Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017
ISSN 2236-1855 6227
CULTURA MATERIAL ESCOLAR RADIOFÔNICA NO ESTADO DO PARÁ: ANÁLISE DAS CARTILHAS DE ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO
DE JOVENS E ADULTOS (1960-1980)
Rogerio Andrade Maciel1
Maria do Perpetuo Socorro Gomes de Souza Avelino de França2
Cesar Augusto Castro3
Introdução
O presente estudo tem como objetivo analisar a cultura material escolar radiofônica nas
cartilhas de alfabetização para os jovens e adultos em duas escolas radiofônicas no Estado do
Pará, no período de 1960 a 1980.
Sousa (2007), compreende a cultura material escolar como um amplo e renovado
programa de pesquisa, do qual emergem e intercruzam-se os campos de investigação e
temáticas, tais como: a história da leitura, das disciplinas escolares, do currículo, da
profissionalização docente, entre outras.
Para Julia (1995), a cultura material escolar possui um conjunto de normas que
definem os saberes a ensinar e as condutas a inculcarem um conjunto de práticas sobre
determinados comportamentos nas instituições educativas. Neste caso, ao se transmitir
saberes, práticas e condutas de comportamento, expressam- se a formação de valores
educativos em cada sujeito e ao mesmo tempo uma identificação da cultura escolar presente
em cada contexto.
De acordo com Bencosta (2013), a cultura material escolar tem invadido os estudos das
ciências humanas, propiciando uma análise das relações com os sujeitos, de uma análise
sobre os modos de vida de cada população, ela se exprime como um conjunto de significações
que está mergulhada pela ciências da sociologia, antropologia, da história que convergem
para uma análise sobre o objeto de disputa, tensão, conflito da sociedade.
1 Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará-UFPA. 2 Profa. Dra. do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará- UEPA. 3 Prof. Dr. do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará- UFPA.
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Para esta assertiva buscou-se responder as seguintes questão científica: Que elementos
da cultura material escolar radiofônica estão presentes nas cartilhas de alfabetização para os
jovens e adultos no período de 1960 a 1980?
Com base na pesquisa documental, foi possível identificar nos Livros de Tombos do
memorial de D. Eliseu o manual pedagógico da escola radiofônica do Município de Bragança
– PA, a cartilha de alfabetização “Viver é lutar” e os documentos da implantação da Rádio
rural do Município de Santarém, com a cartilha de alfabetização “O Ribeirinho”.
Diante do exposto, no primeiro tópico deste artigo aborda-se a contextualização
histórica da cultura material escolar e seus desdobramentos na história da educação europeia
e brasileira. No segundo tópico do artigo, “Análise das cartilhas de Alfabetização e as
concepções de jovens e adultos no Brasil e no Pará”, apresenta-se uma análise deste objeto
sobre as concepções de jovens e adultos no Brasil e no Pará. Por fim, tecemos nas
considerações finais, uma síntese da realidade que nos propomos a investigar.
A contextualização histórica da cultura material escolar e seus desdobramentos na história da educação europeia e brasileira.
É preciso considerar que os estudos sobre a cultura material escolar está imbuída de
diversos acontecimentos históricos que ultrapassaram séculos para se materializar enquanto
um campo do conhecimento nas ciências humanas.
A composição do material escolar remonta diversos períodos históricos, desde os textos
de Comenius no século XVI, a intervenção da lousa com a utilização dos novos artefatos, a
construção dos prédios escolares no século XVIII e o surgimento do moderno mobiliário
escolar no século XIX, advindos da constituição dos sistemas nacionais de ensino e o
desenvolvimento do capitalismo, nos permitem considerar a cultura material escolar em cada
contexto histórico (SOUZA, 2007).
No século XIX, a ideologia do progresso pela técnica e pela ciência mergulhavam no
âmbito industrial, econômico e social, possibilitando a expansão dos objetos escolares que
incidem nas mais variáveis formas de ensino.
Um dos propósitos para a expansão desta modernidade está constituída pela lógica das
exposições pedagógicas, realizadas nos países europeus e nos Estados Unidos, cuja proposta
era a circulação dos produtos industriais de modernização educacional, ou seja, a propagação
dos materiais escolares que figuravam-se com uma única finalidade, simples produtos das
empresas (SOUZA, 2007).
