Decisao do agravo arvoredo

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Agravo de Instrumento n. 2014.040953-1, de Criciúma Agravante : Construtora Locks Ltda Advogados : Drs. Moacyr Jardim de Menezes Neto (23498/SC) e outro Agravado : Ministério Público do Estado de Santa Catarina Promotor : Dr. Luiz Fernando Góes Ulysséa (Promotor) Relatora : Desa. Cláudia Lambert de Faria DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pela CONSTRUTORA LOCKS LTDA., contra a decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Fazenda da comarca de Criciúma que, nos autos da Ação Civil Pública n. 020.14.006107-0, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, ora agravado, deferiu, parcialmente o pedido liminar, determinando a empresa ré/agravante se abstenha de realizar qualquer obra, serviço, limpeza de vegetação, supressão, deslocamento ou qualquer outro ato que importe em modificação do estado atual da área referente ao loteamento Condomínio do Arvoredo, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (fls. 39/44). Pugna pela concessão do efeito suspensivo e, ao final, pelo provimento do recurso, com a reforma da decisão recorrida. É o relatório. O recurso é tempestivo, foi instruído com os documentos indispensáveis, relacionados no art. 525, inc. I, do Código de Processo Civil, e recolhido o respectivo preparo, preenchendo assim os requisitos de admissibilidade. Resta averiguar se a fundamentação do agravo é relevante e plausível, acarretando não um juízo de certeza, mas de probabilidade acerca do objeto da discussão. Insurge-se a agravante contra a decisão de primeiro grau que deferiu, parcialmente o pedido liminar, determinando sua abstenção em realizar qualquer obra, serviço, limpeza de vegetação, supressão, deslocamento ou qualquer outro ato que importe em modificação do estado atual da área referente ao loteamento Condomínio do Arvoredo, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00. Da análise dos autos, observa-se que, de fato, a Fundação do Meio Ambiente - FATMA, expediu Certidão n. 1042757/2010 (fl. 505 do Inquérito Civil), informando que a atividade de drenagem do canal "não integra a Listagem de Atividades Consideradas Potencialmente Causadoras de Degradação Ambiental, aprovada pela Resolução CONSEMA 01/06", motivo pelo qual a empresa agravante

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Agravo de Instrumento n. 2014.040953-1, de CriciúmaAgravante : Construtora Locks LtdaAdvogados : Drs. Moacyr Jardim de Menezes Neto (23498/SC) e outroAgravado : Ministério Público do Estado de Santa CatarinaPromotor : Dr. Luiz Fernando Góes Ulysséa (Promotor)Relatora : Desa. Cláudia Lambert de Faria

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pela CONSTRUTORALOCKS LTDA., contra a decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Fazenda dacomarca de Criciúma que, nos autos da Ação Civil Pública n. 020.14.006107-0,ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, oraagravado, deferiu, parcialmente o pedido liminar, determinando a empresaré/agravante se abstenha de realizar qualquer obra, serviço, limpeza de vegetação,supressão, deslocamento ou qualquer outro ato que importe em modificação doestado atual da área referente ao loteamento Condomínio do Arvoredo, sob pena demulta diária no valor de R$ 1.000,00 (fls. 39/44).

Pugna pela concessão do efeito suspensivo e, ao final, pelo provimentodo recurso, com a reforma da decisão recorrida.

É o relatório.O recurso é tempestivo, foi instruído com os documentos

indispensáveis, relacionados no art. 525, inc. I, do Código de Processo Civil, erecolhido o respectivo preparo, preenchendo assim os requisitos de admissibilidade.

Resta averiguar se a fundamentação do agravo é relevante e plausível,acarretando não um juízo de certeza, mas de probabilidade acerca do objeto dadiscussão.

Insurge-se a agravante contra a decisão de primeiro grau que deferiu,parcialmente o pedido liminar, determinando sua abstenção em realizar qualquerobra, serviço, limpeza de vegetação, supressão, deslocamento ou qualquer outro atoque importe em modificação do estado atual da área referente ao loteamentoCondomínio do Arvoredo, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00.

