemplados nas exposições, desde as plantas dos prédios escolares, os móveis, os acessórios, até os materiais de uso em sala de aula para finalidade diretas do ensino: quadro negro, mapas, livros etc. Essa diversidade é reveladora dos múltiplos sentidos que os materiais escolares obtiveram no final do século XIX e nas décadas inicias do século XX (SOUZA, 2007, p. 165).

Observa-se que toda a produção material para a escola representava uma face do

desenvolvimento econômico e social em que as tecnologias de ensino estavam diretamente

ligadas ao espetáculo da indústria. Essa lógica se materializava no desejo de classificar todas

a coisas do mundo – a agricultura, a mineração, o artesanato, as instituições políticas e

sociais a produção científica e até o espetáculo sobre os países colonizados.

De acordo com Souza (2007), a educação moderna, baseado na utilização da lousa no

século XVIII até ao uso do computador no século XX, dos bancos às carteiras individuais; da

instalação dos primeiros museus e laboratórios nas escolas primárias do século XIX,

evidenciam-se na busca por um processo de um ensino mais produtivo e eficiente, tornando

as aulas mais motivadas e atrativas, características imprescindíveis da educação moderna.

A cultura material no final da década de 1970, estavam permeados pela nova história

cultural, redimensionando as discussões acerca dos artefatos como fontes e objetos. Por isso,

neste período histórico a história da cultura material escolar é recente, permanecendo com

um campo jovem de pesquisa (PESEZ, 1990 apud SOUZA, 2007).

Durante o período de 1980- 1990, os estudos da cultura material escolar, floresceram

motivados em partes pelos desdobramentos da terceira geração dos Annales, e mais trade

pelo impacto da Nova História Cultural (BURKE, 2005 apud BENCOSTA, 2007).

No que concerne ao período de 1980, os estudos na França em história social, passou a examinar aspectos como a habitação (arquitetura), os artefatos domésticos, a alimentação, o vestuário. Na realidade, a preocupação com uma história da vida privada tendo em vista a esfera íntima foi o fermento que mobilizou as investigações sobre o cotidiano, dando ênfase à análise da vida material. Apesar de os estudos seriais com base em investigações quantitativas terem acumulado um conhecimento apreciável sobre o mundo dos objetos no antigo regime, críticas a análise serial apontaram a necessidade de se levar em conta o contexto do objeto não somente aspectos relacionados a circulação, mas também aqueles pertinentes à recepção e aos usos (SOUZA, 2007, p. 167).

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Neste ínterim, esta mudança de enfoque traz a emergência da constituição de uma nova

história da cultura material francesa. Daí a ênfase de que os historiadores passaram a

privilegiar a questão do consumo dos objetos materiais, buscando explicar as condutas

implicadas no consumo dos bens materiais. De certa forma, eram contra as análises

centradas nas ideias de alienação, fetichismo da mercadoria e retificação, o consumo é

tratado como processo de um ritual ligado aos sentidos e às escolhas dos consumidores

considerando os valores, a produção de identidades e o lugar da imaginação.

Na década de 1970 a 1980, os estudos sociológicos das populações escolares, nos mais

variados níveis de escolaridade, com base nos diferentes níveis de desigualdades, fomentado

pela burguesia a normatizar o povo, era reproduzido um manto de uma igualdade abstrata

que se veiculava intactas nas desigualdades herdadas pela reprodução das heranças culturais

num universo técnico e cívico (JULIA; 1995).

Ao destacar a cultura material escolar é preciso ter clareza que estava atrelada a um

pensamento europeu dotado de uma corrente positivista, permeados por um movimento

modernista, advindo da sociedade capitalista. Logo, estas produções científicas e históricas

da educação europeia e norte americana irão refletir diretamente nos desdobramentos da

cultura material escolar em diversos países, inclusive no Brasil.

No cenário brasileiro, os estudos sobre a cultura material escolar é recente no campo

educacional.