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Nesse campo de socialização de exposições pedagógicas os países demonstravam cada
vez mais o grau de civilidade e modernidade e o papel da educação passa a ser redefinido nas
exposições. Tanto é que os métodos, programas e propostas de educação popular passam a
obter uma perspectiva de identificar a nacionalidade de cada país por meio dos diversos
materiais escolares.
Os mais variados suportes materiais estavam contemplados nas exposições, desde as plantas dos prédios escolares, os móveis, os acessórios, até os materiais de uso em sala de aula para finalidade diretas do ensino: quadro negro, mapas, livros etc. Essa diversidade é reveladora dos múltiplos sentidos que os materiais escolares obtiveram no final do século XIX e nas décadas inicias do século XX (SOUZA, 2007, p. 165).
Observa-se que toda a produção material para a escola representava uma face do
desenvolvimento econômico e social em que as tecnologias de ensino estavam diretamente
ligadas ao espetáculo da indústria. Essa lógica se materializava no desejo de classificar todas
a coisas do mundo – a agricultura, a mineração, o artesanato, as instituições políticas e
sociais a produção científica e até o espetáculo sobre os países colonizados.
De acordo com Souza (2007), a educação moderna, baseado na utilização da lousa no
século XVIII até ao uso do computador no século XX, dos bancos às carteiras individuais; da
instalação dos primeiros museus e laboratórios nas escolas primárias do século XIX,
evidenciam-se na busca por um processo de um ensino mais produtivo e eficiente, tornando
as aulas mais motivadas e atrativas, características imprescindíveis da educação moderna.
A cultura material no final da década de 1970, estavam permeados pela nova história
cultural, redimensionando as discussões acerca dos artefatos como fontes e objetos. Por isso,
neste período histórico a história da cultura material escolar é recente, permanecendo com
um campo jovem de pesquisa (PESEZ, 1990 apud SOUZA, 2007).
Durante o período de 1980- 1990, os estudos da cultura material escolar, floresceram
motivados em partes pelos desdobramentos da terceira geração dos Annales, e mais trade
pelo impacto da Nova História Cultural (BURKE, 2005 apud BENCOSTA, 2007).
No que concerne ao período de 1980, os estudos na França em história social, passou a examinar aspectos como a habitação (arquitetura), os artefatos domésticos, a alimentação, o vestuário. Na realidade, a preocupação com uma história da vida privada tendo em vista a esfera íntima foi o fermento que mobilizou as investigações sobre o cotidiano, dando ênfase à análise da vida material. Apesar de os estudos seriais com base em investigações quantitativas terem acumulado um conhecimento apreciável sobre o mundo dos objetos no antigo regime, críticas a análise serial apontaram a necessidade de se levar em conta o contexto do objeto não somente aspectos relacionados a circulação, mas também aqueles pertinentes à recepção e aos usos (SOUZA, 2007, p. 167).
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Neste ínterim, esta mudança de enfoque traz a emergência da constituição de uma nova
história da cultura material francesa. Daí a ênfase de que os historiadores passaram a
privilegiar a questão do consumo dos objetos materiais, buscando explicar as condutas
implicadas no consumo dos bens materiais. De certa forma, eram contra as análises
centradas nas ideias de alienação, fetichismo da mercadoria e retificação, o consumo é
tratado como processo de um ritual ligado aos sentidos e às escolhas dos consumidores
considerando os valores, a produção de identidades e o lugar da imaginação.
Na década de 1970 a 1980, os estudos sociológicos das populações escolares, nos mais
variados níveis de escolaridade, com base nos diferentes níveis de desigualdades, fomentado
pela burguesia a normatizar o povo, era reproduzido um manto de uma igualdade abstrata
que se veiculava intactas nas desigualdades herdadas pela reprodução das heranças culturais
num universo técnico e cívico (JULIA; 1995).
Ao destacar a cultura material escolar é preciso ter clareza que estava atrelada a um
pensamento europeu dotado de uma corrente positivista, permeados por um movimento
modernista, advindo da sociedade capitalista. Logo, estas produções científicas e históricas
da educação europeia e norte americana irão refletir diretamente nos desdobramentos da
cultura material escolar em diversos países, inclusive no Brasil.
