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CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS Francisco Tonial Gonçalves COMBATE AO TERRORISMO APÓS 11/09: UMA ANÁLISE COMPARATIVA DOS GOVERNOS BUSH E OBAMA Santa Cruz do Sul 2015

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CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Francisco Tonial Gonçalves

COMBATE AO TERRORISMO APÓS 11/09: UMA ANÁLISE COMPARATIVA DOS

GOVERNOS BUSH E OBAMA

Santa Cruz do Sul

2015

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Francisco Tonial Gonçalves

COMBATE AO TERRORISMO APÓS 11/09: UMA ANÁLISE COMPARATIVA DOS

GOVERNOS BUSH E OBAMA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Relações Internacionais da Universidade de Santa Cruz do Sul, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais.

Orientador: Prof. Bruno Mendelski de Souza

Santa Cruz do Sul

2015

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RESUMO

Os atentados ocorridos no dia 11 de setembro de 2001, em Nova Iorque, contra as torres do World Trade Center e o Pentágono, redirecionaram a política externa dos Estados Unidos para o Oriente Médio, fazendo com que houvesse uma mudança no foco da atuação do país e gerando guerras e crises políticas. Surgiu o argumento de que as intervenções estadunidenses na região, após os ataques, poderiam ser justificadas pela necessidade de permanência na posição de superpotência global e manutenção da segurança nacional, assim como pelo dever de posse das reservas de petróleo, pois caso outro Estado o fizesse, estaria comprometendo a posição de maior potência mundial ocupada pelos Estados Unidos. Considerando isso, o objetivo do presente trabalho foi investigar as diferenças e possíveis semelhanças nas providências tomadas por George W. Bush e Barack Obama para conter ou prevenir a ameaça terrorista, indicando os fatores internos e externos que influenciaram no processo de tomada de decisão, para, assim, responder o problema de pesquisa, que questiona quais foram essas medidas utilizadas pelos dois governantes. Além isso, buscou-se apresentar as consequências das duas políticas externas para a segurança internacional, bem como os principais grupos que, para o Ocidente, ameaçam a segurança global. A metodologia do trabalho pautou-se pela pesquisa bibliográfica, histórico-descritiva, explicativa e exploratória, com análise predominantemente descritiva e baseada em procedimentos hipotético-dedutivos. Para relacionar as variáveis internas e externas e facilitar o processo de formulação das ações externas dos países, o trabalho teve a teoria de Análise de Política Externa como método de pesquisa, com enfoque no Modelo de Hermann (1990). Como resultados, pode-se destacar que a pesquisa confirmou a hipótese de que as duas políticas externas, ainda que reflitam reações dos Estados Unidos em contextos diferentes e que tenham sido realizadas por dois governantes com visões políticas, convicções e personalidades distintas, não se desvincularam totalmente uma da outra. O uso da força para alcançar um objetivo pré-estabelecido (contenção do terrorismo) esteve presente na Doutrina Bush e na Doutrina Obama, ainda que, na primeira, de forma mais unilateral, e, na segunda, de modo mais discreto e com defesa do multilateralismo e da cooperação. Além disso, pôde-se perceber que os eventos ocorridos, sobretudo, no século XX (como a Primeira e a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria), contribuíram para o prestígio estadunidense, favorecendo o crescimento econômico, político e militar dos Estados Unidos e, com isso, sua elevação ao nível de única superpotência mundial. Viu-se também que o terrorismo não foi o primeiro “inimigo” na concepção estadunidense, e que ainda que a prática terrorista tenha ganhado destaque no século XXI, as ações caracterizadas como terroristas existem desde o século XVIII, e vão muito além de ataques radicais motivados por princípios religiosos.

Palavras-chave: Política externa estadunidense. Terrorismo internacional. Oriente Médio. Doutrina Bush. Doutrina Obama.

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ABSTRACT

The attacks against the towers of the World Trade Center and the Pentagon occurred on September 11th, 2001 in New York redirected the foreign policy of the United States to the Middle East, changing the focus of the country’s actions and generating wars and political crisis. It has emerged the argument that the American interventions in the zone after the attacks could be justified by the requirement of permanence in the global superpower position and maintenance of national security, as well as the duty of possession of the oil reserves, because if another State did it would be compromising the world’s biggest potency position occupied by the United States. Considering that, the goal of the present study was the investigation of the differences and possible similarities in the providences taken by George W. Bush and Barack Obama to contain or prevent the terrorist threat, indicating the internal and external factors that influenced in the decision making process to thereby answer the research problem, that questions which were these measures used by both the leaders. Moreover, the consequences of both policies for the international security were also presented just like the main groups that threaten the global security to the West. The methodology was guided by bibliographic, historical-descriptive, explanatory, exploratory research methods, with descriptive analysis and hypothetical-deductive procedures. To relate the internal and external variables and to facilitate the process of formulation of external actions utilized by the countries, the study had the Foreign Policy Analysis theory as research method, focusing on the Hermann’s Method (1990). As results, the research confirmed the hypothesis that the two external policies, although reflect reactions of the United States in different contexts and both have been accomplished by two rulers with different political views, convictions and personalities, didn’t detach completely from each other. The use of force to achieve a predetermined goal (terrorism containment) was present in Bush Doctrine and Obama Doctrine, although more unilaterally in the first one, and more discreet and with the defense of the multilateralism and cooperation in the second one. Furthermore, the events occurred mainly in the 20th century (like the World War I, World War II and Cold War), contributed to the American prestige favoring the economic, political and military growth of the United States and therewith its elevation to the level of the world's unique superpower. Thus, the terrorism was not the first ‘enemy’ in the American conception, and even if the terrorist practice has gained prominence in the 21st century, the actions categorized as terrorists exist since the 18th century and go far beyond of radical attacks motivated by religious principles. Keywords: American foreign policy. International terrorism. Middle East. Bush Doctrine. Obama Doctrine.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Fluxograma 1 – O papel de arbitragem de processos de tomada de decisão entre

agentes de mudança e níveis de mudanças de políticas .......................................... 44

Fluxograma 2 – O Modelo de Hermann (1990) para a política externa de Bush em

relação ao terrorismo ................................................................................................ 62

Fluxograma 3 – O Modelo de Hermann (1990) para a política externa de Obama em

relação ao terrorismo ................................................................................................ 62

Mapa 1 – Principais áreas de atuação da Al-Qaeda ................................................. 20

Mapa 2 – Áreas de atividade dos principais grupos terroristas ................................. 26

Mapa 3 – Ofensiva contra o terrorismo, sob a perspectiva dos EUA ........................ 27

Mapa 4 – Áreas controladas pelo Estado Islâmico .................................................... 28

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 6

1.1 Problema de pesquisa ........................................................................................ 6

1.2 Hipóteses ............................................................................................................. 7

1.3 Objetivos .............................................................................................................. 7

1.3.1 Objetivo geral ................................................................................................... 7

1.3.2 Objetivos específicos ....................................................................................... 7

1.4 Justificativa .......................................................................................................... 8

1.5 Metodologia ......................................................................................................... 9

1.5.1 Estrutura do trabalho ..................................................................................... 10

2 O TERRORISMO COMO AMEAÇA AOS ESTADOS UNIDOS ............................. 12

2.1 O terrorismo antes do 11/09 ............................................................................. 12

2.1.1 O terrorismo islâmico .................................................................................... 15

2.2 O terrorismo após o 11/09 ................................................................................ 21

3 BREVE HISTÓRICO DA POLÍTICA EXTERNA ESTADUNIDENSE E A TEORIA

DE ANÁLISE DE POLÍTICA EXTERNA ................................................................... 30

3.1 Histórico da política externa dos Estados Unidos ......................................... 30

3.2 Análise de Política Externa ............................................................................... 38

3.2.1 O modelo de Hermann para a análise de alterações na política externa .. 42

4 A POLÍTICA EXTERNA DOS ESTADOS UNIDOS PARA O TERRORISMO

DESDE O 11/09 ........................................................................................................ 45

4.1 A política externa de George W. Bush para o terrorismo (2001 – 2008) ....... 45

4.2 A política externa de Barack Obama para o terrorismo (2009 – atualidade) 54

4.3 Aproximações e distanciamentos das políticas de Bush e Obama para o

terrorismo ................................................................................................................ 59

5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 65

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 69

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1 INTRODUÇÃO

Mesmo que não haja um consenso sobre o conceito do terrorismo, costuma-

se definir esse fenômeno, exercido, especialmente, por grupos como a Al-Qaeda,

como o uso sistemático da violência contra uma população ou comunidade

específica para criar um ambiente de medo, e, assim, alcançar um objetivo político.

As ações terroristas ganharam maior destaque, sobretudo, após os ataques de 11

de setembro de 2001, contra os Estados Unidos (EUA), considerados, por sua vez, o

maior atentado terrorista de todos os tempos. Após o ocorrido, a adoção de medidas

de prevenção e segurança se fez altamente necessária, não só no país, mas em

todo o mundo, uma vez que os ataques foram contra a maior potência mundial.

Isso fez com que a política externa estadunidense para o Oriente Médio fosse

modificada, ocasionando guerras e crises políticas. Além disso, gerou uma série de

questionamentos a respeito do propósito estadunidense em empreender as medidas

que foram utilizadas para garantir a segurança nacional e a posição de destaque

internacional ocupada pelo país.

Surge, então, a chamada “Guerra ao Terror”, declarada pelo então presidente

dos Estados Unidos, George W. Bush, como parte de uma estratégia global de

combate ao terrorismo. Com a chegada do seu sucessor, Barack Obama, ao poder,

houve uma reformulação na estratégia de segurança estadunidense, que continuou

com o seu objetivo inicial, porém, devidamente adaptada ao governo vigente,

diferindo, em vários aspectos, da adotada no governo anterior. Essas diferentes

abordagens serão analisadas no decorrer deste trabalho.

1.1 Problema de Pesquisa

Quais foram/são as medidas utilizadas pelos Estados Unidos, nos governos

Bush e Obama, para prevenir e/ou combater o terrorismo, após o 11 de setembro de

2001, e quais são as diferenças e possíveis semelhanças existentes entre elas?

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1.2 Hipóteses

Ainda que as duas doutrinas de combate ao terrorismo reflitam deveres da

política de segurança nacional dos Estados Unidos em contextos diversos, dados os

interesses e o lobby de grupos internos como a indústria de petróleo, construção

civil, armamentos e o lobby sionista, é indubitável a interligação dessas doutrinas.

Enquanto a primeira foi a reação direta imediata aos atentados terroristas de 11 de

setembro de 2001, que extrapolou os limites do uso da força, a segunda, reação aos

efeitos negativos de sua sucessora, foi reduzida e redirecionada a propósitos muito

menos ambiciosos e belicosos (contrapondo-se, parcialmente, à anterior), ocorrendo

em um período em que a crise econômica, a multipolaridade mundial e o crescente

antiamericanismo surgiram como fatores de grande influência na política externa

estadunidense.

1.3 Objetivos

1.3.1 Objetivo Geral

Este trabalho tem por objetivo geral a identificação e análise das diferenças e

possíveis semelhanças nas medidas adotadas pelos dois últimos presidentes dos

Estados Unidos, em seus respectivos mandatos, para combater e/ou prevenir o

terrorismo, após os ataques de 11 de setembro de 2001.

1.3.2 Objetivos Específicos

Este trabalho tem por objetivos específicos:

a) Analisar a política externa de Bush e de Obama, mapeando, discutindo e

identificando a forma como as medidas de prevenção e combate ao

terrorismo foram adotadas pelos dois presidentes;

b) Ponderar os fatores internos e externos que contribuíram para a tomada

das principais decisões de Bush e Obama relacionadas à política externa

dos EUA para o terrorismo;

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c) Identificar os principais grupos terroristas combatidos pelos Estados Unidos

e sua relação com a segurança internacional.

1.4 Justificativa

A questão da adoção do uso da força, pelos dois governos, como principal

estratégia contra o terrorismo, vem sendo constante alvo de críticas desde a

Doutrina Bush, anteriormente, até os dias atuais, na Doutrina Obama, pois se tem a

ideia de que o uso da força gera o acirramento dos conflitos e a multiplicação de

vítimas civis. Por um lado, afirma-se que as duas estratégias diferem somente em

relação ao modo como são empregadas, e, por outro, tem-se a afirmação de que

Obama terminou com a Doutrina Bush.

Visto que os Estados Unidos são a maior potência mundial, e que sua política

externa tem sido objeto de constante discussão, tanto interna quanto externamente,

tem-se este estudo complementar acerca da mesma, abrangendo, também, uma

análise das variáveis internas, visando o enriquecimento do debate sobre o tema –

pertinente e atual. Como os ataques de 11/09 levantaram inúmeras questões (como,

principalmente, a da realidade de vulnerabilidade americana) e invocaram o "Choque

de Civilizações", em que o poder da civilização “ocidental” esteve ameaçado e houve

ascensão da civilização islâmica, esse atentado ocasionou grande mudança nas

relações internacionais, havendo uma alteração na política externa estadunidense,

que gerou guerras, no Afeganistão e no Iraque. Com isso, também se tornou ainda

mais relevante a análise dos atores não estatais violentos, como a Al-Qaeda.

Tendo-se em vista a atualidade de constante ameaça do terrorismo

internacional para o Ocidente, há a importância de ainda se estudar a ação

terrorista, que continua presente na contemporaneidade, ameaçando e

comprometendo a paz internacional (dentro do que as concepções tradicionais de

mundo e das Relações Internacionais entendem como ameaça), constituindo, assim,

um problema essencial das Relações Internacionais.

O estudo do objeto da pesquisa em questão se dá em virtude do interesse do

pesquisador nesta área, por envolver, além de questões políticas e econômicas,

questões culturais e religiosas. Além disso, advém da sua intenção de aprofundar o

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seu conhecimento acerca do tema, bem como o dos demais que, por ventura,

vierem a ler este trabalho.

1.5 Metodologia

Este trabalho utiliza-se do método hipotético-dedutivo – proposto por Karl

Popper (1935) e baseado na formulação de hipóteses para a explicação de um

fenômeno –, partindo de um conhecimento geral sobre a realidade do terrorismo,

para, então, distinguir e classificar as medidas adotadas pelos dois últimos

presidentes dos Estados Unidos (George W. Bush e Barack Obama) como forma de

combate e/ou prevenção ao terrorismo, após os ataques de 11 de setembro de

2001. É identificada a forma como essas medidas foram utilizadas, assim como os

fatores internos e externos levados em consideração para a tomada de decisões

acerca da política externa antiterrorismo estadunidense.

De acordo com Gil (2008), o método hipotético-dedutivo parte do surgimento

de um determinado problema, o que ocorre quando os conhecimentos disponíveis

não são suficientes para explicar algum fenômeno. Para tentar explicar esse

fenômeno, são formuladas hipóteses, das quais são deduzidos certos resultados,

que devem ser testados ou tornados falsos. Em outras palavras, as consequências

das hipóteses formuladas devem ser derrubadas, por meio da procura de evidências

empíricas. Segundo Gil (2008, p. 13), “quando não se consegue demonstrar

qualquer caso concreto capaz de falsear a hipótese, tem-se a sua corroboração, que

não excede o nível do provisório”, pois, apesar de a hipótese superar todos os

testes, tornando-se válida, ela não pode ser definitivamente confirmada, uma vez

que está sujeita a sofrer invalidações a qualquer momento, com o possível

surgimento de novos fatos.

Para melhor compreensão do processo de formulação das ações externas do

governo americano, faz-se uso da Análise de Política Externa (APE), em específico,

do modelo de Hermann (1990), que procura examinar a extensão das alterações de

rumo da política externa das nações e identificar os principais atores e eventos que

provocam tais mudanças. Hermann (1990) defende a possibilidade de

enquadramento das mudanças ocorridas na política externa em um continuum,

abrangendo pequenos ajustes, modificações de objetivos e de programas e, até

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mesmo, alterações no comportamento internacional dos países. As origens dessas

mudanças são agrupadas em quatro fatores: líderes políticos, burocratas,

reestruturação doméstica e choques externos.

Por tratar-se de um trabalho de análise bibliográfica, a exploração do assunto

é realizada em fontes bibliográficas e documentais sobre o tema proposto, com a

finalidade de resolver o problema de pesquisa, dando destaque aos trabalhos de

autoria de Cristina Soreanu Pecequilo, como o artigo A Era George W. Bush

(2001/2007): Os EUA e o Sistema Internacional (2007) e o livro A política externa

dos Estados Unidos: continuidade ou mudança? (2011), bem como às obras de

Erica Simone Almeida Resende, tais como o artigo As condições de possibilidade da

Guerra ao Terror: americanidade e puritanismo nas práticas discursivas da Política

Externa Norte-Americana no pós-onze de setembro (2011), de Luis Fernando

Ayerbe, o artigo Excepcionalidade unipolar às responsabilidades compartilhadas,

Barack Obama e a liderança internacional dos Estados Unidos (2010), além dos

artigos Os Estados Unidos e a Guerra contra o Terror: o uso da força contra o

terrorismo nas Doutrinas Bush e Obama (2014) e Obama e Política Exterior: Novas

Perspectivas para a Guerra contra o Terrorismo? (2008), de Tatiana Waisberg, do

livro O Islã (2001), de Paulo Daniel Farah, do artigo Análise de Política Externa e

Política Externa Brasileira: trajetória, desafios e possibilidades de um campo de

estudos (2013), de Mônica Salomón e Letícia Pinheiro, e da contribuição teórica

baseada no trabalho de Charles Hermann, sobretudo, na obra Changing course:

when governments choose to redirect foreign policy (1990).