Historicamente, os profissionais da educação no Brasil utilizaram o termo materiais escolares para designar o conjunto dos artefatos materiais necessários para o funcionamento das escolas envolvendo mobiliários e acessórios, infra-estrutura do prédio escolar, equipamentos e utensílios destinados ao ensino das matérias como cartilhas, livros de leitura, mapas, globos, laboratórios de física e química e outros. (FISCARELLI, 2004 apud SOUZA, 2007, p. 170).

Diante de tal afirmativa, os materiais escolares receberam inúmeras designações ao

longo do tempo, materiais didáticos, recursos de ensino, materiais pedagógicos e isso está

atrelado a uma concepção didática na metade do século XX, que influenciava na construção

de um saber sobre os materiais escolares utilizados pelos professores e alunos no processo de

ensino e aprendizagem. A conceituação sobre a cultura material escolar, é utilizada na área

da história da educação com ênfase na preservação de fontes de pesquisa e de memória

educacional em arquivos escolares, museus e centros de documentação (SOUZA, 2007).

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Figura 1 – Articulação entre cultura escolar e cultura material escolar.

Fonte: Castro (2013).

A articulação entre a cultura material escolar e cultura escolar está influenciada pelos

estudos sobre cultura escolar, e isso é de suma importância para a pesquisa histórica porque

retrata os sujeitos que estão presentes em cada realidade histórica nas instituições

educativas, ou seja, os sujeitos neste universo escolar são visibilizados no campo da cultura

escolar.

Nessa lógica Julia (1995), nos diz que a cultura escolar não deve ser analisada sem as

relações conflituosas ou pacíficas que elas mantêm, a cada período histórico, com o conjunto

das culturas contemporâneas, religiosas, política ou cultura popular.

No que tange os próprios trabalhos que tomam a cultura escolar como categoria de

análise, das diversidade das disciplinas escolares, na pedagogia, psicologia da educação

Sociologia da educação, filosofia da educação entre outras partilham estas disciplinas de um

arsenal teórico, para assegurar procedimentos de validação da pesquisa e de legitimar

análises, constituídos de cada disciplina, a luz das especialidades do saber pedagógico e seu

diálogo com o campo dos conhecimento históricos e afins (JULIA, 1995).

Dependendo de cada contexto histórico surge a necessidade de interpelar as finalidades

da transmissão do conhecimento sociopolítico e sua socialização, que moldam a formação do

corpo profissional e dos agentes que são chamados a obedecer a essas ordens dos dispositivos

pedagógicos utilizados em cada contexto histórico, a fim de facilitar sua aplicação na

formação dos alunos. O que difundi, para além dos modos de pensar e agir no interior das

escolas, um debate amplo no interior das sociedades como um processo de escolarização

(JULIA, 1995).

Quando a educação escolarizada está relacionada aos artefatos e aos contextos

materiais, existe uma relação intrínseca dos objetos com a produção de sentidos que são

produzidas e reproduzidas pela sociedade em cada contexto histórico. Os objetos e seus

Cultura escolar

Cultura material escolar

Identifica a funcionalidade da instituição

educativa

Compreende-se os artefatos, arquitetura

escolar, mobiliário, canetas, papel, carteiras, quadro

negro etc.

c

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artefatos estão possibilitam a compreensão das ideologias, concepções, estratégias e práticas

culturais em cada realidade educativa.

No que diz respeito as produções de sentidos, os materiais para a concretização do

ensino, estavam embasadas numa concepção de renovação pedagógica pressuposta pelo

método intuitivo na virada do século XX (SOUZA, 2007).

De acordo com Valdemarim (2004) apud Souza (2007), o método intuitivo foi

fundamental para a consolidação da diversificação dos materiais didáticos na transição do

século XIX para o século XX, pois foi ele fixou os sentidos humanos como fonte de origem

das ideias, como método de instrumentos dos bons resultados. Neste método a observação e

o trabalho eram essenciais para tornar os elementos pedagógicos mais significativos, por isso,

ele possibilitou colocar as crianças em contato com um modelo de sociedade moderna e

capitalista.