Da análise dos autos, observa-se que, de fato, a Fundação do MeioAmbiente - FATMA, expediu Certidão n. 1042757/2010 (fl. 505 do Inquérito Civil),informando que a atividade de drenagem do canal "não integra a Listagem deAtividades Consideradas Potencialmente Causadoras de Degradação Ambiental,aprovada pela Resolução CONSEMA 01/06", motivo pelo qual a empresa agravante

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passou a realizar a obra de canalização.Contudo, não resta dúvida que a canalização de água e o consequente

desvio de seu curso natural é atividade potencialmente poluidora e que acarretadanos ao meio ambiente.

A respeito, colhe-se entendimento desta Corte de Justiça:

AÇÃO CAUTELAR - LIMINAR DEFERIDA - SUSPENSÃO DE OBRA DEFINALIZAÇÃO DE VIA PÚBLICA - CANALIZAÇÃO DE CURSO D'ÁGUA -ATIVIDADE POTENCIALMENTE LESIVA AO MEIO AMBIENTE - NECESSIDADEDE ESTUDO AMBIENTAL SIMPLIFICADO (EAS) - RECURSO IMPROVIDO.

A canalização de cursos de água figura na listagem de atividadespotencialmente causadoras de degradação ambiental, passíveis de licenciamentoambiental, nos termos das Resoluções do CONSEMA n. 001/2006 e 0003/2008.Mesmo as áreas com extensão menor ou igual a dois quilômetros, como no caso,estão sujeitas ao Estudo Ambiental Simplificado (EAS), devendo ser mantida adecisão que suspendeu a construção potencialmente lesiva, para o fim de prévioestudo sobre o seu impacto ambiental. (TJSC - AI n. 2010.055550-6, de Ascurra.Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, julgado em 09/122010).

Além disso, também está demonstrado que o órgão ambientalresponsável, de forma equivocada, dispensou a empresa agravante do licenciamentode atividade de canalização de curso d'água, tanto que, posteriormente, em abril de2013, a Fundação do Meio Ambiente de Criciúma - FAMCRI emitiu o Parecer n.233/2013 atestando que a FATMA "cometeu um equívoco ao enquadrar umaatividade licenciável como atividade não constante" (fl. 64 do Inquérito Civil), fato quetambém restou demonstrado através do Parecer n. 015/2013 (fls. 66/69 do InquéritoCivil).

Portanto, existindo indícios de que a agravante está violando regra deproteção ao meio ambiente, a medida mais correta, é a suspensão da atividadepoluidora até sua regularização, porquanto a proteção ao meio ambiente é um direitogarantido pela Constituição Federal, que assim prevê, em seu art. 225, in verbis:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bemde uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao PoderPúblico e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes efuturas gerações.

Nesse sentido, citam-se julgados deste Tribunal de Justiça:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONCESSÃO DELIMINAR - ALEGADO ESGOTAMENTO DO OBJETO DA AÇÃO - INOCORRÊNCIA -PROVA PERICIAL DEFERIDA - AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO PRÉVIA DOPODER PÚBLICO - DESNECESSIDADE - SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA -PRELIMINARES REJEITADAS.Não há falar em esgotamento do objeto da demandaquando o Magistrado defere liminar em ação civil pública determinando aSUSPENSÃO de ATIVIDADE econômica suspeita de causar danos ao meio