Quanto à forma de estudo, esta se dará de modo descritivo, por meio da

observação, análise, classificação e interpretação da realidade. Conforme elucidado

por Gil (2008, p. 28), “as pesquisas deste tipo têm como objetivo primordial a

descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o

estabelecimento de relações entre variáveis”.

1.5.1 Estrutura do Trabalho

A pesquisa é realizada e organizada em três capítulos. No primeiro capítulo, é

feita uma contextualização a respeito do que vem a ser o terrorismo contemporâneo.

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Já no segundo capítulo, é relatado o histórico da política externa

estadunidense até o início do século XXI. Nesse capítulo, também é apresentada a

teoria de Análise de Política Externa, e, logo após, o Modelo de Hermann (1990),

importantes para o auxílio no entendimento sobre a formulação da política externa

estadunidense.

Por fim, no terceiro capítulo, o trabalho enfoca na análise propriamente dita

das políticas externas de Bush e Obama, objetivando ponderar os fatores externos e

internos que contribuíram para a tomada de decisões relativas à política externa, em

cada contexto, e apontando suas aproximações e distanciamentos. Para isso, tem-

se o auxílio complementar das ideias de pesquisadores da área.

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2 O TERRORISMO COMO AMEAÇA AOS ESTADOS UNIDOS

O multiculturalismo e a diversidade cultural existentes no mundo abrem

espaço para o surgimento de divergências, ocasionando dicotomias e provocando

conflitos entre as partes envolvidas. No caso específico dos Estados Unidos, onde o

aspecto cultural constitui um marco de bastante relevância, e, principalmente pelo

país ter assumido, ao longo dos anos, uma postura autoritária em relação às outras

nações, ao mesmo tempo em que não mede esforços para garantir os seus

interesses particulares, os atritos com as regiões que não concordam com essas

ações passam a ser habituais. Isso gerou dois ataques no território estadunidense e

fez com que novas estratégias fossem formuladas pelos EUA para garantir sua

soberania. Assim, a proposta do presente capítulo é apresentar uma

contextualização histórica acerca do assunto, para que se compreenda onde e de

que forma o terrorismo surgiu, bem como para que haja o entendimento dos

principais motivos pelos quais o Oriente Médio faz parte da agenda da política

externa dos Estados Unidos. Ademais, o capítulo também apresenta as mudanças

que o terrorismo foi tendo, ao longo dos anos, bem como os principais grupos

terroristas combatidos pelos Estados Unidos e a relação dos mesmos com a

segurança internacional.

2.1 O terrorismo antes do 11/09

Dado o seu intenso caráter político e autocrático, o termo “terrorismo” constitui

um método fundamental para a formação social da realidade, trazendo consigo uma

forte problemática, em razão de não haver um consenso internacional a respeito de

uma única definição. Além disso, acarreta uma série de julgamentos prévios que são

formados a respeito do indivíduo caracterizado com o termo, por conta do caráter

negativo que se formou ao redor do conceito de “terrorismo”.

Tem-se o argumento de que a ideia de terrorismo nasceu com a Revolução

Francesa (1789-1799), mais especificamente no chamado “Reino do Terror” (1793-

1794), comandado por Maximilien de Robespierre, líder dos jacobinos1. De acordo

1 Grupo formado por membros da pequena burguesia, que defendiam o ideal de uma sociedade igualitária (VICENTINO; DORIGO, 2008).

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com o que salienta Simioni (2008, p. 27), “a primeira vez que o termo terrorismo

apareceu grafado foi em 1798 no Suplemento do Dicionário da Academia Francesa,

para caracterizar o extermínio em massa de pessoas de oposição ao regime

promovido pela autoridade governamental [...]”.

Nesse período, os líderes terroristas tentavam garantir as conquistas da

Revolução contra as pretensões dos reacionários, que desejavam que o Antigo

Regime retornasse. A nova ordem inaugurada pelos revolucionários no poder

possibilitava a reclusão dos suspeitos de oposição ao regime vigente, ocasionando a

morte de milhares de pessoas na guilhotina (PARRY, 1976).

O termo terrorismo, nesse contexto, possuía uma conotação positiva, uma vez

que, dado o seu contínuo uso político, consistia em um recurso adotado pelo Estado

para reconstituir e manter a ordem. Passou a ter conotação negativa, sobretudo,

após o dia 27 de julho de 1794, conhecido como “9 Termidor”, que designou o fim do

regime do Terror na França e fez com que o termo começasse a ter um caráter

desfavorável, abrindo espaço para o julgamento prévio daqueles aos quais a

característica terrorista fosse atribuída (SIMIONI, 2008). Qualificar alguém ou um

grupo como terrorista passou a significar deslegitimação política.

De forma mais geral, o tipo de terrorismo empregado durante a Revolução

Francesa, conhecido como terrorismo de Estado, consiste na utilização da política

de destruição de minorias étnicas e/ou opositores de um regime, ou seja, o grupo

político que retém o poder faz uso do terror como ferramenta de governabilidade.

Expandiu-se no século XX, podendo-se ainda citar, como exemplos da prática do

mesmo, o regime racista instaurado na África do Sul, causador de ações terroristas

contra a maioria negra do país até o final do apartheid2, no início da década de 1990,

e as ditaduras militares da América Latina, que incrementaram o terrorismo de

Estado, nos anos 1960 e 1970, contra os seus opositores, promovendo a tortura de

várias pessoas e ocasionando milhares de mortes (ESCOLA DE COMANDO E

ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO, 2010).

Contudo, foi no século XIX que surgiu o terrorismo moderno propriamente

dito, originado no contexto europeu, quando grupos anarquistas viam o Estado como

2 Regime de segregação racial instaurado na África do Sul, de 1948 a 1994, e imposto pela minoria branca da população, que comprometeu e restringiu os direitos da maioria negra (VICENTINO; DORIGO, 2008).

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o seu principal inimigo. Nesse contexto, a principal ação terrorista tinha como

objetivo a luta armada para constituir uma sociedade apátrida, tendo o chefe de

Estado como principal alvo, e não os cidadãos. Já ao longo de todo o século XX, o

terrorismo entrou em ascensão, de forma que os grupos que optaram por ele como

forma de luta expandiram-se. Esteve associado aos conflitos de grupos

nacionalistas, como foi o caso do Exército Republicano Irlandês (IRA), e do Euskadi

Ta Askatasuna (ETA), na Espanha. Além disso, surgem também, no referido século,

a organização palestina Hamas, que, embora não seja considerada um típico grupo

terrorista por todos os Estados, provoca o temor na maior parte das organizações

internacionais e dos Estados, o grupo político Talibã, atuante no Paquistão e no

Afeganistão, e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Cabe

ressaltar que, ademais, ainda há existência de dezenas (ou até centenas) de outros

grupos de caráter terrorista menores, que encontram-se dispersos pelo mundo

(PENA, 2015).

Pode-se dizer que o apogeu do terrorismo ocorreu no período da Guerra Fria

(1947-1991), após a Segunda Guerra Mundial. O terror no qual a Guerra Fria se

baseava estava associado à ideia de um sistema de equilíbrio entre dois blocos

oponentes (Estados Unidos X União Soviética), que possuíam enorme poder de

destruição nuclear. Esse entendimento validou o terror como uma forma de

relacionamento entre os Estados. Assim, a denominada "cultura da Guerra Fria" foi o

grande impulso à propagação de grupos terroristas (ESCOLA DE COMANDO E

ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO, 2010).

O terrorismo como um plano político elaborado por grupos defensores de uma

bandeira, que podem fazer uso da violência física e/ou psicológica para impactar um

governo ou um conjunto de habitantes de um determinado local, e no qual os

membros são profundamente convictos de que suas ações são legítimas, pode ser

categorizado como indiscriminado ou seletivo. O terrorismo indiscriminado (ou

aleatório) não possui um alvo pré-estabelecido e procura instaurar o medo na

população de forma geral. Já o terrorismo seletivo, por sua vez, tem um alvo

particular que já é conhecido antes de o ato acontecer, utilizando a chantagem, a

vingança e a destruição de um obstáculo como meios de eliminar esse alvo

(ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO, 2010).

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De acordo com Wellausen (2002), o atentado caracterizado como terrorista

tem o costume de alvejar civis e de não ser um ataque esperado, além de buscar a

maior quantidade possível de vítimas e alta visibilidade. O autor (2002) ainda

destaca que há a possibilidade de o ataque terrorista ser uma tentativa de um

governo de se manter no poder. Finalmente, Wellausen (2002, p. 89) aponta que “o

terrorismo é sempre a quebra da ordem imposta pelo poder dominante”.

A falta de um consenso universal acerca da definição de terrorismo faz com

que os Estados empreguem o termo da forma que melhor lhes convêm, conforme os

seus respectivos interesses políticos. Isso pode ser observado, por exemplo, através

da análise do discurso dos próprios Estados Unidos, que constroem a imagem do

terrorista como sendo um indivíduo desprovido de moral, fanático, danoso, bárbaro e

perigoso. Além disso, pode-se citar o grupo xiita3 Hezbollah, taxado de terrorista

pelas autoridades estadunidenses, mas considerado simplesmente um grupo de

resistência pela União Europeia. Por outro lado, poucas são as organizações que

atualmente se autodenominam terroristas, dado o caráter negativo que o vocábulo

possui.

2.1.1 O terrorismo islâmico

Dentro do terrorismo, há o terrorismo religioso, representado, sobretudo, pelo

terrorismo judaico, pelo cristão e pelo islâmico (ou islamita), sendo este último,

exercido por grupos extremistas que possuem, como base, a defesa do Islamismo, o

mais comum. O terrorismo islâmico é, acima de tudo, contra a cultura imposta pela

globalização, que propaga a disseminação dos princípios estadunidenses para o

resto do mundo. Em outras palavras, seu objetivo consiste em atacar a influência

ocidental no mundo islâmico, livrar os países mulçumanos do que seus militantes

chamam de “influência profana” do Ocidente e substituir o governo desses países

por regimes fundamentalistas islâmicos (ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-

MAIOR DO EXÉRCITO, 2010).

O Oriente Médio, por sua vez, é tido como a maior fonte originária do que as

autoridades estadunidenses consideram como terrorismo universal. A quantidade de

3 Termo usado para designar aquele que é partidário das convicções religiosas e políticas do xiismo (um dos ramos do Islã) (FARAH, 2001).

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grupos terroristas da região vem expandindo-se cada vez mais, e esses últimos vêm

tornando-se ainda mais violentos, sendo o Irã, o Iraque, a Líbia, o Sudão e a Síria os

países encontrados na região do Oriente Médio que são apontados pelos Estados

Unidos como os principais responsáveis pelo terrorismo internacional.

Os movimentos islâmicos conservadores vêm sendo, em algumas regiões, a

forma mais empregada para se obter mudança e melhoria das comunidades,

visando o bem-estar das mesmas e o aumento da participação politica por parte da

população. Em outras partes do mundo, servem para estimular o apoio popular às

razões conservadoras e ao empenho realizado no sentido de estreitar ou suspender

os direitos de membros da sociedade politica. Os movimentos reformistas islâmicos

apresentam-se como um modelo de caráter político, e não simplesmente como um

aspecto integrista da religião, baseando-se na transformação da lei islamita num

esquema metódico de ideias políticas (SILVA, 2011).

Dentre suas principais particularidades, pode-se citar a presença de um

aglomerado de tópicos fundamentais, como o totalitarismo, que compreende e

regulamenta as questões da vida social pública e privada, dada a obrigação da

aplicação rigorosa dos dogmas apresentados pelo Alcorão4. Em outras palavras, os

movimentos são algo intolerante e repressivo, não constituindo um modo alternativo,

mas sim, imposto (SILVA, 2011).

Os grupos Talibã, Hamas e Hezbollah são alguns dos principais

empreendedores desses movimentos. O Hezbollah, organização islâmica xiita e

libanesa, surgiu, em 1982, inicialmente como uma milícia, em resposta à invasão

israelense do Líbano, tornando-se um dos principais movimentos de combate à

presença israelense no Oriente Médio e fazendo uso de ataques de guerrilha, não

somente em Israel, mas também em outros Estados os quais julgam ser

“ocupadores” (como, principalmente, os Estados Unidos). Para Gonçalves (2013, p.

64), a caracterização do grupo “[...] é uma das mais complexas no campo do

terrorismo devido às suas diferentes metamorfoses e pragmatismo”. Além de obter

suporte financeiro oriundo de libaneses xiitas, o Hezbollah ainda conta com o apoio

do Irã.

4 Livro sagrado do Islã (FARAH, 2001).

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O grupo islâmico militante palestino e sunita5 conhecido como Hamas, por sua

vez, foi fundado em 1987, no Egito, como uma extensão da Irmandade Muçulmana6

e com o propósito de eliminar o Estado de Israel, criando, no seu lugar, um Estado

islâmico, ocupando o território que, atualmente, constitui as regiões de Israel, Gaza e

Cisjordânia. Foi eleito, democraticamente, em 2006, para comandar os territórios

palestinos (GRAY, 2010). Contudo, uma vez que o Hamas não é uma célula da Al-

Qaeda, as repercussões do “terror” propagado pelo grupo sunita ecoam muito além

das fronteiras da Cisjordânia e de Gaza. Além de ameaçar a paz e a segurança

regional no Oriente Médio, estimular o conflito árabe-israelense e trabalhar para

enfraquecer iniciativas de paz, a organização ainda contribui diretamente para a

propagação do anti-americanismo por toda a região (LEVITT, 2006).

Por fim, o Talibã, que consiste em um grupo radical islâmico, surgiu no início

dos anos 1990, no Afeganistão, objetivando restaurar a ordem, em um período no

qual as variadas facções mujaheddins7, apoiadas pelos EUA e pelo Ocidente contra

as forças soviéticas, começaram a entrar em desacordo umas com as outras,

levando o Afeganistão a uma situação de caos e ruína ainda mais intensa. Para

alcançar esse objetivo de neutralização e desarmamento das facções, o Talibã

utilizou um programa radical, baseado no regresso aos princípios fundamentais

islamitas, considerados puritanos. Atuando no Paquistão e no território afegão, o

Talibã comandou este último de 1996 até 2001, quando houve a invasão

estadunidense (GOODY, 2005).

Esses grupos apresentam alta eficiência no cumprimento de suas mudanças

radicais, sejam estas de caráter político-ideológico, étnico ou meramente religioso.

Essas transformações constituem elementos de incentivo prevalecentes dos

enfrentamentos irregulares, caracterizados pelo conflito armado entre tropas

militares uniformes, cuja capacitação militar é indubitavelmente maior, e forças

assimétricas de diferentes níveis de capacitação militar (GOODY, 2005).

Além do argumento da defesa de princípios religiosos que esses grupos

utilizam, há também o ódio cultivado nas populações do Oriente Médio, que se deu,

5 Vocábulo que caracteriza aquele que defende o sunismo (ramo do Islã) (FARAH, 2001).

6 Movimento fundado em 1928, no Egito, que atua em diversos países árabes e defende a adoção da lei islâmica (GRAY, 2010).

7 Termo árabe utilizado para designar o indivíduo participante da guerra santa Islâmica (JACKSON, 2008).

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principalmente, por causa do histórico de intervenções estadunidenses na região,

motivadas por interesses econômicos e políticos (a exemplo da invasão americana

no Iraque, em 2003, que ocorreu sob a alegação de que o então presidente,

Saddam Hussein, mantinha um arsenal nuclear8, o que, para os Estados Unidos,

“comprometeria” a paz mundial). Essas agressões imperialistas, que já ocorriam nos

países de Terceiro Mundo desde os anos 1960 – como foi o caso da intervenção

estadunidense na Guerra do Vietnã9 (1959-1975) – ocasionaram, em geral, mortes

de inocentes muçulmanos, com as quais o governo estadunidense pareceu não se

preocupar, e fizeram com que a violação dos direitos humanos, que também ocorria

dentro dos Estados Unidos, ultrapassasse as fronteiras do país. Junto a isso, houve

a agressão de leis nacionais10 e, até mesmo, internacionais, que acabou por gerar

profunda “americafobia” em parte dos muçulmanos (PECEQUILO, 2011).

Esse descontentamento de parte dos muçulmanos fez com que surgissem

figuras como a do saudita Osama Bin Laden, criador, financiador e ex-líder (1989-

2011) do que viria a ser a organização terrorista conhecida como Al-Qaeda. Bin

Laden, após iniciar os estudos na faculdade de Economia da Universidade de Gidá,

na Arábia Saudita, ficou familiarizado com as ideias islâmicas radicais, formando,

assim, suas posições político-religiosas, que seriam agravadas com os

acontecimentos geopolíticos posteriores (ocorridos entre o final da década de 1970 e

início da década de 1990) nos territórios do Oriente Médio e Afeganistão,

envolvendo guerras e conflitos armados, como, principalmente, a Guerra do

Afeganistão11 (1979-1989) e a Guerra do Golfo12 (1990-1991), resultando, assim, no

surgimento da Al-Qaeda (BAKKER; BOER, 2007).

8 Essas armas nunca foram encontradas, o que gera ainda mais críticas a respeito da invasão estadunidense (PECEQUILO, 2011).

9 Conflito armado entre o Vietnã do Norte (comunista) e o Vietnã do Sul (capitalista), que durou dezesseis anos e contou com a intervenção militar direta estadunidense, por meio do envio de tropas para oferecer apoio ao governo sulista (VICENTINO; DORIGO, 2008).

10 A Declaração de Direitos da Constituição dos EUA, em vigor desde 1791, proíbe a busca e a apreensão sem razão alguma, o castigo cruel e não habitual, e que se force alguém a atribuir culpa a si próprio (VICENTINO; DORIGO, 2008).