Segundo Souza (2007), a proposta sobre a observação direta ou das noções empíricas,

fez com que os profissionais da educação estabelecessem uma dependência entre o método e

o uso dos materiais escolares, vistas como condições indispensáveis. Em todo método

utilizado pelos professores para o ensino da matemática, o ensino da linguagem, ciências

físicas e naturais, geografia e história e para o desenho, eram necessários os materiais

escolares.

Com base nesta relação do método e os materiais em todas as disciplinas, todo o ensino

público ficou seduzido pelo fascínio da pedagogia dos sentidos, no ato de ver e ouvir, ao qual

se tornaram elementos fundantes para a apreensão e produção do conhecimento em que a

cultura material escolar estava atrelada.

Vale destacar que a cultura material e visual, deve ser:

Entendida como “todo segmento do universo físico socialmente apropriado” no qual os artefatos compreendem um dos componentes mais importantes e de grande valia (MENEZES, 1998, p.01 apud SOUZA, 2007, p. 176).

Nesta citação, verifica-se que a cultura material escolar compreende os diversos

componentes materiais ligados ao mundo da educação. Por isso, a lógica da educação deve

ser vista como uma prática social e cultural, que não se restrinja somente ao processo de

escolarização, mas a apropriação de cada sociedade histórica.

De certa forma, as crenças sobre a modernização educacional com base nas construções

dos prédios e dotação de materiais escolares, possibilitaram aos historiadores e aos próprios

professores, diretores, inspetores das instituições normais e de ensino secundário, a

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criticarem à precarização das condições dos prédios da provisão material das escolas,

problematizando a atuação do poder público no cenário brasileiro.

Diante do exposto, observou-se que na cultura material escolar, é utilizada na história

da educação para dá ênfase a materialidade dos objetos construídos pela atividade humana e

a produção de sentidos que são guardados pela humanidade.

Na cultura material escolar, o mundo dos objetos entra em cena com o foco principal de

análise, numa lógica da interpretação histórica voltada para os estudos de representações,

práticas, saberes, culturas que são peculiares a cada contexto histórico da educação

brasileira.

Portanto, a trajetória da cultura material escolar possui um universo amplo de

programa de refinamento conceitual, teórico, analítico e de exploração de um conjunto

significativo de fontes de pesquisa, permeados pelos objetos escolares em sua materialidade.

Análise das cartilhas de Alfabetização e as concepções de jovens e adultos no Brasil e no Pará

A cultura material presente nas cartilhas de alfabetização nas escolas radiofônicas é

utilizada na área da história da educação pela influência da Nova História Cultural e pela

produtividade do conhecimento da pesquisa dos historiadores sobre à preservação de fontes

de pesquisa e de memória educacional em arquivos escolares, museus e centros de

documentação e material didático para a educação de jovens e adultos.

As cartilhas de alfabetização são artefatos escolares que apresentam as completudes

dos cotidianos escolares, imbuídos nos hábitos, tradições, ideologias e sujeitos relacionados

com a escolas.

A relação das cartilhas como objetos da cultura material escolar, transmitem saberes,

práticas e condutas de comportamento na alfabetização de jovens e adultos das escolas

radiofônicas, expressam- se, ainda, na formação de valores educativos em cada sujeito e ao

mesmo tempo uma identificação da cultura escolar presente em cada contexto.

Quando se propõe a analisar as cartilhas não se pode desvincular o movimento de

educaçao de base- MEB que projetou as cartilhas de alfabetização a estes sujeitos educados

jovens e adultos.

Sobre a orientação das equipes do MEB, os movimentos das primeiras décadas nas

escolas radiofônicas do Brasil, utilizaram inicialmente a cartilha “Venceremos”, que fazia

parte da educação de Cuba, como um dos instrumentos didáticos para orientar a equipe.

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Posteriormente, o movimento cria o seu livro didático “Viver é lutar”, que pós-ditadura, é

tolhido e reconfigurado pela cartilha “Multirão” (FÁVERO, 2006).

É preciso evidenciar que a lógica das cartilhas tinham como intuito promover

socialmente e humanamente, ao longo da vida dos jovens e adultos, processo de leitura e

escrita correlacionados a vida cotidiana dos sujeitos educandos.

Figura 2 – Cartilha “Viver é Lutar” Fonte: http://www.viverelutar.com.br/, 1963.