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AMBIENTE, sobretudo quando a medida judicial de urgência apenas objetivou aprevenção do direito material tutelado, qual seja, a preservação de determinadoecossistema até que a instrução da lide conclua se a ATIVIDADE é ou nãocausadora de dano ambiental, dependendo, para tanto, de prova pericial.Consoantea jurisprudência hodierna, pode o Magistrado, diante do caso concreto, desde quepresentes os requisitos legais (fumus boni juris e periculum in mora), e verificandotratar-se o caso de extrema urgência, deferir liminar em ação civil pública tendente aimpedir a ocorrência de dano ambiental, independentemente da oitiva do PoderPúblico.DIREITO AMBIENTAL - EXTRAÇÃO E BENEFICIAMENTO DE GRANITO -ATIVIDADE PRATICADA EM DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO E AS LICENÇASAMBIENTAIS - ALEGADA ATIVIDADE ECONÔMICA DE RISCO AMBIENTAL AOSISTEMA HÍDRICO NA REGIÃO POR OUTRAS EMPRESAS - PROTEÇÃO AOMEIO AMBIENTE - INTERESSE COLETIVO - EXEGESE DO ART. 225 DA CF -PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO - PRESENÇA DO FUMUS BONI JURIS E DOPERICULUM IN MORA - RECURSO DESPROVIDO. A prevenção de dano ao meioAMBIENTE, com o fim de proteger o interesse coletivo, pois a reparação, casoocorra dano ambiental, afigura-se incerta, onerosa e muitas vezes irreversível,justifica o deferimento de liminar tendente a obstar, ainda que de forma provisória, acontinuidade de ATIVIDADE econômica suspeita de causar dano a um determinadoecossistema. A existência de outras irregularidades porventura verificadas contra omeio AMBIENTE por outras empresas, não afasta a ilicitude e não confere direitos;os abusos e as violações das leis devem ser coibidas e nunca imitadas (nonexemplis sed legibus est judicandum), pois todos são iguais perante a lei paracumpri-la e não para descumpri-la. Com base nos princípios da "precaução" e da"prevenção", as autoridades devem tomar medidas preventivas sempre que existiremmotivos razoáveis de preocupação com a saúde pública e a manutenção doecossistema equilibrado, ensejando, pois, a paralisação imediata de qualquerATIVIDADE econômica tendente a degradar o meio AMBIENTE sadio. (TJSC - AI n.2004.021074-4, de Garopaba. Rel. Des. Rui Fortes, julgado em 15/02/2005 – semgrifo no original).

APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO SEGURANÇA. ENGENHO DE FARINHA.ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA. INTERDIÇÃO DOESTABELECIMENTO ANTE A AUSÊNCIA DA RESPECTIVA LICENÇAAMBIENTAL. VIOLAÇÃO AO ART. 60 DA LEI N. 9.605/1998. ALEGADA INÉRCIADO ÓRGÃO AMBIENTAL NA CONCESSÃO DO REFERIDO LICENCIAMENTO.NÃO COMPROVAÇÃO. PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DO ALEGADO DIREITOLÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADA. ORDEM DENEGADA. É sabido que "emtema de controvérsia sobre licenciamento ambiental, a ponderação dos riscos eeventuais prejuízos deve, à luz do princípio da precaução e ante a possibilidade depericulum in mora inverso, ser resolvida em favor do INTERESSE COLETIVO naPROTEÇÃO ao meio AMBIENTE" (AI n. 2009.026444-3, da Capital, rel. Des. NewtonJanke, j. em 15-9-2009).Na hipótese, inviável a manutenção da atividade produtivadesenvolvida pelo impetrante, qual seja, produção de farinha de mandioca, uma vezque potencialmente poluidora, bem como porque até o presente momento não foitrazida aos autos a respectiva licença ambiental, embora concedido prazo paratanto.SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO (TJSC - AC em MS n.2011.056682-5, de Jaguaruna. Rel. Des. Vanderlei Romer, julgado em 28/11/2011 –

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sem grifo no original).

