DALTONISMO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: UM MAPA QUE ENXERGUE AS DIFERENÇAS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO, POLÍTICA E SOCIEDADE CENTRO DE EDUCAÇÃO CURSO DE GEOGRAFIA ANDRÉ ERLER TONINI DANIEL TÓTOLA FONTANA MARCOS EDUARDO NASCIMENTO MORAES RICHARDSON JOSÉ CARDOSO LYRIO SÉRGIO BENACHIO SUANNO DALTONISMO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: UM MAPA QUE ENXERGUE AS DIFERENÇAS VITÓRIA - ES 2014

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TCC Licenciatura

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPRITO SANTO

    DEPARTAMENTO DE EDUCAO, POLTICA E SOCIEDADE

    CENTRO DE EDUCAO

    CURSO DE GEOGRAFIA

    ANDR ERLER TONINI

    DANIEL TTOLA FONTANA

    MARCOS EDUARDO NASCIMENTO MORAES

    RICHARDSON JOS CARDOSO LYRIO

    SRGIO BENACHIO SUANNO

    DALTONISMO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: UM MAPA QUE

    ENXERGUE AS DIFERENAS

    VITRIA - ES

    2014

  • ANDR ERLER TONINI

    DANIEL TTOLA FONTANA

    MARCOS EDUARDO NASCIMENTO MORAES

    RICHARDSON JOS CARDOSO LYRIO

    SRGIO BENACHIO SUANNO

    DALTONISMO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: UM MAPA QUE

    ENXERGUE AS DIFERENAS

    Trabalho de Concluso de Curso apresentado ao Departamento de Educao, Poltica e Sociedade do Centro de Educao da Universidade Federal do Esprito Santo, como requisito parcial para a obteno do grau de Licenciados em Geografia.

    Orientador: Prof. Dr. Vilmar Jos Borges

    VITRIA

    2014

  • ANDR ERLER TONINI

    DANIEL TTOLA FONTANA

    MARCOS EDUARDO NASCIMENTO MORAES

    RICHARDSON JOS CARDOSO LYRIO

    SRGIO BENACHIO SUANNO

    DALTONISMO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: UM MAPA QUE

    EXERGUE AS DIFERENAS

    Trabalho de Concluso de Curso apresentado ao Departamento de Educao,

    Poltica e Sociedade do Centro de Educao da Universidade Federal do Esprito

    Santo, como requisito parcial para a obteno do grau de Licenciados em Geografia.

    Vitria, 11 de dezembro de 2014.

    COMISSO EXAMINADORA

    ________________________________

    Professor Doutor Vilmar Jos Borges

    Universidade Federal do Esprito Santo

    Orientador

    ________________________________

    Professor (a):

    Instituio:

    ________________________________

    Professor (a):

    Instituio:

  • AGRADECIMENTOS

    Agradecemos as nossas famlias pelo apoio durante os quatro anos de caminhada,

    ao nosso orientador Prof. Dr. Vilmar Jos Borges, que sempre se mostrou disponvel

    em nos atender e incentivou nossa pesquisa, e a todos aqueles que direta ou

    indiretamente contriburam para a realizao deste trabalho.

    Onde quer que haja mulheres e homens, h sempre o que fazer, h sempre o que

    ensinar, h sempre o que aprender Paulo Freire.

  • RESUMO

    Este Trabalho de Concluso de Curso teve como objeto de estudo a compreenso

    da problemtica de alunos daltnicos. Tambm analisamos em uma tica da

    incluso dos alunos aos contedos escolares, principalmente no que diz respeito a

    Geografia. A partir da resoluo de mapas e grficos, utilizando tcnicas que na

    maioria das vezes no so levadas em conta e que fazem toda a diferena para a

    incluso do daltnico. A partir dessas constataes a pesquisa incitou-nos a

    despertar as potencialidades de um estudo aprofundado, permitindo curiosear um

    projeto pessoal e coletivo. Durante todo o processo dessa pesquisa permearam-se

    diversos pontos e dvidas acerca das prticas do ensino geogrfico na utilizao de

    mapas e grficos. As investigaes e descobertas nas comunidades escolares

    auxiliaram para ajudar nas indagaes surgidas.

    Palavras chave: daltonismo; educao; cotidiano escolar.

  • SUMRIO

    1. APRESENTAO ................................................................................................... 7

    2. EDUCAO E INCLUSO: ALGUMAS REFLEXES ........................................... 9

    2.1 RELACIONAMENTO E EXCLUSO NA HISTRIA DA EDUCAO.................................................... 9

    2.2 BRASIL NO CONTEXTO MUNDIAL DA EDUCAO INCLUSIVA ..................................................... 12

    2.3 NOVOS OLHARES SOBRE A EDUCAO ESPECIAL: O PARADIGMA INCLUSO E INTEGRAO .. 16

    2.4 O DESAFIO EDUCAO ESPECIAL: DALTONISMO E O ENSINO DE GEOGRAFIA COMO EXEMPLO

    DAS SINGULARIDADES DA EDUCAO NA ATUALIDADE .................................................................. 21

    2.4.1 CONSIDERAES A CERCA DO DALTONISMO ...................................................................... 22

    2.4.2 DALTONISMO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: UM MAPA QUE ENXERGUE AS DIFERENAS .. 23

    3. PERCURSO METODOLGICO DE IDENTIFICAO DOS ALUNOS

    DALTNICOS: MAPEANDO O DALTONISMO ........................................................ 25

    4. PROPOSTAS ........................................................................................................ 47

    4.1 APLICAO ALTERNATIVA DOS RECURSOS DE COR E TONS ....................................................... 48

    4.2 A APLICAO DE SMBOLOS ........................................................................................................ 51

    4.3 A UTILIZAO DE HACHURAS ...................................................................................................... 53

    4.4 CRIANDO ALTERNATIVAS PARA CONFECO DE GRFICOS, VISANDO OS DALTNICOS .......... 59

    5. CONSIDERAES FINAIS .................................................................................. 63

    6. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ...................................................................... 65

  • 7

    1. APRESENTAO

    PALAVRAS INICIAIS...

    As intencionalidades de desenvolvimento da presente investigao nos acompanha

    h algum tempo. Nosso primeiro contato com a problemtica ocorreu no ano de

    2013, cursando a disciplina Tpicos Especiais de Ensino I, quando evidenciamos

    que um dos nossos colegas e hoje tambm membro da equipe de pesquisa, deixou

    transparecer certas dificuldades na diferenciao de cores. Soubemos, ento, que

    nosso colega era daltnico e tivemos, j naquele momento, relatos do mesmo

    acerca dos impactos que o daltonismo causam na efetivao do processo ensino-

    aprendizagem. Segundo nos informou, naquele momento, nosso colega, nas

    disciplinas de Geografia e Artes esses impactos se intensificam, principalmente

    quando se refere leitura e interpretao de mapas, grficos, figuras, desenhos,

    imagens de paisagens etc. Nasceu a, o desejo de intensificar as reflexes a

    respeito.

    A inquietude inicial se intensificou quando, ao iniciarmos as primeiras investidas

    sobre a temtica, constatamos, como primeiras dificuldades a quase inexistncia de

    bibliografia disponibilizada abordando a temtica. Se, por um lado, essa escassez de

    referencial bibliogrfico fosse vista como um obstculo, por outro, nos deparamos

    com o desejo e a possibilidade de contribuirmos para inserir na pauta dos debates

    um tema existente que impacta no processo de ensino-aprendizagem e que, no

    entanto, no tem sido devidamente considerado. Ressalta-se que so muitos os

    estudos e reflexes acerca da incluso. Discutem-se a relevncia de incluso de

    alunos com necessidades especiais no ensino regular. No entanto, tais estudos, via

    de regra, se referem s vrias necessidades especiais, tais como viso, audio,

    oralidade, mobilidade, entre outros, raramente se relacionam ao daltonismo. Ocorre,

    aqui, de certa maneira uma espcie de excluso na lgica das polticas de

    incluso.

    Nasce da o desejo e os esforos no sentido de estabelecer um dilogo entre

    daltonismo e a Geografia, e, assim, elaborar uma proposta alternativa.

  • 8

    Diante das dificuldades em encontrar estudos acerca da nossa problemtica,

    deparamo-nos com a necessidade de ouvir e dar vozes sujeitos estudantes com

    traos daltnicos, buscando pistas que evidenciassem no s a sua presena nos

    cotidianos escolares, como tambm pistas que pudessem auxiliar a elaborao de

    propostas alternativas no sentido de mitigar as dificuldades relatadas pelos mesmos.

    Limitados pelo espaotempo disponvel para a realizao da pesquisa, nosso

    primeiro desafio foi o de delimitar o universo da mesma. Deliberamos, ento, por

    selecionar duas escolas pblicas para, ento, identificarmos alunos daltnicos

    matriculados nas mesmas e que se dispusessem participar de nossa investigao.

    Constatamos, ento, a exemplo da no considerao do daltonismo nas polticas

    educacionais de incluso, que tambm nas unidades escolares no existem

    registros regulares acerca de alunos nessas condies. Foi, portanto, necessrio

    aplicar o teste de Ishihara, em alunos das escolas campo, no intuito de identificar a

    presena de daltnicos inseridos no meio escolar.

    Aps a seleo das unidades escolares, aplicao do teste de Ishihara e constatar a

    presena de alunos com traos daltnicos, nosso prximo passo foi o de contactar

    professores de Artes e Geografia, que ministram aulas nas turmas desses alunos,

    bem como os referidos alunos, consultando-os sobre a disponibilidade e interesse

    em conceder entrevistas que subsidiassem nossas reflexes.

    Com o desenvolvimento da pesquisa foi possvel a elaborao do presente relatrio,

    que est organizado em trs captulos, onde no primeiro desenvolvemos uma

    reflexo terica acerca do levantamento bibliogrfico sobre a educao especial e as

    polticas voltadas as minorias. O segundo captulo se destina a abordar as

    experincias e vivncias, tanto de nosso colega e pesquisador, Andr Tonini, como

    tambm as experincias vivenciadas pelos alunos entrevistados. J no terceiro e

    ltimo captulo apresentamos os primeiros ensaios de propostas alternativas e

    possveis para facilitar a aprendizagem de alunos daltnicos, no estudo da Geografia

    e, sem a pretenso de concluir e encerrar as discusses, deixamos em aberto e o

    convite para nossas investidas que possibilitem solu(a)es.

  • 9

    2. EDUCAO E INCLUSO: ALGUMAS REFLEXES

    Para elucidar nossa problemtica de pesquisa e no intuito de contribuir com os

    atuais debates sobre propostas de educao inclusiva, inserindo na pauta dos

    mesmos a questo do aluno daltnico, no presente captulo buscaremos

    contextualizar a necessidade de se buscar garantir condies de equidade no

    processo educativo, como condies ao exerccio da cidadania.