Para Wanderley (1984), o livro “Viver é lutar” representava um instrumento de

alfabetização de jovens e adultos. O livro tinha por objetivo contribuir para que homens e

mulheres refletissem sobre o mundo, as relações entre os homens e a sociedade brasileira. A

capa desta cartilha representa diversos bonecos de barro que estão constituídos no cotidiano

de uma escola radiofônica. No centro dos bonecos encontra-se o rádio como um dos objetos

escolares que moldam as formas de ensinar aos jovens e adultos.

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Figura 3 – Cartilha “Viver é Lutar”. Fonte: http://www.viverelutar.com.br, 1963.

Na lição que trata sobre as relações de trabalho enquanto parte integrante da família

camponesa, está constituído o trabalho coletivo em prol da comunidade, como um

instrumento de luta e vida. Esta ideologia de educação presente na cartilha “Viver é Lutar”,

teve seu recuo ideológico pela própria diretoria executiva do MEB nacional, porque os bispos

enfrentaram a onda de acusações defendendo a necessidade de uma linguagem mais forte,

pois o problema era profundo e o povo não aceitava mais meias- palavras; ao mesmo tempo,

enfraqueceram esse argumento colocando a cartilha de leitura como apenas um instrumento,

pertencente a um conjunto didático que compreendia outros folhetos, principalmente aquele

que explicitava a mensagem religiosa do MEB (FÁVERO, 2006).

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Figura 4 – Manual Pedagógico do Sistema Educativo Radiofônico de Bragança- SERB. Fonte: Diretoria do SERB, s/a

O livro “SERB” O Pioneiro em Tele Educação na Amazônia O que é O que faz”; discute

os Campos de Atuação do SERB; Metas alcançadas; Entidades que colaboram com o SERB. É

um dos manuais pedagógicos do sistema educativo radiofônico de Bragança, que indica uma

proposta de alfabetização pela cooperatividade em prol de uma alfabtização constituída pela

mensagem do evangelho.

Este manual pedagógico se coaduna comas concepções da doutrina dos Barnabitas,

mediados pelo padre Maria Giambelli e Dom Eliseu Maria Corolli, ambos tinham como

objetivo alfabetizar os caboclos jovens e adultos da Amazônia.

Nesta proposta, os saberes emancipatórios se faziam presente na cartilha viver é lutar e

era mediado pelas aulas dos professores locutores, pois estes traziam as temáticas contidas

nas lições sobre família, trabalho, relações sociais, práticas de trabalho que problematizam

as realidades educativas do povo brasileiro.

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Figura 5 – Manual Pedagógico do Sistema Educativo Radiofônico de Bragança- SERB/Equipe de Educação.

Fonte: Diretoria do SERB, s/a.

Este livro não possui autor e ano, entretanto, verificando o seu conteúdo é perceptível

que o trabalho desenvolvido pelo prelado está contido uma orientação de atividades sob o

viés do controle da comunidade, da catequese, da ação missionária, obtendo assim uma

alfabetização por uma vertente ideológica de evangelização, da congregação barnabítica.

Os saberes constituídos neste manual orientavam as aulas dos professores locutores da

escola radiofônica de Bragança tinham como base alfabetizar os jovens e adultos nos lugares

mais longíquos do Estado do Pará.

Na cartilha de alfabetização o ribeirinho, identifica-se a realidade da população

ribeirinha.

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Figura 6 – Cartilha o Ribeirinho da rádio rural do Município de Santarém -PA Fonte: Rodrigues, 2012

Nas cartilhas do MEB, “O ribeirinho”, existem orientações dos temas que são discutidos

pelos professores locutores e monitores, no sentido de desenvolver práticas educativas de

acordo com os objetos do cotidiano dos alunos da EJA. Destaca-se em uma das atividades “o

pote” enquanto elementos de sustentação da conservação da água para a população

ribeirinha e daí o monitor, sujeito que orienta os alunos na comunidade e tem habilidade de

leitura e escrita, faz todo processo de orientação.