11 Conflito armado entre as tropas soviéticas (apoiadoras do governo marxista do Afeganistão) e os insurgentes afegãos (contrários ao regime comunista do país), que durou dez anos e contou com o suporte logístico estadunidense aos grupos que lutavam contra a invasão, ocasionando a derrota do regime marxista afegão e fazendo com que as contradições entre o Afeganistão e os Estados Unidos emergissem (VICENTINO; DORIGO, 2008).

12 Confronto entre Kuwait e Iraque, motivado por interesses econômicos (comércio de petróleo e reivindicação, por parte do Iraque, de um território kuwaitiano) que contou com a intervenção dos

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Osama, que vinha de uma família enriquecida financeiramente por meio da

prática da construção civil, disponibilizou seus recursos para a Arábia Saudita

durante a Guerra do Golfo, entre Kuwait e Iraque. Porém, a Arábia Saudita não

aceitou e permitiu que os Estados Unidos colocassem tropas no território saudita

para intervir no confronto (apoiando os kuwaitianos), assegurando a retirada das

mesmas após o término do conflito. Como isso não se concretizou, houve um

rompimento entre a Arábia Saudita e Bin Laden, pois este último, apesar de

hostilizar o governo iraquiano pela invasão ao Kuwait e por considerá-lo um regime

não islâmico, não admitia que as tropas estadunidenses se fizessem presentes na

Arábia Saudita – sede dos principais santuários do Islã (KEPEL, 2003).

Após esse rompimento, Bin Laden foi para o Sudão, onde “[...] diversificou

seus negócios e fundou cerca de trinta empresas; desde laboratórios de alta

tecnologia até a engenharia civil” (GUNARATNA, 2004, p. 107). Transferiu, em 1991,

a infraestrutura da Al-Qaeda, anteriormente localizada no Afeganistão (onde contava

com o apoio do Talibã para desenvolver suas atividades, fazendo uso do livre

acesso ao território dominado pelo grupo, que abrangia campos de treinamento,

armas e equipamentos variados), para esse país, o que fez com que a Al-Qaeda

fosse, cada vez mais, crescendo e expandindo-se internacionalmente, pois foi nesse

período que a sua campanha de atentados violentos começou.

O Mapa 1 apresenta as principais áreas de atuação da Al-Qaeda. A

organização possui células espalhadas por diversas regiões do mundo, tais como o

leste e o norte da África, grande parte da Europa, o território da Ásia-Pacífico e

países como o Iraque e o Afeganistão (BBC NEWS WORLD, 2011).

Estados Unidos (anteriormente aliados do Iraque contra o Irã), que, por sua vez, utilizaram o território da Arábia Saudita para a preparação das tropas para a ação militar, liderando uma coalizão internacional, em uma ação autorizada pelo Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, mas que causou descontentamento nas populações locais (VICENTINO; DORIGO, 2008).

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Mapa 1 – Principais áreas de atuação da Al-Qaeda

Fonte: BBC News World (2011).

No período de 1994 a 1996, a Al-Qaeda foi enfraquecida economicamente

(devido à grave situação econômica do Sudão e ao congelamento, por parte do

governo saudita, dos bens de Bin Laden), e acabou sendo transferida para o

Afeganistão, onde ficou até a invasão dos EUA13, em 2001 (GUNARATNA, 2004).

Bin Laden, que fazia campanha contra os estadunidenses, defendendo a ideia

de que estes eram opressores dos muçulmanos e os considerando seus maiores

inimigos, foi conquistando, cada vez mais, influência entre radicais muçulmanos,

advinda da profunda admiração adquirida no território do Afeganistão, pois sua ação

terrorista era fortemente aprovada pelos talibãs. A partir daí, começou a investir nos

primeiros ataques contra bases militares da superpotência, visando à queda na

economia do país e à degradação do seu governo e da sua população

(GUNARATNA, 2004).

A respeito dos ataques da rede, em geral, deve-se destacar o ocorrido em 26

de fevereiro de 1993, no qual houve a explosão de um carro-bomba por terroristas

13

Essa invasão dos EUA ao Afeganistão, após os atentados de 11 de setembro de 2001, ocasionou a captura e a morte de muitos dos líderes da Al-Qaeda, bem como a retirada do Talibã, aliado local da organização, do poder, fazendo com que a Al-Qaeda fosse enfraquecida como organização territorialmente situada e tivesse de mudar o seu formato operacional, passando a não depender de um território para a coordenação de suas ações (GUNARATNA, 2004).

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árabes islâmicos, no parque de estacionamento subterrâneo localizado debaixo de

uma das torres do World Trade Center, em Nova Iorque (6 mortos e cerca de mil

feridos). A década de 1990 ainda foi marcada por um complô formado para uma

campanha de terror em solo estadunidense, pelas tentativas frequentes dos

extremistas islâmicos de danificar as negociações de paz para o Oriente Médio e

pelos atentados de 1995 e 1996 contra alvos estadunidenses na Arábia Saudita.

Além disso, militantes da Al-Qaeda também explodiram, em 1998, embaixadas

estadunidenses localizadas em Nairobi, no Quênia, e em Dar es Salaam, na

Tanzânia, resultando na morte de centenas de pessoas (dentre elas, 12 cidadãos

estadunidenses), e em 2000, o navio de guerra pertencente aos Estados Unidos,

USS Cole, no porto de Áden, no Iêmen, que ocasionou a morte de soldados

estadunidenses (PINTO, 2003).

2.2 O terrorismo após o 11/09

No dia 11 de setembro de 2001, terroristas suicídas destruíram totalmente as

torres do World Trade Center, utilizando dois aviões, e parte do Pentágono,

localizado nos arredores de Washington, com outro avião. Os ataques foram

realizados com aviões de carreira sequestrados, provocaram quase 3.000 mortes e

objetivaram atingir os símbolos do poderio econômico, político e militar

estadunidense, resultando na morte de milhares de cidadãos. Um quarto avião caiu

em um campo aberto, próximo de Shanksville, na Pensilvânia, após uma tentativa de

alguns dos passageiros e tripulantes de retomar o comando da aeronave dos

sequestradores, que a haviam reordenado na direção da capital estadunidense.

A partir desse dia, com os ataques sofridos pelos Estados Unidos, o

terrorismo ganhou um maior destaque mundial. O Ocidente passou a vê-lo como

uma ameaça internacional, e, desde então, tem-se discutido cada vez mais sobre o

tema.

Conforme Procópio (2001, p. 63) “o sacrifício dos limites impostos pelo estado

de direito e pelo estado democrático na luta contra o terror fere o que há de nobre,

precioso e sagrado na alma da democracia americana”. Essa afirmação leva a uma

reflexão a respeito da visão que o resto do mundo tem dos Estados Unidos, e que os

próprios estadunidenses têm de si mesmos. Pela primeira vez desde o ataque a

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Pearl Harbor, em 1941, no Havaí, o país sofreu um atentado de tamanha relevância

dentro de seu próprio território, demonstrando uma vulnerabilidade considerável.

Nesse sentido, surge a questão do “medo”, em que cabe citar Francis

Fukuyama (2004, p. 24), que afirma que os atentados mostraram que o novo

terrorismo pode causar "danos significativos aos Estados Unidos e a outros países

desenvolvidos", como, por exemplo, seus aliados na guerra contra o terror. Os

ataques foram um golpe tão forte que fizeram com que os bancos centrais desses

países tivessem de articular suas ações, de modo a evitar que o ocorrido produzisse

efeitos demasiadamente negativos para a economia mundial.

Da mesma forma, novos atentados nunca foram descartados, o que coloca os

Estados ocidentais em uma situação de insegurança. Nenhum país está imune a

essa ameaça global, e o seu combate e prevenção exige, acima de tudo,

cooperação internacional. Segundo Viana (2011, p. 25):

[...] o combate ao terrorismo não se esgota no isolamento e desarticulação das redes terroristas e na destruição da sua capacidade criminosa, ou seja, apenas na saída militar. Ele requer, também, uma política de cooperação internacional multifacetada, capaz de combater eficazmente o subdesenvolvimento, a ausência de Estado de direito e de bom governo, que são os contextos em que germinam e se desenvolvem muitas lógicas terroristas. Isso exige estratégias integradas que combinem ações diplomáticas, econômicas, sociais, de controle financeiro, legislativas, de informação pública, policiais e militares, entre outras.

A justificativa da Al-Qaeda para atacar os Estados Unidos e os seus aliados

(civis e militares) possuía grande embasamento religioso, estando a articulação e a

coesão dos muçulmanos baseadas na luta contra esses inimigos. O conceito de

“jihad14” está diretamente relacionado à ideia de que cabe ao indivíduo de religião

muçulmana disseminar a fé islâmica, com o intuito de buscar o que eles

considerariam uma melhor humanidade. Essa ideia acaba sendo ameaçada quando

o inimigo se faz presente no território islâmico, o que exige que os muçulmanos se

comprometam a combater esse inimigo.

No que diz respeito à batalha dos Estados Unidos contra a Al-Qaeda, essa

está longe de terminar, para Harman (2011, p. 10), “a Al-Qaeda [...] se transformou

em uma organização horizontal com filiados no mundo todo, e, agora, é mais letal do

14

Termo árabe que significa, em geral, “luta”, “esforço” ou “empenho”, mas que não possui uma aceitação universal em relação a essa definição, devido à amplitude do seu conceito.

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que nunca15". Friedman (2011), citado por Cuéllar (2011, p. 11) por sua vez, tem

uma concepção diferente, dizendo não haver "uma guerra contra o terrorismo [...]

porque essa organização [Al-Qaeda] estava muito mais fraturada e débil do que

nossos líderes acreditavam". Já Hotchkiss (2011), também citada por Cuéllar (2011,

p. 12), destaca que:

A guerra contra o terrorismo é similar à que se trava contra as drogas: uma batalha que não se pode ganhar nem perder. Primeiro porque não há um consenso sobre o que é "terrorismo". Segundo, porque entendemos que um conflito se ganha no contexto de uma batalha entre nações onde estão estabelecidas as maneiras para determinar essas vitórias. Temos que compreender que o terrorismo não pertence a uma religião ou a um grupo étnico. Está sustentado em cometer atos violentos para intimidar as pessoas e promover as crenças políticas do algum grupo. Isso existe por todos os lados.

Porém, várias tendências já observáveis permanecem como linhas de

continuidade no sistema internacional e não se alteraram com tais acontecimentos.

Viana (2011, p. 30) reconhece isso quando aponta que:

Mantêm-se as assimetrias demográficas e de desenvolvimento, a disputa estratégica pelo domínio dos recursos escassos e não renováveis, a crescente propensão para a democratização dos regimes e a emergência de novos polos de poder. Continua a ascensão progressiva da China ao estatuto de superpotência, a crise financeira no Japão e a incógnita quanto ao aprofundamento do processo de integração da Europa. Após um período de recuo estratégico, a Rússia reemerge como potência que afirma a sua esfera de influência, mantendo a paridade nuclear estratégica com os Estados Unidos. Persiste o impasse no Processo de Paz no Médio Oriente. Mantém-se a acrescida importância da dimensão econômica do poder.

Castells (2010, p. 135) afirma que “depois que o centro de comando da Al-

Qaeda no Afeganistão foi destruído, em 2001, redes de contato com lutas locais

tornaram-se cada vez mais importantes”. O objetivo dessas redes era adquirir fontes

alternativas de financiamento, criar contatos com grupos islâmicos locais e fazer com

que pequenas filiais surgissem. Essas novas células da Al-Qaeda, ainda que

atuantes de forma independente e autônoma, foram formadas por indivíduos que

estabeleciam certo contato com a organização, que, por sua vez, continuou agindo

por intermédio de seus grupos associados.

15

Tradução livre.

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24

O período de “guerra ao terror”, iniciado em 2001, que ocasionou a queda do

governo Talibã no Afeganistão, acarretou a ascendência da ação militar

estadunidense, promovendo a descentralização da Al-Qaeda e fazendo com que a

organização passasse a atuar clandestinamente, por meio de organizações

associadas (fossem elas reconhecidas como tal pela Al-Qaeda ou não) e, ainda, por

pequenos grupos de pessoas que simpatizassem com os padrões da rede. Com

isso, sua atuação, apesar de ter sido desvinculada da imagem exclusiva de Osama

Bin Laden, continuou diretamente atrelada aos discursos e ao poder de atração

deste último, agindo mais como uma ideologia para ativistas islâmicos do que como

um sistema funcional e rigoroso (CASTELLS, 2010).

Ainda que esse desmantelamento da infraestrutura terrorista afegã tenha

comprometido a capacidade da Al-Qaeda de proporcionar um treinamento de boa

qualidade, a dissipação de seus membros aumentou significativamente as fronteiras

da violência terrorista. No lugar do Afeganistão, o Paquistão e o Iraque emergiram

como os novos epicentros do terrorismo internacional. Quando houve a “caça” dos

terroristas, estes se mudaram para regiões desprovidas de lei ou ordem

(GUNARATNA, 2004).

Pode-se destacar associações como Al-Qaeda na Terra de Dois Rios

(Iraque), Organização da Al-Qaeda na Península Arábica, Al-Qaeda no Magreb

Islâmico e Al-Qaeda no Afeganistão como organizações ou redes reconhecidas

como afiliadas pelo grupo fundado por Bin Laden. Cada uma delas representa uma

fusão da Al-Qaeda com outras organizações locais (BAKER; BOER, 2007).

A Al-Qaeda na Terra de Dois Rios, atuante no território iraquiano, tem sido

responsável numericamente pela maior parte dos atentados da Al-Qaeda, tendo a

expulsão de tropas estadunidenses do Iraque e subsequente implantação de um

governo islâmico na região como seus principais objetivos. A Organização da Al-

Qaeda na Península Arábica, por sua vez, atua na Arábia Saudita e visa derrubar os

governos saudita e iemenita e, da mesma forma atacar alvos estadunidenses no

exterior. Já a Al-Qaeda no Magreb Islâmico centra suas atividades na região da

Argélia e do Magreb, apesar de também ter sido associada a tentativas de ataques

frustrados a alvos do Ocidente. Por fim, a Al-Qaeda no Afeganistão opera com base

no apoio fornecido pelo Talibã, concentrando suas ações para eliminar os Estados

Unidos do território afegão, desde a sua ocupação (BAKER; BOER, 2007).

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Além disso, há, também, principalmente no Oriente Médio, no Sudeste

Asiático, na África e na Europa, grupos caracterizados (por eles mesmos e por

outros) como atuantes sob o rótulo da Al-Qaeda, operando de forma parcialmente

autônoma. Dentre estes, pode-se citar associações como a Jemaah Islamiyah, na

Indonésia, Abu Sayyaf, nas Filipinas, Al Shabaab e Al-Ittihad Al Islami, na Somália,

Tehrik-i-Taliban, no Paquistão, Lashkar Al-Toiba, no Paquistão e na Índia, e Jaysh

Muhammad e Harakat Al-Ansar, na Índia (BAKER; BOER, 2007).

Com isso, a Al-Qaeda continuou sendo um modelo a ser seguido por outros

grupos praticantes da ação terrorista. Ao longo dos anos, foi compartilhando, através

de meios de comunicação (como a internet) e de visitas de especialistas em táticas

de confronto, a sua experiência e o seu vasto conhecimento em terrorismo, com o

objetivo de intensificar a campanha multinacional terrorista e jihadista contra os

Estados Unidos e seus aliados (GUNARATNA, 2004).

As táticas empregadas pela Al-Qaeda inspiraram ataques como o realizado

em Moscou, em 2002, por grupos chechenos, que sequestraram cerca de mais de

700 espectadores de um teatro, tomando-os como reféns e exigindo que a Rússia

retirasse suas tropas da Chechênia, causando a morte de, pelo menos, 129 pessoas

(U.S. Department of State, 2005). Nessa categoria, também se destacam os

atentados contra quatro comboios da rede ferroviária de Madri, em março de 2004,

em que dez bombas foram detonadas, vitimando 191 pessoas e fazendo com que

mais de 1.700 ficassem feridas, e contra uma escola em Beslan, na Ossétia do

Norte, em setembro do mesmo ano, que resultou em 331 mortos e centenas de

feridos (U.S. Department of State, 2005).

No dia 7 de julho de 2005, em Londres, quatro homens-bomba explodiram-se,

atingindo três trens do metrô e um ônibus, matando 56 pessoas e deixando mais de

700 feridos. Após isso, foi localizado, também na capital inglesa, pelas autoridades

locais, um circuito utilizado em carros-bomba similar aos elaborados na Arábia

Saudita e no Iraque (U.S. Department of State, 2006).

Uma década depois, ainda são registrados ataques semelhantes aos citados

anteriormente, sobretudo nos Estados Unidos, comprovando a continuidade da

influência da Al-Qaeda. Em dezembro de 2009, houve uma tentativa de explosão do

voo transatlântico Northwest Airlines 253, que saía de Detroit, nos EUA, com destino

a Amsterdã, na Holanda. O suspeito, de nacionalidade nigeriana, foi detido pelas

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autoridades locais (U.S. Department of State, 2009). Além disso, em abril de 2013,

em Boston, houve a explosão de duas bombas durante uma maratona, perto da

linha de chegada (3 mortos e 264 feridos) (U.S. Department of State, 2014). O

atentado, realizado por dois irmãos muçulmanos, reforçou ainda mais o debate de

questões polêmicas nos Estados Unidos, como o problema da imigração, o

tratamento diferenciado levando em conta as diferentes religiões e etnias, o terror de

caráter doméstico e as relações estadunidenses com o Mundo Islâmico. Com isso,

no Mapa 2, tem-se a indicação das áreas de atividade dos principais grupos

terroristas, e no Mapa 3, pode-se identificar a ofensiva contra o terrorismo, sob a

perspectiva estadunidense.