    2.1 RELACIONAMENTO E EXCLUSO NA HISTRIA DA EDUCAO

    Conforme bem assevera a maioria dos antropologistas, em nenhum momento na

    histria humana se evidenciou a sua constituio pautada na ocorrncia do

    individualismo. Depreende-se da, que interagir e relacionar-se com o outro uma

    capacidade inerente e necessria a todos os homens. Esta mesma capacidade

    cumpre uma srie de fatores que so complexos e singulares principalmente quando

    observamos as mais variadas sociedades e suas respectivas culturas j produzidas

    pela humanidade. Por mais singulares que sejam os homens, seja por fatores

    morfolgicos ou mais subjetivos como a maneira de relacionar-se com o mundo,

    sempre esteve presente certa noo de normalidade 1 no que diz respeito ao

    homem em si, nestas sociedades.

    A questo que essa normalidade , em alguns casos, estabelecida politicamente

    em um jogo de poder e hegemonia social, poltica e econmica. Os excludos so

    resultado disso. Em todas as sociedades se presencia a formao de um grupo ou

    indivduos desagregados da maioria hegemnica dita como normal.

    A concepo de deficincia fsica ou mental foi e, lamentavelmente ainda , um

    fator de excluso. O homem normal aquele que no apresenta caractersticas

    como surdes, cegueira, idiotia, m formao ssea e etc. Todas estudadas e

    caracterizadas como patologia dentro de um padro de cincia medicinal, ou seja,

    olvida-se o fato de todos ns termos caractersticas nicas para tratar o que foge do

    padro estabelecido de normal como deficincia.

    1 Essa normalidade aqui se refere, entre outros fatores, ao pleno domnio do ser humano de todas

    as suas condies fsicas, motoras e intelectuais, consideradas normais pelos padres das respectivas sociedades.

  • 10

    Nessa direo Walter (2006) ao discutir a problemtica da excluso do indivduo no

    seu relacionar-se, no atual contexto do, O Mundo Moderno Colonial, onde temos

    hegemonicamente um processo de globalizao cultural que se estabelece por

    quase todo o mundo e que enraizada na Europa, afirma que temos na educao

    um exemplo da concepo hegemnica de igualdade. Esse exemplo, segundo o

    referido autor, resulta em excluso.

    Especificamente no que se refere modalidade de educao escolar, visando

    mitigar a solidificao dos processos de excluso dos indivduos que no se

    enquadram dentro os parmetros da normalidade, no Brasil tem sido implementada

    a chamada educao especial. Segundo o Art. 58 da Lei de Diretrizes e Bases da

    Educao Nacional (Lei n 9394/96), a educao especial se refere modalidade

    oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores

    de necessidades especiais. Para tanto, seus objetivos devem ser os mesmos da

    educao em geral, o que difere o atendimento, que passa a ser de acordo com as

    diferenas individuais do educando.

    O que conhecemos hoje como educao especial teve sua origem ainda na

    Antiguidade, antes mesmo de sua institucionalizao. Miranda (2003) assinala que

    os estudos sobre a educao especial apontam para quatro perodos distintos,

    datados e consolidados por fatores sociais, polticos e culturais. Esses quatro

    perodos so assim categorizados: a) perodo da negligncia, onde os deficientes

    eram abandonados, perseguidos e at eliminados, devido s suas condies

    atpicas; b) perodo de institucionalizao, os indivduos no so mais abandonados,

    porm, so segregados e protegidos em instituies residenciais; c) perodo da

    incluso, marcado pelo desenvolvimento de escolas especiais, com educao

    especial, para pessoas especiais; e, d), o perodo de integrao, que visa a

    integrao de tais indivduos em ambientes escolares o mais prximo possvel

    daqueles oferecidos aos indivduos considerados normais. A chamada Educao

    Especial consolida-se, portanto e de acordo com a referida autora, seguindo uma

    ordem paralela formao e constituio de mundo e, acima de tudo, de ser

    humano, conforme assevera:

    Inicialmente evidenciada uma primeira fase, marcada pela negligncia, na era pr-crist, em que havia uma ausncia total de atendimento. Os deficientes eram abandonados, perseguidos e eliminados devido s suas condies atpicas, e a sociedade

  • 11

    legitimava essas aes como sendo normais. Na era crist, segundo Pessotti (1984), o tratamento variava segundo as concepes de caridade ou castigo predominantes na comunidade em que o deficiente estava inserido.

    Num outro estgio, nos sculos XVIII e meados do sculo XIX, encontra-se a fase de institucionalizao, em que os indivduos que apresentavam deficincia eram segregados e protegidos em instituies residenciais. O terceiro estgio marcado, j no final do sculo XIX e meados do sculo XX, pelo desenvolvimento de escolas e/ou classes especiais em escolas pblicas, visando oferecer pessoa deficiente uma educao parte. No quarto estgio, no final do sculo XX, por volta da dcada de 70, observa-se um movimento de integrao social dos indivduos que apresentavam deficincia, cujo objetivo era integr-los em ambientes escolares, o mais prximo

    possvel daqueles oferecidos pessoa normal. (MIRANDA, 2003. p 2)

    Depreende-se da, que a efetivao das chamadas polticas de incluso escolar

    relativamente recente, haja vista que os esforos, segundo observa Miranda (2003),

    para integrao de pessoas com necessidades especiais em ambientes escolares

    ofertados pessoas consideradas normais, vo se sistematizar formalmente por

    volta da dcada de 1970, no chamado movimento de integrao social dos

    indivduos que apresentam deficincia.

    Como precursores da Educao Especial, Miranda (2003) destaca trs autores:

    Jean Marc Itard (1774-1838), primeiro a sistematizar um mtodo para educao de

    deficientes; Edward Seguin (1812-1880), que influenciado por Itard, desenvolveu

    varias estudos e mtodos para educar os chamados deficientes chegando a criar

    uma escola para educao especial (atualmente conhecida como Associao

    Americana sobre Retardamento Mental - AAMR). e mais contempornea Maria

    Montessori (1870-1956), influenciada por ambos, contribuiu enormemente com a sua

    metodologia baseada na manipulao de objetos concretos como blocos, recortes,

    peas coloridas etc.

    Destaca-se o fato de todos esses autores desenvolveram uma metodologia pautada

    na concepo de deficincia como patologia, ou seja, como algo a ser curado.

    Entretanto, no podemos olvidar a contribuio dos mesmos para o

    desenvolvimento da educao dos chamados deficientes no contemplados pelo

    sistema educacional padronizado em um homem normal. Ainda mais quando

    levamos em considerao que em determinado momento os mesmos chegaram a

  • 12

    serem simplesmente ignorados ou extirpados da vivencia no s educacional, mas

    social tambm.

    2.2 BRASIL NO CONTEXTO MUNDIAL DA EDUCAO INCLUSIVA

    No Brasil, os estudos e polticas sociais voltadas para a educao especial no se

    consegue identificar traos dos quatro perodos distintos elencados por Miranda

    (2003), no que se refere educao especial em outros lugares do mundo como

    Europa ou Amrica do Norte. Essa no identificao se justifica, conforme aponta a

    referida autora, sobretudo pela nossa constituio histrica de colnia e as

    dificuldades dela resultantes tanto no mbito social como econmico. Vide o fato,

    por exemplo, de o Brasil ser um dos ltimos a abolir a escravatura. H tambm uma

    enorme dificuldade em relao documentao bibliogrfica para o estudo dessa

    temtica.

    A fase da negligncia ou omisso, que pode ser observada em outros pases at o sculo XVII, no Brasil pode ser estendida at o incio da dcada de 50. Segundo Mendes (1995), durante esse tempo, observamos que a produo terica referente deficincia mental esteve restrita aos meios acadmicos, com escassas ofertas de atendimento educacional para os deficientes mentais. (...) Entre os sculos XVIII e XIX podemos identificar a fase da institucionalizao em outros pases do mundo, marcada pela concepo organicista, que tinha como pressuposto a ideia de a deficincia mental ser hereditria com evidncias de degenerescncia da espcie. Assim a segregao era considerada a melhor forma para combater a ameaa representada por essa populao. Nesta mesma ocasio, no nosso pas, no existia nenhum interesse pela educao das pessoas consideradas idiotas e imbecis, persistindo, deste modo, a era da negligncia (MENDES,

    1995; DECHICHI, 2001, citados por MIRANDA, 2003. p 3)

    Fica evidente o atraso do Brasil em termos de educao especial quando voltamos

    nossos olhos para outros lugares. Nesse aspecto, Miranda (2003), ainda destaca

    outra caracterstica importante na histria da educao especial no Brasil, que a

    relao entre a essa modalidade educacional e os constantes equvocos polticos e

    descasos polticos, que no priorizam investimentos na rea social, sob a ideolgica

    alegao de economia de dinheiro do Estado. Conforme enfatiza a referida autora,

    essa ausncia de investimentos nas polticas da educao especial so histricas no

    Brasil, manicmios ou penitenciarias eram depsitos para esses excludos sociais

  • 13

    e, ambos, tinham um custeio do qual o Estado no achava interessante em manter,

    visto que, esses indivduos eram considerados deficientes e desnecessrios para a

    sociedade, ou seja, colocados margem da sociedade.

    Mesmo com tais denncias, no podemos deixar de registrar esforos pontuais e

    isolados rumo ao atendimento educacional dos chamados deficientes, embora

    sendo os mesmos entendidos doentes, conforme se observa no excerto abaixo:

    Mendes (2006) fala que desde o sculo XVI a histria da educao no Brasil vem sendo traada. Mdicos e pedagogos daquela poca j comeavam a acreditar na possibilidade de educar os indivduos considerados ineducveis. Entretanto, naquele momento, o cuidado era meramente assistencialista e institucionalizado, por meio de asilos e manicmios.

    No perodo Imperial iniciou-se o tratamento de doentes mentais em Hospitais psiquitricos. Os institutos tiravam e isolavam surdos e cegos do convvio social, sendo que estes no necessitavam de tal isolamento. Comearam, neste perodo, tratamentos no Hospital psiquitrico da Bahia, em 1874. Embora, de forma lenta, aps a proclamao da repblica, a educao especial foi se expandindo; em 1903 Pavilho Bournevile, no Hospital D. Pedro II (Bahia) foi instalado para tratamento de doentes mentais; em 1923 foi criado o Pavilho de Menores do Hospital do Juqueri e o Instituto Petallozzi de Canoas, em 1927(BUENO, 1993, citado por DOTA e ALVES, 2007, p.4)

    Na maioria dos estudos com abordagem na Educao Especial do Brasil,

    encontramos referncias na criao do Imperial Instituto dos Meninos Cegos e do

    Instituto dos Surdos-mudos, na cidade do Rio de Janeiro, como o marco dos estudos

    em relao a essa modalidade de educao em nosso pas. As pesquisas e

    estudos tambm apontam que o atendimento dos denominados deficientes visuais

    tambm ganham maiores enfoques com a criao dos Institutos de Cegos do Recife,

    da Bahia, de So Rafael (Taubat SP), de Santa Luzia (Porto Alegre RS), do

    Cear (Fortaleza), da Paraba (Joo Pessoa), do Paran (Curitiba) e os Institutos

    Padre Chico, em So Paulo e o Sodalcio da Sacra Famlia, no Rio de Janeiro, em

    1929, alm, tambm, da Unio dos Cegos do Brasil, no Rio de Janeiro, em 1924.