No cenário brasileiro, os estudos sobre a cultura material escolar é recente no campo
educacional.
Historicamente, os profissionais da educação no Brasil utilizaram o termo materiais escolares para designar o conjunto dos artefatos materiais necessários para o funcionamento das escolas envolvendo mobiliários e acessórios, infra-estrutura do prédio escolar, equipamentos e utensílios destinados ao ensino das matérias como cartilhas, livros de leitura, mapas, globos, laboratórios de física e química e outros. (FISCARELLI, 2004 apud SOUZA, 2007, p. 170).
Diante de tal afirmativa, os materiais escolares receberam inúmeras designações ao
longo do tempo, materiais didáticos, recursos de ensino, materiais pedagógicos e isso está
atrelado a uma concepção didática na metade do século XX, que influenciava na construção
de um saber sobre os materiais escolares utilizados pelos professores e alunos no processo de
ensino e aprendizagem. A conceituação sobre a cultura material escolar, é utilizada na área
da história da educação com ênfase na preservação de fontes de pesquisa e de memória
educacional em arquivos escolares, museus e centros de documentação (SOUZA, 2007).
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Figura 1 – Articulação entre cultura escolar e cultura material escolar.
Fonte: Castro (2013).
A articulação entre a cultura material escolar e cultura escolar está influenciada pelos
estudos sobre cultura escolar, e isso é de suma importância para a pesquisa histórica porque
retrata os sujeitos que estão presentes em cada realidade histórica nas instituições
educativas, ou seja, os sujeitos neste universo escolar são visibilizados no campo da cultura
escolar.
Nessa lógica Julia (1995), nos diz que a cultura escolar não deve ser analisada sem as
relações conflituosas ou pacíficas que elas mantêm, a cada período histórico, com o conjunto
das culturas contemporâneas, religiosas, política ou cultura popular.
No que tange os próprios trabalhos que tomam a cultura escolar como categoria de
análise, das diversidade das disciplinas escolares, na pedagogia, psicologia da educação
Sociologia da educação, filosofia da educação entre outras partilham estas disciplinas de um
arsenal teórico, para assegurar procedimentos de validação da pesquisa e de legitimar
análises, constituídos de cada disciplina, a luz das especialidades do saber pedagógico e seu
diálogo com o campo dos conhecimento históricos e afins (JULIA, 1995).
Dependendo de cada contexto histórico surge a necessidade de interpelar as finalidades
da transmissão do conhecimento sociopolítico e sua socialização, que moldam a formação do
corpo profissional e dos agentes que são chamados a obedecer a essas ordens dos dispositivos
pedagógicos utilizados em cada contexto histórico, a fim de facilitar sua aplicação na
formação dos alunos. O que difundi, para além dos modos de pensar e agir no interior das
escolas, um debate amplo no interior das sociedades como um processo de escolarização
(JULIA, 1995).
Quando a educação escolarizada está relacionada aos artefatos e aos contextos
materiais, existe uma relação intrínseca dos objetos com a produção de sentidos que são
produzidas e reproduzidas pela sociedade em cada contexto histórico. Os objetos e seus
Cultura escolar
Cultura material escolar
Identifica a funcionalidade da instituição
educativa
Compreende-se os artefatos, arquitetura
escolar, mobiliário, canetas, papel, carteiras, quadro
negro etc.
c
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artefatos estão possibilitam a compreensão das ideologias, concepções, estratégias e práticas
culturais em cada realidade educativa.
No que diz respeito as produções de sentidos, os materiais para a concretização do
ensino, estavam embasadas numa concepção de renovação pedagógica pressuposta pelo
método intuitivo na virada do século XX (SOUZA, 2007).
De acordo com Valdemarim (2004) apud Souza (2007), o método intuitivo foi
fundamental para a consolidação da diversificação dos materiais didáticos na transição do
século XIX para o século XX, pois foi ele fixou os sentidos humanos como fonte de origem
das ideias, como método de instrumentos dos bons resultados. Neste método a observação e
o trabalho eram essenciais para tornar os elementos pedagógicos mais significativos, por isso,
ele possibilitou colocar as crianças em contato com um modelo de sociedade moderna e
capitalista.