Mapa 2 – Áreas de atividade dos principais grupos terroristas

Fonte: GEOGRAFIA PARA TODOS, 2015.

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Mapa 3 – Ofensiva contra o terrorismo, sob a perspectiva dos EUA

Fonte: GEOGRAFIA PARA TODOS, 2015.

Por outro lado, com a derrubada do ditador Saddam Hussein, pelos EUA, no

Iraque, em 2003, houve a formação do Estado Islâmico do Iraque (ISI), a partir de

uma filial da Al-Qaeda. Mais tarde, passou a abranger, também, a Síria, vindo a ser

conhecido como Estado Islâmico do Iraque e da Síria (ISIS). Assim, o Oriente Médio,

palco de incansáveis conflitos históricos, testemunhou o aparecimento de um ator

que se tornou motivo de apreensão, tanto interna quanto externa, uma vez que

propaga o extermínio de fronteiras, a queda dos Estados nacionais e a imposição

absoluta da lei islâmica, ou sharia (PALAZZO, 2014).

O ISIS declara autoridade religiosa sobre todos os muçulmanos do mundo e

almeja comandar muitas outras regiões de maioria islâmica, forçando as pessoas

que vivem nas áreas que comanda a se converterem ao Islamismo, além de viverem

conforme a interpretação sunita da religião. Possuindo cada vez mais estrutura e

capacidade de recrutamento, pode-se ver, no Mapa 4, as regiões que o grupo

controla efetivamente, bem como os locais em que o mesmo tem forte apoio:

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Mapa 4 – Áreas controladas pelo Estado Islâmico

Fonte: Globo.com, 2015.

Seu maior feito, até o presente momento, foi ter assumido o controle, em

junho de 2014, da cidade de Mossul, a terceira maior cidade iraquiana e tida como a

segunda mais importante do país. A partir dessa conquista, as forças do Iraque e do

Curdistão, apoiadas pelo poder aéreo dos Estados Unidos, buscaram retomar o

controle da área. Os extremistas também se dedicaram a ataques contra cidades

perto de Bagdá, visando chegar até a capital, mas foram contidos pelas forças

militares iranianas, por militantes do Hezbollah, milícias e voluntários xiitas e pelo

poder aéreo estadunidense. Ainda assim, o ISIS massacrou adversários e

consolidou seu domínio sobre várias regiões, criando um califado e alterando seu

nome para Estado Islâmico (BBC NEWS WORLD, 2014).

A respeito do capital que os grupos militantes possuem, estima-se que este

último seja o mais rico do mundo. Anteriormente, dependia de doações privadas e

instituições de caridade islâmicas no Oriente Médio, e embora esse tipo de

financiamento ainda seja utilizado para custear o transporte de combatentes

estrangeiros à Síria e ao Iraque, o grupo agora possui capacidade de

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autofinanciamento. Presume-se que, no ano de 2014, o grupo pode ter arrecadado

um total de US$ 100 milhões, advindos do comércio de petróleo bruto e produtos

refinados para intermediários locais. Ademais, os sequestros cometidos pelo grupo

também geraram pelo menos US$ 20 milhões em pagamentos de resgate, em 2014.

Atividades como roubos, saques, extorsão, imposição de tributos às minorias

religiosas e venda de meninas e mulheres como escravas sexuais também

constituem fontes de renda do Estado Islâmico. Esse tratamento desumano que o

grupo apresenta em relação às minorias religiosas e outros muçulmanos presentes

no território tem uma repercussão internacional bastante negativa, que contribuiu

para a formação da oposição de vários líderes e grupos islâmicos, inclusive para o

rompimento com a própria Al-Qaeda. Apesar disso, continua a ser uma força potente

na região (BBC NEWS WORLD, 2014).

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30

3 BREVE HISTÓRICO DA POLÍTICA EXTERNA ESTADUNIDENSE E A TEORIA

DE ANÁLISE DE POLÍTICA EXTERNA

Analisar o desenvolvimento da política externa de um Estado é essencial para

compreender que ela não é fixa, sendo representada por fases que vão se alterando

de acordo com os acontecimentos que ocorrem no mundo. A formação da política

externa de uma nação pode ser feita, parcialmente, com base nos costumes e nas

experiências que forem vivenciadas pelo Estado ao longo de sua trajetória. Neste

capítulo, realiza-se uma revisão histórica da política externa estadunidense, com

destaque para o período entre o início da Guerra Fria até o 11 de Setembro. Da

mesma forma, busca-se apresentar a teoria de Análise de Política Externa, e, em

seguida, o Modelo de Hermann (1990), importantes para o auxílio no entendimento

sobre a formulação da política externa dos Estados Unidos.

3.1 Histórico da política externa dos Estados Unidos

Pecequilo (2011) destaca que os Estados Unidos formaram o padrão histórico

de sua política externa entre os anos de 1776, em que ocorreu a independência do

país, bem como a definição da sociedade, da política, da economia e dos elementos

mentores de sua ação externa, e 1945, em que sua posição como potência

hegemônica mundial foi consolidada. Nessa fase, houve, portanto, o surgimento das

bases fundamentais da política externa estadunidense, com a garantia inicial da

estabilização do território e da população e, posteriormente, da segurança e do

interesse nacional.

O período de formação interna e externa da política externa estadunidense,

desde a ascensão do país até a ocupação de sua posição como potência

hegemônica, foi marcado, sobretudo, pela Revolução Americana (1776-1783),

caracterizada, por Pecequilo (2011, p. 38) como “experimento norte-americano” (o

qual separou os Estados Unidos da influência inglesa), pelas medidas de

isolacionismo e unilateralismo que a nação veio a adotar, pela expansão de suas

fronteiras, pelo sistema estadunidense, pela esfera regional e pelo império

estadunidense. Além disso, também se destacaram a política das portas abertas

(“open door policy”), que estava relacionada com a difusão dos interesses

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econômicos em outras nações para manter e aprofundar um sistema de livre-

comércio (oferecendo, assim os mesmos direitos e possibilidade de ação a esses

Estados), e o wilsonianismo, desenvolvido no governo de Woodrow Wilson (1913-

1921), ao final da Primeira Guerra Mundial, e caracterizado como uma perspectiva

idealista que proporcionaria a sustentação do internacionalismo liberal

estadunidense (baseado na crença de um sentido progressista da história, com a

defesa da cooperação entre as nações para a obtenção da paz) e faria com que a

promoção da democracia e das liberdades individuais se tornassem prioridades da

política externa. Cada uma dessas fases correspondeu a um modo de

comportamento frente ao sistema internacional.

Pecequilo (2011) destaca que, no século XIX, os Estados Unidos começaram

a atuar de forma mais ativa no sistema internacional, como forma de reagir às

mudanças que o cenário sofria na época (como a Guerra Hispano-Americana, em

1898, na qual os Estados Unidos e Espanha passaram a disputar a posse de Cuba e

a nação estadunidense se viu pressionada a modificar o seu modo de atuação na

América Latina, e, da mesma forma, a ampliar suas fronteiras ao Pacífico, depois de

terminada a conquista do continente). Ademais, o progresso interno e as demandas

originadas de sua nova condição doméstica também contribuíram para a mudança

no modo de o país agir internacionalmente, baseado na ideia de que a sua

expansão territorial era justificada pelo dever de disseminação dos ideais de

democracia e liberdade aos locais onde esses padrões não existiam.

A entrada dos Estados Unidos na Primeira Guerra Mundial, em 1917,

salientou a força presente em seus ideais e direitos. A partir daí, vários acordos

internacionais que foram estabelecidos pela comunidade internacional contam com a

presença de princípios e valores estadunidenses. Kissinger (1994, p. 17-18)

reconhece essa influência dos Estados Unidos nas relações internacionais do século

XX quando aponta que:

No século XX, nenhum país influenciou as relações internacionais tão decisivamente e, ao mesmo tempo, tão ambivalentemente como os Estados Unidos. Nenhuma sociedade insistiu mais fortemente na inadmissibilidade da intervenção nos assuntos domésticos de outros Estados, ou mais apaixonadamente afirmou que os seus próprios valores eram aplicáveis universalmente. Nenhuma nação tem sido mais pragmática na condução do dia-a-dia de sua diplomacia, ou mais ideológica na perseguição de suas convicções morais históricas. Nenhum país tem sido mais relutante para se

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engajar no exterior, mesmo enquanto empreende alianças e compromissos de alcance e escopo sem precedentes

16.

Conforme Pecequilo (2011), a maneira como os EUA, em nome da defesa

dos valores de liberdade e democracia, formaram o seu império e a sua política

externa foi diferente da forma como os países europeus o fizeram. A nação buscou

evitar políticas de conquista e anexação territorial, tornando evidente um equilíbrio

contínuo entre o pragmatismo e o idealismo. Pecequilo (2011, p. 122) ainda destaca

que “isso fundamentalmente se refletiu nos conteúdos de políticas como a defesa do

isolacionismo e do unilateralismo, passando pela afirmação da hegemonia regional,

até chegar à expansão das fronteiras, à construção do império e às portas abertas”.

Pecequilo (2011, p. 52) ainda chama atenção para a presença do realismo na

composição da política externa dos Estados Unidos, apresentando o argumento de

que “[...] a própria estratégia do isolacionismo e unilateralismo é de inspiração mais

pragmática do que idealista, partindo de uma avaliação equilibrada sobre as reais

condições do Estado norte-americano nessa época específica”. Da mesma forma

que existe uma simbiose acentuada no ideal, na política externa estadunidense,

também há uma saliência no real, e essa combinação se fez presente nos padrões

históricos dessa política externa, ao longo das fases da mesma.

Bortoluci (2005) salienta que, até o início do século XX, a política externa dos

Estados Unidos era do tipo isolacionista, tendo sido inaugurada pelo primeiro

presidente estadunidense, George Washington, e por Thomas Jefferson, principal

autor da Declaração de Independência e, posteriormente, terceiro presidente do

país. Essa prática era tida como defensiva e esteve presente desde a independência

estadunidense, em 1776, em que havia o predomínio de valores considerados

fundamentais, como a neutralidade e o não alinhamento aos países europeus, além

da presença da proposta de separação entre “Antigo” e “Novo Mundo”. Os Estados

Unidos não desejavam subordinar-se à Europa e tinham necessidade de focar a sua

atenção ao próprio conjunto de interesses e de desenvolvimento do comando frente

à América Latina. Também ocorreu um crescimento dos investimentos externos

estadunidenses (multinacionais), sobretudo na Europa e na América Latina.

16

Tradução livre.

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33

Até o ano de 1944, a política externa estadunidense não esteve fortemente

envolvida com o sistema internacional. As intervenções que ocorriam eram

consideradas meramente periódicas e localizadas, com exceção do wilsonianismo, e

as prioridades na agenda estadunidense eram a preservação e crescimento do

“experimento” dos Estados Unidos, abrangendo as expansões de fronteiras políticas,

estratégicas e econômicas e a garantia do isolamento. Contudo, a experiência das

duas grandes guerras e a mudança da posição relativa e dos objetivos dos EUA

forçaram o surgimento de uma necessidade de maior busca pela participação do

país nas questões e decisões internacionais, alterando, assim, seu perfil tradicional.

Pela primeira vez na história, o país apresentou ao mundo uma ideia de construção

da nova ordem internacional, o que, por sua vez, evidenciou um afastamento da

tradicional política isolacionista (PECEQUILO, 2011).

Dessa forma, pode-se citar o encerramento da Segunda Grande Guerra como

uma ocorrência responsável pela intensa reformulação da política externa

estadunidense. Pecequilo (2011) destaca a inauguração do ciclo expansivo final da

política externa do país, realizada nessa época, e o resgate da construção da nova

ordem internacional, havendo a criação de novos modelos de relacionamento e

comportamento político entre os Estados, com o intuito de evitar um novo conflito de

caráter global. Bortoluci (2005), por sua vez, chama atenção para o esgotamento e o

declínio significativo que o fim da guerra provocou nas nações europeias, no que diz

respeito à sua representação no sistema internacional, bem como às vantagens

econômicas e militares que os Estados Unidos adquiriram, como o crescimento de

sua capacidade industrial, de seu poder aéreo e de sua marinha, considerada a

maior do mundo, que foram responsáveis pelo destaque do país no sistema

internacional e pela elevação ao status de grande potência.

Pertencendo à aliança vitoriosa e tendo sofrido pequenas perdas na Segunda

Guerra Mundial, a nação foi capaz de restabelecer sua economia e continuar

crescendo, além de viabilizar suas estratégias militares e o domínio do mercado de

armas nucleares. Era necessário, porém, que a busca e a ampliação dos interesses

estadunidenses dentro do sistema internacional fosse favorecida. Com isso, a

procura por uma posição hegemônica no sistema internacional abrangeu, de forma

indireta, uma tática que fez uso de condutas tradicionais da política externa

estadunidense. Assim, os movimentos de descolonização, que se instauraram a

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partir da segunda metade da década de 1950, posteriormente à decadência das

potências europeias, contaram com o apoio dos Estados Unidos, que acabaram

contrariando aliados importantes, como a França e a Grã-Bretanha, de forma a

assegurar o desaparecimento da influência europeia no sistema. Porém, o exercício

da hegemonia estadunidense conduzia à fácil aceitação pelas outras potências,

dada a busca do país pelo domínio e não pela conquista, constituindo, assim, um

modo aberto de exercício que possibilitava a introdução de demandas internas e

fazia com que possíveis contestações não ocorressem (PECEQUILO, 2011).

A partir da Guerra Fria (1947-1991), com a oposição entre o capitalismo e o

socialismo sendo levada ao extremo pela bipolarização política, ideológica e militar,

que fez com que as relações internacionais estivessem submetidas aos interesses

da União Soviética (1922-1991) e dos Estados Unidos, a política externa

estadunidense passou por outra mudança de rumo, passando a enfocar na política

de contenção, sob a administração de Henry Truman (1945-1953). No período da

Guerra Fria, buscou-se definir os paradigmas da política externa dos EUA, no que

diz respeito ao alinhamento ou não aos blocos ocidental e oriental, com o objetivo de

conter a ameaça soviética, o comunismo e proporcionar a expansão da democracia

e do livre-comércio. Nesse sentido, cabe citar Kissinger (1994, p. 23), que afirma

que:

Durante a Guerra Fria, a única abordagem americana para a política externa foi notavelmente apropriada para o desafio. Houve um profundo conflito ideológico, e somente um país, os Estados Unidos, possuía toda a panóplia de meios – políticos, econômicos e militares – para organizar a defesa do mundo não comunista. Uma nação em tal posição é capaz de insistir em seus pontos de vista e consegue muitas vezes evitar o problema que os estadistas de sociedades menos favorecidas enfrentam: que os seus meios lhes obrigam a perseguir objetivos menos ambiciosos do que suas esperanças [...]

17.

Além disso, a Guerra Fria ainda marcou um período de equilíbrio de terror, no

qual as armas nucleares viraram um meio de poder fundamental (que não poderia

ser usado, por conta do risco de destruição em massa). De acordo com Pecequilo

(2011, p. 167) o período ainda passou por diversas fases, sendo elas: “a

Confrontação (1947 a 1962); a Coexistência (1963 e 1969); a Détente (1969 a

17

Tradução livre.

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35

1979); a Confrontação Renovada (1979 a 1985) e a Retomada do Diálogo (1985 a

1989)”. Nessas etapas, foram alterados os atores e os cenários, o que delimitou o

progresso da bipolaridade, da inclusão e da política externa estadunidense.

Na fase da Confrontação, houve o estabelecimento dos padrões de

relacionamento entre as duas potências. O enfrentamento anticomunista e o dever

de fortalecer o bloco capitalista deram origem ao programa de investimentos e de

resgate econômico para os países europeus em crise, conhecido como Plano

Marshall, e à Doutrina Truman. Ademais, essa fase contou com a criação da aliança

de países ocidentais conhecida como Organização do Tratado do Atlântico Norte

(OTAN), no plano político-militar, da Organização das Nações Unidas (ONU), do

Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (PECEQUILO, 2011).

Paralelamente, ainda ocorria a Guerra da Coreia (1950-1953). Esse conflito,

estabelecido entre a República da Coreia, ao Sul, sob ocupação estadunidense, e a

República Popular Democrática da Coréia, ao Norte, sob domínio soviético e

apoiada pela China, serviu para agravar ainda mais a tensão entre as duas

superpotências (ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO,

2010).

No governo de Dwight Eisenhower (1953-1961), a principal meta da política

externa estadunidense passou a ser formar uma política de caráter mais positivo,

criando uma estratégia de contenção mais ativa e menos preventiva, partindo do

pressuposto de que o comunismo é uma ameaça para o mundo. O presidente

adotou a proposta do “Novo Olhar”, que focava principalmente no poder nuclear e

objetivava o aprimoramento da capacidade de construção e utilização desse tipo de

armamento, buscando evitar a ameaça soviética (PECEQUILO, 2011).

A fase de Coexistência, que passou pelos governos de John Kennedy (1961-

1963) e Lyndon Johnson (1963-1969), foi marcada pela continuidade da disputa por

zonas de influência e pela perda de espaço sofrida pelos Estados Unidos e pela

União Soviética, devido, sobretudo, ao restabelecimento de aliados do bloco

ocidental, à consolidação do bloco oriental e ao aparecimento do Terceiro Mundo

(formado por países neutros em relação ao conflito). Com isso, a prioridade passou

a ser a autopreservação, que fez com que os Estados Unidos e a União Soviética

precisassem começar a perseguir objetivos em comum para preservar as suas

respectivas posições no cenário global (PECEQUILO, 2011).