    Outro passo considerado importante no contexto da educao especial foi criao

    da inspeo-mdica-escolar, ocorrida no ano de 1911, onde uma vez identificados

    os alunos com deficincia, os mesmos eram encaminhados para classes especiais.

  • 14

    Com tais medidas, tambm comea a surgir demanda por profissionais

    capacitados para atender a esse tipo de alunado.

    Conforme enfatizam DOTA e ALVES (2007), a segunda metade do sculo XX, no

    Brasil, marcada por avanos na educao especial com investimentos tanto no

    setor pblico quanto no privado. marco tambm desse perodo histrico um

    enorme avano nos estudos, formao de professores e debates acerca de polticas

    pblicas no mbito nacional para a educao especial, incentivado pelo prprio

    crescimento de escolarizao do Brasil na poca. Destaca-se, nesse cenrio, a

    criao do Centro Nacional de Educao Especial CENESP, junto ao Ministrio da

    Educao, no ano de 1973, que d incio formao de grupos ou comits de

    estudos e criao polticas educacionais para deficientes e a tomada de

    responsabilidade da educao especial pela Secretaria Nacional de Educao

    Bsica em 1990. Trata-se da concretizao do que j estava previsto na

    Constituio de 1988, onde, em seu artigo 208, estabelece a integrao escolar

    enquanto preceito constitucional, com a integrao do aluno com necessidades

    especiais na escola pblica regular.

    Destaca-se, como fator de extrema relevncia em mbito mundial, e com

    repercusses no Brasil, que na dcada 1990 realiza-se a Conferncia Mundial sobre

    Necessidades Educacionais Especiais, ocorrida no ano de 1994, em Salamanca, na

    Espanha. Promovida pelo Governo da Espanha, tal conferncia foi um marco no

    processo de difuso e de formao de polticas para a educao especial, sobretudo

    pelo principal produto que a mesma deu origem, a Declarao de Salamanca. Um

    documento criado e debatido por membros de todos os pases participantes em que

    eram estabelecidas metas e obrigaes a serem cumpridas pelos pases que a

    assinassem. Vale aqui ento expor algumas das partes importantes dessa

    declarao, que vo repercutir diretamente, entre outros fatores, na educao

    especial. So elas:

    Toda criana tem direito fundamental educao, e deve ser dada a

    oportunidade de atingir e manter o nvel adequado de aprendizagem,

    Toda criana possui caractersticas, interesses, habilidades e necessidades de

    aprendizagem que so nicas,

  • 15

    Sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais

    deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta

    diversidade de tais caractersticas e necessidades,

    Aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso escola

    regular, que deveria acomod-los dentro de uma Pedagogia centrada na

    criana, capaz de satisfazer a tais necessidades,

    Escolas regulares que possuam tal orientao inclusiva constituem os meios

    mais eficazes de combater atitudes discriminatrias criando-se comunidades

    acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcanando educao

    para todos; alm disso, tais escolas proveem uma educao efetiva maioria

    das crianas e aprimoram a eficincia e, em ltima instncia, o custo da

    eficcia de todo o sistema educacional.

    Vale aqui destacar que a Declarao de Salamanca, ao reconhecer que todos ns

    somos nicos, contribuir para romper com o ideal de homem normal, com a ideia

    que existem pessoas deficientes. Ideias que, conforme discutido anteriormente,

    tem sido impostas e difundidas hegemonicamente, no apenas no Brasil, mas no

    mundo e, assim, vem se consolidando como responsveis pelo afastamento de

    inmeros grupos e indivduos do bem estar social, da educao e da vida. O mesmo

    documento indica que dever da escola, portanto, promover a completa insero de

    todas essas singularidades na escola e no ensino, a fim de promover a educao de

    todos.

    lamentvel e evidente que tais medidas assinadas no foram completamente

    atendidas e implementadas, e, portanto, ainda no se conseguiu atingir e atender a

    todos os que no se enquadram no padro de normal, que ainda persiste. No

    entanto, inegvel que ter respaldo em lei sumariamente imprescritvel para a

    criao de um mundo e uma escola mais justa e que contemple todas as

    necessidades e singularidades de todos os membros da sociedade.

    Resultante disso no Brasil temos em dezembro de 1996, a publicao da Lei de

    Diretrizes e Bases da Educao Nacional 9.394/96. Na referida LDB, fica explcita a

    inteno e a recomendao de aumentar o contingente de alunos com necessidade

    especial nas escolas, ampliando o nmero de ofertas e a capacitao e formao de

    professores e outros profissionais para a rea.

  • 16

    Tratam-se de conquistas que, embora lentas sinalizam por considerveis avanos.

    No entanto, entre o previsto e o executado existem distncias que requerem

    investigaes e proposies. Nesse cenrio que buscamos inserir a presente

    investigao.

    2.3 NOVOS OLHARES SOBRE A EDUCAO ESPECIAL: O PARADIGMA

    INCLUSO E INTEGRAO

    Conforme discutido anteriormente, no Brasil e no mundo os anos de 1990 foram

    marcados por significativos avanos em termos de educao e de concepo de

    ensino especial. Todavia a histria da sociedade humana pautada por conflitos

    no apenas fsicos, mas de ideias. A todo o momento a dimenso do que so as

    coisas e do que elas representam so criadas e refutadas. A educao e o ensino

    no fogem desse processo complexo de criao e de recriao de pensamento. No

    obstante, podemos afirmar que a dcada de 1990 caracteriza um perodo em que se

    comea a intensificar os debates em torno da ideia de incluso. Os excludos do

    convvio escolar, agora comeam a dividir o mesmo ambiente dos considerados

    no deficientes ou normais. A questo crucial que nesse cenrio se incluam,

    tambm, os debates acerca de simplesmente colocar esses alunos com

    necessidades especiais na escola regular, se torna suficiente e eficiente para uma

    real incluso. H que se considerar alternativas capazes de faz-los partes do

    mesmo ambiente, rompendo com o equvoco de apenas colocarmos de maneira

    irresponsvel no ambiente escolar, o que seria uma prtica de incluso excludente.

    Pertinente aqui as lies de Boaventura Souza Santos ao enfatizar que ... temos o

    direito a ser iguais quando a nossa diferena nos inferioriza; e temos o direito a ser

    diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. (SANTOS, Boaventura de

    Sousa. Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitanismo multicultural.

    Introduo: para ampliar o cnone do reconhecimento, da diferena e da igualdade.

    Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2003: 56).

    No Brasil, de uma maneira geral e, conforme preconizam Borges e Aquino (2012),

    podemos entender os princpios filosficos da educao especial em trs grandes

    momentos. Ou mais precisamente trs propostas tericas: a) o da normatizao em

    1950; b), o da integrao em 1970; e, e c), o da incluso 1975. Todas as trs

  • 17

    propostas tm como ideia original ou propostas adeso ou incluso dos excludos,

    porm enxergam a forma dessa incluso, o conceito de excludo e o resultado da

    mesma, de formas diferentes.

    Na proposta da normatizao encontramos o ideal de cura ou mitigao do aluno

    com necessidades especiais a fim de torn-lo normal e apto para a integrao

    sociedade. Esta base filosfica teve curta durao de tempo na histria da educao

    inclusiva brasileira2, tendo sido sucedida pela proposta da integrao que fruto das

    maiores crticas atuais.

    De incio deve se ressaltar que embora aparentemente integrao e incluso tenham

    significados parecidos, dentro do debate da educao especial, so usados para

    denominar maneiras diferentes da concepo do que realmente a insero plena

    do aluno com necessidades especiais na escola, conforme enfatiza Mantoan (1997):

    O princpio de integrao teve sua divulgao no Brasil depois dos anos setenta. O termo nasceu nos pases escandinavos, precisamente na Dinamarca, mas se desenvolveu nos Estados Unidos. Em seguida, o Canad juntou-se ao movimento, idealizado para atender os objetivos da corrente integracionista em defesa dos alunos com alguma deficincia ou com dificuldades especficas na aprendizagem. (p.8).

    E, buscando elucidar a sua posio, recorre metfora da cascata, afirmando que a:

    [...] integrao escolar, cuja metfora o sistema de cascata, uma forma condicional de insero em que vai depender do aluno, ou seja, do nvel de sua capacidade de adaptao s opes do sistema escolar, a sua integrao, seja em uma sala regular, uma classe especial, ou mesmo em instituies especializadas. Trata-se de uma alternativa em que tudo se mantm, nada se questiona do esquema

    em vigor. (MANTOAN, 1997, 8)

    Em sntese, segundo este princpio o aluno com necessidades especiais passa a ser

    integrado ao ambiente escolar sendo aceita a ideia de que o mesmo tem

    necessidades nicas de aprendizado. Entretanto, o referido princpio, em sua

    essncia, no prev uma incluso plena do aluno, visto que o mesmo fica apenas

    em alguns momentos em uma sala com outros alunos no diagnosticados com

    necessidades especiais. Na maior parte do tempo o aluno fica em uma sala

    2 . Importante registrar, no entanto, que certos conceitos como o de patologia e, portanto, de cura

    dos que so diferentes ainda persistam mesmo que de forma mascarada na educao especial.

  • 18

    especial onde recebe contedo diferenciado dos demais alunos ou tem em outra

    instituio a responsabilidade de ensino/aprendizado. Nesse caso a escola passa a

    ser tomada apenas como um ambiente de socializao daquele que teoricamente

    no est na sociedade.

    Como contraponto ao princpio da integrao, a proposta pautada no princpio da

    incluso surge como base terica para uma insero plena dos alunos com

    necessidades especiais. Sua gnese se fundamenta principalmente na enorme

    evaso desses alunos e/ou pela passagem dos mesmos pelo ensino pblico. Nessa

    passagem, sem uma formao escolar reconhecidamente formada e concretizada,

    muitos so empurrados pelos anos de ensino at abandonarem a escola ou,

    mesmo, serem covardemente aprovados sem ao menos terem sido efetivamente

    alfabetizados. Analisando, de uma maneira geral, a proposta da educao inclusiva

    que fundamenta as principais polticas e propostas na atualidade, Borges e Aquino

    (2012), entendem a sua origem da seguinte forma:

    A chamada educao inclusiva teve incio nos Estados Unidos em 1975. Surge como uma reao contrria s polticas integracionistas cujo significado bem como a efetivao da sua prtica trouxe muita discusso e polmica. Trata-se de uma nova expresso que vem fazer da integrao uma obrigao de todos: a incluso, que significa que a resposta s necessidades pedaggicas de todos os alunos se faa no mesmo contexto atravs de atividades comuns, embora adaptadas. (SAPON SHEIN, 1992: FRIEND e BURSUCK, 1996, apud SAINT-LAURENT. 1997, p. 68). Esse paradigma chegou ao Brasil na dcada de 90. (p. 4)

    O que se verifica que essa proposta de educao inclusiva apresenta crticas

    proposta de integrao em diversos pontos... Destaca-se, entre os aspectos

    criticados o que se refere concepo do que venha ser desigualdade e deficincia.