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DEMOLITÓRIA - OBRACONSTRUÍDA SEM AUTORIZAÇÃO DO MUNICÍPIO - AUTO DE INFRAÇÃOAMBIENTAL - EDIFICAÇÃO INSERIDA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃOPERMANENTE - IMPOSSIBILIDADE DE REGULARIZAÇÃO - PREPONDERÂNCIADO DIREITO COLETIVO AO MEIO AMBIENTE SADIO E EQUILIBRADO EMDETRIMENTO DO DIREITO À MORADIA.Considerando que restou comprovado nosautos que a construção foi realizada sem a devida autorização do Município, bemcomo que é impossível regularizar tal situação eis que a obra foi erguida em área depreservação permanente, cabível, pois, a demolição."Todos têm direito ao meioAMBIENTE ecologicamente equilibrado. O direito ao meio AMBIENTE equilibrado éde cada um, como pessoa humana, independentemente de sua nacionalidade, raça,sexo, idade, estado de saúde, profissão, renda ou residência. (...) Por isso, o direitoao meio AMBIENTE entra na categoria de INTERESSE difuso, não se esgotandonuma só pessoa, mas se espraiando para uma coletividade indeterminada."(MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 13. ed. São Paulo:Malheiros, 2005. p. 116) É hialino que o meio AMBIENTE, direito de terceira geração,de INTERESSE difuso e COLETIVO, das presentes e futuras gerações, deve estarsobreposto aos interesses individuais, mormente nos casos em que verifica-seflagrante o desrespeito às normas de PROTEÇÃO a natureza. DANO MORALAMBIENTAL - POSSIBILIDADE - REQUISITOS QUE AUTORIZAM A INDENIZAÇÃONÃO VERIFICADOS - DEVER, CONTUDO, DE RECUPERAR A ÁREADEGRADADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO."É admissível a indenizaçãopor dano moral ambiental nos casos em que a ofensa ao meio AMBIENTE acarretasentimentos difusos ou coletivos de dor, perda, sofrimento ou desgosto." (ApelaçãoCível 2000.025366-9, da Capital, rel. Des. Newton Janke, j. 23.09.04). (TJSC - AC n.2009.064540-9, da Capital. Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, julgado em08/01/2010 – sem grifo no original).

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANO AMBIENTAL -EDIFICAÇÃO DE RESIDÊNCIA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE -CABO DE SANTA MARTA PEQUENA (PRAIA DA GALHETA) - ÁREA NONAEDIFICANDI - INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO OU LICENÇA DO ÓRGÃO DEPROTEÇÃO AMBIENTAL - RECURSO DESPROVIDO."Entre o risco demonstradode agressão ao meio AMBIENTE e os eventuais prejuízos a serem suportados peloparticular, em obediência ao princípio da proporcionalidade, impõe-se seja protegidoo bem maior - o INTERESSE COLETIVO" (AI n. 2002.009857-0, de Joinville).O art.225, § 1°, III, da CF/88, veda qualquer utilização de área que comprometa aintegridade dos atributos que justificam a PROTEÇÃO ambiental. (TJSC - AC n.2007.060848-1, de Laguna. Rel. Des. Rui Fortes, julgado em 27/08/2009).

Assim, a prevalecer os entendimentos colacionados, por precaução ediante do periculum in mora a toda coletividade, visando resguardar o meio ambiente,a providência mais adequada é manutenção da decisão agravada, mantendo aabstenção, por parte da ré/agravante, em realizar qualquer obra, serviço, limpeza devegetação, supressão, deslocamento ou qualquer outro ato que importe em

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modificação do estado atual da área referente ao loteamento Condomínio doArvoredo, até análise do mérito pela Câmara competente.

De qualquer forma, cabe consignar que, nesta fase do agravo deinstrumento, apenas de cognição sumária, a questão é apreciada apenas de formasuperficial, a fim de verificar a existência ou não dos requisitos necessários àconcessão do efeito liminar pleiteado, sem, contudo, esgotar a discussão da matéria,que cabe à Câmara decidir.

Em face do exposto, admito o processamento do agravo na sua formade instrumento e, nos termos do artigo 527, inciso III, do Código de Processo Civil,indefiro a concessão do almejado efeito suspensivo, mantendo, por ora, os termos dadecisão agravada, até o pronunciamento definitivo da Câmara competente.

Comunique-se ao MM. Juízo a quo.Cumpra-se o disposto no art. 527, incisos V e VI, do Código de Processo

Civil.Após, à redistribuição nos termos do Ato Regimental n. 41/2000.Publique-se.Intime-se.Florianópolis, 07 de julho de 2014.

Cláudia Lambert de FariaRELATORA

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