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A estratégia da détente, formulada na década de 1970, por Richard Nixon e

Henry Kissinger, trouxe consigo um novo estágio para as relações internacionais

estadunidenses. Foi considerada como uma tática geopolítica de longo prazo, que

se afastava das tradições idealistas e buscava o alcance de um rumo inovador para

a diplomacia dos EUA. Seu apogeu ocorreu até o ano de 1974, após o episódio de

impeachment de Nixon, que fez com que um caráter negativo fosse atribuído à

estratégia (PECEQUILO, 2011).

Em 1975, com o fim da Guerra do Vietnã (1959-1975), os Estados Unidos

redirecionaram sua atenção às questões internas, adotando uma política rigorosa de

não envolvimento com. os problemas políticos europeus. Se houvesse a

necessidade de uma intervenção, esta se daria de forma limitada (WESSON, 1978).

O final da estratégia détente ocorreu no governo de Jimmy Carter (1977-

1981). Carter foi responsável por promover um crescimento dos gastos no ramo de

defesa e políticas de pressão frente à União Soviética, com o intuito de restaurar o

prestígio dos Estados Unidos e não obtendo sucesso. Somente após a eleição de

Ronald Reagan (1981-1989) é que a imagem do país diante do mundo foi

melhorada. Reagan, que defendia o neoconservadorismo18, conduziu a nação para o

término da Guerra Fria, podendo sua administração ser dividida em duas fases: a

primeira, de 1981 a 1985, de competição com a União Soviética, chamado de

Confrontação Renovada ou Segunda Guerra Fria, e a segunda, entre 1985 e 1989,

chamada de Novo Diálogo, caracterizada pela colaboração entre as duas

superpotências. Foram retomados, assim, os preceitos da política de contenção,

com o retorno dos Estados Unidos ao ambiente internacional, e a situação de

confronto intenso com a União Soviética passou a ser de cooperação (PECEQUILO,

2011).

Quando a presidência dos Estados Unidos foi assumida por George H. W.

Bush (1989-1993), esperava-se que o bom nível de relacionamento entre os Estados

Unidos e a União Soviética, instaurado na segunda etapa do governo Reagan,

prevalecesse, com as duas superpotências conservando suas posições no cenário

18

De acordo com Pecequilo (2011, p. 362), os neoconservadores que remanesceram na Era Reagan foram “[...] responsáveis por suas políticas neoliberais na economia [...], endurecimento e militarização do setor externo, balizados por uma retórica messiânica e religiosa [...]”. Além disso, viam o fim da Guerra Fria como um momento de crescimento, não de introversão.

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global e buscando resolver suas diferenças e solucionar os problemas econômicos e

políticos. Todavia, essa nova détente durou apenas até a queda do Muro de

Berlim19, no final de 1989, e a Guerra Fria ainda se estendeu até o ano de 1991,

quando a União Soviética não se mostrou mais capacitada para manter a disputa

com o bloco rival e sustentar a integridade do seu próprio bloco, não possuindo

recursos ou tecnologia suficientes para competir com o poder armamentista dos

EUA e recuando seu poder às suas fronteiras (PECEQUILO, 2011).

Gomes (2007) ressalta que o fim da Guerra Fria representou um choque

externo cuja grande relevância contribuiu para ocasionar inflexões no

comportamento dos atores internacionais e grandes alterações sistêmicas,

modificando significativamente os rumos da atuação internacional estadunidense.

Com isso, os EUA tornaram-se a única superpotência mundial, e a principal

estratégia da política externa estadunidense do governo de George H. W. Bush

passou a ser evitar que um novo rival, de magnitude semelhante à da União

Soviética, surgisse e se estabelecesse. O país passou, então, a atuar de modo a

prevenir que qualquer potência hostil dominasse um local cujos recursos a

capacitariam a se tornar uma grande potência, baseado na doutrina do Destino

Manifesto20.

Com a ascensão de Bill Clinton (1993-2001) à presidência dos Estados

Unidos, sua estratégia foi a de procurar alcançar um maior nível de atuação

estadunidense nas questões mundiais de forma cooperativa, o que chegou a ser

considerado incoerente. O apoio à expansão da OTAN, de acordo com a segurança

cooperativa, e a ação seletiva em alguns assuntos (como o fortalecimento da

fronteira do Kuwait com o Iraque e a relutância em enviar tropas a Ruanda em 1994)

ocorriam de forma simultânea (GOMES, 2007).

Além disso, também se pôde perceber certo antagonismo em ações como os

bombardeios ao Afeganistão, em 1998, como resposta aos atentados às

embaixadas estadunidenses em Nairobi, no Quênia, a Dar Es Salaam, na Tanzânia,

19

Muralha construída, em 1961, no centro da capital alemã, pelo regime socialista (Alemanha Oriental) para simbolizar a divisão do mundo entre o capitalismo e o socialismo, sendo considerado, por muitos, como o principal símbolo da Guerra Fria (VICENTINO; DORIGO, 2008).

20 Essa doutrina expressa a crença de que os Estados Unidos foram eleitos, por Deus, para civilizar a América e o mundo, e que, devido a isso, o expansionismo estadunidense é apenas o cumprimento da vontade divina (PECEQUILO, 2011).

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em 1998, e à Sérvia, em 1999. Contudo, Clinton obteve apoio universal do

Congresso em bases constitucionais para que os ataques fossem efetivados, em

nome da segurança (GOMES, 2007).

A respeito da questão da segurança, é possível notar que, desde o século XX,

esta esteve diretamente relacionada, sobretudo, ao combate a um inimigo externo

específico, cujo modelo de vida era incompatível com o estadunidense. Na Segunda

Guerra Mundial, o inimigo era representado pelo nazismo alemão, passando a ser,

posteriormente, o comunismo soviético, na Guerra Fria, e, logo após, a ameaça

terrorista. Esse inimigo, por sua vez, acaba tendo um papel peculiar na reorientação

da política externa, atuando como determinante na composição da mesma.

3.2 Análise de Política Externa

A respeito da Análise de Política Externa, teoria selecionada para a análise e

compreensão do processo de formulação das ações externas dos Estados Unidos,

esta surge como uma crítica ao Realismo na disciplina de Relações Internacionais e

se consolida dentro da mesma. Essa consolidação, para Salomón e Pinheiro (2013,

p. 40), pode ser indicada por diversos fatores, tais como:

[...] a existência de revistas especializadas (destacando-se a Foreign Policy Analysis) e de diversos manuais específicos sobre APE e capítulos sobre APE nos principais manuais de Relações Internacionais; a criação de grupos de trabalho ou seções sobre APE nas principais associações acadêmicas nacionais e internacionais de Ciência Política/Relações Internacionais (ABRI e ABCP no Brasil, International Studies Association nos EUA e British International Studies Association no Reino Unido); e a inclusão de disciplinas com essa denominação nas grades curriculares dos cursos de Relações Internacionais em todo o mundo.

A APE parte do pressuposto de que se deve incluir o âmbito doméstico que

se encontra por trás da política externa das nações. Nessa teoria, tem-se a

combinação dos fatores internos e externos que contribuem para as mudanças

nesse processo. Tendo-se em vista que a política externa é dependente de

representações atribuídas ao Estado, ao povo ou, até mesmo, ao interesse que se

busca proteger, bem como à ameaça que se procura eliminar, cabe citar Hansen

(2006, p. 17):

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As políticas externas são legitimadas como necessárias, em termos de interesses nacionais, ou da defesa de direitos humanos, através de referências a identidades. No entanto, as identidades são simultaneamente constituídas e reproduzidas através de formulações de política externa. As políticas exigem identidades, porém as identidades não existem como narrativas objetivas sobre indivíduos e lugares como “eles realmente são”, mas sim como sujeitos e objetos continuamente reafirmados, negociados e refeitos.

O estudo da APE enfoca ações internacionais de unidades específicas, ou

seja, a política externa de governos particulares, levando em consideração os

determinantes dessa política externa, bem como suas metas, a tomada de decisões

e as ações realizadas que forem anunciadas. Esse estudo parte do pressuposto de

que não somente a estrutura internacional determina a atuação diplomática, mas a

política externa também é formada a partir da interação entre os ambientes interno e

externo.

O enfoque da APE nos processos políticos estatais não faz com que estes

últimos sejam exclusivos para a compreensão da realidade internacional. O papel de

atores não estatais e de ações na política internacional que não tenham o Estado

como principal força atuante não é, obrigatoriamente, desconsiderado pela área de

APE, que também leva em conta os atores existentes dentro e fora do Estado que

influenciam na constituição da política pública. Nesse sentido, Salomón e Pinheiro

(2013, p. 41) afirmam que:

A política externa, com efeito, é uma política pública, embora com uma especificidade que a diferencia do resto das políticas públicas: o fato de ser implementada fora das fronteiras estatais, o que pode levar a uma distância considerável entre objetivos e resultados. Por sua condição de política pública, cabe distinguir a política externa da mera “ação externa”, um conceito mais amplo que inclui todo tipo de contatos, planificados ou não, de um governo com outro ator fora de suas fronteiras. Por sua vez, entender a política externa como política pública leva a considerar seu processo de elaboração, no qual incidem, como em qualquer outra política pública, as demandas e conflitos de variados grupos domésticos.

Além disso, de acordo com White (1989), para que a Análise de Política

Externa, de fato, ocorra, é necessário que haja a distinção da política externa das

demais áreas da atividade governamental. Para isso, o primeiro passo é ter como

conceituais as fronteiras estatais e os limites territoriais, distinguindo a política

externa da interna. Logo após, deve-se reconhecer que essa área representa a

direção e, da mesma forma, uma espécie de política particular, que leva em

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consideração os interesses securitários vitais do Estado. Para White (1990), essa

análise deve ir além da descrição da política passada e presente, tendo-se de

investigar o porquê de os Estados se comportarem de uma forma e como a política

externa é formada. Segundo Gomes (2007), há outras variáveis importantes, além

da questão da sobrevivência, que são englobadas pela APE, atuando na formulação

desta, tais como o sistema político doméstico, o desenho institucional dos países, os

fatores subjetivos presentes nos tomadores de decisão (moldados pelo ambiente

externo) e o papel que as burocracias governamentais exercem. Assim, atualmente,

o Estado, na função de ator unitário do sistema internacional, tem sido questionado,

já que a realização da distinção entre a política interna e a externa está cada vez

sendo mais dificultada.

Ainda a respeito da formulação da APE, tem-se a personalidade do líder

como um dos principais fatores que devem ser analisados, pois os líderes

governamentais e acadêmicos sofrem influência direta do espaço e do tempo em

que estão inseridos, bem como das percepções que possuem acerca do mundo.

Nesse sentido, Giacomello, Ferrari e Amadori (2009) salientam que, na política

internacional, o ambiente de paz ou de guerra pode não depender do caráter dos

chefes de governo, mas os traços de personalidade destes últimos podem levá-los a

facilitar o entendimento e o diálogo ou, por outro lado, causar hostilidade.

De acordo com Jervis (1968), deve-se repensar a racionalidade dos atores,

levando-se em conta sua credulidade e visão do mundo, bem como o seu estado

psicológico frente às decisões a serem tomadas, e não somente uma objetividade

racional. Já para Neack (2006), quando o tomador de decisão em política externa

está em face da imagem de um oponente ruim por natureza, ele considera

unicamente os atributos negativos deste, excluindo de sua análise as imagens que

revelam maior complexidade ou menor capacidade de destruição do inimigo.

Além disso, surge a ideia da intervenção da opinião pública no

comportamento dos formadores da política externa, que afeta a sua atuação e

também é afetada por ela. No caso específico dos Estados Unidos, pode-se

destacar, através das pesquisas de opinião que foram realizadas no país a respeito

das políticas públicas, duas fases primordiais: uma primeira, que foi do começo da

década de 1940 até o final da década de 1960, em que havia a predominância do

questionamento sobre o papel que o país deveria exercer no fim da Segunda Guerra

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Mundial, a fim de preservar a sua ascendência no cenário global; e uma segunda

fase, que teve início na Guerra do Vietnã (1959-1975), quando surgiu a preocupação

com as descobertas e proposições da análise de opinião pública do período

antecessor (HOLSTI, 2001).

Segundo Shapiro e Page (1988), a qualidade da opinião pública tende a

refletir o caráter das informações e das opções que são apresentadas ao público. Se

este parece confuso sobre alguma questão, a falha pode estar nos fornecedores de

informação (ou desinformação). Quando os líderes explicam as realidades

internacionais de forma clara e correta, o público, em geral, responde de forma

sensata, com base nos seus valores subjacentes.

Com o aumento do número de países que possuem regimes democráticos,

amplifica-se o debate a respeito da participação de atores não governamentais,

como consumidores, trabalhadores, empresários, donos de terra, líderes de

sindicatos ou de movimentos sociais e representantes das mais variadas

associações civis, no processo decisório de política externa, além da sua influência e

dos canais institucionais para esse acesso. Assim, ocorre a influência dos grupos de

interesse na constituição da política externa.

Hill (2003) destaca que, em termos de áreas temáticas individuais, os grupos

de pressão podem ser eficazes, embora haja muita variabilidade de acordo com o

contexto histórico e nacional. O autor (2003) ainda explica que, na política externa, o

público em geral tem pouca escolha a não ser contar com esses grupos para manter

os governos cientes de atitudes que ocorrem dentro da sociedade em que eles

atuam. Nos Estados Unidos, pode-se perceber a atuação desses grupos,

principalmente, através da relevância do lobby sionista/judaico, tido como o mais

poderoso do país, que promove uma reunião de grupos, organizações e cidadãos,

de modo a redirecionar o governo para o apoio dos propósitos do sionismo ou

nacionalismo judaico, em todo o mundo, mas, sobretudo, na sustentação do Estado

de Israel.

Por fim, tem-se a relação entre regimes democráticos, e a colisão da

alteração de regência na formulação da política externa, bem como o papel do

Executivo e Legislativo no processo decisório. Rogowski (1999) sugere que sejam

analisadas as evidências empíricas por meio de três variáveis para estabelecer a

ampliação das instituições políticas domésticas em relação à política externa: direito

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ao voto (ou o alongamento da influência das preferências de grupos), representação

(ou a forma de escolha dos votantes) e regras decisórias (de que modo os

representantes se tornam capazes de exercer influência sobre a ação). Além disso,

os partidos políticos também assumem papel significativo em matéria de política

externa, pela sua forma de inserção no sistema político, que opera ao nível da

opinião pública, ainda que tenham tendência a ocultar o meio das realidades

internacionais ou fazer uso deste para simplificar seus artifícios no campo político

interno.

Assim, as instituições podem interferir na política externa por meio da

inclinação da política, afetando a confiabilidade dos compromissos, estimulando e

salientando o poder, dando coerência e firmeza à política, assim como o

estabelecimento de um ambiente estratégico favorável à negociação. As regras

decisórias influenciarão os resultados através da abundância de corpos políticos,

que levam à revisão do status quo, ocasionando atrasos e impulsionando respostas

mais rápidas, tornando os compromissos feitos pelo governo mais plausíveis

(ROGOWSKI, 1999).

3.2.1 O Modelo de Hermann para a análise de alterações na política externa

De uma forma mais específica, surge o Modelo de Hermann (1990),

metodologia que compõe a teoria da APE e busca a identificação dos atores e

acontecimentos que alteram o rumo da política externa dos Estados. Hermann

(1990) baseia-se na ideia de que as mudanças no rumo da política externa dos

Estados ocorrem devido à intervenção e influência de atores e/ou eventos, os quais

ele busca identificar.

Hermann (1990) defende que essas mudanças podem ser alocadas em uma

sequência, que vai desde pequenos ajustes à experimentação de alterações de

programas e objetivos, além de abranger as transformações significativas no

comportamento dos países internacionalmente. Essa sequência é dividida em quatro

categorias, onde as mudanças são agrupadas: (1ª) líderes; (2ª) burocratas; (3ª)

reestruturação doméstica; e (4ª) choques externos. Essas quatro categorias, por sua

vez, podem ser combinadas nas análises de mudanças em política externa.

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Os ajustes que ocorrem consistem em alterações que atribuem uma maior ou

menor clareza e/ou esforço às metas que a nação busca atingir, e têm tendência a

ser quantitativos. Por outro lado, as alterações nos programas são qualitativas, e,

com a sua realização, tem-se a busca pelas mesmas metas, por meio de novos

métodos que são empregados. Já a redefinição dos objetivos ocorre quando há a

substituição das propostas iniciais por outras novas, sendo as antigas abandonadas

ou mudadas. Por fim, com a reorientação internacional, tem-se a mudança total da

orientação da ação externa do Estado, no que se refere aos seus objetivos

internacionais.

Para Hermann (1990), as principais mudanças têm origem nas ações do líder

político. Dada a influência, a convicção e o poder do mesmo, ele estabelece o seu

posicionamento particular sobre o rumo que a política externa deve seguir.

A respeito do grupo de burocratas como agente de redirecionamento da

política externa, este, de acordo com Hermann (1990), deve contar com o apoio do

chefe de Estado. Isso faz com que haja a obtenção do destaque necessário à

interferência na formulação e no resultado do processo de decisões da política

externa.

A origem das mudanças por meio da reestruturação doméstica, por sua vez,

está atrelada ao apoio de lobbies e grupos de pressão à exigência de

governabilidade. Esse suporte, dadas as suas demandas, tem potencial para causar

transformações na política externa (HERMANN, 1990).

Por último, tem-se os choques externos, que dizem respeito aos eventos

internacionais de grande impacto e visibilidade. Esses acontecimentos também

acabam forçando alterações significativas na política externa (HERMANN, 1990).

As informações apresentadas anteriormente encontram-se sintetizadas por

Hermann (1990) no quadro do Fluxograma 1, a seguir:

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Fluxograma 1 – O papel de arbitragem de processos de tomada de decisão

entre agentes de mudança e níveis de mudanças de políticas

Fonte: Elaborado pelo autor a partir de Hermann (1990, p. 13).