    Este , sem dvida, um interessante ponto de partida para se entender de que tipo

    de incluso, a proposta inclusiva se refere. Nesse sentido, na incluso entende-se

    que deficincia diz respeito a uma necessidade biolgica, que provoca

    desigualdades sociais. Isso evidencia o enorme fator de diferenciao em uma sala

    de aula. Podemos ter alunos com baixa viso e de origem segregada ou de risco

    social e econmico com necessidades nicas de aprendizado em relao a alunos

    sem essas caractersticas. Entretanto na proposta inclusiva at mesmo esses dois

  • 19

    alunos entre si, tero necessidades nicas de aprendizado mesmo tendo duas

    caractersticas em relao deficincia e desigualdade. Na incluso so as

    diferenas que os unem, conforme enfatizam Borges e Aquino (2012):

    Destarte, se antes a integrao defendia o discurso da igualdade abstrata entre os homens, afirmando que todos so iguais, agora, o princpio da incluso afirma que todos ns somos diferentes, e por isso, devemos permanecer juntos. Dessa forma, somos igualados agora, pela diferena. Assim, somos agora igualados pela diferena e pela desigualdade, pois, o que temos de comum ou de igual a evidente constatao de que todos ns somos diferentes. (p.6)

    Mais do que isso para a proposta inclusiva o aluno com necessidades especiais no

    est em inrcia na sociedade. Conceber essa ideia acreditar que o mesmo est

    fora de um padro de normalidade. H que se considerar que, das mais variadas

    formas, esse indivduo est na sociedade se relacionando de alguma maneira, pois

    a pluralidade do ser uma caracterstica da sociedade nessa proposta, conforme

    verificado por Fernandes (1995) e referenciado por Borges e Aquino (2012), em

    pesquisa realizada no intuito de conhecer a concepo dominante de professores

    que atuam na rea, a respeito da integrao das pessoas com necessidades

    educativas especiais. Em tal pesquisa foi constatado que:

    ...existem diversos pontos de vista sobre a integrao, mas que preciso identificar os mecanismos gerados na sociedade capitalista, que reforam a ideia de que as pessoas com necessidades educativas especiais no esto integradas na sociedade. Afirma que a integrao no deve implicar em tirar a pessoa do estado de no participao e/ou do estado de inrcia, pois, na verdade, essas pessoas nunca estiveram fora da sociedade. A sociedade capitalista, que se preocupa com o valor da troca de mercadoria, que define que todos tm um papel definido dentro dessa mesma sociedade. Nessa perspectiva, o princpio de integrao deseja inserir os indivduos com necessidades educativas especiais na sociedade, de onde, porm, eles nunca estiveram fora. (FERNANDES, 1995, citado por BORGES e AQUINO, 2012, p.3).

    Todavia no podemos fechar os olhos para situao atual da educao e suas

    possibilidades e dificuldades. evidente diante de um esforo reflexivo que a escola

    deva incluir todos os alunos e suas necessidades especiais em seu ambiente

    escolar sem causar constrangimento ou segregao, mas clara a dificuldade que

    escola passa para ensinar at mesmo os que so enquadrados como normais e

    dos quais o prprio sistema hegemnico de ensino e cultural j est preparado para

  • 20

    absorver. Mas a crtica a proposta da integrao deve ser mantida, visto posto que a

    mesma tenta mascarar a realidade da excluso na atual sociedade que continua a

    excluir at mesmo quando inclui. Mais do que apenas inserir tais indivduos no meio

    educacional, tido como normal, mascarando tal insero com a alegao de se estar

    integrando-os. H que se cuidar para, uma vez inseridos, tenham condies de

    equitativas de se desenvolverem intelecto e socialmente, interagindo e aprendendo

    em condies de igualdade com os demais sujeitos do processo.

    Reportamo-nos aqui aos ensinamentos de Hannah Arendt (2004), para explicitarmos

    a heterogeneidade dos seres humanos e a complexidade das relaes sociais, no

    intuito de reafirmar que, na educao de maneira bastante especfica, deve-se

    conceber que o que nos une exatamente as diferenas:

    ...cada homem singular, de sorte que, a cada nascimento, vem ao mundo algo singularmente novo. (...) Se a ao, como incio, corresponde ao fato do nascimento, se a efetivao da condio humanada da natalidade, o discurso corresponde ao fato da distino e a efetivao da condio humana da pluralidade, isto , do viver como ser distinto e singular entre iguais. (ARENDT, 2004, p. 191).

    Depreende-se da que o que nos torna iguais, em sociedade, exatamente o fato de

    sermos diferentes. Assim como existem as singularidades entre os seres

    provocando uma enorme heterogeneidade social, tambm heterogneas so as

    chamadas deficincias que atribuem aos sujeitos no considerados normais, as

    caractersticas de sujeitos com condies especiais, sob as quais gravitam as

    propostas de incluso. Dentre tais caractersticas comumente se elencam indivduos

    com deficincias ou restries visuais, auditivas, motoras. Especificamente no que

    se refere s limitaes visuais, via de regra, considera-se o percentual da

    capacidade e viso dos sujeitos. O daltonismo no tem sido considerado nesse

    sentido, embora sua incidncia influencie e afeta diretamente na aprendizagem

    daqueles que possuem tais traos...

  • 21

    2.4 O DESAFIO EDUCAO ESPECIAL: DALTONISMO E O ENSINO DE

    GEOGRAFIA COMO EXEMPLO DAS SINGULARIDADES DA EDUCAO NA

    ATUALIDADE

    Nessa breve anlise histrica e conceitual sobre a educao especial buscamos

    evidenciar que inmeras so as dificuldades e, por que no, possibilidades que

    surgiram ao longo do desenvolvimento da sociedade atual no que diz respeito a

    educao especial.

    Dentro de todas essas complexidades que envolvem a escola e o desafio da mesma

    em abranger as singularidades dos alunos, vamos tomar como objeto de anlise o

    Daltonismo. Nossa inteno entender como uma caracterstica como essa, to

    desconhecida e ao mesmo tempo to presente entre os cidados, tem sido ou pode

    vir a ser tratada nas escolas.

    De imediato, j ressaltamos o baixo nmero de estudos relacionados ao Daltonismo

    na educao e nas possveis adaptaes e/ou modificaes nos currculos.

    Portanto, nosso trabalho busca acima de tudo fomentar a pesquisa em torno dessa

    caracterstica sem ter a presuno de criar ou inventar solues para o problema

    atual dos indivduos com essa caracterstica na educao. Nossa pretenso gravita

    em torno de contribuir, ainda que minimamente, com reflexes acerca de

    possibilidades de ensino e incluso do aluno Daltnico na escola regular de ensino.

    Registra-se a enorme dificuldade para se encontrar trabalhos relacionados ao

    Daltonismo no ensino, de forma geral e, ainda mais acentuada de forma especfica

    no ensino da Geografia. A questo que os daltnicos, assim como outras

    singularidades que ocorrem em escala relativamente pequena, ficam de fora do Big

    Picture dos debates acadmicos e, consequentemente, so excludos na

    fomentao de polticas no currculo de ensino. Portanto a reflexo aqui vale

    tambm para ressaltar essa imensa quantidade de singularidades educacionais que

    no tem sido contempladas, nem mesmo por aqueles que esto se dedicando

    temtica da incluso na escola. No fica aqui a crtica pela crtica, entendem-se os

    avanos mesmo em um cenrio de profunda contrariedade e complexidade, mas

    importante ressaltar os enormes desafios que ainda temos para uma escola e um

    ensino to plural quanto os alunos que nela esto.

  • 22

    2.4.1 CONSIDERAES A CERCA DO DALTONISMO

    Conforme j amplamente ressaltado anteriormente, embora no conhecido e

    considerado nas pesquisas e produes educacionais, o Daltonismo est presente

    de forma relativamente importante na populao.

    O daltonismo a incapacidade de distino e/ou identificao de cores que afeta cerca de 10% da populao mundial, onde 98% dos casos ocorrem em pessoas do gnero masculino. uma deficincia basicamente congnita que ocorre nas clulas fotossensoras (cones) do aparelho ptico humano. Os portadores apresentam dificuldade com as cores-luz primrias (vermelho, verde e azul), podendo prejudicar a visualizao de todo o espectro luminoso. O tipo mais comum a incapacidade de distino entre o vermelho e o verde. Porm, o daltonismo pode apresentar-se em diversos nveis, passando por uma leve confuso de matizes, at a completa

    cegueira de cores (NEIVA, 2008, citado por MAIA e SPINILLO, 2013, s/p.)

    Tal incapacidade de diferenciao de cores responsvel por uma srie de

    problemas quando pensamos em um mundo em que no efetivamente preparado

    para o Daltnico, conforme bem enfatizam Maia e Spinillo:

    A inabilidade de percepo de cores, segundo Kuppers pode causar fortes problemas qualidade de vida dos daltnicos, considerando que, 80% das informaes recebidas diariamente so obtidas atravs do canal visual, e delas, 40% referem-se cor. (2013, s/p).

    Sendo ainda mais preciso sobre a maneira de como o Daltonismo se manifesta, os

    referidos autores nos esclarecem que:

    De acordo com Farina, Rodrigues e Filho basicamente, o daltonismo caracteriza-se pela ausncia ou insuficincia das clulas fotossensoras da retina, responsveis pela viso de cores. Estas clulas se dividem em trs tipos, caracterizando a taxonomia da deficincia que Neiva define como:

    deficincia ou ausncia de cones responsveis pela percepo da cor vermelha.

    cones responsveis pela percepo da cor verde.

    s responsveis pela percepo da cor azul ou amarela. (MAIA e SPINILLO, 2013, s/p)

  • 23

    No Brasil, o estudo do IBGE (2005) revelou que 16,6 milhes de pessoas possuem

    algum grau de deficincia visual. E, destas, quase 150 mil so cegas por completo.

    Em mdia 10% da populao caracterizam-se por serem daltnicas, mais

    precisamente, um a cada 20 homens so portadores de daltonismo.

    Conforme Neiva (2008), citado por Maia e Spinillo (2013), em escala global estima-

    se que existam cerca de 600 milhes de pessoas no mundo com essa. Portanto h

    sim um considervel contingente de pessoas com Daltonismo na sociedade e,

    consequentemente, na escola, o que torna a aparente no preocupao com essa

    caracterstica mais preocupante.