Segundo Souza (2007), a proposta sobre a observação direta ou das noções empíricas,
fez com que os profissionais da educação estabelecessem uma dependência entre o método e
o uso dos materiais escolares, vistas como condições indispensáveis. Em todo método
utilizado pelos professores para o ensino da matemática, o ensino da linguagem, ciências
físicas e naturais, geografia e história e para o desenho, eram necessários os materiais
escolares.
Com base nesta relação do método e os materiais em todas as disciplinas, todo o ensino
público ficou seduzido pelo fascínio da pedagogia dos sentidos, no ato de ver e ouvir, ao qual
se tornaram elementos fundantes para a apreensão e produção do conhecimento em que a
cultura material escolar estava atrelada.
Vale destacar que a cultura material e visual, deve ser:
Entendida como “todo segmento do universo físico socialmente apropriado” no qual os artefatos compreendem um dos componentes mais importantes e de grande valia (MENEZES, 1998, p.01 apud SOUZA, 2007, p. 176).
Nesta citação, verifica-se que a cultura material escolar compreende os diversos
componentes materiais ligados ao mundo da educação. Por isso, a lógica da educação deve
ser vista como uma prática social e cultural, que não se restrinja somente ao processo de
escolarização, mas a apropriação de cada sociedade histórica.
De certa forma, as crenças sobre a modernização educacional com base nas construções
dos prédios e dotação de materiais escolares, possibilitaram aos historiadores e aos próprios
professores, diretores, inspetores das instituições normais e de ensino secundário, a
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criticarem à precarização das condições dos prédios da provisão material das escolas,
problematizando a atuação do poder público no cenário brasileiro.
Diante do exposto, observou-se que na cultura material escolar, é utilizada na história
da educação para dá ênfase a materialidade dos objetos construídos pela atividade humana e
a produção de sentidos que são guardados pela humanidade.
Na cultura material escolar, o mundo dos objetos entra em cena com o foco principal de
análise, numa lógica da interpretação histórica voltada para os estudos de representações,
práticas, saberes, culturas que são peculiares a cada contexto histórico da educação
brasileira.
Portanto, a trajetória da cultura material escolar possui um universo amplo de
programa de refinamento conceitual, teórico, analítico e de exploração de um conjunto
significativo de fontes de pesquisa, permeados pelos objetos escolares em sua materialidade.
Análise das cartilhas de Alfabetização e as concepções de jovens e adultos no Brasil e no Pará
A cultura material presente nas cartilhas de alfabetização nas escolas radiofônicas é
utilizada na área da história da educação pela influência da Nova História Cultural e pela
produtividade do conhecimento da pesquisa dos historiadores sobre à preservação de fontes
de pesquisa e de memória educacional em arquivos escolares, museus e centros de
documentação e material didático para a educação de jovens e adultos.
As cartilhas de alfabetização são artefatos escolares que apresentam as completudes
dos cotidianos escolares, imbuídos nos hábitos, tradições, ideologias e sujeitos relacionados
com a escolas.
A relação das cartilhas como objetos da cultura material escolar, transmitem saberes,
práticas e condutas de comportamento na alfabetização de jovens e adultos das escolas
radiofônicas, expressam- se, ainda, na formação de valores educativos em cada sujeito e ao
mesmo tempo uma identificação da cultura escolar presente em cada contexto.
Quando se propõe a analisar as cartilhas não se pode desvincular o movimento de
educaçao de base- MEB que projetou as cartilhas de alfabetização a estes sujeitos educados
jovens e adultos.
Sobre a orientação das equipes do MEB, os movimentos das primeiras décadas nas
escolas radiofônicas do Brasil, utilizaram inicialmente a cartilha “Venceremos”, que fazia
parte da educação de Cuba, como um dos instrumentos didáticos para orientar a equipe.
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Posteriormente, o movimento cria o seu livro didático “Viver é lutar”, que pós-ditadura, é
tolhido e reconfigurado pela cartilha “Multirão” (FÁVERO, 2006).