Figura 7 – Cartilha o Ribeirinho, instrução de uma palavra geradora da rádio rural do Município de Santarém –PA.

Fonte: Rodrigues, 2012.

O conteúdo orientado pelo monitor para os alunos eram ministrados pelos professores

locutores nos rádios educativos da Amazônia Paraense, pois algumas comunidades se

situavam nos lugares mais longíquos da Amazônia. No caso da cartilha o “ribeirinho”, a

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atividade sobre o “pote”, apresenta e problematiza os instrumentos sobre o trabalho do

ribeirinho, sobre o conceito de natureza e cultura, constituindo por uma ideologia de

emancipação do homem.

As cartilhas de alfabetização para os jovens e adultos se constituem enquanto

elementos da cultura material escolar radiofônica, devido apresentarem os saberes emersos

na cultura camponêsa e do ribeirinho.

Diante da análise destas cartilhas, verifica-se que a cartilha do MEB/Nacional, e do

MEB da rádio rural de Santarém, estão imbuídas em suas atividades pedagógicas, de

ideologias emancipatórias - progressistas, porque problematizam os conteúdos, a partir da

noção de familia, trabalho e objetos do cotidiano que servem de base para a alfabetização de

jovens e adultos. Enquanto que no manual pedagógico do sistema educativo radiofônico de

Bragança, está emerso uma alfabetização destinada a evangelização dos jovens e adultos, via

rádio.

Considerações Finais

Ao analisar as cartilhas de alfabetização aos jovens e adultos, identificou-se que elas

fazem parte da cultura material escolar, pois apresenta uma lógica de fomação que molda os

sujeitos de acordo com as suas representações, práticas, saberes, culturas, ideologias, que

são peculiares a cada contexto histórico da educação brasileira

Num primeiro deste estudo, elencou-se a cultura material escolar e cultura escolar

enquanto campo do conhecimento na História da educação, observou-se que estas estão

constituídas por tempos remotos que ultrapassam uma era os textos de Comenius no século

XVI, com a intervenção da lousa com a utilização dos novos artefatos, a construção dos

prédios escolares no século XVIII e o surgimento do moderno mobiliário escolar no século

XIX, advindos da constituição dos sistemas nacionais de ensino e o desenvolvimento do

capitalismo, nos permitem considerar a cultura material escolar em cada contexto histórico.

No século XIX, a ideologia do progresso pela técnica e pela ciência que que mergulhava

no âmbito industrial, econômico e social, possibilitaram a expansão da cultura material

escolar, com uma concepção pelo método intuitivo que estabelecia uma dependência entre o

método dos professores e o uso dos materiais escolares. Em todo método utilizado pelos

professores para o ensino da matemática, o ensino da linguagem, ciências físicas e naturais,

geografia e história e para o desenho, eram necessários os materiais escolares, tornando o

ensino mais produtivo e eficiente. Vale mencionar que os materiais escolares obtinham uma

única finalidade, produtos de circulação das empresas.

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A cultura material escolar no Brasil é recente no campo educacional, pois os

historiadores designaram os materiais escolares como conjunto de artefatos, mobiliários,

infra-estrutura, acessórios, prédios escolares entre outros. Vale destacar, que isto estava

presente com a estrutura de uma concepção didática na metade do século XX, ao qual

influenciava na construção de um saber sobre os materiais escolares utilizados pelos

professores e alunos no processo de ensino-aprendizagem.

Neste sentido, observou-se que os diálogos sobre a cultura material escolar, nos

permite analisar as cartilhas de alfabetização aos jovens e adultos nas escolas radiofônicas do

Brasil e do Estado do Pará, pois elas estão contidas numa, que apresenta diversos saberes e

práticas educacionais, leitura e escrita, imbricados nas cartilhas e toda diversidade de

impressos sobre a leitura escrita que se faziam presentes na difusão e circulação de ideias.

Portanto, as cartilhas de alfabetização é um dos objetos escolares das escolas

radiofônicas que fazem parte de um patrimônio cultural, que guarda em si uma

representação do lugar, da memória material e imaterial, das representações e concepções de

jovens e adultos no período de 1960 a 1980.

Referências

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