    Aparentemente a incapacidade de diferenciar e/ou enxergar cores pode parecer um

    desvio leve de normalidade, mas como aqui j exposto, vivemos em um mundo onde

    tudo projetado para o normal, no caso, aquele que enxerga cores perfeitamente.

    Inmeras situaes podem ser expostas para demonstrar tais dificuldades como:

    interpretao de sinais de transito, placas e anncios das mais variadas finalidades

    ou at mesmo o simples ato de se vestir, visto que as cores e suas combinaes

    possuem na formao cultural e social, simbologias presentes em sua mistura e

    combinaes.

    2.4.2 DALTONISMO E O ENSINO DE GEOGRAFIA: UM MAPA QUE ENXERGUE

    AS DIFERENAS

    A cincia Geografia caracterizada por ter um vasto campo de conhecimento como

    objeto de pesquisa: o Espao. Definir o mesmo um trabalho rduo e que se

    estende por toda a vida do gegrafo e da prpria Geografia. Para se estudar o

    espao necessrio visualiz-lo, entende-lo e decifr-lo em toda sua complexidade,

    para tal, o gegrafo utiliza-se de diversos elementos de pesquisa e anlise. Um dos

    mais conhecidos e importantes so os mapas e, portanto ser um dos enfoques de

    analise para a incluso do aluno Daltnico, adotado pela presente pesquisa.

    Mapas so representaes do espao que podem ser nas mais variadas formas.

    Entretanto em sua grande maioria so representaes grficas que requerem uma

    capacidade visual completa. No se olvida aqui o enorme esforo que vem sendo

  • 24

    realizado na adaptao do uso e fabricao de mapas para deficientes visuais como

    os que j utilizam braile e outras formas de representao que se apropriam de

    outras capacidades sensoriais que no a viso. Todavia inegvel a quantidade

    nfima em que esses mapas so produzidos quando comparados aos que requerem

    a utilizao da viso considerada completa. Isso de deve em muito pelo fato de,

    como j discutido anteriormente, o prprio mundo pautado na normalidade visual

    exigir mapas para no portadores de necessidades especiais, ou seja, os normais

    visualmente.

    Se o nmero de mapas para deficientes visuais pequeno, para os daltnicos que

    so uma minoria dentro da minoria so ainda mais escassos e raros o nmero de

    mapas que contemple essa caracterstica. Isso, sem dvida, dificulta e muito o

    trabalho do professor de Geografia, que conta com alunos daltnicos em suas

    respectivas salas de aula. Nesse contexto podemos afirmar que trabalhar Geografia

    e mais precisamente mapas com alunos Daltnicos uma tarefa extremamente

    difcil.

    As realidades das escolas pblicas e privadas so repletas de contradies e, no

    obstante o advento da incluso nas polticas e diretrizes de ensino, ainda temos o

    aluno com necessidades especiais como aquele que deve se adaptar ao ensino.

    No caso especfico do aluno daltnico teria que se adequar ao mapa com cores e as

    utilizaes das mesmas e, por mais difcil que seja pensar nisso exatamente o que

    acontece. Embora tal adequao venha sendo, de uma forma ou de outra, realizada

    pelos alunos daltnicos, isso no nos exime, enquanto educadores da necessidade

    de fazermos crtica incapacidade do ensino em abranger tal necessidade at

    porque, ele no ocorre, evidentemente, de forma plena e ideal.

    Salienta-se, de imediato, que o uso e a conceituao de uma proposta de mapa por

    si s j exigiria uma pesquisa ampla e polemica. Portanto, reafirmamos que no

    temos a pretenso de propor objetivamente um mapa ideal. Trata-se de um trabalho

    de esforo de analise, de tentativa e erro, com a inteno de servir como ponto de

    crticas e apoio para outras possibilidades. Acreditamos que dentro de um contexto

    de poucos estudos a simples analise do cenrio atual mesmo que em uma escala

    no to abrangente pode ser vital para uma possvel incluso desses alunos ou de

  • 25

    em um futuro prximo de uma nova cartografia, mais abrangente no que diz

    respeito s singularidades dos que usam e produzem mapas.

    Mapas tm por objetivo representar a realidade, portanto visualizar um aluno

    utilizando um mapa indicado como representao da realidade, mas que esse

    mesmo aluno no consegue utiliz-lo uma clara demonstrao da excluso dentro

    do ensino de Geografia. Talvez este mesmo aluno se faa a pergunta: Que realidade

    essa do mapa da qual fao parte, mas que no consigo ver?

    Seria o aluno que no consegue ver a realidade ou a realidade que no capaz de

    ver o aluno?

    Nesse sentido a escolha por uma pesquisa emprica para detectar a complexa

    relao de adaptao, se e como ocorre do aluno Daltnico na escola, to

    importante. Nas entrevistas e nas visitas que realizamos a duas escolas, tidas como

    campo emprico da presente pesquisa, tivemos a oportunidade de ter contatos com

    mais do que dados, mas a histrias vivas de toda contradio terica aqui exposta.

    As histrias relatadas nas entrevistas tm esse objetivo, mostrar os desafios e as

    potencialidades presentes no cenrio atual da educao.

    3. PERCURSO METODOLGICO DE IDENTIFICAO DOS ALUNOS

    DALTNICOS: MAPEANDO O DALTONISMO

    Conforme discutido no captulo anterior, o daltonismo no raro entre os cidados

    e, especificamente no que se refere ao processo de ensino aprendizagem, acaba

    influenciando tanto na efetivao da aprendizagem dos estudantes, quanto tambm

    numa espcie de excluso dos alunos daltnicos. Excluso, no sentido de se tratar

    de um elemento que influencia no processo de aprendizagem e que, no obstante

    as polticas de educao inclusiva, no so consideradas nesse contexto.

    Assim, torna-se relevante o esforo no sentido de propiciar aos educadores

    mecanismos que possam contribuir para a identificao da presena de alunos

    daltnicos em suas respectivas salas de aulas e, consequentemente, se pensar em

    alternativas didticas de ensino que propiciem a incluso de tais alunos, com

  • 26

    equidade das possibilidades de aprendizagem; ou, ao menos, mitiguem as lacunas

    existentes.

    Neste sentido, objetivo do presente captulo, apresentar uma alternativa simples e

    eficaz na identificao da presena de alunos daltnicos nas salas de aulas.

    Apresentaremos, tambm, os passos seguidos na aplicao de tal alternativa,

    efetivada como procedimento metodolgico da presente pesquisa, em uma escola

    da rede pblica estadual de ensino do Esprito Santo, bem como uma escola de rede

    pblica municipal de Vitria. E ainda, identificados alunos daltnicos, procedemos

    realizao de entrevistas com os mesmos, no intuito de coletar informaes relativas

    interferncia dessas caractersticas no processo ensino-aprendizagem, na

    concepo de tais estudantes.

    Para a identificao dos alunos daltnicos, optamos por utilizar a metodologia de aplicao do teste de Ishihara3.

    Essa opo se justifica pelo fato de se tratar de um teste simples de ser aplicado,

    rpido e de fcil acesso, pois em diversos sites da internet possvel encontr-lo. O

    teste consiste em vrios crculos coloridos onde em cada crculo, existe um nmero,

    ou um smbolo. Quem possui viso normal, conseguir rapidamente identificar o

    nmero dentro do crculo, quem for daltnico ter dificuldade ou no enxergar

    nmero algum. Vale ressaltar que os testes identifica um aluno daltnico, e tambm

    o grau do daltonismo, relacionado quantidade e quais cores o daltnico tem

    dificuldade ou impossibilidade de identificar.

    Neste trabalho, optamos apenas por classificar os alunos como daltnicos ou de

    viso normal, uma vez que para lidarmos com os mais diversos tipos de daltonismo

    fugiria da proposta central do projeto, e, ao obtermos os resultados das entrevistas,

    visamos que independente do grau de daltonismo, os alunos tendem a ter as

    mesmas dificuldades no processo de ensino-aprendizagem. Vale, ainda, explicitar

    que nosso objetivo no o de traar um perfil clnico do daltonismo, o que exigiria

    um estudo com profissionais da rea. Nosso intuito o de encontrar sinais de

    daltonismo e, em consequncia, pensar alternativas de ensino.

    3 O nome Ishihara devido ao Dr. Shinobu Ishihara (1879-1963), professor da Universidade de

    Tquio, criador do teste em 1917.

  • 27

    O teste de Ishihara ento foi adaptado pelos integrantes do grupo de modo a

    simplificar sua apresentao e aplicao nas escolas, visto que se trata de um teste

    relativamente rpido, de fcil entendimento e efetivo no que diz respeito

    identificao dos alunos. Esse foi o nosso primeiro desafio.

    O teste adaptado ento se constitui em nove crculos, todos contendo uma

    numerao, inclusive um crculo de controle, onde todos os alunos de viso normal

    ou daltnicos conseguem enxergar o nmero ali existente. Assim, poderamos

    identificar e descartar o aluno que de certa forma omitisse ou colocasse um nmero

    diferente do correspondente ao crculo. As respostas deveriam ser registradas em

    pequenas tiras de papel, contendo o nome do aluno, a srie em que se encontra

    matriculado e as respectivas respostas, onde, em um espao pr-estabelecido, os

    alunos apenas anotavam a numerao dos crculos correspondente.

  • 28

    Modelo de Teste de Ishihara adaptado e Carto Resposta.

    Buscando evitar falhas na identificao de alunos daltnicos e, considerando as

    adaptaes efetuadas no teste de Ishihara e, ainda, considerando que um dos

    integrantes do grupo de pesquisa daltnico, o mesmo foi previamente aplicado ao

    referido integrante, que no participou de sua confeco para no haver incoerncia

  • 29

    com as respostas. O resultado foi positivo, uma vez que o integrante do grupo

    conseguiu acertar apenas os crculos 2 e 5.

    Reafirmamos, mais uma vez, que o teste identifica caractersticas de daltonismo.

    Porm, para as pessoas serem de fato diagnosticadas como tendo essa

    caracterstica, necessrio um laudo profissional da rea mdica especfica.

    Aps a definio do teste de Ishihara como a ferramenta de identificao dos alunos

    daltnicos, nosso prximo desafio foi o de encontrar escolas parceiras que se

    dispusessem a participar de nossa investigao, autorizando a aplicao do mesmo

    em seus alunos. Aceitaram o desafio e foram nossas parceiras as seguintes escolas:

    a escola EMEF Otto Ewald Junior, e a escola a EEEM Godofredo Schneider.