É preciso evidenciar que a lógica das cartilhas tinham como intuito promover
socialmente e humanamente, ao longo da vida dos jovens e adultos, processo de leitura e
escrita correlacionados a vida cotidiana dos sujeitos educandos.
Figura 2 – Cartilha “Viver é Lutar” Fonte: http://www.viverelutar.com.br/, 1963.
Para Wanderley (1984), o livro “Viver é lutar” representava um instrumento de
alfabetização de jovens e adultos. O livro tinha por objetivo contribuir para que homens e
mulheres refletissem sobre o mundo, as relações entre os homens e a sociedade brasileira. A
capa desta cartilha representa diversos bonecos de barro que estão constituídos no cotidiano
de uma escola radiofônica. No centro dos bonecos encontra-se o rádio como um dos objetos
escolares que moldam as formas de ensinar aos jovens e adultos.
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Figura 3 – Cartilha “Viver é Lutar”. Fonte: http://www.viverelutar.com.br, 1963.
Na lição que trata sobre as relações de trabalho enquanto parte integrante da família
camponesa, está constituído o trabalho coletivo em prol da comunidade, como um
instrumento de luta e vida. Esta ideologia de educação presente na cartilha “Viver é Lutar”,
teve seu recuo ideológico pela própria diretoria executiva do MEB nacional, porque os bispos
enfrentaram a onda de acusações defendendo a necessidade de uma linguagem mais forte,
pois o problema era profundo e o povo não aceitava mais meias- palavras; ao mesmo tempo,
enfraqueceram esse argumento colocando a cartilha de leitura como apenas um instrumento,
pertencente a um conjunto didático que compreendia outros folhetos, principalmente aquele
que explicitava a mensagem religiosa do MEB (FÁVERO, 2006).
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Figura 4 – Manual Pedagógico do Sistema Educativo Radiofônico de Bragança- SERB. Fonte: Diretoria do SERB, s/a
O livro “SERB” O Pioneiro em Tele Educação na Amazônia O que é O que faz”; discute
os Campos de Atuação do SERB; Metas alcançadas; Entidades que colaboram com o SERB. É
um dos manuais pedagógicos do sistema educativo radiofônico de Bragança, que indica uma
proposta de alfabetização pela cooperatividade em prol de uma alfabtização constituída pela
mensagem do evangelho.
Este manual pedagógico se coaduna comas concepções da doutrina dos Barnabitas,
mediados pelo padre Maria Giambelli e Dom Eliseu Maria Corolli, ambos tinham como
objetivo alfabetizar os caboclos jovens e adultos da Amazônia.
Nesta proposta, os saberes emancipatórios se faziam presente na cartilha viver é lutar e
era mediado pelas aulas dos professores locutores, pois estes traziam as temáticas contidas
nas lições sobre família, trabalho, relações sociais, práticas de trabalho que problematizam
as realidades educativas do povo brasileiro.
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Figura 5 – Manual Pedagógico do Sistema Educativo Radiofônico de Bragança- SERB/Equipe de Educação.
Fonte: Diretoria do SERB, s/a.
Este livro não possui autor e ano, entretanto, verificando o seu conteúdo é perceptível
que o trabalho desenvolvido pelo prelado está contido uma orientação de atividades sob o
viés do controle da comunidade, da catequese, da ação missionária, obtendo assim uma
alfabetização por uma vertente ideológica de evangelização, da congregação barnabítica.
Os saberes constituídos neste manual orientavam as aulas dos professores locutores da
escola radiofônica de Bragança tinham como base alfabetizar os jovens e adultos nos lugares
mais longíquos do Estado do Pará.
Na cartilha de alfabetização o ribeirinho, identifica-se a realidade da população
ribeirinha.
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Figura 6 – Cartilha o Ribeirinho da rádio rural do Município de Santarém -PA Fonte: Rodrigues, 2012
Nas cartilhas do MEB, “O ribeirinho”, existem orientações dos temas que são discutidos
pelos professores locutores e monitores, no sentido de desenvolver práticas educativas de
acordo com os objetos do cotidiano dos alunos da EJA. Destaca-se em uma das atividades “o
pote” enquanto elementos de sustentação da conservação da água para a população
ribeirinha e daí o monitor, sujeito que orienta os alunos na comunidade e tem habilidade de
leitura e escrita, faz todo processo de orientação.