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4 A POLÍTICA EXTERNA DOS ESTADOS UNIDOS PARA O TERRORISMO

DESDE O 11/09

Uma vez esclarecidos os padrões históricos da política externa dos Estados

Unidos, apresentar-se-á, no presente capítulo, as diretrizes que a política externa do

país seguiu, em relação ao terrorismo, depois dos atentados do 11 de Setembro.

Para isso, será feita a análise dos governos de George W. Bush e Barack Obama,

levando-se em conta os fatores internos e externos que influenciaram em seu

comportamento, tendo-se o auxílio complementar do Modelo de Hermann (1990).

4.1 A política externa de George W. Bush para o terrorismo (2001 – 2008)

Ao assumir o cargo de 43º presidente dos Estados Unidos da América, após

uma eleição cuja apuração de votos passou por uma série de irregularidades,

havendo sucessivas recontagens, George W. Bush proclamou a reativação militar,

principalmente a montagem de um escudo antimísseis. A instalação desse sistema

possibilitaria, teoricamente, que os EUA pudessem promover um ataque-surpresa e

estivessem aptos a atacar deliberadamente como forma de reação, promovendo,

assim, a garantia de sua superioridade nuclear internacional, num contexto em que o

terrorismo já tinha conquistado o seu espaço na agenda externa estadunidense

(VICENTINO; DORIGO, 2008). Além disso, Gomes (2007, p. 43-44) ainda destaca

que:

[...] no início de seu governo, a administração rejeitou o Protocolo de Kyoto sobre mudanças climáticas; rompeu o Tratado de Mísseis Antibalísticos, firmado com a então URSS, em 1972; congelou o processo de aproximação entre as duas Coreias, além de negar um protocolo de verificação da Convenção de Armas Tóxicas e Biológicas. Tais atos foram vistos como unilaterais por boa parte dos demais países, mas conseguiram apoio interno para sua execução com um discurso calcado em ataques à administração anterior, cuja política teria comprometido o desempenho externo do país.

Com isso, Bush, republicano sustentado pelo pensamento neoconservador,

promoveu, em um período no qual a agenda estadunidense era predominantemente

democrata, uma mudança radical na política do país, visando promover ajustes para

a recuperação do poder perdido no cenário internacional e dos princípios morais da

nação. Pecequilo (2007, p. 7) chama atenção para o fato de que:

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Nos primeiros meses de governo, os baixos níveis de popularidade mostravam uma população descrente sob o efeito do trauma eleitoral de 2000 e insatisfeita com as novas medidas (rejeição do Tratado de Quioto, o Tribunal Penal Internacional, construção do sistema de defesa anti-mísseis- o novo IDE- tensões com a China, a Europa e a Rússia). Para muitos, a presidência Bush terminara antes de começar, já se construindo cenários para a eleição de 2004. Contudo, esta situação se altera profundamente com 11/09.

Com os ataques do 11 de Setembro, a resposta imediata do governo vigente

na época foi o uso da violência, validando a visão de mundo republicana e tendo por

base a hostilidade e a luta intransigente às “ameaças de civilização”, dando início,

assim, à Doutrina Bush e à “Guerra ao Terror”, que previa, sobretudo, o combate ao

denominado “Eixo do Mal21”. Essa guerra, para Resende (2011, p. 37), deve ser

entendida como “uma prática social pela qual o Estado assume o papel de exclusivo

representante da comunidade nacional ao se engajar num incessante processo de

produção de diferenças frente ao “Outro” externo”.

Em 1999, havia sido aprovada, pelo Conselho de Segurança da ONU, devido,

sobretudo, à pressão dos EUA, a resolução 1267, que ficou conhecida como “Comitê

de Sanções contra a Al-Qaeda e o Talibã”. Mais tarde, surgiu a resolução 1368

(2001), que garante o direito de legítima defesa dos Estados Unidos, em resposta

aos atentados terroristas contra as torres gêmeas do World Trade Center e contra o

Pentágono. A combinação entre essas duas resoluções apresentou uma evidência

firme para o estabelecimento da ligação entre o Talibã e a Al-Qaeda no Afeganistão,

o que legitimou a invasão comandada pelos Estados Unidos e pela OTAN, no

território afegão, em outubro de 2001 (WAISBERG, 2008).

Gomes (2007, p. 44) ainda acrescenta que “o Senado norte-americano [...]

aprovou, em 14/9/2001, a S. J. Resolution 23, autorizando o Presidente Bush a usar

todos os meios necessários e apropriados contra os associados com os eventos de

11 de setembro de 2001”. Da mesma forma, entrou em vigor, em outubro de 2001, a

lei que ficou conhecida como “Ato Patriota” (USA Patriot Act), que trazia a ideia da

segurança acima de tudo, permitindo, que órgãos de segurança e de inteligência dos

21

Expressão utilizada por Bush para agrupar os países que julgava serem favoráveis ao terror (VICENTINO; DORIGO, 2008). Dentre os países caracterizados como tal, estariam Irã, Iraque, Coreia do Norte e, posteriormente, Cuba, Líbia e Síria.

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Estados Unidos interceptassem ligações telefônicas e e-mails de organizações e

indivíduos, estrangeiros ou não, supostamente envolvidos com o terrorismo.

Assim, com a criação da ideia de que o “Outro” era ameaçador, fanático e

intolerante, e, partindo dessa concepção, o governo estadunidense aproveitou-se da

situação após o 11 de Setembro para aumentar o controle sobre as atividades das

pessoas, tanto em âmbito local quanto em âmbito nacional. Levou pessoas,

anteriormente mantidas em liberdade, aos tribunais, empreendeu detenções de

estrangeiros e cidadãos americanos e deteve suspeitos de prática terrorista de forma

indefinida, sem julgamento ou mesmo assistência de advogados. Chevigny (2004, p.

145) reconhece essa invasão de privacidade quando afirma que:

Os governos federal e local se aproveitaram do temor do público depois do 11 de Setembro para permitir um grau maior de invasão da privacidade, quer por meios eletrônicos, quer recorrendo a informantes e infiltração, não apenas na esfera da inteligência internacional, mas, igualmente, em casos criminais e contra os ativistas políticos nacionais.

Com isso, a disposição a violar direitos e liberdades civis para maior

segurança cresceu e o patriotismo foi exacerbado. Além disso, a união da resposta

de violência estadunidense e da cultura do medo que foi instaurada ocasionou

diversas ações xenofóbicas, tanto por parte do governo, que efetuou a captura de

centenas de pessoas com sobrenome árabe ou muçulmano por pequenos delitos ou

questões de imigração, quanto por parte da população, que desenvolveu um

preconceito em relação aos muçulmanos e reportou uma visão desfavorável da fé

islâmica. Conforme Farah (2001, p. 10):

Vinte e cinco dias após os atentados, o Conselho de Relações Americano-Islâmicas já registrava 1.500 atos de hostilidade contra muçulmanos. As vítimas islâmicas dos atentados à Costa Leste norte-americana – entre 600 e 1.400, segundo estimativas – praticamente não foram citadas.

Ainda que os atentados de 11 de setembro de 2001 tenham tido tamanho

impacto, e suas consequências estratégicas tenham sido de grande relevância, elas

não conduziram a um novo ordenamento internacional, mas deram condições para

que os Estados Unidos adotassem, durante todo o governo Bush, uma política

externa isolacionista unilateral, como forma de demonstrar que seu poder não havia

sido abalado após os ataques. Isso acabou gerando duas guerras (invasão

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estadunidense no Afeganistão, em outubro de 2001, e no Iraque, em março de

2003) e causando certo isolamento do país, que veio a menosprezar a Organização

das Nações Unidas e os demais organismos internacionais, colocando o seu próprio

soft power em segundo plano (PECEQUILO, 2011).

O conflito iniciado contra o terrorismo, para Bandeira (2008, p. 16-17) ocorreu

“[...] para disfarçar os reais objetivos do presidente George W. Bush, que consistiam

em vencer a resistência e/ou a insurgência islâmica, e controlar a Ásia Central e o

Oriente Médio, com suas enormes jazidas de gás e petróleo”. A política internacional

dos Estados Unidos passou, então, a ser pautada pela convergência dos deveres da

economia global capitalista e pelos interesses das grandes corporações.

Com a ruína militar e decadência do Talibã, após o bombardeio realizado

pelos Estados Unidos no Afeganistão, estabeleceu-se, em dezembro de 2001, um

governo provisório, visando extinguir as diversas facções e reerguer o país, uma vez

que os Estados Unidos tinham, como um de seus principais objetivos, “civilizar” os

Estados que, para o governo estadunidense, não possuíam capacidade para isso.

Contudo, as disputas armadas entre chefes guerreiros regionais continuaram

ocorrendo, bem como o aumento do consumo de entorpecentes, da criminalidade e

do descontrole governamental, dificultando a plena pacificação do Afeganistão

(VICENTINO; DORIGO, 2008).

Ademais, em 2003, Bush transferiu prisioneiros de guerra do Afeganistão para

a base estadunidense de Guantânamo, localizada na ilha de Cuba, além de mandar

centenas de milhares de soldados para locais próximos ao Golfo Pérsico, como

forma de amedrontar seu maior inimigo na época: o Iraque. Mais tarde, em 2004 e

2006, seriam divulgadas fotos de maus tratos e tortura a prisioneiros em bases

militares dos EUA, sobretudo na de Guantânamo, com a justificativa estadunidense

de que essas pessoas mereciam tal tratamento por serem simpatizantes da prática

terrorista transnacional (VICENTINO; DORIGO, 2008).

A invasão dos EUA ao Iraque acabou ocorrendo, após tentativas fracassadas

de negociação, em março de 2003, sem o apoio da comunidade internacional ou do

Conselho de Segurança da ONU. Afirmava-se que, desde a derrota no ano de 1991

e as imposições de sanções contra o país, o Iraque, dono da segunda maior reserva

de petróleo do mundo, não possuía capacidade de agressão e projeção de poder

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externo (tanto regionalmente quanto internacionalmente), o que foi desconsiderado

por Bush, naquele momento (PECEQUILO, 2011).

Sob alegação de que o presidente iraquiano, Saddam Hussein, possuía

arsenais químicos, biológicos e nucleares, considerados, por Bush, como

comprometedores à segurança internacional, os Estados Unidos convenceram a

Grã-Bretanha a se aliar para atacar o território do Iraque. Assim, fazendo uso de

equipamentos sofisticados e de tecnologia de última geração, as tropas aliadas

bombardearam a capital iraquiana de Bagdá, destruindo-a de modo generalizado e

deixando incontáveis vítimas (VICENTINO; DORIGO, 2008).

O presidente, que pregava, em seu discurso, o início da trajetória do Iraque

para a liberdade, garantiu que a presença estadunidense na reconstrução do país

asiático seria temporária. Todavia, o fim das denominadas “principais operações

militares” não significou o término da hostilidade no território iraquiano ou da

tentativa de conquista do mesmo, como afirma Pecequilo (2011). Paralelamente, a

oposição à presença estadunidense crescia, cada vez mais, dentro do Iraque, e as

forças internas ligadas ao xiismo e ao sunismo brigavam entre si pela ocupação dos

espaços políticos que Saddam havia deixado.

Bush ainda efetivou a alteração do comando das forças de ocupação no

Iraque, buscando diminuir a percepção de suas ações militares no país, tanto pela

população local quanto pelo restante do mundo. Porém, essa troca não resultou na

pacificação das forças internas, e ocasionou o crescimento da violência. Devido a

isso, o presidente se viu obrigado a apostar em outras medidas que compensassem

esses efeitos negativos e fossem capazes de reverter a situação. Sobre isso,

Pecequilo (2011, p. 415) salienta:

A primeira dessas medidas foi o aumento dos efetivos militares, com o envio de mais soldados do país e da Grã-Bretanha. Em segundo lugar, os Estados Unidos abandonaram seu discurso inicial de exclusão de forças daqueles que não haviam participado da guerra, sinalizando um possível retorno ao multilateralismo. A postura republicana passou a afirmar a importância da ONU e dos aliados tradicionais, tentando amealhar apoio político, militar e financeiro para a continuidade das operações no Iraque. Tais tentativas foram inicialmente rechaçadas individualmente por França, Alemanha e Rússia, uma vez que inexistiam sinais de que essa fosse uma mudança real de comportamento da Presidência Bush. No âmbito da ONU, contudo, dois compromissos foram alcançados por meio de concessões norte-americanas: a aprovação da Resolução 1483, que previa o fim das sanções ao Iraque e garantia aos Estados Unidos e Grã-Bretanha (e aos demais membros da coalizão) a responsabilidade pela administração do

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processo de reconstrução física e política do Iraque até o fim da transição, legando-lhes autoridade completa para a exploração de petróleo; [...].

Pecequilo (2011, p. 405) aponta que “[...] a Coreia do Norte e o Irã pareciam

representar um perigo muito maior à segurança internacional do que o Iraque,

porém, não eram vistos como objetos de uma intervenção militar no curto prazo”.

Além do mais, caso fossem realizadas intervenções militares no Irã, os EUA

entrariam em confronto com uma grande mobilização e com o programa nuclear

iraniano, justificando a opção de iniciar com o Iraque, considerado mais fraco.

Ademais, posteriormente, foi apresentado, pelos inspetores de armas

estadunidenses, um relatório que comprovou a inexistência dos supostos arsenais

no território iraquiano, derrubando o principal pretexto para a realização da guerra.

Bush, por sua vez, reconheceu que a interpretação dos dados que haviam sido

fornecidos, antes da invasão, pela Agência Central de Inteligência (Central

Intelligence Agency – CIA), poderia ter ocorrido de forma exagerada, mas defendeu

a ideia de que a simples suspeita, levando-se em conta o longo histórico de

agressões cometidas por Hussein, justificava a intervenção que fora realizada

(PECEQUILO, 2011). Ayerbe (2005, p. 347) ainda aponta que:

A partir da invasão ao Iraque, tornam-se mais explícitas as controvérsias entre os que veem na intervenção uma exacerbação contraproducente do poderio militar, os que vislumbram mais um sintoma de crise de hegemonia e os que defendem o papel dos Estados Unidos como nação indispensável, única disposta a adotar medidas extremas de acordo com a natureza dos desafios.

No final de 2003, o governo estadunidense efetuou a captura de Saddam

Hussein, e instaurou, no início de 2004, o chamado Conselho de Governo do Iraque

(CGI), que contou com a nominação de pessoas selecionadas pelos estadunidenses

para elaborar uma Constituição provisória para o país. Essa Constituição, que previa

uma reformulação política, tendo, como propostas, a transferência de poder para um

governo soberano, eleições diretas para a Assembleia Nacional e realização de

eleições gerais, entrou em vigor um ano após a ocupação estadunidense. Contudo,

principalmente por não estabelecer um prazo para a retirada dos Estados Unidos do

Iraque, a Constituição provisória não foi aceita pela população iraquiana, e os

conflitos internos continuaram a ocorrer, com ataques da resistência iraquiana e

investidas das tropas estadunidenses (PECEQUILO, 2011).

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Ainda que esses ocorridos tenham levantado vários questionamentos sobre a

atuação dos EUA, o discurso de Bush acerca de sua eficácia no combate à ameaça

terrorista, bem como a estratégia de desvio da atenção do público para questões de

âmbito social, foram o suficiente para garantir sua reeleição, em 2004. Após reeleito

para um mandato de mais quatro anos, o presidente, de forma mais homogênea e

conservadora, manifestou sua intenção de agravar a guerra contra o terror e a

atuação no Iraque, ameaçando os países do “Eixo do Mal” (VICENTINO; DORIGO,

2008). Acerca desse segundo mandato, conforme Pecequilo (2011, p. 442):

Internamente, as políticas econômicas e sociais sustentam-se nos mesmos patamares, introduzindo o conceito de ownership society. Tal conceito sistematiza a agenda republicana clássica nesses campos (associada à linha neoliberal), defendendo a diminuição do papel do governo, corte de impostos, redução do Estado de Bem-Estar e desregulamentação generalizada dos mercados. Preserva-se o Ato Patriota e as posturas com relação a minorias raciais, sexuais e os imigrantes (legais e ilegais) de isolamento e endurecimento. A essa linha associa-se uma perda da perspectiva secular do Estado em benefício das pressões de grupos religiosos em setores como aborto, pesquisas com células-tronco, defesa da abstinência, proibição do ensino da teoria da evolução (substituído pelo criacionismo) que afeta programas educacionais e de saúde.

Além do mais, procurou-se retomar a proximidade com os aliados tradicionais

da Europa Ocidental, valorizar as parcerias com potências regionais e ajudar nações

falidas a se democratizarem. Todavia, nem mesmo as eleições presidenciais

iraquianas, em 2005, e a execução de Saddam Hussein, em 2006, foram capazes

de conter o índice de violência no Iraque, e o confronto direto com o país continuou

presente na política externa estadunidense (PECEQUILO, 2011). Isso levou o

governo dos EUA a ignorar questões internas como o crescimento da taxa de

desemprego e o retardamento dos mercados imobiliário, de crédito e financeiro

(BANDEIRA, 2008).

Paralelamente, ainda que não tenham existido novas grandes guerras de

2004 até 2008, os Estados Unidos mantiveram a retórica agressiva, sobretudo em

relação ao Irã. Este último, por sua vez, foi conquistando cada vez mais espaço na

agenda estadunidense, sendo considerado o maior patrocinador do terrorismo global

e sofrendo ameaça de guerra preventiva, ao mesmo tempo em que continuava a

desenvolver seus programas de armas de destruição em massa (PECEQUILO,

2011).