    Relataremos o contato com as escolas parceiras e a experincia de identificao

    dos alunos a seguir:

    A escola Otto Ewald Junior, localiza-se na Rua Daniel Abreu Machado, 302, Itarar,

    Vitria. O contato inicial dos pesquisadores com esta escola ocorreu h cerca de um

    ano, quando os integrantes do grupo de pesquisa cursavam a disciplina de

    Educao e Incluso, e, na ocasio, realizaram uma pesquisa com alunos que

    possuem necessidades especiais. Motivou a busca pela referida escola, o fato de

    um dos membros um integrante do Grupo da pesquisa, j ter trabalhado com a

    pedagoga em outra escola da rede de Vitria. Esse fato, sem dvida, facilitou a

    aproximao com a escola. Coincidentemente, naquela ocasio, os pesquisadores

    tambm conheceram a professora de Artes, lotada na referida escola e, aps uma

    conversa informal na sala dos professores, a mesma se identificou com a proposta

    da pesquisa, relatando que em suas aulas percebeu que alguns alunos sentiam

    dificuldade em colorir desenhos. Tendo conhecimento do que o daltonismo, a

    referida professora relatou que j havia aplicado o teste de Ishihara nos alunos,

    onde pode constatar que alguns alunos foram identificados como daltnicos. Assim,

    proposto para o prximo perodo.

    No dia 9 de setembro de 2014 (tera-feira) os componentes do grupo foram

    referida unidade escolar, com o propsito de realizar o primeiro contato com a

    professora parceira. Foi agendado um dia na semana, em uma quinta-feira, onde foi

    combinado com a professora que o teste seria aplicado em todas as salas de aula

    da escola, no intuito de identificar os possveis alunos que seriam daltnicos.

  • 30

    Na quinta-feira, portanto, j com o modelo do teste em mos, o mesmo foi

    efetivamente aplicado em todas as turmas da escola, no turno vespertino. Para

    tanto, contamos com a colaborao dos professores, que tambm receberam muito

    bem o projeto. Inicialmente conversamos com os alunos, explanando sobre o

    daltonismo, e a motivao de estar sendo aplicados os testes com os mesmos. Os

    alunos levantaram questes sobre como fazer o teste e da problemtica dos

    daltnicos ao interpretar um semforo de trnsito. A aplicao dos testes transcorreu

    normalmente, sem nenhum problema grave. No entanto, faz-se necessrio ressaltar

    a probabilidade de acontecerem equvocos no resultado final, uma vez que alguns

    alunos levaram o teste na brincadeira, omitiram informaes ou at mesmo

    rasuraram o carto resposta.

    A tabulao dos resultados da aplicao do teste na referida escola est explcito no

    grfico abaixo:

    A escola a EEEM Godofredo Schneider, fica localizada na Rua Bernad Schneider,

    no centro de Vila Velha. O contato com a referida escola se deu por indicao do

    nosso orientador, que conhece o professor de Geografia atuante na mesma e que se

    disps a contribuir com a efetivao da pesquisa.

    276

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    150

    200

    250

    300

    Testes Aplicados Alunos Daltnicos

    TESTE DE ISHIHARA

  • 31

    Assim, no dia 9 de outubro de 2014 foi feita a visita a EEEM Godofredo Schneider.

    Onde fomos recebidos pelo professor de Geografia, que nos recebeu com

    entusiasmo e nos acompanhou nas 15 salas de aulas, sendo oito turmas de

    segundo ano e sete turmas do terceiro ano do ensino mdio. Nessa visita, o projeto

    e os testes eram explicados aos alunos, e os mesmos, prontamente se dispuseram

    a respond-los.

    Vale aqui registrar que os alunos colaboraram com os trabalhos e tambm fizeram

    bastantes perguntas sobre o daltonismo. No entanto, alguns brincavam e at

    tratavam do fato de ser daltnico de forma pejorativa. Em uma das salas

    possivelmente descobrimos um aluno com daltonismo, visto que ao fazer o teste ele

    falava que no enxergava nada, apenas um nmero. Os colegas ao lado

    comearam, ento, a pegar vrios materiais entre bolsinhas, lpis e canetas e a

    perguntar que cor eram os objetos. Em outra situao entramos numa sala e uma

    aluna copiou o resultado da colega ao lado e percebemos que ela fez isso, avisamos

    ao professor que estava na sala no momento e depois quando estvamos nos

    dirigindo para a outra sala o professor, tambm de geografia, veio dizer que a garota

    daltnica, porm ficou com medo da reao dos amigos descobrirem que ela era

    daltnica.

    So fatos que evidenciam a necessidade de se refletir sobre o daltonismo na

    educao, visto que, lamentavelmente, ser daltnico tambm motivo de piadas e

    brincadeiras dos colegas de classe, e a afirmao dessa situao pode causar um

    constrangimento ao aluno.

  • 32

    A tabulao dos dados relativos aplicao do teste na EEEM Godofredo Schneider

    revela o seguinte:

    Considerando o grande nmero de turmas onde foram aplicados o teste, no foi

    possvel, no mesmo dia, a reaplicao do teste para se confirmar os alunos

    daltnicos. Assim, os testes tiveram que ser aplicados em outro dia. Acontece que

    neste dia nem todos os alunos estiveram presentes na escola, portanto, s pode-se

    confirmar o daltonismo presente em quatro alunos. Por uma questo de viabilidade

    de horrios, no foram feitas a confirmao nos outros trs alunos, que ficaram fora

    do resultado final. Porm, considerando que a quantidade de alunos confirmados j

    nos dava base para a posterior coleta de informao pelas entrevistas, decidimos

    por dar sequncia s atividades da pesquisa, mediante a necessidade de nos

    adequarmos ao espao tempo disponvel para sua efetivao.

    A somatria dos dados obtidos coma aplicao do teste nas duas escolas,

    considerando o total do universo de alunos que participaram do mesmo, nos revela

    que um total de 0,84% dos nossos sujeitos investigados possuem traos de

    daltonismo. No entanto, insistimos, mais uma vez, que no alcance desse resultado

    podem ter ocorridos casos em que alunos omitiram informaes ou mesmo copiaram

    os testes dos colegas, no obstante os esforos dos pesquisadores em evitar esse

  • 33

    tipo de burla por parte dos alunos. Registra-se, tambm que os testes em que o

    crculo de controle foi respondido errado, foram descartados. Assim, levando-se em

    considerao essa porcentagem, nossos resultados destoam da literatura, que

    aponta que o daltonismo afeta cerca de 10% da populao em todo o mundo com

    predominncia no gnero masculino. (NEIVA, 2008, apud MAIA, SPINILLO, 2013, p.

    16).

    Resultado Global dos testes levantados nas escolas parceiras.

    No entanto, reafirmamos aqui, que os dados apresentados nesse trabalho so

    meramente ilustrativos e no visou mapear ou traar uma estatstica do percentual

    de aluno daltnico em escolas da educao bsica. Nosso objetivo central foi o de

    identificar a presena de alunos com traos do daltonismo para comporem o

    universo de sujeitos a serem entrevistados, no intuito de traarmos alternativas

    metodolgicas para o ensino de Geografia que facilitem a efetivao da

    aprendizagem para tais alunos. Para se ter um perfil estatstico do percentual

    efetivamente existente de alunos daltnicos faz-se necessria a reaplicao dos

    testes, observando-se os entraves e distores j anunciadas.

    Aps a aplicao dos testes e a identificao dos alunos com traos e

    caractersticas daltnicas, nosso prximo desafio foi o de entrar em contato

    novamente com as unidades escolares e agendar um novo dia para que fossem

    realizadas entrevistas com alunos. Para realizao das entrevistas, optamos por

    combinar roteiro semiestruturados com questes mais objetivas. O intuito foi o de

    598

    5

    Testes Aplicados Alunos Daltonicos

    TESTE DE ISHIHARA

    Srie1

  • 34

    deixar o aluno mais livre para descrever acontecimentos e experincias a respeito

    de como ser daltnico. Deixamos claro que os nomes seriam resguardados a fim

    de no criar nenhum constrangimento futuro.

    Percebemos tambm a necessidade de colocar a famlia como um eixo da

    problemtica, uma vez que a famlia tambm, responsvel pela percepo dos

    acontecimentos da vida escolar e cotidiana do aluno. Essa opo se pautou no

    depoimento da me do integrante Andr, Cludia Helena Erler Tonini, cujo fato de

    ser daltnico j foi mencionado anteriormente. Percebemos que a mesma, foi de

    fundamental importncia no diagnstico do filho e fez uma srie de mecanismo para

    que ele conseguisse acompanhar o andamento normal em uma atividade que ele

    sentiria dificuldade, conforme depoimento da mesma, em conversa informal com os

    pesquisadores:

    O Andr vinha com um monte de lpis de uma mesma cor para casa, fiquei com medo de ele estar pegando material e no devolvendo aos colegas. Ento eu perguntava o porqu disso estar acontecendo, a ele me respondia que pedia um lpis emprestado do aluno, um lpis verde, amarelo, vermelho, rosa. Para ele poder colorir certo... Na famlia tenho um primo que daltnico, uma vez ele comprou uma banheira rosa para um filho que tinha nascido... Ento eu soube que Andr era daltnico, pois tambm perguntava a ele as cores, e ele no sabia me responder, ou sabia por exemplo, que o sol amarelo, mas quando eu mandava ele pegar o amarelo na caixinha de lpis, ele pegava o verde-claro ou o laranja, ou o amarelo de fato...

    E a nossa depoente, ainda completou relatando como ajudava o aluno a saber as

    cores respectivas dos lpis:

    Fazia o seguinte: cortava a ponta superior do lpis e escrevia a cor correspondente. Assim ele no precisava pegar nada emprestado: - a rvore ento seria pintada pelo lpis escrito verde.

    Consideramos, tambm, a necessidade de aplicar os questionrios aos educadores,

    pois os mesmos so parte fundamental na problemtica do projeto, uma vez que os

    professores, pedagogos, diretores, etc, conhecendo a situao, podero adotar

    medidas que possam contribuir para o seu contorno.

    Ressaltamos aqui, mais uma vez, as memrias do integrante do grupo de pesquisa,

    que daltnico. O mesmo relata que no jardim de infncia, aps colorir o tronco da

  • 35

    rvore de uma cor errada foi levado aos puxes no brao pela sua professora ao

    ptio da escola, juntamente com um lpis de cor. A professora mostrou o lpis e a

    arvore para o mesmo, dizendo: t vendo? Essa a cor da rvore!. Segundo o

    pesquisador, naquela ocasio no entendeu nada, pois no sabia o que era

    daltonismo, e pelo visto, a professora tambm.

    Evidencia-se, assim, que se os educadores estiverem cientes dessa situao,

    podem lidar com a problemtica de uma maneira menos agressiva, como no

    exemplo anterior. Nesse sentido, optamos por entrevistar, tambm oseducadores

    sendo eles: uma professora de educao especial, um pedagogo e professores de

    artes, histria, ingls, portugus e geografia, sem saber se eles j tinham

    conscincia ou no da existncia de um aluno daltnico na escola e, se os mesmos

    sabiam de fato o que era daltonismo. A sugesto das entrevistas fora feita na prpria

    sala de professores ou nas salas em que os professores cediam as aulas para a

    aplicao dos testes de Ishihara. Todos se comprometeram em serem entrevistados,

    elogiando a iniciativa e contribuindo dessa forma para o futuro do nosso projeto, sem

    saber se eles j tinham conscincia ou no da existncia de um aluno daltnico na

    escola e, se os mesmos sabiam de fato o que era daltonismo.