Figura 7 – Cartilha o Ribeirinho, instrução de uma palavra geradora da rádio rural do Município de Santarém –PA.
Fonte: Rodrigues, 2012.
O conteúdo orientado pelo monitor para os alunos eram ministrados pelos professores
locutores nos rádios educativos da Amazônia Paraense, pois algumas comunidades se
situavam nos lugares mais longíquos da Amazônia. No caso da cartilha o “ribeirinho”, a
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atividade sobre o “pote”, apresenta e problematiza os instrumentos sobre o trabalho do
ribeirinho, sobre o conceito de natureza e cultura, constituindo por uma ideologia de
emancipação do homem.
As cartilhas de alfabetização para os jovens e adultos se constituem enquanto
elementos da cultura material escolar radiofônica, devido apresentarem os saberes emersos
na cultura camponêsa e do ribeirinho.
Diante da análise destas cartilhas, verifica-se que a cartilha do MEB/Nacional, e do
MEB da rádio rural de Santarém, estão imbuídas em suas atividades pedagógicas, de
ideologias emancipatórias - progressistas, porque problematizam os conteúdos, a partir da
noção de familia, trabalho e objetos do cotidiano que servem de base para a alfabetização de
jovens e adultos. Enquanto que no manual pedagógico do sistema educativo radiofônico de
Bragança, está emerso uma alfabetização destinada a evangelização dos jovens e adultos, via
rádio.
Considerações Finais
Ao analisar as cartilhas de alfabetização aos jovens e adultos, identificou-se que elas
fazem parte da cultura material escolar, pois apresenta uma lógica de fomação que molda os
sujeitos de acordo com as suas representações, práticas, saberes, culturas, ideologias, que
são peculiares a cada contexto histórico da educação brasileira
Num primeiro deste estudo, elencou-se a cultura material escolar e cultura escolar
enquanto campo do conhecimento na História da educação, observou-se que estas estão
constituídas por tempos remotos que ultrapassam uma era os textos de Comenius no século
XVI, com a intervenção da lousa com a utilização dos novos artefatos, a construção dos
prédios escolares no século XVIII e o surgimento do moderno mobiliário escolar no século
XIX, advindos da constituição dos sistemas nacionais de ensino e o desenvolvimento do
capitalismo, nos permitem considerar a cultura material escolar em cada contexto histórico.
No século XIX, a ideologia do progresso pela técnica e pela ciência que que mergulhava
no âmbito industrial, econômico e social, possibilitaram a expansão da cultura material
escolar, com uma concepção pelo método intuitivo que estabelecia uma dependência entre o
método dos professores e o uso dos materiais escolares. Em todo método utilizado pelos
professores para o ensino da matemática, o ensino da linguagem, ciências físicas e naturais,
geografia e história e para o desenho, eram necessários os materiais escolares, tornando o
ensino mais produtivo e eficiente. Vale mencionar que os materiais escolares obtinham uma
única finalidade, produtos de circulação das empresas.
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A cultura material escolar no Brasil é recente no campo educacional, pois os
historiadores designaram os materiais escolares como conjunto de artefatos, mobiliários,
infra-estrutura, acessórios, prédios escolares entre outros. Vale destacar, que isto estava
presente com a estrutura de uma concepção didática na metade do século XX, ao qual
influenciava na construção de um saber sobre os materiais escolares utilizados pelos
professores e alunos no processo de ensino-aprendizagem.
Neste sentido, observou-se que os diálogos sobre a cultura material escolar, nos
permite analisar as cartilhas de alfabetização aos jovens e adultos nas escolas radiofônicas do
Brasil e do Estado do Pará, pois elas estão contidas numa, que apresenta diversos saberes e
práticas educacionais, leitura e escrita, imbricados nas cartilhas e toda diversidade de
impressos sobre a leitura escrita que se faziam presentes na difusão e circulação de ideias.
Portanto, as cartilhas de alfabetização é um dos objetos escolares das escolas
radiofônicas que fazem parte de um patrimônio cultural, que guarda em si uma
representação do lugar, da memória material e imaterial, das representações e concepções de
jovens e adultos no período de 1960 a 1980.
Referências
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