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Apesar de o combate ao terrorismo ter continuado a ser o principal foco, o

presidente Bush foi perdendo popularidade, levando os Estados Unidos ao

enfrentamento de uma profunda crise, o que fez com que os democratas

conquistassem a maioria no Legislativo (PECEQUILO, 2011). Essa derrota dos

republicanos, para Pecequilo (2007, p. 11), “[...] pode ser atribuída ao afastamento

de Bush de parte dos neocons: tanto os mais centristas (Fukuyama, dentre eles)

quanto os mais radicais (religiosos) sentiram-se abandonados pela presidência”.

Porém, cabe ressaltar que nem toda a ação defendida pelo governo Bush

contra o terrorismo internacional violou, em princípio, o Direito Internacional. A

intervenção no Iraque, sob essa perspectiva, pode ser considerada um fenômeno

excepcional, enquanto a alegação do direito de legítima defesa contra organizações

terroristas pode ser tida como regra. Por outro lado, Ayerbe (2005, p. 353) lembra

que “[...] a ação no Iraque articula interesses que vão além do conjuntural, em

termos de garantir a presença de um governo confiável em um país que detém as

segundas maiores reservas de petróleo”.

A ideia de que o governo Bush fracassou em comprovar a conexão entre o

regime de Saddam Hussein e a Al-Qaeda, e, da mesma forma, a existência de

armas de destruição maciça no território iraquiano, empobreceu o argumento do uso

da força estadunidense contra o Iraque. Por outro lado, o ocorrido previamente à

intervenção no Iraque, se equiparado às incontáveis instâncias em que os EUA

atacaram abrigos de organizações terroristas no Afeganistão, no Yêmen, no

Paquistão e na Síria, tornou menos clara a mudança de paradigma posta em

execução pelas reações internacionais aos atentados de 11 de Setembro, e,

principalmente, pela estratégia global de combate ao terrorismo internacional

adotada pelo Conselho de Segurança e pela Assembleia Geral da Organização das

Nações Unidas (PECEQUILO, 2011). Além disso, Pecequilo (2007, p. 9) ainda

lembra que:

[...] a retórica anti-terror serve de justificativa de ações em outros continentes, como a América Latina, a África e a Europa. A construção do escudo antimísseis apesar das objeções de Rússia, China e aliados europeus, os reforços dos laços da OTAN, intervenções em Estados Falidos e a instalação de bases militares incluem-se neste processo. Na América Latina, os EUA combatem o narcoterrorismo na Colômbia, a imigração ilegal, destacam elevada prioridade à Tríplice Fronteira Brasil, Argentina, Paraguai, prosseguem na instalação de uma base no Paraguai e colocaram a Venezuela (a despeito do comércio bilateral de petróleo) na lista dos

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Estados bandidos. Ou seja, a Eurásia é prioritária, mas não deixaram de existir movimentos paralelos de expansão hegemônica.

Gomes (2007, p. 45), com base no modelo desenvolvido por Hermann (1990),

caracteriza Bush como um “líder predominante sensível (sensitive predominant

leader)”, afirmando que, nesse caso, “[...] o líder monitora o ambiente para procurar

quais grupos são atingidos pelos problemas a serem solucionados e quais são as

suas reações”, de modo a buscar o consenso enquanto lida com a questão tratada

pela política externa. Esse consenso, no episódio do 11 de Setembro, foi

representado pela resposta que a população, como um todo, esperava que o país

desse, de forma a garantir a não impunidade. Bush, então, viu-se em um cenário

demasiadamente favorável para a atuação de forma autônoma, ficando,

aparentemente, sem nenhum constrangimento.

Em suma, Bush estabeleceu uma política externa transformativa que se

aproximou retoricamente do liberalismo internacional, rebuscando as orientações

delineadas por seu antecessor, Bill Clinton (1993-2001). Foi resgatada a perspectiva

relativa à democratização, à utilização da força, à questão do aumento de armas de

destruição em massa, às nações cuja conduta é tida como irregular (de acordo com

o que a comunidade internacional julga como conduta adequada) e à reconstrução

nacional (PECEQUILO, 2011).

A aproximação com o chamado “clintonismo” ficou mais evidente no período

de discussão em torno da intervenção militar no território do Iraque, uma vez que

este último era considerado a fonte da conjugação dos problemas. Mais

precisamente, foi a questão do Iraque que aproximou a visão de Bush (em relação à

política externa) da visão de Clinton (PECEQUILO, 2011).

Sobre a proximidade da Doutrina Bush com as políticas adotadas por Ronald

Reagan, presidente estadunidense no período de 1981 até 1989, no que diz respeito

ao combate ao terrorismo, tem-se a alegação da legítima defesa preventiva e a

discriminação de Estados aparentemente cooperadores e/ou simpatizantes da ação

terrorista (“Eixo do Mal”) como pontos em comum. A eloquência da Guerra Fria,

relacionada ao chamado “império do mal”, além de defender esse pressuposto da

legítima defesa preventiva contra o terrorismo internacional, fez com que houvesse

justificativa para as intervenções (diretas e indiretas) em outros Estados, como parte

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do método de oposição estadunidense para reprimir a influência soviética,

principalmente na América Latina (PECEQUILO, 2011).

4.2 A política externa de Barack Obama para o terrorismo (2009 – atualidade)

Diante desse cenário internacional, após o término do criticado governo Bush

– o qual resultou em um aumento do antiamericanismo no mundo – e a instauração

de uma profunda crise econômica, semelhante à de 1929, Barack Obama é eleito,

tornando-se o primeiro presidente negro do país e simbolizando o começo de uma

nova situação política, tendo a “mudança” como principal elemento presente em seu

discurso. Para Bandeira (2008, p. 41), “a eleição de Barack Obama, de uma forma

ou de outra, acabou com o sonho de George W. Bush de manter os

neoconservadores do Partido Republicano com o domínio do governo [...]”.

Assim, sua eleição representou uma alternativa de reforma, com base em

uma agenda de governo progressista, que objetivava modernizar a hegemonia e as

relações sociais e econômicas do país. Entretanto, como se verá adiante, as

mudanças não ocorreram de forma radical. A hegemonia estadunidense perante o

resto do mundo, bem como as guerras envolvendo o país, continuaram a existir,

tendo ainda o combate ao terrorismo internacional como prioridade (PECEQUILO,

2011).

O contexto em que houve a eleição de Obama era de início de uma intensa

crise econômica, a qual Bush enfrentou apenas no final de seu governo. O novo

presidente se apresentou, então, como candidato da união, de acordo com

Pecequilo (2011). Porém, dado o início de seu mandato, suas atividades conduzidas

à criação de expectativas favoráveis acerca de sua política externa são

apresentadas como indícios de fraqueza e humilhação. Como exemplos dessas

ações, Gardiner e Roach (2009), citados por Ayerbe (2010, p. 93), destacam:

[...] os reiterados pedidos de desculpas por comportamentos arrogantes do passado com o mundo muçulmano (entrevista à rede Al Arabiya, 27/01/2009), com os aliados europeus (discurso na França, 3/04/2009) e latino-americanos (Cúpula de Trinidad y Tobago em 17/04/2009); sua proposta de um novo começo nas relações com o Irã (Videotape parabenizando o país pelo ano novo Persa, 20/03/2009), reconhecendo e se desculpando pela participação no golpe contra o primeiro-ministro Mosaddek em 1953 (discurso no Egito, 4/06/2009); sua crítica a práticas de tortura a prisioneiros por parte da CIA, que teriam sacrificado valores

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nacionais essenciais no terreno dos direitos humanos (discurso aos funcionários da agência, Virgínia, 20/04/2009), propondo fechar a prisão da Baía de Guantánamo (discurso na França, 3/04/2009).

Paralelamente, os ajustes previstos por Obama enfrentaram fortes

resistências (entre e intrapartidárias), o que acarretou o surgimento de contradições

e balanços no desempenho da Casa Branca. A oposição criticava a falta de

experiência do presidente e argumentava que este definia sua mudança levando em

consideração apenas o público ao qual se direcionava, sendo ela desprovida de

consistência ou visão estratégica (PECEQUILO, 2011).

Obama prometeu o estabelecimento de um cronograma de retirada do Iraque

e reordenamento de missão, com a intenção de proporcionar uma reavaliação na

operação neste país, caracterizando, naquele momento, a missão no Iraque como

“guerra de escolha” e a no território afegão como “guerra de necessidade”, tendo

esta última se estendido ao Paquistão, que havia virado o santuário da Al-Qaeda.

Com isso, surgiu a proposta de tentativa de diálogo com a Coreia do Norte e o Irã,

de forma a evitar que as armas nucleares se proliferassem e caíssem nas mãos de

terroristas, e afirmando-se que haveria a busca pela reforma do multilateralismo, a

restauração da credibilidade estadunidense e a consolidação dos EUA como um

país que atua por meio da cooperação. Em outras palavras, o rompimento com os

padrões promovidos por Bush, em seu governo (PECEQUILO, 2011).

Neste período, segundo Pecequilo (2011), no Oriente Médio, assim como na

África, a retórica se centralizou na harmonização entre os povos e religiões, na

aceitação das diferenças (respeito às demais religiões, sobretudo ao Islã) e na

reativação do desenvolvimento gradativo do processo de paz entre Israel e

Palestina. Contudo, a revisão da missão no Afeganistão (que, até então, contava

com o aumento sucessivo de tropas na região, buscando combater o terror) apenas

foi anunciada no fim de 2009, em meio a um constante crescimento da violência

nesse país, resultado do ressurgimento do regime talibã e da Al-Qaeda.

A reformulação das missões no Iraque e no Afeganistão, com o ajuste de

datas limites para as forças militares se retirarem das respectivas regiões, gerou

certa controvérsia, uma vez que pareceu não depender dos resultados dessas

missões. Pecequilo (2011) chama atenção para o caráter político, ao invés de

estratégico, que as datas possuem, dada a necessidade de réplica aos setores

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pacifistas e isolacionistas, que se chocou com o papel dos EUA no Oriente Médio,

dividido entre negociações ou pressões (multilaterais e unilaterais) ou, ainda,

operações militares. Com a demonstração que a Casa Branca realizou a favor do

engajamento do Irã, buscando conter o seu programa de armamento nuclear,

ocorreram diversas críticas por parte de neoconservadores, defensores de uma

intervenção militar, no território iraniano, e contrários à tentativa de diálogo.

Em 2010, conforme Ayerbe (2010), ao mesmo tempo em que lista o

crescimento econômico dos Estados Unidos e a redução do déficit como desafios

para se renovar a supremacia do país internacionalmente, Barack Obama, ao

divulgar a Estratégia de Segurança Nacional, alavanca o fenômeno do terrorismo,

que, por sua vez, passa a fazer parte de uma agenda mais extensa, tendo sua

magnitude relativizada com relação ao período de governo de Bush. Na concepção

de Obama, a globalização, que se expandiu pelo mundo, ainda que tivesse trazido

consigo um aspecto muito positivo, sobretudo em relação aos avanços na

propagação da democracia, da liberdade e do crescimento da paz entre os Estados,

também aumentou a possibilidade de alastramento de ameaças transnacionais,

como o terrorismo.

A chamada Doutrina Obama, instaurada no mesmo ano, permitiu que o

governo estadunidense retomasse a iniciativa política, em meio às pressões que

ocorriam naquele momento. Foram claramente definidos como “inimigos” a Al-Qaeda

e seus aliados, abandonando-se o conceito de terrorismo transnacional e a noção de

"guerra global contra o terror" de Bush. Loy (2011), citado por Jesus (2014), ainda

resume as estratégias de Obama para o combate ao terrorismo, citando, entre elas,

a utilização de um aparato de inteligência aprimorado, o uso de uma cooperação

intensificada com aliados acerca do terrorismo, o estabelecimento de relações

cordiais com povos muçulmanos (a fim de conter ações terroristas) e um foco no

impedimento da posse de armas de destruição em massa por terroristas.

Ainda em 2010, desconsiderando as críticas republicanas e com a sensação

de dever cumprido, o presidente declarou encerrada a guerra no Iraque, afirmando

que o fim do conflito, iniciado em março de 2003, seria do interesse de iraquianos e

estadunidenses, vindo a retirar as tropas estadunidenses da região, em 2011, e

colocando, assim, a responsabilidade pelo futuro do país nas mãos dos próprios

iraquianos. Por outro lado, intensificou a presença militar dos Estados Unidos no

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Afeganistão, justificando que as forças afegãs ainda não possuíam a capacidade

necessária para comandar a segurança do país, tomado pelo Talibã e pela Al-Qaeda

(BBC NEWS WORLD, 2010).

O fim de 2010 ainda contou com o começo de uma onda de protestos no

Oriente Médio e no Norte da África, que ficou conhecida como “Primavera Árabe” e

objetivava a queda dos governantes e consequente instauração da democracia nas

regiões. Após o início das manifestações, surgiram opiniões, por parte de analistas e

legisladores, sobre qual deveria ser o papel estadunidense na Primavera Árabe,

defendendo-se, por um lado, a ideia de que o país deveria agir de forma

intervencionista para tratar dos dilemas árabes, por outro, o pensamento de que

esses dilemas foram origem das agressivas políticas de intervenção estadunidenses,

e, por fim, a opinião de que a intervenção simplesmente não estava entre os

interesses estadunidenses. Porém, a postura geral dos Estados Unidos durante as

revoluções resumiu-se, predominantemente, em passividade, vindo a agir, de forma

lenta, no Egito, na Síria e na Líbia (HAMID, 2011).

No início de 2011, após instaurada uma crise institucional na Líbia, que

resultou em uma rebelião interna contra o ditador Muammar al-Gaddafi, ocorreu,

autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU, uma intervenção dos Estados

Unidos na região, por meio de forças exclusivamente aéreas. Com isso, aeronaves

não tripuladas (drones) foram usadas para atingir instalações de defesa do governo

líbio, possibilitando que uma zona de exclusão aérea fosse efetivamente executada

no país em conflito. Obama, reafirmando o não envio de tropas terrestres para a

região, buscou construir um modelo explicativo que alocasse a participação dos

Estados Unidos em uma ação militar limitada, não em uma guerra. Ademais,

posteriormente, os EUA abdicaram da linha de frente dos ataques aéreos e

transferiram a liderança da operação para a OTAN (DAMIN, 2012).

Em 2011, Obama prorrogou a vigência do Ato Patriota até junho de 2015,

argumentando que, sem tal legislação, os estadunidenses se encontrariam em um

cenário de insegurança. Porém, não houve atualizações significativas nas medidas

controversas de invasão de privacidade. Ainda que os memorandos de

autorização/redefinição de tortura, empregados durante a gestão de Bush, tenham

sido suspensos, não ocorreu o julgamento dos prisioneiros e nem o fechamento de

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Guantânamo22, que continuou em funcionamento devido à falta de definição de um

status legal dos acusados de cometer algum crime, ainda que não mais recebesse

novos detentos (PECEQUILO, 2011).

O governo estadunidense modificou a lei, fazendo com que fossem adotados

os métodos de escutas telefônicas e de investigações na internet de milhões de

cidadãos, inclusive líderes de outras nações. Na área militar, os drones tornaram-se

populares pelo seu uso sistemático, ainda que já existissem na Era Bush. De acordo

com Bataoel (2011), citado por Damin (2012), de 2009 até 2011, o governo Obama

realizou 180 ataques com drones, vitimando 1.131 militantes e 209 pessoas

desconhecidas. Bush, entre 2004 a 2008, executou 42 ataques do mesmo tipo,

matando 241 militantes e 153 desconhecidos.

Sendo assim, pode-se afirmar que a Doutrina Obama, ao mesmo tempo em

que se baseia, teoricamente, no conceito de “desengagement”, ou seja, na intenção

de recuo da influência do exército estadunidense de regiões tidas como estratégicas

durante o governo Bush (principalmente forças ocupantes do Afeganistão e do

Iraque), fornece uma agenda pacifista, presente nos discursos presidenciais que se

referem à guerra contra o terror, o que ocasiona medidas diversas, abrangendo a

crescente utilização maciça dos drones nas regiões do Afeganistão, do Iêmen e da

Somália (WAISBERG, 2014).

Contudo, o foco excessivo na proteção de nacionais estadunidenses ameaça

a continuação de uma guerra mundial ao terrorismo, anteriormente relacionada a

princípios ocidentais, em contexto mais extenso. A defesa de uma agenda seletiva

de luta contra o terror é legitimada em função dos gastos excessivos que ocorreram.

Além disso, tem-se o suposto risco de conquistar novos inimigos ao favorecer a

intervenção militar em Estados onde organizações terroristas se fazem presentes. O

foco nacionalista e a continuidade da defesa do uso unilateral da força em casos

específicos representam, conforme Waisberg (2014), uma contradição entre a

agenda pacifista e a afronta ao sistema de segurança coletiva da ONU. A falta de um

22

Até o presente momento, o presidente não efetuou o fechamento da prisão de Guantânamo, que constituía uma de suas propostas iniciais, alegando que os detentos não poderiam retornar aos seus países de origem, havendo a possibilidade, ainda, de eles reincidirem na sua prática extremista. Da mesma forma, Obama, que havia anunciado a retirada das tropas estadunidenses do Afeganistão em 2016, a reagendou para 2017, utilizando a mesma justificativa adotada, por ele, anteriormente: de que as forças afegãs ainda não estão fortes o bastante.

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documento único que estabeleça a doutrina de segurança nacional no governo

Obama favorece ainda mais o reforço das divergências patentes na atual política

estadunidense de segurança nacional de combate ao terrorismo.