    Para realizao das entrevistas e coleta dos dados empricos, explcitos nas

    narrativas dos sujeitos que se dispuseram a participar da presente investigao, sem

    nos prendermos rigidamente nos pressupostos da Histria Oral Temtica, tomamos-

    a, como parmetro metodolgico na conduo das entrevistas. Tal fato se justifica

    pelo fato de que, segundo Bom Meihy (1996), a

    Histria oral um recurso moderno usado para a elaborao de documentos, arquivamento e estudos referentes vida social de pessoas. Ela sempre uma histria do tempo presente e tambm conhecida por histria viva (...) a histria oral se apresenta como forma de captao de experincias de pessoas dispostas a falar sobre aspectos de sua vida mantendo um compromisso com o

    contexto social; (1996, p. 13).

    Assim, seguindo tais preceitos, considera-se que a base da Histria Oral o

    depoimento gravado, portanto, constituem condio mnima o entrevistador, o

    entrevistado e a aparelhagem da gravao. Nesse sentido, todas as entrevistas

  • 36

    foram gravadas, transcritas e nos possibilitaram obtermos narrativas dos nossos

    sujeitos, acerca da problemtica que iremos discutir.

    As narrativas, portanto, dever seguir uma linha temtica, por isso, nossa opo por

    questes semiestruturadas, objetivando fundamentar a nossa temtica inicial de que

    deve haver uma discurso a respeito da forma de educao aos daltnicos de modo

    que os mesmos no sejam excludos em certas atividades e tambm, nortear uma

    futura proposta de educao que comtemplem esses alunos.

    Figura 1 - Roteiro de entrevista semiestruturada realizada com os alunos

    Fonte: Elaborada pelos autores

    Conforme j explicitado anteriormente, foram realizadas cinco entrevistas com os

    alunos, no obstante termos identificado um nmero maior de alunos. Isso se

    justifica pelo fato de que, conforme tambm j informado, as datas de aplicao do

    teste e realizao das entrevistas foram diferentes, o que no foi possvel entrevistar

    todos os alunos, uma vez que os mesmos no frequentaram a aula no dia da

    realizao da entrevista. Considera-se, tambm, que j era previsto a adeso

  • 37

    espontnea dos alunos com traos daltnicos em participarem como sujeitos da

    pesquisa.

    No que se refere s narrativas dos alunos que participaram da pesquisa, a maioria

    respondeu que sabia o que era daltonismo, no obstante asdificuldades em

    conceituar. Nesse sentido, as expresses comumente usadas foram dificuldades de

    enxergar cores, ou ver as cores diferentes das outras pessoas. O que da uma viso

    de resposta em baseada no senso-comum, mas tambm em conformidade com a

    literatura, onde segundo Neiva (2008, apud MAIA, SPINILLO, 2013, p. 16) o

    daltonismo a incapacidade de distino e ou identificao de cores.

    Observa-se, ainda que em sua totalidade, os alunos que participaram da entrevista,

    afirma que no sabiam que tinham daltonismo, embora maioria tambm afirme que

    suspeitava desse fato. Foi, segundo suas narrativas, com os resultados do teste de

    Ishihara que puderam confirmar essa condio. Um aluno entrevistado alega no

    confiar somente no teste e, portanto, que ir procurar um diagnstico mdico,

    conforme sua narrativa

    Tipo assim, eu fiquei curioso, achei que daltonismo era preto branco e cinza. Pesquisei e vi que tinha muitos graus... Vou ter que fazer uma consulta, mais sinceramente estou com medo...

    Outro sujeito, tambm afirma que suspeitava ter daltonismo. Segundo suas

    narrativas tais suspeitas decorriam do fato de colorir errado, quando fui desenhar a

    falaram que eram as cores erradas, era o desenho.

    As principais dificuldades, decorrentes dos traos do daltonismo, apontadas pelos

    nossos alunos colaboradores, se referiam, sobretudo com a interpretao de

    grficos e mapas e tambm com contedos e atividades desenvolvidas nas aulas de

    Artes, conforme se observa nas narrativas abaixo:

    Ainda mais como mapas e grficos assim... as cores so muito similares, ento dificulta bastante identificao de cada, cada dado.

    A minha maior dificuldade na disciplina de Artes, n. A professora manda fazer um desenho, a dependendo da cor eu fico perguntando ao pessoal por medo de errar porque eu sou daltnico....

    Eu tive dificuldades em bastantes exerccios, tipo geografia e outras que apresentam grficos. Os grficos... as coisas assim so muito semelhantes. Em mapas as cores me confundem, ainda mais as

  • 38

    azuladas, amarelo, verde sempre dificultam a identificao de cada uma.

    E o prprio aluno que aponta as dificuldades relacionadas s tonalidades de cores,

    ao se trabalhar com mapas, apresenta como alternativa para mitigar essa deficincia

    dos daltnicos, a possibilidade de:

    A prpria tonalidade das cores, se diferenciar bastante nos mapas as tonalidades eu acho que facilitaria para quem daltnico.

    Alguns alunos lembraram casos especficos, como em exerccios ou em uma prova,

    como nos revelam as narrativas abaixo:

    ... atividade de geografia tinha que fazer um grfico e identificar um pas pela cor, a quando eu ia fazer esse pas com essa cor e eu pegava a cor errada, fora isso no muito.

    pra falar a verdade sim, principalmente nas aulas de artes, interpretao de grficos e mapas, tipo interpretao de grficos que tinha cores parecidas e eu no conseguia diferenciar as cores... Embola as informaes.

    Evidencia nitidamente a necessidade de se buscar alternativas possveis para a

    superao de obstculos como os acima explicitados, a narrativa do aluno abaixo,

    ao ser perguntado sobre como conseguia interpretar um mapa que estava exposto

    na sala de aula. O referido aluno informou que s via trs cores, quando, na

    realidade, no mapa existiam sete diferentes cores. E o mesmo aluno ainda narra:

    Fui fazer a prova do PAEBES, e assim, a primeira questo de geografia tinha uma interpretao com legenda de cores que mandava identificar a regio hachurada e eu no enxergava a cor e

    chutei a questo.

    No que se refere conscincia da famlia sobre a ocorrncia do daltonismo, nossos

    colaboradores afirmaram que apenas as mes sabiam das manifestaes de

    dificuldades. Em alguns casos, nossos sujeitos informara que as mes, embora

    soubessem de suas dificuldades, no enxergavam o fato como uma situao sria,

    em alguns casos, at desconsiderando os fatos, conforme se visualiza nas

    narrativas abaixo:

    S minha me sabe. Mas acho que ela no leva isso a srio. Fala que besteira minha.

  • 39

    Minha me parece que ela j sabia, porque ela disse que quando eu era pequeno ela comeou a me ensinar as cores e ela chegou na minha beira e disse: Pedro a cor da geladeira bran... a tipo assim, ela tentava completar as frases para eu tentar falar que cor era e eu falava que era preta, mas era branca.

    Tambm buscamos saber dos nossos sujeitos colaboradores, se a escola onde

    esto matriculados tinha conhecimento de que os mesmos eram daltnicos. Apenas

    um aluno nos informou que a escola sabia, j que a professora de Artes j havia

    aplicado o teste de Ishihara, anteriormente:

    Sabe, no entanto, s a professora de Artes que ela lida com isso um pouco diferente. Tipo assim, quando ela vai fazer qualquer desenho ela diz que cor , s isso.

    Ainda segundo afirmam dois de nossos sujeitos colaboradores, alguns amigos

    sabem da situao. Com isso, ficam apenas zoando com os alunos, perguntando

    as cores de tudo, nunca passando de uma brincadeira. Ao serem perguntados se j

    se sentiram discriminados ou envergonhados com o fato, os alunos garantem que

    no, pois os colegas fazem apenas brincadeiras. Em suas palavras:

    S de zoao: mesmo que tem uma televiso que laranja e para mim eu acho que amarela

    S os amigos que brincam.

    Vale aqui considerar que as narrativas dos alunos colaboradores, refletem uma

    situao de desencontro de informaes sobre a situao de ser ou no daltnico,

    de o que ser daltnico e o que essa situao pode modificar na vida escolar de

    uma pessoa. Percebe-se que, de maneira bastante velada, a interferncia nas

    atividades de aprendizagem bastante significativa. Isso se evidencia com bastante

    nitidez, ao considerarmos que um grupo de alunos daltnicos no consegue, em

    determinada atividade, acompanhar com o mesmo ritmo de uma pessoa que

    enxerga as cores de modo normal. Assim, justifica-se a proposio de trabalhos

    investigativos e de reflexes que possibilitem a incluso desta temtica nos debates

    acerca da educao formal. Trata-se de um percentual significativo de cidados que

    se deparam cotidianamente com obstculos na efetivao de seu processo de

    formao e que, portanto, h que se buscar e propor alternativas para que forma

    esses alunos no se sintam prejudicados, ou percam de certa forma uma informao

  • 40

    necessria para a formao da vida escolar desse cidado. Portanto, apesar de ser

    uma deficincia de diversos nveis, todos eles podem vir a despertar desconforto

    psicolgico no indivduo e a necessidade da presena de outras pessoas para

    realizar determinadas tarefas (MAIA; SPINILLO, 2013, p.16). Alm disso, a errada

    interpretao das cores pode suscitar inseguranas na integrao num dado

    contexto social sempre que a imagem pessoal projetada seja um fator determinante

    de julgamentos e juzos de valor (NEIVA, 2008, apud MAIA, SPINILLO, 2013, p.

    16).

    Sendo assim, considera-se importante dispor ferramentas que lhes proporcionem

    independncia e segurana, principalmente em atividades dirias como a escolha do

    vestido ou o uso de um sistema de informao baseado em cor.

    muito frustrante para uma criana ter a certeza de que est vendo um objeto de determinada cor, enquanto todos os colegas e a professora afirmam que ele de outra. Alm disso, o aluno portador de daltonismo pode encontrar dificuldades para interpretar grficos, mapas, tabelas, bandeiras, trabalhos em computador e aulas de educao artstica, por exemplo. (SANTOS; VILA-VERDE; FERREIRA; NOVAIS, 2011, p.2).

    Em nossas entrevistas, as disciplinas mais lembradas pelos sujeitos entrevistados

    foram a de Artes, no colorir o desenho da forma correta, e a disciplina de

    Geografia, na interpretao de grficos e mapas, que com o jogo de cores podem

    prejudicar o aluno a adquirir a totalidade das informaes presentes ali. Vale

    registrar, no entanto, que no se podem excluir as outras disciplinas, pois a

    utilizao de grficos, mapas e imagens coloridas em geral, est presente em todas

    as matrias do currculo escolar, e ainda que no foram lembradas e/ou

    mencionadas pelos alunos em questo, s o ato de no observar determinada cor

    em uma imagem j pode se tornar uma informao a menos no para o aluno.

    As narrativas dos alunos que participaram da presente pesquisa reafirmam que

    alunos daltnicos possuem dificuldades no processo educacional. Essas

    dificuldades perduram por toda a trajetria educacional desses alunos j que o

    daltonismo uma caracterstica hereditria, ou seja, est presente nos indivduos

    desde o seu nascimento. Nesse sentido, Santos; Vila-Verde; Ferreira; Novais (2011,

    p.2) explicam que o daltonismo um transtorno hereditrio de herana recessiva

  • 41

    ligada ao sexo e a herana clssica para o daltonismo est ligada ao cromossomo

    sexual X.

    Como vrias outras sndromes e situaes particulares genticas, conforme pode se

    observar pela literatura mdica disponibilizada at a presente data, no existe

    mtodo de cura para o daltonismo. A anomalia se d na retina, e congnita,

    hereditria e incurvel, afirma Katia MoherdauiVespucci4.

    No h como um daltnico que nasce com essa caracterstica, algum dia enxergar

    de acordo com as demais pessoas de viso normal. Portanto a escola no pode se

    furtar ao desafio de enfrentar e trabalhar essa questo, como tantas outras, de forma

    a no excluir os alunos com essas caractersticas de todas as informaes

    possveis.

    Mediante tais constataes e pressupostos, buscamos ouvir e dar vozes

    educadores atuantes nas escolas pesquisadas, no intuito de encontrar pistas e

    sinais de prticas alternativas na superao das dificuldades inerentes aos alunos

    daltnicos, no que se refere ao processo de aprendizagem. Os educadores

    entrevistados foram os que se dispuseram entrevista j na sala de aula que estava

    sendo aplicados os testes, e tambm alguns que concordaram em ceder entrevista

    na sala dos professores.

    Assim, ao todo foram entrevistados sete educadores e, a exemplo dos

    procedimentos metodolgicos adotados com os alunos, tambm aqui utilizamos do

    critrio de invisibilidade de nossos sujeitos colaboradores, garantindo-lhes, assim, a

    privacidade.

    4

    Daltnicos ao volante, disponvel em: http://www.sinaldetransito.com.br/artigos/daltonicos_ao_volante.pdf, acesso em 10/11/2014, s 18:30.

  • 42

    Para subsidiar a realizao das entrevistas com os professores que se dispuseram a

    participar de nossa investigao, definimos o seguinte roteiro semiestruturado:

    Figura 2 - Roteiro de entrevista semiestruturada realizada com os educadores

    Fonte: Elaborada pelos autores

    A grande maioria das respostas sobre o que daltonismo dos docentes

    entrevistados tambm foi baseada no senso-comum. As respostas obtidas ficaram

    apenas na definio de daltonismo como sendo uma dificuldade em enxergar cores.

    Apenas um professor disse no saber o que era, e nunca ter ouvido falar sobre o

    tema. Tal constatao mostra-se preocupante, uma vez que era pressuposto que o

    educador deveria pelo menos ter noo que essa situao existe.

    Quando um educador informa nunca ter ouvido falar de uma situao que no to

    rara no cotidiano escolar, a situao nos reporta discusso acerca da formao

    acadmica desse profissional de uma maneira especfica e dos cursos de formao

    de professores, de maneira geral, apontando para a deficincia de tais cursos ao

    no abordarem a temtica.

    Dentre os professores colaboradores, apenas um foi direto no conceito do

    daltonismo, afirmando j ter buscado informaes com uma colega e com leitura

    complementar. Em suas palavras:

  • 43

    Eu sei sim. j fiz algumas leituras sobre a temtica, que fez at parte de uma de minhas discusses, no por uma questo da disciplina que eu trabalho, hoje que geografia que envolve a lidar com imagens, grficos etc, e mapa. Mas por uma questo biolgica mesmo que a gente levantou aqui na escola, quando uma colega da rea de biologia. Mas o meu conhecimento assim que foi a partir da minha conversa com ela. Como ela biloga que eu pude esclarecer

    minhas dvidas a respeito do tema de daltonismo.

    Quando nossos sujeitos professores foram perguntados se sabiam da existncia de

    algum aluno daltnico na escola, as respostas foram que no. Alguns alegam que

    agora que est sendo realizada essa pesquisa, com aplicao dos testes de

    Ishihara, eles ficaram sabendo do fato, conforme narram:

    No sabia. Fiquei sabendo hoje do aluno da 8 srie, meu aluno... ... daltnico.

    O aluno da 8 srie que vocs entrevistaram ele j tinha comentado comigo h um tempo atrs que ele daltnico, n?

    Tomei conhecimento de um aluno da 8 srie a que tem esse problema e eu j tive algumas conversas com ele a respeito, dessa dificuldade dele e aparentemente que no conhece acha que no tem problema nenhum.

    Mediante ao questionamento acerca de uma possvel interferncia da condio de

    daltonismo, no processo de ensino-aprendizagem, assim se posicionaram nossos

    professores colaboradores:

    Interfere. Interfere uma vez que trabalhar com Geografia que envolve n, por exemplo, utilizar os recursos da cartografia para trabalhar minhas aulas n. essas aulas de cartografia envolvam o uso de grficos, o uso de tabelas, o uso de mapas. Muitos desses mapas so mapas temticos que envolvem a questo da cor. Eu acredito que esses so fatos que influenciam bastante tambm. bem significativa a interferncia dessa problemtica, desse problema no que se refere ao lidar com a minha matria em sala de aula.

    No. Eu no notei nenhuma dificuldade at porque o aluno apontado com, , em geral um dos bons alunos, em raras excees. Acho que ele um bom aluno, com boas informaes. Ento se existe alguma dificuldade, porm na minha disciplina ele no apresentou nenhuma.

    Quando a professora identifica esses traos, eu acho que no atrapalha no. Quando a professora e o aluno identificam. Porque se o professor no sabe que ele tem o daltonismo, eu acho que ele tem que ter a conscincia disso ele tem que falar:- olha professor eu sou daltnico. Porque a o professor no vai considerar ele com aquilo que ele faz, entendeu? E a o professor j vai usar outras cores para ele.

  • 44

    Esta ltima narrativa vem reafirmar a importncia do diagnstico prvio, haja vista

    que se o professor tem conscincia do fato, poder tomar as suas providencias,

    propor alternativas de ensino de maneira a no prejudicar ainda mais o aluno.

    Outra questo que se apresentou aos nossos professores colaboradores se

    relaciona com o fato de a escola, principalmente a pblica, estar preparada para

    lidar com esse tipo de alunado. Nesse sentido, a grande maioria dos entrevistados

    afirmaram julgar que no h um preparo da escola, conforme exemplifica a narrativa

    abaixo:

    No. A escola no t preparada. Desde, a etapa inicial que a matricula do aluno, quando a secretaria no pergunta, no interroga no diagnostica se o aluno tem esse problema... desde a at passar para o pedagogo, at passar para o professor em sala de aula. E, assim como o professor, a escola tambm no est preparada para atender essa demanda de aluno. Eu nunca vi, anteriormente, no sei de caso nenhum na escola de aluno com daltonismo. Ento isso parte do princpio que a escola no sabe lidar com esse tipo de aluno. Mesmo que a escola no atenda essa demanda de aluno. Parece-me que no objetivo da escola lidar com isso. Nem a Secretaria da Educao da rede pblica de ensino parece estar preparada para trabalhar esse aluno como aluno de incluso. mesmo assim a escola no t preparada.

    Apenas um educador respondeu que a escola est preparada, porm dando nfase

    na importncia da identificao do aluno:

    Preparada a escola est sim, desde que voc identifique o aluno. Porque se o aluno tem nota boa no altera nada o professor s vai mudar algumas estratgias com ele, ele vai usar... ele vai pintar um mapa de uma cor o professor vai ter que estar junto orientando e o colega tambm, ele j sabendo no custa procurar ajuda.

    Assim, mediante a indagao a respeito da opinio pessoal dos nossos

    entrevistados, se os mesmos julgam que os alunos daltnicos devem ser includos

    no rol dos alunos com necessidades especiais, as respostas obtidas tambm foram

    bem divididas, como se verifica nas narrativas abaixo:

    entendendo aluno de incluso de educao especial como aquele aluno que vai ter o seu processo avaliativo complicado por conta de sua deficincia, eu acredito que o daltnico tambm deva ser inserido a nesse grupo de aluno, nesse nicho de alunos que deva ter um tipo de atendimento especial. Como eu falei grande parte do que eu trabalho em sala de aula com a questo visual, do audiovisual.

  • 45

    analise de msica, analise de grfico, tabelas e mapas. Analise de imagens tambm. Uma vez que esse aluno, por conta do daltonismo, possui algum tipo de dificuldade a fazer essa anlise, o seu processo avaliativo vai ser complicado. Ento esse aluno uma vez prejudicado ele deva sim receber, tem que receber algum tipo de atendimento especial para que possa mitigar esses problemas no que se refere a avaliao do mesmo.

    No. Com os de necessidades especiais no. Porque eu no imagino que seja uma coisa to grandiosa assim. Mas a gente que precisaria assim... um pouco de cuidado para lidar com eles, todos os professores no s o de Artes.

    Importante mencionar que todos os educadores que participaram da pesquisa,

    ressaltaram a relevncia de trabalhar esses alunos, no intuito de garantir a efetiva

    educao dos mesmos e, apesar de alguns julgarem que os referidos alunos no

    devem ser includos como alunos com necessidades especiais, so unnimes ao

    afirmarem a preocupao para que o processo de ensino aprendizagem seja efetivo

    para todos.

    As narrativas dos educadores entrevistados nos revelam um dado relativo ao no

    conhecimento aprofundado do fato de que o daltonismo est presente no cotidiano

    escolar. Acreditamos que isso se justifica pelo fato de que o nmero dos alunos

    daltnicos seja relativamente pequeno e, ainda, que muitas vezes nem os prprios

    daltnicos sabem de suas condies, alm daqueles que omitem essa informao.

    Ora, o desconhecimento da presena desse tipo de aluno no cotidiano da sala de

    aula, leva, por consequncia, ausncia de atividades didtico-pedaggicas

    alternativas que possam contribuir com o processo de aprendizagem de tais sujeitos.

    Embora, em sua maioria, os professores desconhecessem a existncia de alunos

    daltnicos em suas salas de aula, os mesmos demonstraram, unanimemente, terem

    conhecimento e acreditarem na importncia dessa temtica. Porm, s param para

    discuti-la quando, de fato, tiveram a certeza de que existem alunos daltnicos na

    escola em que trabalham.

    Pensamos assim que a partir dessa informao, os educadores passam a olhar com

    cuidado os alunos com essa caracterstica. Mais uma vez ressaltamos aqui a

    importncia do teste, que iden