Também merece destaque o envolvimento indireto dos Estados Unidos na

guerra civil da Síria (promovida para tirar o presidente Bashar al-Assad do poder),

que ocorre desde 2011 até o presente momento, para combater a Irmandade

Muçulmana e a "franquia" da Al-Qaeda denominada Al-Nursa, apoiadores da revolta

armada. O país norte-americano fornece apoio a parte dos rebeldes e, desde 2014,

promove bombardeios contra o Estado Islâmico.

Além disso, no ano de 2015, Irã e EUA, inimigos históricos, firmaram um

acordo nuclear. Nesse acordo, que vinha sofrendo resistência de políticos

conservadores dos dois países, o Irã aceitou reduzir o seu programa nuclear, em

troca de alívio nas sanções impostas ao país nos últimos anos. Como parte da

negociação, Obama impôs a remoção, por parte do Irã, de dois terços das

centrífugas instaladas e o armazenamento das mesmas sob supervisão

internacional, bem como o extermínio de 98% do urânio enriquecido que o país

possui. Além disso, ressaltou-se que as sanções podem voltar a ser aplicadas, caso

o acordo seja violado (BBC NEWS WORLD, 2015).

4.3 Aproximações e distanciamentos das políticas de Bush e Obama para o

terrorismo

A política externa do governo de Barack Obama, ao contrário da do governo

antecessor, dá ênfase à oposição ao intervencionismo estadunidense da Doutrina

Bush, condenando os efeitos de anos de envolvimento no Afeganistão e no Iraque.

Essa condenação, para Waisberg (2014, p. 6), sugere uma “manipulação do

discurso de segurança nacional dos Estados Unidos, ofuscando a manutenção da

defesa do uso da força unilateral no combate ao terrorismo”. Já para Ayerbe (2010,

p. 96), “[...] a atuação de Obama vai ao encontro de concepções que nortearam seus

antecessores Nixon, Carter e Clinton, diferenciando-se da trajetória assumida por

Reagan e George W. Bush”.

Em contrapartida, apesar de criticar a Doutrina Bush, Obama manteve

algumas diretrizes de seu antecessor republicano. Com a sua eleição, esperava-se

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que fosse estabelecido um maior diálogo com a ONU e que a prisão de

Guantânamo, onde, na época, aproximadamente 250 suspeitos de atos terroristas

estavam mantidos presos, fosse fechada, o que não veio a ocorrer. Obama, assim

como Bush, não considerou indispensável o apoio do Conselho de Segurança das

Nações Unidas, bem como não pôs fim à prisão, alegando que não haveria

possibilidade de transferência dos detentos. Isso acabou levantando dúvidas não

somente acerca de sua credibilidade, mas também do tamanho de seu

distanciamento do governo anterior.

Assim, o discurso de Obama acerca da política externa estadunidense, que

sai em defesa do multilateralismo e da diplomacia como estratégias a serem

utilizadas, não tem plena credulidade para uma parte considerável da população

(americana e mundial), e, principalmente, perante os republicanos, conservadores e

liberais intervencionistas. O antiamericanismo, decorrente de mais de uma década

de guerras, surge como ponto negativo na luta pelos interesses nacionais, ao

mesmo tempo em que a pressão (sobretudo, por parte dos lobbies sionista, da

indústria armamentista e da indústria do petróleo) para que o governo estadunidense

aja de forma que suas ações tenham devida relevância cresce cada vez mais.

Com Obama, há um enfoque na sofisticação dos métodos. O governo de

Bush tinha um modo indelicado de executar o Ato Patriota, e na gestão de Obama, a

deterioração é menor e a eficácia considerada maior. Contudo, Bush não faz tanta

distinção entre o terrorismo em geral e o islâmico. Sob Obama, a definição de

terrorismo passa a contemplar exclusivamente a Al-Qaeda e seus aliados. Ademais,

Bush declarou guerra ao Iraque e ao Afeganistão, e Obama tirou o foco da região

iraquiana e focou apenas na afegã.

George W. Bush, estando alocado na categoria de líder predominantemente

sensível, conceito sugerido por Hermann (1990), tem seu comportamento

caracterizado pela preferência à prática, à tomada de ações, não sendo considerado

reflexivo, o que fez com que Bush jamais cogitasse a possibilidade de isolacionismo

ou protecionismo, optando pelo unilateralismo. Com os ataques de 11 de setembro

de 2001 (choque externo), Bush passou a ter uma visão mais realista, vendo o

mundo como um lugar hostil e perigoso.

No caso das medidas antiterrorismo adotadas pelos EUA, após o 11 de

Setembro, as mudanças ocorridas na Era Bush podem ser alocadas na categoria de

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“alteração de programa”, conforme o conceito de Hermann (1990). Nesse período,

houve o surgimento de uma maior necessidade de se combater o “Terror” e o “Eixo

do Mal”, e o governante (Bush) reformulou e reestruturou a política de segurança

nacional dos EUA, fazendo uso da força bélica para alcançar um objetivo

previamente estabelecido (enfrentar a ameaça terrorista). Assim, a partir do governo

Bush, tem-se a ação militar como uma nova maneira de garantir aquilo que os

grupos interessados na política externa dos EUA gostariam que ocorresse.

Além disso, Bush afirmava que a ele caberia o fornecimento das diretrizes

para a elaboração da política externa, à medida que seu gabinete ficaria responsável

por transformar as metas em realidade. Esteve, portanto, amparado por um conjunto

de assessores, que tiveram importância fundamental para o formato final da Doutrina

Bush, bem como para a construção dos meios para se alcançar o objetivo.

Ocorreu, no governo Bush, a influência dos think tanks23 no

neoconservadorismo estadunidense (fator ideológico) e dos lobbies sionista e de

empresas – sobretudo, dos ramos militar e energético – junto ao parlamento,

interessadas na política externa do governo (fator econômico) como variáveis

internas, que acabaram influenciando a tomada de decisões na política exterior, de

uma forma geral. Como principal variável externa, tem-se a ação militar,

expressivamente caracterizada pelas guerras (intervenção no Afeganistão e Guerra

do Iraque).

No governo Bush, ainda percebe-se que, com o final da Guerra Fria, a opinião

pública deixou de se preocupar tanto com a política externa estadunidense, o que

mudou radicalmente com os atentados do 11 de Setembro. A brutalidade com que

os ataques foram realizados e as mortes que ocorreram fizeram com que se

formasse um cenário de medo no país, gerando um alto nível de preconceito dos

estadunidenses para com os árabes e muçulmanos. Com a subsequente aprovação

de leis que permitiam ao país atuar no combate ao terrorismo, ficou claro que os

Estados Unidos possuíam autonomia para elaborar sua estratégia sem nenhum

constrangimento interno ou externo.

23

Organizações ou instituições sem fins lucrativos, atuantes na área dos grupos de interesse, que promovem discussões acerca de assuntos estratégicos, de modo a influenciar no surgimento de transformações sociais, políticas, econômicas ou científicas.

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62

As definições expostas anteriormente, acerca da política externa de Bush

para o terrorismo, são ilustradas no Fluxograma 2, abaixo:

Fluxograma 2 – O Modelo de Hermann (1990) para a política externa de Bush

em relação ao terrorismo

Fonte: Elaborado pelo autor a partir de Hermann (1990, p. 13).

Obama, por sua vez, enfrentou o início da crise econômica de 2008, como

principal fator interno, e o antiamericanismo decorrente dos anos que sucederam o

seu governo, como fator externo. Com a mudança de governo, esperava-se que

Obama, com a sua ideologia e concepção de mundo diferente das de Bush,

alterasse totalmente os meios empregados na busca do objetivo, o que também

constituiria a “alteração de programa”, prevista por Hermann (1990). Como o

governante não abandonou o uso da força, mantendo a essência do mesmo modelo

econômico, e apenas intensificando os meios para alcançar o objetivo inicial, a

mudança esteve alocada na categoria de “pequenos ajustes”.

Como forma de facilitar o entendimento dessas informações acerca da política

externa de Bush para o terrorismo, tem-se o Fluxograma 3, a seguir:

Fluxograma 3 – O Modelo de Hermann (1990) para a política externa de Obama

em relação ao terrorismo

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Fonte: Elaborado pelo autor a partir de Hermann (1990, p. 13).

Na gestão de Obama, como se pode perceber no Fluxograma 3, houve a

permanência da influência dos grupos de pressão (lobbies). A pressão dos lobbies e

as resistências com que Obama se deparou dentro do aparelho de governo e do

Congresso constituíram, desde o início de seu governo, entraves para que ele

alterasse substancialmente suas diretrizes.

Porém, o presidente, enquanto comandante ou como ator obediente às

resoluções da ONU, não necessitou de um ato do Congresso que o autorizasse a

levar o país à guerra com outras nações, como foi o caso da intervenção na Síria.

Seguindo essa lógica, Obama poderia atuar com as forças armadas em qualquer

tempo ou lugar, sem a obrigação de uma autorização congressual prévia. Mas, por

outro lado, o Congresso poderia cortar o financiamento das tropas, o que resultaria

numa retirada dos contingentes.

Ao mesmo tempo, ainda que, com Obama, houvesse a busca pelo resgate da

multipolaridade e do multilateralismo, não se abriu mão totalmente do unilateralismo

de Bush. A intensificação dos ataques no Afeganistão com os drones constituiu uma

política unilateral, e a intervenção na Líbia, por sua vez, foi tratada de forma não

tradicional, uma vez que os EUA abriram mão da liderança da operação,

transferindo-a para a OTAN. Porém, apesar disso, Bush trabalhou mais com as

coalizões, e Obama prioriza a passagem pelas instituições.

Contudo, apesar da mudança de Obama para ações mais direcionadas contra

a Al-Qaeda, enquanto o Iraque foi a decisão essencial de Bush em sua guerra global

contra o terror, o uso sistemático dos drones, que já ocorria no governo Bush,

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64

aumentou no governo Obama. Com isso, abriu-se mão da forma de guerra mais

tradicional, que antes levava as tropas estadunidenses aos campos de batalha

principalmente por vias terrestres.

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5 CONCLUSÃO

O presente trabalho procurou demonstrar que as táticas empregadas nas

doutrinas Bush e Obama de combate e prevenção do terrorismo, ainda que

apresentem aspectos da política externa dos Estados Unidos em contextos diversos,

não se distanciaram totalmente, embora tenham existido mudanças significativas. A

primeira formou-se como resposta aos atentados terroristas que ocorreram em 11 de

setembro de 2001, trazendo a utilização da força unilateral como principal forma de

alcançar os seus objetivos políticos. Já a segunda, por sua vez, ocorreu como forma

de reagir diretamente às consequências desfavoráveis da primeira, principalmente

provenientes da invasão do Iraque, realizada em 2003.

Tendo o terrorismo contribuído de forma significativa para o reordenamento

da política externa estadunidense e constituído o principal foco dessas ações, foi

feita, no primeiro capítulo, uma retrospectiva, de modo geral, sobre sua história,

começando pelo seu surgimento, na Revolução Francesa (1789-1799), e indo até a

contemporaneidade, onde passou a ser, mais do que nunca, um problema para os

Estados Unidos. Da mesma forma, apresentou-se a problemática do conceito de

“terrorismo” pela falta de um consenso universal em torno do vocábulo, bem como

as distinções entre as práticas consideradas terroristas, os acontecimentos

internacionais de maior destaque ligados ao tema e, por fim, a identificação dos

principais grupos que atuam nessa modalidade, que constitui um dos objetivos

centrais da presente pesquisa.

No que tange à prática terrorista, percebeu-se que está diretamente

relacionada à propagação do medo para o alcance de um objetivo específico,

fazendo-se uso da violência física e/ou psicológica. Além disso, viu-se que a ação

está atrelada, sobretudo, a questões religiosas e políticas. Religiosas no sentido de

defesa de uma determinada bandeira (religião) e políticas em relação à sua

utilização, por parte de um Estado, como ferramenta de governabilidade, visando

manter a ordem.

Já no capítulo subsequente, partiu-se de um relato histórico acerca da política

externa dos Estados Unidos, em diferentes épocas e sob diversos governos. Com

isso, pôde-se perceber que a posição de única superpotência global, hoje

conquistada pelo país, foi uma consequência dos mais variados acontecimentos

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66

internacionais ocorridos nos últimos séculos, que ocasionaram meios favoráveis

para a supremacia estadunidense, e, somados às decisões e os aspectos internos

dos EUA, possibilitaram a sua ascensão. Dentre eles, destacam-se a Primeira

Guerra Mundial (1914-1918), na qual o país pertenceu ao bloco vitorioso, a Segunda

Guerra Mundial (1939-1945), que trouxe vantagens econômicas e militares à nação

(crescimento da capacidade industrial, do poder aéreo e da marinha), e a Guerra

Fria (1947-1991), que incapacitou outra grande potência (União Soviética) de

concorrer com o poderio dos EUA.

Além disso, buscou-se apresentar a teoria de Análise de Política Externa,

utilizada para investigar a política externa de governos específicos, levando em

conta os seus determinantes, os objetivos, a tomada de decisões e as ações que

forem efetivamente realizadas. Em outras palavras, se fez uso dessa teoria e,

sobretudo, de uma de suas metodologias, conhecida como Modelo de Hermann

(1990), para promover a associação entre as variáveis internas (como a crise

econômica de 2008 e a influência dos lobbies e da opinião pública) e externas (como

o crescimento do “antiamericanismo” no mundo), objetivando alcançar um maior

nível de compreensão do processo de formulação das ações externas dos Estados

Unidos.

Por fim, analisou-se as políticas externas em questão, objetivando solucionar

o problema de pesquisa proposto, o qual questiona as principais medidas que Bush

e Obama utilizaram contra o terrorismo, e os demais objetivos deste trabalho, que

incluem a ponderação dos fatores que influenciaram na tomada de decisões dos

dois governantes e as consequências de suas ações para a segurança internacional.

Dessa forma, constatou-se que a Doutrina Bush está frequentemente associada a

duas noções primordiais: a alegação da legítima defesa preventiva e a depreciação

de atores que aparentemente colaboram com o terrorismo internacional,

classificados, por Bush, como “Eixo do Mal”. Em contrapartida, Obama parte de uma

concepção diferente, também priorizando o combate à ameaça terrorista, porém,

fazendo uma maior distinção entre os Estados considerados inimigos.

Contudo, a agenda de segurança nacional no governo Obama, ainda que

atrelada a fins pacíficos, não reflete abandono total do isolacionismo estadunidense

de Bush. O aumento da utilização dos drones e a oposição às intervenções militares

diretas para o combate ao uso de armas de destruição em massa demonstram

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continuação do uso da força unilateral, desagregada da abordagem global

relacionada à proteção dos direitos humanos. Além disso, se por um lado, com

Bush, o combate ao terrorismo se deu de forma mais radical, com as invasões no

Iraque e no Afeganistão, objetivando a eliminação das organizações terroristas,

como forma de prevenir o seu alastramento, com Obama foi redefinida a

caracterização de “inimigo”, houve a retirada das tropas do Iraque e enfoque nas

missões no Afeganistão e no combate à Al-Qaeda e aos seus aliados.

A respeito do Ato Patriota, que torna legítimas as ações dos Estados Unidos

na guerra contra o terrorismo e foi instaurado no governo Bush, cabe reforçar a

manutenção pela qual ele passou, posteriormente, com Obama. Se durante a gestão

de Bush, se fazia, de forma drástica, uso de métodos unilaterais, de invasões a

países suspeitos de resguardar terroristas, de prisões controversas e de meios para

interrogatório (sobretudo, em Guantânamo), no governo Obama, essas medidas

estratégicas se dão de forma mais discreta (ainda que com a utilização dos drones),

por meio de escutas telefônicas, espionagem, monitoramento de informações e

intenções de diálogo.

Ademais, a crítica de Obama ao intervencionismo na Doutrina Bush oculta a

conservação da defesa do uso da força unilateral no combate ao terrorismo, cada

vez mais separado do discurso dos direitos humanos no âmbito internacional. Por

conseguinte, as orientações da doutrina Obama apresentam aumento no abandono

do apelo ao papel de chefia estadunidense em instituições de cooperação militar e

na prática de ações de segurança coletiva permitidas pelo Conselho de Segurança

da ONU.

Também ficou clara a intenção de Obama de diminuir a incidência de

intervenções diretas em conflitos internacionais, conservando somente o suporte

financeiro e logístico, sem ameaçar a segurança das tropas estadunidenses. Com

isso, a tática de combate ao terror renega o discurso de inclusão e restrição,

deixando de evidenciar a guerra internacional contra o terrorismo. Essa concepção,

associada ao argumento em favor de uso unilateral da força, sugere regressão a

princípios da Doutrina Reagan (utilização indireta da força em conflitos periféricos e

alternativa de operações unilaterais específicas). Consequentemente, o apelo a

convicções estadunidenses é estruturado para justificar intervenções em casos

excepcionais.

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Pode-se concluir, portanto, que as semelhanças entre Bush e Obama, para o

terrorismo, estão representadas pela defesa da democracia e da liberdade, pela

necessidade de intervenção em assuntos externos (sobretudo, que envolvam a

prática terrorista) e, principalmente, pela defesa do extermínio da ameaça terrorista a

todo custo, em nome da segurança nacional e mundial. A respeito das diferenças,

tem-se, sobretudo, a personalidade de cada um como fator determinante da maioria

das ações de combate ou prevenção que foram realizadas, como é o caso da forma

de fazer uso da força para eliminar o terrorismo, da caracterização do mesmo e da

própria percepção de mundo que cada um dos dois governantes possui.

Deve-se ressaltar, também, que nem todas as ações externas dependem

única e exclusivamente do chefe de Estado. Bush enfrentou a crise econômica,

ocorrida no ano de 2008, apenas no final de seu mandato, ao contrário de Obama,

que a enfrentou desde o início de seu governo e ainda lida com um crescente

antiamericanismo do mundo.

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